arte como lugar de memoria. alecsandra matias de oliveira
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7/22/2019 ARTE COMO LUGAR de MEMORIA. Alecsandra Matias de Oliveira
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ARTE COMO LUGAR DA MEMÓRIA
ART AS A PLACE OF MEMORY
Alecsandra Matias de Oliveira1
RESUMO: O presente estudo aborda as relações existentes entre a memória e a arte,registradas através de monumentos arquitetônicos na cidade de São Paulo, especialmente, noâmbito da arte contemporânea !lege como instrumental de pesquisa a "istória da arte e seusdesdobramentos estéticos
PALARAS!C"AES: contemporaneidade# "istória# memória# arte
A#STRACT: $"is stud% deals &it" t"e relations bet&een memor% and art, especiall% t"econtemporar% art seen in arc"itectural monuments in t"e cit% o' São Paulo (it" t"is aim, t"eart "istor% and its aest"etic developments are used as a tool 'or t"e researc"$EY %ORDS: contemporar%, "istor%, memor%, art
I&TRODU'(O
O processo da memória no "omem 'a) intervir não só aordenação de vest*gios, mas também a releitura desses vest*gios+P-. /012!-3, 4! 2O55, 67789
Os grupos sociais, antes da escrita, partil"am suas experi:ncias, transmitindo
con"ecimento oralmente, de geração para geração, sob a 'orma de mitos, lendas e narrativas
contadas ou cantadas O saber é guardado somente na mente "umana +$O;<, =>>69 té o
advento da escrita, a memória poderia extirpar?se com a morte do indiv*duo nova 'orma de
registro provoca uma revolução no que tange ao con"ecimento "umano porque altera a ação
da memória sobre os indiv*duos partir da escrita, o "omem pode perpetuar experi:ncias $orna?se 'act*vel 'alar aos outros mesmo após a morte '*sica +S@A-!@B, =>>C9
1.outorado em rtes Disuais pela !scola de /omunicações e rtes da -niversidade de São Paulo e!specialista em /ooperação e !xtensão -niversitEria no ;useu de rte /ontemporânea da -SP e?mailF alemaoliGuspbr
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O registro escrito rompe a barreira '*sica, propiciando a conservação de 'ragmentos do
con"ecimento de um modo externo ao corpo escrita torna?se uma 'orma de trans'ormação
da memória do grupo H permanece aquela que consegue transpor a 'ronteira do tempo, ou
seIa, a que estE registrada O registro mnemônico permite o seu desenvolvimento em dois tipos
de materiaisF o documento escrito +escol"a do "istoriador9 e a celebração através de um
monumento comemorativo +"erança do passado9 Documentum deriva de docere, “ ensinarJ, com
o tempo, o termo evolui para KprovaJ e é costumeiramente utili)ado no vocabulErio legislativo
+4! 2O55, 677L9 Monumentum remete M rai) indo?européia men que exprime uma das 'unções
essenciais do esp*rito + mens 9, a memória + memini 9 O verbo monere signi'ica K'a)er recordarJ,KavisarJ, KiluminarJ, KinstruirJ O monumentum é um sinal do passado H tudo aquilo que pode
evocar o passado e perpetuar a recordação +4! 2O55, 677L9
Auanto ao documento escrito H papiro, pergamin"o, papel e, depois outros apoios
eletrônicos e digitais H evolui na e'ici:ncia com relação ao arma)enar in'ormações O
con"ecimento, assim, adquire nova dimensão com a escrita e com as posteriores 'ormas de
prolongamento da memória !sses novos suportes elevam, em muito, as potencialidades da
memória estendida +S@A-!@B, =>>C9 @ndependentemente do 'ormato, o documento escritoapresenta duas signi'icativas 'unçõesF =N9 arma)ena in'ormações, que permitem comunicar
através do tempo e do espaço, 'ornecendo meios para a marcação, a memori)ação e o registro
e 6N9 assegura a passagem da es'era auditiva M visual, permitindo reexaminar, reordenar,
reti'icar 'rases e até palavras isoladas +4! 2O55, 677L9
E os monumentos comemorativos são mltiplos em diversas partes do mundo O
monumento pode con'igurar?se como obra comemorativa de arquitetura ou escultura +arco do
triun'o, coluna, tro'éu e pórtico9 ou, ainda, de carEter 'unerErio destinado a conservar a
memória de uma pessoa no dom*nio da morte +pirâmides, tmulos e mausoléus9 1o Oriente
antigo, por exemplo, os obeliscos e as estelas desempen"am papel especial na perpetuação dos
grandes triun'os, através de representações 'iguradas acompan"adas por inscrições que
permitem transmitir Ms gerações 'uturas aquelas vitórias Para 4e 2o'', esses monumentos são
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Kverdadeiros arquivos de pedraJ que acumulam, além da 'unção de arquivo propriamente dito,
a de Kpeças publicitEriasJ duradouras +4! 2O55, 677L9
1esses monumentos, a marca principal é o es'orço em manter a comemoração e a
lembrança por intermédio de imagens e inscrições que, geralmente, encerram uma narrativa
dos eventos gloriosos 1a transição entre a oralidade e o registro escrito +através de
monumentos ou documentos9 ocorre a Kdomesticação do pensamento selvagemJ +4! 2O55,
677L9 O registro da memória permite o partil"ar de narrativas caras M sociedade que o
constitui través dos registros, os indiv*duos normati)am o conv*vio social e, de certo modo,
perpetuam a tradição memória registrada é uma exig:ncia coletiva nas sociedades "istóricas
1ão nasce da individualidade Para 5riedric" 1iet)sc"e, a memória não é, de 'orma alguma,
um atributo individual, mas um produto das pressões e viol:ncias sociais Para que o "omem
possa 'orIar uma memória são necessErios requintes de crueldades para que a Knature)aJ
impulsiva, espontânea do ser "umano gere um corpus de lembranças, que o levam a prever e a
calcular os acontecimentos +1@!$</0!, =>>Q9
Para o 'ilóso'o, toda memória é uma construção social !m Iogo constante com o
esquecimento +instinto espontâneo do ser "umano9, a memória condiciona a viv:ncia emgrupo de modo con'iEvel e previs*vel 5orça o "omem a responder por si, comprometer?se
com seus atos, controlar seus a'etos, imbuir promessas, inibindo sua capacidade salutar do
esquecimento /omo condição para viver em grupo e por ele ser protegido, o "omem
desenvolve a memória para que, dessa 'orma, se torne con'iEvel e comprometido com os
interesses da coletividade 1esse sentido, 1iet)sc"e torna?se um dos percussores da temEtica
contemporânea da memória social
!m princ*pios do século 33, o sociólogo ;aurice 0alba&ac"s promove umimportante avanço nas re'lexões sobre o tema, quando elabora o conceito de memória coletiva,
segundo o teórico Ko passado permanece vivo em um determinado grupo social
/ontrapondo?se a ela, a memória "istórica é uma 'orma de con"ecimento do passado, sem
relação com a viv:ncia do indiv*duoJ +04R(/0S, =>>79 o executar cuidadosamente as
recordações coletivas, o indiv*duo as ordena de acordo com suas próprias percepções que,
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contudo, também estão in'luenciadas pelos valores do grupo a que pertence ssim sendo, a
memória pode ser entendida como reconstrução do passado
!m ci:ncias sociais, a memória e o seu registro, então, atribuem signi'icado Ms idéias,
valores e normas de conviv:ncia !m algumas dessas investigações, a memória é tomada como
Kcomportamento narrativoJ que primordialmente se caracteri)a por sua 'unção social H isto
porque se trata de comunicação a outrem de uma in'ormação, estabelecendo o elo memória?
linguagem
.eve?se atentar para o 'ato de que a memória vive em permanente tensão entre a
aus:ncia e a presençaF presença do presente que se lembra do passado esvanecido, mas
também presença do passado que irrompe o presente +;-., =>>C9 @sto é, a memória
pertence ao presente e este se utili)a dela para, em seguida, 'a)er proIetos para o 'uturo 1as
palavras de Pierre 1oraF Ksem dvida, para que "aIa um sentimento do passado é necessErio
que apareça um antesT e um depoisT para que o presente surIa recondu)ido e atuali)adoJ
$alve), a reconstrução temporal dos monumentos adven"a do conceito de KrastroJ H
tão utili)ado em re'lexões sobre a memória "istória?registro, por muitos anos, considera que
um es'orço de lembrança +através, por exemplo, de um documento ou monumento9 poderia
ressuscitar o passado, trans'ormando o presente em uma KamElgamaJ H uma reconstrução e
uma releitura do que passa, a partir da inserção do indiv*duo na coletividade e em momentos
presentes sucessivos Por essa ra)ão, se dE a insistente interpretação sobre os Kvest*giosJ de
obIetos e lembranças de realidades vivenciadas s KpistasJ e K*ndicesJ provenientes de
imagens verbais e não?verbais, especialmente as registradas, permitem, pelos 'ragmentos, uma
busca lógica e elucidativa em determinado tempo e espaço
Bastros, vest*gios, pistas e *ndices são termos sinônimos que autori)am, por umtrabal"o de indução permeado pela intuição e pela imaginação, concluir a exist:ncia de
acontecimentos que se encontram obscurecidos, porém, relacionados a circunstâncias
con"ecidas O obscurecimento das lembranças estE intimamente vinculado M memória, ou seIa,
o ser "umano estE naturalmente suIeito M lei do esquecimento e vive com este em eterna luta,
pois necessita combat:?lo e, simultaneamente, contar com ele .ocumentos e monumentos
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são instrumentos de luta contra o esquecimento, porque introIetam um signi'icado simbólico
intimamente ligado M evocação de memórias Porém, os documentos e monumentos
privilegiam certas memórias em detrimento de outras, ou seIa, constituem o Iogo memória
versus esquecimento
1esse processo, o ato mnemônico, enquanto comportamento narrativo, permeado
pelas tecnologias, atribui Ms lembranças con'igurações maqu*nicas que, em ltima instância,
manipulam a memória coletiva ssinala?se, nesse ponto, que uma das grandes problemEticas
da contemporaneidade reside no acmulo de memória e seu conseqUente esquecimento
atual Kcultura da memóriaJ parece so'rer de amnésia, devido ao acesso maqu*nico +da imprensa
M televisão, passando por /.?roms e internet9 que gera uma K'alta de vontade de lembrarJ que,
por sua ve), acarreta perda da consci:ncia "istórica +0-VSS!1, 67779 Outro dado
signi'icativo contemporâneo reside no grande nmero de memórias comerciali)adas em massa
que são rapidamente consumidas e, por essa ra)ão, são de mais 'Ecil esquecimento H 'ato não
tão comum M memória vivida
W percept*vel, então, que a memória também depende de mecanismos de seleção e
descarte, sendo vista como um sistema de esquecimento programado O esquecimento énecessErio para a sociedade e para o indiv*duo Sem o esquecimento a memória "umana é
imposs*vel Segundo ;arc ugéF KW preciso saber esquecer para saborear o gosto do presente,
do instante e da espera, mas a própria memória necessita do esquecimentoF é preciso esquecer
o passado recente para recobrar o passado remotoJ +-2W, =>>Q9
relação tempo e memória surge como ponto relevante na questão do esquecimento
O tempo apaga os rastros ou os trans'orma leitura de um documento ou monumento
depende de sua relação com o presente O presente é a re'er:ncia para as lembranças ouesquecimentos H o painel segue essa orientação O momento de sua con'ecção, as
comemorações dos 8X7 anos da cidade de São Paulo, deve ser considerado em sua seleção de
memórias e esquecimentos Segundo ugé, Ko esquecimento devolve o presente e se conIuga
em todos os temposF no 'uturo para viver o in*cio# no presente, para viver o instante e no
passado, para viver o retornoJ @mposs*vel lembrar sem esquecer Para lembrar determinados
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'atos é preciso esquecer outros H tal como a metE'ora do Iardineiro que poda as plantas para
que 'loresçam com mais 'orça /omo assinala, ainda, ugéF K5a)er o elogio do esquecimento
não é vilipendiar a memória, e ainda menos ignorar a recordação, mas recon"ecer o trabal"o
do esquecimento na primeira e assinalar sua presença na segundaJ +-2W, =>>Q9
4e 2o'', sobre a amnésia, pondera que esta não é uma perturbação somente do
indiv*duo, mas também a 'alta ou a perda, voluntEria ou involuntEria, da memória coletiva
Kpode determinar perturbações graves da identidade coletivaJ Para o "istoriadorF K$ornarem?
se sen"ores da memória e do esquecimento é uma das grandes preocupações das classes, dos
grupos, dos indiv*duos que dominam as sociedades "istóricas Os esquecimentos e os sil:ncios
da "istória são reveladores desses mecanismos de manipulação da memória coletivaJ +4!
2O55, 677L9
s permanentes trans'ormações que ocorrem, paulatinamente, até o in*cio de século
33, no plano da memória versus esquecimento aceleram?se ainda mais a partir das metE'oras
que envolvem a biologia e a in'ormEtica !ssas duas metE'oras alteram a concepção de registro
Auando se pensa que o registro dessa memória estE internamente +no código genético9 ou
ainda mltiplo em ligações de redes computacionais, "E uma 'lexibilidade no paradigmamemória versus esquecimento
.os parâmetros 'isio?bioqu*micos, passando pela biologia e in'ormEtica, Ms implicações
sociais que decorrem do conceito e do registro da Kmemória,J surgem questões bastante
complexas que permitem ao pesquisador somente uma rEpida pontuação H mesmo assim, este
pode perder?se M complexidade do tema 0E algum tempo, "istoriadores, literatos, cientistas,
'ilóso'os, psicólogos e outros estudiosos t:m se dedicado M apreensão da memória?'aculdade
intelectual e memória?con"ecimento
O labirinto das especialidades disciplinares poderestringir a concepção dos 'enômenos mnemônicos e banali)ar o signi'icado de suas
aplicações Pesquisadores, cada ve) mais, es'orçam?se para dar conta desse conceito
multidisciplinar e interdisciplinar de modo mais pro'undo, explicitando poss*veis relações
inerentes ao tema
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São diversas as memórias e mais variados ainda seus atributosF memória?testemun"o#
memória que transita pelo KapagamentoJ de outras memórias# memória?advert:ncia# memória?
rememória e, memória?comemoração !ssas memórias dependem do apa)iguamento de outras
na a'irmação impositiva da interpretação un*voca de acontecimentos e orientações pol*ticas
con'lituosas que, por ve)es se impõem na 'orma de documentos ou de monumentos
arquitetônicos Os documentos eYou monumentos são basilares para a perman:ncia da
rememoração !sse é o limiar da memória porque não é certo que essa reconstitui o passado H
somente a pesquisa "istórica pode apro'undar?se nessas questões
/onsidera?se, então, que a "istória se 'a) a partir de memórias e de esquecimentos, do
mesmo modo que a produção art*stica se consolida ou se dissolve por esses elementos Os
repertórios, temas, linguagens, estilos e técnicas são recordações ou impressões que
permanecem como o registro e o a'eto de obIetos exteriores em reação aos sentidos "umanos
1o estudo espec*'ico sobre os traços da memória na arte, os aspectos interdisciplinares
precisam de maior aplicação, pois a própria nature)a da arte exige essa quali'icação da pesquisa
;onumentos e documentos são os registros que perpetuam a memória Os registros art*sticos
mostram?se como di'erenciais nessa busca em reconstituir o passado Os monumentosart*sticos encontram?se carregados de "istoricidade e, principalmente, tra)em uma Eurea
simbólica 'orte, capa) de unir a comunidade que os cercam 1esse sentido, a re'lexão
direcionada a partir das relações da memória e da "istória torna?se um importante subs*dio, na
tare'a de elucidar algumas questões relativas M interação entre arte e memória
O embasamento "istórico dos 'enômenos da memória na arte pode apontar camin"os
expressivos para a leitura dos monumentos arquitetônicos de São Paulo, particularmente,
Mqueles que possuem estrita relação com memórias consideradas 'undantes da cidade, como
por exemploF o *ndio, os bandeirantes, a independ:ncia, a industriali)ação e os imigrantes
/ontudo, as relações entre arte e memória passam pelo debate "istória versus memória O que,
verdadeiramente, é registrado nos monumentosF memórias ou a "istória de São PauloZ
A "ISTÓRIA
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+9 o laboratório da 0istória é o espaço de trabal"o sobre a
memória, em que ela é tratada, não como um obIetivo, mascomo obIeto de con"ecimento +;!1!S!S, =>>89
O estudo da memória surge, atualmente, como tema emergente, em especial no campo
da "istória Para -lpiano Re)erra de ;eneses "E o enlace das relações entre memória, passado
e presente Para o autor de A História, Cativa da Memória? , a memória estE submetida M dinâmica
social e, portanto, reestrutura?se constantemente, evidenciando que o passado não é o seu
produtor ou detentor constituição da memória se opera no presente, sendo que é este
tempo que o'erece as condições necessErias para a sua 'ormação O tempo presente incentiva eprescreve a rememoração, atendendo Ms demandas de seu 'uncionamento social ;eneses,
também, observa Ms di'erentes categorias da memória, particularmente, as denominadas
individual, coletiva e nacional s ci:ncias sociais interessam?se, geralmente, pelo conv*vio da
memória individual e coletiva, ou seIa, quando o campo da memória sai da es'era ps*quica do
indiv*duo e estabelece contato com outros representantes de um grupo social
O relacionamento entre "istória e memória remonta Ms origens do con"ecimento
"umano Histor, historía que advém do latim, "istória, compartil"a com oida , uma mesma rai)'undante, weid + wid, presente também em videre H latim9, signi'ica KverJ ou do sânscrito vettas ,
Ktestemun"aJ +P@B!S, 67789 Observar pessoalmente, ser testemun"a ocular, Keu sei por ter
vistoJ, caracteri)a o oida , ou seIa, histor ? aquele que tem a visão como 'onte essencial de
con"ecimento Kquele que v:J também é Kaquele que sabeJ, em grego antigo historein
Kprocurar saberJ, Kin'ormar?seJ Histor designa o suIeito, historie signi'ica KprocurarJ e historía
remete M obra
!m 0es*odo, o sentido de suas Histórias estE na ação de investigar ou de procurar 1a
2récia de $uc*dides +século @D9, o histor trans'orma?se em uma 'igura Iur*dica, ou seIa, aquele
que poderia resolver uma situação litigiosa, marcadamente envolvendo um contexto Iur*dico,
quando duas partes con'litam em divergentes asserções de veracidade quanto a um 'ato O
histor poderia alcançar a verdade, não propriamente porque viu ou presenciou o 'ato, mas
porque 'a) ver discernindo quem di) ver*dico de quem di) 'also ssim, a denominação histor
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designa, de modo geral, aquele que 'a) ver a verdade discernindo, pela ação "istoriante que
con'ronta as versões contadas# quem di) a verdade, atestando e autenticando a verdade de
apenas uma posição
ssinala?se, ainda, que semel"ante Ms 'unções do histor encontra?se, na 2récia arcaica, a
'igura do mnemon H uma pessoa que guarda a lembrança do passado em vista de uma decisão de
Iustiça Pode ser uma pessoa cuIo papel de memória se limite a uma operação ocasional +como
testemun"a9, mas pode ser também 'unção durEvel, ou seIa, o mnemon poderia atuar como
magistrado encarregado de arbitrar sobre as questões religiosas e Iur*dicas, apresentando, nesse
contexto, uma 'unção social para a memória +4! 2O55, 677L9 O histor e o mnemon , em
di'erentes épocas, serviram a constituição da verdade em pol:micas Iur*dicas e religiosas
"istória inicia?se, então, com uma narração daquele indiv*duo que podia di)er Keu viJ, Keu
sentiJ ou ainda KbuscarJ, Kin'ormarJ, bem como Klembrar?seJ O "istoriador trans'orma?se
em uma espécie de narrador de acontecimentos dotado de procedimento retórico?narrativo
!ssa concepção mantém?se no pensamento grego para o qual a memória é responsEvel
pela transmissão dos costumes e tradições, ligando?se ao con"ecimento sens*vel Para os
gregos, por exemplo, a memória do poeta reconstrói e transmite o passado Ms próximasgerações .esse modo, a memória é sagrada e privilégio de alguns "omens memória do
poeta inspirado é onisciente de carEter adivin"atório, permitindo ao poeta acesso direto aos
acontecimentos que evoca Possibilita a comunicação entre os "omens e o mundo dos deuses e
vislumbra o presente eterno memória do poeta é uma pot:ncia religiosa transcende o tempo
dos "omens 1ão é mani'estação de uma vontade ou de um pensamento individual, nem a
expressão de um agente, de um eu# é uma 'unção social +B!2@S, =>>C9
1o per*odo clEssico mantém?se a aproximação 'ecunda e, simultaneamente,problemEtica entre "istória, memória e arte primeira constituindo?se 'inalmente como meio
privilegiado de acesso ao verdadeiro con"ecimento, a segunda como elemento mediador e a
terceira como expressão do esp*rito Bessalta?se que a noção, que retém dominantemente a
memória como 'aculdade intelectual +a memória?con"ecimento H aquela que leva ao Saber9,
sedimenta a tradição platônica e neoplatônica, que 'ornece as bases para os ideais medievais,
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particularmente, a concepção agostiniana de memória, que por sua ve) in'luencia a cultura
racionalista posterior +S!@3S, 67789 1o século 3@3, contudo, a busca pela obIetividade e
verdade torna?se intensa e subtrai da "istória elementos basilares como Ms técnicas 'iccionais de
representação .esse modo, o nascimento da "istória, enquanto disciplina, pauta?se na
categoria da exclusão H a "istória não deveria ser ou ter espaço para a 'Ebula, para o mito ou
para a poesia, distanciando?se da narrativa e aproximando?se dos parâmetros de obIetividade e
neutralidade inspirados em modelos explicativos das ci:ncias naturais
1esse contexto positivista, a "istória privilegiaria a memória registrada nos documentos
o'iciais, eliminando maneiras de constituição do passado permeadas pela imaginação e
subIetividade, como por exemplo, outros registros mnemônicos +relatos, contos, lendas e
literatura9 ;onumentos art*sticos são relegados ao segundo plano das 'ontes de pesquisas,
uma ve) que a arte daria maior abertura M subIetividade, que naquele momento, é conspurcada
do con"ecimento "istórico /ontudo, entre o valor do testemun"o, a negação da narrativa H
como elemento constitutivo do passado H e a presente relação entre "istória?memória,
medeiam os nexos de um processo de memori)ação da qual o suIeito "umano e os obIetos
art*sticos se constituem como instância "istórica depositEria +P@B!S, 67789O surgimento da Ecole de Annales permite ao "istoriador uma t:nue distinção entre
memória coletiva e o estudo dela O "istoriador, ao renunciar a temporalidade linear, dando
importância para as diversas temporalidades existentes na relação do indiv*duo com o coletivo,
promove, segundo 1ora, uma Krevolução da memóriaJ !ssa concepção de temporalidade,
sustentada pela École de Annales , sugere que a contemporaneidade é portadora de certo tipo de
temporalidade socialF o tempo real $al noção, intensi'icada, em grande parte, anos mais tarde,
pela in'ormEtica presume a condensação no presente, a operação em andamento W o tempo
pontual das redes de in'ormEtica, cuIo devir é a velocidadeF
Se a "umanidade construiu outros tempos, mas rEpidos e violentos que os das plantas e animais, é porque dispõe desteextraordinErio instrumento de memória e de propagação dasrepresentações que é a linguagem +4!DV, =>>L9
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linguagem +escrita ou não9 torna?se o instrumental da memória para subverter a
temporalidade @sto porque a memória KteceJ 'ios entre os seres, os lugares, os acontecimentos
+tornando alguns mais densos com relação aos outros9, mas do que os recuperando,
resgatando?os ou descrevendo?os como Krealmente aconteceramJ, a memória por intermédio
da linguagem introdu) o passado no presente sem, necessariamente, modi'icE?lo, tornando o
tempo pretérito plural e descontinuo +S!@3S, 67789 Ou, ainda, quando se trata de "istória, é
necessErio dar conta de duas temporalidadesF o tempo em que se desenrolaram os
acontecimentos contados e o tempo da redação da narrativa memória desempen"a o papelde intermediEria entre essas duas temporalidades, pois compreende inicialmente uma imagem
mental do passado# é um 'enômeno intelectual volEtil, mas em seguida é aprisionada nas
palavras +RBO(1, =>QX9
Para 1ora, até o in*cio do século 33, "istória e memória se con'undem, pois a
produção "istoriogrE'ica pauta?se nas rememorações de acontecimentos e personagens,
remetendo?se M memória coletiva noção de vest*gio, essencial no trabal"o elaborado pelo
"istoriador, constitui o elo indi)*vel que liga o tempo através de seus rastros memorativos
!ntende?se, então, que documentos e monumentos constituem?se em vest*gios que
estabelecem a interação entre memória e "istória 1ora retoma e apro'unda os conceitos
bEsicos de 0allba&c"s que distingue a memória individual da coletiva e, sobretudo, a memória
coletiva da "istória [ memória coletiva, o sociólogo atribui adIetivos como natural,
espontânea, desinteressada e seletiva, que guarda do passado somente o que l"e possa ser
su'iciente para criar um elo entre o passado e o presente, ao contrErio da "istória, que constitui
um processo interessado, pol*tico e, portanto, manipulador O "istoriador radicali)a ainda mais
essa oposiçãoF 1ora a'irma que é imposs*vel operar?se uma distinção clara entre memóriacoletiva e memória "istórica, pois a primeira passa necessariamente pela "istória# é 'iltrada por
ela# é imposs*vel M memória escapar contemporaneamente dos procedimentos "istóricos
+1OB, =>>L9
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1esse sentido, Pierre 1ora organi)a uma classi'icação dicotômica entre memória e
"istória memória é a tradição vivida H Ka memória é a vidaJ H e sua atuali)ação no Keterno
presenteJ é espontânea e a'etiva, mltipla e vulnerEvel# a "istória é o seu oposto, uma operação
pro'ana, uma reconstrução intelectual sempre problemati)adora que demanda anElise e
explicação, uma representação sistemati)ada e cr*tica do passado memória tece v*nculos
com a tradição e o mundo pré?industrial, a "istória, com a modernidade, nesse sentido, a
"istória?memória é, sobretudo, conservadora# a "istória?cr*tica é subversiva e iconoclasta $udo
aquilo que se tem como memória, para 1ora, IE não o é, IE é "istória memória se encontra,
atualmente, prisioneira da "istória# trans'orma?se em obIeto, em memória "istorici)ada eexilada
-m conceito que permite articular as prEticas, os agentes, os re'erenciais e os
contedos da memória é o de lugar da memória , criado por 1ora, que analisa as aproximações e
distanciamentos entre a memória coletiva e memória "istórica Para o autor, a memória emerge
de um grupo social por ela uni'icado, e é esse grupo que determina Ko que é memorEvel, e
também como serE lembrado Os indiv*duos se identi'icam com os acontecimentos pblicos
de importância para seu grupoJ partir desse argumento, 1ora constrói a noção de H lugaresda memória H que, segundo o autor, servem para garantir a 'ixação de lembranças e de sua
transmissão, e estão impregnados de simbolismos, pois caracteri)am acontecimentos ou
experi:ncias vividas pelos grupos, ainda que muitos de seus membros não ten"am participado
diretamente de tais eventos
Os lugares da memória representariam menos uma aus:ncia de memória ou a
mani'estação de uma memória "istorici)ada do que irrupções a'etivas e simbólicas da memória
em seu diElogo constante com a "istória conservação de museus e monumentos necessita
de atribuição de signi'icado para que a memória não se esva)ie de todo -m lugar de apar:ncia
puramente material, como um depósito de arquivos, Ksó é lugar de memória se a imagem o
investe de uma aura simbólicaJ, a'irma 1ora Ou seIa, o arquivo precisa exprimir signi'icado
!sses lugares de memória envolvem o tempo, a mudança e a "istóriaF
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O lugar de memória deve parar o tempo, bloquear o trabal"o
do esquecimento, 'ixar um estudo de coisas, imortali)ar amorte, materiali)ar o imaterial para +9 prender o mEximo desentido num mEximo de sinais, é claro, e é isso que os tornaapaixonantesF que os lugares da memória só vivem de suaaptidão para a metamor'ose, no incessante ressaltar de seussigni'icados e no silvado imprevis*vel de suas rami'icações+1OB, =>>L9
Betoma?se, então, que com relação aos materiais, tanto a memória coletiva quanto a
"istória aplicam?se a dois tiposF monumentos e documentos 1o âmbito dessa pesquisa, adota?
se a noção de documento como algo mais amplo do que a noção estipulada até o século 3@3+durante a escola positivista9 .ependendo diretamente da escol"a do "istoriador, o
documento pode ser escrito, ilustrado através de imagem digitali)ada ou 'otogra'ada,
transmitido por aparel"os audiovisuais ou qualquer outro suporte /omo monumento, toma?se
mani'estações escultóricas, arquitetônicas e, especialmente, obIetos art*sticos em tr:s ou duas
dimensões com algum sentido narrativo ou não
1o que tange Ms 'ontes de pesquisa, a "istória oral apresenta particularidade no âmbito
das relações existente entre "istória e memória "istória oral apresenta como prEticametodológica o recol"imento de entrevistas de "istória de vida +memórias individuais9 ou ainda
entrevistas de grupos +memórias mais coletivas9, levando em consideração as pontes imutEveis
da memória relativas aos acontecimentos, personagens e lugares +PO44\, =>>69 O
"istoriador precisa recon"ecer as proIeções ou trans'er:ncias nos depoimentos, isto é,
in'ormações que são transmitidas por outrem ao depoente e são incorporadas como suas
próprias memórias H isto ocorre porque a memória é seletiva e socialmente constru*da +4!
2O55, 677L9 O especialista necessita recon"ecer esse 'ato para que possa exercer a cr*tica
sobre a 'onte
discussão entre aproximações e distanciamentos, envolvendo "istória e memória,
tem, atualmente, uma densidade complexa Paul De%ne, por exemplo, sugere que a "istória é
K'il"a da memóriaJ, uma ve) que a "istória não 'a) reviver os eventos, pois o vivido, tal como
sai das mãos do "istoriador, não é a viv:ncia dos atores envolvidos na ação 1esse sentido, Ka
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"istória é, em ess:ncia, con"ecimento por meio de documentosJ Porém, a narração "istórica
situa?se para além dos documentos, pois nen"um deles serE o próprio evento, ou seIa, não é
um KdocumentErioJ que reprodu) o 'ato tal como ocorrido +D!V1!, =>>Q9
"istoriogra'ia anglo?saxônica procura apontar novos en'oques na relação memória e
"istória !m uma perspectiva diversa a de 1ora e a de 0allba&c"s, busca dar maior autonomia
M memória /ontudo, no es'orço de recompatibili)ar memória e "istória, esses autores
aproximam exageradamente a memória da noção de "istória, de tal modo que uma união
simbiótica se e'etua e se acaba por aplicar aos procedimentos e mecanismos da memória,
aqueles recon"ecidos como "istoriogrE'icos H o resultado é o não recon"ecimento da distinção
entre as duas categorias Se em 1ora toda memória é apropriada e "istorici)ada, na vertente
anglo?saxônica, memória é imediatamente "istória# uma di'erença, portanto, de grau, mas não
de qualidade
partir dos anos de =>>7, diversos "istoriadores tomam consci:ncia de que a relação
memóriaY"istória é mais uma relação de con'lito e oposição do que de complementaridade o
mesmo tempo, nessa perspectiva, a "istória se coloca como Ksen"ora da memóriaJ ou
produtora dela pós a passagem da "istória?narrativa para a "istória?problema, as condiçõesemergentes de gestão da memória contaminam a 0istória ;uitas ve)es, na prEtica pro'issional
ocorrem grandes dilemas que tendem M substituição da memória pela 0istóriaF Ka 0istória não
deve ser o duplo cient*'ico da memória, o "istoriador não pode abandonar sua 'unção cr*tica, a
memória precisa ser tratada como obIeto da 0istóriaJ /ontudo, muitas produções
"istoriogrE'icas, ainda, se constroem sem que aconteça uma ruptura e'etiva com a tradição
aristotélica que entende a memória +ou mel"or, a reminisc:ncia, o ato de lembrar9, sobretudo
em sua 'unção cognitiva, como con"ecimento do passado +S!@3S, 67789
Segundo -lpiano Re)erra de ;eneses, a discussão atual sobre memória divide?se em
dois grupos distintosF no primeiro, a memória é vista como um 'etic"e, trans'ormando?se em
mercadoria, para legitimação de valores culturais# no segundo, a memória busca o engaIamento
social cr*tico, procurando discutir as poss*veis alienações da sociedade emergente ocasionadas
pela sua expropriação /ontudo, a memória e a "istória re'letem e discutem o passado, e
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embora locali)adas em campos di'erentes, executam 'unções complementares, auxiliando na
'ormação da identidade dos atores "istóricos
.iante desse quadro, estabelecem?se poss*veis 'ronteiras entre a "istória e a memória
memória é, enquanto produto social, um conIunto de elementos necessErios para a
'ormação, manutenção e modi'icação das identidades individual, coletiva e nacional E a
"istória é uma operação cognitiva, um modo de produção de con"ecimento apropriação da
memória pela "istória tem, diretamente, dois e'eitosF =9 extrema operacionalidade e
produtividade e, 69 vulnerabilidade teórica, pois ao se levantar as oposições entre "istória e
memória para, em seguida, destitu*?las, não se discutem os mecanismos de produção e
reprodução da memória
s produções mais recentes indicam que não se trata radicalmente de apartar esses
aspectos do con"ecimento# tampouco de uni'icE?los Os estudos como os de !cléa Rosi em
Memória e Sociedade lem!ran"as de velhos e dos "istoriadores /arlos lberto Desentini e !dgar de
.ecca em A #evolu"$o do %encedor apontam que as di'erenças entre "istória e memória não
estão resolvidas e sua interação completa é algo problemEtico 1essas duas produções,
observa?se que a memória é um constante es'orço de construção e reconstrução H deconstante luta entre as divergentes KmemóriasJ s memórias dos grupos sociais se organi)am
e reorgani)am em um processo de 'eição adaptativa, tendo como re'er:ncia a dinâmica social
do presente
.iversas pesquisas explicitam a pertin:ncia da "istória em ocupar seu devido lugar
enquanto ci:ncia, distanciando?se do lugar ocupado pela memória K.o mesmo modo que o
passado não é "istória, mas obIeto da "istória, assim a memória não é "istória, mas um de seus
obIetos e um n*vel elementar de seu desenvolvimentoJ +4! 2O55, 677L9 1esse ponto, deve?se assinalar que muitos teóricos relutam em aceitar a "istória como ci:ncia Outros de'inem
que memória seria algo que emerge naturalmente da mente "umana, enquanto que a "istória
seria produto da anElise e da re'lexão memória é subIetiva, Kum brinquedo das emoçõesJ,
complacente com seus capric"os, 'orti'icando?se em seu próprio entusiasmo# a "istória, em
princ*pio pelo menos, é obIetiva, guiando?se pela ra)ão abstrata e submetendo suas
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considerações M experimentação emp*rica memória somente pode trabal"ar com imagens
concretas, ao passo que a "istória, tem o atributo da abstração memória é de'ormada pelo
tempo "istória tende M linearidade e M progressão +04R(/0S, =>>79
Para -lpiano Re)erra de ;eneses, a memória, como construção social, dispõe dos
instrumentais necessErios para a 'ormação e para o re'orço da identidade individual, coletiva e
nacional O "istoriador ressalta ainda a impropriedade de se con'undir memória e "istóriaF a
"istória é 'orma intelectual de con"ecimento, uma operação cognitiva /ontrariamente, a
memória é operação ideológica, processo psico?social de representação de si próprio, que
organi)a simbolicamente o universo das pessoas, das coisas, imagens e relações, pelas
legitimações que produ) memória 'ornece quadros de orientação, de assimilação do novo,
códigos para classi'icação e para o intercâmbio social +;!1!S!S, =>>89
.o embate entre memória e "istória tem?se que o labor da "istória aplica?se, então,
sobre a memória O trabal"o do "istoriador estE emaran"ado na memória, cabe ao pro'issional
selecionE?lo e organi)E?lo para que possa construir uma versão intelig*vel ao seu tempo e
sociedade Por outro lado, no trabal"o de enquadramento da memória, "E também o trabal"o
da própria memória em si Ou seIaF cada ve) que uma memória estE relativamente constitu*da,ela e'etua um trabal"o de manutenção, de coer:ncia, de unidade, de continuidade e de
organi)ação Porém, essa memória, como se observa no in*cio desta tese, é pass*vel de diversas
leituras a partir do momento de seu registro nas 'ormas privilegiadas de documentos ou
monumentos s disciplinas +tais como, a "istória, a estética, a psicologia ou a biologia9 ao se
constitu*rem, na maioria dos casos, no século 3@3, elegem sua própria categoria de memória
1a "istória opta?se pela memória voluntEria coletiva, ou ainda, a memória con"ecida como
memória da intelig:ncia +ou memória?con"ecimento9, deixando de lado aspectos da memória
involuntEria +ou a'etiva9 e a 'unção criativa inscrita na memória de atuali)ação do passado com
vista Ms utopias do 'uturo
memória?con"ecimento +ou voluntEria9 em seu contato com a "istória tem exclu*do,
sistematicamente, a 'aceta a'etiva inerente M memória Percebe?se que desde os gregos até a
École de Annales , a "istoriogra'ia elege a memória voluntEria, desquali'icando a memória
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involuntEria H tida como constitutiva de irracionalismos e, por essa ra)ão, avessa M "istória O
privilégio da memória voluntEria sobre a involuntEria, no campo "istoriogrE'ico, pode
sustentar?se pelo es'orço da própria "istória em se constituir como ci:ncia, aplicando
procedimentos metodológicos e disciplinares que não permitem o estudo dos mitos, das
sensibilidades, das paixões pol*ticas, da imaginação e do imaginErio na "istória 1esse ponto de
vista, a memória não se con'unde com a "istória# pelo contrErio, a escrita da memória é, o mais
das ve)es, o lugar do apagamento ao privilegiar a memória?con"ecimento em detrimento da
memória involuntEria
1as ltimas décadas, a "istória tem re'letido sobre essa postura de exclusão
contecimentos "istóricos signi'icativos, tais como a queda do muro de Rerlim, a implosão da
ex?-BSS, a globali)ação e os diversos con'litos étnico?religiosos espal"ados pelo mundo
provocam uma urgente revisão, visto que a racionalidade "istórica e as grandes narrativas não
dão conta de atender a diversidade de memórias que irrompe M cena pblica atualmente !ssas
memórias insurgentes mostram o decl*nio das metanarrativas criadas pela modernidade 'rente
a conIuntos de 'ragmentos de "istória variados e muitas ve)es contraditórios sobre um mesmo
assunto +4VO$B., =>>Q9 lguns estudiosos pregam o K'im da "istóriaJ em decorr:ncia dodesmoronamento das metanarrativas O 'im da "istória, como a'irma o cientista russo @l%a
Prigogine, seria Ka realidade de uma sociedade atemporal que perdeu sua memóriaJ
+/1$O1, 677Q9 Para o cientista, a memórias '*sica e ps*quica garantem a condição "umana
e tornam?se as principais molduras da criação art*stica contemporânea
1essa perspectiva aberta pelos acontecimentos contemporâneos, a memória
involuntEria passa a constituir novo obIeto do trabal"o "istoriogrE'ico, acentuando uma
mudança gradual de paradigma O que ocorre, "oIe, é a busca por modelos narrativos que
satis'açam os "istoriadores na :n'ase da pluralidade de signi'icados e que considerem a
pulveri)ação das es'eras da vida "umana, engendrada na contemporaneidade o re'letir sobre
a problemEtica relação entre memória e "istória, procuram?se paralelos da questão no campo
art*stico, tendo como noção basilar os parâmetros estabelecidos pela "istória da arte H nota?se
que, em alguns momentos, os 'atos constituintes da "istória da arte estão tão próximos e,
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1essa nova con'iguração, a promessa de uma globali)ação econômica e social
apresenta suas limitações, porque permite a uma minoria os con'ortos desta condição e impõe
a maioria M exclusão Para essa minoria, os poss*veis KagoraJ se desdobram em in'initas
realidades dispersas O deseIo pode estar em todos os lugares e em todos os tempos !m
grandes cidades, como por exemplo, São Paulo, essa situação desenrai)a o indiv*duo,
tornando?o Khomeless J H um Ksem casaJ, destitu*do do sentimento de Kem casaJ# uma aus:ncia
de 'amiliaridade com o mundo# certos modos de ser# sentidos compartil"ados, crençasF a
globali)ação impele o indiv*duo M diEspora +M procura por uma identidade ou ainda M busca por
memórias partil"adas9 +D@4/, =>>>9
W a perda das certe)as identidade somente se torna uma questão quando algo que se
supõe como 'ixo, coerente e estEvel é deslocado pela experi:ncia da dvida e da incerte)a E
não se absoluti)a questões re'erentes aos agrupamentos, tais comoF g:nero, classe social, etnia,
nacionalidade ou sistema social própria noção uni'icada e estEvel de subIetividade passa por
pro'undas alterações O suIeito apresenta maior mobilidade noção de indiv*duo, assim
como a de memória, in'luencia?se e dirigi?se de acordo com as interações deste com outros
indiv*duos e instituições ssim, o suIeito não é apenas um, mas possui diversas gradações quese modi'icam de acordo com o tipo de relação que estabelece com seu entorno H suas
memórias também terão a mesma mobilidade W Iustamente o entorno "abitado pelo suIeito
que se altera a partir da globali)ação H a cidade contemporânea torna?se 'raturada e transitiva
Por conseqU:ncia, o suIeito antes uni'icado estE se tornando cada ve) mais 'ragmentado e
temporErio, IE que as bases sobre as quais ele constrói sua identidade não são mais previs*veis,
mas, ao contrErio, variEveis
1a edi'icação do lugar contemporâneo, "E uma estreita relação entre a memória e o
sentimento de identidade 1essa construção da identidade, "E a unidade '*sica, ou seIa, o
sentimento de ter 'ronteiras '*sicas, no caso do corpo da pessoa, ou 'ronteiras de
pertencimento ao grupo, no caso de um coletivo# "E a continuidade dentro do tempo, no
sentido '*sico da palavra, mas também no sentido ético e psicológico +PO44\, =>>69 .esse
modo, a memória é um elemento constituinte do sentimento de identidade, tanto individual
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como coletiva, na medida em que também é 'ator relevante do sentimento de continuidade e
de coer:ncia de uma pessoa ou de um grupo em sua reconstrução de si
KO estabelecimento da identidade é um processo cultural e simbólico reali)ado a partir
de diversos enrai)amentosJ !sses enrai)amentos se estabelecem a partir do contexto de
tempo e de espaço, nos quais o indiv*duo procura os elementos constituintes de sua identidade
mutEvel Os membros de um grupo particular como aqueles ligados por g:nero, 'aixa etEria,
estrato social, etnias, religião, possuem uma extensa rede de articulações tanto na linguagem
como nas crenças partil"adas de uma localidade .entro das linguagens poss*veis, as artes
visuais apresentam?se como campo aberto para o surgimento de diversos discursos, porque são
capa)es de espel"ar as di'erenças ocultas sob muitas outras H até mesmo em indiv*duos com
ancestralidade e "istória em comum /om essas condicionantes, os indiv*duos deslocam?se tão
aceleradamente por espaços reais e virtuais que parecem estar sempre no mesmo lugar,
sentindo o va)io de não c"egar a lugar algum +044, 677X9
globali)ação estabelece uma identidade "omog:nea do grupo privilegiado que t:m
acesso ao processo, uma ve) que as possibilidades tecnológicas o'erecem mensagens
instantâneas e internacionali)adas O volume dessas mensagens "omogenei)adas é avassaladoro que provoca no indiv*duo uma sensação de estran"amento, de distanciamento e de
passividade 1a maioria das ve)es, são mensagens sem mensageiros ou destinatErios que
deixam no indiv*duo a sensação de perplexidade W a criação de um mundo desabitado, no qual
a ltima morada IE estE em vias de rompimentoF o corpo +D@4/, =>>>9 /onsiderado a
re'er:ncia estEvel da modernidade, o corpo é apresentado como o lugar do ser, da ra)ão e da
consci:ncia 0oIe, o corpo cede espaço M relativi)ação da presença c&!er corporal
'inal, na contemporaneidade, o indiv*duo estE em algum lugar ou em lugar nen"umZ arte pode resgatar a sensação de lugar perdido +o sentimento de Kem casaJ9Z Pode construir
um lugar pass*vel de relações identitErias e "istóricasZ !xistem espaços criados pela literatura, a
exemplo de obras de Proust !xiste nas artes visuais a criação de espaços plEsticos e a'etivos
que contam e compartil"am as memóriasZ
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!m São Paulo, os sentimentos de desrai)amento e de pertencimento são
complementares cidade, considerada a maior da mérica 4atina, é um conglomerado
arquitetônico mesclado por pessoas vindas de diversos locais do Rrasil e do mundo O
sentimento de Kem casaJ e de Khomeless J apresentam?se 'ortemente nesse ambiente urbano
!mbora, São Paulo propon"a espaços +presenciais e virtuais9 globali)ados cotidianamente, sua
população estE longe de traços identitErios "omogenei)ados vocação cosmopolita da cidade
advém do movimento de industriali)ação pós?=>67 .e lE para cE, a cidade mostra?se cada ve)
mais global Simultaneamente, as KetniasJ +RB!$O1, =>>79 presentes na mal"a urbana t:m,
crescentemente, a preocupação de marcarem suas memórias em lugares espec*'icos da cidade,erigindo +ou Ms ve)es, destruindo9 monumentos que evocam suas identidades !ssas
intervenções são responsEveis pela construção de um lugar, no qual os indiv*duos,
concomitantemente, resgatam o registro de suas memórias +o sentimento de Kem casaJ9 e o
apagamento delas +a sensação de Khomeless J H Ksem casaJ9
São Paulo, então, pode ser vista como um campo, onde as questões sobre os espaços, a
arte e a memória estão Iogadas Becentes pol*ticas pblicas, revitali)ação de lugares e 'ormas
estabelecidas de arte pblica lutam para a manutenção e renovação da memória coletivaurbana O acelerado processo de integração global das cidades tem alterado radicalmente as
condições e os princ*pios das intervenções H é importante ressaltar que esse é um movimento
mundial +RB@SS/, 677C9
2randes proIetos de desenvolvimento e de criação de instituições culturais
transnacionais estão ocasionando pro'undas reestruturações nas cidades, em escala global
!xigem novo repertório técnico e institucional# novas estratégias para a ação no espaço urbano
e, uma readequação dos espaços voltados M conservação da memória !ntre as estratégias,
emerge a tend:ncia M implantação de megamuseus e exposições temEticas de itinerância
internacional, que subordinam produção e percepção estética M lógica espacial cercada por
imensos ambientes arti'iciais e cenogra'ados !sse tipo de monumentalidade disponibili)a a
cidade e a arte ao espetEculo que, por ve)es, não tra) contribuições signi'icativas para a maioria
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dos "abitantes H alguns autores alertam que o 'ator exclusão pode pesar muito nessas
propostas grandiosas
Para 1elson Rrissac, um dos organi)adores do evento Arte'Cidade , a ação art*stica no
ambiente urbano contemporâneo, portanto, necessita ser pautada mais por proposta de
atuação 'lu*da e discursiva do que 'ixa e dirigida .eve ser moldada, num grau decisivo, pelas
circunstâncias e condições de cada lugar espec*'ico +RB@SS/, 677C9 !nvolvido na edi'icação
de lugares, o artista não é um Kcriador de sociedadesJ e tampouco tornar?se um espel"o
passivo da realidade O artista procura alterar a paisagem em volta, em alguns casos recupera
espaços degradados e incentiva o debate sobre os problemas e questões sociais /omo
membro da comunidade não se a'asta das implicações relativas ao ambiente em que vive e,
tampouco, evita as Kresponsabilidades éticas e pol*ticas de sua inserção no espaçoJ +RB@SS/,
677C9
CO&SIDERA')ES FI&AIS
.iante da idéia de monumento e aliando?se M idéia de arte pblica +ROBR, 67789,
essa concepção art*stica é capa) de trans'ormar a consci:ncia pblica em relação aos
movimentos de alteração dos espaços das cidades e semear um aspecto caro Ms ações estéticas
interessadas em discutir o ambiente urbanoF a dimensão de uma prEtica conectada aos
processos de constituição de lugares 1esse contexto, a sensação de Knão?lugarJ, os espaços a?
"istóricos e a perda do valor da memória que são 'atores componentes do discurso
globali)ante são combatidos por pessoas +artistas e 'ruidores9 que se utili)am a arte pblica
para a construção de uma paisagem urbana plena de signi'icações
Dale lembrar, ainda, as concepções de ;ilton Santos sobre a paisagem e o urbanismoF
K paisagem existe através de um conIunto de 'ormas?obIetoT criadas +9 em momentos
"istóricos di'erentes, porém coexistindo no momento atualJ !ssas 'ormas não t:m vida
própria, não se explicam so)in"as Somente K+9 no espaço, as 'ormas de que se compõe a
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paisagem preenc"em, no momento atual, uma 'unção atual, como resposta Ms necessidades
atuais da sociedadeJ +S1$OS, =>>>9
O autor a'irma, então, que a atuação da sociedade KanimaJ a paisagem, con'erindo?l"e
novas 'unções, dando?l"e contedo sociedade, ainda, altera a organi)ação espacial para criar
novas situações de equil*brio e movimento @sto é, 'ormula uma KinserçãoJ na paisagem que
acaba por originar o espaço H a s*ntese K+9 sempre provisório, entre o contedo social e as
'ormas espaciaisJ +S1$OS, =>>>9 partir desses parâmetros, o artista, como a 'igura de
ano +observando, simultaneamente, o passado e o 'uturo9 pode interagir como um negociador
entre as diversas memórias existentes na mal"a urbana# negociando com as identidades
'orIadas e, principalmente, atuando na construção de um lugar de memórias
intervenção do artista em espaços pblicos, retomando a noção de Pierre 1ora,
sobre os lugares da memória é de 'undamental relevância porque nesse contexto, o artista é o
responsEvel por sensibili)ar a população a atribuir memórias ou não a um determinado lugar
lgumas ve)es, a missão de atribuição de memórias é, 'irmemente, abalada, con'igurando?se
em casos tais como (ilted Arc +=>Q=9 de Bic"ard Serra, em 1ova Vor] ou ainda a Pirâmide do
arquiteto c"in:s @; Pei +=>Q>9 na Erea externa do 4ouvre H obras que não tiverem, emprimeiro momento, receptividade pblica positiva Para o pleno :xito do engaIamento da arte
em espaços urbanos, o artista deve compreender que a cidade é um imenso palimpsesto, onde
a evocação de imagens memorEveis serve?se dos momentos atuais e instaura uma nova 'orma
de se relacionar com a obra, que, por sua ve), gan"a sentido a partir das inter'er:ncias
contemporâneas H é uma constante e perene trans'ormação de signi'icados
idéia de cidade +coloque?se, nesse contexto, também as concepções de nação ecomunidade9 não é tão somente uma identidade pol*tica ou social, mas um sistema simbólico
de produção de sentidos, de representação cultural e de discurso +/1$O1, 677Q9 cidade
surge, então, como produto da sobreposição de épocas, dos extratos temporais da memória
.i'*cil é a missão de recol"er esses extratos e criar condições para sua adequação
contemporânea
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1ão são de mani'estação imediata a lógica "istórica e o controle de memória que se
re'letem na realidade urbana H o mais evidente é a desordem dos eventos "erdados /ontudo, a
cidade é o lugar da 'ormação de um pensamento visual que permite encarE?la no seu sentido
museológico H a cidade?museu, segundo \atia /anton, torna?se depositEria de poéticas visuais
que evocam sentimentos de identi'icação e recon"ecimento O 'a)er art*stico contemporâneo
rea'irma essa concepção de cidade?museu, porque em meio a diversas possibilidades de uso de
materiais, espaços e tempos, não se separa a rua e o museu +/1$O1, 677Q9
discussão sobre a construção de lugares de memória em São Paulo tem continuidade
quando se voltam Ms atenções para as KetniasJ que mapeiam os espaços da metrópole
paulistana Os monumentos imersos na mal"a urbana servem como instrumentos de
rememoração, porém, agregam os valores de construção do espaço a partir dos traços
identitErios da sociedade na qual estão inseridos São Paulo, cidade de etnias mltiplas, possui
memórias 'undantes que são registradas nas ruas, alamedas, avenidas e praças da cidade
+logradouros pblicos da cidade9
.essas memórias, registram?se 'atos "istóricos que constituem, acima de tudo, marcos
espaciais presentes na cidadeF a "erança ind*gena, o legado dos bandeirantes, a independ:ncia, aindustriali)ação, o movimento de imigração e, mais tarde, o de migração arte registra cada
um desses acontecimentos "istóricos e imprime nos espaços urbanos, em di'erentes n*veis de
"istoricidade, a batal"a pela construção de um lugar e por uma identidade plural
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