processo arbitral vs processo civil_pt_2010
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Processo arbitral: Princípios fundamentais e desvios mais relevantes relativamente ao processo civil (Nos termos do novo projecto de lei proposto pela APA)
Trabalho Final da Pós-graduação de Arbitragem
Por Álvaro Martins Freitas em 2010
Alvaro Freitas Página 1/26 07-10-2011
UMA QUESTÃO DE PRINCIPIOS…
“As Leis podem variar, mas os princípios são universais”
Processo arbitral
PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS E DESVIOS MAIS RELEVANTES
RELATIVAMENTE AO PROCESSO CIVIL
(Nos termos do novo projecto de lei proposto pela APA)
Organização do trabalho:
1. Breve introdução.
2. Relevância dos princípios fundamentais. Processo justo (Due Process).
3. O processo arbitral. Princípios fundamentais no PROJAPA.
3.1 Direito positivo nacional.
3.2 Referências internacionais (transnacionais).
4. Comparação com o Processo Civil.
4.1 Desvios mais relevantes.
5. Conclusão.
Processo arbitral: Princípios fundamentais e desvios mais relevantes relativamente ao processo civil (Nos termos do novo projecto de lei proposto pela APA)
Trabalho Final da Pós-graduação de Arbitragem
Por Álvaro Martins Freitas em 2010
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1. Introdução. O objectivo específico deste trabalho é verificar e analisar os princípios fundamentais presentes no
processo arbitral, elencá-los, analisá-los e relacioná-los com o projecto de nova Lav da APA (doravante
denominado PROJAPA).
Complementarmente, e ainda dentro do escopo deste trabalho será efectuada uma comparação com os
princípios do processo civil destacando essencialmente os desvios mais relevantes entre as duas formas
processuais.
Finalmente, procuraremos retirar as conclusões possíveis e demonstrar alguma da relevância desta
problemática.
Pela natureza deste trabalho as análises efectuadas são necessariamente sucintas e não dispensarão
aprofundamentos para quem queira dar carácter científico ao tema.
Importa ter presente que este não é um tema geralmente tratado autonomamente. Na verdade a doutrina
aborda estas questões de forma integrada em outras problemáticas, tais como a impugnação da
sentença arbitral, o recurso e os seus efeitos, a problemática do respeito pela Ordem Pública
Internacional do Estado Português, a arbitrabilidade, o estatuto dos árbitros, a natureza especial dos
conflitos administrativos, laborais e penais, a natureza, validade, caducidade, inexistência de convenção
arbitral entre muitos outros.
Assim, torna-se mais difícil elaborar um trabalho desta natureza num contexto como este (trabalho de
final de pós-graduação) em regime pós-laboral.
Fomos verificando à medida que o tempo ia passando e que os problemas se nos colocavam que a
matéria poderia merecer e seguramente exigir uma maior dedicação e seria apta para propiciar uma
investigação mais ampla sobre o tema relacionando.
Ficamos com a sensação «a posterior» que poderia ser útil para o saber conhecido aprofundar mais
detalhadamente o que se pensa e diz sobre o tema nos principais mercados mundiais da matéria.
Tal não era nem podia ser o compromisso assumido com este trabalho pelo que os resultados também
não podem ser todos aqueles que gostaríamos.
Do conjunto de princípios abordados e minimamente analisados esperamos ter focado os que mais
relevos apresentam, mas temos claro que muitos outros ficaram por analisar e tratar.
A metodologia seguida passou por identificar os principais princípios fundamentais, verificar o que
alguma jurisprudência e doutrina diz sobre eles a para da legislação e do PROJAPA procurar
compreender a problemática subjacente a cada um deles e passar a papel as principais ideias retidas
mesmo correndo o risco de alguma (certa) imprecisão.
No final após a leitura do trabalho esperamos que seja possível sentir que o mesmo dá um micro
contributo para a clarificação de ideias e um futuro tratamento mais detalhado pelos vindouros.
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Por Álvaro Martins Freitas em 2010
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2. Relevância dos princípios fundamentais. Processo justo (Due Process).
Em determinados contextos e situações extremas podem estar em causa elementos vitais, senão atente-
se neste texto que aqui reproduzimos:
“ (...) condena categoricamente estas execuções, que se seguiram a um julgamento somatório que não
seguiu os devidos trâmites, e [também] o facto de a sentença ter sido aplicada no mesmo dia, negando
aos acusados o direito de apelarem" da sentença, (...) ” extraído de notícia publicada online.
A diferença entre a vida e a morte demonstra a enorme relevância da aplicação dos princípios do
processo.
Como se pode aferir pelo extracto acima referenciado a inobservância dos devidos trâmites de um
processo podem ter consequências catastróficas e irreversíveis.
Tal como refere António Santos Abrantes Geraldes1, «o recurso aos grandes princípios do nosso sistema
processual (civil) constitui um instrumento fundamental para a busca das soluções mais acertadas».
Tanto no processo civil, como no processo arbitral, a relevância dos princípios fundamentais advém,
desde logo, definida pelo relevo constitucional que lhe é atribuído (e do impacto acima referido –vida ou
morte).
Com efeito, na CRP, logo no art. 3º n.º 2 estabelece-se o princípio da legalidade, ou seja da plena
subordinação à lei. A primazia da lei sobre tudo o demais no maior respeito pela vida humana.
Segue-se um primeiro afloramento do princípio da igualdade no art. 13º, a integração internacional
dos direitos fundamentais no âmbito no art. 16º, o princípio da aplicação directa no art. 18º (do maior
relevo pois torna os princípios fundamentais de aplicação directa no nosso ordenamento jurídico), e
depois no art. 20º temos assegurado o acesso ao direito, à assistência judiciária, a uma decisão em
prazo razoável, e a um processo equitativo, com celeridade, em defesa dos seus direitos.
Este conjunto de 10 direitos/princípios referem-se essencialmente à natureza do processo, à esfera
privada das pessoas e ao modo de exercício do poder.
Depois, para definir a realidade “tribunais” a CRP apresenta um conjunto adicional de regras e princípios
dos quais destacamos, no art. 202º - a atribuição da função jurisdicional aos tribunais, a atribuição de
poder soberano aos tribunais (não especifica se públicos ou privados), a defesa do princípio da
legalidade para dirimir os conflitos públicos e privados e o direito dos tribunais à coadjuvação das
autoridades (não especifica se públicos ou privados).
De seguida, estabelece o princípio da independência no art. 203º, atribuindo assim à Justiça o papel
de terceiro poder livre e independente cujo principal papel é a aplicação da justiça nos termos da lei e
dando prevalência à CRP, como prescreve o art. 204º.
Continua a CRP no art. 205º a prever a fundamentação das suas decisões (resultado do principio da
legalidade) e o efeito “erga omnes” das decisões dos tribunais (não especifica se públicos ou
privados2).
1 in “Temas da Reforma do Processo Civil”.
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Segue a determinar o princípio da publicidade no art. 206º para as audiências dos tribunais e o direito
ao patrocínio (assistência judiciária), art. 208º, em ambos os casos não especificando se públicos ou
privados.
Finalmente, determina a relevância constitucional dos tribunais arbitrais que está expressa no art.
209º n.º 2 remetendo para a lei as condições de funcionamento e organização.
Este preceito é concretizado através da actual LAV e prevê-se futuramente através da passagem do
PROJAPA a lei (nova LAV).
Deste modo, devemos ter presente que o processo arbitral tem também em vista, concretizar aqueles
direitos e princípios constitucionais e a regras internacionais inerentes a esta tipologia processual de
resolução de litígios, dando o seu contributo para agilizando a justiça, torná-la mais célere e eficaz.
Essa eficácia deve por isso respeitar sempre os preceitos e princípios constitucionais e como tal adequar
a sua acção aos conceitos do chamado processo justo (equitativo, segundo a constituição) com toda a
segurança.
Não basta assegurar a qualquer interessado o acesso à justiça: tão importante como esse acesso é
garantir que o processo a que se acede apresenta, quanto à sua própria estrutura e funcionamento,
garantias de justiça.
Este direito ao processo justo encontra-se expressamente consagrado no art. 10º Declaração Universal
dos Direitos do Homem, no art. 14º/1 Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos e no art. 6º/1
Convenção Europeia dos Direitos do Homem (integração internacional acima referida).
Todos estes preceitos atribuem o direito a um processo equitativo, que se concretizam nas garantias de
imparcialidade e de independência do Tribunal, de igualdade das partes, de publicidade das audiências,
do juiz legal ou natural e de proferimento da decisão num prazo razoável e na viabilidade da dupla
jurisdição.
Ou seja, em regra os princípios a que deve obedecer um processo para que seja considerado justo são:
� Segurança (Estabilidade da instância) – juiz natural ou legal estável e regras pré-definidas.
� Imparcialidade e independência - julgamento imparcial (colectiva e/ou individualmente).
� Igualdade de tratamento das partes - plena ou substancial igualdade das partes.
� Contraditório – direito à defesa (citação, pronuncia, etc.) ou seja, direito ao contraditório.
� Duração razoável do processo (celeridade) - uma duração razoável da acção.
� Publicidade do processo – permitir que seja público.
� Dupla jurisdição – permitir a correcção de erros aumentando a segurança judicial.
Estes deverão ser os princípios observados nas previsões legais do processo arbitral de acordo com a
nossa legislação e também no processo civil estadual como procuraremos verificar de seguida.
2 A CRP ao não especificar em tantos artigos estes aspectos deixa dúvidas de até onde
podem ir os tribunais arbitrais no exercício da sua jurisdição, tanto mais que lhes dá
relevância constitucional.
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Também o projecto APA deverá manter na generalidade as preocupações de garantia de um processo
justo fazendo dele o elemento estrutural das suas previsões legais.
3. O processo arbitral. Princípios fundamentais na Lav actual e no PROJAPA.
3.1 Direito positivo nacional.
Os princípios fundamentais previstos na LAV estão definidos no art. 16º e são essencialmente os
seguintes:
� Princípio da igualdade. Alínea a).
� Princípio do Contraditório (pressupõe a citação como elemento mínimo e a audição oral ou
escrita antes da decisão). Alíneas b, c e d).
Como podemos aferir dos princípios fundamentais do processo justo apenas encontramos dois.
Contudo, esta discrepância é mais aparente do que real, porquanto:
� O princípio da segurança (estabilidade da instância) e da imparcialidade estão previstos nos
artigos do capítulo II onde se verifica a dificuldade de substituição dos árbitros, a sua
responsabilidade pela estabilidade do processo – art. 9º e 10º - e o dever de imparcialidade;
� O princípio da celeridade é inerente ao processo arbitral e está expresso no art. 19º onde se
determina um prazo muito curto para a prolação de uma decisão.
� O princípio da dupla jurisdição comummente conhecido como o direito ao apelo, leia-se
recurso, está previsto no art. 29º de forma clara e expressa.
Na realidade somente o princípio da publicidade está totalmente derrogado no processo arbitral onde em
alternativa vigora o princípio da confidencialidade.
Deve-se este regime ao facto de se pretender que a arbitragem, como meio alternativo e particular de
composição de litígios seja executada no recato tranquilo que as partes consideram mais adequado para
a boa resolução dos seus litígios.
Derroga-se o princípio da publicidade não como forma de denegar a justiça ou o acesso a ela mas como
meio de permitir uma forma diferente de justiça onde se privilegia a confidencialidade (o segredo de
justiça) em nome da reserva da privacidade das partes e porque assim elas o determinam quando optam
pelo recurso ao processo arbitral.
Neste particular, no PROJAPA o regime altera-se um pouco como veremos.
Quanto ao princípio da legalidade como dissemos os tribunais arbitrais estão sujeitos a ele nos termos
indicados na constituição e isso revê-se no art. 1º da LAV, onde se determina que a origem do poder de
autoridade do tribunal arbitral é contratual, ou seja, depende da vontade das partes e da celebração por
elas de uma convenção arbitral (clausula compromissória ou compromisso arbitral).
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No PROJAPA os princípios fundamentais encontram-se previstos essencialmente nos seguintes
articulados:
Princípio do contraditório - Art 30 n.º1 a) e c) visa garantir o direito à defesa em todas as
circunstâncias
Art 30 n.º1 a) citação como garantia de pressuposto para realizar o
contraditório
Princípio da igualdade Art 30 n.º1 b) visa garantir a igualdade de tratamento e de oportunidades
Princípio da imparcialidade
e independência
Art. 9º n.º 3 visa garantir a Independência e imparcialidade de forma
expressa o que não acontece literalmente na LAV.
Art 30 n.º4 permite através da livre apreciação da prova garantir a
independência do tribunal
Princípio da segurança e
estabilidade
Art. 30º n.º 2 As partes têm papel na definição das regras processuais
Art. 30º N.º 3 Neste caso o tribunal actua supletivamente às partes ou
por atribuição de competência delas
Princípio da celeridade Art. 43º n.º 1 O prazo passa a ser de 12 meses prorrogáveis .
O projecto altera o prazo legal previsto (alarga-o) e cria a possibilidade
de prorrogar esse prazo uma ou mais vezes embora as partes possam
por acordo opor-se à prorrogação.
Esta solução de alargamento do prazo pode por em causa o princípio da
celeridade e como tal deve ser vista com muito cuidado.
Parece-nos exagerado permitir o alargamento generalizado do prazo e a
sua prorrogação indefinida.
Pensamos que seria de distinguir o que é diferente e dar soluções
diversas em função do grau de dificuldade – p.ex. casos de especial
complexidade, com multiplicidade de partes poderiam beneficiar deste
regime, mas o mesmo já não se diga para um processo simples de valor
diminuto.
Princípio da
confidencialidade
Art 30 n.º 5 Garantir a confidência processual preservando a privacidade
das partes.
Art 30 n.º 6 Abre a porta da publicidade parcial
Prevê-se a possibilidade de as partes poderem autorizar a publicidade
parcial do processo mas sem identificação das mesmas a fim de manter
o sigilo e a sua privacidade. Tem duas vantagens;
- Uma é dar a conhecer a produção de jurisprudência arbitral que será
muito útil,
- A outra é desrespeitar em menor grau a previsão constitucional da
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publicidade dos actos processuais
Princípio da dupla
jurisdição ou
recorribilidade
Art. 46º n.º 1 só por prévio acordo das partes é que existirá possibilidade
de recurso, mas a regra geral passa a ser não existir.
A única via de efectivar uma dupla jurisdição é a solução do pedido de
anulação de sentença arbitral ou o pré-acordo das partes na existência
de recurso.
Esta é a regra geral na generalidade das legislações arbitrais.
Pressupõe-se que estamos apenas perante matéria patrimonial da qual
as partes podem dispor e transigir, criar, modificar ou extinguir direitos ou
ónus, pelo que a figura do recurso torna-se menos desnecessária.
Mais ainda quando se pretende celeridade e se opta por uma via
alternativa de resolução de litígios como a arbitragem.
Querendo salvaguardar a via do recurso de apelo/cassação as partes
deverão então prevê-lo na convenção arbitral ou então deverão recorrer
aos tribunais estaduais.
O pedido de anulação assenta essencialmente nos mesmos critérios que
a Lav apresenta no seu art. 27º, mas parte da doutrina considera, e
quanto a nós bem, que também deveria ser motivo de anulação a
preterição pelo tribunal arbitral de normas de ordem pública internacional
do Estado Português alinhando assim a nova lei com as legislações dos
principais países com tradição na matéria e com a Convenção de NY. No
seu art. V n.º 2 alínea b).
Ver a este propósito os textos do Prof. Luis Lima Pinheiro3.
Complementarmente, verificamos que existe um conjunto adicional de princípios que não estando na
categoria dos fundamentais contribui significativamente para a matriz central do processo arbitral.
Estes princípios já estavam presentes na actual LAV e continuam como parte integrante do PROJAPA.
Como passamos a confirmar:
Princípio do dispositivo Art 46º n.º 3 iii) v) O Tribunal só pode decidir questões que estejam no
âmbito da competência que a Convenção Arbitral ou as partes lhes
atribuíram.
No processo arbitral o tribunal não pode decidir ou sequer deixar de
decidir sobre matérias que devesse conhecer ou que não devesse
conhecer, nem decidir «ultra petita» ou decidir sobre coisa diversa do
pedido.
Tais acções são fundamento de anulação da sentença como determina o
Projapa no seu art. 46º n.º 3 v).
3 Prof. Lima Pinheiro in, … Apontamento sobre a impugnação da decisão arbitral
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Isto significa que as partes são as únicas com capacidade de decidir
sobre o que deve ser dirimido em tribunal.
Princípio da
Competência-competência
Art 18º n.1 e 8 Só o tribunal arbitral tem o poder de determinar a sua
própria competência com efeito de excluir competência de tribunal
estadual
Trata-se de um princípio segundo o qual o tribunal arbitral é quem tem
competência para determinar a sua competência no caso concreto e ao
fazê-lo produz os seguintes efeitos:
� Efeito negativo – que significa afastar a competência do tribunal
estadual para o caso (494º CPC).
� Efeito positivo – que significa que é o único a apreciar a sua
competência.
A análise é efectuada a partir da convenção de arbitragem.
Princípio da
Autonomia
Art 30 n.º2 e n.º3, Poder de determinar lei aplicável, regras do processo,
julgar segundo a equidade, definir lugar arbitragem, língua do processo e
regras de prova Art 39º n.º 1, Art 31º, Art 32º, entre outras.
As partes no processo arbitral detêm uma capacidade de determinação
do processo muito grande, designadamente: estabelecerem a arbitragem
como forma de resolução dos litígios, a possibilidade de escolher
árbitros, definir local, língua e direito aplicável, acordar o regime
processual a seguir incluindo o regime de prova e da admissibilidade de
recurso.
Resulta claramente muito mais flexível a metodologia arbitral que apenas
peca por falta de “ jus imperii”.
A generalidade da doutrina arbitral e das legislações ocidentais tem este
tipo de matriz que é característica distintiva e “sine qua non” do processo
arbitral e uma das suas principais vantagens.
O processo arbitral caracteriza-se, assim, por uma grande autonomia
das partes embora com as limitações inerentes ao princípio da
legalidade, às normas imperativas e às normas de ordem pública interna
ou internacional.
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3.2 Referências internacionais (transnacionais).
A generalidade dos regulamentos dos principais centros de arbitragem internacional estrutura os seus
regulamentos em torno do projecto da Lei-Modelo da UNCITRAL4.
Complementarmente, seguem em geral as regras recomendadas pela IBA5.
De acordo com estas orientações gerais a maioria das regras dos processos arbitrais compõem-se dos
seguintes momentos:
1) Fase de apresentação das posições das partes – pedidos e respostas.
2) Fase de audiência para prova e alegações.
3) Fase de decisão.
No inicio da segunda fase ou entre a primeira fase e a segunda pode existir uma audiência prévia (ou as
partes serem ouvidas pelo tribunal) para efectuar um planeamento do processo e determinar em mais
detalhe como se deverá proceder na fase segunda. É o caso previsto no art. 15º n.º do Reg Suíço.
Desta forma as melhores práticas internacionais eliminam em regra (salvo especial complexidade dos
conflitos e temas a tratar) a fase de saneamento do processo com ganhos efectivos de tempo e dinheiro.
Para a orientação do processo dispomos a nível internacional dos seguintes instrumentos padrão:
� Lei-Modelo UNCITRAL, que tende a servir de base às novas e modernas legislações sobre
arbitragem em todos os países por se tratar de uma sugestão de modelo de lei-quadro que dá as
principais referências do que deve ser a pratica processual na arbitragem. O PROJAPA está
próximo deste modelo.
� ALI Unidroit6, Princípios Processuais Civis Transnacionais, que serve de padrão para a moderna
regulamentação das leis processuais estaduais civis.
� IBA Rules, para admissão e produção de prova em arbitragens internacionais, facilitando assim a
definição de quais as regras a observar para garantir um tratamento igual e o contraditório.
� IBA Guide Lines, para ajudar a determinar regras de definição da imparcialidade e
independência dos árbitros.
Para além destes elementos que apoiam a construção e o desenvolvimento de um processos arbitral
justo dispomos adicionalmente de vasta informação referente a inúmeros centros internacionais de
arbitragem de renome mundial e dos quais apenas destacamos três que são comummente reconhecidos
como principais quer pela procura que têm (sinal de reconhecimento de qualidade) quer pelo destaque
que a doutrina lhes atribui e mais um pela seu destaque no mercado português.
� SR - Regulamento Suíço.
� LCIA – Regulamento de Londres.
� ICC – Regulamento de Paris (CCI).
� CAC – Regulamento de Lisboa
4 United Nations Commission For International Trade, também conhecida por CNUDCI 5 International Bar Association 6 International Institute for The Unification Of the Private Law
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Em todos estes regulamentos verificamos uma similitude de organização e funcionamento processual
que passa pelas três fases acima descritas e depois deriva em especificidades de cada centro e
regulamento.
Na nossa opinião não cabe no âmbito deste trabalho analisar detalhadamente estes regulamentos e
estas instruções mas não podemos deixar de transcrever as ideias chave do ALI DROIT; Princípios
Processuais Transnacionais por reconhecermos que representa muito bem o espírito dos princípios
fundamentais do processo arbitral. Principais elementos ALI DROIT a destacar:
� Independência, imparcialidade e qualificação do Tribunal e dos juízes (árbitros) art. 1º.
� Jurisdição sobre as partes (dependente consentimento das partes e em razão da matéria) art. 2º.
� Tratamento igual das partes, art. 3º.
� Direito de contratar um advogado, comum direito à defesa e ao patrocínio, art., 4º.
� Direito a conhecer os factos e pretensões e a ser ouvido, art. 5º.
� Língua de acordo com o Tribunal, se outro não for o entendimento deste, art. 6º.
� Pronta resolução do litígio, (celeridade), art. 7º.
� Possibilidade de medidas cautelares, art. 8º.
� Processo organizado geralmente em três fases (como acima explicámos), art. 9º.
� Processo deve ser iniciado pelas partes (por uma queixa ou pretensão – dispositivo – partes
devem indicar causa de pedir e pedido), art. 10º.
� Conduta das partes assente na boa-fé, art. 11º.
� Admissibilidade de múltiplas partes, art. 12º.
� Admissão de «amicus curiae» (intervenção de terceiros que possam ajudar), art. 13º.
� Tribunal tem a responsabilidade pela condução do processo, art. 14º.
� Seguindo-se demissão e substituição de árbitros,
� acesso a informação e provas,
� sanções aos intervenientes por faltas ou recusas,
� privilégios e imunidades,
� procedimentos orais e escritos,
� publicidade dos procedimentos orais sempre que não seja necessário defender
a privacidade das partes ou interesses públicos,
� ónus da prova,
� determinação dos factos determinantes e da lei,
� fundamentação das decisões,
� encorajamento de acordos entre as partes,
� custos e executabilidade imediata.
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Menos detalhada a Lei-Modelo da UNCITRAL no seu capítulo V abarca alguns destas regras e como tal
podemos facilmente concluir:
� São dominantes e estão alinhados os princípios fundamentais também identificados no nosso
direito interno, a saber:
� Contraditório,
� Igualdade,
� Imparcialidade,
� Segurança (estabilidade processual),
� Celeridade,
� Confidencialidade (com excepção deste).
� Fazem parte da natureza do processo arbitral os princípios que identificámos como essenciais
para o “ADN” da arbitragem, a saber:
� Dispositivo das partes,
� Autonomia das partes e do Tribunal para decidir regras de processo,
� Competência do tribunal de acordo com a sua própria avaliação (Competência-
competência).
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4. Breve análise aos princípios fundamentais do Processo Civil.
Os princípios fundamentais previstos no processo civil estão definidos em inúmeros artigos de forma
explícita ou implícita. e representam um acumular de muitos anos de reflexão e experiência forense e
legislativa.
Naturalmente que foram evoluindo ao longo dos anos de acordo com as culturas maioritárias vigentes,
transformando-se e adaptando-se, muitas vezes tardiamente, às novas realidade económico-sociais.
Hoje verificamos que o processo civil na senda das ideias igualitárias que a revolução de Abril nos trouxe
assenta os seus princípios nos mesmos conceitos previstos na CRP.
Isto significa que assenta em princípios e direitos iguais ou similares aos do processo arbitral, na sua
essência.
Claro que isto não significa que um esteja subordinado ao outro ou que exista alguma relação de
supletividade entre eles.
Devemos entender que são similares nos princípios por questões constitucionais e de justiça geral e
abstracta mas apenas nisso sendo diversos e por vezes muito divergentes na sua estrutura e prática.
Feitas estas ressalvas podemos então aferir quais os principais princípios vigentes no processo civil e
dentro desses quais os fundamentais.
Desde logo, devemos destacar o princípio da legalidade previsto na CRP e ao qual o processo civil
também naturalmente se submete.
Tudo está sujeito à lei e nada pode ser feito contra esta ou em derrogação desta.
Depois encontramos um conjunto de princípios que podemos agrupar em três variáveis que são:
Princípio Fundamentais Contraditório, Igualdade, Segurança (Estabilidade da instância),
Celeridade, Imparcialidade, Dupla jurisdição e Publicidade.
Princípios instrumentais Dispositivo, Preclusão, Aquisição formal, Adequação processual,
Economia processual, Oficiosidade e Inquisitoriedade
Princípios particulares Boa-Fé, Auto-Responsabilização das partes, Cooperação e Dever de
Recíproca Correcção.
Verificando que cada um destes princípios tem uma função e utilidade processual, uma vez agrupados
deste modo podemos facilmente apreender a sua natureza.
Os princípios fundamentais correspondem essencialmente aos princípios do processo justo e são
aqueles que mais nos importa reter no âmbito deste trabalho.
Os demais princípios indicados têm funções importantes ou essenciais mas já não estão dentro do nosso
objectivo.
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Para um melhor entendimento das diferenças e/ semelhanças passamos a efectuar mais alguns
comentários adicionais.
Princípio do contraditório.
Ainda relativamente a este princípio importa por em evidência a sua natureza essencial para a
estruturação do processo.
A sua importância é de tal forma grande que regra geral dispõe de dignidade constitucional e faz parte
integrante dos princípios do “due process”, isto é, dos princípios do processo justo sendo um dos seus
pilares.
Permite a defesa às partes demandadas e demandantes e tem implícito o princípio da citação como
momento inicial fundamental para o exercício da defesa.
Está bem presente em qualquer das formas processuais (arbitral ou estadual) ainda que naturalmente
tenha formas diferentes de se manifestar e exercer quer quanto ao modo quer quanto à intensidade.
O direito do contraditório – que é uma decorrência do princípio da igualdade das partes estabelecido no
art. 3º-A do CPC, possui um conteúdo multifacetado: ele atribui à parte não só o direito ao conhecimento
de que contra ele foi proposta uma acção ou requerida uma providência e, portanto, um direito à audição
antes de ser tomada qualquer decisão, mas também um direito a conhecer todas as condutas assumidas
pela contraparte e a tomar posição sobre elas, ou seja um direito de resposta.
O art. 3º/3 1ª parte CPC, impõe ao juiz o dever de observar e fazer cumprir, ao longo de todo o processo,
o princípio do contraditório.
Princípio da igualdade.
Este princípio revela-se também fundamental para a estruturação do processo e a sua importância está
bem patente pela relevância constitucional que lhe é atribuída e pela forma como é expresso em todas s
legislações analisadas e indicadas, sem excepção.
É que sem tratamento igual as partes não são justamente tratadas e são afectadas na sua dignidade e
direitos.
A problemática inerente é tratada especificamente pela lei mas sempre com dificuldade em estabelecer
as fronteiras e a forma de se exercer este princípio,
� Bastará que seja dada às partes uma oportunidade razoável ou condições razoáveis ou
igualdade substancial?
� Devem duas partes com necessidades jurisdicionais diferentes ser tratadas de forma igual?
� Ou devem ser tratadas de forma ajustada às suas necessidades?
� Em que medida é que se garante a igualdade de uma ou de outra forma?
Trata-se do direito que têm os litigantes de receberem idêntico tratamento ou seja, ambas as partes
devem gozar das mesmas faculdades e oportunidades processuais.
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Trabalho Final da Pós-graduação de Arbitragem
Por Álvaro Martins Freitas em 2010
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Ambas as partes devem possuir os mesmos poderes, direitos, ónus e deveres, isto é, cada uma delas
deve situar-se numa posição de plena igualdade perante a outra e ambas devem ser iguais perante o
Tribunal.
Parece ser prática corrente que bastará dar a cada parte as mesmas oportunidades e tratamento, mas
na realidade tal pode não significar tratamento igual pois uma das partes pode não ter possibilidade de
usufruir dos seus direitos por motivos alheios à sua vontade e à sua condição.
Deverá nesse caso o tribunal pender para uma das partes para equilibrar a balança?
Parece que não tanto quanto pudemos apurar em geral ao tribunal compete manter a imparcialidade e
independência, isenção e neutralidade. Essa é a sua obrigação não podendo tomar partido.
Contudo, pode agir no sentido de que uma das partes ultrapasse algumas das suas limitações sempre
quando não afecte o contraditório e a igualdade de tratamento. Vejamos um exemplo; o tribunal pode
chamar a depor alguém a quem uma das partes não tem acesso mas que é convicção do tribunal pode
saber informações úteis para que se esclareça a verdade material. Isto não compromete os princípios
referidos e antes facilita o cumprimento da obrigação de acesso e á realização da justiça.
Esta igualdade das partes, que deve ser assumida como uma concretização do princípio da igualdade
consagrado no art. 13º CRP, é agora um princípio processual com expressão legal no art. 3º-A CPC,
este preceito estabelece que o Tribunal deve assegurar, durante todo o processo, um estatuto de
igualdade substancial das partes, designadamente no exercício de faculdades, no uso dos meios de
defesa e na aplicação de cominações ou de sanções processuais.
Princípio da segurança (estabilidade da instância).
Nesta vertente trata-se de que qualquer parte tem o direito de saber com o que conta e ter a segurança
de poder exercer a sua defesa ou demanda com regras pré-definidas, juiz natural ou legal estável, e
estabilidade de instância, sem ver no futuro a sua situação alterar-se por alteração do processo ou das
regras subjacentes., pelo menos sem que lhe seja dada oportunidade de resposta e ser ouvido pelo
tribunal em condições iguais às do seu oponente.
Sem segurança não existe confiança e sem esta o Estado de Direito desestrutura-se integralmente pelo
que o art. 268º prescreve a estabilidade da instância como factor de segurança.
Pilar da legalidade este principio garante às partes o conhecimento atempado das questões conexas
consigo e permite às partes saber ou antever quais as fases em que os processos se vão desenrolar,
nomeadamente, com as mesmas partes, o mesmo tribunal (colectivo ou singular) a mesma causa de
pedir e o mesmo pedido.
Só assim se realiza este princípio na sua plenitude e só assim é possível garantir o contraditório e a
igualdade das partes.
Trata-se por isso de garantir a unidade e a estrutura do processo dentro da unidade do sistema jurídico
em que se enquadram.
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Princípio da celeridade.
Realizar o direito ou a justiça através de um processo pode ter enormes dificuldades que tornam a justiça
lenta.
Este princípio instrui-nos assim na necessidade de sermos céleres nos procedimentos processuais para
assim, em absoluto respeito pelos princípios, se obtenha uma decisão de um tribunal.
Trata-se um princípio essencial para a unidade do sistema jurídico e tem enorme relevo na forma como
as pessoas percepcionam a justiça.
Não realizar este princípio coloca em causa a segurança e a legalidade.
O art. 2º/1 CPC, atribui à parte o direito de obter, num prazo razoável, a decisão da causa, o que
significa que o Estado tem do dever de disponibilizar os meios necessários para assegurar a celeridade
na administração da justiça.
Este princípio tem integração com a Convenção Europeia dos Direitos do Homem (art. 25º/1), podendo
levar a se solicitar a apreciação da violação pelo Estado português da garantia da decisão do processo
num prazo razoável no Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (arts. 44º e 48º/1 Convenção Europeia
dos Direitos do Homem) e, se for o caso, a atribuição ao lesado de uma reparação adequada (art. 50º
Convenção Europeia dos Direitos do Homem).
Princípio da imparcialidade.
Sem imparcialidade do tribunal e dos seus membros não existe processo justo.
Este princípio é essencial para preservar o sistema e a estrutura do processo e é determinante na
prossecução dos demais.
Não existe legalidade nem contraditório nem igualdade ou segurança que resistam se não existir
imparcialidade.
Tem dignidade constitucional e merece a maior atenção pois é fundação essencial do sistema jurídico.
A administração da justiça não é possível sem um Tribunal independente e imparcial: a imparcialidade
do Tribunal constitui um requisito fundamental do processo justo.
As garantias de imparcialidade do Tribunal podem ser vistas, quer como garantias do Tribunal perante
terceiros, quer como garantias das partes perante o Tribunal.
Na perspectiva das partes, as garantias de imparcialidade referem-se à independência do juiz e à sua
neutralidade perante o objecto em causa.
Constitui ainda uma garantia das partes a chamada independência interna do juiz.
É este aspecto da independência interna que justifica a proibição da prática de actividade político-
partidárias de carácter público e de ocupação de cargos políticos pelos magistrados judiciais em
exercício de funções bem como a proibição do desempenho de qualquer outra função pública ou
privada, salvo as funções docentes ou de investigação jurídica mas apenas desde que não remuneradas
(EMJ).
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Princípio da dupla jurisdição.
No processo estadual a regra é a da recorribilidade para um tribunal superior.
Embora a regra não seja absoluta, criando algumas injustiças claras, desde que reunidas certas
condições existe recurso com efeito suspensivo.
O recurso faz parte integrante das condições de garantia de acesso ao direito e da sua realização
permitindo em jurisdições múltiplas a reanálise da aplicação do direito aos factos dados como provados.
É por isso um indicador importante de garantia de acesso ao direito e à sua adequada realização.
Princípio da Publicidade.
No seguimento da previsão na CRP, art. 206º o processo estadual é público – art. 167º/1 CPC.
A regra é a publicidade do processo embora em situações específicas possa ser fundamentadamente
decretada confidencialidade.
São as situações onde haja que salvaguardar a dignidade das pessoas, da moral pública e/ou garantir o
normal funcionamento da audiência.
Com relação aos demais princípios acima referidos passamos sinteticamente a indicar algumas das suas
expressões legais no CPC:
Princípios instrumentais Dispositivo, Preclusão, Aquisição formal, Adequação processual,
Economia processual, Oficiosidade e Inquisitoriedade
Dispositivo Art 3º, 264º, 467ºn.º 1d), 661º O Juiz só pode decidir o que as partes
levam a juízo.
A iniciativa pertence às partes.
Preclusão Art 467º n.º 1, 489º, 147º n.º2, 145º n.º 3, 145º n.º 5 e 6, 146º
O Tribunal deve garantir que os actos processuais se praticam no
momento previsto e não fora dele.
A ideia é zelar pelo cumprimento dos prazos para evitar dilações , mas
as partes podem prorrogar uma vez por acordo mutuo.
Regime diferente propõe o PROJAPA como veremos depois.
Aquisição processual Art 515º O tribunal tem a liberdade de aproveitar a prova para a justa
resolução da questão substantiva sendo este um claro sinal de
aproximação ao processo arbitral e uma forma de procurar garantir uma
verdade material em detrimento de uma verdade formal ou adjectiva.
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Adequação formal
Art. 265º-A, 508º n.º 1 a), 288º n.º3, 274º
Trata-se de permitir (mais do que isso o juiz deve) adequar o processo
aos interesses controvertidos, flexibilizando a marcha processual e
possibilitando a sanação de irregularidades processuais.
Mais uma tentativa de aproximação ao processo arbitral criando a
possibilidade de uma metamorfose processual ao caso concreto.
Economia processual Art. 137º e 138º Trata-se de garantir que o processo é célere e tem o
mínimo custo possível.
Oficiosidade Art. 265º Conhecer de questões que possam formalmente obstar à
decisão sobre a causa ou aprofundar a prova para cabal esclarecimento
material.
Inquisitório Art. 265º, 266º, 837º-A, 519º-A
Visa possibilitar uma direcção efectiva do processo pelo Juiz que em
anteriores versões legais tinha menos capacidade de acção proactiva no
processo.
No processo arbitral o tribunal pode estar investido do poder de conduzir
o processo como bem entender desde que ouças as partes e garanta
tratamento igual. (ex. Reg. Suíço, art. 15º n.º 1)
Quanto aos princípios que apelidamos de particulares teremos:
Princípios particulares Boa-Fé, Auto-Responsabilização das partes, Cooperação e Dever de
Recíproca Correcção.
Boa-fé processual Art 266º-A
Garantir que o processo não é usado para outros fins que não os do
pedido.
Auto-responsabilidade das
partes
Art 155º Co-responsabilizar as partes pelo processo.
Cooperação Art 266º, 519º Dever de colaborar com o tribunal e com a outra parte.
Dever de recíproca
correcção
Art 266º-B Garantia de urbanidade e lealdade
Nota:
Classificamo-los como particulares porque dizem respeito essencialmente às partes na medida em que
pela sua natureza correspondem a comportamentos exigíveis ou pelo menos expectáveis das partes.
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Entenda-se, contudo, que por partes entendemos todos os actores do processo – árbitros ou juízes,
partes em sentido estrito, os seus representantes advogados, peritos, funcionários e todos aqueles que
de algum modo se relacionem com o processo e devam colaborar para uma boa resolução dos litígios.
Quando dizemos particulares referimo-nos à natureza da sua origem embora se refiram também quer a
interesses particulares quer públicos.
No fundo, esta classificação representa o peso que estes princípios têm e o papel que devem
desempenhar.
Representam a vertente humana e comportamental do Estado de Direito e de um processo justo – é o
podemos chamar de – Factor Humano – e por isso têm uma importância e valor incalculáveis fazem toda
a diferença para uma boa realização da justiça.
Pensando no que é o edifico judicial no seu todo podemos agora expressar graficamente a arrumação
dos princípios que vimos apresentando através da construção de uma casa da justiça e dos princípios.
Princípios instrumentais
Instrumentalidade, Estabilidade instância, Celeridade e Economia processuais, Adequação formal
CONTRADITÓRIO
IGUALDADE
LEGALIDADE
(Celeridade, Recorribilidade)
IMPARCIALIDADE
(Publicidade,
confidencialidade)
SEGURANÇA
(Juiz natural+Estabilidade)
PROCESSO JUSTO UNIDADE SISTEMA
JURIDICO
AUTO-RESPONSABILIZAÇÃO
BOA-FÉ
RECIPROCA CORRECÇÃO
COOPERAÇÃO
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4.1 Desvios mais relevantes dos princípios fundamentais do processo arbitral face ao processo civil.
Em face do exposto resulta que são poucos os desvios ao nível dos princípios fundamentais centrando-
se essencialmente as divergências em torno de três princípios:
� Princípio da dupla jurisdição.
� Princípio da autonomia.
� Princípio da publicidade.
Vejamos um pouco mais em detalhe.
Princípio da dupla jurisdição.
Quanto à dupla jurisdição ou recorribilidade é interessante referir que geralmente se colocam 3 hipóteses
de regulamentação:
1. A proibição de recurso da decisão arbitral. É a solução mais comum desde os
primórdios da arbitragem e ainda hoje muito usada (quando a lei o permite) quer nos
centros institucionais quer na arbitragem ad-hoc. Representa um sentido de elevada
autonomia e idoneidade da arbitragem.
2. O carácter facultativo, podendo as partes excluir ou prever a disponibilidade ou
indisponibilidade de recurso. É o caso actual do PROJAPA onde a regra é não haver
recurso salvo se as partes acordarem a sua disponibilidade. Ao contrario a solução
da actual LAV é a de que cabem recursos das decisões arbitrais salvo se as partes a
isso tiverem renunciado.
3. A obrigação de existir sempre disponibilidade de recurso e de a mesma não poder
ser afastada pela vontade das partes.
Assim, conforme o estatuto que a arbitragem detém e o reconhecimento que obtém ou vai merecendo do
Estado assim se legisla nesta matéria.
A submissão da decisão do árbitro a escrutínio de juiz estadual representa em certa medida o
reconhecimento da sua menor força e autonomia e a forte preocupação do Estado em controlar a
administração da justiça.
De qualquer forma as preocupações inerentes a este princípio centram-se na necessidade de garantir a
realização da justiça de forma segura prevenindo ou eliminando o erro judicial e dar às partes a
possibilidade de ver revista, confirmada ou alterada a decisão que lhe foi desfavorável – uma espécie de
“second chance”.
Estamos no terreno da justiça dos homens onde o contraditório e os meios ao dispor das partes podem
variar significativamente pondo em causa a sua capacidade de litigar em juízo com as mesmas armas e
bagagem
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Assim, a possibilidade de recorrer e ver revista a justiça aplicada torna-se um bem essencial a ponto de
fazer parte do conjunto restrito dos princípios do processo justo.
Entende-se, contudo, no âmbito do processo arbitral que a garantia de realização de justiça não carece
de prever a possibilidade de recurso, bastando a qualidade especializada e natureza imparcial dos
árbitros para garantir uma boa justiça.
Acresce nesta lógica que para salvaguarda de erro material ou injustiça processual está sempre
disponível e de forma irrenunciável o direito ao pedido de anulação de sentença arbitral (Lav art. 27º e
PROJAPA art. 46º) e ainda a possibilidade de oposição à execução de sentença no âmbito das
previsões da Convenção de NY, art. V, n.º 2 alínea a), p.ex.
Assim sendo para quê dispor ainda da possibilidade de recorrer e com isso alongar a produção de
efeitos que urgem à parte vencedora?
Ora bem, os mais convictos defensores da arbitragem não vêm necessidade do recurso para garantir a
justiça e baseando a sua convicção na natureza da própria arbitragem entendem que a opção por esta
implica o compromisso de se submeter de boa-fé à sentença tal como determina o art. 37º da
Convenção de Haia, no Acto Geral de Arbitragem referido pelo Dr. Armindo Ribeiro Mendes7.
Outros convictos defensores da arbitragem que sabem quanto é errónea a justiça humana seguramente
preferem dispor de uma porta de escape mais ampla.
Neste sentido, ponderando ambas as opções pensamos ser mais adequada uma solução como a que
agora é proposta no projecto PROJAPA tornando o recurso disponível por vontade das partes que
negoceiam a convenção de arbitragem e melhor conhecem os seus interesses e necessidades.
Desta forma, faz-se seguramente mais e melhor justiça.
Note-se a propósito desta preocupação de erro de justiça que no âmbito arbitral a legislação inglesa
deixou uma porta aberta para em circunstâncias restritas mas possíveis as partes poderem recorrer da
sentença arbitral alegando erro (grosseiro) de direito. É uma situação interessante, confortável que pode
ser útil em situações específicas em prol da Justiça.
7 in, “Introdução às práticas Arbitrais”
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Princípio da autonomia.
No que respeita ao princípio da autonomia que se descreveu como mais ampla na arbitragem do que no
processo estadual importa recordar que a lei estabelece limites a essa autonomia no art. 280º do Código
Civil, prevendo a nulidade de negócios contrários à lei (princípio da legalidade) e/ou à ordem pública e
ofensivos dos bons costumes, para além dos que tenham um objecto física ou legalmente impossível ou
indeterminado.
Podemos concluir que existe uma grande liberdade e autonomia da vontade das partes sempre que
sejam respeitadas estas limitações e cumprindo os requisitos:
� Da actual LAV art. 1º - “Desde que por lei especial não esteja submetido exclusivamente a
tribunal judicial ou a arbitragem necessária, qualquer litígio que não respeite a direitos
indisponíveis” – ou,
� Do PROJAPA art. 1º – “Desde que por lei especial não esteja submetido exclusivamente aos
Tribunais do Estado ou a arbitragem necessária, qualquer litígio respeitante a interesses de
natureza patrimonial”,
Complementarmente, importa destacar um dos aspectos importantes nesta matéria que é a capacidade
das partes e do tribunal (em eventual audiência preliminar) decidirem sobre os meios e a forma de
produção de prova podendo inclusive definir um plano de litígio ou calendário de acção para controlo do
processo e garantia da sua celeridade.
Tal comportamento corresponde à importação de práticas e metodologias da arbitragem internacional
que representam um rico acervo de experiências a aproveitar e está alinhado com as previsões legais do
contexto internacional como já vimos.
Importa referir, ainda, a este titulo um exemplo clássico e importante que representa uma restrição à
autonomia das partes – não é possível em decisão arbitral das partes e do tribunal inverter o ónus da
prova.
Porquê? Porque o mesmo é um princípio estrutural da ordem jurídica portuguesa e portanto a sua
preterição é contrária à ordem pública e como tal nula, tal como disse o Dr. Filipe Alfaiate8.
Consequentemente, como defende o Prof. Lima Pinheiro9 essa decisão por ser manifestamente contrária
à ordem pública deve ser considerada fundamento de anulação (embora não caiba na letra da lei – LAV,
art. 27º (até para manter congruência com o estabelecido na Convenção de NY, art. V n.º 2 alínea b).
Como exemplo de boa prática arbitral no âmbito da autonomia refira-se a possibilidade das partes
mandatarem os árbitros com poder de autoridade bastante para determinarem o aperfeiçoamento das
regras procedimentais às especificidades do litígio com claro benefício das partes em termos de
celeridade e economia processual.
Note-se, contudo, que este aspecto já não é privilégio do árbitro pois o CPC já prevê o princípio da
adequação formal (art. 265º) permitindo ao juiz adaptar o processo às necessidades específicas do caso
concreto. Não tem a mesma força e significado mas é similar na intenção.
8 in, “A prova em arbitragem, na intervenção no II Congresso do CAC – ACL, 2008
9 in, Apontamento sobre a impugnação da decisão arbitral
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De resto o processo estadual tem vindo a evoluir de forma expressiva na sua atribuição ao juiz de
poderes acrescidos para garantir uma maior procura da verdade material em detrimento da formalidade
processual pelo que vem incorporando noções e regras praticadas na arbitragem tendo em vista
melhorar a celeridade processual e dar mais prevalência à correcta composição material do litígio para
que a justiça percebida pelas partes seja mais eficaz.
Outros aspectos de desvios relevantes em matéria de autonomia no processo arbitral face ao processo
estadual são:
� A capacidade das partes para determinarem a língua. No processo estadual a língua tem de ser
o português – art. 139º CPC.
� A capacidade das partes para determinarem o lugar ou sede da arbitragem. Este facto pode
determinar a lei aplicável ao fundo da causa. No processo estadual isso não é possível embora a
lei processual estadual já permita os chamados pactos de jurisdição. Contudo, estes não
permitem determinar a lei aplicável apenas o local (tribunal competente).
� A capacidade do tribunal reunir em diferentes locais (mesmo países), o que também não é viável
no processo estadual.
� A capacidade das partes para definirem a lei aplicável, o que não acontece no processo estadual
que apenas poderá aplicar as normas nacionais e internacionais que integrem o sistema jurídico
português.
� A capacidade das partes para permitirem ao tribunal arbitral uma decisão por equidade o que no
processo estadual só acontece nos casos previstos na lei.
� A capacidade do tribunal (de acordo com o PROJAPA, art. 35º n.º 4) poder admitir a prática de
um acto omitido bem ao contrário do princípio da preclusão vigente no processo estadual.
Estas são vertentes claramente diferenciadoras dos dois tipos processuais pese embora o processo
estadual já ter também evoluído nesta direcção ao permitir maior intervenção (oficiosa e inquisitória do
juiz) de que é exemplo o art. 645 do CPC.
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Princípio da publicidade.
Relativamente ao princípio da publicidade e do seu contraponto – confidencialidade importa relembrar os
aspectos principais.
Se por um lado a publicidade do processo passou a ser um princípio fundamental para garantir a
transparência e verticalidade da aplicação da justiça – nada a esconder.
Por outro lado, como não pode deixar de ser tem um efeito negativo que é o de expor as partes aos
demais concidadãos em questões que estas podem considerar (ou querer manter) privadas.
Neste sentido a publicidade processual pode funcionar como uma violação da privacidade.
Tanto assim é que existem no processo estadual (onde a regra é a publicidade) áreas específicas (p.ex.
adopção) ou situações legalmente previstas onde a confidencialidade é ou pode (deve) ser decretada
pelo juiz, p.ex os art. 656º e 519º-A do CPC.
No processo arbitral a privacidade é um dos elementos fundamentais (princípio da confidencialidade) e
caracterizadores do seu “ADN”, passe a expressão.
Por um lado, permite uma opção diferente de realização da justiça, por outro, permite que as partes
possam (no âmbito da sua autonomia) preferir discutir os seus litígios (relações controvertidas) longe do
foco e olhar de toda a gente numa autêntica devassa da privacidade.
Certo, também, é que a própria natureza mais patrimonial da arbitragem conduz as partes a optar pelo
recanto privado em detrimento do palco público, seja por questões de segurança seja por questões de
salvaguarda do bom nome (pessoal, empresarial ou imagem de marca).
Importa reter ainda a este propósito que também neste princípio existem importantes aproximações entre
as normas dos dois formatos processuais.
Na verdade existe uma progressão dirigida ao centro ou equilíbrio sem que se descaracterize a tipologia
e a natureza de cada um dos processos em análise (quanto a princípios).
Pela parte do processo arbitral o PROJAPA abre a possibilidade da publicidade da decisão mas
salvaguardando a privacidade das partes e permitindo-lhes que elas a isso se oponham – art. 30º n.º 6.,
pese embora podermos ter dúvidas sobre a constitucionalidade desta regra atentos os preceitos já
referidos, consideramos positiva a direcção tomada.
Esta previsão é uma evolução clara no sentido de matizar um pouco o princípio da confidencialidade
essencialmente pelo grande proveito que se pode obter por dispormos de uma jurisprudência arbitral que
é um saber que a todos aproveitará.
Assim, sem pôr em causa a confidencialidade retira-se o mais importante para terceiros – o saber
aplicado ao caso concreto.
Na vertente do processo estadual caminha-se pelo contrário na direcção oposta, isto é, reforça-se a
possibilidade de permitir a confidencialidade de certos processos por razões especialmente atendíveis
no caso concreto.
Ora isto é uma clara aproximação de conceitos sempre baseados na análise do caso concreto.
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5. Conclusão.
Resulta de tudo o exposto que as duas formas de processo (estadual e arbitral) são em termos de
princípios muito similares divergindo essencialmente na dimensão e complexidade das regras e na
autonomia que as partes têm para interagir com elas.
No final obtém-se essencialmente o mesmo resultado (resolução de um litigio) com maior ou menor
rapidez e maiores ou menores custos e com maior ou menor qualidade de decisão.
No plano dos princípios ambos os processos respeitam a essência dos princípios do processo justo e
ambos procuram essencialmente a verdade substantiva pesem embora o façam por caminhos diferentes
e obtenham resultados diversos.
No plano dos princípios têm ainda em comum um outro conceito – o princípio da instrumentalidade, ou
seja, o princípio de que ambos os processos são e devem ser vistos como instrumentos valiosos para
alcançar a verdade substantiva.
É neste sentido que se torna pertinente evitar o que podemos designar por “efeito perverso” recorrendo
às doutas e sábias palavras do Prof. Lebre de Freitas que passamos a citar:
«\ a existência de fases estanques, aliada ao regime dos prazos peremptórios, tornou coerente o
sistema processual civil, mas inverteu a relação de instrumentalidade que devia existir entre o direito
processual e o direito substantivo, acabando por subordinar a eficácia das normas de comportamento de
direito material ao modo de comportamento das partes em juízo»10.
Para realçar o papel que os princípios fundamentais devem desempenhar na aplicação e interpretação
da lei releva ainda o Acórdão de Uniformização de Jurisprudência n.º 13/96, in D.R., I Série, de 26 de
Novembro, onde grande parte da fundamentação assenta em diversos princípios gerais de processo
civil.
Posto isto, relembremos uma passagem bíblica muito bem adaptada ao mundo actual pelos “Da
Weasel”:
(No Princípio Era) O Verbo No princípio era o verbo,a palavra e depois a rima, que provocou reacções como se fosse uma enzima. No princípio era a tesão, a fúria e a sofreguidão,
depois veio a calma, procura do saber e a satisfação. Inspiração para uma vida melhor, um caminho melhor,
um mundo melhor, para uma pessoa melhor.
Muitas vezes fruto da pressão e da celeridade que a vida nos exige as questões de principios ficam
esquecidas.
Quando isso acontece perdem-se as referências e os pontos de apoio e de seguida perde-se a
coerência, o nexo relacional e o sentido de orientação.
10 in R.O.A., ano 55º, págs 9 e 10, citado por António Santos Abrantes Geraldes, in
Temas da Reforma do Processo Civil.
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Deixamos de saber para onde vamos e de onde partimos. Fica em causa a nossa identidade.
Para evitar isso desejamos destacar como mensagem final o enorme papel que os principios
fundamentais devem desempenhar nos processos justos e que se podem reconduzir a 4 papeis
essenciais:
1. Carácter integrador de lacunas. Função integradora – vide Acórdão STJ n.º 12/94, onde se
destacou o princípio da economia processual.
2. Auxiliares de interpretação das normas. Ob. Cit: António Geraldes, “\o recurso aos grandes
princípios processuais civis constitui um instrumento fundamental para a busca de soluções mais
acertadas\”
3. Garantia da unidade do sistema jurídico servindo como meios de entendimento da natureza e
razão de ser do sistema jurídico no seu todo.
4. Directrizes para a estruturação do processo e indicativo da razão inspiradora de algumas
normas – Anselmo de Castro, in Processo Civil Declarativo, vol. III, pág. 152.
\
Se por um lado não se pode decidir ou aplicar a lei só com bases em princípios, também em bom rigor
não se deverá aplicá-la sem a observância dos mesmos e sem garantir que a unidade do sistema
jurídico não seja afectada.
Aplicar a lei sem atender aos princípios pode ser feito, mas não se deve faze-lo por respeito às melhores
práticas e aos direitos a uma correcta aplicação da lei.
Os excessos são sempre negativos – excessivos garantismos ou excessivos fundamentalismos – não
são bons companheiros.
Trata-se, no fundo, de relembrar nesta matéria o que representa o símbolo da Justiça – uma balança –
que significa equilíbrio em salvaguarda dos interesses de todos.
Lisboa, 06 de Outubro de 2010
Universidade Nova de Lisboa – Faculdade de Direito
Álvaro Martins Freitas
P.S.
A palavra grega “logos”, que aqui é traduzida como “verbo”, em si mesma não significa “Jesus”. Geralmente ela é traduzida como “verbo”, mas também é traduzida como: Causa, Doutrina, Intenção, Razão\
“No Princípio” era “Logos” pode se referir estritamente ao pensamento interior que ganha expressão externa em palavras e outras formas de comunicação.
In, http://www.biblebasicsonline.com/portuguese/07/0704.html
Processo arbitral: Princípios fundamentais e desvios mais relevantes relativamente ao processo civil (Nos termos do novo projecto de lei proposto pela APA)
Trabalho Final da Pós-graduação de Arbitragem
Por Álvaro Martins Freitas em 2010
Alvaro Freitas Página 26/26 07-10-2011
Bibliografia e elementos consultados:
� Temas da Reforma do Processo Civil, António Santos Abrantes Geraldes, Almedina,
1997.
� Manual de Arbitragem, Manuel Pereira Barrocas, Almedina, 2010.
� Arbitragem Transnacional, Luis Lima Pinheiro, Almedina, 2005
� Arbitragem de Litígios com entes públicos, Ana Perestrelo de Oliveira, Almedina, 2007.
� Os Efeitos da Anulação da Sentença Arbitral, Daniela Filipa Calado Mirante, FDUNL,
2009
� Comentários ao Anteprojecto de Nova Lei de Arbitragem, Manuel Pereira Barrocas,
2010
� “Impugnação da Decisão Arbitral”, Manuel Pereira Barrocas, no Colóquio Organizado
pela APA, no dia 12 de Março de 2010, Texto integral.
� A acção executiva arbitral, Mariana França Gouveia, UIHJ, Euro med.
� A execução em Portugal de decisões arbitrais nacionais e estrangeiras, Paula Costa e
Silva. 2007.
� Decisão Arbitral e Ordem Publica, Robin Andrade, 2010.
� A Convenção de Nova Iorque e o Direito Interno Português, Nuno Salazar Casanova,
2009.
� Apontamento sobre a impugnação da decisão arbitral, Luís de Lima Pinheiro.
� Garantias Fundamentais do Processo: O Processo Justo, Leonardo Greco, 2002
� A Arbitragem Voluntária Institucionalizada Em Portugal, António José Clemente.
� Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, 2678/08.8TVLSB.L1-6, MÁRCIA PORTELA,
2009
� Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, 02A3043, JSTJ000, RIBEIRO COELHO, 2002
� Revista Internacional Arbitragem, APA, 2008.
� II Congresso do CA – CCIP, Intervenções, 2008.
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