as operações aritméticas e a aprendizagem de matrizes no ... · matrizes para realizar o estudo,...
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Tiago Pereira de Avila
Rosemary Aparecida Santiago
AS OPERAÇÕES ARITMÉTICAS E A
APRENDIZAGEM DE MATRIZES NO
ENSINO MÉDIO
Universidade Cruzeiro Do Sul
2013
© 2013
Universidade Cruzeiro do Sul
Pró-Reitoria de Pós-Graduação e Pesquisa
Mestrado Profissional em Ensino de Ciências e Matemática
Reitor da Universidade Cruzeiro do Sul – Profa. Dra. Sueli Cristina Marquesi
PRÓ-REITORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA
Pró-Reitor – Prof. Dr. Danilo Antonio Duarte
MESTRADO PROFISSIONAL EM ENSINO DE CIÊNCIAS E MATEMÁTICA
Coordenação – Profa. Dra. Edda Curi
Banca examinadora
Rosemary Aparecida Santiago
Rosa Monteiro Paulo
Laura Marisa Carnielo Calejon
FICHA CATALOGRÁFICA ELABORADA PELA BIBLIOTECA CENTRAL DA
UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL
A972o
Avila, Tiago Pereira de.
As operações aritméticas e a aprendizagem de matrizes no
ensino médio / Tiago Pereira de Avila. -- São Paulo: Universidade Cruzeiro do Sul, 2013.
37 p. : il. Produto educacional (Mestrado em Ensino de Ciências e
Matemática). 1. Ensino de matemática 2. Operações aritméticas 3.
Matemática – Dificuldades de aprendizagem 4. Matemática – Ensino médio. I. Título II. Série.
CDU: 51
Ficha catalográfica a ser elaborada pela Biblioteca
Sumário
1 APRESENTAÇÃO ................................................................................................................... 5
2 O DESENVOLVIMENTO MENTAL DO SER HUMANO E A CONSTRUÇÃO DAS
OPERAÇÕES MATEMÁTICAS ................................................................................................ 9
3 A DESCRIÇÃO DE UM EXPERIMENTO REALIZADO EM SALA DE AULA: O
TRATAMENTO DIDÁTICO DO ERRO NO ENSINO DE MATEMÁTICA ........................ 15
3.1 CONSIDERAÇÕES ACERCA DO PAPEL DO ERRO NO ENSINO DE MATEMÁTICA
..................................................................................................................................................... 15
3.2 O TRATAMENTO DIDÁTICO E A PERCEPÇÃO DOS ERROS PELO PROFESSOR
..................................................................................................................................................... 16
3.3 O TRATAMENTO DIDÁTICO DAS DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM EM
MATEMÁTICA COM NÚMEROS INTEIROS ....................................................................... 18
3.4 PRÉ-TESTE E CATEGORIZAÇÃO DOS ERROS ....................................................... 20
4 ORIENTAÇÕES AO PROFESSOR ................................................................................... 27
4.1 ORIENTAÇÕES AO PROFESSOR PARA O TRATAMENTO DIDÁTICO DO ERRO DO
PONTO DE VISTA COGNITIVO ............................................................................................ 28
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................................ 31
REFERÊNCIAS ........................................................................................................................ 34
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Mestrado Profissional em Ensino de Ciências e Matemática
1 APRESENTAÇÃO
A pesquisa intitulada O conhecimento das operações aritméticas e a
aprendizagem de matrizes no ensino médio: análise de interferências
aborda a aprendizagem de matemática, em especial, das quatro operações
aritméticas no Ensino Fundamental I e sua interferência na aprendizagem do
conteúdo de matrizes no Ensino Médio. Este estudo foi defendido no ano de
2013 com o objetivo de investigar e analisar como os alunos do segundo ano
do Ensino Médio relacionam o conceito das quatro operações aritméticas com
o conteúdo de matrizes e se os erros, por eles cometidos, estão vinculados ao
processo de resolução envolvendo a aplicação das operações básicas ou ao
conhecimento do conteúdo de matrizes.
O pesquisador é professor da Rede de Ensino Estadual de São Paulo e
leciona a disciplina de matemática no Ensino Médio desde 2007. A partir de
experiências vividas em sala de aula, notou que durante a realização de
exercícios, atividades ou avaliações, os alunos erravam muito na aplicação das
operações no processo de resolução de questões dos conteúdos de suas
séries, e esse foi o motivo do tema para pesquisa. Foi escolhida a matéria
matrizes para realizar o estudo, pois a mesma exige muito as operações
básicas.
Em 2011 trabalhou somente com turmas de alunos de 2ºs anos do
Ensino Médio de uma escola pública do Estado de São Paulo. Por meio desta
atuação apresenta aqui três exemplos de erros observados durante algumas
aulas: 1º) Eles entendiam como funcionava a adição/subtração entre matrizes,
mas erravam ao somar ou subtrair elementos de posições equivalentes; 2º) Em
uma aula, sobre trigonometria, já havia ensinado os alunos a calcularem os
lados de um triângulo-retângulo (com um de seus lados conhecido e um ângulo
interno dado) com as relações métricas seno, cosseno e tangente, quando,
depois de fazer todos os algoritmos corretos (nomear os lados do triângulo,
escolher qual das relações usar, trocar a relação pelo valor da tabela
trigonométrica, substituir os lados pelos valores do triângulo, usar razão e
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proporção, trabalhar com equação do primeiro grau, racionalizar a resposta),
uma aluna respondeu “x é igual a doze vezes raiz de três divididos por três”, e
me perguntou se estava certa a resposta e acabaria ali mesmo. Disse que
estava tudo certo e para “terminar”, precisava apenas dividir doze por três e
continuar multiplicando essa resposta por raiz de três. A aluna me disse que
não sabia qual seria o resultado, veria a resposta no celular, a colocaria no
caderno e me traria para correção; 3º) Em outubro desse mesmo ano revisava
o “Teorema de Pitágoras” com os alunos, para futuramente trabalhar geometria
espacial, e propus um exercício de um triângulo isósceles de base 12 cm e
lados iguais de 10 cm para acharem a altura. Depois da explicação, um aluno
veio tirar uma dúvida na minha mesa e falou: “Professor, a hipotenusa não é ‘x’,
é 10, não é?! (Confirmei com a cabeça), um cateto será o ‘x’ e o outro a
metade de 12, porque temos que dividir a base ao meio, não é?!” Eu disse:
“Isso mesmo, e quanto colocaremos no outro cateto que não é ‘x’?” O aluno
insistiu que seria a metade de 12 e eu perguntei quanto valia a metade de 12.
Ele falou que resolveria na calculadora e voltaria para me falar.
Nos dois últimos exemplos os alunos compreenderam o conteúdo que
estava sendo estudado e conseguiram resolver os exercícios com auxílio da
calculadora, que foi usada como um recurso para os cálculos de divisão.
As pessoas não precisam dominar os conteúdos avançados da
matemática, mas é importante que dominem as quatro operações, pois as
mesmas aparecem em nosso dia a dia, sendo relevante saber como resolver
isso rapidamente e por meio do cálculo mental.
A matemática está entre as disciplinas que os alunos mais reprovam, sendo considerada uma das mais difíceis pelos alunos de ensino médio. Essencial não apenas na escola ou em exames e concursos, mas também na vida cotidiana e no exercício pleno da cidadania, a matemática precisa ter seu ensino discutido e repensando para que este possa ser significativo e alcance seus objetivos. (ROJAS, 2012, p. 3).
Com novas tecnologias e o fácil acesso a elas, como o uso de celulares
com calculadoras, no cotidiano até por crianças, o ensino de matemática e
seus conteúdos deveriam ser repensados para adequarem-se melhor a essa
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evolução, possibilitando, deste modo, o foco no conceito e nas estratégias
utilizadas. Entretanto, essas mudanças não podem prender-se exclusivamente
aos cálculos com ajuda de recursos, nos deixando dependentes de uma
máquina que faça pequenas contas para nós, perdendo assim a habilidade do
cálculo mental, estratégias para resolução de problemas e julgamento com
criticidade dos resultados encontrados.
A escolha dessa temática se deu por perceber uma maior dificuldade
dos alunos nas operações básicas que são necessárias para resolver
exercícios como adição, subtração, multiplicação e determinantes de matrizes.
É dado muito destaque às quatro operações básicas no Ensino
Fundamental I, e no Ensino Médio ainda são muito utilizadas. Entretanto, no
decorrer do processo educacional sua importância é diminuída, possivelmente
por ter reduzida sua ênfase no final do Ensino Básico. Não existem muitas
publicações e pesquisas que abordam o ensino-aprendizagem dessas
operações no Ensino Médio, faltando uma literatura específica para
professores que atuam nessa fase da Educação.
Zunino (1995) apresenta o relato de um professor que afirma:
O mau é quando vão indo de forma mecânica, porque depois custa-lhes mais. Uma coisa é aprender mecanicamente e outra é aprender por interpretação; isso você nunca mais esquece. E o que você memoriza se esquece através do tempo. Como isso tem sido memorizado... E como uma gravação que esqueces por tê-la aprendido por repetição, porém não por conhecimento ou porque tenha sentido o que você está lendo. (ZUNINO, 1995, p. 16).
Por meio desta pesquisa, busco analisar se os alunos que aprendem o
conceito das operações básicas no Ensino Fundamental conseguem aplicá-lo
nos conteúdos novos que estão aprendendo no Ensino Médio. Para tanto,
pretende-se averiguar se a maior parte dos erros é atribuída aos conteúdos ou
às operações durante a realização das atividades.
É evidente que outros fatores, como o aluno ter um bom domínio da
leitura, interpretação e raciocínio lógico, motivação, entre outros tantos,
influenciam no aprendizado, mas o foco da pesquisa foi a compreensão dos
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alunos sobre as operações básicas e sua aplicação na aprendizagem de
matrizes, por ser um conteúdo que trabalho com os alunos durante o ano letivo
e por muitas vezes como professor identificava que muitos erros não eram
relacionados à matéria, mas ao caráter instrumental de sua resolução e às
quatro operações estão mais presentes nesse tema do que em outros assuntos
do 2º ano do Ensino Médio. Para Orrantia (2006, p. 158), “A aprendizagem da
matemática supõe, junto com a leitura e a escrita, uma das aprendizagens
fundamentais da Educação Básica, dado o caráter instrumental dos seus
conteúdos”.
A partir dessas experiências, interessamo-nos em saber se no decorrer
de seus estudos os alunos aprenderam as operações de um modo significativo
e se ainda lembravam-se do conceito e de como aplicá-lo em novos conteúdos
do Ensino Médio, no caso, em matrizes, ou se os mesmos encontravam
dificuldades nessa execução.
Para melhor andamento da pesquisa, foram definidas algumas questões
problematizadoras:
Os alunos que têm maior domínio da resolução das operações básicas
conseguem aprender melhor o conteúdo de matrizes de modo diferente
dos alunos que têm dificuldades na realização das operações?
O ensino de matrizes, por si só, possibilita ao aluno um aprendizado e
uma compreensão das quatro operações e sua aplicação no próprio
conteúdo de matrizes?
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2 O DESENVOLVIMENTO MENTAL DO SER HUMANO E A CONSTRUÇÃO
DAS OPERAÇÕES MATEMÁTICAS
Teixeira (1992) traz estudos de Piaget que apontam o desenvolvimento
mental do ser humano através de mudanças estruturais, que ocorrem a partir
das interações produzidas entre o sujeito e o objeto de conhecimento. Nesse
estudos, Piaget afirma que essas estruturas pertencem ao inconsciente
cognitivo e o indivíduo não tem consciência desse processo pelo qual está
passando.
São quatro os níveis definidos por Piaget como os estágios
correspondentes a essas estruturas mentais: sensório-motor (0 a 2 anos), pré-
operatório (2 a 7 anos), operações concretas (7 a 11 anos) e operações
formais (11 anos em diante). Rizzi e Costa (2004) sintetizam as principais
características de cada fase:
O período sensório-motor caracteriza-se pelas sensações e pelas atividades motoras que têm suas raízes na hereditariedade. Com a sucção, os movimentos das mãos, dos olhos, etc., além das sensações ocorre um aumento gradativo na capacidade do bebê em adquirir hábitos, coordenar visão e preensão, coordenar esquemas, descobrir novos meios e solucionar alguns pequenos problemas. O período pré-operatório abrange a primeira infância e é anterior ao aparecimento das operações propriamente ditas, mas prolonga os mecanismo de assimilação e a construção do real própria ao período sensório-motor anterior. O pensamento da criança, no período pré-operatório, é intuitivo e, sendo ela ainda pré-lógica, suas respostas são apoiadas basicamente na percepção. Ela passa a interiorizar os esquemas de ação (o que faz na ação passa a fazer também em pensamento) e a fazer uso da função simbólica. Existem três manifestações importantes da função simbólica: a imitação diferida, quando a criança é capaz de imitar uma determinada situação ou pessoa sem a presença da mesma; o brinquedo simbólico ou “faz de conta”, quando a criança passa a imaginar suas brincadeiras e interage em sua imaginação; e a fala, que é a mais importante manifestação da função simbólica; é a partir da fala que a representação se acentua, pois uma única palavra pode substituir, representar uma diversidade de ações antes efetuadas na prática pela criança. O período das operações concretas abrange a infância propriamente dita e caracteriza-se, principalmente, pela capacidade adquirida pela criança de realizar operações concretas. Esta capacidade tem sua constituição fundamentada a partir do agrupamento das relações intuitivas (próprias do período anterior) em sistemas de conjunto e que transformam as intuições em operações de todos os tipos. A noção de operação aplica-se a realidades diversas, mas bem definidas. Existem as operações lógicas, as aritméticas, as geométricas, as temporais, as mecânicas, as físicas, etc. Então, uma operação é uma ação cuja origem é sempre motora, perceptiva ou
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intuitiva. Gradativamente, o raciocínio lógico (mais característico neste período) vai se sobrepondo à percepção e à intuição próprias ao período anterior. Essa lógica se manifesta, essencialmente, pela capacidade que a criança demonstra em considerar as situações como um todo, estabelecendo as relações entre os elementos que a compõem. A criança passa a organizar, em sistemas, as informações de que dispõe, conservando-as, revertendo-as, compondo-as, etc., portanto, lidando com várias relações possíveis neste sistema. O quarto e último período, denominado operatório formal, envolve a adolescência, etapa onde ocorre a passagem do pensamento concreto para o formal. A estrutura formal conquistada neste período é constituída a partir da estrutura operatória, própria do período anterior. Naquele período, a criança pensava concretamente sobre cada problema conforme eles surgiam e não estabelecia relações entre suas soluções e teorias gerais. Ao contrário, o que se observa no adolescente é seu interesse por problemas abstratos e a facilidade com que elabora as respectivas teorias que versam sobre política, filosofia, ética, enfim, particularmente, sobre sistemas que visem transformar o mundo. Este tipo de raciocínio é denominado hipotético-dedutivo. (RIZZI & COSTA, 2004, p. 31-32).
Desde muito pequenas, ainda no período sensório-motor, as crianças
têm contato com quantidades, somente conseguem distinguir entre poucos ou
muitos objetos e fazem relações de correspondência de unidade com unidade.
Quando uma criança atinge a idade de quinze ou dezesseis meses, ultrapassa o estágio da simples observação do mundo ao redor. Já é capaz de conceber o princípio da correspondência unidade a unidade e em particular a propriedade do emparelhamento. Se lhe dermos, por exemplo, tantas bonecas quantas cadeirinhas, vê-la-emos provavelmente associar cada uma dessas bonecas a cada cadeira. Brincando ao acaso ela não fará outra coisa senão emparelhar os elementos de uma primeira coleção (as bonecas) àqueles de uma segunda coleção (as cadeiras). Se lhe dermos, ao contrário, mais bonecas do que cadeiras (vice-versa) vê-la-emos, sem dúvidas, embaraçada ao final de algum tempo; terá constatado a impossibilidade de um emparelhamento. (IFRAH, 1997, p. 22).
Começam a usar números para contar a partir dos três anos, ainda no
começo do pré-operatório, dando início ao cálculo abstrato, fazendo contagens,
inicialmente, até 10 com ajuda das duas mãos.
Quando a criança atinge 6 ou 7 anos e inicia o período das operações
concretas, e também o período escolar do Ensino Fundamental, começa a
formalizar o aprendizado dos números, porém precisa apoiar-se na realidade
concreta para as tarefas matemáticas.
É a partir deste estágio (operações concretas) que começam a ver o mundo com mais realismo, deixam de confundir o real com a fantasia. É neste estágio que a criança adquire a capacidade de realizar
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operações. Podemos definir operação como a ação interiorizada - realizada no pensamento, componível - composta por várias ações, como a reversível - pode voltar ao ponto de partida. A criança já consegue realizar operações, no entanto, precisa de realidade concreta para realizar as mesmas, ou seja, tem que ter a noção da realidade concreta para que seja possível à criança efetuar as operações. [...] pois já compreendem a noção de volume, bem como peso, espaço, tempo, classificação e operações numéricas. [...] primeiro a criança aprende o conceito de número e seriação, por volta dos sete anos, depois a classificação da realidade, mas essa classificação vai variando conforme a aprendizagem que ela vai fazendo ao longo do tempo. (CARVALHO, 2006, p. 1).
A partir dos 11 ou 12 anos, quando chega ao Ensino Fundamental II e
tem o primeiro contato formal com os números negativos, a criança entra no
estágio das operações formais. O educando está em uma fase de transição, já
não precisando mais apoiar-se totalmente na realidade concreta para realizar
as operações matemáticas, entretanto, o professor não pode confundir isso e
achar que o estudante irá conseguir abstrair tudo o que lhe é ensinado,
desvinculando esse ensino-aprendizagem do cotidiano do aluno.
A dificuldade que os matemáticos sentiram é a mesma que os nossos alunos enfrentam ao estudarem os números relativos e suas operações. Além disso, a passagem do estágio das operações concretas para as abstratas, com todas as implicações que elas trazem, acentua a necessidade de estudo e de aprofundamento didático em números relativos. (HOFFMANN apud TEIXEIRA, 2011, p. 3).
Para Piaget (1996), o desenvolvimento mental passa pelas quatro fases
descritas anteriormente, e a construção das operações pode demonstrar a
ligação entre as características biológicas e as formas do pensamento como
manifestações da adaptação do sujeito ao mundo real, entretanto o processo
desse desenvolvimento não está relacionado diretamente ao método de
aprendizagem de cada indivíduo. Para Coll (apud Teixeira, 1992, p. 77) a
“diferença fundamental entre o processo evolutivo e o processo educativo é
que o primeiro refere-se a uma gênese espontânea enquanto o segundo é
resultado de uma atividade intencional”.
De um modo simplificado, no processo educativo, para Piaget (1996), o
sujeito constrói o conhecimento pelo procedimento de equilibração, sistema
esse que o indivíduo sofre perturbações, criando uma desequilibração em seus
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esquemas mentais, buscando a assimilação do elemento exterior e suas
propriedades particulares sobre os quais aplicam-se a um novo esquema de
pensamento e com isso uma acomodação gerando uma reequilibração de suas
estruturas cognitivas.
Para Wadsworth (1996) os esquemas são estruturas mentais, ou
cognitivas, pelas quais os indivíduos adaptam-se intelectualmente e organizam
o meio. Os esquemas são tratados como conjuntos de processos dentro do
sistema nervoso, não como objetos reais. Os esquemas não são observáveis,
são inferidos e, portanto, são constructos hipotéticos.
Teixeira (1992) relata que as perturbações são relativas ao
desenvolvimento das estruturas mentais do indivíduo.
As perturbações são definidas por Piaget (1975/1976) como “algo que serve de obstáculo a uma assimilação”, o que não significa que todo obstáculo seja perturbador por si mesmo, porque nem todos os estímulos ou problemas colocados pelo meio são perturbadores para sujeito. Só haverá perturbação se as estruturas mentais estiverem desenvolvidas a ponto de assimilá-la como tal. A reação do sujeito conduz a regulações, embora nem toda perturbação provoque uma regulação. (TEIXEIRA, 1992, p. 19).
Piaget (1996) definiu assimilação como:
[...] uma integração a estruturas prévias, que podem permanecer invariáveis ou são mais ou menos modificadas por esta própria integração, mas sem descontinuidade com o estado precedente, isto é, sem serem destruídas, mas simplesmente acomodando-se à nova situação. (PIAGET, 1996, p. 13).
E depois definiu acomodação da seguinte maneira:
Chamaremos acomodação toda modificação dos esquemas de assimilação sob a influência de situações exteriores aos quais se aplicam. Mas, assim como não há assimilação sem acomodações (anteriores ou atuais), assim também não há acomodação sem assimilação. Isto significa que o meio não provoca simplesmente o registro de impressões ou a formação de cópias, mas desencadeia ajustamentos ativos. E por isso que só falamos em "acomodação" subtendendo "acomodação de esquemas de assimilação". (PIAGET, 1996, p. 18).
Para Piaget (1996), a equilibração é o mecanismo principal que o
desenvolvimento depende, é resultado da assimilação e acomodação, e:
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[...] constitui um processo muito geral, que, em grandes linhas, vem a opor compensações ativas às perturbações exteriores; compensações que variam, sem dúvida, segundo os níveis e os esquemas do sujeito, mas consistem sempre em reagir às perturbações sofridas ou antecipadas. (PIAGET, 1996, p. 37).
Vergnaud (1982) acredita que a formação de conceitos é um processo
demorado, que ocorre com as interações do sujeito com novas situações do
meio. Para ele, o conhecimento operacional surge a partir da resolução de
problemas, e quanto mais variedades dessas situações o aluno resolve, melhor
cria e/ou amplia determinados conceitos que já possui. Para o autor, a
formação de um conceito envolve muitos processos e está ligada a muitas
situações, invariantes e representações, não sendo possível estudá-los
isoladamente, e cabe ao professor partir do conhecimento já existente do
aluno, gerando conflitos, para que crie novas relações, favorecendo a
acomodação e assimilação de suas ideias. Somente após certo tempo
estudando um mesmo tema e aprofundando-se progressivamente, o professor
precisa generalizar as propriedades relevantes dessas situações e partir para
definições com a linguagem matemática. Para esse estudo, Vergnaud (1982)
alega que é necessário mapear todos os elementos envolvidos através do que
chama de campos conceituais, que são definidos por ele como “conjunto de
situações cujo domínio requer uma variedade de conceitos, procedimentos e
representações simbólicas fortemente unidos uns aos outros”. É importante
trabalhar diferentes situações em sala de aula e depois estimular o aluno a
relacionar seu aprendizado escolar com atividades do seu dia a dia, a fim de
mobilizar seu conhecimento, adaptá-lo e aplicá-lo a situações fora da escola.
As competências e concepções dos alunos desenvolvem-se ao longo do tempo através de experiências com um grande número de situações, tanto dentro quanto fora da escola. Em geral, quando defrontados com uma nova situação, eles usam um conhecimento desenvolvido através de experiências em situações anteriores e tentam adaptá-lo a essa nova situação. É preciso gerar provocações pelas quais conduzir os alunos a descobrir novas relações e conceitos novos. (VERGNAUD, 2012, p. 15).
Quando o aluno inicia o Ensino Fundamental II é essencial prosseguir o
trabalho dos ciclos anteriores, tanto no conteúdo dos números inteiros como
complemento do conjunto dos naturais, nas quatro operações, tratando
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adição/subtração e multiplicação/divisão como operações inversas, e na
diversidade de situações de aprendizagem, principalmente as que utilizam
problemas mais voltados para o contexto do aluno.
Construir os invariantes necessários a cada uma destas operações com inteiros supõe abstrações reflexivas que facultam destacar a estrutura comum a diversas situações nas quais estão implícitas realidades numéricas representativas dos inteiros. Se tal construção se dá sobre a forma de autorregulação, deduz-se que se for possibilitada a criança maior heterogeneidade de situações, contextos e mesmo linguagens, ampliam-se os pontos de referência e a possibilidades de interconexões. Em outras palavras, a diversidade de situações das quais partem os problemas, desde que não levem a reproduções mecânicas, favorecem à abstração tanto quanto possibilitam que o dado abstraído se generalize, permitindo reconstruções diante de novos problemas. (TEIXEIRA, 1992, p. 100).
Após passar por diferentes situações de aprendizagem, criar suas
próprias hipóteses e as testar em vários problemas matemáticos, o aluno
começa a assimilar aquele conceito trabalhado e o professor, de forma gradual,
insere a linguagem matemática, até então não familiar para criança, para que
aconteça o esquema de autorregulação e reequilibração. Fraga (1988) cita
Dienes (1974) para mostrar que o professor deve partir da construção do
conhecimento do aluno para a linguagem matemática e não ao contrário.
Em Matemática, a criança vai utilizar outra linguagem; ela não tem pressa nenhuma em aprendê-la, porque as experiências que estes estímulos trazem são por demais estranhos para ela. (DIENES, 1974, p. 6). Sabe-se que o desenvolvimento da linguagem usual se dá gradativamente e é uma consequência da familiaridade e domínio de certo número de conceitos, por intermédio de experiências vividas pela criança em situações simbolizadas por estes termos. Assim também acontece com a linguagem matemática; as crianças precisam ter [...] oportunidade de passar por um número suficiente de experiências variadas que lhes sejam indispensáveis, antes que o simbolismo matemático assuma toda a sua significação para elas Dienes (1974, p. 6) adverte ainda que “a não assimilação do significado ‘das expressões simbólicas’ levará o aluno a uma [...] coleção de fórmulas cuidadosamente decoradas, a fim de responder corretamente nas provas e obter boas notas”. (FRAGA, 1988, p. 41).
Deste modo, o aluno desenvolve conceitos mobilizando seus esquemas
e os organiza para a linguagem matemática, produzindo uma aprendizagem
que realmente fará sentido para ele, não apenas decorando fórmulas sem
saber o que fazer com elas ou seus significados.
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3 A DESCRIÇÃO DE UM EXPERIMENTO REALIZADO EM SALA DE AULA:
O TRATAMENTO DIDÁTICO DO ERRO NO ENSINO DE MATEMÁTICA
3.1 CONSIDERAÇÕES ACERCA DO PAPEL DO ERRO NO ENSINO DE
MATEMÁTICA
Existem muitos estudos sobre os erros cometidos pelos estudantes de
matemática e suas causas, passando por pesquisas na psicologia até a
construção da aprendizagem a partir dos erros. Esses estudos buscam
compreender a importância do erro no processo de aprendizagem dos alunos.
Em todas as matérias, mas, principalmente, em matemática, existe uma
valorização muito grande do acerto e o erro é visto como fracasso do aluno que
não aprendeu o conteúdo.
Em geral, o erro era observado pelo professor como um indicador do mau desempenho do aluno, sem jamais ser utilizado para o redimensionamento do ensino. O que permeava o ensino era uma “pedagogia da resposta” em que o erro era o sintoma visível do fracasso do aluno, assim como o acerto era o sinal mais evidente de seu sucesso. (PINTO, 2000, p. 8).
Na disciplina de matemática, para haver uma mudança, o professor
precisa mudar seus métodos de avaliação, alicerçando-se no processo que o
aluno percorre para atingir o resultado e analisar as possíveis causas dos
erros, criando subsídios para que possa planejar novas situações de
aprendizagem para ajudar a criança. Para Pinto (2004), isso:
[...] se inicia no momento em que o educador reflete sobre o significado dos erros e acertos dos alunos preocupando-se em compreender os diferentes processos que os alunos utilizam ao apropriar-se dos conhecimentos, ao inquietar-se frente aos resultados obtidos e buscar sua regulação. (PINTO, 2004, p.123).
O erro está sempre presente no ato da aprendizagem, fazendo parte da
construção do conhecimento, e não pode ser desprezado. Para Macedo
(1997):
[...] quando se considera o processo, ignorar o “erro” é supor que se pode acertar sempre ‘na primeira vez’; é eliminá-lo como parte, às
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vezes inevitável, da construção de um conhecimento, seja de crianças, seja de adultos. Como processo, ‘errar’ é construtivo. (MACEDO, 1997, 29).
Diariamente surgem situações matemáticas na vida das pessoas e uma
ótima forma de analisar os erros do aluno é estimulando-o para que trabalhe
com a resolução de problemas baseado em seu dia a dia, para que mostre
como faz para resolvê-los e faça registros de tudo, explicando cada passo
utilizado no processo empregado. É importante haver uma conversa com a
criança para que não tenha medo de errar e, mesmo que ache que está
errando, anote todo o procedimento para que o professor possa retomá-lo mais
tarde e faça uma análise mais minuciosa. Deste modo, além de melhorar o
processo de ensino- aprendizagem, o docente conhece um pouco mais sobre o
aluno e como ele pensa.
O mais importante é o professor adotar uma atitude reflexiva diante do erro do aluno, procurando, não apenas, compreender o erro no interior de um contexto de ensino, mas também compreender o aluno que erra. (PINTO, 2000, p. 164-165).
Todas essas formas de trabalhar exigem do professor mais tempo e
dedicação, porém ajudam muito a conhecer as causas dos erros cometidos.
Para cômputo de estatística deste estudo, os exercícios dos testes da pesquisa
foram considerados apenas certos ou errados, entretanto, foi dada maior
ênfase para os erros, para que fosse feita uma discussão sobre sua natureza.
3.2 O TRATAMENTO DIDÁTICO E A PERCEPÇÃO DOS ERROS PELO
PROFESSOR
Exponho, inicialmente, mais algumas experiências vivenciadas com os
alunos, em que os erros emergiram em variadas situações, principalmente no
primeiro semestre de 2012.
Como professor de matemática, todos os dias são presenciados muitos
erros dos alunos do Ensino Médio que ocorrem com muita frequência. Por
exemplo: “4+3=6”, “9-5=5”, “1x1=2”, “5x0=5”. Esses não são casos isolados,
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são frequentes e, algumas vezes, ocorrem em todas as aulas do dia. Pelos
resultados obtidos nas atividades, os erros podem ter origem no fato dos
alunos não terem assimilado o conceito das quatro operações ou algum tipo de
distração.
Já lecionei em outras duas escolas públicas e duas particulares, e esses
problemas não eram muito diferentes. Durante conversas em intervalos de
professores ou reuniões em Aulas de Trabalho Pedagógico Coletivo, percebo
que esses problemas são comuns em diversas classes de diferentes séries.
Em 2012, no final de uma aula, em uma conversa informal com uma
aluna, que obtinha as melhores notas da sala em todas as matérias, perguntei
quanto era 1x1 e ela respondeu 1; perguntei quanto era 5x0 e ela respondeu 0;
perguntei quanto era 3x4 e ela respondeu 12. Eu a elogiei por acertar as
respostas, com a intenção de deixá-la mais a vontade para as próximas
perguntas. Depois perguntei por que/o que significava 1x1=1, 5x0=0 e porque
3x4=12 e não 3x4=13, e ela disse que sabia as respostas porque havia
“decorado” a tabuada, mas não o porquê resultaria aquelas respostas. Para
“perturbar” um pouco a aluna, fiz mais algumas perguntas. Perguntei quanto
era 10x10, quando uma colega sua, que estava ouvindo a conversa, precipitou-
se em responder 20, mostrando também que, possivelmente, não tem o
conceito de multiplicação assimilado. A aluna que eu conversava inicialmente a
corrigiu e disse que a resposta era 100. Confirmei e perguntei quanto era
11x10 e, sem pensar muito, ela respondeu 110. Questionei se havia decorado
a tabuada do 11 também e ela disse que não, e explicou que somou mais 10
ao 100, que era 10x10. Como acabou a aula, pedi às duas para que
pensassem e discutissem e na próxima aula me dissessem o porquê, o que
significava 1x1=1, 5x0=0, 3x4=12, 10x10=100 e 10x11=110. No dia seguinte
perguntei para as alunas se haviam debatido sobre o que conversáramos no
dia anterior e elas confirmaram, e, mesmo após essa conversa, me disseram
que não entendiam o significado de 1x1=1, e o porquê 3x4 seria 12. Um pouco
de forma inconsciente ela conseguiu achar o 11x10=110 usando o conceito da
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multiplicação, mas não generalizou isso para as outras contas.
É possível inferir que essas alunas, durante suas vidas escolares,
tiveram o ensino-aprendizagem baseado na memorização da tabuada, sem
passarem por diferentes situações que as ajudassem a construir o conceito da
multiplicação como soma de parcelas iguais.
3.3 O TRATAMENTO DIDÁTICO DAS DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM
EM MATEMÁTICA COM NÚMEROS INTEIROS
Em minha prática docente, quando algum exercício ou problema usa
divisão de números naturais, o cenário torna-se pior. Se na adição, subtração e
multiplicação os alunos arriscam alguns palpites para as respostas durante
explicações, quando é perguntada alguma divisão “simples” como 18/3 na
lousa, é raro algum aluno tentar responder, e quando os alunos conversam de
forma mais particular em suas mesas ou na mesa do professor para tirar suas
dúvidas, às vezes esboçam alguma resposta, mas quase sempre errada.
Quando a resposta é um número racional na forma decimal, ninguém arrisca
nem tentar responder.
No conjunto dos números inteiros a situação vira uma “bagunça”. Os
alunos usam as “regras de sinais”, e de maneira errada, para tudo. Costumam
perguntar “+ com + é -?”. Aparentemente, durante suas vidas escolares, os
alunos não formaram uma boa compreensão de números negativos e suas
operações e cometem diversos tipos de erros.
Entre a diversidade de erros, os estudantes misturam a adição com
multiplicação e tentam unificar as “regras de sinais” para esses dois casos.
Problemas como esses não são exclusivos dos nossos alunos e são
encontrados desde a antiguidade, até mesmo por matemáticos daquela época,
como mostra Glaeser (1981/1985) em seu estudo sobre obstáculos.
Com essa confusão que fazem, muitas vezes acabam errando em
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situações mais simples, mostrando um obstáculo epistemológico, como afirma
Bachelard (1996): Quando a tentativa da generalização de uma ideia ou
conceito é apressada, é preciso atentar-se para que isso não se torne um
obstáculo epistemológico à formação do conhecimento científico.
Souza (2002) afirma que o conceito é uma evolução do pensamento,
algo que acontece na reconstrução de um conhecimento anterior, e quando
isso não acontece e um saber anterior mal estabelecido prevalece sobre o
novo conhecimento, temos o que Bachelard (1996) chama de obstáculos
epistemológicos.
[...] no fundo, o ato de conhecer se dá contra um conhecimento anterior, destruindo conhecimentos mal estabelecidos, superando o que, no próprio espírito, é obstáculo à espiritualidade. (...) é no âmago do próprio ato de conhecer que aparecem, por uma espécie de imperativo funcional, lentidões e conflitos. É aí que mostraremos causas de estagnação e até de regressão, detectaremos causas de inércia às quais daremos o nome de obstáculos epistemológicos. (BACHELARD, 1996, p. 17).
Relacionando o conhecimento da “regra de sinais” dos números inteiros
com os números naturais, bloqueando a evolução, alguns alunos quase
chegam a uma regressão, esquecendo-se de como fazer os exercícios mais
simples com as quatro operações.
Durante uma aula no 2º ano do Ensino Médio, quando os alunos
estavam aprendendo o conteúdo de matrizes, fiz uma revisão sobre as quatro
operações com números inteiros para podermos fazer a subtração de matrizes.
Havia alguns exercícios que começavam fáceis e depois aumentavam a
dificuldade. Dentre eles, que eram os primeiros da revisão:
5 + 2 =
5 – 2 =
2 + 5 =
2 – 5 =
Enquanto eu estava na lousa, durante a explicação, uma aluna
perguntou procurando expressar sua dúvida: “5 – 2 é igual a –3? Porquê
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Mestrado Profissional em Ensino de Ciências e Matemática
positivo com negativo, dá negativo, e 5 é positivo e 2 é negativo, então a
resposta é negativa, –3.” Menos de 1 minuto depois, a mesma aluna perguntou
novamente: “Na conta 2 – 5, se de 2 não dá para tirar 5, de onde eu vou pegar
‘emprestado’? Quanto vai dar esse resultado?”.
O conhecimento antigo atua como uma força contrária à realização de uma nova aprendizagem. A evolução do conhecimento encontra-se, então, estagnada até o momento em que ocorrer uma ruptura epistemológica com os saberes que predominaram por um certo período. Num caso extremo, a obstrução do conhecimento antigo pode até mesmo provocar uma regressão do nível de compreensão. (PAIS, 2005, p. 40).
É possível afirmar que os professores abordarem o conteúdo, mas que,
em uma tentativa frustrada de generalizar as “regras de sinais”, ocorreram
lacunas neste processo de ensino que, de algum modo, prejudicou a
construção do conhecimento dos alunos, gerando um obstáculo
epistemológico, que age como uma barreira para a realização da
aprendizagem das operações com números inteiros.
3.4 PRÉ-TESTE E CATEGORIZAÇÃO DOS ERROS
Os testes envolviam as quatro operações, e para não ficar ainda maior,
foram usados exercícios simples, não tratando diretamente com expressões
numéricas, adição, subtração, multiplicação ou divisão de números inteiros
negativos ou racionais nas formas fracionárias ou decimais.
Com a intenção de verificar se os alunos construíram os conceitos das
quatro operações, na pesquisa foram propostos testes na forma de exercícios e
problemas que simulavam situações do cotidiano, a fim de estimulá-los e
desafiá-los a acharem soluções, não importando os procedimentos ou
algoritmos que usassem para isso. Era esperado que mobilizassem esquemas
já construídos para a resolução das tarefas e, logo que terminassem os testes,
expressassem oralmente seus raciocínios empregados para que fossem
analisadas as origens desses erros.
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Para uma contagem de erros e acertos, os testes foram divididos em:
exercícios de adição/subtração que resultaram em números naturais (inteiros
positivos) e em números inteiros negativos; exercícios de multiplicação, e;
exercícios de divisão que resultaram em números naturais e em números
racionais na forma decimal. Entretanto, nas tabelas, por existirem exercícios
compostos, estão como adições, que envolvem as adições/subtrações,
multiplicações, que envolvem as multiplicações/divisões e problemas, que
envolvem as quatro operações.
Adições/subtrações que têm resultados números naturais, houve 27,3%
de erros, os exercícios que só envolviam adição houve 16,6% de erros e os
que só envolviam subtração 35,4%. A respeito das adições/subtrações que
resultaram em números inteiros negativos, houve 91,6% de erros. Aconteceram
50% de erros nos exercícios de multiplicação e 76% na divisão. Por último os
problemas, que apresentaram 58,3% de erros cometidos pelos alunos.
Para facilitar a visão desses números, segue uma tabela, onde “X”
significa erro e a ausência de caracteres representa o acerto da questão. Os
“códigos” A1, A2, etc. referem-se aos alunos, listados em ordem alfabética,
sendo tratados todos no masculino durante os exemplos e explicações, mesmo
sendo feminino.
Antes de começarem os testes, foi pedido aos alunos que
respondessem cada exercício da maneira mais completa possível, colocando o
sinal negativo, dividissem o resto, colocassem o símbolo R$ e as barras
(colchetes ou parênteses), no caso de matrizes, quando necessário. Durante
toda resolução dos testes podiam usar qualquer estratégia para resolvê-los,
com exceção do uso de recursos extras como calculadoras, por exemplo.
Todos optaram pelos algoritmos convencionais para cada operação, com ajuda
do cálculo mental.
Categorizamos cinco dos erros identificados em nossa pesquisa.
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A) Erros na Organização Espacial do Algoritmo Convencional1 – São
erros cometidos pela organização errada das colunas das unidades,
dezenas, centenas e milhares, gerando uma adição indevida dos valores
que não correspondem às mesmas casas decimais.
Apesar de terem feito, parcialmente, as somas ou multiplicações
corretas, os alunos alinharam as colunas decimais de forma errada, mostrando
que não possuem o domínio das regras de uso do sistema de numeração
decimal formado, não reconhecendo quando as parcelas são de ordens
diferentes.
No exemplo 7, o Aluno 2 respondeu a conta em duas partes, e quando
realizou a segunda adição montou o algoritmo incorretamente, colocando e
somando centenas com unidades de milhar.
O erro está relacionado à ordem de grandeza de um número e ao
algoritmo. O aluno não entende os reais valores centenas e unidades de
milhar, “armando” as contas, erroneamente, alinhando-as no método usado.
No exemplo 8, o Aluno 4 acertou as tabuadas, porém errou no algoritmo
da multiplicação, fazendo a organização espacial da soma de maneira errada.
Seu erro está relacionado à ordem de grandeza de um número e ao
algoritmo. O aluno não multiplica o número 22 como 20 e 2, mas como 2 e 2,
não entendendo o real valor desse número, e dispõe os produtos parciais de
1 Organização Espacial do Algoritmo Convencional denomina-se a posição dos números e suas
ordens de grandezas.
(Ex. 7 – Adição c – A2) (Ex. 8 – Multiplicação c – A4)
3 9 7 + 4 0 2 7 9 9 + 1 0 0 9 8 9 9 9
4 3 x 2 2 18 6 8 6 1 7 2
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modo errado, não respeitando a segunda parcela como 860, semelhantemente
ao exemplo 2, porém não tem a sorte do exemplo anterior.
B) Reprodução Errada dos Números Propostos – O aluno “arma” ou
resolve a conta com valores diferentes dos propostos no exercício.
Em ambos os exemplos os alunos fizeram os procedimentos corretos,
após as contas copiadas, e, com esses números, acertaram os resultados. Por
terem copiado os números errados, mesmo mostrando que sabiam o que
estavam fazendo, acabaram errando os resultados esperados.
No exemplo 9, o Aluno 2 copiou o número 2 ao invés do 6 quando
“armou” a conta para resolvê-la.
O erro está relacionado à outra natureza. O aluno comete o erro
devido a uma distração.
No exemplo 10, o Aluno 9, quando “armou” a conta para a resolução,
copiou o número 6 no lugar do 3, alterando assim os resultados.
O erro está relacionado à outra natureza. O erro acontece devido a
uma desatenção.
C) Reprodução Errada Da Operação Proposta – O aluno faz a
reprodução de outra operação que não a indicada no exercício.
(Ex. 11 – Adição d – A3)
(Ex. 12 – Adição a – A12)
(Ex. 9 – Adição b – A2)
1 1
9 2 7 + 5 8 5 1 5 1 2
(Ex. 10 – Adição l – A9)
3415615 911 8 + 2 8 6 + 1 7 9 - 1 7 9 1 0 9 7 – 1.097
1
8 5 8 5 3 4 1 3 9 2
3411 7 - 5 6 1 - 2 5 6
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Os dois exercícios eram de adição, porém ao resolvê-los os alunos
fizeram a operação de subtração.
No exemplo 11, o Aluno 3 não atentou-se ao que o exercício pedia e
copiou a subtração.
O erro está relacionado à outra natureza. O aluno não analisa o
exercício e o resolve com a operação errada.
No exemplo 12, quando perguntado ao Aluno 12 se estava certo, o
mesmo percebeu o erro e disse que confundiu-se ao olhar rapidamente para o
exercício proposto e achou que era subtração.
O erro está relacionado à outra natureza. O aluno comete o erro em
razão de um descuido.
D) Erros De Contagem – São erros que acontecem em consequência da
contagem dos números de uma das colunas das casas decimais ser
feita incorretamente.
Nos dois primeiros exemplos as respostas estariam certas se fossem
feitas as contagens corretas. Apesar de serem erros considerados tolos para
alunos do segundo ano do Ensino Médio, um deles não ocorreu por distração.
No exemplo 13, o Aluno 2 calculou 8-5=4, e quando questionado, “leu”
8-5=4 e não percebeu o erro, mas quando perguntado quanto era 8-5, mostrou
8 dedos e abaixou 5, viu que sobraram 3 e entendeu onde errara.
O erro está relacionado à outra natureza. O aluno comete um erro ao
responder 8-5 de forma automática, mas depois, com auxílio de algo concreto,
(Ex. 13 – Adição d – A2)
(Ex. 14 – Adição b – A8)
(Ex. 15 – Adição g – A10)
8 5 8 - 5 3 4 4 2 4
1 1
9 6 7 + 5 8 5 1.5 5 3
8 715 - 4 3 7 1 4 8 4 4 8 1 4 8 1 0 0
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consegue perceber o erro e arrumá-lo.
No exemplo 14, o Aluno 8 realizou os procedimentos corretos, mas ao
somar 7+5 colocou 13, e ao ser pedido para fazer essa conta novamente, disse
que a resposta era 12 e contara errado na primeira vez.
O erro está relacionado à outra natureza. O aluno comete o erro
devido a uma desatenção.
No exemplo 15, o Aluno 10 cometeu dois erros durante o exercício e na
parte onde calculou 448-148, quando pedi para refazer essa parte, disse que 8-
8=0, 4-4=0 e, como feito na primeira vez, 4-1=1.
O erro está relacionado à outra natureza. O aluno faz
automaticamente, de forma inconsciente, a conta e não pensa no significado e
resultado de subtrair 1 de 4 (centenas).
E) Procedimento Incorreto, Evitando O “Empréstimo” – O aluno não faz
o “empréstimo”, subtraindo o menor número do maior, não importando
se é minuendo ou subtraendo.
Nos dois primeiros exercícios os estudantes deveriam fazer a subtração
e, quando não conseguissem subtrair o subtraendo do minuendo, deveriam
“pegar emprestadas” dez unidades da coluna imediatamente à esquerda para
prosseguirem normalmente com o cálculo, entretanto, evitaram o “empréstimo”
e fizeram as subtrações do maior número não importando onde esse se
encontrava. Já na terceira conta, o caminho, errado, que o aluno seguiu o levou
(Ex. 17 – Adição g – A1)
(Ex. 18 – Adição i – A12)
(Ex. 16 – Adição e – A6)
9 3 5 - 5 6 7 4 3 2
8 7 5 - 4 3 7 4 4 2 - 1 4 8 3 0 6
2 7 7 - 9 3 6 - 7 4 1
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a obrigatoriamente improvisar no final do cálculo.
No exemplo 16, o Aluno 6 não sabia tirar 7 de 5, então subtraiu 5 de 7,
não conseguia tirar 6 de 3, então calculou 6-3 e terminou com 9-5.
O erro está relacionado à ordem de grandeza de um número, à
compreensão do sistema decimal e ao algoritmo. O aluno olha cada
algarismo de maneira individual, como se fosse 9, 3 e 5, não compreendendo o
real valor do número. Por esse motivo, não usa o recurso da decomposição de
1 dezena em 10 unidades para somar com 5, obter 15 e subtrair 7 unidades, e
faz um método de resolução alternativo de forma errada.
No exemplo 17, o Aluno 1 realizou esse procedimento duas vezes no
mesmo exercício. Quando pedido para explicar o que fizera, argumentou o
mesmo que o aluno do exemplo anterior.
O erro está relacionado à ordem de grandeza de um número, à
compreensão do sistema decimal e ao algoritmo. O aluno também não
percebe a dimensão dos números, não usa da decomposição e faz um
procedimento que não condiz com o exercício.
No exemplo 18, o Aluno 12 começou a resolução do exercício na ordem
que os números apareceram, fazendo, inicialmente, “certo”. Quando chegou na
subtração das centenas, pelo percurso que escolheu, “não havia alternativa” a
não ser subtrair o menor do maior, não importando onde se encontravam, pois
mesmo que soubesse fazer o “empréstimo”, não teria como fazê-lo.
O erro está relacionado à ordem de grandeza de um número e ao
algoritmo. O aluno não entende a magnitude dos números envolvidos,
operando na ordem em que aparecem, e finaliza retirando o minuendo do
subtraendo de forma improvisada.
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4 ORIENTAÇÕES AO PROFESSOR
O professor das séries iniciais precisa contribuir e ajudar o aluno na
construção do conceito das operações matemáticas, trabalhando com
diferentes tipos de atividades, relacionando-as com o cotidiano das crianças. A
cada situação diferenciada que o aluno aprende, ele integra esse novo
conhecimento a seus esquemas obtendo melhor assimilação e acomodação
desse conteúdo estudado. Para Franco (1999, p. 62), “serão necessárias
muitas assimilações e acomodações para se chegar à construção de estruturas
que possibilitem, de fato, um novo conhecimento”. Para Golbert (apud Müller,
2003), quanto mais o professor varia as situações de aprendizagem, mais o
aluno agrega essa assimilação a seus esquemas. Isso ocorre de forma gradual
no decorrer das possibilidades de aplicação das propriedades do objeto de
estudo a novos contextos.
Nessa variedade de situações, o professor não pode prender-se a um
único caminho, mas sim trabalhar com o máximo de possibilidades diferentes,
como jogos, situações históricas e a tecnologia, sempre buscando
contextualizar o conteúdo para melhor assimilação do estudante.
É consensual a ideia de que não existe um caminho que possa ser identificado como único e melhor para o ensino de qualquer disciplina, em particular da matemática. No entanto, conhecer diversas possibilidades de trabalho em sala de aula é fundamental para que o professor construa a sua prática. Dentre elas, destaca-se a história da matemática, as tecnologias da comunicação e os jogos como recursos que podem fornecer os contextos dos problemas, como também os instrumentos para construção das estratégias de resolução. (BRASIL, 1998, p. 42).
Independente da situação é imprescindível conhecer seus alunos para
saber provocar o grau de perturbação adequado para cada um, pois o que
pode ser perturbador para um pode não ser para outro, e para Teixeira (1982,
p. 25) “se o indivíduo não é perturbado, não há reequilibração, portanto, seu
conhecimento não se altera”.
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4.1 ORIENTAÇÕES AO PROFESSOR PARA O TRATAMENTO DIDÁTICO
DO ERRO DO PONTO DE VISTA COGNITIVO
Existem diversos fatores que corroboram para uma melhor
aprendizagem de alguns alunos e para as dificuldades de outros, entre eles: a
organização dos conteúdos e das situações de ensino-aprendizagem, a
abordagem afetiva entre professor e aluno, incentivos ou problemas familiares
e a própria motivação do aluno em querer aprender.
[...] comecemos a refletir sobre essa citação de Piaget: Toda conduta seja ela exterior (ação realizada sobre o meio), seja ela interna (pensamento), apresenta-se sempre como uma adaptação, ou melhor, readaptação. O indivíduo somente age se ele sentir a necessidade de fazê-lo, isto é, se o equilíbrio for momentaneamente rompido entre o meio e o organismo, e a ação tende a restabelecer o equilíbrio, a readaptar o organismo. (LA TAILLE, 1997, p. 42).
Quando acontece algum problema dentro desses vários fatores o aluno
perde o interesse em querer aprender e isso o afeta em sua aprendizagem.
Considerando um ambiente favorável e excluindo os problemas extraclasse,
nos atentamos às causas dos erros durante o processo de ensino-
aprendizagem. Para Brousseau (apud Rossi, 2009) os obstáculos na
aprendizagem matemática têm quatro origens:
* Obstáculos de origem Ontogênica: São aqueles mais ligados ao desenvolvimento intelectual do aluno. Cada indivíduo que aprende desenvolve capacidades e conhecimentos adequados à sua idade mental que pode ser diferente à sua idade cronológica. Essas capacidades e conhecimentos podem ser insuficientes à elaboração de novos conceitos e podem assim se constituir como obstáculos de natureza ontogênica. Os obstáculos dessa natureza estão ligados à evolução individual do aluno e são superados pela evolução dessa fase, inclusive cronológica. * Obstáculos de origem Cultural: São aqueles frutos de concepções errôneas que equivalem a certas maneiras de pensar, mas que não correspondem a conhecimentos científicos reconhecidos, como por exemplo, a ideia de sorte como determinante da probabilidade. * Obstáculos de origem Didática: São aqueles ligados ao ensino. Cada docente, por exemplo, escolhe uma maneira de ensinar, uma organização curricular, um projeto, que considera eficaz, de acordo com suas convicções científicas e didáticas, para alguns alunos essa escolha revela-se um obstáculo didático. * Obstáculos de origem Epistemológicos: São aqueles inerentes ao conhecimento matemático, aqueles que não se pode fugir, pois são constitutivos do conhecimento, como por exemplo, o surgimento do zero, dos números negativos, entre outros. (ROSSI, 2009, p. 43).
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Uma prática de ensino que visa a aprendizagem em que o aluno constrói
o próprio conhecimento pode considerar situações que sejam baseadas em
problemas, não em fórmulas de exercícios isolados e sem sentidos. Também
necessita favorecer as várias tentativas que ele faz para chegar até a resposta
desejada. Para isso é preciso que o professor o desafie e o estimule a refletir e
criar diversos cenários, não se preocupando com acertos ou erros, mas sim
com a compreensão do que se está fazendo, sem exageros no grau de
dificuldade para que esse desafio não se torne algo que a criança veja como
algo sem resposta ou inalcançável e perca a vontade de tentar transpor essa
barreira, não ocorrendo assim o processo de assimilação e acomodação em
sua estrutura cognitiva. A partir do momento que o aluno sente-se desafiado e
tenta diversas formas de resolução de certa situação, e começa a adquirir o
conceito e compreender o que está estudando, o erro passa a ajudá-lo a
aprimorar essa compreensão e ele assimila isso em sua estrutura cognitiva.
Cabe ao professor aproveitar esses momentos, em que os alunos sentem-se
desafiados e tentam superar essas barreiras, para diagnosticar quais tipos de
erros cometem e identificar suas origens, analisando se encaixam em um
desses padrões propostos por Brousseau (apud Rossi, 2009) ou se o erro é
proveniente de alguma outra fonte como uma simples distração, por exemplo.
É necessário que os professores tenham acesso aos dados de pesquisa que informem sobre as estratégias, no geral usadas pelos alunos, quando da aprendizagem de um conceito, para levantar as prováveis confusões ou erros que fazem. Mais do que isso, identificar se a origem dos erros se localiza no próprio aluno, no método usado ou é intrínseca ao próprio conteúdo; ou, como define Brousseau (1983), se os obstáculos são de origem ontogenética, didática ou epistemológica. (TEIXEIRA, 1992, p. 113).
Geralmente, professores não se preocupam em analisar os
procedimentos realizados pelos alunos, não se atentando às causas dos erros,
verificando somente a resposta final. Em suas visões, o erro é algo ruim, indício
de que os estudantes não estão aprendendo e precisa ser evitado que isso
aconteça.
Como contrapondo, em uma visão construtivista, o erro é aceito como algo natural, que acompanhará os estudantes em todo seu processo de aprendizagem, pois se trata de um desequilíbrio momentâneo entre um resultado esperado e o obtido, sendo assim um momento
Tiago Pereira Avila
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para que o aluno faça uma reflexão. Macedo (1994) esclarece que, na linha construtiva, o erro é um elemento possível e até mesmo necessário, intrínseco ao processo de construção do conhecimento. Para o autor, o desacerto, por fazer parte do processo, pode ser analisado por diferentes maneiras e não deve ser negado ou justificado de modo complacente, tão pouco evitado por meio de punições, mas sim problematizado e transformado em situações de aprendizagem. Para quem aprende, o erro aparece como um problema a ser resolvido, e, muitas vezes, é possível reconhecê-lo apenas depois de tê-lo cometido, ou seja, não se pode prevê-lo. (LOPES; ALLEVATO, 2011, p. 25).
O erro não deve ser evitado de maneira que o aluno faça milhares de
repetições de exercícios até isso tornar-se “natural” e automático, porém
compete ao professor diversificar as situações de ensino-aprendizagem de
modo que cada criança escolha aquela que melhor o ajuda na compreensão
dos conteúdos e conceitos.
O fator que faz emergir a análise de erros do ensino de matemática é sua ocorrência relacionada a “disparates” de compreensão e nos processos lógicos, sistematizados pelos alunos de maneira errônea quando da realização de uma tarefa ou na resolução de um problema. Consequentemente, o professor deverá alterar suas estratégias docentes, com o objetivo de adaptar uma metodologia mais adequada a esses alunos e explorar não somente o saber mecânico operacional, mas incentivar cada educando a escolher os procedimentos que mais se adéquam ao seu propósito e estilo de aprendizagem. (LOPES; ALLEVATO, 2011, p. 35).
O professor é incumbido de olhar o erro como um auxiliar que
diagnostica as maiores dificuldades e facilidades dos alunos durante as aulas
e lhe serve de subsídio para ajudar no ensino-aprendizagem.
Tiago Pereira Avila
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5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Possivelmente há diversos obstáculos – epistemológicos, didáticos,
culturais, ontogênicos, extraclasse – que atuam no processo de aprendizagem
das quatro operações, conteúdo do Ensino Fundamental I. Essas barreiras
influenciam para que os alunos ingressem no Ensino Médio sem terem
construído os conceitos fundamentais esperados dessas operações
aritméticas.
Portanto, a nossa pesquisa apontou para o fato de que a não construção
dos conceitos fundamentais esperados das quatro operações pode repercutir
no insucesso escolar, na retenção, e no receio dos alunos sobre esta área do
conhecimento, pois é a disciplina mais temida das escolas. Se os alunos
possuíssem claros os conceitos dos conteúdos matemáticos, em evidência
aqui as quatro operações básicas, haveria menos reprovação e não temeriam
tanto essa matéria. Esses fatores poderiam ajudar durante toda vida escolar,
aprenderiam a importância dela em seus cotidianos e conseguiriam perceber
erros em que a resposta é muito discrepante, parando de apoiarem-se somente
em algoritmos convencionais e tendo alternativas para a resolução de
problemas e exercícios.
Durante os testes de conhecimentos prévios, os alunos podiam usar
quaisquer recursos para a resolução das atividades, entretanto, todos optaram
por usar os algoritmos convencionais. Nos rascunhos feitos é possível vê-los
montando a tabuada “decorada”, mas em raros momentos podemos vê-los
fazendo alguma soma de parcelas iguais ou alguma outra estratégia que os
auxiliasse a obter a multiplicação desejada. Mesmo apoiando-se nos algoritmos
convencionais, é perceptível que os alunos não se lembram mais como usá-
los, acarretando na grande variedade de erros. Apenas a partir dos conteúdos
do segundo ano do Ensino Médio, em especial as matrizes, os alunos não
conseguem adquirir esse conceito das operações básicas com os números
naturais e/ou inteiros, pelo contrário, a maioria deles queixa-se que a
dificuldade dos exercícios está nos cálculos.
Tiago Pereira Avila
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Mestrado Profissional em Ensino de Ciências e Matemática
Comparando o resultado dos testes de conhecimentos prévios, que
verificava os erros – apresentados como um produto da experiência vivida pelo
professor - e os acertos nas quatro operações, com o teste de conhecimento
de matrizes 1, que continha exercícios de matrizes que eram necessários usar
as quatro operações para calculá-los, dos 10 alunos que fizeram as duas
avaliações, a maioria manteve os índices de acerto muito próximos, e a média
de acerto geral foi praticamente igual, ficando em 41% e 40%. Todos os alunos
apresentaram aumento no percentual de acertos do teste de matrizes 1 para o
teste de matrizes 2, consequentemente aumentaram também em relação ao
teste prévio e teste de matrizes 2, o que reforça a ideia de que a maior
dificuldade deles ocorreu por causa das quatro operações e não por causa do
conteúdo de matrizes.
Os erros mais frequentes durante a resolução de exercícios do teste de
matrizes 1 foram atribuídos à multiplicação e divisão de números naturais e às
operações em geral com os números negativos.
Os alunos que foram melhores no teste prévio, que supostamente têm
melhor o conceito das quatro operações, também foram melhores no teste de
matrizes 1, mostrando que conseguem relacionar bem as quatro operações
com a resolução do conteúdo do Ensino Médio. Já os alunos que foram piores
na primeira avaliação, não foram necessariamente os piores no último teste, o
que revela que aprendem o conteúdo de matrizes independentemente de
saberem realizar as quatro operações.
Quando perguntado aos alunos se as quatro operações eram usadas em
algum conteúdo do Ensino Médio, a maioria deles respondeu que eram usadas
em trigonometria (conteúdo que estudaram recentemente), gráficos e nas
matérias de física e química, mostrando que entendem a importância dessas
operações ainda no Ensino Médio. Entretanto, quando questionados se elas
eram usadas no cotidiano deles, 34% responderam que as quatro operações
não eram usadas em situações do dia a dia deles, apontando que não fazem
uma relação entre o conteúdo escolar e seus cotidianos.
Tiago Pereira Avila
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O foco da pesquisa foi analisar se os alunos que possuem maior
domínio das quatro operações básicas conseguem aplicá-las nos conteúdos do
Ensino Médio, em especial as matrizes. Muitos professores reclamam que os
alunos não aprendem o conteúdo do Ensino Médio por terem dificuldades em
ler ou não dominar as quatro operações, mas o problema maior não está no
fato de os alunos não compreenderem o conteúdo, e sim no processo de
resolução dos exercícios que são exigidos as quatro operações.
É de extrema importância o professor do Ensino Fundamental I trabalhar
com problemas, jogos e diferentes situações do dia a dia para ajudar os alunos
na compreensão dos conceitos matemáticos, porém é imprescindível que os
professores seguintes, do Ensino Fundamental II e Médio, deem continuidade a
essa prática, não se limitando a ensinar apenas fórmulas e algoritmos, mas
dando continuidade ao trabalho de conceitos, para que os alunos saibam fazer
essa relação entre as operações básicas e novos conteúdos que estão
aprendendo.
Aqui fica uma contribuição para que professores de Ensino Fundamental
II e Médio reflitam se o importante é olhar para o “certo/errado” de uma
resposta, ou analisar o porquê do aluno ter errado, o que está impedindo ele de
acertar, ou chegar o mais próximo de uma resposta esperada, se questionar se
o aluno está deixando de aprender a matéria trabalhada em sala, ou está
errando durante o processo de resolução que envolve as quatro operações.
Tiago Pereira Avila
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Mestrado Profissional em Ensino de Ciências e Matemática
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