baci lulus
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Higiene Alimentar Vol. 23 n 170/171 87 maro/abril 2009
ARTIGOS
RESUMO
Bacillus cereus faz parte do grupo
de bactrias formadoras de esporos que
tem sido associada a surtos de intoxi-
cao alimentar. Muito j se tem estu-
dado com a finalidade de identificar
seus fatores de virulncia, entre eles as
toxinas emtica e diarrica. Neste arti-
go realizamos uma reviso que tem
como objetivo demonstrar a importn-
cia desta bactria, sua patogenicidade
e fatores de virulncia, como ferramenta
para preveno das Enfermidades
Transmitidas por Alimentos (ETAS).
Palavras-chave: Toxina emtica.
Toxina diarrica. Surtos. Virulncia.
Summary
Bacillus cereus is part of the spore-
forming bacteria group that has been
associated to foodborne intoxication
outbreaks. A lot of researches have been
done in order to identifying their viru-
lence factors, as the emetic and diar-
rhoeagenic toxins. In this article we
accomplished a revision that has as
objective to demonstrate the importan-
BACILLUS CEREUS E SUASTOXINAS EM ALIMENTOS.
Emmanuela Prado de Paiva
Ana Elizabeth Cavalcante Fai
Daniela Souza Soares
Tnia Lcia Montenegro Stamford
Departamento de Nutrio, Universidade Federal dePernambuco, Recife.
ce of this bacterium, due to its patho-
genesis and virulence factors, as a pre-
vention tool for the occurrence of out-
breaks of foodborne diseases.
Key words: Emetic toxin. Diarrho-
eagenic toxin. Outbreaks. Virulence.
INTRODUO
acillus cereus uma bac-
tria ubqua que pertence
famlia Bacillaceae, se
apresenta em forma de basto, Gram-
positiva, aerbica facultativa, mvel e
formadora de esporos esfricos em pre-
sena de oxignio. Esta bactria tem
uma temperatura mnima de crescimen-
to de aproximadamente 4 a 5C, com
mxima para germinao em torno de
48 a 50C, sendo tipicamente mesfila.
O crescimento foi observado na faixa
de pH entre 4,9 e 9,3 (HOLT et al,
2000).
Os esporos de B. cereus lhe confe-
rem resistncia a altas temperaturas,
secagem, e a alguns sanitizantes qu-
micos e radiaes ionizantes, como a
UV, alm de contribuir para os proces-
sos de adeso em superfcies (KOTI-
RANTA et al, 2000). A resistncia des-
tes est associada a sua estrutura mor-
folgica, possuindo uma regio central,
onde esto os elementos genticos, jun-
to com as enzimas necessrias a germi-
nao e crescimento inicial do esporo,
sendo esta estrutura protegida do am-
biente externo de dentro para fora por:
uma membrana interna, crtex, uma
cobertura interna e uma cobertura ex-
terna.
A resistncia fisiolgica aliada sua
habilidade de produzir uma vasta gama
de enzimas que degradam diversos
substratos orgnicos possibilita esta
bactria estar amplamente distribuda
no meio ambiente, sendo o solo seu re-
servatrio natural (BLACKBURN &
MCCLURE, 2000; FRANCO & LAN-
GRAF, 2002). Em virtude destas ca-
ractersticas, contamina facilmente di-
ferentes tipos de alimentos, inclusive os
cozidos, com o benefcio da inativao
da microflora competidora.
Contudo, encontrado comumente
em baixos nveis nos alimentos (105
UFC/g), ressaltando-se que, neste caso,
o microrganismo per se no respon-
svel pela patologia e sim as toxinas
que este produz (FORSYTHE, 2002 ).
A maioria das tcnicas de deteco
de B. cereus faz uso de meios formula-
dos contendo gema de ovo, os mais
comumente usados so os descritos por
Holbrook & Anderson (1980) conhe-
cido como PEMBA. Este meio contm
um baixo nvel de peptona para esti-
mular a esporulao, piruvato para re-
duzir o tamanho das colnias, polimi-
B
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xina como agente seletivo, gema de ovo
para demonstrar a produo de leciti-
nase, manitol como agente diferencial
e um pH indicativo (a produo de co-
lnias manitol negativa, com uma for-
te reao de gema de ovo, caracteriza-
da por um grande halo de precipitao,
caracterstica de B. cereus, ao contra-
rio de outros Bacillus ssp.). Neste meio
de cultura o crescimento das colnias
visvel com 24h, e os esporos forma-
dos podem ser observados em micros-
cpio de contraste de fases (BLACK-
BURN & MCCLURE, 2000).
H tambm o meio MYP (Agar
manitol gema de ovo polimixina) ou
MYA (Agar manitol gema de ovo),
autorizados pelos rgos regulatrios
internacionais. Caso se pretenda con-
tar apenas os esporos, as clulas vege-
tativas devem ser mortas por tratamen-
to trmico (diluio de 1:10, por 15 min,
a 70C) ou tratamentos alcolicos (di-
luio de 1:1 em lcool etlico 95%, 30
minutos temperatura ambiente)
(FORSYTHE, 2002).
Para a confirmao de B. cereus,
deve-se determinar a mobilidade (a
maioria dos B. cereus mvel), a pre-
sena de cristais de toxina (comum em
B. thuringiensis), atividade hemoltica
(a maioria dos B. cereus e outros so -
hemolticos com exceo do B. anthra-
cis) e o crescimento de rizides tpico
em B. mycoides. (FORSYTHE, 2002).
Em adio, temos que B. cereus cata-
lase positivo, oxidase varivel e produ-
tor de fosfolipases, alm de diversas
enzimas extracelulares degradadoras
dos alimentos como: protease, amila-
ses, lecitinases, sendo esta ltima utili-
zada na identificao do microrganis-
mo em ensaios bioqumicos. (KONE-
MAN et al, 2001).
A diferenciao de B. cereus e B.
thuringiencis de extrema importn-
cia quando se trata de contaminao
de alimentos, visto que estes so ge-
neticamente bastante similares, e os
cristais de toxina do B. thuringiensis
esto sendo utilizados como bioinse-
ticidas (DAMGAARD, 1995). Ro-
senquist et al (2005) em estudo de
48.901 amostras - que variaram de
frutas, vegetais, produtos tratados
com calor, pratos prontos, molhos,
pastas, arroz, carnes, peixes, maione-
se, sobremesas (sorvetes, bolos e pu-
dins), detectou que 0,5 % das amos-
tras estavam com mais de 104 UFC/g-
de Bacillus sp. O fato mais preocu-
pante que a maiorias das linhagens
identificadas nas amostras de alimen-
tos pertenciam na verdade B. thurin-
giensis, conforme verificado pela pre-
sena de cristais intracelulares, de-
monstrando assim, que o uso de bio-
inseticidas carreadores de B. thurin-
giensis possa ser na realidade um ve-
culo de contaminao alimentar.
A contaminao de alimentos por
B. cereus est associada ocorrncia
de dois tipos de sndrome devido in-
gesto de alimentos contaminados com
cepas patognicas produtoras de toxi-
nas emtica e diarrica. Na tabela 01
podem-se identificar as caractersticas
dos dois tipos de sndrome causada por
B. cereus.
Quando a toxina a emtica, em
geral, os alimentos implicados so pra-
tos base de arroz frio ou quente, cre-
mes pasteurizados, espaguetes, pur de
batata e brotos vegetais. Quando a to-
xina a diarretognica os alimentos
veculos consistem em pratos base de
cereais, contendo milho e amido de
milho, pur de batata, vegetais, carne
moda, linguia de fgado, bolinho de
carne moda, leite, carne assada, pratos
base de arroz ao estilo indonsio, pu-
dins, sopas e outros (JAY, 2005).
No que concerne deteco da to-
xina diarrica, produzidas por B. ce-
reus, esto disponveis kits comerciais
dos testes ELISA e RPLA que so ba-
seados em ensaios imunoenzimticos.
O ELISA ou Ensaio Imunossorbente
Ligado Enzima mais comumente
realizado usando anticorpos monoclo-
nais sobre placas para capturar o an-
tgeno alvo. O antgeno capturado
Tabela 01. Caractersticas dos dois tipos de sndrome causados por B. cereus.
Adaptado: BLACKBURN & MCCLURE, 2000.
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ento detectado usando um segundo
anticorpo que pode estar conjugado a
uma enzima, ressaltando-se que a adi-
o de substrato facilita a visualiza-
o do antgeno-alvo. Na Aglutina-
o em Ltex Reversa Passiva
(RPLA) as partculas de ltex so re-
cobertas com soro de coelho, o qual
reativo contra o antgeno-alvo, ocor-
rendo a ligao antgeno-anticorpo
(aglutinao) na presena do antge-
no. Sendo assim, o que se v como
resultado positivo a disperso das
partculas na soluo, enquanto o re-
sultado negativo se da pela precipita-
o das partculas para o fundo da pla-
ca em forma de V (FORSYTHE,
2002).
Por muitos anos, a toxina emtica
no pde ser detectada devido a pro-
blemas de purificao, porm, atual-
mente, com o desenvolvimento de
modernos mtodos esta identificao
j possvel. A cromatografia lqui-
da, aliada espectroscopia de massa,
est sendo utilizada como ferramenta
na identificao de quatro ons espe-
cficos presentes no cereulideo (H+,
NH+4, K+ e Na+). Tcnicas biomole-
culares como PCR (Reao em Ca-
deia de Polimerase) so empregadas
na deteco dos genes responsveis
pela produo da toxina, no caso da
toxina emtica o gene ces e da toxina
diarrica o modelo operon hbl (CAR-
LIN et al, 2006; GRANUM &
LUND, 1997). Infelizmente devido
aos custos que envolvem estas tcni-
cas, elas ainda no esto sendo em-
pregadas em laboratrios de rotina.
Pirhonenan et al (2005), investi-
garam um caso de intoxicao alimen-
tar na Finlndia, desenvolveram o que
parece ser um mtodo alternativo atra-
vs de anlises bioqumicas. Eles per-
ceberam que colnias com halo maio-
res que 4 mm em agar sangue, consi-
deradas como hemolticas, foram po-
sitivas para hidrolise de goma e le-
citina. Colnias que tiveram halos
menores que 1-2, classificadas como
de baixa ou nenhuma hemlise, fo-
ram negativas para hidrolise de go-
mas e positivas para a produo de
lecitinase. Posteriormente quando
comparados os resultados bioqumi-
cos com os tipos de toxinas produzi-
das verificou-se que colnias com
baixa ou nenhuma hemlise tinham
toxina de comportamento cereulideo
e que as colnias hemolticas tinham
toxinas de comportamento diarrico.
Desprende-se, do acima exposto, a ne-
cessidade de se dar ateno s col-
nias de baixa ou nenhuma hemlise
em combinao a outros testes bio-
qumicos, uma vez que estes indcios
podem ser pistas para uma identifica-
o vivel de linhagens que produzam
toxinas emticas.
B. cereus tem merecido destaque
na atualidade devido sua crescente
presena nos alimentos sejam estes in
natura, processados, como os desidra-
tados e esterilizados, semi-prontos ou
preparados e servidos em unidades de
alimentao.
Mendes et al (2004) estudaram B.
cereus em 24 bancadas de ao inox
em uma unidade de alimentao e nu-
trio de uma Universidade Publica
de Viosa MG. O microrganismo,
em questo, no foi detectado em 73%
das amostras, observando-se, que, os
27% de casos positivos ocorreram em
bancadas localizadas no setor de pr-
preparo de vegetais, local onde se ma-
nipulavam alimentos que na maioria
das vezes no recebiam tratamento
trmico de acabamento.
No entanto, mesmo com tratamen-
to trmico UAT (ultra-alta tempera-
tura), leites pesquisados por Vidal-
Martins et al (2005) tambm foram
alvos de contaminao por B. cereus,
sendo detectado em 11,8% das 13
amostras de diferentes marcas comer-
cializadas em So Jos do Rio Preto
SP. Atribuiu-se, assim, a presena
deste patgeno como possvel resul-
tado de condies higinico-sanitri-
as precrias na ordenha, beneficia-
mento ou transporte do leite, enfati-
zando-se que apesar do tratamento
UAT ser capaz de eliminar totalmen-
te a forma vegetativa do microorga-
nismo, formas esporuladas, altamen-
te resistentes ao calor podero persis-
tir e germinar no produto final se pre-
sentes no leite antes do tratamento
trmico.
Mesmo produtos desidratados e
farinceos tm demonstrado grande
potencialidade para a contaminao
e desenvolvimento de B. cereus.
Shaheen et al (2006) estudaram a pre-
sena de B. cereus nestas formula-
es. Aps a reconstituio destes ali-
mentos e seguidos dos procedimen-
tos microbiolgicos, obteve-se 11
colnias de B. cereus com atividade
txica aps 24h de crescimento. Com
o isolamento das culturas puras foi
possvel identificar a presena de 2-
200 g de cereulideo por 100 ml de
alimento acumuladas por 24h sem
refrigerao. Os tipos de formulao
tiveram influencia sobre a estabilida-
de da produo de cereulideo, alimen-
tos ricos em cereais e vegetais desi-
dratados deram maior suporte ao de-
senvolvimento da toxina.
Sendo assim, este trabalho teve por
objetivo abordar os principais aspec-
tos quanto s caractersticas de B. ce-
reus e suas toxinas em alimentos pois
imprescindvel o conhecimento dos
fatores que interferem na germinao
deste microrganismo para, ento, evi-
t-lo, garantindo, deste modo, a sani-
dade dos alimentos.
Aspectos epidemiolgicos
B. cereus tem sido associado com
intoxicaes alimentares na Europa
desde 1906. O primeiro pesquisador
a descrever essa sndrome com preci-
so foi Plazikowski, e s apenas em
1950 este bacilo foi reconhecido
como causador de enfermidades
transmitidas por alimentos (ETAs).
O primeiro surto documentado nos
EUA ocorreu em 1969, e na Gr-Bre-
tanha em 1971. (JAY, 2005).
Devido subnotificao das
ETAs causadas por B. cereus, existe
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pouca preciso dos registros entre os
surtos dos vrios pases. As intoxica-
es do tipo diarricas tm sido re-
gistradas na Hungria, Finlndia, Bul-
gria e Noruega, com mais frequn-
cia que a sndrome emtica. No Ja-
po e Reino Unido esta ltima foi
prevalente entre os anos de 1950
1985 (KRAMER & GILBERT,
1989). Entre 1973 -1985 de todos os
registros de intoxicao causados por
bactrias, B. cereus foi responsvel
por: 17.8% dos casos na Finlndia,
11,5% nos Pases Baixos, 0,8% na
Esccia, 0,7% na Inglaterra e Pais de
Gales, 2,2 % no Canad, 0,7% no Ja-
po e 15% (entre1960-1968) na Hun-
gria (KOTIRANTA et al, 2000). En-
tre 1988 -1993 B. cereus foi respon-
svel por 33% de todos os casos de
ETAs na Noruega e de 47% dos ca-
sos na Islndia entre 1985-1992. Em
1994 o Departamento de sade de
Taiwan registrou 74 casos de intoxi-
cao, destas 14,9% foram causadas
por B. cereus (GRANUM & LUND,
1997). Nesta mesma dcada foi regis-
trado um caso de bito causado B.
cereus e o alimento envolvido foi es-
paguete contaminado com a toxina
emtica, o paciente manifestou sinto-
mas da sndrome emtica que resul-
tou na falncia do fgado causada por
inibio da oxidao lipdica (MAH-
LER et al, 1997).
Em 2005 foi registrado um caso
de intoxicao de duas pessoas na
Finlndia que se alimentaram de uma
mistura de picadinhos de carne e mas-
sa, estas tiveram tanto os sintomas
emticos como os diarricos, possi-
velmente porque estavam presentes
duas linhagens genticas diferentes
(PIRHONENAN et al, 2005).
A diversidade de pases envolvi-
dos em surtos por B. cereus reflete
os diferentes hbitos alimentares e a
diversidade de alimentos em que este
pode se proliferar. Refeies a base
de arroz frio ou cozido, cremes pas-
teurizados, espaguetes, pur de bata-
ta e brotos vegetais, so comuns no
Japo, Gr-bretanha, Finlndia, e
EUA onde prevalecem os sintomas
da intoxicao emtica. J alimentos
como sopas, leite e derivados, pratos
que contenham carne e temperos so
comumente consumidos nos Pases
da Europa e Amrica do Norte, onde
predomina a intoxicao diarrica
(BLACKBURN & MCCLURE,
2000).
Fatores de virulncia
A patogenicidade do B. cereus tem
sido associada sua capacidade de
produzir toxinas. Estas so: trs tipos
de toxina diarrica, toxina emtica,
quatro hemolisinas e trs diferentes
fosfolipases C. Alm da presena de
uma protena na parede celular, de-
nominada S-layer, responsvel pela
adeso do microrganismo a tecidos
humanos. Contudo a habilidade de
produo destes fatores de virulncia
varia de acordo com as linhagens
(KOTIRANTA et al, 2000).
Dentre as enterotoxinas diarricas
duas tm sua estrutura molecular e vi-
rulncias bem conhecidas. Thompson
et al. (1983) na tentativa de aperfeioar
os mtodos de separao por cromato-
grafia da protena B-4ac associada aos
sintomas da intoxicao diarrica ca-
racterizou um complexo protico ex-
tracelular tripartido (38, 39.5, e 43 kDa),
o qual foi posteriormente referido como
complexo HBL, tendo suas protenas
denominadas de: L2 (46 kDa), L
1 (38
kDa) e B (37 kDa). HBL hemoltico
e so necessrios os trs componentes
para uma ao mxima que inclui cito-
toxicidade, ao dermonecrotica, per-
meabilidade vascular e acmulo de l-
quidos em coelhos com ala de leo li-
gada. J se sabe que os componentes
L2 e L
1 tm ao ltica e que o compo-
nente B funciona nos processos de li-
gao ao hospedeiro. Acredita-se que
HBL o fator de virulncia primrio
em B. cereus (GRANUM & LUND,
1997).
A segunda enterotoxina NHE tam-
bm um complexo tripartido de pro-
tenas denominadas L1 (39 kDa), L
2
(45 kDa) e B (105 kDa). No he-
moltica e foi recentemente caracte-
rizada por Granum & Lund (1996),
sendo bastante similar a HBL e ma-
nifestando os mesmos sintomas em
pessoas infectadas. Entretanto, as li-
nhagens de B. cereus que produzem
NHE podem manifestar seus sinto-
mas de forma branda apenas com os
componentes L1 e B, porm, sua ao
mxima, tambm se d pela ao con-
junta dos trs componentes. Estudos
realizados com NHE indicaram que
a frao de 105 kDa o componente
de ligao a clulas alvo e que L2 e
L1 so
geneticamente bastante simila-
res. A toxicidade da terceira entero-
toxina, denominada T, todavia no foi
completamente elucidada, embora se
saiba que esta constituda de uma
nica protena de 41 kDa e que no
apresenta propriedade hemoltica.
A toxina emtica, por sua vez,
um dodecapsipeptideo ou uma estru-
tura em anel denominado cereulideo.
Este constitudo de uma sequncia
de trs a quatro aminocidos em se-
quncia repetida, com peso molecu-
lar de 1,2 kDa., bastante similar ao
antibitico valiomicina, insolvel em
gua, resistente ao calor (126 C por
90 min), cidos e enzimas proteolti-
cas (BLACKBURN & MCCLURE,
2000).
Carlin et al (2006), concluram
que as linhagens que possuem genes
para codificar a toxina emtica fazem
parte de um grupo que evoluiu sepa-
radamente das outras espcies de B.
cereus, ou seja, o microrganismo s
pode produzir um tipo de toxina:
emtica ou diarrica. Entretanto ain-
da no est totalmente esclarecido se
o cereulideo um produto gentico
ou enzimtico no meio de cultura.
Agata et al (1995), devido s difi-
culdades de purificao do cereuli-
deo, utilizou roedores domsticos
oriundos do Japo, Suncus murinus,
como modelo animal para estudos da
ao emtica da toxina do B. cereus.
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ARTIGOS
Eles constataram que a toxina ca-
paz de induzir a formao de vaco-
los em clulas Hep-2, ao emtica
atravs dos receptores 5-HT3 e est-
mulos no nervo vago aferente alm
de inibir as mitocndrias do fgado
no processo de oxidao dos lipde-
os. Em estudos posteriores, Mikkola
et al, 1999, utilizaram mitocndrias
de espermatozide de javali para es-
tudar a formao de vacolos por
ao da toxina emtica e verificou que
estes vacolos causam o desacopla-
mento da fosforilao oxidativa por
atingir os canais dos on K+.
No que refere s hemolisinas, es-
tas, so responsveis pela atividade
hemoltica do B. cereus e tem assu-
mido papel nos processos de infec-
o. A cereolisina possivelmente
um receptor de membrana, termo-l-
bil, tiol-ativada e pode ser inibida por
colesterol. A Hemolisina II, no
inibida por colesterol, e pode estar
associada a uma toxina isolada de um
caso de intoxicao alimentar que foi
letal quando testada em ratos. Recen-
temente, uma nova hemolisina codi-
ficada pelo gene Hly-III, a hemolisi-
na III foi sequenciada, a qual foi ca-
paz de causar lise em eritrcitos, por
causar a formao de poros trans-
membrana. A esfingomielinase tam-
bm uma protena de atividade hemo-
ltica e participa do processo de liga-
o do B. cereus aos eritrcitos
(GRANUM & LUND, 1997).
B. cereus produz trs tipos de fos-
folipases C, cada uma com diferen-
tes mecanismos. A fosfatidilinositol
hidrolase, a fosfatidilcolina hidrola-
se e a esfingomielinase hemoltica. O
primeiro hidrolisa fosfatidilinosito e
derivados glicosilados de fosfatidili-
nositol, os quais participam do anco-
ramento de protenas na superfcie de
membranas plasmticas. O segundo
hidrolisa fosfatidilcolina, fosfatidile-
tanolamida e fosfatidilserina, ressal-
tando-se que, todas estas molculas
fazem parte da maioria das membra-
nas plasmticas de eucariotos e pro-
cariotos, sugerindo-se, assim, que
estas fosfolipases participam da des-
truio do epitlio de tecidos infec-
tados e degradao da matriz subepi-
telial (KOTIRANTA et al, 2000).
A aderncia essencial para mui-
tas bactrias expressarem seus fato-
res de virulncia. Neste sentido, S-
layer uma protena que recobre a
parede celular do B. cereus, e permi-
te maior estabilidade em outras ma-
trizes celulares. Estudos indicam que
a presena de S-layer garante uma
efetiva ligao matriz de clulas
humanas, enquanto a perda desta pro-
tena resulta na diminuio da hidro-
fobicidade e capacidade de adeso s
clulas. (KOTIRANTA et al, 2000).
Acredita-se que todos estes apa-
ratos faam parte de um complexo de
virulncia, que dependem da infor-
mao gentica do microrganismo,
presente no DNA e em plasmdeos,
que so primordiais para o sucesso de
invaso ao hospedeiro.
Medidas preventivas
Bacillus cereus frequentemente
encontrado em alimentos secos: tem-
peros, ingredientes farinceos, leite
em p, na forma de esporos resisten-
tes ao calor, uma vez que a reidrata-
o destes alimentos dar condies
viveis a sua germinao, se esta
ocorrer. Das vrias formas de tratamen-
to trmico, o cozimento em vapor sob
presso, a fritura e o assar em forno a
temperaturas superiores a 100 C per-
mitir a eliminao das clulas vege-
tativas, contudo parte dos esporos
pode no ser eliminado, pois j se
sabe que nem todos os esporos pode-
riam germinar ao mesmo tempo e que
resistem a temperaturas superiores a
100C (BLACKBURN & MCCLU-
RE, 2000).
O controle consiste inicialmente
em limitar a germinao dos esporos,
manuteno de um nvel baixo de
clulas viveis (< que 104 clulas), ou
seja, controlar o crescimento das c-
lulas ali presentes, atravs do contro-
le da temperatura, atividade de gua,
pH e combinao destes. Para carnes
de porco Byrne et al (2006) verifica-
ram que um tratamento trmico, o
qual pudesse destruir clulas vegeta-
tivas e esporos do Bacillus cereus e
Clostridium perfringens, precisaria
de 33.2 min a temperatura de 50 C e
1.0 min para temperatura de 60 C.
Logo, recomendaes para o cozi-
mento de carnes a 70C por 2 min pa-
recem ser suficiente para alcanar a
reduo de 6 logaritmos da popula-
o de Bacillus cereus, entretanto, os
esporos poderiam ainda sobreviver,
por isso significante lembrar a im-
portncia dos processo de higieniza-
o e do cozimento seguido de rpi-
do resfriamento.
Alm das medidas j citadas, a uti-
lizao de substncias protetoras pode
ser uma via para garantir maior con-
servao do produto. Com este pen-
samento, Abriouel et al (2002) veri-
ficaram a potencialidade dada pela
Bacteriocina AS-48. Esta um pep-
tdeo cclico produzido por Entero-
coccus faecalis que mostrou ter alta
atividade bactericida para B. cereus
mesfilos e psicotrficos sob varia-
das condies de temperatura e pH.
Eles tambm verificaram que o uso
combinado de AS-48 e nitrito de s-
dio, lactato de sdio e cloreto de s-
dio garantiu melhores resultados con-
tra as clulas vegetativas e os espo-
ros de B. cereus.
CONSIDERAES FINAIS
H um interesse crescente da co-
munidade cientfica em investigar B.
cereus, sendo, atualmente, este mi-
crorganismo alvo de investigaes
permanentes no campo da microbio-
logia e que avanam com a bioqu-
mica e gentica molecular. Sabemos,
entretanto que ainda no esto escla-
recidos muitos dos aspectos que en-
volvem os surtos de intoxicao j
que fatores de virulncia so conti-
nuamente descobertos e alvos de pu-
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Higiene Alimentar Vol. 23 n 170/171 maro/abril 200992
ARTIGOS
blicao. Contudo, os estudos nas re-
as da sade e dos alimentos tm tra-
zido discusses que convergem para
um aumento das aes que tem como
alvo evitar surtos e contaminaes
por B. cereus.
REFERNCIAS
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