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Universidade Federal de Itajubá Instituto de Recursos Naturais
Ciências Biológicas Licenciatura
CAMILA DE CARVALHO FERREIRA DA SILVA
ANÁLISE DA TRANSPOSIÇÃO DIDÁTICA DOS
CONHECIMENTOS SOBRE A REAÇÃO EM CADEIA DA
POLIMERASE NOS LIVROS DIDÁTICOS DE BIOLOGIA
DO ENSINO MÉDIO
ITAJUBÁ - MG
2017
CAMILA DE CARVALHO FERREIRA DA SILVA
ANÁLISE DA TRANSPOSIÇÃO DIDÁTICA DOS
CONHECIMENTOS SOBRE A REAÇÃO EM CADEIA DA
POLIMERASE NOS LIVROS DIDÁTICOS DE BIOLOGIA
DO ENSINO MÉDIO
Trabalho Final de Graduação apresentado à
Universidade Federal de Itajubá, como parte das
exigências para a conclusão do curso de Ciências
Biológicas Licenciatura.
ORIENTADORA: Profa. Dra. Andreia Arantes
Borges
ITAJUBÁ – MG
2017
CAMILA DE CARVALHO FERREIRA DA SILVA
ANÁLISE DA TRANSPOSIÇÃO DIDÁTICA DOS
CONHECIMENTOS SOBRE A REAÇÃO EM CADEIA DA
POLIMERASE NOS LIVROS DIDÁTICOS DE BIOLOGIA
DO ENSINO MÉDIO
Itajubá, 27 de novembro de 2017.
BANCA AVALIADORA
Profa. Dra. Janaína Roberta dos Santos
Profa. Dra. Andreia Arantes Borges Orientadora
i
AGRADECIMENTOS
Agradeço primeiramente à minha família, em especial aos meus pais, Carlos
Alberto e Zilda, que não só neste momento, mas em toda a minha vida estiveram comigo,
ao meu lado, fornecendo apoio, compreensão e estímulo. Que me deram todo o suporte
necessário para eu seguir em frente e não desistir dessa batalha. Devo minha vida à
eles.
À minha cachorrinha, Pandora, pela companhia em cada momento na produção
deste trabalho, e em muitas outras ocasiões tensas, felizes ou tristes.
Ao meu parceiro, Matheus, por toda ajuda e suporte psicológico nos meus
momentos difíceis, por aguentar minhas crises de choro e desespero, por estar sempre
tão perto, sempre disposto a me ajudar e me colocar pra cima, com muita atenção e
carinho.
À minha professora orientadora, Andreia Arantes Borges, por me ajudar e me
guiar ao longo dessa jornada. Pela paciência, compreensão e dedicação, e por me
fornecer todo o suporte necessário para o desenvolvimento desta pesquisa.
À Professora Janaína Roberta dos Santos por contribuir com este trabalho como
parte da banca avaliadora.
À todos os outros professores e professoras desta universidade, que de alguma
forma contribuíram para a minha formação profissional e como ser humano.
Às minhas amigas, Brunna Araújo, Joyce Ramalho, Laís Oliveira, Leticia Dias,
Vivian Martins pelas conversas, pelos conselhos, pela parceria, pelas risadas,
principalmente, por serem as melhores pessoas que a Biologia me trouxe.
Aos demais colegas das turmas 2012 e 2013 por passaram comigo as adaptações
que o curso foi sofrendo durante nosso período juntos e por serem as melhores parcerias
no dia-a-dia.
À comunidade escolar que com disponibilidade me aceitou como estagiária em
alguns momentos e por estar tão disposta a suprir minha necessidade com os livros
didáticos, fundamentais para realização desse trabalho.
E por fim agradeço à todos que, direta ou indiretamente, fizeram parte dessa
jornada e contribuíram para esta conquista.
ii
RESUMO
A biotecnologia tem otimizado as interações com a natureza, buscando suprir as
necessidades de sobrevivência dos organismos a partir da busca pela melhoria da
qualidade de vida do homem. Para atingir tais objetivos, técnicas especializadas para
análise da expressão de genes e sequenciamento foram desenvolvidas tendo como base
a Reação em Cadeia da Polimerase (do inglês, Polymerase Chain Reaction - PCR). Esta
técnica molecular revolucionou os estudos genéticos, sendo amplamente utilizada, pois
possibilitou a produção de um grande número de cópias de uma sequência específica
de DNA de uma forma automatizada, sem a necessidade de células vivas. No entanto,
o saber científico sofre transformações, adaptando-se para uma linguagem mais simples,
buscando adequar-se ao ensino escolar. Neste contexto, ocorre o que se denomina
transposição didática que se configura como um instrumento eficiente para analisar o
processo pelo qual o saber científico (saber sábio) se transforma no conhecimento
contido nos currículos e livros didáticos (saber a ser ensinado) e no que é discutido nas
salas de aula (saber ensinado). Em geral, os livros didáticos são conjuntos de
transposições didáticas de conteúdo, sendo considerados instrumentos pelos quais
transforma-se o conhecimento científico em conhecimento escolar, para que possa ser
ensinado pelos professores e aprendido pelos alunos. O presente trabalho tem como
objetivo geral analisar como o saber científico relativo aos conhecimentos sobre a
Reação em Cadeia da Polimerase (PCR) é preservado nos livros didáticos do ensino
médio das escolas da rede pública de ensino do município de Itajubá, sul de Minas
Gerais, ao ser concebido como objeto de ensino, através da análise da transposição
didática feita pelos autores dos livros em questão.
Palavras-chave: Transposição didática; PCR; Livro didático; Ensino Médio.
iii
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO ............................................................................................ 1
2. OBJETIVOS ................................................................................................ 2
3. REFERENCIAL TEÓRICO ......................................................................... 3
3.1. Contribuições do livro didático para a formação social ...................... 3
3.2. O Programa Nacional do Livro Didático para o Ensino Médio ............ 4
3.3. A transposição didática ....................................................................... 4
3.4. A Reação em Cadeia da Polimerase .................................................. 7
3.4.1. Contexto histórico ..................................................................... 7
3.4.2. Princípios metodológicos .......................................................... 11
3.4.3. Aplicações ................................................................................ 14
4. METODOLOGIA .......................................................................................... 15
4.1. Pesquisa bibliográfica ......................................................................... 16
4.2. Análise de conteúdo ........................................................................... 17
5. RESULTADOS E DISCUSSÃO .................................................................. 18
5.1. A transposição didática da técnica de PCR nos livros didáticos ........ 18
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS ........................................................................ 21
7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ............................................................ 22
8. APÊNDICE ………………………………………………………………………. 24
8.1. Proposta de transposição didática da técnica de PCR .......................... 24
1
1. INTRODUÇÃO
A última década do século XX destacou-se por seus avanços no campo das
ciências da vida, sobretudo nas áreas da biotecnologia. Os diversos ramos do
conhecimento científico reuniram-se, revelando fascinantes áreas de pesquisa que
evoluem rapidamente.
Considerando-se a biotecnologia como um conjunto de técnicas que utiliza
sistemas biológicos e organismos vivos para a criação ou modificação de produtos ou
processos para usos específicos, notadamente verifica-se que as novas pesquisas têm
revolucionado o campo de estudo propondo soluções geneticamente possíveis para
grandes problemas das sociedades modernas.
Neste sentido, a biotecnologia tem otimizado as interações com a natureza,
buscando suprir as necessidades de sobrevivência dos organismos a partir da busca
pela cura de doenças, da criação de novos medicamentos, do tratamento do lixo
produzido nas atividades diárias, do uso de novos insumos agrícolas menos prejudiciais
ao ambiente e à saúde.
Para atingir tais objetivos, técnicas especializadas para análise da expressão de
genes e sequenciamento foram desenvolvidas tendo como base a Reação em Cadeia
da Polimerase (do inglês, Polymerase Chain Reaction - PCR). Esta técnica molecular
revolucionou os estudos genéticos, sendo amplamente utilizada, pois possibilitou a
produção de um grande número de cópias de uma sequência específica de DNA de uma
forma automatizada, sem a necessidade de células vivas.
No entanto, os surpreendentes avanços alcançados geram dúvidas e incertezas
quanto a aspectos éticos, jurídicos, ecológicos e sociológicos, sendo extremamente
importante que os conhecimentos sejam compartilhados e compreendidos por todos os
ramos da sociedade a fim de se evitar que interpretações equivocadas responsáveis
pelo estabelecimento de pré-julgamentos favoráveis ou contrários ao desenvolvimento
biotecnológico.
Tem-se que a escola é um importante meio de aproximação dos estudantes e
professores do conhecimento científico, desempenhando um papel decisivo no processo
de formação da cidadania para que todos possam atuar na sociedade de forma crítica e
ativa, permitindo a interpretação do mundo ao seu redor.
A articulação de uma visão de mundo natural e social encontra-se na proposta
dos Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Médio (PCN) ao estabelecer a divisão
do conhecimento nas áreas das Ciências da Natureza, Matemática e suas Tecnologias
2
englobando os conteúdos de Física, Matemática, Química e Biologia. Segundo Brasil
(1997),
... sinaliza-se claramente que, em cada uma de suas disciplinas, pretende-se promover competências e habilidades que sirvam para o exercício de intervenções e julgamentos práticos. Isto significa, por exemplo, o entendimento de equipamentos e de procedimentos técnicos, a obtenção e análise de informações, a avaliação de riscos e benefícios em processos tecnológicos, de um significado amplo para a cidadania e também para a vida profissional. (Brasil, 1997, p.48)
No entanto, o saber científico sofre transformações, adaptando-se para uma
linguagem mais acessível, buscando adequar-se ao ensino escolar. Neste contexto,
ocorre o que se denomina transposição didática que se configura como um instrumento
eficiente para analisar o processo pelo qual o saber científico (saber sábio) se transforma
no conhecimento contido nos currículos e livros didáticos (saber a ser ensinado) e no
que é discutido nas salas de aula (saber ensinado).
Em geral, os livros didáticos são conjuntos de transposições didáticas de
conteúdo, sendo considerados instrumentos pelos quais transforma-se o conhecimento
científico em conhecimento escolar, para que possa ser ensinado pelos professores e
aprendido pelos alunos. Neste sentido, deve-se atentar que os objetos do saber que
serão ensinados não devem ser corrompidos ou substituídos, mas transformados.
Cientes da importância da educação para a disseminação do conhecimento
científico e da necessidade de compreender os avanços tecnológicos, o presente
trabalho visa compreender como o saber científico relacionado a técnica de PCR é
preservado nos livros didáticos do ensino médio.
2. OBJETIVOS
O presente trabalho tem como objetivo geral analisar como o saber científico
relativo aos conhecimentos sobre a Reação em Cadeia da Polimerase (PCR) é
apresentado nos livros didáticos do ensino médio das escolas da rede pública de ensino
do município de Itajubá, sul de Minas Gerais, ao ser concebido como objeto de ensino.
Como objetivo específico destaca-se:
Identificar a transposição didática referente aos conhecimentos sobre a PCR
presente nos livros didáticos do ensino médio.
Verificar se o conhecimento referente ao assunto-alvo foi preservado nos livros
didáticos do ensino médio.
3
3. REFERENCIAL TEÓRICO
3.1. Contribuições do livro didático para a formação social
O livro didático representa uma ferramenta muito importante para a prática do
professor e, para o aluno, contribui com a construção do conhecimento e como fonte de
pesquisa. Batista, Cunha e Cândido (2010), ao discutir o ensino de biologia destacam
que o livro didático, em muitos casos, é o único material de apoio disponível, afirmando
ainda mais a sua importância para o processo de democratização do saber. Assim, torna-
se imprescindível a análise dessa ferramenta pedagógica dado o papel de protagonista
que assume na educação básica.
Segundo Lopes (2007), os livros didáticos correspondem à transmissão escrita do
conhecimento garantindo a manutenção da produção científica. No entanto, eles devem
ser utilizados como um instrumento capaz de conduzir os alunos a reflexões sobre
valores e atitudes e não como uma mera fonte de informações.
Apesar de admitir as limitações das escolas para a formação moral dos alunos,
os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) consideram que a organização
institucional e os professores são responsáveis pela formação ética dos estudantes, além
de elegerem o livro didático como um meio importante de transmissão de valores e
regras (BRASIL, 1997).
No entanto, deve-se ressaltar as limitações inerentes ao uso dos livros didáticos
quanto a forte dependência de alguns professores que baseiam suas aulas
exclusivamente ao conteúdo abordado nos livros. Ademais, existe uma forte influência
mercadológica das editoras, onde observa-se a valorização de interesses de
determinadas empresas em detrimento da qualidade das obras.
Apesar de tais limitações, ainda a sua presença no ensino escolar é de grande
valia. Por estas razões, torna-se importante que os docentes realizem uma seleção
criteriosa dos livros didáticos a serem utilizados com seus alunos, visando aqueles
capazes de mediar a construção do conhecimento pelo aluno, para que ocorra o
empoderamento das importantes contribuições da ciência e o desenvolvimento de
valores éticos relevantes para a sociedade (PERUZZI et al., 2000).
3.2. O Programa Nacional do Livro Didático para o Ensino Médio
Ao saber da importância do livro didático como material de apoio à prática
pedagógica dos docentes e como recurso facilitador da aprendizagem dos alunos, a sua
4
seleção deve ser realizada de forma criteriosa, prezando pela qualidade do ensino a ser
difundido em sala de aula.
Nesse sentido, o Estado criou em 2003 e implantou em 2004 o Programa Nacional
do Livro Didático para o Ensino Médio (PNLEM) visando a universalização dos livros
didáticos para os alunos do ensino médio das escolas públicas brasileiras
O PNLEM é executado em ciclos trienais alternados e a avaliação das obras é
realizada por uma equipe de avaliadores designados pelo Ministério da Educação. A
avaliação obedece uma série de critérios que culmina na elaboração do Guia do Livro
Didático que contém as resenhas e informações de cada obra aprovada. Este material é
disponibilizado aos docentes para que avaliem as reflexões e orientações quanto ao
conteúdo e estrutura das obras e, então, procedam à seleção daquelas que julgam
apresentar maiores potencialidades para a sua prática pedagógica.
No âmbito da Biologia, deve-se verificar se a obra:
[...] contribui para que os conhecimentos biológicos sirvam para reconhecer
formas de discriminação racial, social, de gênero, bem como para a formação de
atitudes, posturas e valores que eduquem os cidadãos no contexto étnico-racial
para a construção de uma sociedade democrática (GUIA DE LIVROS
DIDÁTICOS, 2014, p. 12).
De certa forma, os autores de livros didáticos e os editores tornam-se
responsáveis pela construção dos conceitos e capacidades a serem ensinadas
(BUNZEN E ROJO, 2008). Por essa razão, os docentes devem realizar uma seleção
consistente do livro didático a ser adotado para as suas turmas, visto que esta tarefa
pode influenciar diretamente no sucesso do processo de ensino-aprendizagem dos seus
alunos.
A partir da seleção correta do livro didático, associada a imprescindível atuação
responsável do docente em sala de aula, é possível estabelecer um maior diálogo com
as ciências permitindo que os alunos não fiquem alheios à realidade científica
circundante. No entanto, a necessidade de se ensinar um conhecimento leva à
necessidade de modificá-lo para que se transforme em um objeto de ensino em
condições de ser aprendido pelos alunos. Tal modificação é conhecida como
transposição didática.
3.3. A Transposição didática
O conceito de transposição didática foi proposto por Michel Verret em 1975 e
amplamente divulgado por Yves Chevallard e Marie-Albert Joshua em 1982. Segundo
5
Chevallard (1991, apud BATISTETI, ARAÚJO E CALUZI, 2010, p.45), “um conteúdo de
saber designado como saber a ensinar, sofre um conjunto de transformações adaptativas
que vão torná-lo apto para ocupar um lugar entre os objetos de ensino”. Assim, o saber
científico (saber sábio), uma vez designado como um saber a ensinar, conforme presente
nos programas de ensino, sofre uma série de transformações até tornar-se um saber
ensinado.
A transformação do conhecimento científico com fins de ensino e divulgação não
constitui simples adaptação ou uma simplificação do conhecimento, pois compreende a
produção de novos saberes.
Para Chevallard a Transposição Didática é realizada por uma instituição
“invisível”, uma “esfera pensante”, nomeada como Noosfera. Tal instituição é formada
por pesquisadores, técnicos, professores, especialistas, enfim, por aqueles que ligados
a outras instituições que irão definir que saberes devem ser ensinados e com que forma
eles devem chegar à sala de aula (Figura 1). No Brasil, o resultado do trabalho da
Noosfera aparece nos documentos que trazem as diretrizes curriculares e orientam o
ensino de uma determinada disciplina científica.
Figura 1- Esquema da trajetória do saber na Transposição Didática segundo Chevallard. (Fonte: Matos Filho et al., 2008)
Nesse processo de transposição didática interna o professor é o responsável pela
transformação do saber para os alunos, negociando com eles a sua gestão, os papéis
que cada um deverá assumir, para que esse saber possa ser ensinado e aprendido.
6
Durante o processo de transformação dos conceitos científicos em objetos de
ensino é possível que ocorra os processos de despersonificação,
descontemporialização, descontextualização e naturalização (CHEVALLARD 1991,
apud BATISTETI, ARAÚJO E CALUZI, 2010).
A despersonificação está relacionada à publicidade do saber, que promove certo
grau de despersonalização à medida que este é compartilhado pela comunidade
científica. Quanto à descontemporialização, o saber ensinado torna-se desvinculado de
algum tempo ou lugar, sendo exilado de suas origens e separado de sua construção
histórica no contexto do saber sábio. Há uma recontextualização, porém, com muita
frequência o saber ensinado se encontra profundamente modificado. No que se refere à
naturalização, esta confere ao saber ensinado a evidência incontestável da naturalidade
sobre a qual a escola funda valores e administra a ordem didática, ou seja, considerar o
saber como obvio e de ocorrência natural.
Astolfi e Develay (2001) ao discutirem a transposição didática nas ciências
biológicas, enfatizaram a existência de uma “epistemologia escolar” distinguível da
epistemologia em vigor nos saberes de referência. Segundo estes autores durante as
mudanças de estatuto epistemológico do saber científico pode ocorrer o efeito de
reformulação da apresentação dos resultados das pesquisas à comunidade científica,
gerando um distanciamento entre a lógica da exposição dos resultados e o contexto de
desenvolvimento da pesquisa. Comumente evidencia-se também o processo de
dogmatização, sendo importante a consulta às publicações originais, além de se evitar
reescritos abusivos.
Segundo a teoria de Chevallard, o saber ensinado é legitimado pelo saber
científico, assim, o docente deve ter como referência o saber científico, exercendo uma
constante vigilância epistemológica ao longo das transformações que o conteúdo sofre
ao ser ensinado em sala de aula.
Tem-se que o processo de ensino passa pela transposição didática que
pressupõe relações entre o currículo formal, enunciado nos livros didáticos, e o currículo
real, tal como se apresenta na sala de aula. A caracterização deste processo, quando da
análise de livros didáticos, deve-se atentar para a análise do impacto das modalidades
de atualização dos saberes científicos propostos pelos livros didáticos na estrutura de
conhecimento dos alunos.
Neste sentindo, durante a reconstrução de uma cadeia de transposição didática
deve-se analisar o livro didático como um modo de textualização escolar do saber
7
científico, considerando-se a atualidade dos conhecimentos e a forma que será discutido
em sala de aula.
Leal (2001) analisou os processos de transposição didática da cadeia alimentar
presentes nos programas escolares e nos livros didáticos e observou que este processo
demanda criatividade e exige vigilância epistemológica para que não ocorra a
descaracterização do saber científico.
A transposição didática do conceito de transformação bacteriana proposta por
Frederick Griffith presente nos livros didáticos de Biologia foi analisada por Batisteti,
Araújo e Caluzi (2010) e revelou que o contexto histórico é pouco explorado, além de
não destacar as possibilidades de integração de conteúdos de diferentes áreas.
3.4. A Reação em Cadeia da Polimerase
3.4.1. Contexto histórico
O desenvolvimento da técnica de Reação em Cadeia da Polimerase (do inglês,
Polymerase Chain Reaction – PCR) em 1983 revolucionou o campo de estudo da
Biologia Molecular pelo fato de aumentar a eficiência de detecção de polimorfismos a
nível de DNA ou RNA a partir da redução do tempo de execução dos experimentos, de
seu custo e complexidade.
A concepção inicial desta técnica foi de Kary Mullis (Figura 2), um bioquímico
estadunidense que trabalhava com síntese química de oligonucleotídeos na Cetus
Corporation, uma empresa de biotecnologia da Califórnia. No entanto, é importante
destacar que todos os elementos necessários para a sua execução haviam sido
desvendados por outros pesquisadores que direta ou indiretamente colaboraram para a
produção do conhecimento científico associado ao desenvolvimento da PCR.
Figura 2- Kary Mullis, bioquímico estadunidense que desenvolveu a técnica da Reação em Cadeia da Polimerase.
8
Deve-se esclarecer que após a elucidação da estrutura tridimensional da
molécula de DNA em 1953 por James D. Watson e Francis Crick, intensificaram-se os
estudos sobre os mecanismos capazes de assegurar a sua replicação fiel. Neste sentido,
em meados da década de 1950, Arthur Kornberg iniciou os estudos sobre a resplicação
do DNA e em 1957 identificou a primeira enzima DNA polimerase da bactéria Escherichia
coli. Observou-se que esta enzima requeria um molde de DNA fita simples e promovia a
sua replicação em uma única direção (5’ 3’), além de necessitar de um nucleotídeo
iniciador para proceder a incorporação de novos desoxirribonucleotídeos ao longo da
nova fita sintetizada (Figura 3).
Figura 3- Química da síntese de DNA na qual ocorre a adição de um desoxirribonucleotídeo à extremidade 3’ da fita recém-sintetizada. O pareamento das bases entre o desoxirribonucleosídeo trifosfato a ser incorporado e a fita molde resulta na sequência de nucleotídeos complementares. (Fonte: Alberts et al., 2010)
Verificou-se posteriormente que o processo global de replicação do DNA era
surpreendentemente complexo, exigindo um conjunto enzimático necessário para
desnaturar a dupla hélice de DNA, para mantê-la aberta, para sintetizar os
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oligonucleotídeos iniciadores (primers), remover os primers e unir os fragmentos
amplificados.
No início da década de 1960, H. Gobind Khorana iniciou um grande projeto para
sintetizar totalmente um gene humano funcional e então iniciou a síntese de
oligonucleotídeos de DNA sintéticos para serem utilizados como iniciadores para a
extensão da fita-filha de DNA pela DNA polimerase.
Em sua pesquisa básica, o microbiologista Thomas Brock que estudava os
organismos que viviam nas águas termais do Parque Nacional de Yellowstone, em 1966,
cultivou uma bactéria que crescia a temperaturas mais elevadas do que se considerava
possível para um organismo vivo. Tal bactéria termofílica foi denominada Thermus
aquaticus. Em 1976, uma DNA polimerase é isolada de T. aquaticus (Taq DNA
polimerase) e apresentava estabilidade ao calor, mantendo sua atividade a temperaturas
acima de 75°C.
Na década de 1970, a equipe de Khorana desenvolveu um processo similar à
PCR ao propor a síntese de um sistema artificial de primers que permitiam à DNA
polimerase copiar segmentos gênicos. Apesar do uso de aplicações repetidas de DNA
polimerase, o processo empregava apenas um iniciador e, portanto, não resultava na
amplificação exponencial dos fragmentos.
No ano de 1971, a empresa de biotecnologia Cetus Corporation é fundada e
inicialmente dedicou-se ao cultivo de microrganismos capazes de produzir componentes
utilizados na indústria farmacêutica e de alimentos. Posteriormente, a empresa assumiu
projetos envolvendo o novo setor de biotecnologia, principalmente a clonagem e
expressão de genes humanos, além do desenvolvimento de testes diagnósticos para
mutações genéticas.
Kary Mullis foi contratado pela Cetus Corporation em 1979 para sintetizar
oligonucleotídeos para a execução de vários projetos de pesquisa. Em maio de 1983,
Mullis sintetizou sondas de oligonucleotídeos para analisar a mutação na hemoglobina
que causava a anemia falciforme e propôs o uso de uma técnica alternativa baseada na
adição de um segundo iniciador na fita oposta que se hibridizaria à molécula de DNA e
ocorreria a extensão da nova fita em uma reação em cadeia na qual os produtos de um
ciclo se tornavam moldes para os próximos.
Inicialmente, Mullis testou sua proposta sem alterações de temperatura, pois
esperava que a DNA polimerase extraída de E. coli permanecesse continuamente ativa
durante todas as etapas da replicação. Infelizmente, o produto de amplificação esperado
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não foi visível em eletroforese em gel de agarose, levantando dúvidas quanto a validade
e especificidade da técnica para uma região alvo.
Em novembro de 1984, os produtos de amplificação foram analisados por
Southern blot1, revelando claramente uma quantidade de 110pb esperados para o
fragmento amplificado. A partir deste primeiro sinal visível da validade da técnica, iniciou-
se a busca pelas condições ideais para as reações. Posteriormente, os produtos
amplificados foram clonados e sequenciados, demostrando a especificidade da reação,
pois apenas uma pequena fração alvo do DNA era amplificado e a DNA polimerase então
usada raramente incorporava nucleotídeos incorretos durante a replicação.
Kary Mullis tentou publicar seus experimentos nas duas revistas científicas mais
importantes, Science que lhe negou a publicação, e Nature que procedeu da mesma
forma. Resignado, Mullis publicou seu artigo sobre a amplificação do gene da β-globina
humana na Methods in Enzymology, de menor impacto (MULLIS E FALOONA, 1987).
A DNA polimerase originalmente utilizada na PCR era isolada de E. coli e não
apresentava estabilidade térmica, sendo destruída a cada passo de aquecimento para
desnaturar a dupla fita de DNA, necessitando que alíquotas frescas da enzima fossem
adicionadas manualmente a cada ciclo. Para otimizar o processo, necessitava-se de uma
DNA polimerase termoestável que permanecesse ativa durante o passo de desnaturação
do DNA realizado a cerca de 95ºC.
A solução foi encontrada no início de 1985, quando a equipe de Gelfand
purificou e clonou a DNA-polimerase da bactéria termofílica Thermus aquaticus. Assim,
em 1988, a equipe liderada por Randal Saiki substituiu a enzima obtida de E. coli pela
Taq DNA-polimerase permitindo a realização completa da PCR sem abrir o tubo de
reação, promovendo maior independência ao processo, aumentando a confiabilidade por
redução de riscos de contaminação, além de impor um maior rigor na ligação dos
iniciadores eliminando a amplificação de produtos inespecíficos (SAIKI et al., 1988).
No entanto, mesmo com essa melhora, a técnica de PCR era laboriosa e lenta,
pois exigia a transferência manual entre banhos de água a diferentes temperaturas.
Assim, as empresas Cetus e Perkin-Elmer uniram esforços e desenvolveram a primeira
máquina de termociclagem, "Mr Cycle", que podia ser programada para controlar o
tempo e a temperatura da reação de PCR sem a necessidade de transferência manual.
Em 23 de julho de 1991, a empresa Cetus Corporation anunciou a sua venda à
empresa de biotecnologia Chiron. Como parte da venda, os direitos sobre as patentes
da PCR foram vendidos por US $ 300 milhões para a empresa Hoffman-La Roche.
1 Southern blot: técnica na qual fragmentos específicos de DNA separados por eletroforese são
imobilizados em uma membrana e detectados com uma sonda de ácido nucleico marcada.
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Diante das importantes contribuições para o avanço da Biologia Molecular, em
13 de outubro de 1993, Kary Mullis foi premiado com o Prêmio Nobel de Química por ter
concebido uma técnica eficaz de amplificação de segmentos específicos de DNA que
adota os princípios básicos da replicação in vivo, mas é realizada inteiramente in vitro.
3.4.2. Fundamentos metodológicos
Antes do advento da PCR, a detecção de um segmento de DNA era possível
pelo uso de sondas marcadas radioativamente, as quais eram hibridizadas em
membranas contendo o DNA-alvo. No entanto, essas metodologias necessitavam de
uma grande quantidade de DNA-alvo e material radioativo.
Essas dificuldades foram solucionadas com a introdução da técnica de PCR que
possibilita a obtenção de grandes quantidades de fragmentos específicos de DNA por
meio da amplificação em ciclos. Tem-se que a PCR consiste na síntese enzimática in
vitro de cópias de fragmentos específicos de ácidos nucleicos, onde a partir de uma única
molécula de DNA molde é possível gerar até cem bilhões de moléculas similares em uma
reação (MATIOLI E FERNANDES, 2012).
O procedimento da PCR tem uma simplicidade interessante necessitando de
cinco componentes básicos: uma amostra de DNA contendo o fragmento a ser
amplificado, um par de oligonucleotídeos iniciadores sintéticos (primers),
desoxirribonucleotídeos trifosfatados (dNTPs), uma enzima DNA-polimerase e uma
solução tampão que contém as condições apropriadas para a ativação da enzima. Estes
componentes são misturados e colocados em um termociclador, equipamento que
possibilita o aquecimento e resfriamento rápido das amostras.
A mistura da reação é aquecida brevemente para desnaturar o DNA, onde o
calor será responsável pelo rompimento das ligações de hidrogênio existentes entre os
pares complementares de bases nitrogenadas do DNA (Adenina-Timina e Guanina-
Citosina), resultando em moléculas unifilamentares de DNA. Em seguida, a mistura é
resfriada de modo que os oligonucleotídeos iniciadores possam se hibridizar ao DNA.
Tem-se que dois oligonuceotídeos sintéticos são preparados, complementares a
sequências nas fitas opostas do DNA-alvo nas posições que definem as extremidades
do segmento a ser amplificado. As extremidades 3’ dos iniciadores hibridizados são
orientadas uma na direção da outra e posicionadas para iniciar a síntese de DNA ao
longo do segmento de DNA (COX, DOUDNA E O’DONNELL, 2012).
12
O segmento hibridizado com os oligonucleotídeos iniciadores é então replicado
seletivamente pela Taq DNA-polimerase que é tolerante ao calor, usando o conjunto de
dNTPs como blocos de construção para a síntese da nova fita complementar de DNA.
Novos filamentos complementares são sintetizados como na replicação normal de DNA
nas células, formando duas moléculas bifilamentes de DNA idênticas à molécula
bifilamentar parental que atuou como molde.
A otimização da PCR exige o ajuste fino de muitos parâmetros, incluindo as
temperaturas de desnaturação, de hibridização dos iniciadores e de extensão da nova
fita pela DNA polimerase, bem como as concentrações do DNA molde, oligonucleotídeos
iniciadores e dNTPs que serão suficientes para a amplificação satisfatória do material ao
longo da duração dos ciclos pré-estabelecidos. Portanto, é importante que tais
parâmetros sejam determinados experimentalmente para a amostra de interesse a partir
de testes que padronizarão a reação. A figura 4 exemplifica as etapas de um protocolo
de amplificação da PCR, destacando as temperaturas e tempo utilizados para a
replicação de um segmento de DNA.
Figura 4- Representação das etapas gerais de um protocolo de PCR, em que a amostra de DNA é aquecida para separar a dupla hélice de DNA e em seguida a mistura de reação passa por repetidos ciclos de hibridização dos iniciadores, síntese de DNA e desnaturação. (Fonte: Adaptado de Watson et al., 2009) O ciclo de aquecimento, resfriamento e replicação é repetido de 25 a 30 vezes
por poucas horas em um processo automatizado, onde os produtos de cada ciclo atuam
como DNA molde para o próximo, dando origem ao termo “reação em cadeia” da
polimerase. Após poucos ciclos de amplificação, o produto predominante é uma espécie
A amostra de DNA é
desnaturada para separar
as fitas (94ºC, 5min)
Ligação dos iniciadores às
fitas de DNA (30 - 65ºC,
30 segundos)
A DNA polimerase
sintetiza novas fitas de
DNA (65 - 75ºC, 2 - 5min)
Desnaturação para
separar as fitas de DNA
(94ºC, 30seg.)
+DNA-polimerase e tampão +dATP +dGTP +dCTP +dTTP
13
única de fragmento de DNA, cujo comprimento correesponde à distância entre os dois
oligonucleotídeos iniciadores originais (Figura 5).
Figura 5- Representação dos ciclos de amplificação, onde os novos fragmentos sintetizados servem como molde e após poucos ciclos o DNA predominante é idêntico à sequência entre os dois iniciadores, incluindo os dois iniciadores no molde original do DNA. (Fonte: Alberts et al., 2010)
Cada ciclo aumenta a quantidade do segmento de DNA por um fator de 2, de
modo que a concentração do DNA de interesse aumenta exponencialmente, conforme
apresentado na Tabela 1.
Tabela 1- Amplificação de moléculas de DNA durante a reação em cadeia da polimerase
Fonte: Watson et al., 2009.
Região do
DNA
cromossomal
de fita dupla a
ser
Oligonucleotídeos
iniciadores de DNA
Separação
das fitas de
DNA e
hibridização
dos
Síntese
de DNA
Síntese
de DNA
PRIMEIRO CICLO (produzindo 2 moléculas de DNA dupla fita)
SEGUNDO CICLO (produzindo 4 moléculas de
DNA dupla fita)
Síntese
de DNA
TERCEIRO CICLO (produzindo 8 moléculas
de DNA dupla fita)
Separação
das fitas de
DNA e
hibridização
dos
Separação
das fitas de
DNA e
hibridização
dos
14
A técnica da PCR é bastante sensível, sendo capaz de amplificar sequências-
alvo, que estão presentes em números extremamente baixas de cópias em uma amostra,
desde que sejam utilizados iniciadores específicos para essa sequência rara.
Embora a sensibilidade e especificidade da PCR sejam vantagens claras, a
técnica tem algumas limitações significativas. Para desenvolver os oligonucleotídeos
iniciadores, algumas informações das sequências devem estar disponíveis sobre o
fragmento de DNA a ser amplificado. Na ausência de tal informação, a amplificação não
ocorrerá. Dada a extrema sensibilidade dos métodos de PCR, não se deve permitir a
contaminação das amostras. Em várias aplicações, controles devem ser realizados para
se ter certeza de que o DNA amplificado não é derivado do pesquisador ou de um
organismo contaminante (COX, DOUDNA E O’DONNELL, 2012).
3.4.3. Aplicações
A amplificação do DNA pela PCR tornou-se uma ferramenta indispensável para
uma grande variedade de aplicações. Clinicamente, essa técnica é utilizada para o
diagnóstico rápido de doenças infecciosas, onde é possível detectar a presença de
pequenas quantidades de DNA do patógeno em diferentes amostras clínicas.
A PCR tem sido utilizada como teste para a detecção de DNA proviral do HIV.
Considerando que o diagnóstico sorológico é demorado, pois a produção de anticorpos
começa a ser detectada a partir de um a seis meses após a exposição ao vírus, a técnica
de PCR fornece um diagnóstico precoce e confiável, onde um resultado positivo pode
ser obtido a partir de 30 dias de exposição (MACHADO E COSTA, 1999).
Akuzawa et al. (2001) detectaram o DNA de Leptospira spp. diretamente na urina
de cães infectados, aumentando as chances de identificar animais doentes ou
portadores da doença, contornando as dificuldades laboratoriais de se isolar a bactéria.
A identificação de mutações nos genes BRCA1 e BRCA2, associadas ao câncer
de mama, tem sido realizada empregando a técnica de PCR. Foram identificadas três
mutações específicas mais relevantes para auxiliar o prognóstico para câncer de mama:
as mutações 185delAG e 5382insC, no gene BRCA1 (WOOSTER E LANCASTER, 1995)
e a mutação 6174delT, no gene BRCA2 (EASTON et al., 1993; COHEN, 1994). A
amplificação de regiões específicas destes genes, e posterior sequenciamento permitem
identificar rapidamente a presença de tais mutações revelando uma predisposição ao
desenvolvimento de câncer de mama aos portadores.
15
Na área forense a sensibilidade do PCR possibilita a utilização de pequenas
amostras como saliva em filtros de cigarro ou fios de cabelo, permitindo uma comparação
com outras amostras já coletadas, permitindo a identificação de vítimas, suspeitos e a
exoneração de inocentes. A identificação pelo DNA é uma das principais ferramentas do
sistema judiciário, pois estabelece laços de parentesco e identifica individualmente as
pessoas, visto que essa identificação é fundamentada no conjunto de características
hereditárias que um indivíduo possui para um determinado número de marcadores
genéticos (DOLYNSKI E PEREIRA, 2007).
A PCR também é responsável pelo florescimento da arqueologia molecular.
Krings et al. (1997) compararam sequências de DNA mitocondrial extraído de uma
amostra de 0,4g de osso de um neandertal com o material de 986 linhagens humanas
modernas de uma grande variedade de etnias. A análise filogenética revelou que os
seres humanos modernos e os neandertais divergiram há cerca de 660.000 anos
indicando que os neandertais não contribuíram com informações genéticas para a
formação do homem moderno durante os seus muitos milhares de anos de coexistência
e que, assim, o Homo neandertalensis e o Homo sapiens são espécies distintas.
A PCR tem sido empregada para a identificação de constituintes transgênicos em
alimentos. Na detecção de grãos geneticamente modificados, a técnica de PCR mostrou-
se altamente sensível, capaz de distinguir as variedades alteradas que apresentam
diferentes construções gênicas, porém expressam a mesma proteína (YAMAGUCHI et
al., 2003). Considerando que o gene transgênico é apenas um entre os milhares de
genes do genoma é necessário detectar uma única semente geneticamente modificada
entre 1.000 a 10.000 sementes convencionais e a PCR tem demonstrado ter
sensibilidade suficiente para tal (LUTHY, 1999). No entanto, o processamento de
alimentos associado ao excesso de calor, atividade de nucleases e pH baixo contribui
para a degradação do DNA, comprometendo os resultados da PCR. Assim, é
fundamental a utilização de controles de qualidade que avaliam a qualidade do DNA
extraído para evitar resultados falso-negativos (HOLST-JENSEN, 2003).
4. METODOLOGIA
A presente pesquisa possui natureza qualitativa que compreende a obtenção de
dados descritivos acerca do assunto estudado, buscando compreender a dinâmica dos
fatos a partir da perspectiva dos seus sujeitos (GODOY, 1995).
16
Entende-se que a pesquisa qualitativa pode ser realizada por meio de uma
orientação metodológica que favoreça uma compreensão mais abrangente do assunto a
ser pesquisado. Desta forma, o presente trabalho comprometeu-se a realizar uma
pesquisa bibliográfica dos livros didáticos utilizados pelos docentes do Ensino Médio,
analisando a abordagem empregada acerca do conteúdo relacionado à PCR.
A seguir é apresentado os procedimentos relacionados à fase de análise dos
dados obtidos durante a realização deste trabalho.
4.1. Pesquisa bibliográfica
A caracterização das abordagens relacionadas à PCR presentes nos livros
didáticos do ensino médio foi investigada utilizando a pesquisa bibliográfica como
método de coleta de dados.
Segundo Severino (2007), a pesquisa bibliográfica utiliza fontes constituídas por
material elaborado e registrado por outros pesquisadores, como livros, artigos, teses,
etc. Desta forma, o livro didático foi utilizado como objeto de estudo pelo fato de ser
considerado o principal documento pedagógico de apoio aos docentes nas salas de aula.
A seleção dos livros analisados foi baseada na sua utilização pelos docentes do
Ensino Médio das oito escolas da rede pública de ensino regular do município de Itajubá-
MG. A Tabela 2 apresenta a relação dos livros analisados na presente pesquisa.
Tabela 2. Relação dos livros analisados adotados pelos docentes do Ensino Médio da rede pública de ensino regular das escolas estaduais de Itajubá, volume em que o assunto pesquisado é abordado e o número de escolas em que são adotados.
Livro didático
Informações da obra
Volume
No de escolas
A
Título: Biologia Hoje Autores: Sérgio Linhares e Fernando Gewandsznajder 2ª edição São Paulo: Ática 2013
-
3
B
Título: Conexões com a Biologia Autora: Rita Helena Brockelmann 1ª edição São Paulo: Moderna 2013
3
1
C
Título: Biologia Autora: Vivian L. Mendonça 2ª edição São Paulo: Editora AJS 2013
-
2
17
Fonte: a autora.
4.2. Análise de conteúdo
A condução da compreensão e interpretação das perspectivas de ensino e
aprendizagem a que se propõem os livros didáticos analisados quanto ao assunto-alvo
do presente trabalho, foi realizada a partir da metodologia de análise de conteúdo
proposta por Bauer e Gaskel (2013) que permite a produção de inferências objetivas de
um texto considerando o seu contexto social.
Para a sistematização dos dados a transposição didática do conhecimento
relacionado à PCR foi analisada a partir de imagens e excertos transcritos dos livros
didáticos. A fim de se evitar que a análise estivesse atrelada a uma interpretação
subjetiva, os materiais textuais foram transcritos em sua forma íntegra, bem como eles
são apresentados nos livros didáticos. Posteriormente, procedeu-se à interpretação dos
dados embasada no referencial teórico articulado às informações obtidas.
A análise das possíveis mudanças decorrentes da transposição didática acerca
de conceitos referentes à PCR foi realizada a partir do estabelecimento de categorias e
subcategorias:
Presença dos conceitos científicos referentes à PCR nos livros didáticos.
Formas de abordagem dos conceitos:
- Histórica: abrangência do contexto histórico relativo ao desenvolvimento dos
conceitos.
- Atual: preservação dos saberes científicos atualmente aceitos.
Presença de elementos que caracterizam os processos de despersonificação,
descontemporialização, descontextualização e naturalização.
A partir do estudo da organização do material buscou-se identificar as
perspectivas de ensino e aprendizagem a que se submetem os livros didáticos quanto à
transformação do conhecimento científico em conhecimento escolar a ser aprendido
pelos alunos.
D
Título: Biologia Autores: César da Silva Jr., Sezar Sasson e Nelson Caldini Jr. 10ª edição São Paulo: Saraiva 2013
3
2
18
5. RESULTADOS E DISCUSSÃO
5.1. A transposição didática da técnica de PCR nos livros didáticos
A pesquisa bibliográfica realizada evidenciou que o conteúdo relacionado à PCR
é abordado em apenas dois livros didáticos (B e D) adotados pelos docentes do ensino
médio da rede pública de ensino regular do município de Itajubá-MG. Tem-se que este
conteúdo é exclusivamente abordado no volume 3 dos livros B e D nas unidades que
destacam os conhecimentos referentes à área da Genética e Biologia Molecular.
A tabela 3 reúne as informações referentes às unidades e capítulos/temas em que
a PCR é abordada nos livros didáticos analisados.
Tabela 3. Relação das unidades, capítulos/temas em que os conteúdos acerca da PCR são abordados nos livros didáticos analisados.
Livro
didático
Unidade
Capítulo/Tema
Elementos
observados
B
2. Biologia molecular e aplicações
Tema 3. Engenharia genética
Descontemporalização, descontextualixação e
naturalização.
D
2. Genética
Capítulo 13. Biotecnologia
Despersonificação, descontemporalização, descontextualixação e
naturalização.
Fonte: a autora.
Tem-se que todos os livros didáticos analisados seguem as recomendações do
Guia do Livro Didático (2014), pois apresentam tópicos relacionados a ética e
manipulação gênica. No entanto, os livros A e C omitem explicações referentes à técnica
de PCR que conforme mencionado trata-se de um procedimento básico de amplificação
do material genético in vitro, mas destacam informações referentes aos organismos
geneticamente modificados, terapia gênica, sequenciamento genético, clonagem e
terapia gênica.
Apesar dos livros B e D apresentarem o conteúdo sobre a PCR, observou-se um
baixo nível de aprofundamento quanto aos seus procedimentos metodológicos, bem
como uma breve ou mesmo inexistente apresentação do contexto histórico relativo ao
desenvolvimento da técnica e suas aplicações nos dias atuais.
Em relação à transposição didática referente à PCR, investigou-se a presença de
elementos que caracterizam os processos de despersonificação,
19
descontemporialização, descontextualização e naturalização. Tais elementos podem ser
evidenciados em excertos transcritos dos livros B e D.
Apesar do livro D abordar o conteúdo relacionado à PCR observou-se a ausência
de informações sobre os indivíduos que contribuíram para a construção da técnica da
PCR, além de não mencionar as questões problematizadoras que motivaram seu
desenvolvimento. Priorizou-se a explicação atual do processo de forma definitiva e
naturalizada, desestimulando novos questionamentos, conforme evidenciado no excerto
transcrito abaixo:
Chamada de PCR, da expressão em inglês Polymerase Chain Reaction, a técnica da reação de polimerase em cadeia permite produzir, a partir de uma pequena amostra de determinado DNA, completamente in vitro, um grande número de cópias desse DNA. As amostras podem ser fragmentos mínimos de qualquer tecido (sangue, ossos ou pele por exemplo), esperma, pelos e até material fossilizado. Em alguns casos, por exemplo em medicina legal, a quantidade de DNA recolhido pode ser muito pequena para ser analisada diretamente. Com essa técnica, no entanto, pode-se obter, em pouco tempo, uma grande quantidade de cópias daquele determinado segmento, o que possibilita sua manipulação. (Livro D, p. 173).
Diferentemente, o livro B apresenta a informação histórica que personifica o
desenvolvimento da técnica de PCR, conforme apresentado a seguir:
Outra forma de clonagem molecular foi desenvolvida pelo bioquímico estadunidense Kary Mullis em 1983, a reação de amplificação em cadeia da polimerase (PCR – do inglês Polymerase Chain Reaction). Esta técnica tornou a clonagem ainda mais rápida e fácil. (Livro B, p. 74).
Apesar da disseminação da importância do conhecimento científico ser construído
a partir da sua produção histórica, Carneiro e Gastal (2005) destacaram que,
comumente, a história da ciência é abordada superficialmente nos livros didáticos e
reforçaram a necessidade de se discutir o contexto histórico vivenciado pelos
pesquisadores como uma forma de contextualizar o conhecimento científico.
Observou-se, portanto, uma simplificação do contexto histórico ao creditar o
desenvolvimento da técnica apenas ao bioquímico Kary Mullis, pois Randal Saiki e sua
equipe contribuíram significativamente para a otimização da técnica ao propor o uso da
enzima DNA polimerase termoestável isolada da bactéria Thermus aquaticus. Mullis
(1983) empregava a enzima DNA polimerase isolada da bactéria Escherichia coli que se
desnaturava durante a fase inicial em elevadas temperaturas para promover a abertura
da dupla hélice do DNA, fazendo com que, a cada ciclo, uma nova quantidade de enzima
deveria ser adicionada. Saiki et al. (1988) substituíram a polimerase de E. coli pela já
conhecida Taq polimerase isolada da bactéria T. aquaticus, que vive em águas quentes
de gêiseres e vulcões submersos, e possui um ponto de crescimento ótimo entre 70 e
20
75ºC. Tal substituição promoveu maior independência ao processo, além de aumentar a
confiabilidade por redução de riscos de contaminação.
Desta forma, permanece uma transposição didática descontextualizada e
descontemporalizada. Novamente, os princípios da PCR são apresentados de forma
definitiva, explorando textualmente de forma superficial as etapas da técnica, conforme
observado no transcrito abaixo:
A metodologia de PCR foi desenvolvida empregando alguns princípios similares aos que ocorrem in vivo durante a replicação do DNA. Assim, podem ser usadas como molde por exemplo, preparações de DNA extraídas do organismo de interesse. A delimitação da região de interesse que se deseja clonar (amplificar) é realizada pela escolha de iniciadores, pequenas sequências de nucleotídeos (cerca de 20) sintetizadas quimicamente que devem servir de início da amplificação realizada pelas polimerases de DNA. A amplificação então ocorre em progressão exponencial, pois as novas cadeias sintetizadas começam a servir de molde nos ciclos seguintes para a síntese de mais moléculas. Com isso, a PCR possibilita uma forma de clonagem em escala de bilhões de vezes, sem a necessidade de usar células vivas (Livro B, p. 74-75).
A partir de uma representação esquemática (Figura 6), os autores do livro B
exploraram as etapas de desnaturação da dupla fita de DNA, hibridização dos iniciadores
e extensão da fita-filha, destacando a amplificação exponencial realizada pela técnica de
PCR.
Figura 6- Representação esquemática do processo de clonagem usando reação em cadeia da polimerase – PCR. (Fonte: Livro B, p. 74. Adaptado de Alberts et al., 2008)
Região
que será
amplificada
Iniciadores
Fitas de DNA
se separam e
os iniciadores
se ligam
Síntese
de DNA
Fitas de DNA
se separam e
os iniciadores
se ligam
Síntese
de DNA
PRIMEIRO CICLO (duas moléculas de DNA são formadas)
SEGUNDO CICLO (quatro moléculas de DNA são formadas)
21
Considerando as deficiências observadas nas obras analisadas, o presente
trabalho elaborou uma proposta de transposição didática para a técnica de PCR,
conforme apresentado no Apêndice. Buscou-se explorar o contexto histórico em que os
conhecimentos foram construídos, bem como questões relacionadas a microbiologia,
bioquímica e genética que favorecem a aprendizagem dos princípios relacionados a esta
técnica.
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Os avanços científicos e tecnológicos no domínio da biotecnologia constituem um
instrumento de grande potencial para contribuir para o desejável desenvolvimento
sustentável das sociedades a partir de processos de produção baseados em aplicações
biotecnológicas que visam a otimização dos mecanismos e a utilização responsável dos
recursos naturais assegurando a preservação do ambiente.
Neste sentido, deve-se promover a difusão dos avanços biotecnológicos a fim de
que os conhecimentos sejam compreendidos pelos diferentes setores da sociedade,
auxiliando na desconstrução de concepções equivocadas responsáveis pelo
estabelecimento de preconceitos devido a ausência de embasamentos teóricos
adequados.
Considerando-se a escola como importante disseminadora do conhecimento,
deve-se atentar para as diferenças existentes entre o saber de referência produzido pela
comunidade científica e o saber didatizado para os livros didáticos. Observa-se, portanto,
que o saber científico passa por um processo de transformação para que se torne um
saber a ser ensinado, caracterizando a transposição didática.
No entanto, é importante que exista uma correspondência relativa entre a
sistematização da estrutura do ensino com a da ciência a fim de garantir que o
conhecimento científico seja preservado e apresentado sem distorções que venham a
comprometer a veracidade das informações. Neste sentido, deve-se ainda priorizar a
formação inicial dos cursos de licenciatura de forma a proporcionar aos futuros
professores sólidos conhecimentos nas áreas específicas dos seus cursos para que
possam selecionar de forma criteriosa o livro didático a ser empregado em suas turmas.
Assim, o saber científico referente à técnica de PCR que tanto contribuiu para os
avanços biotecnológicos ao ser transferido para os livros didáticos para se tornar um
saber ensinado deve passar por uma série de transformações adaptativas que o tornem
apto a ocupar um lugar entre os objetos de ensino. Entretanto, deve-se promover a
22
reestruturação do conteúdo de uma forma lógica, contextualizada e integrada, além de
fazer uso de uma linguagem simples que busque se adequar ao ensino evitando-se o
distanciamento e simplificação dos conhecimentos científicos.
7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
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24
8. APÊNDICE:
8.1. Proposta de transposição didática da técnica de PCR
A Reação em Cadeia da Polimerase pode ser explicada a partir da integração de
conceitos de diferentes áreas da Biologia, pois o seu entendimento requer noções de
biologia molecular, genética, microbiologia e bioquímica.
Neste contexto, seria interessante apontar os processos que antecederam as
investigações acerca da concepção da técnica de PCR a fim de fornecer um panorama
do contexto histórico e metodológico em que as pesquisas foram realizadas. De acordo
com Fleck (1986), a inserção da história da ciência no ensino tem se mostrado uma
estratégia metodológica eficiente que apresenta a ciência como uma atividade humana
realizada por pessoas comuns que se dedicaram aos estudos. Assim, o aluno terá uma
melhor compreensão da evolução do conhecimento científico, avistando a ciência como
um processo que influencia e é influenciado por seu contexto social (BIZZO, 1991).
Adicionalmente, promoveria-se a desmistificação da visão da ciência como um fato
isolado, destacando a importante contribuição dos pesquisadores que colaboraram para
a produção do conhecimento científico associado ao desenvolvimento da PCR.
Uma recapitulação da estrutura tridimensional da dupla hélice do DNA seria
interessante, destacando a complementaridade das bases nitrogenadas em que adenina
(A) pareia com timina (T) por meio de duas ligações de hidrogênio, enquanto guanina
(G) pareia com citosina (C) por meio de três destas ligações químicas, conforme
apresentado na figura 7.
Figura 7- Pares de bases nitrogenadas presentes na dupla hélice do DNA. Como indicado, duas ligações de hidrogênio são formadas entre adenina e timina, enquanto que três são formadas entre guanina e citosina. (Fonte: Adaptado de Alberts et al., 2010)
A partir de tal discussão é possível explicar a necessidade de elevadas
temperaturas para a realização da primeira etapa da PCR que consiste na desnaturação
da dupla hélice para que as fitas simples atuem como molde para a síntese das novas
25
fitas-filhas. Cabe descrever que uma sequência rica em pares A-T desnatura-se mais
rapidamente que um fragmento com abundância em pares C-G, em virtude da menor
energia necessária para romper as duas ligações de hidrogênio que unem os pares de
base A-T em contraposição às três ligações de hidrogênio que unem os pares C-G. Este
tipo de raciocínio foi recentemente exigido na prova do Exame Nacional do Ensino Médio
(ENEM) 2017, conforme apresentado na figura 8.
Figura 8- Questão do ENEM 2017 envolvendo o princípio de desnaturação da técnica de PCR.
Como em qualquer questão é importante que o candidato leia atentamente o
enunciado, analise e reflita as informações fornecidas antes mesmo de ler as
alternativas. Nota-se que o enunciado descreveu a etapa de desnaturação necessária
para obtenção das fitas moldes do DNA. A partir de uma breve explicação sobre a forma
pela qual ocorre a complementaridade das fitas que garante a estabilidade da dupla
hélice, buscava-se verificar se os candidatos eram capazes de associar a abundância de
pares de bases nitrogenadas unidas por um menor número de ligações de hidrogênio
com a energia gerada pelo calor necessária para rompê-las mais facilmente.
Considerando que os pares A-T são unidos por apenas duas ligações de hidrogênio,
uma sequência rica neste tipo de pares de bases será desnaturada mais rapidamente
durante o aumento da temperatura na PCR. Portanto, a alternativa correta é a C. A
presença deste tipo de questão no ENEM, atualmente um dos meios de ingresso à
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educação superior, reforça a importância de se abordar a técnica de PCR nos livros
didáticos e nas salas de aula.
Outro ponto a ser explorado é sobre a utilização de organismos-modelo nos
estudos genéticos, pois conforme discutido Kary Mullis concebeu a técnica de PCR a
partir dos conhecimentos sobre a replicação in vivo estudada inicialmente na bactéria
Escherichia coli. Segundo Griffiths et al. (2008), muitos fenômenos da genética foram
investigados por experimentos em um pequeno número de espécies tidas como
organismos-modelo, pelo fato de compartilharem, especialmente a nível molecular,
muitos mecanismos genéticos. Assim, pode ser interessante discutir os motivos que
conferiram à bactéria intestinal E. coli este importante título de organismo-modelo, tais
como: reduzido tamanho dos seus representantes, curto tempo de geração e facilidade
com que podem ser cultivados e cruzados sob condições controladas em laboratório.
Adicionalmente, estes organismos são de considerável interesse para desenvolvimento
de estudos genéticos pelo fato de serem unicelulares, possuírem um único cromossomo
de DNA dupla fita circular e em maior parte de suas vidas possuírem um único conjunto
de cromossomos, sendo, portanto, haploides.
A diversidade de formas de vida dos microrganismos também pode ser abordada
ao se discutir a técnica de PCR, destacando a existência daqueles capazes de sobreviver
em fontes hidrotermais como é o caso da bactéria termofílica Thermus aquaticus. A sua
sobrevivência a elevadas temperaturas é garantida por uma composição de proteínas
que resistem ao calor extremo como a Taq DNA-polimerase que se mantém estável a
95º C. A partir de então deve-se discutir que a termoestabilidade desta enzima eliminou
a necessidade de adição de mais enzima a cada etapa de desnaturação do DNA,
garantindo a automatização da técnica de PCR.
Diante do exposto, percebe-se a viabilidade de relacionar aspectos de diferentes
áreas do conhecimento ao desenvolvimento da técnica de PCR, evitando-se a
fragmentação deste conteúdo e contribuindo para a construção do conhecimento
científico.