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ANÁLISE MORFOMÉTRICA E DETERMINAÇÃO DE REGIÕES
FISICAMENTE HOMEGÊNEAS NA BACIA DO RIO DOCE
(MG/ES)
Laura Pereira do Nascimento. Aluna do 5º Período do Curso de Tecnologia em
Gestão Ambiental do IFMG, campus Governador Valadares. [email protected]
Fábio Monteiro Cruz. Professor Mestre do Curso de Tecnologia em Gestão
Ambiental do IFMG, campus Governador Valadares. [email protected]
RESUMO: As bacias hidrográficas constituem unidades onde todos os processos hidrológicos
que caracterizam o ciclo da água se processam simultaneamente. Neste sentido, as
características físicas das bacias podem modular a magnitude destes processes e eventos
hidrológicos que causam grandes prejuízos, como enchentes, e ainda determinar a
disponibilidade hídrica das bacias. A bacia do rio Doce (MG/ES) apresenta recorrentes eventos
de enchentes e ainda possui grandes usuários de recursos hídricos. Desta forma, foi realizada
análise morfométrica das sub-bacias principais do rio Doce e determinação de regiões
fisicamente homogêneas, a fim auxiliar os processos de regionalização hidrológica e
gerenciamento de recursos hídricos regionais. Os resultados revelaram que quanto à forma
não há grande fragilidade a enchentes nas sub-bacias, contudo, o relevo associado ao
antropismo pode estar sendo mais determinantes neste processo. Foram identificadas sete
regiões fisicamente homogêneas na bacia do rio Doce, podendo otimizar eficientemente o
exercício de determinação das regiões hidrologicamente homogêneas na bacia do rio Doce.
Palavras-chave: Análise morfométrica, regiões fisicamente homogêneas, análise de
grupamentos, bacia hidrográfica do rio Doce.
ABSTRACT: Watersheds are units where all the hydrological processes that characterize the
water cycle are processed simultaneously. In this sense, the physical characteristics can
modulate the magnitude of these processes and hydrological events that cause major damage
such as floods, and even determine the availability of water on watersheds. The Doce
watershed (MG/ES) presents recurring flood events and still has large water users. Thus, we
performed a morphometric analysis of major sub-basins of the Doce river and determination of
physically homogeneous regions, to assist the processes of regionalization and hydrological
management of regional water resources. The results showed that as to the great fragility no
flooding sub-basins, however, the relief may be associated with anthropism being more decisive
in this process. We identified seven regions physically homogeneous in Doce river watershed
and can efficiently optimize the performance of determination hydrologically homogeneous
regions in the Doce river.
Keywords: Morphometric analysis, physically homogeneous regions, analysis of clusters, Doce
river watershed.
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1. INTRODUÇAO
A água doce é elemento essencial ao consumo humano, ao desenvolvimento
de suas atividades industriais e agrícolas e aos ecossistemas das terras emersas
(REBOUÇAS, 2006). Além disso, considerando o ciclo hidrológico, a água ao interagir
com os componentes do meio incorpora as características ambientais e de
conservação das áreas drenadas, funcionando como indicador ambiental de grande
eficiência (OKI, 2002).
O ciclo hidrológico representa o percurso da água desde a atmosfera,
passando por diferentes estados físicos (fluxos) e compartimentos (estoques), até
retornar novamente à atmosfera (DERISIO, 2000). A água que cai na superfície
terrestre está sujeita à interceptação da vegetação, evaporação, evapotranspiração,
infiltração no solo e ao escoamento superficial. Assim, a caracterização do ciclo
hidrológico é importante para avaliação da quantidade e qualidade da água,
(EMBRAPA, 2013).
Na fase terrestre do ciclo hidrológico, que ocorre nas bacias hidrográficas, se
sobressaem os processos hidrológicos de infiltração e escoamento superficial. Neste
sentido, a bacia hidrográfica pode ser definida como uma área limitada por um divisor
de águas, que a separa das bacias adjacentes e que serve de captação natural da
água de precipitação através de superfícies vertentes. Por meio de uma rede de
drenagem, formada por cursos d’água, ela faz convergir os escoamentos para a seção
de exutório, seu único ponto de saída (LINSLEY; FRANZINI, 1978; TUCCI, 1997).
Os principais componentes das bacias hidrográficas - solo, água, vegetação e
fauna - coexistem em permanente e dinâmica interação respondendo às interferências
naturais (intemperismo e modelagem da paisagem) e aquelas de natureza antrópica
(uso/ocupação da paisagem), afetando os ecossistemas como um todo (SOUZA;
FERNADES, 2000).
Considerando o contexto climático do Brasil, o clima tropical predominante leva
frequentemente a ocorrência de chuvas intensas sazonais, assim os tipos de solos e
condições do relevo são variáveis que podem favorecer eventos como enchentes, as
quais são agravadas devido às características da drenagem (forma e densidade) de
uma determinada bacia hidrográfica (CASTRO; CARVALHO, 2009).
Do exposto ocorre que, ao longo das últimas décadas, ações corretivas e de
prevenção de danos ambientais surgiram em função da discussão sobre a importância
em se promover o desenvolvimento econômico e social aliado à proteção ambiental,
onde a inclusão de medidas de disciplinamento, principalmente do uso/ocupação do
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solo e da apropriação dos recursos naturais assumem um papel fundamental
(BEZERRA, 2008).
Dado o fato de que o estado de conservação ambiental e as características
físicas das bacias hidrográficas produzem efeitos diretos sobre a disponibilidade
hídrica quali e quantitativa, soluções propostas para equacionar esta problemática
devem estar estreitamente ligada ao manejo e manutenção das bacias (SANTOS,
2004).
Neste contexto, a análise morfométrica constitui uma importante ferramenta
para o planejamento ambiental e de recursos hídricos, uma vez que corresponde a um
conjunto de procedimentos que caracterizam aspectos geométricos e de composição
dos sistemas ambientais, servindo como indicadores relacionados à forma, ao arranjo
estrutural e a interação entre as vertentes e a rede de canais fluviais de uma bacia
hidrográfica (CHRISTOFOLETTI, 1999), que por sua vez evidenciam situações e
valores que extrapolam as questões hidrológicas e geomorfológicas.
Análise morfométrica também pode ser definida como a análise quantitativa
das relações entre a fisiografia da bacia e a sua dinâmica. Ela tem grande importância
nos estudos de bacias hidrográficas, pois, através da abordagem quantitativa, pode-se
ter uma melhor noção do comportamento hidrológico, uma vez que, os parâmetros
morfométricos são bons indicadores da capacidade de escoamento superficial
hidrológica (NUNES; RIBEIRO, FIORI, 2006).
De acordo com Villela e Mattos (1975) as características físicas de uma bacia
constituem elementos de grande importância para avaliação do seu comportamento
hidrológico, pois, ao se estabelecerem relações e comparações entre tais
características e os dados hidrológicos conhecidos, podem-se determinar
indiretamente os valores hidrológicos em locais nos quais faltem dados.
Logo, a morfometria de bacias, pode orientar eficientemente as ações de
gestão territorial das bacias visando à manutenção dos sistemas hídricos.
A unidade básica em que assentam as análises morfométricas é a bacia
hidrográfica. Isto porque legalmente ela constitui a unidade de planejamento e gestão
dos recursos hídricos no Brasil, estabelecida como o sistema “fechado” de balanço
dos processos constituintes de ciclo hidrológico (CRUZ, 2010a).
A determinação de índices e parâmetros morfométricos para bacias
hidrográficas, historicamente foi realizada de forma analógica. Estas técnicas são
bastante imprecisas e demandam bastante tempo e habilidade de quem conduz as
análises. Contudo, com o progresso tecnológico dos meios de obtenção da informação
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ganharam dinamismo e precisão, além de tornar possível o “armazenamento de dados
em ambiente computacional” (CÂMARA; DAVIS, 2013)
Segundo Zeiler (1999) os sistemas de informação geográfica (SIG’s) têm como
função proporcionar uma estrutura espacial para auxiliar as tomadas de decisões para
o uso racional dos recursos naturais e gerenciamento das ações antrópicas sobre
estes recursos. Os SIG’s constituem-se em um conjunto harmônico composto por uma
base de dados, um ou mais softwares que permitam a manipulação de informações e
uma interface gráfica para acesso do usuário (CÂMARA; QUEIROZ, 2013).
A aplicação dos SIG’s em estudos relacionados aos recursos hídricos tem sido
crescente, principalmente pela facilidade de manipulação de mapas, organização de
banco de dados e de obtenção de informações geomorfológicas das bacias
hidrográficas (CÂMARA; QUEIROZ, 2013). Assim, as ferramentas de geotecnologias
têm se consolidado como meio eficaz de caracterização dos sistemas hidrográficos,
possibilitando, por exemplo, a determinação de valores para variáveis de cobertura e
uso do solo, variabilidade espacial de parâmetros climáticos, identificação de fontes
poluidoras significativas e o mapeamento de áreas vulneráveis a processos erosivos
(CRUZ, 2009).
A determinação de índices e parâmetros físicos que caracterizam uma dada
bacia hidrográfica são importantes não somente para identificar eventuais fragilidades
naturais a processos hidrológicos, tais como cheias e enchentes, e auxiliar no manejo
e planejamento do uso/ocupação dos solos destas unidades, mas também como meio
de auxiliar nos processos de gerenciamento de recursos hídricos.
Em estudos do aproveitamento dos recursos hídricos de uma bacia
hidrográfica defronta-se, muitas vezes, com o problema da ausência ou insuficiência
de dados que permitam a construção da série histórica de vazões, necessária à
avaliação da disponibilidade hídrica superficial. Nesses casos, requer-se a aplicação
de técnicas de transferência de informações de outros locais hidrologicamente
semelhantes para a bacia hidrográfica em questão. Ao procedimento de transferência
de informações de vazão denomina-se regionalização (BARBOSA et al., 2005).
Entende-se por regionalização hidrológica, ou mais especificamente
regionalização de vazões, o conjunto de procedimentos e métodos estatísticos que
visam explorar ao máximo os dados existentes numa região, buscando-se permitir a
estimativa da vazão num local com ausência ou insuficiência de dados. Por meio da
regionalização, visa-se permitir, por exemplo, a obtenção indireta das vazões em
seções em que faltem dados ou onde, por fatores de ordem física ou econômica, não
seja possível a instalação de estações hidrométricas. A estimativa é realizada com
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base em modelos de cálculo das vazões, que se demonstram estatisticamente
aplicáveis a qualquer seção fluvial da bacia considerada (BARBOSA et al., 2005).
Em geral, o modelo de regionalização considera as características físicas e/ou
climáticas da bacia que exercem maior importância em seu comportamento
hidrológico. Elementos de natureza física são de grande importância no
comportamento hidrológico da bacia hidrográfica, e são introduzidos no modelo de
regionalização por explicarem a distribuição espacial da vazão e pela sua estreita
correspondência com o regime hidrológico da região (BARBOSA et al., 2005).
Elesbon (2004) afirma que bacias hidrográficas com grandes áreas de
drenagem podem ter comportamentos hidrológicos diferentes e por isso delimitar a
homogeneidade hidrológica de uma determinada região é um dos primeiros objetivos a
ser alcançado para um correto gerenciamento dos recursos hídricos, através dos
processos de regionalização hidrológica.
Oliveira, Antonini e Griebeler (2008) ressaltam ainda que a regionalização
hidrológica é um instrumento eficaz em estudos de planejamento e administração de
recursos hídricos, possibilitando a obtenção de variáveis hidrológicas de maneira
simples e rápida, em consonância com a agilidade que a administração dos recursos
hídricos requer para suas decisões.
O princípio da regionalização se baseia na similaridade espacial destas
informações que permitem essa transferência (TUCCI, 2002).
Segundo Cruz (2010b) regiões hidrologicamente homogêneas correspondem a
bacias ou sub-bacias onde a magnitude dos processos hidrológicos ocorre de forma
semelhante. Nestas regiões ainda, os componentes físicos e climáticos que
determinam o comportamento hidrológico possuem níveis de similaridade bastante
pronunciados, o que de fato, determina a homogeneidade dos processos hidrológicos
em seu interior. Disto decorre que, para a determinação de uma região
hidrologicamente homogênea pode-se lançar mão do estudo dos componentes físicos
das bacias.
Considerando as bacias hidrográficas presentes no Estado de Minas Gerais, a
bacia do rio Doce merece destaque. Na bacia em questão o desmatamento
indiscriminado e o manejo inadequado do solo criaram condições favoráveis à
formação de processos erosivos, que somado aos despejos inadequados advindos da
mineração e de resíduos industriais e domésticos, deram origem ao contínuo processo
de assoreamento dos leitos dos rios da bacia. Além disso, algumas cidades ocuparam
a planície de inundação dos rios e de tempos em tempos, períodos de chuva mais
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severos provocam o alagamento de parte destas planícies, trazendo graves prejuízos
à região. (CBH-DOCE, 2013).
Quanto à susceptibilidade à erosão dos solos da bacia, o poder de erosão das
chuvas e a declividade dos terrenos, assim como a natureza da cobertura vegetal são
as três principais variáveis a considerar na avaliação da erosividade na bacia
(ECOPLAN-LUME, 2010).
Outro grande problema ambiental evidenciado na bacia é ocorrência de
inundações. A questão das cheias está entre as mais prementes da bacia do rio Doce
pelas proporções que têm assumido, pelo rastro de problemas sociais que deixa e
pela vulnerabilidade que a bacia apresenta a esses eventos extremos recorrentes,
agravados ano após ano pelo desmatamento, ações antrópicas que deflagram
processos erosivos e ocupação indevida do uso do solo urbano (ECOPLAN-LUME,
2010).
Alguns exemplos de enchentes registradas na bacia do rio Doce são: a de
fevereiro de 1979, a de janeiro de 1997 e mais recentemente a de janeiro de 2003.
Dentre elas a de 1979 foi a de maior magnitude, que provocou maiores danos. As
cidades mais atingidas foram àquelas localizadas as margens dos rios Doce,
Piracicaba e Manhuaçu.). Mais recentemente também é válido destacar a enchente
de janeiro de 2002 em Ponte Nova, janeiro de 2003 e janeiro de 2004 em Caratinga.
(CBH-DOCE, 2013).
Desnecessário é lembrar a relação que a ocorrência das cheias guarda com o
uso e ocupação do solo, principalmente em áreas urbanas, e o agravamento das
mesmas nessas áreas por sistemas de drenagem insuficientes ou inoperantes por
falta de manutenção. Do mesmo modo pode ser aventada a relação entre cheias e
assoreamento (ECOPLAN-LUME, 2010).
Neste sentido, o presente trabalho objetiva realizar análise morfométrica das
principais sub-bacias da bacia do rio Doce, a fim de identificar os grupos que
apresentam similaridades físicas (regiões fisicamente homogêneas) e evidenciar
eventuais fragilidades a processos de enchentes e inundações advindos das
características físicas das sub-bacias, podendo assim auxiliar nos processos de
regionalização hidrológica e gerenciamento de recursos hídricos regionais.
2. MATERIAL E MÉTODOS
A bacia hidrográfica do rio Doce está situada na região Sudeste, entre os
paralelos 18° 45' e 21° 15' de latitude sul e os meridianos 39° 55' e 43° 45' de
longitude oeste (Sistema de coordenadas geográficas SAD-69), compreendendo uma
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área de drenagem de cerca de 83.400 km², dos quais 86% pertencem ao Estado de
Minas Gerais e o restante ao Estado do Espírito Santo. Limita-se ao sul com a bacia
hidrográfica do rio Paraíba do Sul, a oeste com a bacia do rio São Francisco, e, em
pequena extensão, com a do rio Grande. Ao norte, limita-se com a bacia dos rios
Jequitinhonha e Mucuri e a noroeste com a bacia do rio São Mateus (CBH-DOCE,
2013) (figura 01).
Figura 01: Mapa de localização da bacia do rio Doce.
Fonte: ANA (2013), IBGE (2013), CRUZ & NASCIMENTO (2013).
A extensão do rio Doce é da ordem de 853 Km. Seus principais afluentes
são: pela margem esquerda os rios Piracicaba, Santo Antônio e Suaçuí Grande, em
Minas Gerais, Pancas e São José, no Espírito Santo; pela margem direita os rios
Casca, Matipó, Caratinga-Cuieté e Manhuaçu, em Minas Gerais, e Guandu, no
Espírito Santo (CBH-DOCE, 2013).
As atividades econômicas da bacia do rio Doce são bastante diversificadas,
destacando-se: a agropecuária (reflorestamento, lavouras tradicionais, cultura de café,
cana-de-açúcar, criação de gado leiteiro e de corte e na suinocultura.); a agroindústria
(sucroalcooleira); a mineração (ferro, ouro, bauxita, manganês, pedras preciosas e
outros); a indústria (celulose, siderurgia e laticínios); o comércio e serviços de apoio
aos complexos industriais; e a geração de energia elétrica (ECOPLAN-LUME, 2010).
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Segundo pesquisas realizadas pela Fundação Centro Tecnológicas de Minas
Gerais - CETEC, 95% das terras da bacia constituem pastos e capoeiras,
demonstrando a predominância da atividade pecuária (CETEC apud CBH-DOCE,
2013).
Considerando o clima regional, o regime pluviométrico da bacia caracteriza-se
por dois períodos distintos: chuvoso, de outubro a março, e seco, de abril a setembro
(CUPOLLILO; ABREU; CASTRO, 2006). Dos maiores totais pluviométricos para os
menores, caracteriza-se por apresentar sentido oeste–leste, ou seja, um escoamento
com sentido das regiões serranas do Espinhaço e Mantiqueira para o litoral
(CUPOLLILO, 2008). A região Norte e Leste da bacia do rio Doce apresenta
predominantemente, menor índice pluviométrico que a Sul e Oeste da bacia
(CUPOLLILO; ABREU; CASTRO, 2006).
Cupollilo (2008) ressalta ainda que a duração das estações seca e chuvosa
varia da montante para jusante, com maior duração da estação chuvosa à montante e
maior estação seca na região central da bacia.
Para alcançar os objetivos propostos neste estudo, o mesmo foi dividido em
duas principais etapas sendo: análise morfométrica de sub-bacias da bacia do rio
Doce e determinação do nível de similaridade das sub-bacias pelo método de análise
estatística multivariada de agrupamentos (Cluster).
Inicialmente para a análise morfométrica foi realizada a aquisição de bases de
dados em formato vetorial e matricial disponibilizados nos portais do SNIR (Sistema
Nacional de Informações de Recursos hídricos) (ANA, 2013) e Embrapa
Monitoramento por Satélite (EMBRAPA, 2013).
Segundo Silva (2003) as bases vetoriais são aquelas onde as entidades físicas
dispostas na superfície da terra são representadas por elementos de geometria
simples como pontos linhas e polígonos, enquanto as matriciais (raster) compreendem
representações destas mesmas feições formadas por pequenas unidades digitais
(pixel) que em conjunto formam as entidades em questão.
As bases de dados vetoriais correspondentes as sub-bacias da bacia do rio
Doce, foram obtidas através de download do arquivo de ottobacias nível 03 (feições
poligonais representativas de bacias hidrográficas) no portal do Sistema Nacional de
Informações de Recursos Hídricos (SNIRH) (ANA, 2013). As otto bacias são áreas de
contribuição dos trechos da rede hidrográfica, codificadas segundo o método
elaborado no final da década de 1980 por Otto Pfafstetter, do extinto Departamento
Nacional de Saneamento (DNOS) (ANA, 2013).
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A escolha das ottobacias nível 03, em detrimento das demais disponíveis,
deveu-se ao fato de que esta divide a bacia do rio Doce em um número de sub-bacias
que não é muito pequeno e nem excessivo, tendo apresentado a configuração que
melhor se adequou aos objetivos da pesquisa, analogamente ao que sugere Silva et
al. (2009) ao realizar trabalho em área de abrangência regional de Cerrado em que
utilizou também ottobacias nível 03. Desta forma as sub-bacias (ottobacias nível 03)
estudadas foram: 761, 762, 763, 764, 765, 766, 767, 768 e 769 (figura 02).
Figura 02: Ottobacias nível 03 da bacia do rio Doce.
Fonte ANA (2013), IBGE (2013), CRUZ & NASCIMENTO (2013).
As bases matriciais utilizadas corresponderam às cenas do modelo digital de
elevação (MDE) SRTM (Shuttle Radar Topographic Mission), que recobrem toda a
extensão da bacia do rio Doce. Logo, as cenas incluíram tanto o Estado de Minas
Gerais, quanto o Espírito Santo. Elas foram obtidas em formato geotiff, através do
portal da Embrapa Monitoramento por Satélite (EMBRAPA, 2013) e seu PROGRAMA
BRASIL EM RELEVO.
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O Modelo Digital de Elevação (MDE) ou Modelo Numérico do Terreno (MNT) é
uma representação matemática computacional da distribuição de um fenômeno
espacial que ocorre dentro de uma região da superfície terrestre. Dados de relevo,
informações geológicas e dados geofísicos são exemplos típicos de fenômenos
representados por um MDE (FELGUEIRAS; CAMARA, 2004).
As cenas do MDE SRTM utilizadas na pesquisa foram as seguintes: SE-23-X-
C/ SE-23-X-D/ SE-23-Z-A/ SE-23-Z-B/ SE-23-Z-C/ SE-23-Z-D/ SE-24-V-C/ SE-24-Y-
A/SE-24-Y-C/ SF-23-X-A/ SF-23-X-B/ SF-23-X-C/ SF-23-X-D/ SF-24-V-A/ SE-24-Y-B/
SE-24-Y-D.
Para a análise morfométrica optou-se por trabalhar apenas com parâmetros
que tivessem alguma interpretação ou relacionamento direto com a hidrologia, como a
fragilidade a processos erosivos, e, por conseguinte, ao assoreamento das redes de
drenagem e também a propensão a eventos extremos, tais como enchentes e
enxurradas. Tal escolha decorreu exatamente do contexto regional da bacia, que
apresenta problemáticas bastante marcantes relativas aos dois processos descritos.
Desta forma, os parâmetros determinados para cada sub-bacia otto nível 03,
do rio Doce foram: índice de circularidade, coeficiente de compacidade, altitude
máxima, altitude mínima, amplitude altimétrica e distribuição de frequência de classes
de relevo.
O coeficiente de compacidade (Kc) constitui a relação entre o perímetro da
bacia e o perímetro de uma circunferência de um círculo de área igual à da bacia
(ALMEIDA, 2007). O Kc foi determinado segundo a equação abaixo:
√ equação 01
Kc=coeficiente de compacidade
P=perímetro (Km)
A=área da bacia (km²)
A susceptibilidade a enchentes medida pelo coeficiente de compacidade
depende da proximidade do valor obtido da unidade, isto é, quanto mais próximo de 1
maior o risco de ocorrências de enchentes (CARDOSO et al., 2006).
O índice de circularidade pode ser descrito matematicamente conforme a
equação descrita abaixo :
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equação 02
onde:
Ic: índice de circularidade;
P: perímetro da bacia (km);
A: área da bacia (km²).
Segundo Tonello (2005) o índice de circularidade tende para a unidade à
medida que a bacia se aproxima da forma circular.
Quanto maior for o valor do índice de circularidade, maior é o perigo de
ocorrência de enchentes, pois haverá uma maior concentração de água no tributário
principal quando se tem uma chuva intensa em uma dada bacia hidrográfica (ROCHA
apud VIEIRA; FURTADO, 2004).
Para o cálculo do coeficiente de compacidade e índice de circularidade foram
utilizados documentos do Microsoft Excel 2007TM, com programação específica feita a
partir das fórmulas que compõe cada método. Contudo, anterior à determinação dos
parâmetros foi necessário calcular a área e o perímetro de cada sub-bacia estudada,
ambos demandados pelos dois parâmetros supracitados.
Para tanto, inicialmente, foi realizada a reprojeção da base de ottobacias em
GCS WGS-84 para o sistema de projeção UTM WGS-84, através da ferramenta
Project do toolbox Data Management Tools, do ArcGIS 10TM. Posteriormente então, na
própria tabela de atributos utilizando o operador Calculate Geometry, sobre duas
novas colunas previamente adicionadas, foram calculadas as áreas e perímetro de
cada sub-bacia, em Km2 e m respectivamente.
As altitudes máxima e mínima corresponderam ao maior e menor valor de cota
altimétrica observado na disposição do relevo de cada sub-bacia. Enquanto que, a
amplitude altimétrica representou o range ou variação total dos níveis hipsométricos.
A variação da altitude e a elevação média de uma bacia, ou sub-bacia, são
importantes pela influência que exercem sobre a precipitação, sobre as perdas de
água por evaporação e transpiração e, consequentemente, sobre o deflúvio médio
(TONELLO, 2005).
Para a determinação das altitudes máxima e mínima de cada sub-bacia, foi
necessário inicialmente gerar o MDE da bacia do rio Doce. Ele foi feito através de
procedimento de mosaicagem das cenas SRTM, função Mosaic to New Raster do
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toolbox Data Management Tools, e posterior eliminação das regiões excedentes pelo
uso da ferramenta Extract by Mask do toolbox Spatial Analyst Tools.
Do MDE da bacia, obteve-se então o MDE de cada sub-bacia pelo uso,
novamente, da ferramenta Extract by Mask, utilizando como máscara o arquivo vetorial
das ottobacias nível 03. A partir daí, apenas consultando a janela de propriedades de
cada arquivo de MDE de cada sub-bacia, obtiveram-se os valores de altitude máxima
e mínima.
A amplitude altimetrica foi determinada apenas subtraindo-se o valor de maior
magnitude de cota do MDE de cada sub-bacia do menor valor, já obtidos conforme
descrito na etapa anterior.
As classes de declividade utilizadas na pesquisa constituíram aquelas
adotadas pela EMBRAPA em sua classificação de tipos de relevo, presente na tabela
01 (EMBRAPA, 1979).
Tabela 01: Classes de relevo.
Fonte: EMBRAPA (1979)
CLASSES DE RELEVO INTERVALO (%)
Plano 0-3
Suavemente ondulado 3-8
Ondulado 8-20
Fortemente ondulado 20-45
Montanhoso 45-75
Fortemente montanhoso >75
A partir dos MDES de cada sub-bacia foi gerado um arquivo matricial de
declividades, através da aplicação da ferramenta Slope do toolbox Spatial Analyst
Tools, tendo sido escolhida a opção da determinação das declividades em percentual.
Em seguida cada arquivo de declividades passou por um processo de reclassificação,
em que a declividade individual de cada pixel na base foi reagrupada à luz dos
intervalos das classes dos critérios adotados, através da ferramenta Reclassify do
toolbox Spatial Analyst Tools.
A partir das bases de declividades reclassificadas de cada arquivo, foram
geradas automaticamente a distribuição de frequência absoluta de níveis de
declividade, simplesmente extraindo o número de pixels dentro de cada classe por
consulta a sua tabela de atributos.
Por fim, os dados de distribuição de cada classe para cada sub-bacia foram
transferidos para documento Microsoft Excel 2007TM, onde se pôde determinar o
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percentual de representatividade de cada classe de relevo, isto é, a distribuição de
frequência relativa em percentual.
A fim de identificar sub-bacias com níveis característicos de similaridades, que
corresponderiam a regiões fisicamente homogêneas da bacia do rio Doce, foi utilizado
método estatístico de análise multivariada de grupamentos (Cluster) sobre o conjunto
de parâmetros morfométricos determinados para cada sub-bacia. Esta etapa utilizou
como ferramental estatístico o pacote Bioestat 5.0TM. O Bioestat 5.0TM é um software
com 210 aplicativos estatísticos de fácil uso (AYRES et al., 2007).
O objetivo principal da Análise de Grupamentos é, obviamente, agrupar os
indivíduos em conglomerados ou Clusters. Os conglomerados são identificados como
grupos que compõem a população ou a amostra que está sendo analisada. As
unidades de um grupo apresentam muitas semelhanças entre si e muitas diferenças
em relação às unidades dos demais grupos (AYRES et al., 2007).
Nos métodos hierárquicos de Cluster, onde se encontra o método de Ward, a
delimitação de grupos é feita de maneira subjetiva, observando-se os pontos de alta
mudança de nível no diagrama de árvore (dendrograma). Por esse motivo, podem-se
esperar diferentes padrões de grupamento, os quais dependem ainda do método de
grupamento e da medida de distância ou de similaridade adotados (PEREIRA; CRUZ,
2003).
Os nós do dendrograma representam grupamentos, que são compostos pelos
grupos e/ou objetos (grupos formados apenas por ele mesmo) ligados a ele (nó). O
dendrograma ao ser cortado em um nível desejado produz uma classificação do
número de grupos existentes e dos indivíduos que os formam. O número de grupos
dos indivíduos é obtido pelo corte do dendrograma em um nível desejado e então cada
componente conectado forma um grupo (ALBUQUERQUE, 2005).
Neste sentido, optou-se por utilizar o método de Ward. O método de Ward é
um método de agrupamento onde os grupos de dados são formados em etapas e são
sistematicamente reduzidos (n,n-1,n-2,...), considerando a união de todos os n(n-1)/2
possíveis pares e selecionando a união que tem um valor máximo para a função
objetivo (WARD apud DINIZ; SOARES; CABRAL, 2012).
O algoritmo Ward pode ser apresentado em linhas gerais, como segue:
1. Criar M grupos, cada grupo contendo um vetor componente da base de
dados;
2. Considerar as M x M combinações e calcular o erro interno para cada
combinação;
3. Escolher a combinação que obteve o menor erro interno;
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4. O número de grupos é reduzido de 1 (M = M-1) e o processamento retorna
ao passo 2 até que se tenha apenas um grupo que inclua todos os objetos ou
qualquer outro critério de parada seja atingido.
Cada nível de agregação implica numa perda de informação resultante de cada
agrupamento. O nível de agregação aumenta à medida que diminui o número de
grupos (BRAGA; BECKER apud BRAGA; MELO; MELO, 2013).
Vicini (2005) ressalta que pelo método de Ward um grupo será reunido se essa
reunião proporcionar o menor aumento da variância intragrupo. Tal método, portanto,
calcula as médias de todas as variâncias para cada grupo, escolhendo a que
proporciona a menor variância.
Outro elemento fundamental na aplicação de qualquer método hierárquico de
análise de grupamentos é a escolha do tipo de distância, ou medida de
dissimilaridade. A distância compreende um parâmetro para medir o grau de
similaridade entre dois objetos. Cada variável corresponde a uma dimensão, e cada
objeto é representado por um ponto no espaço multidimensional resultante. Quanto
menor for à distância mais similar serão os objetos e, portanto, aumenta a
probabilidade de pertencerem ao mesmo grupo (AYRES et al., 2007).
Segundo Ayres et al. (2007) a medida da distância é a base da análise de
grupamentos. A princípio, cada objeto é único e, portanto, as distâncias entre os
grupos são óbvias. Entretanto, à medida que os objetos são agrupados, deve-se
decidir qual a forma de medir a distância entre um grupo (Cluster) e um objeto, ou
entre dois grupos. Cada método de agregação fornece um critério diferente para
definir, no espaço multidimensional, o ponto dentro do grupo que servirá de referência
para calcular as distâncias entre esse grupo e outros objetos ou grupos.
Considerando a escolha pelo método de Ward, como método de Clusterização,
optou-se consequentemente pelo quadrado da distância Euclidiana, como medida de
dissimilaridade. O quadrado da distância euclidiana pode ser definido como o
somatório dos quadrados das diferenças entre os valores i e j para todas as variáveis
(v = 1, 2... p) de todos os objetos (i e j) (ALBUQUERQUE, 2005).
= ∑ ( )
2 equação 03
Para interpretação do dendrograma, sendo a medida da distância euclidiana a
base da análise pelo método de Ward, adotou-se como nível de corte aquele em foi
possível identificar as menores distâncias entre as sub-bacias em análise.
15
3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
3.1 ANÁLISE MORFOMÉTRICA
A análise morfométrica das sub-bacias otto nível 03 reportou os resultados da
dos quadros 01 e 02.
SUB-
BACIAS Kc Ic
ALTITUDES (m)
MÁX MÍN AMPLITUDE
ALTIMÉTRICA
761 1.86 0.29 1527 0 1527
762 1.49 0.45 2627 75 2552
763 1.96 0.26 1551 16 1535
764 1.78 0.31 1642 138 1504
765 2.00 0.25 1272 94 1178
766 1.66 0.36 1782 184 1598
767 1.32 0.57 1114 172 942
768 1.68 0.35 2076 217 1859
769 1.47 0.46 1915 202 1713
Quadro 01: Parâmetros morfométricos das sub-bacias Otto nível 03
Do quadro 01 pode-se notar que as altitudes máximas variam de 1114 a 2627
metros. O valor máximo das máximas foi registrado na sub-bacia 762, enquanto o
menor ocorreu na sub-bacia 767. Considerando ainda a variação das altitudes
máximas entre todas as sub-bacias foi evidenciada uma amplitude hipsométrica da
ordem de 1513 metros, que pode ser considerada bastante pronunciada.
Em relação à análise das altitudes mínimas foi reportado um valor máximo de
217 metros na sub-bacia 768. O valor mínimo evidenciado correspondeu à cota 0
metros, localizada na sub-bacia 761 que se encontra no baixo curso do rio Doce,
notadamente na região em que ocorre a confluência do rio com o oceano Atlântico.
Quanto à variação das altitudes mínimas entre todas as sub-bacias pôde-se evidenciar
uma amplitude hipsométrica de 217 metros, constituindo assim um “range” de menor
magnitude quando comparada as altitudes máximas.
O estudo das amplitudes altimétricas das sub-bacias revelou haver uma menor
variabilidade na sub-bacia 767, em que ocorreram também os registros das menores
cotas, tendo sido observada uma variação de níveis altimétricos de 942 metros.
16
Enquanto que a maior amplitude foi evidenciada na sub-bacia 762, com exatos 2552
metros. Note-se também que nesta mesma sub-bacia foi também registrado o maior
valor de altitudes máximas. De forma geral, evidencia-se que as amplitudes de todas
as sub-bacias possuem valores significativos, correspondendo com frequência a
variações de mais de 1000 metros.
O coeficiente de compacidade das sub-bacias, de maneira geral, apresenta
valores que se afastam da unidade; se estendendo de 1,47 a 2,0; a exceção da sub-
bacia 767 que registrou o valor de 1,32. Valores de Kc que se afastam da unidade
sugerem bacias que não possuem formato que se aproxima do círculo, constituindo
unidades mais alongadas (SAIS; BELI, 2012). A sub-bacia 767, por apresentar valor
Kc relativamente próximo da unidade, possui uma maior fragilidade aos eventos de
inundações, considerando-se seu formato mais radial, que pode ser constatado pelo
histórico de eventos desta natureza na região do médio rio Doce, onde está inserida
tal sub-bacia (ECOPLAN-LUME, 2010).
Deve-se notar, contudo, que outras regiões que vão além da sub-bacia 767,
sofrem sazonalmente com as inundações decorrentes das cheias do rio Doce, apesar
de que suas fragilidades podem não estar evidentes apenas a partir da análise da
forma da bacia. Tal explicação para a ocorrência desta problemática pode estar,
então, relacionada a outros fatores tais como relevos mais acidentados, solos rasos e
intensos processos de desmatamento e mudanças no uso da terra, segundo Olszevski
et al. (2011). Corrobora para isto Ecoplan-Lume (2010) ao afirmar que o
desmatamento indiscriminado e o manejo inadequado do solo criaram condições
favoráveis à formação de processos erosivos na bacia do rio Doce, assoreando os
mananciais. Além de que algumas cidades ocuparam a planície de inundação dos rios
e de tempos em tempos, períodos de chuva mais severos provocam o alagamento de
parte destas planícies, trazendo graves prejuízos à região.
Com relação ao índice de circularidade todas as sub-bacias registram valores
relativamente pequenos que se afastam da unidade, a exceção da sub-bacia 767; que
apresenta o maior valor encontrado (0,57). Desta forma, pode-se considerar que esta,
dentre todas as sub-bacias estudadas, é a que apresenta o maior potencial para
ocorrência de enchentes, visto que ela é a que mais se aproxima da forma circular
(Ic=1) (TORRES et al., 2007), analogamente ao ocorrido quanto às análises do
coeficiente de compacidade.
Alves e Castro (2003) descrevem o valor de Ic 0,51 como sendo crítico, ou
determinante, do comportamento hidrológico em bacias hidrográficas. Ainda segundo
os autores, Ic menores que 0,51 descrevem bacias mais alongadas onde há um
17
favorecimento do escoamento, ao passo que bacias com valores maiores que 0,51
são característicos de bacias circulares onde há um evidente favorecimento dos
processos de inundação (cheias rápidas).
Considerando que todas as sub-bacias, excetuando-se a 767, possuem valores
de Ic menores que o crítico (0,51), em tese há uma menor tendência a ocorrência de
inundações nestas unidades, visto que constituem sub-bacias mais alongadas, onde
há um favorecimento natural ao rápido escoamento (Oliveira et al., 2010), não
constituindo-se a forma das sub-bacias como relevantes para a formação de
inundações (CAJAZEIRO, 2012).
Contudo, a realidade que se apresenta em várias regiões da bacia do rio Doce
é totalmente contrastante com este cenário, uma vez que as cheias e enchentes que
ocorrem sistematicamente na bacia não costumam se concentrar apenas na área da
sub-bacia 767, mas se estendem por outras sub-bacias, conforme já mencionado.
Desta forma pode-se afirmar novamente que este cenário crítico de eventos
extremos certamente sofre influência na bacia de fatores como o desmatamento e
assoreamento da drenagem, uma vez que, segundo Ecoplan-Lume (2010) a bacia do
rio Doce, de forma geral, teve sua cobertura vegetal removida, principalmente a partir
do século XIX, para o cultivo de café e cana-de-açúcar, exploração madeireira e
formação de pastagens, o que pode ter levado a modificação da capacidade de
infiltração e armazenamento dos solos e agravado os efeitos das cheias,
principalmente nas pequenas bacias.
A distribuição de frequência de classes de relevo, baseado nos critérios da
EMBRAPA (1979), apresentou diferentes proporções, para cada sub-bacia. Contudo,
pôde-se evidenciar um pronunciado predomínio em todas as sub-bacias de relevos
“ondulados” e “fortemente ondulados”, conforme ilustrado no quadro 02 e figura 03.
18
Quadro 02: Distribuição de frequência de classes de declividade nas sub-bacias Otto nível 03
Figura 02: Mapa clinográfico das sub-bacias otto nível 03.
Fonte: EMBRAPA(2013), ANA (2013), CRUZ & NASCIMENTO (2013).
Na sub-bacia 762 há o menor percentual de relevo na classe “ondulado”, mas
ainda assim esta classe recobre 29, 22% da sub-bacia, enquanto a sub-bacia onde há
SUB-
BACIAS
TIPOS DE RELEVO - % (EMBRAPA, 1979)
PLANO SUAVEMENTE
ONDULADO ONDULADO
FORTEMENTE
ONDULADO MONTANHOSO
FORTEMENTE
MONTANHOSO
761 8.78 11.43 29.68 42.01 7.09 1.01
762 2.95 7.94 29.22 51.77 7.32 0.79
763 5.02 11.70 36.02 43.08 3.77 0.41
764 4.93 10.93 38.05 43.86 2.12 0.10
765 5.52 11.26 36.91 42.05 4.09 0.17
766 2.31 9.46 38.87 43.82 5.29 0.26
767 7.50 15.09 40.00 34.41 2.81 0.20
768 2.65 10.22 38.57 43.91 4.34 0.30
769 4.11 10.99 40.03 42.92 1.88 0.07
19
o maior predomínio desta classe é a 769 com aproximadamente 40,03%. Quanto aos
relevos “fortemente ondulado” o menor percentual de classe ocorre na sub-bacia 767,
com 34,41%, e o maior na sub-bacia 762 (51,77%).
Considerando uma composição de ambas as classes de relevos “ondulado” e
“fortemente ondulado”, elas representam, em geral, percentuais em cada sub-bacia,
que variam de 71,69 a 82,95% das respectivas áreas de drenagem.
Disto ocorre que, há uma notável predominância de relevos acidentados em
todas as sub-bacias, incorrendo em grande tendência a efeitos hidrológicos por vezes
de alto poder degradador, uma vez que o tipo de relevo existente na área tem
influência direta na relação entre a precipitação e o deflúvio da bacia hidrográfica,
sobretudo devido ao aumento da velocidade de escoamento superficial, que reduz a
possibilidade da infiltração de água no solo (TORRES et al., 2010).
Considerando o cenário que se apresenta, isto é, aquele em que não há
notáveis fragilidades a enchentes e inundações decorrentes da forma das sub-bacias
no rio Doce, mas há de fato a ocorrência destes eventos em regiões da bacia
diferentes da sub-bacia 762, a constatação de que há declividades muito significativas
em todas as sub-bacias associadas a grandes níveis de antropização na região em
estudo (ECOPLAN-LUME, 2010) pode ser um componente que justifica esta
problemática.
Ambos os fatores descritos acima podem modular as inundações ao promover
aporte de sedimentos nos canais fluviais, que ao depositarem-se reduzem a calha de
drenagem dos rios, pelo assoreamento, podendo levar ao transbordamento e posterior
alagamento marginal. Corrobora para isto Martini (2012) ao atestar que em áreas de
declividades muito elevadas devem haver fortes restrições ao uso agrícola da terra,
uma vez que gera-se assim um quadro de grande risco de erosão hídrica aos solos; e
Tonello (2005) que aponta que este processo pode levar a perdas de solo, provocando
assim assoreamento e eutrofização de corpos hídricos.
Santos, Silva e Cecília (2013) reforçam ainda mais esta conclusão ao
afirmarem que em bacias muito íngremes, caso não haja cobertura vegetal adequada
espera-se um menor tempo de concentração, fato que poderá implicar em enchentes e
um maior escoamento superficial, indicando maior susceptibilidade à degradação.
3.2 REGIÕES FISICAMENTE HOMOGÊNEAS
A análise de cluster hierárquica realizada (método de Ward) permitiu agrupar
as sub-bacias otto nível 03 em regiões fisicamente homogêneas, baseadas em seu
20
nível de dissimilaridade quanto as variáveis morfométricas estudadas, conforme
ilustrado na figura apresentada abaixo.
Figura 04: Grupos formados pela análise de Cluster.
Por se tratar de um método hierárquico, o dendrograma formado pela aplicação
do método de Ward agrega os grupos de sub-bacias em cenários em que uma única
sub-bacia pode constituir desde uma região fisicamente homogênea em si própria, até
o nível em que todas as sub-bacias podem ser consideradas um único grupo, isto é, a
bacia do rio Doce de forma integral poderia ser entendida como uma única região
fisicamente homogênea.
Pode-se constatar, então, que o número de grupos formados, e as sub-bacias
que compõe cada grupo, é fortemente influenciado pela decisão quanto ao nível de
corte no dendrograma.
Desta forma, considerando que o nível de corte adotado pela pesquisa, que
correspondeu aquele em que é possível identificar os primeiros nós que caracterizam
o agrupamento das sub-bacias, foram identificadas sete regiões fisicamente
homogêneas.
As sub-bacias 761, 762, 764, 769 e 767 não apresentaram níveis de
similaridades bem pronunciados, considerando as distâncias euclidianas entre si e o
nível de corte adotado, que permitissem agrupamentos entre si, de forma que todas
21
constituem bacias com características físicas distintas. Elas foram então denominadas
respectivamente, para efeito da pesquisa região 01, 02, 04, 06 e 07.
Apenas dois grupos foram formados pela agregação de mais de uma sub-
bacia. A região denominada 03 foi constituída pelo agrupamento da sub-bacia 763 e
765. Já a região 05 constituiu-se da agregação da sub-bacia 766 e 768. Todos os
grupos formados tem sua disposição espacial apresentada na figura 05.
Figura 05: Regiões fisicamente homogêneas da bacia do rio Doce.
Fonte: ANA (2013), IBGE (2013), CRUZ & NASCIMENTO (2013).
Caso o nível de corte adotado fosse um pouco mais flexível, haveria maior
possibilidade em se formar grupos com mais de uma sub-bacia. Isto pode ser
evidenciado claramente ao se observar que o próximo nível hierárquico no
dendrograma, já pressupõe dois grupos formados por três sub-bacias, o que não
ocorre no nível de corte analisado.
Considerando o cenário mais flexível, a sub-bacia 769 seria agregada ao grupo
já formado pelas sub-bacias 766 e 768, a partir da análise do dendrograma. Contudo,
deve-se observar que dada à significativa distância euclidiana entre o primeiro grupo e
22
a sub-bacia 769, a agregação entre esta sub-bacia e o grupo anteriormente formado,
poderia não representar na prática uma região fisicamente homogênea, apesar de que
esta última sub-bacia apresenta maior dissimilaridade com o grupo citado, do que com
todos os demais grupos.
Desta forma, justifica-se o baixo nível de corte adotado pelo fato deste garantir
a elucidação do maior nível de dissimilaridade entre os grupos, garantindo por sua vez
que a identificação das regiões fisicamente homogêneas, pela análise do
dendrograma, possa apresentar um grau de segurança e confiabilidade factíveis, isto
é, que na prática há níveis de similaridades físicas entre as unidades, que levem a crer
que possivelmente estes níveis de similaridade podem condicionar também
comportamento hidrológico semelhantes nas sub-bacias, dado a relação das
características físicas destas últimas com o processo de escoamento superficial.
Portanto, considerando que os modelos de regionalização hidrológica, que
permitem predizer o comportamento do escoamento superficial em uma dada bacia,
frequentemente utilizam como variáveis explicativas em seus modelos de regressão
estatística variáveis de natureza física das bacias, é de se supor que a identificação de
regiões fisicamente homogêneas pode sugerir os arranjos entre sub-bacias que
poderiam identificar de forma mais ágil as regiões hidrologicamente homogêneas,
gerando assim otimização dos recursos e do tempo necessários no desenvolvimento
dos modelos.
4. CONCLUSÃO
O uso de sistemas de informações geográficas (SIG) constituiu uma ferramenta
fundamental na pesquisa, pois permitiu extrair informações para análise morfométrica
de maneira ágil e eficiente.
As sub-bacias otto nível 03 da bacia do rio Doce, de forma geral não
apresentam uma evidente fragilidade a eventos extremos, inundações e enchentes,
baseada somente nas formas da bacia. Contudo, dado que a bacia do rio Doce
apresenta-se bastante antropizada, onde historicamente as áreas de florestas
primárias foram convertidas em pastagens, plantações de cana-de-açúcar e outros
usos alternativos; e que pôde-se constatar que há uma significativa predominância de
relevos íngremes (relevos ondulados e fortemente ondulados); cria-se um cenário de
risco decorrente dos últimos fatores, associados ao regime de precipitação regional,
que se materializa em enchentes em variadas sub-bacias do rio Doce.
23
Disto decorre que, medidas que visem atenuar ou mitigar a problemática das
enchentes, nas sub-bacias do rio Doce, devem impreterivelmente passar pela
realização de ações de recuperação de áreas degradadas e reflorestamento,
principalmente nas regiões de relevo mais íngreme, uma vez que estas são regiões
que podem potencializar o processo de escoamento superficial e ainda ser uma fonte
de sedimentos para as redes de drenagem, modulando assim a ocorrência das cheias
e enchentes.
A análise de cluster permitiu identificar sete regiões fisicamente homogêneas
na bacia do rio Doce, onde há significativas semelhanças quanto às fatores de
natureza física destas unidades. Considerando que os modelos de regionalização
hidrológica, que permitem predizer o comportamento do escoamento superficial em
uma dada bacia, frequentemente utilizam como variáveis explicativas em seus
modelos de regressão fatores físicos das bacias, é de se supor que a identificação de
regiões fisicamente homogêneas pode auxiliar também na determinação de regiões
hidrologicamente homogêneas, podendo ser entendida como uma etapa de pré-
regionalização hidrológica.
Logo, é necessário que trabalhos de regionalização hidrológica, utilizando
como unidades espaciais de análise as ottobacias nível 03, sejam realizados
complementarmente, a fim de que se possa avaliar se as regiões fisicamente
homogêneas definidas, constituem também regiões hidrologicamente homogêneas.
Podendo-se assim estimar a proporção com que os processos hidrológicos das sub-
bacias do rio Doce, são condicionados por fatores físicos. Desta forma, otimizando os
processos de gestão de recursos hídricos.
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