batracomiomaquia - bibliotrónica portuguesa · 2 nota dos editores na ... lemos, maximiano,...
TRANSCRIPT
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Lisboa
Outubro de 2007
1
BATRACOMIOMAQUIA Edio da traduo portuguesa de
Antnio Maria do Couto
Carlos Costa
Evelina Costa
Ins Semedo
Coordenao de ngela Correia
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Batracomiomaquia
1
NDICE
Nota dos editores
Antnio Maria do Couto Elementos biobibliogrficos
Referncias bibliogrficas
Transcrio
Rosto
Dedicatria
Preliminar
Poema
Tabela onomstica etimolgica
Aviso
Erratas
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Batracomiomaquia
2
NOTA DOS EDITORES
Na presente edio, transcreve-se a traduo portuguesa, publicada em 1835, do
poema Batracomiomaquia, atribudo a Homero:
Batrachomyomachia ou Guerra dos Ratos e das Ras (trad. de Antnio
Maria do Couto), Lisboa, Tipografia de R. D. Costa, 1835.
A transcrio que aqui se apresenta foi feita a partir de um exemplar pertencente
Biblioteca Nacional de Lisboa, onde se encontra includo numa miscelnea. O
exemplar tem a cota L. 25897 // 11P. e trata-se de um livro colado, com 19,1 x 13,6 cm e 32 pginas.
Esta foi a primeira traduo do poema grego para portugus, nunca at hoje
reeditada. Recentemente, Fabricio Possebon traduziu o poema para portugus do Brasil.
Esta segunda traduo foi publicada em 2003 pela Humanitas, na cidade de So Paulo.
O texto foi transcrito sem actualizao ortogrfica, nem alterao da estrutura original
do livro em papel, na medida do possvel. Para atingir este objectivo, procedeu-se como
a seguir se indica.
No canto superior direito, entre parntesis, foram reunidas duas indicaes de srie, que se encontram em locais diferentes na edio em papel. A primeira
(assinatura) consiste numa letra ou num conjunto de letra e nmero, e encontra-
se na margem inferior, ligeiramente direita do centro. No ocorre em todas as
pginas, pois indica o incio de cada in-quarto e o incio da segunda folha de
cada in-quarto. Esta indicao comea na pgina 3 com o conjunto A2; segue-se
a letra B que coincide com a pgina 9; B2 ocorre na pgina 11; C, na pgina 17 e
assim sucessivamente. D2 a ltima ocorrncia e encontra-se na pgina 27.
transcrio destas indicaes juntmos o nmero de cada pgina na edio em
papel. A ausncia de seriao relativa ao in-quarto indica a ausncia da mesma
na edio em papel.
Adicionou-se um ttulo corrente, indicando o ttulo do livrnico ( esquerda) e o ttulo de cada captulo ( direita).
As capitulares foram marcadas a negrito, mas o tamanho inferior ao do livro em papel.
Todos os adornos grficos e ilustraes presentes na edio de 1835 foram excludos.
Mantiveram-se todos os itlicos e espaamentos de linhas, mas eliminou-se o espao que separa os sinais de pontuao da palavra que os precede.
As notas de rodap dos editores foram numeradas e graficamente distinguidas das notas do tradutor.
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Batracomiomaquia Nota dos editores
3
A marca de nota de rodap do tradutor um asterisco (ou vrios) entre parntesis, tanto na edio de 1835 quanto na presente edio. S o tamanho do
smbolo foi alterado.
As gralhas presentes no texto de 1835 no foram corrigidas, mas foram assinaladas em rodap. Exceptuam-se as palavras de acentuao pouco legvel
em que os editores foram forados a intervir.
O texto, incluindo as notas de rodap do tradutor, foi justificado de forma a manter a mancha tipogrfica do original. Desta forma, o texto contido numa
pgina do livro em papel exactamente o mesmo texto contido numa pgina do
livrnico.
As palavras em itlico, iniciadas ou grafadas com maiscula, e as palavras translineadas foram mantidas como na edio em papel.
No se desenvolveram as abreviaturas.
As aspas francesas, presentes no preliminar da edio de 1835 foram, devido a algumas limitaes tcnicas, substitudas por aspas correntes.
A cor azul indica a existncia de uma hiperligao ao ndice, cujo objectivo facilitar a deslocao do leitor entre as vrias partes da presente edio.
Agradecemos ao Professor Doutor Rodrigo Furtado, do Departamento de
Estudos Clssicos da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, a ajuda prestada
na reviso do texto em grego, presente na tabela onomstica, e em duas notas de rodap
do tradutor.
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Batracomiomaquia Nota dos editores
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ANTNIO MARIA DO COUTO
Elementos biobibliogrficos
Nasceu em Lisboa em 1778, morreu na mesma cidade em 1843. Foi professor de
grego e reitor no Liceu de Lisboa, cargos que desempenhava quando faleceu. Realizou
alguns estudos biogrficos e literrios sobre Bocage e o Padre Jos Agostinho de
Macedo (Memrias sobre a vida de Manuel Maria Barbosa du Bocage, Poesias
satricas inditas de Manuel Maria Barbosa du Bocage, Exame crtico do motim
literrio de Jos Agostinho de Macedo, anlise do poema Oriente de Jos Agostinho de
Macedo etc.). Traduziu alguns textos literrios e no literrios, incluindo o primeiro
canto da Ilada, em verso herico; a Batracomiomaquia, um conto da Madame de
Aulnoy No h felicidade perfeita um texto espanhol O monstro sem rebuo ou
reflexes de um madrilense residente em Madrid, depois da segunda invaso dos
franceses. Publicou o Glossrio de Homnimos e Equvocos da Lngua Portuguesa,
alguns estudos histricos relacionados com as Invases Francesas e uma carta sobre a
origem e os efeitos do Sebastianismo em Portugal.
REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS
Batrachomyomachia (trad. de Antnio Maria do Couto), Lisboa, Tipografia de R. D.
Costa, 1835
Batracomiomaquia (trad. de Fabricio Possebon), So Paulo, Humanitas, 2003
Correia, Joaquim, Heri-cmico (Poema), in Biblos. Enciclopdia Verbo das
Literaturas de Lngua Portuguesa, vol. 2, Lisboa-So Paulo, Editorial Verbo, 1997,
cols. 1006-1008
Himnos homricos la Batracomiomaquia (introduo, traduo, notas de Alberto
Bernab Pajares), Madrid, Editorial Gredos, 1988
Homeri Ilias [Ulyssea. Batrachomyomachia. Hymni XXXIj], Florentiae, in aed.
haered. Philippi Luntae, 1519
Homeri Odyssea grce et latine, item Batrachomyomachia, Hymni, et
Epigrammata, Homero vulg adscripta (edio crtica de Samuel Clarke), vol. 1,
Londini, Impensis Johannis et Pauli Knapton, 1740, pp. 661-681
Homeri qv exstantomnia Ilias, Odyssea, Batrachomyomachia, Hymni, Pomatia
aliquot, volume nico, segundo tomo, Basile, per Sebastianum Henric Petri, 1606,
pp. 340-345
Por falta de conhecimentos dos editores, no foi possvel determinar quais as pginas em que se
encontra a Batracomiomaquia.
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Batracomiomaquia Nota dos editores
5
La Guerra de ranocchi e de topi (traduo de Angiol Maria Ricci em verso
anacrentico), In Firenze, Nella Stamperia di Gaetano Albizzini, 1741, pp. 1-34
Lemos, Maximiano, Batrachomyomachia, in Encyclopedia Portugueza Illustrada,
vol. 1, Lisboa, Biblioteca Nacional, s/d, p. 829
Lemos, Maximiano, Couto (Antonio Maria do), in Encyclopedia Portugueza
Illustrada, vol. 3, Lisboa, Biblioteca Nacional, s/d, p. 408
Lesky, Albin, Histria da Literatura Grega (trad. de Manuel Losa), Lisboa,
Fundao Calouste Gulbenkian, 1995, pp. 111-112
Martins, J. Cndido, Pardia I, in Biblos. Enciclopdia Verbo das Literaturas de
Lngua Portuguesa, vol. 3, Lisboa-So Paulo, Editorial Verbo, 1997, col. 1418
Pereira, M. H. Rocha, Homero, in Enciclopdia Verbo Luso-Brasileira de
Cultura, vol. 14, Lisboa-So Paulo, Editorial Verbo, 2000, col. 1334
Prieto, Maria Helena Urea. Dicionrio de Literatura Grega, Lisboa, Editorial
Verbo, 2001, cols. 75-76
As referncias bibliogrficas em latim esto conforme as indicaes do rosto de cada exemplar. (No
caso do Homeri Ilias, porm, em cujo rosto apenas se l o ttulo, os editores recorreram a informaes
constantes nos catlogos da Biblioteca Nacional de Lisboa).
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Batracomiomaquia Rosto
6
BATRACHOMYOMACHIA, ou
GUERRA DOS RATOS, e
DAS RAS. POEMETO HEROE-COMICO
por
HOMERO,
TRADUZIDO DO GREGO EM VERSO SOLTO PORTUGUEZ,
pelo Professor Rgio da Lingua Grega,
ANTONIO MARIA DO COUTO.
Dos ratos, e das ras a cra guerra
Eu farei resoar por toda a terra.
Pard. da Gatic.
LISBOA.
NA TYPOGRAPHIA DE R. D. COSTA. Rua direita de S. Paulo N. 10 A, 1. andar.
1835.
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Batracomiomaquia Dedicatria
7
Ex.mo Snr. D. Vasco Pinto Balsemo Bibliothecrio Mr.
(A 2; 3)
He inutil fallar do mericimento das Obras do
Principe dos Potas Gregos, que, ha vinte e no-
ve seculos compostas, ainda se respeito, e imi-
to, e admiro; isto a quem ama do peito os Sa-
bios, e as letras. No he menos ocioso tobem
fallar do insano trabalho, que do em se traduzi-
rem nas linguas vivas; ou to pouco da mingua
de taes verses no Idima Portuguez, sendo alis
to ricas as linguagens mortas em similhantes
modellos para o estudo, e imitao. Seria gran-
de, e reprehensivel desleixo meo, no dar luz a presente traduo feita (ainda que em tempos
verdes) com alguma diligencia, e canceira, e na
frente o amavel nome de hum amigo, que a sa-
ber honrar, e avaliar, esperando, que descu- bra nesta pequena offerta hum sincero desejo de
perpetuar hum Nome charo Amisade; neces-
sario Beneficencia; modello Probidade; util
aos Homens de bem; e de vantagem aos Estu-
dos Patrios.
Seo amigo por muitas razes obrigado,
O Professor Rgio,
Antonio Maria do Couto.
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Batracomiomaquia
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PRELIMINAR. (4)
cerca das Traduces disse o erudito A. da cora Gthica, que todas er feio de pannos de rz olhados pelo avesso; e o sabio Rollin, que ero carcassas, ou ossadas nas sem rtulo, que
nos inculque a especie de animaes a que pertenc-
ro. Sendo exactissima esta avaliao por vir de
homens, que dro mate nos conhecimentos hu-
manos, que no se dir daquellas verses de obras
Poticas, que se fazem em prosa? He bvia a
resposta, e facillimo de conhecer-se o motivo,
porque me abalancei a trasladar em verso Por-
tuguez esta pequena Pea de Poesia: e posto que
no repute eu totalmente desdichada huma ta- refa assim (attentas as difficuldades, que en- volve) todavia no alrotarei to bem, que seja uma obra prima. Firme neste presupposto, e
tendo-me entregue gostosamente, ainda com pou-
cos annos s letras, e com especialidade ao Es- tudo das Gregas, em cujo acerbo trabalho gas- tei uma boa poro da vista, da saude, e da idade, sem nenhum incentivo mais que o de uma vontade decidida; e pensando to bem, que era alguma coisa em Philologa authorisan- do-se-me um vislumbre de renome, e daura
popular, que a muito custo hei obtido; por fim
passado o melhor de 23 annos, (*) a reservada
intriga, e inveja de meus mulos assombrados por me verem gozar de alguma Fama, e aos
(*) Allude-se ao anno de 1824, ento 24 do meo Magis- trio.
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Batracomiomaquia Preliminar
9
(5)
quaes nunca baixa, e servilmente dobrei o joelho,
com insidiosas tortuosidades, e corcvos, que o mau tempo facilitava; forcejro por me des-
pojar desse bem, que gosava havido com tama- nha nobreza, e canasso, sem que da minha parte houvesse provocao; (inimigos gratitos)
sem ter posto em vulgar as Cartas de Sneca para lisongear o Francez Herman, por ento intruzo Ministro Presidente da Fazenda em Por-
tugal; nem to pouco haver traduzido o Cathe-
cismo Napolenico, quando Buonaparte aleivo-
samente se apossra destes Reinos, cuja catheche-
sis foi depois de publicada logo supprimida &c. Qui potest capere, capiat... mas seja muito em- bora mais rotunda, e fulgurante a estrella de certos escrevedores, pois que j antigamente
Phcion dissera ao seu amigo Emphyleto at non inopinata isso mesmo esperava eu. Os sen- satos, e conhecedores do facto me perdoaro a
digresso amphigourica; continuemos porm com a materia. He a Batrachomyomchia de Ho- mero um Poemasinho Here-cmico, por certo no de grande vala, apezar da sua originalida- de, antiguidade, e fama do A. a quem se attri- bue, sentem comigo os melhores. Le Fevre, que
escreveo as vidas dos Poetas Gregos, impresso de Basle, e annotadas pelo clebre Rolland, na- da falla desta composio do immortal cantor
dAchilles; menos Sudas; to pouco Moreri; o
mesmo Diccionario dos Homens illustres; e das
Belas Artes; e outros muitos AA. de boa nota nada dizem a respeito da Batrachomyomachia,
tendo largamente dissertado sobre esta casta de
Poemas, taes como a Sechia Rapita de Tassoni; o Lutrin de Boileau, o qual Poema me parece ser nesta especie de Poesia huma obra comple- ta, e cujo andamento, distribuio, ideias, e mesmo Episodios, se acho felizmente imitados
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Batracomiomaquia Preliminar
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(6)
em o nosso bello Poema o Hyssope; sem que nos
esqueamos do Annel de cabellos de Pope; do
Dispensary do Dr. Garth; do Culex de Virgilio; e de outros innumeraveis Poemas Here-cmicos
em que ns os Portuguezes muito abundamos,
quaes a Estupidez, Agostinheida, que a julgamos
correr parelhas com o Hyssope; Benteida; Toi-
ros; Gaticanea; Palito metrico, bem que em La-
tim macarrnico, superior a Scarron, a Thomaz d Yriarte (contra Studia modernorum), e su-
blime macarrnea Italliana; Santareneida; Nari-
gueida; Foguetaida, aos Burros, Satyra virulen-
ta, e Menipeia escripta no gosto da Dunciada por Pope, mas infinitamente inferior, porca, e
obscenissima (*) (manuscripto dedicado ao Ge- ral de Alcobaa) &c. Todavia se o Cantor dEs-
mirna com este pequeno Poema no alcanou o
laurl com que a fogosa Iliada lhe enramra a
frente, nem por isso, e por muito chamado fal-
samente Rapsodista merece vituprio (antes de-
cididos elogios) porque escreveu na infancia
darte, ainda que Aristoteles delle colhra ospre-1
ceitos para formalizar a sua Arte Poetica, a quem seguro Horacio; Jeronimo Vida; Boi-
leau; e o nosso Francisco Jos Freire, alis Can-
dido Luzitano; quasi que se copiro depois de
haverem copiado o Estagirista. Todavia no
pretendo por taes razes descnlpar2 de todo o
Principe dos Poetas Gregos como a celebre Ma-
dama Dacier fez na sua m traduco de Homero,
pretendida elogiadora deste Poeta, e que sempre
pretextou motivos para revelar-lhe os defeitos,
esquecida do que dissera o Venuzino com ou- tras luzes do Idima Grego, por mais visinho aos tempos Olympiacos, com outros fundos, e
natureza Poetica, quando escrevia aos Pizes
(*) Seu Autor no o era menos.
1 ospre- gralha por os pre-. 2 descnlpar gralha por desculpar.
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Batracomiomaquia Preliminar
11
(7)
que algumas vezes dormitra (*): e na ver- dade pareceo adormecer despregadamente, e com o somno interrompivel de Jove, que to
magnificamente descrevra na Iliada quando nes-
ta pequena Pea (se he composio sua, o que
Plutarcho nega, e muitos outros AA. pem em
dvida) rompendo todas as barreiras do verosi-
mil, qualidade essencial da Fbula potica, e que os preceitos mando restrictamente obser-
var, sem observancia dos quaes mandamentos em Poesia, toda a composio no passa de hum
mro apontoado de versos pouco valiosos; faz
Homcro3 com que hum dos seus Heres (so Ra-
tos, e Ras) agarre no centro do conflicto em hum pedregulho to pesado, e enorme que a terra gemia debaixo do pezo da mesma pedra. Esta hyperbole, sobre attrevida he como as desta feitura, improvavel, e incrivel, ainda que alguns criticos para cohonestalla produzo
alguns lugares paralellos de outros Poetas, v. g. a desforme bengalla de Polyphemo em Virgi- lio trunca manum pinus regit4 Porm have- r paridade entre uma Ra, e um Gigante? ainda que isto seja de proposito imaginado para
augmentar o ridiculo, que similhantes fices
exigem, elle perde todo o xiste, e galantaria, logo que transpe os limites da credibilidade e
verosimilhana. Demais: O Mantuano para se
fazer acreditavel nhum adjuncto to pouco ver-
dadeiro, d ao Centimano huma estatura mais do que a de Colosso, e desmesurada; diz, que hum s olho; que tinha o (monculo) Briareu, cra5 lampadis instar, maneira de pharl; as-
sevra, que o Pai do Agiphago era Neptuno, ida assz augmentadora para a grandeza do
Gigante, e emprega varias outras preparaes,
(*) Aliquando que bonus dormitat Homerus.
3 Homcro gralha por Homero. 4 Falta um ponto final. 5 cra gralha por era.
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Batracomiomaquia Preliminar
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(8)
as quaes insensivelmente conduzem os Leitores crena de similhantes encarecimentos, como em taes casos se costuma, aprumando-os pelos
preceitos de Quintiliano, que recommenda mui- to se ade o attrevimento das hyperboles ex-
cessivas com as seguintes clausulas se he pos- sivel podello-heis crer seja-me licito assim dizello se o posso dizer consinta-se me pas- sar a expresso6 &c. cujas expresses, e outras do mesmo jaz so huns verdadeiros passapor- tes das exageraes altivas. Tudo isto he dou-
trina seguida pelos melhores Hummanistas: e por tanto eis o motivo porque em a nossa ver- so mollificmos a incredibilidade da hyperbole; e se de Homero he o Poemto, com a ingeren- cia do seguinte v/ . n. 304, que he da nossa la- vra,
E posto ser Gigante lhe custra! *
e que no seu proprio lugar vai marcado com o
signal, (*), e escripto em letra Italica.
Apezar do que levo dito com tudo na Ba-
trachomyomachia se descobre no pouco sal, e
muito donaire da lingua original, em que foi
composta, fogo dimaginao, ptima metrifica-
o, viveza dimagens e bellos exemplares na
parte descriptiva, rythmo potico, de cujas bellezas tal vez proviesse dar-se Homro por A. desta composio, e se o no foi era quem o estudra bebendo-lhe o estillo. A comparao
do rapto da Europa por Tauro applicada inver-
samente aos dois amantes (Ra, e Rato) he huma pincellada de Mestre, em que se v re-
saltar aquella sublimidade, que nos parallellos, e equiparaes desta Natureza, introduzidas epi-
sdicamente em taes imaginaes deleitaveis, faz sobresahir o ridiculo sem deturpar o vero-
6 Falta uma aspa.
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Batracomiomaquia Preliminar
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(B; 9)
simil, segundo a bem assentada opinio de Lon-
gino, e Demetrio de Phalra. Quanto a meu vr por entre muito bas similhanas, que hei lido, aquella, que me parece irmanar com es- ta, pelo que respeita ao augmento do ridiculo
requerido em invenes destas, he a que se acha
de Cicero na invectiva contra Calpurnio Piso.
Querendo o Principe de Eloquencia Romana exa-
gerar, considerano o estado da embriaguez a que
nhum Bdo chegra Piso com varios outros
amigos, como elle debchados, que o acompa-
nhavo na crpula, diz, que ouvindo o dito Pi- so cucurrejar hum Gallo, exclamra aos seus
Conscios da vinolencia, e bebedice que seu Av o chamava, e cumpria-lhe fallar pelo que mandou levar a meza, e sahio em tom de prs- sa: advirta-se que o Av de Piso pela parte
materna j tinha morrido, e que o seu officio fra Pregoeiro de leiles de vz espivitada, que he aonde est a galantaria occulta do smile,
applicado ao canto do Gallo.
A vista do reflexionado parecer certa a
minha avaliao; e que este rasgo manifesta bem, e crivelmente huma gravissima tumu- lencia, assz appropriada para amplificar a ri-
dicularia, e o desprezo de que tanto preciza o
baixo Cmico. No menos em Homro a passa-
gem fabuloza do roubo da Europa applicado
Ra, e Rato faz hum maravilhoso effeito.
Outro lugar para mim admiravel da Rato-
ranaguerra he o arlequim, e variado uniforme, e celeberrimo armamento dos Heres combaten-
tes, e descripo da raa carangueija, tudo con-
forme aos preceitos de Horacio descriptas ser- vare vices. O combate porm he fastiento, ain- da que bem desenhado; e o final parece no ter o seo devido termo, pois acaba de chfre, fa-
zendo com que se julgue incompleto; por manei-
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Batracomiomaquia Preliminar
14
(10)
ra que se esta obrinha fra no seo acabamento
hum pouco mais lidada, deixar-se-hio por isso
mais longe dos tiros Censura algumas incorrec-
es, e falhas de colorido, que no mesmo opus-
culo se deviso ao luminoso facho de huma cr-
tica sa, e artezoada.
Dever o Leitor curioso saber, que no vi para fazer esta verso mais do que o Texto Gre-
go; apezar de que as Traduces de Boivin, e
Desmarets, e a mais antiga de todas Batra- chomyomachia de Homro tradotta in terza rima
da Giorgio Somariva, Cavalier Veronense in in
Verona pouco mais de hum sculo depois de descuberta a impresso por Pedro Scheffer; Joo
Guttemberg, e Joo Fust, tem pela Fama de seos AA. muita celebridade, e mrito; mas no
quero com isto dizer, que fui vante delles, posto que a riqueza da Lingua Portugueza (s-
mente pobre para quem a desconhece) seja in-
comparavelmente superior dos Idimas Fran-
cez, e Italiano, no lhe cedendo neste caso a
palma, seno por minha insufficiencia. Todavia se pelo contrario eu tivra hum tal bazfio alar-
de, he, que este se poderia reputar pedantes- co; mas longe de mim tal presumpo, e os Lit-
teratos, e conhecedores da materia me julguem. A lingua Philosphica dos Demosthenes, e Pinda-
ros muitos alroto de a saber; porm os Mestres
della, como Gretzero (*), Vazo, Salvini, Brun- ck, Clark, Camerario, Wolfio, Hederico, Cle-
nardo, Hoogeveens (**), Gesnero, Vossio, Lan-
(*) Nome ficticio dado a huma Arte Grega, em 4 Par- tes, e ptima; feita por alguns eruditos Jesuitas para desfrra
de hum seo Collega chamado Gretzcro, que em hum Concillio
fra reputado cousa pouca no conhecimento das letras Gregas. (**) Escreveo sobre o verdadeiro uzo, e intelligencia das
particulas Gregas, exemplificadas em Pindaro, e Homero. Te-
mos este livro raro, e verdadeiramente de ouro.
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Batracomiomaquia Preliminar
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(B 2; 11)
celloto, Auger, Estevo, Bourdelotio, Scapula,
Justi, Pope, Reiskio, Le Fevre, Gori, Rollin,
Hemstherusio, Burmanno, Bitaub, Vaurviliers,
Cellario, Budo, Noltenio, Scioppio, Bulengher,
Worstio, Pomey, Zeune, Erasmo, Sudorio, Schi-
midio, Batteux, Bachet, Robertson, Ernesto,
Schrervelio, Ubbo Ernio, Meursio, Erasmo, Da-
ly, Mallon, e outros muitos exmios, e abaliza- dos cultores das letras Gregas so raros, pensa-
mento, que no he da minha lavra; mas do fa-
mozo Rodolfo Kustero, que no saber, e erudi- o do Grego, imitao dos Sabios Heinecio,
Sanches, e Perizonio, Fourgault, Barnouf dei-
tro a barra muito alm da meta, e da curta vista daquelles, que por copiarem o que ja ach- ro escripto desprezo o nome da Familia de que
viro para tomarem algum outro mais fausto- so da Rpublica das letras, esquecidos de que
Pythagoras fizera o contrario, abraando antes o nome genrico de amador da Sabedoria (Phi-
losopho) em vez do nome de Sophista, porque,
dizia elle que o Titulo de Philosopho era me- nos pomposo, e inculcador, que o de Sophista,
deixando-o livremente aos Anitos, e Melitos, ac-
cusadores de Socrates.
Ditosa condio, ditosa gente! (*)
Fiz os possiveis esforos para traduzir o que
Homro disse, e quiz dizer, penoza obrigao a que todo o Traductor se v ligado; nus to
rduo, que forou o nosso com tamanha razo
louvado Joo Franco Barreto no Prlogo da Tra-
duco da Eneida a confessar que muitas ve- zes por querer representar a mente de Virgilio en- tendra perder o juizo.7 As vantagens da Lingua
(*) Cames.
7 Na antepenltima linha, antes do verso de Cames, falta uma aspa depois da palavra Sophista. O mesmo acontece no texto em itlico de Joo Franco Barreto, depois da palavra juizo.
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Batracomiomaquia Preliminar
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(12)
Grega comparativamente s dos outros Idimas
so innumeraveis, o que por extremo augmen- ta muito a difficuldade de as conhecer, quando, e como applicadas. Aproveitei o que me coube
quanto phrase charra, e zombeteira, que tan- ta graa d aos pensamentos chulos bem natu-
raes a composies, que tem por baze o rizivel, e em breves Notas illustrei o que ficaria escuro, e longe do texto sem muito as estirar, nem fa- zer-lhe longos cabealhos para meo encmio,
sempre reprehensivel em bocca propria; costu-
meira asss endmica de alguns Escriptores, que
por todos os pros querendo destillar gravissima
erudio, sem attenderem ao gosto moderno, que
por isso lhe d o bem merecido nome de Copis-
tas, bem como os Tabellies, que tiram da No- ta, visto o que ha em depsito por essas vastas
Bibliothecas, vertendo em lingua materna, para
fazerem suas, as Annotaes, Escholios, lucu-
braes, corollrios, variantes, commentarios,
dilucidaes, cnones, dissertaes, hypthe- ses, reflexes, preliminares, thses, Prlogos,
Programmas, e anlyses de tantos pulvurolen- tos, e antiquadas Commentadores, impingindo ao Pblico por um bom dinheiro a fazenda alheia,
Cujos crdores nos Elyzios fervem: (*)
porque Criadores ha poucos, e nem todos os s-
culos os depro, mrmente depois que se foi o Sculo de Augusto com Mecenas, e o de M-
dicis na Italia, o de Luiz XIV. em Frana, o de Pedro o Grande na Russia, e o do Senhor D. Jos I. com o Marquez de Pombal, Sebas- tio Jos de Carvalho em Portugal, a cujos Sa-
bios, as Sciencias e as letras devro sua res-
(*) Bocage. Satyra impressa no Investig. N. 16, por mim.
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Batracomiomaquia Preliminar
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(13)
taurao, e a recobrario hoje das Mos do Ex-
celso Duque de Bragana, o senhor D. Pedro
dAlcantara, de saudosa memoria.
Recolhendo todas estas ideias, e outras mais, que sero bvias, dever mais saber o P-
blico imparcial, e sensato, que a philaucia alheia despertou em ns por esta vez tambem o nosso amor proprio, que para sempre julg-
mos, que nos teria cahido em profunda modor- ra, vista dos muitos escriptos sbios e instru-
ctivos, que sahem do Prlo Portuguez; porm ao ouvirmos, que se traduzia a Ratoranaguerra de Homro em proza, fosse quem fosse o seu
Traductor exclamamos com Bocage,
Que mesquinhez do Vate, e que insolencia!..
e este o incentivo, que nos levou presente tra-
duco, e no ambio philolgica de Nome, ou gloria, drogas que se nos tem tornado bem
mofinas, para agora jorrarem saber, e se torna-
rem em galla; alis seria o p, smente o p, o unico avaliador, corrector, e contraste do nos- so posto que rasteiro trabalho, ao menos feito em verso [que oxal se empregasse em criticar
Pedantes], porque traduzir hum Pota em lin-
guagem pedestre, o termo diz a humildade he perder [como diz Juvenal] o tempo, e o azei- te (*): tresvaro bem proprio de alguns Escri- ptores jactanciosos, [que muitos ha] de quem diz o rifo formados com Bullas falsas ou de quem so mais as nzes do que as vzes o que irmana: e o que mais he, he, que nada se lhes diz; campeio, salto, folgo, assentan- do a sua carunchoza peanha na ruina, e perda dos
outros, que talvez com hum bem pequeno, e li-
(*) Perdere tempus, atque oleum.
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Batracomiomaquia Preliminar
18
(14)
geiro sopro os pudessem supllantar. Mas fique
muito embora o balfo, o fraco, e o intrigante com as armas da traio, que lhe so proprias, que se pensa entre os mais Astros ter a superio-
ridade do Sol, este por ser hum chuveiro de lu- zes no tolhe, que os outros fulgrem, e brilhem
tambem: ao contrario hum grande luzeiro des-
lumbra, e cga, principalmente se o esplendor que espalha tamanha claridade, em vez de es-
clarecer offusca os homens, e no illumina a So-
ciedade.
Cabe a pllo neste lugar lembrar-me agra-
decido Memoria do Augusto Senhor D. Joo VI. que me salvou do abismo em que a mais te-
nebroza das intrigas me hia sepultando, toda
gratita, sem concorrermos da nossa parte a
asanhalla, deixando neste pblico, e indelvel
agradecimento hum testemunho irrefragavel de
quanto soubmos prezar a virtude da Beneficen-
cia deste Monarcha, em mim verificada, e ao
mesmo tempo a justificao do meo tal, e que-
jando merecimento, que sempre em quanto vi- vo servir de ralador, remorso (*) aos nossos
Emulos, que muito desprezamos (**), bem co-
(*) Pascitur in vivis livor post fata quiescit. [Ovid.] (**) Corroboramos o nosso sincro, e pblico dito, (e o que j tocmos de passagem) com a cpia authentica do seguinte
Aviso Rgio.
Certido.
Nesta Secretaria dEstado dos Negocios do Reino a fl. 212
do Livro 6. da Universidade de Coimbra se acha registado o
Aviso de que faz meno a spplica retr, cujo theor he o se-
guinte. Para o Vice-Reitor da Universidade de Coimbra. El Rei Nosso Senhor, attendendo ao que lhe representou Anto-
nio Maria do Couto, e s informaes, que houve sobre o seo
comportamento pblico: Ha por bem por effeitos da sua beni-
gnidade de o mandar restituir ao livre exercicio da Cadeira de
Lingua Grega desta Crte, de que se achava dimittido: Orde-
nando, que a Junta da Directora dos Estudos passe a este effei-
-
Batracomiomaquia Preliminar
19
(15)
mo desprezmos o Usurpador, que por isso nos
dimittio, logo que intrusamente senthronisou, de que folgamos pelo no servir, apezar dos sa-
crificios porque passmos.
Concluamos. Os nomes dos Heres do Poe-
mto de Homro, e sua fico vo no fim des- ta verso explicados por ordem alphabtica, e
ethymolgicamente: assentmos de os empregar
como so no Grego, imitao do que fez na sua
bella traduco da Iliada em Italiano, o famige-
rado Antonio Maria Salvini, Bibliothecario Mr
em Pisa, e Professor de lingua Grega; (e me ufana a uniformidade do seo nome, e cargo), e isto para fugir da locuo periphrastica, que
augmentaria com grande desproporo o nme- ro dos versos na traduco, comparado elle com o do Original; pois constando o original de 304 v/ . viria a verso a ter muito acima de 415 v/ . a que ficou limitada, imitando o sabio Italiano
Monti na sua bella, e moderna Traduco da
Iliada.
to as ordens necessarias, o que V. S. far presente na mesma
Junta, para que se execute. Deos Guarde a V. S. Palacio da
Bemposta em 8 de Junho de 1825. = Jos Joaquim de Almei- da e Araujo Correia de Lacerda. = E no se continha mais no Registo do referido Aviso, de que se passou a competente
Certido para constar aonde conveniente fr. Secretaria dEstado
dos Negocios do Reino em 12 de Julho de 1825. = Gaspar
Feliciano de Moraes.
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Batracomiomaquia
20
(16)
RATORANAGUERRA.
Perlege Maeonio cantatas carmine ranas,
Et frontem nugis solvere disce meis.
Mart. Epigr. L. XIV. Ep. 103.
Nos versos l de Homro as ras cantadas;
As nugas minhas l, rirs farta.
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Batracomiomaquia
21
BATRACHOMYOMACHIA. (C; 17)
Poma Here-Cmico.
Canado de cantar Mavrcias lides,
Tumultos, guerras, e brisos feitos,
Auxilio aos versos meos primeiro implro
Do sublime Helicnio Ajuntamento,
Para que transmittir eu possa aos Homens 5
O Plano com que os Ratos em batalha,
As Ras lhe dero ca, o lzio pondo
Na prle agigantada, e obras suas,
Que pasmo trouxe ao mundo: he esta a origem.
Dhum Gato s unhas livre Rato esperto 10
Sedento ao p de hum lago encosta as barbas,
E sencharca dagua em prazer nadando;
Limncharis o bispa, e assim vozeia.
Ignto, donde vens? Teos Pais quem so? No te pilhe a mentir, dize a verdade; 15 Se digno de amisade te fizeres Abrigo te darei na casa minha, E quanto em hospedagem dar-te psso. Physgnato he meo nome, eu sou das Ras Aqui no charco o Rei, em outros vos 20 Pelo, Hydromeduza me gerro Conjunctos em amor do P s margens. Em ti lombrigo hum Rei com sceptro, e mando, Gentil, exmio, esbelto, assz galante, Guerreiro finalmente, diz, te peo 25
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Batracomiomaquia Poema
22
(18)
Quem sois, e qual a tua descendencia? Pesicarpax destarte assim lhe vlve.
Amada, o sangue meo, meos avoengos As Aves, Numes, Homens bem conhecem. Trxarta, o Alma grande, meo Pai foi, 30 E por Me a honrada Lychomylla DEl-Rei Peternotrcta, illustre Filha. Nhum buraco nasc nutrido sempre Com figos, nzes, e mui fina papa: Se amor me queres ter, como he possivel 35 Unir o que discorda Natureza? Aqutil vives, e te cvas nagua, Quando eu entre os mortaes me vou mantendo. Em prato orbicular o po sovdo, De muito gergelim altas fogaas, 40 Prezunto com heptica substancia, Que toda em roupas brancas sencapta: De leite o bello queijo (ha pouco expresso) Aos mesmos Numes gratas, saborosas Golodices quaesquer, nada mescapa. 45 Farejo at no centro das marmitas, Engenho daltas obras cozinheiras Em que de noite a gente a gula affga. Aos imgos jmais virei o rabo; Na frente em bruta guerra este o meo posto. 50 Gigantes no me aterro, nem Colssos, Deitados a dormir lhe ro os dedos, O proprio calcanhar sem dr soffrerem, Nem minha trincadella o somno espanca. Bixinhos deste mundo s dois temo, 55 O Gato, mais o Ar me fazem tratos; (*) No menos a dolsa ratoeira, Da morte chamariz, caurim manhoso. No psso as gatas vr , todo eu sou medo;
(*) A nosso modo de olhar esta circunstancia do ar, pen-
samos, que o Pota tomou por esta Ave de rapina quaesquer
outras, ou collectivamente por ella representadas as que se sus-
tento dos sevandijas da terra, como a cegonha, a gralha &c. e por serem aliund ves agourentas.
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Batracomiomaquia Poema
23
(C 2; 19)
Fugindo se me acoito a algum buraco, 60 Espreitando o buraco ahi mempolgo. Manjares a vs outras delicados No cmo, nem destro, grelos sejo, Abboras, ou aipo, ou verde acelga... Physgnato surr, e assim lhe torna. 65
Alrtas mui do papo, Estrangeiro! Coitadas ns to falhas da papana, Dos lagos fructo, e do quengendra a terra, Da vista engdo, e no comer incerto, Que do Saturnio s Ras, e pulos darem, 70 Ou nagua sesconder, partilha sua. He facil de saber-se o que te advirto. Se te aprz , s cabritas te conduzo, Agarra-te a mim bem, seno fences, E brincando entrars os Paos meos. 75 Apenas disse a Ra, o lombo agacha,
Em salto leve o Rato se lhescancha.
Nadando a Ra, baboso elle espraiava
Os olhos pelos Portos limitrphes;
Porm ao penetrar as ondas vastas, 80
(Que negras so) choroso, arrependido
Debalde na barrga agatanhava,
E da fronte os cabellos deprima.
No peito o corao bailava afflicto
Com susto ao mar, e saudade terra. . 85
Qual remo a rasto vai, a cauda estende
Entrando as vagas, e rogando aos Numes
Lhe dessem tomar p; e assim clamava.
Destarte para Crta nas espaldas Por mar no conduzo Tauro a Europa, 90 Do seo amor enlvo, e joia amavel; (*) Mas eu pegado Ra, que vai vogando Levado sou por ella casa sua, Alevantando o corpo verdoengo
(*) Acerca deste smile original, que faz hum ptimo contraste; bello rasgo por certo deste Poemto, repare-se no que
dissemos em a reflexo preliminar.
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Batracomiomaquia Poema
24
(20)
Acima do crystal, que o pgo esmalta. 95 Aos dois neste comenos apparece
Hydra horrenda, medonha bixarca,
O cllo sobre as ondas assomando;
Medrosa, e sem pensar Physiguento,
Que no lago matava o Scio querido, 100
Vai tmida, do tanque ao mr abysmo,
Illude a negra morte, e della escapa.
Da Ra em abandono o Rato posto,
De costas sobre as aguas estirado
Com lethal afflico ranga os dentes; 105
Travando-se as mos, ra hia abaixo,
E ra vinha acima escoucinhando,
Vendo-se finar sem ter remedio.
O pllo por molhado, enorme carga,
Nas vagas o mergulha, e alli espicha. 110
Alfim carpindo o trance assim fallava.
Aos Deoses, Physignto, no encobres Do corpo sacudir hum naufragante, Qual dexcelso penedo escorregra. Melhor, malvada, fra, que no Circo 115 Comigo no Pancracio, (*) ou curso, ou murro Tentasses meo poder, e a fora minha; No mar porm, manhosa, me lanaste, Dos Numes a desfrra espera, encra. Na lda margem estava Licopnax; 120
Que pinchos altos deo o caso vendo,
E prestes a correr o diz aos Ratos.
Apenas o successo miserando
Sabido foi, em ira todos ardem.
A pressa logo Arautos se despedem 125
Concelho a convocar de madrugada
Na casa de Trxarta, infausto Pai
(*) Pancracio, era hum combate composto da luta, e do pugilato, em que os Athletas no s tinho direito de todas as
suas foras, e ards para debellarem seos Antagonistas; mas tam-
bem lhe era permittido valer-se do murro, pontap, unhadas, e dentadas ( ), de todos os meios para maltra tar; combate violento em prctica s entre os Gregos.
No final da quinta linha do rodap, a falta de um hfen gralha.
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Batracomiomaquia Poema
25
(21)
Do msto Pesicarpax, que no charco
Boiva resupno tona dagua.
Sem praias inda ver o desgraado, 130
Chega-se o dia, e os Vogaes se ajunto.
No Salo do Congresso foi Trxarta
Primeiro o que a fallar se levantra,
Soltando a vz assim do peito iroso.
Eu sou o que das Ras prejudicado 135 Soffr damno maior, Camaradas, Oio todos o mal; que toca a todos. (*) Mereo compaixo perd tres Filhos: Ha pouco nhuma greta hum foi fisgado; Por Gata do Diabo, e deo-lhe a morte; 140 Malvolos segundo tasquinhro Buscando huma arte nova, huma armadilha De pau insidiosa ratoeira, Negaa em perdimento da Ratada. (**) O mimo de seos Pais, que era o terceiro 145 Physgnato sem d no charco affga: As armas pois, s armas contra as Ras; Com brio todos eia, vamos todos, E com armado vrio os corpos brilhem. Isto dizendo logo as armas tomo 150
A gosto de Mavorte, o Deos da guerra.
Polainas foro cascas verdejantes,
E justas, como luva bem calada
Na perna musaranha, ero das favas,
Que de noite os Heres tinho roido; 155
De cana entretecido o correme,
Despojo dhuma Gata, que esfollro
Coiraas duras, ptimas fizero;
Na candeia o lugar, que he da torcida
Chamado ento assim Embigo della, 160
Griseta agora, de pavz servio; (***)
(*) Cames: C. 6. Est. 14. (**) Para os ratos matar, tirar-lhe a casta. (Var.) (***) Foi foroso volver a ida do Pota por huma perphra-
se, porque embigo da candeia, a nosso uso hoje nada explica-
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Batracomiomaquia Poema
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(22)
De ferro todas, inveno Gradva,
Agulhas alongadas foro lanas;
De nzes na moleira a capa rija
Os elmos ero, era o uniforme. 165
As Ras chum tal rumor o lago deixo,
Procuro posio, concilio frmo
Da pugna sobre o mal, e discorrendo
Donde vinha o motim, e a causa vinha;
Eis hum Rei darmas chega, o sceptro alado; 170
Por nome Embasichryto, digna prle
Tyrglypha, alma grande, predizendo
Da guerra a nova m destarte orando.
Dictro em furor os Arganazes Por mim o Fecial (*) que sem demora 175 Prestes as Ras pugna se preparem. As mos do vosso Rei Physiguento No tanque Pesicarpax vro morto. Eia pois as valentes tomem armas. E logo que isto disse, evaporou-se. 180
A morganha noticia fez barulho
Apenas, que das Ras furou a orelha,
Quaes bichas a Physgnato accusavo,
Mas esta empespinhada assim lhes clama.
No matei o Rato nem morto o vi, 185 Amigas, affogou-se nalaga Por gosto como ns nadar querendo; Porm, eu innocente, as ms no cesso Dincrepar-me; por tanto discutamos Cabo dos Ratos dar, matreira raa, 190 E o projecto meo mui franca explano. Salvar a nossa pelle procuremos Estando bem armadas sobre as margens, Ponte de que vo ao precipicio;
va; e muito mais segundo a serventia antiga deste utensilio com-
parada com a moderna do mesmo, e seo diverso feitio. (*) Os Feciaes ero huns Magistrados, que entre os anti- gos tinho a cargo a declarao da guerra, arremessando no ter- reno inimigo huma lana &c.
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Batracomiomaquia Poema
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(23)
Quando os prros a ns combate ousarem 195 Pela celada azindo os de mais perto No charco com as armas se sepultem, Ignaros do nadar a morte encontrem, E hum tropho aqui de ratos mortos Levante-se, e se vingue a nossa injria. 200 Fallou; do-se o alarme, s armas correm.
De malva s gambias folhas enrollro;
Acelgas largochatas cttas fro,
Por chuas empunhavo longos juncos,
E de conchas fizero capacetes. 205
Nalta borda, que o pgo moldurava,
Alli todas se pem ao scco promptas
Vibrando os piques, e fervendo em pulgas.
No Co em que as Estrellas fulgem, brilho
De Jve ao mando os Deoses se congrgo 210
A ver a bichara dos Soldados,
Que trazem fortes hastas mui compridas,
Achilles taes em fim, que mas querem
Dos Gigantes haver, mais dos Centauros
Na pra, no marchar, e na chibana; 215
Risonho indaga Jve qual dos Numes
Os Ratos, e as Ras favorecia;
Primeiro ento a Pallas diz O Filha Auxilio acaso aos Ratos dar intentas? No Templo teo saltar os tenho visto 220 Buscando pelo cheiro, que os regalla Mamar do sacrificio as iguaras. Saturnio se callou, e diz Minerva:
Favor aos Ratos dar? Oh isso nunca, Se os visse espernear; he casta brava, 225 Damninha raa, e grande mal me ha feito, Minhas cras roendo, e o lampadario A pesca do azeite destruindo. Jmais riscar da mente eu psso a traa, Que no fato avistei: fatal destroo! 230 O Pplo achei mordido, que eu tramra (*)
(*) Era o Pplo na Grecia hum vo roagante com que
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Batracomiomaquia Poema
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(24)
Com fio mui subtl, ficou hum crivo; Onzenas me custou delle o concerto (Estava o remendo de mo na ilharga!) A crto a paga foi; por esta causa (*) 235 Ardida estou, devendo, estou em brasa: No menos soccorrer as Ras cogto, Culpadas tobem so no meo cartrio. Canada nhum recontro quando ha tempos No somno desejava achar guarida 240 Galrando todas juntas mempcro (Malditas!) Pregar olho, e sempre s voltas, A cabea no ar com dr immensa, Jaz at ouvir cantar os gallos: Por isto de soccorro nada, Numes, 245 A taes animalejos se faculte; Ferir algum de ns no venha o dardo, Bulhentos so, e Deoses no acto. Vejamos ra os toiros de palanque Estando c no Olympo, e folgaremos. 250 Apenas se callou, obedecro
Os Deuses immortaes unidos todos
Nhum canto l do Co a vr a guerra. (**) Deo signal a trombeta, e dois Heraldos
Mal dero o aviso; abro a bcca 255
O vasto Co, e embocando a tuba (***)
se ornavo as mulheres por cima do mais vistuario, corres-
pondente Palla, ao Amictum das Damas Romanas. (*) Por achar, que os termos Crto, e Remendo aug- mentavo muito o ridculo necessario a taes composies, os em-
preguei como phrase charra em vez dos de paga, e alfaiate, que
esto no texto. (**) Deo signal a Trombeta Castelhana.... [Cames.] (***) O texto diz assim, como primeiro havia-mos tradu- zido
Deo signal a trombeta, e dois Heraldos
Mal este aviso dero: trovejra
O Filho de Saturno, senha horrivel &c.
Mas com o Abbade Eustathe na Nota ao verso 388 da Iliada, Liv. 21, pensando, que dizer o Pota smente, que Jpiter =
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Batracomiomaquia Poema
29
(D; 25)
Rebomba nos mortaes a senha horrivel
Do mal, que a lide faz sem d, sem pejo.
Primeiro Lichenr8, que na vanguarda
O passo defenda, com o chuo 260
Da fra Hypsibas, cahe de ventas,
No figado ferrou, o ventre aberto,
E de p os cabellos se empastro.
Da Pelida logo apz Troglodtes,
O pique feito, a pana lhe esburaca, 265
E j sem vida morte o corpo entrega.
Seuthleu o mesmo faz a Embasichryto;
De cstas a Polphon, Artophgo
Ferida no bandulho pem por terra,
E dos membros o nimo se livra. 270
Polphon morto vendo Limnochris
Chuma pedra molar corre apressada,
Do Troglodta em meio o cllo esmaga,
E elle s trvas d cerrar-se a vista.
De Lichnor, a lana fulgurante 275
Com fito ao alvo certa se dirige,
O fgado lhe vra, e Crambophgo
Cheirando-lhe a esturro ao fundo volve,
Mas sem ficar no fundo ao alto assma:
Cessou de respirar, morro, e o tanque 280
Vermelho o sangue fez; ella estirada
Nas bordas encalhou, zaguncho acerbo
As veias, intestinos lhe rasgra.
Na praia Limensio espoliava
O gro Tyroguelpho; e Calamintho, 285
trovejra = nada tinha de surprehendedor, e de extraordinario
antes convm muito grande Poesa figurar no Ceo huma b- ca para embocar a tuba, e que desta o som he mais proprio pa- ra signal do combate, que o trovo; por isso de algum modo
paraphrasemos o texto, servindo-nos do outro citado da Iliada que he do mesmo A. (se delle he a Batrachomyomachia) e vem a ser Liv. 21 da Iliada vers. 388
'mf d'eslpigxen m ....
E do no vasto Olympo a trompa o alarme....
m gralha por m.
8 Palavra cujo acento no se reconhece com certeza, possivelmente um acento agudo. (Vide verso 275,
variao grfica).
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Batracomiomaquia Poema
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(26)
Ao vr Peternoglypho horrorisou-se,
Mettendo-se no charco, e sem escudo.
Hydrcharis chum seixo na cachlla
Matou gostosa Elrei Peternophgo,
Das ventas os millos lhe sahro, 290
Manchando negro sangue impuro a terra.
Chum dardo arremettendo Licopnax,
Mata sem culpa ter Borborocte,
Que vida para sempre os olhos feicha.
De rojo pelo cho Cnissidicta 295
O triste Prassophgo o caso vendo
Arrasta pelos ps, no lago o affga,
Sem poder, nem se quer bulir-se o pbre.
De Psicarpax s mos pagou Pelsia
As favas pelos mortos Companheiros, 300
Nas vsceras lhenterra o ferro duro,
No cho o corpo cahe, no Orco a vida.
De lodo Pelobtes, bom punhado,
Nos olhos do contrario d, e o cga;
Mui zangado elle ento do slo extrahe 305
Co a valente mo penhasco enorme
Tamanho, que gemia a terra ao pezo,
E posto ser gigante lhe custra. (*)
Pelbates alcana nos gelhos,
De todo a dextra perna lhesmigalha 310
Por fim no cho baqueia Pelbates.
Segunda vez a elle Craugasdes
Vingana por tirar lhenfia o junco,
Qual sovina no centro do bandulho,
E do tronco ao sacalla a mo robusta 315
Cahio sobre o p a tripalhada. (**)
(*) Para adoarmos o attrevimento da hyperbole, segundo o preceito de Quinctiliano, inserimos o verso que vai em gry- pho: e perguntados, se o encarecimento tornando-se incrivel sem algum salvo conducto augmenta o ridiculo, responderemos,
que sem verosimilhana elle perde todo o chiste, e sainete, sen- do do nosso sentir o grande Boileu na sua Potica, que diz = Il nest beau que le vrai. = S o verdadeiro he bello. (**) Pelo p sentornou a tripalhada. [Var.]
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Batracomiomaquia Poema
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(D 2; 27)
Junto ribeira estava Sitophgo,
Que vendo no visinho arder as barbas
O prlio abandona manquejando,
Nhuma lapa se mirra, e morte escapa. 320
Troxarta a Physgnato ento avana
Ferindo-lhe da planta a extremidade;
Porm a dr, que a punge ao lago a implle.
Apenas semimrta a lombrigou
Para a lympha fugir, e no entralla 325
De novo pobresita se arremea,
E Prasso, que a avistra moribunda
No primo ataque seu lhe toma a frente,
Dardeja o fino junco, e na rodella,
Sem furar-se, do pique a ponta entorta. 330
Entre os Rates hum Principe excellente,
Amado filho do bom Artepibullo,
Exmio joven, muito affeito guerra,
Outro Marte na fora, e na figura,
[Tinha o nome o tafl de Meridrpax,] 335
Que sempre no combate aos mais do calas,
Fez alto junto ao lago, e com basfia
A si dava louvor, vergonha aos Scios;
Dizendo boca cheia, que dara
As Ras bellzes cabo do canastro; 340
Por certo era potente, era hum alarve.
Ento o Pai dos Numes, e dos homens
Das Ras compadecido miserandas,
Pois via muito mal parado o caso,
Decretou a cabea meneando. 345
O Numes, grande mal eu vejo, eu sinto; Zangar me fez no pouco Meridrpax: Ufano sem largar o pgo ostenta As Ras levar morte cubioso. Com Pllas turbulenta o Deos da guerra, 350 Da guerra vo j ambos retirallo, Ainda que he valente, e he soldado.9 Destarte sexpressou, responde Marte.
A derrta das Ras he certa Jve10,
9 Faltam aspas no fim do discurso. 10 Palavra de acentuao duvidosa, possivelmente um acento agudo. (Vide verso 363).
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Batracomiomaquia Poema
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(28)
No vale meo poder, nem mesmo Pllas, 355 Soccrro todava lhe prestemos. Melhor ser, que Tu o raio vibres, Castigo dos Tites, castigo horrendo, A vida lhe tirando, bem que fortes, A cima de quaesquer; arma terrivel 360 Com que o desforme Encdalo atterraste, E mais a gigantona agreste raa.11 Disse: fulmna Jve o raio ardente,
Primeiro trovejou, e o Olympo aballa.
De Jpiter o fogo abrasador 370
Rodando pelo ar das mos lhe va,
E Ras, e Ratos assombrados fico.
Mas os Ratos ceder..! vante sempre
At que sem parar s Ras dm cresta.
Do Co ento s miseras auxilio 375
Mandar acena Jve altitonante.
Horrivel manga surge de Centllas,
Bigorna trazem dura no costado,
Esguelhas no andar, griffos aduncos,
A bocca de tenzes semeda, 380
To rija como so os ssos rijos,
Quaes stras, concha s-costas rutilantes,
Nos hombros, e no drso aselvajadas,
No peito vivos olhos, que so muitos,
Nervosa garra longa em pernas zambras, 385
Manetas, oito ps, cabeas duas,
A quem o vulgo chama Caranguejos;
Cahindo de repente sobre os Ratos,
Caudas, as mos, os ps lhes despedao,
E ja as lanas de cortar canavo. 390
Dos cancros a torquez temendo os Ratos,
Podendo mal soffrer, s trancas dro
Em derrta batida ao pr do Sl,
Hum dia s durando a guerra infausta. 394
FIM.
11 Faltam aspas no fim do discurso.
-
Batracomiomaquia
33
TABELLA (29)
Dos Nomes dos Heres do Poma, por ordem
alphabtica explicada ethymolgicamente.
A 1 ARTEPIBULLO Furtapdo = de po; e de traidor.
2 ARTOPHAGO Pannvoro = da raiz supra, e do v. devorar.
B 3 BORBOROCETE A que dor- me no lodo = de lodo, e de cama.
C 4 CALAMINTHO nveda = Plan- ta, que segundo Dioscorides he vermfuga, ou
anthelminthica, isto he, a que expulsa os ver-
mes do corpo humano; especie de hortela: de
ba, e hortela.
5 CNISSIDIOCTE cheiradr = de odr, cheiro dos assados, e do v,12
perseguir, hir a traz do cheiro &c.
6 CRAMBOPHAGO , couvvora = de couve, e do v. devorar,
devorar couves.
7 CRAUGASIDES gritadora = de
alardo, gritaria. He nome com fei-
o de patronymico.
E 8 EMBASICHRYTO entrapanel- las = do v. entrar, e de panella,
furtllas, comllas.
H 9 HYDROCHARIS a que folga na- gua = agua; e do v. alegrar-se.
10 HYDROMEDUZA Rei dagua de agua, e de moderar, governar,
reinar &c.
11 HYPSIBOAS Berrador = de alto,
e do v. gritar.
L 12 LICHENOR o que lambe homens de lamber, e de homem.
12 , gralha por ..
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Batracomiomaquia Tabela onomstica etimolgica
34
(30)
13 LICOMYLLA lambefarinha da raiz supra, e de farinha.
14 LICOPINAX x lambepinturas = da raiz supra, e de x quadro, painel, pin-
tura.
15 LIMNESIO encharcado = o que vive no charco; de charco, e de vi- da.
16 LIMNOCHARIS a que folga nalaga, no
tanque, nos lagos &c- da origem supra, e do v. folgar, alegrar-se, regosijar-se &c.
M 17 MERIDARPAX o que furta parte x de parte, e de x ladro.
P 18 PELEO lodozo = de lodo, lama &c.
19 PELIDA patronymico da mesma origem
supra.
20 PELOBATES a que anda pelo lodo, da origem supra, e do v. andar.
21 PELUSIA entodada = da origem
supra, e de existente: a que est no lodo.
22 PSICARPAX x furtamigalhas = do v. roubar, e de x migalha.
23 PHYSIGNATO bochechuda = do v. encher de vento, inchar, e de
bochecha.
24 PETERNOGLYPHO re-cal-
canhares = de perna, calcanhar, e do v. ror.
25 PETERNOPHAGO da mes- ma origem supra, e do v. devorar.
26 PETERNOTROCTA da ori- gem
supra, e do v. ror = a que re- pernas
&c.
27 POLYPHON multvoca, de gran- de voz, famosa &c. = de voz, e de
muito.
28 PRASSEO a que se sustenta do alho porro 13.
29 PRASSOPHAGO da mesma
origem supra, e do v. comer = a que
cme similhantes alhos.
S 30 SEUTHLEO a que se nutre de acelgas , que em Grego diz, acelga [herva.]
31 SITOPHAGO pannvoro de
po, e do v. devorar.
13 gralha por .
-
Batracomiomaquia Tabela onomstica etimolgica
35
(31)
T 32 TROGLODITA sevandija, que vive em tcas, em buracos, de buraco, tca,
covil &c. e do v. introduzir-se.
33 TROXARTA x roedr de po = de
roer, e de po.
34 TYROGLYPHO o escavador do
queijo, de queijo, e de escavar,
comer, ror, esboroar &c.
Fim da Tablla.
AVISO.
Declara o Traductor, que tem promptas pa- ra o Prlo as Obras seguintes, que successiva-
mente se publicar; a saber.
Monitrio de Phocilides hum dos Potas Me-
nores Gregos, vertido em Verso Heroico Por-
tuguez. Tinha sido licenciado pela extincta Com-
misso da Censura; em que analyzaremos em No-
ta, huma, que a veneranda velha, por imperti-
nente, l nos pz, com a condio sine qua non,
e que rejeitaremos, e rejeitaria todo o Litterato face da curta observao, que haviamos fei- to sobre o texto em certo lugar: nos quoque gens
sumus et cavalgare sabemus: s com o Palito me-
trico podiamos (segundo nossos principios) res-
ponder represso do pensamento, ou a huma
Commisso Censoria, monstro, que em tempo
Constitucional, no ha nenhum Buffon, que o
classifique.
Odes selectas de Anacreonte traduzidas em
Verso sobre o texto Grego: edio Trajecti ad
Rhenum com as notas de Cornelio de Paw.
Dialogos de Luciano escolhidos.
-
Batracomiomaquia Aviso
36
(32)
Traduco da bella Arte Grega Rudimen- ts of the Greek language for the use of Char-
therouse School. London: 1817 applicada lin-
gua Portugueza.
4 Edylios, os que suppmos melhores de The-
chrito14: e vrias outras Traduces de diversos AA. Prosaicos, e Potas Gregos. Dariamos as Traduces completas de suas Obras, se ti-
vessemos meios.
Annunciar-se-ha a Folhinha Constitu- cional do Traductor, seo A. para o anno de 1836, em tempo competente, protestando des15 de j contra os roubadores do Titulo da sua Pro-
priedade.
Originaes para vender.
Diccionario da Mythologa Grega propria-
mente dita, exemplificado; seguido de varias
dissertaes sobre os Orculos, Theatros, Prin-
cipes, e Generaes Gregos, Argonautas, Ani-
maes consagrados aos Deoses, e Arvores, Sa-
crificios, Sibillas, e Jogos pblicos: flio. Glossario dos termos equvocos da Lingua Por-
tugueza com as suas derivaes. Obra original
em que o A. gastra 14 annos consecutivos, e
em cpia ainda, letra (r): flio pde vr-se. &c. &c.
ERRATAS.16
Pag. 8 lin. 16 em vez de v/ . 304, leia-se 308. 12 lin. 24 leia-se.............................antiquados.
15 lin. 17 leia-se.......................................294.
id. lin. 18 leia-se.........................................394.
14 Palavra de acentuao duvidosa, possivelmente um acento agudo. 15 Falta o hfen. 16 Texto da edio de 1835, no confundir com o aparato crtico dos editores.