análise de “onde vivem os monstros”
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Uma análise do longa-metragem Onde Vivem os Monstros em relação a técnica audiovisual e a construção narrativa.TRANSCRIPT
UFF - Universidade Federal Fluminense
Instituto de Arte e Comunicação Social — Licenciatura em Cinema e
Audiovisual
Niterói, 05 de dezembro de 2014
Aluno: Pedro Henrique Alves Silva
Análise de “Onde Vivem Os Monstros”: o complexo de castração, a
montagem “jonzeana” e o imaginário infantil em cores.
2014/2
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SUMÁRIO
PARTE I ............................................................................. 03
I.1. - Crítica...................................................... 04
PARTE II............................................................................. 06
II.1. - O diretor................................................. 07
II.2. - Narrativa................................................. 10
II.3. - Fotografia................................................ 20
II.4. - Som.......................................................... 27
II. 5. - Montagem............................................... 29
BIBLIOGRAFIA.................................................................... 30
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PARTE I
Crítica
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CRÍTICA
Durante as inconstâncias do outono estadunidense do ano de 2009, um filme muito
esperado pelos norte-americanos finalmente entrava em cartaz nos cinemas. Seu nome
era Onde Vivem os Monstros, uma adaptação literária do livro infantil mais famoso do
país. Acrescente a isso o fato de ser o terceiro longa-metragem do promissor diretor de
Quero ser John Malkovich e Adaptação e lá se forma a fama em torno da película.
Não podemos começar a falar sobre o filme sem observar algo bem importante, Spike
Jonze resolveu ultrapassar as barreiras da adaptação. O livro possui somente 9 frases e
algumas ilustrações e o diretor resolveu ele mesmo adaptá-lo em roteiro para um longa-
metragem com a complexa história de uma criança aprendendo a lidar com suas
relações familiares e seus demônios interiores. Na história, Max (Max Records) é um
garoto que, após ser colocado de castigo em seu quarto, fugir de casa e ir parar em uma
misteriosa ilha; acaba se tornando uma espécie de "rei" para as criaturas que lá vivem.
A partir de uma fábula, Spike Jonze faz um complexo estudo de personagem com o
garoto Max. Usando princípios freudianos para explicar a psique infantil, a história
constrói muito mais que uma jornada edificante. Max acaba encontrando essa ilha onde
as criaturas se parecem muito com indivíduos do seu mundo real. No seu imaginário
infantil, o garoto constrói uma terra de pessoas ideais. Contudo, ao conviver com a
idealização de cada uma das criaturas, Max tem que se confrontar com a castração que
não foi finalizada por conta do rompimento abrupto do relacionamento dos seus pais.
Entre as criaturas estão Carol (James Gandolfini), o principal deles, que representa o
egocentrismo de Max e, não por acaso, torna-se o favorito do menino. Ao lado dele
estão o bode carente Alexander, a irritadiça Judith, o amável Ira, o melancólico Touro, o
companheiro Douglas e KW — o sentimento mais estranho para o garoto — o materno.
A trilha sonora para tal obra é feita por Karen O, vocalista da banda Yeah Yeah Yeahs,
e que dá outra aura ao filme. Para alguns a trilha sonora foi considerada em certos
momentos como um excesso de informação. Visto que, além do enredo complexo,
cenas com cortes rápidos e os diálogos que sempre carregam um sentido por trás; ainda
temos uma adição (ou distração dependendo do individuo) da voz suave de Karen.
Contudo, o que todos concordam é que as músicas são um espetáculo a parte.
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Por ser um filme diferente dos convencionais, o tema central muda de pessoa para
pessoa. Alguns podem achar se tratar somente de um filme de amadurecimento. Outros
podem apenas olhar pela óptica psicanalítica da trama. Entretanto, essa multiplicidade
de sentidos é o que torna o filme de caráter tão único. Jonze, assim como em outras
obras suas, consegue produzir um filme que consegue ser maior que sua própria
história. Onde Vivem os Monstros transcende o simples ato de passividade de uma
exibição, ele produz debates e questões sócio-filosóficas.
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PARTE II
Análise
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O DIRETOR
O valor cinematográfico de cada uma das obras de Spike Jonze na história do cinema
contemporâneo é enorme. Adam Spiegel, verdadeiro nome do diretor, é conhecido por
ser um autor multifacetado e perpassar no limiar entre os diversos gêneros. Entre suas
muitas funções, Jonze já acumulou a de diretor, produtor, roteirista e ator, com uma lista
de obras que incluem videoclipes icônicos, comerciais de televisão, filmes e seriados.
Logo no começo de sua carreira, Jonze se decidiu por desbravar o mundo dos skatistas
de rua. Com uma sequência de curtas e médias-metragens que abordavam o tema com
uma sensibilidade impressionante, a carreira dele como cinegrafista desse tipo de
esporte underground atingiu seu ápice com o filme “Video Days” (1991) que recebeu
diversos elogios de revistas especializadas no esporte. O filme é considerado até hoje
como um dos filmes de skate mais influentes de todos os tempos.
Quando sua fama com os seus primeiros filmes se deu início, Jonze começou a atuar no
ramo de videoclipes. Entre eles estão obras-primas do formato como "Sabotage" dos
Beastie Boys (1994), "Buddy Holly" de Weezer (1994) e "It's Oh So Quiet" da Björk
(1995). Nessa época, ele se apropriou da linguagem audiovisual dos videoclipes para
desconstruí-la e subvertê-la. Isso continua sendo uma característica observável até os
dias de hoje em seus longas-metragens.
Apesar de sua produtiva carreira em diversos ramos do audiovisual, Jonze dirigiu
apenas 4 longas-metragens. Seus dois primeiros trabalhos Being John Malkovich (1999)
e Adaptation (2002) receberam muito atenção da mídia especializada na época. Muito
se deve ao roteiro escrito por Charlie Kaufman que além de seguir por temas que as
plateias não estavam acostumadas, flertava com a metalinguagem e possuía uma crítica
embutida ao que seria o audiovisual.
Em Being John Malkovich (1999), seguimos a história de um titereiro que, ao começar
a trabalhar em uma nova empresa, descobre uma porta que o leva diretamente para o
interior da cabeça do ator John Malkovich. Em seu primeiro longa, vemos um Jonze
mais comedido. A fotografia, por mais que case com o tema proposto pelo roteiro, é
muito sombria para que possamos dar alguma importância para ela. Contudo, já
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percebemos nesse filme dois dos aspectos que seguirão toda a carreira do diretor: o
relacionamento como tema central de seus filmes e a sensibilidade presente não só
durante a direção, mas durante a montagem. O relacionamento, nesse caso, refere-se ao
triângulo amoroso incomum que se forma entre o titereiro, sua conjugue e sua nova
colega de trabalho.
Já em Adaptation (2002), Kaufman para de flertar com a metalinguagem e embasa toda
a estrutura da história nessa figura de linguagem. No filme, vemos Charlie Kaufman
logo após o término de Being John Malkovich passando por um bloqueio criativo ao
tentar adaptar um livro para o cinema. O filme vai perpassando o limiar da realidade e
ficção a ponto de realmente confundir os espectadores. Nicolas Cage faz o papel do
Kaufman no filme, o que já projeta o espectador para longe da verossimilhança. Porém,
o roteirista teria mesmo um irmão gêmeo na realidade? O livro The Orchid Thief ao
qual ele tenta desesperadamente adaptar realmente existe? Perguntas essas que deixam
quem está assistindo a película em um limbo da descrença, onde não sabem no que
podem acreditar ou não. A fotografia vista aqui é uma transição entre o escuro-bréu do
seu primeiro longa para o claro com tons escuros de seu filme seguinte. O
relacionamento que é estudado dessa vez é o de Kaufman e seu irmão gêmeo.
Seu terceiro longa-metragem Where the Wild Things Are (2009) só veio ser lançado
sete anos depois do antecessor. Havia uma grande expectativa em cima do filme por
conta de se tratar de uma adaptação literária e do roteiro caber agora ao próprio Spike
Jonze. Na história acompanhamos a visão do garoto Max sobre o mundo e somos
convidados a acompanha-lo na viagem que ele faz após fugir de casa em direção a ilha
onde os monstros do título vivem. Aqui, mais do que nunca, Jonze explora o tema do
relacionamento humano, onde os monstros são, cada qual, uma pessoa pela qual o
menino Max possui problemas no “mundo real”.
Em 2013, Spike Jonze lançou Her, o que pode ser considerado seu ode ao
relacionamento. O enredo gira em torno da relação de um homem que possui o emprego
de criar cartas românticas e seu sistema operacional. O filme pode ser considerado uma
ficção científica, mas Jonze apenas usa essa roupagem para dissertar a cada plano sobre
a dificuldade de se manter um relacionamento. Não por coincidência, a ex-mulher do
protagonista é vista como a antagonista do filme, sendo a única coisa que separa o
homem de seu amor verdade, que é personalizado em seu OS.
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Ao analisarmos sua obra como um todo, podemos perceber a influência que a época em
que ele dirigiu videoclipes possui sobre seus filmes. Os cortes, por mais que sejam
escolhidos com muita sensibilidade, se mostram frenéticos em alguns momentos. Assim
como os ângulos que ele adota vez ou outra em certos planos. A importância que ele dá
em relação ao movimento também pode ser explicada pelos filmes que ele filmou no
começo de sua carreira, onde os movimentos deveriam ser valorizados.
Spike Jonze possui atualmente mais de 59 premiações incluindo o Oscar de melhor
roteiro original pelo filme Ela em 2014 e o prêmio de melhor novo cineasta no MTV
Movie Awards no ano de 2000.
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NARRATIVA
“A felicidade nem sempre é o melhor caminho para ser feliz.”
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O livro
Where the Wild Things Are (no Brasil: Onde Vivem os Monstros) é um livro infantil do
escritor e ilustrador americano Maurice Sendak lançado em 1963.
Maurice Bernard Sendak nasceu em 10 de junho de 1928 no Brooklyn. Sendak iniciou
sua carreira como ilustrador, mas em meados da década de 1950, decidiu começar tanto
a escrever quanto ilustrar seus próprios livros. Em 1956, publicou seu primeiro livro
como autor solo, Kenny's Window (1956). Logo depois, ele começou um novo trabalho.
A história era para ser supostamente sobre uma criança que, depois de um acesso de
raiva, é deixado de castigo em seu quarto e decide fugir para o lugar que daria título ao
livro, a "terra dos cavalos selvagens" (The land of wild horses). Pouco antes de iniciar
as ilustrações, Sendak percebeu que ele não sabia como desenhar cavalos e, por
sugestão de seu editor, mudou dos cavalos selvagens para criaturas mais ambíguas
denominadas "Wild Things", um termo inspirado na expressão iídiche "vilde Chaya"
("animais selvagens"), usado para indicar crianças barulhentas.
Ele substituiu os cavalos por caricaturas de seus tios e tias. Caricaturas essas que ele
tinha desenhado originalmente em sua juventude como uma fuga das visitas semanais
caóticos de seus parentes, nas tardes de domingo, a casa de sua família no Brooklyn.
Sendak, quando criança, via seus parentes como sendo "todos malucos - rostos loucos e
olhos selvagens; com os olhos manchados de sangue e "grandes e amarelos" dentes;
pessoas que beliscavam as bochechas até que elas estivessem vermelhas". Estes
parentes, como os pais de Sendak, eram imigrantes judeus pobres da Polônia, cujo
restante da família que estava na Europa foi morta durante o Holocausto enquanto
Sendak ainda estava no início de sua adolescência. Quando era criança, no entanto, viu-
os apenas como "grotescos".
Where the Wild Things Are já vendeu 19 milhões de cópias pelo mundo, sendo destas
10 milhões somente em territórios estadunidense, se transformando no livro infantil
mais famoso dos Estados Unidos e elevando o nome de Sendak ao título de um dos
maiores ilustradores americanos. O livro é composto por 9 frases e 18 ilustrações. A
história segue Max, um garoto de cinco anos de idade, que, após fazer uma grande
travessura, é posto de castigo por sua mãe. No quarto, o menino fantasia um mundo
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fantástico, onde ele interage de diversas formas com vários monstros gigantes. As
ilustrações vão seguindo o fluxo narrativo do enredo. Aos poucos, elas vão aumentando
até tomar conta de uma página inteira e, em seguida, de duas; como se representassem o
fluxo imaginativo do garoto Max.
De acordo com Sendak, num primeiro momento, o livro foi proibido em bibliotecas e
recebeu críticas negativas. Demorou cerca de dois anos para que os bibliotecários e
professores percebessem que os estudantes estavam se reunindo e verificando toda hora
a disponibilidade do livro na biblioteca da escola. Esse também foi o tempo necessário
para que os críticos amenizassem suas opiniões negativas. Desde então, o livro recebeu
alta aclamação da crítica especializada. Francis Spufford sugere que o livro é "um dos
poucos livros ilustrados que faz um uso totalmente deliberado e bonito da história
psicanalítica da ira”. Mary Pols da revista Time escreveu que "o que faz o livro de
Sendak tão convincente é a sua fundamentação: Max tem um acesso de raiva e em um
voo de fantasia visita seu lado selvagem, mas ele é trazido de volta por uma crença no
amor dos pais para uma sopa que "ainda continua quente, equilibrando a gangorra de
medo e conforto"". O crítico de cinema do New York Times, Manohla Dargis, observou
que "há diferentes maneiras de ler o livro, através de um prisma freudiano ou
colonialista, e provavelmente existem tantas maneiras de arruinar esta delicada história
de uma criança solitária liberada por sua imaginação". No livro de Selma G. Lanes “A
Arte de Maurice Sendak”, Sendak discute Onde Vivem os Monstros, juntamente com
seus outros livros In the Night Kitchen e Outside Over There como uma espécie de
trilogia centrada em crianças em fase de amadurecimento, sobrevivência, mudança e
fúria. Ele indicou que os três livros são "todas as variações sobre o mesmo tema: como
as crianças dominam vários sentimentos - perigo, tédio, medo, frustração, ciúme - e
conseguem vir a enfrentar as realidades de suas vidas".
Com base em uma pesquisa on-line de 2007, a Associação Nacional de Educação
nomeou o livro como um dos "Top 100 livros para crianças" através dos professores.
Cinco anos mais tarde, a School Library Journal patrocinou uma pesquisa entre seus
leitores que identificou Where the Wild Things Are como o melhor livro ilustrado.
Elizabeth Bird, a bibliotecária da New York Public Library (NYPL) que conduziu a
pesquisa, observou que não havia nenhuma dúvida de que ele seria eleito o número um
e destacou o comentário de um leitor que serviu como um divisor de águas durante a
votação, "(o livro) deu início à era moderna de livros ilustrados". Outro leitor o chamou
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de "perfeitamente trabalhado, perfeitamente ilustrado... Simplesmente o epítome de um
livro ilustrado" e observou que Sendak "se destaca dos demais, em parte porque ele é
subversivo". O presidente Barack Obama lê o livro anualmente para as crianças que
frequentam a Easter Egg roll da Casa Branca.
Apesar da popularidade do livro, Sendak recusou-se a produzir uma sequência; quatro
meses antes de sua morte em 2012, ele disse ao comediante Stephen Colbert que seria
"a ideia mais chata que se possa imaginar". Sendak morreu em 2012 depois de sofrer
um acidente vascular cerebral.
No decorrer do tempo, o livro passou por várias adaptações além do filme do Spike
Jonze.
Um curta de animação baseado no livro, que havia levado cinco anos para ser
concluído, foi lançado em 1973, dirigido por Gene Deitch e produzido pelo Krátký
Filme, Praga, por Weston Woods Studios. Duas versões foram lançadas: a versão
original 1973, com narração de Allen Swift e uma trilha sonora composta pelo próprio
Deitch; e uma versão atualizada em 1988, com nova música e narração de Peter
Schickele.
Na década de 1980, Sendak trabalhou com o compositor britânico Oliver Knussen em
uma ópera infantil baseado no livro. A ópera realizou a sua primeira performance
(incompleta) em Bruxelas em 1980; a primeira apresentação completa da versão final
foi apresentada pela Glyndebourne Touring Opera em Londres, em 1984; seguida pela
sua primeira apresentação nos EUA em Saint Paul, Minnesota, em 1985; e a estreia na
cidade de Nova Iorque pela New York City Opera em 1987. Uma performance foi feita
na Proms no Royal Albert Hall em Londres, em 2002. Foi durante esse trabalho que
Sendak nomeou os monstros, ao dar-lhes os nomes de seus parentes: Tzippy, Moishe,
Aaron, Emile e Bernard.
Em 1983, o estúdio de Walt Disney realizou uma série de testes de imagens geradas por
computador criado por Glen Keane e John Lasseter usando como tema Onde Vivem os
Monstros.
Em 1999, Isadar lançou uma composição para piano intitulada "Onde Vivem os
Monstros", que apareceu em seu álbum Active Imagination, inspirada no livro de
Sendak. A composição foi revisitada e regravada em 2012 no álbum de Isadar,
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Reconstructed, com o vencedor do Grammy e fundador da Windham Hill Records,
William Ackerman, produzindo.
Em 2012, o quarteto indie Alt-J lançou a música "Breezeblocks", inspirada em partes
pelo livro. O tecladista Gus Unger-Hamilton disse que a história e a música
compartilham ideias semelhantes sobre o sentimento de se despedir de um ente querido.
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O roteiro
Spike Jonze durante a escrita do roteiro contou com a ajuda de Dave Eggers. O roteiro
posteriormente foi, inclusive, romantizado e lançado em conjunto com fotos e
curiosidades dos bastidores do filme.
A história do garoto Max ganhou uma nova forma nas mãos do Spike Jonze. Abaixo
analisaremos alguns planos que formam uma poesia visual entre situações bastante
semelhantes no decorrer do roteiro.
Nos dois planos acima, podemos ver Max tendo o mesmo ponto de vista de duas
situações muito parecidas. A primeira sendo a destruição de seu igloo pelos amigos da
sua irmã e a segunda sendo a formação de um “igloo” formado por monstros. Nas duas
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situações ele tem um mesmo ponto de vista a partir de um buraco onde apenas pode
enxergar tudo passivamente. A diferença entre os dois pontos de vista são somente o
próprio garoto que acaba tendo sentimentos opostos: raiva e medo em um, e alegria e
felicidade em outro.
O momento que mais se aproxima do que ele sentiu no igloo, contudo, pode ser esse.
Nesse plano, Max é escondido dentro da barriga de KW, pois Carol se descontrola e
tenta devorá-lo. Enquanto conversa com a criatura, Max está tão ou mais desolado que
no incidente na neve do começo do filme. Seu único ponto de vista é o buraco da boca
do monstro.
Cada um dos três planos pode, por si só, também ser uma alusão ao nascimento e ao
ultrapoder materno cujo menino sente tanto medo no decorrer da trama.
Outra coisa muito interessante no roteiro são as pistas visuais que o diretor cria sobre o
desenvolvimento da história.
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A cidade que Max criou e tem em seu quarto é bastante parecida com a que Carol
construiu na sua caverna secreta. Isso serviu para aproximar mais o relacionamento dos
dois, além de ter dado uma pequena dica de que tudo não passa da imaginação do
menino.
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Assim como a existência de um barquinho e de um objeto que se assemelha bastante a
habitação que Max começa a construir na ilha dos monstros.
Por fim, vale ressaltar pequenos detalhes que destoam o filme do gênero de infanto-
juvenil.
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Tanto os ossos que estavam junto a coroa que deram a Max logo que o menino chega a
ilha, quanto o fato de Carol arrancar o “braço favorito” de seu amigo torna a tarefa dos
espectadores classificarem o filme no gênero infantil impossível.
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FOTOGRAFIA
“Ele é só um menino fantasiado de lobo que finge ser rei”
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Imagem 1
http://moviesincolor.com/post/79685885824/spike-jonze-week-where-the-wild-
things-are-2009
Imagem 2
http://moviesincolor.com/post/79840424283/spike-jonze-week-where-the-wild-
things-are-2009
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Imagem do espectro de cores
Como pode ser observado nas duas imagens anteriores, a paleta de cores do filme como
um todo transita entre os tons pastéis e claros. As cores passeiam pelo campo do
marrom para que façamos subconscientemente a relação do lugar com os monstros que
lá vivem; e com o azul claro para deixar toda a paisagem mais onírica sem que nos
esqueçamos de que estamos observando as desventuras criadas dentro da mente de uma
criança.
Como um elemento narrativo, pudemos destacar dois pontos de grande importância da
fotografia no filme.
O primeiro se observa na dicotomia realidade/fantasia. Nos primeiros minutos da
película, quando vemos Max ainda no dito “mundo real”, a paleta de cores que é vista é
bastante diferente. Por mais que possamos ainda encontrar os tons claros e pastéis que
percorrem toda a narrativa, as cores em destaque são diametralmente opostas as vistas
na ilha dos monstros. O azul está presente, mas ao invés de simbolizar o céu e toda a
liberdade propiciada pelo dia que está acontecendo — ou mesmo as águas da praia; ela
está presente nas roupas, cobertores e carpetes. O céu, inclusive, aparece nessa primeira
parte do longa como algo cinza e depressivo logo quando o professor divaga sobre a
provável morte iminente do sol. Já os tons terrosos vistos durante o dia na ilha, na
realidade são percebidos através das cores amareladas durante, por exemplo, o momento
que Max conta a história dos vampiros para a sua mãe.
A segunda se observa na dicotomia dia/noite. Para cada um desses pontos do dia é dada
certa importância no desenrolar da história na ilha. Durante o dia, somente
acontecimentos que possuam relações com amor e liberdade são mostrados. É durante o
dia que Max faz a bagunça geral com os monstros. Também é durante o dia que eles
fazem a guerra de lama; o Carol o leva para ver sua maquete do mundo ideal; e é
quando eles começam a construir o forte. Já durante a noite são onde os acontecimentos
que envolvem raiva e aprisionamento ocorrem. Durante esse período que Max observa
as tendências homicidas de Carol enquanto dorme; fica preso na barriga de KW quando
Carol tenta devorá-lo; e, ainda, é quando todas as criaturas descobrem que ele não
possui poder algum e o deixam sozinho durante a neve.
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Já ao considerarmos a fotografia como um elemento técnico durante o filme, há alguns
pontos do longa-metragem que merecem ser destacados.
O primeiro é quando e como ocorre a mudança de cores de uma paleta de cores para
outra — da paleta que simboliza a “realidade” para que simboliza a “fantasia”. Durante
a sequência da fuga de Max de sua casa, logo após ele passar por baixo de uma cerca,
ele começa a descontar sua raiva em todos os objetos que encontra. Nesse momento,
onde ele começa a tentar descarregar sua raiva, a cor predominante na tela é um amarelo
que quase tende a um verde. Logo quando ele se acalma e começa a pensar no que havia
feito, a cor muda gradativamente para um azul escuro. A partir daí, todas as cores se
resignificam e se transformam em um elemento de desenvolvimento da história.
Outro ponto importante é o céu. Mais especificamente, o sol.
Em cada um dos ambientes da ilha, o céu adquire uma coloração diferente. Quando os
personagens estão no penhasco ele tem um azul forte e vivo; na floresta um azul mais
claro que dá lugar as raios amarelos do sol; no deserto, ele é quase acinzentado; e,
quando Max visita a caverna secreta de Carol, ele quase se confunde com as rochas da
caverna.
As cores só se resignificam novamente quando todas as criaturas brigam com Max,
deixando o menino sozinho. Em um plano, o menino está sentado em uma pedra
observando as águas do mar e o céu. Tanto um quanto o outro não está mais azuis, nem
tampouco acinzentados. A cor de ambos tende para um verde-água dúbio que tanto pode
ser associado ao momento triste que Max está passando, quanto pode ser ligado a
indiferença daquele ambiente com relação aos sentimentos do garoto.
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Direção de arte
A importância dada a direção de arte é bem maior do que na maioria dos outros filmes
da contemporaneidade. Isso se deve na maior parte pela forma que o diretor trabalha em
seus filmes. Nos anteriores, ele também havia dado uma atenção especial a toda a
construção de cenários e a pequenos detalhes dos personagens. Onde Vivem os
Monstros em si, é um filho que abusa dos planos detalhes. Isso nos ajuda a perceber
cada uma das escolhas minuciosas escolhidas pelo producion design.
Dois aspectos óbvios que não poderíamos deixar de comentar são as fantasias tanto do
Max quanto dos monstros.
A do Max, um misto de fantasia e pijama, demonstra muito bem a maior parte da
personalidade do menino. Uma fantasia de lobo te dá a ideia do quão fraternal o menino
é, ao mesmo tempo em que não consegue controlar totalmente seus institutos primitivos
como a ira. Assim como os lobos, Max busca viver em uma alcateia e, a cada vez que
algum integrante da alcateia-família dele tenta se afastar, ele perde o controle e tenta
punir severamente o integrante.
As vestimentas das criaturas foram mais complicadas. Por ser uma adaptação literária
de um livro ilustrado, a produção já tinha um modelo a seguir. Concomitantemente, a
produção de arte buscava deixar cada uma das fantasias mais palatáveis para o público
infanto-juvenil para qual a produtora estava vendendo o filme no mercado. As roupas
foram criadas pela The Jim Henson Company, que também criou os Muppets. Por
querer que o filme não possuísse quase nenhum efeito digital, Spike Jonze optou pelas
máscaras das roupas serem robóticas e controladas por controle remoto. Contudo,
nenhum dos dublês que ele selecionou — que possuíam entre 1,8 e 2,4 metros de altura
— conseguia andar normalmente com a fantasia. Isso fez com que as máscaras fossem
refeitas e todas as expressões dos monstros criadas a partir de computação gráfica.
Para as paisagens foram usados ambientes reais localizados na Austrália e nos Estados
Unidos.
Já em relação a cada detalhe criado pela equipe de arte, Spike Jonze deu uma atenção
redobrada como veremos nos planos abaixo.
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Quando entramos no quarto da irmã de Max, vemos logo na porta uma placa
customizada junto com uma foto dela com algumas amigas. Esses detalhes junto a cena
inicial mostram as prioridades de relacionamento da Claire e mostra o quão relapsa a
menina é como irmã.
Podemos ver a mesa de cabeceira da Claire e conhecer suas predileções.
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Assim como podemos ver mais sobre o Max em suas pelúcias.
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SOM
A direção de som é bem precisa durante todo o tempo de filme. Os ruídos são na
maioria das vezes realistas (com alguns momentos hiper-realistas como no momento
dos sons da bola de neve sendo acertada logo no começo do filme). Esses ruídos são
parte importante para a narrativa, vide que muitos dos momentos mais importantes da
história como a guerra de lama seca, a guerra de neve, a bagunça geral e a construção do
forte não possuem muitos diálogos. É o som dos ruídos em conjunto com a trilha sonora
musicada que vão desenvolvendo tal história.
Em relação à música, ao invés de contratar um musicista que criaria as faixas de áudio
com a ajuda de uma orquestra ou instrumentos próprios, Spike Jonze convidou a
vocalista da banda norte-americana Yeah Yeah Yeahs, Karen O. Foi um trabalho bem
intimista dos dois durante a época de produção do filme, considerando que ambos
estavam em um relacionamento amoroso.
Com toda a liberdade ofertada a ela, a vocalista se decidiu por montar uma banda
formada por grande parte dos seus companheiros do Yeah Yeah Yeahs e algumas
adições como o guitarrista Jack Lawrence vindo do quarteto australiano The
Raconteurs. Nos vocais, Karen O convidou o elenco infantil do filme para acompanha-
la. Desse modo foi formado Karen O and the Kids.
Para dar mais profundidade a trilha e auxiliar Karen O em sua empreitada, Carter
Burwell também foi chamado. Ele já era um componente fixo na equipe de Jonze, já
tendo composto a trilha sonora nos dois filmes anteriores do diretor: Quero ser John
Malkovich e Adaptação. Suas 3 faixas instrumentais colocadas no filme não foram
creditas.
A trilha sonora foi bem recebida pela maioria dos críticos e pelo grande público em
geral. A maioria das críticas negativas que recebeu se devia ao fato de afirmarem que a
junção dos planos visuais com as melodias criados pela Karen O formava um
compendio com muita informação visual e auditiva para o espectador, de uma forma
que o mesmo não conseguia assimilar completamente nem um aspecto da película, nem
outro.
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Já os diálogos, ao contrário que pode parecer ao ouvirmos falar de todos os temas que a
narrativa evoca não tem um papel maior que os outros aspectos do som. Ele é
importante em alguns momentos, é claro. Todo o diálogo de Max com Carol parece ser
um mergulho na psique do garoto, mas em muitas outras sequências as palavras nunca
conseguiriam causar o mesmo impacto com a música colocada. Poderemos citar a
sequência de Max chorando logo após ter seu igloo destruído e olhando para a irmã a
procura de ajuda, enquanto a mesma entra no carro dos amigos e vai embora.
Em nenhum momento do filme, porém, há um silêncio absoluto. Mesmo durante as
elipses com fade a cena inicia com uma trilha. Essa escolha pode ter sido feita para
salientar o caráter agitadiço do garoto, sem nenhum momento de total calma e
meditação; mas somente momentos que transitam no extremo da felicidade e da tristeza.
Uma coisa muito curiosa sobre o som do filme foi que, para gravar as dublagens dos
monstros, Spike Jonze chamou todos os atores e atrizes para um estúdio e, a partir de
um microfone preso a cabeça, os fez atuarem como se realmente fossem os monstros
fazendo o que eles dublavam. Com isso, ele conseguiu extrair dos atores uma dublagem
verossímil que passa exatamente o que o diretor queria com cada sequência.
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MONTAGEM
A montagem observada durante o filme é bem dinâmica. A partir de planos que são, na
maioria das vezes, curtíssimos, a montagem adquire uma característica excepcional
durante a película de mascarar os mais de mil planos que se desenrolam durante os
minutos de projeção para que o espectador não se sinta cansado pela constante mudança
de angulações.
Nos outros aspectos, ela possui caráter bem clássico-narrativa ao tentar mascarar o final
de um plano e o começo de outro.
Contudo, a dois pontos que merecem destaque.
Primeiramente, os créditos inicias do filme customizados pelo Max são excepcionais em
termos de imergir o espectador na atmosfera do filme. O encarte do DVD tem esse
mesmo cuidado de colocar os traços fortes e febris de Max como uma customização.
Inclusive a fonte do título remetendo a descuido e a rabiscos possui esse mesmo
propósito de imersão.
Os outros destaques são os dois momentos onde a montagem se utiliza da fusão de
imagens. Quando a paleta de cores começa a mudar logo após Max fugir de sua casa, há
uma sequência de fusões de imagens que servem ao propósito de desacelerar tanto a
narrativa quanto o personagem. Serve como a marcha de um carro desacelerando tudo.
E consegue servir a esse propósito.
Já na segunda vez, é logo quando Max está indo embora da ilha. Nesse momento
porém, a fusão possui o propósito de acelerar a narrativa e dar ritmo, além de funcionar
como uma clara elipse de tempo.
É bem curioso perceber isso, já que todas essas fusões servem ao caráter de mostrar o
tempo psicológico do personagem e mostrar o quão frenética é a própria imaginação de
Max.
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BIBLIOGRAFIA
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