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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PRÓ-REITORIA DE PLANEJAMENTO E DESENVOLVIMENTO
DIRETORIA DE PROJETOS ESPECIAIS
PROJETO A VEZ DO MESTRE
GERENCIAMENTO ESCOLAR:
UMA PROPOSTA PARA UMA BOA ORGANIZAÇÃO NO SÉCULO XXI
DANIELA VIEIRA DE ALMEIDA
ORIENTADOR:
Prof. Carlos Alberto Cereja
CO-ORIENTADOR:
Prof.ª Mary Sue Pereira Carvalho
Rio de Janeiro, Abr./2002
1
UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PRÓ-REITORIA DE PLANEJAMENTO E DESENVOLVIMENTO
DIRETORIA DE PROJETOS ESPECIAIS
PROJETO A VEZ DO MESTRE
GERENCIAMENTO ESCOLAR:
UMA PROPOSTA PARA UMA BOA ORGANIZAÇÃO NO SÉCULO XXI
DANIELA VIEIRA DE ALMEIDA
Apresentação de monografia ao Conjunto Universitário
Cândido Mendes como condição prévia para a
conclusão do Curso de Pós-Graduação “Lato Sensu” em
Docência do Ensino Médio e Fundamental.
Rio de Janeiro, Abr./2002
2
A Deus, por sua fidelidade; aos meus pais, Célio e
Beth, pela dedicação e amor; e, aos meus irmãos
Jeane e Alessandro, que me estimularam ao
sucesso.
3
Dedico esta monografia ao Leandro, por me fazer
feliz, com seu companheirismo; aos meus amigos,
Sylvia Cristina, Carlos Frederico, Nersetite e
Sandra pela ajuda, incentivo e participação ativa
nesta conquista.
4
RESUMO
A discussão sobre o gerenciamento mostra-se relevante à medida em que se observa,
no âmbito escolar, uma práxis autoritária e conservadora, voltada apenas para a parte
burocrática-administrativa e colocando em segundo plano a ação progressista, participativa,
que busque uma ação transformadora no cotidiano escolar e o embricamento de todos os
envolvidos no processo educacional. Nesse aspecto, a presente pesquisa visa discutir as
principais questões relacionadas a implantação de um gerenciamento, como também a função
do administrador dentro desse novo modelo organizacional.
5
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ............................................................................................................. 06 CAPÍTULO I - A FUNÇÃO DO GERENCIAMENTO ESCOLAR NO PROCESSO PEDAGÓGICO ........................................................................................ 08 1.1 A Organização burocrática da escola ...................................................................... 11 1.2 A questão da liderança ............................................................................................. 14 1.3 Estratégias de ação .................................................................................................. 15 1.4 Gerenciamento e eficácia escolar ............................................................................ 19 CAPÍTULO II - O GERENCIAMENTO VISANDO A QUALIDADE DO ENSINO 21 CAPÍTULO III - O GERENCIAMENTO NO ENFOQUE DA GESTÃO PARTICIPATIVA ......................................................................................................... 26 3.1 O conceito de gestão participativa ........................................................................... 26 3.2 O envolvimento com a gestão participativa ............................................................ 29 CONCLUSÃO ............................................................................................................... 36 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .......................................................................... 38 ANEXOS ....................................................................................................................... 39
6
INTRODUÇÃO
Até os dias atuais muito se discute a respeito da administração na área escolar, na
busca de um profissional permeado por objetivos claros, que possam determinar uma atuação
mais direcionada.
Pode-se dizer que uma nova trajetória vem sendo traçada na administração escolar
brasileira; muitas mudanças estão ocorrendo, orientadas talvez, pela própria prática
profissional, direcionadas à descoberta de novos rumos na atuação.
A administração escolar é uma área desconhecida pelos profissionais de educação no
Brasil, sejam eles professores, diretores, "burocratas das delegacias de ensino" ou estudantes
de pedagogia que atuam sob um olhar ultrapassado e restrito no que se refere ao que pode ser
desenvolvido pelos supervisores escolares. A expectativa que se tem sobre os serviços que um
administrador pode prestar, volta-se para a psicologia, ou seja, restringe-se ao atendimento do
aluno problema, na tentativa de diagnosticar e modificar comportamentos considerados
inadequados.
Diante de tantos questionamentos não fica difícil imaginar quão conturbada e nebulosa
se faz a atuação deste profissional que ainda procura respostas e modelos teórico-práticos que
embasem seu trabalho. O que acontece, na maioria das vezes, é que o profissional não
consegue desvincular-se das expectativas sobre seu desempenho.
Refletindo em torno destas questões, pode-se apontar alguns dos motivos que
colaboram para as dificuldades profissionais encontradas pelos supervisores, como a falta de
identidade profissional, a formação acadêmica e a realidade educacional brasileira que conta
7
com escolas, principalmente as de rede pública, que ainda não trabalham seguindo diretrizes
comuns, padronizadas e integradas entre si.
Frente às duvidas e despreparos que o supervisor enfrenta em sua atuação, este depara-
se ainda com sua própria inadequação em determinados contextos. A influência de modelos
internacionais também se faz significativa em relação às dificuldades de atuação e na imagem
do papel profissional. Os parâmetros para atuação são comumente procurados dentro de um
âmbito internacional a fim de propiciar um modelo mais amplo e adequado de intervenção
que acaba na implantação destes modelos que, com freqüência, não se adaptam ao contexto e
à realidade das escolas brasileiras, resultando na obtenção de resultados pouco eficientes,
contribuindo para o descrédito e inadequabilidade profissional.
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CAPÍTULO I
A FUNÇÃO DO GERENCIAMENTO ESCOLAR NO PROCESSO PEDAGÓGICO
A princípio, deve-se ressaltar o que se entende como processo pedagógico, para que se
possa situar a exata necessidade da direção escolar dentro desse processo.
O que é processo pedagógico?
Implica tudo o que estiver relacionado com o planejamento escolar, em busca de
objetivos que visem exclusivamente partes positivas em função da educação dos alunos. Por
exemplo: a metodologia usada para o ensino, que demonstra qual a filosofia educacional, na
qual a escola se baseia no desenvolvimento do processo ensino-aprendizagem: a participação
e articulação da família na vida escolar dos alunos; a promoção de reuniões de responsáveis,
conselho de classe além de outras extraordinárias sempre que houver necessidades à causa da
educação; as questões disciplinares na escola; a criação de metas viáveis para a solução de
problemas de aprendizagem; critério de avaliação bem como o resultado da mesma.
Cabe ao administrador escolar estar aliado a essas questões, de modo que o processo
pedagógico da escola aconteça de forma eficaz, fazendo, assim, com que ele desempenhe suas
funções sem se esquecer que também é, antes de tudo, um educador.
Sabe-se que o processo de atuação da administração escolar se envolve com ações
meramente burocráticas, ou seja: levantamentos e fornecimento de dados estatísticos do
rendimento geral dos alunos; informações sobre o pessoal que atua na escola: dados de
entrada e gastos de merenda e outros materiais necessários à escola (luz, água, telefone). Isto
pode fazer do diretor, que é um educador, o elemento mais distante da educação, tornando-se
9
não reais um profissional voltado para a educação. Esse educador passa a ser somente um
administrador burocratizado, um profissional da educação mergulhado em documentos atrás
de uma mesa, funcionando, quase que exclusivamente para atender às exigências burocráticas
do sistema.
Se a administração escolar for compromissada com o processo educacional, esse
profissional deixaria parte dessas atribuições burocráticas; que são necessárias, nas mãos de
outros elementos auxiliares escolares, e passaria a se dedicar também ao processo pedagógico
da escola.
Por exemplo, para se ser um bom diretor, é preciso ser-se também, um educador
capaz, não apenas, conhecendo os pormenores da organização e da administração escolar,
mas, também, possuindo um racional Filosofia do processo educativo, que lhe compete
orientar ... como administrador, deverá possuir tal capacidade, que não possa ser bem
substituído, em sua função por nenhum dos professores.
Acredita-se que o bom administrador é aquele que sabe participar do projeto da escola,
aquele que se propõe a conhecer a filosofia educacional da mesma, colocando-se no trabalho
de equipe, segundo Silva “é preciso acreditar que as mudanças são possíveis e podem
ocorrer mediante uma ação coletiva e democrática”.
As atribuições democráticas da administração são necessárias e portanto não podem
ser esquecidas dentro da unidade escolar. As demais podem ser redistribuídas a outros
profissionais, com os que atuam na secretária da escola que estariam comprometidos em
ajudar o administrador nessas funções burocráticas, proporcionando ao mesmo ter um tempo
necessário para participar das questões pedagógicas, apesar de saber-se das muitas
dificuldades que existem, para que assim se proceda, dentro da escola.
Na prática, pode-se observar, o porquê da administração escolar estar voltada quase
que exclusivamente para atender às necessidades do sistema. Muitos diretores, perdidos nas
solicitações dessa rotina, vão simplesmente esperando que tudo isso mude, sem implantar um
mecanismo próprio para que a burocracia não seja a única a ocupar o seu tempo, dentro da
escola.
10
Muitos problemas surgidos na escola ocorrem devido à ausência da participação do
administrador escolar, principalmente os problemas pedagógicos. Observa-se, com isso, a
decadência do sistema educacional em todos os ângulos do sistema. Faz-se necessário se ter
um diretor que conheça as funções, as inter-relações e as inclusões da educação.
O ideal seria que o administrador realizasse um trabalho de equipe. Sem esquecer, é
claro, as suas atribuições, sendo democrático, no sentido em que permitisse que todos os
elementos envolvidos na escola pudessem participar, baseado no conceito da gestão
participativa.
A competência exigida ao administrador da educação, mostra-se muito difícil de
alcançar, frente à pluralidade de atividades que o mesmo deve realizar. Esse profissional é um
educador e um administrador quase que ao mesmo tempo, devendo atender às questões
pedagógicas e, paralelamente, às exigências burocráticas. Para que o administrador consiga se
movimentar nesse duplo caminho, deve ser competente o suficiente para realizar uma direção
onde, não somente irá liderar o grupo, mas se propor a trabalhar junto ao grupo,
envolvendo-se profissionalmente com a equipe docente e não docente da escola.
O administrador da educação, também deverá funcionar como um articulador entre a
comunidade e a escola, com a finalidade de criar um elo de cooperação entre elas.
Cabe ao administrador o compromisso e a boa vontade em mudar o que não estiver
atendendo à causa da educação, que inclui a formação do cidadão capaz de participar e,
possivelmente, colaborar na transformação do meio social em que vive. Para tanto é preciso
ao administrador da educação possuir, entre outras, três características necessárias:
competência, disposição e o compromisso com a educação.
A administração escolar deve estar preparada para realizar, junto ao grupo, o projeto
pedagógico da escola, sendo este, um trabalho que tenha por objetivo, dinamizar o processo
de transformação social. Para isso o diretor escolar, precisa ser um cidadão capacitado,
esclarecido em relação à realidade da comunidade à qual a escola está inserida e ser
consciente de seu papel como educador.
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A preparação, o interesse, a vontade de fazer a mudança social são aspectos exigidos
no perfil do administrador da educação. A realização de um trabalho de equipe e a mediação
que esse administrador pode realizar dentro da participação educacional dos alunos, são
relevantes para que a escola atinja seus objetivos - que visa o cidadão dentro de uma
sociedade mais justa.
Aqueles que se propõem a assumir a direção de uma escola devem estar conscientes
do relevante papel a que essa função se destina. Administrar com o grupo, pais, alunos,
comunidade, professores, pessoal de secretaria e pessoal de apoio da escola, sempre será a
melhor opção de um diretor escolar.
A administração está voltada para o fazer da educação, junto e em luta com a prática,
na realidade do dia-a-dia da escola. O diretor tem por básico, na sua atuação, a de colaborador
para a conquista de uma educação relevante da maioria, conquistando isso, com o trabalho
consciente e comprometido, integrando todas as forças atuantes dentro da escola.
Segundo Wiltmann & Cardoso (citados por Marcelino, 1994)
A prática administrativa do sistema de ensino e sua forma organizacional apresenta, hoje uma grande complexidade da função básica do administrador escolar. Essa passa pelo compromisso sócio-político que impulsiona a prática educativa para torná-la democrática e pelo compromisso educativo pedagógico, que articula escola-comunidade, verificando-se que a teoria na prática garanta a socialização do saber e da cultura ... Nesse contexto, a administração escolar é elemento qualificado, dinâmico, vivificante do processo educacional.
1.1 A Organização burocrática da escola
Segundo Perrow (citado por Leito, 1987) a dinâmica da organização se expressa
através da burocracia que ela desenvolve e que irá se refletir em sua estrutura.
A burocracia não lida diretamente com os objetos de trabalho; seu papel é organizar e
sobretudo controlar a execução do trabalho. Como toda organização burocrática, a escola é
organizada para atingir certos objetivos definidos pela cúpula do sistema hierárquico.
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O uso da categorização como técnica de processo decisório é, na unidade escolar, uma
conseqüência da confiabilidade de comportamento. Por essa razão, as decisões do diretor de
escola se situam mais ao nível de gerência do que ao nível técnico ou institucional, pois as
decisões fundamentais já foram tomadas na cúpula. Por ser a escola uma organização
essencialmente de característica normativa apresenta um alto grau de identificação intra
grupo; assim, toda a sua processualística é incorporada internalizada pelo professor, que se
torna um reprodutor do próprio processo que o formou e das relações entre superiores e
subordinados. A obediência a ordens e normas emanadas do poder central gera, na escola, não
só novos tipos de comportamentos para os que as questionam e discutem, como também uma
certa rigidez de comportamento, que leva a uma internalização das diretivas da escola; as
normas que se constituem em meios do processo educativo, passam a ter um valor único,
constituindo-se nos próprios objetivos da escola. Para Lapassade (citado por Paro, 1997), o
deslocamento de objetivos, provocado pelas normas burocráticas, acaba alienando o professor
e tirando-lhe o poder de decisão.
O enquadramento rigoroso dos casos concretos em categorias simples, sem qualquer
consideração a características específicas da unidade escolar, empobrece o próprio processo
educativo, contribuindo para sua falta de produtividade.
Como a legislação de ensino é sempre produto da classe dominante que controla os
significados culturalmente legítimos e socialmente mais valorizados, é através da escola, pela
dominação racional-legal, que as classes dominadas aceitam a meritocracia como critério de
seleção daqueles que são mais bem sucedidos, aceitando inclusive a sua própria exclusão. No
esquema weberiano sujeito e dominação são categorias fundamentais. Assim a contratação e
promoção dos funcionários é feita com base na competência. Essa competência advém de seu
capital cultural; assim a escola fornece a base para uma mobilidade social que reproduz as
diferenças culturais e sociais.
A uniformidade das operações da escola e a coordenação de suas atividades
contribuem para controlar a atividade transformadora do ensino, garantindo uma manutenção
de padrões que controlando as mudanças, mantém a escola como reprodutora do sistema
social.
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O processo de planejamento escolar desenvolve-se em etapas formais, sem grande
empenho nos reais problemas da escola e acaba por se transformar num instrumento formal de
controle. As escolas que forçam este esquema e que procuram, realmente adequar o
planejamento às suas próprias características, fazendo reivindicações, tornam-se clientes
incômodos do sistema, pois fogem à previsibilidade de comportamento esperado, na medida
em que exijam um tratamento individualizado.
O convívio com este tipo de estrutura faz com que esta situação acabe se reproduzindo
no interior da escola, em relação ao aluno, na medida em que este se afaste do comportamento
padrão esperado e necessite de atendimento individual. Observa-se então, uma tendência em
rotular o aluno e suportá-lo como cliente indesejável: reproduz-se em nível de sala de aula
entre aluno e professor as mesmas relações observadas entre escola e sistema central. Há,
assim, segundo Lapassade, uma comunicação íntima entre dominação pedagógica e
dominação burocrática.
Na organização burocrática, os contatos dos funcionários entre si e destes com os
clientes devem ter caráter impessoal, assegurando julgamentos racionais. É dentro deste
princípio que a escola se coloca como instituição de equalização social. Tratamento igual para
desiguais significa perpetuar a desigualdade social; a escolarização torna-se, então, base para
uma mobilidade social limitada que dá aparência de realidade ao mérito.
No modelo burocrático, a adoção de normas gerais e impessoais tem como
conseqüência a diminuição da visibilidade das relações de poder, diminuindo assim, o nível
de tensão interpessoal dentro do grupo. Observa-se, no entanto, uma contradição: ao mesmo
tempo em que a norma do trabalho escolar define o comportamento inaceitável, amplia
também o conhecimento dos padrões mínimos aceitáveis, que ao lado do baixo grau de
internalização dos objetivos da escola, aumenta a disparidade entre metas e realização. Esse é
um dos problemas que o modelo burocrático traz para o ensino: ao se definirem os
comportamentos mínimos esperados, estes passam a se constituir no máximo de realização
que a escola exige do aluno, contribuindo assim, para manutenção do funcionamento
medíocre do sistema escolar como um todo.
A divisão do trabalho na escola, tendo em conta a especialização, é desempenhada, na
escola, pelo corpo docente e técnico-administrativo. Quando se delega a especialistas certas
14
tarefas específicas, observa-se que a delegação resulta em departamentalização e cria-se uma
barreira entre os que fazem e os que orientam o trabalho pedagógico, causando, desse modo,
maior produção de ideologias entre funções específicas e maior internalização de diferentes
objetivos, afetando deste modo a escola como um todo. A visão da escola como organização
burocrática nos permitiu entender a realidade escolar como um campo de ações onde as
inovações são institucionalizadas através da palavra oficial do Estado, não havendo, pois,
possibilidade de ocorrerem mudanças estruturais, uma vez que o modelo burocrático estimula
e prevê uma praxis repetitiva, capaz de absorver e neutralizar qualquer mudança maior, nos
objetivos e estrutura da escola.
O modelo de administração da unidade escolar é montado para atender ao aluno ideal
que se enquadre nas normas do sistema escolar, separando, através do processo de ensino o
joio do trigo. Na escola, a internalização de seu aspecto normativo faz com que a cobrança
interna se volte mais para a qualidade formal (Conselhos de Classe) do que para a qualidade
real do processo educativo. Assim, a adoção do modelo burocrático para a administração
escolar maximiza eficiência da escola, mas minimiza a eficácia.
1.2 A questão da liderança
As ações específicas relativas à liderança do gestor estão diretamente associadas às
escolas eficazes. Nessas escolas, os gestores agem como líderes pedagógicos (apoiando o
estabelecimento das prioridades, avaliando os programas pedagógicos, organizando e
participando dos programas de desenvolvimento de funcionários e também enfatizando a
importância dos resultados alcançados pelos alunos). Também agem como líderes em relações
humanas, enfatizando a criação e a manutenção de um clima escolar positivo e a solução de
conflitos - o que inclui promover o consenso quanto aos objetivos e métodos, mantendo uma
disciplina eficaz na escola e administrando disputas pessoais.
As implicações das pesquisas sobre as escolas eficazes no desenvolvimento de países
foram revisadas por Cohn e Rossmiler. Eles concluíram que, embora exista consenso geral
sobre o fato de a eficácia ser fortemente influenciada pelo administrador local, a ligação direta
entre as características dos diretores de escola e os resultados dos estudantes (como medida de
eficácia altamente restritiva) deve ser melhor estudada. Finger (1996) notou, adicionalmente,
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a carência de estudos que examinassem o papel dos diretores na criação de um ambiente
propício à aprendizagem nas escolas.
Deve-se ter em conta que a motivação, o ânimo e a satisfação não são
responsabilidades exclusivas dos gestores. Os professores e os diretores trabalham juntos para
melhorarem a qualidade do ambiente, criando as condições necessárias para o ensino e a
aprendizagem mais eficaz, e identificando e modificando os aspectos do processo do trabalho,
considerados adversários da qualidade do desempenho. As escolas onde há integração entre os
professores tendem a ser mais eficazes do que aquelas onde os professores se mantêm
profissionalmente isolados.
Nesse contexto, são dimensões de liderança relacionadas com as escolas eficazes: o
enfoque pedagógico do diretor; a ênfase nas relações humanas; a criação de ambiente
positivo; as ações voltadas para metas claras, realizáveis e relevantes; a disciplina em sala de
aula garantida pelos professores; a capacitação em serviço voltada para questões pedagógicas;
o acompanhamento contínuo das atividades escolares; o consenso sobre valores e objetivos; o
planejamento de longo prazo; a estabilidade e manutenção do corpo docente; o apoio em
âmbito municipal para a melhoria escolar.
As práticas de liderança em escolas altamente eficazes incluem: apoiar o
estabelecimento de objetivos claros, propiciar a visão do que é uma boa escola e encorajar aos
professores, ao auxiliá-los nas descobertas dos recursos necessários para que realizem seu
trabalho. As escolas bem-sucedidas são caracterizadas pela delegação aos professores da
gestão e tomada de decisões em sala de aula, assim como pela boa integração profissional
entre os professores.
1.3 Estratégias de ação
As medidas de descentralização administrativa atualmente propostas para o sistema
escolar irão, conseqüentemente, outorgar autonomia à unidade escolar. Acredita-se que tal
autonomia irá mostrar a necessidade de se pensar em novo modelo de organização escolar;
não um modelo outorgado, mas um modelo que será construído pela escola através de um
processo participativo que retire do cotidiano das escolas a simples obediência a regulamentos
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formais e dê oportunidade para que a comunidade escolar construa as suas normas, com base
em valores reconhecidos como válidos para a individualidade de cada unidade escolar. O
regimento, corporificando o aspecto normativo das exigências genérico-sociais da escola se
caracteriza como norma abstrata; hipotetiza valores que os usos e os costumes não esgotam.
Indica uma linha de ação em que a liberdade cotidiana se converte em genérica, quando a
vontade da comunidade escolar se encontra em harmonia com os valores do desenvolvimento
genérico.
A autonomia administrativa, pedagógica e financeira demandará uma nova forma de
organização que será buscada, certamente, através da participação da comunidade escolar, que
minimizando a burocracia da centralização administrativa, poderá também se libertar da
obediência contumaz a normas centrais quanto à organização de turmas, arraigados hábitos de
organização do trabalho pedagógico, do imediatismo das meias soluções visando apenas a
economia de tempo e energia para assumir sua definição de princípios, que irá nortear a
construção do cotidiano escolar, através do exercício do magistério enquanto profissão, em
que uma ética deverá comandar as ações.
Nos dias atuais, em que a categoria do magistério passa por um processo de
marginalização na sociedade, a necessidade de sobrevivência faz com que os professores
assumam diversas funções, caracterizando-se como operários do ensino. Essa divisão em
papéis contribui para que no desempenho de suas funções, cada vez mais deixem de atuar
como indivíduos inteiramente comprometidos, desenvolvendo uma praxis repetitiva, cuja
única função é manter a escola em funcionamento. Assim, é necessário, em nível de política
de pessoal assumir para com o magistério do Estado do Rio de Janeiro a dívida em relação à
deteriorização continuada de seu salário e o compromisso de estimular o aperfeiçoamento e a
atualização dos professores, através de mecanismos que valorizem socialmente o magistério.
Há necessidade de se mudar as características atuais de trabalho dos docentes, que os
obrigam a trabalhar em diferentes colégios ou em diferentes profissões. Tal situação faz com
que, em nível escolar, o professor desempenhe um papel e, em relação à categoria de trabalho,
se apresente como indivíduo inteiramente comprometido.
Essa duplicidade de situações gera comportamentos diferenciados, que exprimem a
contradição entre a ação de particulares, portadores de papel e o pensamento de indivíduos.
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Assim, nas escolas, as reivindicações se referem, em sua maioria, a situações concretas de
trabalho (horário, recursos materiais, uso de benefícios legais etc.), enquanto nas entidades de
classe essas mesmas reivindicações se dirigem ao humano genérico (política de educação).
As perdas por demissões voluntárias e abandono da profissão exigem uma análise
teórica e histórica: se por um lado o pragmatismo do cotidiano o impede, por outro é
necessário a superação do momento vivido para que se compreenda, que no magistério
público estadual se reflete toda uma herança histórica da educação brasileira. A política de
pessoal docente adotada pelas Secretarias de Educação têm contribuído para que a educação
pública se constitua num problema cuja solução ultrapassa o âmbito das ações desenvolvidas
até agora.
Quando a comunidade escolar organizar a realização dos objetivos, para com base
neles, desenvolver a consciência individual de seus integrantes, irá também se preocupar com
a qualidade do processo educativo, além de mudar as relações sociais dentro da escola em que
o contato interpessoal deverá se pautar pela igualdade livre de homem a homem.
A valorização que a burocracia do sistema escolar dá ao trato da coisa pública relega a
escola da rede estadual a um nível de importância secundária, porque as classes populares
ainda não se apropriaram dos mecanismos de pressão utilizados pela classe dominante; há
necessidade pois, de participação e conscientização da comunidade escolar para que a escola
pública afirme não só a sua autonomia, mas também sua cidadania e exija a manutenção de
condições materiais e de segurança mínimas para o funcionamento da escola.
Em lugar do planejamento curricular como processo formal, através de uma praxis
repetitiva, a escola autônoma terá de assumir a construção histórica de seu projeto
pedagógico, tendo como objetivo a capacitação dos alunos em cidadãos capazes de criticar,
transformar e construir a realidade social.
No processo reivindicatório de categorias profissionais é necessária uma valorização
crescente da presença e da atuação das pessoas e não a submissão a um sistema de relações
sem conseqüências para o grupo, que configura, em última análise, a alienação.
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A autonomia implica a superação de uma praxis por outra que não se efetiva de modo
homogêneo; geralmente é conduzida pelas lideranças que utilizam o poder de discussão de
condições objetivas, para fazer surgir a consciência coletiva.
A existência de uma liderança docente atuante, que acredite na visão política da
educação e que seja capaz de suspender o pragmatismo da vida cotidiana da escola pública,
procurando refletir sobre a prática pedagógica, submetendo à discussão os usos e as normas e
examinando-os sob uma base moral, ética e teórica, deve mostrar que existe, na comunidade
docente, um espaço, embora não homogêneo e totalmente consensual, para a construção da
vida cotidiana dessa escola.
Sabe-se que não pode haver inteiro consenso, a não ser sobre valores fundantes, uma
vez que cada escola é um universo próprio, que reflete os valores da comunidade em que está
inserida. Na sociedade atual em que os sistemas de prescrição se fragmentam em papéis e
onde não há valores que guiem a totalidade da vida humana, dificilmente se chegará a um
consenso em nível da praxis da comunidade educativa.
Reconhecer a individualidade da escola, aprendendo a respeitá-la e valorizá-la,
eliminando a rigidez da burocracia dos sistemas escolares, sem impor limites, mas
outorgando-lhe responsabilidades para com a clientela, estes são alguns dos riscos que se terá
de enfrentar, dentro do sistema, para que a escola se construa como autônoma e cumpra com
seus objetivos.
A autonomia da escola irá requerer estratégias de ações diferenciadas, que são:
Quanto à organização escolar: aceitação por parte dos sistemas escolares, de uma
despadronização do funcionamento das unidades escolares, em que as características culturais
de cada escola devam ser respeitadas, sem no entanto, deixar de reconhecê-las como
instituições de socialização efetiva de valores e conhecimentos; aperfeiçoamento dos modelos
de administração escolar, para que as escolas possam utilizar seus mecanismos de autonomia,
ampliando seu espaço de decisão em todas as suas áreas de ação, inclusive na definição do
pessoal necessário e na liberdade para utilizar os recursos em prioridades estabelecidas pela
própria escola; um programa de avaliação da escola em que se busque identificar os
problemas do processo de aprendizagem para superação e busca de soluções possíveis;
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fortalecimento da função do administrador escolar - liderança formal responsável pelo
desempenho da escola.
Quanto à escola como coisa pública e organismo de operacionalização de uma política
de educação: a definição de uma política municipal de educação que considere a autonomia
da escola e o alcance de níveis de otimização da avaliação da qualidade do ensino que deve
ser levada a termo com o apoio e participação da comunidade; a organização e funcionamento
dos Conselhos Municipais de Educação, no sentido de normatizar as linhas essenciais de uma
política de educação a ser desenvolvida.
Quanto ao magistério: definição de uma política de pessoal que valorize o professor,
com vistas ao aperfeiçoamento e atualização, avaliação do desempenho, compromisso com a
qualidade do processo de ensino e fidelidade a princípios de uma ética profissional
comprometida com estes objetivos.
Quanto ao planejamento e organização curricular: autonomia administrativa e
pedagógica para assumir a total implementação de sua proposta curricular, inserida na
construção histórica do projeto político-pedagógico da escola; implementação de critérios de
avaliação de professores e alunos, em todas as séries, no sentido de se alcançar a efetividade
do processo educativo, através de uma recuperação paralela e continuada; um programa de
avaliação externa no sentido de orientar a capacitação dos professores, dar subsídios à
atualização pedagógica e definir uma política educacional dos sistemas escolares.
1.4 Gerenciamento e eficácia escolar
Os estudos sobre eficácia escolar são diversificados, tanto do ponto de vista
metodológico como conceitual. Recentemente, a ênfase tem recaído na identificação dos
fatores que tornam certas escolas mais eficazes do que outras, cujas características em termos
de clientela, nível educacional e recursos são as mesmas. Esta abordagem pretende identificar
as qualidades de cada escola que fazem a diferença, com relação a certos resultados como
nível de aprendizado e a reputação da escola na comunidade. Estes estudos variam na sua
orientação metodológica, podem ser feitos desde estudos de casos qualitativos ou
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etnográficos, até análises multivariadas em larga escala, do relacionamento entre as
características escolares mensuráveis e do desempenho dos alunos.
As pesquisas sobre a eficácia escolar indicam que as características organizacionais
das escolas são responsáveis por 32% na variação do desempenho dos alunos entre as escolas.
Isto significa que mais de um terço das perdas ou ganhos dos alunos em testes de desempenho
resulta da qualidade da escola como um todo.
A pesquisa educacional em países industrializados tem crescentemente se voltado para
o estudo sobre a gestão e o clima organizacional. Esta linha de questionamento tem revelado a
importância das práticas de autogestão na escola para produção de melhores resultados em
termos de aprendizagem, quando os inputs e as características do histórico dos alunos são
comparáveis entre as escolas.
Muitos dos estudos sobre eficácia escolar nos países desenvolvidos, particularmente
nos Estados Unidos, identificaram algumas características administrativas que são
positivamente associadas às escolas eficazes. As descobertas provenientes desses estudos são
extremamente consistentes.
A importância da estrutura organizacional da liderança e da cultura organizacional são
pontos que emergiram a partir desse trabalho. O planejamento participativo e o
relacionamento entre professores, que quebram o isolamento tradicionalmente associado ao
ensino e que promovem o senso de unidade e propósito no ambiente escolar, são
características encontradas nas escolas eficazes. Onde quer que haja um forte sentimento de se
sentir parte de uma comunidade, observa-se melhoria mensurável nos resultados e
comportamento dos alunos. As experiências observadas em todo o mundo, com relação à
gestão escolar democrática, sugerem que a essência da abordagem participativa e dos seus
conceitos balizadores residem no fato de os dirigentes de escolas serem profissionais capazes
de trabalharem para construir a escola.
21
CAPÍTULO II
O GERENCIAMENTO VISANDO A QUALIDADE DO ENSINO
A chamada Gerência da Qualidade Total (GQT), como todo método eficiente de
administração, não se restringe à sala dos administradores, mas, consonante com o conceito
de administração como utilização racional de recursos, se propõe alcançar todos os tempos e
espaços em que esses recursos estejam sendo utilizados. Embora seu discurso insista na
questão da qualidade, sua característica fundamental é a preocupação com a gerência. Como
sua origem é a administração capitalista, é claro que toma as características dessa
administração e procura servir a seus propósitos, assumindo a gerência no sentido que lhe dá
Braverman, de “controle do trabalho alheio”. Como afirma Fidalgo (1994),
a GQT não propõe a auto-gestão, mas sim o auto-gerenciamento dos trabalhadores, ou seja, autocontrole restrito ao processo de trabalho, e mesmo assim, com grandes limitações. Com este argumento comumente afirma-se que a qualidade total tem um caráter descentralizador, pois cada trabalhador torna-se o gerente de seu próprio processo. Nesta afirmação, podemos detectar o caráter encobridor das contradições inerentes ao modelo de gestão de qualidade total, através de dois pontos: primeiro, cada trabalhador torna-se gerente de seu próprio trabalho, relacionando-se diretamente com fornecedores e clientes, responsável, portanto, não somente pelo seu processo de trabalho como também pela avaliação do trabalho dos fornecedores e pelo balanceamento da seqüência produtiva. Segundo, a organização sistêmica faz com que cada um fique restrito ao seu próprio território, perdendo a noção do caráter mais amplo do processo.
Em outras palavras, a gerência, ou controle do trabalho alheio, expande-se dos
órgãos de cúpula para as relações entre os trabalhadores, chamados de colaboradores,
promovendo uma gerência interpessoal. O mando porém continua vindo de cima, e o interesse
22
a ser perseguido continua sendo o do capital. Apenas que, agora, cada colaborador é
supervisionado (controlado) pelo outro. Como diz ainda Fidalgo (1994),
"o que a GQTE [Gerência da Qualidade Total em Educação] pretende é, de um lado, através da introdução de métodos e técnicas, buscar a contribuição 'voluntária' dos trabalhadores, impingindo-lhes o auto-gerenciamento e, de outro, padronizar estes conhecimentos no sentido de aumentar o controle sobre os processos de trabalho.”
Em vez do diálogo (relação de troca entre sujeitos), instaura-se o gerenciamento
mútuo (controle interpessoal que faz de todos objetos de vigilância uns dos outros).
Que se pense quanto esse processo é contrário à constituição de sujeitos e se poderá
inferir os efeitos deletérios à educação escolar. No momento em que mais se precisaria
introduzir a contradição, a crítica e o questionamento de uma realidade desfavorável aos que
são permanentemente feitos objetos no trabalho e na sociedade, os novos qualitatistas da
educação, sob pretexto de entrarem na moda e copiar a eficiência empresarial, aparecem com
mais uma fórmula para coibir o desenvolvimento de personalidades em formação.
Pela sua vocação de expandir-se e perpassar todos os poros da organização onde ela
se implanta, a GQT se reveste de uma grande força ideológica, de convencimento e conversão
a seu credo e discurso. O discurso é, na maioria das vezes, tolo, carregado de formulações ao
modo dos provérbios populares mais surrados, com pretensão de verdade científica, que
constituem verdadeiros dicionários de lugares comuns, frases rimbombantes e, em certo
sentido, autênticos glossários de messianismo pedagógico. Mas o credo é o do mercado. Se o
risco do discurso é apenas concorrer para imbecilizar as pessoas envolvidas, já o perigo do
credo é muito mais sério, porque impede a reflexão sobre o real, ao vir embutido numa
concepção de mundo, a ideologia liberal, que procura fazer crer que não há salvação possível
fora das soberanas leis do mercado.
A GQT, ao introduzir-se na escola, embora atinja, inicialmente, apenas os
professores e demais funcionários escolares, não deixa de envolver também os alunos, por
duas vias, distintas porém complementares entre si: pela influência desse pessoal escolar,
especialmente professores, e pela força material das práticas escolares em geral.
23
A influência dos professores não deixa de ser contraditória, dependendo diretamente
da adesão dos mesmos aos propósitos da GQT que se implanta. Nos casos em que o professor
não aceita a medida, ele pode servir como propagandista de idéias contrárias e até se
vangloriar diante dos alunos por não ter-se deixado ludibriar pelo novo canto de sereia. Mas é
preciso considerar o caso do professor que aceita a ideologia transmitida e que, ipso facto,
procura passá-la aos alunos, tentando convertê-los ao novo dogma. Neste caso, sua intenção
encontra solo fértil nas escolas brasileiras, de um modo geral, em que se registra a quase
completa ausência de componentes críticos em seus currículos que propiciem uma visão
realista de mundo e de sociedade.
Isso não chega a ser problema para uma concepção conservadora de educação, para a
qual o importante é apenas os alunos apreenderem o máximo de conteúdos das disciplinas
tradicionais (Língua Portuguesa, Matemática, Geografia, História etc.) que o prepara para
viver de acordo com a ordem vigente e para exercer uma ocupação no mercado (de
preferência o mais rendosa que se puder). Mas é um problema bastante sério se visto a partir
de uma perspectiva educacional que não sonha apenas que os muitos milhões de alunos das
escolas se saiam bem nas provas realizadas para medir aquisição de conteúdos; mas esteja
vivamente comprometida com uma escola que, acima de tudo, concorra para a apropriação de
valores de cidadania e o desenvolvimento de comportamentos compatíveis com a colaboração
recíproca entre os homens, para além das leis naturais do mercado.
Então, essa perspectiva de educação deve preocupar-se sim em neutralizar a
ideologia que acompanha a introdução, na escola, do ideário neoliberal, via gerência da
qualidade total. Adotar determinada concepção de mundo implica certas responsabilidades
com respeito à difusão de tal concepção. Uma escola comprometida com valores como os de
democracia, liberdade e homem histórico, nos moldes em que se viu anteriormente, não pode
deixar passivamente encharcar-se por uma ideologia antagônica, nada fazendo para que seus
alunos, pela mediação da educação, se apropriem de uma visão de mundo consentânea com
esses valores. A democracia, como valor que é, não constitui herança genética, mas histórica;
por isso, é preciso, de forma intencional, ser passada permanentemente às novas gerações. A
via para isso é a educação; a agência que pode alcançar sistematicamente multidões de jovens
e crianças é a escola. Por isso, a democracia, como também o trabalho, devem ser
propositadamente incluídos como objeto de estudo, por parte de todo educador comprometido
com a superação da injustiça social. Para se aquilatar o atraso da realidade escolar brasileira a
24
esse respeito, basta verificar o quanto conceitos como democracia, liberdade, trabalho, a
partir de uma visão progressista como a vista aqui, estão pouco presentes explicitamente nos
conteúdos curriculares dessas escolas. Entretanto, seria difícil nomear algo que mereça
precedência a isso em termos de importância para a vida consciente numa sociedade.
O desenvolvimento de uma concepção de mundo que se contraponha ao
neoliberalismo, na escola, põe-se com maior importância ainda quando se sabe que os jovens
estão diuturnamente se alimentando dessa ideologia nos demais espaços que eles freqüentam.
Mas, também na escola, a influência sobre eles não se restringe à sala de aula, e, mesmo aí,
não se limita ao que o professor diz. Isso leva à consideração da segunda forma pela qual a
ideologia de mercado, que perpassa a gestão da qualidade total, envolve os alunos, ou seja,
pela força material das práticas escolares em geral.
A esse respeito, é de particular importância atentar para a organização de todo o
trabalho na escola, a distribuição da autoridade e do poder, bem como para os padrões de
relacionamento interpessoal. Esses elementos, com os quais a gerência de qualidade total não
deixa de se ocupar, são de relevância vital porque são a própria organização das
possibilidades de contato entre as pessoas a interferirem na conduta e na consciência dos
jovens. Aqui, para neutralizar os efeitos deletérios da qualidade total, a melhor solução não é
pôr-se simplesmente contra ela e suas disposições, mas, em vez disso, pautar-se por uma
alternativa democrática de relações de cooperação, de trabalho e dedicação aos objetivos
maiores da educação enquanto instrumento de aquisição cultural para a realização plena de
sujeitos. Isso porque o conceito de democracia não se apreende apenas no discurso, mas
constrói-se na prática, com o constante exercício enquanto opção de vida, não como uma
medida tópica que se aplica numa ou noutra ocasião.
A evidência da influência positiva da organização escolar sobre o comportamento
das pessoas pode ser percebida quando se comparam escolas, em que foram introduzidas
inovações que provocaram maior democratização dos contatos humanos, com situações
anteriores, em que as relações eram de mando e submissão. Em duas pesquisas de campo —
uma concluída e outra em vias de conclusão1 — percebe-se os efeitos de medidas visando à
democratização do ambiente escolar, com a introdução de eleições de diretores, no primeiro
1 Ambas as pesquisas foram parcialmente financiadas pelo CNPq.
25
caso, e com a ocorrência de uma direção de escola mais democrática, comprometida com os
interesses dos usuários, no segundo. Em ambos os casos, a partir de entrevistas e de
observações em campo pôde-se constatar a melhoria no relacionamento humano entre direção
e pessoal escolar, entre a escola e os usuários e, principalmente, o relacionamento geral dos
alunos entre si e com os vários profissionais da escola, quer dentro, quer fora da sala de aula.
As pessoas, que antes eram tratadas apenas como objetos de decisão de outras localizadas em
níveis hierárquicos superiores, sentiram a introdução de mudanças elevá-las à condição de
sujeitos desse processo, e isto não é pouco em termos de avanço no relacionamento pessoal.
Tudo isso propiciou a apropriação de valores de cidadania e o desenvolvimento de
comportamentos compatíveis com a colaboração recíproca entre os homens.
Assim, na medida em que, em educação, não se pode separar método de conteúdo, os
padrões mais avançados de relacionamento e convivência entre os envolvidos passam a fazer
parte integrante do conteúdo educacional que se realiza em um ambiente escolar mais
democrático, mais dialógico, portanto de melhor convivência humana.
Se o compromisso é com uma nova visão de mundo, que exige a prática para ser
apreendida, o caminho parece ser precisamente este: ao mesmo tempo em que se
desenvolvem conteúdos de uma concepção mais elaborada de mundo, se propiciam condições
para vivê-la e apreendê-la cada vez mais consistentemente. Só assim se pode esperar
contribuir para desarticular a ideologia do mercado incrustada no dia-a-dia da sociedade e, em
particular, no sistema de ensino. A superação a ser empreendida a esse respeito guarda
paralelo com a destruição que precisa ser feita do fetichismo da mercadoria no mundo das
relações sociais, pois sua circunstância não consiste apenas em que as relações se dão como
relações entre coisas, mas são, de fato, movidas por meio de coisas, implica que não basta
tomar consciência da situação para que o mesmo se desmanche. É preciso uma prática que
mude a realidade. Mas aquela consciência se põe como condição imprescindível dessa práxis.
26
CAPÍTULO III
O GERENCIAMENTO NO ENFOQUE DA GESTÃO PARTICIPATIVA
3.1 O conceito de gestão participativa
No domínio das teorias da administração em geral, a gestão participativa corresponde
a um conjunto de princípios e processos que defendem e permitem o envolvimento regular e
significativo dos trabalhadores na tomada de decisão.
Este envolvimento manifesta-se, em geral, na participação dos trabalhadores na
definição de metas e objetivos, na resolução de problemas, no processo de tomada de decisão,
no acesso à informação e no controle da execução. Ele pode assumir graus diferentes de poder
e responsabilidade e afetar quer a organização no seu conjunto, quer cada trabalhador e o seu
posto de trabalho, embora esteja sempre orientado para a realização das finalidades da
organização.
No quadro da evolução das teorias da administração, a gestão participativa tem a sua
origem no movimento das relações humanas que se difundiu a partir dos célebres estudos
conduzidos entre 1924 e 1933, por Elton Mayo, na Western Electric’s Hawthorne, nos
Estados Unidos. Estes estudos e a investigação que se lhes seguiu mostraram a importância do
fator humano nas organizações relativizando, assim, a idéia de que era possível uma
racionalidade da gestão baseada na organização científica do trabalho, como defendiam
Fréderic Taylor e os seus seguidores, desde o princípio do século.
27
Contudo, apesar de, desde esta altura, e do ponto de vista teórico e empírico, se dar
como adquirida a importância dos sentimentos e dos fatores afetivos e psicológicos para
explicar o comportamento dos indivíduos nas organizações, só muito lentamente é que se
introduziram modificações nos processos de gestão nas empresas e outros serviços, de acordo
com esses princípios.
Um dos momentos em que se assiste a uma aceleração no desenvolvimento de formas
de gestão participativa situa-se nos finais da década de 1960, até meados da década de 1970,
na Europa, onde, por efeito de movimentos políticos e sociais diversos, os trabalhadores e as
suas organizações sindicais passam a reivindicar modalidades mais democráticas de gestão
que levam à introdução de diversas formas de co-gestão em muitas empresas e a experiências
autogestionárias.
Mais recentemente, já a partir da década de 80, tem-se assistido ao aparecimento de
múltiplas propostas de estruturas e processos de participação, no quadro de uma profunda
modificação dos princípios e métodos da gestão empresarial.
Entre estas estruturas e processos são de referir, segundo a caracterização que Lise
Demailly faz do ideal-tipo de gestão participativa, nas empresas industriais, os procedimentos
descritos abaixo (Paro, 1993).
Divisão de tarefas e funções que permitam manter, ao nível da pessoa, a coerência
entre a escolha dos objetivos, os métodos, a organização, a execução e o controle; substituição
de uma hierarquia de autoridade, por uma hierarquia de competências, de ajuda técnica e de
animação de equipes; criação de espaços de negociação sobre os objetivos do trabalho, a
qualidade, a organização e as condições de trabalho, no quadro de modelos de decisão mista;
avaliação (e progressão na carreira) a partir das capacidades técnicas, mas também da
implicação e do grau de participação, envolvendo neste processo os profissionais de base e a
hierarquia; criação de ilhas de produção através da autonomia e funcionamento coletivos, à
volta de projetos contratualizados, e larga delegação de poderes de decisão; utilização da
preocupação pela qualidade, como forma de estabelecer relações entre as atividades concretas
28
dos trabalhadores e as finalidades da empresa (criação de estruturas de participação, coletivos
de trabalho, redes de comunicação, grupos de projeto, etc.).
Este desenvolvimento recente da gestão participativa ficou-se a dever, essencialmente,
a dois tipos de fatores:
Por um lado, no domínio das teorias da administração e da análise organizacional,
vários autores têm vindo a mostrar, com a sua reflexão teórica e com a sua investigação
empírica, a importância dos indivíduos (da sua racionalidade, da sua autonomia e das suas
estratégias) nas organizações. É neste contexto que hoje se fala dos atores organizacionais e
da sua racionalidade, das organizações como arenas políticas, da autonomia, estratégias e
jogos relacionais dos atores, das dinâmicas da ação organizada etc.
Por outro lado, no domínio das práticas de gestão empresarial tem-se assistido à
influência crescente dos princípios e modelos japoneses, com a criação de dispositivos de
desenvolvimento organizacional baseados na partilha de responsabilidades pelas equipes de
trabalho; com o aparecimento dos círculos de qualidade como forma de associar
voluntariamente os trabalhadores à resolução de problemas e ao processo de tomada de
decisão; com o desenvolvimento do trabalho em equipe; com a co-responsabilização dos
trabalhadores na elaboração dos projetos da organização e conseqüente comprometimento na
sua execução; etc.
Abreviando, por força das circunstâncias, a descrição da lenta e complexa evolução
que este movimento sofreu desde o seu início, pode-se dizer que ao longo destes últimos
setenta anos a participação dos trabalhadores na gestão foi sendo sucessivamente
reivindicada: por razões psicossociais (como forma de motivar os trabalhadores); por razões
políticas (como forma de democratizar o governo das empresas); por razões sociais (como
forma de conciliar a liberdade individual com a necessária integração social); e, finalmente,
por razões "gestionárias" (como forma de melhorar a qualidade do trabalho, de ajustar a
organização à turbulência exterior, e resolver a complexidade dos problemas organizacionais).
29
Deste modo, é possível dizer que existe, hoje, um largo consenso quanto à necessidade
de introduzir formas de gestão participativa nas organizações (públicas ou privadas,
industriais ou de serviços, lucrativas ou sem fins lucrativos), embora, as motivações possam
ser muito diversas.
Também nas escolas se assistiu a um movimento idêntico, embora só recentemente se
tenha generalizado o conceito. Para isso, muito contribuíram (para além da própria evolução
das teorias das organizações e da administração educacional) os estudos realizados no
domínio das escolas eficazes.
Na verdade, a maior parte destes estudos, efetuados a partir dos finais da década de
setenta, mostraram a importância dos fatores organizacionais no rendimento escolar dos
alunos, em particular os relacionados com a sua gestão. Entre estes fatores destacava-se a
existência de um estilo de gestão que promovesse a participação dos professores na
planificação das atividades, o trabalho em equipe, formas de gestão colegiais, e uma cultura
de reforço mútuo na resolução de problemas e no desenvolvimento profissional.
3.2 O envolvimento com a gestão participativa
Como se depreende do que foi dito, quando se fala de gestão participativa (e
independentemente de outros contextos, níveis e destinatários da participação) está-se a falar
essencialmente do envolvimento dos trabalhadores na gestão, o que no caso das escolas, quer
dizer, em primeira linha, dos professores.
Os professores constituem, em princípio, uma força de trabalho altamente
especializada e qualificada que em muitos casos se aproxima de um corpo profissional.
Mesmo se, no nosso país, ainda se mantém o estatuto de funcionários públicos, a
tendência geral é para reforçar um conjunto de requisitos ao nível da formação inicial, do
controle sobre o seu próprio trabalho, e da estandardização das suas qualificações, que
desfuncionarizam as suas funções e promovem o seu profissionalismo. As escolas tornam-se
30
organizações profissionais, e uma das características destas organizações é, exatamente, o
controle que os profissionais exercem sobre a sua gestão, quer diretamente, quer através da
escolha dos seus gestores.
Mas outras razões há que justificam o envolvimento dos professores na gestão das
escolas.
Em primeiro lugar, numa organização como a escola, a gestão é uma dimensão do
próprio ato educativo. Definir objetivos, selecionar estratégias, planificar, organizar,
coordenar, avaliar as atividades e os recursos, ao nível da sala de aula, ou ao nível da escola
no seu conjunto, são tarefas com sentido pedagógico e educativo evidentes. Elas não podem,
por isso, ser dissociadas do trabalho docente e subordinarem-se a critérios extrínsecos,
meramente administrativos.
Em segundo lugar, a redefinição da profissão docente e as próprias mudanças nos
modelos e práticas de ensino, a que se tem assistido nos últimos anos, têm valorizado a
abordagem do professor como um gestor de situações educativas. O professor já não é o que
transmite conhecimentos aos alunos, mas o que cria as condições necessárias para que estes
aprendam. Ele é, portanto um organizador e disponibilizador de recursos, em conjunto com os
seus colegas e, por vezes, outros adultos, quer na sala de aula, quer noutras dependências do
estabelecimento de ensino, quer envolvendo alunos isolados, quer em pequenos ou grandes
grupos, em atividades estritamente curriculares ou extra-curriculares, no interior ou no
exterior da escola. E tudo isto são funções de gestão que, naturalmente, o professor não pode
desenvolver sozinho e fora de uma organização.
Por tudo isto se vê o papel central que a participação dos professores desempenha para
o êxito da gestão de uma escola e para a sua adequação aos objetivos educativos. Contudo
esta complexificação evidente do papel do professor, não pode dispensar a correspondente
formação. É ela que permite uma participação qualificada e o assumir de novos papéis quer se
trate de professores que desempenham cargos de gestão de topo, ou de gestão intermédia, ou
simplesmente se integrem em equipes de ensino.
31
A gestão do ensino e das escolas é uma tarefa complexa que exige conhecimentos
específicos, no domínio da administração educacional, e que devia fazer parte da formação
inicial e contínua de cada professor, em função da natureza dos cargos que exercesse e das
tarefas pelas quais se responsabilizasse.
Apesar de serem em menor número e, durante muito tempo, exercerem uma atividade
desqualificada, os membros do pessoal não docente deverão integrar também as estruturas e
as redes de participação da escola. Devem fazê-lo na sua qualidade de adultos com
responsabilidades educativas e como técnicos de apoio logístico às atividade de ensino.
Quem conhece a base de recrutamento de muitos destes trabalhadores e o abandono a
que foi votada a sua formação sabe que esta é uma área onde a reconversão das tarefas e dos
perfis profissionais mais é necessária. Essa reconversão deve ir no sentido da sua maior
especialização, na redução do seu número e na diversificação das suas competências e
qualificações.
Enquanto isto não acontece é preciso que os próprios trabalhadores e os responsáveis
pela gestão das escolas encontrem as formas mais adequadas de valorizar a dimensão
educativa do seu trabalho. E é nessa dimensão que devem assentar os dispositivos e processos
de participação do pessoal não docente.
Na maior parte das obras que tratam especificamente da gestão participativa nas
escolas, não é suficientemente valorizado o papel desempenhado pelos alunos.
Por um lado, em muitos setores nomeadamente nos ligados à administração da
educação, ainda é dominante a concepção do aluno como produto do trabalho dos professores
e da atividade da escola. Esta concepção está ligada aos modelos e práticas tradicionais de
ensino que faziam do professor um oleiro e dos alunos o barro que ele moldava, ou, para
utilizar outra metáfora, o jardineiro que ajudava a planta-aluno a crescer.
32
Por outro lado, mesmo em versões menos artesanais do trabalho pedagógico e que
correspondem a perspectivas neo-liberais recentes, o aluno é visto como um cliente e o
professor como um prestador de serviços.
Ora, quer num caso quer no outro, o aluno é sempre visto como algo extrínseco à
produção do próprio ato educativo, limitando-se a sofrê-lo ou a consumi-lo. E neste caso não
faz sentido falar em participação na gestão.
Para que se possa defender a participação dos alunos na gestão das escolas há que
encará-los como se fossem trabalhadores.
Na verdade, e numa concepção pedagógica mais atualizada, os alunos são
considerados, não como objetos da formação, mas como sujeitos da sua formação. Isto
significa que as crianças e jovens que freqüentam as nossas escolas não devem ser vistas
como consumidoras passivas dos conhecimentos transmitidos pelos professores, mas sim
como co-produtoras dos saberes, saberes fazeres e saberes ser, necessários ao seu crescimento
e desenvolvimento.
Nesta perspectiva, a atividade das escolas não é (como dizem os economistas da
educação) produzir alunos-formados, mas sim produzir conhecimentos, fornecer os meios e
criar as condições para que as crianças e os jovens sejam autores do seu próprio crescimento
(físico, psíquico, intelectual, afetivo, moral etc.). E nesta atividade os professores, outros
adultos que exercem funções na escola e os próprios alunos são todos produtores, ainda que
diferentemente qualificados e especializados, mas igualmente responsáveis.
É por isso que, olhando de um ponto de vista da gestão participativa, não basta dizer
que a participação dos alunos na gestão das escolas é uma aprendizagem da cidadania, mas,
mais do que isso, a participação dos alunos na gestão das escolas é uma condição essencial
para a própria aprendizagem. Isto não significa que se minimizem os efeitos educativos da
formação cívica e pessoal inerente à vivência democrática que a participação dos alunos na
gestão proporciona. Mas que, para além destas razões educativas, é preciso reconhecer aos
alunos o direito de interferirem na organização do seu próprio trabalho, em parceria com os
33
outros trabalhadores, no respeito das suas competências próprias e de um modo ajustado à sua
idade e esfera de influência.
De um modo geral, parece existir hoje um relativo consenso quanto às vantagens das
relações entre a escola e a família para uma correta escolarização dos alunos. Contudo,
durante muito tempo as regras e a natureza destas relações eram exclusivamente determinadas
pelas autoridades escolares que viam nos pais uns auxiliares ou colaboradores da ação
educativa da escola, e nunca uns parceiros e co-decisores.
A partir de 1960, tem-se assistido na maioria dos países do ocidente europeu, a um
reforço dos direitos parentais sob o controle da escola pública. Estes direitos adquirem uma
dimensão e um campo de aplicação muito diversificados, conforme os países e as épocas, mas
situam-se fundamentalmente em quatro domínios: a definição das políticas educativas; a
escolha da escola freqüentada pelos filhos de acordo com os valores, interesses e estratégias
que adotam para orientar o seu percurso escolar e profissional; a gestão da escola e o controle
sobre o seu funcionamento; e o acompanhamento da escolarização dos seus educandos e a
decisão sobre o seu futuro escolar.
Para fundamentar os direitos dos pais nesta matéria, três tipos de argumentos têm sido
utilizados: a responsabilidade legal dos pais na educação dos filhos; os direitos que devem
possuir, como contribuintes e utilizadores de um serviço público com fins sociais como é a
escola; e as vantagens que resultam da articulação entre as práticas educativas familiares e as
atividades escolares.
De um ponto de vista formal-legal, a sua participação está confinada à presença de
seus representantes em alguns órgãos e no direito de serem informados sobre a escolarização
dos filhos.
34
De acordo com Marcelino (1998) para se perceber qual o nível e modalidades de
participação na gestão que os pais deverão ter, há que distinguir os dois tipos de papéis que
eles normalmente podem desempenhar nas relações com a escola:
- Responsáveis pela educação dos alunos: O pai e a mãe (ou encarregado de educação)
individualmente considerados, como responsáveis legais da educação dos alunos, devem
dispor dos meios para acompanhar a escolarização do seu educando e interferir na defesa dos
seus interesses, no quadro das normas definidas para o serviço público da educação nacional e
no respeito pelas competências profissionais dos professores.
Neste domínio a participação dos pais faz-se quer a nível individual junto dos
professores e diretor de turma, quer, eventualmente, a nível coletivo, através de uma
Associação de Pais e Encarregados de Educação que os representam junto da direção da
escola.
- Co-educadores: As famílias constituem estruturas sociais com um impacto determinante no
processo de socialização das crianças e dos jovens. Nesse sentido, é importante que a
organização e gestão da escola permitam o envolvimento da família dos alunos, em particular
do pai e da mãe, como co-educadores. Esse envolvimento deve ter como principais
finalidades: articular as práticas escolares com as práticas educativas familiares; beneficiar do
contributo dos seus membros, como educadores, em atividades de natureza sócio-educativa;
associar os pais à tomada de decisão sobre questões que afetam diretamente as modalidades
da sua colaboração com a escola, ou que se prendem com o modo como a escola define e
realiza os seus objetivos.
Como se vê, estes dois tipos de papéis remetem para duas modalidades de participação
de natureza diferente: a primeira, que se poderia chamar de participação individual e
corporativa está essencialmente ligada à idéia de informação, prestação de contas e de
controle; e a segunda, que se poderia chamar de participação social e cívica, prende-se mais
com o sentido de solidariedade, co-responsabilização e partenariado.
35
Uma e outra modalidade de participação são importantes e devem dispor de estruturas
próprias e complementares. Mas, no quadro de uma gestão participativa, é a segunda
modalidade de participação que é fundamentalmente valorizada.
Na verdade, é na medida em que os pais se integram na escola como co-educadores
que devem participar nas estruturas formais e informais de gestão cotidiana da escola,
independentemente do direito que lhes assiste, sempre, de acompanhar a escolarização dos
seus filhos e exercer o controle democrático sobre o funcionamento da escola.
Por isso, se quer desenvolver nas escolas uma cultura de participação que abranja os
pais, deve-se criar condições para que um número cada vez maior e diversificado de pais
possa ter um papel de relevo e intervenção no regular funcionamento e vida da escola. Só
assim eles farão parte de uma mesma comunidade educativa, e só assim será possível
encontrar representantes qualificados para integrarem as diversas estruturas de decisão.
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CONCLUSÃO
O gerenciamento escolar - especialmente quando se dá através de ações estruturadas -
permite que os setores interessados participem da elaboração da política municipal de
educação. São gerados, assim, ganhos em qualidade das decisões, pois estas podem refletir a
pluralidade de interesses e visões que existem entre os diversos atores sociais envolvidos. As
ações empreendidas passam a um patamar de legitimidade mais elevado.
A criação de instâncias participativas na gestão da educação diminui os lobbies
corporativistas, por aumentar a capacidade de fiscalização da sociedade civil sobre a execução
da política educacional. Força um aumento da transparência das ações do governo municipal,
através da ampliação do acesso à informação.
Como a educação é uma política e um serviço público de grande visibilidade, a
democratização de sua gestão traz resultados positivos para a ampliação da cidadania, por
oferecer a um grande contingente de cidadãos a oportunidade de participar da gestão pública.
O governo municipal pode valer-se da estrutura do sistema de gestão participativa da
educação para ampliar sua capacidade de comunicação com a população. Neste ponto, os
Conselhos de Escolas, por atingirem diretamente grande parte das famílias, têm papel
fundamental.
É necessário que os mecanismos de democratização da gestão da educação alcancem
todos os níveis do sistema de ensino. Devem existir instâncias de participação popular junto à
Secretaria Municipal de Educação, junto a escolas e, onde for o caso, em nível regional.
Também é possível imaginar instâncias de participação especializadas, correspondentes aos
37
diferentes serviços de educação oferecidos (creches, ensino fundamental e ensino médio,
alfabetização de adultos, ensino profissionalizante). Em qualquer instância, os mecanismos
institucionais criados devem garantir a participação do mais amplo leque de interessados
possível. Quanto mais representatividade houver, maior será a capacidade de intervenção e
fiscalização da sociedade civil.
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