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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
ADMINISTRAÇÃO ESCOLAR
A IMPORTÂNCIA DA AVALIAÇÃO DIAGNÓSTICA E
INTERVENÇÃO INTERDISCIPLINARES NA
ALFABETIZAÇÃO NUM CURRÍCULO
SOCIOINTERACIONISTA
Por: Angélica da Cruz Monteiro Serpa
Orientadora
Professora Mary Sue
Rio de Janeiro
2003
2UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO "LATO SENSU”
ADMINISTRAÇÃO ESCOLAR
A IMPORTÂNCIA DA AVALIAÇÃO DIAGNÓSTICA E
INTERVENÇÃO INTERDISCIPLINARES NA
ALFABETIZAÇÃO NUM CURRÍCULO
SOCIOINTERACIONISTA
Apresentação de monografia à Universidade Candido
Mendes como condição prévia para a conclusão do curso
de Pós-Graduação “Lato Sensu” em Administração Escolar.
Por: Angélica da Cruz Monteiro Serpa
3AGRADECIMENTOS
- À Orientadora Mary Sue, pela ajuda valiosa nesta pesquisa monográfica;
- Ás minhas companheiras de curso e de trabalho, Inês Maria Vargas
Chagas e Maria Helena Santos, pelas suas contribuições com idéias, textos e,
sobretudo, por serem pessoas que acreditam, como eu, na importância da
parceria entre os profissionais da área de Saúde e Educação na luta pela
Inclusão Social;
- Aos meus pais, cujo espírito de luta e persistência herdei;
- Aos meus queridos filhos, Júlio Cezar e Leila Cristina, que, não poucas
vezes, procuraram me ajudar nas pesquisas;
- Ao meu marido Carlos, pela sua tolerância, paciência e compreensão
durante as vezes em que me ausentei do convívio familiar para realizar esta
pesquisa;
- Enfim, a cada aluno da Escola Municipal Artur Ramos - RJ, cujo semblante
e olhar, sempre me serviram de inspiração.
4DEDICATÓRIA
Dedico essa monografia a todos os
educadores que, no dia-a-dia da escola,
buscam uma prática pedagógica que
transforma, liberta e inclui.
5RESUMO
Esta pesquisa monográfica pretende demonstrar que a avaliação diagnóstica e
intervenção interdisciplinares em suas várias modalidades, são um caminho
para prevenção, detecção, minimização, recuperação ou compensação das
deficiências dos educandos durante o processo de alfabetização. Ressalta,
sobretudo, a importância de um trabalho interdisciplinar e de parceria entre os
profissionais da Área de Saúde e Educação, juntamente com as famílias e
comunidade, para que a inclusão se torne realidade na sociedade.
Partimos do pressuposto de que a escola não modifica a sociedade mas que
contribui para as mudanças sociais, na medida em que educa para a
consciência crítica, cooperação e formação da autonomia. Colabora na
transformação da sociedade, sobretudo quando educa segundo os princípios
democráticos, da igualdade de direitos entre os cidadãos.
Consideramos ainda, que o processo de desenvolvimento na primeira Infância
é influenciado pela presença ou ausência de estímulos humanos e ambientais.
No que tange aos educadores, o grande desafio é fazer mudanças radicais
nas próprias Instituições Educacionais, que, muitas vezes, acabam
desempenhando o papel de reprodutoras das desigualdades sociais.
Cabe à sociedade, sobretudo aos Profissionais da Saúde e Educação, efetuar
mudanças radicais em suas Instituições, para que suas práticas, sendo então
inclusivas, sejam anunciadoras de que é possível uma sociedade democrática,
mais justa e solidária.
É preciso rompermos com os preconceitos que nos acompanham desde a
nossa formação acadêmica de que somos completos e abrangentes ou que
podemos dar conta de tudo, o que nos impede de ver os limites de nossa
ciência e as possibilidades das demais. O exercício em equipe traz crescimento
pessoal e profissional, nos educa para a interação, nos levando a descobrir
que não basta sermos bons individualmente. Temos que saber trocar. Dessa
dinâmica depende a solução de problemas de aprendizagem e, mais
especificamente, da alfabetização.
6METODOLOGIA
A metodologia utilizada nesta monografia se destina a reunir alguns dos
estudos realizados nas últimas décadas sobre ações educativas de enfoque
multidimensional e multiprofissional, especificamente: a avaliação e a
intervenção.
Este trabalho teve início no mês de agosto com a elaboração do Plano de
Projeto de Pesquisa, quando foi definido o tema, assim como o problema, a
justificativa, os objetivos, a hipótese, a delimitação e o procedimento
metodológico.
No entanto, podemos dizer que este trabalho é fruto de inquietações pessoais
e coletivas. Afinal, a grande preocupação dos educadores atualmente tem sido
a de como melhor intervir pedagogicamente para que a criança aprenda a ler e
a escrever. Mais ainda, quais saberes se tornaram indispensáveis aos
educadores, em termos de competência técnica, para que a evasão escolar e a
repetência se tornem apenas coisas do passado?
Buscamos fundamentação teórica a partir de livros, revistas científicas, fontes
eletrônicas, jornais educativos e algumas teses de mestrado.
Vale ressaltar que, durante esta pesquisa, foi utilizada a orientação de
monografia do curso. Além disso, foram realizadas observações nas turmas de
alfabetização e de progressão, que, embora não tenham sido explicitamente
citadas, serviram de embasamento prático e para identificar as tentativas de
renovação e metodologias alternativas no âmbito escolar.
Buscamos textos e autores cujas abordagens fossem inclusivistas e
sociointeracionistas.
Reconhece-se a limitação da metodologia aplicada, pois teria sido uma
excelente complementação dados de entrevistas e observações em sala de
aula, visitas a centros de estimulação precoce, onde há ações
multiprofissionais, conversas com famílias, diretores de escolas que têm um
trabalho sociointeracionista e que, portanto, vivem práticas inclusivas.
Tal dinâmica não foi possível devido ao pouco tempo disponível.
7SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 08
CAPÍTULO I - A SOCIEDADE BRASILEIRA E A EDUCAÇÃO:
DA ELITIZAÇÃO À INCLUSÃO SOCIAL 10
CAPÍTULO II - O EDUCANDO EM PROCESSO DE
ALFABETIZAÇÃO 36
CAPÍTULO III - AVALIAÇÃO DIAGNÓSTICA INTERDISCIPLINAR:
LIMITAÇÕES PROFISSIONAIS
E POSSIBILIDADES DE INTERAÇÃO 53
CAPÍTULO IV: INTERVENÇÃO INTERDISCIPLINAR -
CONSTRUIND0 PRÁTICAS INCLUSIVAS
NA ESCOLA 70
CONCLUSÃO 85
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA 87
ÍNDICE 98
FOLHA DE AVALIAÇÃO 100
8INTRODUÇÃO
Esta pesquisa monográfica trata da importância do diagnóstico e intervenção
interdisciplinares na alfabetização segundo um enfoque sociointeracionista.
A avaliação diagnóstica em educação tornou-se assunto discutido no mundo
inteiro, a partir das últimas décadas. Porém, nem sempre esta discussão tem
levado a uma reflexão que, efetivamente, favoreça a compreensão sobre o
processo a que ela se refere, nem tampouco tem provocado mudanças nas
práticas pedagógicas.
A ONU, em 1990, estabeleceu que por volta de 2010 a sociedade inclusiva
será uma realidade. Demagogia ou utopia?
Seja o que for, para aqueles que lutam pela inclusão, não só por meio de
discursos ou frases prontas, é preciso buscar soluções. Voltando o olhar para a
Educação, a evasão, a repetência e o fracasso escolares têm sido objetos de
grandes questionamentos, uma vez que tais situações educacionais levam à
exclusão social. Porém, apesar de alguns esforços, estamos longe de
resolvermos estes problemas.
Para a compreensão de que isso não ocorrerá da noite para o dia, foi
reservado todo o Capítulo I com os fatos mais marcantes da luta pela educação
inclusiva de qualidade. É feita uma reflexão sobre a relação da sociedade
brasileira com a questão da educação ao longo da história, numa análise de
diferentes paradigmas sociais mostrando que a inclusão é, antes de tudo, um
projeto a ser construído por todos, a partir de uma nova Cultura, uma nova
mentalidade: a de que todos os homens têm direitos iguais. Encontra-se ainda
neste capítulo a definição de alguns conceitos inclusivistas mais usados pelas
Organizações Governamentais e Não-Governamentais. Finalizando este
capítulo, procuramos estabelecer as principais diferenças entre integração e
inclusão social, uma vez que muitas das práticas sociais e educacionais,
inclusive, ainda visam apenas alcançar a integração social.
No Capítulo II, apontamos alguns esclarecimentos referentes às teorias do
desenvolvimento humano a partir de quatro concepções: a inatista, a
ambientalista, a interacionista e a sociointeracionista, assim como as
9implicações de cada uma no contexto educacional. Encontra-se ainda, um
pouco sobre o pesquisador VYGOTSKY, cujas pesquisas têm contribuído muito
para as novas tendências em Educação, principalmente na fase da
alfabetização. Por fim, neste capítulo, são especificadas as dimensões da
linguagem escrita e alguns distúrbios considerados mais relevantes no caso da
alfabetização.
No Capítulo III, a avaliação diagnóstica interdisciplinar é apresentada como um
suporte facilitador do desenvolvimento infantil, onde, além de alguns conceitos,
discute-se aspectos de caráter prático como os programas de prevenção,
detecção e diagnóstico, as diferentes áreas do desenvolvimento infantil, suas
interligações, as características próprias das crianças e diferentes tipos de
avaliação diagnóstica.
Finalmente, no Capítulo IV, aponta-se para os grandes desafios às Instituições
Educacionais na busca de práticas inclusivas e consolida-se a idéia de que a
educação que visa a inclusão social não faz das dificuldades no ensino-
aprendizagem uma justificativa para a segregação, mas busca estratégias
educacionais que favoreçam a valorização da diversidade humana, a
cooperação e a autonomia. Entre muitas outras estratégias, destaca-se a
própria Organização Curricular, as Metodologias diversificadas e atualizadas
continuamente, a colaboração entre professores e outros profissionais e os
cursos de capacitação.
Na parte conclusiva desta pesquisa monográfica, encontram-se algumas
considerações finais a respeito do tema, uma análise pessoal sobre o contexto
educativo no que concerne à teoria sociointeracionista e as práticas
pedagógicas inclusivas nas escolas, a partir da bibliografia estudada, do
convívio com os profissionais da área de Saúde e da experiência profissional
na área de Educação.
10
CAPÍTULO I
A SOCIEDADE BRASILEIRA E A EDUCAÇÃO - DA
ELITIZAÇÃO À INCLUSÃO SOCIAL
“Sou professor a favor da decência contra o despudor, a
favor da liberdade contra o autoritarismo, da autoridade
contra a licenciosidade, da democracia contra a ditadura de
direita ou de esquerda.”
Paulo Freire,1998
11
O Brasil sempre foi mantido numa situação de dependência de outros países,
começando por Portugal, seguindo a Inglaterra e, atualmente, dos Estados
Unidos. E com toda certeza, um dos instrumentos que serviram e ainda servem
para manter essa situação é a Educação; ora através da exclusão
propriamente dita, ora por meio de um ensino que reproduz as regras da
sociedade, que não está embasado numa reflexão crítica.(PILETTI PILETTI,
1988)
A sociedade brasileira é profundamente marcada pelo acentuado privilégio de
poucos e a exclusão ou marginalização da grande maioria. E a escola, tanto no
seu presente quanto em seu passado, desempenhou por vezes o papel de
maquiadora ou de fantasiadora da realidade social.(Revista AEC,1989)
SASSAKI (1997, p.17) considera que “o conceito e a prática da inclusão são,
muito recentes” e que os princípios que norteiam a construção de uma
sociedade igualitária são, ente outros:
“celebração das diferenças; direito de pertencer;
valorização da diversidade humanitária; solidariedade
humanitária; igual importância das minorias; cidadania com
qualidade de vida.”.
O autor afirma ainda:
“ainda hoje vemos a exclusão e a segregação sendo
praticadas em relação a diversos grupos sociais
vulneráveis, em várias partes do Brasil assim como em
praticamente todos os outros países”.
As afirmações acima citadas, além de nos ajudar na formação de conceitos
inclusivistas, servem para avaliarmos os nossos programas, serviços e políticas
públicas e, especificamente, nossas práticas pedagógicas, assuntos que serão
12abordados posteriormente durante esta pesquisa monográfica. Dessa forma,
poderemos ser participantes ativos na construção de uma sociedade mais
justa e mais humana e somente para esse fim, lançarmos mão da Educação, e
nunca mais para promover a exclusão e manter privilégios das classes
dominantes, como a História nos mostra.
1- Antes de 1900
ARANHA (1989), assinala que no período Colonial, prevaleceu no Brasil a
educação humanista e elitista dos padres jesuítas, cujo objetivo maior era a
escolarização dos filhos dos colonos e da formação dos futuros padres.
Em 1759, os jesuítas são expulsos de Portugal e de todas as suas
colônias.Assim, muitos colégios e seminários ficaram sem professores e todo o
sistema pedagógico construído ao longo de 250 anos foi desagregado.
(BESEN,2000)
ARANHA (1989, p.161),afirma que “o Marquês de Pombal inicia a organização
do ensino público propriamente dito, refletindo com a educação leiga e
universal as preocupações típicas do século XVIII.”.
Segundo BESEN (2000), Pombal era formado na escola do Iluminismo, que
defendia uma resposta científica para os problemas e uma visão racionalista da
vida, sugerindo para isso, uma reforma do ensino e do Estado. Tudo isso,
contrapunha-se à tradição humanística dos jesuítas.
O povo não precisava de educação. O Brasil era apenas o lugar de captar
matéria-prima para mandar à Coroa e dali para Londres.
Em 1822, o Brasil teve sua independência ‘declarada’ por um príncipe que a
metrópole aqui deixara de forma que a dominação pudesse ser
continuada.Dom Pedro I ‘proclamou a independência’. Não foi o povo, pois,
nesta época, da população livre, 80% era analfabeta. O sistema escolar estava
reduzido às ‘aulas régias’ para as elites latifundiárias e às escolas públicas nos
vilarejos para o ‘subsídio literário’, como era chamado o povo
brasileiro.(LIMA,1974)
13O objetivo da Educação era formar dirigentes do país. Para isso, o ensino
superior e o secundário passaram a ser privilegiados, em detrimento do ensino
primário e do técnico-profissional. O primário não era pré-requisito para o
secundário.
O Decreto de 1o. de março de 1823, estabeleceu que para cada grupo de 10
alunos um menos ignorante ensinaria aos demais e haveria um professor por
escola.
No ano de 1834, ficou estabelecido que o Ensino Superior era de competência
do governo Imperial e que os demais graus ficariam sob os cuidados das
províncias totalmente atrasadas e desorganizadas. (LIMA, 1974). Segundo o
autor, a 1a. Escola Normal foi fundada em Niterói, neste mesmo ano. No ano de
1857, o Colégio de Artes Mecânicas para Ofícios no Rio Grande do Sul,
recusava matrículas às crianças de cor preta e aos escravos. Outra citação do
mesmo autor impressiona:
“O senador Oliveira Junqueira (1879) dizia: ‘certas
matérias, talvez, não sejam convenientes para o pobre; o
menino pobre deve ter noções muito simples’, a que o
Senador Teixeira Junior acrescentou: ‘ a grande massa
deve ter apenas instrução elementar’”.
No fim do Império, apenas cerca de 15% da população em idade escolar
estavam na escola. Não havia no Brasil um Sistema integrado de Ensino.
RUI BARBOSA escreve em 1883 em defesa da Reforma do ensino primário e
da educação que promova o pleno desenvolvimento do educando:
“Todas as leis protetoras são ineficazes, para gerar a
grandeza econômica do país; todos os melhoramentos
materiais são incapazes de determinar a riqueza, se não
partirem da educação popular, a mais criadora de todas as
forças econômicas, A MAIS FECUNDA DE TODAS AS
MEDIDAS FINANCEIRAS. (...) A criança, esse belo
14organismo, animado, inquieto, assimilativo, feliz, com os
seus sentidos dilatados pela viveza das impressões como
amplas janelas abertas para a natureza, com a sua
insaciável curiosidade interior a atraí-la para a observação
dos fenômenos que a rodeiam, com o seu instinto
investigativo, com a sua irreprimível simpatia pela
realidade, com a sua espontaneidade poderosa, fecunda,
criadora, com a sua capacidade incomparável de sentir e
amar o ‘divino prazer de conhecer’ (...) entra para o
regímen da escola, como flor, que retirassem do ambiente
enérgico e luminoso do céu tropical, para experimentar na
vida vegetativa da planta, os efeitos da privação do sol, do
ar livre, de todas as condições essências à natureza da
pobre criaturinha condenada.” (MEC, 1947. t.1, p.143. t.2,
p.33-4)
Para BERTAZZO (1998), o nascimento da sociedade industrial no século XIX e
o progresso na luta contra infecções e pela reabilitação de lesados de guerra
fizeram surgir grandes avanços nos estudos da biomecânica humana. Segundo
o autor, isto se deu principalmente na Europa: as necessidades sociais
começam a ser discutidas e feitas progressivas descobertas na área do
desenvolvimento infantil.
KRAMER (1991, P.25), assinala que “as progressivas descobertas na área do
desenvolvimento infantil geram intensos questionamentos à chamada escola
tradicional, no plano educacional” nos séculos XIX e XX..
Também é importante lembrar que, enquanto na Europa os homens e animais
eram substituídos pelas máquinas nos trabalhos pesados, aqui no Brasil, a elite
atrasada se fechava à modernidade e conseguiu prolongar ao máximo a
escravidão nos dando a glória de sermos o último país do planeta a acabar
com a escravatura. Somente em 13 de maio de 1888 foi dado um fim à
escravidão.
15Após 67 anos, a monarquia foi abandonada pelos fazendeiros, donos de
escravos, pelos padres e pelos militares.
Em 1889, nasceu a república. O Brasil mudava a forma de governo sem
revolucionar a sociedade.Foram feitas uma nova bandeira e uma nova
Constituição (1890). Mas não houve participação do povo, o qual permaneceu
pobre e explorado pela elite. De 1894 a 1930, o comando do país ficou nas
mãos dos políticos civis e sob forte influência dos grandes latifundiários. Os
analfabetos representavam quase 80% da população e por lei não podiam
votar. (COTRIM,1996)
2 - Crise da educação elitista - 1920
Conforme assinala PILETTI (1988, p.188), “a educação elitista entrou em crise
de modo especial, na década de 1920, quando também se tornou mais aguda
a crise de outros setores da vida brasileira – político, econômico, cultural e
social.”
Segundo ARANHA (1989, p.162), “no início do século XX é altíssimo o índice
de analfabetismo de uma população predominantemente rural, o que mostra o
descaso com a educação elementar.” A autora ainda ressalta que nessa
década, as idéias liberais incentivam as reformas educacionais e considera que
a crise na escola neste período se deve entre outras causas, à demanda de
escolarização provocada pelo processo de industrialização.
O Brasil, que, já havia substituído o açúcar pelo café na exportação, os
escravos por ex-escravos e imigrantes, os barões do império pelos ministros da
república, mantinha a mesma exclusão social que é a situação na qual “uma
minoria esbanja o supérfluo, enquanto a maioria não tem o estritamente
necessário”, segundo palavras de COTRIM (1996, p.93). Segundo o autor,
1920 é o ano em que se acentua o descontentamento social contra o
tradicional sistema oligárquico que dominava o país. Ele cita em seu livro, o
movimento político- militar tenentista liderado por Luís Carlos Prestes que
pretendia fazer reformas na República velha. Suas principais propostas eram:
• Moralização da administração pública e o fim da corrupção eleitora;
16• Defesa do Brasil contra a exploração das empresas e do capital
estrangeiro;
• Reforma na educação pública, para que o ensino fosse gratuito e
obrigatório para os brasileiros.
Segundo ARANHA (1989), na década de 20, diversas reformas educacionais
ocorreram no Brasil, incentivadas pelos ideais do movimento da Escola Nova.
que consideravam ser possível reformar a sociedade pela reforma do ser
humano, através da escola.
2.1 - Os ideais republicanos e a realidade
Na opinião de PILETTI (1988), o sonho de um país democrático, que
favorecesse a inclusão social e promovesse o progresso econômico e a
independência cultural, foi frustrado, o que provocou diversas crises em todos
os setores da sociedade brasileira.
Na revolução de 1930, o poder foi entregue a Getúlio Vargas, candidato
derrotado nas eleições. As elites entenderam que era necessário agir para
assumirem o comando do poder. (COTRIM, 1996)
No entender de ARANHA (1989), apesar de tudo, nesse período, são
observados alguns fatores de mudança como o direito ao voto para os maiores
de dezoito anos de ambos os sexos, a jornada de oito horas de trabalho,
salário mínimo, etc. No setor de ensino, o mais importante foi o
estabelecimento de uma política nacional de educação.
3 - A educação no Brasil – 1930-1970
Alguns idealistas da educação brasileira ocuparam cargos políticos na
administração do ensino, após a Revolução de 1930, contribuindo para que se
estabelecesse um sistema educacional articulado, segundo normas do
Governo Federal. Criou-se o Ministério da Educação e das Secretarias
Estaduais de Educação. Na Constituição de 1934, o Governo assume novas
atribuições como as de integrar e planejar a educação brasileira com o Plano
17Nacional de Educação, traçar as diretrizes da Educação, controlar,
supervisionar e fiscalizar o cumprimento das normas federais. (PILETTI, 1988)
3.1 - A luta pela escola pública
O direito de todos à educação aparece pela primeira vez na Constituição de
1934, artigo 149, assim como a obrigatoriedade da escola primária integral, a
gratuidade do ensino primário, a assistência aos estudantes necessitados, etc.
Nas décadas de 30 a 60, o Brasil passou de um país agro-comercial-
exportador dependente, para um modelo nacional desenvolvimentista, baseado
na industrialização, com predominância do urbano. E a escola passou a ser um
instrumento a serviço desta nova ordem econômica (AEC,1986). Este
fenômeno pode ser explicado segundo análise de TOFFLER (1980, p.41):
“A produção econômica deslocou-se do campo para a
fábrica, a família não mais trabalhava junta, como uma
unidade. Para liberar trabalhadores para o serviço da
fábrica, funções básicas da família eram distribuídas para
novas instituições especializadas. A educação das crianças
era entregue às escolas. O cuidado dos idosos era
entregue a asilos de indigentes ou casas de saúde. Acima
de tudo, a nova sociedade exigia mobilidade. Precisava de
trabalhadores que seguissem os empregos de um lugar
para o outro”.
O velho e o novo convivendo na fase de transição entre a sociedade agrária e
a sociedade urbano-industrial torna-se a nova realidade brasileira.
Em 1932, publica-se o Manifesto dos pioneiros da educação nova que defende,
segundo resume ARANHA (1989, p.162), “a escola leiga, nacional e gratuita, a
organização da educação popular e a abolição dos privilégios”.
KRAMER (1991, p. 28), num trabalho sobre Educação Infantil, ressalta a
importância do movimento escolanovista e analisa seus limites:
18
“Apesar de reconhecer a grande contribuição dada por
estes educadores em defesa da educação pré-escolar, é
preciso perceber seus limites, em especial por não levarem
em consideração a heterogeneidade social e o papel
político que a pré-escola desempenha no contexto mais
amplo da educação e da sociedade brasileira”.
As idéias modernas da educação influenciaram muito os educadores no Brasil.
Segundo CUNHA (1980), o pensamento de John Dewey, sobre a “pedagogia
da escola nova”, que apresentava um modelo de escola destinada à
reconstrução da sociedade, foi trazido para o Brasil pelo grande educador
Anísio Teixeira. O autor esclarece que “desde o início da década de 30 até o
início da de 60 (à exceção do período do Estado Novo, 1937-1946), Anísio
Teixeira trabalhou intensamente dentro do Estado para que ele assumisse a
tarefa de reconstrução social, utilizando para isso a escola pública, obrigatória
e gratuita” (p.49)
O Período do Estado Novo é marcado pelo Governo Ditatorial de Getúlio
Vargas, que não aceitando deixar o poder, prepara um golpe de Estado e
permanece na presidência da República.(COTRIM, 1996)
RIBEIRO (1985), explica que o Estado Novo recrutou também, para seu
aparato político, o sistema escolar, através da revisão de programas, da
obrigatoriedade do ensino cívico, dos desportos, do canto coral e de desfiles
majestosos, além da edição de livros didáticos, que eram verdadeiros manuais
de propaganda do regime e culto a Getúlio Vargas.
A Constituição outorgada de 1937 demonstra que a política educacional do
Estado Novo deveria servir para confirmar o status social e educacional ao qual
o aluno pertencia, instituindo um sistema educacional dualista onde houvesse
“um segmento destinado aos jovens das ‘classes menos favorecidas’ e outro
segmento destinado à classe formada pelas ‘individualidades condutoras’,
ambos destinados a reproduzir as situações preexistentes.” (CUNHA, 1980,
p.237)
19 Segundo o Censo do ano de 1940, existiam 13279889 analfabetos. Em
1946, foi regulamentado o ensino primário, Conforme CHAGAS (1980,p.52-3),
na Lei do ensino primário acenava-se “com o tríplice objetivo de
desenvolvimento da personalidade, de preparação à vida cultural e familiar e à
defesa da saúde, e de iniciação ao trabalho, tudo com um sentido
acentuadamente brasileiro”.
O fim da ditadura do Estado Novo se confirmou em 29 de outubro de 1945 em
que a presidência da República foi entregue temporariamente a José Linhares,
presidente do Supremo Tribunal Federal. O país ingressava na vida
democrática num clima de efervescência social e política. Entra em vigor a
Constituição liberal de 1946 e começa o governo Dutra que vai desse ano até
1950. (COTRIM, 1996).
Na Constituição de 1946, ficou estabelecido que o ensino deveria ser
ministrado pelos poderes públicos, embora livre à iniciativa privada. (CHAGAS,
1980)
Uma das características importantes do Governo Dutra foi a abertura às
empresas estrangeiras em detrimento do desenvolvimento nacional. (COTRIM,
1996)
Em 1948, começa ser discutida no congresso a 1a. Lei de Diretrizes e bases da
Educação nacional. (PILETTI, 1988)
De 1951 a 1954, Getúlio Vargas volta ao poder como líder político e popular.
Para os trabalhadores das cidades, o discurso de Getúlio Vargas era de que
iria construir uma democracia social e econômica em que tivessem o direito a
desfrutar do progresso que eles mesmos haviam criado com seu trabalho. A
aproximação do governo com o povo provocou o ódio das elites tradicionais as
quais exigiam a sua renúncia. Getúlio acabou suicidando-se .(COTRIM, 1996)
Segundo descreve o mesmo autor acima citado, no ano de 1955, novas
eleições elegeram Juscelino Kubitschek para presidente da República, o qual
prometeu modernizar o país em cinco anos.(COTRIM, 1996)
SILVA (1991, p.9), analisa a situação dessa época da seguinte forma:
20“Nos anos 50, investimos nossos ideais revolucionários
nas teorias da modernização: pensávamos no futuro de um
país rico, uma potência. As lutas de libertação, a teoria da
dependência, diante do fracasso do desenvolvimento,
denunciaram o papel discriminador da educação.
Concordamos com Illich que a escola era essa “velha e
gorda vaca sagrada”. E nos equivocamos. Assistimos, duas
décadas depois, ao desencanto da escola: era preciso dar
prioridade à transformação da sociedade.Vimos surgir
numerosas iniciativas não-escolares, multiplicarem-se os
movimentos, os centros paralelos à escola.”
Segundo PILETTI (1988), de 1946 a 1964 surgiram vários movimentos de
educação popular visando à erradicação do analfabetismo como por exemplo,
a Campanha de Educação de Adultos, o Movimento de Educação de Base e o
Programa Nacional de Alfabetização. Em 1961 foi promulgada a 1a. Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional. As idéias do grande educador
brasileiro Paulo Freire começam a ser praticadas no nordeste brasileiro,
visando atingir uma população até então marginalizada pela educação escolar:
os adultos analfabetos daquela região.(MULTIEDUCAÇÃO, 1996)
Politicamente tivemos nesse ano, a vitória e a renúncia do presidente Jânio
Quadros que governou por oito meses, substituído por João Goulart o qual
propôs reformas de base para o país, inclusive no âmbito educacional, para
aumentar o número de escolas públicas, matricular todas as crianças
brasileiras e combater o analfabetismo. Não o deixaram realizar seu projeto
reformista. No dia 31 de março de 1964, explodiu a rebelião das Forças
Armadas contra o governo João Goulart. Começava a ditadura militar. O Brasil
cresceu durante a ditadura. Cresceu a riqueza de poucos. Cresceu a miséria
de muitos. (COTRIM, 1996)
A educação no Brasil também se tornou vítima do autoritarismo e da ditadura
militar. Inúmeras escolas foram invadidas. Professores e estudantes presos e
exilados. O decreto nº 477, de 26 de fevereiro de 1969, no artigo 1o, é um
21exemplo desse tempo de repressão, sendo considerado infrator o professor,
aluno, funcionário ou empregado de estabelecimento de ensino público ou
particular quem paralisasse as atividades escolares, praticasse atos
subversivos, passeatas, desfiles não autorizados pelas autoridades,distribuísse
material subversivo, etc. (PILETTI, 1988)
3.2 - A educação pública brasileira desde a reforma de 1971 até
hoje
Em 1971, foi promulgada a Lei 5692, que reformava todo o ensino de 1o. e 2o.
graus no Brasil, tendo como maior inovação foi a extensão da escolaridade
obrigatória de 4 para 8 anos e a profissionalização do Ensino Médio. No
entanto, o planejamento do sistema de ensino, orientado pelo Estado,
reconhece que as reformas educacionais podem não resultar nos objetivos
pretendidos se não forem feitas mudanças em outros setores da sociedade
brasileira. (CUNHA, 1983)
Na análise de ARANHA (1989, p.119), “o que se conseguiu, de fato, foi a
formação de mão-de-obra barata, não-qualificada, pronta para engrossar o
exército de reserva – trabalhadores dispostos a se empregar por baixos
salários.”
Em 1974, o MOBRAL realizou um Diagnóstico do Ensino Fundamental para
saber o número de pessoas não atendidas pelo ensino regular. Havia na
verdade uma distância entre a Lei e a realidade.
Segundo a análise de CUNHA (1983, p. 121),
“quando as crianças oriundas das classes dominantes e
das camadas médias vão à escola, têm no ensino um
prolongamento da primeira socialização, difusa, doméstica.
Entretanto, para os filhos dos trabalhadores, a experiência
escolar é algo traumatizante.”
É na questão educacional principalmente sistemática, que a contradição entre
o legal e o real atinge um extremo inaceitável. Sempre foi angustiante de um
22lado ouvir os discursos, as resoluções, e de outro, os dados estatísticos e as
observações do dia-a-dia.(AEC,1986) A Lei 7044/82, é um exemplo dessa
distância. De texto bonito, determina que o ensino, de 1o. e 2o. graus, tenha por
objetivo geral “proporcionar ao educando a formação necessária ao
desenvolvimento de suas potencialidades como elemento de auto-realização,
preparação para o trabalho e para o exercício pleno consciente da cidadania”.
Segundo dados do MEC, no período de 1960 a 1990, “o crescimento da
escolaridade foi inferior ao esperado, considerando-se o ritmo de aumento da
renda per capita no período”. O sistema regular de ensino permanece incapaz
de acolher a demanda total de crianças na faixa etária de 7 a 14 anos e
continua a produzir, por meio da repetência e da evasão, novos contingentes
de analfabetos funcionais e subescolarizados. (SESI)
O regime militar chegou num determinado momento sem forças para se
manter, isolado, repudiado por toda a população, embora em silêncio forçado.
A burguesia liberal – banqueiros, donos de fábricas, donos de casas
comerciais, grandes latifundiários - começou a brigar entre si. Aquela
burguesia que financiara o golpe militar. Entenderam que era necessário fazer
reformas que atendessem aos interesses do povo, de tal maneira que não
prejudicassem sua situação de privilégio. E isso foi coroado na Campanha das
Diretas Já. Tancredo Neves foi eleito indiretamente para presidente, mas
morreu antes de assumir o cargo. Assume José Sarney. O Brasil mergulhava
numa profunda crise econômica, mas isso não impediu a elaboração da
Constituição Federal de 1988. (COTRIM, 1996)
O Brasil pára de crescer mas não pára de produzir a desigualdade. Em relação
à educação, conhecimento, informação, cultura, a questão da desigualdade
não é menor nem menos grave. (SOUZA, 1991)
Em maio de 1992, entrava no Senado um projeto de nova Lei de Diretrizes e
Bases da Educação Nacional, de autoria do Senador Darcy Ribeiro. Para ele, a
saída para reduzir a injustiça social brasileira era uma escola com no mínimo
seis horas diárias de atividades e funções que fossem além do ensino e da
aprendizagem.
23Darcy Ribeiro considerava o sistema educacional brasileiro elitista e
desonesto, porque promovia a exclusão. (REVISTA NOVA ESCOLA, 2003)
A Nova LDB, no. 9.394, de 20 de dezembro de 1996, precisa ser conhecida e
discutida pela população.(CNBB, 1998)
Não podemos deixar de questionar os descaminhos do sistema educacional
brasileiro que traz em seu bojo os ranços e resquícios do autoritarismo pós 64,
cujo modelo centralizador, legalista e tecnicista de educação – levando ao
desenvolvimento econômico – exclui a participação política lúcida, realista e
conseqüente, da maioria da população, sobretudo das camadas populares.
(AEC, 1986)
4 - Inclusão social e inclusão escolar
As desigualdades sociais no Brasil como vimos até agora foram construídas e
acumuladas ao longo do tempo, em todos os setores da vida social. Suas
conseqüências não atingem apenas os excluídos. A violência das grandes
cidades e do campo nos mostra que todos saem perdendo numa sociedade
excludente. (CNBB, 1998). A democracia, que para uns é uma espécie de ópio
do povo, para outros é uma utopia, uma idéia-força sempre presente e jamais
plenamente realizada.(AEC, 1991)
O sociólogo Herbert José de Souza (AEC, 1991, p.86), numa de suas análises
sobre a situação de desigualdade social no Brasil, define da seguinte forma a
democracia:
“A democracia é o igual e o diverso. O encontro de
liberdades. A convergência da pessoa e da comunidade.
Da sociedade civil e do Estado (administração do bem
público). A democracia é o atendimento do básico e do
transcendental. Do Pão e da Liberdade. Do finito e do
infinito. Do Eu e do Nós. É a afirmação da consciência, no
mundo de sua falsificação em relações coisificadas.
Democracia é obra sem limites e portanto inacabável. Mas
24democracia é exatamente aquilo que fizermos dela e por
isso é fundamental inventá-la a todos os níveis e a cada
momento.”
De uma sociedade democrática depende a Inclusão Social.
“O ato da inclusão significa lutar contra a exclusão de
todas as mazelas advindas da mesma com o racismo, o
sexismo, o ‘handicapism’. Lutar pela inclusão envolve
assumir que todos os sistemas de suporte sejam
acessíveis para aqueles que deles necessitem. Prover e
manter estes sistemas de suporte é uma responsabilidade
cívica, não um favor.” - SHAFIK ABU – TAHIR – líder das
Novas Vozes Africanas da Filadélfia (CENTRO UNIVERS,
AUGUSTO MOTTA, 2001).
Para construirmos uma sociedade inclusiva no mundo atual precisamos
conjugar progresso, eqüidade e democracia. GONZALEZ (AEC,1996, p.48),
afirma que “o melhor mundo sócio-político possível é a condição da vida boa
para todos” e complementa: “A boa vida humana é boa vida entre seres
humanos ou, ao contrário, pode ser que seja vida, porém, não será nem boa
nem humana”.
Fica então a pergunta: Como construir uma ordem de convivência democrática
e como formar hábitos de cidadania no espaço escolar?
É importante reconhecer que nenhuma força legal é suficiente para tornar
possível a convivência respeitosa e solidária. Os ideais não se impõem nem se
exigem. Só se chega a eles pelo convívio vital e dialogante. As relações
humanas educam e a educação as aperfeiçoa.
O educador Paulo Freire (1998, p.109), afirma que “quanto mais solidariedade
exista entre o educador e educandos no ‘trato’ deste espaço, tanto mais
possibilidades de aprendizagem democrática se abrem na escola.”
25
4.1 - Conceitos inclusivistas
De acordo com a análise de WERNECK (1997), incluir significa inserir total e
incondicionalmente todas as pessoas e isto exige, da sociedade como um todo,
muitas rupturas, como eliminar o individualismo, a falta de solidariedade e o
preconceito.
Segundo ARANHA (2001), é preciso sair do discurso legal para a prática; e
acrescenta:
“Há que buscar soluções para a convivência na diversidade
que a caracteriza (a sociedade), enriquece, dá sentido e
significado. Há que efetivamente favorecer a convivência e
a familiaridade com as pessoas com deficiência,
derrubando as barreiras físicas, sociais, psicológicas e
instrumentais que as impede de circular no espaço
comum.” (p.13)
Segundo SASSAKI (1998), INCLUSÃO SOCIAL, é “o processo pelo qual a
sociedade se adapta para poder incluir, em seus sistemas sociais gerais,
pessoas com necessidades especiais e, simultaneamente, estas se preparam
para assumir seus papéis na sociedade.” (SASSAKI, 1995, p. 41).
Em outra publicação (1997, p.47), o autor esclarece que a sociedade precisa
assumir que muitos são os problemas que ela cria para as pessoas portadoras
de necessidades especiais, “causando-lhes incapacidades (ou desvantagem)
no desempenho de papéis sociais em virtude de :
Ü seus ambientes restritivos;
26Ü suas políticas discriminatórias e suas atitudes
preconceituosas que rejeitam a minoria e todas as
formas de diferenças;
Ü seus discutíveis padrões de normalidade;
Ü seus pré-requisitos atingíveis apenas pela maioria
aparentemente homogênea;
Ü sua quase total desinformação sobre necessidades
especiais e sobre direitos das pessoas que têm
essas necessidades.”
O princípio da inclusão compatibiliza os modelos médico e social da
deficiência, processo pelo qual a sociedade se adapta para poder incluir, em
seus sistemas sociais gerais, pessoas com necessidades especiais e,
simultaneamente, estas se preparam para assumir seus papéis na sociedade.”
(SASSAKI, 1995, p. 41).
ARANHA (2001) sugere que a deficiência é uma condição social caracterizada
pela limitação ou impedimento da participação da pessoa diferente nas
diversas instâncias da sociedade, como o debate de idéias e a tomada de
decisões. Segundo a autora, no sistema capitalista, a pessoa com deficiência é
considerada um peso para a sociedade, a partir do momento que não contribui
para o aumento da renda per capita. Além disso, com suas barreiras
arquitetônicas programáticas e atitudinais, a sociedade impede a participação
plena das pessoas portadoras de deficiências e dificultam o acesso a serviços
e bens necessários ao seu desenvolvimento pessoal, social, educacional e
profissional.
4.1.1 - Autonomia - Para GUIMARÃES (1994), ter autonomia é ter o
domínio no ambiente físico e social em que a pessoa está inserida. O grau
desta autonomia depende dos ajustes no ambiente físico – social como
também da prontidão físico-social do portador de deficiência. O autor cita a
construção de rampas nas calçadas e o bom manejo das cadeiras de roda
como exemplos de ‘autonomia física’ e a ‘autonomia social’ .
27
4.1.2 - Independência - “É a faculdade de decidir sem depender de outras
pessoas, tais como: membros da família ou profissionais especializados”
(SASSAKI, 1997, p.36). Pode acontecer a nível pessoal, social e econômico.
Além disso, a independência de uma pessoa portadora de deficiência, segundo
o autor, precisa ser aprendida e exercitada diariamente.
4.1.3 - Equiparação de oportunidades - Em 1981, a Disabled Peoples’
International (DPI), uma organização formada por pessoas portadoras de
deficiências, aprovou a sua Declaração de Princípios onde define ‘equiparação
de oportunidades’ como :
“o processo mediante o qual os sistemas gerais da
sociedade, tais como o meio físico, a habitação e o
transporte, os serviços sociais e de saúde, as
oportunidades de educação e trabalho, e a vida cultural e
social, incluídas as instalações esportivas e de recreação,
são feitos acessíveis para todos. Isto inclui a remoção das
barreiras que impedem a plena participação das pessoas
deficientes em todas estas áreas, permitindo-lhes assim
alcançar uma qualidade de vida igual à de outras
pessoas.”(DRIEDGER & ENNS, 1987, p. 2-3 1n SASSAKI,
1997).
A Organização das Nações Unidas também procurou definir este termo em
documentos de 1982 e em 1993. Esse último traz a seguinte definição:
“O termo ‘equiparação de oportunidades’ significa o
processo através do qual os diversos sistemas da
sociedade e do ambiente, tais como serviços, atividades,
informações e documentação são tornados disponíveis
para todos, particularmente para pessoas com deficiência.”
(UNITED NATIONS,1996,§ 24).
28
Para SASSAKI (1997) e PINTO (1999), equiparar as oportunidades torna-se
prioridade para que ocorra a inclusão de todos os cidadãos, inclusive os
portadores de deficiência. Exige evitar e suprimir as barreiras arquitetônicas
para que as pessoas com mobilidade ou comunicação reduzidas possam ter
iguais condições de alcance na utilização de transportes, edificações, espaço,
mobiliário e equipamento urbanos.
4.1.4 - Rejeição zero - Este conceito, inicialmente, surgiu dentro da
proposta de emprego apoiado onde o portador de deficiência é colocado
primeiro na empresa para depois ser treinado numa determinada função,
recebendo geralmente apoio individualizado e contínuo. Desta forma, em
nenhuma hipótese, uma pessoa poderia ser excluída tendo como pretexto
para sua rejeição o fato de ser portadora de deficiência.
No entanto, o princípio da rejeição zero tem sido razão para que mundialmente
as instituições destinadas ao trabalho com os portadores de deficiências se
reorganizem e busquem criar novos programas e serviços internamente ou
mesmo servindo-se de outras entidades da comunidade nas quais estejam
inseridas (SASSAKI, 1997).
4.1.5 - Vida independente
“O conceito de vida independente compreende movimento,
filosofia, serviços, equipamentos, centros, programas e
processo, em relação aos quais as figuras centrais são os
cidadãos portadores de deficiência que se libertaram ou
estão em vias de se libertar da autoridade institucional ou
familiar.” (SASSAKI, 1997, p. 51)
A luta pela elaboração e execução de programas que contribuam para uma
vida independente tem sido a razão de viver de muitos portadores de
29deficiência, luta que foi iniciada na década de 70, nos EUA e em 1988 no
Brasil.
Hoje, já é uma realidade em nosso país, vários serviços de vida independente,
como por exemplo: grupos de apoio, envolvimento com a comunidade,
assessoria jurídica, treinamento das atividades de vida diária (SASSAKI, 1997).
5 - Integração & inclusão
O PARADIGMA DE SUPORTES surge como fruto de muita luta, do despertar
da humanidade para o pressuposto de que a pessoa portadora de algum tipo
de deficiência tem direito a uma vida não segregada e acesso aos recursos
disponíveis aos demais cidadãos e que, para isso, é preciso disponibilizar os
suportes ou instrumentos que lhes possibilitem se beneficiar de todo e qualquer
recurso da comunidade, favorecendo a inclusão social. Estes suportes podem
ser a nível social, econômico, físico e instrumental (ARANHA, 2001).
Segundo a autora supracitada, enquanto no Paradigma de Serviços se
contextualiza a idéia da INTEGRAÇÃO SOCIAL, no Paradigma de Suportes, se
encontra a idéia da Inclusão social onde se prevê uma atuação direta junto ao
sujeito e às diversas esferas
sociais que contextualizam a vida desse sujeito, a fim de que sejam feitos os
ajustes físicos, materiais, humanos, sociais, legais, etc., que garantam
condições de acesso ao espaço comum da vida na sociedade. Enquanto na
integração se procura ajustar o sujeito à vida em sociedade, na inclusão, além
disso, se busca criar condições que garantam a sua participação, ou seja, não
há o esforço unilateral das pessoas portadoras de deficiências, e sim, uma
exigência de que o ônus da participação seja dividido entre o indivíduo e a
sociedade (SASSAKI, 1998; GOFFREDO, 1991).
A autora comenta que nas sociedades antigas, as atividades de agricultura,
pecuária e artesanato eram executadas pela população considerada sub-
humana e suas vidas só tinham valor para a realização dos desejos de quem
pertencia à nobreza. E, nesse contexto, a pessoa com deficiência, assim como
qualquer outra do povo, parecia não ter importância enquanto ser humano, já
30que sua exterminação (abandono ou exposição) não demonstrava ser
problema ético ou moral.
Segundo FONSECA (1999), os senhores feudais abrigavam e amparavam as
pessoas com deficiência em casas assistenciais mantidas por eles. O
pensamento de que toda pessoa possuía alma era a razão para que os
infortunados merecessem respeito e, sobretudo, caridade. A própria Bíblia
Sagrada, faz referência aos cegos, aos leprosos, entre outros, “a maioria dos
quais sendo pedintes ou rejeitados pela comunidade, seja pelo medo da
doença, seja porque se pensava que Deus estava punindo os doentes.”
(ARANHA , 2001. p.2).
A partir do século XVIII, alguns avanços no conhecimento da fisiologia, da
bioquímica e da patologia foram favorecendo o desenvolvimento da medicina
preventiva. Porém os portadores de deficiência mental continuavam com a
mesma sorte, uma vez que tal quadro era considerado hereditário e incurável,
restando-lhes somente a completa segregação na família ou em abrigos
(BENCINI, 2001.).
Surge na Idade Moderna, a partir de 1789, a cadeira de rodas, bengalas,
muletas, etc.
Para BERTAZZO (1998), o nascimento da sociedade industrial no século XIX e
o progresso na luta contra infecções e pela reabilitação de lesados de guerra
fizeram surgir grandes avanços nos estudos da biomecânica humana além de
uma mudança de mentalidade com relação às pessoas portadoras de
necessidades especiais. Segundo o autor, isto se deu principalmente na
Europa: as necessidades sociais começam a ser
discutidas e o Estado toma o doente como responsabilidade sua.
Na verdade, como bem diz SASSAKI (1997,p.1), “se algumas culturas
simplesmente eliminavam as pessoas deficientes, outras adotaram a prática de
interná-las em grandes instituições de caridade, junto com doentes e idosos.”
Em ambas as formas, os direitos dos portadores de necessidades especiais,
enquanto seres humanos e cidadãos, foram desrespeitados. Essa prática de
internação das pessoas com deficiências em instituições constituiu-se no
primeiro paradigma formal no que se refere à relação sociedade-deficiência,
31conforme análise de ARANHA (2001) – o Paradigma da Institucionalização.
As instituições foram cada vez mais se especializando a fim de prover todos os
serviços.
A partir do final dos anos sessenta, iniciou-se no mundo ocidental, o movimento
pela desinstitucionalização, uma vez que o paradigma tradicional de
institucionalização demonstrava seu fracasso na busca de restauração do
funcionamento normal do
indivíduo no contexto social (ARANHA, 2001). O movimento pela integração
social começou a procurar inserir as pessoas com deficiências nos Sistemas
Educacionais, na família, no trabalho e no lazer (SASSAKI, 1995). A princípio,
a idéia era a de normalizar estilos ou padrões de vida, mas acabou sendo
confundida com a noção de “tornar normais as pessoas deficientes”
(JONSSON, 1994, p.67; BRASIL, 1994, p. 22 e 37).
Surgiram “as escolas especiais, centros de habilitação, centros de reabilitação,
oficinas protegidas de trabalho, clubes sociais especiais, associações
desportivas especiais.” (SASSAKI. 1997, p. 31).
Segundo a fonte citada acima, a década de sessenta tornou-se, assim,
marcante na promoção de mudanças no padrão de relação entre as
sociedades e as pessoas com deficiências.
Evidentemente, algumas pessoas portadoras de deficiências necessitam de
ajuda física ou médica, mas isso deve ter como objetivo propiciar-lhes
oportunidades de maior controle sobre suas vidas; o que parece correto é fazer
as coisas ‘com elas e não para elas’.
Este modelo ainda orienta vários profissionais e familiares ligados às pessoas
com deficiências, na tentativa de que eles possam alcançar padrões e normas
da sociedade atual.
Os modelos médico e social da deficiência merecem aprofundamento para que
se possa melhor entender o processo histórico que produziu o paradigma da
inclusão.
O modelo médico da deficiência justifica a idéia de que a deficiência é um
problema da pessoa que a tem, e esta precisa ser reabilitada para se adaptar à
sociedade. A sociedade tende a acreditar que “bastaria prover-lhe algum tipo
32de serviço para solucioná-lo, explica SASSAKI (1995, p.29). Cabe ao
deficiente a responsabilidade de tornar-se apto a fazer parte da sociedade.
Além disso, numa sociedade em que se cultua o corpo como uma máquina
saudável, produtiva, dentro dos padrões convencionais de estética e eficiência,
as pessoas com alguma deficiência passam por um processo de rejeição
justamente por não se acharem enquadrados nestes padrões. As
conseqüências deste sentimento de rejeição têm repercussão na vida
emocional, afetiva e na formação da auto-imagem. (MANUAL DA CAMPANHA
DA FRATERNIDADE SOBRE OS EXCLUÍDOS, 2000).
Por causa de sua deficiência, a pessoa é considerada improdutiva e impotente.
O modelo médico da deficiência começa a ser desenvolvido principalmente
após a II Guerra Mundial com a finalidade de integração ou reintegração social
dos portadores de deficiências que passam a ser vistos como cidadãos com
direitos e deveres de participação na sociedade (BENCINI, 2001). No entanto,
para isso, eles teriam que demonstrar ter atingido o nível necessário de
normalidade e atitudes sociais para estarem nos ambientes físicos e
participarem dos eventos sociais (SASSAKI, 1998).
A LDB (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional) de 1961, pela
primeira vez, fala em Educação Especial dos Excepcionais e sugere que
crianças e jovens com deficiência mais aptos sejam enquadrados no sistema
geral de Educação. A partir daí, surgem as classes especiais e as salas de
recursos dentro das escolas regulares de ensino.
No modelo médico da deficiência procura-se melhorar as pessoas com
deficiência para que elas se enquadrem aos padrões da sociedade.
SANTOS (2000) afirma que na integração a maior ênfase estava na provisão
de serviços, nos quais, muitas vezes, predominavam as práticas de testagem e
rotulação, e assim o problema continuava a ser centrado apenas na pessoa a
ser integrada.
Segundo ARANHA (2001), integrar significava localizar no sujeito o alvo da
mudança, embora para tanto se fizesse necessário, muitas vezes, mudar
alguns aspectos da comunidade, ou seja, era preciso garantir serviços e
recursos que possibilitassem às pessoas com deficiências se aproximarem ao
33máximo do ‘normal’. As entidades assistenciais, as casas de passagem, os
centros de vida independente, as escolas de educação especial, as classes
especiais, os centros de reabilitação, entre outros, provêm desta filosofia.
Esta nova abordagem baseava-se nos seguintes princípios:
a) Normalização - “Segundo conceituação de BRADDOCK (1977),
‘normalização é uma ideologia – um conjunto de idéias que reflete as
necessidades e aspirações sociais de indivíduos extraordinários na
sociedade.’” (ARANHA, 2001. p. 4).
Surge nesse contexto um novo paradigma de relação entre a sociedade e as
pessoas com deficiências: O PARADIGMA DE SERVIÇOS, com o objetivo de
“oferecer aos portadores de necessidades especiais, modos e condições de
vida diária mais semelhantes possível às formas e condições de vida do resto
da sociedade.” (BRASIL, 1994,p. 22).
b) Mainstreaming – A partir da década de oitenta, na tentativa de
avançar mais no processo de integração social das pessoas com
deficiências, algumas ações foram desenvolvidas na área da educação
especial, baseadas no princípio de mainstreaming, e os alunos eram
encaminhados para os serviços educacionais disponíveis da
comunidade onde residiam. Conforme análise da especialista Nancy
Mills Costa (WERNECK, 1995, p. 176), o mainstreaming “pode ocorrer
em classes regulares, durante o almoço, em matérias específicas (como
música, artes, educação física) e em atividades extracurriculares”.
SASSAKI (1997, p.32), aponta o exemplo apresentado por ROBERTSON et al.
(1995) a respeito dessa prática na Educação que nos parece conveniente
repeti-la:
“No passado, o mainstreaming consistia em colocar
estudantes (com deficiência) em classes comuns,
principalmente classes acadêmicas, para finalidades
instrucionais. Com freqüência, o mesmo estudante era
34colocado em várias classes. Por exemplo, esse
estudante poderia estar colocado na aula de matemática da
3a. série, na aula de leitura da 2a. série e na aula de
educação física da 4a. série. Assim, ele nunca pertencia
realmente a nenhuma turma.”
No entanto, a partir dos anos oitenta, o paradigma de serviços começa a ser
criticado por vários setores da sociedade, como por exemplo, pela comunidade
acadêmica e científica, pelas pessoas com deficiências e seus familiares.
(ARANHA, 2001; SASSAKI, 1995).
As principais críticas, segundo estes dois autores, são:
• Por mais que se busque a ‘normalização’, devido às próprias
características do tipo de deficiência e do grau de comprometimento,
dificilmente se pode esperar que as pessoas com deficiência alcancem
semelhança com os que não têm deficiências;
• O fato de ser diferente tornar-se razão para sua menor valia enquanto
ser humano e cidadão;
• A inserção dessas pessoas ocorria por méritos próprios sem que
houvesse alguma modificação na sociedade;
• A segregação continuou a existir, embora de forma diferenciada, pois a
inserção de pessoas com deficiência ocorria em ambientes separados dentro
dos sistemas gerais. Exemplos dessa segregação são as classes especiais nas
escolas comuns,
horários exclusivos para pessoas portadoras de deficiências em clubes
comuns, etc;
• O portador de deficiências chega a desempenhar papéis sociais
individuais (pai, mãe, consumidor, trabalhador, etc.) como sujeito autônomo,
mas nem sempre com independência.
E assim, foi que na década de oitenta, as pessoas portadoras de deficiência e
outras ligadas à sua luta, passaram a se organizar e a exigir que suas
necessidades especiais não fossem apenas motivo para receberem serviços
específicos, mas que fossem razão também para que toda a sociedade
35mudasse, reorganizando-se de modo a garantir o acesso de todos os
cidadãos (inclusive os portadores de deficiências) a todos os bens e serviços,
independentemente do seu grau de normalidade (ARANHA, 2001).
Segundo SASSAKI (1997), surge daí, o modelo social da deficiência que
fundamenta a idéia e a práxis das pessoas que se dedicam à luta por uma
sociedade inclusiva,as quais entendem que o ato da inclusão não significa
buscar ações assistencialistas. Vai muito além disso.
Para SANTOS (2000), na inclusão, o enfoque passa a ser nas respostas de
todas as instituições e organizações sociais, entre elas, as Educacionais, de
Saúde e Sociais, no que se refere à provisão de suportes que viabilizem a
participação social e o pleno exercício da cidadania. É preciso que haja uma
mobilização interna, isto é, o desejo da própria pessoa de mudar a situação de
exclusão e a mobilização externa, que é o eixo fundamental para a criação de
mecanismos e estratégias que possibilitem o processo de inclusão. A autora
parece ter uma visão otimista com relação a esse processo, pois ainda
acrescenta em sua abordagem que
“o movimento tem sido cada vez mais em direção à
adoção, na prática (em complementação à teoria), de
atitudes e ações que incorporem princípios humanistas e
democráticos, como o da igualdade de valor e direitos entre
seres humanos” (p.160).
Importante destacar ainda a análise de GASPAR (2001) sobre o processo de
inclusão, que para ela, começa na família, principalmente quando esta vê o
filho deficiente como um sujeito possuidor de potencialidades e direitos e lhe
cabe o papel de fomentadora da auto-estima e condutora do processo de
independência. Ao contrário, famílias excludentes são “as fomentadoras de
escolas excludentes e de uma sociedade excludente.” (p.102).
36
CAPÍTULO II
O EDUCANDO EM PROCESSO DE ALFABETIZAÇÃO
“O aprendizado adequadamente organizado resulta em
desenvolvimento mental e põe em movimento vários
processos de desenvolvimento que , de outra forma ,
seriam impossíveis de acontecer”.
Vygotsky (1987)
37Segundo CUNHA (1983), o fracasso escolar é um fato comum na sociedade
brasileira e as causas deste fato sempre foram atribuídas às insuficiências das
escolas, seja pela falta de recursos humanos, seja pela escassez de recursos
materiais. No entanto, segundo ele, muitos estudos têm comprovado os efeitos
da exclusão social sobre o desempenho escolar, fazendo com que tal situação
seja perpetuada em todos os níveis.
POPOVIC (CADERNOS DE PESQUISA,1973), considera que as pessoas
marginalizadas possuem uma subcultura que é uma transformação da cultura
da classe dominante. Esta última, usa da imposição através de diversos meios,
entre eles a escola e os meios de comunicação sociais e pela sutileza e
eficácia dos mesmos, para conseguir a imitação das chamadas classes
marginalizadas.
Comentando essa teoria, CUNHA (1983, p.52), afirma:
É a escola que vai transformar a diferença em
marginalidade e, em decorrência, produzirá juntamente
com outras agências a discriminação social. Tudo começa
quando as crianças oriundas das ‘camadas mais
desfavorecidas’ ingressam na escola.”
Vale nesta pesquisa comentar uma tese de mestrado em Antropologia Social
de Dorith W. Schneider nas escolas da cidade do Rio de Janeiro há 20 anos,
sobre os mecanismos de exclusão escolar. O processo de discriminação se
dava em três etapas:
1a. etapa – Logo que as crianças chegam à escola, as professoras separam-
nas em dois grupos: um, considerado maduro para a alfabetização, compõe as
“classes de alfabetização matura”; outro, considerado imaturo, integra as
“classes de alfabetização imatura”. O primeiro grupo inicia imediatamente a
alfabetização, e ao terminá-la será promovido à 2a. série, caso seja bem-
sucedido. O grupo dos imaturos permanece todo o ano letivo em atividades de
desenho, recorte e outras, destinadas a apressar o seu amadurecimento. A
38seleção é feita subjetivamente, quando muito usam algum teste. A autora
explica que a imaturidade é
“(...)freqüentemente confundida com o comportamento e
conduta ‘inapropriada’, por exemplo, ser turbulento,
inquieto, barulhento, etc.” (p.57)
Ao final do ano letivo, essas crianças são transferidas para
a “1a. série analfabeta”
2a. etapa - Durante o ano essas crianças serão encaminhadas pela professora
para serem avaliadas com testes que definirão se elas devem seguir nas
turmas “normais” ou destinadas às classes “especiais”.
3a. etapa - Ingressam numa turma especial aquelas crianças consideradas
inaptas por não alcançarem como os demais os objetivos da professora.
“(...) em várias escolas, as turmas AE não podem participar
das festividades das escolas, tais como solenidades
cívicas, representações teatrais, e assim por diante, nem
podem votar nas eleições escolares, nem freqüentar
biblioteca da escola”.(p.62)
Assim, o ensino que lhes será dado será retardado e modificado de maneira a
tornar quase impossível o desenvolvimento ‘normal’.
SCHNEIDER sugere que o processo de: identificação, estigmatização e
segregação das crianças “especiais” não existe na rede privada, onde as
dificuldades de aprendizagem são resolvidas com recursos humanos e
materiais.
Apesar de reconhecer os aspectos positivos da tese de Schneider, CUNHA
considera que o estudo faz conclusões improcedentes e afirma:
“Os processos de discriminação intra-escolares mais relevantes ocorrem
justamente nas turmas ‘normais’.(...) Ao invés de se falar na marginalidade
cultural como um produto dessas relações (de dominação), ela será entendida
(ou melhor, desentendida) como uma ‘carência’ de pessoas que sofrem
39‘privações’, superadas, tão logo se mobilizem recursos humanos e materiais
dentro dos parâmetros existentes do sistema educacional.” (p.223)
Nossas escolas ainda são muito inadequadas à educação popular, de
conteúdo sem significado, onde todos têm que aprender ao mesmo tempo,
onde a avaliação é classificatória.(REVISTA MUNDO JOVEM, MAIO DE 2003)
Hoje mais do que nunca, os educadores são desafiados a buscarem uma
forma de ensino em que a aprendizagem seja significativa para os educandos,
para que o conhecimento seja transformado em questões problematizadoras,
levando em conta as suas dimensões: científica, conceitual, cultural, histórica,
social, política, ética, etc. (REVISTA MUNDO JOVEM, 2001)
1 - Teorias do desenvolvimento humano
A busca de alternativas que viabilizem a cada criança o acesso aos recursos
humanos e materiais que favoreçam o seu desenvolvimento global,
principalmente nos seus primeiros anos de vida, e, conseqüentemente, sua
inclusão social, tem sido o esforço de muitos educadores brasileiros que
compreendem a estreita relação entre desenvolvimento , cidadania e exclusão.
O pleno desenvolvimento das potencialidades e habilidades individuais é direito
de cada indivíduo para que possa exercer sua cidadania, compreendida como
a construção do bem comum, superando interesses individuais ou de grupos.
(MULTIEDUCAÇÃO, 1996)
Para MORAES (1992), quando elaboramos as propostas pedagógicas
adotamos uma concepção acerca do desenvolvimento humano que as
embasem.
Veremos a seguir as teorias do desenvolvimento humano a partir de quatro
concepções: a inatista, a ambientalista, a interacionista e a sociointeracionista.
401.1- Teoria inatista
Na visão inatista, o desenvolvimento humano, é determinado por fatores
biológicos, especialmente as características genéticas do indivíduo, não só as
físicas como também as psicológicas. . Sendo dessa forma, as qualidades e
capacidades básicas de cada ser humano estariam determinadas por ocasião
do nascimento.
Segundo MORAES (1992), a concepção inatista considera que cada
capacidade nova é simplesmente sinal de maturação do sistema nervoso. O
trabalho da educação e do ambiente tem seu papel reduzido.
Conforme KRAMER (1991, p. 27), a respeito desta concepção, “é preciso
perceber seus limites, em especial, por não levarem em consideração a
heterogeneidade social e o papel político” da educação.
FERNANDEZ (AEC, 1996, p.25), analisando a ineficácia dos sistemas
educacionais baseados na concepção inatista no mundo de hoje, afirma que
pesquisas têm mostrado
“novas formas de iletrismo e de manejo insuficiente de
códigos básicos de habilidades e capacidade de
compreensão de jovens, que tenham passado doze ou
mais anos pela escola, uma notável falta de preparação
para subir no mercado de trabalho e falta de resposta para
sua demanda e uma inversão da capacidade integradora
dos sistemas educacionais, que apresentam uma tendência
cada vez mais segmentadora que acumula a ignorância de
um lado e sobre-educa por outro, reproduzindo e
aumentando as desigualdades.”
MORAES (1992), a concepção inatista levou muitos educadores a uma atitude
passiva diante das crianças. Se ela apresenta ser muito inteligente, menos
trabalho e se torna a criança ideal; se se apresenta com necessidades de
atendimento mais individualizado, cruza-se os braços. Ela cita como exemplo
algumas frases ditas infelizmente ainda hoje no contexto escolar:
41“Pau que nasce torto, não tem jeito, morre torto.”
“Filho de peixe, peixinho é.”
“Joãozinho nasceu com a inteligência do pai e a teimosia e
temperamento difícil do avô, não é possível mudar sua
sina.”
Na concepção inatista, o papel do educador é apenas de cuidar para que
nenhuma influência negativa traga distúrbios à marcha do desenvolvimento da
natureza do homem. Como uma semente, a criança deve ser cuidada e regada
para atender a ordem natural do seu desenvolvimento.(KRAMER, 1991)
1.2 - Teoria ambientalista
“Água mole em pedra dura tanto bate até que fura”.
“Diga-me com quem andas e te direi quem és.”
“Não coloque a carroça na frente dos bois.”
Estes ditos populares bastante conhecidos, ilustram bem a concepção
ambientalista, também conhecida como comportamentalista, empirista e
behavorista. Segundo essa teoria, o desenvolvimento é determinado pelas
influências do meio ambiente. O educando é um ser passivo e receptor de
informações. O educador, por sua vez, detém o conhecimento e o controle do
processo de aprendizagem: informa, demonstra e corrige. (Formação
continuada para professores do Município do Rio, 2003)
A escrita é entendida como código de transcrição gráfica das unidades
sonoras.Trabalha-se apenas com fonemas, sílabas, palavras ou até mesmo
com frases, isoladamente. Alfabetizar é desenvolver habilidades perceptivo-
motoras.(BOZZA,2003)
Segundo MORAES (1992), o desenvolvimento infantil seria um produto
determinado basicamente pelo ambiente de acordo com os padrões esperados
de determinada cultura.
42Ainda segundo a autora, a grande contribuição desta concepção foi a de
tratar a questão da plasticidade do ser humano em se adaptar a diferentes
condições de existência, uma vez condicionados para isso. No entanto, ela cita
as desvantagens dessa concepção como por exemplo, o excessivo diretivismo
pelo adulto que tem o papel de principal agente e promotor do desenvolvimento
infantil, a consideração do educando como um agente receptor passivo, a idéia
de homogeneidade do saber das crianças..
1.3 - Teoria interacionista
Antes, aprendia-se por imitação de gestos e através de imitações; a
aprendizagem da nova sociedade começa pela mudança nos modos de
transmissão do saber. (AEC, 1996)
A concepção interacionista engloba os dois elementos essenciais do
desenvolvimento humano, conforme assinala MORAES (1992, p. 17 ?)
“o biológico e o social não podem ser dissociados e
exercem influência mútua. As características biológicas
preparam a criança para agir sobre o social e modificá-lo,
mas esta ação termina por influenciar na construção das
próprias características biológicas da criança. Além disso, o
interacionismo defende a reciprocidade de influências
também entre o indivíduo e o meio.”
Segundo essa abordagem, o aluno é concebido como sujeito ativo, inteligente
e cognoscente. O papel do professor é o de estimular, intervindo, propondo,
organizando, promovendo e informando.
A leitura e a escrita são consideradas como representações da linguagem e
objetos do conhecimento e este é o resultado da interação do homem com o
meio físico e social bem como da interação entre o sujeito e o objeto a ser
conhecido. (Curso de formação continuada, 2003)
43Segundo Piaget, pioneiro nos estudos sobre os estágios do desenvolvimento
humano, o ser humano, a partir do seu nascimento, se encontra submerso em
um meio social que atua sobre ele da mesma forma que o meio físico,e que, de
certo modo, a sociedade transforma o indivíduo em sua própria estrutura, ao
obrigar-lhe a reconhecer fatos e fornecer-lhe um sistema de signos
completamente construídos que modificam seu pensamento, propondo-lhe
valores novos e impondo-lhe uma cadeia definida de obrigações. (PIAGET,
1971)
1.3.1 – Áreas de desenvolvimento infantil
a) Área do desenvolvimento cognitivo
Segundo FLAVELL (1988), quando há interação entre a criança e o meio, ela
incorpora novos dados aos seus esquemas mentais, em cada experiência
vivida, e modifica o que for necessário à adaptação à realidade. Estes dois
processos denominam-se respectivamente, assimilação e acomodação. Dentro
dessa abordagem piagetiana, são assinaladas diversas etapas do
desenvolvimento cognitivo. Para o estudo em questão, serão consideradas
apenas duas etapas, ou seja, aquelas que abrangem a primeira infância.
Ü Etapa sensório-motora: Piaget não define idéias rígidas para os
estágios, pois para ele, os mesmos evoluem como uma espiral,
onde cada estágio engloba o anterior e o amplia, num
desenvolvimento encadeado (construtivismo seqüencial
(OLIVEIRA LIMA, 1980; KRAMER, 1991). Esta etapa se estende
desde o nascimento até, mais ou menos, os dois anos de idade.
Tem início com o exercício dos reflexos, onde os órgãos dos
sentidos são os instrumentos de captação da realidade que, aos
poucos, vão se transformando em representação mental, com o
uso dos movimentos da criança sobre o ambiente. (PÉREZ-
RAMOS, 1992) Por esta razão, é fundamental possibilitar à
criança o desenvolvimento amplo e dinâmico, desde o seu
nascimento, através dos estímulos.
44Ü Etapa pré-operatória: Inicia-se por volta dos dois anos de
idade. Segundo OLIVEIRA LIMA (1980), a criança começa a
imitar, na ausência do objeto, criando um novo universo das
significações, das representações e das diferentes formas de
linguagem, ou seja, da realidade. Exemplo dessa atividade da
inteligência, é a utilização do desenho, do jogo, do faz-de-conta
nas brincadeiras onde se assume o papel de mamãe, papai,
professora, etc.. Daí, a importância de que seja permitido à
criança manifestar seu simbolismo. Os processos cognitivos
nesta fase são chamados de classificação, seriação, conceitos de
número, espaço, tempo e causalidade (KRAMER, 1991 e PÉREZ-
RAMOS, 1992).
b) Área do desenvolvimento físico
Quanto a este aspecto do desenvolvimento infantil, há duas etapas a serem
consideradas.
Ü Primeira etapa - do nascimento aos doze meses de vida - é a mais
delicada do seu desenvolvimento, pois neste período, a criança é
bastante vulnerável às doenças embora geralmente seu crescimento
acontece de forma rápida e graças ao aumento do corpo, peso, enfim,
do desenvolvimento de seus músculos, etc., ela se torna mais ágil e apta
a participar neste sistema de suporte que é a família (BARREIRO,
2001). É fundamental uma alimentação sadia, cuidados com a higiene
do bebê e com o ambiente no qual ele vive, e principalmente, zelo e
atenção dos pais e dos outras pessoas de sua convivência. Disto
depende o seu desenvolvimento em todas as áreas (PÉREZ-RAMOS,
1992).
Além disso, há uma variação de criança para criança, isto é, cada uma tem o
seu próprio ritmo,pertencem a ambientes sócio-culturais diferentes, e mesmo
entre irmãos, pode-se constatar esta variedade, uma vez que as histórias de
vida nunca são idênticas e cada pessoa humana é um ser único.
45Ü Segunda etapa - do primeiro até o terceiro ano de vida - a criança
passa por uma fase em que seu crescimento se dá mais lentamente.
PÉREZ-RAMOS, (1992) destaca o desenvolvimento de determinadas
funções dos órgãos e sistemas como o geniturinário e o digestivo e a
dentição primária composta por vinte dentes por volta dos dois anos e
meio. O autor coloca ainda a importância de uma alimentação
adequada, rica em proteínas, cálcio, fósforo e vitaminas para a formação
e calcificação dos dentes.
c) Área do Desenvolvimento Motor
“Ao nascermos, a percepção de um novo espaço e dos
elos que unem objetos, pessoas e idéias, ou seja, a
percepção do real, começa a se processar em nosso corpo.
Para que se torne efetiva, qualquer alteração em nossa
consciência deve ocorrer no âmago de todas as nossas
estruturas.” (BERTAZZO, 1998, p. 10).
Partindo desta forma de conceber o desenvolvimento humano, pode–se afirmar
que entre a área motora e as demais, existe uma interdependência; e que a
motricidade evolui de acordo com certos princípios válidos também para as
outras áreas.
Segundo PÉREZ-RAMOS (1992), pode-se considerar o desenvolvimento motor
na 1ª infância em duas etapas, como veremos a seguir:
Ü Primeira etapa: Até os dois anos de idade, o ritmo é acelerado. Nos
primeiros quatro meses, há um progressivo controle do corpo, primeiro
da cabeça, depois do tronco, até sentar-se com apoio. Posteriormente,
começa a controlar os braços e mãos agitando-os para apanhar algum
objeto que lhe é mostrado. Do quarto ao oitavo mês, senta-se com o
auxílio de suas mãos e no final deste período já pode engatinhar ou até
mesmo ficar de pé, apoiando-se em algum móvel. A partir do oitavo
mês, senta-se sozinha, ficando em equilíbrio ao inclinar-se para frente
46ou para os lados. Aos doze meses, tenta dar seus primeiros passos e
subir escadas engatinhando. De um a dois anos, a criança explora o
espaço e manipula objetos de forma bastante livre.
Ü Segunda etapa: Ritmo lento durante a fase de 2 a 3 anos de idade.
Vale destacar que o uso das mãos começa a ser diferenciado,
mostrando dominância lateral. Rabiscar, cortar, juntar peças, colorir,
encaixar, entre outras, são habilidades que começam a se desenvolver.
De forma gradativa, vai adquirindo controle postural e consciência do
esquema corporal.
d) Área do Desenvolvimento da Linguagem:
Ü Primeira etapa - Segundo BRITO FILHO (1999), através do
choro, o recém-nascido dá seu sinal de chegada ao mundo e
também demonstra o funcionamento da laringe, órgão
responsável pela passagem do ar. Logo após, o bebê é levado ao
seio materno, iniciando a amamentação através da sucção,
realizando assim a deglutição. À medida que o bebê cresce, vai-se
diferenciando seu choro de acordo com suas necessidades
básicas, possibilitando assim que sua mãe faça distinção do que
deve fazer para atendê-lo. Além disso, aprende outros sons,
como o gorjeio, balbucio e lalação. Esta etapa é considerada
pelos estudiosos como preparação para a linguagem verbal.
Ü Segunda etapa- Do 10º ao 15º mês de idade, aparecem as
primeiras palavras com sentido próprio, embora por uma só sílaba
duplicada. Gradativamente, vai surgindo a união de dois
substantivos para designar objetos, pessoas e ações (“água-
nenê, por exemplo, significando, “o nenê quer água”).Das
palavras-frases, a criança passa a adquirir vocabulários mais
elaborados e melhor pronunciados, conservando a característica
de uma linguagem egocêntrica, isto é, fala de suas próprias
experiências (PÉREZ-RAMOS, 1992).
47e) Área do Desenvolvimento Sócio-Emocional
Os progressos alcançados nesta área são fundamentais para o
desenvolvimento das outras áreas e vice-versa. Segundo a classificação de
ERIKSON, ela se divide em duas etapas, a saber:
Ü Primeira etapa - O desenvolvimento depende do vínculo afetivo
entre mãe e filho. O fato da mãe garantir-lhe tudo o que precisa
orgânica e psicologicamente, desenvolve nele o sentido da
confiança básica. Caso isto não ocorra, a superação do sentido
de desconfiança básica será dificultada.
Ü Segunda etapa - Por volta dos dezoito meses, inicia-se a
autonomia e superação da vergonha e da dúvida. A criança
começa a querer fazer tudo sozinha, de acordo com sua vontade.
E assim, neste processo acaba por descobrir suas próprias
capacidades como também suas limitações, o que não poucas
vezes, gera inibição, insegurança e até mesmo desvios de
comportamento (birras, teimosias, etc). Porém, da superação
destes conflitos, fica a autonomia, a identidade pessoal e a
interação com os outros; isto se a criança encontrar quem a
oriente, com carinho, atenção e escuta, durante esta etapa tão
importante de sua vida.
1.4 – Teoria sociointeracionista
A concepção sociointeracionista de desenvolvimento entende que é através da
interação social, que desde o nascimento, o ser humano vai construindo seu
modo de pensar, sentir, ver o mundo e também seu conhecimento. A ação é
partilhada e, por isso mesmo, traz características de ambas as partes.
(MORAES, 1992)
Para a autora supracitada, é nessa interação que a criança começa a
participar do mundo simbólico do adulto, usando a linguagem para se
comunicar, compartilhar da história e da cultura de seu grupo social. O
desenvolvimento humano se processa nessa rede de relações.
48A concepção histórico-cultural do desenvolvimento considera os aspectos
histórico-culturais e suas implicações na ação educativa na qual o indivíduo é
um sujeito capaz de estabelecer relações, participa ativamente da construção
de sua própria cultura e de sua história, modificando-se e modificando os
demais sujeitos que com ele interagem.
“A origem das mudanças que ocorrem nas pessoas está, segundo seus
princípios, na interação entre estas, a Sociedade, a Cultura e a sua própria
História”. (MULTIEDUCAÇÃO,1996, p.51)
1.4.1 – A construção do conhecimento segundo Vygotsky
O psicólogo Lev Vygotsky defendia a idéia de que o indivíduo não nasce pronto
nem é cópia do ambiente externo. Sua evolução intelectual se dá na interação
entre processos internos e influências do mundo social. Para ele, o
desenvolvimento e a aprendizagem estão interligados: somente nos
desenvolvemos quando aprendemos. Não basta apenas a maturação. Para
que uma criança aprenda, é preciso que se parta do que ela sabe e domina
(desenvolvimento real) ajudando-a a ampliar seu conhecimento
(desenvolvimento potencial). Essa distância entre o que a criança sabe fazer
sozinha e o que é capaz de realizar com ajuda de alguém mais experiente, foi
denominada por Vygotsky de zona de desenvolvimento proximal. (NOVA
ESCOLA, fevereiro de 2001)
A grande diferença entre as teorias de Piaget e Vygotsky está na forma de
entender a relação entre desenvolvimento e aprendizagem. Como já foi dito
anteriormente nesta pesquisa, para Piaget a aprendizagem depende do estágio
de desenvolvimento mental. Para VYGOTSKY (1987, p.101), a aprendizagem
favorece o desenvolvimento das funções mentais:
“O aprendizado adequadamente organizado resulta em
desenvolvimento mental e põe em movimento vários
processos de desenvolvimento que, de outra forma, seriam
impossíveis de acontecer.”
49LIMA (2002, p.4), afirma:
“A aprendizagem não se dá no vazio. É uma realização
individual, por meio de construção que é histórica e social e
que supõe, portanto, a interação com o outro e com a
produção simbólica da humanidade. É, portanto, um
processo complexo.”
Ainda numa outra publicação de LIMA(?), encontra-se a afirmação de que a
aprendizagem se dá pelas sinapses interneuronais o que precisamente
constituem no cérebro humano os sistemas neuronais.; e ainda, que, pelos
estudos antropológicos e psicolingüísticos sabemos da interferência das
práticas culturais e sociais na aprendizagem do indivíduo.
Para GÓES (1991, p.20), “a boa aprendizagem é aquela que consolida e
sobretudo cria zonas de desenvolvimento proximal sucessivas.”
Na Revista Nova Escola (Junho/julho de 2003), encontra-se uma explicação de
como se forma a memória que vale a pena ser destacada:
“O cérebro funciona em módulos cooperativos, que se
ajudam na hora de recuperar informações. A informação
captada transita pelos neurônios, células nervosas
semelhantes a árvores sem folhas: os galhos seriam os
dentritos; o tronco, o axônio; e as raízes, os terminais pré-
sinápticos. Eles criam emaranhados de caminhos que se
orientam em diversas direções. Quando os galhos de uma
célula encontram-se com as raízes de outra forma-se uma
sinapse, local de comunicação entre os neurônios e
unidade elementar de armazenamento da memória.”
501.4.2 – A linguagem como mediadora da interação social
A linguagem humana num enfoque sociointeracionista é concebida como algo
imprescindível para o funcionamento e desenvolvimento do cérebro; o
caminho para que o ser humano se constitua social e psiquicamente; enfim, é
“pela linguagem que o sujeito ocupa e produz seu lugar no mundo, sendo ela
própria sua arma para condená-lo ou libertá-lo.” (BOZZA, 2003, p. 2)
Vygotsky, fala da importância da linguagem como instrumento de pensamento,
ou seja, da função planejadora da fala que introduz “mudanças qualitativas na
forma de cognição da criança, reestruturando diversas funções psicológicas,
como a memória, a atenção voluntária, a formação de conceitos, etc.”
(MULTIEDUCAÇÃO, 1996, p. 68)
2 – Componentes do sistema da linguagem escrita
Segundo LIMA (Nova Escola,dezembro de 2000), um dos principais entraves
no processo de mudanças na educação brasileira são a falta de conhecimento
sobre a evolução biológica do ser humano e a deficiente formação inicial dos
professores.
Numa outra publicação (2002,), a autora acima referida, afirma que para
escrever é necessário um domínio das dimensões da linguagem que são as
seguintes: fonológica-ortográfica, léxica, sintática, semântica e prosódia. E
esclarece:
“No início do processo de aquisição da escrita, a criança
depende muito do desenvolvimento do componente léxico
e fonológico. Do léxico, principalmente, porque o elemento
de escrita a ser trabalhado precisa ser “reconhecido” de
alguma forma pelo educando. Para a construção de
significados (do âmbito da semântica), é preciso haver
elementos de compreensão da palavra. Sinônimos,
antônimos, formas diferentes de comunicar a mesma idéia
51são elementos que auxiliam a compreensão e
possibilitam a elaboração de frases (organizações
sintáticas). O componente fonológico (estabelecimento de
relação fonema-grafema) também é muito apoiado pelo
desenvolvimento léxico. O desenvolvimento das relações
entre fonemas (linguagem oral) e os grafemas
(representação escrita das unidades de som) é realizado
com o envolvimento do léxico, mas depende do
conhecimento ortográfico.” (p.11-2)
A emoção é outro fator de grande relevância no trabalho de alfabetização.
Sobre isso, LIMA (2002, p. 12), afirma: “As palavras mais “carregadas” de
significados no acervo léxico da criança e do jovem são aquelas relacionadas
com as práticas de cultura e com as atividades cotidianas.”
As emoções são reguladoras e estimuladoras da formação e evocação de
memórias, pois provocam a produção e a interação de hormônios ao fazerem
com que os estímulos nervosos circulem mais nos neurônios. (NOVA ESCOLA,
JUN/ JUL DE 2003)
2.1 – A função social da leitura e escrita
A grande discussão entre os educadores atualmente tem sido sobre o trabalho
pedagógico o qual favoreça a alfabetização que vá além do ensinar a ler e
escrever, mas sobretudo, que oriente os educandos quanto ao uso social da
leitura e da escrita..
Para a conquista da cidadania, é preciso que o aluno seja capaz de não só
dominar os códigos de leitura e escrita, mas compreender o significado dessa
aprendizagem no dia-a-dia na vida em sociedade. (Revista NOVA ESCOLA,
setembro de 2001)
Conforme BOZZA (in Temas em Educação II, 2003), o processo de aquisição
da língua escrita vai além de habilidades motoras. O trabalho pedagógico
52precisa priorizar o desenvolvimento da capacidade de estabelecer relações,
pois é pela linguagem que o ser humano se constitui social e psiquicamente.
Para a conquista da cidadania, é preciso que o aluno seja capaz de não só
dominar os códigos de leitura e escrita, mas compreender o significado dessa
aprendizagem no dia-a-dia na vida em sociedade. (Revista NOVA ESCOLA,
setembro de 2001)
Segundo FERREIRO (2001, p.38-9),
“A criança recebe informação dentro mas também fora da
escola, e essa informação extra-escolar se parece à
informação lingüística geral que utilizou quando aprendeu a
falar. É informação variada, aparentemente desordenada,
às vezes contraditória, mas é informação sobre a língua
escrita em contextos sociais de uso, enquanto que a
informação escolar é freqüentemente informação
descontextualizada.”
53
CAPÍTULO III
AVALIAÇÃO DIAGNÓSTICA INTERDISCIPLINAR:
LIMITAÇÕES PROFISSIONAIS E POSSIBILIDADES DE
INTERAÇÃO
“Para remover barreiras à aprendizagem é preciso sacudir
as estruturas tradicionais sobre as quais nossa escola está
assentada,as quais estimulam o culto pelos rituais de
transmissão, avaliação somativa, reprovação e repetência.”
Rosita Elder Carvalho (1999)
54
O padrão natural das escolas convencionais consiste em designar para a
mesma classe alunos com ou sem dificuldades cognitivas. Os resultados são a
baixa auto-estima, a repetência e a evasão escolar.
A partir, principalmente, de Piaget, o papel do professor se revestiu de
acentuada responsabilidade, na medida em que precisou incorporar novas
idéias educacionais, entre elas, o uso do método clínico em sala de aula.
(MANTOAN, 1988)
Para que um sistema educacional seja considerado democrático, precisa
apresentar uma variedade de estratégias que possibilitem atendimento a todos
os educandos, independentemente das diferenças de cada um.
A partir do momento em que a educação escolar é proclamada direito de todos
os cidadãos e se torna espaço para a concretização desta igualdade,se efetua
o papel de mediação da escola entre a origem e o destino social de cada
aluno.
Conforme as considerações de MELLO (1985, p. 38), é necessário que os
professores saibam o que fazer,
“objetivamente, para ensinarem a esses alunos (...) se eles
fossem capazes de planejar e realizar um trabalho didático-
pedagógico eficiente para a aprendizagem dos alunos
pobres, talvez mudassem suas expectativas diante destes
últimos.”
1 - Conceituação
A avaliação diagnóstica interdisciplinar pode ser considerada como um
conjunto de investigações que articulam diferentes saberes, teorias e ciências,
redimensionando a estrutura escolar, através de ações que visem à saúde
física (higiene, segurança física, alimentação) e à saúde mental (psicológica,
emocional, social e intelectual) em prol do desenvolvimento global e harmônico
55do indivíduo. (SECRETARIA MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO DE MANAUS,
2003)
A interdisciplinaridade cria caminhos que levam à co-responsabilidade, onde a
troca, parceria e unidade são valores fundamentais, respeitando, entretanto, a
diversidade e reconhecendo as fronteiras das diversas áreas e ciências. Assim,
a busca de alternativas integradoras, conforme análise de ZABALA (2002, p.
24), “desenvolvem-se seguindo dois caminhos aparentemente antagônicos: a
superespecialização, por um lado, e a busca de modelos sistêmicos e
integradores com diferentes graus de interdisciplinaridade, por outro”.
A avaliação diagnóstica interdisciplinar procura dar conta de todos os aspectos
do desenvolvimento da criança, não só o cognitivo, que revele o que precisa
ser feito para que o aluno aprenda, como intervir para mudar a situação.
Segundo MEDIANO (1989, p. 137),
“A avaliação passa a ter objetivos um poucos diferentes
daqueles que comumente encontramos na prática
pedagógica de muitas escolas. A finalidade classificatória
perde seu significado, pois não interessa classificar o aluno
como fraco, carente, incompetente, mas buscar caminhos
para que realmente adquira a cultura letrada, tão valorizada
pela atual sociedade. A avaliação portanto passará a ter
com principal objetivo diagnosticar as dificuldades do
processo de transmissão/aquisição do conhecimento,
buscar as falhas tanto na transmissão, como na aquisição,
para tomar decisões acerca da próxima etapa do
processo”.
Para NOVAES (1980), o processo diagnóstico é a ponte entre o referencial
médico-psicossocial e o trabalho educativo, porque fornece informações reais
objetivas.
No programa UM SALTO PARA O FUTURO, n 14, de julho de 1990 (?),
encontra-se uma definição que nos parece ser importante destacar:
56
“Diagnóstico é um processo contínuo que se inicia com a
identificação, passando pelo encaminhamento,
atendimento e acompanhamento. Este processo deverá ser
norteado por um referencial teórico, agindo-se através da
interdisciplinaridade, Istoé, todas as categorias
profissionais envolvidas no diagnóstico devem embasar
seus trabalhos numa mesma concepção teórica, havendo
uma unidade de pensamento, uma vez que o sujeito é
único. Temos de ter como objetivo fundamental seu
desenvolvimento global e harmonioso.”
Segundo CARVALHO (1993), as deficiências mais visíveis logo são
identificadas, porém, por falta de esclarecimento das famílias e escolas, muitas
crianças não são atendidas precocemente, e os problemas acabam sendo
fatores que interferirão no seu desenvolvimento.
A maioria dos alunos encaminhados para turmas especiais necessitaria de que
seus professores revissem sua prática pedagógica, de modo que eles não
necessitassem ser excluídos das turmas ditas “normais”. (GOFFREDO, 1991)
“Deve haver um esforço no próprio interior do sistema escolar, no sentido das
buscas de alternativas que melhor atendam às necessidades de seus alunos.”
(UM SALTO PARA O FUTURO, julho, n 14, (?))
2- Utilidade prática da avaliação diagnóstica interdisciplinar
Há menos de três décadas num momento em que a medicina se desenvolvia a
passos largos, os ganhos na reabilitação de adultos com lesões sérias eram
muitos; as técnicas cirúrgicas alcançavam eficiência; enfim, aperfeiçoava-se
cada vez mais o diagnóstico precoce de determinadas doenças sendo que isto
se tornou possível principalmente pela sistematização do desenvolvimento
neurológico infantil (CORIAT, 1997). A autora ainda ressalta que “não só diante
do real da morte a medicina toca os seus limites, mas também frente ao real de
57um corpo que chega ao mundo com determinadas alterações orgânicas, ou
que é lesionado pelo caminho” (p. 94 ).
As pesquisas em saúde e educação têm reforçado a idéia de que, quanto mais
cedo a criança portadora de deficiências ou vulnerável às mesmas for
submetida a programas de intervenção precoce, maiores probabilidades de que
o prognóstico de sua habilitação ou reabilitação seja otimista. (ONU, 1971;
LORENZO, 1976 e HOLY, 1973 in PÉREZ-RAMOS, 1992).
Para Vaz (2000), “as medidas buscam minimizar e/ou compensar a deficiência
da qual a criança é portadora, visto que o que se encontra em jogo é a infância
e sua dignidade” (p.13).
Segundo ASSIS (NOVA ESCOLA, maio 2000, p.25), “quem recebe uma
formação adequada antes dos 6 anos dificilmente fracassa no Ensino
Fundamental. (...) Investir em Educação Infantil significa diminuir a repetência e
a evasão escolar.”
Professores de Educação Infantil e de Alfabetização, principalmente, precisam
ser preparados para identificar necessidades, enxergar as características
pessoais de cada aluno no dia-a-dia escolar através de algumas ações como:
• Respeitar o ritmo de aprendizagem de cada aluno;
• Criar oportunidades para que todos cresçam juntos, abrindo
possibilidades de ajuda mútua;
• Auto-avaliar-se;
• Agrupar os alunos sem se preocupar com a homogeneidade;
• Desenvolver atividades que favoreçam a auto-estima. (NOVA ESCOLA,
maio 2002)
Para NÓVOA (NOVA ESCOLA, maio 2003 p.15), os profissionais da educação
precisam colocar-se “num espaço de redes (culturais, familiares, sociais) que
construa novos compromissos em torno da educação.” Ele ainda acrescenta:
“É tempo de pôr a “sociedade a serviço da escola” em vez da “escola a serviço
da sociedade.”
Os problemas educacionais brasileiros não foram resolvidos com a
universalização da educação e nem poderão ser resolvidos somente pela
atuação dos professores. A camada popular passou a ter acesso à escola, que,
58sem dúvida precisa ser reconstruída para ser um sistema de suporte para a
verdadeira inclusão, buscando alternativas que melhor atendam às
necessidades de seus alunos. (UM SALTO PARA O FUTURO, julho, n 14)
O sociólogo Darcy Ribeiro defendia uma escola que além do ensino e
aprendizagem, fosse um
“espaço de instrução, orientação artística, desenvolvimento
das ciências, assistência médica, odontológica e alimentar
com práticas diárias orientadas, como tomar banho ou
escovar os dentes. E, principalmente, um local para formar
o cidadão crítico.” (NOVA ESCOLA, abril, 2003, p. 33)
O que cabe a nós, numa sala de aula com organização de tempo normal (não
integral) e sem este aparato de recursos humanos e materiais, é estarmos
bastante atentos no dia-a-dia ao desempenho real de cada aluno, para que
possamos ajudá-lo a se desenvolver, orientando as suas famílias quanto à
procura de atendimento na área da saúde, quando isso se fizer necessário.
Para MEDIANO (1989, p. 138), “assumir esta posição implica em o professor
assumir um compromisso político com as camadas populares que ainda se
encontram à margem dos benefícios econômicos e educacionais”.
Numa entrevista à Revista Mundo Jovem (setembro/2000, p. 14) Sofia
Cavedon Nunes ao faalr de avaliação e inclusão, afirma:
“Temos que nos negar à padronização, todo o aluno pode
aprender no mesmo tempo, no mesmo ano e do mesmo
jeito que os outros. Não podemos aceitar a avaliação
comparativa, cada ser humano é diferente. Precisamos
reconstruir nossa escola para incluir”.
Um aspecto considerado de suma importância por MELLO (1985, p. 145) é a
competência técnica do profissional da educação, que, para ela, “é o saber
fazer aquilo que o bom senso aponta como necessário”.
59A autora ainda acrescenta:
“Suponho que o despreparo e insegurança técnica estão na
raiz da dissimulação, da estratégia de culpar a vítima e ao
mesmo tempo amá-la sem nada poder fazer de objetivo
para evitar-lhe o peso do fracasso. Uma melhor
capacitação profissional do professor permitiria, no mínimo,
eliminar essa hipótese. Sem ela, pouco se pode afirmar
com segurança acerca de sua disponibilidade e vontade
política para mudar a escola (...) Porque o saber fazer
constitui uma das necessidades imediatas para sua
imagem de profissional, para uma percepção mais crítica e
menos assistencialista do valor do seu trabalho”.
2.1 - A intervenção terapêutica
Numa visão sociointeracionista da educação em que a diversidade não é uma
limitação, são exigidas da escola práticas pedagógicas mais precisas e
adequadas que venham minimizar o máximo possível, as deficiências “reais” e
as circunstanciais.” No entanto, a maior dificuldade está na falta de capacitação
de recursos humanos para prevenir e detectar precocemente deficiências
fazendo o encaminhamento a serviços. O que se observa predominantemente
nas escolas, segundo SANTOS (SALTO PARA O FUTURO, p. 75, 1999),
“É que os profissionais assumem uma postura de
superioridade e se limitam a ‘prescrever’ o que a família
deve fazer. A escola diz: “O senhor tem de levar este
menino à ‘fono’, ao psicólogo”, etc.”
Portanto, consideramos fundamental que todo profissional da educação
adquira conhecimentos, ainda que mínimos, sobre a prevenção, detecção e
diagnóstico, pois, embora não seja sua missão intervir terapeuticamente,
60interagir com a família e outros profissionais, trará luzes à sua intervenção
pedagógica, possibilitando-lhe identificar a si mesmo como “profissional da
aprendizagem” e não mais como “profissional do ensino” (DEMO, 1997)
2.1.1 – Prevenção, detecção e diagnóstico
A influência de determinados fatores somáticos e/ou ambientais ocorridos nos
períodos pré, peri ou pós-natais, comumente denominados fatores de alto
risco, podem provocar déficits duradouros no desenvolvimento motor,
sensorial, mental e emocional da criança, tornando-a vulnerável ao
aparecimento de deficiências. (PÉREZ-RAMOS, 1992).
O autor supracitado destaca os especialistas CULLINAN (1970); SOMEROFF
E CHANDLER (1970), KOCH E DOBSON (1971); LORENZO (1976), entre
outros, os quais citam como fatores de alto risco os antecedentes familiares,
inclusive os de ordem genética, as doenças específicas e outras anormalidades
ocorridas na gravidez, no parto e no período neo-natal, a desnutrição, os maus
tratos, e, por fim, a carência de estimulação apropriada nos primeiros anos de
vida.
Especificamente no Brasil, as pesquisas sobre fatores de alto risco têm
destacado a “carência protéica, a prematuridade, a anoxia perinatal e
desidratação como fatores etiológicos ou desencadeantes” (PÉREZ-RAMOS,
1992, p. 11).
No trabalho de detecção e diagnóstico incluem-se:
a) ANAMNESE: análise dos fatores de alto risco e dos dados que
comprovam as possíveis deficiências. É feita a partir da história familiar da
criança;
b) Exames médicos e laboratoriais para análise de anomalias maiores e
menores e seus comprometimentos neuropsicomotores;
c) Avaliação psicológica onde se faz a análise do desenvolvimento verbal,
motor cognitivo e sócio-emocional;
d) Análise dos dados sobre a estimulação ambiental recebida pela criança.
612.1.2 – Programas de intervenção precoce
O fator básico da prevenção (UM SALTO PARA O FUTURO, 2000, p.11) “é
identificar e minimizar o maior número de fatores causais, gerais ou específicos
das deficiências dentro das possibilidades sócio-econômicas existentes,
colocando-se disponível o máximo de recursos materiais e humanos.”
Segundo dados da OMS (Organização Mundial da Saúde) de 1980,
aproximadamente 70% das causas de deficiência poderiam ser evitadas se
algumas medidas fossem adotadas. Eis alguns exemplos:
Ü melhor nutrição materna e na 1ª infância;
Ü imunização contra infecções bacterianas e viróticas;
Ü exame e aconselhamento genético;
Ü educação familiar sobre o risco de nascimento de bebês com
deficiência, frutos de uniões consangüíneas;
Ü cuidados pré-natais e perinatais;
Ü imunização de crianças do sexo feminino contra rubéola;
Ü identificação dos fatores de alto risco de deficiências;
Ü exame pré-nupcial.
Os programas de Prevenção devem abranger três dimensões, a saber:
a) Prevenção primária – tem como principal objetivo proteger o bebê, mesmo
antes de seu nascimento. Pode ser feita em três fases:
• Pré-Natal - melhoria das condições biopsicossociais dos cidadãos,
assistência pré-natal, vacinação, aconselhamento genético,etc.;
• Peri-Natal – melhoria das condições do parto e do nascimento,
estimulação ao aleitamento materno, criação de vínculo afetivo entre a mãe e
o bebê, etc.;
• Pós-Natal – medidas gerais e específicas que minimizem os fatores
patológicos causadores de deficiências, vigilância ao crescimento físico e
psicossocial da criança, ênfase na divulgação das possíveis causas das
deficiências, conscientização da importância da família como mediadora na
estimulação da criança, incluindo o manejo e relacionamento com as pessoas
com as quais ela convive, etc. (PÉREZ- RAMOS, 1992).
62b) Prevenção secundária
• Descoberta precoce dos fatores de risco para a gestante e o feto como a
desnutrição, a farmacodependência, o uso do fumo e álcool, a paternidade
responsável, os maus tratos e conflitos familiares;
• Identificação de possíveis fatores negativos a influenciar o vínculo
afetivo entre mãe e filho (CORIAT, 1997);
• assistência perinatal: medidas enérgicas e imediatas com bebês de alto
risco e elaboração de programas de estimulação essencial. Ter ciência de que
um bebê pode não ter um desenvolvimento normal, permite que se tomem
providências, a fim de lhe possibilitar um desenvolvimento o melhor possível.
c) Prevenção terciária
• Organização de serviços de Estimulação Essencial para atender
crianças com alterações anatômicas, fisiológicas ou psicológicas que podem
interferir no seu desenvolvimento;
• Conscientização da família sobre a importância da estimulação em
casa, visto que é com ela que o bebê primeiramente se relaciona. Sendo
assim, os profissionais da saúde e educação devem orientar principalmente a
mãe para que, em casa, sejam criadas condições favoráveis ao
desenvolvimento da criança. Para isso, é de suma importância a interação
entre estes profissionais, a criança e sua família, pois através do diálogo, é
que se pode realmente ajudá-la. Os pais buscam uma nova possibilidade de
vida para seu filho e muitas deles demonstram angústia, aflição e ansiedade
quando procuram atendimento terapêutico que possa tornar possível esta
esperança. O terapeuta, por sua vez, afoito em corresponder às expectativas
dos familiares, geralmente experimenta sentimentos não muito diferentes
daqueles experimentados por eles (PÉREZ-RAMOS, 1992; CORIAT, 1997;
CHAER, 2000; DOLTO, 1988 e PROGRAMA “UM SALTO PARA O FUTURO”
p. 9).
Na verdade, a estimulação é importante para qualquer criança com ou sem
atraso no desenvolvimento. A criança não precisa apenas de cuidados básicos
como comer, beber e dormir. Logo ao nascer, ela precisa ser recebida de
forma acolhedora , com amor e afeto. O seu desenvolvimento dependerá tanto
63do próprio organismo como também do meio e da variedade de descobertas
possíveis ao seu redor.
Para VAZ (2000), no nascimento de um bebê com problemas neurológicos, é
fundamental que este seja submetido imediatamente a um programa de
estimulação com base em técnicas neuroevolutivas planejadas, uma vez que o
seu sistema nervoso ainda é plástico e maleável, podendo “ajustar-se,
adaptando-se e realizando novas correções suprindo áreas lesadas,
restaurando as funções desorganizadas.” (VAZ, 2000, p.14). Esta visão
terapêutica é baseada numa das mais recentes descobertas no campo das
neurociências: a PLASTICIDADE NEURONAL, que põe em dúvida a teoria de
irreversibilidade de uma lesão e permite supor que possa existir recuperação
da função afetada.
“Plasticidade é a tendência do Sistema Nervoso Central a
ajustar-se perante influências ambientais durante o
desenvolvimento e restabelecer ou restaurar funções
desorganizadas por condições patológicas ou
experimentais (...) e associa-se os fenômenos de
recuperação funcional à formação de novas conexões no
interior do cérebro, possibilitando por outras vias o
restabelecimento do processamento de informações
necessário ao reaparecimento das funções antigas.” Robert
Lent (ESEHA, 2001).
O sucesso desses programas acima citados depende da adoção de medidas
preliminares que permitirão delinear os objetivos a serem alcançados e analisar
os meios e recursos disponíveis para tal fim. Segundo PÉREZ-RAMOS (1992),
estas medidas são:
Ü estudo da clientela, ou seja, das crianças a serem submetidas à
avaliação, intervenção, portadoras de distúrbios neuropsicomotores,
susceptíveis ou normais, na faixa etária de 0 a 6 anos;
64Ü levantamento dos recursos disponíveis na comunidade que possam
garantir a continuidade do trabalho a ser iniciado;
Ü sondagem sobre a disponibilidade de pessoal que possa integrar-se à
equipe;
Ü pesquisa das possibilidades de locais, instalações, equipamentos e
materiais técnicos;
Ü análise dos recursos financeiros;
Ü exame das questões legais e burocráticas.
2.2 - Intervenção pedagógica: rompendo barreiras à
aprendizagem
A situação social em que vivem milhões de crianças e adolescentes,
apresenta-se muito complexa e torna-se um grande desafio para a Educação
contribuir para reverter este quadro, elaborando estratégias que de fato sejam
eficientes e eficazes. Segundo MELLO (NOVA ESCOLA, p.14, março de 2003),
“é um objetivo do ensino propiciar mudanças que caracterizem
desenvolvimento, seja ele cognitivo, afetivo ou social”. As mudanças precisam
ocorrer em quase todos os níveis educacionais: currículo, gestão escolar,
organização da sala de aula, tipos de atividade e, principalmente o jeito de
avaliar o aluno.Para a educadora Sandra Maria Zákia Lian Sousa, da USP, “a
mudança não é apenas técnica, mas também política”. (NOVA ESCOLA, p.27,
jan/ fevereiro 2003). O importante na avaliação não é identificar problemas,
mas, as necessidades de cada aluno. Segundo Marta Sorvi dos Santos (NÓS
DA ESCOLA, 2003, n13, p.33),
“é importante acompanharmos a situação em forma de
pesquisa, partindo da análise de entrevistas semi-
estruturadas com os responsáveis, professores e
especialistas, no intuito de encontrarmos pistas que nos
mostrem quais são os caminhos possíveis para a escola
seguir, possibilitando que seja parceira dos alunos em sua
65formação, na construção de sua identidade, em sua
leitura de mundo, na conquista de sua cidadania”.
O cuidado que se deve ter ao avaliar a aprendizagem escolar é fundamental,
pois muitas vezes ela determina o fracasso e a exclusão do aluno. LIMA
(2002, p. 4-7), afirma:
“Portanto, o olhar sobre a criança que não aprende deve
integrar o professor (incluindo as práticas pedagógicas), as
dinâmicas intra-escolares, a organização do tempo e do
espaço na escola, e o contexto macro em que se insere a
instituição escolar. (...) Toda criança pode aprender a ler e
a escrever, mas não em qualquer situação. (...) Por este
motivo é importante avaliar os conhecimentos de leitura e
de escrita fora da sala de aula, em outros ambientes da
escola, com intervenção de outros educadores (como
coordenador, diretor, vice-diretor, pessoal de apoio da
Secretaria da Educação, professor co-regente, eventual,
volante, etc.) e com a utilização de materiais diversos e
também sobre assuntos diferentes”.
A partir desse ponto, pode ser que algumas crianças precisem de uma
avaliação especializada, que deverá ter um caráter multidisciplinar e
interdisciplinar, envolvendo além de técnicos de educação, profissionais da
área da saúde. (MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO, 1992).
Embora não seja uma função específica do professor cuidar da saúde da
criança, sua atenção precisa estar voltada para este aspecto, principalmente
se atua nas escolas das camadas populares, uma vez que, conforme as
palavras de CARVALHO (SALTO PARA O FUTURO, 60-, 1999),
“Barreiras à aprendizagem são obstáculos que se impõem
aos alunos, criando-lhes dificuldades no aprender.
66Inúmeros fatores geram tais dificuldades: alguns são
intrínsecos aos alunos e outros, talvez a maioria, externos
a eles.”
As necessidades educativas especiais precisam ser atendidas e as dificuldades
minimizadas. São inúmeras as barreiras enfrentadas pelo professor. A maior
delas, porém, é a falta do trabalho em equipe, principalmente na avaliação da
aprendizagem dos alunos.
Para encerrar este capítulo, são destacados a seguir, alguns casos nos quais
existem efetivamente necessidades educativas especiais que exigem uma
avaliação e intervenção de uma equipe multiprofissional:
• Distúrbios de linguagem - Quando uma criança tem problemas
para se comunicar verbalmente é necessário fazer uma série de exames
para se chegar a um diagnóstico preciso. Esse diagnóstico deverá ser
pluridimensional e realizado por uma equipe interdisciplinar. Quando o
problema estiver relacionado com a fala, chamamos de DISLALIA e
DISARTRIA; se estiver relacionado com a linguagem propriamente dita,
pode ser uma AFASIA, DISLEXIA, DISORTOGRAFIA, DISGRAFIA,
DISCALCULIA, DISLOGIA, GAGUEIRA E ATRASO DE LINGUAGEM;
enfim, a DISFONIA, se o problema estiver relacionado com a voz
(NATAL, 1984).
• Deficiência auditiva - Diminuição da capacidade de percepção
normal dos sons. A competência auditiva é classificada como normal, perda
leve, moderada, severa e profunda. Pode ser congênita ou adquirida e também
classificada como deficiências de transmissão, quando o problema está no
ouvido externo ou médio; mista, quando se localiza no ouvido médio e interno;
e sensório-neural quando se origina no ouvido interno e no nervo auditivo
(FERNANDES, 1990).
67• Deficiência múltipla - São aquelas pessoas que apresentam
associadas duas ou mais deficiências primárias (mental, física, visual e
auditiva) com comprometimentos que levam a atrasos no desenvolvimento
global e na capacidade de adaptação (MEC/ SEE, 1993).
• Autismo (Gauderer, 1993) - A Síndrome do autismo foi definida em
1979 pela associação americana abaixo referida, como
“uma inadequação no desenvolvimento que se manifesta
de maneira grave durante toda a vida. É incapacitante e
aparece tipicamente nos três primeiros anos de vida.
Acontece a cerca de cinco entre cada dez mil nascidos e é
quatro vezes mais comum em meninos do que em
meninas. Não se conseguiu provar nenhuma causa
psicológica no meio ambiente dessas crianças que possa
causar Autismo”- The National Society for Autistic Children.
(CENTRO UNIVERSITÁRIO AUGUSTO MOTTA, 2001,
Educação Especial, p.91)
A criança com Síndrome de Autismo possui atraso na fala, distúrbios da
linguagem e sérios problemas no relacionamento social. Os filhos autistas não
costumam sorrir a partir do terceiro mês, como geralmente ocorre com todas as
crianças; têm pouca sensibilidade à dor; agem como se fossem surdos;
apresentam o olhar vago, ausente;não demonstram medo diante do perigo.
Apesar de todos esses sintomas, a criança
impressiona por um semblante que demonstra inteligência. Tanto pais quanto
médicos têm dificuldades em perceber a doença.
• Superdotação (Machado et al., 1989) - São aqueles que apresentam
excelente desempenho e elevada potencialidade em qualquer dos seguintes
aspectos ou em mais de um: capacidade intelectual, aptidão acadêmica
específica, pensamento criativo ou produtivo, capacidade de liderança, talento
68especial para artes, capacidade psicomotora, necessitando de atendimento
educacional adequado (MEC/SEE, 1993).
• Transtorno de Déficit de Atenção com Hiperatividade e/ou
Impulsividade – TDAHI (Santos, 1994; Sassaki, 1995) –
Uma constante agitação motora, a impulsividade e a impossibilidade de se
concentrar, seja em brincadeiras ou em atividades pedagógicas, as
dificuldades em seguir instruções,
realizar tarefas rotineiras, facilidade em perder objetos, distração, a fala
incessante e intrometimento nas conversas dos outros, entre outros, podem ser
sintomas de hiperatividade, que atinge de 3% a 6% de crianças em todo o
mundo.
“Os sintomas fazem parte de uma tríade: falta de atenção,
impulsividade e hiperatividade. Os componentes desse
tripé aparecem em maior ou menor grau e caracterizam os
três tipos de TDAH diagnosticados pelos médicos”, afirma
LUIZ CUSHNIR, psiquiatra e psicoterapeuta (Revista
EDUCAÇÃO abril/99, p.31).
É importante que o diagnóstico seja dado pelo médico neurologista, com dados
da escola, de casa e um histórico familiar para que não se confunda com
simples inquietações da infância. “O conceito moderno de hiperatividade
adotado é o de que há uma imaturidade de algumas áreas do Sistema Nervoso
Central”, afirma o médico neurologista e psiquiatra infantil Luiz Augusto Rhode
(COUTO, 1999, p. 32)
692.2.1- Avaliação Diagnóstica Interdisciplinar da leitura e
escrita
É importantíssimo identificar as formas de superação de barreiras à
aprendizagem. A avaliação classificatória não faz mais sentido, embora
continue a ser para muitos professores a prática mais comum. (KRAMER,
1995; CANDAU, 1995).
Segundo CORSINO (SALTO PARA O FUTURO, VOL1, p. 38, 1999),
“Para se fazer uma avaliação diagnóstica de leitura e
escrita e compreender como os alunos estão construindo
esse processo, é preciso considerar vários aspectos:
• O que os alunos já conhecem da língua escrita (o
que pensam e falam sobre ela);
• Quais são as suas concepções de leitura e escrita;
• Como percebem os usos e funções da língua escrita
(para quê? Para quem?);
• Que práticas fazem parte do seu cotidiano (o que
lêem? Como escrevem?);
• Como se apropriam dessas práticas (como lêem,
como escrevem?).”
Além disso, a aquisição da língua escrita depende do desenvolvimento
neuropsicomotor entre os 5 e 7 anos, que envolve, desde a independência de
ombro, braços e dedos, até uma integridade das funções psicológicas. Se ela é
privada de algum elemento importante ao seu desenvolvimento, seja carência
afetiva, alimentar, de linguagem ou de estímulos – visuais, auditivos, motores,
táteis, olfativos ou gustativos – sua aprendizagem será afetada e mais ainda se
houver ausência de estratégias do seu grupo social e da própria família.
(UNIVERSIDADE AUGUSTO MOTTA, p. 127, 2001)
70
CAPÍTULO IV
INTERVENÇÃO INTERDISCIPLINAR -
CONSTRUINDO PRÁTICAS INCLUSIVAS NA ESCOLA
“A diferença, interpretada como deficiência, pode servir
para que se façam diagnósticos das crianças,
medicalizando-se o fracasso escolar, patologizando-se o
que não é deficiência e sim posição na vida social,
singularidade, expressão de cultura, momento particular.”
MULTIEDUCAÇÃO (1996)
71
Na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional 9394, encontramos no
Artigo 13:
“Os docentes incumbir-se-ão de:
I- participar da elaboração da proposta
pedagógica do estabelecimento de ensino;
II- elaborar e cumprir plano de trabalho, segundo
a proposta pedagógica do estabelecimento de
ensino;
III- zelar pela aprendizagem dos alunos;
IV- estabelecer estratégias de recuperação para
os alunos de menor rendimento;
V- ministrar os dias letivos e horas-aula
estabelecidos, além de participar
integralmente dos períodos dedicados ao
planejamento, avaliação e ao
desenvolvimento profissional;
VI- colaborar com as atividades de articulação da
escola com as famílias e a comunidade.”
As incumbências do professor destacadas neste artigo, geralmente constam no
regimento interno das escolas particulares e nas escolas oficiais em
documentos administrativos.
A atualização e a produção de novas práticas de ensino somente surgem a
partir de uma reflexão partilhada entre os colegas educadores.
1 – A formação do educador
Segundo ASSIS (1992, p.4),
“É na relação com o “outro”, desde o nascimento que vão
se constituindo os papéis que a criança assume no diálogo
72(as formas culturais de responder à fala do outro), os
objetos do conhecimento (aquilo sobre o que se fala), e o
próprio uso da língua (a noção desta como veículo
comunicativo).”
Muitos são os desafios que são colocados à frente daqueles que devem ser os
animadores no processo educativo.
A construção da cidadania é o que importa no processo educativo. Hoje, o
aluno dispõe de inúmeros meios de aprendizagem (rádio, televisão, jornais,
revistas, internet), não necessitando, obrigatoriamente, ligar-se à figura do
professor. Mas há o lado da formação, algo intrinsecamente político, que
depende da qualidade do professor e do aluno. (AEC, 1996)
O professor não pode ser movido somente pela inteligência, mas também pela
emoção. Sem ela, como desempenhar, com alegria, uma tarefa desgastante,
muitas vezes, pouco compreendida pelos pais, autoridades e alunos
entediados?
Sua missão não é ser facilitador, mas animador.
Sendo o professor o agente responsável pela orientação do aluno na
construção do conhecimento e da cidadania, poderá ele agir para melhorar a
situação vigente. E, a partir do momento em que defendemos esta bandeira,
partilhamos da afirmação de que educar bem seja educar para o bem.
No entanto, pesquisas apontam que um grande número de profissionais da
área da educação, ou seja, o professor-educador, aquele que tem o papel de
mediador do ensino e organizador dos diálogos e discussões filosóficas,
encontra-se esgotado. (CANDAU, 1989)
Entre outras causas deste esgotamento, podemos destacar as seguintes:
• A crise de identidade do profissional da educação em face das novas e
crescentes demandas para o seu trabalho, cuja complexidade questiona os
“saberes” tradicionalmente válidos para o desempenho das funções de
professor;
73• A violência e a agressão nas escolas, tanto a alunos quanto a
professores e, ainda, em relação ao patrimônio coletivo, incompatíveis com a
ação de educar;
• A falta de relação entre os salários praticados pela grande maioria dos
estados e a relevância da função social do educador;
• O poder de compra dos trabalhadores em educação e o
comprometimento do salário em moradia, transporte, alimentação, saúde, etc.,
interferindo nas condições de vida e, conseqüentemente, nas atividades
profissionais. (REVISTA MUNDO JOVEM, 2000)
No ano de 2000, a Confederação Nacional dos trabalhadores em Educação
(CNTE) lançou o livro “Educação: carinho e trabalho”, cujo subtítulo comprova
uma preocupante tese: Burnout, a síndrome da desistência do educador, que
pode levar à falência da educação.
A exaustão emocional, despersonalização e falta de envolvimento pessoal no
trabalho são três sintomas desta síndrome. Pode-se dizer que há uma
desistência de quem ainda está na profissão. Encalacrado em uma situação de
trabalho que não pode suportar, mas de que também não pode desistir, o
trabalhador arma, inconscientemente, uma retirada psicológica, um modo de
abandonar o trabalho, apesar de continuar no posto.
A natureza da atividade de educar, embora socializadora, concentra nos
profissionais grande parte do conteúdo, do processo e da dinâmica de
trabalho. Por isso, é imperativo investir nos sujeitos responsáveis pela ação
transformadora da escola, tanto do ponto de vista do conhecimento quanto dos
valores e da cidadania. (SALTO PARA O FUTURO, 1999)
A doença que atinge, em diferentes níveis, uma grande parte da categoria tem
sérios reflexos sobre a educação, com decorrências muito sérias para os
alunos, para as comunidades escolares, enfim, para a sociedade.
Embora não ter tempo hábil para planejar, estudar e preparar aulas
interdisciplinares não sejam a principal razão para o professor dar aulas pouco
interessantes, os fatores disponibilidade e baixa remuneração não podem ser
considerados irrelevantes. Quantos professores correm de uma escola à outra
74diariamente, pois só assim conseguem ter um salário razoável e o mínimo de
dignidade. (REVISTA NOVA ESCOLA, 2003)
A desvalorização do profissional de educação decorrentes de uma política de
descaso obriga esse profissional a verdadeiras maratonas, o que prejudica,
sem dúvida nenhuma, a preparação de aulas, seu desempenho junto ao aluno,
a relação com os colegas de trabalho, a avaliação do trabalho pedagógico, etc.
Por outro lado, tornar a escola um lugar onde o aluno seja orientado a
questionar, procurar respostas para problemas, estimulado a buscar soluções
para situações concretas, depende de recursos apropriados. Não bastam uma
sala com carteiras, quadro, “cuspe e giz”. Precisamos de recursos materiais e
humanos, educadores com remuneração e condições de trabalho adequadas
ao exercício pleno da profissão, que estejam sempre buscando atualização
para fazerem o melhor que puderem.
Se com tudo isso, o profissional persiste numa prática medíocre e alienada,
parece-me tratar de falta de ética profissional. PAULO FREIRE, 1998)
2 - A equipe
Os recursos para uma intervenção interdisciplinar podem ser oferecidos em
centros de detecção, diagnóstico e intervenção precoces ou em programas
multifocais como os que se referem à saúde e à educação infantil.
Os profissionais buscam uma linha de ação mais preventiva, visando evitar a
deficiência, minimizá-la ou prevenir suas conseqüências. VAZ (1999), ressalta
que o grande desafio é ajudar a criança a ser um ser humano capaz de
participar como puder, da construção do futuro, possibilitando no hoje que ela
faça suas escolhas.
Mais de 50% das crianças com deficiência poderiam chegar a um
desenvolvimento normal se lhes fossem aplicadas medidas preventivas.
(PÉREZ-RAMOS, 1996).
O sucesso deste trabalho depende das ações interdisciplinares dos
profissionais da área de reabilitação, saúde e educação que buscam juntos
75oferecer programas preventivos e terapêuticos, respeitada a especificidade
de cada um (VAZ, 1999; MAIA,1999).
PÉREZ RAMOS (1992, p.26) esclarece quais os profissionais que comumente
fazem parte da equipe interdisciplinar:
“Além dos especialistas sobejamente conhecidos que
fazem parte desta equipe (psicólogos, assistentes sociais e
médicos - em suas especialidades de neonatologia,
pediatria, oftalmologia, etc), inclui-se a participação de
outros, (fonoaudiólogos, educadores de primeira infância,
psicopedagogos, visitadores domiciliares, fisioterapeutas,
terapeutas ocupacionais e enfermeiros de saúde pública)
como também dos próprios pais das crianças atendidas,
que atuam mais diretamente nos programas de
intervenção, seja no lar, no próprio serviço ou nos recursos
de atendimento geral da comunidade. Ao lado da atuação
dessas equipes, os programas destacam a importância do
trabalho de voluntários.”
3 – Estratégias
PÉREZ-RAMOS (1992) apresenta, a partir das idéias básicas sobre o
desenvolvimento infantil, uma série de estratégias, entre as quais destacamos:
a) quanto à área de desenvolvimento físico
• Propiciar à criança condições de alimentação adequada e variada:
• Orientá-la quanto aos hábitos de higiene pessoal e zelar para que o
ambiente no qual ela vive esteja limpo, despoluído e iluminado;
• Facilitar à criança recursos de prevenção contra doenças.
b) quanto à área de desenvolvimento motor
• Possibilitar à criança o uso diferenciado dos reflexos funcionais através
das mãos e dedos, chupeta, mamadeira, pedaço de pano, etc;
76• Criar condições para que ela possa movimentar-se de várias
maneiras, vestindo-lhe roupas confortáveis, deixando que ela veja
objetos brilhantes, de diferentes formas cores e texturas e tente pegá-
los, exercitando braços e pernas com exercícios suaves e graduados;
• Facilitar-lhe materiais que desenvolva a coordenação motora fina, como
o recorte e colagem, o desenho, encaixe e construção de blocos;
• Através da música, facilitar o desenvolvimento do esquema corporal e a
lateralidade;
• Proporcionar-lhe oportunidades durante o banho, de desenvolver
• movimentos espontâneos como dar voltas, tocar os pés, olhar as mãos.
c) quanto à área do desenvolvimento cognitivo
• Durante as situações de vida diária, exercitar os reflexos funcionais e
permitir ao bebê fazer contatos onde ele possa seguir os movimentos
dos adultos;
• Facilitar à criança a brincar com objetos repetidamente, primeiramente
em forma causal, e posteriormente com intenção e a relação de causa e
efeito;
• Através de brincadeiras como esconde-esconde, proporcionar-lhe
situações para que busque objetos;
• movimentos espontâneos como dar voltas, tocar os pés, olhar as mãos.
d) quanto à área do desenvolvimento cognitivo
• Durante as situações de vida diária, exercitar os reflexos funcionais e
permitir ao bebê fazer contatos onde ele possa seguir os movimentos
dos adultos;
• Facilitar a criança em brincar com objetos repetidamente, primeiramente
em forma causal, e posteriormente com intenção e a relação de causa e
efeito;
• Através de brincadeiras como esconde-esconde, proporcionar-lhe
situações para que busque objetos;
• Facilitar-lhe experiências com diferentes dimensões espaciais (caixa de
encaixe, casa de boneca para brincar no seu interior, bola para rodar e
seguir sua trajetória, etc);
77• Permitir que a criança dramatize situações e personagens familiares e
outros, provendo-lhe materiais e roupas;
• Possibilitar-lhe o uso de revistas, massa de modelar, lápis de cera,
papel, etc., de forma a desenvolver a função simbólica;
• Trabalhar os conceitos de causalidade, espaço, tempo e número,
através de relatos passados e encenação dos mesmos, elaboração de
perguntas e respostas etc.;
• Facilitar a socialização através de jogos, carrinhos, bonecas, etc.
• Intervenção educativa, programada e sistemática para os alunos que
apresentam necessidades educativas especiais, quer a nível curricular,
quer sob a forma de aprender e/ou de ensinar (METTRAU, 1999).
e) quanto à área da linguagem
• Aproveitar as situações de rotina (alimentação, banho, troca de fraldas,
etc.) para dialogar com a criança, reforçando assim o vínculo afetivo e
estimulando sua vocalização;
• Realizar gesticulações e estimular a criança a imitá-las;
• Contar estórias que permitam à criança identificar papéis;
• Usar vocabulários simples ou compreensíveis pela criança.
f) quanto à área do desenvolvimento sócio-emocional
• Incentivar a criança a demonstrar satisfação ou desagrado;
• Através do contato rosto a rosto, consolidar o vínculo de dar e receber;
• Proporcionar-lhe condições para desenvolver comportamentos mais
independentes, como alimentar-se e vestir-se sozinha;
• Aproveitar os momentos da rotina para desenvolver a cooperação.
784 - Os desafios de um currículo sociointeracionista
Foi realizada a Conferência Mundial sobre Educação para Todos, na Tailândia,
em 1990, “defendendo a universalização do acesso, promoção da igualdade,
ampliação dos meios e conteúdos da Educação Básica e melhoria do ambiente
de estudo”.(BENCINI, 2001, p. 38)
O Estatuto da Criança e do Adolescente de 1990, Lei brasileira nº 8069/90,
reforça a Constituição de 1988, no que tange à educação inclusiva na rede
regular de ensino.
Em junho de 1994, foi realizado um encontro na Espanha com a participação
de representantes de instituições governamentais e não governamentais do
mundo inteiro, mais de oitenta países, e nessa reunião foi elaborada e
aprovada a DECLARAÇAO DE SALAMANCA, um dos mais importantes
documentos de compromisso de garantia de direitos educacionais. Segundo
ARANHA(2001), ela proclama as escolas regulares inclusivas como o meio
mais eficaz de combate à discriminação e ao desrespeito às diferenças. Além
disso, “ determina que todas as escolas devem acolher a todas as crianças,
independentemente de suas condições físicas, intelectuais, sociais, emocionais
ou lingüísticas” (BENCINI, 2001).
SOUZA (2000) ressalta que está previsto neste documento, entre outras
coisas, a inclusão de pessoas que necessitam de atenção especial na área
educacional e as adaptações sociais para que seja garantido o acesso dessas
pessoas aos bens e serviços, inclusive aqueles oferecidos nas escolas de
ensino regular. Tal se verifica nos seguintes trechos da Declaração:
“Durante os últimos 15 ou 20 anos, tornou-se claro que o
conceito de educação relativa a necessidades especiais
teve que ser ampliado para incluir todas as crianças que,
por quaisquer motivos, não estivessem se beneficiando da
escolarização.
79Além das crianças com deficiências e incapacidades que
são impedidas de freqüentar suas escolas locais, existem
milhões de outras que:
experimentam dificuldades temporárias ou permanentes na
escola;
não apresentam interesse ou motivação em aprender;
• completam apenas um ou dois anos da educação primária
e são forçadas a repetir de ano;
são forçadas a trabalhar;
vivem nas ruas;
moram muito longe de qualquer escola;
moram em condições extremas de pobreza ou sofrem de
má nutrição crônica;
são vítimas de guerras e conflitos armados;
sofrem de contínuos abusos físicos, emocionais e sexuais,
ou
simplesmente não freqüentam a escola, seja qual for o
motivo”.
Tomando como base o documento acima, pode-se afirmar que todo aluno que
necessitou ou necessita, em qualquer período de sua vida, de meios especiais
para o seu pleno desenvolvimento, foi ou é um aluno com necessidades
educativas especiais.
A prática da inclusão nas escolas acontece principalmente, a partir da
sensibilidade dos profissionais de educação, de observar as necessidades de
apoio e as potencialidades de cada um dos educandos, na opinião de
SANTOS (2000). A autora ainda ressalta que as instituições educacionais
devem providenciar a remoção dos obstáculos à aprendizagem através de
estratégias à luz de princípios humanistas e democráticos, “como o da
igualdade de valor e direitos entre seres humanos” (p. 160).
Na maioria dos serviços educacionais ainda existem muitas dúvidas quanto às
estratégias a serem adotadas na prática da inclusão.
80Segundo SOUZA (2000), um exemplo de atividade estimuladora que
favorece o desenvolvimento das potencialidades e habilidades individuais
segundo princípios inclusivistas é o brincar. No entanto, a autora ressalta que
apesar de tão importantes, são poucos os brinquedos industrializados
adaptados para este fim; e sugere:
“(...) é necessário uma reflexão a respeito da adaptação
dessas atividades lúdicas entre elas, brinquedos, jogos,
brincadeiras populares e brinquedotecas como suporte de
uma sociedade que facilite a inclusão de todas as crianças,
respeitando suas diferenças e possibilitando a diminuição
de preconceitos que impedem os relacionamentos
saudáveis” (p.175).
O que nos parece de fundamental importância é que quando as crianças estão
em grupos desenvolvem habilidades sociais como a cooperação, a participação
na busca de soluções, zelo pelo outro, enfim, em companhia dos colegas,
desenvolvem-se atitudes de solidariedade, da verdadeira liberdade e do
respeito às diferenças.
Sobre este aspecto, METTRAU (1999) afirma “que as relações do cotidiano
podem vir a favorecer ou não o desenvolvimento de potencialidades”
(ANPED,22ª reunião anual), e que a oportunidade de compartilhar as
habilidades que cada um tem é um exercício de cidadania que favorece a
inclusão.
KRAMER (1991, p. 38), em sua proposta pedagógica para Educação Infantil,
destaca alguns princípios metodológicos que nos parece estimular o
desenvolvimento infantil segundo os princípios inclusivistas, embora ela não
tenha feito referências diretas às praticas escolares inclusivas. São os
seguintes:
“- Tomar a realidade das crianças como ponto de partida
para o trabalho, reconhecendo sua diversidade;
81- Observar as ações infantis e as interações entre as
crianças, valorizando essas atividades;
- Confiar nas possibilidades que todas as crianças têm de
se desenvolver e aprender, promovendo a construção de
sua auto-imagem positiva;
- Propor atividades com sentido, reais e desafiadoras para
as crianças, que sejam, pois, simultaneamente
significativas e prazerosas, incentivando sempre a
descoberta, a criatividade e a criticidade;
- Favorecer a ampliação do processo de construção dos
conhecimentos, valorizando o acesso aos conhecimentos
do mundo físico e social;
- Enfatizar a participação e a ajuda mútua, possibilitando a
construção da autonomia e da cooperação.”
Conforme análise de defensores da educação inclusiva, a falta de recursos da
sociedade para receber todas as pessoas começa na escola, que ainda não
está preparada para receber e assistir todas as crianças. Para isso, sugerem
capacitação dos professores, adequação do material pedagógico, entre outras
medidas (MARTINO,1999).
Segundo a jornalista Cláudia Werneck, é necessário que as crianças cresçam
acostumando-se com as diferenças e aprendendo a respeitá-las. E que
ninguém torna-se defensor de uma sociedade sem preconceitos de uma hora
para outra. Daí, a importância de que o currículo da Educação Infantil tenha
uma organização e uma metodologia que possibilite desenvolver a cultura da
solidariedade, do respeito e valorização das diferenças, desde
cedo.(MARTINO, 1999)
MANTOAN (1997) descreve sobre a verdadeira inclusão escolar:
“a inclusão questiona não somente as políticas e a
organização da educação especial e regular, mas também
o conceito de mainstreaming. A noção de inclusão institui a
82inserção de uma forma mais radical, completa e
sistemática. O vocábulo integração é abandonado, uma vez
que o objetivo é incluir um aluno ou um grupo de alunos
que já foram anteriormente excluídos; a meta primordial da
inclusão é a de não deixar ninguém no exterior do ensino
regular, desde o começo. As escolas inclusivas propõem
um modo de se constituir o sistema educacional que
considera as necessidades de todos os alunos e que é
estruturado em virtude dessas necessidades. A inclusão
causa uma mudança de perspectiva educacional, pois não
se limita a ajudar somente os alunos que apresentam
dificuldades na escola, mas apóia a todos: professores,
alunos, pessoal administrativo, para que obtenham sucesso
na corrente educativa geral.”
5 - Atitudes inclusivas no contexto educacional
Este tópico e seu sub-tópico foram elaborados a partir de SASSAKI (1997),
MULTIEDUCAÇÃO (1996) e HOFFMANN (1996).
O professor ensina a todos os alunos - em escolas inclusivas, o
professor tem a responsabilidade de educar tanto as crianças
sem deficiências como aquelas com deficiência. Tem também a
responsabilidade de assegurar que o aluno deficiente seja um
membro integrante e valorizado da sala de aula;
Currículo adequadamente adaptado – Educação Inclusiva
significa que os alunos com deficiência estão sendo ensinados no
mesmo contexto curricular e instrucional com os demais colegas
de sala de aula. Materiais curriculares comuns podem precisar ser
adaptados, mas somente até o nível necessário para satisfazer as
necessidades de aprendizagem de qualquer aluno;
83 Colaboração entre professores e outros profissionais – A
tendência para uma maior colaboração e apoio mútuo entre
professores e a preferência dos terapeutas e consultores em
oferecer apoio na própria sala de aula;
Nos programas de alfabetização, os seguintes métodos são
considerados eficientes: redação de experiências com
linguagem, histórias e outros textos sobre temas que o aprendiz
conhece, alfabetização assistida por computador, material
disponível no cotidiano do público, leitura assistida ou parada
usando livros convencionais e livros falados, debate após
atividade extra-classe, coleção de histórias de vida dos próprios
alunos, uso da lousa para escrever um texto em grupo, colagem
com recortes de revistas, entre outros;
O professor estimula outras pessoas importantes na vida do aluno
a se envolverem com o processo educativo.
As famílias são reconhecidas pela escola como parceiros plenos
junto à equipe escolar.
5.1- Avaliação das práticas escolares
Ü Individualizamos o programa instrucional para todos os alunos e
oferecemos os recursos que cada aluno necessita para explorar
interesses individuais no ambiente escolar?
Ü Nossos professores comuns e educadores especiais já integraram seus
esforços e seus recursos de tal forma que eles possam trabalhar juntos
como parte integrante de uma equipe unificada?
Ü Estamos preparados para modificar os sistemas de apoio para os alunos
de tal forma que eles possam atingir e experienciar sucessos e sentirem
que verdadeiramente pertencem à sua escola e à sua sala de aula?
Ü Damos aos alunos o currículo escolar pleno na medida de suas
capacidades e modificamos esse currículo na medida do necessário
84para que eles possam partilhar elementos destas experiências com
seus colegas?
Ao finalizar este último capítulo, podemos afirmar que o reconhecimento da
necessidade de buscar a capacitação das escolas comuns para atender a
todos os alunos, em seus diferentes ritmos de aprendizagem, constitui-se num
grande desafio. Os currículos apropriados, as mudanças organizacionais, as
estratégias de ensino, o uso de recursos e a parceria com outros setores da
comunidade são algumas das muitas alternativas possíveis que devem ser
debatidas nas escolas, com todos os membros da comunidade educativa.
85CONCLUSÃO
Consideramos ter atingindo com esta pesquisa monográfica o objetivo proposto
inicialmente: demonstrar a importância do diagnóstico e intervenção
interdisciplinares na alfabetização num currículo sociointeracionista, seja
através de currículos, metodologias e recursos estimuladores na esfera
educacional, seja pela orientação familiar ou encaminhamento e parceria com
outros profissionais.
Na verdade, na forma como as escolas encontram-se estruturadas ainda hoje,
o caminho mais curto e fácil é o de simplesmente separar as crianças com
necessidades especiais, inclusive as educativas.
Devido à complexidade das questões educativas como a diversidade dos
educandos, problemas familiares, morais, sociais e econômicos, temos de
repensar vários aspectos da profissão de educador.
É no espaço concreto de cada escola, em torno de problemas pedagógicos ou
educativos reais que o professor deve participar na elaboração e execução de
projetos político-pedagógicos e nos momentos interdisciplinares de trabalho
que facilitem a aprendizagem do aluno.
Portanto, isso não depende só de cada um dos educadores, mas da
possibilidade de uma partilha efetiva para a construção de culturas de
cooperação e parceria.
Dois requisitos imprescindíveis para que o processo educativo se dê com o
prazer do aluno é que o professor “goste do que faz” e se empenhe numa
prática inter, intra e multidisciplinar.
Ouso afirmar que a Inclusão Social, em geral, e a Escolar, em particular,
dependem, em grande parte, do diagnóstico e intervenção interdisciplinares.
Não estou referindo-me apenas aos serviços oferecidos em centros, clínicas
ou escolas de Educação Infantil, mas a garantia de direitos iguais desde a
maternidade, na família, na escola, na sociedade.
Perceber que no campo da prevenção, nossos esforços não têm sido
suficientes para evitar o aparecimento de deficiências, fracasso e evasão
escolares, e que, por medidas simples, muitos destes problemas poderiam ser
86evitados, motiva-me a ampliar meu trabalho na escola pública como
educadora, junto às crianças e adolescentes, como também no convívio com
as famílias da comunidade educativa.
Espero que os estudos realizados durante esta monografia e aqueles
propostos durante o Curso de Pós-Graduação em Administração Escolar,
possam efetivamente renovar minha prática social e educativa.
“Há uma relação entre a alegria, necessária à
atividade educativa, e a esperança. A esperança
de que professor e aluno, juntos, podemos
aprender, ensinar, inquietar-nos, produzir e juntos
igualmente resistir aos obstáculos à nossa alegria.” Paulo Freire (Pedagogia da Autonomia, p. 80)
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____Ninguém mais vai ser bonzinho na sociedade inclusiva. Rio de
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98ÍNDICE
FOLHA DE ROSTO 2AGRADECIMENTOS 3DEDICATÓRIA 4RESUMO 5METODOLOGIA 6SUMÁRIO 7INTRODUÇÃO 8
CAPÍTULO I - A SOCIEDADE BRASILEIRA E A EDUCAÇÃO – DA ELITIZAÇÃO À INCLUSÃO SOCIAL
10
1- ANTES DE 1900 122- CRISE DA EDUCAÇÃO ELITISTA – 1920 152.1- OS IDEAIS REPUBLICANOS E A REALIDADE 163- A EDUCAÇÃO NO BRASIL- 1930-1970 163.1- A LUTA PELA ESCOLA PÚBLICA 173.2- A EDUCAÇÃO PÚBLICA BRASILEIRA DESDE A REFORMA DE 1971 ATÉ HOJE 21
4- INCLUSÃO SOCIAL E INCLUSÃO ESCOLAR 234.1- CONCEITOS INCLUSIVISTAS 254.1.1- AUTONOMIA 264.1.2- INDEPENDÊNCIA 264.1.3- EQUIPARAÇÃO DE OPORTUNIDADES 274.1.4- REJEIÇÃO ZERO 284.1.5- VIDA INDEPENDENTE 285- INTEGRAÇÃO & INCLUSÃO 29
CAPÍTULO II - O EDUCANDO EM PROCESSO DE ALFABETIZAÇÃO 36
1- TEORIAS DO DESENVOLVIMENTO HUMANO 391.1- TEORIA INATISTA 401.2- TEORIA AMBIENTALISTA 411.3- TEORIA INTERACIONISTA 421.3.1- ÁREAS DO DESENVOLVIMENTO INFANTIL 431.4- TEORIA SOCIOINTERACIONISTA 471.4.1- A CONSTRUÇÃO DO CONHECIMENTO SEGUNDO VYGOTSKY 481.4.2- A LINGUAGEM COMO MEDIADORA DA INTERAÇÃO SOCIAL 502- COMPONENTES DO SISTEMA DA LINGUAGEM ESCRITA 502.1- A FUNÇÃO SOCIAL DA LEITURA E ESCRITA 51
CAPÍTULO III – AVALIAÇÃO DIAGNÓSTICA INTERDISCIPLINAR:
LIMITAÇÕES PROFISSIONAIS E POSSIBILIDADES DE INTERAÇÃO 53
1- CONCEITUAÇÃO 542- UTILIDADE PRÁTICA DO DIAGNÓSTICO INTERDISCIPLINAR 56
992.1- INTERVENÇÃO TERAPÊUTICA 592.1.1- PREVENÇÃO, DETECÇÃO E DIAGNÓSTICO 602.1.2- PROGRAMAS DE INTERVENÇÃO PRECOCE 612.2- INTERVENÇÃO PEDAGÓGICA: ROMPENDO BARREIRAS À
APRENDIZAGEM 64
2.2.1- AVALIAÇÃO DIAGNÓSTICA INTERDISCIPLINAR DA LEITURA E
ESCRITA
69
CAPÍTULO IV
INTERVENÇÃO INTERDISCIPLINAR – CONSTRUINDO PRÁTICAS
INCLUSIVAS NA ESCOLA
70
1- A FORMAÇÃO DO EDUCADOR 712- A EQUIPE 743- ESTRATÉGIAS 754- OS DESAFIOS DE UM CURRÍCULO SOCIOINTERACIONISTA 785- ATITUDES INCLUSIVAS NO CONTEXTO EDUCACIONAL 825.1- AVALIAÇÃO DAS PRÁTICAS ESCOLARES
83
CONCLUSÃO
85
BIBLIOGRAFIA
87
ÍNDICE
98
FOLHA DE AVALIAÇÃO 100
100FOLHA DE AVALIAÇÃO
UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” ADMINISTRAÇÃO ESCOLAR
TEMA DA MONOGRAFIA: A importância da avaliação diagnóstica e intervenção interdisciplinares na alfabetização num currículo sociointeracionista Data da entrega:_________________________________________ Auto-Avaliação: Como você avaliaria esta pesquisa monográfica? _________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ . Avaliado por: __________________________________ Grau_____ _________________, ____ de ____________de ______
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