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UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE
Centro de Ciências Biológicas e da Saúde
FELIPE TADEU GALANTE ROCHA DE VASCONCELOS
ESTUDO DAS CAUSAS GENÉTICAS DO ALBINISMO EM
MACACO-PREGO (SAPAJUS SP)
São Paulo
2014
UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE
CENTRO DE CIÊNCIAS BIOLÓGICAS E DA SAÚDE
CURSO DE CIÊNCIAS BIOLÓGICAS
Felipe Tadeu Galante Rocha de Vasconcelos
ESTUDO DAS CAUSAS GENÉTICAS DO ALBINISMO EM
MACACO-PREGO (SAPAJUS SP)
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao
Centro de Ciências Biológicas e da Saúde, da
Universidade Presbiteriana Mackenzie como parte
dos requisitos exigidos para a conclusão do Curso
de Ciências Biológicas.
Orientadora: Prof.ª Dr.ª Daniela Maria Oliveira Bonci
São Paulo
2014
AGRADECIMENTOS Agradeço à Profª Drª Daniela Maria Oliveira Bonci, por ter me aceito como aluno
de iniciação científica, por todas as conversas sobre o projeto e por ter demonstrado
o verdadeiro significado de “mãe científica”.
Agradeço à Drª. Einat Hauzman, além das conversas informais, por todo o apoio
durante o projeto, permitindo a apresentação deste trabalho e por ter participado da
arguição e contribuindo ainda mais para este trabalho.
Agradeço também à Drª Ana Paula Pimentel Costa pela participação na arguição
e contribuições e este trabalho.
Agradeço à minha família, minha mãe Rosana, minha avó Rosina, meu pai José
Flávio e meus tios José Luiz e Patrícia por terem me educado, me dado todo o apoio
emocional e financeiro para que eu pudesse chegar a esse momento.
Agradeço a todos os queridos amigos do laboratório, pelas conversas e
brincadeiras, tanto dentro quanto fora do laboratório, deixando o ambiente mais
descontraído, o que ajudou bastante durante o ano de trabalho, além do apoio
durante todo o ano.
Agradeço aos meus amigos Luiz Baran, Natália Carnevale e Gabrielly Souza que
foram mais que importantes e estiveram ao meu lado durante toda a minha trajetória
na faculdade e fora dela, sabendo que estarão ao meu lado em todos os momentos.
Por fim, agradeço a meus amigos mais antigos, pois mesmo que a vida nos
tenha levado a rumos diferentes, sempre encontramos um jeito de nos encontrar,
reviver lembranças antigas e viver outras novas, e que também sei que posso
sempre contar com essas pessoas maravilhosas em minha vida.
Resumo
Melanócitos são células pigmentadas que produzem e armazenam a melanina. O
gene da tirosinase (TYR) tem importante papel na via de síntese da melanina.
Mutações ou deleções neste gene causam o fenótipo de albinismo, síndrome
caracterizada pela perda de pigmentação na pele, olhos e cabelo, nistagmo e
diminuição de acuidade visual. Entre populações selvagens, o albinismo é
considerado um evento raro, devido à forte pressão seletiva. Animais albinos não
têm as mesmas habilidades de camuflagem, e são mais suscetíveis à predação,
além de apresentarem alterações visuais e imunológicas. O objetivo deste projeto foi
identificar a mutação genética responsável pelo albinismo em um indivíduo macaco-
prego do gênero Sapajus sp. Foram analisados onze macacos-prego, mantidos na
Escola Experimental de Primatas da UFPA, dos quais um indivíduo era albino e dez
não albinos. Estes últimos constituíram o grupo controle. O DNA dos animais foi
extraído a partir de 3 ml de amostra de sangue e a reação em cadeia da polimerase
(PCR) foi realizada para amplificar o gene TYR. Os produtos de PCR foram
sequenciados e, em seguida, foi realizada uma análise comparativa das sequências
para identificar a mutação gênica responsável pelo albinismo. Este projeto foi
aprovado pelo comitê de Ética da UFPA, processo Nº PS001/2005. A partir das
análises comparativas das sequências de DNA foi observada, apenas no indivíduo
albino, uma mutação C → T no nucleotídeo 64, códon 22, localizado no éxon 1 do
gene TYR. Nos indivíduos controle, o códon 22 (CGA) codifica o aminoácido
arginina, enquanto a mutação observada no indivíduo albino gera um stop codon
(TGA) que interrompe a leitura da sequência do gene da tirosinase. O albinismo
observado no Sapajus spp é causado por uma mutação do tipo nonsense C22TER
no exon 1 do gene TYR. Mutações do tipo nonsense no gene TYR também foram
previamente encontradas em macaco-rhesus (Macaca mulatta) e em humanos. A
mutação encontrada não foi descrita nem em humanos nem primatas não humanos
até o presente momento.
Palavras-chave: Genética, albinismo, tirosinase, Sapajus
5
Abstract
Melanocytes are pigmented cells that produce and store melanin. The tyrosinase
gene (TYR) has an important role in synthesis of melanin. Mutations or deletions
in TYR gene cause the phenotype of albinism a syndrome characterized by loss of
pigmentation in the skin, eyes and hair, nystagmus, and decreased visual acuity.
Among wild populations, albinism is considered a rare event, due to strong
selective pressure. Albino animals do not have the same skills of camouflage, and
are more susceptible to predation, besides presenting visual and immunological
impairments. The objective of this project was to identify the gene mutation
responsible for albinism in a capuchin monkey Sapajus sp. Eleven capuchin
monkeys maintained at the Experimental School of Primates UFPA were
analyzed, which an individual was albino and ten were non albino. The non-albino
animals constituted the control group. The DNA of each animal was extracted from
3 ml blood samples and the polymerase chain reaction (PCR) was carried out to
amplify the TYR gene. The PCR products were sequenced, and then, a
comparative sequence analysis to identify the mutation responsible for albinism
was performed. This project was approved by the Ethics Committee of the UFPA,
No. PS001 / 2005. From the comparative analysis of DNA sequences was
observed only in the albino monkey a mutation C → T at nucleotide 64, codon 22,
located in exon 1 of the TYR gene. In control subjects, the codon 22 (CGA)
encoding the amino acid arginine, whereas the mutation observed in the individual
albino generates a stop codon (TGA) which stops the reading sequence of the
tyrosinase gene. The albinism observed in Sapajus sp is caused by a nonsense
mutation in exon 1 C22TER TYR gene. Nonsense mutations in TYR gene have
been previously described in rhesus monkey (Macaca mulatta) and humans. But,
the mutation described here was not found or described in human or nonhuman
primates to date.
Keywords: Genetic, albinism, tyrosinase, Sapajus
6
Sumário Resumo .................................................................................................................. 4
Abstract ................................................................................................................. 5
1. INTRODUÇÃO ..................................................................................................... 7
1.1. Pigmentação .............................................................................................. 7
1.2. Albinismo ................................................................................................... 8
1.3. Sapajus sp ................................................................................................ 11
2. JUSTIFICATIVA .............................................................................................. 14
3. OBJETIVO ....................................................................................................... 14
4. MATERIAL E MÉTODOS ................................................................................ 14
4.1. Macaco-prego .......................................................................................... 15
4.2. Extração de DNA ...................................................................................... 15
4.3. Reação em Cadeia da Polimerase .......................................................... 16
4.4. Sequenciamento do DNA ........................................................................ 17
5. RESULTADOS E DISCUSSÃO ....................................................................... 18
6. CONCLUSÕES ................................................................................................ 19
7. REFERÊNCIAS................................................................................................ 20
Anexos ................................................................................................................ 24
7
1. INTRODUÇÃO
1.1. Pigmentação
A pigmentação da pele, cabelo e olhos em mamíferos é determinada por
uma mistura de fatores genéticos e ambientais. A herança genética é multifatorial
poligênica, na qual a determinação do fenótipo do individuo é resultado de vários
genes em conjunto com a influência do ambiente, como a exposição ao Sol (OTTO
et al, 1998).
Os grânulos de pigmento são produzidos e armazenados nas células
pigmentares ou cromatóforos. Em aves e mamíferos a diversidade de cromatóforos
foi perdida e o único tipo de célula pigmentada presente é o melanócito, célula que
sintetiza e armazena melanina (Bluhm et al., 2005). Os melanossomos, que são
organelas especializadas presentes nos melanócitos, são os responsáveis pela
síntese (dependente de diferentes genes) e deposição da melanina, além de
armazenarem a tirosinase sintetizada pelos ribossomos (MIOT et al, 2009).
A melanina é um polímero insolúvel que protege a pele contra os raios
ultravioletas, protegendo também contra alguns tipos de câncer, alem de conferir
cor à pele (MIOT et al, 2009). Ela é produzida a partir da tirosina, a qual é
convertida em Dopa e depois Dopaquinona pela tirosinase. A partir desse ponto a
via se divide em duas para a formação da eumelanina e da feomelanina pela ação
de diferentes agentes (LEVIN & STROH, 2011). A Figura 1 representa o esquema
da melanogênese (modificado de MIOT et al, 2009).
8
Figura 1. Esquema ilustrando o processo de melanogênese. Modificado de Miot et al.
(2009).
Alguns genes já são conhecidos pela sua relação com a pigmentação, como
os genes: ASIP, DCT, OCA2, SCL24A5, SCL45A2, TYR, TYRP1 e o MC1R. Este
último, quando expresso estimula a produção da eumelanina. Quando ocorre uma
mutação nesse gene impedindo sua expressão há uma produção aumentada de
feomelanina, resultando num individuo de pele clara e cabelo ruivo. Além disso, o
MC1R está envolvido também na suscetibilidade a formação de câncer de pele
(DESSINIOTI et al, 2011).
Além das mutações relacionadas a genes de pigmentação que produzem
indivíduos com cabelos ruivos, outras mutações são responsáveis pelo albinismo.
1.2. Albinismo
O albinismo é uma síndrome, caracterizada pela ausência ou perda de
pigmentação na pele, no cabelo e nos olhos, além de ser observado nistagmo,
fotofobia, estrabismo e perda de acuidade visual (MÁRTINEZ-GARCÍA &
MONTOLIU, 2013).
9
Existem duas classificações principais de albinismo em humanos:
- albinismo ocular (Ocular Albinism – OA), doença que afeta somente os
olhos, com redução da acuidade visual e fotofobia, com padrão de herança ligada
ao X, com mutações no gene GPR143 (LEVIN & STROH, 2011);
- albinismo oculocutâneo do tipo 1 (OCA 1), causado por mutações no gene
TYR o qual é responsável pela expressão da enzima tirosinase, e do tipo 2
(OCA2), causado por mutações no gene P o qual expressa a proteína P da família
das permeases. A proteína P não tem função totalmente conhecida, mas acredita-
se que ela está envolvida com o transporte de tirosina, regulação do pH e
maturação do melanossomo, além de possivelmente servir como ponto de controle
chave para determinação da variação da cor de pele (LEVIN & STROH, 2011).
Em humanos, sabe-se que o albinismo do tipo OCA1 ocorre por erro na
atividade da tirosinase e é uma herança autossômica recessiva, ao contrário do
albinismo do tipo OCA2 no qual o erro está ligado ao mau funcionamento do influxo
de tirosina no melanossomo (estrutura produtora de melanina, presente no
melanócito) e sua herança pode ser autossômica recessiva, com raras
observações de uma herança dominante (LEVIN & STROH, 2011).
Em animais não-humanos são consideradas outras anomalias (Miller, 2005),
como:
- o piebaldismo, caracterizado por uma perda de pigmentação em algumas
partes do corpo mantendo a pigmentação dos olhos;
- o leucismo, caracterizado pela perda total ou parcial da pigmentação por
todo o corpo, com exceção das extremidades e dos olhos negros ou azuis;
- e o albinismo, caracterizado por ausência de pigmentação do corpo (varia
entre branco e amarelado) e olhos de cor rosa, os quais também podem aparecer
azul claros ou verdes.
Leucismo, piebaldismo e albinismo foram registrados em muitas espécies de
vertebrados neotropicais, incluindo cobras (SAZIMA & DI-BERNARDO, 1991;
SILVA et al., 2010), anuros (SANABRIA et al., 2010), morcegos (VEIGA &
OLIVEIRA, 1995), aves (FRANZ & FLECK, 2009; MANCINI et al., 2010), peixes
(SAZIMA & POMBAL, 1986; BRITO & CARAMASCHI, 2005; LEAL et al., 2013) e
10
em vários mamíferos como gambá (ABREU et al., 2013) leão marinho (ACEVEDO
E AGUAYO, 2008), veado (OLIVEIRA, 2009b) entre outros (Tabela 1).
Tabela 1. Descrição das mutações no gene TYR responsáveis pelo albinismo em
diferentes animais.
Organismos Gene Mutação Local da mutação Referência
Macaco-rhesus TYR Nonsense (S184TER) éxon 1 Ding et al,
2000
Búfalo TYR Nonsense (W477TER) éxon 5 Damé, et al, 2012
Gato TYR Frameshift (c.975delC) éxon 2 Imes, et al
2006
Gato TYR Missense(G227W) Missense(G302R)
éxon 1 éxon 2
Lyons et al,2005
Gado TYR Frameshift (c.316insCCCC) éxon5 Schmutz et
al, 2003
Baleia jubarte TYR Frameshift (c.264delC) éxon 1 Polanowski et al, 2011
Entre os primatas, um único trabalho foi publicado por Ding et al. (2000)
descrevendo albinismo em macaco-rhesus (Macaca mulatta). Este estudo mostra a
presença de uma mutação no éxon 1 do gene TYR em dois indivíduos. A mutação
responsável pelo albinismo nestes macacos foi descrita na posição 184 o que gera
um códon de parada formado pela substituição do nucleotídeo citosina por
adenina, resultando na não produção da tirosinase.
A perda de pigmentação são eventos considerados raros em populações
selvagens (WALTER, 1914), devido ao fato destes animais perderem o mecanismo
de camuflagem, tornando-se mais visíveis aos predadores (SAZIMA & DI-
BERNARDO, 1991; PARSONS & BONDERUP-NIELSEN, 1995). Além disso, existe
uma série de patologias que podem surgir em associação com o albinismo, como
defeitos visuais (PÉREZ-CARPINELL et al., 1992; GRANT et al, 2001; GARIPIS &
HOFFMANN, 2003) e imunológicos (MANGALANI et al, 2004; SUMMERS, 2009;
CARRETERO et al., 2009).
11
1.3. Sapajus sp
O objeto do presente estudo é um indivíduo albino do gênero Sapajus sp (Figura 2),
popularmente conhecido no Brasil como macaco-prego, nome provavelmente
relacionado com a aparência de seu pênis quando ereto, semelhante a um prego
(Carvalho, 2013).
Figura 2. Sapajus apella, o macaco-prego: Extraído de <
http://livelikedirt.blogspot.com.br/2014/03/primate-monday-sapajus-apella.html >
Sabe-se que os macacos-prego são animais de hábitos diurnos e
arborícolas, encontrados desde a Venezuela até o Rio Grande do
Sul. Seu habitat é o mais diversificado entre os primatas
neotropicais, utilizando todos os estratos arbóreos de florestas
chuvosas inundáveis ou não, florestas primárias, secundárias,
caatinga, palmeiras, campos e mangues (AURICCHIO, 1995). A
maioria dos macacos-prego é classificada como onívora e se
alimentam principalmente de frutos, nozes, sementes, flores,
insetos, ovos e pequenos vertebrados, podendo ser importantes
12
dispersores de sementes e polinizadores (FREESE &
OPPENHEIMER, 1981; VISALBERGHUI, 1990; DE LILLO et al,
1997; ROCHA et al, 1998; SILVEIRA et al, 2005; FRAGASZY et al,
2004).
Até o trabalho de Silva (2001), os macacos-prego eram classificados como
Cebus sp dentro do mesmo gênero dos caiararas. Após vários estudos genéticos e
considerando também modos de vida e diferenças morfológicas entre os animais,
foi proposta a separação destes animais em dois gêneros, Cebus e Sapajus, sendo
que os cairaras permaneceram dentro do gênero Cebus compondo quatro
espécies: C. albifrons, C. capucinos, C. olivaceus e C. kaapori; enquanto os
macacos-prego passaram a representar o gênero Sapajus. Este contém mais sete
espécies, como mostrado na Figura 3 (Guimarães, 2012). Nesta figura podemos
observar como ocorreu o deslocamento desses animais pela América do Sul
durante milhões de anos e como está a distribuição atual das doze espécies que,
ao todo, representam ambos os gêneros mencionados.
13
Figura 3. Esquema ilustrando a dispersão de macacos-prego e caiararas nos
últimos seis milhões de anos. Fonte: < http://revistapesquisa.fapesp.br >.
14
2. JUSTIFICATIVA
O tema desenvolvido neste trabalho, “genética do albinismo em um indivíduo
macaco-prego” teve início com a chegada de um macaco-prego albino na Escola
Experimental de Primatas (EEP), da Universidade Federal do Pará (UFPA), Belém,
Pará, em 2011. Este animal foi recebido pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente
e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) após ser resgatado por um morador
da região de Breves, na Ilha do Marajó o qual encontrou o animal abandonado
nesta região. Segundo o Ibama, o animal estava muito magro, teve o rabo cortado
e as presas cerradas. Por decisão do Ibama, o animal foi deixado sob os cuidados
da EEP da UFPA. Desde então, o animal vem recebendo cuidados adequados e
tem suas funções visuais avaliadas no laboratório coordenado pelo Prof. Dr. Olavo
F. Galvão e pelo Prof. Dr. Paulo R. K. Goulart da UFPA. Os pesquisadores avaliam
funções visuais como acuidade visual, discriminação de cores e contrastes através
de testes comportamentais e genéticos em parceria com o laboratório coordenado
pela Profa. Dra. Dora F. Ventura no Instituto de Psicologia da USP, em São Paulo.
Este trabalho contribui para a elucidação das causas genéticas do albinismo neste
indivíduo.
Assim, a realização deste trabalho poderá trazer novos dados a respeito da
mutação do albinismo em primatas, uma vez que o único trabalho realizado foi com
macaco rhesus. Os resultados do trabalho poderá auxiliar o entendimento das
consequências dessa mutação no albinismo em humanos.
3. OBJETIVO
O objetivo deste trabalho é identificar a mutação responsável pelo albinismo em um
indivíduo macaco-prego (Sapajus sp).
4. MATERIAL E MÉTODOS
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4.1. Macaco-prego
Um macaco-prego albino macho (Figura 4) e dez macacos-prego não albinos (sete
machos e três fêmeas) mantidos na Escola Experimental de Primatas da
Universidade Federal do Pará foram avaliados. Este trabalho tem aprovação no
comitê de ética PS001/2006.
Figura 4. Sapajus sp, macaco-prego albino: Extraído de < http://www.jb.com.br/ciencia-e-
tecnologia/noticias/2011/06/17/macaco-prego-albino-e-resgatado-na-ilha-de-marajo-no-
para-2/>.
4.2. Extração de DNA
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Para a análise genética foi realizada uma coleta de 3ml de sangue de cada
indivíduo em tubos contendo citrato de sódio ou EDTA por um veterinário
especializado da Escola Experimental de Primatas da Universidade Federal do
Pará. A extração do DNA foi realizada utilizando o kit PUREGENE DNA purification
Kit (Gentra Systems) de acordo com o protocolo do fabricante.
4.3. Reação em Cadeia da Polimerase
A técnica de PCR (Reação em Cadeia de Polimerase) foi realizada com o kit
Platinum® Taq DNA Polymerase (Life Technologies). Para a realização da reação
com os exons 1 (11 e 12), 2, 3, 4 e 5 utilizou-se em cada amostra 40,3 µl de água
destilada (H2Od) autoclavada, 5 µl de tampão (10x Buffer), 1 µl de
deoxinucleotideos trifosfatos (dNTPs), 0,5 µl de cada primer , 1,5 µl de MgCl2 e 0,2
µl da enzima Platinum Taq.
As condições de PCR foram inicialmente 94 ºC por 1 min, seguido de 37
ciclos de 94 ºC por 15 seg, 30 seg na temperatura de anelamento e mais 30 seg a
72 ºC, finalizando com 7 min a 72 ºC. Em todos os experimentos foram adicionados
controles negativo (sem DNA) e positivo (amostra padronizada para a reação). Os
primers utilizados e suas respectivas temperaturas de anelamento estão descritos
na Tabela 2.
Tabela 2. Descrição dos primers e respectivas temperaturas de anelamento ao
DNA.
Sequência amplificada
Identificação do iniciador
Temperatura de
Anelamento
Sequência de nucleotídeos do iniciador
Exon 1, gene TYR
TYR11 59 ºC FW_CCAATTAGCCAGTTCCTGCAGA RV_CACAGTTGAATCCCATGAAGTTGC
Exon 1, gene TYR
TYR12 57 ºC FW_TATAATAGGACCTGCCAGTGCTCTG RV_AATGTCTCTCAAGATTTCAGATCCC
Exon 2, gene TYR
TYR2 60 ºC
FW_TTGTTTAACATGAGGGTGTTTTGTACAG RV_GGACTTTGGATAAGAGACTGTAAATATG
17
Exon 3, gene TYR
TYR3_Sb 59 ºC FW_TCCATTTACTGGGATAGCAGATG RV_GTGAAGAAGGAAGATGGGATCAT
Exon 4, gene TYR
TYR4_Sb 59 ºC FW_GAAGGCATCGCCCTCTTCTA RV_AGGTAGCTATAGTCATAGCCCAGA
Exon 5, gene TYR
TYR5_Sb 60 ºC FW_CCCAGACTCTTTTCAAGACTAACATT RV_AATAAAGATGGGGCCAATAAAAA
Os iniciadores para os éxons 1 e 2 (Tabela 2) foram obtidos no trabalho de
Preising et al. (2011) que desenvolveu esses primers a partir de sequências do
gene TYR humanas (M27160.1, NM_000372.4). Os primers para os éxons 3, 4 e 5
foram desenhados no programa Primer3 (Untergasser et al, 2007) a partir da
sequência do gene TYR de Saimiri boliviensis (HM757583.1).
Os produtos da PCR foram visualizados através da eletroforese em gel de
agarose (1%). Após eletroforese, o material genético amplificado foi purificado,
utilizando o kit Illustra™ GFX™ PCR DNA and Gel Band purification (GE
Healthcare) seguindo o protocolo do fabricante. As amostras foram mantidas a -
20°C para posterior sequenciamento.
4.4. Sequenciamento do DNA
O sequenciamento das amostras de DNA foi realizado com o kit Big Dye
Terminator (Life Technologies) utilizando o sequenciador 3500xL (Life
Technologies) do Instituto Israelita de Ensino e Pesquisa do Hospital Albert Einstein
em São Paulo, para comparação entre as sequencias do indivíduo albino e dos não
albinos. As sequências foram analisadas com o programa BioEdit v7.2.5.
18
5. RESULTADOS E DISCUSSÃO
Após as análises dos sequenciamentos observou-se que o indivíduo albino
apresenta uma mutação C → T no nucleotídeo 64, códon 22, no éxon 1 do gene
TYR, de modo a alterar o códon CGA para o códon TGA. Em todos os animais
controles foi possível observar o códon CGA; o códon TGA estava presente apenas
no indivíduo albino.
Essa mutação resulta na substituição do aminoácido Arginina codificada pelo
códon CGA por um código de parada (stop codon) codificado pela sequência TGA
(Figura 5).
Este tipo de mutação é chamada de nonsense. Mutações do tipo nonsense no
gene TYR também foram previamente encontradas em macaco-rhesus (Macaca
mulatta) e em humanos (DING et al, 2000).
A mutação R22TER encontrada no macaco-prego albino não foi descrita nem
em humanos nem em primatas não humanos até o presente momento.
Figura 5. Representação gráfica do eletroferograma de parte do exon 1 do gene
TYR de um indivíduo não albino (A) e a mesma região do gene TYR do macaco
albino (B). A substituição C → T no nucleotídeo 64 resulta na formação de um novo
códon (R22TER).
A
B
19
Assim como mostra a Tabela 1, o albinismo já foi estudado em diversos
animais e em sua maioria apresentam mutações no gene TYR. Este gene é
responsável pela produção da tirosinase, o que mostra que apesar de haver vários
genes envolvidos na pigmentação, o mais comumente afetado é o gene TYR. Como
mostra o estudo de GARGIULO e colaboradores (2011), mais de 70% dos casos
encontrados de albinismo são causados por mutações no gene que expressa a
tirosinase. Devido a importância da tirosinase na biossíntese da melanina, é
compreensível que a maioria das mutações relacionadas com o albinismo se
encontrem no gene TYR. Porém, em humanos, uma alta taxa de mutações é
encontrada no gene que expressa a proteína P (KAMARAJ & PUROHIT, 2014). Até
o momento, não foram descritas mutações neste gene relacionadas a albinismo em
animais não-humanos.
O albinismo, além de alterar a pigmentação da pele e pelos, também pode
causar dificuldades visuais, devido à perda de acuidade, fotofobia e nistagmo (DING
et al, 2000) que fazem com que o animal possa ter mais dificuldade de se locomover
no seu habitat, dessa forma tanto a predação quanto a fuga de predadores ficam
prejudicadas.
Essas mesmas alterações, somadas à hipoplasia foveal e cruzamento
anormal de fibras do nervo óptico como descrito por LEVIN & STROH (2011)
acometem humanos afetados pelo albinismo. Desse modo, os estudos com modelos
animais podem trazer grandes avanços no estudo da doença, suas consequências e
possibilidades de melhor diagnostico e eventual tratamento.
6. CONCLUSÕES
O albinismo observado no indivíduo do gênero Sapajus sp é causado por uma
mutação do tipo nonsense R22TER no éxon 1 do gene TYR.
O animal estudado, portanto, possui de fato uma mutação em um dos genes
responsáveis pela pigmentação, refletindo em fenótipo diferente ao encontrado em
macacos-prego comuns, possivelmente com problemas relacionados à visão.
Maiores estudos sobre os efeitos desta mutação nas funções visuais devem ser
realizados para correlação dos prejuízos fenotípicos com o tipo de mutação
encontrada.
20
7. REFERÊNCIAS ABREU, M. S. L. et al. Anomalous colour in Neotropical mammals: a review
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21
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