as possibilidades da arqueologia pública

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Aline Vieira de Carvalho e Pedro Funari

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As possibilidades da Arqueologia Pblica por Aline Vieira de Carvalho e Pedro Paulo A Funari Arqueologia Pblica: as relaes entre a academia e a sociedadeO que uma Arqueologia Pblica (AP)? Para o arquelogo britnico Nick Merriman, a dificuldade encontrada para definir esse campo de atuao da Arqueologia advm da prpria complexidade de se estabelecer o que o pblico. Para ele, desde o sculo XIX estamos acostumados a assistir aos financiamentos estatais de trabalhos arqueolgicos (Merriman, 2004:3). Motivados pelo interesse de construir e fortalecer identidades nacionais, os Estados vinculavam-se s pesquisas acadmicas apoiando seus desenvolvimentos, atravs dos museus ou, posteriormente, das universidades (Bastos e Funari, 2008: 1128). O custeio destas pesquisas com fundos pblicos, por si s, poderia transform-las em algo pblico. Acreditar, no entanto, que o sustento estatal seria suficiente para transformar uma pesquisa arqueolgica em trabalho de Arqueologia Pblica (AP) uma premissa bastante reducionista. Desde a dcada de 1970, arquelogos influenciados ou por teorias marxistas ou por teorias ps-modernas, passaram a se indagar sobre as funes sociais da Arqueologia e, principalmente, sobre como deveriam se estabelecer as relaes entre os acadmicos, suas investigaes e a sociedade como um todo. A obra Public Archaeology (1972), do arquelogo norte-americano Charles Robert McGimsey, professor de Antropologia da Universidade da Lousiana, considerada um marco na inaugurao deste novo campo da Arqueologia (Merriman, 2004:3). A AP, portanto, uma rea da Arqueologia voltada para o interesse pblico em geral (Merriman, 2004: 2). Existem diversas vertentes de teorias e prticas dentro deste campo. O que tange todas essas discusses a reflexo sobre como as pesquisas arqueolgicas, realizadas dentro das academias ou mesmo pelas empresas de Arqueologia, se relacionam com a sociedade. Para o professor de Arqueologia da Universidade de Lund, na Sucia, Cornelius Holtorf, existem trs modelos gerais que caracterizam as atuaes dos arquelogos dentro do campo da AP: 1) o modelo da Educao; 2) o modelo da Relao Pblica e, por fim, 3) o modelo Democrtico (Holtorf, 2007:107). Cada um destes modelos traz embutido em si as prprias concepes dos arquelogos a respeito da academia e da sociedade. Para o autor, todos os trs vieses apresentam caractersticas interessantes, mas necessrio refletir sobre suas propriedades para escolher de forma consciente as aes para a AP, mesmo que isso implique misturar as vertentes mencionadas. No primeiro modelo, o da Educao, Holtorf identifica uma permanncia da tradio iluminista de se compreender a academia e a sociedade como duas esferas distintas. O arquelogo, nesse vis interpretativo, se percebe como detentor de uma verdade: ele sabe como era a vida no passado. H, portanto, a crena na possibilidade da reconstruo fiel de um tempo atravs da cultura material. A Arqueologia, creditada como cincia neutra e exata, torna-se um instrumento de educao das massas. A sociedade, atravs da AP, instruda sobre o seu passado. No h debates entre os arquelogos e a sociedade como um todo: os nicos capazes de discutir o passado reconstrudo pelos vestgios materiais, dentro do modelo da Educao, seriam os arquelogos e seus pares (Holtorf, 2007:107). Distanciando-se dos propsitos deste modelo, a vertente da Relao Pblica almeja melhorar a imagem da Arqueologia na sociedade. Isso para garantir o aval social que permite a continuidade dos prprios trabalhos arqueolgicos. Holtorf afirma que esse vis da AP compreende que muitas so as necessidades sociais no necessariamente ligadas cincia: questes como alimentao, sade, habitao, segurana entre inmeros outros problemas, podem se configurar, na maioria das vezes, como mais urgentes em financiamentos do que um projeto arqueolgico. Assim, por uma questo de sobrevivncia, torna-se imperativo demonstrar para a sociedade o quanto os trabalhos arqueolgicos, e as memrias deles derivadas, so relevantes e, por isso, podem ser financiados com fundos pblicos ou apoiados das mais diversas maneiras (Holtorf, 2007:114-119). A propaganda dos trabalhos arqueolgicos, dentro do modelo Relao Pblica, feita atravs das mdias: da televiso, passando por filmes e documentrios, at os jogos de computador, tudo entendido como vlido quando se trata de divulgao. Para Holtorf, o grande inconveniente desta vertente a tendncia simplificao da Arqueologia e, principalmente, do passado (Holtorf, 2007:114-119). Para vender a Arqueologia como um produto, na maioria das vezes, apaga-se uma srie de relaes que podem ter existido no passado e que poderiam ser debatidas no presente. O passado tende a ser transformado em algo simples demais; tudo para que ele seja consumido. Nesse contexto, poderiam ser citados documentrios exibidos pelos canais pagos de televises, que, na maioria das vezes, so vinculados aos arquelogos e, mesmo assim, valorizam situaes por demais peculiares. O modelo Democrtico configura-se como uma alternativa a esses caminhos da AP apresentados at agora. Em clara defesa aos ideais dessa vertente, Holtorf afirma que o maior pressuposto deste modelo a valorizao igualitria do conhecimento (Holtorf, 2007:119-126). Em uma linha argumentativa muito semelhante do educador brasileiro Paulo Freire (1980), Holtorf advoga que todas as pessoas so detentoras de conhecimentos vlidos: esses saberes podem variar de acordo com a trajetria de vida de cada um dos indivduos, mas possuem igual importncia. Como existe uma igualdade no valor das pessoas e de seus conhecimentos, todos podem ser estimulados a se relacionar com a Arqueologia. No porque ela detentora da verdade, ou est relacionada s aventuras Hollywoodianas, mas porque esse campo de pesquisa pode ser um fascinante instrumento para a leitura crtica do mundo que nos cerca; composto pela cultura material.A cultura material presente na vida humana. Nascemos, crescemos e morremos interagindo com as mais diversas materialidades, criadas dentro de diferentes propsitos. Mas como ler essas materialidades? Um exemplo da leitura da cultura material o estudo realizado pelo arquelogo ingls Matthew Johnson, professor de Arqueologia histrica na Universidade de Southampton, em sua obra An Archaeology of Capitalism (1996).No livro, o autor traa um mapeamento das mudanas ocorridas na paisagem e na cultura material da Inglaterra durante a transio do final da Idade Mdia para o incio da modernidade. A busca pelo nascimento do capitalismo uma preocupao prpria do autor, em seu tempo e contexto especficos. De forma bastante interessante, Johnson estuda estruturas como as de igrejas e, atravs da anlise de suas distribuies espaciais, consegue propor uma relao entre as divises sociais existentes naquele perodo e os usos dos espaos. Para o pesquisador, a cultura material seria produzida em uma sociedade desigual e acabaria por reproduzir e reforar essas disparidades. O exemplo da anlise material feita por Johnson poderia ser extrapolado e trazido para o nosso tempo presente como, por exemplo, na investigao da materialidade das escolas. A disposio das salas, carteiras dos alunos, mesa do professor, arquitetura do prdio da escola, entre outros elementos, facilitam alunos e professores a adotarem comportamentos socialmente aceitos (Funari & Zarankin, 2005). A cultura material, portanto, repleta de intencionalidade; ela concebida, materializada e utilizada dentro de determinadas sociedades. Por isso, ela pode ser lida para a compreenso do funcionamento das regras culturais. importante destacar que existem inmeras maneiras de analisar os vestgios materiais e refletir sobre suas intencionalidades e efeitos. A leitura sobre o universo material, entretanto, crucial para a compreenso das regras culturais e sociais em que estamos inseridos. O conhecimento arqueolgico reconhecido, dentro do modelo Democrtico, como mltiplo e no exato. Por isso, o arquelogo no pode se identificar como um policial da verdade (Holtorf, 2007:119-126). Esses saberes com os quais a AP trabalha devem ser construdos de forma cooperativa e no sentido de fornecer instrumentos para que todos os envolvidos em um determinado projeto possam elaborar questionamentos e concluses a respeito dos temas debatidos. Neste sentido, os dilogos, as crticas e as reflexes acerca da cultura material, entre os arquelogos e os no arquelogos, so as maiores responsabilidades da AP.A Arqueologia Pblica Democrtica: o dever da educao patrimonial Em outubro de 1990, o Comit Internacional para a Gesto do Patrimnio Arqueolgico (ICAHM ICOMOS) publicou a Carta de Proteo e Gerenciamento do Patrimnio Arqueolgico. O texto, redigido de forma bastante genrica, e direcionado aos profissionais da rea, almejava compor alguns parmetros e diretrizes para a proteo especfica dos vestgios arqueolgicos considerados patrimnios. A definio usada para o patrimnio arqueolgico na Carta bastante ampla. No texto, o patrimnio arqueolgico destacado como composto por patrimnios materiais passveis de serem lidos ou analisados pela Arqueologia (ICAHM, 1990). De acordo com o texto, o patrimnio arqueolgico engloba: (...) las huellas de la existencia del hombre y se refiere a los lugares donde se ha practicado cualquier tipo de actividad humana, a las estructuras y los vestigios abandonados de cualquier ndole, tanto en la superficie, como enterrados, o bajo las aguas, as como al material relacionado con los mismos (ICAHM, 1990)Composta por nove artigos, a Carta traz referncias especficas ao campo que hoje denominamos como AP. Em primeiro lugar, o texto afirma que a proteo do patrimnio arqueolgico deve ser compreendida como obrigao moral e de responsabilidade coletiva (ICAHM, 1990). dado aos Estados incumbncia de providenciar fundos para embasar as atividades de proteo do patrimnio. A proteo efetiva e cotidiana, no entanto, responsabilidade do Estado, mas, tambm, de toda a sociedade. Para o envolvimento da sociedade nesta tarefa considerada moral, a Carta estabelece a necessidade de prover o pblico geral de informaes acerca do patrimnio. No so definidos os moldes da Educao patrimonial. A Carta indica que as especificidades locais devem ser sempre respeitadas e, por isso, no existem frmulas para ao de preservao e de educao. O nico imperativo proposto pelo texto o de que o passado deve ser mostrado como multifacetado (ICAHM, 1990).Parte-se do pressuposto, na Carta, de que s possvel preservar o patrimnio atravs do conhecimento e da afeio. Ao mostrar um passado mltiplo, composto por diversas identidades e passvel de muitas interpretaes, seria possvel criar um nmero maior de aproximaes entre a sociedade no presente e as imagens do passado, representadas pelo patrimnio. Para a Carta, com a identificao pressupem-se a preservao.Contudo, no sempre que existe a possibilidade de valorizao de um imenso leque de identidades relacionadas aos patrimnios, sejam eles arqueolgicos ou no. O patrimnio, que composto por um conjunto de bens de ordem material e imaterial, faz referncias s identidades e memrias de diferentes grupos sociais (Soares: 2005). O que pode ser importante e gerador de afeio para um determinado grupo de pessoas, no necessariamente causa a mesma comoo em outro grupo social. Neste sentido, convm a pergunta: seria possvel a preservao de um patrimnio por parte de pessoas que no se reconhecem nele? Como no h reconhecimento entre o indivduo e o patrimnio e, infelizmente, sentidos ou significados sobre a coisa pblica, a resposta a essa pergunta seria: a princpio, no! E, exatamente por isso, a Educao patrimonial torna-se urgente. Dentro dos princpios da AP Democrtica, preciso construir junto com as comunidades o conceito de patrimnio e de bem pblico. Apenas quando esses conceitos tiverem sentidos para os indivduos ser possvel alcanar uma preservao efetiva dos patrimnios, sejam eles de quaisquer espcies. O indivduo precisa compreender que esse patrimnio importante para algum. Para Funari e Bastos, atravs da educao patrimonial o cidado torna-se capaz de entender sua importncia no processo cultural em que ele faz parte, cria uma transformao positiva entre a relao dele e do patrimnio cultural (Bastos e Funari, 2008: 1131).A preocupao com a divulgao dos trabalhos arqueolgicos no Brasil As tentativas de defesa do patrimnio arqueolgico brasileiro comearam na dcada de 1920. Naquele momento, o presidente da Sociedade Brasileira de Belas Artes e chefe do Museu Nacional do Rio de Janeiro, Alberto Childe, propunha a nacionalizao das fontes culturais (Bastos e Funari, 2008: 1128). A iniciativa no foi aprovada pelo Congresso, isto porque, a ao poderia significar a necessidade da nacionalizao de propriedades privadas. Atitude nada interessante para os polticos do perodo.A proposta de 1920 no assinalava a necessidade de uma divulgao ou de um programa educacional acerca dos patrimnios. Essa preocupao surgiu apenas em 1935, perodo anterior fundao do SPHAN (Servio do Patrimnio Histrico e Artstico Nacional). Naquele ano, Raimundo Lopes, arquelogo maranhense, publicou um estudo sobre as fontes culturais nacionais e sobre a necessidade da elaborao de programas educacionais e da divulgao de informaes sobre stios arqueolgicos (Bastos e Funari, 2008: 1128). Mesmo com a publicao de Lopes, o grande passo para a preservao do patrimnio arqueolgico nacional s seria dado na dcada de 1960. Uma comisso formada por arquelogos, pesquisadores da Pr-Histria, conquistou a elaborao da lei n. 3924/61, aprovada pelo congresso em 1961. O maior objetivo da lei era definir o patrimnio arqueolgico, regularizar sua propriedade e seus usos (Bastos e Funari, 2008: 1128). Nela ficava estabelecida a guarda e proteo do patrimnio arqueolgico pelo Poder Pblico. Por isso, a realizao das escavaes, tanto em terras pblicas como nas particulares, s poderia acontecer mediante a permisso do Governo da Unio. As licenas para os trabalhos arqueolgicos eram emitidas pela Diretoria do Instituto do Patrimnio Histrico e Artstico Nacional (IPHAN). Proibia-se ainda a explorao comercial dos vestgios culturais, bem como sua destruio ou mutilao (Ojeda: sd). As preocupaes com a divulgao das escavaes arqueolgicas, assim como os programas de educao patrimonial, no esto presentes na lei n. 3924/61. Os debates sobre esses temas s voltariam ao centro do cenrio poltico-acadmico brasileiro aps 1985, com o final da ditadura militar. A abertura poltica do pas foi acompanhada pela elaborao de legislaes estaduais de proteo dos stios, monumentos e colees arqueolgicas (Bastos e Funari, 2008:1129), bem como pelo inicio das discusses sobre a Arqueologia Pblica. No contexto internacional, no ano de 1986, surgia o Congresso Mundial de Arqueologia, cujas discusses se voltavam para os aspectos sociais da disciplina. Entender as relaes entre essa cincia e a sociedade tornava-se um dos pilares desse novo campo de atuao. Entre os anos de 1961 e 1985, ocorreram inmeras iniciativas de divulgao do conhecimento arqueolgico no pas. Essas aes, na maioria das vezes, estavam atreladas aos museus, como o caso do Museu Imperial, em Petrpolis, Rio de Janeiro (Soares, 2005:20). Apesar da existncia de uma preocupao em mostrar ao pblico o trabalho arqueolgico brasileiro, apenas a partir da segunda metade da dcada de 1980, passou-se a refletir sobre os mtodos, prticas, valores e significados dessa divulgao. Nascia, ento, a AP brasileira. Arquelogos da academia, junto com arquelogos das empresas privadas (recm-inauguradas), inseridos nas discusses sobre a AP nos Estados Unidos e na Europa, fundaram novos museus com suas vertentes educacionais (um exemplo seria o prprio MAE, fundado em 1989). Alm disso, foram planejadas aes inseridas nos trabalhos de campo da Arqueologia, voltadas para o envolvimento das comunidades com os vestgios materiais escavados e suas posteriores preservaes e divulgaes. Mesmo que haja atividades em AP no presente momento, ainda se configura como emergencial a elaborao de outras aes e prticas neste campo. A pesquisa realizada por Ana Pinn, mestra pela Universidade Complutense de Madrid, comprova essa necessidade. Ao indagar 821 alunos do Ensino Fundamental de escolas pblicas, nos primeiros anos do sculo XXI, espalhados por todo Brasil, sobre quem eram os donos dos patrimnios nacionais, Pinn recebeu 2/3 das respostas afirmando que os patrimnios pertenciam donos especficos, fossem eles pessoas ou instituies (Pinn e Funari, 2007: 298). Os estudantes no conseguiam identificar relaes e aproximaes entre os patrimnios e eles prprios. Saul Milder, arquelogo brasileiro e professor da Universidade Federal de Santa Maria, atestou a mesma situao no sul do pas. Em um trabalho de consultoria realizado pelo Laboratrio de Estudos e Pesquisas Arqueolgicas (LEPA), da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), para a Empresa de transmisso do Alto Uruguai (ETAU), Milder afirma que: Chamou a ateno do grupo, durante o processo , que muitos habitantes da regio com as quais se fazia contato, ficavam absolutamente admirados e, em muitas ocasies, simplesmente no compreendiam o que se estava realizando. Demonstravam um desconhecimento daquilo que, mesmo ignorado, fazia parte do seu cotidiano (Milder, 2005:3). O distanciamento entre a sociedade e seus diversos patrimnios pode ser superado atravs de aes slidas da Educao patrimonial. No se almeja atribuir sociedade um conhecimento enciclopdico sobre quais so seus patrimnios, datas de fundao, autores, caractersticas fsicas, entre outros dados. Ao contrrio, a Educao patrimonial deve agir no sentido de, democraticamente, construir dilogos entre a sociedade e seus patrimnios. Estes dilogos devem ser constitudos para permitir a realizao de conexes entre a vida cotidiana das pessoas com o processo histrico relatado. Devem providenciar instrumentos para a reflexo (Vargas e Sanoja, 1990:53). Assim, cada grupo social torna-se capaz de atribuir significados ao prprio patrimnio e ao bem pblico como um todo. Tm-se um cidado crtico pronto para a preservao e, principalmente, para transformao tanto de seu entorno como da sociedade. O Ncleo de Estudos Estratgicos e aes da Arqueologia PblicaO Ncleo de Estudos Estratgicos apresenta larga trajetria, dedicada a diversos aspectos relativos reflexo cientfica. O NEE foi criado pela Portaria GR-59/85, de 28 de maro de 1985, como rgo complementar da Universidade Estadual de Campinas, Unicamp, tendo por objetivos: a realizao de estudos de natureza interdisciplinar; a participao sistemtica no debate acadmico nacional; e a divulgao de conhecimentos que possam contribuir para o desenvolvimento da Estratgia. Desde o incio do sculo XXI, o NEE atua no campo das Estratgias em Arqueologia Pblica. Os Estudos Estratgicos, oriundos das preocupaes sociais j presentes em Von Clausewitz (Howard 2002), h dois sculos, fundam-se na percepo de que a sociedade est no centro das questes relativas segurana e defesa, presentes no timo grego strati (exrcito). Por isso, o imperialismo e as relaes de poder formam o cerne dos Estudos Estratgicos (pace Quartim de Moraes 2005, Cavagnari 2009), assim como a Arqueologia passou a ser, nas ltimas dcadas, o estudo no apenas do antigo, mas do poder, a partir do timo grego arkh, antigo, mas tambm poder (Shanks e Tilley 1987; Funari 2003). A convergncia entre Estudos Estratgicos e Arqueologia, como estudo e ao relativas s relaes sociais de poder, d-se no campo das Estratgias em Arqueologia Pblica, rea de atuao levada adiante no NEE nos ltimos anos. No contexto brasileiro, tema estratgico de primeira ordem, desde a dcada de 1980, ao menos, consiste na diversidade:A Diversidade Cultural tema estratgico para as polticas culturais no Brasil e no mundo. Com a entrada em vigor da Conveno da Diversidade, reafirma-se direito soberano dos Estados de implementarem polticas necessrias proteo e promoo de suas expresses culturais. A nova concepo de Poltica Cultural implantada pelo Ministrio da Cultura j incorpora grande parte dos objetivos da Conveno, porm surgem novos desafios. O MinC utilizar este espao para publicar e conversar, com vistas a aprofundar o debate sobre o assunto (grifo no original). [3]A diversidade o princpio estratgico norteador da vida social brasileira, em ambiente livre e democrtico. Como se ressalta na publicao do NEE:No Brasil, a expresso Arqueologia Pblica, surgida em mbito anglo-saxo, ainda nova e pode levar a confuso. De fato, pblico, em sua origem inglesa, significa voltada para o pblico, para o povo e nada tem a ver, stricto sensu, com o sentido vernculo de pblico como sinnimo de estatal. Ao contrrio, o aspecto pblico da Arqueologia refere-se atuao com as pessoas, sejam membros de comunidades indgenas, quilombolas ou locais, sejam estudantes ou professores do ensino fundamental ou mdio. A ao do Estado d-se, de maneira necessria, por meio da legislao de proteo ambiental e cultural que obriga os empreendedores empresas privadas ou pblicas a custearem estudos de impacto ambiental e cultural. O NEE desenvolve aes com as comunidades, de modo que sua diversidade cultural possa se constituir em meio de fortalecimento estratgico. Essas atividades referem-se a grupos indgenas, mas tambm de grupos humanos variados, nos rinces mais recnditos, como em ambientes urbanos. Exploram-se, tambm, a diversidade das identidades humanas, com projetos e atuaes em relao a grupos to variados como os caiaras, as mulheres e as crianas. Projetos de mbito internacional, com a cooperao entre pases como Cuba, Gr-Bretanha, Argentina, Estados Unidos, Frana, Colmbia, entre outros, inserem essas pesquisas e aes em uma perspectiva muito mais ampla e variada. Projetos envolvem o arquivo de Paulo Duarte, custodiado na UNICAMP (Funari e Silva 2007), aes patrimoniais estratgicas em portos como Havana, Cuba e Santos, Brasil (Funari e Domnguez 2002), o estudo das identidades e o imperialismo, a partir da cultura material (Garraffoni, Funari, Pinto, 2009; Hingley 2009), entre outros diversos. As perspectivas para o avano da Arqueologia Pblica no NEE so as mais amplas e variadas, de maneira a contribuir para o aprimoramento tanto de disciplinas como os Estudos Estratgicos e a Arqueologia, como da ao comunitria. AgradecimentosAgradecemos a Rossano Lopes Bastos, Geraldo Cavagnari, Lourdes Domnguez, Renata Senna Garraffoni, Richard Hingley, Cornelius Hortolf, Matthew Johnson, Nick Merriman, Saul Milder, Joo Quartim de Moraes, Ana Pion, Renato Pinto, Erika Robrahn-Gonzlez, Mario Sanoja, Michael Shanks, Glaydson Jos da Silva Helaine Silverman, Christopher Tilley, Iraida Vargas. Mencionamos o apoio institucional do Ncleo de Estudos Estratgicos, FAPESP, CNPq, CAPES. A responsabilidade pelas idias restringe-se aos autores. BibliografiaBastos, R. L.; Funari, P. P. A. Public Archaeology and Management of the Brazilian Archaeological-Cultural Heritage. Handbook of South American Archaeology. Silverman, Helaine e Isbell, William H. (orgs). New York: Springer, 2008. 1127-1133. CAVAGNARI, G. L. EUA, a estratgia do Chacal, http://www.galizacig.com/index.html, 2009.Freire, P. Educao com prtica da liberdade. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1980. FUNARI, P.P.A. Arqueologia. So Paulo, Contexto, 2003.Funari, P. P.; Carvalho A. V. Palmares: ontem e hoje Rio de Janeiro: Zahar, 2005. Funar, P. P; Zarankin, A. Cultura material escolar: o papel da arquitetura. Pro-Posies, Campinas, v. 16, n. 1, p. 135-144, 2005.FUNAR, P. P. Rescuing ordinry peoples culture: museums, material culture and education in Brazil. The presented past Heritage, museums and education. 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