ana carolina aquino de sousa
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1ANA CAROLINA AQUINO DE SOUSA1
O IMPACTO SOBRE A PESSOA DO TERAPEUTA
DO ATENDIMENTO AO CLIENTE BORDERLINE
Orientador: LUC MARCEL A. VANDENBERGHE
UNIVERSIDADE CATLICA DE GOIS
2004 1 Bolsista CNPQ
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2ANA CAROLINA AQUINO DE SOUSA
O IMPACTO SOBRE A PESSOA DO TERAPEUTA
DO ATENDIMENTO AO CLIENTE BORDERLINE
Dissertao apresentada ao Programa deMestrado da Universidade Catlica de Goiscomo requisito parcial para a obteno dottulo de Mestre em Psicologia.
Orientador: LUC MARCEL A. VANDENBERGHE
UNIVERSIDADE CATLICA DE GOIS
2004
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iAGRADECIMENTOS
Agradeo ao orientador Luc pela sua ateno, compreenso, disponibilidade e
compromisso.
s terapeutas e clientes que tornaram o trabalho possvel.
Aos assistentes de pesquisa (especialmente, Daniele Pereira e Silva, Artur Vandr
Pitanga e Juliana Brasiliense Vilela) pela colaborao imprescindvel na transcrio e digitao
das fitas.
Aos colegas mestrandos pelas contribuies dadas nas discusses tericas e prticas.
Em especial, minha famlia que contribuiu para a execuo e concluso deste deste
trabalho.
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ii
A sensao de estar construindo uma
casa no meio de um furaco.
(Cukier, 1998; p. 91; referindo-se ao atendimento ao
cliente borderline)
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iii
SUMRIO DE TABELAS
Tabela 1. Critrios Diagnsticos do TPB...........................................................................13
Tabela 2 . Esquema de participao das terapeutas na pesquisa........................................76
Tabela 3. Sentimentos mencionados por T1, pela sua cliente durante todo o processo de
coleta de dados....................................................................................................82
Tabela 4. Sentimentos mencionados por T2, com relao ao seu cliente, durante toda a
coleta de dados .................................................................................................121
Tabela 5. Sentimentos relatados por T3, com relao sua cliente, durante toda a coleta
de dados............................................................................................................141
Tabela 6. Sentimentos relatados por T4, com relao sua cliente, durante todo o
processo de coleta de dados.............................................................................179
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iv
SUMRIO
Agradecimentos ....................................................................................................................i
Epgrafe ...............................................................................................................................ii
Sumrio de Tabelas ............................................................................................................iii
Sumrio ...............................................................................................................................iv
Resumo ...............................................................................................................................ix
Abstract ................................................................................................................................x
Introduo ............................................................................................................................1
1. O Borderline ........................................................................................................3
1.1. O Surgimento do Termo Borderline..........................................................3
1.2. Comportamento Interpessoal .......................................................................8
1.3. A Formao da Personalidade Segundo o Behaviorismo Radical .............11
1.4. A Classificao Topogrfica ......................................................................13
1.5. Millon e a Inovao da Noo de Psicopatologia ......................................16
1.6. A Formao do eu (ou self) Segundo o Behaviorismo Radical .............18
1.7. Fatores Etiolgicos do Transtorno de Personalidade Borderline................20
1.7.1. O Desenvolvimento do Self: o papel da aprendizagem....................20
1.7.2. Fatores Sociais ..................................................................................24
1.7.3. Fatores Biolgicos ............................................................................26
1.8. O Impacto Interpessoal dos Padres Borderlines ......................................27
2. O Papel da Relao Teraputica ........................................................................30
2.1. Terapias Validadas Empiricamente: Ps e Contras ...................................30
2.2. Relacionamentos Teraputicos Apoiados Empiricamente .........................37
2.3. A Relao Teraputica como um Instrumento de Mudana ......................45
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v2.3.1. Comportamentos Clinicamente Relevantes .....................................48
2.3.2. Condutas do Terapeuta .....................................................................50
2.3.3. Transferncia e Contra-transferncia ...............................................50
2.3.4. A Necessidade da Superviso ..........................................................56
2.3.5. Estratgias de Mudana ....................................................................59
2.3.5.1. Desafios e Tentativas de Soluo.......................................62
2.4. Conduo de Pesquisas Sobre a Relao Teraputica ...............................67
3. Objetivos ..............................................................................................................71
Mtodo ...............................................................................................................................72
Participantes .............................................................................................................72
Materiais ...................................................................................................................72
Procedimento ............................................................................................................73
Anlise de dados .......................................................................................................78
Resultados ..........................................................................................................................81
Terapeuta 1 ...............................................................................................................81
1. Sentimentos mais freqentemente relatados pela terapeuta 1 (T1) e
estratgias utilizadas para o manejo das contingncias que os geraram.................83
1.1. Incompetncia .....................................................................................83
1.2. Maternal e/ou medo de fazer mal cliente .........................................88
1.3. Raiva ....................................................................................................93
1.4. Desvalorizao ..................................................................................101
1.5. Dificuldade de trabalhar ....................................................................104
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vi
2. Comportamentos Clinicamente Relevantes da Terapeuta na Relao de
Superviso ............................................................................................................106
2.1. Comportamento de dar razes, quando confrontada por Mestranda,
que referia-se possvel sada da cliente .........................................106
2.2. Desespero ......................................................................................110
3. Principais Alvos da Superviso .......................................................................115
3.1. Enfraquecer CCRs1 da cliente...........................................................115
3.2. Se vulnerabilizar na relao teraputica ............................................116
3.3. Modelar Tatos de Eventos Privados...................................................118
Terapeuta 2 ......................................................................................................................120
1. Sentimentos mais freqentemente relatados pela terapeuta 2 (T2) e estratgias
utilizadas para o manejo das contingncias que os geraram.................................122
1.1. Averso/ vontade de no atend-lo mais ou de se distanciar
.............................................................................................................122
1.2. Alvio .................................................................................................127
1.3. Culpa .................................................................................................128
1.4. dio e/ou Raiva .................................................................................130
1.5. Dificuldade de trabalhar ....................................................................132
2. Comportamentos Clinicamente Relevantes da Terapeuta na Relao de
Superviso ......................................................................................................133
2.1. Comportamento Desesperado............................................................133
3. Principais Alvos da Superviso .......................................................................135
3.1. Se vulnerabilizar na relao teraputica.............................................135
3.2. Apontar Similaridades Funcionais ....................................................135
3.3. Usar Tticas de Intervenes Produtivas ..........................................136
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vii
Terapeuta 3 ......................................................................................................................140
1. Sentimentos mais freqentemente relatados pela terapeuta 3 (T3) e estratgias
utilizadas para o manejo das contingncias que os geraram.................................142
1.1. Dificuldade de trabalhar.....................................................................142
1.2. Desvalorizao/Desrespeito ..............................................................148
1.3. Desmotivao/ Frustrao/ Vontade de no atender mais a
cliente..................................................................................................155
1.4. Distanciamento ..................................................................................162
1.5. Insegurana.........................................................................................167
2. Comportamentos Clinicamente Relevantes da Terapeuta na Relao de
Superviso ............................................................................................................172
2.1. Comportamento de dar razes........................................................172
3. Principais Alvos da Superviso ........................................................................175
3.1. Enfraquecer CCRs1 da cliente ..........................................................175
3.2. Vulnerabilizar-se na relao teraputica ...........................................172
3.3. Tentativa de Fortalecer CCR3 ...........................................................176
3.4. Evocar CCR2 .....................................................................................177
Terapeuta 4 ......................................................................................................................178
1. Sentimentos mais freqentemente relatados pela terapeuta 4 (T4) e estratgias
utilizadas para o manejo das contingncias que os geraram.................................180
1.1. Incompetncia....................................................................................180
1.2. Sentimentos Contraditrios ...............................................................184
1.3. Impacincia / Irritao / Raiva...........................................................190
1.4. Dificuldade de Trabalhar / Impotncia ..............................................195
1.5. Desnimo............................................................................................198
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viii
2. Comportamentos Clinicamente Relevantes da Terapeuta na Relao de
Superviso .......................................................................................................200
2.1. Comportamento de dar razes.........................................................200
3. Principais Alvos da Superviso ..................................................................201
3.1. Enfraquecer CCRs1 da cliente...........................................................201
3.2. Vulnerabilizar-se na relao teraputica ...........................................203
3.3. Validao X Mudana........................... ............................................203
Discusso ...............................................................................................................................204
Referncias Bibliogrficas .....................................................................................................210
Anexos ...................................................................................................................................223
Anexo 1 ......................................................................................................................224
Anexo 2 ......................................................................................................................226
Anexo 3 ......................................................................................................................228
Anexo 4 ......................................................................................................................230
Anexo 5 ......................................................................................................................232
Anexo 6 ......................................................................................................................235
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ix
RESUMO
O presente trabalho um esforo em explorar sentimentos que o atendimento ao clienteborderline provoca em terapeutas, a partir de uma viso analtico-funcional. Primeiro, a relaoteraputica descrita como um instrumento de mudana que pode promover mudanas norepertrio do cliente. Esta abordagem parte do pressuposto de que se o indivduo se comporta emrelao ao terapeuta da mesma maneira que o faz no seu dia a dia com outras pessoas, essesambientes so funcionalmente idnticos, e que, portanto, se um deles for mudado, esta alteraoafetar os demais. Alm disso, os sentimentos que os comportamentos do cliente provocam noterapeuta (fenmeno conhecido na literatura psicoterpica como contra-transferncia) podemservir como dicas sobre o que outras pessoas do seu cotidiano sentem. Desta forma, a relaoteraputica seria um contexto que possibilita o aprendizado ao vivo para o indivduo, j que ocomportamento pode ser reforado ou enfraquecido imediatamente aps a sua ocorrncia.Participaram deste trabalho, quatro terapeutas comportamentais que atendiam clientesborderlines. Elas realizavam os atendimentos semanalmente com sesses de uma hora dedurao. Relatos de sentimentos dos terapeutas foram gravados durante entrevistas semi-estruturadas e durante supervises mensais com cada terapeuta separadamente. Todas asgravaes foram transcritas e exploradas de acordo com os mtodos da teoria fundamentada nosdados. Os resultados apontaram que os terapeutas percebem a ocorrncia de comportamentosclinicamente relevantes e de contra-transferncia na relao teraputica. Tentou-se, nassupervises, levar as participantes a utilizar dos seus prprios sentimentos em relao ao cliente,como dicas para atuar de modo a promover mudanas no repertrio do cliente. Elas relataram quemuitos dos novos comportamentos adotados por elas, foram punidos pelos seus clientes sendoisto coero para continuar reagir de forma complementar aos seus comportamentos. Asterapeutas, que voltavam a se comportar de modo mais seguro para si reforaram oscomportamentos problemticos dos clientes. Tal comportamento contra-teraputico parecerelacionado com a esquiva experiencial. Os resultados sugerem que ateno particular para ospadres interpessoais durante a sesso poderia evitar que a relao teraputica chegasse a manteros problemas do cliente e que um melhor proveito das respostas encobertas do terapeuta para estefim possvel.
Palavras-chave: contra-transferncia, transtorno de personalidade borderline, relao teraputica.
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xABSTRACT
This research is an effort to explore, from a functional analytic perspective, the feelingsthat dealing with borderline clients causes in therapists. First, the therapeutic relationship isdescribed as an instrument that can promote changes in the clients repertoires. This approachconsiders that if an individual behaves in relation to a therapist in the same way as he behaves inhis daily life in relation to other people, these settings are functionally identical. So, changes inone context, will affect the others. Besides, the clients behaviors cause feelings in the therapist (aphenomenon known in psychotherapy literature as counter-transference) that can be used as cuesabout how other people feel in the clients daily life. So, the therapeutic relationship would be acontext that makes in-vivo learning possible for the client, since the behavior can be immediatelyreinforced or weakened after its occurrence. Four behavioral therapists, who worked withborderline clients, took part in this research. The sessions were conducted weekly and lasted onehour each. Reports by the therapists concerning their feelings were recorded during semi-structured interviews and during monthly supervisions with each therapist separately. Allrecordings were transcribed and explored according the methods of grounded theory. The resultsindicate that the therapists noted the occurrence of clinically relevant behaviors and counter-transference in the therapeutic relationship. During supervision it was tried to lead theparticipants to use their own feelings (about the client) as cues to promote changes in clientsbehaviors. They reported that their clients punished many of their new behaviors they werecoerced to continue reacting in ways that were complementary to the clients behaviors. Thetherapists what went back to behave in a way that was safe for them reinforced the problembehaviors of their clients. This counter-therapeutic behavior seems related to experientialavoidance. The results suggest that particular attention to interpersonal interactions during thesession is important. It could avoid that the therapeutic relationship maintains the clientsproblems and can make it possible to take better advantage of the therapists private responses.
Key-words: counter-transference, borderline personality disorder, therapeutic relationship.
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1O presente trabalho trata do que hoje chamado de Transtorno de Personalidade
Borderline, sob a perspectiva analtico-funcional. imprescindvel ressaltar, entretanto, que o
termo Borderline emergiu dentro da abordagem psicanaltica, num contexto histrico especfico
que o possibilitou.
Partindo do princpio de que o comportamento de um organismo, bem como de um grupo
funo de sua histria, torna-se primordial uma anlise histrica do termo Borderline. Isso
significa reportar histria dos comportamentos dos cientistas da poca e de suas prticas para a
produo do conhecimento. Andery e Micheletto (1999), apontam a necessidade de que sejam
criadas condies para que a anlise histrica constitua um elemento essencial dentro da Anlise
do Comportamento.
O conhecimento da histria consiste em identificar quais as variveis que esto
controlando o comportamento de um indivduo, em particular, ou de uma comunidade verbal, em
geral. Assim, uma anlise histrica do termo Borderline leva identificao de variveis que
controlaram o comportamento dos estudiosos que o tornaram um conceito diagnstico. Deve-se
reconhecer que os cientistas (assim como qualquer ser humano) se comportam em funo de uma
dada comunidade verbal. Por isso, outro elemento constitutivo de um estudo histrico a
identificao e caracterizao das prticas da comunidade verbal em questo, ou seja, da
identificao de metacontingncias. Em outras palavras, necessrio descrever as prticas da
comunidade verbal relacionadas com o comportamento de conhecer dos cientistas (Andery &
Micheletto, 1999). Alm disso, imprescindvel destacar a relevncia no s das contingncias
scio-verbais, mas tambm das econmicas e empregatcias envolvidas, j que tambm podem
ser responsveis para a modelagem do uso de um termo cientfico. Enfim, trata-se de considerar o
conceito de borderline como produto de exposio a um contexto complexo.
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2A utilizao do termo conhecer identifica um tipo diferente de comportamento. Skinner
(1953), define o conhecimento como um comportamento verbal que se estabelece devido ao
reforamento social, ou seja, mediado por um outro organismo. Deste modo, o conhecer pode
ser traduzido em termos de regras, sendo estas instncias de comportamento verbal de descrever
contingncias. Assim, o conhecimento cientfico pode ser caracterizado como um conjunto de
regras construdas pelo cientista, que passa a controlar a ao de uma comunidade (Andery &
Micheletto, 1999).
Todos estes elementos ficaro evidentes na anlise que se segue da perspectiva histrica
do que hoje denominado Borderline.
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31. O Borderline
1.1. Surgimento do Termo Borderline
At o sculo XIX, a psiquiatria lidava com a loucura atravs do encarceramento em
asilos. As pessoas eram colocadas nesses ambientes devido aos defeitos que apresentavam em
sua razo. Foi somente com Pinel, que reconheceu no s a existncia de pessoas loucas, mas
tambm das que mantinham certos aspectos da razo, que tornou-se possvel atentar-se a
indivduos que, embora apresentassem disordens comportamentais e emocionais, mantinham o
senso da realidade (Mack, 1975).
Em 1905, Kraepelin (apud Mack, 1975) escreve que existiam diversas combinaes e
estados limtrofes, que podem ser definidos como uma fronteira entre insanidade e condies
normais ou apenas estranhas. Autores hoje considerados precursores da psiquiatria moderna
(Kretschmer, 1925, Kasanin, 1933, e Schneider, 1920, apud Millon, 1981) apontavam a
existncia daqueles pacientes, cujo equilbrio emocional sofria grandes oscilaes, podendo
chegar a um estado de fria mesmo diante de circunstncias banais; pensamentos suicidas,
queixas hipocondracas, pessimismo, impulsividade e irritao extrema. Estas descries
compuseram, posteriormente, a base para o estabelecimento de critrios diagnsticos do
borderline no Manual Diagnstico e Estatstico de Transtornos Mentais (DSM).
Ao mesmo tempo em que a psiquiatria atentava s psicopatias e apontava a existncia de
estados limtrofes, a psicanlise estava desenvolvendo um conjunto de conceitos e uma prtica
cientfica que, mais tarde, iriam possibilitar falar sobre uma personalidade borderline. No incio,
porm, a maioria das pesquisas dentro da abordagem psicanaltica, envolvia distrbios
considerados neurticos em pessoas relativamente bem adaptadas socialmente (Mack, 1975).
Na dcada de 30, tinha-se mtodos especficos para o tratamento de pacientes
classificados como neurticos ou psicticos. Esta classificao estava bem definida a partir da
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4teoria freudiana, que havia desenvolvido um modelo explicativo da formao da personalidade,
em termos destas duas estruturas. Englobava as defesas do ego, esclarecendo diferenas
fundamentais entre os mecanismos de defesa de pessoas neurticas ou psicticas (Mack, 1975;
Millon, 1981).
Comeou a ficar evidente a existncia de um grupo de pessoas que no se conformavam a
esta dicotomia. Eram indivduos que apresentavam sintomas neurticos (como a ansiedade,
depresso, compulses, obsesses, distrbios emocionais etc), mas que numa anlise apurada,
no se encaixavam neste diagnstico. Alm disso, apresentavam episdios psicticos, mas que
diferentemente do esquizofrnico, quebravam com a realidade apenas temporariamente.
No final da dcada de 30, Adolf Stern publica o primeiro artigo formal da designao
borderline (Mack, 1975, Pfeiffer, 1975, Millon, 1981). A partir da dcada de 40, apareceram
mais esboos conceituais deste grupo residual. Deutsch denomina de as-if personalidade,
aqueles indivduos que se comportam como se mantivessem uma relao genuna e completa com
a realidade. como se respondessem adequadamente s circunstncias da vida, mas transmitiam
a sensao de que havia algo no verdadeiro no seu comportamento. Alm disso, a autora aponta
tambm a caracterizao de uma pseudo-afetividade, em que, apesar de aparentemente tudo estar
bem, internamente h uma vivncia de vazio (Pfeiffer, 1975).
Nos anos 50, Wolberg e Frosh (Millon, 1981) e principalmente Knight (Mack, 1975;
Pfeiffer, 1975; Chessick, 1974; Millon, 1981) so citados como autores que contriburam com a
descrio da categoria limtrofe.
O primeiro estudo sistemtico de pacientes borderlines foi publicado em 1968 por
Grinker e seus colaboradores (Mack, 1975; Pfeiffer, 1975; Chessick, 1974). Talvez uma maior
contribuio foi o interesse em questionar a que se devia a emergncia da sndrome
caractersticas especficas da cultura, como o stress da vida urbana, o aumento da ansiedade
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5existencial, bem como as vrias mudanas tanto na estrutura familiar como na social. Deste
modo, chamaram a ateno para o funcionamento do paciente em relao ao seu ambiente social.
Alm disso, apontaram a necessidade de estudos que tratassem no s do relacionamento me-
criana, como os trabalhos psicanalticos at ento, mas tambm de outros membros da famlia
(Mack, 1975).
O contexto histrico em que o conceito do borderline emergiu e as contingncias que
controlaram o comportamento dos autores acima referidos, pode ser retomado. Havia uma
definio de patologia em termos neurticos ou psicticos de um lado, e a existncia de pessoas
que manifestavam uma combinao de caractersticas tanto neurticas quanto psicticas, de outro
lado. Foi necessrio elaborar uma entidade distinta que englobasse esse novo grupo, que poderia
ser descrito, com os termos existentes na poca, como estando na fronteira entre o neurtico e o
psictico da a utilizao do termo borderline. Pode-se perceber que o comportamento de
escrever dos investigadores a respeito dos pacientes, estava sendo controlado por aquele contexto
histrico. Estratgias para que fossem entendidos dentro daquela comunidade verbal especfica,
isto , falando de pacientes que no se conformavam teoria existente foram moldados pelas
contingncias sociais. A comunidade verbal psicanaltica pde reforar novas formulaes,
medida que conseguiam falar de modo coerente com as convenes psicanalticas, a respeito do
que estava acontecendo nos consultrios.
Partiu-se para a formulao de relaes objetais proposta por Klein que permitia melhor
falar sobre a instabilidade apresentada pelo borderline, j que a teoria freudiana ortodoxa
dificultava a descrio das contradies extremas apresentadas pelo grupo de pessoas que no
eram nem psicticas, nem neurticas. A teoria kleiniana com seus conceitos de ciso, objetos
bons e maus, e identificao projetiva, possibilita falar sobre a instabilidade apresentada pelo
borderline.
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6Segundo Fairbairn (1952, apud Guntrip, 1974), por exemplo, o paciente esquizide tem
perigosos impulsos. Seu ego infantil e dependente. Isto se d, de acordo com o autor, devido a
uma falha na relao objetal materna, em am-lo por ele mesmo. A no ser que as relaes
objetais fossem boas suficientemente para manter a criana em contato genuno como o mundo
externo, poderia vir a ser mais e mais dominada pelo medo, e perder o contato com a realidade
externa, voltando-se para o mundo da fantasia.
Nos anos 60, tais formulaes foram integradas por Otto Kernberg, em sua representao
conceitual da personalidade borderline. Props uma nova teoria das relaes objetais que
enfatizava a importncia das relaes com pessoas significativas em geral. Esta se tornaria o
veculo mais importante da popularizao do conceito de borderline. Desde o nascimento, as
relaes com estas pessoas, sob o impacto de afetos fortes seriam internalizadas como memria
afetiva. As pessoas absorveriam o que ocorre ao seu redor. O ego armazenaria informaes,
integrando-as e aprendendo a selecionar o que importante, bom, ruim, til e perigoso. Assim,
tornaria possvel o controle do prprio corpo e, gradativamente, um mundo interno vai sendo
construdo. A possibilidade de falhas nestes processos podia explicar de maneira mais elegante
do que a teoria tradicional, o quadro clnico do paciente borderline (Kernberg, 2003a; 2003b).
Um excelente artigo sobre o impacto das idias de Kernberg sobre a psicanlise americana
The Seeds of the Self (Kernberg, 2003a). Aponta um aspecto interessante do contexto
histrico dos anos 60, em que a psicanlise estava marginalizada, sendo portanto, retirada dos
cursos de psiquiatria. Uma forte crtica era que a psicanlise era lenta, com alto custo e que no
estava sendo eficaz. Pode-se imaginar uma comunidade cujas perspectivas de emprego e seu
status cientfico, estavam ameaados.
A psicanlise estava sendo ameaada. As contingncias de sobrevivncia desta cultura
cientfica favoreceram mudanas nas prticas do grupo de estudiosos e clnicos que constituem
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7a psicanlise. Isso ocorreu a partir da proposta de Kernberg que, ao criar uma Nova Psicanlise,
argumentava pertencer a outra linha psicanaltica.
Vale ressaltar que, ao construir um saber o cientista (como descrito acima) est sob
controle (embora nem sempre tenha conscincia disto) no s do objeto que est analisando, mas
tambm de sua histria em particular, que moldou uma ou outra forma de pensar, e ainda, deve-se
considerar que est inserido numa sociedade, que refora certas linguagens na descrio dos
objetos que estuda.
Percebe-se que os novos psicanalistas quando no conseguiam mais ser compreendidos
apresentaram um novo discurso para se restabelecer. Estas foram, portanto, as contingncias
scio-verbais, empregatcias e econmicas da poca que controlavam o comportamento dos
autores. O investigador controlado pelo pblico (isto , pelos colegas, pelas instituies) e pelos
resultados de dados comportamentos verbais, que quando no so eficazes, requerem a adoo de
uma reviso tanto conceitual, quanto metodolgica, que tenham melhores resultados. Isto no
significa, contudo, que os integrantes da cultura cientfica utilizem conscientemente estas
estratgias. A anlise proposta a de seleo por conseqncias, o que quer dizer que so as
contingncias que reforam as prticas culturais mais eficazes. Neste caso, trata-se de novas
prticas verbais que esto sob controle do objeto da teorizao (a realidade no consultrio) e a
evoluo scio-cultural.
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81.2. Comportamento Interpessoal
Ficou claro que a organizao da personalidade borderline surgiu como termo, no seio da
comunidade psicanaltica. Prossegue-se a verificar como terapeutas comportamentais se
interessaram pelo conceito.
Mais ou menos na mesma poca de Kernberg, surge uma teoria (a do Crculo
Interpessoal) que trouxe os pr-requisitos para o tratamento, dentro da psicoterapia
comportamental, dos transtornos de personalidade. Abaixo, segue-se uma breve descrio.
Segundo Leary (1957), h uma variedade de comportamentos interpessoais que compartilham
de alguns elementos comuns, podendo por isso, ser distribudos em classes de comportamento
representadas como segmentos de um crculo. O autor props oito categorias para descrever
todos os padres interpessoais possveis, sendo que seria freqente um indivduo favorecer mais
alguns segmentos do que outros. Pode-se associar seus comportamentos interpessoais com a
noo de personalidade, de modo que a rigidez, inflexibilidade e o uso excessivo de estratgias
pertencente a um segmento particular, produzidas intensamente, podem ser caracterizados como
mal ajustamento ou transtorno de personalidade (Leary, 1957).
Um ponto central no trabalho de Leary (1957) a idia de que os comportamentos
interpessoais so operaes empregadas pelas pessoas com a finalidade de manter relativo
conforto, segurana, e de se livrar da ansiedade nas interaes com as demais. Para isso,
necessrio induzir respostas complementares nos outros aprendemos a treinar os outros a nos
responder de modo que supram as nossas necessidades. Passamos, portanto, a utilizar estratgias
que so eficazes para obter os comportamentos que desejamos dos outros. Assim, a no
complementaridade pode passar a ser evitada, j que adquire valor negativo devido resposta
emocional de ansiedade ou desprazer que ficou a ela associada.
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9Posteriormente, Kiesler (1986) elaborando idias de Leary, props 16 categorias para
descrever os diferentes padres interpessoais possveis, mantendo tambm que a caracterstica
bsica do comportamento interpessoal (categorias ou segmentos do crculo) mal adaptativo a
sua rigidez e inflexibilidade, ao invs do uso de vrias estratgias interpessoais dadas diferentes
situaes, como ocorre com uma pessoa bem adaptada.
A maior contribuio do trabalho de Kiesler (1986) para a presente discusso a noo da
necessidade de que o terapeuta observe o impacto do cliente sobre ele durante a sesso. Uma vez
tendo identificado quais os segmentos utilizados pelo cliente, o terapeuta pode prever quais as
reaes que ele prprio ir experienciar, isto , pode antecipar as reaes interpessoais
complementares.
No contexto teraputico, a complementaridade ocorre quando o terapeuta responde ao
cliente com comportamentos interpessoais recprocos em termos de controle e afiliao. Se ao
contrrio, o terapeuta reagir de modo no complementar (enfraquecendo comportamentos
problema), denomina-se de anti-complementaridade. Algumas vezes pode ocorrer tambm a no
complementaridade parcial, em que o terapeuta reage complementando apenas uma dimenso (ou
afiliao ou controle) e no a outra (Kiesler, 1986).
Dos trs tipos de reaes do terapeuta apontadas acima, pode-se classificar o primeiro
como sendo o mais confortvel para o cliente, o segundo como o mais aversivo, e o ltimo, com
nvel mdio de desconforto. Uma vez que o comportamento do cliente mais rgido e extremo do
que o do terapeuta, o cliente tem mais poder de determinar a natureza da relao teraputica.
Alm disso, nas primeiras sesses, o terapeuta freqentemente no pode evitar emitir respostas
complementares , reforando assim,os padres rgidos do cliente (Kiesler, 1986).
imprescindvel notar o crculo vicioso que mantm comportamentos desadaptativos. As
reaes dos outros confirmam ou validam suas experincias. Num dado momento, podem por
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10
exemplo, se sentir maltratados pelo cliente e no conseguir parar de dar respostas
complementares, que reforam os comportamentos dominadores do cliente. Assim, geram
mensagens que, por sua vez, provocam ansiedade no cliente, que mais desesperado ainda, tenta
utilizar as mesmas estratgias, na tentativa de corrigir as reaes aversivas dos outros. De modo
similar, o terapeuta vivenciar sentimentos aversivos, a no ser que detecte o padro interpessoal
do cliente, para ento, interromp-lo, evocando estratgias diferentes e respondendo
diferentemente, no emitindo respostas complementares s estratgias rgidas e extremas
(Kiesler, 1986).
No incio do processo, o terapeuta inevitavelmente d respostas complementares ao cliente,
que podem manter sua comunicao mal adaptativa. Por esta razo, o terapeuta deve detectar o
que o cliente evoca nele, e em seguida, emitir comportamentos que no so complementares, e
compartilhar diretamente com o mesmo, o impacto de seu comportamento (do cliente) sobre ele
(o terapeuta), fornecendo assim, informaes a respeito dos indesejveis efeitos de seus
comportamentos sobre os outros, e ao mesmo tempo, ensinando uma nova forma de agir com
eles. O cliente aprende, ento, a tornar seu comportamento mais flexvel e menos extremo
(Kiesler, 1986). A relao teraputica , portanto, uma arena na qual as mudanas podem ser
facilitadas, ponto este, bastante semelhante proposta do presente trabalho, cujo enfoque
analtico-comportamental, como ser elucidado posteriormente.
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1.3. A Formao da Personalidade Segundo o Behaviorismo Radical
A viso do behaviorismo radical mostra similaridades acentuadas com o modelo
interpessoal. Ambos rejeitam a existncia de um eu interior que dirige a ao do outro. Reagem
contra o pressuposto que haveria um eu, ou seja, uma fora que impulsionaria o outro eu (o
que se comporta), a agir. Na viso rejeitada por ambos, observa-se a ocorrncia do
comportamento, e infere-se a existncia de uma entidade (a fora propulsora) como causa do
mesmo. Essa concepo pode ser observada, por exemplo, com o termo personalidade, que
tratado como um eu que responsvel pela ocorrncia de comportamentos. Explica-se, por
exemplo, que uma pessoa tem comportamentos delinqentes porque tem uma personalidade anti-
social (Skinner, 1953), quando, na realidade, este conjunto de comportamentos delinqentes,
denominado de personalidade anti-social e, portanto, a causa no pode ser atribuda
personalidade.
Numa linguagem behaviorista radical, pode-se definir o eu como um conjunto de
respostas funcionalmente unificado, sendo que o importante explicar a unidade funcional desse
conjunto, estabelecendo as relaes existentes entre estas respostas e suas variveis de controle
(estmulos discriminativos e conseqncias). Conclui-se, portanto, que a personalidade
aprendida (Skinner, 1953).
Personalidade consiste no repertrio comportamental de cada um, e multideterminado.
Skinner (1953) apontava a importncia de entender os trs nveis de seleo do comportamento:
filognese, ontognese e a cultura. Esses trs fatores se combinam e interagem durante toda a
vida formando o que chamamos de personalidade. Ao nascer, apresentamos comportamentos
inatos (reflexos). Mas desde o momento inicial as contingncias comeam a influenciar a
probabilidade futura dos nossos comportamentos. Podemos observar isso j nas primeiras
interaes de uma me com o seu beb. Se a me espera a criana chorar para dar-lhe alimento,
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esta aprender que atravs do choro ganha comida. Entretanto, se a me a amamenta antes que
chore, por imaginar que pode estar com fome, o que a criana aprender ser muito diferente o
alimento ser, neste caso, contingente aos comportamentos que para a me so dicas de que o
beb est com fome.
Falar em personalidade significa apontar uma tendncia a se comportar de uma dada
maneira em funo de uma histria passada de reforamento, que individual. Refere-se,
portanto, a um conjunto de comportamentos que ocorrem de forma consistente em muitas
situaes. Estes padres consistentes so resultantes de um ambiente com contingncias
consistentes ao longo do tempo. Os pais, por exemplo, no mudam radicalmente na maneira de
lidar com os filhos no dia a dia. A cultura valoriza padres consistentes de comportamentos
porque til para predizer como vo se comportar e facilita a manuteno do funcionamento da
sociedade (Parker, Bolling, & Kohlenberg, 1998).
H, entretanto, aquelas pessoas que no so muito previsveis, e que por isso, podem ser
consideradas como apresentando um transtorno de personalidade. A inconsistncia tambm deve
ser entendida a partir de uma anlise funcional. Se, por exemplo, uma criana tem pais que ora
so atenciosos, ora no, ou que s vezes afirmam o seu intenso amor, e outras a punem
severamente, cresce esperando as mesmas atitudes de outras pessoas, e pode inclusive, comear a
observar pistas que podem ser irrelevantes (isto , no relacionadas com os estmulos
antecedentes dos comportamentos dos pais) para identificar se os pais esto irritados ou no. Ao
crescer, elas podem funcionar como estmulos discriminativos para comportamentos
considerados contraditrios e confusos diante das pessoas (Parker et al, 1998).
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1.4. A Classificao Topogrfica
O DSMIVTR (APA, 2003), o quarto Manual Diagnstico e Estatstico de Transtornos
Mentais, um manual descritivo que foi criado para descrever sintomas, adotando uma
linguagem clara, para facilitar o diagnstico, com a pretenso de ser a-terico. Distancia-se de
uma viso contextualista, como a de Skinner, medida que preocupa-se com a descrio
topogrfica dos diversos transtornos. A seguir, apresenta-se como o manual descreve o
transtorno de personalidade borderline, para ento, discutir brevemente se esta anlise pode ser
integrada uma viso behaviorista radical.
De acordo com o DSMIVTR (APA, 2003), no Transtorno de Personalidade Borderline
(TPB), o indivduo apresenta um padro instvel no que se refere a relacionamentos
interpessoais, auto-imagem e afetos, padres constantes de impulsividade, que esto presentes
em uma variedade de contextos, tendo incio na idade adulta, preenchendo cinco ou mais dos
critrios citados abaixo (Tabela 1).
Tabela 1. Critrios Diagnsticos do TPB, segundo o DSM-IV-TR (APA, 2003).
Critrios Diagnsticos1. Esforos para evitar um abandono real ou imaginrio so pessoas intolerantes solido;2. Padro de relacionamentos interpessoais instveis e intensos, em que a pessoa alterna entre
extremos de idealizao e desvalorizao;3. Perturbao da identidade instabilidade constante da auto-imagem ou do sentimento do eu;4. Impulsividade em duas ou mais reas, prejudicando significativamente a sua vida (sexo, abuso de
substncias, comer compulsivo etc);5. Comportamentos, gestos ou ameaas de suicdo ou de comportamentos automutilantes;6. Instabilidade afetiva oscilao freqente de humor;7. Sentimentos crnicos de vazio;8. Raiva intensa ou dificuldade em controlar a raiva;8. Episdio de ideao paranides relacionados ao stress sintomas dissociativos intensos.
Uma pergunta relevante : ser til uma classificao como a apresentada no DSMIV
TR (APA, 2003), dentro de uma proposta, cujos pressupostos so skinnerianos? Trabalhos
publicados vm demonstrando seno a adeso, ao menos o uso coloquial por alguns terapeutas
comportamentais, desta classificao topogrfica (Linehan, 1993; Kohlenberg & Tsai, 2001;
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Conte & Brando, 2001; Guimares, 2001; Craske & Barlow, 1999; Vasconcelos, 2002; Martone
& Zamignani, 2002; Ingberman, 2001; Lotufo Neto, 2001; etc).
Skinner (1953) j apontava para a importncia de uma anlise funcional para entender o
comportamento. O DSMIVTR (APA, 2003), ao classificar cada transtorno de acordo com
critrios especficos, atenta para uma anlise topogrfica, e no funcional. Assim, poderia
questionar-se que este uso significa convergir em pontos de vista freqentemente considerados
opostos (Koerner, Kohlenberg & Parker, 1996; Cavalcante & Tourinho, 1998).
Devido aos princpios filosficos do behaviorismo radical, pode-se apontar objees ao
uso de um manual classificatrio. Uma delas refere-se ao obscurecimento da individualidade.
Pessoas caracterizadas ou classificadas em uma mesma categoria diagnstica podem apresentar
comportamentos diferentes, ou preencher critrios diferentes. Alm disso, um sistema
classificatrio pode gerar estigmatizao em funo do rtulo recebido. Finalmente, cabe
ressaltar que o sistema classificatrio no diz nada sobre o que est mantendo o problema. Numa
anlise comportamental o mais importante a identificao de variveis controladoras do
comportamento, pois so estas que direcionam a interveno. Uma anlise topogrfica pode
distanciar a possibilidade de uma anlise funcional, uma vez que ao identificar s a topografia
corre-se o risco de punir uma melhora do cliente (Kohlenberg & Tsai, 1987; 1994; 1995b; 2001;
Koerner, Kohlenberg & Parker, 1996; Cavalcante & Tourinho, 1998).
Suponha, por exemplo, dois clientes. O primeiro cliente traz a agresso como um
problema em sua vida, e que portanto, precisa ser mudado. O segundo, entretanto, busca a terapia
devido sua dificuldade em expressar seus sentimentos. Imagine que ambos apresentem diante
do terapeuta, o comportamento agressivo. Considerar este comportamento como um problema
para o primeiro cliente seria adequado, embora o mesmo no seja verdadeiro para o segundo, que
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ao ser agressivo est sinalizando uma melhora, pois apresenta dificuldades em expressar
sentimentos. Portanto, embora a topografia seja a mesma, a funo diferente.
Algumas vantagens prticas so apontadas, contudo, por Koerner et al (1996) para a
utilizao de um sistema de classificao diagnstico. Pode alertar o terapeuta para ocorrncias
de problemas e melhoras dentro da sesso. Dar nomes para classes de respostas auxilia na
identificao de comportamentos similares entre si. Ressalta-se que, sendo os transtornos de
personalidade sinnimos de problemas difceis de tratar, um processo diagnstico que os
identifique, leva o terapeuta a uma maior tolerncia s lentas mudanas (ao invs de comportar-se
impacientemente com a demora dos progressos) e aumenta a probabilidade de que reforce as
pequenas melhoras, pois considera que a obteno da sade um processo contnuo. Portanto, a
concluso de um diagnstico til porque pode ter impacto sobre as mudanas no repertrio do
cliente. Pesquisas sobre transtornos de personalidade enfatizam a continuidade entre o saudvel e
o patolgico, e assim, terapeutas influenciados por estes dados, podem ser menos susceptveis a
estigmatizar o indivduo, ou seja, so mais sensveis natureza contextual do transtorno e ao
reforamento de melhoras. Contudo, como ficar evidente nas prximas sees, do ponto de vista
behaviorista radical, o sistema classificatrio deve ser complementado com uma anlise
funcional. Por isso, sero discutidos e descritos a seguir uma viso analtico-comportamental a
respeito da formao do eu normal e borderline.
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1.5. Millon e a Inovao da Noo de Psicopatologia
Sob influncia da conceitualizao do diagnstico de organizaes de personalidade de
Kernberg, da proposta do crculo interpessoal (de Leary) e das abordagens de aprendizagem
(incluindo a teoria de Skinner), Millon (1969/1979), que tambm participou da construo do
DSM, props uma abordagem atravs da aprendizagem biosocial. imprescindvel notar que
antes dele, os behavioristas no tiveram facilidade para tratar dos transtornos de personalidade.
Acreditava que a personalidade era formada por fatores biolgicos combinados e interagindo
reciprocamente com as experincias, no decorrer da vida. Assim, se a criana alegre e
adaptvel, torna-se mais fcil cuidar dela, e ento, a me teria uma atitude positiva. J se a
criana ansiosa e nervosa, os cuidados dispensados consomem mais tempo, e a me pode reagir
com desnimo e/ou hostilidade. H investigaes que demonstram este jogo recproco de
influncias (Gewirtz & Boyd, 1977).
Defendia que a criana inicialmente explora o ambiente, apresentando grande
flexibilidade e mutabilidade dos padres de comportamentos. Na sua interao com as pessoas,
seus comportamentos vo sendo selecionados pelas conseqncias que os mesmos provocam.
Portanto, as experincias levam ao aprendizado de estratgias adaptativas que passam a
caracterizar nossa maneira de nos relacionarmos com os outros ou seja, nossa personalidade. Os
comportamentos persistem em funo de uma histria de reforamento intermitente, e por isso,
so altamente resistentes extino (Millon, 1969/1979).
A etiologia da psicopatologia explicada seguindo o mesmo raciocnio. Tanto a
normalidade quanto a patologia devem ser consideradas como pontos num continuum. Isso
significa que no h como definir uma linha divisria clara entre o normal e o patolgico, uma
vez que o comportamento pode ser adequado em um dado momento, e no em outro, dada a
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circunstncia. Pode-se definir, contudo, alguns critrios que sugerem a ocorrncia de
funcionamento patolgico (Millon, 1969/1979; 1981):
9 Inflexibilidade Adaptativa: consiste no uso rgido de um repertrio estreito de
comportamentos diante de diversas e variadas situaes.
9 Crculos Viciosos: se engajar em comportamentos que pioram suas dificuldades, trazendo
mais conseqncias auto-derrotantes.
9 Estabilidade Tnue: o indivduo susceptvel a experienciar situaes estressantes, pela
escassez das novas estratgias interpessoais.
Ao apresentar estes trs elementos, a vida da pessoa torna-se mais complicada, j que
estes perpetuam os problemas.
A influncia do trabalho apresentado por Millon inegvel para a psicopatologia, j que
foi convidado posteriormente a escrever o esboo de critrios operacionais dos distrbios de
personalidade no DSM III, e principalmente, inovou a viso tradicional de normalidade e
patologia, reinterpretando-a em termos de processos de aprendizagem que poderiam gerar
nveis diferentes (num continuum) de sade ou desadaptao, abordando-a em termos de
comportamentos privados e interpessoais, tornando assim, os transtornos de personalidade
acessveis terapia comportamental. At ento, o conceito era puramente psicanaltico.
Segundo Millon (1969/1979), o funcionamento da personalidade pode ser analisado, a
partir da combinao de dois elementos:
9 Os comportamentos interpessoais: so de fundamental relevncia porque dependendo
de como se relaciona com as pessoas, dadas reaes que evocam nas mesmas, sero
modeladas, sendo que elas, posteriormente, influenciaro a permanncia,
estabilidade, melhora ou piora da patologia atual do indivduo.
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9 Os tipos de reforadores procurados: se positivos ou negativos, onde (se em si mesmo
ou nos outros), e ainda, quais estratgias utilizadas para a sua obteno (ativamente
ou passivamente).
Props uma taxonomia de transtornos de personalidade, baseado nestes princpios, com
suas respectivas explicaes etiolgicas (Millon, 1981).
No presente trabalho adotou-se a compreenso do cliente borderline elaborada nesta
viso. O ponto central a ser considerado que embora sejam utilizadas diversas estratgias pelo
borderline, cuja finalidade a busca permanente para evitar rejeio, atravs de estratgias
extremas e incoerentes, perpetua as dificuldades da pessoa e impedem esforos por uma vida
melhor, j que fracassa em alcanar suas metas, resultando assim, em relacionamentos marcados
por hostilidade, ansiedade e conflitos, que conseqentemente, conduzem comportamentos ainda
mais desesperados (Millon, 1981).
1.6. A Formao do eu (self) Segundo o Behaviorismo Radical
Kohlenberg e Tsai (1987), propuseram a Psicoterapia Analtico-funcional (FAP),
fundamentada no behaviorismo radical. Nos anos subseqentes (1991/2001; 1995a) apresentaram
sua formulao do desenvolvimento do eu. Na teoria proposta, o eu emerge inicialmente
como uma unidade funcional a partir de unidades maiores diretamente aprendidas, como estou
com calor, estou com fome, estou aqui tendo em comum, portanto, o eu estou. Uma vez
estabelecidas unidades funcionais como eu estou, eu quero, a criana passa a utilizar uma
srie de combinaes de palavras que nunca havia dito ou ouvido anteriormente. Posteriormente,
emerge o eu como referncia, primeiro sob controle de estmulos pblicos, depois privados.
Deste modo, a experincia do eu explicada atravs da identificao e descrio do que
experienciado.
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Koerner et al (1996) apresentam algumas caractersticas importantes da viso de self
proposta pela FAP:
9 A experincia do self paralela ao desenvolvimento do uso de nomes e pronomes
pessoais, como por exemplo eu, me Paula.
9 O uso destes nomes e pronomes ensinado pelas pessoas que cuidam da criana, que
modelam, reforam ou punem respostas, conforme consideram apropriadas ou no.
9 O uso destes auto-referentes no pode ser ensinado diretamente. So aprendidos
indiretamente a partir de sentenas como estou com fome, estou com sede, estou
com calor etc, atravs de um tipo de aprendizagem que Skinner (1957) denominou de
subproduto da aquisio de respostas maiores, contendo elementos idnticos. Ou
como Koerner et al (1996) preferem emergncia.
9 A emergncia, conforme apontado no pargrafo anterior, progressiva. A progresso
de unidades maiores a menores tem sido observada em crianas aprendendo a falar.
De acordo com Kohlenberg e Tsai (1991/2001; 1995a), o conceito de self engloba ainda
diferentes caractersticas. O self no fsico, no sentido em que refere-se a algo que difere do
corpo. resultante de contingncias externas as pessoas com as quais um indivduo convive
modelam seu repertrio, e que em um dado momento, deixa de ser sujeito ao controle dos outros.
Este o momento em que a pessoa passa a se ver como nica e constante, mesmo que as
circunstncias s quais exposta estejam em constante mudana, pode-se ouvir afirmaes sobre
o eu. Isto foi possibilitado a partir da comunidade verbal que refora a palavra eu repetidas vezes
diante de situaes nas quais o indivduo estava se comportando.
O eu depende de experincias pblicas, mas medida que ocorrem concomitantemente
com eventos privados, estes podem passar a controlar o uso da palavra eu quando uma pessoa
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fala sobre si mesma. Uma vez que a aprendizagem do eu complexa e imprecisa, ocorrem
necessariamente, falhas neste processo. O indivduo pode ser exposto experincias em que o eu
no colocado sob controle de eventos privados, mas apenas de eventos pblicos, o que pode
levar instabilidade e dependncia (Conte & Brando, 2001). Portanto, pode-se dizer que em um
desenvolvimento normal as afirmaes do eu so inicialmente controladas por eventos pblicos e
que posteriormente, ficam sob controle de eventos privados.
Pode-se concluir dizendo que, dependendo da experincia passada, as pessoas sero
sensveis a diferentes contextos, o que explica o fato de duas pessoas reagirem diferentemente
diante de uma mesma circunstncia. Embora haja a crena de que essas diferentes reaes surgem
de dentro do corpo, tais fatores no so os nicos a serem considerados, inclusive porque h
evidncias de que a experincia pode alterar aspectos fisiolgicos (Parker et al, 1998). Cada
organismo exposto uma histria de reforamento, que nica e, por isso, a mesma situao
evocar diferentes respostas, em pessoas diferentes.
1.7. Fatores Etiolgicos do Transtorno de Personalidade Borderline (T.P.B.)
1.7.1. O Desenvolvimento do Self: o papel da aprendizagem
Os clientes com diagnstico de T.P.B., em geral, trazem ao terapeuta, sentimento de
impotncia e confuso, pois afirmam no saber quem so, do que gostam ou do que esperam da
vida. Seus comportamentos (tanto pblicos quanto privados) tendem a ser contraditrios entre si
e mudam rapidamente. comum desistirem do tratamento ou no aproveitarem bem a terapia.
Diante de situaes de escolhas, tendem a ter dificuldades para tomar decises. freqente a
tentativa de suicdio em funo da intensidade do sofrimento. Muitas vezes, relatam crises de
identidade (Conte & Brando, 2001). Deve-se lembrar, entretanto, que para um diagnstico
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comportamental, mais importante que a topografia, analisar as funes destes comportamentos
na vida de uma pessoa, em particular.
O cliente relata, geralmente, eu me sinto vazio. Segundo Kohlenberg e Tsai
(1991/2001; 1995a), tal declarao ocorre em funo da falta de estmulos discriminativos
privados que controlam o eu. Quando a experincia do eu depende de estmulos externos, a
pessoa pode se sentir instvel e insegura. Assim, a sensao descrita como vazio pode ser
entendida a partir da ausncia de estmulos externos, que antes estavam presentes. Alm disso, a
ausncia destes estmulos externos pode levar sensao de despersonalizao. Com isso, a
pessoa pode isolar-se, criando um contexto para ser ela mesma, livre do controle dos outros.
Muitas podem passar a esquivar-se tanto fisicamente quanto emocionalmente dos outros, pois
assim, no do oportunidade para que estes as controlem. Temem perder a sua identidade ao se
envolverem (Melges & Swartz, 1989; Conte & Brando, 2001; Livesley, 2000).
Kohlenberg e Tsai (1991/2001) apontam que a pessoa torna-se capaz de identificar
quaisquer mudanas nos comportamentos dos outros, e estas servem como estmulos
discriminativos para que ela mude sua forma de pensar, sentir e ver em relao ao eu. Pessoas
com o eu sob controle de estmulos pblicos no sabem o que querem, o que podem fazer e o que
sentem, a menos que outras digam-lhes o que fazer e o que permitido sentir (Parker et al, 1998).
Por apresentarem pouco controle privado sobre a experincia do eu, a pessoa pode achar
intolervel ficar s. De acordo com Kohlenberg e Tsai (1991/2001), o fato de temerem a solido
se explica no s pela invalidao, mas tambm pela experincia de negligncias, em que suas
necessidades bsicas no foram atendidas. Enfim, pais que ao no fornecer suporte emocional
quando imprescindvel criana, ou que a deixavam s, tornaram a experincia do eu
assustadora, acarretando assim, na idade adulta, em buscas incessantes pela companhia de outras
pessoas.
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A pessoa, muitas vezes, busca evitar o sentimento de vazio, atravs de encontros casuais.
Porm, medida que ocorre uma aproximao mais ntima, a pessoa fica com raiva, sente-se
sufocada e se afasta. Seus comportamentos podem variar. comum apresentarem raiva excessiva
(ou exploses) e repertrios de esquiva. Podem ir do extremo da idealizao do outro at a
desvalorizao. comum expressarem necessidade de ateno e de intimidade, mas aps um
pequeno perodo de tempo, rejeitar intimidade, podendo at pr fim a relacionamentos.
Se baseados em idias esboadas por Millon (1969/1979; 1981) Wasson e Linehan
(1993), Linehan (1993), Linehan, Cochran e Kehrer (2001), e Korner e Linehan (2002), apontam
que indivduos com T.P.B. apresentam uma vulnerabilidade biolgica que os leva a ser
extremamente sensveis a estmulos emocionais. Em geral, vm de famlias em que seus relatos,
quando crianas, em relao sua prpria experincia, eram invalidados. Assim, ao relatar as
suas experincias, especialmente as negativas, foram ridicularizadas, ignoradas ou dito-lhes que
no estavam sentindo raiva, por exemplo, quando, de fato, estavam. Alm disso, os pais deixaram
a mensagem de que os pensamentos, sentimentos e emoes devem ser controlados, o que
invalida a vivncia de dificuldades e o carecimento de apoio. Por fim, a criana foi punida de
alguma forma, por manifestar opinies e preferncias que fossem conflitantes com as dos pais.
As respostas da criana que estavam sob controle privado no foram reforadas positivamente,
mas sim punidas, o que levou ao reforamento negativo de auto-relatos inadequados, pois para
evitar conseqncias aversivas, a criana passa a experienciar o self a partir de estmulos
externos, o que a torna extremamente sensvel ao humor e aos desejos dos outros.
Gunderson, Kerr e Woods (1980) realizaram um estudo que apoia as explicaes
etiolgicas para a formao do borderline. Investigaram se havia caractersticas especficas que
pudessem ser identificadas em famlias borderlines. Para isso, foram comparadas famlias de
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borderlines com famlias de pacientes psiquitricos diagnosticados como esquizofrnicos e
neurticos.
Dentre as caractersticas especficas das famlias de borderlines, pode-se ressaltar o
investimento dos pais na relao conjugal, em detrimento da relao pais e criana, sendo esta,
negligenciada pelos mesmos, pois o casal tende a se atacar, utilizando a criana, e portanto, no
oferecendo-lhe ateno, empatia, apoio e proteo necessrios, nem os cuidados bsicos. As
relaes interpessoais so marcadas pela hostilidade e dominao. A me tende a ser no
afetuosa. A criana deixada de lado pelos pais, j que centram-se nos seus problemas conjugais.
A relao entre pais e filhos tende a ser pobre e distante. Este achado sugere uma possvel
explicao para a percepo que o borderline apresenta sobre os seus pais como sendo um grupo
unido e/ou indiferenciado (Gunderson et al, 1980). Alm disso, apoia as explicaes de Linehan
da importncia da negligncia para o desenvolvimento deste transtorno.
A negligncia, muitas vezes, leva hospitalizaes da criana. Os pais, que no esto
aptos a lidar com este problema, podem tornar-se amargos e nervosos. Deste modo, a criana
pode aprender desde cedo, a ser responsvel em cuidar de outras pessoas e da prpria casa
(Gunderson et al, 1980).
Uma anlise acurada de psicopatologia nas mes de borderlines, demonstrou a presena
de diversos transtornos como esquizofrenia, TPB, depresso, alcoolismo, alm de outros
comportamentos como autoritarismo, infidelidade, sarcasmo, brigas, abusos verbais ou fsicos e
punio inadequada aos comportamentos da criana. comum, entretanto, encontrar
psicopatologias em ambos os pais, principalmente depresso na me, que preocupada com seus
problemas maritais, no se disponibiliza criana, rejeitando-a e levando-a a sentir-se
desapontada. Assim, de modo geral, os resultados sugerem falta de envolvimento dos pais com
suas crianas (Gunderson et al, 1980).
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Os resultados de Gunderson et al (1980) so importantes porque foram replicados por
outros estudos empricos de Soloff e Millward (1983) e Livesley (2000) que destacam os mesmos
fatores da histria de desenvolvimento que contribuem para a formao do borderline.
Paris (2000) e Fornagy e Target (2000), revisaram estudos mais recentes acerca da
influncia da aprendizagem na formao do borderline, que tambm confirmam os resultados
supracitados.
1.7.2. Fatores Sociais
Kreisman e Straus (1989) e Armony (1998) analisaram como a cultura atual favorece o
desenvolvimento do TPB. O avano tecnolgico requer cada vez mais o compromisso individual
com estudo e trabalho solitrios, sacrificando assim, a socializao. Alm disso, o aumento da
taxa de divrcio, da utilizao de babs, da dificuldade em alcanar relacionamentos ntimos mais
estveis, da necessidade de mudanas geogrficas devido s presses econmicas, contribuem
para uma sociedade instvel, com solido, sentimento de vazio, ansiedade, depresso e
dificuldade em confiar.
O conforto outrora fornecido por vizinhos, familiares e papis sociais consistentes fora
perdido, piorando os relacionamentos interpessoais e o isolamento, j que no se conta com o
apoio de um grupo estvel e/ou presente (Kreisman & Straus, 1989; Armony, 1998).
A sociedade de muitos modos um mundo de contradies. Somos levados a acreditar e
defender a paz, embora as ruas, os filmes, os esportes, a televiso etc sejam marcados por
agresso e violncia. Fala-se em solidariedade, mas na prtica, o capitalismo ensina o
individualismo. A liberdade de expresso valorizada no discurso e punida na prtica. Ensina-se
um mito: a polaridade. As coisas so boas ou ruins, certas ou erradas, brancas ou pretas. Contudo,
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embora o mundo no seja to exato assim, as pessoas so levadas a acreditar que sim (Kreisman
& Straus, 1989; Armony, 1998).
Com as constantes guerras e mudanas, a continuidade histrica perdida. O passado
desvalorizado. O suicdio tem sido uma maneira freqente de lidar com a ameaa do presente,
revelando como o futuro visto de modo pessimista. Isto predispe a uma orientao para o
agora, que vista no borderline. Este, vive quase uma amnsia cultural, sem lembranas felizes
que possam confortar em tempos difceis, ou de erros cometidos, o que o leva a repeti-los j que
no pode aprender com eles (Kreisman & Straus, 1989; Armony, 1998).
No de se causar estranheza o fato de que o TPB seja mais freqente em mulheres. No
passado, elas tinham essencialmente um curso de vida: se casar, ter filhos, cuidar destes e do lar.
Hoje, necessita conciliar todos estes papis com seu trabalho fora de casa, ou s vezes, tomar
decises sobre o que priorizar, o que pode torn-las confusas e estressadas sobre quem so ou o
que querem. J os homens, tiveram que fazer poucos ajustes em suas vidas. No precisam
desempenhar tantos papis e no sofrem tantas presses sociais como as mulheres.
Concomitantemente ao aumento da liberdade feminina, as responsabilidades tambm foram
maximizadas (Kreisman & Straus, 1989; Armony, 1998). Portanto, todos os fatores sociais
ressaltados aqui devem ser considerados, uma vez que contribuem com as contingncias
familiares e interpessoais relacionadas com o desenvolvimento do TPB.
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1.7.3. Fatores Biolgicos
Embora o desenvolvimento do T.P.B. seja relacionado com fatores na histria de vida do
indivduo, admite-se a probabilidade de predisposio biolgica. Apesar de no existir nenhum
marcador gentico ou biolgico, como um teste sangneo ou um gene, algumas pesquisas tm
demonstrado resultados interessantes (Kreisman & Straus, 1989; Siever & Davis, 1991; Paris,
2000; Fonagy, Target & Gergely, 2000; Livesley, 2000):
9 Desequilbrios Bioqumicos
H uma correlao entre comportamentos impulsivos e anormalidades no metabolismo de
serotonina. Esta relao apoiada pelo fato de que certas medicaes tm aliviado os sintomas no
T.P.B. Contudo, o que ocorre uma melhora, sendo que muitos dos sintomas ainda persistem.
Comportamentos auto-destrutivos, como abuso de comida, lcool ou outras drogas, e
auto-mutilao, podem ser vistos como tentativas de obter efeitos calmantes. A auto-mutilao,
por exemplo, como qualquer outro trauma fsico, resulta na liberao de endorfina, trazendo a
sensao de relaxamento.
9 Fatores Neurolgicos
O T.P.B. tem sido associado a certas desordens neurolgicas, como: Distrbios de
Aprendizagem, Transtorno de Dficit de Ateno e Hiperatividade, Epilepsia, Traumatismo
Craniano e Encefalites. Alm disso, atividades anormais de ondas cerebrais no lobo temporal,
sugerem possveis disfunes, com produo tambm anormal de neurotransmissores durante os
testes.
Finalmente, parece haver uma atividade distinta de ondas cerebrais, durante o sono, na
maioria dos pacientes com diagnstico de T.P.B, conhecida como latncia REM: um curto
perodo de tempo precedendo a chegada dos sonhos, uma caracterstica bem documentada em
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pacientes deprimidos. Estes padres foram encontrados na maioria dos borderlines, estando
deprimidos ou no.
9 Fatores Genticos
Um ou ambos os pais de borderlines tambm apresentam estas caractersticas. Parece
sensato admitir que pelo menos uma vulnerabilidade a frustraes, traumas e eventos estressores
herdada, que interage com fatores no ambiente no qual o indivduo est inserido. Todavia, a
inferncia tem sido a de que os padres borderlines sejam ensinados de pais para filhos, ao invs
de transmitidos geneticamente. So necessrios mais estudos que envolvam uma grande amostra
de gmeos idnticos. Alm disso, avaliaes sistemticas dos pais ao longo da infncia deveriam
ser feitas.
1.8. O Impacto Interpessoal dos Padres Borderlines
Do ponto de vista analtico-comportamental de maior importncia o impacto dos
padres borderlines sobre as pessoas de sua convivncia. Os seguintes pontos (resumidos de um
site de apoio famlias de borderlines: //members.aol.com/BPDCentral/bpdlist.html), do a idia
de como a convivncia com algum com personalidade borderline, afeta os prximos.
9 Voc esconde o que realmente voc sente ou pensa, porque tem medo da reao dela. Isso
tem se tornado to automtico, que voc tem encontrado dificuldade at mesmo para
identificar o que voc sente ou pensa.
9 Se sente como se estivesse pisando em ovos, e que no importa o que voc diga ou faa,
ser usado contra voc.
9 Se sente o centro de toda a ira e violncia que no faz sentido, alternando periodicamente,
em que a pessoa age perfeitamente normal e amavelmente.
9 Se sente manipulado, controlado ou at mesmo como se tivesse mentido algumas vezes.
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9 Sente que ela o v como mau ou como bom, deseja que ela aja como costumava agir,
quando ela demonstrava am-lo e pensava que voc foi perfeito e que tudo foi
maravilhoso.
9 Sente que ela uma hora uma pessoa carinhosa e amvel, outra hora, algum que parece
to rancoroso que voc mal reconhece, tentando descobrir, qual delas real. Espera que
essa seja uma fase que logo passar, mas no passa, ento voc se sente como se voc
estivesse em uma montanha-russa emocional cheia de altos e baixos.
9 Tem medo de pedir coisas no relacionamento, porque voc ser considerado como
exigente demais, ou que voc no importante ou que h algo errado com voc.
9 Voc comea a se perder no terreno da fantasia, porque ela sempre o colocou para baixo
ou rejeitou seu ponto de vista. Ela age to completamente normal na presena de outra
pessoa, que ningum acredita em voc, quando voc expe a situao.
9 Nada que voc faz est correto, e quando voc tenta fazer suas vontades, ela
imediatamente muda suas expectativas. As regras continuam mudando, e no h nada que
voc faa que tenha xito. Voc se sente desamparado e encurralado.
9 Voc se sente culpado de ter feito coisas que voc nunca fez, ou de ter dito coisas que
voc nunca disse. Voc sente-se incompreendido, e quando tenta explicar, ela no acredita
em voc.
9 Sendo constantemente diminudo, ainda quando voc tenta se afastar do relacionamento a
outra pessoa tenta impedi-lo disso de vrias formas, com declaraes amorosas,
promessas de mudanas radicais, e ameaas.
9 Tem dificuldade para planejar compromissos sociais, porque a ela imprevisvel, seu
humor instvel, desanimada, e comporta-se impulsivamente.
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9 s vezes ela pede desculpas por seu comportamento, tentando convencer que esse tipo de
comportamento normal.
O impacto supracitado, tambm tende a ocorrer com o terapeuta, uma vez que a relao
teraputica um contexto interpessoal. A proposta do presente trabalho focalizar exatamente
isto: o impacto dos padres borderlines sobre a pessoa do terapeuta.
Na prtica clnica, percebe-se muitas vezes, que o cliente repete padres comportamentais
do seu dia a dia na sua relao com o terapeuta, sendo que este, pode utilizar da relao
teraputica para produzir mudanas no repertrio do cliente. Com clientes com diagnstico de
Transtorno de Personalidade Borderline, o terapeuta pode encontrar alguns desafios. Poder
sentir-se inclinado a se comportar exatamente como as pessoas do cotidiano do cliente se
comportam, bem como sentir-se de modo semelhante ao que as mesmas sentem. Desta forma, o
terapeuta pode no s utilizar destas emoes para produzir mudanas no repertrio do cliente,
como tambm, como ferramenta para conduzir o processo da anlise funcional.
Outro ponto interessante que o indivduo borderline ao pensar na possibilidade de se
expor a um processo psicoterpico, pode acreditar que medida que se revelar ao terapeuta, pode
perder o controle sobre si e sobre o ambiente, e de reforadores obtidos com a manuteno de
condutas inadequadas. Alm disso, o cliente tambm pode identificar, no decorrer do processo,
possveis ganhos e alvio de seu sofrimento. Com isso, o cliente pode apresentar comportamentos
tanto de esquiva quanto de aproximao na relao teraputica, sendo imprescindvel, o
entendimento por parte do terapeuta das funes do comportamento de resistir para cada
indivduo em particular, para que possa ajud-lo a bloquear sua esquiva e a tornar-se mais
consciente (descrever as relaes funcionais) dos comportamentos que podem estar contribuindo
para a manuteno das suas dificuldades (Conte & Brando, 2001). De acordo com a abordagem
da FAP (como ser exposto adiante), o terapeuta utiliza-se do impacto das dificuldades do cliente
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sobre a sua pessoa, para ento, propiciar oportunidades de mudana a partir do estabelecimento
de uma relao teraputica intensa e genuna.
2. O Papel da Relao Teraputica
A relao teraputica tem sido tratada como desempenhando um papel bastante
importante, embora nem sempre primordial, em diversas abordagens de psicoterapia. A
abordagem comportamental durante muito tempo considerou a relao teraputica como
secundria para o desenvolvimento da terapia (Eysenck, 1959). O foco era sempre a aplicao de
tcnicas a fim de propiciar mudanas de comportamentos nos clientes. Conte e Brando (1999) e
Shinohara (2000) apontam que nesta corrente tradicional, a relao teraputica era a circunstncia
que permitia a mudana, atravs da utilizao de um corpo terico e tcnicas especficas. Este
pensamento chegou no seu auge com o movimento que ficou conhecido como Terapias
Validadas Empiricamente, liderado por Diane Chambless.
2.1. Terapias Validadas Empiricamente: Prs e Contras
O movimento em torno das Terapias Validadas Empiricamente (T.V.E), que colocou em
maior evidncia resultados de pesquisas a respeito de terapias que funcionam, gerou muitos
manifestos, especialmente daquelas terapias cujos resultados encontrados no foram positivos.
A seguir so discutidos argumentos contra este movimento, e suas respectivas defesas a favor
do mesmo.
Garfield (1996), tomando o significado da palavra validar` no dicionrio, argumenta que
ao invs de apontar uma dada terapia como declarada vlida legalmente, o mais apropriado seria
a utilizao da palavra efetiva`, uma vez que a mesma quer dizer produzir resultados ou ter
efeito sobre. Assim, defende que a tentativa de avaliar uma terapia como vlida seria prematura.
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O movimento promoveu o uso de manuais de treinamento especficos e padronizados para
a terapia, o que reduziria a variao entre terapeutas, permitindo assim, uma possibilidade maior
de comparar seu treinamento e desempenho. Manuais especficos so desenvolvidos para
desordens especficas. Implicitamente, estaria a desconsiderao das experincias clnicas
adquiridas pelos terapeutas como desencadeadoras de mudanas (Garfield, 1996; Wampold,
Mondin, Moody, Stich, Benson & Ahn, 1997a ; 1997b).
Garfield (1996) e Wampold et al (1997a ; 1997b) referem-se dificuldade em oferecer um
tratamento padronizado, j que clientes que apresentam o mesmo diagnstico no so idnticos,
alm do fato que uma mesma tcnica pode produzir resultados diferentes em pessoas diferentes.
Isto porque outros aspectos do cliente devem ser considerados, como por exemplo, sua identidade
tnica, situao de vida, experincias anteriores em psicoterapia, expectativas em relao
mesma, percepo a respeito do terapeuta. Assim, todos estes fatores podem ter um impacto
sobre o processo teraputico e seus resultados.
Garfield (1996), Havik e Vandenbos (1996) e Wampold et al (1997a ; 1997b) destacam
que as pesquisas tradicionais na rea de psicoterapia, ao utilizar um manual especfico de
treinamento preocupando-se em aumentar a integridade da terapia que ser avaliada, deparam-se
com um problema particularmente importante: o da validade externa. A questo levantada : Os
resultados encontrados nas pesquisas seriam relevantes para os clnicos, uma vez que a realidade
na qual, estas so feitas, diferente da realidade clnica? Os manuais no abarcariam a
complexidade do tratamento e das interaes terapeuta cliente.
Havik e Vandenbos (1996) e Garfield (1996) ressaltam que os pacientes nas pesquisas so
altamente selecionados, com o fim de eliminar aqueles com mltiplos problemas. Na prtica
clnica h uma alta comorbidade. Alm disso, h diferenas individuais entre terapeutas. Deste
modo, focalizar em tcnicas significaria limitar-se a um aspecto apenas do processo teraputico,
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deixando de explorar outras variveis, como aquelas envolvidas na relao teraputica, como a
capacidade do terapeuta em comunicar-se e em compreend-lo, o seu apoio e encorajamento
fornecido, a ajuda dada ao entendimento a respeito de si mesmo. Deve-se considerar que embora
as psicoterapias difiram-se notavelmente em suas teorias e tcnicas, resultados teraputicos
similares so encontrados, o que corrobora a importncia de fatores na relao terapeuta cliente.
Talvez esta seja uma das razes pelas quais, uma dada psicoterapia pode ser eficaz para um
grande nmero de pessoas, mas no para todas.
Chambless (1996), defende o movimento. Inicia sua discusso afirmando que a revolta
demonstrada contra o movimento das terapias validadas justifica-se com esta denominao
dada, uma vez que uma escolha mais apropriada poderia ter sido feita, como por exemplo,
intervenes apoiadas empiricamente. Entretanto, como o movimento ficou conhecido com o
primeiro nome, sua troca conduziria a confuses.
O primeiro esclarecimento dado por Chambless (1996), que ainda que no se conhea
todos os elementos que constituem a eficcia de uma psicoterapia, no se pode descartar as
variveis j identificadas. Psiclogos podem ser treinados a utilizar tratamentos demonstrados ser
efetivos. Embora manuais no reflitam completamente o setting teraputico, tm muito a oferecer
pois a cincia avana medida em que um conhecimento mais especfico obtido. Isso no
significa que o terapeuta deva seguir inflexivelmente o protocolo de tratamento do manual. De
fato, eventos inesperados so comuns e merecem ateno. Portanto, a agenda programada deve
incluir espaos para eventuais necessidades que possam aparecer. Crits-Christoph (1996) tambm
sustenta este argumento.
necessrio notar que a questo de se um tratamento que envolva fatores inespecficos
ser melhor ou igual aos de protocolos, emprica. A idia apresentada por Garfield (1996) de que
no h nenhuma diferena entre os resultados obtidos por diferentes terapias, deve ser segundo
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Chambless (1996) analisada cautelosamente, uma vez que historicamente as pesquisas nem
sempre foram conduzidas com rigor necessrio. Isto no significa, contudo, que no h
necessidade de considerar a importncia dos fatores inespecficos. A maioria dos manuais
teraputicos indica a relevncia da relao terapeuta cliente, cujas caractersticas devem
envolver: apoiar, no julgar, e ser caloroso e afetivo. As qualidades interpessoais, entretanto, no
seriam suficientes, embora necessrias.
Do que foi dito at aqui, percebe-se a defesa de duas posies. De um lado, aqueles que
afirmam que o conhecimento acumulado dos fatores especficos (tcnicas) diz pouco para o
trabalho e sucesso clnico, sendo este mais influenciado pelos fatores inespecficos. De outro
lado, os que apoiam a necessidade de conhecimento empiricamente validado.
Na tentativa de um consenso, Fornagy e Target (1996) apontam as vantagens e
desvantagens das duas posies apontadas acima, e propem um modelo de integrao. O
argumento apresentado que regras clnicas a ser seguidas so importantes, mas devem ser
combinadas com experincia clnica e sensibilidade, sendo que estas devem ser monitoradas a
fim de revelar os espaos em branco entre o conhecimento de tcnicas padronizadas e os fatores
inespecficos, para que se possa determinar quais as necessidades do clnico quanto ao seu
treinamento e educao, levantando os componentes essenciais para um tratamento efetivo.
Do que foi tratado nesta seo, pde-se perceber que a revolta contra o movimento das
terapias validadas, em parte parece consistir na incompreenso da proposta do mesmo. O
manifesto parece ter sido despertado pelo nome do movimento, que poderia conduzir idia de
que somente aquelas terapias ali includas que eram dignas de crdito e merecimento, sendo
todas as demais, no efetivas. Contudo, o movimento parece no rejeitar em momento algum, a
relao teraputica (ou fatores inespecficos), ressaltando sua importncia inclusive para que as
tcnicas possam ser aplicadas e o cliente esteja motivado a pratic-las. Alm disso, toda cincia
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se constri a partir de pequenos passos, ou seja, no possvel conhecer de uma vez, todos as
variveis envolvidas na determinao de um dado fenmeno.
Por outro lado, interessante notar que toda a discusso gerada pela proposta deste
movimento implicou pontos positivos, uma vez que os clnicos que defendiam a importncia da
relao teraputica no processo de mudanas do cliente, sentiram-se ameaados, sendo obrigados
a defender seus pressupostos face aos dados empricos trazidos pelo outro ponto de vista.
Passaram, assim, a buscar apoio emprico para justificar sua posio. Portanto, o movimento
impulsionou os psiclogos a pesquisar, com mais rigor, quais as variveis na relao teraputica
que propiciam mudanas no repertrio do cliente.
Luborsky et al (2002) e Wampold et al (1997a, 1997b) ressaltam a existncia de
diferenas mnimas entre resultados obtidos por diferentes tipos de tratamentos, corroborando
com anlise feita por Rozenzweig nos anos 30, que ficou conhecida como Dodo Bird Verdict.
Retirado de Alice no Pas da Maravilha, Dodo Bird era um pssaro que ao final de um
concurso alega que todo mundo ganhou e, portanto, todos devem ser premiados. Assim, esta idia
foi transposta para os resultados obtidos com as pesquisas para indicar que todas as terapias eram
eficazes. Com isso, o termo Dodo Bird Verdict passou a ser freqentemente utilizado, de modo
que pesquisadores continuaram a publicar artigos em defesa ou contra idia.
Meta-anlises recentes como as de Wampold et al (1997a; 1997b;) Luborsky et al (2002)
e Messer e Wampold (2002), apoiam o veredicto do Dodo Bird.
Schneider (2002) no contrape-se nem aceita que todos ganharam. Embora admire os
esforos feitos pelas meta-anlises, seu ponto de vista de que muitas questes ainda no foram
respondidas satisfatoriamente. Os dados acumulados seriam restritos, tanto em termos do
processo teraputico, quanto no que se refere metodologia empregada para analis-los. Sendo
assim, um delineamento qualitativo rigoroso elucidaria quem de fato est ganhando, ao
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apresentar uma rica anlise das experincias teraputicas, utilizando medidas como entrevistas
(com terapeutas, clientes e pessoas significativas na vida deste), inventrios, instrumentos
fisiolgicos etc.
Crits-Christoph (1997), Howard, Krause, Saunders e Kopta (1997) e Klein (2002)
tambm concordam com a necessidade de mais investigaes, devido falta de demonstraes
controladas acerca dos benefcios fornecidos pela relao teraputica. Deste modo, explicitam a
importncia de avaliar meticulosamente estes estudos sobre tratamentos eficazes.
Beutler (2002), Crits-Christoph (1997), Howard, Krause, Saunders e Kopta (1997)
questionam tambm ao que exatamente pode-se atribuir os efeitos positivos da relao
teraputica. Falta identificar quais variveis esto presentes neste relacionamento que podem
conduzir a melhoras no repertrio do cliente. Alm disso, consideram que se os defensores do
Dodo Bird tivessem identificado apenas a existncia de ingredientes comuns a todos os
tratamentos, no haveria tanta polmica, pois seria reconhecido que os mesmos contribuem para
as mudanas, ao invs de afirmar equivalncia entre diferentes tipos de tratamento. A admisso
de equivalncia entre os tratamentos inconcebvel porque estes so oriundos de diversas teorias.
importante notar tambm que modelos tericos semelhantes podem ocasionar diferentes
resultados devido divergncias encontradas entre as populaes estudadas, terapeutas e settings
teraputicos.
Chambless (2002), Rounsaville e Carrol (2002) tambm contrapem-se ao veredicto do
Dodo Bird, afirmando que esta idia traz perigosas implicaes para a prtica clnica. Dentre os
argumentos mencionados, a primeira autora aponta que ao longo de seus 30 anos de trabalho, tem
encontrado inmeros clientes que, aps anos de tratamento, no obtiveram grandes mudanas, e
por isso, foram responsabilizados, como se fossem resistentes mudanas ou que no
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tentaram o suficiente. Ao ser exposta terapia comportamental, a maioria (70%) teve seus
problemas resolvidos.
preciso, segundo Chambless (2002) e Howard et al (1997) fornecer o tratamento correto
para um dado cliente. Se os estudos mostram a superioridade de uma tcnica, em detrimento de
outra, o clnico estar sendo anti-tico, ao usar a menos efetiva. Deste modo, o praticante deve ser
conduzido pelo que j se conhece acerca da eficcia de tratamentos.
Finalmente, imprescindvel ressaltar que publicaes como as de Luborsky et al (2002)
e de Wampold et al (1997a, 1997b) parecessem ignorar a anlise da generalidade dos dados
encontrados.
Embora o veredicto do Dodo Bird tenha sobrevivido por dcadas e seja baseado em
alguns suportes empricos, seu impacto no extenso sobre a prtica, treinamento e pesquisa,
pois estes continuam a enfatizar o desenvolvimento e evoluo de tcnicas psicoterpicas cada
vez mais especficas (Nathan, Stuart & Dolan, 2000; Rounsaville & Carrol, 2002).
Uma crtica a respeito das meta-anlises que o conhecimento de mdias de efeitos no
diz nada sobre quando, onde, por que e como a terapia funciona. De fato, na prtica clnica o
tratamento fornecido depende dos efeitos esperados. Se o cliente no consegue responder a um
dado tratamento, recomenda-se o uso de diferentes tcnicas ou de outro psiclogo, o que implica
avaliar as variveis que podem interferir no tratamento, dados estes, que so excludos numa
anlise de mdias (Rounsaville & Carrol, 2002).
A presente dissertao prope-se a contribuir para a discusso no sentido reivindicado por
Schneider (2002), analisando em mais detalhes a experincia teraputica.
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2.2. Relacionamentos