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Anais Eletrônicos do V Encontro da ANPHLAC Belo Horizonte - 2000 ISBN 85-903587-1-2
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Os códices mexicas. Soluções figurativas a serviço da escrita pictoglífica
Eduardo Natalino dos Santos Introdução
Uma importante característica cultural dos povos mesoamericanos foi a criação e utilização
sistemática de uma escrita pictoglífica, a qual, de forma geral, combinava representações
pictóricas com glifos calendários, toponímicos e antroponímicos, produzindo registros com sua
própria organização e lógica. As bases desse sistema provavelmente foram elaboradas pelos
olmecas a partir do ano 1000 a.C. e difundidas por outras regiões, passando a ser utilizadas e
transformadas por outros povos. A abrangência geográfica desta difusão delinearia,
aproximadamente, o que hoje chamamos de Mesoamérica.
Diversos suportes materiais e técnicas foram utilizados para os registros dessa escritura:
relevos em pedra, pinturas murais e cerâmicas policromadas são os mais antigos remanescentes
encontrados em regiões atingidas pela expansão olmeca1, regiões nas quais três importantes
culturas se desenvolveram: a teotihuacana, a maia e a zapoteca, as quais marcaram o chamado
período Clássico (aproximadamente dos séculos II a.C ao IX d.C.).
Essa tradição de escrita contou, desde então, com escribas especializados (tlacuilos) na
produção e na leitura dos registros, que também tomaram a forma de livros – confeccionados em
peles de veado, telas de algodão ou papel produzido a partir da casca da figueira (amate) ou da
fibra do agave. Mas os livros mais antigos que nos chegaram datam do período posterior, o Pós-
clássico, cujo marco inicial é o colapso parcial das cidades maias e zapotecas e de Teotihuacan.
Tal período se caracterizou pela ascensão dos povos mixtecos em Oaxaca e dos povos nahuas no
Altiplano Central, além da continuidade de algumas cidades maias.
Nesses livros, atualmente chamados de códices, eram registrados temas de relevância para a
organização das sociedades e do pensamento mesoamericano, dentre os quais: as explicações
sobre as origens e transformações do mundo e do homem, as epopéias divinas, os ciclos
calendários, as histórias regionais, os limites e fronteiras territoriais e a organização e o
1. Os mais antigos glifos calendários e texto encontrados datam, respectivamente, de 600 a.C. (Monte Albán, Oaxaca) e do século II d.C. (estela La Mojarra, Tres Zapotes, Veracruz).
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recolhimento de tributos. É notável a importância dada ao calendário que, mesmo quando não é o
tema explícito dos escritos, funciona como uma lógica subjacente para o registro de outros temas.
A produção desses escritos não cessou com a invasão e progressiva conquista espanhola e
muitos exemplares, tradicionais ou adaptados ao contexto colonial, foram produzidos até o século
XVIII. 2 Além disso, também se produziu na época colonial – em geral pelo trabalho conjunto de
freis cristãos, sábios e alunos indígenas – uma grande quantidade de textos alfabéticos baseados
em conteúdos tradicionalmente veiculados pelos códices e sua oralidade acoplada.3
Muito se tem avançado no estudo e no entendimento de tais escritos. Um dos caminhos que
vem mostrando resultados consistentes é o estudo comparativo entre os diversos tipos de escritos
– códices pré-hispânicos e/ou coloniais e textos transliterados. Esses estudos, além de mostrarem
a possibilidade de um escrito esclarecer outro, apontam para o acerto metodológico de se analisar
as imagens de forma contextualizada, isto é, como parte de um texto e não como identidades
auto-suficientes, que podem ser retiradas e explicadas isoladamente. Quando tais estudos
conseguem ainda combinar-se com as fontes e estudos arqueológicos, os resultados se tornam
ainda mais consistentes.
Apesar do muito que se tem estudado e entendido desse sistema, ainda há muito por se
fazer e muitas polêmicas e preconceitos a serem superados.4
Uma dessas polêmicas, que será apenas apontada aqui, diz respeito à não aceitação da
aplicação do conceito de escrita ao sistema de registros mesoamericano. Alguns estudiosos ainda
afirmam que escrita é apenas escrita fonética, e registros que não grafem os sons são apenas
formas primitivas, as quais até poderiam se desenvolver e atingir um “estágio mais avançado”, o
do sistema alfabético. Segundo tais estudiosos, a maioria das culturas que desenvolveram
sistemas pictóricos, uma espécie de primeiro estágio, pararam no meio do caminho ou no
máximo chegaram ao patamar da escrita glífica; apenas umas poucas escolhidas conseguiram
2. Cf. VALLE, Perla. Códices coloniales – Testimonios de una sociedad em conflicto. In: Arqueología Mexicana. Códices prehispánicos. vol. IV, nº. 23, p. 64-69, 1997. 3. Oralidade essa, muito importante no caso do sistema mixteco-nahua – que pouco se utilizava de glifos fonéticos – e menos importante no caso maia – que se servia basicamente de tais glifos. Cf. LEÓN-PORTILLA, Miguel. El destino de la palabra: de la oralidad y los códices mesoamericanos a la escritura alfabética. 4. Galarza aponta três problemas nos estudos dos códices mexicas: A – a falta de inventários completos dos manuscritos; B – a ausência de um método de trabalho compartilhado e baseado nos detalhes e na análise sistemática dos grupos de manuscritos; C – a dificuldade de se estabelecer o sentido de leitura de cada página ou manuscrito. Cf. GALARZA, Joaquín. The aztec system of writing: problems of research. In: BROWMAN, David L. (editor). Cultural continuity in Mesoamerica.
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chegar ao estágio da escritura alfabética. Estes estudiosos tendem a analisar a escrita como um
processo universal, evolutivo e separado das demandas de cada sociedade, isto é, separado das
necessidades e prioridades que cada época e cultura poderiam requerer ou atribuir a um sistema
de registros. Deste modo, explicam as escritas não-fonéticas pelo que supostamente lhes falta, ou
pelos estágios que, supostamente, deveriam ter atingido.5
Esse tipo de postura demonstra, segundo
Gordon Brotherston, um forte preconceito
ocidental contra as escritas não-alfabéticas, o qual
subestima os recursos visíveis da linguagem
escrita, como, por exemplo, no caso
mesoamericano, ser utilizada por falantes de
diversas línguas e não estar ligada foneticamente
a nenhuma; fato que gera a ampliação da
abrangência conceitual dos elementos glíficos ou
pictóricos em oposição à sua abrangência verbal.6
Um outro preconceito atinge o universo
pictoglífico mesoamericano e suas soluções
figurativas. De modo análogo à inadequada
aplicação de conceitos da escrita alfabética a outros tipos de escritura, é muito comum vermos
aplicado às pinturas mesoamericanas os critérios estéticos e figurativos da arte ocidental,
fortemente marcados pelo Renascimento e pelo uso da perspectiva. Desse modo, as imagens
mesoamericanas são vistas apenas como resultados de uma cultura que não desenvolveu
plenamente a “arte” pictórica, pois suas imagens nunca chegaram a “reproduzir realisticamente” a
realidade visível ou fazer uso da perspectiva. Mas, seriam essas as prioridades dos tlacuilos
mesoamericanos? Quais as prioridades de uma pintura que era ao mesmo tempo parte de um
5. Entre estes estudiosos está ELLIOTT, Jorge. The relationship between painting and scripts. In: BROWMAN, David L. (editor). Cultural continuity in Mesoamerica. Outros estudos mostram que nenhuma escrita seguiu totalmente o suposto caminho evolutivo – da pictografia ao alfabeto – e que utilizar-se de signos reconhecíveis no mundo não torna uma escritura pictográfica. Cf. MANRIQUE CASTAÑEDA, Leonardo. Ubicación de los documentos pictográficos de tradición náhuatl en una tipología de sistemas de registro y de escritura. In: MARTÍNEZ MARÍN, Carlos (apresentador). Primer coloquio de documentos pictográficos de tradición náhuatl. 6. Cf. BROTHERSTON, Gordon. Traduzindo a linguagem visível da escrita In: Literatura e Sociedade.
Figura 1: Tlacuilo trabalhando. Códice Vindobonense, f. 48v.
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sistema de escrita? Nas páginas dos códices podemos encontrar algumas soluções figurativas que
talvez nos ajudem a entender as prioridades que pautavam a confecção de imagens em um
contexto escriturário.
Uma dessas soluções é, na falta de um termo mais adequado, o ponto de vista múltiplo7, ou
seja, em uma mesma cena pictórica alguns elementos se apresentam como se você os olhasse de
lado – ou mesmo de dois ou mais lados – e outros como se você os olhasse de cima. Em uma
famosa imagem do Códice Vindobonense (Figura 1), temos um bom exemplo do ponto de vista
múltiplo. Nela temos um tlacuilo pintando/escrevendo um códice e utilizando-se de dois
elementos associados, conceitual e verbalmente, às suas habilidades: as tintas (negra e vermelha)
e a pluma/pincel. Repare que temos, de forma predominante, uma visão lateral. Mas se assim
fosse não poderíamos ver o que ele está pintando/escrevendo, pois as páginas do códice seriam
apenas uma linha fina. Para que saibamos que é um códice o que ele está pintando, as páginas são
apresentadas como se as olhássemos de cima, permitindo-nos ver claramente suas divisões e as
imagens em negro e vermelho, as duas cores mais utilizadas na confecção dos códices e que
também caracterizavam verbalmente a função do tlacuilo: o que usa a tinta negra e vermelha.8
Nessa mesma imagem podemos observar uma outra solução figurativa das pinturas que
compunham o sistema escriturário e que, também na falta de um termo mais adequado, podemos
chamar de vista em corte. Podemos observar este fenômeno na vasilha de tinta do tlacuilo que é
vista de lado, como o próprio escriba, mas que está seccionada para que possamos ver a tinta
negra em seu interior. Esta solução gráfica permite que o observador/leitor visualize elementos
que estariam invisíveis em uma composição pictórica que buscasse reproduzir um ponto de vista
ótico. Penso que o fato dessa imagem do Vindobonense trazer essas duas soluções pictóricas em
uma verdadeira meta-pintura/escritura, ou seja, um produto da obra do tlacuilo que se refere à sua
própria atividade, pode nos indicar algo acerca do modo pelo qual devemos olhar/ler os códices.
Este ensaio analisará a apresentação dessas duas soluções figurativas em três códices
mexicas do século XVI na tentativa de confirmar que tais soluções estavam a serviço das
prioridades do sistema de escrita pictoglífica. Espero que esse exercício contribua para que nos
7. As expressões ponto de vista múltiplo e vista em corte fazem parte do universo das artes ocidentais. Utilizo-as aqui apenas para me referir a duas soluções figurativas encontradas nos códices mesoamericanos, e não como parâmetros de avaliação qualitativa em relação à arte pictórica ocidental. 8. In tlilli in tlapalli ou a tinta negra e vermelha, sinais da sabedoria e da palavra escrita. Cf. VALLE, Perla. Memorias en imágenes de los pueblos indios In: Arqueología Mexicana. Códices coloniales.
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convençamos, cada vez mais, que as imagens não possuem significados universais e intrínsecos
que poderiam ser apreendidos apenas pela contemplação isolada. Seus múltiplos sentidos não
estão nelas: em última instância são formadas apenas de pigmentos e suportes materiais. É
preciso trabalhar comparativamente e também buscar informações em outras fontes para poder
situar as imagens dentro do universo social que as produziu e as utilizou.9 Só assim teremos um
entendimento razoável das intenções e significados que seus produtores e usuários, de forma
consciente ou não, lhes atribuíam.
Os códices mexicas
Os três códices utilizados neste ensaio pertencem ao grupo de manuscritos mexicas
produzido no século XVI, um pouco antes – no caso do Borbónico, provavelmente – ou um
pouco depois da chegada dos espanhóis – no caso do Vaticano A e do Magliabechiano.
O Códice Magliabechiano é um livro ritual, calendário e etnográfico, produzido por volta
de 1566 no Vale do México, provavelmente nas proximidades de Tepoztlan ou na parte oriental
de Morelos, região ocupada pelos xochimilcas. Possui noventa e duas folhas de papel europeu
sobre as quais há pictoglifos, feitos, provavelmente, por indígenas, e glosas em espanhol. Seus
principais temas são as festas, os signos dos dias, os signos dos anos, as cerimônias das dezoito
vintenas e as chamadas cerimônias móveis. O Magliabechiano é parte integrante do Grupo
Magliabechiano, que é formado também pelos códices Ixtlilxochitl e Tudela.10
O Códice Vaticano A possui cem folhas de papel europeu e glosas em italiano. Atribui-se
sua compilação ao frei Pedro de los Rios – a quem também é atribuído o Telleriano-Remensis. O
Vaticano A foi composto a partir de cópias de antigos códices pictoglíficos, feitas, possivelmente,
por algum religioso ou por alunos indígenas dos colégios missionários da região do Altiplano
Central. É classificado como ritual, calendário, histórico e etnográfico e acredita-se que foi
produzido entre 1566 e 1589. Suas pinturas teriam sido copiadas por um artista não
mesoamericano na Itália, e seu texto em italiano deve ter se baseado nos comentários do frei
Pedro de los Rios. Divide-se em sete maiores seções: tradições cosmogônicas e Quetzalcoatl,
9. Por se tratar de um ensaio, tomarei a liberdade de utilizar algumas consagradas idéias sobre a Mesoamérica sem a preocupação de referenciar sistematicamente as fontes ou a bibliografia. 10. Cf. GLASS, John B. & ROBERTSON, Donald. A census of native Middle American pictorial manuscripts In: Handbook of Middle American Indians. vol. 14 (parte 3), p. 155.
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calendário mântico, tábuas calendárias, dezoito vintenas, sacrifícios e outros costumes, anais
pictóricos e glifos anuais.11
O Códice Borbónico é um documento classificado como ritual e calendário e produzido em
México-Tenochtitlan nas primeiras décadas do século XVI. Confeccionado em papel
mesoamericano e em formato de biombo, possui trinta e seis folhas pintadas apenas de um lado.
Acredita-se que as duas primeiras e as duas últimas folhas perderam-se após o século XVIII,
época em que ainda se encontrava no Escorial, na Espanha.12 Possui quatro grandes seções que
tratam dos seguintes temas: o tonalpohualli (conta dos dias), o xiuhmolpilli (conta dos anos) e os
Nove Senhores da Noite, as dezoito vintenas para a cerimônia do Fogo Novo e a repetição de
uma das cerimônias com as datas para um novo período de cinqüenta e dois anos. O documento
possui algumas glosas em espanhol acrescentadas após sua confecção.
O ponto de vista múltiplo
Não podemos entender adequadamente as composições pictóricas contidas nos códices
abstraindo-as de seu contexto pictoglífico visto que, nesse contexto, uma das preocupações
centrais dos tlacuilos era confeccionar uma composição que agregasse signos reconhecíveis,
tradicionalmente utilizados e portadores de sentidos bem delimitados, os quais, por vezes, se
relacionavam à tradição oral. Parece que a solução figurativa do ponto de vista múltiplo foi um
recurso constantemente utilizado pelos tlacuilos para apresentar os elementos que dotariam uma
dada imagem de significados reconhecíveis em sua leitura.
Na última seção do Códice Magliabechiano, dedicada a algumas celebrações mexicas,
podemos perceber claramente o ponto de vista múltiplo na apresentação do campo de pelota
(Figura 2a), cujos elementos pictóricos característicos eram o formato em “H”, os anéis laterais e
os jogadores. Cada um desses três elementos figurativos é apresentado de um ponto de vista: o
traçado do campo é apresentado de cima, os anéis laterais como se você estivesse dentro do
campo, na posição dos jogadores, e esses, por sua vez, são apresentados lateralmente, como se
fossem observados horizontalmente a partir do mesmo plano em que se encontram. É claro que
esta composição não está preocupada em retratar um determinado instante de um determinado
ponto de vista, mas fornecer os elementos que servirão de registros indiciadores para sua leitura.
11. Cf. ibid, p. 186. 12. Cf. ibid, p. 97.
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Podemos observar os mesmos elementos e o mesmo recurso figurativo no Códice
Borbónico que, ao tratar das dezoito vintenas do ano sazonal, apresenta a celebração de um jogo
de pelota com a participação de quatro sacerdotes-deuses – Cinteotl-Xochipilli e Ixtlilton, à
esquerda, e Quetzalcoatl e
Cihuacoatl, à direita – na passagem
entre as vintenas Etzalcualiztli e
Tecuilhuitontli, respectivamente a
sexta e sétima vintenas (Figura 2b).
Os elementos característicos do
jogo de pelota – o traçado dos
limites do campo, os anéis e os
jogadores estão dispostos
basicamente da mesma forma que
na imagem anterior. Vale notar que
o campo de pelota do Borbónico
encontra-se inserido em um
contexto muito específico: a
celebração das festas das dezoito
vintenas do ano sazonal, mais
especificamente da passagem do
ano 1 coelho para o ano 2 cana
(1506/1507) entre os mexicas. Isto
significa que apesar de seu caráter
genérico – traçado do campo,
jogadores e os anéis – temos
também a presença de personagens e acontecimentos específicos, possivelmente identificáveis
em seus detalhes pelos tlacuilos e outros leitores, conhecedores da tradição escriturária-oral
mexica.
A utilização desta mesma solução figurativa também pode ser notada em composições que
se remetem a episódios contidos nos livros anais, cuja estrutura baseia-se na contagem dos anos
sazonais e seus ciclos de 52 anos, chamados xiuhmolpilli. Esses livros, em geral, narram as
Figura 2a e 2b: Campo de pelota e jogadores; Campo de pelota na passagem entre as vintenas Etzalcualiztli e Tecuilhuitontli. Códice Magliabechiano, p. 80v, e Códice Borbónico, p. 27.
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migrações, o estabelecimento, as lutas e as conquistas de determinado povo, como é o caso de
parte do Códice Vaticano A, que trata, sobretudo, da história mexica, desde a passagem por
Chicomoztoc (ano 2 cana ou 1194) até os tempos posteriores à chegada dos espanhóis.
Nesta seção do Vaticano A, podemos destacar duas composições que apresentam o ponto de
vista múltiplo, mas que também trazem um outro elemento em comum: a água, presente nas mais
diversas composições sempre de forma muito característica: em azul ou verde – adjetivos de
preciosidade – e em movimento – com suas pontas de pequenas ondas em círculos ou em formato
de caracol. Mas no momento nos interessa apenas que esta água em movimento se apresenta
como vista de cima enquanto que as outras personagens que compõem a cena são
caracteristicamente apresentadas de lado e com elementos que as tornam reconhecíveis.
Na primeira composição (Figura 3a), temos o episódio da fuga de Quetzalcoatl de Tula e
sua chegada em Tlapallan (Lugar Vermelho), na qual a divisa entre a terra e o mar é apresentada
como vista de cima e Quetzalcoatl como visto de lado, permitindo a visibilidade de seu chapéu
cônico, seu bastão encurvado e sua bolsa de copal. Na segunda composição (Figura 3b), temos o
local de estabelecimento definitivo dos mexicas (Tenochtitlan) entre os anos 4 coelho e 9
pedernal (1366 – 1384). Nela podemos observar a mesma solução figurativa, capaz de apresentar
o Lago Texcoco – com os tulares y cañaverales que o caracterizam por esta época – e os
elementos que indicam com precisão que se trata de Tenochtitlan – glifo toponímico do nopal
Figuras 3a e 3b: Quetzalcoatl em Tlapallan e Tenochtitlan. Códice Vaticano A, pp. 9v e 73v.
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sobre a pedra – e do soberano Acamapichtli – glifo antroponímico formado por um Feixe de
Canas que paira sobre sua cabeça.
Podemos perceber que no caso do Vaticano A, talvez por se tratar de uma cópia feita por
alguém que já não se vinculava de forma próxima às instituições mexicas responsáveis pela
escrita, a representação da água praticamente perdeu suas pontas arredondadas ou em forma de
caracol, as quais apenas podem ser pobremente vislumbradas. É como se a pintura tivesse ganho
precedência sobre os elementos pictoglíficos. Veremos que tais elementos aparecem claramente
delineados no Borbónico e mesmo em algumas partes do Magliabechiano e do próprio Vaticano
A como, por exemplo, na composição da Trezena 1 Cana. Nessa composição, Chalchiuhtlicue –
A da Saia de Jade, patrona da Primeira Idade que terminou com grandes inundações – aparece
sobre um enorme jorro de água que arrasta homens, mulheres e bens (Figura 4a).
A mesma trezena no Borbónico apresenta como provavelmente deveria ser o tonalamatl
que serviu de fonte para a confecção do Vaticano A (Figura 4b). Essas duas imagens podem nos
servir para, dentro da problemática do ponto de vista múltiplo, introduzir uma outra questão: a
pintura do corpo humano e de animais nestas composições pictoglíficas.
O corpo humano e os animais
Uma das atitudes mais comuns do olhar ocidental frente a uma pintura antropomorfa,
produzida ou não por uma outra cultura, é medir o quanto ela se aproxima ou se distancia de uma
Figuras 4a e 4b: Chalchiuhtlicue nas Trezenas 1 Cana dos códices Vaticano A, p. 17v, e Borbónico, p. 5.
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pintura baseada em princípios da ótica. Assim se pensa poder medir o desenvolvimento ou o
atraso da “arte” do povo ou da época que a produziu.
Podemos ver claramente nessas duas imagens de Chalchiuhtlicue que parte de seu corpo e
seu rosto são representados de lado – provavelmente por assim mostrarem elementos
fundamentais de seus adornos, como os brincos redondos, os cabelos longos e partes dos
toucados de algodão – e que alguns outros adornos são apresentados como se a olhássemos de
frente – como sua narigueira azul em formato de meia lua e seu peitoral de contas e pingentes
com uma grande bola amarela em seu centro. Certamente os critérios de escolha e de disposição
dos elementos nessas duas composições foram pautados antes pelo seus significados pictoglíficos
do que por preocupações com princípios anatômicos ou óticos, preocupações essas que também
estavam presentes, mas que não eram o “carro-chefe”da composição. A imagem estava a serviço
das mensagens pictoglíficas e não a serviço de uma duplicação do “mundo real”, ou melhor
dizendo, do mundo ótico.
Esta solução figurativa é muito recorrente nos códices mexicas, como podemos observar
nas páginas do Magliabechiano dedicadas às dezoito vintenas do ano sazonal. Nessa seção temos
imagens de sacerdotes-deuses que, apesar de aparecerem isoladamente, isto é, sem muitos dos
elementos que os acompanhavam em composição tradicionais, trazem alguns adornos e atavios
que não poderiam ser vistos se os olhássemos apenas de lado: como o colar do sacerdote que leva
Figuras 5a e 5b: Sacerdote que leva a máscara de Tlaloc e Xilonen. Códice Magliabechiano, pp. 29r e 36r.
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a máscara de Tlaloc e a parte frontal de seu toucado (Figura 5a); ou ainda a narigueira azul de
Xilonen, a parte frontal de seu toucado e seus adornos peitorais e abdominais (Figura 5b).
Em alguns casos, além da junção de elementos frontais e de perfil em uma mesma
composição, agregam-se também elementos vistos de cima, como é o caso das esteiras (petatl),
utilizadas pictoglificamente como elemento significativo para a leitura da composição, indicando
um grau de dignidade de deidades e/ou sacerdotes. Podemos observar esta “vista aérea” das
esteiras em composições como a da primeira página do Vaticano A (Figura 6a), na qual temos
Ometeotl – o Deus Dois, a primeira e incriada deidade que habitava o mais alto céu – sobre uma
esteira verde, ou na Trezena 1 Jacaré, na qual Ometeotl aparece como Tonacatecuhtli ou Senhor
do Nosso Sustento (Figura 6b). A importância significativa da esteira para a leitura é enfatizada
no caso de Micapetlazolli, uma das Senhoras que formariam os quatro casais do Inframundo, cujo
o próprio nome contem a palavra petatl em sua composição: seu nome significa Petate Velho dos
Mortos (Figura 6c).
Figuras 6a, 6b e 6c: Ometeotl acima dos níveis celestes; Tonacatecuhtli patrono da Trezena 1 Jacaré; Micapetlazolli no Inframundo. Códice Vaticano A, pp. 1v, 13v e 2v.
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A existência de figuras frontais nos códices mostra que o predominante uso do perfil humano não
era uma regra absoluta ou a conseqüência de uma deficiência técnica. Como vimos, seu uso
estava a serviço de um sistema que primava pela junção de elementos significativos à
composição pictoglífica. Quando os elementos significativos de uma figura humana estavam
predominantemente em sua frontalidade, esta também era pintada. No caso do Borbónico,
encontramos a frontalidade, por exemplo, em duas figuras femininas. A primeira delas é a de
Tlazolteotl-Ixcuina (Deusa da Imundície e Senhora do Algodão), deidade relacionada ao
nascimento e à fertilidade do campo (Figura 7a), e que nessa cena veste uma pele humana
feminina. Nesse caso, a sua posição de parto parece ser um dos elementos mais importantes na
composição – podemos ver a criança entrando por sua cabeça e saindo por entre suas pernas – e
gera a necessidade de uma apresentação frontal. Não obstante essa frontalidade, suas orelhas e
brincos são apresentados de forma destacada e em conjunto com adornos que cobrem sua boca e
Figuras 7a e 7b: Tlazolteotl-Ixcuina; Xilonen-Chicomecoatl. Códice Borbónico, pp. 13 e 30.
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Figuras 8a e 8b: Tecolotl e Chicoatl. Códice Borbónico, pp. 16 e 15.
que deveriam ter significados muito precisos na leitura dessa composição.
Um outro caso de frontalidade feminina aparece na seção do Borbónico dedicada às
vintenas. Na celebração da Vintena Ochpaniztli (Varrer os Caminhos) temos Xilonen-
Chicomecoatl (A do Milho Tenro–Sete Serpente), ou um sacerdote ataviado como a deusa que
também veste uma pele humana (Figura 7b). Antes de seu sacrifício, Xilonen – ou uma estátua
sua – é apresentada sobre uma grande pirâmide e cercada por quatro sacerdotes-deuses. Nesse
caso de frontalidade, também temos uma figura feminina mas não em posição de parto. Seria
necessário uma investigação mais sistemática para sabermos se o frontal apresenta-se como uma
espécie de característica de figuras femininas que vestem peles humanas ou se apresentam na
posição de parto.
No caso dos animais creio que ocorre algo semelhante. A grande maioria deles é
apresentada como se vista de lado, exceto nos casos em que os elementos mais característicos se
apresentem por outros ângulos. É o caso da aves – Treze Voadores – que acompanham os dias do
tonalamatl do Borbónico e que serviam como agouros para a consumação dos prognósticos.
Quase todas as aves são apresentadas de lado, tanto seus corpos como suas cabeças, e em posição
de vôo – no caso das sete primeiras que se dispõem junto aos dias apresentados horizontalmente
– ou em posição de repouso – no caso das seis
últimas que acompanham os dias apresentados
verticalmente. Em todos estes casos, podemos
perceber a presença de elementos característicos para o reconhecimento de tais aves: a cor das
penas, o formato da cabeça, a presença ou não de crista, o formato do bico e etc. A exceção é o
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caso do tecolotl (coruja), cujo corpo é representado lateralmente e a cabeça frontalmente, a qual
realça sua mais notória característica diacrítica: seus enormes olhos e sua enormes orelhas
emplumadas (Figura 8a).13
No caso da ave chicoatl (mocho), acontece algo parecido. Essa ave é representada
lateralmente no tonalamatl do Borbónico até a décima quarta trezena, em representações que
destacam seus olhos enormes com grandes plumas em seu redor. Da décima quinta trezena em
diante, sua cabeça é apresentada de frente, o que permite um destaque ainda maior para seus
olhos, os quais se tornam muito parecidos com os da coruja, da qual se diferencia então por não
possuir orelhas tão grandes (Figura 8b).
Vista em corte
Uma outra solução figurativa freqüentemente utilizada nas composições pictoglíficas
mexicas é a vista em corte. Esta solução permite a representação do interior das coisas, algo que o
olhar, normalmente, não têm acesso, mas que se pode chegar pela imaginação ou pelo corte na
própria coisa.
Um dos casos de utilização dessa solução figurativa é o glifo de atl (água), um dos vinte
símbolos do tonalli. Esse glifo compõem-se de um canal de irrigação ou transporte de água
seccionado transversalmente e cheio de água em movimento, com suas tradicionais pontas
arredondadas e/ou em forma de caracol.
No Vaticano A, o glifo da água aparece em suas primeiras páginas grafando a data 10 água
dentro do contexto da Primeira Idade (Idade de Chalchiuhtlicue), a qual terminou, justamente,
13. Somente na Trezena 1 Macaco (p. 11) a coruja é apresentada com o rosto em perfil, mas mesmo assim se destacam sua enormes orelhas.
Figuras 9a, 9b, 9c e 9d: Glifo 10 água na Idade de Chalchiuhtlicue; glifo 10 água no tonalamatl do Vaticano A; glifo água no conjunto dos 20 tonalli no Magliabechiano; dia 3 água no tonalamatl do Borbónico. Códice Vaticano A, pp. 4v e 17r, Códice Magliabechiano p. 12r e Códice Borbónico, p. 3.
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com grandes inundações (Figura 9a). Além disso, o glifo água aparece por todo o tonalamatl
desse mesmo códice (Figura 9b). No Códice Magliabechiano, o glifo atl aparece na seção
dedicada a apresentar os vinte signos dos dias (Figura 9c). Vale notar que este códice já não
possui um tonalamatl e sua estrutura difere bastante dos outros dois códices mexicas analisados.
Parece mais uma relação simplificada de elementos de origem mexica organizados em uma
apresentação temática que já não possui uma estrutura tipicamente mesoamericana, e que talvez
tenha sido concebida pelo pensamento cristão. Ou seja, são elementos descontextualizados para
satisfazer as perguntas e curiosidades cristãs do século XVI sobre as vestimentas, a contagem dos
dias e dos anos, a suposta astrologia, os rituais, os deuses da bebida e etc. No Borbónico, o glifo
da água também aparece de forma tradicional e ocupa uma pequena parte do quadrângulo do dia
(Figura 9d), assim como os outros glifos do tonalli, dividindo o espaço com os Nove Senhores da
Noite.
Podemos perceber que a composição do glifo atl aparece de forma bastante regular nos três
códices analisados, apesar das enormes diferenças que, em geral, separam o estilo do Borbónico,
do Vaticano A e do Magliabechiano. Além de possuírem em comum a cor azul para a água – de
novo aqui um possível adjetivo de preciosidade –, podemos observar também a presença comum
do verde em torno da base do canal em três casos, do vermelho em dois, e do amarelo em todos
os casos. Quais sentidos eram atribuídos a essas cores em um contexto pictoglífico? Voltaremos a
esse assunto em uma outra ocasião.
A vista em corte também pode ser observada em outro caso: as representações dos ossos.
Elemento constantemente presente nas páginas dos códices, os ossos aparecem em diversas
situações: formando o corpo de personagens do Inframundo, como parte de toucados na forma de
pulsões ou como bastões portados por personagens divinas ou humanas. Na maioria dos casos,
sua representação utiliza-se da vista em corte para destacar o interior vermelho (tutano), elemento
que certamente possuía uma carga significativa na leitura da composição pictoglífica.
Podemos observar claramente o destaque dado ao interior dos ossos pela solução da vista
em corte na pintura de Mictlantecuhtli como um dos patronos da Trezena 1 Pedernal do
Borbónico (Figura 10a). De forma não tão clara, podemos observar o mesmo tipo de solução na
pintura de Mictlantecuhtli como um dos patronos da Trezena 1 Erva no Vaticano A (Figura 10b).
No Magliabechiano não podemos ver o interior dos ossos nas figuras de Mictlantecuhtli (pp. 78v
e 87v). Nelas, seu corpo não é formado de ossos, suas mãos transformaram-se em enormes garras
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e apenas sua cabeça é uma caveira. Precisaríamos aqui saber mais sobre o grau de relação desse
códice com o universo
pictoglífico mexica.
Mesmo assim, em uma
de suas cenas podemos
ver Mictlantecuhtli sobre
um patamar no qual se
representam caveiras e
ossos cruzados, nos
quais ainda é possível
divisar traços
longitudinais e centrais
que, provavelmente, são
resquícios de um padrão de representação tradicional (p. 87v).
De qualquer forma, Mictlantecuhtli, o Senhor do Inframundo, é caracteristicamente
apresentado como um esqueleto cujos ossos estão à vista e mostram seu interior – talvez uma
referência à preciosidade do sangue e sua origem no interior dos ossos. Como não lembrar aqui
da famosa passagem da Leyenda de los Soles, na qual, para criar o atual homem, Quetzalcoatl
desce ao Inframundo para conseguir os preciosos ossos guardados por Mictlantecuhtli.
Conjuntamente com o sangue – com o qual os deuses irrigam os ossos – e com o milho – com o
qual o homem é alimentado –, os ossos são elementos centrais na criação do atual homem. Vale
notar que essa criação se dá a partir da junção de elementos pré-existentes: os ossos de Mictlan, o
sangue dos próprios deuses e o milho do Tonacatepetl. Parece que no pensamento
mesoamericano, a importância de tais elementos e suas origens equipara-se à própria atuação dos
deuses. Certamente tal importância era comunicada nas composições pictoglíficas e a grafia do
osso que mostra seu interior talvez se relacione com estes episódios cosmogônicos.
Figuras 10a e 10b: Mictlantecuhtli na Trezena 1 Pedernal; Mictlantecuhtli na Trezena 1 Erva. Códice Borbónico, p. 10 e Códice Vaticano A, p. 23r.
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Observamos também que em vários outros contextos aparecem ossos com a vista em corte,
geralmente na forma de um pulsão. Podemos destacar aqui um conjunto sacrificial e um toucado.
No conjunto de objetos sobre o trono da Serpente de Fogo, na Trezena 1 Serpente do Borbónico
(Figura 11a), temos uma série de elementos – uma borboleta, um espinho de maguey e uma seta
com plumas –, dentre os quais figura um pulsão de osso. O mesmo tipo de pulsão é visto no
toucado de Pahtecatl no Magliabechiano, um dos deuses do pulque, do qual brota uma flor que é
sugada por um colibri (Figura 11b). Em ambos os casos, percebemos claramente que a vista em
corte trazia ao conjunto pictórico a presença do elemento interno do osso, fato que nos autoriza a
indicar a importância desse elemento para a leitura destes conjuntos.
Creio que o caso da vista em corte também nos mostra que no universo pictoglífico mexica,
a imagem estava a serviço dos sentidos que seriam veiculados e não a serviço de uma
representação que duplicasse o mundo visível. Ao contrário, no caso da vista em corte o intuito
do tlacuilo era tornar visível o invisível, o que estava no interior das coisas, o que não podia ser
atingido diretamente pelo olhar mas que podia ser atingido pelo pensamento e pelas palavras que
seriam proferidas na leitura dos elementos destes conjuntos.
Palavras finais
Para encerrar, gostaria apenas de apresentar dois exemplos em que essas soluções
figurativas – o ponto de vista
múltiplo e a vista em corte –
se juntam e permitem o
acesso ao interior de objetos
vistos de vários ângulos. O
primeiro é a famosa cena do
ciclo de 52 anos contido no
Borbónico, no centro da qual
o casal primordial Oxomoco
e Cipactonal – vistos de perfil – estão em um recinto de ouro – cortado ao meio e visto de cima –
lançando prognósticos com grãos de milho e incensando com a bolsa de copal (Figura 12a). No
segundo exemplo, Quetzalcoatl – um dos patronos da Trezena 1Vento do Vaticano A – também
porta uma bolsa de copal em meio de um recinto cortado e cujo interior é exposto (Figura 12b).
Figuras 11a e 11b: Pulsão de osso sobre o trono da Serpente de Fogo; Pulsão de osso no toucado de Pahtecatl. Códice Borbónico, p. 9 e Códice Magliabechiano, p. 53r.
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Parece que nos dois casos, o estar no interior de um tal recinto é parte da carga significativa,
assim como a ação praticada – lançar a sorte ou incensar – e a identificação das personagens, que
por isso devem ser vistas em detalhes significativos para a leitura. Podemos seguramente afirmar
que nos dois casos, as soluções pictóricas utilizadas respondem perfeitamente às necessidades
semânticas que pautavam as prioridades pictóricas dos tlacuilos em um contexto pictoglífico,
contexto esse que não deve ser deixado de lado nas análises das imagens contidas nos códices
mexicas.
Figuras 12a e 12b: Oxomoco e Cipactonal um recinto; Quetzalcoatl patrono da Trezena 1 Vento. Códices Borbónico, p. 21, e Vaticano A, p. 31r.
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