apolÔnio de tÍana

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APOLNIO DE TANAO Filsofo, Explorador e Reformador Social do Primeiro Sculo depois de CristoG.R.S.Mead Edio de 1901

CONTEDO I II III IV V VI VII VIII IX X XI XII XIII XIV XV XVI XVII Introduo As Associaes e Comunidades Religiosas do Primeiro Sculo ndia e Grcia O Apolnio das Primeiras Descries Textos, Tradues e Literatura O Bigrafo de Apolnio Primeiros Anos As Viagens de Apolnio Nos Santurios dos Templos e Retiros Religiosos Os Gimnosofistas do Alto Egito Apolnio e os Governantes do Imprio Apolnio, o Profeta e Taumaturgo Seu Estilo de Vida Ele e Seu Crculo De Seus Ditos e Sermes De Suas Cartas Os Escritos de Apolnio I. INTRODUO Para o estudioso das origens do Cristianismo naturalmente no h perodo na histria ocidental de maior interesse e importncia do que o primeiro sculo de nossa era; e mesmo assim quo comparativamente pouco conhecido sobre ele de natureza realmente definida e confivel. Se j to lamentvel que nenhum escritor no-Cristo do primeiro sculo tenha tido intuio suficiente do futuro para registrar sequer uma s linha de informao referente ao nascimento e crescimento do que viria a ser a religio do mundo ocidental, igualmente desapontador encontrar to pouca informao definida sobre as condies sociais e religiosas gerais da poca. Os governantes e as guerras do

Imprio parecem ter constitudo o interesse principal dos historigrafos do sculo seguinte, e mesmo neste departamento de histria poltica, ainda que os atos pblicos dos Imperadores possam ser bastante bem conhecidos, pois os podemos averiguar por registros e inscries, quando passamos aos seus atos e motivos privados j no nos encontramos mais no terreno da histria, mas geralmente na atmosfera do preconceito, escndalo e especulao. Os atos polticos dos Imperadores e seus oficiais, entretanto, podem no mximo lanar s uma tnue luz sobre as condies sociais gerais da poca, mas j no iluminam nada das condies religiosas, exceto at onde de algum modo estas contatem o mbito da poltica. Tambm poderamos tentar reconstruir uma imagem da vida religiosa da poca a partir dos atos e editos Imperiais tanto quanto poderamos formar alguma idia da religio privada deste pas a partir de um estudo dos estatutos e anais das sesses do Congresso. As chamadas Histrias Romanas, com as quais estamos bem familiarizados, no podem nos ajudar na reconstruo de uma imagem do ambiente onde, de um lado, Paulo conduziu a nova f na sia Menor, Grcia e Roma; e onde, de outro lado, j a encontramos estabelecida nos distritos margeando o sudeste do Mediterrneo. somente reunindo laboriosamente migalhas isoladas de informao e fragmentos de inscries que nos tornamos cnscios da existncia da vida de um mundo de associaes religiosas e cultos privados que existiam neste perodo. No que mesmo assim tenhamos qualquer informao muito direta do que ocorria nestas associaes, guildas e irmandades; mas temos evidncias suficientes para fazer-nos lamentar agudamente a ausncia de um conhecimento adicional. Mesmo que este seja um campo difcil de lavrar, extraordinariamente frtil em interesse, e de lastimarmos que comparativamente to pouco trabalho tenha sido feito nele at agora; e que, como ocorre to amide, em sua maior parte seja inacessvel ao leitor em portugus. O trabalho que j foi feito sobre este assunto em especial pode ser conferido atravs da nota bibliogrfica anexa a este ensaio, na qual dada uma lista de livros e artigos tratando das associaes religiosas entre os gregos e entre os romanos. Mas se procurarmos obter uma viso geral da situao dos assuntos religiosos no primeiro sculo, nos encontramos desprovidos de um guia confivel; pois tratando deste assunto particular h s poucos livros, e neles aprendemos pouco, que no interessa diretamente, ou imagina-se que interesse, ao Cristianismo; enquanto que, no nosso caso, justamente sobre o estado do mundo religioso no-Cristo que desejamos ser informados. Se, por exemplo, o leitor dirigir-se a trabalhos de histria geral como o de Merivale, History os the Romans under the Empire (Histria dos Romanos sob o Imprio Londres, 1865), ele encontrar, de fato, no captulo iv, uma descrio do estado da religio at a morte de Nero, mas aprender pouco de seu estudo. Se ele recorrer Geschichte der rmischen Kaiserreichs unter der Regierung des Nero (Histria do Imprio Romano sob o Reinado de Nero Berlin, 1872), de Hermann Schiller, ele encontrar muitas razes para abandonar as opinies vulgares sobre os monstruosos crimes imputados a Nero, como de fato poderia fazer pela leitura do artigo de G.H.Lewes Was Nero a Monster? (Nero foi um Monstro? Cornhill Magazine, julho de 1863) e ele

tambm encontrar no livro IV, captulo III, uma viso geral da religio e da filosofia da poca que muito mais inteligente que a de Merivale; mas tudo ainda muito vago e insatisfatrio, e nos sentimos fora da vida ntima dos filsofos e religiosos do primeiro sculo. Se, ainda, ele acorrer aos ltimos escritores da histria da Igreja que abordaram esta questo especfica, ver que eles esto inteiramente ocupados com os contatos entre a Igreja Crist e o Imprio Romano, e s incidentalmente nos do alguma informao sobre a natureza do que buscamos. Neste terreno especfico, C.J.Neumann interessante em seu cuidadoso estudo Der rmische Staat und die allgemeine Kirche bis auf Dioclecian (O Estado Romano e a Igreja Geral at Diocleciano Leipzig, 1890); enquanto que o Prof. W.M.Ramsay, em seu The Church in the Roman Empire before AD 170 (A Igreja no Imprio Romano antes de 170 d.C. Londres, 1893) extraordinrio, pois ele tenta interpretar a histria romana atravs dos documentos do Novo Testamento, cujas datas em sua maioria so to calorosamente disputadas. Mas, voc pode dizer, o que tudo isso tem a ver com Apolnio de Tana? A resposta simples: Apolnio viveu no primeiro sculo; seu trabalho foi realizado precisamente entre estas associaes religiosas, colgios e guildas. Um conhecimento deles e de sua natureza nos daria uma ambientao natural para grande parte de sua vida; e informao sobre suas condies no primeiro sculo talvez nos ajudasse a entender melhor alguns dos motivos da tarefa que ele empreendeu. Entretanto, se apenas a vida e trabalhos de Apolnio fossem iluminados por este conhecimento, poderamos entender por qu to pouco esforo tem sido feito nesta direo; pois o carter do Tianeu, como veremos, desde o sculo IV tem sido encarado pouco favoravelmente, mesmo por poucos, enquanto que a maioria olha para nosso filsofo no s como um charlato, mas mesmo como um anticristo. Mas quando exatamente este conhecimento sobre estas associaes e ordens religiosas o que lanaria uma torrente de luz sobre a evoluo inicial do Cristianismo, no s a respeito das comunidades Paulinas, mas tambm a respeito daquelas escolas que posteriormente foram condenadas como herticas, espantoso que no tenhamos trabalhos mais satisfatrios feitos sobre o assunto. Entretanto, pode ser dito que esta informao no est disponvel simplesmente porque no encontrvel. De modo geral isto verdade; no obstante, muito mais do que j foi feito at agora poderia ser tentado, e os resultados da pesquisa em direes especficas e nos desvos da histria poderiam ser combinados, de modo que o leigo pudesse obter alguma idia geral das condies religiosas da poca, e fosse assim menos inclinado a se juntar agora estereotipada condenao de todo o esforo moral e religioso no-Judeu ou no-Cristo no Imprio Romano do primeiro sculo. Mas o leitor pode redargir: As coisas sociais e religiosas naqueles tempos devem ter estado em uma condio muito deplorvel, pois, como este ensaio demonstra, o prprio Apolnio passou a maior parte de sua vida tentando reformar as instituies e cultos do Imprio. A isto respondemos: Sem dvida

havia muito a ser reformado, e quando no h? Mas para ns seria no apenas mesquinho, mas nitidamente maldoso, julgarmos nossos companheiros daqueles dias somente pelo alto padro de uma moralidade ideal, ou mesmo desclassific-los sob o peso de nossas prprias supostas virtudes e conhecimentos. Nossa opinio no que no havia nada a reformar, longe disto, mas que todas as acusaes de depravao levantadas contra a poca no suportariam uma investigao imparcial. Ao contrrio, havia muito bom material pronto para ser desenvolvido de muitas maneiras, e se no fosse assim, como poderia ter havido entre outras coisas alguma Cristandade? O Imprio Romano estava no auge de seu poder, e se no tivesse tido muitos administradores notveis e homens dignos na casta governante, uma consumao poltica como aquela jamais poderia ter sido conseguida e mantida. Mais ainda, e como jamais no mundo antigo, a liberdade religiosa era garantida, e onde encontramos perseguies, como nos reinados de Nero e Domiciano, isso deve ser atribudo a razes polticas antes que teolgicas. Pondo de lado a disputada questo da perseguio dos Cristos sob Domiciano, a perseguio de Nero foi dirigida contra aqueles que o poder Imperial considerava como revolucionrios polticos Judeus. Assim, tambm, quando encontramos os filsofos presos ou banidos de Roma durante aqueles dois reinados, no foi porque fossem filsofos, mas porque o ideal de alguns deles era a restaurao da Repblica, e isto os tornou passveis da condenao de serem no s agitadores polticos, mas tambm de tramarem ativamente contra a majestas do Imperador. Apolnio, entretanto, foi sempre um ardoroso defensor da regra monrquica. Quando, ento, ouvimos sobre filsofos sendo banidos de Roma ou sendo lanados na priso, devemos lembrar que isto no era uma perseguio total da filosofia por todo o Imprio; e quando dizemos que alguns deles quiseram restaurar a Repblica, devemos lembrar que a sua vasta maioria no se envolvia na poltica, e este especialmente foi o caso dos discpulos das escolas religioso-filosficas. II. AS ASSOCIAES E COMUNIDADES RELIGIOSAS DO PRIMEIRO SCULO No campo da religio bem verdade que os cultos estatais e instituies nacionais do Imprio estavam quase sem exceo num estado lamentvel, e deve ser notado que Apolnio devotou muito tempo e trabalho para os reviver e purificar. De fato, a fora havia h muito se esvado das instituies religiosas gerais do estado, onde tudo era agora perfunctrio; mas longe isto de no haver uma vida religiosa na regio, pois na medida em que os cultos oficiais e instituies ancestrais j no satisfaziam s suas necessidades religiosas, mais diligentemente o povo se devotava aos cultos privados, e avidamente se fazia batizar em todo aquele afluxo de entusiasmo religioso que derivava cada vez com maior fora do oriente. Sem dvida em toda essa fermentao houve muitos excessos, e mesmo abusos penosos, de acordo como nossa atual concepo de decoro religioso; mas ao mesmo tempo muitos encontravam nisto a devida satisfao para sua emoo religiosa, e, se excetuarmos aqueles cultos que eram nitidamente viciosos, temos em grande medida diante de ns o espetculo, em crculos populares, do que, em ltima anlise, so fenmenos similares aos entusiasmos que em nossos dias podemos encontrar

freqentemente em seitas como os Shakers e Ranters [seitas inglesas surgidas no sculo XIX, caracterizadas por sua pregao veemente, seus cultos onde havia grande agitao mstico-fsica, e seus preceitos de pureza e sobriedade de vida NT], e nas assemblias de revivescncia religiosa das pessoas simples. No se deve pensar, contudo, que os cultos privados e os atos das associaes religiosas fossem todos desta natureza ou confinados a esta classe; longe disto. Havia irmandades, comunidades e clubes religiosos thiasi, erani, e orgenes de todos os tipos e condies. Havia tambm sociedades de benefcio mtuo, grmios para funerais, e companhias onde havia refeies grupais, os prottipos de nossos atuais Maons, Oddfellows, e etc. Estas associaes religiosas no eram s privadas no sentido de que no eram mantidas pelo Estado, mas tambm em sua maior parte eram privadas no sentido de que o que faziam permanecia secreto, e talvez esta seja a razo principal para que delas tenhamos registros to falhos. Entre elas devem ser enumeradas no somente as formas inferiores dos cultos de mistrios de vrios tipos, mas tambm as maiores, como os Mistrios Frgios, Bquicos, Isacos e Mitraicos, que estavam espalhados por todo o Imprio. Os famosos Mistrios de Elusis, entretanto, estavam sob a gide do Estado, mas ainda que fossem to famosos, como cultos estatais, eram muito mais perfunctrios. Alm disso, no deve ser pensado que os grandes tipos de cultos de mistrios acima mencionados fossem uniformes mesmo entre eles mesmos. No havia somente vrios degraus e graus dentro deles, mas tambm com toda a probabilidade havia muitas formas em cada linha de tradio, boas, ms e indiferentes. Por exemplo, sabemos que era considerado obrigatrio para todo cidado respeitvel de Atenas ser iniciado nos Eleusinia, e por isso os testes no poderiam ser muito exigentes; enquanto que no trabalho mais recente sobre o assunto, De Apuleio Isiacorum Mysterirorum Teste (Sobre o Teste de Apuleio nos Mistrios de sis Leyden, 1900), o Dr. K.H.E. De Jong demonstra que numa forma dos Mistrios de sis o candidato era convidado iniciao atravs de um sonho; isto , ele devia ser psiquicamente impressionvel antes que fosse aceito. Aqui, ento, temos um vasto terreno intermedirio para o exerccio religioso entre as formas mais populares e indisciplinadas de culto e as formas mais altas, que poderiam ser abordadas somente atravs da disciplina e treinamento da vida filosfica. O lado superior destas instituies de mistrios despertou o entusiasmo de todos os melhores na antigidade, e aplauso irrestrito foi dado a uma ou outra de suas formas pelos maiores pensadores e escritores da Grcia e Roma; de modo que no podemos seno pensar que aqui o instrudo encontrava aquela satisfao para suas necessidades religiosas que era necessria no s para os que no poderiam se elevar ao ar rarefeito da razo pura, mas tambm para aqueles que j haviam subido to alto aos pncaros da razo que poderiam captar um vislumbre do outro lado. Os cultos oficiais eram notoriamente incapazes de lhes dar esta satisfao, e eram tolerados pelos

ilustrados apenas como um auxlio para o povo e um meio de preservar a vida tradicional da cidade ou estado. Era pensamento geral que as pessoas mais virtuosas da Grcia fossem membros das escolas Pitagricas, tanto homens quanto mulheres. Aps a morte de seu fundador, os Pitagricos parecem ter gradualmente se misturados s comunidades rficas e a vida rfica era o termo reservado para uma vida de pureza e auto-negao. Sabemos igualmente que os rficos, e portanto os Pitagricos, estavam ativamente engajados na reforma, ou mesmo na reformulao completa, dos ritos Baco-Eleusinos; eles parecem ter recuperado o lado puro do culto Bquico com a reinstituio ou reimportao dos Mistrios Bquicos, e muito evidente que tais ascetas e profundos pensadores no poderiam ter-se contentado com uma forma inferior de culto. Sua influncia tambm se espalhou amplamente nos crculos Bquicos em geral, de modo que vemos Eurpides colocando as seguintes palavras na boca do coro dos iniciados Bquicos: Envolto em vestes brancas eu fujo da raa dos mortais, e jamais me aproximarei do vaso da morte novamente, pois eu criei com alimento aquela alma sempre habitada (de um fragmento de Os Cretenses. Vide Aglaophamus, de Lobeck, p. 622). Tais palavras poderiam bem ser colocadas na boca de um asceta Brmane ou Budista, vido por escapar dos laos de Samsra [a roda dos eternos nascimentos e mortes NT]; e tais homens no poderiam com justia ser classificados indiscriminadamente junto com lacres dissolutos a concepo comum de uma companhia Bquica. Mas, algum poderia dizer, Eurpides e os Pitagricos e os rficos no constituem evidncia para o primeiro sculo; qualquer bem que tenha havido em tais escolas e comunidades, tinha terminado h muito. Ao contrrio, a evidncia toda contra esta objeo. Filo, escrevendo em torno de 25 d.C., nos fala que em seus dias numerosos grupos de homens, que em todos os aspectos levava esta vida de religio, que haviam abandonado suas propriedades, se retirado do mundo e devotado-se completamente procura da sabedoria e ao cultivo da virtude, estavam largamente espalhados por todo o mundo. Em seu tratado Sobre a Vida Contemplativa, ele escreve: Esta classe natural de homens encontrada em muitas partes do mundo habitado, tanto grego como no-grego, comungando no bem perfeito. No Egito h multides deles em cada provncia, ou nomo, como eles chamam, e especialmente em torno de Alexandria. Esta uma declarao importantssima, pois se havia tantos devotados vida religiosa em seu tempo, segue-se que a poca no era de pura depravao. No se deve pensar, contudo, que estas comunidades fossem todas de natureza exatamente similar, ou de uma e mesma origem, a menos que fossem todos Terapeutas ou Essnios. Temos s que lembrar das vrias linhas de descendncia das doutrinas mantidas por inumerveis escolas classificadas em bloco como Gnsticas, como esbocei em meu ltimo trabalho, Fragments of a Faith Forgotten (Fragmentos de uma F Esquecida), e ento voltarmo-nos aos belos tratados das escolas Hermticas, para nos persuadirmos que no primeiro sculo a procura pela vida religiosa e filosfica era largamente disseminada e multiforme.

No estamos, porm, entre aqueles que acreditam que a origem das comunidades dos Terapeutas de Filo, e dos Essnios de Filo e Josefo, deva ser derivada da influncia rfica ou Pitagrica. A questo da origem precisa ainda est alm do poder da pesquisa histrica, e no somos daqueles que amplificam um elemento da massa at que se torne uma fonte universal. Mas quando lembramos da existncia de todas estas comunidades to amplamente disseminadas no primeiro sculo, quando estudamos os registros imperfeitos mas importantes das mui numerosas escolas e irmandades de natureza semelhante que passaram a contatar intimamente com o Cristianismo em suas origens, no podemos seno sentir que havia o fermento de uma forte vida religiosa agindo em muitas partes do Imprio. Nossa grande dificuldade que estas comunidades, irmandades e associaes se mantiveram parte, e com raras excees no deixaram registros de suas prticas e crenas ntimas, ou se deixaram algum, foi destrudo ou se perdeu. Para a maior parte temos ento que nos fiar em indicaes gerais de carter muito superficial. Mas este registro imperfeito no escusa para negarmos ou ignoramos sua existncia e a intensidade de suas prticas; e uma histria que se prope a formar uma imagem da poca inteiramente insuficiente na medida em que omitir de sua perspectiva este assunto to vital. Apolnio circulou neste ambiente; mas quo pouco seu bigrafo parece ter-se apercebido do fato! Filstrato tem uma apreciao retrica de uma vida filosfica palaciana, mas nenhum sentimento para a vida religiosa. s indiretamente que A Vida de Apolnio, como agora descrita, pode jogar alguma luz sobre estas interessantssimas comunidades, mas mesmo um claro ocasional precioso onde tudo est em tamanha obscuridade. Fosse possvel apenas entrar na memria viva de Apolnio e ver com seus olhos as coisas que viu quando viveu dezenove sculos atrs, quo inestimvel pgina da histria poderia ser recuperada! Ele no s percorreu todos os pases onde a nova f estava assentando razes, mas viveu durante anos na maioria deles, e estava intimamente relacionado com diversas comunidades msticas do Egito, Arbia e Sria. Certamente ele deve ter visitado tambm algumas das primeiras comunidades Crists, deve ter palestrado at mesmo com alguns dos discpulos do Senhor! Mas nenhuma palavra dita sobre isso, nem obtemos sequer um simples fragmento de informao sobre estes pontos do que foi registrado sobre ele. Certamente ele deve ter-se encontrado com Paulo, se no em outro lugar, pelo menos em Roma, em 66, cidade que ele teve de deixar por causa do edito de banimento contra os filsofos, no mesmo ano em que segundo alguns Paulo foi decapitado! III. NDIA E GRCIA H contudo uma outra razo pela qual Apolnio importante para ns. Ele era um admirador entusistico da sabedoria da ndia. Aqui tambm se abre um tpico de grande interesse. Que influncias, se alguma houve, tiveram o Bramanismo e o Budismo sobre o pensamento ocidental naqueles primeiros anos? Alguns asseveram enfaticamente que houve grande influncia; do mesmo modo enftico outros negam que tenha havido alguma. Portanto aparente que no h evidncia realmente inquestionvel a respeito do assunto.

Exatamente como alguns atribuiriam a influncia Pitagrica sobre a constituio das comunidades Essnias e Teraputicas, outros atribuiriam suas origens propaganda Budista; e no somente eles detectariam esta influncia nos preceitos e prticas Essnias, mas relacionariam at o ensino geral de Cristo a uma fonte Budista sob uma feio monotesta Judia. E no s, mas alguns diriam que dois sculos antes, atravs do contato direto e comum da Grcia com a ndia, produzido pelas conquistas de Alexandre, a ndia, via Pitgoras, teria influenciado forte e duradouramente todo o pensamento grego posterior. A questo certamente no pode ser resolvida com uma negativa ou afirmao apressadas; requer no apenas um amplo conhecimento de histria geral e um estudo detalhado das indicaes esparsas e imperfeitas sobre o pensamento e a prtica, mas tambm uma fina apreciao do valor correto da evidncia indireta, pois no temos nenhum testemunho direto de natureza realmente decisiva. No pretendemos possuir estas altas qualificaes, e nossa maior ambio simplesmente dar umas indicaes muito breves e gerais sobre a natureza do assunto. claramente asseverado pelos antigos gregos que Pitgoras foi ndia, mas como a declarao foi feita por escritores Neo-Pitagricos e Neo-Platnicos, posteriores ao tempo de Apolnio, objetado que as viagens do Tianeu sugeriram no s este item na biografia do grande Samiano mas diversos outros, ou mesmo que o prprio Apolnio, em sua Vida de Pitgoras, foi o autor do boato. A estreita semelhana, entretanto, entre muitas das caractersticas da disciplina e doutrina Pitagricas e o pensamento e prtica Indo-Arianas nos fazem hesitar ante rejeitar inteiramente a possibilidade de Pitgoras ter visitado a antiga ryvarta. E mesmo que no possamos ir to longe a ponto de acalentar a possibilidade de um contato direto pessoal, devemos levar em conta o fato de que Fercides, o mestre de Pitgoras, possa ter conhecido algumas das idias principais da sabedoria Vdica. Fercides ensinou em feso, mas ele mesmo era muito provavelmente persa, e muito verossmil que um asitico instrudo, ensinando uma filosofia mstica e baseando sua doutrina sobre a idia do renascimento, possa ter tido algum conhecimento direto ou indireto do pensamento IndoAriano. A Prsia deve ter estado naquele tempo em contato estreito com a ndia, pois perto da morte de Pitgoras, no reinado de Dario, filho de Histaspes, e no fim do sexto e incio do stimo sculo antes de nossa era, ouvimos sobre a expedio do general Persa Scilax sobre o Indo, e aprendemos de Herdoto que neste reino da ndia (isto , o Punjab), ele constituiu a vigsima satrpia da monarquia Persa. Mais ainda, havia tropas indianas entre as hostes de Xerxes; elas invadiram a Tesslia e lutaram em Platia. Do tempo de Alexandre em diante houve um contato constante e direto entre ryvarta e os reinos dos sucessores do conquistador do mundo, e muitos gregos escreveram sobre esta terra de mistrios; mas em tudo o que nos

chegou procuramos em vo por algo alm de vagas indicaes do que os filsofos da ndia pensavam sistematicamente. Que os Brmanes tivessem nesta altura permitido que seus livros sagrados fossem lidos pelos yavanas (os jnios, o nome genrico para os gregos nos registros indianos) contrrio a tudo o que conhecemos de sua histria. Os yavanas eram mlechchhas [estrangeiros NT], estranhos sociedade dos rias, e tudo o que poderiam obter da ciosamente guardada Brahma-vidy ou teosofia deve ter dependido somente de observao externa. Mas a atividade religiosa dominante na ndia de ento era o Budismo, e neste protesto contra as rgidas distines de casta e raa feitas pelo orgulho Bramnico, e na extraordinria novidade de uma propaganda religiosa entusistica entre todas as classes e raas da ndia, que devemos procurar pelo contato mais direto de pensamento entre a ndia e a Grcia. Por exemplo, em meados do sculo III a.C., sabemos, pelo XIII Edito de Asoka, que este imperador Budista da ndia, o Constantino do oriente, enviou missionrios a Antoco II da Sria, Ptolomeu II do Egito, Antgono Gnatas da Macednia, Magas de Cirene, e Alexandre II do piro. Quando, em um terreno de registros to imperfeitos, a evidncia do lado da ndia to clara e indubitvel, quo mais extraordinrio que no tenhamos nenhum testemunho direto de nosso lado sobre uma atividade missionria to grande. Mesmo que, ento, meramente por causa de uma ausncia de toda informao direta a partir de fontes gregas, seja muito temerrio generalizarmos, no obstante por nosso conhecimento da poca no ilegtimo concluirmos que nenhum grande impacto pblico poderia ter sido feito por estes pioneiros do Dharma no ocidente. Com toda probabilidade estes Bhikshus [sbios ascetas NT] Budistas no produziram nenhum efeito sobre os governantes ou sobre o povo. Mas foi sua misso inteiramente improfcua; e a iniciativa missionria Budista para o ocidente termina com eles? A resposta para esta pergunta, segundo nos parece, est oculta na obscuridade das comunidades religiosas. No podemos, contudo, ir to longe a ponto de concordar com os que cortariam o n grdio assegurando dogmaticamente que as comunidades ascticas na Sria e no Egito foram fundadas por estes propagandistas Budistas. Mesmo na Grcia j havia no s comunidades Pitagricas, mas mesmo antes destas, comunidades rficas, pois mesmo aqui acreditamos que Pitgoras antes desenvolveu o que encontrou j existindo, do que estabeleceu algo inteiramente novo. E se eram encontradas na Grcia, muito mais que razovel supor que estas comunidades j existissem na Sria, Arbia e Egito, cujas populaes eram muito mais dadas a exerccios religiosos do que os Gregos, cticos e amantes do riso. Contudo, crvel que em tais comunidades, se em alguma delas, a propaganda Budista tenha encontrado uma audincia receptiva e atenta; mas mesmo assim notvel que elas no tenham deixado traos diretos ntidos de sua influncia. De todo modo, seja por mar, seja pela grande rota de caravanas, sempre houve uma linha de comunicao aberta entre a ndia e o Imprio dos sucessores de Alexandre; e mesmo permissvel especular que

se fosse possvel recuperar um catlogo da grande biblioteca de Alexandria, por exemplo, talvez por acaso descobrssemos que havia manuscritos indianos entre outros rolos e pergaminhos das escrituras dos povos. De fato, h frases nos tratados mais antigos da literatura Hermtica Trismegstica que podem ser emparelhados to prximo com frases dos Upanishads e do Bhagavad Git que quase se tentado a acreditar que os escritores tinham algum conhecimento do contedo geral destas escrituras Brmanes. A literatura Trismegstica tem sua gnese no Egito, e seu primeiro depsito deve ser datado pelo menos no primeiro sculo d.C., se a data no puder ser levada ainda mais para trs. Ainda mais extraordinria a similitude entre a elevada metafsica mstica do doutor Gnstico, Baslides, que viveu entre o fim do primeiro e o incio do segundo sculo d.C., e as idias Vedantinas. Mais ainda, tanto as escolas Hermticas quanto as Basilidinas e suas predecessoras imediatas eram devotadas frrea auto-disciplina e ao profundo estudo filosfico, o que as poderia tornar vidas por acolher quaisquer filsofos ou msticos que pudessem chegar do longnquo oriente. Mas mesmo assim, no somos daqueles que por suas limitaes de possibilidades auto-impostas esto condenados a considerar algum contato fsico direto como uma explicao para a similaridade de idias ou mesmo de frases. Considerando, por exemplo, que h muita semelhana entre os ensinamentos do Dharma de Buda e o Evangelho de Cristo, e que o mesmo esprito de amor e gentileza pervade a ambos, ainda no h necessidade, por virtude desta semelhana, de procurar por uma transmisso puramente fsica. Do mesmo modo quanto a outras escolas e instrutores; condies semelhantes produzem fenmenos similares; esforos e aspiraes similares produzem experincias e idias parecidas, e respostas tambm semelhantes. E este acreditamos ser o caso no de uma maneira genrica, mas que tudo muito definidamente ordenado a partir de dentro pelos servos dos verdadeiros guardies das coisas religiosas neste mundo. No somos, pois, compelidos a enfatizar demais a questo da transmisso fsica, ou a procurar mesmo encontrar prova de cpia. A mente humana em seus vrios graus basicamente a mesma em todos os climas e idades, e sua experincia interna tem um cho comum no qual a semente pode ser lanada, assim como cultivada e livrada de ervas daninhas. As boas sementes provm todas do mesmo granel, e os que as semeiam no prestam ateno alguma s distines externas de raa e credo feitas pelo homem. Portanto, por mais difcil que seja provar, a partir de registros inquestionavelmente histricos, qualquer influncia direta do pensamento indiano sobre as concepes e prticas de algumas destas comunidades religiosas e escolas filosficas do Imprio Greco-Romano, e mesmo que em qualquer caso particular a similaridade de idias no precise necessariamente ser assinalada pela transmisso fsica direta, de qualquer maneira, a maior probabilidade, se no a maior certeza, continua sendo a de que mesmo antes dos dias de Apolnio havia na Grcia algum conhecimento privado das idias gerais do Vednta e do Dharma; enquanto que no caso do prprio Apolnio, mesmo se descontarmos nove dcimos do que dito sobre ele, sua nica idia

parece ter sido disseminar largamente entre as irmandades e instituies religiosas do Imprio alguma poro da sabedoria que ele trouxe consigo da ndia. Quando, ento, descobrimos no final do primeiro e no incio do segundo sculos, entre associaes msticas tais como as escolas Hermticas e Gnsticas, idias que nos lembram fortemente a teosofia dos Upanishads ou a tica esclarecida dos Suttas, temos sempre que levar em conta no s a alta probabilidade de Apolnio ter visitado tais escolas, mas tambm a possibilidade de ele ter nelas palestrado amplamente sobre a sabedoria indiana. No s isso, mas a memria de sua influncia pode ter perdurado por muito tempo em tais crculos, pois no encontramos Plotino, o corifeu do Neo-Platonismo, como chamado, to enamorado pelo que ele ouvira em Alexandria sobre a sabedoria da ndia, que em 242 ele partiu com a malfadada expedio Grdia ao oriente na esperana de atingir aquela terra da filosofia? Com o fracasso da expedio e o assassnio do Imperador, contudo, ele teve de voltar, para sempre desapontado em sua esperana. Porm, no devemos pensar que Apolnio tenha-se disposto a fazer uma propaganda da filosofia hindu do mesmo modo que os missionrios aprontamse para pregar sua concepo do Evangelho. De modo algum; Apolnio parece ter tentado ajudar seus ouvintes, quaisquer que pudessem ser, do modo mais adequado para cada um deles. Ele no comeava lhes falando que aquilo no que acreditavam era completamente falso e mortal para a alma, e que seu bem-estar eterno dependia de sua adoo instantnea de seu esquema especial de salvao; ele simplesmente tentava purgar e explicar melhor aquilo que eles j acreditavam e praticavam. Que algum grande poder o susteve em sua atividade incessante, e em sua obra quase universal, no to difcil de acreditar; e uma questo do mais profundo interesse, para aqueles que tentam enxergar atravs das nvoas da aparncia, especular o modo como no s um Paulo mas tambm um Apolnio foi ajudado e dirigido em sua obra a partir de dentro. Mas ainda no nasceu o dia em que ser possvel para a mente comum no ocidente abordar a questo livre de preconceitos, para aceitar o pensamento de que, vistos de dentro, no s Paulo mas tambm Apolnio bem podem ter sido discpulos do Senhor no verdadeiro sentido da palavra; e que mesmo que na superfcie das coisas suas tarefas possam parecer to diferentes em muitos aspectos, e mesmo, para os preconceitos teolgicos, inteiramente antagnicas. Por fortuna, contudo, j hoje existe um nmero crescente de pessoas pensantes que no ficaro chocadas com esta crena, mas a recebero com alegria como se fosse o anncio do nascimento de um verdadeiro sol de retido, que far mais para iluminar as multifrias vias da religio de nossa humanidade comum do que toda a auto-retido de qualquer corpo particular de religiosos exclusivistas. Ento, nesta atmosfera de caridade e tolerncia que pediramos ao leitor abordar a considerao de Apolnio e seus feitos, e no s a vida e atos de um

Apolnio, mas tambm de todos aqueles que tm tentado ajudar seus semelhantes em todo o mundo. IV. O APOLNIO DAS PRIMEIRAS DESCRIES Apolnio de Tana (pronuncia-se com o acento na primeira slaba e o primeiro a curto) foi o mais famoso filsofo do mundo greco-romano do primeiro sculo, e devotou a maior parte de sua longa vida purificao dos muitos cultos do Imprio e instruo dos ministros e sacerdotes de suas religies. Com a exceo de Cristo, nenhum personagem mais interessante apareceu na cena da histria ocidental nestes primeiros anos. Muitas e variadas e freqentemente contraditrias so as opinies que tm sido sustentadas sobre Apolnio, pois o relato de sua vida que chegou a ns do feitio de uma histria romntica antes que do de uma histria objetiva. E isto em certa medida talvez deva ser esperado, pois Apolnio, alm de seu ensino pblico, teve uma vida parte, uma vida na qual mesmo seu discpulo favorito no entra. Ele viaja at as terras mais distantes, e perde-se para o mundo por anos inteiros; ele entra nos santurios dos templos mais sagrados e nos crculos internos das comunidades mais fechadas, e o que ele diz ou faz l permanece um mistrio, ou serve somente como uma oportunidade para tecerem alguma histria fantstica aqueles que no compreendem. O estudo a seguir simplesmente uma tentativa de colocar para o leitor um breve esboo do problema que os registros e tradies sobre a vida do famoso Tianeu representa; mas antes que tratemos da Vida de Apolnio, escrita por Flvio Filstrato no comeo do sculo III, devemos dar uma breve notcia das referncias sobre Apolnio entre os escritores clssicos e os Padres da Igreja, e um curto resumo da literatura de tempos mais recentes sobre o assunto, e das vrias oscilaes da guerra de opinio a respeito de sua vida ao longo dos ltimos quatro sculos. Primeiramente, ento, as referncias em autores clssicos e patrsticos. Luciano, o espirituoso escritor da primeira metade do sculo II, toma como tema de uma de suas stiras o aluno de um discpulo de Apolnio, um daqueles que estavam familiarizados com toda a tragdia (Alexander sive Pseudomantis Alexandre, ou o Pseudo-mago -, vi.) de sua vida. E Apuleio, um contemporneo de Luciano, classifica Apolnio junto com Moiss e Zoroastro, e outros Magos famosos da antigidade (De Magia Sobre a Magia -, xc; ed. Hildebrand, 1842; ii, 614). Cerca da mesma poca, em uma obra intitulada Quaestiones et Responsiones ad Orthodoxos (Perguntas e Respostas aos Ortodoxos), antigamente atribuda a Justino, o Mrtir, que floresceu no segundo quarto do sculo II, encontramos a seguinte interessante declarao: Pergunta 24: Se Deus o autor e mestre da criao, como os objetos consagrados (. Telesma era um objeto consagrado, transformado pelos rabes em telsam, talism; vide o Lexicon de Liddell e Scott, sub voc.) de Apollonius tm poder nas (vrias) ordens desta criao? Pois, como ns vemos, eles acalmam a fria das ondas e o poder dos ventos e impedem o

ataque dos vermes e das bestas selvagens. (Justin Martyr, Opera Obras -, ed. Otto; 2 edio; Jena, 1849; ii, 32) Dion Cssio, em sua histria (Lib. I; xxvii, 18), que escreveu entre 211 e 212 d.C., diz que Caracala (Imperador entre 211 e 216) honrou a memria de Apolnio com uma capela ou monumento (heroum). Foi bem nesta poca (216) que Filstrato comps sua Vida de Apolnio, a pedido de Domna Julia, a me de Caracala, e com este documento principalmente que temos de lidar a seguir. Lamprdio, que floresceu em meados do sculo III, informa-nos ainda que Alexandre Severo (Imperador entre 222 e 235) colocou a esttua de Apolnio em seu lararium [espcie de capela onde os romanos colocavam as imagens de seus deuses protetores do lar NT] junto com as de Cristo, Abrao e Orfeu (Life of Alexander Severus A Vida de Alexandre Severo -, xxix). Vopisco, escrevendo na ltima dcada do sculo III, nos conta que Aureliano (Imperador entre 270 e 275) dedicou um templo a Apolnio, de quem ele tivera uma viso quando assediava Tana. Vopisco fala do Tianeu como um sbio da mais larga fama e autoridade, um antigo filsofo, e um verdadeiro amigo dos Deuses, e mais, como uma manifestao da deidade. Pois quem dentre os homens, exclama o historiador, foi mais santo, quem mais digno de reverncia, quem mais venervel, quem mais divinal que ele? Ele foi quem deu vida aos mortos. Ele foi quem operou e disse tantas coisas alm do poder dos homens. (Life of Aurelian A Vida de Aureliano, xxiv). To entusistico Vopisco sobre Apolnio, que prometeu que se vivesse, escreveria uma breve histria de sua vida em latim, para que seus feitos e palavras pudessem estar na lngua de todos, pois at ento os nicos relatos estavam em grego (Quae qui velit nosse, groecos legat libros qui de ejus vita conscripti sunt Que quem quiser saiba que os gregos deixaram livros sobre sua vida. Estes relatos provavelmente foram os livros de Mximo, Mergenes e Filstrato). Vopisco, entretanto, no cumpriu sua promessa, mas sabemos que perto desta data tanto Sotrico (um poeta pico Egpcio, que escreveu diversas histrias poticas em grego; floresceu na ltima dcada do terceiro sculo) quanto Nicmaco escreveram Vidas sobre nosso filsofo, e logo depois Tcio Vitoriano, trabalhando sobre as obras de Nicmaco (Sidonius Apollinaris, Epistolae - Cartas -, viii, 3. Vide tambm Legrand dAussy, Vie dApollonius de Tyane A Vida de Apolnio de Tana -, Paris, 1807; p. xlvii), tambm comps uma Vida. Nenhuma destas Vidas, contudo, chegou a ns. Tambm foi exatamente neste perodo, a saber, os ltimos anos do sculo III e os primeiros do IV, que Porfrio e Jmblico compuseram seus tratados sobre Pitgoras e sua escola; ambos mencionam Apolnio como uma de suas autoridades, e provvel que as primeiras 30 estncias de Jmblico sejam tomadas de Apolnio (Porphyryus, De Vita Pythagorae A Vida de Pitgoras -, seo ii, ed. Kiessling; Leipzig, 1816. Iamblichus, De Vita Pythagorica Sobre a Vida Pitagrica -, cap. xxv, ed. Kiessling; Leipzig, 1913; vide especialmente a nota de Kiessling, pp. II sqq. Vide tambm Porphyryus, Frag., De Styge Sobre o Estige -, p. 285, ed. Holst).

Agora chegamos a um incidente que arremessa o carter de Apolnio na arena da polmica Crist, onde tem sido debatido at os dias de hoje. Hirocles, sucessivamente governador de Palmira, da Bitnia e de Alexandria, e um filsofo, cerca do ano 305 escreveu uma crtica sobre as reivindicaes Crists, em dois livros, chamada Um Apelo Verdadeiro aos Cristos, ou mais concisamente O Amante da Verdade. Ele parece ter-se baseado em grande parte no trabalho anterior de Celso e Porfrio (vide Duchesne sobre as obras recentemente descobertas de Macrio Magno, Paris, 1877), mas introduziu um novo tema de controvrsia ao contrapor as obras maravilhosas de Apolnio reivindicao dos Cristos de direito exclusivo sobre milagres como prova da divindade de seu Mestre. Nesta parte de seu tratado, Hirocles usa a Vida de Apolnio, de Filstrato. A esta pertinente crtica de Hirocles, Eusbio de Cesaria imediatamente replicou em um tratado ainda existente, intitulado Contra Hieroclem (Contra Hirocles O melhor texto o de Gaynsford; Oxford, 1852: Eusebii Pamphili contra Hieroclem Eusbio Pnfilo contra Hirocles; tambm existe em vrias edies de Filstrato. H duas tradues em latim, uma em italiano, uma em dinamarqus, todas reunidas Vita, de Filstrato, e uma em francs, impressa parte: Discours dEusbe Evque de Cesare touchant les Miracles attribuez par les Payens Apollonius de Tyane Discursos de Eusbio, Bispo de Cesaria, a respeito dos Milagres atribudos pelos Pagos a Apolnio de Tana -, tr. de Cousin; Paris, 1584, 12, 135 pp.). Eusbio admite que Apolnio era um homem sbio e virtuoso, mas nega que haja provas suficientes de que as maravilhas atribudas a ele tenham mesmo ocorrido; e mesmo se ocorreram, foram obra de daimons [preferimos manter a palavra daimon, mantida tambm pelo autor (daemon), evidenciando sua fonte grega (), e significando seres mais espirituais que o homem, de vrios graus de sublimidade, em vez da traduo contempornea demnio, cujas associaes so completamente diversas em relao s originais NT] e no de Deus. O tratado de Eusbio interessante; ele escrutiniza severamente as declaraes de Filstrato, e mostra-se possudo de uma faculdade crtica de primeira linha. Tivesse ele apenas usado esta faculdade nos documentos da Igreja, da qual foi o primeiro historigrafo, a posteridade lhe teria um dbito eterno de gratido. Mas Eusbio, como tantos outros apologistas, s conseguia ver um lado da questo; quando qualquer coisa tocante ao Cristianismo era chamada cena, a justia se tornava estranha sua mente, e ele teria considerado blasfemo usar sua faculdade crtica sobre documentos que relatassem os milagres de Jesus. Mesmo assim o problema dos milagres era o mesmo, como Hirocles assinalou, e assim permanece at hoje. Depois a controvrsia reencarnou no sculo XVI, e quando a hiptese de ser o Diabo a causa primeira de todos os milagres exceto os da Igreja perdeu sua fora com o progresso do pensamento cientfico, a natureza dos prodgios relatados na Vida de Apolnio ainda era uma dificuldade to grande que deu origem a uma nova hiptese, a de plgio. A vida de Apolnio seria um plgio Pago da vida de Jesus. Mas Eusbio e os Padres que o seguiram no suspeitavam disto; eles viveram numa poca em que tal assero poderia ter sido facilmente refutada. No h uma s palavra em Filstrato que demonstre ter ele algum conhecimento da vida de Jesus, e fascinante como para muitos

a teoria de escrita tendenciosa de Baur, podemos somente dizer que como plagiador da histria do Evangelho, Filstrato um bvio fracasso. Filstrato escreve a histria de um homem bom e sbio, um homem com a misso de ensinar, revestida das maravilhosas histrias preservadas na memria e embelezadas pela imaginao de uma posteridade indulgente, mas no o drama da Deidade encarnada como o cumprimento da profecia mundial. Lactncio, escrevendo em torno de 315, tambm atacou o tratado de Hirocles, que parece ter apresentado algumas crticas muito pertinentes; pois o Padre da Igreja diz que ele enumera tantos de seus ensinamentos Cristos internos (intima) que algumas vezes ele parece ter seguido ao mesmo tempo o mesmo treinamento (disciplina). Mas, diz Lactncio, em vo que Hirocles tenta demonstrar que Apolnio executou feitos similares ou mesmo maiores que Jesus, pois os Cristos no crem que Cristo Deus porque operou prodgios, mas porque todas as coisas encontradas nele foram as que os profetas anunciaram (Lactantius, Divinae Institutiones As Instituies Divinas -, v 2, 3; ed. Fritsche; Leipzig, 1842; pp. 233, 236). E tomando este rumo Lactncio viu muito mais claramente que Eusbio a fragilidade da prova milagrosa. Arnbio, o professor de Lactncio, entretanto, escrevendo no fim do sculo III, antes da controvrsia, ao se referir a Apolnio ele simplesmente o classifica entre os Magos, como Zoroastro e os outros mencionados na passagem de Apuleio a que j nos referimos (Arnobius, Adversus Nationes Contra as Seitas -, i, 52; ed. Hildebrand; Halle, 1844; p. 86. O Padre da Igreja, contudo, com aquele exclusivismo peculiar viso Judeu-Crist, omite Moiss da lista de Magos). Mas mesmo depois da controvrsia ainda existe uma larga diferena de opinio entre os Padres, pois j no fim do sculo IV Joo Crisstomo, com grande mordacidade, chama Apolnio de enganador e fazedor de ms obras, e declara que todos os incidentes de sua vida so fico desqualificada (Johannes Chrysostomus, Adversus Judaeos Contra os Judeus -, v, 3, p. 631; De Laudibus Sancti Pauli Apost. Homil. Sobre as Honorveis Homilias de So Paulo Apstolo -, iv, p. 493 d; ed. Monfauc). Jernimo, ao contrrio, na mesmssima data, assume uma posio quase favorvel, pois, aps ler Filstrato, escreve que Apolnio encontrou em toda parte algo que aprender e algo por onde se tornar um homem melhor (Hieronymus, Ep. Ad Paulinum Epstola aos Paulinos -, 53; texto a partir de Kayser, pref. ix). No comeo do sculo V tambm Agostinho, enquanto ridiculariza qualquer tentativa de comparar-se Apolnio com Jesus, diz que o carter do Tianeu era muito superior quele atribudo a Jpiter, no que se tratava de virtude (Augustinus, Epistolae Cartas -, cxxxviii. Texto citado por Legrand dAussy; op. cit., p. 294). Por volta da mesma data tambm encontramos Isidoro de Pelsio, morto em 450, negando asperamente que houvesse qualquer verdade na reivindicao feita por alguns, que ele no diz quem so, de que Apolnio de Tana consagrou muitos locais em muitas partes do mundo para a segurana de seus habitantes (Isidorus Pelusiota, Epp. Cartas -, p. 138; ed. J. Billius; Paris, 1585). instrutivo comparar a negativa de Isidoro com a passagem que j citamos do Pseudo-Justino. O escritor de Perguntas e Respostas aos

Ortodoxos no segundo sculo no poderia descartar a pergunta atravs de uma simples negao; ele teve de admit-la e discutir o caso em outras bases, quais sejam, a agncia do Diabo. Nem o argumento dos Padres, de que Apolnio usava magia para produzir seus resultados, enquanto que Cristos ignorantes poderiam realizar curas milagrosas atravs de uma simples palavra (vide Arnbio, loc. cit.), pode ser aceito como vlido pelo crtico imparcial, pois no h evidncias para sustentar a pretenso de que Apolnio haja empregado tais mtodos para suas obras maravilhosas; ao contrrio, tanto o prprio Apolnio quanto seu bigrafo Filstrato reiteradamente repudiam a acusao de magia levantada contra ele. Por outro lado, poucos anos depois, Sidnio Apolinrio, Bispo de Claremont, fala de Apolnio em termos os mais altos. Sidnio traduziu a Vida de Apolnio para o latim para Leo, conselheiro do Rei Eurico, e escrevendo para seu amigo, diz: Lde a vida de um homem que, religio parte, se assemelha vossa em muitos pontos; um homem procurado pelos ricos, ainda que jamais tenha procurado riquezas; que amava a sabedoria e desprezava o ouro; um homem frugal em meio a festins, vestido de linho no meio dos purpurados, austero no meio da luxria... Enfim, falando claramente, talvez nenhum historiador encontrar nos tempos antigos um filsofo cuja vida fosse igual de Apolnio (Sidonius Apollinaris, Epistolae - Cartas -, viii, 3. Tambm Fabricius, Bibliotheca Graeca Biblioteca Grega -, pp. 549, 565; ed. Harles. A obra de Sidnio sobre Apolnio infelizmente foi perdida.) Assim vemos que mesmo entre os Padres da Igreja as opinies se dividiam; enquanto que entre os prprios filsofos o louvor de Apolnio era ardente. Pois Amiano Marcelino, o ltimo sdito de Roma que comps uma histria profana na lngua latina, e amigo de Juliano, o Imperador filsofo, refere-se ao Tianeu como aquele celebrrimo filsofo (amplissimus ille philosophus, xxiii, 7. Vide tambm xxi, 14; xxiii, 19), enquanto que uns poucos anos depois Eunpio, discpulo de Crisncio, um dos professores de Juliano, escrevendo nos derradeiros anos do sculo IV, diz que Apolnio era mais que um filsofo; era um meio-termo, por assim dizer, entre os deuses e os homens ( , significando com isso presumivelmente algum que tenha atingido o grau de ser superior ao homem, mas ainda no igual aos deuses. Esta era a ordem daimnca dos gregos. Mas a palavra daimon, devido aspereza sectarista, h muito degradou-se de seu antigo patamar elevado, e a idia original agora encontra traduo na linguagem comum atravs do termo anjo. Compare com Plato, Symposium O Banquete, xxiii, tudo o que daimnico est entre Deus e o homem. No s Apolnio era um adepto da filosofia Pitagrica, mas exemplificou plenamente o seu lado mais divino e prtico. De fato, Filstrato deveria ter chamado sua biografia de A Estada de um Deus entre os Homens (Eunapius, Vitae Philosophorum Vidas dos Filsofos -, Promio, vi; ed. Boissonade; Amsterdam, 1822; p. 3). Esta apreciao aparentemente por demais exagerada talvez encontre uma explicao no fato de que Eunpio pertenceu a uma escola que conhecia a natureza das realizaes atribudas a Apolnio.

Na verdade, to tarde quanto no sculo V, encontramos um Volusiano, um procnsul da frica, descendente de uma antiga famlia romana e ainda fortemente ligado religio de seus ancestrais, quase adorando Apolnio de Tana como um ser sobrenatural (Rville, Apollonius of Tyana; tr. do francs, p. 56; Londres, 1866. Contudo, no fui capaz de descobrir com que autoridade esta declarao feita). Mesmo depois do declnio da filosofia encontramos Cassiodoro, que passou os ltimos anos de sua longa vida em um mosteiro, falando de Apolnio como o renomado filsofo (Insignis philosophus; vide sua Chronicon Crnica -, escrita antes de 519). Do mesmo modo entre os autores bizantinos, o monge George Syncellus, no sculo VIII, refere-se diversas vezes ao nosso filsofo, e no apenas despido de toda a crtica adversa, mas declarando que ele foi a primeira e mais notvel de todas eminncias que surgiram no Imprio. (Chronographia. Vide Legrand dAussy, op. Cit., p. 313). Tzetzes tambm, o crtico e gramtico, chama Apolnio de todo-sbio e ante-conhecedor de todas as coisas (Chiliades, ii, 60). E mesmo que o monge Xiphilinus, no sculo IX, em uma nota para sua verso abreviada da histria de Dion Cssio, chame Apolnio de astuto ilusionista e mgico, (Citado por Legrand dAussy, op. cit. p. 286), no obstante Cedreno, no mesmo sculo, d a Apolnio o ttulo no indigno de adepto filsofo Pitagrico ( . Cedreno, Compendium Historiarium Compndio de Histria -, i, 346; ed. Bekker. A palavra que traduzi como adepto stoicheiomaticos - significa o que tem poder sobre os elementos) e relata diversos exemplos da eficcia de seus poderes em Bizncio. De fato, se podemos acreditar em Nicetas, no sculo XIII ainda havia em Bizncio certas portas de bronze, antigamente consagradas por Apolnio, que tiveram que ser postas abaixo porque se haviam tornado objeto de superstio mesmo entre os prprios Cristos. (Legrand dAussy, op. cit., p. 308). Tivesse a obra de Filstrato desaparecido junto com as outras Vidas, o que apresentei acima seria tudo o que conheceramos sobre Apolnio (se excetuarmos as suas controversas Cartas e umas poucas citaes de um dos escritos perdidos de Apolnio). Muito pouco, de fato, relativo a uma figura to distinguida, mas o bastante para mostrar que, com a exceo do preconceito teolgico, o sufrgio da antigidade estava todo do lado de nosso filsofo. V. TEXTOS, TRADUES E LITERATURA Agora passamos aos textos, tradues e literatura geral sobre o assunto em tempos mais recentes. Apolnio voltou memria do mundo, depois do esquecimento na idade das trevas, sob maus auspcios. Desde o incio a antiga controvrsia Hirocles-Eusbio foi ressuscitada, e todo o assunto foi de uma vez retirado da calma regio da filosofia e histria e arremessado mais uma vez na tumultuosa arena do amargor e preconceito religiosos. Durante muito tempo Aldus hesitou em publicar o texto de Filstrato, e finalmente s o fez em 1501, com o texto de Eusbio como apndice, para que, como ele piamente diz, o antdoto possa acompanhar o veneno. Junto apareceu uma traduo latina do

florentino Rinucci (Philostratus de Vita Apollonii Tyanei - Sobre a Vida de Apolnio de Tana, por Filstrato, tr. por Rinucci, e Eusebius contra Hieroclem Eusbio contra Hirocles, tr. por Acciolo; Veneza, 1501-04, fol.), a traduo de Rinucci foi retificada por Beroaldus e impressa em Lion [1504?], e novamente em Colnia [1534]). Em acrscimo traduo latina o sculo XVI produziu tambm uma italiana (F. Baldelli, Filostrato Lemnio della Vita di Apollonio Tianeo A Vida de Apolnio de Tana, por Filstrato de Lemnos, Florena, 1549, 8) e uma francesa (B. de Vignre, Philostrate de la Vie dApollonius A Vida de Apolnio, por Filstrato, Paris, 1596, 1599, 1611). A traduo de Blaise de Vignre subseqentemente foi corrigida por Frdric Morel e mais tarde por Thomas Artus, Sieur dEmbry, com notas bombsticas nas quais ataca ferozmente a taumaturgia de Apolnio. Uma traduo francesa tambm foi feita por Th. Sibilet, em torno de 1560, mas nunca foi publicada; o manuscrito estava na Biblioteca Imperial. Vide Miller, Journal des Savants, 1849, p. 625, citado por Chassang, op. infr. cit. P. iv). A editio princeps de Aldus foi superada um sculo depois pela edio de Morel (F. Morellus, Philostrati Lemnii Opera Obras de Filstrato Lmnio, Grega e Latina; Paris, 1608), que por sua vez um sculo depois foi superada pela de Olearius (G. Olearius, Philostratorum quae supersunt Omnia As Obras Completas Remanescentes de Filstrato, Grega e Latina; Leipzig, 1709). Cerca de um sculo e meio aps o texto de Olearius foi superado novamente pelo de Kayser (o primeiro texto crtico), cujo trabalho em sua ltima edio contm todo o moderno aparato crtico (C.L.Kayser, Flavii Philostrati quae supersunt..., etc; Zurique, 1844, 4). Em 1849 A. Westermann tambm editou um texto, Philostratorum et Callistrati Opera Obras de Filstrato e Calstrato, na Scriptorum Graecorum Bibliotheca Biblioteca de Escritores Gregos; Paris, 1849, 8). Mas Kayser trouxe luz uma nova edio em 1853 (?), e novamente uma terceira, com informaes adicionais no Prefcio, na Bibliotheca Teubneriana (Leipzig, 1870). Toda a informao que diz respeito aos manuscritos, encontrada nos Prefcios Latinos de Kayser. Agora tentaremos dar alguma idia da literatura geral sobre o assunto, para que o leitor possa ser capaz de perceber algumas das vrias oscilaes da guerra de opinies nas indicaes bibliogrficas. Se o leitor comum for impaciente e vido de chegar a algo de maior interesse, ele poder facilmente omitir sua consulta; enquanto que se for um amante do caminho mstico, e no tiver gosto pela controvrsia, poder ao menos simpatizar com o escritor, que foi compelido a repassar as obras do ltimo sculo e a dzia dos sculos precedentes, antes que pudesse aventurar uma opinio prpria com clara conscincia. Um preconceito sectarista contra Apolnio caracteriza quase toda a opinio antes do sculo XIX (para um sumrio geral da opinio antes de 1807, em escritores que mencionam Apolnio incidentalmente, vide Legrand dAussy, op. cit. pp. 313-327). Dos livros especialmente dedicados a Apolnio, os trabalhos do Abade Dupin (LHistoire dApollone de Tyane convaincue de Fausset et dImposture A Histria de Apolnio de Tana, cheia de Falsidade e Impostura, Paris, 1705) e de Tillemont (An Account of the Life of Apollonius Tyaneus Um

Relato da Vida de Apolnio de Tana, Londres, 1702; tr. do francs, do vol. ii da Histoire des Empereurs Histria dos Imperadores, de Lenain de Tillemont, 2 ed. Paris, 1720: qual so acrescentadas Some Observations upon Apollonius - Algumas Observaes sobre Apolnio. A viso de Tillemont que Apolnio foi enviado pelo Diabo para destruir a obra do Salvador) so cidos ataques ao Filsofo de Tana em defesa do monoplio Cristo dos milagres; enquanto que os do Abade Houtteville (A Critical and Historical Discourse upon the Method of the Principal Authors who wrote for and against Christianity from its Biginning Um Discurso Crtico e Histrico sobre os mtodos dos Principais Autores que escreveram pr e contra o Cristianismo desde seus Primrdios, Londres, 1739; tr. do francs do Abade Houtteville; ao qual acrescentada uma Dessertation on the Life of Apollonius Tyanaeus, with some Observations on the Platonists of the Latter School Dissertao sobre a Vida de Apolnio Tianeu, com algumas Observaes sobre os Platnicos da ltima Escola, pp. 213-254) e de Lderwald (Anti-Hierocles oder Jesus Christus und Apollonius von Tyana in ihren grossen Ungleichheit Contra Hirocles, ou Jesus Cristo e Apolnio de Tana em sua grande Desigualdade, editada por J.B.Lderwald; Halle, 1793) so menos violentos, ainda que nas mesmas linhas. Um escritor sob pseudnimo, entretanto, segue uma linha algo distinta, no sculo XVIII, ao emparelhar os milagres dos Jesutas e de outras Ordens Monsticas aos de Apolnio, considerando-os todos esprios e sustentando a autenticidade s dos de Jesus (Phileleutherius Helvetius, De Miraculis qu Pythagor, Apolloni Tyanensi, Francisco Asisio, Dominico, et Ignatio Lojol tribuuntur Libellus Libelo contra os Milagres atribudos a Pitgoras, Apolnio de Tana, Francisco de Assis, Domingos e Incio de Loyola, Draci, 1734). No obstante, Bacon e Voltaire falam de Apolnio nos mais altos termos (Vide Legrand dAussy, op. cit., p. 314, onde so dados os textos) e mesmo um sculo antes de Voltaire, o Desta ingls Charles Blount (The Two First Books of Philostratus concerning the Life of Apollonius Tyanaeus Os Dois Primeiros Livros de Filstrato a respeito da Vida de Apolnio de Tana, Londres, 1680, fol. As notas de Blount, geralmente atribudas a Lord Herbert, suscitaram tamanha grita que o livro foi condenado em 1693, e sobrevivem poucas cpias. As notas de Blount, entretanto, foram traduzidas para o francs um sculo mais tarde, nos dias do Enciclopedismo, e anexas a uma verso da Vita, sob o ttulo Vie dApollonius de Tyane par Philostrate avec les Commentaires donns en Anglois par Charles Blount sur les deux Premiers Livres de Cette Ouvrage A Vida de Apolnio de Tana, por Filstrato, com os Comentrios feitos em Ingls por Charles Blount sobre os Primeiros Livros desta Obra, Amsterdam, 1779; 4 vols., S, com uma irnica dedicatria ao Papa Clemente XIV, assinada Philaletes) ergueu sua voz contra o oprbrio universal lanado contra o carter do Tianeu; este trabalho, contudo, foi rapidamente suprimido. Em meio a esta guerra sobre milagres no sculo XVIII agradvel assinalar o curto tratado de Herzog, que tenta dar um esboo da vida filosfica e religiosa de Apolnio (Philosophiam Practicam Apollonii Tyanae in Sciagraphia Memento sobre a Filosofia Prtica de Apolnio de Tana, apresentado por M.Jo. Christian Herzog; Leipzig, 1709; uma preleo acadmica de 20 pp.) mas, pena, no houve seguidores de exemplo to liberal neste sculo de contendas.

O mesmo quanto literatura anterior sobre a matria. Falando francamente, nada digno de leitura; o problema no podia ser considerado calmamente neste perodo. Parte-se do falso terreno da controvrsia Hirocles-Eusbio, que foi apenas um incidente (pois a taumaturgia comum a todos os grandes instrutores e no exclusiva de Apolnio ou Jesus), e foi acirrado pelo surgimento do Enciclopedismo e do racionalismo do perodo Revolucionrio. No que a controvrsia sobre os milagres cessasse mesmo no sculo passado; contudo, no obscureceu mais o horizonte todo, e o sol de um julgamento tranqilo pode ser visto irrompendo por entre as nvoas. A fim de tornar o resto de nosso sumrio mais claro anexamos no fim deste ensaio os ttulos das obras que apareceram desde o incio do sculo XIX, em ordem cronolgica. Um relance nesta listagem mostrar que o ltimo sculo produziu uma inglesa (Berwick), uma italiana (Lancetti), uma francesa (Chassang), e duas alems (Jacob e Baltzer) (Filstrato um autor difcil de traduzir; no obstante, Chassang e Baltzer o conseguiram muito bem; Berwick tambm vale a pena, mas em sua maior parte nos d uma parfrase antes que uma traduo e amide se engana no sentido. Chassang e Baltzer so de longe as melhores tradues). A traduo do Rev. E. Berwick a nica verso inglesa; em seu Prefcio, o autor, enquanto proclama a falsidade do elemento milagroso na Vida, diz que o restante da obra merece ateno cuidadosa. Nenhum mal sobrevir religio Crist pela sua leitura, pois no h aluso vida de Cristo nele, e os milagres so baseados naqueles atribudos a Pitgoras. Certamente este um ponto de vista mais salutar do que o da controvrsia religiosa tradicional, a qual, infelizmente, reviveu sob a grande autoridade de Baur, que diz haver em alguns dos primeiros documentos da era Crist (notavelmente os Atos cannicos) escritos tendenciosos de apenas escasso contedo histrico, representando os destinos variveis das escolas e partidos e no as verdadeiras histrias dos indivduos. A Vida de Apolnio seria um destes escritos tendenciosos; seu objetivo teria sido apresentar uma viso oposta ao Cristianismo e a favor da filosofia. Baur, assim, divorcia todo o assunto de seu ponto de vista histrico e atribui a Filstrato um elaborado esquema do qual era inteiramente inocente. A viso de Baur foi largamente adotada por Zeller em sua Philosophie der Griechen (A Filosofia dos Gregos; v, 140), e por Rville, na Holanda. Esta teoria Crstica (levada por alguns extremistas ao ponto de negarem que Apolnio jamais tenha existido) esteve em grande voga entre escritores deste tema, especialmente os compiladores de artigos enciclopdicos; de qualquer modo esta uma posio mais tolerante do que a tradicional rinha milagreira, que novamente foi ressuscitada em toda sua antiga estreiteza por Newman, que s usa Apolnio como pretexto para uma dissertao sobre os milagres ortodoxos, aos quais devota dezoito das vinte e cinco pginas de seu tratado. Noack tambm acompanha Baur, e em alguma medida Pettersch, ainda que trabalhe o tema no terreno da filosofia; enquanto que Mckeberg, pastor de S. Nicolai em Hamburgo, ainda que tente ser justo com Apolnio, termina sua prolixa dissertao com uma erupo de louvores ortodoxos a Jesus, louvores

que de modo nenhum criticamos, mas que esto totalmente deslocados neste assunto. A evoluo da controvrsia taumatrgica de Apolnio-Jesus para a batalha Jesus-contra-Apolnio e mesmo Cristo-contra-Anticristo, contou com a participao de ardentes campees de um lado contra na melhor das hipteses fracos protestos de outro, um espetculo penoso de contemplar. Quo tristemente Jesus e Apolnio devem ter olhado, e ainda olham, para toda essa acidez e disputa intil sobre suas santas pessoas. Por que a posteridade deveria colocar suas memrias uma contra a outra? Opuseram-se eles durante suas vidas? O fizeram seus bigrafos depois de suas mortes? Por que ento a controvrsia no cessou com Eusbio? Pois Lactncio admite francamente o ponto levantado por Hirocles (para exemplificar que Hirocles somente se referiu a Apolnio como um exemplo entre muitos) que milagres no provam divindade. Baseamos nossos argumentos, diz Lactncio, no sobre milagres, mas no cumprimento da profecia (isto pelo menos devolveria Apolnio ao seu ambiente natural, e confinaria a questo da divindade de Jesus ao seu terreno Judeu-Cristo prprio). Tivesse esta postura mais sensvel sido retomada em vez da de Eusbio, quatro sculos atrs o problema de Apolnio teria sido considerado em seu ambiente histrico natural, e muita tinta e papel teriam sido poupados. Com o progresso do mtodo crtico, entretanto, a opinio finalmente em parte recobrou seu equilbrio, e bom podermos recorrer a obras que resgatam o assunto daquele obscurantismo teolgico e o devolvem ao campo aberto da pesquisa histrica e crtica. Os dois volumes do pensador independente Legrand dAussy, que apareceram bem no incio do sculo passado, so, para a poca, notavelmente livres de preconceito, e so uma tentativa de imparcialidade histrica digna de louvor, mas a crtica ainda era jovem naquele perodo. Kayser, ainda que no mergulhe completamente na matria, decide que o relato de Filstrato puramente uma fabularis narratio (narrao fabulosa - NT), mas encontra oposio consistente em I. Mller, que combate por um forte elemento de histria como pano de fundo. Mas de longe a melhor anlise das fontes a de Jessen (Sou incapaz de oferecer qualquer opinio sobre o livro de Nielsen, pela minha ignorncia do dinamarqus, mas mas ele tem todo o aspecto de um tratado cuidadoso e erudito, com abundncia de referncias). O estudo de Priaulx trata somente do episdio indiano e no tem valor crtico nenhum para a avaliao das fontes. De todos os estudos anteriores, contudo, os trabalhos de Chassang e Baltzer so os mais inteligentes no geral, pois ambos escritores conhecem as possibilidades da cincia psquica, ainda que em sua maior parte do ponto de vista precrio dos fenmenos espritas. Quanto ao algo pretensioso volume de Tredwell, que, sendo em ingls, acessvel ao grande pblico, largamente reacionrio, e usado como uma fachada para uma crtica adversa das origens do Cristianismo de um ponto de vista Secularista, que nega desde o comeo a possibilidade do milagre em qualquer acepo desta palavra. introduzida uma massa de dados numismticos e outros bem conhecidos, que so inteiramente irrelevantes, mas que parecem ser novos e surpreendentes para o autor, e dado um mapa

antes da pgina de ttulo, pretendendo indicar o itinerrio de Apolnio, mas que tem pouca relao com o texto de Filstrato. Na verdade, em parte alguma Tredwell demonstra que est trabalhando sobre o prprio texto, e o assunto, nas suas mos, somente uma desculpa para uma divagante dissertao sobre o sculo I sob o seu prprio ponto de vista. Tudo isso lamentvel, pois com a exceo da traduo de Berwick, que quase inencontrvel, no possumos nada de valor em ingls para o leitor comum (O Pagan Christ Cristo Pago de Rville uma completa deformao do assunto, e o tratamento de Newman sobre a matria transforma seu tratado em um anacronismo para o sculo XX), exceto o breve esboo de Sinnett, que descritivo antes que crtico ou explanatrio. o que temos, ento, a respeito da histria da opinio sobre Apolnio; agora passaremos ao Apolnio de Filstrato, e tentaremos se possvel descobrir alguns traos do homem histrico, e a natureza de sua vida e obra. VI. O BIGRAFO DE APOLNIO Flvio Filstrato, o escritor da nica Vida de Apolnio que chegou at ns (consistindo de oito livros escritos em grego sob o ttulo geral ), era um distinguido homem de letras que viveu no ltimo quartel do sculo II e na primeira metade do sculo III (c. 175 245 d.C.). Ele era um no crculo de escritores famosos e pensadores que se formou em torno da Imperatriz filsofa ( , vide o artigo Filstrato, no Dicionrio de Biografias Gregas e Latinas, de Smith; Londres, 1870; iii. 327 b.) Julia Domna, que foi o esprito dirigente do Imprio durante os reinados de seu marido Septmio Severo e seu filho Caracala. Todos os trs membros da famlia imperial eram estudantes da cincia oculta, e era eminentemente uma poca em que as artes ocultas, boas ou ms, eram uma paixo. Assim o ctico Gibbon, em seu esboo de Severo e sua famosa consorte, escreve: Como a maioria dos africanos, Severo era apaixonadamente dedicado aos vos estudos da magia e divinao, profundamente versado na interpretao dos sonhos e augrios, e perfeitamente conhecedor da cincia da astrologia judiciria, que em quase todas as eras exceto a presente, manteve seu domnio sobre a mente do homem. Ele perdeu sua primeira esposa enquanto era governador da Glia Lionesa. Procurando uma segunda, desejou ligar-se somente a alguma favorita da fortuna; e to logo descobriu que uma jovem dama de Emesa, na Sria, tinha um horscopo rgio [os itlicos so de Gibbon - NA], ele solicitou e obteve sua mo. Julia Domna [mais corretamente Domna Julia; Domna no sendo uma abreviao de Domina, mas sim o nome srio da Imperatriz - NA], (sendo este seu nome), mereceu tudo o que os astros poderiam lhe prometer. Ela possua, mesmo em idade avanada [morreu em 217 d.C. - NA], os encantos da beleza, unidos a uma imaginao brilhante, raramente concedida ao seu sexo. Suas cativantes qualidades nunca fizeram qualquer impresso profunda na sombria e ciumenta tmpera do marido [outros historiadores sustentam o contrrio - NA], mas no reinado de seu filho, ela administrou os principais negcios do Imprio com uma prudncia que avalizava a autoridade dele, e com uma moderao que s vezes corrigia as

selvagens extravagncias dele. Julia dedicou-se s letras e filosofia com algum sucesso, e com a mais esplndida reputao. Ela era a patrona de todas as artes, e a amiga de todos os homens de gnio (Gibbon, Decline and Fall.... Declnio e Queda do Imprio Romano, I, vi). Vemos assim, mesmo a partir da apreciao algo mordaz de Gibbon, que Domna Julia era uma mulher de carter notvel, cujos atos externos do evidncia de um propsito interior, e cuja vida privada no foi descrita. Foi a seu pedido que Filstrato escreveu a Vida de Apolnio, e foi ela quem o proveu da base de certos manuscritos que estavam em sua posse; pois a bela filha de Bassiano, sacerdote do Sol em Emesa, era uma ardorosa colecionadora de livros de todas as partes do mundo, especialmente de manuscritos de filsofos e de memorandos e notas biogrficas relacionadas aos estudantes famosos da natureza interna das coisas. Que Filstrato era o melhor homem a ser encarregado de to importante tarefa, no h dvida. verdade que ele era um habilidoso estilista e versado homem de letras, um crtico de arte e aficcionado antiqrio, como podemos ver por seus outros livros; mas ele era um sofista antes que um filsofo, e mesmo sendo um entusistico admirador de Pitgoras e sua escola, o era distncia, considerando-os mais atravs de uma adorvel e maravilhosa atmosfera de curiosidade e dos embelezamentos de uma imaginao vivaz do que de um conhecimento pessoal de sua disciplina, ou de um conhecimento prtico das foras ocultas da alma com que lidavam seus adeptos. Temos, portanto, que esperar um esboo da aparncia de uma coisa desde fora, antes que uma exposio da coisa em si desde dentro. Abaixo damos uma listagem das fontes de onde derivaram suas informaes a respeito de Apolnio (uso inteiramente as edies do texto de Kayser de 1846 e 1870): Coletei meu material em parte das cidades que o amaram, em parte dos templos cujos ritos e regras ele restaurou de seu antigo estado de negligncia, e em parte de suas prprias cartas [uma coleo destas cartas mas no de todas esteve em posse do Imperador Adriano (117 138 d.C.), e foi depositada em seu palcio de ncio (viii, 20). Isto prova a grande fama que Apolnio desfrutava logo depois de seu desaparecimento da histria, e enquanto sua memria ainda era viva. Deve ser notado que Adriano era um governante esclarecido, um grande viajante, um amante da religio, e um iniciado nos Mistrios de Elusis NA]. Informaes mais detalhadas eu procurei do seguinte modo. Damis foi um homem de alguma educao que antes costumava viver na antiga cidade de Ninus [Nnive NA]. Tornou-se um discpulo de Apolnio e registrou suas viagens, nas quais ele diz que tambm tomou parte, e tambm as concepes, ditos e predies de seu mestre. Um membro da famlia de Damis trouxe Imperatriz Julia seu livro de notas [ , tabuletas de escrever. Isto sugere que o relato de Damis no poderia ser muito volumoso, ainda que Filstrato mais adiante assegure sua natureza detalhada (i, 19) - NA] contendo estas memrias, que at ento no eram conhecidas. Como eu era um do crculo da princesa, que era uma amante e patrona de todas as produes literrias, ela me ordenou que reescrevesse

estes esboos e melhorasse sua forma de expresso, pois o ninivita expressou-se claramente, mas seu estilo estava longe de ser correto. Tambm tive acesso a um livro de Mximo de Egue [um dos secretrios imperiais da poca, famoso por sua eloqncia, e tutor de Apolnio - NA], que continha todos os feitos de Apolnio em Egue [uma cidade no longe de Tarso NA]. Tambm h um testamento escrito por Apolnio, onde podemos conhecer como ele quase desdenha a filosofia . O termo ocorre s nesta passagem, e no estou bem seguro de seu significado NA]. Quanto aos quatro livros de Mergenes [esta Vida, de Mergenes, casualmente mencionada por Orgenes, Contra Celsum, vi, 41; ed. Lommatzsch; Berlin, 1841; ii, 373 NA] sobre Apolnio, no merecem ateno, pois ele no sabe nada sobre a maioria dos fatos de sua vida (i, 2,3). A estas fontes que Filstrato deve sua informao, fontes que infelizmente j no existem, exceto talvez umas poucas cartas. Tampouco Filstrato poupou quaisquer esforos para reunir mais informaes sobre o assunto, pois em suas palavras finais (viii, 31), ele nos conta que ele prprio viajou para muitas partes do mundo e em toda parte deparou-se com os ditos inspirados ( ) de Apolnio, e que ele conhecia especialmente bem o templo dedicado memria de nosso filsofo de Tana e fundado s expensas imperiais (pois os imperadores no o julgaram indigno de honras semelhantes s devidas a eles mesmos), cujos sacerdotes, presume-se, tinham reunido toda informao que podiam a respeito de Apolnio. Uma anlise inteiramente crtica do esforo de Filstrato, portanto, deve levar em conta todos estes fatores, e tentar assignar todas as declaraes s suas fontes originais. Mas mesmo ento a tarefa do historiador seria incompleta, pois transparentemente bvio que Filstrato embelezou consideravelmente a narrativa com numerosas notas e acrscimos prprios e com a composio de dilogos. J que os antigos escritores no separavam suas notas do texto, ou destacavam-nas de um modo ntido, temos de estar constantemente em guarda para distinguir as fontes originais das glosas do escritor (raramente temos uma indicao to clara como, por exemplo, em i, 25: O que segue o que eu fui capaz de saber... sobre a Babilnia.). De fato Filstrato est sempre tirando partido da meno de um nome ou tema para demonstrar seu prprio conhecimento, o qual freqentemente de uma natureza altamente legendria e fantstica. Especialmente este o caso na descrio das viagens de Apolnio ndia. Naquela poca e por muito tempo depois a ndia era considerada o fim do mundo, e uma infinidade das mais estranhas histrias de viajantes e fbulas mitolgicas estavam em circulao a seu respeito. S temos que ler os relatos dos escritores sobre a ndia (vide E.A.Schwanbeck, Megasthenis Indica A ndia, por Megstenes; Bonn, 1846; e J.W.McCrindle, Ancient India as described by Megsthenes e Arrian A ndia descrita por Megstenes e Arriano, Calcut, Bombaim, Londres, 1877; The Commerce and Navigation of the Erythraean Sea O Comrcio e Navegao do Mar Eritreu, 1879; Ancient India as described by Ktesias A ndia descrita por Ktsias, 1882; Ancient India as described by Ptolemy A ndia descrita por Ptolomeu, Londres, 1885; e The Invasion of India by Alexander the Great A Invaso da

ndia por Alexandre o Grande, Londres, 1893, 1896) do tempo de Alexandre em diante para descobrirmos a fonte dos mais estranhos incidentes que Filstrato registra como experincias de Apolnio. Para tomarmos apenas um exemplo dentre centenas, Apolnio tinha de cruzar o Cucaso, um nome genrico para o grande sistema de montanhas que guardam o limite norte de ryvarta. Prometeu foi acorrentado ao Cucaso, como todas as crianas tm aprendido durante sculos. Portanto, se Apolnio cruzou o Cucaso, deve ter visto aquelas correntes. E assim foi, conforme nos assegura Filstrato (ii,3). No s isso, mas ele livremente acrescenta a informao de que ningum poderia dizer de que material elas eram feitas! Uma consulta a Megstenes, contudo, logo reduz a longa narrativa de Filstrato sobre as viagens indianas de Apolnio (i, 41 iii, 58) para um mbito bem mais estreito, pois pgina aps pgina pura inveno, retirada das numerosas histrias indianas s quais nosso ilustrado escritor tinha acesso (um outro bom exemplo encontrado na discusso sobre os elefantes que Filstrato toma da Histria da Lbia, de Juba, ii, 13 e 16). A julgar por estes escritores, Poro (talvez um ttulo, ou o Rei de Purus), o raj vencido por Alexandre, era o legendrio rei da ndia. De fato, falando sobre a ndia ou qualquer outro pas pouco conhecido, um escritor de ento tinha de nutrir-se de todas estas lendas associadas ou teria pouca chance de se fazer ouvir. Tinha de dar sua narrativa uma cor local, e este foi o caso especialmente em um esforo retrico como o de Filstrato. Alm disso, era moda inserir dilogos e coloc-los na boca de personagens bem conhecidos em ocasies histricas, e bons exemplos disto podem ser vistos em Tucdides e no Ato dos Apstolos. Filstrato faz isso repetidamente. Mas nos alongaramos demais se entrssemos em uma investigao detalhada do assunto, ainda que o escritor tenha preparado notas sobre todos estes pontos, pois isso daria um volume inteiro e no um esboo. S poucos pontos so dados doravante, para alertar o estudante para que esteja sempre atento e separe Filstrato de suas fontes (no que Filstrato de algum modo dissimule seus embelezamentos; vide, por exemplo, ii, 17, onde ele diz: Deixe-me, porm, contar o que eu tenho a dizer sobre o assunto das serpentes, da maneira de ca-las que descrita por Damis). Mas ainda que devamos estar agudamente atentos para a importncia de uma atitude inteiramente crtica onde fatos histricos definidos esto envolvidos, deveramos estar em guarda da mesma maneira contra o julgamento de tudo a partir do ponto de vista dos preconceitos modernos. H somente uma literatura da antigidade que foi tratada sempre com real simpatia no ocidente, e a Judeu-Crist; s nela as pessoas foram treinadas para se sentirem vontade, e tudo na antigidade que trata da religio de um modo diverso do Judeu ou do Cristo, sentido como estranho, e, se obscuro ou extraordinrio, como repulsivo. Os ditos e feitos dos profetas Judeus, ou de Jesus, e dos Apstolos, so relatados com reverncia, embelezados com as maiores formosuras de fraseado, e iluminados com o melhor pensamento da poca; enquanto que os ditos e feitos de outros profetas e instrutores tm sido em sua maior parte sujeitos crtica mais antiptica, na qual no feita nenhuma tentativa de entender seus pontos de vista. Tivesse um julgamento benevolente sido concedido em toda a volta, o mundo hoje seria muito mais rico em

entendimento, em liberalidade de mente, em compreenso da natureza, da humanidade e de Deus, em resumo, em experincia da alma. Portanto, ao lermos a Vida de Apolnio, lembremos que devemos encar-la com os olhos de um Grego, e no com os de um Judeu ou um Protestante. O Mltiplo em sua prpria esfera deve ser para ns uma manifestao to autntica do Divino como o Um ou o Todo, pois de fato os Deuses existem a despeito da lei e do credo. Os Santos e Mrtires e Anjos aparentemente tm tomado o lugar dos Heris e Daimons e Deuses, mas a mudana de nome e de ponto de vista entre os homens afeta muito pouco os fatos imutveis. Sentir os fatos da religio universal debaixo dos nomes sempre em mudana que os homens lhes atribuem, e ento penetrar plenamente simpticos e compreensivos nas esperanas e temores de cada fase da mentalidade religiosa ler, talvez, as vidas passadas de nossas prprias almas, uma tarefa das mais difceis. Mas at que consigamos nos colocar compreensivamente no lugar de outros, jamais veremos mais que um lado da Infinita Vida de Deus. Um estudante de religio comparada no deve temer os nomes; ele no deve se intimidar quando depara-se com o politesmo, ou horrorizar-se quando encontra o dualismo, ou sentir uma satisfao maior quando chega no monotesmo; ele no deve assombrar-se quando pronuncia o nome de Jav e desprezar o nome de Zeus; no deve imaginar um stiro quando l a palavra daimon, ou figurar um sonho alado de beleza quando pronunciar a palavra anjo. Para ele a heresia e a ortodoxia no devem existir; ele v apenas sua prpria alma lentamente elaborando sua prpria experincia, olhando para a vida de todos os ngulos possveis, de modo que eventualmente enfim ela possa ver o todo, e tendo visto o todo, possa unificarse a Deus. Para Apolnio a mera forma da f de um homem no era o essencial; ele estava em casa em todas as terras, entre todos os cultos. Tinha uma palavra de auxlio para todos, e um conhecimento ntimo do caminho particular de cada um, o que lhe possibilitava devolv-los sade. Tais homens so raros; os registros de tais homens, preciosos, e no requerem nenhum embelezamento retrico. Tentemos ento, primeiramente, recuperar o perfil da primeira vida exterior e das viagens de Apolnio, livre dos embelezamentos de Filstrato, e ento tentemos considerar a natureza de sua misso, a feio da filosofia que ele tanto amava e que para ele era sua religio, e enfim, se possvel, o modo de sua vida interior. VII. PRIMEIROS ANOS Apolnio nasceu em Tana (lendas das maravilhas que ocorreram no seu nascimento estavam em circulao, e tm a mesma natureza de todas as lendas de nascimento de grandes personagens), uma cidade no sul da Capadcia, em algum momento dos primeiros anos da era Crist, Seus pais eram de antiga linhagem e considervel fortuna (i, 4). Numa idade precoce deu sinais de memria prodigiosa e disposio estudiosa, e era notvel por sua beleza. Com a idade de 14 anos foi enviado a Tarso, um afamado centro de

estudos daquele tempo, para completar sua instruo. Mas mera retrica e estilo e a vida das escolas eram pouco afins ao seu esprito srio, e ele logo passou a Egue, uma cidade no litoral a leste de Tarso. L encontrou um ambiente mais adequado s suas necessidades, e mergulhou com ardor no estudo da filosofia. Tornou-se ntimo de sacerdotes do templo de Esculpio, onde curas ainda eram realizadas, e desfrutou da sociedade e instruo de discpulos e instrutores das escolas de filosofia Platnica, Estica, Peripattica e Epicurista; mas mesmo tendo estudado estes sistemas de pensamento com ateno, foram as lies da escola Pitagrica que ele absorveu com uma extrordinria profundeza de compreenso ( ), mesmo que seu professor, Euxeno, fosse apenas um repetidor das doutrinas e no um praticante da disciplina. Mas tal repetio no era o suficiente para o esprito vido de Apolnio; sua memria extraordinria, que infundiu vida nas secas lies de seu tutor, levaram-no adiante, e com dezesseis anos ele elevou-se vida Pitagrica, levantado por algum Grande (Sci., seu tutor ento; isto , a memria dentro dele, ou seu daimon). No obstante ele reteve sua afeio pelo homem que lhe mostrara o caminho, e recompensou-o generosamente (i, 7). Quando Euxeno perguntou-lhe como ele iniciaria seu novo modo de vida ele respondeu: Como o doutor purga seus pacientes. Da em diante ele recusou tocar qualquer coisa que tivesse tido vida animal, considerando que isso densifica a mente e a torna impura. Ele considerava que a nica forma de alimentao pura era a produzida pela terra: frutas e vegetais. Tambm se abstinha do vinho, pois mesmo sendo feito de frutas, tornava o ter trbido [presumivelmente a substncia mental NA] na alma, e destrua a compostura da mente. Mais ainda, andava descalo, deixou seu cabelo crescer livremente, e vestia-se somente com tecidos de linho. Agora vivia no templo, para a admirao dos sacerdotes e com a aprovao expressa de Esculpio (isto , presumivelmente ele foi encorajado em seus esforos por aqueles auxiliares invisveis do templo atravs de quem as curas eram indicadas atravs de sonhos, e ajuda era dada de modo psquico e mesmrico) e rapidamente se tornou to famoso por seu ascetismo e vida pia, que uma frase dos cilcios sobre ele (Para onde esto correndo? Apressam-se para ver o jovem?) se tornou um provrbio (i, 8). Com a idade de vinte anos seu pai morreu (sua me havia morrido alguns anos antes), deixando considervel fortuna, que Apolnio dividiria com seu irmo mais velho, um jovem selvagem e dissoluto de 23 anos. Sendo ainda menor, Apolnio continuou a morar em Egue, onde o templo de Esculpio havia se tornado um movimentado centro de estudos, e reverberava de um extremo a outro ao som dos elevados discursos filosficos. Chegando maioridade, voltou a Tana para tentar salvar seu irmo de sua vida viciosa. Seu irmo aparentemente j havia dissipado sua parte da herana, e Apolnio imediatamente deu metade de sua prpria parte para ele, e atravs de seus conselhos gentis devolveu-o humanidade. De fato parece ter devotado este tempo para colocar em ordem os assuntos da famlia, pois ento distribuiu o restante de seu patrimnio entre alguns parentes, mantendo para si apenas uma mnima parte; precisava de pouco, dizia, e jamais casaria (i, 13).

Ento fez um voto de silncio por cinco anos, pois determinou-se que no escreveria sobre filosofia antes de ter passado por toda sua disciplina. Estes cinco anos foram passados na Panflia e na Cilcia, e ainda que passasse muito tempo em estudo, no emparedou-se numa comunidade ou mosteiro, mas manteve-se em movimento nas proximidades e viajava de cidade em cidade. As tentaes de quebrar seu voto auto-imposto foram enormes. Sua estranha aparncia chamava a ateno de todos, e o populacho amante do chiste fez o silencioso filsofo o alvo de sua verve inescrupulosa, e toda a proteo que tinha contra suas insolncias e mal-entendidos era a dignidade de seu semblante e o olhar de seus olhos que agora podiam ver o passado e o futuro. Muitas vezes esteve a ponto de imprecar contra algum excepcional insulto ou falatrio mentiroso, mas sempre se conteve com as palavras: Corao, s paciente, e tu, lngua, fica quieta (compare com a Odissia, xx, 18) (i, 14). Mesmo esta frrea represso da fala comum no o impedia de fazer o bem. J nesta idade juvenil ele havia comeado a corrigir abusos. Com olhos e mos e movimentos da cabea, fazia-se entender, e em uma ocasio, em Aspendo, na Panflia, evitou um grave furto de gros silenciando a turba com seus gestos imperiosos e ento escrevendo o que queria dizer sobre uma tabuleta (i, 15). At aqui, aparentemente, Filstrato depende do relato de Mximo de Egue, ou talvez s at a poca em que Apolnio deixou Egue. Agora h uma lacuna considervel na narrativa, e tudo o que Filstrato pde produzir foram dois breves captulos de vagas generalidades (i, 16, 17) sobre cerca de 15 ou 20 anos (sou inclinado a pensar, contudo, que Apolnio ainda era um homem jovem quando iniciou sua viagem ndia, em vez de ter j 46 anos, como alguns supem. Mas as dificuldades da maior parte da cronologia so insuperveis), at que comeam as notas de Damis. Depois dos cinco anos de silncio, encontramos Apolnio em Antiquia, mas isto parece ter sido apenas um incidente em uma longa srie de viagens e trabalho, e provvel que Filstrato saliente Antiquia meramente porque o pouco que sabia sobre este perodo da vida de Apolnio havia conseguido nesta movimentada cidade. Mesmo do prprio Filstrato sabemos incidentalmente mais adiante (i, 20; iv, 38) que Apolnio havia passado algum tempo entre os rabes, e havia sido instrudo por eles. E por Arbia entendemos o sul da Palestina, que nesta poca acolhia numerosas comunidades msticas. Os locais que visitou eram fora das rotas, onde reinava o esprito da solitude, e no as populosas e agitadas cidades, pois o tema de sua conversao, dizia, requeria homens, e no povo ( ). Ele passou o tempo viajando de um a outro destes templos, santurios e comunidades; de onde podemos concluir que havia entre eles algo semelhante a um tipo de maonaria comum, da natureza de uma iniciao, que franqueava-lhe as portas de sua hospitalidade. Mas onde quer que fosse, sempre observava uma diviso regular do dia. Ao nascer do sol praticava certos exerccios religiosos sozinho, cuja natureza ele s transmitia a quem passasse a disciplina dos quatro anos (cinco anos?) de silncio. Ento palestrava com os sacerdotes do templo ou os lderes das comunidades, conforme estava em um templo grego ou no-grego com ritos

pblicos, ou em uma comunidade com uma disciplina peculiar parte do culto pblico (). Ento tentava trazer os cultos pblicos de volta pureza de suas tradies antigas, e sugerir melhoramentos nas prticas das irmandades privadas. A parte mais importante de seu trabalho era com aqueles que estavam seguindo a vida interna, e que j olhavam Apolnio como um instrutor do caminho oculto. A estes camaradas () e discpulos (), devotava muita ateno, estando sempre pronto para responder suas perguntas e dar conselhos e instruo. No que nisso negligenciasse o povo; era seu costume invarivel ensin-lo; pois os que viviam a vida interior ( ), ele dizia, deveriam ao raiar do dia entrar na presena dos Deuses (isto , presumivelmente, passar algum tempo em meditao silenciosa), e ento passar o tempo at o meio-dia dando e recebendo instruo nas coisas santas, e s depois devotar-se aos afazeres humanos. Isto , a manh era devotada por Apolnio cincia divina, e a tarde, instruo em tica e na vida prtica. Depois do trabalho do dia ele se banhava em gua fria, como faziam tantos msticos da poca naquelas terras, notavelmente os Essnios e os Terapeutas (i, 16). Depois destas coisas, diz Filstrato, to vagamente como o escritor de uma narrativa evanglica, Apolnio determinou-se a visitar os Brachmanes e Sarmanes (isto , os Brmanes e Budistas. sarman a corruptela grega do snscrito shramana e do pli samano, o termo tcnico para um asceta ou monge Budista. A ignorncia dos copistas mudou sarmanes primeiro para germanes e depois para hircanianos!). O que induziu nosso filsofo a fazer to longa e perigosa jornada no esclarecido por Filstrato, que diz simplesmente que Apolnio imaginou ser uma boa coisa para um jovem viajar (isto mostra que Apolnio ainda era jovem, e no entre 40 e 50, como alguns tm afirmado. Tredwell, p. 70, data as viagens indianas em 41-54 d.C.). mais que evidente, contudo, que Apolnio jamais viajou meramente por amor da viagem. O que ele faz, faz com um propsito especfico. E seus guias nesta ocasio, como assevera a seus discpulos que tentavam dissuad-lo de seu projeto e recusaram acompanh-lo, foram a sabedoria e seu orientador interno (daimon). J que sois fracos de corao, diz o peregrino solitrio, dou-vos meu adeus. Pois eu mesmo devo ir onde quer que a sabedoria e meu eu interior me levarem. Os Deuses so meus conselheiros e no posso fiar-me seno em suas direes (i, 18). VIII. AS VIAGENS DE APOLNIO E assim Apolnio parte de Antiquia e viaja para Ninus, relquia da uma vez grande Nina ou Nnive. L encontra com Damis, que se torna seu companheiro constante e fiel discpulo. Vamos juntos, diz Damis em palavras que nos lembram algo das de Rute, tu seguindo Deus e eu a ti! (i, 19) Deste ponto em diante Filstrato declara basear-se em grande medida na narrativa de Damis, e antes de prosseguirmos, necessrio tentarmos formar uma imagem do carter de Damis, e descobrir at que ponto ele foi admitido na verdadeira confiana de Apolnio.

Damis era um entusiasta que amava Apolnio com um afeto apaixonado. Ele via em seu mestre um ser quase divino, possuidor de poderes maravilhosos que continuamente o assombravam, mas