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A paisagem mutável modelos tridimensionais como registro da evolução urbana 1 PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE CAMPINAS Faculdade de Arquitetura e Urbanismo Mestrado em Urbanismo V SEMINÁRIO DE HISTÓRIA DA CIDADE E DO URBANISMO “Cidades: temporalidades em confronto” Uma perspectiva comparada da história da cidade, do projeto urbanístico e da forma urbana. SESSÃO TEMÁTICA: 5 HISTÓRIA E CULTURA URBANA CIDADE: MODERNIZAÇÃO E RESISTÊNCIA II COORDENADORA: MARLICE NAZARETH S. AZEVEDO (UFF) A PAISAGEM MUTÁVEL Modelos tridimensionais como registro da evolução urbana Leonardo Barci Castriota Wagner de Souza Rezende I - Introdução “... tendo sido Belo Horizonte uma cidade projetada e considerando seu vertiginoso crescimento, ela constitui um paradigma, como cidade idealizada e implantada da noite para o dia. Ao mesmo tempo, o seu centro, como espaço-síntese do urbano, representa o espaço privilegiado da sua metamorfose.” 1 Celina Borges Lemos No final da década de 30, quando visita o Brasil, o antropólogo Claude Lévi-Strauss se espanta com a rapidez de transformação das cidades nas Américas, que, para ele, "jamais incitam a um passeio fora do tempo, nem conhecem essa vida sem idade que caracteriza as mais belas cidades que chegaram a ser objeto de contemplação e de reflexão, e não só instrumentos da função urbana". Nas cidades do Novo Mundo impressiona-lhe a "falta de vestígios", que reconhece como um elemento de sua significação: a sua obsolescência é rápida demais, significando o passar dos anos para elas não "uma promoção", como na Europa, mas " uma decadência" 2 "Não só foram recentemente construídas, como estão para renovar-se com a mesma rapidez com que foram edificadas. No momento de levantar-se, os novos bairros quase nem são elementos urbanos: demasiado brilhantes, demasiado novos, demasiado alegres para isso. Parecem mais uma feira, uma exposição internacional construída só para alguns meses. Logo depois desse lapso de tempo, a festa termina e essas figuras enlanguescem: as fachadas descascam, a chuva e o granizo deixam suas

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  • A paisagem mutvel modelos tridimensionais como registro da evoluo urbana

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    PONTIFCIA UNIVERSIDADE CATLICA DE CAMPINAS Faculdade de Arquitetura e Urbanismo

    Mestrado em Urbanismo

    V SEMINRIO DE HISTRIA DA CIDADE E DO URBANISMO Cidades: temporalidades em confronto

    Uma perspectiva comparada da histria da cidade, do projeto urbanstico e da forma urbana.

    SESSO TEMTICA: 5 HISTRIA E CULTURA URBANA

    CIDADE: MODERNIZAO E RESISTNCIA II COORDENADORA: MARLICE NAZARETH S. AZEVEDO (UFF)

    A PAISAGEM MUTVEL Modelos tridimensionais como registro da evoluo urbana

    Leonardo Barci Castriota Wagner de Souza Rezende

    I - Introduo

    ... tendo sido Belo Horizonte uma cidade projetada e considerando seu vertiginoso crescimento, ela constitui um paradigma, como cidade idealizada e implantada da noite para o dia. Ao mesmo tempo, o seu centro, como espao-sntese do urbano, representa o espao privilegiado da sua metamorfose.1 Celina Borges Lemos

    No final da dcada de 30, quando visita o Brasil, o antroplogo Claude Lvi-Strauss se espanta com a rapidez de transformao das cidades nas Amricas, que, para ele, "jamais incitam a um passeio fora do tempo, nem conhecem essa vida sem idade que caracteriza as mais belas cidades que chegaram a ser objeto de contemplao e de reflexo, e no s instrumentos da funo urbana". Nas cidades do Novo Mundo impressiona-lhe a "falta de vestgios", que reconhece como um elemento de sua significao: a sua obsolescncia rpida demais, significando o passar dos anos para elas no "uma promoo", como na Europa, mas "uma decadncia"2

    "No s foram recentemente construdas, como esto para renovar-se com a mesma rapidez com que foram edificadas. No momento de levantar-se, os novos bairros quase nem so elementos urbanos: demasiado brilhantes, demasiado novos, demasiado alegres para isso. Parecem mais uma feira, uma exposio internacional construda s para alguns meses. Logo depois desse lapso de tempo, a festa termina e essas figuras enlanguescem: as fachadas descascam, a chuva e o granizo deixam suas

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    marcas, o estilo passa de moda, a disposio primitiva desaparece sob as demolies que uma nova impacincia exige".

    "No so cidades novas em contraste com cidades antigas", conclui, mas cidades com um ciclo de evoluo muito curto, comparadas com outras de ciclo lento". Lvi-Strauss registra com preciso, a nosso ver, a dinmica desse nosso cenrio sem muita espessura, onde os sentidos do vivido mal conseguem se fixar e so logo engolfados pela lgica da destruio modernizadora. Assim, a paisagem da cidade latino-americana vai se caracterizar por uma intensa mutabilidade, que exige redobrada ateno dos estudiosos.

    Nesse sentido, esse trabalho procurou elaborar uma metodologia que conseguisse, atravs de uma simulao informatizada, documentar com clareza e objetividade as transformaes ocorridas na paisagem urbana de Belo Horizonte. Para isso, partimos de alguns estudos realizados na ltima dcada, que procuraram desvendar as engrenagens que movem o cotidiano do centro da cidade, enfocando principalmente a evoluo urbana da metrpole e a conseqente transformao nos usos e no processo de ocupao das suas edificaes. Como objeto especfico de estudo, escolheu-se o Conjunto Urbano da Rua dos Caets, localizado no centro tradicional da cidade, e que se caracteriza, como veremos, desde o incio de sua histria, por uma intensa vida econmica e social.

    Metodologicamente, tratou-se de um exerccio de inventariao sistemtico, que procurou coletar com preciso os dados necessrios para a elaborao de grficos, tabelas, e, principalmente, para a construo de uma maquete virtual, que pode, a nosso ver, constituir uma poderosa ferramenta, no campo da anlise urbana, conferindo rapidez na execuo de estudos bsicos e nas respectivas anlises. Se mapas e grficos so ferramentas imprescindveis em estudos que levam em conta os processos de ocupao e estruturao urbana, crescimento populacional, tendncias de ocupao e adensamento do solo, a representao cartogrfica convencional, muitas vezes, deixa a desejar no que se refere sua intelegibilidade, apresentando resultados excessivamente codificados. Neste quadro, o uso de uma maquete virtual pode ser entendida como uma simulao mais prxima de uma determinada realidade e de mais fcil compreenso pelo usurio da cidade. Embora este estudo aborde um conjunto urbano especfico, nossa preocupao precpua foi a de desenvolver uma metodologia genrica, que pudesse, sem prejuzo do necessrio rigor, ser utilizada tambm em trabalhos que objetivem anlises sobre as potencialidades e perspectivas de outros conjuntos urbanos.

    II - Procedimentos metodolgicos

    1- Delimitao da rea

    A rea considerada para estudo corresponde poligonal definida pelos seguintes pontos:

    P1 - Rua dos Tupinambs esquina de Avenida Afonso Pena P2 - Rua dos Caets esquina de Avenida Afonso Pena P3 - Rua dos Guaicurus esquina de Rua 21 de Abril P4 - Avenida do Contorno esquina de Avenida Oiapoque P5 - Avenida do Contorno esquina de Rua Esprito Santo

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    P6 - Rua Esprito Santo esquina de Rua dos Guaicurus P7 - Rua dos Guaicurus esquina de Rua da Bahia P8 - Rua da Bahia esquina de Avenida Amazonas P9 - Avenida Amazonas esquina de Rua dos Tupinambs P10 - Rua dos Tupinambs esquina de Avenida Afonso Pena

    Esta delimitao teve como base um levantamento realizado pela Secretaria de Cultura da Prefeitura Municipal Belo Horizonte com o objetivo de se definir uma A.D.E. (rea de Diretrizes Especiais), no Plano Diretor proposto para a cidade. A Lei de Uso e Ocupao do Solo aprovada em Belo Horizonte em 1996, apresenta a seguinte definio desse instrumento urbanstico:

    Art. 75 - As reas de diretrizes especiais - ADEs - so as que, por suas caractersticas, exigem a implementao de polticas especficas, permanentes ou no, podendo demandar parmetros urbansticos, fiscais e de funcionamento de atividades diferenciados, que se sobrepem aos do zoneamento e sobre eles preponderam. 1 - As ADEs so institudas por lei especfica, da qual, alm da delimitao, devem constar os instrumentos, as intervenes, os parmetros urbansticos e fiscais, os usos a serem admitidos e os critrios para o funcionamento de atividades, as normas complementares necessrias e, se for o caso, o tempo de durao. 2 - Os parmetros urbansticos relativos a coeficiente de aproveitamento do solo, quotas de terreno por unidade habitacional e taxa de permeabilizao das ADEs que vierem a ser institudas por lei especfica devem ser iguais ou mais restritivos que os da zona em que se localizem. 3

    2- Levantamento dos dados

    A representao cartogrfica tornou-se imprescindvel nos estudos das transformaes que ocorrem no uso e ocupao dos espaos urbanos das grandes cidades. Atravs de mapas possvel ter-se informaes mais claras a respeito dos diversos itens pesquisados. O mtodo desenvolvido nessa pesquisa tem como principal referncia a dissertao defendida no Mestrado em Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal da Bahia, sob o ttulo A transformao da paisagem na rua do Ouvidor: 1874 - 1988, PEREIRA (1989), que utiliza plantas de parcelamento, um mapa arquitetural, um levantamento aerofotogramtrico com dados relativos a gabarito e um cadastro de campo, para reconstituir o processo de transformao da ocupao daquela via atravs das alteraes verificadas na sua configurao parcelar e nas elevaes de suas edificaes.

    No presente estudo consideramos necessrio representar no apenas um processo de transformao na ocupao, mas um processo de transformao do uso e da ocupao. Elaborou-se, assim, uma planilha com dados referentes ao uso e ocupao na rea em questo em dois perodos: 1942 e 1997. Em relao ao ano de 1942, utilizou-se a lista telefnica para dados relativos ao uso e uma foto area para os dados relativos ocupao. Em relao a 1997, foi realizado um levantamento in loco, no qual

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    registrou-se a poca de construo de cada edifcio. Desse modo, considerando que os edifcios construdos aps 1960 foram edificados em substituio aos existentes, na maquete de 1942 esses espaos foram ocupados de acordo com uma foto area da poca.

    Para a representao desses dados foram utilizados os levantamentos aerofotogramtricos realizados pela Prodabel (empresa de informtica da Prefeitura de Belo Horizonte) em 1942 e em 1989 (esse ltimo atualizado em 1992). s projees das edificaes em 1989 e 1942 adicionamos os dados relativos ao gabarito, sendo o resultado obtido uma representao tridimensional da rea de estudo, que serviu de base para a representao das transformaes do uso num perodo de 50 anos. Ressaltamos que a cada unidade de ocupao correspondeu uma edificao; assim, considerando a multiplicidade de usos no centro tradicional de Belo Horizonte, vrias unidades de uso so encontradas em uma nica unidade de ocupao. As unidades de uso, por sua vez, foram contabilizadas para a elaborao de uma tabela de uso predominante, onde seria contabilizado apenas o uso com o qual estivessem ocupadas mais unidades. importante anotar, no entanto, que ainda assim, as vrias unidades de uso so discriminadas em outra tabela com o intuito de se compreender melhor o conjunto em termos de utilizao do espao urbano.

    3- Tabulao dos dados

    Com o objetivo de evidenciar as transformaes no uso e ocupao do conjunto urbano em estudo, empregaram-se as categorias utilizadas por LEMOS (1988) em seu estudo sobre o centro de Belo Horizonte. Assim, utilizamos as seguintes categorias de uso:

    Servios de circulao compreendem todas as atividades utilizadas para facilitar ou viabilizar o processo de circulao de mercadorias e mesmo de servios (consumo). Podem ser divididos em cinco sub-categorias: os servios de comrcio varejista e atacadista, as atividades financeiras, os servios pblicos e os servios de representao.

    Servios de comrcio pressupem toda atividade que estiver implcita na circulao da mercadoria. Segundo Lemos, tanto no comrcio varejista como no atacadista a mercadoria est pronta para ser consumida; a diferena est na estocagem.

    Atividades financeiras esto inseridas na atividade produtiva e abrangem todas as atividades vinculadas a transaes financeiras, como bancos, financeiras, seguradoras, etc.

    Servios pblicos so atividades desenvolvidas em instituies pblicas, seja autarquia, ou fundao vinculada ao poder pblico municipal, estadual ou federal.

    Servios de representao esto localizados num ponto de intermediao entre a compra e a venda da mercadoria. Entre eles, poderamos incluir: imobilirias, consultoras, jornais (escritrios de vendas), sindicatos, cartrios, assessoria e consultoria, agncias de cobrana, consrcios, agncias de publicidade, de marcas e patentes, de empregos, de limpeza e conservao de imveis, de shows e promoes artsticas, empresas de turismo, associaes, etc.

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    Servios de consumo envolvem todas as atividades produtoras de servios de consumo imediato, sendo que estes so produzidos em um mesmo ponto do espao-tempo. A sua atividade comea e acaba no mesmo local e nem sempre seu resultado se expressa num bem material. O servio de consumo est subdividido em quatro categorias: os servios de hotelaria, alimentao, diverso e outros.

    Servios de diverso compreendem todas as atividades que tm por fim nico o lazer, o ldico, o jogo, a trama. 4 Esto includos aqui os cinemas, as casas de jogos eletrnicos, os teatros e as boates.

    Algumas atividades de consumo que no atingiram numericamente uma relevncia no quadro geral dos servios localizados no centro foram reunidas em uma nica categoria denominada outros, na qual incluram-se, por exemplo, escolas, cabeleireiros, tintureiros, consertos em geral, estacionamento, etc.

    Apesar da diviso em sub-categorias configurar um quadro ntido das transformaes, observou-se, de acordo com PENNA (1997), que

    nenhuma categoria ou sub-categoria suficiente para substituir aquilo que ela representa: a generalizao vai significar sempre uma reduo da realidade. Ao se lerem os dados tabulados, no se deve desconsiderar que, embora o universo abarcado por cada categoria ou sub-categoria guarde uma homogeneidade, que o que lhe permitiu enquadrar-se em uma categoria ou sub-categoria, h internamente a essa homogeneidade uma diversidade muito grande...5

    Feita a diviso em sub-categorias, elaborou-se uma tabela com os dados relativos a 1942 e outra tabela com os dados relativos a 1997. Tais dados referem-se, em 1997, ao nmero de pavimentos da edificao , uso de cada unidade da edificao, uso predominante da edificao, poca provvel de construo da edificao e estado de conservao da mesma. Em relao a 1942, apenas o uso predominante de cada unidade foi tabulado.

    Cabe anotar ainda duas observaes relativas sub-categoria outros, levando em conta a qualidade das informaes encontradas no Livro Vermelho dos Telefones - 1944 e no levantamento in loco realizado em 1997. Em primeiro lugar, necessrio frisar que os usos que so ordenados nesta sub-categoria so os mesmos, tanto em 1942 quanto em 1997. Alm disso, em relao pesquisa realizada em lista telefnica de 1944, importante ressaltar que o uso residencial no pde ser identificado em todos os casos, pelo fato de se encontrarem profissionais liberais que constam na lista apenas pelo nome, sem indicao da profisso, o que nos levou a considerar ambos os usos na categoria outros, juntamente com os servios citados acima, o que levou a um aumento significativo no percentual desta subcategoria em 1942.

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    III - Anlise dos resultados

    Para uma melhor compreenso dos resultados obtidos, apresentamos a seguir a anlise individualizada de cada um dos cruzamentos relevantes:

    Grficos 3 e 4 - Distribuio dos servios de consumo em 1942 e 1997

    Dentro da totalidade de unidades de ocupao consideradas na categoria servios de consumo, podemos comparar a situao do ano de 1942 em contraposio ao ano de 1997.

    Em primeiro lugar, salta aos olhos como a sub-categoria hotelaria - que aqui engloba hotis, penses e motis -, teve um aumento significativo dentro do perodo analisado: de 27,4% em 1942 aumentou para 43,2% do total dos servios de consumo presentes na rea. Analisando-se mais detidamente os dados, pode-se constatar que tal fato deve-se principalmente ocupao das edificaes por motis, que foi intensificada nos ltimos anos.

    Na sub-categoria alimentao, os dados devem ser lidos levando-se em conta que as porcentagens revelam o uso predominante. Assim, mesmo tendo ocorrido um aumento significativo do nmero de bares e lanchonetes em relao a 1942, na medida em que grande parte deles localiza-se em edifcios de escritrios e hotis, esse aumento no se manifesta claramente no grfico de uso, mas apenas num estudo mais detalhado.

    Grficos 5 e 6 - Distribuio dos Servios de Circulao

    Dentro da categoria servios de circulao, percebemos pequenas diferenas entre os dois perodos analisados. claro que a totalidade das edificaes existentes em 1942 associadas a essa categoria superior ao total de edificaes existentes em 1997, mas as porcentagens nesse caso que devem ser levadas em considerao para uma melhor compreenso dos resultados.

    As sub-categorias servios pblicos (de 4,0% para 3,5%), atividades financeiras (de 2,5% para 2,8%) e comrcio varejista (de 61,6% para 58,5%), no sofreram alteraes significativas, mas o comrcio atacadista expandiu-se (de 3,0% para 15,5%), resultando numa alterao da estruturao da rea estudada, no que diz respeito ocupao do solo e no impacto causado pela substituies de pequenos prdios por galpes de mdio porte.

    Os servios de representao, por sua vez, registraram queda no perodo de 1942 a 1997: enquanto em 1942 perfaziam 28% do total, em 1997 constituem apenas 19,7% das edificaes analisadas. O desenvolvimento de novos centros , alm do processo de degradao pelo qual vem passando esta regio, pode ter causado uma crescente desocupao, principalmente por parte dos escritrios de representao.

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    Grfico 7 Estilo de Construo das Edificaes

    Esse um dos grficos mais importantes que elaboramos, na medida em que mostra a permanncia e as transformaes ocorridas. Numa primeira anlise j possvel observar, no total das edificaes existentes, o peso que tm as edificaes construdas at a metade do sculo XX.

    Da totalidade das edificaes levantadas apenas 9,4% so remanescentes das principais dcadas da capital (897-1930), 50,2% foram construdas entre 1930 e 1960, 33,2% datam de 1960 a 1980 e apenas 7,2% dos edifcios do conjunto em estado foram construdos entre 1980 e 1997. Esse quadro mostrou-nos claramente um perfil atpico em relao a outras reas do centro tradicional de Belo Horizonte: enquanto aqui permanece grande parte das edificaes construdas entre 1930 e 1960, em outros conjuntos urbanos pode-se constatar visivelmente a substituio dos exemplares arquitetnicos desse perodo, por edifcios de mais de 15 pavimentos, construdos aps 1960.

    A manuteno de uma parcela considervel das construes com os mesmos usos e ocupaes de cinqenta anos atrs no conjunto urbano estudado tem pelo menos duas causas provveis. Inicialmente, o contexto scio-cultural em que ela se insere: a rua dos Caets tornou-se lugar de comrcio de tecidos e confeces, armarinhos e restaurantes, em sua maioria administrados por famlias de srios e rabes, que ocupam a rea desde os primeiros anos da cidade e a se mantm. Isso pode ter impedido, de certo modo, que ocorresse a demolio sistemtica das edificaes, como ocorreu com outras edificaes do centro da cidade.

    A outra razo vem do fato de que a rea tem sido considerada imprpria para novos empreendimentos comerciais por parte da iniciativa privada, uma vez que se encontra em processo de degradao h alguns anos, no atraindo desse modo a ateno dos investidores para a regio. Em reforo a essa tendncia nota-se ainda, a partir de 1980, uma transformao no uso de algumas edificaes com reformas e ampliaes que resultaram em pequenos galpes ou demolio de outros edifcios para a construo de novos motis.

    Tais fatores resultaram em um complexo urbano no qual a quase totalidade das edificaes tm at quatro pavimentos, tendo sido construdas entre 1897 e 1960. De acordo com o grfico 8, que representa o ndice de verticalizao do conjunto, podemos ter informaes que, juntamente com o grfico 7, podem esclarecer alguns pontos da evoluo da regio. Do total de edificaes, 82,4% tm at quatro pavimentos, 9,3% tm de cinco a dez pavimentos e apenas 7,7% dos edifcios tm mais de onze pavimentos. Numa rpida anlise, podemos considerar que os edifcios com at quatro pavimentos foram quase todos construdos desde 1897 at 1960, abrangendo o estilo ecltico e o estilo art dco. Por outro lado, pode-se afirmar tambm que os edifcios com mais de onze pavimentos provavelmente foram construdos aps 1980, correspondendo s edificaes contemporneas representadas no grfico 7.

    Grfico 8 - Estado de Conservao das Edificaes

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    Em nossa pesquisa de campo, consideramos em bom estado de conservao aqueles edifcios que tm a parte externa e o primeiro pavimento sem sujeira ou marcas de vandalismo: somam 36,3% das edificaes existentes na regio. As edificaes avaliadas como regulares, no que diz respeito ao estado de conservao, perfazem 61,1% do total, restando apenas 4,2 % do total classificados como em pssimo estado, estando abandonadas ou parcialmente demolidas.

    IV - Concluses - A Rua dos Caets, corredor tradicional do comrcio

    A Rua dos Caets, local do antigo comrcio dos rabes e Judeus, tem nas lojas de roupas feitas sem destaque, seguidas pelas de caladas, material escolar, armarinhos, bares e lanchonetes.6

    Celina Borges Lemos

    Contrariamente maior parte do centro de Belo Horizonte, nosso estudo mostrou que poucas transformaes marcaram o perodo de 1942 a 1997 na rua dos Caets no que diz respeito ao uso e ocupao. Apenas alguns edifcios mais altos foram construdos, em grande parte para acomodar escritrios de representaes e instituies pblicas, mas nenhum para uso residencial.

    A maior parte dos seus edifcios tem at 4 pavimentos. H uma preferncia em se colocar os edifcios mais altos nas esquinas, talvez pela maior monumentalidade que se d ao projeto, ou pela maior rea disponvel no terreno. Assim, desde o incio da rua, na esquina com a avenida Amazonas (onde se localizam dois hotis, um com sete e outro com 11 andares) at o encontro com a avenida Afonso Pena (marcado por um hotel de 12 pavimentos e um edifcio de escritrios com 25 andares), podemos perceber o modo como se valorizam aqui as esquinas, principalmente as que se encontram nas extremidades da rua e atuam como verdadeiros prticos.

    As edificaes que constituem a rua dos Caets so em geral mal conservadas. Algumas necessitam de pintura, outras de reforma completa, mas nenhuma est em estado precrio de conservao que impea o funcionamento das atividades ali presentes.

    Em relao ao uso, tambm se percebe uma notvel continuidade. A Rua dos Caets, mantendo a sua tradio, continua a ser a grande referncia do comrcio popular no centro da cidade. Alm do comrcio formalmente institudo, podemos definir a rua hoje como um mercado a cu aberto: camels nas caladas em toda a sua extenso fazem parte da rotina de quem passa por esse caminho. Ali vende-se de tudo, inclusive os produtos que se encontram nas lojas de confeces, magazines populares, produtos eletrnicos, havendo um certo mimetismo entre o que os camels vendem e o que vende o ponto comercial em frente ao pedao da calada em que se localizam. Se a loja vende discos um camel situado na calada contgua vende discos e fitas tambm; se h uma loja de produtos eletrnicos, camels vendem produtos eletrnicos mais barato que a loja.

    O uso da rua dos Caets no se restringe apenas ao comrcio, sendo o numero de hotis bastante superior ao de muitas outras rua do centro. Eles tambm esto presentes

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    principalmente nas esquinas, havendo grande predominncia daqueles de nvel mdio. Eles convivem com alguns edifcios de escritrios e uns poucos edifcios pblicos, entre os quais se destaca o edifcio da central de exames do INPS, muito movimentado durante todo o dia.

    Enquanto os usos e a ocupao no parecem ter se modificado com a mesma intensidade que em outras reas do centro tradicional de Belo Horizonte, a Rua dos Caets foi atingida por uma transformao que tem marcado grande parte daquela rea: a sua transformao em corredor de passagem para um trnsito metropolitano cada vez mais sobrecarregado. A Rua dos Caets em particular transformou-se num corredor de nibus, com grande quantidade de pontos de parada. Os pedestres, impedidos de caminhar pelas caladas devido presena de inmeras bancas de camels, dividem a rua com os veculos automotores.

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    V - Anexos Anexo 1 - Mapa 1942

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    Anexo 2 - Mapa 1997

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    Anexo 3 Grficos

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    Anexo 4 Maquetes

    DISTRIBUIO DOS SERVIOS TERCIRIOS EM 1942

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    SERVIOS DE REPRESENTAO SERVIOS PBLICOS ATIVIDADES FINANCEIRAS COMRCIO ATACADISTA COMRCIO VAREJISTA OUTROS DIVERSO ALIMENTAO

    HOTELARIA ATIVIDADES INDUSTRIAIS

    DISTRIBUIO DOS SERVIOS TERCIRIOS EM 1997

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    SERVIOS DE REPRESENTAO SERVIOS PBLICOS ATIVIDADES FINANCEIRAS COMRCIO ATACADISTA COMRCIO VAREJISTA OUTROS DIVERSO ALIMENTAO

    HOTELARIA SEM USO

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    MAPEAMENTO CULTURAL DO CONJUNTO URBANO

    IMVEIS TOMBADOS (ALTIMETRIA EXISTENTE) IMVEIS DE INTERESSE CULTURAL (ALTIMETRIA EXISTENTE) OUTROS IMVEIS (ALTIMETRIA CONSOLIDADA) OUTROS IMVEIS (ALTIMETRIA PREVISTA)

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    ESTUDO PROSPECTIVO DO DESENVOLVIMENTO DO CONJUNTO URBANO DA RUA DOS CAETS

    Esta maquete leva em considerao a nova Lei de Uso e Ocupao do Solo, aprovada em 1996, com o intuito de se demonstrar qual seria a configurao da regio em estudo caso se projetasse de acordo com os modelos de assentamento presentes na lei.

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    VII - Referncias Bibliogrficas

    1. LEMOS, Celina Borges. Determinaes do Espao Urbano: A Evoluo Econmica, Urbanstica e Simblica do Centro de Belo Horizonte. Tese apresentada ao Mestrado de Sociologia da UFMG, Belo Horizonte, 1988.

    2. LVI-STRAUSS, Claude. Tristes Trpicos. Editorial Universitria de Buenos Aires, 1970. pp. 81/82.

    3. Prefeitura de Belo Horizonte. Plano Diretor de Belo Horizonte. Belo Horizonte:1995.

    4. LEMOS, Celina Borges. Op. Cit.

    5. PENNA, Alcia Duarte. O espao Infiel. Quando a Economia Capitalista Impe-se Cidade. UFMG, 1997. Dissertao de Mestrado/ IGC.

    6. LEMOS, Celina Borges. Op. Cit.