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  • 7/25/2019 Artigo Bentivoglio

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    Revista de Teoria da Histria Ano 1, Nmero 3, junho/ 2010 Universidade Federal de GoisISSN: 2175-5892

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    Cultura Poltica e Historiografia Alem No Sculo XIX:A Escola Histrica Prussiana e a Histor ische Zeit schr ift .

    Professor Adjunto de Teoria da HistriaJulio Bentivoglio

    PPGHIS-UFESE-mail:[email protected]

    RESUMOA constituio da cincia histrica alem no sculo XIX coincidiu com um

    momento mpar da prpria histria da Alemanha o processo de unificao

    poltica e de formao do Imprio no qual a investigao histrica esteve direta

    ou indiretamente relacionada emergncia do nacionalismo e poltica prussiana.

    Naquele perodo, duas escolas histricas se tornaram referncias aos jovens

    historiadores: a escola rankeana e a escola histrica prussiana. Este artigopretende caracteriz-las e discutir a formao da cultura historiogrfica germnica

    oitocentista tomando como referncia a Historische Zeitschrift.

    Palavras-Chave: teoria da histria; histria intelectual; historiografia alem; sculo

    XIX.

    ABSTRACTThe constitution of the German historical science in the nineteenth century

    coincided with an unprecedented moment of the history of Germany the processof political unification and formation of the Empire in which historical research

    was directly or indirectly related to the emergence of nationalism and Prussian

    policy. At that time, two schools have become historical references to young

    historians: the Rankean school and the Prussian Historical Pchool. This article aims

    to characterize them and discuss the formation of the 19th century Germanic

    cultural historiography taking the Historische Zeitschrift like reference.

    Keywords: theory of history; intellectual history; german historiography;

    nineteenth century.

    Tarefa difcil definir escolas histricas, delimitando-as num certo tempo e

    espao, localizando suas idias de fora e os elementos que conferem identidade

    aos historiadores que as compem. Um recurso que permite um primeiro passo

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    nesta direo analisar seus expoentes, bem como sua produo o que,

    invariavelmente, nos leva a um determinado peridico. Tal como podemos

    vislumbrar uma escola dos Annalesnas pginas da revista homnima ou uma Nova

    Esquerda Inglesa nos artigos da New Left seria possvel identificar uma EscolaHistrica Prussiana nas pginas da Historische Zeitschrift?

    Lamentavelmente a historiografia alem durante o sculo XIX foi reduzida

    a uma imagem distorcida e caricata de um historiador s: Franz Leopold von

    Ranke. Como se toda a produo historiogrfica germnica adotasse a escrita

    rankeana da histria. Essa imagem duradoura que surge ainda hoje em certas

    interpretaes (FUNARI & SILVA, 2008) oblitera a existncia de diferentes escolas

    ou movimentos em solo alemo durante o oitocentos, das quais se destacaram

    de um lado Ranke e seus seguidores e de outro a Escola Histrica Prussiana, tal

    como localizam os intrpretes (Iggers, 1983) (SOUTHARD, 1995). este o objeto

    das linhas que se seguem, discutir a historiografia germnica em suas linhas mais

    gerais e analisar o contexto histrico em que foi produzida, tomando como

    referncia a Historische Zeitschrift (Revista Histrica), criada por Heinrich von

    Sybel em 1859, peridico que existe at hoje e oferece um panorama bastante

    sensvel da produo historiogrfica alem.

    Em Michel de Certeau (2002) encontramos uma chave analtica acurada

    para se pensar a operao historiogrfica e, por conseguinte, a produo individual

    e coletiva dos historiadores, visto ser resultante da relao entre determinados

    processos de institucionalizao os lugares , a conformao de determinadas

    regras ou mtodos as prticas e, por fim, a expresso e materializao de um

    saber consubstanciado em regimes de escrita. Em outras palavras, nesta operao

    observa-se a reproduo de algumas estratgias funcionais: a institucionalizao e

    reunio em torno de centros universitrios privilegiados, a adoo de

    procedimentos metodolgicos semelhantes e o exerccio de uma forma de escrita,que, a seu modo, privilegia um peridico particular; responsvel por integrar os

    sujeitos do saber, as prticas e os circuitos de circulao do conhecimento

    histrico, produzindo um vnculo entre as universidades, os historiadores, as

    associaes cientficas e os arquivos, garantindo a gnese e a divulgao das idias

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    do grupo. Longe de querer propor um esquema, tenho me convencido de que as

    escolas histricas dos sculos XIX e XX parecem seguir um certo desenho: sua

    durao constituio e influncia no costuma exceder um sculo; orientam-se

    a partir de um grande centro, uma universidade que se destaca e projeta suasobras histricas que so reconhecidas e traduzidas em outros pases1 e, por fim,

    cujo programa e identidade do grupo cristalizado por meio de um instrumento

    de difuso fundamental, uma revista, uma coleo, uma srie. Seria possvel

    localizar ainda outras iniciativas que consubstanciam as escolas, relacionadas ao

    acesso e controle privilegiado de certas fontes. Seno vejamos, a Escola Histrica

    Prussiana sediada na Universidade de Berlim tornou-se pujante j em meados de

    1840, notabilizou-se pela publicao da Monumenta Germanicae Historica e uma

    das referncias centrais do grupo foi a Historische Zeitschrift , tendo seu ocaso

    ocorrido em meados da virada do sculo aps a querela de Karl Lamprecht.2

    O interesse por este tem surgiu-me em meados de 2003, quando me

    convenci de que os historiadores alemes oitocentistas tinham sido reduzidos a

    um lugar-comum. A emergncia da histria produzida na Alemanha atualmente,

    que bastante conhecida pelos leitores brasileiros, a partir, sobretudo, do contato

    com Gumbrecht (2003), Rsen 2001) e Koselleck (2006), conduziu-me ao

    pensamento histrico germnico do sculo XIX. E revelou que ele no passava

    exclusivamente pela obra de Ranke, que ainda hoje muito mal-conhecida3, mas

    tambm por Niebuhr, Droysen e Gervinus, estes dois ltimos expoentes da

    chamada Escola Histrica Prussiana. Da leitura destes historiadores estampou-se a

    urgncia para que sua obra fosse estudada. Assim surgiram as tradues do

    1 E curioso que quase todos estes historiadores iniciam sua carreira em alguma universidadeperifrica e depois migram para um plo maior e mais importante na rea. Deste centro passam aperegrinar e conferenciar em outros centros importantes, em outras universidades dentro e fora deseu pas.2A escola metdica francesa, composta por Monod, Fagniez, Langlois e Seignobos dentre outros, demodo semelhante, aglutinou-se em torno da Revue Historique de 1876 nome idntico revistaalem e da Sorbonne irradiando um tipo de escrita da histria que depois seria combatida poruma nova escola, osAnnales, que inicia suas atividades a partir de 1929 na revista homnima, Bloche Febvre tambm se deslocam de Estrasburgo para a Sorbonne e at o final do sculo XX foram umainfluente corrente historiogrfica. A micro-histria segue padro similar, nas pginas dos QuaderniStorici.3 Basta lembrar que, a rigor, existem apenas dois ensaios sobre o pensamento deste autor, oprimeiro redigido por Srgio Buarque de Holanda (1981) e o ltimo, publicado em 2010, por sinaluma anlise que nada deixa dever ao clebre historiador, de autoria de Srgio da Mata (2010).

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    Manual de Droysen (2009) e dos Fundamentos de teoria da histria (2010) de

    Gervinus. O despertar epistemolgico da Histria, vivido na Alemanha do sculo

    XIX referenda um momento singular em que o pensamento histrico, ou suas

    idias-fora parecem tomar conscincia de si, historicizando-se, situando seuslugares e sua pertena, confrontando sua prpria histria e projetando-se no

    futuro. Nascia a cincia histrica. Outro detalhe importante era a convergncia

    particular de cincia e poltica, visto existir um dilogo intenso entre pensamento

    histrico e ao poltica, haja vista a histria subsidiar e ser subsidiada pelo debate

    poltico em torno da unificao alem, dos conflitos territoriais e do nacionalismo

    emergente de tal maneira que nem mesmo Ranke escapou a isso; o que por si

    desmistifica a interpretao ingnua e os ataques desferidos contra seu pretenso

    apartidarismo. Ao contrrio de Karl Marx, cujas obras histricas procuravam

    produzir ao junto aopovo, em particular os trabalhadores, aqueles historiadores

    prussianos escreviam para os prncipes e para a burguesia, embora no

    desprezassem o dilogo junto opinio pblica, mas para isso se serviam da

    imprensa.

    Como se trata de uma pesquisa em desenvolvimento, talvez existam mais

    perguntas e indcios que respostas categricas neste artigo. A meta, bastante

    modesta, ser pensar a Escola Histrica Prussiana a partir da Revista Histrica,

    uma das primeiras do gnero em todo o mundo. Ela foi anterior s congneres:

    Revue Historique (1876) dos metdicos Monod e Fagniez, English Historical Review

    (1886) fundada na Univesidade de Oxford ou osAnnales (1929) de Marc Bloch e

    Lucien Febvre. E tambm relacion-la com um perfil e uma anlise sobre a

    trajetria dos historiadores que a compunham. Este texto expressa, portanto, tanto

    a necessidade da desfigurao de lugares-comuns da historiografia alem durante

    o sculo XIX, quanto as dificuldades inerentes queles que se enveredam pelo

    estudo da histria da historiografia. E vai enfatizar a convergncia entre odesenvolvimento da cincia histrica alem e o processo de unificao poltica.

    Vnculo, por sinal, percebido por um dos historiadores alemes mais conhecidos do

    perodo, ganhador do prmio Nobel de Literatura em 1904, Theodor Mommsen:

    Eis o horizonte do futuro: organizar o Estado institucionalizado de formaque o comrcio alemo, a manufatura alem, a arte alem, a cincia

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    alem, a sociedade alem e a vida alem continuem equiparadas ou seequiparem ao poder da nao. (THEODOR MOMMSEN, 1871, ApudMARTINS, 2010)

    Em muitas aluses historiografia alem do sculo XIX comum referirem-

    se a ela como sendo positivista, factual e conservadora (FUNARI & SILVA, 2008).

    Pesa sobre aqueles historiadores e, em especial, sobre opai desta histria alem o

    antema de uma condenao categrica, afinal Ranke parece ser a sntese de tudo

    aquilo que no se deve fazer em Histria, algo que poderia ser resumido numa

    frmula: narrar os fatos como aconteceram, ser objetivo e imparcial (Cf.

    CARDOSO, 1988). Como se fosse fcil resolver estas questes em um autor cuja

    obra to vasta quanto complexa1. Creio que sob esta censura ataviaram

    exatamente aquilo que todo historiador deveria evitar: reproduzir acriticamente

    uma mxima, incorrer em anacronismo e no tomar toda uma historiografia a

    partir de apenas um representante. Esta a primeira imagem a ser desfigurada,

    que elimina esta leitura reducionista, superficial e equivocada.

    A complexidade da definio para o que recentemente surge sob a rubrica

    de histria da historiografia exige que algumas advertncias sejam levantadas. A

    primeira remete prpria historicidade do conceito de historiador, um lxico

    antigo que sofreu mutaes no pensamento ocidental em meados do sculo XIX,

    quando se passou a distinguir historiadores de cronistas ou de memorialistas. Asegunda ao problema da relao autor(es) e obra(s), ou ainda, num sentido mais

    amplo, da construo de identidades em um grupo especfico de historiadores. De

    certo modo, esta questo a mesma que ocorre nos estudos consagrados histria

    intelectual, embora em outro registro. Nos estudos franceses consagrados ao tema,

    destacam-se os trabalhos de Jean-Franois Sirinelli e de Michel Winock com uma

    nfase sociolgica sobre as cartografias de intelectuais, suas redes de solidariedade

    e de oposio, seus modos de integrao e em torno da formao de geraes

    (SILVA In: LOPES, 2006:15s). A referncia maior o pensamento de Pierre

    Bordieu, sobretudo em suas noes de campo e de habitus (SILVA In: LOPES,

    2006:16). A esta influncia francesa existe uma outra da New Intellectual History

    1 Concordo com Srgio da Mata (2010) acerca da existncia de um verdadeiro mito historiogrfico arespeito de Ranke.

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    anglo-sax, que entende o texto como uma relao de foras, um nexo entre

    perspectivas e nveis diversos que se configuram em determinadas obras e autores

    (KIRSCHNER in: LOPES, 2006:33). Nesta tendncia temos a influncia sedutora da

    hermenutica filosfica e do desconstrucionismo derridadiano e seu maiorexpoente , sem dvida Dominick La Capra (KIRSCHNER in: LOPES, 2006:34-5).

    Hayden White, a meu ver, apresenta um diagnstico bastante elucidativo acerca do

    campo. Ele se divide entre os analistas

    que 1) assumem uma posio de acordo com uma ou mais dashermenuticas clssicas do sculo XIX (Hegel, Dilhey, Marx, Freud) ouseus herdeiros do sculo XX; 2) advogam uma teoria filolgicaneohumboldtiana da linguagem ultimamente reelaborada e refinada porGadamer e Ricoeur, ou ento 3) subscrevem abertamente a teoria ps-saussuriana do signo lingstico, dos quais so expoentes, ainda que deforma diferenciada Foucault e Derrida (WHITE, 1990:187-8).

    Neste registro, pode-se ponderar que, a seu modo, Pocock e Skinner quando

    subsumem as criaes individuais a um contexto maior, no deixam de ter sua

    utilidade para a histria intelectual e para a prpria histria da historiografia (Cf.

    JASMIN & FERES JNIOR, 2007). Evidentemente, preciso considerar as crticas de

    David Harlan ao chamado contextualismo, sobretudo em Skinner, com sua

    hermenutica de fundo romntico ancorada na proposta terica de resgate das

    intenes originais do autor (HARLAN, 1989:585). Ponto alto das contribuies

    recentes, sem dvida devem ser localizados tanto em Koselleck, quanto em JrnRsen, visto ambos terem dedicado estudos ao problema da historiografia e de

    como deve ser subsumido anlise da conscincia histrica (KOSELLECK, 2003,

    RSEN, 2008). Como se v, o exerccio de crtica historiogrfica a respeito da

    histria da historiografia no algo fcil. Embora existam trabalhos clssicos1 a

    tarefa apresenta algumas dificuldades, sobretudo acerca da melhor maneira de

    avaliar o sentido e o efeito produzido pelas obras. Acrescente-se a os problemas

    inerentes de crtica, ou anlise. Ou, como nas palavras de Barthes:

    A crtica funciona ordinariamente (no uma censura), quer aomicroscpio (esclarecendo com pacincia cada pormenor filolgico,autobiogrfico ou psicolgico da obra), quer ao telescpio (perscrutandoo grande espao histrico que envolve o autor) (2004:27).

    1A lista de autores exaustiva, mas, dentre eles se destacam Croce (1953), Momigliano (1993), Gooch(1959), Collingwood (1972) e Iggers (1983) dentre outros.

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    Numa tentativa de sntese eu diria que o debate a respeito da histria da

    historiografia est marcado ora pela nfase na constituio do autor (e da autoria

    sua formao, mestres, conceitos-chave), ora pelo problema da publicao das

    obras (e do que elas querem dizer), ora pelo do seu efeito (sua aplicao em outrasobras), ora pelo recurso contextualizao (pontos de insero e de disperso em

    um determinado lugar e perodo, ou ainda face s disputas existentes). A

    empreitada se torna ainda mais rdua quando, em meio s diferenas de formao

    e de orientao epistemolgica se procuram identidades que configurem a

    existncia de uma gerao ou de um grupo suprimindo, muitas vezes,

    singularidades, quando no, elidindo a prpria autoria, dissolvendo-a em prticas

    ou em iderios coletivos. O desafio, portanto, o de discutir a experincia daqueles

    historiadores e sua trajetria poltica e historiogrfica para compreender seu

    percurso intelectual no contexto da unificao alem, sem diluir trajetrias

    individuais em uma imagem coletiva, a fim de restituir vida queles historiadores

    embalsamados por clichs, trazendo ao primeiro plano da cena os que foram

    eclipsados pela magnitude de Ranke. Retrat-los no como figuras ingnuas da

    historiografia alem oitocentista ou meros intelectuais conservadores e

    monarquistas, mas como historiadores complexos vivendo em um perodo

    dramtico da histria europia. Em se tratando da apresentao de alguns

    resultados preliminares creio que talvez estes pressupostos no estejam

    plenamente atingidos neste artigo, pois ele apresenta um momento de uma

    pesquisa em andamento, no tendo a pretenso de ser conclusivo.

    O espao de tempo vivido entre 1806 e 1871 crucial para se entender a

    histria alem. Entre a derrota fragorosa em Iena para Napoleo Bonaparte e a

    vitria sobre a Frana e anexao dos territrios de Alscia e Lorena por Otto von

    Bismarck, que marcaram a fundao do Imprio Germnico, ocorreram eventos

    que distinguiram a emergncia do nacionalismo alemo e o comportamento dosestados germnicos em meio ao processo de unificao que seria capitaneado pelo

    Reino da Prssia. A ocupao napolenica marcou a emergncia do nacionalismo e

    o desejo de integrao alem.

    Os excessos da Revoluo Francesa e de Napoleo atiaram osincipientes sentimentos nacionais das pessoas e fizeram-nos irromper

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    em impiedosas labaredas. A nacionalidade tomou o lugar dahumanidade. Ao esforo para se realizar uma cultura humana de carteruniversal, seguiu-se o que visava consolidar uma cultura nacional (...). e aprpria cincia da histria nada hoje com bela desenvoltura na torrentenacional (SCHFER, 1884:I).

    Vale lembrar, contudo, que em 1815 no havia instituies representativas

    na Prssia, mas j as havia na Bavria, em Baden e em Wttemberg. De qualquer

    modo, para a maioria dos historiadores alemes, a dominao napolenica evocou

    o nacionalismo germnico. Breuilly indica que entre 1815 e 1848 teria havido uma

    dominao cooperativa entre austracos e prussianos dos estados germnicos

    (2002:27). No creio. A excluso da ustria do Zolllverein deixa isso muito claro.

    Em termos bem simples, as elites alems em especial, a velha classeagrofeudal em declnio material, inmeros magnatas em ascenso naindstria e nos bancos, e os professores universitrios passaram a se

    ver como guardies do carter especial da nao: pensavam ouimaginavam que a Alemanha estava sendo assediada por um conluio deinimigos externos e, mais importante, de inimigos internos (STERN,2004:13).

    Os historiadores no poderiam fugir a estas demandas. Concomitante a

    estes eventos formava-se a cincia histrica e se constitua uma esfera pblica

    onde comeava a se destacar a figura do intelectual ocupando espao privilegiado

    no cenrio poltico, na burocracia estatal e se projetando junto quela sociedade

    aristocrtica. E muitos destes intelectuais foram, depois de Leopold von Ranke,

    historiadores, tal como Georg Gervinus, Johann Gustav Droysen, Karl Wecker,

    Friedrich Dahlmann, Georg Waitz, Heinrich von Sybel, Maximilian Duncker, Karl

    Rotteck, Ludwig Husser, Theodor Mommsen, Rudolf Haym, Heinrich Treitschke e

    Hermann Baumgarten, que pareciam ter o estudo do passado e a atuao poltica

    no presente como vocaes. A atividade deles foi marcada no somente pelo vivo

    sentimento de agir integrando o pensamento histrico e seus conceitos s palavras

    de ordem usadas na imprensa e na luta poltica, mas tambm por um compromisso

    com determinadas foras e seus projetos polticos. O objeto contemplado, portanto,

    parece ilustrar um expressivo ponto de convergncia no qual histria intelectual,

    histria e historiografia se articulam, numa constelao particular, que projetou

    historiadores e a prpria histria, intelectual e cientificamente, influenciando

    geraes de polticos na Alemanha e tambm de historiadores em toda Europa e

    em vrias partes do mundo. S para se ter uma idia do destaque dos historiadores

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    nesta esfera pblica em formao, basta lembrar que muitos deles foram

    conselheiros polticos, editores de jornais, deputados gerais ou ministros.

    O prprio Ranke no escapou a este processo, pois editou o Politisch-

    historiche Zeitschriftentre 1832 e 1836 a pedido da Casa de Brandemburgo, bemcomo foi conselheiro do rei Frederico IV da Prssia e de Maximiliano I da Baviera

    (BREISACH, 2007:262). O Historisch-Politische Zeitschrift foi criado a pedido do

    conde de Bernstorff, o ministro dos Estrangeiros, que em 1833 tinha duas metas

    claras: combater os radicais liberais de esquerda e afirmar a autoridade do

    governo prussiano face s exigncias do liberalismo poltico (IGGERS, 1983:70). O

    vonem seu sobrenome indica o ttulo de nobreza (baro) por ele obtido em 1865.

    E vale lembrar que suas aulas eram concorridas, freqentadas no somente por

    estudantes, mas tambm por autoridades, militares, polticos, profissionais liberais

    e at integrantes da burocracia prussiana. Nem ele pode fugir do reflexo que as

    guerras napolenicas e depois a Restaurao tiveram sobre a formao do

    nacionalismo (Cf. HOBSBAWM, 1991) que ia ao encontro do interesse crescente

    pelo estudo das razes histricas das diferentes naes europias, o que colocava a

    histria como tematizadora do pensamento social. No por acaso este processo foi

    acompanhado pela presena triunfante do historicismo como um verdadeiro

    paradigma adotado em vrios saberes em formao (MEINECKE, 1997). Ao mesmo

    tempo, nesta nsia pelo vivido, evidentemente que as tcnicas e a natureza da

    prpria histria tambm foram revistas1, explicitando a gnese de uma nova

    conscincia histrica na qual os historiadores redimensionavam suas experincias,

    seus projetos e a historicidade do momento em que viviam. Assim, tanto o passado

    quanto os saberes produzidos sobre ele viveram um despertar epistemolgico que

    pode ser detectado em vrios momentos.

    O primeiro destes momentos a referncia quase obrigatria ao

    pensamento histrico de Chladenius, que em sua Algemeine Geschichtswissenchaftde 1752 havia indicado o percurso metodolgico mais adequado para se estudar o

    passado. Sua obra balizou a crtica e a escrita da histria germnicas ao destacar o

    ponto de vista dos sujeitos histricos e dos historiadores-narradores, revelando

    1 curioso neste sentido ver a hesitao e o uso feito por Ranke do termo Historie em lugar de Geschichte(RANKE, 2010) em muitas passagens de sua obra.

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    que o conhecimento histrico marcado pela crtica, tanto da perspectiva do

    historiador quanto dos testemunhos. O que no significa exatamente a aceitao de

    que os estudos histricos estejam contaminados pela sua subjetividade, mas o

    reconhecimento da existncia da prpria subjetividade, ferramenta imprescindvelpara uma correta compreenso, outro conceito fundamental por ele empregado e

    que seria fundamental na constituio do mtodo histrico posteriormente. A

    crtica dos testemunhos, a compreenso do passado e a busca pela objetividade

    conheceram em Chladenius um crtico veemente do ceticismo ou do relativismo na

    Histria.

    O segundo momento reside na obra de Barthold Niebuhr, sobretudo

    sua Histria romana, na qual desenvolveu inovadoras tcnicas de crtica histrica

    documental, buscando evitar tanto o anacronismo quanto a reproduo acrtica do

    que diziam os documentos. Partindo dos avanos recentes tanto da filologia quanto

    da hermenutica, Niebuhr indicou para os historiadores duas operaes

    fundamentais da histria: a heurstica e a sistemtica. Sua contribuio enorme,

    bem como a repercusso de suas pesquisas; basta ver seu reconhecimento por

    Ranke e Droysen; ambos revelam sua dvida metodolgica a Niebuhr, que

    realmente constituiu um momento de inflexo nas tcnicas de pesquisa histrica

    na Alemanha. Essa tradio veio, sobretudo, da escola filolgica de Gttingen, que

    promoveu o exame crtico e rigoroso dos clssicos antigos e das fontes,

    preconizada por Wolf e Bckh. Este ltimo foi o orientador de Droysen em seu

    doutorado. Junto com Wolf foram responsveis pela disseminao da filologia e

    tambm expressavam a valorizao pelos Estudos Clssicos no interior do

    pensamento germnico, ao lado de nomes como Schleiermacher, Schelling, Schiller

    ou Humboldt.

    O terceiro momento surgiu com Wilhelm von Humboldt e, para ser mais

    preciso, com sua conferncia inaugural proferida em 1821 na Universidade deBerlim: A tarefa dos historiadores. Ali se encontra a agenda cientfica dos

    historiadores prussianos, seu programa fundamental, adotado como referncia por

    toda aquela gerao. Competiria ao historiador reunir os fatos, procurando seus

    nexos, identificando suas foras motrizes e reproduzindo-os por meio de uma

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    exposio narrativa. Nada poderia ser mais claro. Caberia ao historiador seguir

    procedimentos cientficos e no abandonar a atividade criadora em seu ofcio.

    Propagador do historicismo, Humboldt foi, ao lado de Chladenius e de Niebuhr,

    uma das maiores influncias sobre o pensamento de Ranke e de sua gerao. Seunome ficou associado Universidade de Berlim, capitaneada a um dos centros

    nevrlgicos do pensamento germnico, cujo programa e organizao foram por ele

    reformulados tornando-se referncia para reformas universitrias posteriores.

    Lecionar em Berlim era meta almejada por muitos professores de ento. Aquela

    universidade, sobretudo graas a Ranke e a Hegel, tinha seus postos cobiados por

    todo historiador ou filsofo que desejasse ter projeo em sua rea, tornando-se

    um plo irradiador de novas doutrinas, e eles tiveram o mrito de serem

    consagrados em vida no s na Alemanha, mas em toda Europa.

    Um quarto momento corresponde ao desenvolvimento dos trabalhos de

    Ranke e Droysen junto Universidade de Berlim: definindo a relao entre teoria e

    prtica do novo saber. O modo como Ranke escolhia seus objetos de estudo, a

    forma como submetia as informaes crtica, bem como suas narrativas

    profundamente articuladas e expressivas conferiram-lhe uma posio de destaque.

    Mas ao seu lado havia outro gigante, Droysen, responsvel por desenvolver uma

    verdadeira teoria da histria que consolidou o campo epistemologicamente,

    dotando-o da autonomia necessria face aos demais saberes que o destacou

    perante sua gerao. Ao que tudo indica, embora cioso do mtodo, interessava

    mais a Ranke a prtica, a pesquisa e a escrita da histria, ao contrrio de Droysen,

    que embora tenha escrito obras histricas absolutamente rigorosas e fosse

    excelente pesquisador, teve maior e notvel xito com suas reflexes de ordem

    terica. Junto-os aqui, no somente porque foram contemporneos, ou porque

    constituem a expresso maior do pensamento histrico germnico naquele

    perodo, mas tambm porque, embora fossem rivais e no tivessem uma boaconvivncia em Berlim, suas obras se complementam e referendam os

    fundamentos da operao historiogrfica de ento.

    Um dos debates permanentes em relao histria prosseguia, qual seja, o

    de se vincular a narrativa histrica aos domnios dos estudos literrios. E foi para

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    resolver esse conflito de fronteiras que Gervinus em seu Fundamentos de teoria da

    histria, redigido em 1837, analisou a potica da histria, estipulando os elementos

    constitutivos da narrativa histrica, distinguindo-a das narrativas ficcionais. Para

    alm disso, props um modelo sugestivo para se analisar a histria dahistoriografia ocidental bem como para se definir alguns gneros existentes na

    escrita da histria. Este corresponde a um quinto momento, visto distinguir a

    narrativa histrica da ficcional de uma vez por todas, e pensar a histria como um

    gnero hbrido, mas especfico, conferindo assim, um modelo gentico de anlise

    da historiografia. Pela primeira vez havia discutido com profundidade o problema

    da escrita da histria, bem como havia exposto um novo modo de pensar a prpria

    histria da histria.

    O ltimo momento, a meu ver, reside na criao da revista Historische

    Zeitschrift (Estudos Histricos) em 1859 por Heinrich von Sybel, pupilo e discpulo

    de Ranke na Universidade de Berlim e amigo de Droysen desde as jornadas de

    maio de 1848 em Frankfurt. Ali se consubstanciou o que procurarei defender como

    sendo a efetivao de uma nova escola histrica e a constituio de um regime de

    historicidade particular para a escrita da histria na Prssia. Ela coroa todo o

    processo de formao e maturao de um tipo de histria e surge quando as

    manifestaes pr-unificao alem se ampliaram, sobretudo na Prssia, contando

    com a participao de muitos daqueles historiadores. Sem dvida a Historische

    Zeitschrift foi um ponto de encontro, propagador das idias do grupo, projetando-o

    na Alemanha e no exterior. Sua influncia explcita na Inglaterra, Itlia, Espanha e

    nos Estados Unidos, foi, mais velada na Frana1. Ao lado da revista, foroso dizer

    que a editora Duncker & Humblot, tornou-se tambm uma referncia para o grupo,

    uma das maiores na Alemanha, cujo nascimento se deu auspiciosamente com a

    criao da revista Athenaeum, publicada pelos irmos Schlegel e que depois se

    projetou com a publicao das obras completas de Hegel e de Ranke. Nesta editorafiguraram grandes obras produzidas pelo grupo.

    Ao tratar da Escola Histria Prussiana, Robert Southard (1995) revela que

    para nascer ela teve que superar o interdito rankeano: o no-envolvimento direto

    1Embora seus livros sejam sempre lidos, alguns traduzidos e seus nomes sempre lembrados porCoulanges, por Monod, por Seignobos.

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    do historiador nos assuntos da poltica. Acredito, ao contrrio, que a influncia de

    Ranke tinha indicado que o intelectual ou historiador no somente aquele que

    precisa se envolver diretamente nos acontecimentos polticos de seu tempo, mas

    cujo pensamento pode ser uma fora capaz de produzir ao poltica no presente.Seja subsidiando ou sendo subsidiado por um determinado projeto poltico, seja

    imprimindo seus postulados nos acontecimentos do presente, seja agindo para

    refutar projetos ou postulados existentes. preciso ainda lembrar que as

    universidades alems eram instituies estatais e que os graduados comeavam a

    ocupar um lugar especial naquela sociedade. O Cdigo Geral Prussiano havia

    includo na sua classificao dos grupos sociais, alm das tradicionais nobreza,

    burguesia e campesinato os servidores do Estado, incluindo nesta rubrica os

    diplomados1. Escolas e as universidades, afirmava o Cdigo, eram instituies do

    Estado e s podiam ser fundadas com autorizao oficial (RINGER, 1999, 37).

    Aquelas universidades passavam por um perodo de grande renovao nos estudos

    e nas disciplinas. Em Gttingen, o neohumanismo enfatizava o apreo pela cultura

    clssica, pelas razes culturais germnicas e pelos estudos filolgicos. Em Halle

    surgia uma nova universidade, voltada para cursos mais tcnicos e para as cincias

    aplicadas, como o Direito, a Administrao e a Economia. Tratando daquelas

    universidades dir Ringer que na corte de Weimar e na Universidade de Jena,

    cidade vizinha, quinze anos brilhantes reuniram algumas das principais figuras do

    renascimento cultural alemo (RINGER, 1999, p.35), como Schiller, Fichte, Hegel.

    A prpria Universidade de Berlim, que se destacava agora como o centro

    nevrlgico prussiano, superando Praga2, Frankfurt, Gttingen e Leipzig, expressava

    o ideal de uma nova universidade, servindo de modelo para as futuras

    universidades alems, que alterariam seus estatutos tendo-a como referncia

    (Ringer, 1999, 39). Mas estas novidades se adaptavam a uma sociedade

    aristocrtica, onde estes professores eram transformados em conselheiros,Geheimrte, e vistos como leais e eminentes servidores do Estado (RINGER, 1999,

    1Allgemeines Landrecht fr die preussischen Staaten, parte II, tt.VII-X, 1794.2Viena e Praga foram em alguns momentos, a capital do imprio germnico. A ascenso de Berlimfoi recente e est relacionada com a ascenso dos Hohenzollern. Graas s conquistas internas eexternas e tambm habilidade diplomtica desta dinastia, Berlim se equiparou a Paris e aLondres, entre os sculos XVIII e XIX (ELIAS, 1997: 22).

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    51). Penso que esta leitura desmistifica a possibilidade de uma atuao livre e

    apartidria. Afinal a adeso dos docentes era obtida por meio de um instrumento:

    o doloroso processo de habilitao dos candidatos a professores efetivos nas

    universidades alems. Os professores tinham seu passado esquadrinhado pelosHabilitationsschrift antes de serem admitidos, sobretudo depois de 1871. Este

    sistema de recrutamento permaneceu essencialmente intacto at 1945 (IGGERS,

    1983:25). De qualquer modo, o interesse pelas questes do momento levaram

    criao de vrias cadeiras de histria contempornea, que atraam grande pblico,

    desviando os historiadores da cincia para a atuao poltica, cadeiras estas

    ocupadas por historiadores como Droysen, Sybel ou Gervinus, dentre outros. E o

    estudo da histria poltica conduzia cada vez mais rejeio da possibilidade de

    uma tica racional de direitos e valores universais, comum a todos os homens, pois

    cada vez mais era vinculada a situaes histricas especficas1. Vale lembrar que a

    histria disputava com a moral, a poltica e a filosofia o papel de norteadora da

    ao poltica. De qualquer modo, diz Mommsen

    O intelectual alemo tambm se pode vangloriar do que a cincia trouxede benefcio do povo (...) o desempenho individual de cada um de ns,em comparao com o todo, de tal forma nfimo que aparece como umsoldado no campo da batalha em que combateu (...) Muito antes de asarmas alems ganharem nos campos de batalha, a pesquisa alem, emseus campos, conquistou o conhecimento e forou nossos vizinhos a

    aprender nossa lngua. (MOMMSEN, Apud MARTINS, 2010, p.114-5).

    E precisamente esta relao entre histria, filosofia e poltica que

    distinguiriam as escolas histricas que se formaram na Alemanha oitocentista,

    afinal elas no se limitaram Ranke ou a sua obra como querem alguns

    intrpretes, tampouco constituam uma identidade absoluta entre todos aqueles

    historiadores. Os prprios alemes chegam a reconhecer a existncia de vrias

    escolas: a escola Rankeana e Humboldtiana, a escola de Niebuhr (que exerceu

    enorme influncia na Frana e veio a se reforar com o manual de Ernst

    Bernheim), a escola filolgica de Bckh e de Grimm, a escola romntica de Goethe e

    Novalis, a escola histrica do Direito de von Savigny e, finalmente, a Escola

    Histrica prussiana (cf. MARTINS, 2008, p.; cf GOOCH, 1959). Em que se

    1 Exemplos disso seriam as justificativas dadas por Mommsen e Sybel sobre os direitos daAlemanha sobre a Alscia e Lorena, em textos onde a ao poltica era justificada pela histria.

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    distinguiam? Que peculiaridades existem, por exemplo, em relao aos herdeiros

    de Ranke e ao grupo dos historiadores capitaneados por Gervinus e Droysen?

    Penso que foi, sobretudo, a intrnseca relao que estabeleceram entre pesquisa e

    postura intelectual, entre pensamento e ao, entre cincia e poltica. At porque notvel a herana terica e metodolgica comum bem como a atmosfera de

    respeito e reverncias mtuas entre os seguidores de Ranke e os integrantes da

    Escola Histrica. Desafetos haviam, rivalidades tambm, como entre Ranke e

    Droysen, entre Mommsen e Treitschke, ou entre Sybel e Waitz. Mas, o grupo

    assentava-se sobre uma herana epistemolgica comum; foi marcado pelo

    historicismo de Humboldt e de Ranke, pela reao ao idealismo hegeliano e pela

    absoro de procedimentos hermenuticos e filolgicos na composio do mtodo

    a crtica documental buscada em Niebuhr. Defendiam a atualidade de Aristteles

    cujo pensamento visto com respeito , muitos publicaram tradues, redigiram

    obras voltadas para a poltica e a histria do tempo presente, engajaram-se em

    lutas na imprensa peridica, participaram diretamente na vida pblica se

    envolvendo no nacionalismo emergente publicando textos de carter poltico-

    nacionalista , propagando o ideal da Kleindeutsch durante e aps as jornadas de

    1848 alm de preconizar um fundamento axiolgico orientado pela defesa da

    objetividade. Em sua maioria eram protestantes, defensores da monarquia

    constitucional, integravam-se s fileiras dos liberais moderados

    constitucionalistas, no condenaram as guerras de unificao capitaneadas por

    Bismarck (salvo Gervinus e Mommsen) e, por fim, escreveram obras de histria do

    tempo presente. Em resumo, mantinham atmosfera de respeito s escolas

    germnicas de pensamento existentes hermenutica, filolgica e filosfica , que

    eram vistas como coadjutoras na fundamentao da Histria, com um esforo

    terico semelhante e mediante o recurso a procedimentos metodolgicos comuns.

    Para Fritz Stern,Encontramos ncleos de excelncia nas vidas de alguns de seusindivduos representativos; eram imbudos de uma f na cincia queainda era inocente, uma f semelhante a uma religio. Eram protegidospor laos de amizade, tinham o apoio de uma sociedade disciplinada,moviam-se por ambio organizada e contavam com um sistemaeducacional sem igual. A cincia alem e a sociedade alem eramprofundamente interligadas (STERN, 2004:12).

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    Comprova-se assim a existncia de um processo de institucionalizao da

    disciplina histrica em curso, marcado por lugares e tambm por regras que

    definiam a cincia histrica exercitada. Em relao escrita da histria, maiores

    estudos so ainda necessrios para aquilatar o nvel de suas semelhanas ediferenas no que concerne aos aspectos figurativos, estilsticos, retricos e

    narrativos das obras.

    Fortes indcios subsumem seu surgimento em meio a uma crise da

    conscincia histrica europia, vivida desde a Restaurao e marcando o

    pensamento e a poltica oitocentistas. No ocioso, portanto, examinar a atuao

    daqueles historiadores como atores histricos. Em primeiro lugar queriam

    reformas, ademais, do incio do sculo XIX at meados de 1848 buscavam algo

    novo. Creio haver uma compreenso entre eles sobre a necessidade da formao

    de novos homens para uma nova Alemanha, incutida no papel que muitas vezes

    atribuam Bildung, embora isso no fosse algo homogneo. Esses novos homens,

    singularizados na figura do intelectual, contudo, precisavam conviver com uma

    velha poltica. Na crise da experincia histrica vivida, construram novos projetos

    polticos alguns j haviam sido potencializados na literatura , reavaliaram suas

    tradies culturais, mas encontraram muitos obstculos em relao ao poltica,

    revelando uma sensvel tenso em curso entre a sociedade, a burocracia

    administrativa e os governos aristocrticos germnicos. Assim, embora algumas

    experincias fossem questionadas, havia dificuldade em romper determinadas

    orientaes poltico-monrquicas e tambm religiosas. Nem todas as tradies,

    portanto, estavam permeveis s mudanas em curso. Isto talvez explique o triunfo

    da excessiva moderao, bem como, da persistncia do conservadorismo.

    Do ponto de vista poltico, de modo semelhante ao Brasil, os liberais

    moderados desejavam reformas, pois viam com reservas a revoluo ou o

    princpio democrtico. Igualmente no defendiam a igualdade absoluta entre oshomens. Lutavam, contudo, pela consolidao de uma esfera pblica cujo debate

    jornalstico bastante expressivo, mas que enfrentava o poder estatal e as

    retaliaes polticas que se valia de instrumentos como a censura, a demisso ou

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    a priso1. Em uma atmosfera profundamente autoritria, pouco espao era

    conferido ao princpio democrtico. Assim, liberais radicais, comunistas e

    socialistas eram quase sempre resumidos condio de anarquistas ou de

    perturbadores da ordem vigente. Nesta condio sofriam ameaas de priso oueram forados ao exlio.

    Pode-se dizer que o nascimento do historiador na Alemanha coincidiu com

    a constituio deste saber e destes intelectuais, ao lado da construo do estado

    Alemo, cujo passo inicial pode ser localizado na criao doZollvereinem 1834, e

    depois atravs de alianas poltico-militares que viabilizaram as guerras de

    unificao sob a liderana da Prssia. Durante este processo, muitos historiadores

    viram-se integrados no esforo de construo do novo Estado, integrando-se

    burocracia ou ao servio pblico, realizando misses diplomticas, exercendo a

    docncia e a pesquisa e atuando como funcionrios ou como conselheiros. Ou seja,

    foram intelectuais de projeo em sua sociedade, ao lado de juristas, economistas,

    polticos e filsofos, mas que orbitavam em torno do Estado. Como foi exposto

    anteriormente, nem o apartidrioRanke escapou a isso. De maneira mais explcita

    os historiadores da Escola Histrica no viam problemas em integrar escritos

    polticos de ocasio com estudos sobre o tempo presente ou histria do passado.

    Eles percebiam uma relao intrnseca entre as motivaes do presente com a

    investigao histrica, entre a compreenso terica do estudo das sociedades no

    passado e a motivao para a ao poltica no presente, subsumidas a uma marcha,

    ilustrada pela Histria e pela prpria trajetria nacional alem, escamoteando

    pretenses universais, pois a defesa das singularidades da histria alem no

    obliterava a ambio que tinham de escrever uma histria mundial, na qual a

    Alemanha ocupava uma posio de destaque.

    Curiosamente, os historiadores germnicos do sculo XIX pareciam inverter

    a frmula de Koselleck: alimentavam muitas expectativas do passado, cujaexperincia histrica redescobriam cada vez mais graas consulta de fontes

    nunca manuseadas e ao recurso crtica documental que possibilitava uma nova

    1Foi o caso de Gervinus, por exemplo, que teve obra censurada e ameaa de priso, de Dahlmannque tambm foi preso, da perseguio de Droysen na Dinamarca. Ou ainda Karl Wecker que perdeusua cadeira na universidade por questionar o Parlamento de Baden.

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    escrita da histria; e recorriam a esta experincia do passado a fim de encontrar

    uma conexo nos eventos verificados no presente e no futuro. Ou seja, projetavam

    o passado no futuro. Afinal, a histria no era mestra da vida, mas expressava

    foras histricas permanentes que se configuravam de maneira singular em cadapoca e em cada povo. Nos eventos polticos verificavam uma soma em curso, cuja

    tendncia e at mesmo cuja essncia era universal. Tomavam os estudos do

    passado como uma referncia para pensar a atuao nos acontecimentos polticos

    vivenciados no presente, vislumbravam a presena de foras histricas, de idias

    que se materializavam em diferentes sociedades, que possuam um sentido que se

    sentiam capazes de analisar. O que comprova a seduo do pensamento de Hegel, a

    imprimir um forte teor teleolgico na leitura que muitos faziam a despeito de

    resistncias. Foras histricas impeliam o agir humano e este possua uma essncia

    a se realizar, materializada de maneira incompleta em diferentes experincias

    histricas do passado e do presente. O sculo XIX, contudo, trazia novamente a

    possibilidade de tentar concretizar esse ideal, embora soubessem, por sua prpria

    experincia, que isso poderia ou no ser realizado de imediato. A seu modo

    colaboraram para repensar o mito leibziniano de que viviam no melhor dos

    mundos possveis, em uma poca dourada para o pensamento e para a cultura

    germnica. Aps 1848 e, sobretudo, com o incio das guerras de unificao essa

    imagem ganhou fora ainda maior, embora convivesse com vozes dissonantes.

    Mais uma vez, revela Mommsen,

    Por certo temos tambm o orgulho de ser alemes, e disso no nosencabulamos. De todas as ostentaes, nenhuma mais vazia e falsa doque a da modstia alem. Nada temos de modestos, no o queremos ser enem que se diga que o somos (...). No entanto, mesmo se nos declaramosnada modestos, no nos tornamos por isso cegos. (MOMMSEN ApudMARTINS, 2010: 113).

    As manifestaes nacionalistas ganhavam mpeto e exprimiam o desejo de

    formao de um Imprio Germnico, uma monarquia constitucional sob o governodos Hohenzollern, ou seja, sob a liderana da Prssia e a excluso da ustria.

    Aqueles historiadores viam a histria como um processo complexo, no como uma

    relao de causalidade, mas como constelaes de eventos marcados pela ao de

    foras histricas, tendo um sentido: a realizao da liberdade ou ainda da

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    consumao da grande obra divina. Nisso fundiam convices polticas e religiosas.

    Este ltimo aspecto no ser destacado aqui. Mas, a liberdade era, para eles, um

    conceito complexo. Sua idia de liberdade estava fundada sobre velhas tradies

    nacionais e entendia a autoridade real e o poder estatal como historicamenteassociados e no como anttese livre poltica. Mas essa percepo tinha matizes

    nos diferentes Estados 39 ao todo que compunham a Confederao Germnica.

    Com a Unificao Alem liderada por Bismarck (1866-1871), novamente

    potencializou-se o otimismo germnico, afinal, depois da Revoluo Francesa e das

    revolues de 1820 e 1830, tambm a Alemanha parecia realizar os desgnios

    histricos da humanidade. Essa impresso era sensvel em muitos daqueles

    historiadores. E imprimiu neles, por conseguinte, a nfase e o engajamento nos

    acontecimentos. Em 1848 era preciso agir, seja para impedir a anarquia e os

    excessos, seja para dar a direo aos eventos. Mas, derrotadas em uma atmosfera

    reformista a palavra de ordem para o momento foi, sem dvida, moderao. Muitos

    historiadores engajaram-se na crtica da realidade poltico-social alem, tomando,

    declaradamente, partido, em franca oposio ao mestre Ranke. S no pareciam se

    lembrar de que, em 1792, a Prssia havia lutado contra os revolucionrios

    franceses, tentando parar a revoluo. Sobre aquela sociedade diz Norbert Elias:

    O Estado Hohenzollern tinha todas as caractersticas de um Estado

    militar que se erguera atravs de guerras vitoriosas. Seus dirigentesreconheciam a necessidade de crescente industrializao e, lato sensu, decrescente modernizao. Mas os industriais burgueses e os donos docapital no formavam o estrato superior que governava o pas. A posioda nobreza militar e burocrtica, como o estrato mais elevado epoderoso da sociedade foi no s preservada, mas tambm fortalecidapela vitria de 1871. Uma boa parte da classe mdia, mas no toda ela,adaptou-se com relativa rapidez a estas condies. Seus membrosencaixaram-se na ordem social do Kaiserreich como representantes deuma classe de segunda categoria, como subordinados (ELIAS, 1997:26).

    A seguir, vejamos um perfil geral daqueles historiadores integrantes da

    Escola Histrica Prussiana e que tiveram ou exerceram alguma funo poltica

    destacada no perodo entre 1848-1871 apresentado no Quadro 1 e que

    colaboraram na Historische Zeitschrift. Alguns deles integraram o Partido do

    Cassino, nome do hotel e restaurante onde se encontravam, onde defendiam a

    Kleindeutsch, a unificao, o Estado de direito, baseado na constituio; no qual

    pediam rgos representativos eleitos pelos distritos dos estados tradicionais e

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    advogavam a igualdade perante a lei e o fim das restries, como por exemplo aos

    judeus. Alguns deles integraram, nos anos 1860, o Partido Nacional Liberal

    (IGGERS, 1983:93). De um modo geral rejeitavam a filosofia da histria de Hegel, a

    teoria da lei natural, a primazia do indivduo em seu lugar colocaram as forashistricas que produziam o Estado e os indivduos. Acreditavam no progresso. E

    entendiam que o poder no somente fora, mas tambm um princpio tico.

    Entre os 830 deputados da Assemblia de Frankfurt em 1848-9, havia

    apenas um trabalhador e um campons, 49 professores universitrios, 57

    professores escolares, 157 magistrados, 66 advogados, 20 prefeitos, 118

    funcionrios pblicos, 18 mdicos, 43 escritores, 16 pastores e 16 padres. No total,

    pelo menos 550 tinham diplomas de curso superior, perto de 20% eram

    professores universitrios, 35% funcionrios pblicos, 17% advogados (HUBER,

    1960: v.2, 611). No total, 11 eram historiadores. A essncia dos trabalhos revelou-

    se como a unidade pela persuaso (TAYLOR, 1945:76). Soldados do rei

    protegiam os trabalhos. O nacionalismo tcheco da Bohemia conturbou a paz da

    assemblia. E tambm a guerra em Schleswig-Holstein. Em 1850 a ustria

    derrotou tropas bvaras e prussianas em Hesse (Olmutz), em retaliao foi

    novamente recusada no Zollverein; posteriormente, a guerra com a Frana, em

    1859, e a unificao italiana colocaram em xeque a hegemonia austraca. Tem

    incio a expanso da supremacia prussiana, cuja hegemonia pode ser ilustrada pela

    famosa frase proferida em 8 de outubro de 1862, pelo primeiro ministro

    prussiano, Bismarck: os problemas atuais no sero resolvidos por maioria de

    votos este foi o erro dos homens de 1848 e 1849 mas por sangue e ferro (Apud

    TAYLOR, 1945:101).

    O desejo de participao e de maiores liberdades polticas manifestou-se no

    Parlamento de Frankfurt, mas as divises internas entre os parlamentares facilitou

    a recomposio das foras aristocrticas, culminando na sua dissoluo em junhode 1849 e na recusa da coroa do Imprio por Frederico IV. Na Assemblia valores

    liberais predominaram, por exemplo, a separao entre igreja e Estado, a

    independncia do judicirio, a instituio do habeas corpus, a abolio da pena de

    morte (BREUILLY, 2002:45). O grande dilema era entre autoridade nacional de

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    base popular? e autoridade estatal, afinal os prncipes germnicos indicavam os

    ministros em seus Estados. No obstante, as tendncias revolucionrias foram

    esmagadas, os mpetos liberais refreados e a disputa pela hegemonia face aos

    estados germnicos foi resolvida em 1866 na Guerra das Sete Semanas entrePrssia e ustria. Ali se formou a Confederao Alem do Norte, por Otto von

    Bismarck, o Reichstag foi inaugurado em fevereiro de 1867 e a Guerra Franco-

    Prussiana de 1870-1 selou a criao do Imprio, a integrao dos Estados do sul e,

    consequentemente, a unificao.

    No Quadro 1 esto relacionados alguns historiadores alemes do perodo

    que, alm de obras histricas, produziram textos polticos ou exerceram alguma

    atividade poltica importante no perodo estudado. Ele apresenta alguns resultados

    parciais da pesquisa que desenvolvo. Nele relaciono datas de nascimento e morte,

    cidade natal, curso estudado, universidades freqentadas, amigos ou mestres de

    relao mais estreita, universidades onde atuaram, cargos legislativos, outros

    cargos, publicaes de carter poltico e obras histricas. Encontram-se

    relacionados apenas 31 historiadores; s para se ter uma idia na Historische

    Zeitschrift so 273 ao todo que colaboraram enviando 783 artigos entre 1859 e

    1900; mas eles permitem fazer uma radiografia elucidativa dos historiadores e da

    historiografia alem oitocentista. Ao todo, 11 tinham ttulos de nobreza.

    Em primeiro lugar, nem todos eram prussianos, muitos nasceram em outros

    Estados germnicos. Do mesmo modo embora os protestantes fossem a maioria,

    possvel localizar judeus e catlicos atuando dentro do grupo. Uma outra

    caracterstica a presena de pelo menos trs geraes de historiadores: a

    primeira composta por membros como Ranke, Waitz, Gervinus e Droysen; uma

    segunda composta por Sybel, Mommsen, Duncker e Husser; e, a ltima, composta

    pela gerao de Treitschke, Oncken, Waschsmut e outros. Esta ltima gerao

    representa o arrefecimento da hegemonia historiogrfica exercida pelas duasprimeiras geraes, com um afastamento bem maior do paradigma rankeano.

    Aspecto decisivo da formao revela que alguns universidades eram preferidas e

    que era comum estudos desenvolvidos em mais de uma instituio. como se

    buscassem em cada universidade os melhores cursos desejados, ou ainda como se

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    Revista de Teoria da Histria Ano 1, Nmero 3, junho/ 2010 Universidade Federal de GoisISSN: 2175-5892

    41

    deixassem os estudos iniciais em sua cidade natal e seguissem para outros centros

    mais especializados. Histria o curso mais freqentado pelo grupo relacionado,

    seguido por filologia, filosofia e direito. Berlim e Heidelberg so as universidades

    mais apreciadas, seguidas por Freiburg, Gttingen, Leipzig e Bonn.Os vnculos de amizade e afinidades pessoais dentro do grupo bastante

    heterogneo, embora Ranke, Sybel, Gervinus, Droysen Husser e Dahlmann fossem

    figuras de destaque junto aos demais, surgindo em vrias biografias na condio de

    mestres, supervisores de estudos e projetos merecedores de crdito e gratido.

    Alm de algumas biografias foram consultadas enciclopdias de autores alemes

    para localizar os dados apresentados no quadro. Aqueles historiadores lecionaram

    em diferentes universidades, embora seja possvel verificar que os que se

    destacaram no campo costumavam ocupar cadeiras em Berlim, Heidelberg, Bonn

    ou Gttingen. Entre os relacionados, 11 foram deputados no Parlamento em

    Frankfurt de 1849, 13 foram deputados em seus Estados e 10 foram deputados no

    Parlamento Nacional aps 1871, o que indica uma intensa atividade poltica por

    parte dos historiadores. No por acaso, muitos foram conselheiros de reis e

    prncipes germnicos, seis foram reitores de universidades e scios ou integrantes

    de academias e sociedades cientficas.

    Em relao imprensa, 15 foram editores de jornais, a metade do conjunto

    recortado, bem como escreviam em jornais, ao lado de outros dois que apenas

    escreviam na imprensa peridica sem chegar direo. J a produo

    historiogrfica do conjunto no est definidamente indicada, faltando relacionar

    algumas obras, embora possa ser dito que sua principal marca so histrias

    nacionais, estudos sobre a histria do tempo presente e biografias. Idade Mdia e

    Era Moderna eram dois perodos bastante apreciados ao lado de histria recente.

    Mas aqui ainda so necessrios maiores levantamentos para afirmaes mais

    conclusivas.

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    Revista de Teoria da Histria Ano 1, Nmero 3, junho/ 2010 Universidade Federal de GoisISSN: 2175-5892

    42

    Quadro 1. Alguns Historiadores Alemes Do Sculo XIX Envolvidos Em Assuntos De Natureza Poltica.NOME VIDA CIDADE

    NATAL

    FORMAO UNIVERSIDADE MESTRES/

    AMIGOS

    LECIONOU CARGOS

    LEGISLATIVOS

    OUTROS CARGOS OBRAS POLTICAS OU

    JORNAIS

    OBRAS HISTRICAS

    Karl von ROTTECK 1775-1840 Freiburg Direito Freiburg Johann Jacobi Freiburg Parlamento de

    Baden

    Presidente da Cmara

    e Conselheiro em

    Freiburg, pr-reitor da

    Universidade de

    Freiburg

    Editor do jornal O Liberal Histria Geral, Staatslexikon

    Karl Theodor Georg P.

    WELCKER

    1790-1869 Oberofleide

    n HolbergOhm

    Direito e

    CinciaPoltica

    Giessen e

    Heidelberg

    Dahlmann,

    Droysene Gervinus

    Giessen, Kiel,

    Bonn eFreiburg

    Parlamento de

    Baden, Parlamentode Frankfurt

    Editor do jornal

    O liberal independente,

    Staatslexikon

    RudolfHAYM 1821-1901 Grnberg Teologia e

    filologia

    Halle e

    Berlim

    Duncker Halle Parlamento de

    Frankfurt

    Discursos e palestrantes

    do primeiro prussiano

    Unidos Diet, A Assembleia

    Nacional Alem, editor do

    Preuische Jahrbcher,

    Hallesche Algmeneine

    Literatur Zeitung,

    National Zeitung

    Hegel e seu tempo, A escola

    romntica,

    Herder e sua vida.

    Georg WAITZ 1813-1886 Flensburg Filosofia e

    direito

    Kiel e Berlim Ranke

    e Schelling

    Kiel e

    Gttingen

    Assemblia de

    Schleswig-Holstein,

    Parlamento de

    Frankfurt

    Monumenta

    Germaniae Histrica

    Rotteck-Welcker-Staatslexikon,

    Grundzge der Politik,

    Histria constitucional alem,Forschungen zur deutschen

    Geschichte, Histria de Schleswig-

    Holstein.

    Friedrich von

    HERMANN

    1795-1868 Dinkelsbhl Direito-

    economia

    Erlangen Ranke Munique Parlamento de

    Frankfurt

    Conselheiro dos reis

    Maximiliano I e II da

    Baviera, Conselho de

    Estado da Baviera,

    Academia Bvara deCincias

    Estudos dos ativos estatais

    econmicos, comerciais, renda e

    consumo.

    R einh ol d P AUL I 1823 -188 2 Be rl im F ilo lo gia e

    histria

    Bonn e Berlim Da hlmann e

    Ranke

    Bonn,

    Marburg,

    Gttingen

    Secretaria da

    embaixada emLondres

    Wrttemberg e o desastre

    federal

    Histria dos documentos

    hanseticos, Ensaios sobre a

    histria da Inglaterra

    Georg VOIGT 1827-1891 Konigsberg Histria Konigsberg Drumman e

    Von Sybel

    Rosttock,

    Leipzig

    Membro da Associao

    Comercial de Leipzig,

    Academia de Cincias

    da Baviera, Sociedade

    de Leipzig, Academia

    de cincias de Viena

    Jornal Cultural O Renascimento na Antiguidade

    Clssica

    Wilhelm ONCKEN 1838-1905 Heidelberg Filologia,

    histria e

    filosofia

    Heidelberg,

    Gttingen e Berlin

    Husser Heidelberg Parlamento de

    Hesse e Nacional

    Reitor da universidade

    de Giessen

    Histria Geral 44v., a Era da

    Revoluo do imprio guerra

    de libertao, A Era do Imperador

    Wilhelm I, Frederico o Grande.

    F rie drich DAHL MANN 1785 -186 0 Wismar F ilo sofia C ope nha gen e Hal le Wo lff,

    Von Kleist,

    Gervinus,

    Welcker

    Kiel,

    Gttingen,

    Iena, Bonn

    Parlamento de

    Frankfurt 1848,

    Parlamento de

    Erfurt

    Secretrio da cavalaria

    em Schleswig Holstein,

    Lder da revolta dos

    Sete

    Poltica, reduzida ao grau

    e medida das condies

    existentes.

    Fontes para o estudo da histria

    alem, Histria da Dinamarca,

    Histria da revoluo inglesa,

    Histria da Revoluo Francesa

    Maximilian DUNCKER 1811-1886 Berlin Histria, Berlim e Bonn Droysen, Halle , Parlamento de Diretor dos Arquivos Preussische Histria do Parlamento de

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    Revista de Teoria da Histria Ano 1, Nmero 3, junho/ 2010 Universidade Federal de GoisISSN: 2175-5892

    43

    filosofia e

    filologia

    Haym e

    von Sybel

    Tubingen, Hesse, Parlamento

    de Frankfurt,

    Membro do

    Parlamento

    Nacional em 1867

    Prussianos, Ministro

    dos Estrangeiros em

    1860, conselheiro de

    Frederico III,

    6 meses preso por

    participar de

    fraternidade, Academia

    Prussiana de Cincias,

    Academia de Gttingen

    Staatsschriften, Hallesche

    Algmeneine Literatur

    Zeitung.

    Frankfurt, A crise da reforma.

    Ludwig HUSSER 1818-1867 Kleeburg Historia Heidelberg Schlosser,

    Gervinus

    Heidelberg Parlamento de

    Baden

    Allgemeine Zeitung

    Deutschen Zeitung,Preuische Jahrbcher

    Historia da Alemanha da morte de

    Frederico Fundao daConfederao.

    Theodor MOMMSEN 1817-1903 Garding Direito Kiel e Leipzig Moritz Haupt e

    Otto Jahn, Max

    Weber

    Zurique,

    Breslau,

    Leipzig e

    Berlim

    Deputado Nacional

    em 1881

    Amigo do rei da

    Dinamarca, Academia

    de Berlim, Sociedade

    Real de Cincias da

    Saxnia, reitor da

    universidade de Berlim

    Jornal de Rendsburg

    (1848), escritos sobre a

    revolta da Saxnia em

    1848 levam-no

    demisso, escritos de

    combate ao anti-

    semitismo

    Histria Romana, Direito Romano,

    As provncias romanas.

    Georg GERVINUS 1805-1871 Darmstadt Filologia Heidelberg Schlosser,

    Dahlmann

    Heidelberg e

    Gttingen

    Parlamento de

    Frankfurt

    Academia de Cincias

    da Bavria

    Deutsche Zeitung, projeto

    da Constituio em 1847

    Fundamentos de Teoria da

    Histria, Histria da Literatura e

    da Poesia Nacional, Histria do

    sculo XIX.

    Johann G. DROYSEN 1808-1884 Teptow Filologia Berlim Bckh,

    Gervinus,

    Duncker

    Kiel, Iena e

    Berlim

    Parlamento de

    Frankfurt

    Academia Berlinense

    de Cincias,

    Historigrafo da Casa

    de Brandemburgo

    Preuische

    Jahrbcher,Politische

    Schriften. Guerras de

    Libertao, A posiopoltica da Prssia

    Histria do Helenismo, Histria

    das Guerras de Liberdade,

    Histria da Poltica Prussiana,

    Conde Yorck von Wartenburg

    Leopold von RANKE 1795-1886 Wiehe

    (Unstrut)

    Teologia e

    filologia

    Leipzig Schleiermache

    r, Humboldt,

    Sybel, Savigny,

    Niebuhr

    Berlin Historigrafo da Casa

    de Brandemburgo,

    baro von Ranke,

    Membro do Conselho

    Real, American

    Historical Association,

    Memrias da Casa de

    Brandemburgo ,

    Historisch-Politische

    Zeitschrift, Sobre as

    afinidades e diferenas

    entre histria e poltica

    Histria os povos latinos e

    germnicos, Histria dos Papas,

    Histria da Reforma, Histria

    francesa, Histria Inglesa,

    Hardenberg und die Geschichte des

    preussischen Staates von 1793 bis

    1813, Srvia e Turquia no sculo

    XIX.Karl

    MAURENBRECHER

    1838- 1892 Bonn His tr ia Bonn e Berl im e

    Munique

    Sybel, Ranke,

    Siegfried

    Hirsch

    Konigsberg,

    Bonn e Leipzig

    Guilherme II assistiu

    suas aulas, Real

    Sociedade de Cincias

    da Saxonia

    Histria da Reforma, Histria do

    Imprio: Histria da fundao do

    Imprio Alemo

    Heinrich von

    TREITSCHKE

    1834-1896 Dresden Histria e

    Economia

    Bonn, Leipzig,

    Tbingen, Freiburg.

    Bismarck Ki el, Freiburg

    e Heidelberg

    Deputado Nacional

    Editor do Preuische

    Jahrbcher (depois foiexpulso), A soluo da

    questo de Schleswig-

    Holstein, O futuro dos

    estados do norte alemo,

    A guerra ea reforma

    federal, Dez anos de luta

    alem 1865-1874.

    Ensaios histrico-polticos

    alemes, A histria alem dosculo XIX, Lutero e da nao

    alem,

  • 7/25/2019 Artigo Bentivoglio

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    Revista de Teoria da Histria Ano 1, Nmero 3, junho/ 2010 Universidade Federal de GoisISSN: 2175-5892

    44

    Escritos sobre assuntos

    atuais, Alguns

    comentrios sobre a

    questo judaica, O projeto

    da lei da escola prussiana.

    August von

    KLUCKHOHN

    1832-1893 Bavenhause

    n

    Histria Heidelberg e

    Gttingen

    Husser, Waitz

    e Sybel

    Professor em

    Gttingen

    Arquivos do Reichstag

    e correspondncia de

    Wittelsbach, cartas de

    Frederico o Piedoso

    Biografias de Gilherme II, duque

    da Baviera, de Ludwig, de

    Prederico o Piedoso, de Louise,

    rainha prussiana

    Alfred BORETIUS 1836-1900 Meseritz Direito Berlim e Halle Mommsen Zurique e

    Berlim

    Germaniae

    Monumenta Historica

    National Zeitung Frederico o Grande e Carlos

    MagnoCarl Wolfgang Paul

    Mendelssohn

    BARTHOLDY

    1838-1897 Leipzig Direito Heidelberg e

    Freiburg

    Heidelberg e

    Freiburg

    Democrata e opositor da

    Prssia

    Histria da Grcia

    Heinrich von SYBEL 1817-1895 Dsseldorf Historia e

    filosofia

    Berlim Bonn Ranke, Voigt,

    Maurenbreche

    r

    Bonn,

    Marburg,

    Munique

    Deputado em

    Frankfurt e

    deputado na

    Assemblia de

    Kassel, Parlamento

    de Erfurt e

    Parlamento

    Nacional

    Fundador com Ranke

    da Comisso Histrica

    da Academia de

    Cincias da Bavria,

    Diretor dos Arquivos

    Prussianos, membro

    do Instituto Histrico

    de Roma,

    A nao alem e o

    Imprio. Um tratado

    histrico-poltico,

    Klnische Zeitung,

    Autonomen, Sobre a

    relao da nossa

    Universidade com a vida

    pblica, Os partidos

    polticos do Reno

    Histria da Primeira Cruzada,

    Histria da fundao do Imprio

    Alemo,Acta Borussica.

    Wilhelm JUNKMANN 1811-1886 Munique Filologia e

    histria

    Munique e Bonn Ernst Arndt,

    Friedrich

    Dahlmann

    Deputado Nacional,

    Parlamento de

    Erfurt

    Liga catlica, Partido

    do Cassino, Pariser

    Hof,

    Katholischen Magazins

    fr Wissenschaft und

    Leben,

    Obs: no publicou na HZ

    Allgemeinen Kirchenlexikons,

    Allgemeinen Realenzyklopdie fr

    das katholische Deutschland,

    Regesta Historiae Westfaliae,

    Westfalia Sacra.

    Jaco b VE NE DEY 1805- 1871 K ln Direito He ide lberg, Bonn He inr ich

    Heine, Georg

    Fein

    Bonn e

    Zurique

    Foi pro Pr-

    Parlamento, foi do

    parlamento de

    Rumpf e se elegeu

    para o parlamento

    de Frankfurt

    Festival de Hambach,

    atividade poltica

    intensa, exilado

    Deutschen Volksverein,

    vrios jornais, Rotteck-

    Welcker Staatslexikons

    Reise und Rasttage in der

    Normandie, Die Deutschen und

    Franzosen nach dem Geiste ihrer

    Sprachen und Sprchwrter.

    Kurt WACHSMUTH 1837-1905 Naumburg Filologia ehistoria

    Iena e Bonn, Berlim Ludwig Lange,Karl

    Lamprecht

    Marburg,Gottingen,

    Heidelberg,

    Leipzig

    Pesquisa na Itlia,reitor da universidade

    de Leipzig

    Das alte Griechenland im neuen,Die Stadt Athen im Altertum,

    Studien zu den griechischen

    Florilegien, Ausgaben von "Lydus

    de ostentis" und den griechischen

    Kalendern

    Paul HINSCHIUS 1835-1898 Berlim Heidelberg Halle, Kiel Parlamento

    Nacional

    Parece que era do

    Partido Catlico e do

    Partido Liberal

    Zeitschrift fr

    Gesetzgebung und

    Rechtspflege in Preuen

    Die preuischen Kirchengesetze

    (4v), Die Orden und

    Kongregationen der katholischen

    Kirche in Preuen, Das

    landesherrliche Patronatrecht

    Ludwig Karl James

    AEGIDI

    1825-1901 Tilsit Direito Berlim, Gttingen Gervinus, Erlangen,

    Hamburg,

    Parlamento da Liga

    Germnica do Norte,

    Partido do Cassino,

    Deutschen

    Deutschen Zeitung Staatsarchiv

  • 7/25/2019 Artigo Bentivoglio

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    Revista de Teoria da Histria Ano 1, Nmero 3, junho/ 2010 Universidade Federal de GoisISSN: 2175-5892

    45

    Berlim Parlamento

    Prussiano

    nationalverein

    Friedrich von WEECH 1837-1905 Munique Histria Munique eHeidelberg

    ErhartSchrstab

    Freiburg Bibliotecrio dosArquivos Gerais e

    diretor em 1885

    Codex diplomaticus Salemitanus,

    Baden unter den Groherzgen

    Karl Friedrich, Karl, Ludwig 1738

    1830, Geschichte der badischen

    Verfassung, Baden in den Jahren

    1852 bis 1877, Die Deutschen seit

    der Reformation.

    Hermann Eduard von

    HOLST

    1841-1904 Fellin,

    Estland

    Histria Dorpat e Heidelberg,

    Londres, Italia eArglia

    Karl J.

    Marquardt,

    Strassburgo,

    Freiburg,Chicago

    Academia Prussiana de

    Cincias

    Kolnischen Zeitung,

    Deutsch-amerikanischenKonversations-Lexikons

    Ludovico XIV, vrios outros

    Paul von

    BOJANOWSKI

    1834-1915 Schwedt Direito Halle, Heidelberg e

    Berlim

    Reinhold

    Kohler

    Academia de Erfurt,

    Jornalista em Paris,

    bibliotecrio e

    historiador

    Weimarische Zeitung Tomada da Bastilha.

    Alfred STERN 1846-1936 Gttingen Histria Heidelberg,

    Gttingen e Berlim

    Albert Einstein Berna, Zurique Controvrsia

    Baumgarten-

    Treitschke contra os

    judeus

    Histria da Europa desde 1815

    at a Liga de Frankfurt em 1871.

    Johann Friedrich

    Ritter von SCHULTE

    1827-1914 Winterberg Fredeburg Bonn Dllinger,

    Wasserschlebe

    n

    Bonn e Praga Deputado pelo

    partido Nacional

    Liberal

    Conselheiro do kaiser

    Francisco Jos, reitor

    da universidade de

    Bonn

    Die Geschichte der Quellen und

    Literatur des Canonischen Rechts

    von Gratian bis auf die Gegenwart,

    Arnold SCHAEFER 1819-1883 Seehausen Filologia

    clssica

    Leipzig Hermann,

    Wachsmuth,

    Asbach

    Greiswald,

    Bonn,

    Konigsberg

    Reitor da universidade

    de Bonn 1871-2,

    Instituto Arqueolgico

    Alemo emRoma

    Demstenes e seu tempo, Histria

    da guerra dos Sete Anos,

    M ar tin P HI LI PP SO N 1846 -191 6 M ag de burg His tr ia B onn Bonn , Br s se l, Deutsch-Israelitische

    Gemeindebund,

    Jdischen Friedhof

    Berlin-Weiensee,

    Verband deutscher

    Juden.

    Der Grosse Kurfrst Friedrich

    Wilhelm von Brandenburg. 3,

    Neueste Geschichte des jdischen

    Volkes

    Julius Albert Georgvon HARTTUNG

    1848-1919 Wernikow Histria efilologia

    Bonn, Berlim eGttingen

    Paul Kehr,Burckhardt

    Tbingen,Basel

    Soldado na guerraFranco-prussiana,

    Sociedade Histrica de

    Verona, Londres, Paris,

    Ro ma , T ur im e

    Palermo, Geheimen

    Staatsarchiv in Berlin

    Hamburger Zeitung Documentos do Papado 1046-1198

    Friedrich Wilhelm

    Karl von HEGEL

    1813-1901 Nrberg Histria Berlim e Heidelberg Filho de Hegel Rostock e

    Erlangen

    Parlamento de

    Erfurt

    Editor do

    Mecklenburgischen

    Zeitung

    Crnicas dos Estados Germnicos

    Richard ROEPELL 1808-1893 Danzig Halle e Berlim Heinrich Leo,

    Ranke

    Breslau Parlamento de

    Erfurt

    Academia de Cincias

    da Baviera

    Anais Poloneses

    Adolf BEER 1831-1902 Prossnitz Histria Berlim, Heidelberg, Sybel Grosswardein Deputado Nacional Arquivos para a Histria Geschichte des Welthandels, Die

  • 7/25/2019 Artigo Bentivoglio

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    Revista de Teoria da Histria Ano 1, Nmero 3, junho/ 2010 Universidade Federal de GoisISSN: 2175-5892

    46

    Praga e Viena (Romnia) austraca, Historischer

    Zeitschrift

    orientalische Politik sterreichs

    seit 1774, Der Staatshaushalt

    sterreich-Ungarns seit 1868, Die

    Finanzen sterreichs im 19.

    Jahrhundert, Leopold II ., Franz I I.

    und Katharina von Ruland. Ihre

    Korrespondenz

    Ernst BERNHEIM 1850-1942 Hamburg Histria Berlim, Heidelberg

    Gttingen e

    Estrasburgo

    Georg Waitz,

    Julius

    Weizscker

    Greifswald Reitor da universidade

    de Greifswald

    Judeu que se converteu ao

    protestantismo em 1886

    Manual do Mtodo Histrico e da

    filosofia da histria.

    Hans DELBRCK 1848-1929 Bergen auf Rgen Histria Heidelberg e Bonn Sybel Berlim Deputado noParlamento alemo Lutou na guerraFranco-prussiana,

    membro da delegao

    alem na Conferncia

    de Paz de Versalhesem

    1918

    Preussischen Jahrbcher Histria da arte da guerra 4v.

    Fonte: Deutsche National Bibliothek. Disponvel em: http://www.d-nb.de/; Elektronische Allgemeine Deutsche Biographie. Disponvel em: ht tp://mdz10.bib- bvb.de/~ndb/adb_ index.html, Deutsche Biographie.

    Disponvel em: http:// www.deutsche-biographie.de/blaettern.html. Biographie Portal. Disponvel em: http://www.biographie- portal.eu/search. sterreichisches Biographisches Lexikon 18151950. disponvel em:

    http://www.biographien.ac.at/oebl?frames=yes.

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    A participao dos historiadores nos assuntos polticos deixava claro que

    eles disputavam com os filsofos e os polticos o papel de tematizarem a liberdade,

    e de refletirem sobre a poltica ou a governana. Esse envolvimento poltico

    expressa um perodo decisivo da histria alem, vivido entre a derrota paraNapoleo e a vitria na Guerra Franco-Prussiana. Segundo Norbert Elias, a vitria

    dos exrcitos alemes sobre a Frana foi, ao mesmo tempo, uma vitria da nobreza

    alem sobre a classe mdia alem (1997: 26). Com isso, eles trocavam

    decisivamente, o idealismo burgus clssico pelo manifesto realismo do poder

    (ELIAS, 1997:27). De qualquer modo, a histria foi uma matriz disciplinar bem

    como o pensamento historicista e um instrumento capital para a poltica no

    perodo em tela. Com efeito, a histria da Alemanha e do liberalismo alemo no

    poderia ser escrita sem devotar considervel espao ao papel central

    desempenhado pelos historiadores (IGGERS, 1983:91). Assim, os historiadores

    foram importantes atores do momento, algo que tambm ocorreu em relao

    Frana, onde Thiers, Guizot e Michelet, por exemplo, no se furtaram de combater

    na arena poltica e exercer cargos pblicos.

    Sobre as trajetrias individuais algumas anlises podem ser feitas. Ranke,

    por exemplo, era um conservador convicto, mas acompanhou a poltica de

    Bismarck com pouco entusiasmo. Embora visse o chanceler com bons olhos, afinal

    ele havia mantido a Prssia longe dos temores da revoluo, no o defendia

    abertamente. O von em seu sobrenome, inclusive, foi um ttulo nobilirquico de

    baro obtido em 1865. Ranke conclamava os historiadores a contemplar o jogo das

    foras histricas, no de maneira desapaixonada apregoam como seus crticos, mas

    deixando as responsabilidades do governo para os homens de Estado, ou seja,

    polticos (BENTIVOGLIO, 2010).

    Theodor Mommsen editou um jornal poltico em Schleswig-Holstein,

    Gervinus dirigiu a Gazeta Alem. Em 1857 surgiu o peridico PreussischeJahrbcher (Anais Prussianos), criado quando Guilherme assumiu o governo

    devido aos problemas mentais de Frederico IV, para apoiar a causa da unificao

    alem e do governo constitucional sob a liderana da Prssia. A sua frente

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    estiveram Sybel, Treitschke, Baumgarten e Dilthey (IGGERS, 1983:91) todos

    historiadores.

    Da queda de Napoleo e da Restaurao em 1815 at 1857 existiu a

    Confederao Germnica formada por 39 Estados independentes e cujas deciseseram compartilhadas por Prssia e ustria, sob a hegemonia desta ltima. O clima

    reacionrio fez com ambas resistissem a formas mais amplas de representao

    poltica, gerando movimentos em 1820 e 1830; sem contar as ingerncias nas

    constantes intromisses polticas da Santa Aliana. ustria e Prssia se uniram na

    represso, os decretos de Karlsbad revelam isso, sobretudo para conter

    conspiraes estudantis, motivadas pelas sociedades de estudantes, as

    Burschenschafts. Foram elas que organizaram os famosos festivais de Wartburg em

    1817 e de Hambach em 1832, emblemticos para se compreender o nacionalismo

    germnico. Ambos foram gestados pelas Burschenschaften. O festival de Wartburg

    celebrou o tricentenrio de Lutero e o 4 aniversrio da Batalha de Leipzig (HAHN,

    2001:27). J o festival de Hambach tinha como mote a censura da imprensa e a

    defesa do princpio democrtico (HAHN, 2001:29). Mais de 30 mil pessoas ligadas

    a estes eventos foram perseguidas pela polcia secreta de Metternich. A

    radicalizao dos movimentos estudantis teve seu ponto alto no surgimento dA

    Gazeta Renanade Karl Marx, que comeou a circular em 1842, e, em escala menor

    com a Gazeta Alemde Gervinus, surgida em 1845.

    Embora depois da derrota em Iena as aspiraes liberais tivessem sofrido

    duro golpe, paradoxalmente o controle francs sob territrios germnicos animou

    certos atores polticos em relao ao iderio liberal e teve importncia decisiva na

    emergncia do nacionalismo. A atmosfera reacionria ps-Restaurao tambm

    contribuiu para a expanso das reivindicaes de liberdade e de direitos

    democrticos, alm de motivar outros movimentos mais radicais, ilustrados pela

    esquerda hegeliana e tambm pela liga dos comunistas. Os historiadores alemestendiam

    a acreditar que a monarquia Hohenzollern, com seus aspectosautoritrios e aristocrticos e seu ethos burocrtico nico, garantiriamelhor caminho para a defesa das liberdades individuais e seguranajurdica que uma democracia em que poltica pode ser mais reativa aosanseios da opinio pblica que s consideraes e razoes de Estado(IGGERS, 1983:15).

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    Nas frmulas polticas de ento nutriam admirao pelo federalismo norte-

    americano, ainda que no vissem com bons olhos o princpio democrtico que lhe

    inspirava; pelo liberalismo ingls sobretudo de Mill e de Bentham cuja

    monarquia constitucional bicameral era admirada, ao lado do pensamento poltico

    francs oriundo de Montesquieu e de Benjamin Constant. Mas esses iderios eram

    assimilados criticamente e adaptados s prticas polticas vivenciadas em solo

    germnico. Desse modo tradicionalismo, autoritarismo e protecionismo eram

    foras que no universo das prticas polticas moldavam compreenses de

    liberdade e de representao poltica. Historiadores liberais, como Dahlmann ou

    Droysen, no defendiam uma monarquia parlamentarista, como a inglesa ou a

    brasileira, mas uma monarquia constitucional em que rei e administradores daburocracia deveriam respeitar as liberdades civis e serem coadjuvados por

    instituies representativas eleitas para a Cmara Baixa o Parlamento , visto

    justificarem a existncia de uma Cmara Alta, formada pela aristocracia

    tradicional.

    At o Vormrz(Pr-Maro) em 1848, um otimismo reinava entre os crculos

    polticos e intelectuais. Vislumbrava-se a possibilidade do surgimento de um

    Estado alemo unificado, com instituies representativas e governo

    constitucional. A despeito da represso reinante, da censura e das restries

    polticas a intelligentsia germnica acreditava no triunfo do liberalismo. Afinal

    viviam um momento de rpido desenvolvimento econmico, cultural e cientfico

    que alimentava sentimentos patriticos de integrao, sedimentados no

    pressuposto de uma identidade histrica e cultural comum acompanhada pelas

    alianas econmica o Zollverein e poltica a Deutschesbund. O dualismo foi

    rompido apenas em 1849, quando, o impacto da revoluo definiu melhor os

    projetos polticos existentes e ampliou a rejeio monarquia austraca,

    prenunciando a ascenso da Prssia. Se os episdios de 1848 em Frankfurt, Berlim,

    Bohemia e Schleswig-Holstein haviam demonstrado queles polticos a

    necessidade do uso de tropas, austracas ou alems, para garantirem as reformas e

    evitarem aes polticas de uma esquerda radical (IGGERS, 1983:22), nos conflitos

    do norte ficou patente que a ustria no desejava a expanso do poder prussiano.

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    A ao do exrcito prussiano contra a reivindicao da Dinamarca por Holstein

    indicou para a Prssia que somente a fora militar no seria suficiente para

    conquistar a liderana frente aos territrios germnicos1. Seria preciso adotar o

    caminho constitucional a fim de manter sua liderana sobre a ConfederaoGermnica e fazer alianas com os Estados germnicos mais fortes excluindo-se a

    ustria projeto que ganhou at mesmo a adeso homens como Welcker e

    Gervinus. Agora no se tratava somente de evitar conflitos sociais internos, como a

    atuao de Metternich havia priorizado ao lado da expanso e domnio sobre seus

    territrios no leste, mas, sobretudo, conseguir alianas polticas externas. De incio,

    havia o desejo de integrao de todos os estados germnicos, com o passar do

    tempo viu-se que a ustria no poderia integrar a confederao.

    Assim, at 1848 os intelectuais alemes desejavam a liberalizao e a

    unificao nacionais, face ao temor diante dos conflitos que colocavam em risco a

    ordem, em crescente radicalizao poltica, que fizeram com que, salvo poucas

    excees, apoiassem o governo prussiano de Frederico IV; depois, durante a crise

    constitucional de 1862 e 1866 no apoiassem a poltica de Bismarck, mas, enfim,

    que se comprometessem com ela a partir de 1867. Quando Bismarck reformou o

    exrcito violando a constituio em 1862, o Preussische Jahrbcherprotestou, mas

    depois das vitrias de 1866 todos reataram com Bismarck, com exceo de

    Gervinus.

    Para Taylor, at 1848 os escritores alemes escreviam para si e para os

    prncipes, estavam longe da realidade. No tinham pblico (TAYLOR, 1945: 54). E

    seria inimaginvel pensar o equilbrio germnico sem Metternich, mas depois

    daquele ano a posio da ustria tornou-se um problema. A expanso dos jornais

    mudou este panorama, indcio de ampliao da esfera pblica e da constituio de

    foras disputando a arena poltica. O interesse crescente pelas questes do

    momento levaram criao de vrias cadeiras de histria contempornea, queatraam grande pblico, e acabavam por deslocar muitos historiadores da cincia

    para a atuao poltica, como foi o caso das aulas de Droysen em Kiel.

    1Dahlmann publicou seuPoltica reduzida ao grau e medida das condies existentes para tratar destaquesto e foi um orador ativo dos direitos dos Schleswig-Holsteiners germnicos contra a monarquiadinamarquesa, ao lado de Droysen, que inclusive teria que deixar a Universidade de Kiel por conta disso.

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    Quando em 1849 a contra-revoluo destruiu os parlamentos eleitos

    democraticamente e muitas das liberdades criadas pela revoluo (BREUILLY,

    2002:55) e em 1850 Saxnia, Hannover, Bavria e Wttemberg decidiram criar

    uma nova liga de reinos, em oposio Confederao Germnica, sendo realizadaseleies para o parlamento de Erfurt votar uma constituio para esta liga, que foi

    derrotada pelas tropas austracos, preservando a Confederao (Bund), ficou

    evidente a impossibilidade de transformaes mais radicais ou democrticas para

    o futuro da Alemanha. Este episdio, chamado tambm de humilhao de Olmtz,

    contudo, apenas abreviou a franca ascenso da Prssia como liderana poltica.

    Nas palavras de Von den Pfordten, primeiro ministro bvaro, a luta pela

    hegemonia germnica havia sido selada e a ustria perdeu (Apud, BREUILLY

    2002:58).

    Ao contrrio de Georg Iggers que v na chamada Escola Histrica Prussiana

    a expresso de um otimismo poltico ingnuo face a estes acontecimentos, penso,

    que poderiam ser otimistas, mas no eram ingnuos. Mommsen, Gervinus e

    Droysen, por exemplo, no acreditavam na existncia de um aperfeioamento

    espontneo realizado pela histria que tornaria as instituies melhores ou mais

    justas, como produtos necessrios do desenvolvimento histrico. Igualmente, para

    eles, o poder no poderia ser somente o uso da fora, mas o exerccio de princpios

    ticos. Ou seja, ao contrrio dos franceses que aps a Revoluo procuraram

    aplicar a lei natural poltica ou, ou de Hegel que colocava a supremacia da razo

    sobre a histria ou sobre os direitos individuais, revelam um entendimento

    poltico diverso ancorado no princpio constitucional. Droysen, por exemplo,

    escreveu as Guerras de Libertaoentre 1842-3 e a Histria da Poltica Prussiana,

    em 1855, obras que tiveram forte impacto naquele contexto. Para ele a lei muito,

    mas no tudo e o grande erro do liberalismo vulgar foi ter insistido no governo

    baseado na soberania popular e por direitos individuais garantidos (...) e averdadeira essncia do constitucionalismo consiste em o Estado remover de sua

    competncia tudo aquilo que no propriamente pertence a ele (IGGERS,

    1983:107). Nacionalidade, portanto, deveria ser mais importante do que liberdade.

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    A identidade entre os historiadores prussianos no pode ser pensada sem

    reservas, tanto do ponto de vista poltico, quanto do ponto de vista epistemolgico.

    Embora surgissem em um contexto comum e de uma mesma base, no so poucas

    as diferenas existentes. Na Comisso Constitucional durante o Parlamento deFrankfurt em 1849, Dahlmann e Droysen se opuseram ao voto universal, algo que

    Mommsen e Gervinus defendiam. Com o tempo, todos perceberam que a

    Unificao no poderia ser feita a partir de Frankfurt, mas de Berlim. Outro

    exemplo ocorreu