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AVALIAÇÃO DO PROGRAMA CULTURA VIVA: EXPLORANDO MÉTODOS CONTRA HEGEMÔNICOS E CONSTRUÇÃO DE INDICADORES
AGUIAR, Mariana de Araujo1
Eixo Temático: Gestão pública e desenvolvimento social: construindo
Indicadores
RESUMO
O presente artigo visa analisar algumas metodologias contra hegemônicas de avaliação de
políticas públicas, tendo por base a avaliação pós-construtivista experiencial presente na obra
de Raul Lejano (2012) e avaliação responsiva presente na obra de Egon Guba e Yvona
Lincoln (2011). A partir dessa análise, busca-se entender como essas metodologias podem ser
empregadas para a avaliação de uma política pública de cultura brasileira e, quais indicadores
podem ser formulados para tal avaliação. Para o desenvolvimento desse trabalho foi realizada
pesquisa exploratória, recorrendo às seguintes técnicas: levantamento bibliográfico,
documental e pesquisa de campo no Ponto de Cultura Sobrado Cultural Rural, localizado na
cidade de Bom Jardim (RJ). Os resultados encontrados, ainda parciais, nos indicam a
construção de indicadores qualitativos baseados na experiência local.
Palavras-Chave: avaliação, indicadores, Cultura Viva.
1 INTRODUÇÃO
O campo da avaliação de políticas públicas surgiu no início do século XX nos países
anglo-saxões. Grande parte das avaliações realizadas até meados do século XX eram baseadas
em uma tendência gerencialista, ou seja, a visão dos administradores é tomada norteadora e
tinham como paradigma o positivismo. Para os cientistas positivistas, o método indutivo
possibilitava alcançar a possível verdade de uma teoria a partir da observação.
As críticas ao paradigma positivista começaram a surgir no fim do século XX,
apontando que o paradigma positivista não é suficiente para explicar as questões não
1Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Políticas Públicas, estratégias e desenvolvimento (PPED),
UFRJ. Email: [email protected]
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mensuráveis e questões de nível local. O presente trabalho visa dialogar com dois paradigmas:
construtivista e pós-construtivista. A partir desse diálogo pretende analisar a Política Cultura
Viva com foco em desenvolver indicadores para avaliar o impacto da política sobre o
desenvolvimento de comunidades rurais.
2 METODOLOGIAS CONTRA HEGEMÔNICAS DE AVALIAÇÃO
As metodologias contra hegemônicas de avaliação partem da crítica ao paradigma
positivista e propõem que a avaliação deve centrar-se nos sujeitos e deve incorporar os
contextos físicos, psicológicos, sociais e culturais. Nessa perspectiva, paradigmas
hermenêuticos surgem como forma de propor avaliações com enfoque participativo e
compreensivo.
Guba e Lincoln defendem a abordagem alternativa da quarta geração. Segundo os
autores, o que distingue a quarta geração das demais é que os parâmetros e limites da
avaliação não são definidos a priori, mas são definidos “por meio de um processo interativo e
negociado que envolve grupos de interesse” (GUBA; LINCOLN, 2011, p. 47). Nesse sentido,
os autores chamam essa abordagem de avaliação responsiva, ou seja, aquela que identifica as
diferentes visões entre os interessados. Os autores destacam que o enfoque responsivo se
insere dentro do paradigma construtivista, uma vez que esse paradigma nega a existência de
uma realidade objetiva e, afirma que as realidades são construídas socialmente. Para o
paradigma construtivista, a política deve ser lida e interpretada (LEJANO, 2012, p.114) a fim
de averiguar as disputas pela construção de significados. Nesse sentido, o paradigma
construtivista é baseado na análise e nas diferentes construções textuais da política.
A abordagem defendida por Lejano (2012) vai além da análise da identificação e
interpretação das diferentes visões dos agentes. Lejano (2012, p. 96) propõe que a avaliação e
análise da política devem não apenas se basear na concepção da política, mas também na sua
prática. Lejano (2012, p. 206) apresenta um modelo de análise de política baseado na
experiência. A análise experiencial pode se utilizar tanto de informações estatísticas quanto
qualitativas, mas sempre buscando entender e descrever a experiência. Segundo o autor, o
modelo experiencial fornece um importante canal para a formulação de políticas, uma vez que
se insere no contexto e responde às condições reais. Por isso, o processo analítico difere de
lugar para lugar (LEJANO, 2012, p. 226).
As obras de Lincoln e Guba (2011) e de Lejano (2012) possuem como fundamento
diferentes concepções paradigmáticas. Porém, ambos têm em comum algumas características
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como: a participação dos diferentes interessados, a importância dos contextos locais entre
outros aspectos. O que os diferenciam é o papel atribuído à experiência. Assim, enquanto
Guba e Lincoln (2011) apontam como papel importante as construções sociais e mentais de
cada grupo, Lejano (2012) ressalta o que cada grupo vivenciou. Mas, tanto para as
construções sociais quanto para a experiência, o contexto é essencialmente importante e, por
isso, a avaliação deve ser feita em nível local.
3 POLÍTICA CULTURA VIVA: APLICAÇÃO DAS METODOLOGIAS CONTRA
HEGEMÔNICAS
Segundo o paradigma pós-construtivista, presente na obra de Lejano (2012), o
avaliador de políticas públicas deve integrar as interpretações e concepções (texto) e as
experiências de uma política pública. Nesse sentido, o paradigma pós-construtivista perpassa
o modelo descrito pelo paradigma construtivista. A descrição da Política Cultura Viva,
realizada a seguir, ressaltou alguns pontos cruciais do paradigma construtivista, como: a
análise do contexto da formulação da política, consensos, embates e conflitos e a trajetória
institucional da política.
Em relação ao contexto político, o cenário, tanto nacional quanto internacional, era
favorável a um recuo da convenção neoliberal e à formulação de políticas de cunho
neodesenvolvimentista, ou seja, política de desenvolvimento baseada em uma frente política
que abarca tanto a grande burguesia quanto as classes populares (BOITO JR.; BERINGER,
2013). Do ponto de vista socioeconômico, essas políticas visavam aumento da renda familiar
e consumo interno através do aumento do salário mínimo e transferências fiscais, e de
investimentos em infraestrutura e construção residencial, regidos pelo Estado (ERBER, 2011).
Nesse sentido, a atuação do governo do Partido dos Trabalhadores visava à redução da
exclusão social através da redução da pobreza e uma abertura para a participação social,
apesar de bem restrita.
Ao assumir a presidência da república em 2003, Lula nomeou como ministro da
cultura Gilberto Gil. O desafio enfrentado por essa gestão era retomar o papel do MinC
enquanto formulador, executor e articular de políticas culturais em contrapartida ao reduzido
papel que o Estado teve na gestão anterior. A noção de cultura pretendida pelo governo Lula
era ampla, abarcando tanto o conceito antropológico (modos de ser e agir) quanto o conceito
sociológico (setores artísticos). Nesse contexto surgiu o Programa Cultura Viva.
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Programa Nacional de Cultura, Educação e Cidadania - Cultura Viva – foi criado pelo
Ministério da Cultura, em 2004, através da portaria nº 156. Segundo a portaria, o objetivo do
programa era “promover o acesso aos meios de fruição, produção e difusão cultural, assim
como de potencializar energias sociais e culturais, visando a construção de novos valores de
cooperação e solidariedade” (Portaria156/04, art.1), por meio de transferência de recursos
“advindos da Lei Orçamentária e de parcerias agregadas ao Programa” (Portaria156/04, art.5).
Em 2007, a Presidência da República institui o Programa Mais Cultura, através do
decreto n. 6.226, de 4 de outubro de 2007. Nesse sentido, o Programa Mais Cultura funciona
como um “grande guarda-chuva” ao integrar diferentes programas em um único objetivo:
reconhecer a cultura como uma estratégia para reduzir a pobreza e a desigualdade social. O
Programa Cultura Viva, nosso objeto de pesquisa, se inseriu nesse programa geral, na linha de
ação Cultura e Cidadania. A inserção do Cultura Viva dentro do Mais Cultura possibilitou
uma mudança sistemática para descentralizar a implantação dos Pontos de Cultura, reforçando
objetivos e metas do Programa Mais Cultura. Assim, em 2008, os editais para pontos de
cultura passaram a ser realizados pelos estados.
Tanto a gestão de Gil (2004-2006) quanto de Juca Ferreira (2007-2010) sinalizaram
uma possível reorganização do papel do estado na Cultura. Porém, no primeiro governo
Dilma (2011-2014), na gestão de Ana de Hollanda (2011-2012) ocorreu uma descontinuidade
de políticas. O que inspirou uma grande mobilização social, principalmente na internet. Estas
tinham como pauta de reivindicação: a participação da sociedade civil nas alterações das
políticas, a continuidade do Programa Cultura Viva, dentre outros (PRUDENCIO; LEITE,
2013, p. 453).
Cabe apontar que as descontinuidades foram reflexos também do baixo orçamento da
pasta na gestão Dilma. Em relação ao governo Lula, a gestão Dilma teve que lidar com o
baixíssimo orçamento do Ministério da Cultura, representou 0,13% do orçamento total da
União, contra uma média de 0,8% no governo Lula (MIRANDA, 2014). Embora alguns
problemas, o primeiro governo Dilma foi marcado, também, pela aprovação da Lei Cultura
Viva, em 2014, na gestão de Marta Suplicy (set. 2012-2014).
A Lei 13.018/2014, a qual torna o Cultura Viva uma política de estado, explicita
alguns valores e conceitos que não haviam sido expressos diretamente na antiga portaria
ministerial. No primeiro artigo define como o objetivo central do Programa “ampliar o acesso
da população brasileira às condições de exercício dos direitos culturais” (Lei Nº 13.018/14,
art. 1). Nesse sentido, torna-se explícita a noção de direito cultural como norteador do
Programa. Outros objetivos como – gestão pública compartilhada (art.3, inciso III),
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participação social (art.3, inciso IV), diversidade cultural como expressão simbólica e
atividade econômica (art.3, inciso V) – também foram abordados pela lei.
No que diz respeito à trajetória institucional, observamos que política cultura viva
surge no contexto da Secretaria de Projetos Culturais (SPPC), quando esta era dirigida por
Célio Turino O programa Cultura Viva, nesse sentido, foi gestado pelo secretário Célio Turino
e tinha por viés a seleção de projetos culturais já existentes por meio de edital. Segundo o
desenho institucional, o programa cultura viva iria adotar uma gestão compartilhada. Porém,
cabe destacar que toda a iniciativa de envolver outros atores na gestão surgiu do poder
executivo (DEL CLARO, 2003). A Teia só surgiu em 2006 com a intenção de ser uma
proposta de diálogo entre o setor público e os diferentes pontos. A partir da I Teia o projeto já
ganhava um novo contorno a partir da mobilização dos próprios pontos. Os pontos se
articularam para criar o I Fórum de Pontos de Cultura.
Outro órgão gestor que surgiu a partir do diálogo entre os pontos foi a Comissão
Nacional dos Pontos de Cultura que foi formulado na Teia de 2007 e, apesar de diferentes
visões dos próprios representantes dos pontos de cultura, a Comissão tinha por objetivo ser
uma instância deliberativa do Fórum Nacional dos Pontos de Cultura, articulando os
interesses através das redes e fóruns estaduais e regionais, das redes temáticas, consolidada
pelos GTs. A articulação das lideranças dos pontos de cultura tanto nos Pontões, nas Teias
quanto nos fóruns nacionais foram importantes para a definição de regras do programa.
Apesar de haver um aparato decisório pela sociedade civil, as organizações do Fórum e da
Comissão (CNPdC) possuíam grande dependência da iniciativa e dos recursos do MinC.
No que diz respeito à implementação, observamos que os projetos são executados
pelas organizações não governamentais, na figura dos pontos de cultura. Nesse sentido, o
programa ganha várias conotações diferentes. Um dos pontos destacados pelas avaliações
promovidas pelo IPEA, realizadas entre 2007 e 2008 e 2010 e 2011, é a grande burocratização
que o programa possui, uma vez que a prestação de contas ocorria de acordo com a lei de
licitação2. Além desses fatores, muitos gestores se depararam com dificuldades de
comunicação com o MinC e dos atrasos em repasses financeiros.
Outro embate, apontado pela gestora do ponto de cultura Sobrado Cultural Rural,
localizado na região rural de Bom Jardim (RJ), foi a definição do que é ponto de cultura. Para
o MinC ponto de cultura estava relacionado a “toda e qualquer ação cultural desenvolvido por
membros de uma determinada coletividade” (BEZERRA, BARROS, 2014, p. 129). Segundo
2 Lei 8.666, de 21 de junho de 1993.
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a gestora do ponto pesquisado, a definição do que é ponto de cultura ainda está em discussão
entre os pontos. Para essa gestora, reverbera mais a noção de ponto de cultura com base
comunitária e, não apenas, ações culturais por si só3.
Apesar desses embates frequentes, vários consensos se firmaram entre o texto da
política e sua interpretação pelos agentes implementadores da política. A entrevista realizada
com a gestora do ponto de cultura Sobrado Cultural Rural corrobora com o discurso
institucional de que o Cultura Viva legitima ações culturais escondidas para o setor público,
fortalece identidades e promove inclusão4.
Outro consenso presente entre a fala da gestora do ponto e do discurso institucional é a
noção de chancela de Ponto de Cultura. Desde a portaria n. 156/2004, o programa era
destinado para comunidades que “desenvolvem ações no combate à exclusão social e
cultural”, portanto, ser reconhecido como ponto de cultura é uma forma de potencializar as
atividades que já estavam em andamento. Isso se torna claro através da fala da gestora do
Ponto de Cultura Sobrado Cultural Rural quando ela aponta que ter o reconhecimento do
governo federal enquanto um ponto de cultura é tão vantajoso quanto receber a verba federal,
uma vez que, ao ganhar o status de ponto de cultura, a entidade cultural consegue estabelecer
outros parceiros e pertencer a uma rede de entidades culturais com objetivos semelhantes5.
4 EXPERIÊNCIA LOCAL NO PONTO DE CULTURA SOBRADO CULTURAL
RURAL
O ponto de cultura Sobrado Cultural se tornou ponto de cultura no edital de 2007,
porém o coletivo cultural, chamado Instituto de Imagem e Cidadania, já existia há 10 anos na
cidade do Rio de Janeiro. Em 2010, por iniciativa dos coordenadores, o ponto de cultura muda
para a área rural. Eles associam a identidade já construída do coletivo cultural à questão rural.
Assim, os objetivos do projeto continuam sendo “desenvolver atividades que garantam a
participação juvenil na produção de diferentes linguagens culturais e contribuir para o
fortalecimento da identidade local através da valorização da memória da região e da produção
cultural”6, porém, soma-se a isso à valorização da memória e patrimônio rural. Portanto, o
3 Entrevista concedida em 25 de junho de 2016 4 Entrevista concedida em 25 de junho de 2016. 5 Entrevista concedida em 25 de junho de 2016 6 Disponível em: http://www.uff.br/observatoriojovem/materia/instituto-de-imagem-e-cidadania-rio-de-janeiro-
%E2%80%93-sobrado-cultural Acesso em: 09 de julho de 2016.
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ponto de cultura atua em duas grandes linhas de ação: educação patrimonial, através da
valorização dos patrimônios materiais, imateriais e naturais que estão presentes nas
comunidades rurais por meio de oficinas de produção de livros dos conhecimentos locais
(livro de inhame, livros de flores), produção de documentário, o Ecomuseu e etc.; a outra
grande linha de atuação é a promoção e produção das artes, através do incentivo à leitura,
oficinas de artes, apresentações artísticas e etc.
Por estar localizado no vilarejo rural de Santo Antônio, comunidade agrícola
pertencente ao Distrito de Barra Alegre, da cidade de Bom Jardim, e próximo a fronteiras com
outras cidades, o ponto de cultura abarca comunidades rurais de Nova Friburgo, Bom Jardim
e Trajano de Moraes. O Espaço possui várias estruturas como: Biblioteca Brinquedoteca
Conceição Knupp Amaral; Galpão de Artes Malfort, Biblioteca de Artes Visuais, Laboratório
de Fotografia e o Ecomuseu, este último reúne acervo fotográfico e audiovisual dos saberes e
fazeres das comunidades rurais.
O trabalho de campo desenvolvido neste Ponto de Cultura possibilitou uma análise
mais detalhada das atividades do ponto de cultura. Além das ações continuadas promovidas
durante a semana no ponto de cultura, como atividades e oficinas oferecidas junto às escolas
rurais, o ponto de cultura está participando de um projeto junto à Universidade Federal Rural
do Rio de Janeiro designado Projeto Formação Cultural de Jovens da Região Serrana em
Comunicação Comunitária. Tal projeto tem o apoio da Secretaria Nacional de Juventude, do
Ministério do Desenvolvimento Agrário/INCRA e do Conselho Nacional de Pesquisa e
Desenvolvimento Tecnológico através da chamada MCTI/MDA-INCRA/CNPq n° 19/2014 -
fortalecimento da juventude rural.
O projeto reúne jovens dos municípios de Bom Jardim, Trajano de Moraes e Nova
Friburgo, envolvendo quatro vilarejos rurais: Barra Alegre, Serra das Almas, Lumiar e São
Pedro da Serra. As atividades ocorrem semanalmente nos territórios, com a presença dos
monitores e, uma vez por mês há o encontro entre todos os territórios no ponto de cultura. O
encontro mensal tem por caráter realizar oficinas, debates e apresentação das produções feitas
por cada território.
No dia 25 de junho de 2016, a temática desenvolvida pelos oficineiros foi gênero:
diversidade, identidade. As atividades foram elaboradas pelos oficineiros com a participação
dos jovens que tiveram total liberdade para expor opiniões, interesses e se expressar
artisticamente, através de cenas teatrais desenvolvidas por cada território. Os jovens se
responsabilizavam pelo registro fotográfico do evento. Nesse sentido, o ponto de cultura
exerce um papel importante como impulsionador para o desenvolvimento da cidadania, para o
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diálogo intercultural, o fortalecimento da autonomia social e para a incorporação dos jovens
no trabalho cultural.
5 A CONSTRUÇÃO DE INDICADORES QUALITATIVOS A PARTIR DA
EXPERIÊNCIA LOCAL
A avaliação dos pontos fortes e fracos e dos impactos da Política Nacional Cultura
Viva na vida econômica e social devem levar em consideração o aspecto local e os contextos
em que os grupos culturais se inserem. A partir da experiência local, o analista pode
identificar as dimensões de uma política pública, os problemas de implementação e seus
impactos. A reflexão conjunta ou, até mesmo individual dos diferentes interessados, pode
levar à mudança nas ações.
Para a avaliação dos impactos da política Cultura Viva no desenvolvimento local a
formulação de indicadores é primordial, pois estes são parâmetros que “buscam expressar
sinteticamente um aspecto da realidade” (ASSIS et al, 2005, p. 106). Os indicadores permitem
verificar os rumos das mudanças que a política pretende produzir. Os indicadores qualitativos
são captados por meio de suas formas de manifestação (Ibidem). Assim, aspectos
relacionados à autoestima, consciência social, protagonismo, cidadania e direito cultural são
essenciais para analisar o impacto no desenvolvimento social local.
Por muito tempo, os indicadores qualitativos foram construídos a partir de estratégias
quantitativas, ou seja, criação de escalas que medissem um maior grau de satisfação ou
consciência social, por exemplo. Desde os anos 1960, estratégias de cunho hermenêutico têm
balizado as construções de indicadores qualitativos. Segundo aponta Assis et al (2005) os
exemplos de formulação desses indicadores ainda são poucos, mas sua aplicabilidade tem um
importante papel para a compreensão da participação e do envolvimento político das pessoas.
A partir do paradigma pós-construtivista, podemos formular indicadores, ainda que
parciais, para avaliar os impactos do Ponto de Cultura, instituição símbolo da política Cultura
Viva, para o desenvolvimento social das comunidades rurais do entorno do Ponto de Cultura
Sobrado Cultural Rural. Nesse sentido, algumas propostas de indicadores foram formuladas
com base na observação local, na análise documental do Programa Cultura Viva, no contexto
e na trajetória institucional do programa. Assim, os temas que se pretende avaliar são:
cooperação e solidariedade; direito à diversidade cultural; protagonismo.
Para o tema cooperação e solidariedade, os indicadores que nos permite adentrar nesse
aspecto são: (1) grau de associativismo, (2) expressão de entusiasmo, (3) eu sou capaz de
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realizar processos em conjunto. Em relação ao direito à diversidade cultural, podemos apontar
como indicadores: (1) expressão da identidade local, (2) liberdade para expressar as
identidades de gênero, (3) ser aceito por minhas concepções. Já em relação ao protagonismo
social, alguns indicadores qualitativos podem nos nortear, como: (1) habilidade do gestor do
ponto de buscar parcerias, (2) grau de participação do ponto nos fóruns, Teias e Comissão
Nacional do Ponto de Cultura, (3) grau de participação nas discussões estaduais e nacionais,
(4) habilidade dos participantes do ponto de replicarem aquilo que vivenciaram, (4) expressar
confiança do potencial.
Alguns indicadores, como por exemplo o grau de associativismo, possuem como
estratégias de medição o uso de escalas, provenientes da lógica quantitativa. Estes indicadores
são válidos e úteis para análise, mas não levam em consideração os critérios dos participantes
ao jugar sobre o programa. Nesse sentido, esses indicadores devem ser balizados com
estratégias hermenêuticas como: observação participativa, grupos focais e grupos nominais
que permitem analisar sobre os outros indicadores qualitativos.
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Os paradigmas construtivistas e pós-construtivistas ressaltam métodos baseados no
contexto para a realização de avaliação. O presente trabalho foi um exercício de aplicação
desses métodos tanto para a descrição da Política Cultura Viva, a partir de seu contexto
político, das concepções de alguns autores envolvidos e de uma trajetória institucional,
quando para o desenvolvimento de indicadores, construídos com base na observação local e
na descrição do contexto e da trajetória institucional.
Cabe destacar que os indicadores formulados podem ser aprimorados ou rejeitados a
partir das técnicas como grupo focal ou grupo nominal, uma vez que, a validade desses
indicadores está atrelada ao sentido e à veracidade da análise atribuída pelos participantes.
Outra questão importante a ser apontada é a possibilidade de combinar indicadores
qualitativos e quantitativos, uma vez que cada um desses meios podem trazer informações
relevantes para a avaliação que se pretende fazer. Espera-se, portanto, que estes indicadores
possam ser relevantes para a compreensão dos processos associados à política Cultura Viva e
fornecer informações importantes para a análise de impacto.
7 REFERÊNCIAS
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