bioquÍmica clÍnica na gravidez · ea Éster de acridina edta ethylenediamine tetraacetic acid...

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Universidade de Lisboa Faculdade de Farmácia BIOQUÍMICA CLÍNICA NA GRAVIDEZ Rubina Vanessa Dias Cassaca Relatório de estágio orientado pela Professora Doutora Maria João Monteiro dos Santos Ferreira da Silva e coorientado pela Professora Doutora Maria Cristina Crespo Ferreira Silva Marques Mestrado em Análises Clínicas 2017

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  • Universidade de Lisboa

    Faculdade de Farmácia

    BIOQUÍMICA CLÍNICA NA GRAVIDEZ

    Rubina Vanessa Dias Cassaca

    Relatório de estágio orientado pela Professora Doutora Maria João

    Monteiro dos Santos Ferreira da Silva e coorientado pela Professora

    Doutora Maria Cristina Crespo Ferreira Silva Marques

    Mestrado em Análises Clínicas

    2017

  • Universidade de Lisboa

    Faculdade de Farmácia

    BIOQUÍMICA CLÍNICA NA GRAVIDEZ

    Rubina Vanessa Dias Cassaca

    Relatório de estágio orientado pela Professora Doutora Maria João

    Monteiro dos Santos Ferreira da Silva e coorientado pela Professora

    Doutora Maria Cristina Crespo Ferreira Silva Marques

    Mestrado em Análises Clínicas

    2017

  • III

    Agradecimentos

    Agradeço, especialmente, à supervisora de estágio, que acompanhou e prestou

    todo o seu apoio, não só durante a realização do estágio, como também na elaboração do

    relatório de estágio.

    Doutora Ana Catarina Ferreira Rombo (Especialista em Análises Clínicas, do Laboratório

    de Análises Clínicas Dr. Joaquim Chaves).

    Expresso os meus agradecimentos à orientadora da monografia, pela

    disponibilidade, assim como pela contribuição das sua preciosas críticas e sugestões, e à

    orientadora do estágio pela revisão do relatório e sugestões.

    Doutora Maria João Monteiro dos Santos Ferreira da Silva (Professora Auxiliar, da

    Faculdade de Farmácia da Universidade de Lisboa) e à Doutora Maria Cristina Crespo

    Ferreira Silva Marques (Professora Auxiliar, da Faculdade de Farmácia da Universidade

    de Lisboa).

    A todos os Técnicos e Especialistas em Análises Clínicas do Laboratório Dr.

    Joaquim Chaves dirijo o meu agradecimento, pela disponibilidade e simpatia.

    Finalmente, o meu especial agradecimento aos meus pais que sempre me apoiaram

    incondicionalmente.

  • IV

    Universidade de Lisboa

    Faculdade de Farmácia

    RELATÓRIO DE ESTÁGIO

    Rubina Vanessa Dias Cassaca

    Relatório de estágio orientado pela Professora Doutora Maria Cristina

    Crespo Ferreira Silva Marques e supervisionado pela Especialista em

    Análises Clínicas, Doutora Ana Catarina Ferreira Rombo

    Mestrado em Análises Clínicas

    2017

  • V

    RESUMO

    O presente relatório de estágio resulta da componente Estágio

    Laboratorial/Monografia integrada no plano de estudos do Mestrado em Análises

    Clínicas da Faculdade de Farmácia da Universidade de Lisboa. Este trabalho descreve

    parâmetros analíticos, assim como metodologias e equipamentos contactados durante o

    estágio profissional no Laboratório Dr. Joaquim Chaves nas áreas de Microbiologia,

    Bioquímica, Hematologia, Imunologia, Radioimunoensaio, Química Analítica e Fase

    Pré-Analítica.

    Palavras-chave:

    Análises clínicas; microbiologia; bioquímica; hematologia; imunologia

    ABSTRACT

    This internship report results from the Laboratory Internship/Monograph

    component integrated in the study plan of the Master in Medical Laboratory of the Faculty

    of Pharmacy, University of Lisbon. This work describes analytical parameters, as well as,

    methodologies and equipment contacted during the professional internship at the

    Laboratory Dr. Joaquim Chaves in the areas of Microbiology, Biochemistry, Hematology,

    Immunology, Radioimmunoassay, Analytical Chemistry and Preanalytical Phase.

    Keywords:

    Clinical analysis; microbiology; biochemistry; hematology; immunology

  • VI

    Índice

    Agradecimentos ..................................................................................................................... III

    Resumo ................................................................................................................................... V

    Abstract................................................................................................................................... V

    Índice de Figuras ................................................................................................................ VIII

    Índice de Tabelas ................................................................................................................ VIII

    Abreviaturas ..........................................................................................................................IX

    Introdução ................................................................................................................................ 1

    1. Fase Pré-Analítica ............................................................................................................... 2

    2. Microbiologia ...................................................................................................................... 3

    2.1. Métodos ........................................................................................................................ 4

    2.1.1. Exame Microscópico ............................................................................................. 4

    2.1.2. Exame Cultural ...................................................................................................... 6

    2.2. Testes de Identificação Microbiológica ...................................................................... 11

    2.3. Equipamentos de Ensaio ............................................................................................. 14

    2.3.1. Vitek® 2 Systems 05.01......................................................................................... 14

    2.3.2. Cirtómetro Sysmex UF - 1000i ............................................................................ 16

    2.3.3. Sistema BacT/Alert 3D - 60 ................................................................................. 17

    2.4. Produtos Biológicos .................................................................................................... 17

    2.4.1. Urina Asséptica .................................................................................................... 18

    2.4.2. Trato Urogenital ................................................................................................... 22

    2.4.3. Fezes .................................................................................................................... 29

    2.4.4. Exsudado Ocular e Exsudado Auricular .............................................................. 34

    2.4.5. Sistema Respiratório Superior ............................................................................. 37

    2.4.6. Sistema Respiratório Inferior ............................................................................... 39

    2.4.7. Hemocultura ........................................................................................................ 42

    2.5. Antibiograma .............................................................................................................. 44

    2.5.1. Microdiluição ....................................................................................................... 44

    2.5.2. E-test .................................................................................................................... 45

    2.5.3. Método de difusão em placa de Kirby-Bauer ...................................................... 46

    3. Core Laboratorial............................................................................................................... 48

    4. Hematologia ...................................................................................................................... 48

    4.1. Hemograma................................................................................................................. 49

    4.2. Equipamentos de Ensaio ............................................................................................. 50

    4.2.1. ADVIA® 2120 Hematology System ...................................................................... 50

    4.2.2. ADVIA® 2120 Hematology System with Autoslide .............................................. 57

    4.2.3. Analisador de Velocidade de Sedimentação VES - MATIC cube 200 ................. 59

    4.2.4. Analisador Imunohematológico AutoVue® Innova .............................................. 60

    4.2.5. VARIANT™ II Hemoglobin Testing System ........................................................ 62

    4.2.6. Analisador BCS® XP ............................................................................................ 63

    4.3. Técnicas Manuais ....................................................................................................... 65

    4.3.1. Determinação do Índice de Atividade da Fosfatase Alcalina Leucocitária ......... 65

    5. Bioquímica ........................................................................................................................ 66

    5.1. Equipamentos de Ensaio ............................................................................................. 67

  • VII

    5.1.1. ADVIA® 2400 Chemistry System ......................................................................... 67

    5.1.2. Analisador de urinas Clinitek Atlas® ................................................................... 68

    5.1.3. ADVIA Centaur® Immunoassay System ............................................................... 68

    5.1.4. IMMULITE® 2000 Immunoassay System ............................................................ 70

    5.1.5. COBAS e411 ........................................................................................................ 70

    5.1.6. CAPILLARYS® 2 .................................................................................................. 72

    5.2. Analitos ....................................................................................................................... 72

    5.2.1. Metabolismo Proteico .......................................................................................... 72

    5.2.2. Metabolismo Lipídico .......................................................................................... 76

    5.2.3. Metabolismo dos Hidratos de Carbono ............................................................... 78

    5.2.4. Função Hepática .................................................................................................. 80

    5.2.5. Função Renal ....................................................................................................... 83

    5.2.6. Função Pancreática .............................................................................................. 87

    5.2.7. Função Tiroideia .................................................................................................. 89

    5.2.8. Metabolismo Ósseo ............................................................................................. 90

    5.2.9. Eletrólitos ............................................................................................................. 92

    5.2.10. Marcadores Cardíacos........................................................................................ 93

    5.2.11. Marcadores Tumorais ........................................................................................ 94

    6. Química Analítica .............................................................................................................. 96

    7. Imunologia ......................................................................................................................... 97

    7.1. Técnicas de Diagnóstico ............................................................................................. 97

    7.1.1. ELISA .................................................................................................................. 97

    7.1.2. Imunofluorescência .............................................................................................. 98

    7.1.3. Imunoblot ............................................................................................................. 98

    7.1.4. Imunodifusão ....................................................................................................... 99

    7.1.5. Imunocromatografia ............................................................................................ 99

    7.1.6. Aglutinação ........................................................................................................ 100

    7.2. Serologia Infeciosa ................................................................................................... 100

    7.2.1. Hepatite A .......................................................................................................... 100

    7.2.2. Hepatite B .......................................................................................................... 101

    7.2.3. Hepatite C .......................................................................................................... 103

    7.2.4. VIH .................................................................................................................... 103

    7.3. Rastreio na Gravidez ................................................................................................. 105

    7.3.1. CMV .................................................................................................................. 105

    7.3.2. Rubéola .............................................................................................................. 107

    7.3.3. Toxoplasma gondii ............................................................................................. 108

    7.3.4. Sífilis .................................................................................................................. 109

    7.4. Autoimunidade ......................................................................................................... 110

    8. Radioimunoensaio ........................................................................................................... 111

    9. Controlo da Qualidade ..................................................................................................... 112

    9.1. Controlo de Qualidade Interno ................................................................................. 112

    9.2. Controlo de Qualidade Externo ................................................................................ 113

    Conclusão ............................................................................................................................ 114

    Referências Bibliográficas ................................................................................................... 115

  • VIII

    Índice de Figuras

    Figura 1: Citograma BASO obtido a partir de uma amostra de um doente ................... 52

    Figura 2: Histograma de volume de eritrócitos ............................................................ 53

    Figura 3: Histograma de concentração de hemoglobina de eritrócitos .......................... 54

    Figura 4: Citograma de volume e concentração de hemoglobina dos eritrócitos ........... 54

    Figura 5: Citograma de dispersão de plaquetas ............................................................ 55

    Figura 6: Citograma de absorção e dispersão de reticulócitos ...................................... 56

    Figura 7: Citogramas PEROX ..................................................................................... 57

    Figura 8: Ilustração e classificação da reação CAT ...................................................... 60

    Figura 9: Imunoensaio de captura de anticorpos .......................................................... 70

    Figura 10: Reação de eletroquimioluminescência à superfície do elétrodo ................... 71

    Índice de Tabelas

    Tabela 1: Níveis de identificação ................................................................................ 15

    Tabela 2: Microrganismos causadores de ITU ............................................................. 19

    Tabela 3: Defesas do trato urogenital e flora saprófita colonizadora ............................ 22

    Tabela 4: Infeções genitais e respetivos agentes patogénicos ....................................... 23

    Tabela 5: Doenças mais comuns no trato urogenital masculino e feminino .................. 24

    Tabela 6: Meios de cultura (trato urogenital) ............................................................... 29

    Tabela 7: Agentes causadores de disenteria ................................................................. 30

    Tabela 8: Principais mecanismos fisiopatológicos e os respetivos agentes patogénicos 31

    Tabela 9: Meios de cultura utilizados na coprocultura ................................................. 31

    Tabela 10: Parasitas intestinais mais frequentes ........................................................... 33

    Tabela 11: Meios de cultura (exsudado ocular e auricular) .......................................... 36

    Tabela 12: Microrganismos causadores de infeção no sistema respiratório superior..... 37

    Tabela 13: Meios de cultura (sistema respiratório superior) ......................................... 38

    Tabela 14: Agentes patogénicos causadores de infeção no trato respiratório inferior ... 40

    Tabela 15: Critérios de classificação para amostras de expetoração ............................. 41

    Tabela 16: Critérios de semiquantificação aplicados a BAAR ..................................... 41

    Tabela 17: Meios de cultura (expetoração) .................................................................. 41

    Tabela 18: Meios de cultura utilizados na hemocultura ............................................... 43

    Tabela 19: Antibióticos testados nas cartas de TSA, adaptadas ao sistema Vitek® 2 ... 45

    Tabela 20: Antibióticos utilizados no método de Kirby-Bauer ..................................... 47

    Tabela 21: Alterações morfológicas reportáveis .......................................................... 58

    Tabela 22: Alarmes emitidos pelo equipamento Advia® 2120 ..................................... 59

    Tabela 23: Fenotipagem ABO/Rh ............................................................................... 61

    Tabela 24: Proteínas plasmáticas e as suas respetivas frações ...................................... 74

    Tabela 25: Constituição do imunoblot para o VIH 1 e 2 ............................................ 104 Tabela 26: Critérios de classificação CRSS ............................................................... 105

  • IX

    Abreviaturas

    ADH Anti diuretic hormone - Hormona Antidiurética

    ADN Ácido Desoxirribonucleico

    AES Advanced Expert System™

    AgHBc Antigénio do core do Vírus da hepatite B

    AgHBe Antigénio de replicação viral do Vírus da hepatite B

    AgHBs Antigénio de superfície do Vírus da hepatite B

    ALT Alanina Oxoglutarato Aminotransferase

    ARN Ácido Ribonucleico

    AST Aspartato Oxoglutarato Aminotransferase

    BAAR Bacilos Álcool-Ácido Resistentes

    CAM Gelose Campylosel

    CAN Gelose chromIDTM Candida

    CDC Centers for Disease Control and Prevention

    CHGM Concentração de Hemoglobina Globular Média

    CK-MB Creatina Quinase fração MB

    CLED Gelose CLED

    CLSI Clinical and Laboratory Standards Institute

    CMI Concentração Mínima Inibitória

    CMV Citomegalovírus

    CNA Gelose Columbia ANC

    COS Gelose Columbia

    CPS Gelose chromIDTM CPS

    CQE Controlo de Qualidade Externo

    CQI Controlo de Qualidade Interno

    CRSS Consortium for Retrovirus Serology Standardization

    cTnI Troponina I

    cTnT Troponina T

    DGS Direção-Geral da Saúde

    EAM Enfarte Agudo do Miocárdio

    EA Éster de Acridina

    EDTA Ethylenediamine Tetraacetic Acid

    ELISA Enzyme-Linked Immunosorbent Assay

    ESBL Extended-Spectrum Beta-Lactamases

    FA Fosfatase Alcalina

    FTA-abs Fluorescent Treponemal Antibody absorption

    GAR Gelose Gardnerella

    GFR Glomerular filtration rate - Taxa de Filtração Glomerular

    GN Gram Negativos

    GP Gram Positivos

    HAEM Gelose Chocolate Haemophilus

    Hb Hemoglobina

    HbA1c Hemoglobina Glicada

    HDL Higth Density Lipoproteins

    HEKT Gelose Hektoen

    HGM Hemoglobina Globular Média

    HPFH Persistência Hereditária de Hemoglobina Fetal

    Ht Hematócrito

    IAFAL Índice de Atividade da Fosfatase Alcalina Leucocitária

  • X

    ID Identificação Microbiológica

    IF Imunofluorescência

    Ig Imunoglobulina

    IRA Índice Relativo de Avidez

    ITU Infeções do Trato Urinário

    LDL Low Density Lipoprotein

    LJ-T Meio de Lowenstein-Jensen

    LMC Leucemia Mieloide Crónica

    MCK Gelose MacConkey

    MSA Gelose Chapman

    NAD Nicotinamida Adenina Dinucleótico oxidado

    NADH Nicotinamida adenina dinucleótico reduzido

    PAI Pesquisa de Anticorpos Irregulares

    PCR Polymerase Chain Reaction

    PTH Parathormone - Paratormona

    PTOG Prova de Tolerância Oral à Glicose

    PVX Gelose Chocolate PolyViteX

    RBC Contagem de Eritrócitos

    RDW Índice de Dispersão Eritrocitário

    RIA Radioimunoensaio

    SCS Gelose Schaedler

    SGC Gelose Sabouraud Gentamicina Cloranfenicol

    STRB Gelose chromIDTM Strepto B

    TA Temperatura Ambiente

    TP Tempo de Protrombina

    TPHA Treponema pallidum haemaglutination assay

    TSA Teste de Suscetibilidade a Antibióticos

    TSH Thyroid-stimulating hormone - Hormona Estimuladora da Tiroide

    TT Tempo de Trombina

    TTPa Tempo de Tromboplastina Parcial ativada

    T3 Triiodotironina

    T4 Tetraiodotironina (T4)

    UFC Unidades Formadoras de Colónias

    VDRL Venereal Disease Research Laboratory

    VGM Volume Globular Médio

    VHA Vírus da Hepatite A

    VHB Vírus da Hepatite B

    VHC Vírus da Hepatite C

    VIH Vírus da Imunodeficiência Humana

    VLDL Very Low Density Lipoproteins

    VS Velocidade de Sedimentação

    WHO World Health Organization

    YER Gelose Yersinia

  • Rubina Cassaca Relatório de Estágio

    Mestrado em Análises Clínicas

    1

    Introdução

    O presente relatório de estágio resulta do Estágio de natureza profissional em

    Análises Clínicas, como parte integrante do plano de estudos do Mestrado em Análises

    Clínicas da Faculdade de Farmácia da Universidade de Lisboa. Realizei o estágio no

    Laboratório de Análises Clínicas Dr. Joaquim Chaves, entre fevereiro e agosto de 2016,

    com a duração de 1080 horas, sob a orientação da Dr.ª Maria Cristina Crespo Ferreira

    Silva Marques, Professora Auxiliar, da Faculdade de Farmácia da Universidade de

    Lisboa, e supervisão da Dr.ª Ana Catarina Ferreira Rombo, Especialista em Análises

    Clínicas pela Ordem dos Farmacêuticos, Responsável de área substituta do Core

    Laboratorial.

    A atividade técnica do Laboratório Dr. Joaquim Chaves é coordenada pelo Diretor

    Técnico, Dr. Carlos Cardoso. O laboratório efetua análises no âmbito da Bioquímica

    Clínica, Endocrinologia, Hematologia, Imunohematologia, Imunologia, Alergologia,

    Microbiologia, Biologia Molecular, Genética Médica e Anatomia Patológica. O

    laboratório é uma entidade certificada, de acordo com os requisitos da Norma NP-EN-

    ISO 9001:2008, associada à Norma NP-EN-ISO-IEC-17025:2005 que define os

    requisitos gerais de competência para o laboratório de ensaio e calibração.

    O presente estágio foi realizado com o intuito de providenciar a integração no

    meio profissional e contactar com os profissionais da área e, deste modo, aprofundar

    conhecimentos técnico-científicos relacionados com os processos envolvidos na rotina

    laboratorial, como também a aplicação de conhecimentos adquiridos ao longo da parte

    curricular do mestrado, e da observação prática do funcionamento laboratorial,

    nomeadamente das técnicas aplicadas na análise de parâmetros de rotina, como dos

    parâmetros não considerados de rotina, das técnicas de colheita adequadas para cada

    determinação em diversos produtos biológicos, dos processos envolvidos no controlo e

    garantia da qualidade e da correta interpretação dos resultados obtidos.

    O presente relatório de estágio descreve os principais parâmetros analíticos

    aprendidos em cada valência, nomeadamente métodos aplicados, descrição dos

    equipamentos utilizados e a importância/significado clínico. Uma vez que o Laboratório

    Dr. Joaquim Chaves realiza uma vasta quantidade de parâmetros analíticos, sendo-me

    impossível descreve-los todos, limitei-me a referir, no meu entender, alguns dos

    parâmetros mais importantes e/ou frequentes no laboratório.

  • Rubina Cassaca Relatório de Estágio

    Mestrado em Análises Clínicas

    2

    1. Fase Pré-Analítica

    A fase pré-analítica engloba todos os processos envolvidos, desde da preparação

    do Utente, colheita da amostra, triagem, até ao envio da amostra para análise.

    A grande maioria dos erros laboratoriais estão associados à fase pré-analítica. Os

    erros podem ser minimizados cumprindo os requisitos relacionados com a preparação do

    paciente, a colheita (técnica, material utilizado e identificação das amostras biológicas),

    acondicionamento, conservação, transporte para o laboratório, receção, verificação e

    processamento para posterior análise.

    Na colheita da amostra deve-se considerar as variáveis controláveis que

    influenciam os resultados, as quais incluem variações associadas a fatores biológicos

    controláveis como, exercício e treino físico, variação circadiana, influência da dieta e

    fármacos, postura e imobilização. Quanto aos fatores não controláveis (idade, género,

    medicação, doenças existentes, etc.) deve-se ter o seu conhecimento, para tal é realizado

    um inquérito na altura da colheita, de modo a que os resultados estejam adaptados à

    situação do utente (Burtis C. et al., 2015).

    Na área reservada às colheitas, no laboratório central, são colhidos vários tipos de

    amostras biológicas, como urina, sangue, saliva, suor e exsudados. Durante o estágio tive

    a oportunidade de observar a prática de colheitas de sangue venoso. Alguns dos aspetos

    importantes durante o procedimento da punção venosa são: a confirmação dos dados e a

    obtenção de informações relevantes (inquérito) acerca do utente (universal a qualquer tipo

    de colheita); a confirmação da prescrição médica, verificado o tipo de análises necessárias

    e a entrega das restantes amostras solicitadas (exemplo: urina e fezes); a correta rotulagem

    de todos os tubos necessários; a utilização adequada do tipo de agulha e a sua correta

    inserção, evitando hematomas, de forma a obter uma amostra integra (sem hemólise) e

    com volume suficiente; a duração da aplicação do garrote, quando este se prolonga por

    mais de 2-3 minutos pode causar hemoconcentração; homogeneização adequada e

    transporte atempado.

    Existem vários tipos de tubos de colheita, designadamente sem anticoagulante

    (ativa a cascata da coagulação, obtém-se o soro, usado sobretudo em bioquímica), e com

    anticoagulante, nomeadamente o EDTA (Ethylenediamine Tetraacetic Acid) de sódio ou

    potássio (obtém-se sangue total, utilizado em técnicas moleculares e na hematologia, por

    exemplo, na execução de hemogramas), o citrato trissódico (obtém-se plasma, utilizado

    na hematologia para provas da coagulação) e a heparina (colhe-se sangue total, utilizado

  • Rubina Cassaca Relatório de Estágio

    Mestrado em Análises Clínicas

    3

    na determinação de metais e gasometria). O EDTA previne a coagulação ao remover o

    cálcio ionizado, através de um processo de quelação, resultando a formação de um

    complexo entre o cálcio e o EDTA, e permite a preservação celular, assim como a

    conservação da morfologia celular. O citrato impede a coagulação ao neutralizar os iões

    de cálcio, os quais formam um complexo não ionizado (citrato de cálcio). A heparina é

    um anticoagulante natural (produzida por basófilos e mastócitos) que inibe a coagulação

    ao impedir a formação da rede fibrina, através da catalisação da inativação do fator

    trombina (IIa), pois a heparina atua como co-fator de ativação da enzima anti-trombina,

    a qual inativa vários fatores de coagulação, principalmente, a trombina (Bishop M. et al.,

    2010; Burtis C. et al., 2015).

    A triagem das amostras provenientes dos vários postos de colheita, hospitais e

    domicílios, ocorre no laboratório central. A triagem inicia-se com o registo manual de

    entrada, no sistema informático (eDeiaLab), dos vários tipos de amostras, através de um

    sistema de leitura de código de barras, onde é assinalado os tubos em falta associados à

    prescrição médica (caso se aplique). Na triagem efetua-se a centrifugação dos tubos, a

    fim de se separar o plasma, ou soro, dos restantes componentes celulares sanguíneos, e a

    medição do volume das amostras de urina a tempo determinado. Nesta área encontram-

    se os equipamentos Genesis FE500 (Tecan), os quais efetuam a separação das várias

    amostras, através da leitura do código de barras, pelas diferentes valências, de acordo com

    os testes requisitados. As amostras não separáveis pelo equipamento, como as amostras

    destinadas as valências de Microbiologia, Anatomia Patológica e Biologia Molecular, são

    separadas manualmente.

    2. Microbiologia

    A área da Microbiologia Clínica compreende a bacteriologia, micologia e a

    parasitologia. O laboratório realiza a análise de diversos produtos biológicos, sendo os

    mais frequentes as urinas assépticas, as coproculturas e os exsudados, sobretudo os

    vaginais.

    A atividade da área de Microbiologia inicia-se com a triagem dos produtos

    biológicos, efetuada pelos Técnicos de Análises Clínicas da área, de acordo com a

    diferenciação requerida face às exigências impostas relacionadas com a segurança e

    procedimentos técnicos específicos (exemplo: condições de conservação,

    acondicionamento e processamento pré-analítico), de forma assegurar a viabilidade dos

  • Rubina Cassaca Relatório de Estágio

    Mestrado em Análises Clínicas

    4

    microrganismos patogénicos e evitar a contaminação ou desenvolvimento da flora

    comensal.

    A área está organizada de modo a que o fluxo de trabalho cumpra, sempre que

    possível, o princípio de “marcha em frente”, reduzindo ao máximo o risco de

    contaminação cruzada. Portanto, a área encontra-se dividida em zonas específicas,

    nomeadamente triagem de amostras, processamento de produtos, identificação e

    antibiograma, avaliação de exames microbiológicos, parasitologia e citometria de fluxo

    (urinas).

    2.1. Métodos:

    2.1.1. Exame Microscópico:

    Exame direto (a fresco):

    O principal objetivo do exame é a observação (forma e mobilidade celular) dos

    microrganismos vivos (parasitas, bactérias, leveduras e fungos), na amostra biológica. É

    utilizado na deteção e identificação de parasitas nas fezes e em exsudados vaginais. O

    exame é, também, útil na avaliação semiquantitativa de elementos celulares e não

    celulares e de microrganismos.

    Exame direto após coloração:

    Utiliza-se a coloração de Gram e, em determinadas situações, a coloração Álcool-

    ácido. Este exame é útil para avaliar qualitativamente e semiquantitativamente a riqueza

    da amostra em elementos celulares e microbiológicos, bem como a sua disposição e

    morfologia. A coloração é efetuada pelo aparelho de coloração VWR

    (MIDAS/Mirastainer).

    Coloração Gram:

    É uma técnica de diferenciação microbiológica sobretudo utilizada para distinguir

    as bactérias Gram positivas das Gram negativas. Permite a determinação da morfologia

    celular, tamanho e disposição. É utilizada em produtos biológicos e em colónias

    provenientes dos meios de cultura, sendo, usualmente, o primeiro teste de diferenciação.

    Em alguns casos permite-nos a identificação presuntiva de um microrganismo ou a

    eliminação da hipótese de estar presente um determinado microrganismo.

    A técnica consiste em utilizar uma coloração primária com um corante básico

    (cristal violeta), após a fixação da amostra. Seguidamente, aplica-se uma solução

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    Mestrado em Análises Clínicas

    5

    contendo iodo (agente fixador - forma um complexo com o corante, permitindo o aumento

    da afinidade da célula para o mesmo). Depois, procede-se à descoloração com álcool

    (remove a coloração das bactérias Gram negativas). Por fim, aplica-se a safranina (corante

    básico) que cora as Gram negativas. As bactérias Gram positivas adquirem uma coloração

    púrpura, enquanto as Gram negativas obtêm uma coloração vermelho a rosa (Leboffe M.

    et al., 2011).

    A técnica baseia-se na diferença da constituição das paredes celulares entre as

    Gram negativas e as Gram positivas. O agente descorante (álcool) atua nos lípidos (extrai-

    os), tornando a parede mais porosa das Gram negativas e incapaz de reter o complexo

    cristal violeta/iodo. Contrariamente, as Gram positivas, devido ao facto de terem uma

    camada mais espessa de peptidoglicano e um maior número de cross-linking (devido aos

    ácidos teicóicos), retêm o complexo com uma maior eficácia, o que as torna menos

    suscetíveis à descoloração (Leboffe M. et al., 2011; Tortora G. et al., 2013).

    Coloração Álcool-ácido:

    Neste caso, utiliza-se o método de Kinyoun (uma variação da coloração de Ziehl-

    Neelson). É uma coloração diferencial, utilizada para identificar e quantificar Bacilos

    álcool-ácido resistentes (BAAR), na pesquisa de bactérias do género Mycobacterium. A

    técnica é útil no diagnóstico preliminar da tuberculose, tendo um valor preditivo superior

    a 90% em amostras de expetoração. Também, é útil para a monitorização da terapêutica

    antibiótica e para a determinação do grau de contagiosidade. O método baseia-se na

    presença de ácido micólico na parede celular de bactérias álcool-ácido resistentes. Este

    componente da parede possibilita uma maior afinidade para a coloração e uma maior

    resistência à descoloração microbiológica, pelo tratamento com uma solução ácido-

    álcool. Primeiro, faz-se uma coloração com a carbolfucsina (composto fenólico e

    lipossolúvel, com a capacidade de penetrar na parede celular). Uma vez que o corante

    está concentrado e, também, devido à sua elevada lipossolubilidade, não é necessário

    aquecimento da preparação (utilizado no método de Ziehl-Neelsen), pois o corante entra,

    igualmente, para o interior da célula. Depois, procede-se à descoloração com uma solução

    ácido-álcool (remove a coloração de células não BAAR) e, por fim, aplica-se o azul de

    metileno (contraste). O fundo é corado de azul para facilitar a visualização dos BAAR,

    os quais apresentam uma coloração vermelha a púrpura e são os únicos que resistem à

    coloração álcool-ácido (Koneman E. et al., 1997; Leboffe M. et al., 2011; Tortora G. et

    al., 2013).

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    6

    2.1.2. Exame Cultural

    No diagnóstico de infeções bacterianas é fundamental a realização da pesquisa do

    agente por exame cultural. Note-se que no diagnóstico do agente infecioso é, também,

    importante, quando aplicável, a realização do teste de suscetibilidade aos antimicrobianos

    e a pesquisa de antigénios específicos.

    Neste exame é crucial a manutenção da viabilidade da bactéria, logo é importante

    o cumprimento das normas de colheita e de transporte, a fim de não destruir as bactérias

    ou de inibir o crescimento microbiológico. Deve ser efetuado, sempre que possível, antes

    da terapêutica antimicrobiana, de forma a obtermos uma resposta fiável.

    No exame cultural é importante selecionarmos corretamente os meios, de acordo

    com os microrganismos que esperamos encontrar em cada produto biológico, assim como

    adequarmos corretamente as condições de incubação (atmosfera e temperatura) ótimas ao

    desenvolvimento dos microrganismos de interesse.

    O objetivo é detetar e isolar o(s) microrganismo(s) de interesse, logo é importante

    selecionar as colónias a isolar, a fim de proceder à identificação e/ou antibiograma.

    Meios de Cultura (Manual de Meios de Cultura e Suplementos, 2013)

    ✓ Gelose Columbia + 5% de Sangue de Carneiro (COS)

    O COS (meio não seletivo) contém uma mistura de peptonas, que torna o meio

    indicado para o crescimento de bactérias exigentes, como Streptococcus e Listeria, e

    sangue de carneiro que permite o crescimento da maior parte das espécies bacterianas e a

    visualização da hemólise, a qual é um critério fundamental para a orientação da

    identificação. Pode, também, ser utilizado para o isolamento de microrganismos

    anaeróbios.

    Quanto à expressão da hemólise, esta pode ser uma α-hemólise (observando-se

    uma coloração esverdeada, contornando as colónias) ou uma β-hemólise (visualiza-se

    uma zona clara por baixo ou à volta das colónias).

    ✓ Gelose Mac Conkey (MCK)

    O meio seletivo permite a diferenciação de enterobactérias. A gelose contém

    cristal violeta, que possibilita a demonstração da fermentação da lactose pela mudança da

    coloração do meio (vermelho neutro). Deste modo, as bactérias fermentadoras da lactose

    originam colónias vermelhas ou rosa, por vezes, contornadas por um halo de sais biliares.

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    Os microrganismos não fermentadores da lactose geram colónias incolores ou bege ténue.

    Os sais biliares, juntamente com o cristal violeta, inibem o crescimento da maioria das

    bactérias Gram positivas.

    ✓ Gelose Chocolate Haemophilus (HAEM)

    É um meio seletivo que permite, a partir de uma amostra polimicrobiana, o

    isolamento das diferentes espécies de Haemophilus. Contém uma base nutritiva,

    enriquecida em hemina e NAD (nicotinamida adenina dinucleótico), os quais advêm do

    PolyViteX e da hemoglobina. Inclui, igualmente, uma associação de antifúngicos e

    antibióticos, que inibem o crescimento da maioria das bactérias Gram positivas e das

    leveduras, tornando o meio seletivo.

    ✓ Gelose Chocolate PolyViteX (PVX)

    É um meio de isolamento, concebido para espécies com necessidades nutricionais

    exigentes, como a Neisseria, Streptococcus pneumoniae e Haemophilus. O isolamento de

    espécies exigentes é proporcionado pela adição de hemina e NAD, ao meio.

    ✓ Gelose Chapman (MSA)

    Destina-se ao isolamento de Staphylococcus. O meio contém manitol que permite

    distinguir as bactérias fermentadoras, das não fermentadoras, do manitol. As bactérias

    fermentadoras originam colónias amarelas (critério para a orientação da identificação de

    Staphylococcus aureus). O meio contém um elevado teor em cloreto de sódio que

    restringe o crescimento de alguns microrganismos.

    ✓ Gelose Gardnerella (GAR)

    É um meio de isolamento seletivo para a Gardnerella vaginalis. Contém

    antibióticos (inibem a maioria das leveduras e microrganismos) e sangue humano, que

    facilita o crescimento e possibilita a visualização da β-hemólise à volta das colónias, que

    quando obtida, em gelose de sangue humano, significa que existe uma elevada

    probabilidade de ser G. vaginalis.

    ✓ Gelose Schaedler + 5% de Sangue de Carneiro (SCS)

    A gelose é um meio de isolamento, reservado à pesquisa de microrganismos

    estritamente anaeróbios e anaeróbios facultativos, em hemoculturas. O meio contém

    fatores de crescimento, como a hemina, extrato de levedura, vitamina K3 e sangue de

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    carneiro. O desenvolvimento das espécies anaeróbias é favorecido pela adição de um

    agente redutor (L-cistina) e glucose altamente concentrada.

    ✓ Gelose CLED (CLED)

    Este meio de isolamento destina-se a amostras urinárias. A gelose permite a

    diferenciação dos microrganismos fermentadores da lactose (exemplo: E. coli) e impede

    o desenvolvimento de Proteus. As bactérias lactose positivas, através da acidificação do

    meio, geram colónias amarelas a amarelas-pálidas, enquanto os microrganismos não

    fermentadores da lactose originam colónias verdes, azuis ou incolores.

    ✓ Gelose Hektoen (HEKT)

    Destina-se ao isolamento seletivo e diferencial de Salmonella e Shigella, em

    coproculturas. O meio tem como princípio a fermentação, de um, dos três açúcares,

    incluídos no meio (lactose, sacarose e salicina). As colónias de interesse são verdes ou

    azuis-esverdeadas (não há acidificação do meio), já as restantes são amarelas-salmão ou

    amarelas (devido à acidificação do meio). O meio contém sais biliares e corantes (citrato

    de ferro amoniacal, azul de bromotimol e fuscina ácida) que inibem o desenvolvimento

    de bactérias Gram positivas e limitam o crescimento de Proteus. O meio, também, contém

    hipossulfito de sódio, o que permite a distinção de bactérias produtoras de sulfureto de

    hidrogénio (H2S - reduzem o composto adicionado ao meio), através da formação de um

    centro negro, na colónia. Após a incubação, as colónias de Salmonella são verdes ou

    azuis-esverdeadas, com ou sem centro negro, enquanto as de Shigella são da mesma cor,

    mas sem centro negro.

    ✓ Gelose Yersinia CN (YER)

    Meio de isolamento seletivo de Yersinia (coproculturas). O meio contém

    cefsulodina, irgasan e novobiocina, responsáveis pela seletividade do meio. O irgasan

    (contém colato, desoxicolato, cristal violeta e antibióticos) inibe o desenvolvimento de

    bactérias Gram positivas e a maioria das bactérias Gram negativas. O manitol e o

    vermelho neutro, possibilitam a diferenciação da espécie pretendida, através da

    coloração. As colónias de Yersinia diferenciam-se das restantes bactérias, pela coloração

    rosa escuro a vermelho (devido à fermentação do manitol) ou, por vezes, incolor com

    centro colorido, e, ainda, podem apresentar um precipitado (à volta da colónia).

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    ✓ Sangue Desfibrinado de Carneiro ou Cavalo (Todd Hewitt Quilaban)

    Meio de enriquecimento, adaptado ao crescimento de bactérias com necessidades

    nutricionais exigentes. Além de permitir o desenvolvimento de bactérias com um

    crescimento, ligeiramente mais lento, também permite a visualização da hemólise. Após

    a utilização do meio, a cultura é repicada para meios seletivos.

    ✓ Caldo Selenito F

    O caldo é um meio de enriquecimento que favorece o crescimento da Salmonella

    (em colheita de fezes). O caldo é constituído por peptonas de caseína, carne e lactose, que

    favorecem o crescimento das espécies bacterianas, sobretudo as de crescimento mais

    lento, como a Salmonella. Após o enriquecimento, a cultura é repicada para meios

    seletivos.

    ✓ Gelose Sabouraud Gentamicina Cloranfenicol (SGC)

    Meio seletivo, indicado para o isolamento de fungos filamentosos e leveduras. A

    presença de glicose e peptonas, favorece o crescimento de espécies fúngicas. A

    gentamicina e o cloranfenicol inibem a maioria das bactérias Gram positivas e Gram

    negativas e melhora a seletividade, em relação a algumas espécies que possam exibir

    resistência à gentamicina, como o Streptococcus e o Proteus.

    ✓ Gelose Columbia ANC + 5% de Sangue de Carneiro (CNA)

    Indicado para o isolamento seletivo de espécies bacterianas exigentes (bactérias

    Gram positivas). O meio contém ácido nalidíxo e colimicina, que inibem a maioria dos

    Gram negativos e dos Bacillus. Permite a visualização da hemólise, devido à presença de

    sangue. Também contém uma mistura de peptonas adaptadas a bactérias exigentes, como

    a Listeria e Streptococcus.

    ✓ Gelose Campylosel (CAM)

    Utilizada no isolamento seletivo de Campylobacter intestinais, como C. jejuni e

    C. coli em coproculturas. O meio contém antibióticos, antifúngicos e sangue de carneiro,

    que facilitam o crescimento da espécie em causa. O Campylobacter cresce em colónias

    pequenas e cinzentas, ao longo das estrias da sementeira.

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    ✓ Gelose chromIDTM Strepto B (STRB)

    Meio cromogénico seletivo para a deteção de Streptococcus do grupo B de

    Lancefield, nomeadamente S. agalactiae, em recém-nascidos e mulheres grávidas. É

    composta por uma mistura de peptonas, três substratos cromogénicos e antibióticos, que

    permitem a deteção de S. agalactiae (exibe uma coloração rosa-vermelho).

    ✓ Meio de Lowenstein-Jensen (LJ-T)

    Destina-se à cultura de micobactérias, como o Mycobacterium tuberculosis. É um

    meio de enriquecimento, constituído por ovo, asparagina e fécula, os quais beneficiam o

    crescimento de micobactérias. Após a incubação, o M. tuberculosis apresenta colónias

    com aspeto “couve-flor”.

    ✓ Gelose chromIDTM CPS® (CPS)

    É um meio cromogénico destinado ao isolamento e identificação de espécies

    bacterianas em colheitas urinárias. Possibilita a identificação direta de Escherichia coli,

    Enterococcus, KESC (Klebsiella, Enterobacter, Serratia e Citrobacter) e Proteeae. O

    meio permite a contagem das bactérias (unidades formadoras de colónias - UFC), através

    da utilização de um método padronizado de sementeira. O meio é composto por uma base

    nutritiva (mistura de peptonas) e dois substratos cromogénicos, que revelam a respetiva

    atividade enzimática. A gelose também contém uma elevada concentração de agar, que

    delimita a invasão do meio pelo Proteus.

    Relativamente à identificação, as colónias de E. coli apresentam uma coloração

    rosa a vermelho escuro (ou translúcida com o centro rosa a vermelho escuro), enquanto

    os KESC exibem uma coloração verde azulado a azulado-cinza, Enterococcus turquesa e

    Proteus beije com um halo castanho. Utiliza-se o meio só para a identificação direta de

    E. coli.

    ✓ Gelose chromIDTM Candida (CAN)

    Meio cromogénico destinado ao isolamento seletivo de leveduras e à identificação

    direta de Candida albicans. Permite a identificação presuntiva de um conjunto de

    espécies, que incluem C. tropicalis, C. lusitaniae e C. Kefyr. A C. albicans apresenta uma

    coloração azul, devido à hidrólise específica de um substrato cromogénico de

    hexosaminidase.

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    2.2. Testes de Identificação Microbiológica:

    ✓ Teste da Catalase

    Permite identificar a presença da enzima catalase. É utilizado na distinção dos

    Staphylococcus (catalase positiva), dos Streptococcus (catalase negativa), orientando a

    identificação definitiva. A enzima hidrolisa o peróxido de hidrogénio (H2O2) em água

    (H2O) e oxigénio (O2). Verifica-se a realização da hidrólise pela libertação de oxigénio

    (há a formação de “pequenas bolhas”).

    ✓ Identificação de Staphylococcus aureus

    Utiliza-se o Kit de identificação rápida Pastorex™ Staph-Plus. O teste contém

    partículas de látex (reagente) sensibilizadas com anticorpos monoclonais específicos, que

    permitem detetar os polissacarídeos capsulares de S. aureus, a proteína A (presente na

    parede celular) e, também, possui um fator de afinidade do fibrinogénio (igualmente,

    denominado de coagulase ligada ou fator de aglutinação). O teste permite detetar bactérias

    altamente capsuladas através dos anticorpos anti-capsulares, como também estirpes de S.

    aureus mal encapsuladas. As estirpes não encapsuladas são detetadas através do

    fibrinogénio e da IgG (sensibilizada para a proteína A). O reagente é adicionado a uma

    amostra proveniente de um isolamento e, caso haja aglutinação visível, o resultado indica

    a presença de S. aureus (Bula Pastorex™ Staph-Plus, 2007).

    ✓ Teste da Oxidase

    O teste rápido baseia-se na deteção da enzima intracelular oxidase. As bactérias

    que apresentam um sistema de transporte de eletrões (cadeia respiratória), designado

    citocromo oxidase, têm a capacidade de oxidar o citocromo, ao reduzir o oxigénio

    molecular (aceitador de eletrões da cadeia, em aeróbios). Desta forma, os recetores de

    eletrões da cadeia podem ser substituídos por substratos artificiais, onde a oxidação dos

    substratos pelo citocromo oxidase, na presença de oxigénio, produz um produto colorido.

    As bactérias oxidase positiva são aeróbias, mas tal não significa que sejam estritamente

    aeróbias, pois também podem ser oxidase negativa (quando não possuem citocromo

    oxidase) (Leboffe M. et al., 2011).

    Se o resultado for positivo visualiza-se, em cerca de 10 a 30 segundos, após a

    adição do reagente oxidase (discos de papel), uma coloração entre o violeta e púrpura. Se

    o resultado for negativo há ausência de cor (Bula Oxidase Reagent, 2005).

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    Utiliza-se o teste na identificação de bactérias Gram negativas, nomeadamente

    para distinguir as Pseudomonadeceae (oxidase positiva) das Enterobacteriaceae (oxidase

    negativa). O teste é, igualmente, útil na identificação das Neisseriaceae, pois são oxidase

    positiva.

    ✓ Teste da Bacitracina

    A bacitracina é um antibiótico polipeptídeo, produzido pela bactéria Bacillus

    subtilis. Este antibiótico interfere com a síntese do peptidoglicano, composto maioritário

    das paredes celulares, principalmente, nos Gram positivos. A bacitracina, em pequenas

    concentrações, inibe o crescimento de Streptococcus β-hemolíticos do grupo A de

    Lancefield. Os Streptococccus dos outros grupos de Lancefield são, normalmente,

    resistentes. Esta sensibilidade à bacitracina dos Streptococcus do grupo A permite a sua

    identificação presuntiva (Leboffe M. et al., 2011).

    Na presença de colónias β-hemolíticas, na cultura, sugestivas dos microrganismos

    anteriormente referidos, semeia-se a partir de uma colónia isolada, uma placa de

    Columbia (com um disco do respetivo antibiótico). Se se verificar, após incubação até 24

    horas, uma zona de inibição à volta do disco ≥ 15 mm, significa que se trata da presença

    de um Streptococcus do grupo A, numa situação contrária (há crescimento à volta do

    disco) sugere que é uma espécie pertencente aos restantes grupos de Lancefield.

    ✓ Teste da Optoquina

    Utiliza-se na identificação presuntiva de Streptococcus pneumoniae. Ao contrário

    das restantes espécies de Streptococcus α-hemolíticos, o S. pneumoniae é sensível à

    optoquina. O composto químico atua ao nível da membrana celular do S. pneumoniae,

    provocando a lise da membrana através da alteração da pressão osmótica.

    Inoculam-se no meio Columbia, colónias isoladas com α-hemólise sugestivas de

    S. pneumoniae. Coloca-se um disco de optoquina e incuba-se durante 18-24 horas. A

    formação de um halo de inibição ≥ 15 mm é sugestivo da presença de S. pneumoniae.

    Embora seja raro, pode existir estirpes de S. pneumoniae resistentes ao respetivo

    composto e, nesta situação, os halos são < 5 mm ou não há inibição.

    ✓ Teste CAMP

    O teste CAMP (acrónimo para "Christie-Atkins-Munch-Petersen") reserva-se à

    identificação presuntiva de Streptococcus β-hemolíticos do grupo B de Lancefield. Na

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    gelose de sangue (meio COS) inocula-se o Staphylococcus CAMP, realizando uma única

    estria, em linha reta, que divide o meio em duas partes iguais. Seguidamente, semeia-se

    no meio uma colónia sugestiva de S. agalactiae, realizando uma única estria reta (afastada

    2-3 mm e perpendicular ao inóculo de Staphylococcus CAMP) e incuba-se a placa durante

    18-24 horas a 35±2ºC em estufa normal. Caso seja Streptococcus do grupo B (o teste é

    positivo para o fator CAMP), se observa uma hemólise completa em “seta” entre a junção

    da bactéria a testar e do S. aureus CAMP. O teste é negativo quando não ocorre uma

    hemólise reforçada.

    O teste deteta uma proteína termo estável extracelular, produzida por S. agalactiae

    (fator CAMP), que atua sinergicamente na presença de uma β-hemolisina (produzida por

    S. aureus) e, deste modo, induz um aumento reforçado da hemólise dos eritrócitos na

    gelose de sangue (Mahon C. et al., 2011).

    ✓ Teste de Grupagem para identificação de Streptococcus β-hemolíticos

    Efetua-se o teste utilizando o Kit de identificação rápida Pastorex™ STREP. O

    Kit é um teste de aglutinação que agrupa as espécies de Streptococcus, de acordo com a

    classificação de Lancefield. O teste baseia-se na reação anticorpo-antigene e utiliza

    suspensões de partículas de látex sensibilizadas com anticorpos específicos para os

    grupos A, B, C, D, F e G. O teste requer uma extração enzimática antes da identificação

    do antigénio polissacarídeo específico de cada grupo. As partículas de látex, que contêm

    anticorpos homólogos group-specific, aglutinam na presença do antigénio homólogo. O

    teste apenas faz uma identificação presuntiva, sendo necessários testes complementares

    para obter um resultado definitivo. A identificação de Streptococcus β-hemolíticos é

    complicada, por exemplo, algumas estripes têm dois grupos de antigénios (C e G) e alguns

    α-hemolíticos apresentam antigénios do grupo C (Bula Pastorex™ STREP Grouping

    Streptococci, 2007).

    ✓ Galeria de identificação de Neisseria, Haemophilus e Moraxella

    catarrhalis

    A identificação de Neisseria, Haemophilus e Moraxella catarrhalis, executada

    por galeria de identificação API® NH, engloba uma série de mini-testes e uma base de

    dados. A galeria permite a biotipagem de Haemophilus influenzae e Haemophilus

    parainfluenzae e, também, a deteção de uma penicilinase. Contém 10 microtubos com

    substratos desidratados que permitem realizar 12 testes de identificação, através de

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    14

    reações enzimáticas ou fermentativas de açúcares, realizadas pelos microrganismos. As

    reações traduzem-se pela mudança de cor, espontânea ou revelada (através da adição de

    reagentes). Após a leitura (quadro de leitura), a identificação é obtida consultando a lista

    de perfis do folheto informativo ou os sistemas de identificação correspondentes (Bula

    API® NH, 2010).

    2.3. Equipamentos de Ensaio:

    2.3.1. Vitek® 2 Systems 05.01 (bioMérieux)

    O sistema Vitek® 2 destina-se à identificação de bactérias e leveduras, assim como

    à realização do teste de suscetibilidade a antibióticos (TSA) e à deteção de mecanismos

    de resistência aos mesmos.

    O ensaio inicia-se com a introdução do número de identificação das amostras no

    sistema, leitura do código de barras das cartas necessárias, colocação das cartas nas suas

    posições da cassete e preparação da suspensão padronizada da amostra com uma

    determinada turvação, de acordo com as especificações do fabricante. Todas as etapas

    anteriores ocorrem na estação de trabalho. Seguidamente, retira-se a cassete da estação

    de trabalho e coloca-se no Vitek® 2. Cada carta é inoculada por vácuo, selada, e colocada

    nos compartimentos de incubação e de leitura, automaticamente. A incubação ocorre on-

    line a 35.5±1.0ºC, são efetuadas leituras da turvação e da cor, pelo sistema ótico, em

    intervalos de 15 minutos, durante todo o processo. O tempo de incubação varia consoante

    o teste. Durante a leitura (por espectrofotometria) é medido a transmitância a vários

    comprimentos de onda no espetro visível. Posteriormente, os dados são analisados e

    interpretados pelo sistema (Manual Vitek® 2 Systems 05.01, 2006).

    O equipamento possui uma base de dados e um software, o Advanced Expert

    System™ (AES), que compara a informação obtida nas cartas de identificação com os

    resultados das cartas de TSA. Tal, possibilita uma avaliação da concentração mínima

    inibitória (CMI) e a deteção do fenótipo do agente patogénico. A análise feita pelo AES

    tem em conta, não só cruzamento de dados da ID (Identificação Microbiológica) com o

    TSA, como, também, o fenótipo obtido, as resistências naturais do microrganismo, a

    coerência/comportamento dos antibióticos, entre outros aspetos. No final, o sistema emite

    os resultados, onde avalia o nível de confiança entre antibiograma e a espécie identificada.

    Desta forma, o equipamento permite reduzir o tempo necessário de identificação do

    microrganismo e de execução do TSA (Manual Vitek® 2 Systems 05.01, 2006).

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    Testes de Identificação:

    A análise baseia-se em métodos bioquímicos. Os substratos utilizados permitem

    a determinação da atividade enzimática dos microrganismos, relacionada com a

    acidificação, a alcalinização e a hidrólise. Nos microrganismos Gram negativos efetua-se

    também a avaliação das resistências naturais aos antibióticos, nomeadamente à optoquina,

    bacitracina, novobiocina e polimixina.

    No laboratório utilizam-se cartas adaptadas à:

    - Identificação de bacilos Gram negativos (GN)

    - Identificação de cocos Gram positivos (GP)

    - Identificação de bactérias anaeróbias (ANC TEST KIT)

    - Identificação de leveduras (ID YST)

    - Identificação de Neisseria, Haemophilus, Campylobacter sp., Moraxella catarrhalis e

    G. vaginalis (ID NH)

    A carta GP destina-se à identificação da maioria dos cocos Gram positivos, como

    os Enterococcus, Staphylococcus e Streptococcus, é constituída por 43 poços e o

    resultado é emitido após 8 horas. A carta GN permite a ID de bacilos Gram negativos

    fermentadores e não fermentadores, contém 47 testes bioquímicos e um poço de controlo

    negativo para a descarboxílase (usado como referência do valor base para o respetivo

    teste) e os resultados finais estão disponíveis após 10 horas. A ID YST identifica a maior

    parte dos fungos, incluindo a Candida e Crytococcus neoformans, apresenta 46 testes

    bioquímicos e o resultado é fornecido, aproximadamente, em 15 horas. A ID NH é

    composta por 30 testes bioquímicos que são finalizados em cerca de 6 horas.

    Os resultados são expressos em níveis qualitativos de identificação (tabela 1) com

    base num cálculo estatístico realizado pelo sistema.

    Tabela 1: Níveis de identificação.

    Nível de confiança Probabilidade (%)

    Excelente 96 – 99

    Muito bom 93 – 95

    Bom 89 – 92

    Aceitável 85 – 88

    Fraca discriminação Necessita testes suplementares, de forma a haver

    correspondência com a carta de sensibilidade.

    Microrganismo não identificado Deve-se verificar a pureza da cultura e retestar o isolado

  • Rubina Cassaca Relatório de Estágio

    Mestrado em Análises Clínicas

    16

    Testes de suscetibilidade aos antibióticos:

    O teste pode ser feito qualitativamente ou quantitativamente, pelo Vitek® 2

    Systems, a partir do isolamento de colónias de microrganismos com interesse clínico. O

    princípio das cartas de antibiograma assenta na determinação do CMI (utiliza a técnica

    de microdiluição). Cada carta contém uma combinação de fármacos específicos,

    adequados ao tipo de microrganismo que pretendemos analisar. Os resultados facultados

    pelo equipamento são reportados para cada fármaco, como “sensível”, “intermédio” ou

    “resistente”.

    A consistência do antibiograma é feita automaticamente pelo software do

    equipamento. Caso não seja automaticamente validado após a interpretação pelo AES, ou

    se houver inconsistência nos resultados, tendo em conta a identificação (mais de 2

    antimicrobianos com CMIs fora dos limites), o microrganismo deve ser retestado.

    São utilizadas as seguintes cartas de TSA:

    - Antibiograma Automatizado para Bacilos Gram Negativos (AST- N215, AST – N200,

    AST – N244 e AST- N222)

    - Antibiograma Automatizado para Cocos Gram Positivo (AST P586, AST P619 e AST

    P576)

    - Antifungigrama Automatizado para Fungos Leveduriformes (AST YS06)

    Os antibiogramas e antifungigramas destinam-se à determinação da

    suscetibilidade do microrganismo in vitro aos antimicrobianos. Quanto às cartas para os

    Gram negativos, estas podem ser divididas em: avaliação da suscetibilidade da família

    Enterobactereaceae (AST- N215, AST – N200 e AST – N244); Pseudomonas e outros

    bacilos não fermentadores (AST – N222). Relativamente, aos Gram positivos as cartas

    AST-P586 destinam-se aos Enterococcus e S. agalactiae, a AST-P619 aos

    Staphylococcus e a AST-P576 a S. pneumoniae.

    Cada carta é composta por 64 poços, incluindo o poço de controlo. Cada poço

    contém uma determinada quantidade de um agente antimicrobiano, associado ao meio de

    cultura. O Vitek® 2 permite a avaliação do crescimento do microrganismo em cada poço,

    durante 18 horas, e no final da incubação é determinada a CMI.

    2.3.2. Cirtómetro Sysmex UF - 1000i

    O analisador automático associa a citometria de fluxo à impedância,

    possibilitando a contagem dos elementos presentes em urinas e em outros produtos

  • Rubina Cassaca Relatório de Estágio

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    17

    biológicos, como derrames de serosas. O equipamento utiliza a citometria de fluxo

    fluorescente, que permite a determinação do tamanho, da complexidade interna e da

    quantidade de material genético das partículas presentes na amostra.

    O equipamento efetua a homogeneização, aspiração, diluição e coloração da

    amostra, e reporta os seguintes parâmetros: eritrócitos (RBC), leucócitos (WBC), células

    epiteliais (EC), cilindros (CAST) e bactérias (BACT). Também alerta para a presença de

    elementos, como cilindros, cristais, muco, esperma, leveduras e células pequenas

    redondas (células tubulares renais e do epitélio de transição).

    2.3.3. Sistema BacT/Alert 3D-60 (bioMérieux)

    O equipamento, utilizado na deteção microbiana, é um sistema analítico

    automatizado de incubação, agitação e monitorização de hemoculturas, onde são

    incubados os meios específicos para aeróbios e anaeróbios. O sistema permite identificar

    o desenvolvimento dos microrganismos numa fase precoce do processo. Este utiliza um

    sensor colorimétrico que identifica a presença de dióxido de carbono (CO2), dissolvido

    no meio de cultura. Caso exista microrganismos na amostra a testar, o CO2 produzido

    (resultante da metabolização dos substratos existentes no meio) é revelado pela mudança

    progressiva de cor de verde-azulado para amarelo, do sensor permeável ao gás (presente

    no fundo de cada frasco de hemocultura (meio de cultura)). Esta alteração de cor é

    identificada e monitorizada, automaticamente, por espetrofotometria de refletância a cada

    10 minutos. O resultado final é negativo, quando o sistema não deteta o desenvolvimento

    de microrganismos após 7 dias (Manual BacT/Alert 3D-60, 2010).

    2.4. Produtos Biológicos:

    Após a avaliação dos exames microbiológicos, caso não haja crescimento de

    bactérias patogénicas, o resultado é expresso no boletim como “não se desenvolveram

    bactérias potencialmente patogénicas”. Caso contrário (houve desenvolvimento de

    bactérias patogénicas), no boletim reporta-se a identificação do microrganismo e o

    respetivo teste de suscetibilidade aos antimicrobianos (quando aplicável), de acordo com

    as regras EUCAST (European Committee on Antimicrobial Susceptibility Testing) e/ou

    CLSI (Clinical and Laboratory Standards Institute).

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    Mestrado em Análises Clínicas

    18

    2.4.1. Urina Asséptica

    As infeções do trato urinário (ITU) são o segundo tipo de infeção mais prevalente

    no Homem. Podem ocorrer em todas as faixas etárias, sendo mais prevalentes no sexo

    feminino. Estima-se que cerca de 50% das mulheres desenvolvem uma ITU ao longo da

    sua vida (Pommerville J., 2011). As ITU podem envolver o parênquima renal

    (pielonefrite), ureteres (ureterites), a bexiga (cistite) e a uretra (uretrite), e, nos homens, a

    próstata (prostatite) e o epidídimo (epididimite). Estas podem ser circunscritas a um caso

    isolado ou, ainda, recorrentes, recaídas e reinfeções. Uma ITU pode ser adquirida por três

    vias: via ascendente (é a mais frequente), a qual deve-se sobretudo à ocorrência de

    contaminação por flora perianal e fecal, onde o microrganismo poderá atingir, através da

    uretra, outros órgãos do sistema urinário; via hematógena ou descendente (infeção

    secundária a uma septicémia); via iatrogénea, induzida pela introdução de um cateter ou

    sondas vesicais (Mahon C. et al., 2011).

    As manifestações clínicas dependem do hospedeiro (resposta inflamatória), da

    porção do sistema urinário envolvido, do agente etiológico e da gravidade da infeção. Os

    sinais e sintomas clínicos caracterizam-se, normalmente, por disúria, leucocitúria (urina

    turva devido ao pus), hemoglobinúria (urina escura) e polaciúria (ITU baixa), e, também,

    por febre e dor lombar (estão mais associadas a ITU alta) (Pommerville J., 2011).

    É importante diferenciar a bacteriúria assintomática de sintomática (é aplicado de

    imediato o tratamento). A presença de leucocitúria é marcador de infeção urinária. Em

    certas situações uma bacteriúria assintomática pode evoluir para ITU, sendo necessário

    realizar tratamento antimicrobiano, nomeadamente em grávidas, idosos e pacientes

    cateterizados (IX Cong. Bras., 2004).

    A maioria dos agentes patogénicos causadores de ITU são bacilos Gram negativos

    da família das Enterobacteriaceae, nomeadamente a E. coli (sendo mais associada à ITU

    não complicada), constituindo cerca de 95% do total das ITU (Cowan M., 2016).

    Contudo, outros agentes microbiológicos também podem causar uma ITU (tabela 2). As

    ITU complicadas, normalmente, são polimicrobianas (exemplo: doentes com pedras

    renais) e multirresistentes a fármacos (Mahon C. et al., 2011).

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    19

    Tabela 2: Microrganismos causadores de ITU (Mahon C. et al., 2011; Pommerville J., 2011).

    Frequentes Menos comuns Associada a doenças sistémicas

    Enterococcus (incluindo os

    vancomycin-resistant)

    Streptococcus agalactiae

    Enterobacteriaceae

    Pseudomonas spp.

    Streptococcus pyogenes

    Staphylococcus aureus

    Staphylococcus saprophyticus

    Candida spp.

    Gardnerella vaginalis

    Ureaplasma urealyticum

    Mycoplasma hominis

    Mobiluncus spp.

    Leptospira spp.

    Mycobacterium spp.

    Chlamydia trachomatis

    (homens)

    Salmonella spp. (associado a

    gastroenterites)

    Schistosoma haematobium

    Cryptococcus neoformans

    Trichosporon beigelii

    Trichomonas vaginalis

    Aspergillus spp.

    Penicillium spp.

    Colheita:

    Efetuar uma colheita de urina assética corretamente é determinante para obtermos

    resultados fiáveis. Embora a urina seja estéril, ao passar pela uretra durante a micção,

    arrasta flora microbiana consigo e, assim, pode induzir a erros na interpretação (exame

    cultural). Neste laboratório, para o diagnóstico de infeção no trato urinário, a maioria das

    urinas assépticas são colheitas do jato médio. Com menor frequência são recebidas

    amostras provenientes da punção de cateter urinário (algália), do saco coletor (bebés ou

    crianças sem o controlo dos esfíncteres), punção supra-púbica e punção renal (as punções

    são, exclusivamente, um ato médico). O laboratório disponibiliza-se só para a colheita de

    urina assética (jato médio) e do saco coletor.

    Procedimento de colheita de Urina Asséptica:

    Deve ser recolhida a primeira urina da manhã ou após retenção vesical de 2 a 3

    horas. O utente deve lavar as mãos e limpar os genitais externos, a fim de diminuir ao

    máximo a contaminação da amostra. Na mulher a limpeza deve ser feita sempre da frente

    para trás e no homem na zona da glande. O utente deve descartar as primeiras gotas de

    urina e colher o jato médio para o coletor de urina asséptica. Após a colheita para coletor,

    transfere-se a amostra para um tubo com conservante por vácuo, posteriormente ambos

    os recipientes são enviados para o laboratório.

    No caso de colheitas em bebés (saco coletor), o técnico deve lavar as mãos antes

    de iniciar o procedimento. Retira-se a fralda e faz-se uma limpeza da região perineal.

    Seguidamente, fixa-se o saco coletor de urina à volta do meato urinário. Caso o bebé não

    tiver urinado num intervalo de 30 minutos, o processo é repetido até se obter uma amostra.

    Procedimento Laboratorial e Interpretação dos Resultados:

    Todas as colheitas de urinas são analisadas pelo Citómetro, exceto se amostra

    apresentar um volume total inferior a 1 ml, realizando-se de imediato o exame cultural,

  • Rubina Cassaca Relatório de Estágio

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    20

    sem exame citobacteriológico, devendo-se alertar para o facto no boletim no campo das

    observações. Urinas que tenham uma elevada quantidade de muco também não são

    analisadas no Citómetro, pois podem comprometer o correto funcionamento do mesmo,

    como alternativa faz-se sempre a análise do sedimento. Todas as amostras são

    refrigeradas entre 2 a 8ºC até sair o resultado, no caso de ser necessário mais amostra para

    testes posteriores (exemplo: análise do sedimento).

    Após a impressão da lista de trabalho, sempre que o equipamento emite um alerta

    “UTI” (possível infeção urinária), significa que a amostra possui um valor > 20 WBC/µl

    e > 30 BACT/µl ou com > 500 BACT/µl, deve-se semear a amostra em meio CLED.

    Também são semeadas todas as amostras que apresentem um valor > 20 WBC/µl ou >

    400 BACT/µl (equipamento pode não alertar), assim como todas as urinas de bebés e

    amostras processadas em regime de urgência. Quando o equipamento emite o alerta

    “REV” (rever), significa que um ou mais parâmetros têm um valor anormal (exemplo:

    elevado número de eritrócitos ou presença de espermatozoides), e, nestes casos, efetua-

    se sempre a cultura e análise do sedimento, de forma a confirmar/descartar o alerta

    facultado pelo equipamento.

    Do total dos parâmetros analisados pelo Citómetro é sobretudo valorizado o

    número de leucócitos e de bactérias. O número de células epiteliais é útil para averiguar

    a correta execução da colheita.

    Exame do sedimento urinário:

    Centrifuga-se 10 ml de urina (do balão inicial) a 1500 rpm, durante 5 minutos e a

    partir do sedimento, faz-se o exame citológico. Ao microscópio ótico, avalia-se a presença

    de células epiteliais, leucócitos, espermatozoides, eritrócitos, cilindros, bactérias,

    leveduras e parasitas, bem como as possíveis interferências no resultado do Citómetro de

    fluxo. Quantificam-se os elementos com a ampliação de 400x. O valor reportado resulta

    da média do número obtido em 10 campos, multiplicado pelo fator 5, de forma a obter o

    nº/µl de amostra.

    Exame cultural:

    A urina é semeada no meio CLED com uma ansa descartável (calibrada de 10 µl).

    A incubação dá-se a 35±2ºC, durante 18-24 horas em estufa normal. Em situações

    pontuais, por exemplo, utente está a fazer terapêutica com antibióticos, a incubação pode-

    se prolongar até 48-72 horas, caso a cultura seja negativa às 24 horas.

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    21

    A valorização clínica das amostras, para além de ter em conta os dados obtidos

    pelo Citómetro, tem em consideração a contagem das colónias:

    10 colónias = 1000 UFC/ ml (103)

    100 colónias = 10 000 UFC/ ml (104)

    1000 colónias = 1000 UFC/ ml (105)

    Considera-se positivo culturas com contagens ≥ 105 UFC/ml, exceto nas seguintes

    situações: nas crianças e diabéticos e, sempre que a informação clínica justifique, são

    valorizadas contagens de 103 ou 104 UFC/ml. A informação clínica é imprescindível na

    valorização da cultura, por exemplo, nas situações em que o utente apresenta polaciúria

    (urina é mais diluída) ou esteja a fazer tratamento com antimicrobianos, valorizam-se

    culturas com 103 UFC/ml.

    Valorizam-se culturas com um microrganismo predominante. No caso de culturas

    mistas, normalmente, solicita-se repetição da colheita a fim de confirmar os resultados.

    Se com nova colheita surgir a mesma situação, coloca-se a hipótese de se tratar de uma

    infeção dupla. Note-se que podem ocorrer situações pontuais de uma infeção provocada

    por duas bactérias diferentes, especialmente, em pessoas de risco, pois numa pessoa

    saudável é incomum. Podem surgir infeções duplas por dois Gram negativos e, também,

    situações que a cultura apresenta um Gram positivo e outro negativo, em que

    provavelmente um é o agente infetante e o outro o colonizador. Nas culturas mistas nem

    sempre é possível isolar o agente patogénico, o que pode comprometer o resultado.

    Se o exame citobacteriológico for positivo e se for considerado clinicamente

    valorizável, procede-se à respetiva identificação do microrganismo e execução do TSA.

    Identificação e Teste de Suscetibilidade aos antimicrobianos (TSA):

    Quando se obtêm colónias sugestivas de E. coli no meio CLED, procede-se à sua

    repicagem (meio CPS), a fim de realizar a sua identificação presuntiva. O meio CPS é

    incubado durante 18-24 horas (35±2ºC). O crescimento de colónias com uma coloração

    rosa a vermelho em CPS, possibilita a identificação direta da E. coli. Posteriormente,

    realiza-se o respetivo TSA no Vitek® 2.

    Quanto ocorrem culturas não sugestivas de E. coli no meio CLED, através da

    observação macroscópica das colónias, pode-se deduzir que se trata de uma bactéria Gram

    positiva ou negativa. Embora o meio CLED seja dirigido para o crescimento

    bacteriológico, também pode ocorrer crescimento de leveduras. Se necessário, recorre-se

  • Rubina Cassaca Relatório de Estágio

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    22

    à coloração de Gram, caso seja insuficiente utilizam-se testes complementares de

    identificação. Quando é necessário isolar o agente patogénico, os Gram negativos são

    repicados para meio MCK, enquanto os Gram positivos são repicados para o meio CNA.

    Após isolamento efetua-se a identificação e TSA automático.

    No caso de se valorizar o crescimento de leveduras (Candida spp.) em meio

    CLED, as colónias são repicadas para o meio CAN (permite a identificação direta de C.

    albicans (colónias azuis)). No caso de a identificação ser inconclusiva, procede-se à

    identificação e TSA no Vitek® 2 (se solicitado pelo médico), caso contrário o resultado é

    reportado no boletim como Candida spp.

    No Boletim Clínico, caso o exame bacteriológico seja positivo, para além dos

    resultados obtidos na análise do sedimento urinário, reporta-se a identificação e o

    resultado do TSA. Relativamente ao TSA, reportam-se as resistências (se houver) e as

    sensibilidades.

    2.4.2. Trato Urogenital

    O trato genital contém uma flora saprófita (microbiota), que varia consoante o

    sexo e, também, individualmente. Esta flora, juntamente com as defesas locais (tabela 3),

    impede o desenvolvimento da maioria dos microrganismos (Cowan M., 2016).

    Tabela 3: Defesas do trato urogenital e flora saprófita colonizadora (Cowan M., 2016).

    Defesas locais Microbiota

    Trato urinário

    (masculino e feminino)

    Saída da urina que lava a zona e arrasta células epiteliais; pH urina,

    IgA secretora, lisozima e

    lactoferrina da urina

    Streptococcus não hemolíticos, Staphylococcus, Corynebacterium,

    Lactobacillus, Prevotella,

    Veillonella, Gardnerella

    Trato genital feminino

    (crianças e pós-

    menopausa)

    Secreção de muco e IgA secretória Igual à do trato urinário

    Trato genital masculino Igual à do trato urinário

    A uretra é uma zona estéril exceto

    zona exterior, onde a flora é igual à

    do trato urinário. A zona exterior do

    pénis contém Pseudomonas e

    Staphylococcus e bactérias Gram

    negativas anaeróbias

    Na mulher a cavidade uterina, endocolo, trompas e ovário, são estéreis, enquanto

    a vulva, vagina e exocolo, contêm uma flora própria. As bactérias mais abundantes na

    vagina, os Lactobacillus, são importantes na manutenção do pH ácido vaginal (3,8 a 4,5),

    através da produção de ácido láctico. Também produzem peróxido de hidrogénio que, em

    conjunto com o ácido láctico, inibe a maioria dos outros microrganismos. O estrogénio

    tem um papel fundamental no desenvolvimento dos Lactobacillus. Esta hormona sexual

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    23

    é produzida em maiores quantidades durante a idade fértil feminina e promove o aumento

    da produção de glicogénio no epitélio vaginal, que se degrada em glicose, sendo

    posteriormente metabolizada pelos Lactobacillus em ácido láctico (Cowan M., 2016;

    Pommerville J., 2011).

    Os agentes patogénicos mais frequentes, causadores de infeções no trato genital

    feminino, são a Candida albicans, Trichomonas vaginalis, Neisseria gonorrhoeae,

    Mycoplasma sp. e Chlamydia trachomatis. Enquanto que no homem é mais recorrente o

    aparecimento de infeções, causadas por Neisseria gonorrhoeae, Chlamydia trachomatis,

    Pseudomonas spp. e Enterobacteriaceae (IX Cong. Bras., 2004). O tipo de infeção, de

    acordo com a sua localização e agente patogénico frequentemente associado, bem como

    o tipo de doenças mais comuns no trato urogenital e respetiva sintomatologia, encontram-

    se descritos nas tabelas 4 e 5.

    Tabela 4: Infeções genitais e respetivos agentes patogénicos (Cowan M., 2016; Mahon C. et al., 2011;

    Pommerville J., 2011; IX Cong. Bras, 2004).

    Tipo de infeção Microrganismo

    Femenino

    Vulvovaginites

    Candida spp., Trichomonas vaginalis, Gardnerella vaginalis,

    Prevotella, Porphyromonas, Peptostreptococcus, Mobiluncus,

    Mycoplasma Hominis e Ureaplasma spp.

    Bartolinite N. gonorrhoeae, U. urealyticum e Enterobacteriaceae. Com menos

    incidência: anaeróbios, C. trachomatis, S. aureus

    Cervicites Chlamydia trachomatis, N. gonorrhoeae, Mycoplasma, Ureaplasma

    urealyticum

    Endometrites/Salpingite

    Bacteroides spp, C. trachomatis, N. gonorrhoeae (principalmente em

    salpingite), Enterococcus spp., S. agalactiae, enterobactérias, L.

    monocytogenes, Actinomyces spp. (associado ao DIU).

    Uretrite (ambos os sexos)

    Neisseria gonorrhoeae, Chlamydia trachomatis, Ureaplasma

    urealyticum, Mycoplasma sp., Haemophilus spp. (no

    homem)

    Masculino

    Epididimite/Orquite Chlamydia trachomatis, N. gonorrhoeae, Enterobacteriaceae,

    Pseudomonas spp.

    Prostatite

    Flora gastrointestinal, Chlamydia trachomatis e Neisseria

    gonorrhoeae (normalmente resulta de uma infeção prévia do trato

    urinário)

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    24

    Tabela 5: Doenças mais comuns no trato urogenital masculino e feminino (Cowan M., 2016; Pommerville

    J., 2011; IX Cong. Bras., 2004).

    Doença Agente patogénico Fatores

    predisponentes Manifestações clínicas

    Can

    did

    íase

    C. albicans (80-

    92% dos casos), C.

    glabrata, C.

    parapsilosis, C

    tropicalis e C.

    krusei

    Gravidez, diabetes

    Mellitus,

    imunossupressão,

    antimicrobianos de

    largo espectro e

    contracetivos orais

    (alteração do pH

    vaginal)

    Mulher: Ardor, prurido, queimaduras e

    edema vulvovaginal, leucorreia que varia

    entre aquosa esbranquiçada a espesso,

    branco e granuloso

    Homem: erupção cutânea no pénis

    Tric

    om

    on

    ías

    e

    Trichomonas

    vaginalis

    Doença sexualmente

    transmissível (DST)

    Mulher: assintomática ou doença aguda

    inflamatória com leucorreia esverdeada a amarelo, malcheiroso, prurido, irritação e

    eritema e menos comum uretrite

    Homem: assintomático ou uretrite não

    gonocócica

    Go

    no

    rrei

    a

    Neisseria

    gonorrhoeae DST

    Mulher: inicialmente corrimento mucoide,

    seguido por exsudado purulento podendo

    progredir para uretrite, cervicite e

    bartolinite. Pode disseminar-se para o

    endométrio, trompas, ovários, superfície

    peritoneal, causando doença inflamatória

    pélvica

    Homem: corrimento mucoide, seguido por

    exsudado purulento (uretrite gonocócica), pode involuir para crónica atingindo a

    próstata, vesícula seminal e epidídimo.

    Va

    gin

    ose

    Ba

    cter

    ian

    a

    Gardnerella

    vaginalis associada

    ou não a

    Mobilluncus,

    Bacteroides,

    Porphyromonas,

    Peptostreptococcus,

    Prevotella,

    Mycoplasma

    hominis e Ureaplasma spp

    DST

    Leucorreia abundante, mucosa e

    acinzentada, com odor característico a

    “peixe” e inflamação. Há alteração da flora

    normal vaginal com subsequente aumento

    do pH local (>4,5)

    Infe

    çõ

    es

    por

    Ch

    lam

    yd

    ia

    trach

    om

    ati

    s

    DST

    Mulher: cervicite mucopurulenta,

    síndrome uretral, endometrite e salpingite

    predispõem à gravidez ectópica e à

    esterilidade

    Homem: uretrite não gonocócica

    Na mulher grávida é importante a realização da pesquisa de Streptococcus

    agalactiae (Streptococcus β-hemolíticos do grupo B de Lancefield) entre as 35 e 37

    semanas de gestação, a fim de prevenir a transmissão vertical durante o parto. A

    colonização da grávida, por esta bactéria, predispõe a partos prematuros e no recém-

    nascido a transmissão pode causar meningites e pneumonias (Cowan M., 2016).

  • Rubina Cassaca Relatório de Estágio

    Mestrado em Análises Clínicas

    25

    Colheita:

    ✓ Exsudado vaginal

    A utente não deve fazer a sua higiene íntima, no dia da colheita, e não deve efetuar

    nenhum tratamento local, pelo menos, durante três dias antes da colheita. Antes de iniciar

    a colheita, deve-se perguntar se cumpriu as recomendações e questionar se a utente

    apresentou sintomatologia característica de uma infeção (ardor, comichão, aspeto do

    corrimento, etc.). Após a limpeza da zona externa dos genitais, com a utente na posição

    ginecológica, introduz-se o espéculo estéril até expor corretamente o colo do útero e

    efetua-se a colheita com uma zaragatoa, realizando movimentos rotativos das paredes

    vaginais. Introduz-se a zaragatoa em meio de transporte (Kit Stuart). Com uma segunda

    zaragatoa repete-se o processo, realizando-se dois esfregaços (uma lâmina destina-se a

    coloração de Gram e a outra é reservada).

    ✓ Exsudado retal

    Efetuado em simultâneo com o exsudado vaginal. É realizado somente em

    grávidas, para pesquisa