aula 01 sociologia do trabalho

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CURSOS ON-LINE – SOCIOLOGIA DO TRABALHO PROFESSORA TÂNIA LÚCIA MORATO FANTINI www.pontodosconcursos.com.br 1 AULA 1- O TRABALHO NA VISÃO CLÁSSICA E ATUAL Apresentação Caro estudante: Olá. Vamos continuar nossa viagem pela Sociologia do Trabalho, com convicção, calma e tranquilidade. Sugiro, para um melhor aprendizado, que você faça inicialmente uma leitura relaxada, e, em seguida, uma releitura, com a anotação de conceitos, finalizando com a resolução de exercícios... Vimos, na aula introdutória, que o conceito de trabalho tornou-se difícil, dadas as variações de tipos, formas e contratos de trabalhos existentes atualmente. Vimos que há um debate sobre o paradigma do trabalho: se é ou não central à sociedade atual e à Sociologia . Vimos também que as mudanças no mundo atual fizeram surgir uma crise na questão do trabalho. Vamos, hoje, conceituar o trabalho, a partir do pensamento clássico e tratar de alguns pontos cobrados pelo edital. Esta aula, com certeza será a mais “pesada”, pois será necessário explicar o núcleo central da teoria marxista, que é bastante complexo e difícil de explicar. Tentarei fazê-lo do modo mais simples possível. Conteúdos apresentados: Aula 01 – O conceito de trabalho. Exploração e alienação. Os valores sobre o trabalho. Trabalho como ação, necessidade e coerção. O trabalho no pensamento clássico. Remuneração e sistema de assalariamento. Psicopatologia do trabalho. 1. O CONCEITO DE TRABALHO

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    AULA 1- O TRABALHO NA VISO CLSSICA E ATUAL

    Apresentao

    Caro estudante:

    Ol. Vamos continuar nossa viagem pela Sociologia do Trabalho, com convico, calma e tranquilidade.

    Sugiro, para um melhor aprendizado, que voc faa inicialmente uma leitura relaxada, e, em seguida, uma releitura, com a anotao de conceitos, finalizando com a resoluo de exerccios...

    Vimos, na aula introdutria, que o conceito de trabalho tornou-se difcil, dadas as variaes de tipos, formas e contratos de trabalhos existentes atualmente.

    Vimos que h um debate sobre o paradigma do trabalho: se ou no central sociedade atual e Sociologia. Vimos tambm que as mudanas no mundo atual fizeram surgir uma crise na questo do trabalho.

    Vamos, hoje, conceituar o trabalho, a partir do pensamento clssico e tratar de alguns pontos cobrados pelo edital. Esta aula, com certeza ser a mais pesada, pois ser necessrio explicar o ncleo central da teoria marxista, que bastante complexo e difcil de explicar. Tentarei faz-lo do modo mais simples possvel.

    Contedos apresentados:

    Aula 01 O conceito de trabalho. Explorao e alienao. Os valores sobre o trabalho. Trabalho como ao, necessidade e coero. O trabalho no pensamento clssico. Remunerao e sistema de assalariamento. Psicopatologia do trabalho.

    1. O CONCEITO DE TRABALHO

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    Desde que fomos expulsos do paraso, nosso grande problema foi a sobrevivncia. No entanto, conseguimos chegar at aqui e isto aconteceu graas ao fato de lutarmos juntos, isto , comportamo-nos como criaturas sociais. O trabalho humano, socialmente organizado, foi o responsvel principal pela construo da histria da humanidade. Provas disso so obras maravilhosas como as pirmides, as catedrais e palcios, as pontes e estradas, as grandes obras de arte.

    Mas a palavra trabalho, em sua origem, tem um cunho negativo, pois vem do latim tripaliare (do substantivo tripaliu, aparelho de tortura onde os escravos eram atados). Trabalhar significaria, portanto, estar submetido tortura.

    Somente na idade moderna, o conceito de trabalho passou a ter valor positivo. At ento, a vida econmica, social e religiosa eram uma s e o trabalho tinha uma finalidade em si mesmo. No significava, como hoje, um atalho para o consumo de bens materiais ou para a conquista do cu. Embora houvesse o trabalho de servos, artesos, mestres e aprendizes, camponeses e uma vasta gama de mercadores e comerciantes, no predominava a idia de que o trabalho pudesse ser vendido ou comprado livremente em um mercado. Predominava a idia de deveres e obrigaes; a palavra empenhada nas relaes sociais, mas no a idia de trabalho, como a conhecemos.

    Seria preciso surgir o sculo XVIII para que a economia, e a produo de bens necessrios vida tomasse as feies modernas: uma sociedade fundada em um modo de produo capitalista, em que as relaes entre os homens j no so regidas por obrigaes morais e religiosas, mas na relao de troca e de uma finalidade externa ao trabalho.

    O trabalho tornou-se um valor para a sociedade, no de uso (que a sua utilidade s necessidades humanas), mas sim de troca (seu valor como mercadoria).

    Portanto, quando o trabalho humano passou a ter um valor de troca, deu-se incio a uma transformao de toda a sociedade, pois o modo de produzir as coisas havia se modificado.

    O filsofo alemo Hegel foi um dos grandes pensadores sobre o trabalho, influenciando sobretudo, Karl Marx. Para ambos, o trabalho a atividade construtiva da vida individual e social, organizadora e produtora da histria humana. Por que? pelo trabalho que nos tornamos humanos sociais, fazendo-nos distintos das outras espcies. Embora os pssaros produzam ninhos, a abelha produza cera ou mel e os castores faam barragens, eles so coagidos por necessidades

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    instintivas. O homem, ao trabalhar, segue as leis universais e estticas: um artista criativo que transforma a natureza de forma permanente, um poeta.

    Como atividade til, o trabalho exerce uma funo produtiva e transformadora em relao ao mundo objetivo e natureza, inclusive em relao natureza do homem.

    Para Marx, trabalho uma fora organizadora da sociedade e da histria : o trabalho um processo entre o homem e a natureza, em que, por sua prpria ao, media, regula e controla seu metabolismo com a natureza.

    Assim, ao atuar sobre a natureza e modific-la, o homem modifica tambm sua prpria natureza, desenvolvendo suas potncias adormecidas e sujeitando-se ao domnio de si mesmo.

    Segundo Marx, os elementos simples do processo de trabalho so: a atividade orientada a um fim ou o trabalho mesmo, seu objeto e os meios.

    O processo de trabalho humano nico, porque h uma concepo do prprio trabalho, que se torna um ato consciente e uma ao inteligente e proposital. Ns somos capazes de construir em nossa mente o trabalho, entender sua finalidade e determinar os meios necessrios, antes de execut-lo. Aps sua execuo, surge aquilo que ns imaginamos o resultado ou produto de nossa atividade: ele fiou e o trabalho o fio.

    Desta caracterstica, decorre uma consequncia importante para a evoluo do trabalho: a separao entre a concepo e a execuo. Isto permitir que alguns homens possam conceber a forma de trabalho, a finalidade, o objeto e os meios, enquanto outros apenas executem.

    Permitir ainda que alguns possam controlar os meios de produo - ferramentas, instrumentos, fora humana, equipamentos, instalaes.

    Tambm possibilita o controle da finalidade do trabalho, tornando o trabalho um valor para a sociedade, no o mero valor de uso que supre as necessidades, mas o valor de troca, que o valor como mercadoria.

    E poder ainda transformar todo o processo de produo, dividindo a execuo do trabalho em partes e distribuindo-as para diferentes trabalhadores.

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    Em resumo, o processo de qualquer trabalho inclui:

    1 atividade (a ao racional de concepo do prprio trabalho e sua execuo);

    2 - orientao para um objetivo (finalidade);

    3 o objeto (matria onde ser executado o trabalho, por exemplo, algodo);

    4 os meios (ferramentas, instrumentos, corpo, equipamentos, etc);

    5 - o trabalho mesmo (resultado ou produto).

    No entanto, Marx no aceita, como Hegel, que todo trabalho positivo. S o trabalho til positivo, ou seja, aquele no qual existe um carter social. Quando algum obrigado a vender sua fora de trabalho (a capacidade de executar o trabalho), muda o sentido do trabalho. O trabalhador pe sua energia no trabalho, mas o produto de seu esforo passa a no lhe pertencer mais.

    Quem o fez no o reconhece, pois no o concebeu. O objeto se torna estranho como um feitio. E isto faz com que se torne estranho o homem diante de si mesmo e do outro que comprou sua fora de trabalho, pois sente-se rebaixado a simples meio. Ele no foi o dono da ao, que deveria ser uma atividade livre.

    Seu trabalho tornou-se um meio para uma produo, uma coisa, como se fosse uma mera ferramenta.

    Ao vender seu trabalho e a si mesmo, o homem torna-se mercadoria, assim como sua atividade de trabalho e o resultado dela. Eles tornam-se coisas. Cria-se a reificao (coisificao) - a desvalorizao do ser humano e uma supervalorizao da mercadoria - uma condio de alienao pelo trabalho.

    Vamos entender melhor, com um contraste radical: os povos primitivos. Suas atividades produtivas, como a caa e o plantio contm elementos de magia, jogos, dana e msica, rituais de comemorao e de fertilidade. Sua produo est incorporada vida, sem criar o domnio de um homem sobre o outro. Os ndios brasileiros, por exemplo, no aceitaram o trabalho e foi impossvel a escravido indgena.

    Entre os povos escravizados, h o trabalho sob o total domnio de outro. A escravido foi a principal forma de trabalho em muitas sociedades, existindo at o final do sculo XIX. E ainda existe, infelizmente, pela coero ou imposio de adultos ou da prpria famlia. Crianas e mulheres so obrigadas a se prostituirem, a pedir esmolas, vender objetos, drogas ou a roubar, ou seja, a trabalhar em

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    atividades marginais sociedade (ou at centrais, como o trabalho em lixes, carvoarias, como muitas crianas ainda fazem).

    Portanto, uma condio onde o homem pode vender sua fora de trabalho uma situao intermediria entre a escravido e a tribo.

    2. A EXPLORAO E A ALIENAO PELO TRABALHO

    Voc j deve conhecer a palavra alienao. No dia-a-dia, ela bastante usada (Joo alienado, no presta ateno nos polticos, Maria alienada, no se preocupa com nada), mas nem sempre de maneira correta.

    Alienar significa separar-se de, ceder a outro um direito.

    O conceito de alienao surge na filosofia hegeliana e reconfigurado em Marx.

    Para Marx, a alienao surge de relaes entre os homens, em que o homem passa de uma vontade prpria de agir e ser til socialmente, submisso de sua vontade. As relaes de dominao transformam os homens em inimigos e estranhos. Do mesmo modo, o produto de seu trabalho, nestas condies, separa-se de quem as produziu. Ento, o que aliena o homem e produz nele uma falsa conscincia o modo de produzir, de trabalhar. Quando vende sua fora de trabalho a outro homem, aliena-se, separa-se a sua conscincia, produz uma falsa conscincia de si mesmo porque falseia as relaes sociais. Um homem domina o outro, quando o que deveria ocorrer seria uma relao de igualdade, em que cada um se reconhece no outro. S nesta relao de igualdade possvel produzir a conscincia verdadeira.

    Aqui, h uma discordncia com Hegel. Para este, a alienao no pode ser superada, porque a prpria sociedade cria uma conscincia falsa no homem. S se poderia superar esta alienao pelo trabalho intelectual.

    Para Marx, a alienao surge do homem despossudo da propriedade de seu trabalho e do produto dele, transformando a ambos em mercadorias ou coisas. O homem no concebe ou planeja, no cria ou determina os meios para as finalidades. Ele apenas realiza uma atividade imposta. No possui acesso ao processo de criao, mas obrigado a faz-lo, diante da necessidade de sobreviver, j que no h outro modo de produzir para viver, neste tipo de sociedade. O trabalho modificou sua funo social e sua funo psicolgica para o trabalhador.

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    Das relaes sociais desiguais surge a condio da alienao e de explorao do valor do trabalho.

    Estar alienado significa estar separado de si, de sua conscincia, da natureza e dos outros homens, da construo da sociedade.

    A alienao surge da vida alienada, isto , distante do ser humano natural, que deve ser comprometido com a produo de si mesmo e da histria por meio de uma ao prtica e concreta, realizada com os outros homens, por uma prtica social (prxis social).

    Alguns autores, como Guerreiro Ramos consideram 3 tipos de alienao: a auto-alienao, a reificao e a alienao do poder. Contudo, estes conceitos no tm o significado que Marx lhe deu. O uso inadequado do conceito aborreceu tanto Marx que ele abandonou-o em escritos posteriores.

    3. TRABALHO COMO AO, NECESSIDADE E COERO

    Como vimos na aula introdutria, os fatos sociais so coercitivos, isto , levam-nos a pensar e agir de determinados modos. No entanto, a ao prpria do indivduo que delibera e julga as coisas, e est consciente de suas finalidades intrnsecas. Ao implica em uma forma tica de agir. Os seres humanos so levados a agir, a fazer escolhas de acordo com os fins e no com os meios.

    Da, vem a grande dificuldade no trabalho como ao humana. Impelido pelas necessidades e pela coero social, geradas pelas relaes de dominao, que o tornam alienado, o homem se v distante de uma ao tica e moral no trabalho. Ele tambm convertido em meio, no um fim em si mesmo.

    A necessidade de sobrevivncia pode favorecer a explorao.

    A explorao pelo trabalho vem associada ao conceito de trabalho como valor de troca. no tempo de trabalho que este valor se manifesta, como veremos mais adiante. Diante da necessidade de trabalhar para viver, mas no sendo possvel uma relao de igualdade entre o trabalhador e os outros homens, as condies de trabalho favorecem a explorao do trabalho.

    O prprio trabalhador transforma-se em um valor de troca, perdendo a capacidade de agir.

    Segundo Guerreiro Ramos, nestas condies, o homem passa a se comportar e no a agir. Condicionado por um sistema, que o considera como um meio ou recurso de produo, torna-se utilitrio e

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    fluido em seus valores, buscando a convenincia de seus interesses, adota uma perspectiva relativista que aceita tudo, desde que no se prejudique pessoalmente. Torna-se formalista e educado, comportando-se pelas aparncias, de forma correta e educada, operacionaliza suas aes, cedendo a sua vontade de forma mecnica e sem julgamento.

    Marx v a emancipao do trabalhador apenas se o trabalho deixar de ser uma imposio de exigncias das necessidades e finalidades externas, subjugando-o: satisfazer suas necessidades com liberdade, por meio de cooperao com os outros, onde o controle coletivo toma o lugar da dominao e as atividades so realizadas, com o mnimo gasto de energia e sob condies dignas, regulando coletivamente o uso da natureza.

    A ao livre e a necessidade tm uma relao dialtica, uma relao de opostos e de negao. A base da ao livre a necessidade, mas, sob coero, a ao se transforma em luta para a liberdade. Do mesmo modo que existem luz e sombra, dia e noite, fim e comeo, a dominao conduz luta.

    A dialtica caracteriza a filosofia de Hegel e tornou-se a base do humanismo marxista, cuja filosofia chamada materialismo-histrico, para a qual cada perodo histrico de uma sociedade feito de contradies.

    Desse modo, no modo de produzir capitalista, ao subjugar o trabalho e torn-lo mercadoria, existe a semente da superao e mudana, pela luta dos trabalhadores em busca de liberdade.

    4. O TRABALHO NO PENSAMENTO CLSSICO

    O pensamento clssico se refere quelas primeiras teorias e idias sobre determinado assunto, dando origem ao seu desdobramento terico.

    Neste sentido, podemos considerar os economistas Adam Smith, Marx e Ricardo como representantes do pensamento clssico sobre o trabalho, porque para eles o trabalho constitui a base da produo econmica.

    Vivendo em uma poca de intensas transformaes, inovaes cientficas, idias revolucionrias, nos sc. XVIII e XIX, em que tudo se convulsionava, os primeiros economistas puderam contemplar melhor a paisagem e descobrir os fatos mais relevantes. Os efeitos da

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    passagem de uma sociedade agrcola e artesanal para uma sociedade manufatureira e industrial eram tambm sentidos no pensamento.

    provvel que voc j sentido alguma ansiedade diante das transformaes atuais. H uma grande incerteza sobre o futuro. Vivemos, como disse anteriormente, uma fase de transio, em que tudo parece estar mudando.

    Transformaes semelhantes aqueles senhores observadores e estudiosos puderam ver, analisar, compreender e tentar explicar. quela poca, importavam as questes de como pagar os salrios de tantos trabalhadores, criar empregos, calcular os preos das mercadorias, as ofertas e demandas de produtos novos e em grande quantidade, o preo do dinheiro investido e os juros dos capitais emprestados, etc. Era preciso dar valor s coisas e quantificar este valor. Enfim, solucionar os desafios da economia que surgia.

    Todas estas questes esto contidas em suas publicaes. Suas idias surgiram como respostas aos inmeros problemas que se apresentavam sociedade que mudava. Do mesmo modo, hoje, pensamos sobre o impacto das novas tecnologias de informao no trabalho, no emprego e desemprego e sobre as modificaes que se processam na economia globalizada, sendo objeto de muitos estudos e pesquisas.

    Adam Smith considerado o pai do Liberalismo - viu no trabalho e no tempo de trabalho a fonte de valor para a economia e a sociedade. Foi o primeiro a formular uma teoria do valor, segundo a qual o valor de cada mercadoria deriva da quantidade de trabalho gasto em sua produo.

    A verdadeira fonte de riqueza de uma sociedade o trabalho, atravs do aumento de produtividade, obtida pela diviso e especializao do trabalho.

    O valor no pode ser definido pela utilidade, pois se assim fosse, o ar teria um valor incalculvel. Porm, preciso que algo seja til e escasso para ter valor de troca. Mas como definir o valor de alguma coisa? pela quantidade de trabalho gasto em sua produo. Por exemplo, caar um coelho pode custar mais do que caar um castor, pois h mais trabalho. Um produto de dois dias de trabalho deve valer o dobro de outro que gasta um dia ou uma hora. Desse modo, o preo das mercadorias deve ser baseado no trabalho, porque seu valor no varivel.

    Smith introduz a idia das classes sociais e sua relao conflituosa com a classe dos produtores que cede os meios de produo ao trabalhador e recebe o produto, que vende com lucro. A classe dos

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    proprietrios de terra cede ao trabalhador parte dela e, em troca, exige parte dos produtos ali produzidos, em forma de renda da terra.

    Antes dessa relao, o trabalhador era o nico dono do produto de seu trabalho, ele no tinha patro. A classe capitalista (donos dos meios de produo ou da terra) surge com a apropriao da terra ou acumulao privada de riqueza, o capital. Desta apropriao do trabalho, alm da terra e do capital, surge a idia de explorao, em Marx. Posteriormente, Smith observou que os trabalhadores desejam ganhar o mximo, os patres pagar o mnimo. Os primeiros associam-se para fazer aumentar os salrios, os patres fazem o mesmo para baix-los.

    Segundo Paul Singer, do qual extramos as citaes acima, embora liberal, Smith foi um liberal, mas nem tanto. Ele acreditava na propriedade privada (mas no sem a vigilncia das leis), na livre iniciativa e na livre concorrncia. Supunha existir uma acomodao natural (uma mo invisvel) entre os interesses individuais na economia e na sociedade: todo indivduo deseja progredir e melhorar de vida, assim todos precisam cooperar entre si para que a sociedade e a economia cresam e se desenvolvam. Sendo assim, preciso haver liberdade econmica: a prtica de uma doutrina liberal, que se baseia na propriedade privada, livre iniciativa, livre concorrncia nos mercados. Somente ela possibilita a riqueza de uma sociedade.

    Seu livro Uma investigao sobre a natureza e as causas da riqueza das naes, publicado em 1776, continua, na minha opinio, um dos melhores livros existentes, apesar de ser difcil.

    Marx, seguindo as idias de Smith, desenvolveu-as, mas criticou e se ops ferozmente idia da propriedade privada e ao liberalismo econmico.

    Seu pensamento sobre a teoria do valor-trabalho guarda grande semelhana ao deste autor: todo o valor criado na sociedade nasce do trabalho e o tempo de trabalho a referncia para se estabelecer os preos das mercadorias.

    Vou seguir o mesmo raciocnio que ele desenvolveu para explicar a idia de valor.

    Como podemos comparar reas de figuras geomtricas diferentes, como retngulos e quadrados ou trapzios? Basta transformar as reas em tringulos, encontrando-se um ponto de referncia comum. O mesmo ocorre com o valor das mercadorias. O que vale mais: um tijolo ou um leno de seda? O ponto em comum o trabalho gasto para produzir estes objetos, no para o uso, pois, neste caso, a sua utilidade que conta e ela no tem valor econmico. preciso saber o

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    tempo de trabalho gasto para produzi-lo, mas para troca, pois, a, sm, torna-se uma mercadoria que pode ser trocada por outra ou por dinheiro. Ela tem um valor de troca - valor que possibilita uma transao econmica.

    Assim, um leno de seda pode valer o mesmo que um tijolo para o produtor capitalista. O valor de cada um a quantidade de tempo de trabalho para transform-lo em uma mercadoria com valor de troca.

    Mas isto no sinnimo de preo da mercadoria.

    Vamos imaginar um pobre tecelo manual que antes produzia uma quantidade de lenos por dia, em 10 horas de trabalho. Com a inveno do tear a vapor, ele trabalha 18 horas em vez das 10 anteriores. Mas o produto de suas 18 horas de trabalho no tem mais valor que aquele produzido em 10, embora ele agora produza muito mais lenos.

    O preo das mercadorias sofre influncia da demanda de compradores e da oferta de outros fabricantes e dos salrios pagos, que nunca podem ser maiores que o preo da mercadoria, mas podem ser sempre menores.

    Tambm o valor de um homem ou da fora de trabalho determinado pela quantidade de trabalho para produzir sua fora de trabalho: produzir, manter-se vivo e perpetuar a fora de trabalho. Seu valor equivale aos artigos de subsistncia, de primeira necessidade.

    Por exemplo, um trabalhador precisa de seis horas de trabalho para comprar artigos de 1 necessidade, que equivalem a R$ 12,00. Ento, ele vende sua fora de trabalho por este preo. Se trabalha doze horas, produz R$ 12,00 de mercadoria em seis horas e ainda produz mais R$ 12,00 de mercadoria nas outras seis horas. Assim, ele produz um sobretrabalho, a mais-valia, que se reverter em lucro para o capitalista (ateno: mais-valia no sinnimo de lucro, s uma fonte de lucro, pois h outros custos a pagar, alm do trabalho). A mais-valia o tempo de trabalho que no pago ao trabalhador e a fonte de toda a riqueza na sociedade.

    Mas, se ele trabalhar o dobro de horas, ele gera uma mais-valia equivalente ao dobro ( a mais-valia absoluta). E se trabalhar menos, por exemplo, s oito horas, mas ainda assim produzir mais mercadorias, ele poder gerar uma mais valia igual aos reais economizados com o pagamento de seu trabalho ( a mais-valia relativa).

    Todo trabalho no pago a fonte do lucro, da renda da terra e do juro, que possibilita a acumulao do capital para seu dono. Da, nascem as

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    relaes de produo, pois torna-se capaz de controlar, com o capital acumulado, os meios de produo.

    As relaes de produo (formas de propriedade dos meios de produo gerando as classes sociais e as relaes entre essas classes) criam a economia, sobre a qual se ergue o edificio de uma sociedade. O Estado formado pelas instituies jurdicas e polticas. As ideologias - que so as formas de conscincia social, como costumes, arte, religio, cultura - formam uma superestrutura, para justificar as relaes de produo.

    Desse modo, a classe dominante, que dispe dos meios de produo, dispe tambm dos meios de produo intelectual e poltica. Portanto, as idias dominantes em todas as pocas da histria so as idias das classes dominantes.

    A luta de classes entre trabalhadores e os que controlam os meios de produo o mecanismo ou motor da histria, isto , o que possibilita mudar o modo de produo.

    O ponto de partida para a economia , portanto, a teoria do valor- trabalho. O trabalho convertido em uma fora que pode ser comprada e vendida, modifica todas as relaes sociais. O modo de produo capitalista surge quando transforma em valor o trabalho e possibilita que ele seja trocado, como uma mercadoria em um mercado.

    Ricardo foi o sucessor de A. Smith. Suas idias dominaram a economia por mais de meio sculo. Deu grande contribuio teoria do valor, localizando no trabalho o valor na troca de mercadorias. Mas, Ricardo diferencia o valor do trabalho, em funo da habilidade e da dificuldade para realiz-lo, alm da oferta de trabalho no mercado. Sempre que houver crescimento da produtividade do trabalho, pelo uso das mquinas, poder ocorrer o desemprego, reduzindo o valor do trabalho e fazendo cair os salrios. Para ele, um programa econmico liberal necessrio quelas sociedades estagnadas, sem crescimento econmico (foi grande amigo de Malthus, outro economista de sua poca).

    Enquanto Smith era bastante otimista quanto economia no futuro, Ricardo e Malthus eram trgicos pessimistas. Marx, por sua vez, era um revolucionrio, que confiava no desfacelamento da economia para uma mudana no modo de produo capitalista.

    Posteriormente, as idias sobre o valor-trabalho foram criticadas e o trabalho passou a ser considerado no mais como a base da economia, mas um dos fatores de produo, to importante quanto o capital e os recursos naturais.

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    5.1.TRABALHO E REMUNERAO. O SISTEMA DE ASSALARIAMENTO

    A importncia do salrio para o trabalhador passou a ser imensa, pois refere-se sua fonte de renda, possibilitando-lhe a subsistncia pessoal e familiar e um determinado padro de vida. Tambm passou a constituir-se em um smbolo de sua posio social e de seu valor como trabalhador.

    Para a empresa e a sociedade no menos importante. Reflete-se no preo dos produtos e servios e no poder de consumo. Desse modo, quando o trabalho se torna assalariado, modifica todas as relaes sociais, pois elas se transformam em relaes de troca. O sistema de assalariamento nasceu com o capitalismo. O salrio toma a forma de mercadoria, pois pode ser trocado por fora de trabalho, sob o contrato de trabalho. O trabalhador submete-se ao mercado de trabalho, com suas leis prprias, sujeitas s flutuaes e a influncias do desemprego e ao desempenho da economia.

    Contudo, o conceito de salrio no imutvel. Ele sofre modificaes entre os prprios trabalhadores e a sociedade. A Constituio Brasileira de 88, por exemplo, passou a incluir a participao nos lucros ou resultados como direitos possveis dos trabalhadores, quando houver lucro. O salrio geralmente envolve uma relao de tempo entre o empregado e o empregador. Ele pode ser mensal, semanal ou quinzenal.

    A definio de salrio como a retribuio em dinheiro ou equivalente dos servios prestados pelo empregado, por fora de contrato de trabalho, pelos servios que presta d nfase ao contrato de trabalho. Contudo, na prtica, o contrato uma mera formalidade, sem haver negociao por parte da maioria dos trabalhadores, que aceita as condies impostas.

    H vrias formas de salrios: salrios diretos ou indiretos, salrios-base, piso salarial, salrio real.

    Por exemplo, empregados horistas recebem em funo das horas trabalhadas, diretamente. Um operrio horista pode acumular horas em um banco de horas, recebendo adicionais em funo das horas trabalhadas, por exemplo, se hora noturna ou diurna, normal ou hora-extra. Pode receber tambm um salrio indireto, por meio de servios oferecidos pela empresa, como alimentao, transporte, seguro de vida, assistncia mdica, planos de aposentadoria, etc.

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    O salrio-base do empregado o salrio fixo, sobre o qual vo sendo acrescentadas gratificaes por horas-extras, adicionais de insalubridade e periculosidade, etc. O salrio-base traz a vantagem de reduzir os encargos trabalhistas, assim como os salrios indiretos.

    Falamos ainda em salrio mnimo, como a menor remunerao permitida por lei federal, para os trabalhadores de um pas. O piso salarial o mnimo salrio para uma categoria profissional. O salrio real equivale ao poder de compra em determinado momento e se relaciona com a taxa de inflao. Se muito alta, o poder do salrio real diminui.

    O salrio no algo novo na sociedade. J se pagavam salrios aos soldados romanos. Todavia, os salrios tornaram-se a principal forma de pagamento, com o advento do capitalismo. Trabalhadores assalariados tornaram-se a maioria em todo o mundo. Por exemplo, enquanto a maior parte da populao americana trabalhava por conta prpria em 1900, s um dcimo da populao o fazia, em 1970, segundo Braverman.

    Os valores econmicos sobre o trabalho buscam os fundamentos para atribuir quantidades aos pagamentos do trabalho e como pag-los (a palavra salrio, vem de sal, que j foi utilizado como pagamento). Os primeiros economistas falaram sobre vrias formas de pagamento observadas na sua poca: por hora, por peas, por empreitada, por subempreitada. Marx, por exemplo, conta que as fiandeiras nas fbricas pagavam s crianas para fazer muitos servios e as costureiras empregavam outras para pregarem botes.

    Os salrios tornaram-se to importantes para a sociedade que criaram uma hierarquizao nos trabalhos, na medida que os salrios passaram a ser considerados como referncia do valor do trabalho. Os trabalhos mais bem pagos passaram a ser mais procurados, criando uma competio entre os trabalhadores.

    Patres e empregadores tambm criaram mais exigncias para o ingresso no mercado de trabalho e uma maior cobrana em relao ao desempenho do trabalho, quando criaram os escalonamentos de salrios. Surgiram vrias formas de comparao de cargos e salrios. Em vez de serem pagos com base no tempo, os salrios se tornaram atrelados s exigncias, passando a incluir a descrio do trabalho, grau de instruo, tempo de aprendizagem, habilidades necessrios. Especializaram-se os trabalhos e os trabalhadores, assim como seus salrios.

    O Estado viu nos salrios uma fonte de impostos. Criando impostos sobre os salrios, fez crescer as oportunidades para o surgimento de

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    inmeras instituies ligadas ao trabalho, desde o treinamento e educao da mo-de-obra, recrutamento, proteo, assistncia e benefcios, fiscalizao, etc.

    No entanto, devido a esses impostos sempre crescentes e aos encargos sociais, os empregadores se viram com o problema dos elevados custos dos salrios. Este fato fez surgir outras formas de remunerao, para reduzir estes custos. Benefcios assistenciais e pagamentos indiretos - transporte, alimentao, planos privados de aposentadoria - surgiram como formas de reduzir os encargos sociais.

    Atualmente, a remunerao de um trabalhador pode incluir salrios, benefcios, participao nos resultados da empresa e participao societria. A remunerao constitui tudo quanto o trabalhador recebe direta ou indiretamente.

    Outras formas de reduo dos custos de salrios e das folhas de pagamentos incluem o trabalho em tempo parcial e temporrio ou a terceirizao de mo-de-obra, eliminando-se os custos dos encargos trabalhistas.

    Vrias pesquisas sobre os salrios mostram que h grande desigualdade salarial: salrios mais altos na indstria e mais baixos nos servios; mais altos entre os homens que entre as mulheres; mais altos entre os que tm empregos estveis, com carteira; mais baixos entre os que tm empregos instveis, temporrios e de meio expediente.

    H ainda inmeros trabalhos que pagam salrios incapazes de manter o trabalhador e sua famlia, o que leva ao trabalho feminino ou de jovens, que, em geral, abandonam os estudos para trabalhar.

    O poder de negociao dos trabalhadores baixo, devido ao grande nmero de desempregados, criando um exrcito de reserva que faz baixar os salrios.

    A remunerao no sinnimo de salrios porque inclui salrios e outros proventos, mas tambm regida por contrato.

    Outras denominaes para o pagamento de trabalho podem incluir honorrios (usada para profisses liberais) e soldo (para soldados e militares).

    6. VALORES SOCIAIS SOBRE O TRABALHO

    Valores so importantes para a Sociologia e a Economia. Para a primeira, interessam os valores sociais, para a segunda, preciso

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    quantificar os valores, tornando-os econmicos. Em ambos, o significado bsico o mesmo, uma avaliao, uma atribuio de qualidade ou quantidade. A teoria do valor, apresentada antes, mostrou que o trabalho pode ser visto sob a tica de diferentes tipos de valor (valor de uso, valor de troca).

    Valores so julgamentos e avaliaes comparativos. Se algum diz que um trabalho tem mais valor que outro, julga que um melhor que outro.

    Atitudes so avaliaes tambm, mas referem-se discordncia ou concordncia com um juzo de valor. Por exemplo, se muitas pessoas concordam que o trabalho de um operrio tem menos valor que o de um professor, mostram uma atitude mais negativa com relao ao primeiro.

    Valores e atitudes sociais podem ajudar a explicar as desigualdades encontradas na sociedade e a entender porque o trabalho de uma pessoa considerado melhor ou superior, enquanto outro, visto como inferior.

    Podemos observar que os trabalhos so hierarquizados, no s em relao aos salrios, mas tambm de acordo com os valores e atitudes sociais. O principal critrio utilizado para dizer se um trabalho melhor que o outro o status (ou prestgio). E, em segundo lugar, o poder relacionado com o trabalho.

    O status a posio socialmente identificada, podendo vir de atributos naturais (sexo, idade, famlia, nacionalidade) ou atributos adquiridos (educao, habilidades, casamento, bens).

    Tambm o poder - que a capacidade de controlar as aes alheias - tambm um critrio para escalonar os trabalhos. O poder pode vir da fora fsica, do controle de recompensas materiais ou simblicas.

    Vimos que, na Economia, o valor do trabalho ou de qualquer outro bem, como a gua, por exemplo, no deriva de sua utilidade. Este fato parece ocorrer tambm na sociedade. Por que o trabalho de uma dona de casa no valorizado?

    H um esteretipo com relao ao papel da mulher, isto , que deve ser centrado no lar e na assistncia aos mais fracos. Um esteretipo uma imagem cristalizada na sociedade, uma repetio, baseada em atitudes e valores sociais. Isto prejudica o trabalho feminino, pois gera oportunidades de emprego apenas em atividades de assistncia e cuidados aos outros ou semelhantes ao trabalho domstico. So trabalhos de baixo status e poder, como o papel feminino na sociedade, julgado negativamente em relao ao masculino, dominante nas relaes sociais.

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    Podemos dizer que:

    1 - So menos valorizados ou valorizados negativamente os trabalhos que agregam pouco valor a outros produtos. Por isto, em geral,os servios eram menos valorizados que os trabalhos ligados indstria, tendo menor prestgio social; mudando seu valor na medida em que passaram a incorporar outros valores (por exemplo, servios de sade ou ligados ao conhecimento);

    2 - So pouco valorizados os trabalhos braais, pois so comparados ao das mquinas ou animais, salvo nos esportes ou artes, onde a habilidade e o talento so raramente encontrados;

    3 - So pouco valorizados os trabalhos repetitivos, rotineiros, que tm um ciclo curto (assim que terminados, devem ser reiniciados), como o trabalho domstico, de limpeza, de operrios com baixa qualificao;

    4 - So tambm pouco valorizados os trabalhos que exigem pouco tempo de aprendizagem e pouca educao formal.

    Por outro lado, pesquisas demonstram que so valorizados positivamente os trabalhos de ciclos longos, que criam inovaes e exigem longo tempo de aprendizagem, educao formal especializada, alm de habilidades mentais ou fsicas elevadas.

    A sociedade moderna valoriza a educao formal, as novidades, a inteligncia, conferindo-lhe grande status e poder.

    Os trabalhos mais valorizados so aqueles mais bem remunerados, com altos salrios e benefcios, ou que se associam a poder elevado, pela possibilidade de controlar recursos. Eles possibilitam o consumo de bens materiais, servios ou bens no materiais, como lazer, conhecimento, acesso a oportunidades e pessoas.

    Desse modo, as pessoas atribuem um alto status ao trabalho de um jogador de futebol, principalmente pela alta remunerao (salrio mensal de 50 mil dlares) e ao poder associado ao dinheiro.

    Em sntese: Os valores sociais sobre o trabalho na sociedade industrial esto, portanto, ligados aos aspectos da ocupao e no ao trabalho, em si mesmo: qualificao, poder, renda e status. Obter prestgio ou status social, salrios elevados possibilitando o lazer, a moradia, a sade, a educao, o poder de consumo so importantes para definir

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    o valor do trabalho e seu significado, atualmente. Para a maioria, o trabalho um mal necessrio, sendo assim, pelo menos que ele oferea algumas vantagens materiais.

    As consequncias dos valores e atitudes sociais nem sempre so positivas.

    A principal o preconceito. O pr-conceito um julgamento de valor, prematuro, feito sem cuidado. Ele produz e reproduz o baixo valor conferido a diferentes tipos de trabalho, pessoas e atributos pessoais. Leva ao menosprezo, ao autoritarismo e excluso. Um exemplo o preconceito racial, que, no Brasil, sutil e disfarado, mas que mesmo assim subordina a outra pessoa.

    As discriminaes de quaisquer formas (cor, raa, religio, aparncia, deficincia fsica ou mental, sexo, idade) so atos criminosos no Brasil, mas ainda acontecem.A discriminao baseada no preconceito.

    O mal-estar no trabalho ou assdio moral tambm baseado no preconceito (ou crueldade) e acontece quando uma pessoa perseguida, tratada injustamente no trabalho ou submetida ao ridculo e ao constrangimento social. Por exemplo, o trabalhador recebe os piores trabalhos ou deixado sem atividades e encostado, ou seu corpo ou roupas so revistados. Tanto o assdio moral ou sexual so crimes. Neste ltimo, o superior submete outra pessoa a obedecer-lhe, sob a ameaa de perda do emprego ou rebaixamento, para obter favores sexuais.

    Alm de manter as situaes de desigualdades, os preconceitos podem impedir o conhecimento da realidade.

    7. O SABER-FAZER ou SABER-OPERRIO

    Ao desprezar o saber-operrio, a sociedade perde em suas tradies e cultura, aprofunda a distncia que existe entre vrios tipos de saber: o engenheiro que no ouve o trabalhador, o gerente que impe uma ordem, o patro que no considera os limites fsicos do empregado.

    O saber-operrio nasce da inteligncia prtica, desenvolvida no trabalho, pela experincia e cooperao entre os colegas. uma inteligncia diferenciada da intelectual, ela est inserida principalmente no corpo, parecida com o modo como aprendemos a dirigir. O trabalhador experiente orgulha-se do trabalho bem feito e deseja ser valorizado. Torna-se dono de um grande cabedal de conhecimentos que deve ser valorizado dentro e fora do trabalho.

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    A disciplina muito rgida sobre os trabalhadores gera dificuldades de realizar o trabalho. Quando tudo prescrito em forma de uma tarefa (o que fazer, como, quando) obriga a um modo operatrio que nem sempre adequado realidade. Desse modo, para conseguir terminar a tarefa, o trabalhador obrigado a enganar e a falsear, aumentando as exigncias da prpria atividade, a carga de trabalho. Para ficar mais claro vou dar um exemplo: o motorista de nibus obrigado a fazer um trajeto em um determinado tempo, passando por diversos pontos, parando para esperar os passageiros. Se houver um problema qualquer, como trnsito difcil, ele poder deixar de parar em determinados pontos obrigatrios para cumprir o tempo corretamente. Mas, sabendo que sua conduta no correta, ficar apreensivo e preocupado, aumentando sua carga de trabalho.

    preciso entender que a execuo de um trabalho como uma receita de bolo: a qualidade dos ingredientes, a temperatura correta do forno, o modo de colocar e misturar os materiais vo influenciar no resultado. Nenhum bolo igual ao outro, porque nenhum item sempre idntico. H variaes que exigem do cozinheiro adaptar-se e modificar seu modo operatrio para que o bolo seja perfeito. Se esta adaptao for impedida, com certeza, o bolo estar perdido.

    Vrios estudos mostram que os operrios tm poder sobre suas atividades, reduzindo a disciplina excessiva, de vrias maneiras. Assim, trabalhadores de uma obra podem parar o trabalho, alegando razes de falta de material, tempo ruim, os padeiros podem alegar problemas na matria-prima , problemas com equipamentos, tempo de espera, etc. Eles conseguem perceber ordens autoritrias e absurdas e encontrar mecanismos de fuga, resistindo de forma inteligente s presses recebidas. Os trabalhadores de maior status dentro dos grupos so aqueles que conseguem criar maior resistncia s ordens absurdas para si e para o grupo.

    Se tentam seguir a disciplina imposta, eles podem criar muitas presses sobre si mesmos, como veremos, a seguir.

    8 - A PSICOPATOLOGIA DO TRABALHO

    Por que a Psicopatologia (psico = psquico, pathos = sofrimento, logos = estudo) interessa Sociologia do Trabalho? Devido ao fato de tratar-se de estudos de um conjunto ou categorias de trabalhadores (o coletivo de trabalho).

    A Psicopatologia do Trabalho, como a conhecemos hoje, iniciou-se com as pesquisas de um psiquiatra e psicanalista francs, Christphe

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    Dejours. A publicao de suas pesquisas em um livro chamado A loucura do trabalho, em 1987, causou forte impacto nas linhas de investigao sobre doenas relacionadas ao trabalho. Vrios estudos anteriores sobre a sade mental das telefonistas, fadiga mental e esgotamento, stress e alcoolismo j relacionavam distrbios mentais ao trabalho.

    As investigaes de Dejours, nos anos 70, sobre os operrios da indstria e da construo civil mostraram, contudo, que no se podia atribuir doenas mentais especficas a estes tipos de trabalho. Ele verificou, no entanto, que os trabalhadores apresentavam sofrimento mental e certos mecanismos em seu comportamento, na tentativa de esconder este sofrimento para se adaptarem e conseguir permanecer no trabalho.

    Indo contra os modelos de stress e de doenas mentais associadas ao trabalho, ele ouviu os trabalhadores e considerou suas experincias e vivncias como operrios. Da, descobriu que o psiquismo humano sofre, assim como o corpo, diante das exigncias que se impem ao trabalhador: as presses para executar as atividades, para aumentar a produtividade, as longas jornadas, o medo do desemprego, o medo dos riscos da atividade, de causar danos aos materiais e colegas, de no conseguir dar conta do trabalho.

    Mas, este sofrimento oculto e envergonhado de se mostrar. Este ocultamento se faz de diversos modos, ora por brincadeiras, ora pela competio, ora por condutas perigosas e arriscadas. Por exemplo, os operrios da construo civil so geralmente valentes, maches, desprezam os colegas medrosos, preferem no se cuidar ou proteger no trabalho. Esses comportamentos e atitudes revelam o que est oculto. Eles se defendem do medo constantemente presente nas atividades da construo civil: o risco de quedas mortais, de choques, de causar a morte de um colega. Sem estas defesas diante do perigo real, os trabalhadores no conseguem realizar suas atividades.

    Este esforo para se adaptar gera o sofrimento, podendo gerar doenas psicossomticas, neuroses profissionais (porm no doenas mentais).

    Impedidos de usar sua inteligncia e capacidade intelectual, afetividade e vontade, pela rigidez com que o trabalhador considerado na organizao do trabalho, o esforo para bloquear a energia psquica para se adaptar e produzir, faz surgir o sofrimento.

    Alm disso, as investigaes revelaram um fato surpreendente: que os trabalhadores mais esforados so aqueles portadores de maior sofrimento. As empresas exploram o sofrimento: o sofrimento que

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    produz o trabalho. Este fato pode ser observado entre os trabalhadores de bancos ou vendas, onde a competio entre eles incentivada com o objetivo de faz-los produzir mais.

    Os estudos psicopatolgicos, conduzidos atravs da fala dos trabalhadores (como a psicanlise), mostraram que as categorias profissionais formam defesas coletivas contra o sofrimento.

    Como resultados dessas investigaes, a Psicopatologia do Trabalho passou a ser definida como o estudo dos mecanismos e processos psquicos relacionados ao sofrimento no trabalho.

    Seus fundamentos tericos so a viso do ser humano de Freud: um ser racional e irracional, que considera tanto a vida exterior, como o mundo interior. A vida psquica exerce grande influncia em nosso comportamento, sendo feita de imaginao, do inconsciente, de defesas psicolgicas, de desejos e pulses. Ela , sobretudo, determinada pela energia psquica com uma psicodinmica prpria.

    Suas contribuies mostram que a sade e a doena no so inteiramente separadas, havendo entre elas uma zona de sofrimento mental.

    Alm disso, as pesquisas sugerem que a sade no trabalho passa pelo respeito identidade pessoal, tica no respeito aos limites humanos, construo de uma organizao do trabalho onde seja possvel negociar, comunicar, superar o que a organizao exige e prescreve e o que humanamente possvel realizar.Os trabalhadores desejam contribuir com sua inteligncia, fortalecendo sua identidade pessoal, eles no querem apenas o salrio ou uma retribuio financeira.

    Atuando com conceitos da ergonomia,como carga de trabalho, modo operatrio, constrangimentos, estes pesquisadores vm descobrindo que os processos de mudanas atuais nas empresas e as novas tecnologias da informao, aumentaram mais a presena de sofrimento mental. Aumentaram as cargas psicossensoriais e cognitivas, alm de fsicas, gerando constrangimentos aos modos de pensar e realizar as tarefas. (A carga de trabalho a exigncia de qualquer atividade sobre o corpo ou mente da pessoa que a realiza. O modo operatrio a maneira que uma atividade executada por algum. Constrangimentos, do francs constraints so barreiras colocadas sobre o modo operatrio, dificultando-o.)

    Intensificou-se o trabalho, com maior ritmo de produo e aumentou o nmero de atividades por trabalhador, com a reduo do nmero de empregados ou mudanas nos processos de produo. Sobretudo entre as mulheres estas presses exercem maior impacto. Alm de trabalhos de menor qualificao, tm tambm que lidar com muitas

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    atividades no lar, como cuidar da casa, das crianas, das roupas, das refeies. Alastra-se o sofrimento, com as consequentes doenas ligadas aos distrbios dos ossos, associados a neurolgicos e msculo-esquelticos, como j mencionamos antes.

    Exerccios

    (ESAF 1998 AFT) A partir do contedo do texto abaixo, considerar a incoerncia de uma das opes que dele se deduz:

    O trabalho dos assalariados no remunerado medida de seu resultado. Os detentores dos meios de produo apropriam-se da mais-valia, ento, concluiu Marx, existe explorao. Esta apropriao est no corao dos conflitos de classe. O princpio desta condio que o trabalhador seja livre para vender seu trabalho a quem quiser. O que regula esta venda o contrato de trabalho.

    a) O valor de troca do trabalhador sempre inferior ao seu valor de uso. Isso oferece as bases para a existncia da explorao capitalista.

    b) Entre o trabalho livre e a explorao, nos termos de Marx, est sempre presente a dificuldade do trabalhador em barganhar seu valor real na assinatura do contrato de trabalho.

    c) Pelo fato de o trabalhador livre ser destitudo de todo meio de produo, ele se submete condio de explorao quando vende a sua fora de trabalho no mercado.

    d) O trabalho livre oferece ao trabalhador elementos de barganha na assinatura do contrato de trabalho fazendo desaparecer a explorao no processo de trabalho.

    e) Marx desmascara a armadilha da economia vulgar, aquela que consiste em acreditar nas aparncias do jogo da oferta e da demanda para analisar os fenmenos de troca no mercado.

    Comentrios : A resposta correta a letra D, porque a explorao do trabalho est relacionada mais-valia (o que no pago ao trabalhador, o valor que excede o seu trabalho), a principal fonte de lucro do capitalista. A barganha no contrato de trabalho no elimina a explorao no trabalho assalariado.

    (ESAF 1998 AFT) Assinale a nica opo que no corresponde ao contedo do texto abaixo:

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    A experincia clnica nos ensina que, fundamentalmente, o sujeito, em sua relao com o trabalho, espera que a organizao do trabalho lhe oferea uma possibilidade de contribuio, e no, como se diz com tanta frequncia, que ela lhe oferece unicamente uma retribuio. Por trs dessa expectativa de poder fornecer uma contribuio no campo de trabalho, h sem dvida uma busca de identidade (C. Dejours, 1993).

    a) A expectativa de contribuio no trabalho exige certos fatores como o de confiana na relao de trabalho.

    b) A condio da contribuio exige que se diminua a coero e a fiscalizao sobre os trabalhadores.

    c) Uma excelente retribuio monetria condio necessria e suficiente para se situar no interior do mundo do trabalho.

    d) O exerccio da criatividade tem a ver com a esfera do sofrimento e permite a construo de identidade no trabalho, aliviando tambm o sofrimento.

    e) A contribuio no trabalho exige que seja convocada a inteligncia prtica e a mobilizao do corpo.

    Comentrios: A resposta correta C. O salrio como retribuio condio de um contrato de trabalho, porm ele no capaz de conter as dimenses do agir humano, como afetividade, inteligncia, capacidade de julgamento, prprias de uma mercadoria que no deve ser considerada como tal.

    (ESAF 2003 - AFT) A reflexo abaixo permite vrias afirmaes sobre a Psicopatologia do Trabalho. Uma das apresentadas falsa; assinale-a:

    A Psicopatologia do Trabalho (Dejours) centra sua anlise nas experincias e vivncias dos trabalhadores(as) no cotidiano de trabalho. Sob essa tica, esto em evidncia as formas de expresses do sofrimento advindo do trabalho. Trata-se de tematizar o sofrimento no trabalho e as defesas coletivas contra a doena, evidenciando os vnculos entre presses do trabalho e defesas e no entre as presses do trabalho e as doenas.

    a) Na perspectiva da psicopatologia do trabalho ressaltam-se as estratgias defensivas coletivas construdas para suportar e lutar contra a sofrimento advindo do trabalho.

    b) O reconhecimento no trabalho possui importante funo nas possibilidades de sade mental dos trabalhadores. Existe o

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    reconhecimento pela hierarquia e o reconhecimento pelos pares ou pelos colegas de trabalho.

    c) A noo de sade mental no trabalho sugere as possibilidades que os trabalhadores forjam de alterar as condies de trabalho causadoras de sofrimento.

    d) O sofrimento no trabalho diminui medida que os conhecimentos prticos ou tcitos dos trabalhadores so transformados em prescries.

    e) O reconhecimento que advm da famlia e da sociedade com relao atividade realizada desempenha importante papel na sade mental do trabalhador.

    Comentrios: A resposta correta D.

    Quando no se respeita o saber-operrio e seu conhecimento transformado em ordens prescritas, criam-se dificuldades e constrangimentos no modo operatrio (modo de realizao da atividade) e aumentam-se as cargas psicossensoriais (exigncias que o trabalho faz ao trabalhador). Da, decorre um maior sofrimento mental no esforo de adaptao, no uma reduo.

    Por hoje s. Espero que minha aula tenha sido agradvel e no tenha resultado em sofrimento mental, mas em doce reflexo e aprendizagem. Adeus.