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Anos 70 – Contos da Periferia
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1 - Anos 70 - Coletânea: Contos da Periferia
Edição E-book: ISBN 9788591680535
Edição impressa: ISBN 9788591680542
Copyright © 2014, Clóvis Nicacio
Capa desenvolvida por Studio 44
mailto:[email protected]
Impressão e distribuição
http://www.perse.com.br
Prefácio
s anos 70 são considerados uma época de
ouro para o Brasil e para todos os que
puderam desfrutar da mudança que o
mundo sofreu naquele período.
Eu pude vivenciar estes anos dourados na minha
adolescência. Tenho muitas lembranças daquela época e foi o
que usei para criar os personagens.
Algumas estórias partem de situações que vivenciei
pessoalmente ou ouvi na época, mas o desenrolar e
principalmente os desfechos são pura fantasia, fruto da minha
imaginação.
Por exemplo, na Copa de 70 eu tinha 12 anos e
realmente ouvi os jogos pelo rádio, na casa de um tio,
enquanto as imagens em preto e branco passavam na TV.
Inventei o resto da estória.
Tentei lembrar de coisas da época para estimular a
saudade de quem viveu aquela realidade. De quem enrolava
fitas cassete com canetas esferográficas ou segurava um
microfone na frente do rádio para gravar os sucessos do
momento num gravador portátil. Quem conhece o que é uma
Lettera 82 ou já falou na língua do pê?
Optei por escrever sobre mulheres, inventando temas
adultos, pois esta é a melhor forma de comentar sobre estas
entidades místicas, divinas e maravilhosas.
O
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Cada mulher é sempre um novo universo
surpreendente a ser explorado, não existem duas iguais, e a
cada momento que passamos perto de uma, podemos ter uma
nova surpresa. Usei o termo “explorado" no sentido de
pesquisa, descoberta. O outro sentido faz parte do mundo dos
vampiros, usado em outro livro.
Os homens que tem sensibilidade para interagir com
estas divindades podem encontrar uma amiga inesquecível
(Analice), podem apenas ser surpreendidos (Rosália,
Adelaide), podem ser fisgados permanentemente (Marília,
Lucy) ou podem ser completamente dominados pelas
vencedoras (Marcela).
Aqueles sem visão vão deixar o tesouro escorregar
através dos próprios dedos (Lenora), ou vão vê-las passar por
suas vidas como um relâmpago (Clarinha, Simone, Laura),
podem deixá-las tristonhas ou esperançosas (Lurdinha) ou até
mesmo frustradas (Flor). Sem esquecer das frustrantes
(Mercedes).
No final de tudo, todas as situações revelam uma
única verdade: nós, os homens, mesmo os que se julgam
expertos e safados, somos eternos fantoches nas mãos das
mulheres. E é isto que torna nossas vidas tão sensacionais.
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A coleção “Anos 70 - Contos da Periferia” é
composta por 12 volumes, publicados como E-book
individuais:
1- Brasil Campeão
2- O primeiro beijo
3- Iniciação
4- Avenida São João
5- Depois do baile
6- Volta da praia
7- Bailinho de quintal
8- Sufoco no ônibus
9- O silêncio do Cemitério
10- A Flor portuguesa
11- Passat amarelo
12- A vingança
Esta coletânea inclui um conto extra, exclusivo para
esta edição:
13- A professorinha
Libertem sua imaginação e boa leitura.
Clóvis Nicacio
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Índice
Prefácio ............................................................................................. 3
1 - Brasil Campeão ............................................................................ 7
2 - O primeiro beijo ........................................................................ 13
3 - Iniciação ..................................................................................... 21
4 - Avenida São João ....................................................................... 29
5- Depois do baile ........................................................................... 39
6 - Volta da praia ............................................................................. 49
7 - Bailinho de Quintal .................................................................... 63
8 - Sufoco no ônibus ....................................................................... 77
9 - O Silêncio do Cemitério ............................................................. 87
10 - A Flor Portuguesa .................................................................... 99
11 - Passat amarelo ...................................................................... 109
12 - A vingança ............................................................................. 123
13 - A professorinha ..................................................................... 133
Posfácio ......................................................................................... 143
1 - Brasil Campeão
m 1970 todos os dias de jogos do Brasil pela
Copa do Mundo eram praticamente feriados.
Era o dia em que os amigos se reuniam para
fazer um churrasco, assistir ao jogo e depois
sair para comemorar, pois ninguém duvidava de que a Seleção
Brasileira ganharia a Copa.
No dia da final contra a Itália, 21 de junho, os quatro
amigos que mantinham a amizade desde o tempo do ginásio,
combinaram de se reunir na casa de um deles: a do Marcos,
que morava em um sobrado e tinha uma sala bem espaçosa,
no bairro da Mooca. Além dos quatro amigos, todos casados,
havia mais um novato solteiro, que tinha sido agregado a
pouco tempo.
Mauro, Paulão e Jorginho tinham deixado as esposas
na casa do primeiro, no bairro da Água Rasa, pois as três não
faziam a menor questão de ver futebol, mesmo sendo a
Seleção. Lenora, a esposa de Marcos, ficou de se encontrar
com as amigas mais tarde. Sairia durante o intervalo do jogo,
para evitar o transito confuso.
As quatro esposas tinham uma quinta amiga, a Luíza,
uma cabeleireira solteira que estava namorando Cleyton, o
novato. Foi através dela que o quinto elemento se juntou ao
grupo, há apenas poucos meses. Era um cara metido a
conquistador, gostava de ficar contando vantagem,
principalmente quando estava longe da Luíza. Sempre dizendo
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que era o pegador, o irresistível de quem nenhuma mulher
escapava.
Marcos ficava esperando que ele falasse alguma coisa
da Marly, a esposa do Paulão. Marly era uma tremenda de uma
gostosa, uma morenaça que chamava a atenção de todos, mas
que era território proibido para qualquer conversa, nem os
amigos mais antigos brincavam. Paulão era super ciumento,
com razão, e era louco pela esposa. Louco mesmo, brigaria
com qualquer um que sequer mencionasse o nome dela, e era
um ex lutador de boxe, que sabia brigar e bater para valer.
Seria um problema se o bonitinho falasse qualquer
besteira. Fora estas conversas que acabavam ficando chatas, o
cara até parecia legal. Marcos o chamava de "bonitinho", para
tirar sarro, pois era mais novo do que todos, usava cabelos com
brylcreem e sempre tentava se vestir como um playboy de fala
mansa.
Para os dias de jogos, eles tinham um esquema:
ligavam a TV para ver as imagens, abaixavam totalmente o som
e ligavam o rádio, para ouvir a transmissão que assim ficava
muito mais emocionante. Marcos ficava imaginando como
seria assistir um jogo assim, se tivesse uma TV colorida. Aquela
estava sendo a primeira Copa transmitida em cores.
Todos já estavam preparando a festa, reunidos meia
hora antes do jogo começar. Alguns trouxeram cervejas já
geladas, outros tinham comprado no mercadinho da esquina.
Marcos tentava coordenar:
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- Jorginho, Paulão, as geladas vão para a caixa de
isopor na sala e as outras vão para a geladeira. Lenora deixou a
casa por nossa conta, vamos provar que podemos manter tudo
arrumado sem elas...
Nem ele acreditava nisto, mas sua esposa ainda
estava se arrumando no andar de cima, e devia estar ouvindo a
confusão.
Na sala havia uma mezinha de centro, onde
arrumaram os amendoins, uma torta de sardinhas que a
Denise, esposa do Mauro, tinha feito, algumas bolachas
salgadas e um pote de margarina. Era o cardápio tradicional de
todos os jogos. Normalmente mais da metade sobrava, exceto
as cervejas.
O rádio foi colocado sobre a TV, e tocava as músicas
de sucesso, antes dos times se posicionarem. Enquanto
arrumavam tudo, estava tocando um dos últimos sucessos:
Love Hurts, do grupo Nazareth.
Quando o jogo estava para começar, Marcos mudou a
estação para ouvir o melhor narrador da época, Fiori Gigliotti.
Todos se acomodaram como puderam, no sofá e no chão, para
assistir e ouvir o jogo. Cleyton, o bonitinho, ficou numa cadeira
perto da porta da cozinha.
Conforme as palavras do narrador: "abriram-se as
cortinas e começou o espetáculo", monopolizando todas as
atenções. Praticamente ninguém piscava, só vibrando quando
o Brasil atacava e xingando os italianos quando eram eles que
tinham a bola.
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Com quinze minutos de jogo, Marcos sentiu vontade
de ir ao banheiro, aliviar as muitas cervejas que estivera
bebendo desde cedo. O banheiro ficava depois da cozinha. Ao
sair da sala notou que o bonitinho também não estava mais na
cadeira. Passou ao lado da escada que subia para os quartos,
cruzou a cozinha e viu que a porta do banheiro estava
encostada, mas não trancada. O bonitinho devia estar lá,
aliviando também. Como estava apertado e não queria perder
nenhum minuto do jogo, resolveu subir e usar o banheiro do
andar de cima.
Subiu rapidamente a escada, foi ao banheiro e
resolveu seu problema imediato. Enquanto estava desaguando,
ouviu um leve barulho no quarto, abafado pelos sons do jogo
que vinham da sala no andar abaixo. Como já estava ali, foi ver
se Lenora precisava de algo antes de sair.
A porta do quarto estava só encostada. Antes mesmo
de entrar ele viu a cena: Lenora estava de quatro sobre a cama,
com a saia levantada até a cintura e a calcinha abaixada até os
joelhos. O bonitinho estava atrás dela, também com as calças e
cuecas abaixadas, exibindo uma bunda branca e cabeluda, que
balançava num movimento de vai e vem. As duas mãos do cara
entravam por baixo da blusa dela, massageando os dois seios
ao mesmo tempo. Ambos de costas para a porta, gemendo
baixinho.
Ficou como que paralisado ao ver o cafajeste
pegando sua mulher por trás, na sua casa e em sua cama. A
indecisão durou poucos segundos.
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Na sala os ânimos se exaltaram, todos levantando as
vozes, inclusive o narrador, e terminando com um grito em
uníssono: goooooooool do Brasil...
Sua decisão foi imediata: resolveria aquele problema
depois. Desceu rapidamente as escadas, para ver o replay do
gol do Pelé, feito aos dezoito minutos, ainda no primeiro
tempo.
O jogo continuou animado, com o Brasil ganhando,
até que os italianos empataram, aos trinta e sete. Droga, a
Seleção estava melhor, não podia ficar assim, era a Copa do
Mundo que estava em disputa. Continuaram assistindo,
ouvindo e discutindo o jogo, e bebendo as cervejas. Terminou
o primeiro tempo com Pelé quase fazendo o segundo. Os
quatro casados fizeram fila para usar o banheiro de baixo,
sempre sem parar de discutir o jogo. Tão animados que nem
viram o tempo passar e logo o segundo tempo começou.
A tensão continuou até que Gérson fez o segundo gol,
aos vinte e um minutos do tempo complementar. Explodiram
em comemoração. Mal tinham esvaziado uma lata de cerveja
cada um, quando Jairzinho fez o terceiro gol aos vinte e seis
minutos. Todo o País já se sentia com a Taça na mão, quase não
acreditaram quando o capitão Carlos Alberto Torres fechou a
goleada aos quarenta e um minutos. Fantástico, quatro a um
na Itália, em pleno Estádio Azteca, Cidade de Guadalajara,
México. Um dia para ficar na história.
Marcos e seus amigos pulavam, gritavam, bebiam e
se abraçavam. Até o novato participava como se fosse um
veterano. A comemoração se estendeu para a rua, para o
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Mercadinho, havia rojões explodindo para todos os lados, uma
festa nacional. A Seleção do Zagalo ganhou a Copa: Brasil,
Tricampeão Mundial.... Nada mais importava...
Marcos lembrou que tinha uma conta para acertar
com o bonitinho. Nem tinha percebido quando que ele voltou
para a sala, e nem quando foi que Lenora saiu.
Mas isto poderia esperar, hoje o Brasil se tornou Tri
Campeão do Mundo, tudo é uma festa só...