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UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIS
REGIONAL CATALO
PROGRAMA DE PS-GRADUAO STRICTO SENSU
MESTRADO EM ESTUDOS DA LINGUAGEM
CLEBER CEZAR DA SILVA
OS CURSOS DGUA DE PIRES DO RIO: ANLISE DAS MOTIVAES
TOPONMICAS
CATALO (GO)
2017
-
CLEBER CEZAR DA SILVA
OS CURSOS DGUA DE PIRES DO RIO: ANLISE DAS MOTIVAES
TOPONMICAS
Dissertao apresentada ao Programa de Ps-
Graduao em Estudos da Linguagem nvel de
Mestrado - da Universidade Federal de Gois
Regional Catalo, como requisito parcial de
crditos para obteno do ttulo de Mestre em
Estudos da Linguagem.
rea de Concentrao: Linguagem, Cultura e
Identidade.
Linha de Pesquisa: Lngua, Linguagem e
Cultura.
Orientadora: Dra. Knia Mara de Freitas
Siqueira
CATALO (GO)
2017
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CLEBER CEZAR DA SILVA
OS CURSOS DGUA DE PIRES DO RIO: ANLISE DAS MOTIVAES
TOPONMICAS
Aprovado por:
__________________________________________
Knia Mara de Freitas Siqueira
Universidade Estadual de Gois Cmpus Pires do Rio
Orientadora
__________________________________________
Vanessa Regina Duarte Xavier
Universidade Federal de Gois Regional Catalo
__________________________________________
Karylleila dos Santos Andrade
Universidade Federal do Tocantins Cmpus Palmas
Catalo-GO, 20 de Janeiro de 2017
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Decido este trabalho a Deus; aos eternos amantes
da Toponmia e quela que desde sempre meu
alicerce e a maior incentivadora, minha me,
Nelica Antnia Pereira da Silva.
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AGRADECIMENTOS
E agora, eis o que diz o Senhor, aquele que te criou, Jac, e te formou, Israel: nada
temas, pois eu te resgato, eu te chamo pelo nome, s meu. (ISAAS, 43:1). Senhor de Israel,
foi por chamar-me pelo nome que constitui esta graa, sem o Seu amor e graa eu nada seria,
pois colocou-me em p quando pensava no mais conseguir caminhar e, de amparo me enviaste
o Esprito Santo e a Virgem Maria, graas rendo Santssima Trindade e Virgem por
caminharem comigo e no me deixar perder no caminho.
Os filhos so herana do Senhor, uma recompensa que ele d. Como flechas nas mos
do guerreiro so os filhos nascidos na juventude. Como feliz o homem que tem a sua aljava
cheia deles! No ser humilhado quando enfrentar seus inimigos no tribunal. (SALMO, 127:3-
5). Famlia, o que seria de mim sem vocs, nada! Me e pai, sempre com amor, mesmo que
velado, souberam educar seus dois filhos na dignidade para que se constitussem verdadeiros
homens e, de bem. Mesmo com as dificuldades da vida em momento algum se abateram, foram
fiis misso designada, de serem pais, a vocs minha eterna gratido e se hoje concretizo esta
fase em minha vida, ela to minha quanto de vocs, muito obrigado. Amo vocs!
As relaes de afeto e cuidado sempre foram o nosso maior elo, a vocs que sempre
torceram por mim e a cada conquista vibraram intensamente, obrigado meu irmo, cunhada,
sobrinha, afilhados, tios, primos, padrinhos e a matriarca de nossa famlia, minha adorada av.
Que Deus continue fazendo de ns uma famlia de princpios e sempre grata a Ele por tudo.
O amigo ama em todos os momentos; um irmo na adversidade. (PROVRBIOS,
17:17). Amigos, famlia que a vida me deu de presente, mencionar nomes aqui seria muito
injusto, cada um com seu jeito e adversidade me ensinaram que a vida no se resume apenas
em bons momentos, pois estiveram comigo em momentos nada agradveis, souberam respeitar
o meu silncio, minhas ausncias e o melhor, vibraram comigo todos os momentos desta
conquista, a vocs meus irmos na adversidade, muito obrigado!
Aos colegas e amigos do Programa de Ps-Graduao em Estudos da Linguagem,
Universidade Federal de Gois, Regional Catalo, nos encontros da vida sempre tm surpresas,
a melhor de todas foi poder construir com muitos de vocs verdadeiros laos de amizade, que
iro perpetuar para todo sempre, s posso neste momento agradecer pelos momentos de troca
de experincias e conhecimento e, desejar sucesso a todos.
O ensino dos sbios fonte de vida e afasta o homem das armadilhas da morte.
(PROVRBIOS, 13:14). Ensinar, eis o dom, com tanta dedicao e carinho muitos mestres
conduziram-me at aqui, e foi com a graa do ensino dos sbios que no ca nas armadilhas,
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pois tambm me tornei sbio. Professora, doutora, eterna orientadora Knia Mara de Freitas
Siqueira, nenhuma palavra capaz de expressar a gratido que tenho por voc, foram anos de
ensinamentos e agora se concretizam com mais esta fase, sou e serei eternamente grato por me
apresentar a Toponmia, pois ela me levar a mais um degrau no meio acadmico. Obrigado
por tudo, Deus lhe pague!
Aos professores do Programa de Ps-Graduao em Estudos da Linguagem,
Universidade Federal de Gois, Regional Catalo, que muito contriburam para a construo
desta pesquisa: Fabola Aparecida Sartin Dutra Parreira Almeida, Maria Helena de Paula e
Vanessa Regina Duarte Xavier. A professora Vivian Regina Orsi Galdino de Souza, do
Programa de Ps-Graduao em Estudos Lingusticos, da Universidade Estadual Paulista Jlio
de Mesquita Filho, cmpus So Jos do Rio Preto-SP, obrigado pelos seus vastos ensinamentos
e por permitir que cursasse a disciplina Introduo aos Estudos Lexicogrficos. Mestres,
obrigado pelos ensinamentos e momentos de descontrao e alegria, vocs foram capazes de
mostrar que o universo da pesquisa, tambm, se constitui na felicidade e prazer.
Todo trabalho rduo traz proveito, mas o s falar leva pobreza. (PROVRBIOS,
14:23). O trabalho dignifica o homem, palavras estas do livro da vida, a bblia sagrada. Minha
vida desde a infncia foi pautada no estudo e no trabalho, assim, todos os trabalhos que tive me
possibilitaram crescer enquanto ser humano e profissional. Registro aqui, os meus mais sinceros
agradecimentos aos colegas e amigos do Colgio Estadual Professor Ivan Ferreira, minha eterna
casa, pois foi l que tive o prazer em estudar e depois retornar como profissional, inclusive, ser
gestor deste honrado estabelecimento de ensino. Aos colegas e amigos do Instituto Federal
Goiano Campus Uruta, obrigado por permitirem dividir com vocs este espao de
conhecimento e aprendizado.
A banca examinadora deste trabalho, professores: Karylleila dos Santos Andrade,
Vanessa Regina Duarte Xavier e Alexandre Antnio Timbane, registro os meus mais sinceros
agradecimentos pelas valorosas contribuies no Exame de Qualificao e agora na defesa deste
trabalho, Deus lhes pague!
Ao Programa de Ps-Graduao em Estudos da Linguagem, da Universidade Federal de
Gois, Regional Catalo, na pessoa da coordenadora Luciana Borges, obrigado por dar
possiblidades que novos pesquisadores se formem no mbito dos estudos da linguagem.
Enfim... sozinho no sou nada, sempre necessitarei de outros, por isso, a todos os que
foram meu alicerce para a concretizao de mais esta etapa em minha vida, algo sonhado h
muito tempo, receba o meu muito obrigado e Deus lhes pague!
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O nome um certo sentido a prpria coisa; dar
nome s coisas conhec-las e apropriar-se
delas; a denominao o ato da posse espiritual.
(MIGUEL UNAMUNO)
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RESUMO
Esta pesquisa centra-se nos estudos toponmicos e tem como objetivo descrever e analisar a
origem/etimologia, morfolgica e semanticamente dos topnimos da hidrografia da cidade de
Pires do Rio-GO, para identificar as relaes entre esses designativos de lugares e respectivos
fatores contextuais que, por ventura, possam conter indcios da motivao toponmica. O
levantamento dos topnimos foi feito por meio de documentos oficiais, mapas do Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatstica (IBGE) e Instituto Mauro Borges (IBM) numa escala de
1:100.000 e das cartas topogrficas. A pesquisa de base documental, numa abordagem
qualiquantitativa. O mtodo da pesquisa o onomasiolgico e indutivo, parte-se de casos
particulares para uma verdade geral combinado a outros mtodos da Lingustica Histrica, de
estudo das designaes com o objetivo de analisar os diversos nomes atribudos a um conceito.
A anlise do corpus da pesquisa deu-se aps o levantamento dos 46 topnimos dos cursos
dgua, dentre os quais 15 so analisados neste estudo. Nesse sentido, parte-se do princpio de
que o signo toponmico motivado, pois fatores extralingusticos influenciam o nomeador no
ato de nomear, na perspectiva de que a lngua recorta a realidade sua maneira (Sapir-Whorf),
sendo que a prpria lngua um depositrio de cultura, assim, os topnimos revelam fatores
scio-histrico-culturais do lugar que o nomeia. A histria e a geografia do municpio de Pires
do Rio-GO foram fundantes para as anlises, que nas bases onomasiolgicas e indutivas
evidenciam que o local e suas caractersticas fsicas e sociais influenciam o nomeador no ato
do batismo do topnimo. Perceber as relaes de nomeao e nomeador so fatores que por
meio das classificaes taxionmicas so revelados, sem deixar de perceber tambm que a
origem dos nomes e sua estrutura morfolgica evidencia os fatores contextuais a que da lngua,
cultura e ambiente esto impregnados no topnimo, isso tudo vista de quem o designou.
Palavras-Chave: Toponmia. Lngua. Cultura. Pires do Rio. Hidrografia.
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ABSTRACT
This research focuses on the toponymic studies and aims to describe and analyze the origin of
the names, morphological and semantic of designatory toponyms of the hydrography of Pires
do Rio-GO city, to identify the relations between these designative places and their respective
contextual factors which may, by chance, contain indications of toponymic motivation. The
research of the toponyms was done by means of official documents, maps of the Brazilian
Institute of Geography and Statistics (IBGE) and Mauro Borges Institute (IBM) on a scale of
1: 100,000 and topographic maps. The research is documentary based, in a qualitative and
quantitative approach, the research method is the onomasiological method combined with other
methods, which consists of the study of designations with the purpose of studying the various
names attributed to a concept. The analysis of this researchs corpus took place after the survey
of the 46 toponyms of the watercourses, from which 15 are analyzed in this study. In this sense,
it is assumed that the toponymic sign is motivated, once extralinguistic factors influence the
nominator in the act of naming, in the perspective that the language outlines reality in its own
way (Sapir-Whorf), and the language itself is a depository of culture, thus, toponyms reveal
socio-historical-cultural factors of the place that names it. The history and geography of Pires
do Rio-GO city was the basis for the analyzes, which on the onomasiological bases show that
the place and its physical and social characteristics influence the nominator in the moment of
the toponym baptism. To perceive naming and nominator relationships are factors that are
revealed through the taxonomic classifications, noticing at the same time that the origin of the
names and their morphological structure reveals the contextual factors that are impregnated in
the toponymy of the language / culture / environment, aspects from the point of view of who
appointed it.
Keywords: Toponymy. Language. Culture. Pires do Rio. Hydrography.
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LISTA DE ABREVIATURAS
ATEGO Atlas Toponmico de Gois
ATB Atlas Toponmico Brasileiro
DSG Diretoria do Servio Geogrfico do Exrcito
ETE Estao de Tratamento de Esgoto
FCA Ferrovia Centro Atlntica
GO Gois
IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica
IBM Instituto Mauro Borges
IDH ndice de Desenvolvimento Humano
M Municpio
PEA Populao Economicamente Ativa
RFFSA Rede Ferroviria Federal Sociedade Annima
S/D Sem data
SE Seco
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LISTA DE FICHAS
Ficha 01 Pires do Rio.........67
Ficha 02 Crrego Laranjal......................................................................................................89
Ficha 03 Ribeiro Taquaral................90
Ficha 04 Ribeiro Cachoeira..............91
Ficha 05 Crrego Barreiro......................................................................................................93
Ficha 06 Crrego Terra Vermelha..........................................................................................94
Ficha 07 Crrego Itabi..........................................................................................................96
Ficha 08 Ribeiro Brumado...................................................................................................96
Ficha 09 Rio Corumb...........................................................................................................98
Ficha 10 Rio do Peixe.............................................................................................................98
Ficha 11 Rio Piracanjuba.......................................................................................................99
Ficha 12 Ribeiro Sampaio..................................................................................................101
Ficha 13 Ribeiro Ba..........................................................................................................104
Ficha 14 Ribeiro Caiap.....................................................................................................105
Ficha 15 Ribeiro Marat.....................................................................................................105
Ficha 16 Ribeiro Mucambo................................................................................................106
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LISTA DE GRFICOS
Grfico 1 Natureza das Taxionomias.....................................................................................87
Grfico 2 Taxionomias de Natureza Fsica............................................................................88
Grfico 3 Taxionomias de Natureza Antropocultural..........................................................101
Grfico 4 Origem/Etimologia dos Topnimos.....................................................................108
Grfico 5 Estrutura Morfolgica dos Topnimos.................................................................111
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LISTA DE MAPAS
Mapa 1 Pires do Rio(GO): Microrregio de Pires do Rio(GO).............................................74
Mapa 2 Rede Hidrogrfica de Pires do Rio (GO)..................................................................83
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LISTA DE QUADROS
Quadro 1 Tringulo da significao.......................................................................................44
Quadro 2 Mtodo Onomstico e seus desdobramentos.........................................................57
Quadro 3 Populao da cidade de Pires do Rio(GO), segundo Recenseamento ................. 76
Quadro 4 Populao da cidade de Pires do Rio(GO), segundo Contagem .......................... 76
Quadro 5 Populao estimada da cidade de Pires do Rio(GO) ............................................ 77
Quadro 6 Os cursos dgua da cidade de Pires do Rio(GO) ................................................ 78
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SUMRIO
INTRODUO.......................................................................................................................20
I O NOME E A ATIVIDADE DE NOMEAO ................................................................ 25
1.1 O nome comum, o prprio e o prprio de lugar: consideraes sobre o ato de nomear. 25
1.2 Lngua e Cultura . ........................................................................................................... 33
1.3 A toponmia e o estudo dos nomes ................................................................................. 39
1.4 O signo lingustico em funo toponmica. .................................................................... 43
1.5 Lingustica Histrica ....................................................................................................... 47
II A METODOLOGIA DA PESQUISA E SEUS DESDOBRAMENTOS ........................ 51
2.1 Fundamentos Histrico-Metodolgicos. ......................................................................... 51
2.1.2 Os mtodos da lingustica histrica ............................................................................. 53
2.2 O mtodo onomasiolgico da toponmia.... .................................................................... 57
III A CAPITAL DA ESTRADA DE FERRO, PIRES DO RIO ......................................... 66
3.1 Os trilhos avanam depois da ponte ............................................................................... 66
3.2 Pires do Rio geogrfico ................................................................................................... 74
3.3 Os cursos d'gua.............................................................................................................. 78
IV A TOPONMIA E SUAS RELAES COM O LUGAR..............................................81
4.1 Os topnimos de acordo com as taxionomias de natureza fsica e antropocultural........ 84
4.2 As taxionomias presentes nos topnimos dos cursos d'gua de Pires do Rio-GO ......... 87
4.2.1 As taxionomias de natureza fsica presentes nos topnimos..........................................88
4.2.1.1 Fitotopnimos............................................................................................................89
4.2.1.2 Hidrotopnimos.........................................................................................................91
4.2.1.3 Litotopnimos............................................................................................................93
4.2.1.4 Litotopnimos e Cromotopnimos............................................................................94
4.2.1.5 Litotopnimos e Fitotopnimos.................................................................................95
4.2.1.6 Meteorotopnimos.....................................................................................................96
4.2.1.7 Zootopnimos............................................................................................................97
4.2.2 As taxionomias de natureza antropocultural presentes nos topnimos........................100
4.2.2.1 Antropotopnimos...................................................................................................101
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4.2.2.2 Ergotopnimos.........................................................................................................103
4.2.2.3 Etnotopnimos.........................................................................................................104
4.2.2.4 Sociotopnimos.......................................................................................................106
4.3 As lnguas que deram origem aos topnimos................................................................107
4.4 A estrutura morfolgica dos topnimos.........................................................................111
CONSIDERAES FINAIS...............................................................................................113
REFERNCIAS.................................................................................................................... 116
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20
INTRODUO
Ao dar nome a seres e objetos, o homem tambm os categoriza, j que o ato de nomear
que d existncia a algo ou algum. por meio do nome que h identificao e principalmente,
a diferenciao dos seres e dos objetos. No ato da nomeao, diversos aspectos extralingusticos
podem influenciar o nomeador, isso pode caracterizar especificamente a motivao que subjaz
a qualquer signo lingustico em funo toponmica. A motivao, por sua vez, reveladora de
inmeros aspectos que esto na base da inter-relao lngua, cultura e ambiente, pois o nome
prprio de lugar, como fato da lngua, identifica e guarda uma significao precisa oriunda de
aspectos fsicos ou culturais. Desta forma, busca-se, mediante o estudo dos designativos dos
cursos dgua da cidade de Pires do Rio-GO, descrever essa relao (lngua, cultura e
ambiente). Entende-se assim, que um rio, um riacho, um ribeiro, um crrego so lugares que,
uma vez nomeados, passam a carregar as inmeras memrias do lugar.
Em decorrncia disso, abrem-se possibilidades de inter-relacionar reas do saber
humano com vista a estabelecer algum vnculo epistemolgico a fim de proporcionar novos
olhares sobre um objeto j descrito e analisado por outra rea do conhecimento, a geografia,
mas restrito a um nico nvel de anlise lingustica. Isso leva a considerar os aspectos da
linguagem dentro de uma viso interdisciplinar, que pode trazer, entre tantas contribuies, o
fato de entend-los na totalidade, como em uma rede de relaes. Em outras palavras, oferece
a possibilidade de analisar os fatos lingusticos de maneira holstica, uma vez que os fatores
envolvidos na interao devem ser concebidos como um todo formado por componentes que se
relacionam entre si.
Entrecruzar as reas de geografia e da lingustica um trabalho que j se tem feito e
alguns estudiosos como o caso de Menezes e Santos (2007, apud Menezes; Santos; Santos,
2010), tratam a toponmia na geografia como geonmia. Para Andrade (2010, p. 105-106):
No se pode pensar em toponmia desvinculada de outras cincias como
histria, geografia, antropologia, cartografia, psicologia e a prpria
lingustica. Deve ser pensada como um complexo lingustico-cultural: um fato
do sistema das lnguas humanas. Faz parte de uma cincia maior que se
subdivide em toponmia e antroponmia.
Assim, esta pesquisa relevante para a rea dos estudos da linguagem/lingusticos como
para a geografia, sem mencionar o processo de revisitao histrico-cultural sobre a cidade de
Pires do Rio-GO e levado a conhecimento pblico.
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21
Fazer esse estudo acerca da hidrografia da cidade de Pires do Rio elementar, elencando
no s estudos semnticos, lexicais, origem/etimologia dos termos, mas tambm scio-
histrico-culturais de um povo. Algo ainda se faz pertinente na definio do problema, pois foi
assim que surgiu o interesse por este estudo: em conversas informais com pessoas da cidade,
obtive respostas que aguaram esta pesquisa, pois, prximo de Pires do Rio-GO, cerca de uns
3 km da cidade, h um determinado ribeiro o qual a comunidade local denomina de Pedro
Teixeira, mas na verdade esse nome dado ponte que est sobre o ribeiro e foi construda
pelo fazendeiro Sr. Pedro Teixeira, embora o nome que se apresenta na carta topogrfica seja
ribeiro Sampaio.
Diante da problematizao: qual a origem/etimologia dos nomes dos cursos dgua da
cidade de Pires do Rio? Os nomes so os oficiais atribudos pelo IBGE, ou a comunidade do
lugar que os nomeia a partir de fatos que lhe chamaram ateno? A partir disso, centra-se o
nosso estudo em descrever e analisar a origem/etimologia dos termos, a morfologia e a
semntica, investigando e verificando os topnimos e as relaes histrico-culturais da regio
de Pires do Rio-GO.
Preliminarmente, trabalha-se com a seguinte hiptese de pesquisa: pelo seu carter
motivado, o signo toponmico possibilita reconhecer fatores vinculados motivao que subjaz
escolha dos nomes de lugares; o que pode possibilitar o levantamento de fatores scio-
histrico, culturais e ambientais necessrios anlise lingustica dos nomes dos cursos dgua
como ndice da estreita relao entre lngua e cultura. A toponmia dos cursos dgua de Pires
do Rio-GO incorpora caractersticas sociais, lingusticas e culturais da regio a que pertence.
Este um dos embates fundantes de nosso estudo; assim, espera-se com esta pesquisa,
cartografar os topnimos dos cursos dgua da cidade de Pires do Rio-GO, com base na
metodologia do ATB (Atlas Toponmico Brasileiro), como sugerido por Dick (1990, 2004).
Posto isso, ao final, responderemos s perguntas de pesquisa, j mencionadas
anteriormente, e, ainda, contribuiremos com as pesquisas na rea da Onomstica, que esto
desenvolvendo-se em Gois. Convm mencionar tambm que uma das contribuies desta
pesquisa, alm de revisitar a histria e a cultura de uma regio, a de auxiliar na construo do
Atlas Toponmico de Gois ATEGO.
Assim, o objetivo da pesquisa constitui-se basicamente em: descrever e analisar os
topnimos designativos dos cursos dgua e de outros elementos hidrogrficos da regio do
municpio de Pires do Rio-GO, observando noes pertinentes elaborao de taxionomias de
natureza fsica e de natureza antropocultural. Para tanto, necessrio evidenciar os fatores que
constituem a motivao que subjaz escolha do nome do lugar, o que requer a identificao de
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22
fatos sociais, culturais, histricos, elementos geogrficos (quando pertinente) e outras
motivaes de diferentes naturezas.
De uma maneira peculiar, os objetivos especficos desta pesquisa so: i) remapear os
cursos hdricos mediante o elenco de seus topnimos para cartografar os mapas da bacia
hidrogrfica e dos topnimos seguindo a metodologia do Projeto ATB; ii) verificar, mediante
a anlise lingustica dos topnimos, a motivao referente cultura e histria, e
principalmente aos aspectos fsicos dos lugares que iniciaram o processo de nomeao dos rios,
crregos, ribeires e quedas dgua do municpio de Pires do Rio-GO (evidenciando o vnculo
lngua, ambiente e cultura); iii) de alguma forma, contribuir para o desenvolvimento dos estudos
toponmicos em Gois.
A metodologia consiste de uma pesquisa de natureza documental, de abordagem
qualiqualitativa, para o levantamento dos dados, uma vez que a constituio (sub-regio, limites
e fronteiras) dos lugares est registrada em documentos pblicos (mapas e cartas
topogrficas), e o mtodo da pesquisa o de induo, com nfase para a observao do fazer
onomasiolgico, combinado a outros mtodos da Lingustica Histrica, especialmente o Wrter
und Sachen (palavras e coisas). O mtodo onomasiolgico e indutivo se constitui do estudo das
designaes com o objetivo de estudar os diversos nomes atribudos a um conceito. Usando
esse mtodo, pode-se investigar toda ou, pelo menos, parte da cultura popular de um local e
priorizar aspectos sincrnicos ou histricos se necessrio for. Em relao toponmia, os
aspectos histricos so bastante reveladores da ao de nomeao dos lugares.
Este trabalho apresenta os resultados da pesquisa de dissertao de Mestrado sobre Os
cursos dgua de Pires do Rio: anlise das motivaes toponmicas, produzida no mbito do
Programa de Ps-Graduao em Estudos da Linguagem, Universidade Federal de Gois
Regional Catalo, que focaliza os topnimos hdricos do municpio de Pires do Rio.
Desta maneira, este trabalho se estrutura em quatro captulos organizados de forma a
abranger os resultados desta pesquisa, que articula, por meio da linguagem, quesitos histricos,
geogrficos e culturais.
Assim, no captulo I, O nome e a atividade de nomeao, so apresentadas
consideraes referentes ao nome e ao ato de nomear no sentido de reformular questes tericas
necessrias ao levantamento de dados e construo do corpus, bem como descrio dos
topnimos que designam os elementos (rios, ribeires, crregos e quedas dgua) do municpio
de Pires do Rio-GO. Para tanto, o captulo traz uma reviso dos conceitos de nome (comum,
prprio e o prprio de lugar), verificando as funes dos nomes tanto no sistema lingustico
como em relao cultura e estabelecendo as relaes de lngua e cultura, pois a lngua
-
23
transporta a cultura no tempo e recorta realidade sua maneira. necessrio aqui trazer as
discusses tericas acerca da toponmia e do signo lingustico em funo toponmica, que
sustentam a nossa pesquisa. Ainda, fazemos uma retomada do surgimento e desdobramento da
Lingustica Histrica, pois a partir dela que so criados os mtodos de pesquisa, os quais
contribuem para a rea de estudo.
O captulo II, A metodologia da pesquisa e seus desdobramentos, , praticamente, uma
extenso do primeiro, porque procura reavaliar alguns mtodos usados em pesquisa onomstica
com o objetivo de coadunar teoria, mtodo e procedimentos de pesquisa.
Neste captulo, possvel rever algumas questes sobre os mtodos da lingustica, o
mtodo onomasiolgico, que investiga as relaes de significado e referncias partindo das
designaes e tem como objetivo estudar os diversos nomes atribudos a um conceito. Ainda
apresentada uma sntese do comparativismo e do mtodo Wrter und Sachen, de Hugo
Schuchardt (1842-1929) e Rudolf Meringer (1859-1913); pois, de acordo com Bassetto (2001),
pode-se verificar pontos em comum que compartilham com o mtodo onomasiolgico. Ao
enfatizar questes de ordem semntica das palavras, ressalta-se a realidade que elas designam,
para esses autores, a verdadeira etimologia da palavra est no conhecimento dessa realidade.
Busca-se, assim, instruir sobre a necessidade de conhecer, se possvel, o objeto designado por
um nome, para que o significado possa ser explicitado adequadamente.
Dados histricos e geogrficos referentes capital da estrada de ferro: Pires do Rio,
compem o terceiro captulo, A capital da estrada de ferro, Pires do Rio, de modo a traar, em
linhas gerais, a histria da fundao do municpio no incio do sculo XX, em decorrncia da
construo da Estrada de Ferro Goyaz e da Estao Frrea Pires do Rio, em 09 de novembro de
1922. A importncia deste municpio se deve estrada de ferro e, obviamente, aos primeiros
habitantes que para c acorreram acreditando no desenvolvimento da antiga Teteia do
Corumb.
No captulo quarto, A toponmia e suas relaes com o lugar, apresentamos a anlise
dos dados, as taxionomias de natureza fsica e antropocultural e, as fichas lexicogrficas-
toponmicas dos 15 topnimos analisados, de acordo com os estudos de Dick (1992),
juntamente com a origem das lnguas e estrutura morfolgica dos topnimos, da procedemos
s anlises das classificaes toponmicas que esto presentes nos designativos dos cursos
dgua do municpio de Pires do Rio-GO, estabelecendo as relaes motivacionais e semnticas
do topnimo com o local nomeado.
Na sequncia, so apresentadas as Consideraes Finais, que retomam os resultados
obtidos ao trmino da pesquisa, pautados nos objetivos e perguntas que orientaram este estudo.
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24
E, por fim, seguem as Referncias, que sustentaram a parte terica e a construo do corpus
coletado.
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25
I O NOME E A ATIVIDADE DE NOMEAO
O conhecimento dos nomes no negcio de
importncia somenos.
(PLATO, 2001).
Este captulo tem o objetivo de tecer, de forma mais geral, consideraes acerca do nome
e do ato de nomear, para reformular questes tericas necessrias ao levantamento de dados,
para a construo do corpus, e descrio dos hidrnimos (rios, ribeires, crregos e quedas
dgua) do municpio de Pires do Rio-GO. Para tanto, os itens a seguir trazem uma reviso dos
conceitos de nome (comum, o prprio e o prprio de lugar), verificando as funes dos nomes
tanto no sistema lingustico como em relao cultura, j que representam inmeros aspectos
que culminam em certos critrios para a nomeao ou nominao, revelando, em certo sentido,
especificidades dessa cultura, que so evidenciadas na nomeao. Ao dar um nome a um objeto
ou a um lugar no se reduz apenas a indicar, mas a classificar, situar, identificar e, sobretudo,
uma vez categorizado, inscreve-se tambm em um sistema cognitivo permeado por essa mesma
cultura.
1.1 O nome comum, o prprio e o prprio de lugar: consideraes sobre o ato de nomear
O nome a parte que caracteriza a existncia de algo ou algum, sem a especificidade
do nome, o objeto ou a pessoa no identificada. Alis, em muitas situaes, o nome consolida
a existncia do objeto, que passa a existir como tal em decorrncia de ter um nome, ou seja,
o falante pode perceber no mundo apenas aquilo que conhece pelo nome. O nome est presente
em todas as esferas do desenvolvimento da humanidade. parte constitutiva do prprio ser
humano, que se reconhece e se afirma face ao nome que carrega; tambm o nome que lhe
rompe o anonimato e lhe confere, de certa forma, uma identidade.
Segundo Silva (2000), o nome que diferencia os seres e os objetos do mundo.
Identidade e diferena ocorrem simultaneamente como produto de um mesmo processo, o da
identificao. Pode-se afirmar que, depois de nomeado, o objeto passa a ser identificado
tambm pelas diferenas que possui em relao quilo que no , ou melhor, diferenciado
face aos demais elementos do mundo extralingustico, conferindo-lhe existncia. Tem um nome
porque existe, tornou-se conhecido e reconhecido como elemento cultural importante para a
continuidade de uma populao como um dos milhares de traos que a caracteriza e, desta
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forma, o processo de nomeao uma forma pela qual a sociedade cria os seus membros sua
imagem (CABRAL, 2007, p. 85).
E, em Crtilo, Plato narra um dilogo entre Demstenes e Crtilo acerca da justeza dos
nomes, debates no qual Scrates aponta para ambas as possibilidades, isto , para os socrticos,
tanto se pode entender os nomes como vinculados coisa, como podem ser vistos como
inteiramente sem elo com as coisas do mundo. Plato (2001, p. 48) justifica que o ato de nomear
era visto como uma pressuposio da existncia de algo, assim, as coisas devem ser nomeadas
como lhes pertence por natureza serem nomeadas e por meio do que devem s-lo, e no como
ns queremos; e assim, faremos e nomearemos melhor, mas de outra maneira no.
A nomeao , assim, uma atividade bastante significativa para o ser humano e se
constitui de uma ao complementar do modo como determinada populao entende o meio em
que vive; essa a linha de pensamento tanto de Dick (1990) como de outros estudiosos, como:
Basso (1988), Langacker (2002), Weisgerber (1977), Wierzbicka (1997) e Worf (1971), dos
fatos da linguagem, como evidencia a assertiva que segue:
Apreenso/compreenso e transmisso/participao de um dado qualquer do
saber humano so atuantes de uma mesma e complexa evidncia relacional
o ato comunicativo que corporifica, em sua expressividade, um aglomerado
de situaes lnguo-scio-psquicas. Nele est manifesto, ainda que de modo
implcito, o registro pelo qual se concretizou a assimilao do
mundo atravs do cdigo de linguagem vivenciado por determinada
comunidade lingustica (DICK, 1990, p. 29).
No equivocado afirmar que o nome corporifica aquilo que determinada comunidade
assimilou de seu meio circundante, mediante relaes estabelecidas entre a lngua, que
possibilita a representao daquilo que foi evidenciado, e as impresses sociopsquicas oriundas
dos objetos do mundo que se tornaram salientes aos olhos do nomeador. Assim, recebe um
nome tudo aquilo que, de uma forma ou de outra, tornou-se um item da cultura, seja um acidente
fsico-natural (um rio, uma espcie botnica) ou um item criado culturalmente. Em todas as
sociedades conhecidas, h referncia aos nomes e, consequentemente, ao de nomear. Muitas
vezes, essa atividade humana revestida de mitos e rituais que conferem ao nome poderes
mgicos ou sobre-humanos.
Nas sociedades primitivas, de acordo com Cunha (2004), um nome pode valorar o
sagrado ou o ritual, isso pode ocorrer quando acontece a mudana de nome (candombl e igreja
catlica), desta forma, ao nomear algum tocar-se na personalidade da pessoa e at as partes
da escrita que compem o nome so carregadas de simbologia e foras sobrenaturais. Cunha
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(2004, p. 220) ainda acrescenta que, nas mais diversas culturas, no ter nome no existir,
nomear instituir.
Nesse processo de instituir dos rituais de passagem, possvel entender que a atividade
de nomeao advm de fatores que propiciam uma motivao que resulta na escolha de um
nome. No ritual de escolha de um novo Papa (igreja catlica) ou de um novo membro do
candombl, o indivduo fica recluso por alguns dias e, no momento do ritual, apresenta seu
novo nome comunidade, fato esse que reside, de alguma forma, na escolha do novo nome.
Desta forma, o nome escolhido de acordo com suas caractersticas psicofsicas e tambm com
as que ele deseja ter a partir do momento de escolha do novo nome.
Conforme Biderman (1998), muitas so as culturas que acreditam que o nome est
ligado essncia da pessoa. Nas culturas arcaicas, em geral, os nomes atribudos s pessoas
tinham um significado que indicava, s vezes, a vocao ou o destino do indivduo, o que
corrobora a justeza dos nomes nos rituais de passagem e em outras atividades de nomeao.
O ato de nomear se constitui tambm como algo divino. Para Biderman (1998, p. 85),
o gesto criador de Deus identifica-se com esta palavra ontolgica essencialmente divina. O
que ns homens somos e o que sabemos nasce dessa revelao primordial da palavra criadora,
do gesto divino de dizer. Cunha (2004) evidencia que a palavra j reveladora do poder, desde
a antiguidade, e isso se expressa de forma clara por meio da bblia sagrada que, em vrios textos,
conclama que o poder revelado por meio da palavra, como percebe-se no livro de Gnesis,
captulo I, versculos 19 e 20:
19 Tendo, pois, o Senhor Deus formado da terra todos os animais dos campos,
e todas as aves dos cus, levou-os ao homem, para ver como ele os havia de
chamar; e todo o nome que o homem ps aos animais vivos, esse o seu nome
verdadeiro. 20 O homem ps nomes a todos os animais, a todas as aves dos
cus e a todos os animais dos campos; mas no se achava para ele uma ajuda
que lhe fosse adequada (BBLIA, 1995, p. 51).
Dessa forma, o cristianismo explica a atividade humana de nomeao. Isso evidencia
que todos os objetos recebem um nome (comum) mediante uma ao deliberada de escolha,
individual (como em Gnesis) ou coletiva. Esse nome recebe uma funo de significao, ou
melhor, passa a significar algo no mundo, sua referncia. A nomeao configura-se como um
processo operacional de conhecer e denominar coisas. Conforme De Lastra e Garcia (s/d apud
DICK, 1990), para ser denominado, o mundo externo deve antes passar a ser interno (ntimo).
Na relao das prticas de nomeao, segundo Lpez (2013), ocorrem fatores internos
e externos da seguinte forma: i. mudanas internas, quando elementos do sistema toponmico,
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que designa lugares, passam para o sistema antroponmico, que designa pessoas; ii. mudanas
externas ou foradas, como as que ocorreram na Europa, entre os sculos XVIII e XIX, e
obrigaram os judeus a adotarem nomes cristos e abandonarem os seus de origem hebraica.
Para os judeus, assim como para muitos povos, perder o nome o mesmo que perder a histria,
a identidade e a famlia. Desta forma, as autoridades europeias acreditavam que os judeus
deixariam (perderiam) as suas identidades e constituiriam uma nova, uma identidade europeia.
Convm, ressaltar que o referente1 nem sempre figurou entre os elementos constitutivos
do signo lingustico. No Curso de Lingustica Geral, Ferdinand Saussure (2008) define o signo
lingustico como a juno de uma imagem acstica (significante) a um (ou vrios) conceitos
(significado). Saussure no inclui nessa definio a coisa nomeada, o objeto do mundo ou, em
outros termos, o referente.
Dito de outro modo, os gestos epistemolgicos de Saussure (2008), ao definirem a
lngua como objeto prprio de estudo e tambm no sentido de imprimirem cientificidade aos
estudos lingusticos, excluem o referente, construindo assim um domnio especfico para a
Lingustica, diferente de outras reas que tambm se atm aos estudos da linguagem humana.
A lngua, para o mestre suo, um sistema de signos que, por sua vez, abarca entidades
psquicas constitudas por duas faces: significante e significado. Essas duas faces do signo
lingustico no guardam, porm, entre si, qualquer relao lgica, nenhum vnculo, ou melhor,
a relao entre significante e significado marcada pelo seu carter imotivado, arbitrrio, para
usar os termos saussurianos. Desta forma, Kristeva (2007, p. 24) afirma que a palavra
arbitrrio significa mais exatamente imotivado, quer dizer que no h nenhuma necessidade
natural ou real que ligue o significante e o significado.
O nome sempre suscitou uma questo ontolgica2, ou melhor, uma questo de
existncia. A nomeao apenas uma das funes da linguagem, mas tem um papel importante,
pois o significado dos nomes organiza e classifica as formas de perceber a realidade, alm de
estar ligado diretamente a uma cultura ou comunidade. Assim, para Sapir (1980), a lngua
recorta a realidade sua maneira; por meio dela que se evidencia a relao linguagem,
pensamento e cultura. Desta forma, as palavras da lngua significam ao funcionarem no
acontecimento. Este funcionamento recorta politicamente o real. (GUIMARES, 2005, p. 82).
Nessa perspectiva, possvel dizer que a nomeao ganha relevo quando o assunto a relao
linguagem e realidade.
1 Em um sistema tridico: significante, significado e o referente. 2 Ontolgico: Adj 1 relativo a Ontologia; 2 que trata do ser humano na sua essncia, na sua globalidade. Verbete
inscrito em: (BORBA, 2004, p. 992).
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Guiraud (1986) chama ateno para a fora criadora da linguagem que resulta em uma
funo semntica dinmica e voltil, orientada principalmente por fatores especficos de uma
dada cultura. Assim,
[...] a motivao uma fora criadora inerente linguagem social, que um
organismo vivo de origem emprica; somente depois que a palavra criada e
motivada (naturalmente ou intralinguisticamente) que as exigncias da
funo semntica acarretam um obscurecimento dessa motivao etimolgica
que pode alis, ao se apagar, trazer uma alterao de sentido (GUIRAUD,
1986, p. 31).
Motivao esta que, com o decorrer do tempo, pode vir a se tornar obscura pelo
distanciamento temporal do fato que lhe deu origem. Pode, inclusive, o nome sofrer inmeras
alteraes de sentido, sem nenhum vnculo semntico com o significado original nem com o
fenmeno de sua ocorrncia primeira. No entanto, foroso ressaltar, mais uma vez, que o ato
de nomear motivado, conforme Guiraud (1986), a nomeao inerente linguagem, e decorre
da relao entre homem e ambiente ao reconhecer os objetos do mundo extralingustico.
No que tange motivao, Biderman (1998) reafirma a noo de que o nome no
arbitrrio, ele tem um vnculo de essncia com a coisa ou o objeto que designa. Assim, o homem
primitivo acredita que seu nome tem parte vital com o seu ser. Nas histrias que nos so
relatadas dos povos primitivos em relao aos nomes, podemos observar que, para alguns,
quando se sabia o nome da pessoa, o inimigo poderia fazer magia negra com ele. Essas relaes
culturais com os nomes so recorrentes em vrios pases e histrias da antiguidade clssica.
De acordo com Frazer (1951), em vrias tribos primitivas, o nome era considerado como
uma realidade e no uma conveno artificial, podendo servir de intermdio para fazer atuar a
magia sobre a pessoa, como se fosse parte do indivduo, como cabelo, unha ou qualquer outra
parte fsica. Essas crendices ou mitos acerca do nome se estendem por vrias partes do mundo,
como: para os ndios da Amrica do Norte, o nome como uma parte de seu corpo, e o mau
tratamento (uso) dele pode trazer ferimento fsico. Assim, o nome no deve ser pronunciado,
podendo no ato de sua pronunciao/materializao revelar as propriedades reais da pessoa que
o usa, e assim, torn-la vulnervel perante os seus inimigos.
Nas narrativas das sociedades relatadas por Frazer (1951), o homem do povo esquim
recebe um novo nome ao chegar velhice; na frica, as pessoas podem at receber uma dzia
de nomes no decorrer de sua vida e, em alguns casos, no incio de sua vida, recebem dois nomes,
um nome de preto, usado em casa e junto famlia e outro nome de branco, usado na escola e
na sociedade; os egpcios tambm recebiam dois nomes: um nome pequeno, que era bom e
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usado em famlia, e um nome grande, que era mau e dissimulado; julgamos esse ltimo ser
usado na sociedade.
Segundo Frazer (1951), para os Celtas, o nome era sinnimo da alma e da respirao.
Entre os Yuns (sul da Austrlia) e outros povos, o pai revela o nome ao filho no momento da
iniciao e poucas pessoas o conhecem. Tambm na Austrlia, as pessoas deixam de usar o
nome e passam a chamar um ao outro de primo, tio, sobrinho ou irmo. Nessas relaes, as
historietas dos nomes vo estar sempre entrelaadas aos fatores culturais das comunidades.
Em muitas culturas, Frazer (1951) relata que a no pronunciao de nomes era tabu,
como em Cafres, onde as mulheres no podiam pronunciar o nome de seus maridos ou sogros,
nem qualquer palavra que se assemelhasse aos nomes. Tambm no era permitido pronunciar
nomes de animais, plantas, reis, deuses, personagens sagrados considerados perigosos, pois isso
seria como invocar o prprio perigo.
Frazer (1951) revela uma histria ocorrida no Egito com o deus R, que tinha vrios
nomes, mas o seu verdadeiro nome que lhe dava poder sobre os outros deuses no era conhecido
e, ao ser enfeitiado pela invejosa deusa sis picado por uma serpente cujo veneno s seria
retirado de seu corpo no momento em que ele revelasse o seu verdadeiro nome, R lamenta-se
Eu sou aquele que tem muitos nomes e muitas formas... O meu pai e minha me disseram-me
o meu nome; est escondido no meu corpo desde o meu nascimento para que no se possa dar
nenhum poder mgico a algum que me queira lanar uma maldio. (FRAZER, 1951 apud
KRISTEVA, 2007, p. 64). O veneno tomou conta do corpo de R e j no conseguia andar. sis
continuou a atormentar o deus e o veneno foi penetrando profundamente e queimava seu corpo.
Ento, R consentiu que Isis buscasse o seu verdadeiro nome no ntimo do seu ser, assim ela
fez, arrebatou-lhe o verdadeiro nome e ordenou que o veneno que o queimava casse por terra
e libertasse o deus, pois o que ela queria j havia conseguido. Acreditava-se, assim que quem
conhecesse o verdadeiro nome de um deus (algum), possuiria a sua essncia, o seu verdadeiro
ser e at o seu poder.
Segundo Lpez (2013), os nomes variam conforme o momento e o local em que so
escolhidos, a pessoa que os escolhe e as normas para o uso. Podem indicar gnero, filiao,
origem geogrfica, religio e etnia. H tambm inmeras crenas de que existe uma relao
entre a pessoa, seu nome e o significado deste; inclusive, muitos nomes so nicos.
Segundo Cunha (2004, p. 226), O nome prprio, topnimo ou antropnimo, participa
da literariedade do texto, podendo consequentemente, enriquecer-se de valores semnticos
denotativos e conotativos da mesma forma que as outras palavras que o estruturam., j que,
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quando nomeamos, atribumos simultaneamente um predicado, um complemento ao nome, uma
caracterstica, um adjetivo.
Em Guimares (2005), o ato de dar nome tambm um ato de identificar um indivduo
biolgico como tal para o Estado e para a sociedade e torn-lo sujeito. De acordo com esse
ponto de vista, ganha interesse o funcionamento determinativo da construo do nome prprio
da pessoa no qual, segundo Guimares (2005, p. 52), h uma relao particular entre a
nomeao e o objeto nomeado que se apresenta por uma materialidade histrica e no fsica.
A nomeao , por causa da predicao, um ato que diferencia, sendo tambm um ato
que identifica. De acordo com Lima (2007, p. 51),
o acto (sic) de nomear um dos primeiros momentos de insero da pessoa
numa categoria social de gnero... Mas ainda, mostra-nos que, neste contexto
social, nomear uma das formas mais importantes de construir gnero e
pessoa dentro da famlia.
A insero da pessoa na sociedade por meio de seu nome uma relao hierarquizada,
construda luz de valores tanto sociais como familiares. Como j sabemos, o nome uma
forma de identidade, de revelar o que o outro no , assim, nomear um aspecto crucial da
converso de qualquer um em algum, de acordo com Geertz (1973).
Na converso mencionada, Parkin (1989) justifica que nomear pode ser uma forma de
atribuir direitos3, que d autoridade tanto ao nomeado, quanto ao nomeador, ou uma forma de
objetivao, por meio da escolha de um nome em particular, que estabelea controle sobre o
nomeado. Nessas situaes, pode ocorrer que as pessoas antecipem essas consequncias
escolhendo ou controlando a atribuio do seu prprio nome, ou em alguns casos como
acontece de o nome possuir uma carga negativa perante a sociedade, e a pessoa recorre ao poder
judicirio para requerer a troca de seu nome.
Enfim, nomear se apropriar do real, nessa perspectiva de nomear e apoderar, fato
este que se d por meio da linguagem, e de acordo com isso Kristeva (2007, p. 17) pontua que:
Se a linguagem matria do pensamento, tambm o prprio elemento da
comunicao social. No h sociedade sem linguagem, tal como no h
sociedade sem comunicao. Tudo o que se produz como linguagem tem lugar
na troca social para ser comunicado.
3 Livre traduo para Entitling.
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nessa troca social que acontece, por meio da linguagem, a nomeao. Assim,
necessrio destacar que os nomes prprios de lugares topnimos passam a estabelecer
relaes materializadas, por meio do uso da linguagem. Sabe-se que o nome designado
construdo simbolicamente, isso porque a linguagem que o constri funciona por estar exposta
ao real e constituda materialmente pela histria local, a qual motiva o lxico topnimo, e
nesse momento que ele nasce e se institui naquele lugar.
De acordo com Biderman (1998), por meio da palavra que as entidades da realidade
passam a ser conhecidas, nomeadas e identificadas. Essa realidade cria o seu mbito
significativo, que nos revelado pela linguagem, que tambm a responsvel por elencar os
fatores scio-histrico-cultural que permeiam a realidade. Aqui, no nosso caso, esses fatores
so trazidos por meio do lxico topnimo, mais especificamente, no ato de nomear um
designativo de lugar.
Conforme Crystal (2012), muitas so as razes para designar o nome de lugares, seja
em homenagem a algum, como o caso da cidade de Pires do Rio, que recebeu o nome, o
patronmico4 do ento Ministro da Viao e Obras Pblicas (1919-1922) do governo de Epitcio
Pessoa, Dr. Jos Pires do Rio. H lugares que recebem o nome em razo de caractersticas
geogrficas. Alguns nomes so opacos, conceito de Piel (1979), em contraposio aos
transparentes, pois no apresentam relao alguma com o referente; nesse caso, h de se fazer
uma busca histrica para chegar relao motivacional.
O homem tem a capacidade de associar palavras a conceitos. E, no ato de nomear,
acontece a motivao, que est ligada aos fatores cognitivos. Assim, o lxico que a ele
determinado, por meio do uso da linguagem, se transporta no tempo, sendo capaz de revelar os
fatores culturais e motivacionais que esto nesse nome/lxico toponmico (BIDERMAN, 1998).
O nome comum, no ato de nomeao de um lugar, impregna-se de significaes vrias,
sejam de fatores histricos, culturais, sociais, econmicos. Segundo Guimares (2005, p. 83),
o modo de significar os espaos da cidade mostra que eles so espaos polticos. O espao que
se d como objeto, por uma descrio (referncias), atende a objetividade do discurso
administrativo, que nomeia oficialmente os espaos da cidade. Assim, o nome cifra a narrativa
histrica local, perpassando por fatores ou designativos memorveis.
Essa atividade de nomeao ou prtica de nomeao especificamente da espcie
humana e resulta do processo de categorizao, inerente ao ser humano. De acordo com
Biderman (1998, p. 89):
4 De acordo com Cabral (2007), patronmico sobrenome.
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O processo de categorizao subjaz semntica de uma lngua natural. Os
critrios de classificao usados para classificar os objetos so muito
diferenciados e variados. s vezes, o critrio o uso que o homem faz de um
dado objeto; s vezes, um determinado aspecto do objeto que fundamenta a
classificao; s vezes, um determinado aspecto emocional que um objeto
pode provocar em quem o v, e assim por diante.
Ento, o processo de categorizao, que por via das vezes pode se tornar um legislador
nomeador. Essas discusses acerca das histrias do ato de nomear revelam formas de
organizao social e mudanas lingusticas, polticas e culturais. pois, por meio do nome que
as pessoas ou lugares permanecem vivos na memria coletiva de sua linhagem.
E nesse processo de nomeao, categorizao e motivao nos estudos na rea da
Onomstica, mais precisamente na subrea dos Estudos Toponmicos temtica de nossa
pesquisa , no tem como desvencilhar a lngua e cultura. Assim, para Sapir-Whorf, a lngua
retrata o mundo e a realidade social sua volta, expressos por categorias lexicais, como os
topnimos.
1.2 Lngua e Cultura
A lngua no contexto scio-histrico-cultural nada mais que o resultado de um
processo histrico, um produto revelador da cultura de uma dada comunidade (CMARA JR,
1955). Nessas bases, inter-relacionar lngua e cultura justificar que esto intrinsecamente
interligadas, pois a lngua revela a viso de mundo e tambm a manifestao de uma cultura,
cultura esta que lhe d suporte; a lngua tambm suporte da cultura.
Em seus estudos, Paula (2007) menciona que a lngua um metassistema, ela no s
objeto; ela , nas relaes sociais mais diversamente possveis, tambm instrumento de
investigao distinto que ajuda a entender os outros sistemas sociais (PAULA, 2007, p. 90).
Nesse contexto, possvel evidenciar que, por meio da lngua, so reeditadas e reconfiguradas
as prticas culturais de uma dada comunidade.
Posto isso, convm rever alguns conceitos que remetem face social da lngua, seu
carter eminentemente social, mais condizente com o recorte epistemolgico feito por Saussure
(2008, p. 17):
Mas o que a lngua? Para ns, ela no se confunde com a linguagem;
somente uma parte determinada, essencial dela, indubitavelmente. , ao
mesmo tempo, um produto social da faculdade de linguagem e um conjunto
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de convenes necessrias, adotadas pelo corpo social para permitir o
exerccio dessa faculdade nos indivduos. Tomada em seu todo, a linguagem
multiforme e heterclita; o cavaleiro de diferentes domnios, ao mesmo
tempo fsica, fisiolgica e psquica, ela pertence alm disso ao domnio
individual e ao domnio social; no se deixa classificar em nenhuma categoria
de fatos humanos, pois no se sabe como inferir sua unidade.
De acordo com Fiorin (2013, p. 17), A lngua no um sistema de mostrao de
objetos, porque permite falar do que est presente e do que est ausente, do que existe e do que
no existe, porque possibilita at criar novas realidades, mundos no existentes. A lngua um
produto social e por meio dela se criam e recriam realidades, podendo ento se justificar as
prticas culturais por meio de atos lingusticos.
Com esse movimento epistemolgico, ou melhor, ao eleger a lngua, e no a linguagem
nem a fala, como objeto de estudo da Lingustica, Saussure possibilitou a instituio da cincia
lingustica e, consequentemente, seus inmeros desdobramentos posteriores.
Sapir (1980) ressalta a estreita ligao entre lngua e cultura, j que, para o autor:
Toda lngua tem uma sede. O povo que a fala, pertence a uma raa (ou a certo
nmero de raas), isto , a um grupo de homens que se destaca de outros
grupos por caracteres fsicos. Por outro lado, a lngua no existe isolada de
uma cultura, isto , de um conjunto socialmente herdado por prticas e crenas
que determinam a trama das nossas vidas (SAPIR, 1980, p. 165).
Nesta perspectiva, reafirmando que lngua se difere de linguagem, mas se entrecruza
com ela ou dela faz parte como uma das inmeras formas de linguagem e ainda considerando-
a um dos fatores de identidade de um povo e que no existe isolada da cultura, que se torna
objeto de estudos, o que envolve fatores scio-histrico-culturais das comunidades.
O autor, desta forma, ainda nos revela, que toda lngua est de tal modo construda,
que diante de tudo que um falante deseje comunicar, por mais original ou bizarra que seja a sua
ideia ou a sua fantasia, a lngua est em condies de satisfaz-lo (SAPIR, 1969, p. 33).
nessas condies de satisfazer ao falante ou comunidade que ele pertence, que a lngua se
justifica como um meio de interao social e revelador da cultura, j que ela se configura no
tempo e capaz de transmitir de geraes a geraes, atravs de atos lingusticos, as
manifestaes culturais. Convm ressaltar que:
Tudo que, at aqui, verificamos ser verdade a respeito das lnguas, indica que
se trata da obra mais notvel colossal que o esprito humano jamais
desenvolveu: nada menos do que uma forma completa de expresso para toda
a experincia comunicvel. Essa forma pode ser variada de inmeras maneiras
pelo indivduo, sem perder com isso os seus contornos distintivos; e est
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constantemente remodelando-se, como sucede com toda arte. A lngua a arte
mais ampla e macia que se nos depara, cmulo annimo do trabalho
inconsciente das geraes (SAPIR, 1980, p. 172).
De acordo com Cmara Jr. (1955), a lngua uma parte da cultura, mas ela pode ser
estudada na sua relao com a cultura ou sem considerar essa inter-relao. Segundo o autor,
com essa perspectiva, o linguista se destaca do antroplogo. Porque os estudos lingusticos
podem prescindir do exame da inter-relao lngua e cultura, ou melhor, pode-se estudar a
lngua em sua imanncia ou a relao da linguagem com outras reas do conhecimento humano.
A lngua, alm de inter-relacionar a cultura na/da sociedade, atua para que a prpria
cultura seja conhecida e levada geraes futuras, seja por meio de festas religiosas, cantigas,
e outros fatores que a divulguem. J que, na mesma base terica, a lngua se justifica como um
fato de cultura, assim como qualquer outro, e neste nterim integra-se cultura.
Cmara Jr. (1955) reconhece que a lngua funciona na sociedade para a comunicao e
interao dos indivduos, e, tambm, que ela se torna o resultado de uma cultura global, pois, a
lngua depende de toda cultura, j que a expressa a todo o momento,
assim a lngua, em face do resto da cultura, o resultado dessa cultura, ou
sua smula, o meio para ela operar, a condio para ela subsistir. E mais
ainda: s existe funcionalmente para tanto: englobar a cultura, comunic-la e
transmiti-la (CMARA JR, 1955, p. 54).
Considerada a inter-relao lngua e cultura, pode-se ressaltar mais uma vez que a
cultura se manifesta linguisticamente, sejam elas integrantes de manifestaes da cultura
popular ou da erudita:
De modo geral, a cultura pensada numa viso polarizante, como sendo
cultura popular ou cultura erudita. Convm dizer, porm, que ambas so
formas e contedos diferentes de expresso de uma dada realidade social e
histrica. Ento, no devem ser vistas como opostas ou excludentes, mas como
maneiras especficas de ver, sentir e expressar a realidade conforme se situam
seus atores na produo e circulao do poder (PAULA, 2007, p. 75).
Neste processo, Sapir (1969) menciona que o lxico o nvel lingustico em que mais
intimamente se interligam lngua e cultura. Zavaglia (2012) por sua vez, reconhece que o lxico
est vinculado cultura de um povo, de uma nao, sua histria.
Para Zavaglia (2012), o lxico est relacionado com a memria humana e se configura
no ato de nomeao, diante do processo em que houve a necessidade de o homem, por meio de
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palavras, nomear tudo que o circundava e, assim, categorizar o que estava a seu redor. Pautados
na autora, observamos a grandeza do lxico, pois:
o lxico, em forma de palavras e por meio da linguagem, que conta a
histria milenar de povo para povo; o lxico que transmite os elementos
culturais de um conjunto de indivduos; o lxico que educa ou deseduca;
o lxico que permite a manifestao dos sentimentos humanos, de suas
afeies ou desagrados, via oral ou via escrita. o lxico que registra o
desencadear das aes de uma sociedade, suas mudanas, seu progresso ou
regresso. Condivido com Biderman quando diz que o lxico o tesouro
vocabular de forma codificada da memria do indivduo, restando ali estocado
at que seja ativado quando necessrio para que o homem possa expressar ou
se comunicar. ainda por meio do lxico que conceitos, condutas e costumes
so transmitidos de geraes a geraes e herdados por elas. o lxico que
fisionomiza a cultura (ZAVAGLIA, 2012, p. 233).
O lxico o fio condutor da cultura j que a transporta para geraes futuras; por meio
dele que se registra a histria e a vida de uma sociedade. Para Sapir (1969), a cultura est
nitidamente no lxico da lngua, e este pode ser considerado como todo o conjunto de ideias,
interesses e ocupaes que abrangem a ateno da comunidade. Neste contexto:
O estudo cuidadoso de um dado lxico conduz a inferncias sobre o ambiente
fsico e social daqueles que o empregam; e, ainda mais, que o aspecto
relativamente transparente ou no-transparente do prprio lxico nos permite
deduzir o grau de familiaridade que se tem adquirido com os vrios elementos
do ambiente (SAPIR, 1969, p. 49).
possvel ressaltar que o lxico da lngua contm um recorte da realidade feito sua
maneira, que revela vises de mundo. Os elementos culturais que matizam, do o colorido de
significao ao lxico, mostram de diferentes maneiras as relaes que ambas, lngua e cultura,
tm com o ambiente, seja fsico ou social, pois toda complexidade dessa inter-relao pode ser
anunciada e enunciada no uso da linguagem.
Vale ento ressaltar,
Que o lxico assim reflita em alto grau a complexidade da cultura
praticamente um fato de evidncia imediata, pois o lxico, ou seja, o assunto
de uma lngua, destina-se em qualquer poca a funcionar como um conjunto
de smbolos, referentes ao quadro cultural do grupo. Se por complexidade de
uma lngua se entende a srie de interesses implcitos em seu lxico, no
preciso dizer que h uma correlao constante entre a complexidade
lingustica e cultural (SAPIR, 1969, p. 51).
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O conjunto de signos da lngua ultrapassa as fronteiras do tempo, trazendo para a
atualidade smbolos tambm culturais que so revelados por meio de prticas culturais, que se
interseccionam com as prticas lingusticas. Assim,
No s as palavras da lngua passam a servir de smbolos culturais dispersos,
como sucede nas lnguas em qualquer perodo de desenvolvimento, mas se
pode supor que as prprias categorias e processos gramaticais simbolizariam
tipos correspondentes de pensamento e atividade de significao cultural. At
certo ponto, pode se conceber, portanto, a cultura e a lngua em constante
estado de interao e em associao definida por um largo lapso de tempo.
Mas tal estado de correlao no pode continuar indefinidamente (SAPIR,
1969, p. 60).
Segundo Sapir (1969) a linguagem possui o papel de produzir e organizar o mundo
mediante o processo de simbolizao. Contudo, a realidade mostrada por meio da linguagem,
o que significa dizer que no h mundos iguais, visto que no h lnguas iguais. De acordo com
estas observaes, cabe ressaltar o relativismo lingustico, Hiptese de Sapir-Whorf, a
linguagem determina a forma de ver o mundo, e consequentemente, de se relacionar com esse
mundo.
O relativismo lingustico pode ser entendido como a relao linguagem e pensamento
mediada pela cultura; desta forma, linguagem, pensamento e cultura esto conectados. Sapir-
Whorf observam que a realidade social produto lingustico, tratando assim as relaes de
linguagem/cultura e linguagem/pensamento, a cultura pode ser considerada como
conhecimento adquirido socialmente, por meio das prticas lingusticas.
De maneira geral, diz-se que a cultura o conhecimento que as pessoas detm acerca de
uma comunidade, seja em seus mbitos popular ou cientfico, os quais ultrapassam o tempo,
por meio da lngua, j que A cultura o conjunto do que o homem criou na base das suas
faculdades humanas: abrange o mundo humano em contraste com o mundo fsico e o mundo
biolgico (CMARA JR, 1955, p. 51).
Em outras palavras:
Cultura o conjunto de prticas sociais, situadas historicamente, que se
referem a uma sociedade e que a fazem diferente de outra. Baseia-se na
construo social de sentidos a aes, crenas, hbitos, objetos que passam a
simbolizar aspectos da vivncia humana em coletividade (PAULA, 2007, p.
74).
A diversidade tambm se reflete na cultura, pois de acordo com Bosi:
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[...] no existe uma cultura brasileira homognea, matriz de nossos
comportamentos e dos nossos discursos. Ao contrrio: a admisso do seu
carter plural um passo decisivo para compreend-la como um efeito de
sentido, resultado de um processo de mltiplas interaes e oposies no
tempo e no espao (BOSI, 1987, p. 7).
Neste sentido, a cultura se constri a partir das vivncias e significados que lhe so
atribudos pela prpria sociedade em suas prticas sociais, e constituindo-se tambm em
diferena. Para Bosi (1987, p. 11), o fundamento da cultura popular o retorno de situaes e
atos que a memria grupal refora, atribuindo-lhes valor. Isso so as marcas identitrias da
comunidade que so deixadas e vivenciadas (ou vivificadas) tempos depois. A cultura popular
revelada por meio de prticas culturais e lingusticas, que levam a pblico as relaes scio-
histrica-culturais de determinadas comunidades.
A cultura se constri com base nos valores atribudos pelos sujeitos s relaes
cotidianas e nas relaes de poder. Organiza-se como popular e/ou erudita. Nesse sentido, no
existe cultura melhor nem pior, cada uma expressa pelo seu grupo social, pois cada indivduo
tem uma forma de ver o mundo, modos de vestir, de comer, os meios para se curar, os remdios;
os modos de plantar, de cultivar e colher; os modos de nomear e categorizar os elementos da
natureza e outros tantos mais. Desta forma, conforme as pessoas entendem que participam de
uma cultura esforam-se para agir dentro do que julgam ser pertinente a ela (PAULA, 2007,
p. 75).
Cultura, lngua e identidade no so algo fixo, pronto e acabado, estando sempre em
constituio, uma vez que so produzidas por seres sociais que se encontram em processo de
interao, aprendizado, conhecimento e esto inseridos em contextos sociais que passam por
transformaes. O lxico o meio pelo qual a cultura e a identidade se constroem e se
disseminam.
Na viso de Paula (2007, p. 89), a memria o depositrio tanto da cultura como da
lngua, visto que:
O modo como se estrutura poltica e economicamente uma sociedade diz
muito de suas estruturas culturais; estas, por sua vez, s se fazem possveis
graas elaborao cotidiana do arcabouo de memria coletiva, ao modo
como concebida e ao estatuto que lhe dado. Expressando estas inter-
relaes, servindo a elas no cotidiano da comunicao humana e carregando
em seu funcionamento muito do modo como a sociedade se faz e se refaz est
a lngua.
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Os processos culturais que so construdos por meio de atos lingusticos so uma forma
identitria de dada comunidade, que expressa por relaes sociais como forma de conduzir e
expressar-se perante as demais comunidades, sejam elas internacionais, nacionais ou regionais,
sabemos que a cultura a miscigenao de outras culturas.
1.3 A toponmia e o estudo dos nomes
Embora faa parte do cotidiano das pessoas, portanto estreitamente ligado cultura, no
h muita discusso referente ao nome prprio e aos motivos de algum ou um lugar ter o nome
que tem. Entretanto, conforme Carvalhinhos (2002), j no sculo II a.C., com o gramtico
Dionsio Trcia, o estudo sobre o nome j tinha sido pensado e formulado. Esses estudos
propiciaram, por sua vez, o surgimento da Onomstica, a cincia que se ocupa dos estudos da
origem e alteraes (na forma e no significado) dos nomes prprios. A Onomstica um ramo
das cincias lingusticas que pode-se efetuar em duas vertentes: a toponmia (estudo do
topnimo ou nome de lugar) e a antroponmia (estudo do nome pessoal).
Conforme Dubois (2004) e Houaiss (2004), a Onomstica um ramo da lexicologia e
seu mtodo de trabalho deve-se desenvolver em linha documental mediante a observao de
dados oficiais como mapas, listas de nomes ou outros documentos de valor historiogrfico e
lexicogrfico. Isso possibilita a juno da histria da nomenclatura com momentos histricos e
sociais mais amplos.
No entanto, mesmo pertencendo cincia da linguagem, a Onomstica se estabelece por
meio do suporte de outras reas do conhecimento, como a Antropologia, a Etnografia, a
Botnica, a Geografia e a Histria. Neste sentido, no equivocado salientar que a Onomstica
um campo de amplo carter interdisciplinar.
Assim, a Onomstica ou Onomasiologia o ramo da cincia lingustica que tem o nome
prprio como objeto de estudo, e se constri em relao a outros campos do saber. Contudo, ao
relacionar o seu conhecimento aos de outras reas, ela no os confunde, nem os nega.
De acordo com Ramos e Bastos (2010), a Onomstica assume uma perspectiva
integralizadora de mtodos e demanda um considervel nmero de conhecimentos de campos
diversos, de maneira direta ou indireta e vertical ou horizontal, destacando-se a lingustica, com
valorao da pesquisa etimolgica.
Conforme dito, a Onomstica, para efeito de estudo, pode ser dividida em dois eixos: a
Antroponmia e a Toponmia. Estas, por sua vez, podem apresentar subdivises, dependendo
de algumas consideraes acerca das caractersticas que cada uma sua maneira apresenta.
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A Toponmia, conforme Piel (1979), de acordo com o objeto de denominao, pode
denominar-se tambm como astronmia, hidronmia, litonmia, odonmia, oronmia, para citar
apenas alguns termos que correspondem a objetos que constituem ou so constitudos por
formaes aquosas, astros, formaes ptreas, serras, vias ou caminhos.
J a Antroponmia volta sua ateno para o estudo dos nomes de batismo, dos
sobrenomes, patronmicos (ou matronmicos) e, ainda, das alcunhas, dos apelidos e de nomes
diminutivos. A Antroponmia, semelhana da Toponmia, no se constitui de forma
homognea, j que h uma srie de tradies conforme os povos ou culturas que desenvolveram
esses sistemas antroponmicos. Por outro lado, consenso afirmar que os nomes pessoais so
um aspecto comum ou universal nas lnguas porque as pessoas recebem um nome, em algum
momento de suas vidas, em todas as sociedades conhecidas do mundo.
De acordo com Dick (1992), as intenes e as motivaes que subjazem escolha dos
nomes em cada sociedade variam bastante. Os estudos dos sistemas onomsticos vm confirmar
isso porque os nomes existem e so controlados pelas necessidades e prticas sociais, as quais
podem variar de acordo com a viso de mundo de um determinado povo.
Posto isso, convm conceber a Onomstica como uma disciplina que deve focar como
objeto de estudo os sistemas de denominao que justifiquem os processos de atribuio de
nomes de uma maneira geral.
Em Sols (1997), os nomes so o resultado de algo que os provoca, isto , o sistema
denominativo elaborado pelas culturas para atribuir nomes s coisas apreendidas por sua
atividade cognitiva.
Devido ao fato de a Onomstica estender-se a um amplo campo de estudo, ou seja, que
se volta tanto para o estudo dos nomes prprios de pessoas como s designaes dos lugares,
imperioso delimitar para este estudo apenas o sistema onomstico voltado para os nomes de
lugar, isto , para a toponmia, caracterizando como objeto de estudo os nomes dos cursos
dgua do municpio de Pires do Rio.
A despeito de incorrer em lugar comum, convm rever os constituintes da palavra
toponmia, cujo significado etimolgico pode ser assim expresso: do grego topos (lugar) e
onoma (nome). A Toponmia se ocupa dos locativos (tambm componentes do lxico da lngua)
com o fito de estudar a origem, as significaes e as transformaes por que passam ou
passaram esses nomes. A Toponmia se dedica ao estudo no apenas dos nomes de comunidades
humanas (cidades, povoados, vilas), como tambm elementos geogrficos, a exemplo os cursos
dguas.
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Os estudos toponmicos propiciam a percepo da relao entre povo, lngua e territrio,
considerando que esse territrio pode ser fsico e/ou imaginrio, j que as entidades do mundo
que precisam ser nomeadas podem ser pessoas, entidades geogrficas que fazem parte do
ambiente em que vive determinado povo e que, sobretudo, tenham importncia para esse povo,
pois se no tem importncia no h, em contrapartida, necessidade de ser nomeado. Convm,
no entanto, ressaltar que nem todas as nomeaes ocorrem pela necessidade espontnea de
identificao, uma vez que muitas delas refletem a imposio de foras ideolgicas, polticas e
sociais.
Neste sentido, surge a necessidade de reconhecer os objetos geogrficos da natureza,
tais como rios, mares, lagoas, ilhas, continentes, serras e outros, mas h outros que precisam
ser denominados tambm, principalmente, os objetos da cultura, aqueles criados pelo homem,
dentre os quais podem ser citados: os povoados, represas, moradias (habitao), ruas,
circunscries poltico-territoriais, que se situam em algum lugar do universo fsico.
No se pode omitir aqueles lugares cujo universo foi criado pela cultura imaterial, o
mundo no fsico. Sejam do universo real ou imaginrio, as entidades geogrficas so os
referentes dos topnimos que, por sua vez, integram a viso de mundo de um povo. Isso
constitui uma dificuldade em especificar que referentes existem no mundo fsico ou cultural,
em parte, porque para isso necessrio considerar uma cultura determinada. Em resposta a isso
h o reconhecimento da viso de mundo, que peculiar a cada cultura.
Muitos povos concebem o universo real como um mundo que tem seu correlato mtico
com outros mundos e fazem, assim, surgir universos de nomes toponmicos de variada riqueza
toponomstica porque tm lugares para nomear no espao fictcio criado nesse mundo. Assim,
alm de serem componentes lingusticos como tal, os nomes que compem um sistema de
denominao so ainda criaes socioculturais.
Ento, cabe Toponmia estudar tanto os nomes de lugares (os topnimos) como
componentes de uma lngua que so, como tambm o sistema de denominao organizado pelas
sociedades, para nomear os objetos fsicos ou imaginrios da sua cultura. Devido s diferentes
vises de mundo, tm-se diferentes formas de nomear essas entidades. Alm da viso de mundo,
em sociedades como a brasileira, podem contribuir para a formao de um sistema de nomeao
os movimentos sociais como fora impulsionadora de mudana social. Em relao realidade
brasileira, podem-se mencionar as polticas que vm acontecendo durante os mais de 500 anos
de histria brasileira, que tambm resultou em inmeras formaes e mudanas de designao
toponmica no Brasil.
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Cabe reiterar que a toponmia refere-se a nomes de lugares habitados ou no. Da uma
definio apropriada para o termo topnimo um nome de qualquer ponto localizvel no
espao terrestre que tenha recebido denominao. Definio essa que pode ser estendida para o
nome de qualquer ponto localizvel no mundo real ou em mundos imaginados pelas culturas,
em outras palavras, daqueles universos que existem por meio da atividade ideacional dos
homens.
Assim, por meio da relao povo-territrio que os nomes de lugar so estabelecidos.
Inicialmente, pela posse do territrio, uma vez que, segundo Couto (2007), o territrio uma
das primeiras referncias para que um agrupamento de pessoas possa receber o status de
comunidade e todo territrio entendido como tal tem de ter um nome, um topnimo. Desta
forma, recortam-se os aspectos do meio ambiente mais salientes aos olhos do povo como uma
espcie de acordo que permite a vivncia e a convivncia em sociedade no territrio apossado.
possvel afirmar que a nomeao dos lugares surgiu com a prpria humanidade. Os
registros antigos da histria da civilizao ratificam essa ao do homem sobre o lugar que
habita ou j habitou; so fatores que sugerem uma espcie de posse ou de domnio sobre o lugar,
por meio da significao, da organizao e da orientao pelo espao ocupado ou apenas
conhecido. Em contrapartida, o ato de nomeao se manifesta como a ao do meio fsico e
sociocultural sobre o homem.
nesta perspectiva que se podem considerar os estudos toponmicos em seu mbito
interdisciplinar porque congregam vrias reas do conhecimento humano. Os nomes de um
lugar so enfocados conforme a observao dos aspectos fsicos, socioculturais, mentais e
histricos, interligados ou em separados.
Assim, no equvoco conceber a Toponmia como objeto de estudo da Antropologia,
da Geografia, da Histria, ou ainda da Psicologia Social, para citar apenas algumas disciplinas.
possvel, segundo Dick (1992) realizar anlises do fenmeno toponmico em
consonncia terica com qualquer uma dessas reas, mas, para a autora, nenhuma delas, tomada
isoladamente ou com exclusivismo, alcanaria a plenitude do fenmeno toponmico. Em termos
lingusticos, a Toponmia recorre aos conhecimentos da Semntica, da Lexicologia, da
Etnolingustica, da Dialetologia e da Lingustica Histrica.
Mais recentemente, uma linha de anlise que tem oferecido contribuies importantes
aos estudos dos nomes de lugares a Lingustica Cognitiva. Suas pesquisas vm enfatizando
no s os modelos cognitivos, mas tambm os processos de categorizao, principalmente os
processos de analogia e contiguidade, prprios da metfora e da metonmia. Entend-los
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essencial para compreender os sistemas de nomeao como resultados da experincia e da
cognio humana com o corpo em relevo.
Esta perspectiva de anlise coaduna estudos que procuram reconhecer processos
cognitivos expressos na ao de denominar a realidade e, para tanto, fundamentam-se no corpo.
uma forma de nomear os lugares fsicos ou culturais mediante a percepo do denominador
na interao com meio ambiente fsico e cultural.
1.4 O signo lingustico em funo toponmica
Para realizar qualquer estudo onomstico, necessrio inicialmente buscar na teoria
lingustica os recursos para se explicar como uma forma lingustica se amlgama a um lugar
configurando uma relao entre esse lugar, suas caractersticas e o signo lingustico que passa
a design-lo. Em outras palavras, necessrio buscar conceitos que estejam em consonncia
com os preceitos5 onomstico-toponmicos.
por meio da lngua que se d a interao dos indivduos, e a mesma constitui-se de
signos lingusticos. Em outras palavras, o mundo humano, a realidade extralingustica e a
cultura constituem-se de signos. Calcados nas ideias de Charles Sanders Pierce (2005), tem-se
o conceito geral de que o signo algo que est por algo para algum. Convm salientar que
estar por uma noo bastante ampla, pois pode significar uma srie de coisas como
representar, caracterizar, fazer s vezes de, indicar, entre outros. Para Pierce (2005, p. 46),
um signo, ou representamem, algo que, sob certo aspecto ou de algum modo,
representa alguma coisa para algum. Dirige-se a algum, isto , cria na mente
dessa pessoa um signo equivalente ou talvez um signo melhor desenvolvido.
Ao signo, assim criado, denomino interpretante do primeiro signo. O signo
representa alguma coisa, seu objeto. Representa esse objeto no em todos os
aspectos, mas com referncia a um tipo de ideia que eu, por vezes, denominei
fundamento do representamem (Grifos do autor).
Assim, seguindo a concepo de Pierce (2005) sobre signo, pode-se formular que a
representao de alguma coisa para algum, est no lugar da coisa que ele representa e no a
coisa em si. Tem ainda a condio de perturbar a mente do interpretante, i. , daquele que v,
l ou ouve o signo, na tentativa de atribuir-lhe um significado. Dessa forma, possvel verificar
uma relao de interdependncia entre, pelo menos, trs extremos: i) a face perceptvel do
5 No captulo 2, so apresentados os mtodos usados na pesquisa.
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signo, o representamem, ou significante; ii) o que ele representa, o objeto ou referente e iii) o
que ele significa, interpretante ou significado.
Quadro 1 Tringulo da significao
Fonte: Adaptado a partir do original de Ogden-Richards (1972).
Para Pierce (2005), os signos so elementos tricotmicos6 e apresentam trs divises
amplas: (i) cone, (ii) ndice e (iii) smbolo. A despeito de serem conceitos mais pertinentes a
um estudo semitico, em grande parte, a motivao que subjaz ao designativo de lugar imprime
carter icnico, indicial ou simblico ao nome do lugar, o que acarreta uma dada categorizao.
Para Pierce (2005), (i) cones so os signos que apresentam as caractersticas
especficas, prprias, por analogia; formam-se pela primeira impresso/percepo que o
intrprete tem sobre as coisas do mundo real. um signo que guarda semelhanas entre o
significante e o significado. Em outras palavras, um cone uma representao - auditiva, visual
ou de outra espcie de alguma coisa. Uma fotografia, uma pintura, as imagens, diagramas so
exemplos de cones por evidenciar semelhana com o objeto representado. A semelhana tem
de ser estabelecida de forma quase que consciente por quem observa. No entanto, a semelhana
com o objeto representado pode ser extraordinria, como quando se observam as imagens sacras
ou cones menores, aqueles que aparecem na tela do computador; ou pode ser mais abstrata
como a que acontece com as placas de sinais em geral.
Em relao aos (ii) ndices, Pierce (2005) estabelece que so signos que esto numa
relao direta entre o representamem e o objeto. Um ndice (ou signo indexical) tem a funo
de indicar o que est nas suas proximidades. Nos ndices, a forma e o significado esto
interligados, so contguos, ou seja, caracteriza-se pela relao de contiguidade ou associao
com aquilo que representa. Aquilo que atrai a ateno em um objeto seu ndice. Apresentam
6 O que difere das caractersticas dicotmicas do signo lingustico para Saussure.
Conceito
(Significado)
Palavra Referente
(significante) (elementos da realidade)
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traos de diticos, j que os interlocutores podem recuperar o referente por meio de lembranas
de detalhes do objeto.
Encontram-se muito difundidos nos sistemas de comunicao (verbal ou no). So
amplamente empregados na linguagem mmica e gestual, no cdigo de trnsito. Os diticos so
signos indiciais imprescindveis, pois referem demonstrativamente, indicam a pessoa do
discurso, o lugar, a proximidade7 de espao e tempo entre outros. (iii) J os smbolos so signos
que se referem ao objeto em funo de uma conveno, de uma lei ou de associao geral de
ideias, ou melhor, por no haver uma relao de semelhana e nem contiguidade entre o
significante e o significado, ela estabelecida por conveno, de forma intencional e aprendida
nas relaes sociais. Os smbolos so considerados os signos genunos, esto reservados aos
seres humanos, porque as necessidades comunicativas exigem muito mais que indicaes
indexicais ou imitaes icnicas. O sistema mais elaborado de signos simblicos, certamente,
o das lnguas naturais na modalidade falada e na escrita tambm, sendo que a palavra o
smbolo por excelncia.
Por se constiturem de duas coisas que se encontram em prolongamento uma da outra,
i. , contguas, os signos indexicais podem se substituir mutuamente. Tambm os signos
icnicos podem tomar o lugar do objeto real. J os simblicos so superiores por permitirem
aos seres humanos ultrapassar os limites de contiguidade e semelhana porque estabelecem uma
relao simblica entre determinada forma e determinado significado. Todas essas relaes
icnica, indexical e simblica esto na base dos sistemas de linguagem.
Os signos lingusticos se vinculam noo de smbolo uma vez que a relao com o
objeto referido construda arbitrariamente, em uma espcie de acordo entre os membros de
uma comunidade de fala. Para Saussure (2008), o signo lingustico o resultado da associao
convencional entre o signific
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