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1725 AS TECNOLOGIAS DA INFORMAÇÃO E COMUNICAÇÃO (TIC) NA FORMAÇÃO DOCENTE: A PERCEPÇÃO DE PROFESSORES DE DIFERENTES PAÍSES SOBRE A INOVAÇÃO EM SUAS PRÁTICAS PEDAGÓGICAS Rogério Dias de ARRUDA, Universidade Federal do Triângulo Mineiro Martha Maria PRATA-LINHARES, Universidade Federal do Triângulo Mineiro Eixo 7: Formação e desenvolvimento profissional de professores do ensino superior Agência Financiadora: Capes E-mail: [email protected] 1. Introdução O presente trabalho apresenta o relato de pesquisa desenvolvido durante a primeira fase do estágio de pós-doutoramento no Programa de Pós-graduação em Educação (PPGE) da Universidade Federal do Triângulo Mineiro (UFTM). O objetivo geral da proposta foi compreender as inovações e mudanças pedagógicas que estão acontecendo na prática docente com o uso das Tecnologias da Informação e Comunicação (TIC) em cursos de graduação ou equivalentes. Foram investigadas uma Instituição de Ensino Superior localizada no Brasil (em Minas Gerais), uma Instituição de Ensino Superior localizada na Espanha (na Comunidade Madrid), e uma Escola Normal localizada no México (Estado do México). Para isso, foram definidos os seguintes objetivos específicos: - Compreender como os professores dos cursos pesquisados percebem a integração das TIC em suas práticas educativas; - Analisar as mudanças e inovações pedagógicas decorrentes do uso das TIC. Para estabelecer esses objetivos, foi considerado o fato de que estamos vivendo uma realidade em que os meios tecnológicos estão cada vez mais evoluídos e integrados às nossas ações diárias, e a tendência é que essa integração cresça ainda mais, potencializando e ampliando as formas de interação entre os usuários e as tecnologias. As novas possibilidades de interação propiciam também novos modos de produção de conhecimento. Assim, a integração das TIC às nossas ações alcança também a área da educação, haja vista que suas potencialidades podem favorecer o processo de ensino. Isso, porém, vai depender dos tipos de usos que se faz dos recursos tecnológicos, em especial, na prática docente. 2. Fundamentação teórica

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AS TECNOLOGIAS DA INFORMAÇÃO E COMUNICAÇÃO (TIC) NA FORMAÇÃO

DOCENTE: A PERCEPÇÃO DE PROFESSORES DE DIFERENTES PAÍSES SOBRE A

INOVAÇÃO EM SUAS PRÁTICAS PEDAGÓGICAS

Rogério Dias de ARRUDA, Universidade Federal do Triângulo MineiroMartha Maria PRATA-LINHARES, Universidade Federal do Triângulo Mineiro

Eixo 7: Formação e desenvolvimento profissional de professores do ensino superior Agência Financiadora: Capes

E-mail: [email protected]

1. Introdução

O presente trabalho apresenta o relato de pesquisa desenvolvido durante a

primeira fase do estágio de pós-doutoramento no Programa de Pós-graduação em

Educação (PPGE) da Universidade Federal do Triângulo Mineiro (UFTM).

O objetivo geral da proposta foi compreender as inovações e mudanças

pedagógicas que estão acontecendo na prática docente com o uso das Tecnologias da

Informação e Comunicação (TIC) em cursos de graduação ou equivalentes. Foram

investigadas uma Instituição de Ensino Superior localizada no Brasil (em Minas Gerais),

uma Instituição de Ensino Superior localizada na Espanha (na Comunidade Madrid), e

uma Escola Normal localizada no México (Estado do México).

Para isso, foram definidos os seguintes objetivos específicos:

- Compreender como os professores dos cursos pesquisados percebem a integração das

TIC em suas práticas educativas;

- Analisar as mudanças e inovações pedagógicas decorrentes do uso das TIC.

Para estabelecer esses objetivos, foi considerado o fato de que estamos vivendo

uma realidade em que os meios tecnológicos estão cada vez mais evoluídos e integrados

às nossas ações diárias, e a tendência é que essa integração cresça ainda mais,

potencializando e ampliando as formas de interação entre os usuários e as tecnologias.

As novas possibilidades de interação propiciam também novos modos de

produção de conhecimento. Assim, a integração das TIC às nossas ações alcança

também a área da educação, haja vista que suas potencialidades podem favorecer o

processo de ensino. Isso, porém, vai depender dos tipos de usos que se faz dos recursos

tecnológicos, em especial, na prática docente.

2. Fundamentação teórica

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Na aproximação teórica sobre questões que envolvem o uso das TIC na prática

pedagógica e a inovação, foi apurado que essa temática tem sido objeto de estudo de

vários autores, como, por exemplo, Silva (2006), Kenski (2004), Tejada (2008), Paredes

(2008, 2009, 2013), Paredes, Murillo & Egido (2005), Gonzáles (2007), Paredes & Arruda

(2012) e Moran (2007, 2008), entre outros. Esses autores, de modo geral, apontam que o

uso dos recursos das TIC no processo educativo traz consigo a necessidade de algumas

adequações que vão exigir o desenvolvimento de novas competências e atitudes de

professores e alunos.

Dentre os vários aspectos presentes nesses estudos, um que se destaca diz

respeito às condições de êxito ou não da integração das TIC no processo de ensino-

aprendizagem, possibilitando o seguinte questionamento: os recursos tecnológicos vão

realmente se constituir uma vantagem para professores e alunos, permitindo a inovação

pedagógica, ou irão complicar-lhes a vida? Entende-se que tal questão está relacionada,

entre outras variáveis, à predisposição de docentes e alunos para com as TIC, algo a ver

com a aceitação ou a resistência ao uso desses recursos. Resistência esta que pode ter

origem em conflitos de ordem pessoal, em relação às crenças e condutas do próprio

sujeito-professor, ou institucional, que diz respeito aos valores conceituais e estruturais

de uma instituição.

Esse tema é fundamental, visto que se refere a uma possível mudança

comportamental. Paredes & Estebanell (2005), por exemplo, argumentam que não é fácil

promover inovações pedagógicas com o uso das TIC, haja vista as dificuldades inerentes

ao processo de mudança comportamental, pois apesar de existirem fatores positivos para

que isso ocorra, também há outros, limitantes, que podem prejudicar o desenvolvimento

de tal proposta.

Com isso, tem-se observado que a apropriação dos recursos tecnológicos por

parte dos professores não é uniforme, pois, segundo Paredes (2008), as TIC se

apresentam de modos distintos a cada pessoa, fazendo com que algumas as utilizem

somente de forma esporádica e de modo descomprometido, enquanto outras fazem um

uso com mais regularidade, de modo avançado, tirando mais proveito das possibilidades

pedagógicas e comunicativas que elas oferecem.

Nesse sentido, o sucesso dos objetivos educativos com a utilização das TIC tem

implicações diretas com a atitude do professor ante esses recursos tecnológicos. É muito

difícil alcançar bons resultados na prática educativa com as TIC se não há uma

disposição do professor a: a) uma reflexão crítica sobre suas reais necessidades de

formação (com as TIC); e b) uma atitude positiva no sentido de integrá-las às suas ações

educativas, buscando criar estratégias e métodos de intervenção, cooperação, análises e

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reflexão em sua prática pedagógica (ROMÁN & ROMERO, 2007). Somente assim poder-

se-á considerá-lo um agente de inovação (TEJADA, 2008).

Como a questão que envolve a inovação na prática pedagógica constitui-se tema

central neste estudo, uma das atividades desenvolvidas neste estudo foi revisitar a

literatura no sentido de buscar especificamente noções sobre o conceito de inovação que

tem sido utilizado no âmbito da educação.

A revisão de literatura mostrou que os novos estudos têm apresentado

abordagens mais densas sobre os processos que envolvem a inovação, bem como sobre

o uso das TIC nas práticas pedagógicas, evidenciando o crescente número de fatores

que influenciam diretamente os ditos processos (MONTERO & GEWERC, 2010), ou seja,

torna-se imprescindível considerar, numa análise atual sobre essa temática, ao menos,

os seguintes aspectos: a) geográficos (localização da instituição – país, estado, cidade e,

principalmente, o bairro); b) institucionais (estrutura, organização, cultura e política

educativa da instituição); c) pessoais (a própria formação docente, crenças teóricas sobre

o ensino, postura sobre o uso das TIC em sua prática pedagógica); e d) instrumentais (no

que diz respeito aos avanços das potencialidades e aplicabilidades dos recursos

tecnológicos).

Nesse sentido, as noções sobre o conceito de inovação também incorporam

novos aspectos advindos dessas discussões mais profundas, que é o que se passa a

explanar. No entanto, até para se ter uma dimensão do alcance dessas novas

abordagens, essa explanação inicia com um conceito considerado clássico, no qual

Rogers (1962) considera a inovação como uma ideia, uma prática ou um objeto que é

percebido como novo por um indivíduo. Essa definição pode ser considerada um ponto

de partida, mas já não consegue dar conta das novas situações de ensino em que a

inovação está presente, podendo ir mais além.

Assim, já trazendo novas incorporações às ideias primeiras de Rogers, uma

noção mais descritiva, apresentada por Figueiredo (2011) e Christensen (2011), faz

referência a dois tipos principais de inovação, a incremental (ou sustentada) e a

disruptiva. Sobre a inovação incremental, diz Figueiredo (2011) que sua base está em

introduzir melhoramentos em produtos, processos, organizações ou sistemas sociais já

existentes. Com relação à inovação disruptiva, Christensen (2011) aponta para o fato de

elas emergirem de forma exploratória, sendo que as maiores oportunidades para inovar

não se encontram na tentativa de melhorar o que já existe, mas de criar soluções para

necessidades ainda não satisfeitas.

Em alguns dos estudos consultados, como os realizados por Martínez & Correa

(2010), Aceto, Dondi & Marzotto (2010) e Gallego (2005), a inovação está atrelada a

questões que envolvem a melhora e o alcance da aprendizagem. Para esses autores, a

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inovação está em oportunizar que a aprendizagem (apoiada pelas TIC) saia dos muros

da escola, possibilitando conexões significativas com a realidade extraescolar,

provocando efeitos positivos na formação dos alunos. Isso também encontra eco nas

noções defendidas por Sancho (2015) e Rubia (2010), que acrescentam que essa

formação deve preparar, para além de alunos, cidadãos responsáveis, solidários e

dinâmicos, aptos a fazer uma “leitura de mundo” mais ampla, preparados para se adaptar

a novas situações e promover a criatividade e qualidade pessoal e social.

Ainda nesta vertente de ampliar os horizontes saindo dos muros da escola,

Montero & Gewerc (2010) e Reis (2013) expressam que a inovação tem como

característica a ideia de mudar algo, mas que essa mudança se converta numa proposta

intencional da escola, que considere a comunidade na qual está inserida, com a intenção

de dar respostas às suas necessidades reais, internas, e também de seu entorno. A essa

noção se somam os estudos de Roig (2008) e Dulac & Alenoada (2008), que

acrescentam que uma proposta assim também deve avançar nos conceitos, técnicas,

atitudes e valores, visando à melhora da condição humana, em atitude crítica e solidária,

buscando o bem comum.

Por outro lado, em outros estudos há a vinculação da noção de inovação com as

estratégias adotadas no processo de ensino. Orozco (2007) e Muñoz-Cano, Córdova &

Priego (2012), por exemplo, opinam que a inovação é complexa, integrando vários

elementos, devendo-se pensar estratégias que permitam aos sujeitos familiarizarem-se

com a própria inovação, facilitando, dessa maneira, o desenvolvimento de competências

cognitivas de alto nível. Isso devido ao fato de que há professores que, mesmo com o

uso de recursos digitais, reproduzem práticas pedagógicas tradicionais. Trata-se,

portanto, de um processo de “negociação” com esses professores, no intuito de

oportunizar que consigam superar tais práticas construindo formatos realmente

inovadores. Sobre essa “negociação”, Marcelo, Yot & Mayor (2015) destacam que os

professores que se motivam a introduzir as tecnologias em suas práticas procuram fazê-

lo de maneira coerente com suas crenças sobre o uso das TIC, mas atentando para não

perder a estabilidade que já construíram.

Outros estudos defendem que a noção do conceito de inovação está relacionada

com a integração das TIC no currículo. Alves et al. (2011) comentam que a adoção de

práticas inovadoras tem por base um paradigma de ensino-aprendizagem que faça da

flexibilização curricular, do desenvolvimento de competências e da articulação curricular

suas principais fortalezas. Salinas (2009) explica que, além de mudanças no currículo, a

inovação também implica mudanças nas formas de ver, pensar, organizar e articular as

disciplinas. Isso exige das instituições um processo de reflexão (e possível alteração)

sobre seus procedimentos e suas estruturas administrativas, no sentido de se adaptarem

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às novas modalidades de formação que a sociedade requer, como, por exemplo, a

educação a distância.

Tejada (2008) e Losada (2010) também concordam que a inovação requer

mudanças nos elementos curriculares, no sentido de que tais mudanças devem ser

baseadas num objetivo comum e orientadas à melhora e crescimento, tanto pessoal

quanto institucional. Além disso, defendem mudanças – internas e qualitativas – também

nos processos educativos e seus contextos mais imediatos, com critérios objetivos.

Outra vertente encontrada na revisão de literatura relaciona a noção de inovação

ao desejo pessoal e às relações entre professor e aluno. Martínez (2008) comenta sobre

os anseios e questionamentos pessoais, no sentido de que o desejo e a atitude devem

mover os professores para tentarem melhorar suas práticas pedagógicas a fim de

oferecer uma melhor educação para seus alunos. Correa Gorospe (2015) menciona

também que é imperioso para a inovação educativa o questionamento sobre o

naturalizado, a reflexão por parte dos sujeitos do processo de ensino-aprendizagem, o

que permite repensar os desafios e construir outro olhar sobre a realidade.

Para Melaré et al. (2011), não se pode esquecer a presença da inovação com o

uso das TIC na dinâmica do trabalho colaborativo em rede, que propicia aos processos

de educação e formação novas metodologias de aprendizagem colaborativa com impacto

no desenvolvimento de processos de interação. As redes sociais e suas novas dinâmicas,

por exemplo, representam um potencial pedagógico que precisa ser mais investigado.

Finalizando este panorama teórico, cabe dizer que ao longo desta explanação

procurou-se fornecer elementos, ideias e perspectivas que permitissem conhecer os

principais aspectos presentes neste estudo, que se referem à noção de inovação e à

integração das TIC nos processos educativos.

3. Metodologia

Esta pesquisa caracterizou-se como um estudo exploratório de natureza

qualitativa, orientado pela abordagem sócio-histórica (MOLON, 2009), que “envolve a

arte da descrição complementada pela explicação de um fenômeno no seu acontecer

histórico, no qual o particular é considerado uma instância da totalidade social.”

(FREITAS, 2002, p. 21).

O procedimento metodológico foi o estudo de caso, que é uma técnica muito

utilizada quando se ambiciona entender o “como” e o “por que” de determinados

fenômenos (ROESE, 1998), e a técnica para a coleta de dados consistiu no uso de um

questionário. Considerando os objetivos da pesquisa, o tipo de amostragem adotada foi a

do tipo não probabilística intencional, que consiste em selecionar um subgrupo de

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determinada população, cujas informações obtidas poderão ser consideradas

representativas de toda a população (GIL, 1999; ALAMINOS; CASTEJÓN, 2006). Tal

escolha, segundo o entendimento de Silva e Menezes (2005), é considerada adequada

para a utilização em investigações de cunho qualitativo, que também envolvem questões

subjetivas dos sujeitos participantes.

Como se tratou de uma investigação sobre a formação docente, optou-se por

eleger como sujeitos da pesquisa, professores(as) de alguns cursos de licenciatura das

instituições pesquisadas no Brasil e na Espanha, e de dois cursos, equivalentes à

licenciatura, na Escola Normal do México.

No delineamento metodológico da pesquisa, detectou-se a necessidade de

realizar duas etapas, a saber: (a) a coleta de dados iniciais, por meio de aplicação de

questionário (a distância); e (b) a análise dos dados, com base na Análise de Conteúdo

(BARDIN, 2008). Assim, na primeira etapa, foi aplicado um questionário semiestruturado

com seis perguntas (enviado por meio de correio eletrônico) a professores(as) de alguns

dos cursos das instituições pesquisadas.

O número total de potenciais colaboradores era de 122 docentes (65 do Brasil, 40

da Espanha e 17 do México).

Após o aval dos diretores das instituições para a participação dos docentes na

pesquisa, iniciou-se a realização da primeira etapa do percurso metodológico, a coleta de

dados. Para tanto, foram feitos contatos individuais com os(as) professores(as) dos

cursos envolvidos e todos os sujeitos foram convidados a participar da pesquisa

respondendo a um questionário (já enviado nesse contato inicial). Na mesma mensagem

também foi estipulada uma data limite para que os sujeitos devolvessem o questionário

respondido e o Termo de Consentimento Livre Após Esclarecimento (TCLAE) assinado,

ambos por meio do correio eletrônico. Foi informado aos sujeitos que seus nomes seriam

mantidos em sigilo.

Assim, decorrido o tempo estabelecido para a devolução dos documentos, o

grupo final foi composto pelo número de docentes que efetivamente responderam e

devolveram o questionário e o TCLAE que lhes foram enviados, perfazendo um total de

27 participantes (nove do Brasil; oito da Espanha; e 10 do México).

Cabe salientar que, por se tratar de uma pesquisa de cunho qualitativo, o número

de respondentes (27 sujeitos, que representa aproximadamente 23% do total de sujeitos

contatados) pode ser considerado representativo, estando dentro das estatísticas

(MARCONI & LAKATOS, 2005) sobre a taxa de resposta de questionários enviados por

meio de correio eletrônico.

Na segunda etapa foi realizada a análise e interpretação dos dados com base na

Análise de Conteúdo que, segundo Bardin, ajuda “na superação da incerteza”, podendo

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demonstrar que a leitura particular do observador é válida e generalizável, e também “no

enriquecimento da leitura”, à medida que auxilia no “esclarecimento de elementos de

significações susceptíveis de conduzir a uma descrição de mecanismos de que a priori

não possuíamos a compreensão.” (BARDIN, 2008, p. 31).

Esse tipo de análise, segundo Franco (2007), constitui-se num processo em que

os textos originais, numa primeira etapa, passam pela desconstrução, que consiste no

exame detalhado e na fragmentação do texto em unidades de base, e, em seguida, pela

categorização, que estabelece uma nova relação entre essas unidades de base,

permitindo o agrupamento de elementos semelhantes, bem como condições para uma

maior profundidade na análise e interpretação dos dados.

4. Resultados

Os dados obtidos junto a professores dos cursos investigados, depois de

submetidos à análise de conteúdo, resultaram duas grandes categorias de análise, quais

sejam: (a) Prática docente com TIC; e (b) Inovações pedagógicas.

Com relação à categoria “Prática docente com TIC”, as principais Unidades de

Análise (UA) que a compõem são: “motivações para incorporar as TIC à prática

pedagógica” e “principais usos das TIC”.

Na UA “motivações para incorporar as TIC à prática pedagógica”, alguns sujeitos

da pesquisa responderam que adotaram o uso das TIC por questões didáticas (dinamizar

a aula; conseguir ampliar a participação dos alunos; por entender que as TIC são

ferramentas com alto valor pedagógico), outros por questões que envolvem a

comunicação entre eles e os alunos (permite o contato a qualquer momento; compartilhar

material; desenvolver ações educativas a distância), e outros por questões referentes às

estruturas oferecidas pelas instituições de ensino (ambientes específicos para o uso das

TIC).

No que diz respeito à UA “principais usos das TIC”, os sujeitos relataram o uso em

três momentos: antes da aula (preparação da aula; seleção de material), durante a aula

(projeções; uso de computadores e vídeos; busca de informação; simulação de

processos; geração de ideias; apresentação de trabalhos acadêmicos; trabalhos

colaborativos; auxílio nas explicações teóricas) e após a aula (avaliação; atendimento aos

alunos; participação em fóruns).

Com relação à categoria “Inovações pedagógicas”, as principais UA que a

compõem são: “importância da criatividade” e “percepção sobre o uso inovador das TIC

na prática pedagógica”.

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Na UA “importância da criatividade”, houve opiniões divergentes entre os

participantes. A maioria considera a criatividade fundamental nos processos de inovação

pedagógica (“se não há criatividade, não há inovação”; fortalece a potencialidade dos

alunos para criar novos espaços interativos; provoca a mudança da realidade educativa;

a criatividade precede qualquer inovação), mas houve quem opinasse que se trata de um

aspecto secundário e limitado na docência superior (“pouco se discute e menos ainda

procura-se incorporar a criatividade na prática docente”) e, ainda, o ponto de vista de que

a criatividade se apresenta de modo neutro (“mesmo com uma ação criativa por parte

do(a) docente não há mudança na realidade educativa”).

Também houve divergências com relação à UA “percepção sobre o uso inovador

das TIC na prática pedagógica”, pois alguns participantes destacaram as grandes

potencialidades e impactos positivos decorrentes de tal uso (favorece o desenvolvimento

pedagógico dos alunos; permite a inovação nos processos de aprendizagem; possibilita a

motivação; melhora a compreensão dos conteúdos; estimula o trabalho cooperativo;

propicia vivenciar contextos diferentes sem sair da sala de aula), outros apontaram para a

saturação do uso dos recursos tecnológicos na prática docente (“minha percepção é de

saturação”; “as TIC são apenas instrumentos, não implicam inovação”) e outros não

percebem a inovação em suas práticas (“não sei dizer se houve inovação em minha

prática com TIC”; “não percebo inovação”; “inovação vejo pouco, mas vejo

contribuições”).

Para encerrar esta seção, é possível sintetizar alguns achados. Entre eles,

destaca-se que a postura dos(as) docentes ante as TIC repercute diretamente nos níveis

de integração e tipos de usos dos recursos tecnológicos, apresentando variações nas

práticas pedagógicas. Isso pode ser um reflexo tanto do limite pessoal dos participantes

quanto das condições oferecidas a eles pelas instituições para o uso das TIC.

Também pode-se inferir que a forma como são utilizadas as TIC na prática

docente é que determina o grau de inovação do processo educativo. Desse modo, cabe

destacar o quanto é complexo incorporar os recursos tecnológicos na prática docente,

pois as TIC se apresentam de forma distinta a cada sujeito. Assim, entende-se que

algumas condições devem ser observadas, como: a reflexão crítica sobre a necessidade

do uso da tecnologia; a consciência de que a prática pedagógica inovadora vai muito

além da simples utilização do recurso tecnológico; a disposição para descobrir usos

ressignificados das TIC; e a coragem para exercer a criatividade na própria prática.

5. Conclusões

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Como se pode observar neste relato de pesquisa, abordar a questão da inovação

na prática pedagógica é algo desafiador, pois traz consigo elementos pessoais e

subjetivos. É necessário lembrar que estamos falando de um campo diverso, complexo e

plural, que são os sujeitos envolvidos no processo educativo. E é justamente pelo fato de

a construção de seus conhecimentos se ancorarem “nas práticas sociais, na experiência

partilhada (nunca a ‘mesma’ para todos), como lugar das relações interpessoais, que vão

acontecendo, vão se legitimando e se instituindo” (SMOLKA, 2004, p. 44) que as

necessidades de formação são diferentes, até porque os sujeitos podem ter

necessidades, crenças e atitudes distintas. E isso reflete diretamente, como é aqui o

caso, na postura do sujeito ante as TIC.

Assim, fica evidente que o fato de o(a) docente utilizar recursos tecnológicos não

implica que ele(a) venha a ter uma prática pedagógica inovadora, pois ela – a prática –

pode estar apenas com uma “roupagem moderna” (ARROYO, 2000), mas reprodutora de

práticas tradicionais de ensino.

A inovação vai além, é um grande desafio. Passa pela percepção de que

devemos, como docentes, refletir sobre o que entendemos por conhecimento e pelas

formas como se dá a sua construção; repensar nossas concepções sobre o processo de

ensino-aprendizagem, do sentido da função docente e de seus desafios, entre os quais

está a integração de recursos tecnológicos na prática pedagógica. Prática essa que deve

ter o compromisso também com a formação de cidadãos responsáveis e solidários,

capazes de dar respostas às necessidades da sociedade, buscando o bem comum e a

justiça social. Prática que objetive mudanças orientadas à melhora e crescimento pessoal

e institucional, mais qualitativas que quantitativas.

Para inovar, é preciso olhar para a “mesma coisa” de um ângulo diferente. Trata-

se de trazer muito de si mesmo a temas sobre os quais tudo parece já ter sido feito. Esse

é o requisito, entregar-se e empenhar-se.

Como fazê-lo? Há que se reinventar sempre, com criatividade, mas sem perder a

própria essência.

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