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Antropologia Econômica
Tópicos de antropologia econômica atual
Prof.: Rodrigo Cantu
Foz do Iguaçu Ciudad del Este Puerto Iguazu
Fundação 1914 1957 1902
População (mil) 263,6 654,3 42,8
IDH (estado / departamento) 0,75 0,63 0,8
Ponte da Amizade1959-1965
Ponte da Fraternidade1982-1985
Itaipu 1975-1982
População de Foz do Iguaçu
0
50.000
100.000
150.000
200.000
250.000
300.000
1960 1970 1980 1990 2000 2010
População de Ciudad del Este e Alto Paraná
Chegadas a Foz do Iguaçu (vias aérea e rodoviária), visitações ao Parque Nacional e estimativa de compristas
Fonte: Rabossi (2004, p.240)
0
500
1000
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2,00
1994 1995 1996 1997 1998 1999
Taxa de câmbio - R$ / US$ Estimativa de compristas
Taxa
de
câm
bio
Estimativa d
e com
pristas
Taxa de câmbio e comércio na fronteira
Ciclos históricos de Foz do Iguaçu
• 1870-1970 – Extração da madeira e cultivo de erva mate
• 1970-1980 – Construção da usina de Itaipu
• 1980-1995 – Exportação e turismo de compras
• 1995- – Comércio, turismo e eventos
Mesa
Casilla
Caja
Formação do comércio de rua de Ciudad del Este
• 1971-1972: Primeira regulamentação do comércio de rua. Asociaciónde Lenteros unidos e Asociación de Vendedores de Artículos típicos
• Associados tinham permissão para comércio, mas seu número era limitado em 54 membros
• Expansão por meio dos secretarios ou empregados dos associados
• Monopólio do comércio mesitero pelas associações
• Acordo acerca de margens de lucro, produtos vendidos e controle do uso do espaço
• Absorção da mão-de-obra migrante em excesso de Itaipú
• Expansão agrícola no Paraguai
• Multiplicação das associações e perda do monopólio
Atores no comércio de rua de Ciudad del Este
• Mesitero
• Outros mesiteros da rua
• Associações de trabalhadores das vias públicas
• Fiscais municipais
Atores no comércio de rua de Ciudad del Este
• Como é montado esse mercado?
• Qual é o papel das disposições e do campo econômico?
• Qual são os padrões de integração em funcionamento?
• Há reciprocidade na manutenção do laço social?
O mercado na análise antitruste
Conselho Administrativo de Defesa Econômica -CADE
Mercado perfeito
AtomicidadeNúmero suficiente de compradores e vendedores para que nenhum
influa individualmente no preço
Homogeneidade do produtoConsumidores devem considerar produtos de diferentes vendedores
iguais
Ausência de barreiras à entradaTodos os compradores e vendedores podem entrar e sair do mercado
quando quiserem
Informação simétricaTodos os compradores e vendedores dispõe das mesmas
informações relevantes sobre o mercado
Histórico do CADE
• 1962 – Criação do CADE • Órgão de fiscalização da gestão econômica e do regime de
contabilidade das empresas
• 1994 – Transformado em autarquia • Ligado ao Min. da Justiça• Julgamento de processos administrativos relativos a condutas
anticompetitivas e apreciação de atos de concentração• Investigação e instrução dos processos pelo Min. da Fazenda• Julgamento a posteriori de fusões e aquisições
• 2012 – Reestruturação da política de concorrência• CADE absorve investigação e instrução de processos• Submissão prévia ao CADE de fusões e aquisições
Estrutura do CADE
Investigação e a instrução de processos de repressão ao abuso do poder econômico e a análise
dos atos de concentração
Análises econômicas sobre os efeitos das decisões do Cade no
mercado.
Etapas de Análise Econômica de Atos de Concentração Horizontal
Fonte: Portaria Conjunta SEAE/SDE nº 50/2001
Etapas de Análise Econômica de Atos de Concentração Horizontal
Fonte: Portaria Conjunta SEAE/SDE nº 50/2001
Detalhe da Etapa III - Exercício de Poder de Mercado
Fonte: Portaria Conjunta SEAE/SDE nº 50/2001
No dia 3 de abril de 2013, eu acompanhava o trabalho de uma assessora do
Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE), autarquia vinculada ao
Ministério da Justiça e responsável pela política de defesa da concorrência ou
política antitruste, como também é chamada. O trabalho da assessora, naquela
ocasião, consistia em definir o “mercado relevante” de uma concentração de
empresas no setor de tratamento oncológico. Tal definição de mercado é uma
técnica comum nas análises de “atos de concentração” (uma fusão ou aquisição,
por exemplo) como o que ela estava analisando no momento. A “operação”
notificada ao CADE e que veio parar na mesa da assessora se referia a compra
(aquisição) de um hospital por outro no município do Rio de Janeiro. A aquisição
certamente produziria uma concentração que poderia reduzir a concorrência, mas
para se determinar um certo “índice de concentração” era preciso definir qual era
o mercado que seria afetado.
Etnografia da definição do mercado relevante – caso 1
A questão, nesse caso específico, consistia em decidir se “hospitais” e “clínicas
hospitalares” poderiam ser considerados como participantes de um mesmo
mercado e, portanto, como possíveis concorrentes na prestação de serviços
médico-hospitalares. Caso fossem de um mesmo mercado, a aquisição pouco
alteraria a concentração de mercado, visto que a quantidade de clínicas na região
era enorme. Após sua explicação sobre o modo pelo qual comumente se definia o
mercado neste setor, por meio do cálculo de raios de distância entre as clínicas de
oncologia, a assessora disse: “nesse mercado, por experiência própria, eu sei que a
clínica hospitalar não deve concorrer com os hospitais”.
Etnografia da definição do mercado relevante – caso 1
Não entendendo sua afirmação, perguntei porque ela saberia de uma informação
tão específica. Ela então explicou que, alguns anos atrás, seu pai havia sofrido de
um câncer e que ela lembra, como se fosse hoje, que seu pai não precisava ir ao
hospital para realizar suas sessões de quimioterapia. Na realidade, disse ela, agora
existe até um novo método de tratamento em que não há a necessidade de ir nem
mesmo à clínica todo dia. Existe uma forma de implante acima do peito que vai
liberando a medicação ao longo do dia, não tendo a necessidade do paciente se
locomover, explicou ela. Isso significa, segundo ela, que “talvez não haja uma
concentração horizontal entre hospital e clínica”, pois o pai dela não precisava ir ao
hospital, apenas para uma clínica, eventualmente. Em razão disso, “clínicas” e
“hospitais” não deveriam estar no mesmo mercado.
Etnografia da definição do mercado relevante – caso 1
Embora obscura e praticamente incompreensível para aqueles não familiarizados
com o mundo da política de defesa da concorrência, a relação estabelecida pela
assessora entre a definição de mercado e a história de seu pai ilustra,
resumidamente, o objeto de qual parte a reflexão deste trabalho. Durante a análise
de processos administrativos, os profissionais que trabalham no CADE, sejam eles
economistas, advogados ou de outra formação, frequentemente se utilizam de
experiências vividas pessoais ou conhecidas para ajudá-los a inferir certas
características de mercados, setores, indústrias ou empresas, ou seja, do mundo
econômico. As experiências vividas pelos assessores e analistas, que podem ser
pensadas como um modo de conhecimento do mundo econômico, são utilizadas
de forma complementar às práticas oficiais de produção de conhecimento típicas
do direito administrativo. Por meio de exemplos como o acima, pretende-se
descrever essas práticas de conhecimento intuitivas, laterais (Maurer, 2005), que
atravessam a análise (e o julgamento) dos casos, tendo em vista repensar a relação
entre o órgão regulador e seu objeto de análise, o mundo econômico.
Etnografia da definição do mercado relevante – caso 1
No gabinete em que eu fazia pesquisa, os assessores e o conselheiro se reuniam
quinzenalmente para discutir a instrução de processos que estavam sobre sua
responsabilidade. Os processos eram postos sobre a mesa de reuniões do gabinete
e eram abertos um a um para que fossem discutidas as possíveis formas de
encaminhamento da investigação. Um dos assessores pegava um dos processos e
lia as primeiras páginas em voz alta para que os outros soubessem do que se
tratava e procurassem entender qual era o “problema concorrencial” que o caso
poderia estar suscitando. Em geral, as questões discutidas entre os assessores e o
conselheiro tinham a ver com o tipo de material (informação ou dado) que
precisava ser requisitado para a empresa requerente ou para os concorrentes para
que a dúvida fosse adequadamente esclarecida e, consequentemente, para que o
conselheiro, com o auxílio do assessor, elaborasse seu voto escrito.
Etnografia da definição do mercado relevante – caso 2
Em uma reunião do conselheiro com dois assessores em outubro de 2012, todas
as atenções do grupo se voltavam para uma tabela, que cobria toda uma página de
uma petição, com os nomes e a localização de uma série de centros universitários.
A localização dos centros era dada pelo endereço completo, sendo que a grande
maioria deles estava localizada na Grande São Paulo. A tabela havia sido enviada
pelas requerentes do ato de concentração para enumerar o conjunto completo de
centros universitários que seriam parte do mesmo grupo econômico, caso o ato
fosse aprovado pelo CADE. O apontamento e a localização das unidades era uma
obrigatoriedade do pedido de aprovação de um ato de concentração com tais
características: duas empresas controladoras de universidades, centros
universitários e faculdades estavam se unindo (fusão) e constituindo um só grupo
econômico.
Etnografia da definição do mercado relevante – caso 2
Depois da tabela passar pela mão de todos os presentes, um dos assessores me
perguntou: “Então, Gustavo, você que já morou em São Paulo, qual a distância da
Avenida Paulista para esse lugar aqui em São Bernardo do Campo? Ah, e da
Avenida Vergueiro para a Avenida Paulista?”. Eu respondi que não podia afirmar
qual era a distância exata, mas que provavelmente não levava mais de trinta
minutos, sem trânsito, para se chegar da Av. Paulista a São Bernardo. O assessor
então perguntou: “Mas você, se morasse na Paulista, iria até São Bernardo
estudar?” Disse que provavelmente não; que havia uma série de universidades
mais próximas da Av. Paulista que provavelmente eram similares àquela de São
Bernardo e que não imaginaria alguém que fizesse isso.
Etnografia da definição do mercado relevante – caso 2
Minha experiência pessoal tornava possível, para o assessor, um certo
entendimento sobre o modo de funcionamento do mercado de serviços
educacionais na cidade de São Paulo. Mais do que isso, ele possibilitava uma
aproximação da racionalidade de um consumidor típico desses serviços na cidade
de São Paulo. Podendo inferir características dos consumidores e do tempo de
deslocamento, além de poder observar, ainda que não conclusivamente, a
presença ou não de concorrentes, o assessor seria capaz de elaborar novas
perguntas para as empresas fusionadas e para suas possíveis concorrentes no
mercado. A “dinâmica concorrencial” nesse mercado começava a ganhar certos
contornos e características que possibilitariam avaliar se a fusão notificada geraria
algum dano à “ordem econômica”.
Etnografia da definição do mercado relevante – caso 2