biotecnologia em debate ciências biológicas

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Ciências Biológicas Álvaro Julio Pereira Biotecnologia em Debate Computação Química Física Matemáca Pedagogia Artes Pláscas Ciências Biológicas Geografia Educação Física História 9 12 3

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Fiel a sua missão de interiorizar o ensino superior no estado Ceará, a UECE, como uma instituição que participa do Sistema Universidade Aberta do Brasil, vem ampliando a oferta de cursos de graduação e pós-graduação

na modalidade de educação a distância, e gerando experiências e possibili-dades inovadoras com uso das novas plataformas tecnológicas decorren-

tes da popularização da internet, funcionamento do cinturão digital e massificação dos computadores pessoais.

Comprometida com a formação de professores em todos os níveis e a qualificação dos servidores públicos para bem servir ao Estado,

os cursos da UAB/UECE atendem aos padrões de qualidade estabelecidos pelos normativos legais do Governo Fede-

ral e se articulam com as demandas de desenvolvi-mento das regiões do Ceará. Bi

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Álvaro Julio Pereira

Biotecnologia em Debate

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ComputaçãoQuímica Física Matemática PedagogiaArtes Plásticas

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2ª ediçãoFortaleza - Ceará

2015

Copyright © 2015. Todos os direitos reservados desta edição à UAB/UECE. Nenhuma parte deste material poderá ser reproduzida, transmitida e gravada, por qualquer meio eletrônico, por fotocópia e outros, sem a prévia autori-zação, por escrito, dos autores.

Presidenta da RepúblicaDilma Vana Rousseff

Ministro da EducaçãoAloisio Mercadante

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Governador do Estado do CearáCamilo Sobreira de Santana

Reitor da Universidade Estadual do CearáJosé Jackson Coelho Sampaio

Vice-ReitorHidelbrando dos Santos Soares

Pró-Reitor de Pós-GraduaçãoJerffeson Teixeira de Souza

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Coordenadora Adjunta UAB/UECEEloísa Maia Vidal

Direção do CED/UECEJosé Albio Moreira de Sales

Coordenação da Licenciatura em Ciências BiológicasGermana Costa Paixão

Coordenação de Tutoria daLicenciatura em Ciências Biológicas

Roselita Maria de Souza Mendes

Editor da EdUECEErasmo Miessa Ruiz

Coordenadora EditorialRocylânia Isidio de Oliveira

Projeto Gráfico e CapaRoberto Santos

DiagramadorFrancisco Oliveira

Revisão OrtográficaFernanda Ribeiro

Conselho Editorial

Antônio Luciano Pontes

Eduardo Diatahy Bezerra de Menezes

Emanuel Ângelo da Rocha Fragoso

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Francisco Josênio Camelo Parente

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Conselho Consultivo

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Homero Santiago (USP)

Ieda Maria Alves (USP)

Manuel Domingos Neto (UFF)

Maria do Socorro Silva Aragão (UFC)

Maria Lírida Callou de Araújo e Mendonça (UNIFOR)

Pierre Salama (Universidade de Paris VIII)

Romeu Gomes (FIOCRUZ)

Túlio Batista Franco (UFF)

Editora Filiada à

P436b Pereira, Álvaro Júlio.Biotecnologia em Debate / Álvaro Júlio Pereira. – 2. ed. –

Fortaleza : EdUECE, 2015.145 p. : il. (Ciências Biológicas)

ISBN: 978-85-7826-343-0

1. Biotecnologia. I. Álvaro, Júlio Pereira. II. Título.

CDD 620.8

Dados Internacionais de Catalogação na PublicaçãoSistema de Bibliotecas

Biblioteca Central Prof. Antônio Martins FilhoThelma Marylanda Silva de Melo – CRB-3 / 623

Bibliotecária

Editora da Universidade Estadual do Ceará – EdUECEAv. Dr. Silas Munguba, 1700 – Campus do Itaperi – Reitoria – Fortaleza – Ceará

CEP: 60714-903 – Fone: (85) 3101-9893Internet: www.uece.br – E-mail: [email protected]

Secretaria de Apoio às Tecnologias EducacionaisFone: (85) 3101-9962

Sumário

Apresentação .................................................................................................... 5Capítulo 1 – Biotecnologia: histórico e desenvolvimento ........................ 7

1. Biotecnologia: presente e passado ................................................................. 9

2. Breve histórico da biotecnologia moderna .................................................... 11

3. O homem manipulando a natureza ...............................................................12

4. O homem manipulando o DNA ......................................................................13

Capítulo 2 – Organismos Geneticamente Modificados (OGMs): plantas e animais transgênicos ................................................................... 23

1. Os alimentos e os organismos geneticamente modificados (OGMs) ...............252. As plantas transgênicas ..................................................................................28

3. Técnicas de transformação gênica ...............................................................32

4. Aspectos de biossegurança e bioética ..........................................................34

5. Debatendo: vantagens e desvantagens dos transgênicos ..........................37

6. Os animais transgênicos ................................................................................38

Capítulo 3 – A Clonagem e a Terapia Gênica ............................................. 431. Reprodução e clonagem ................................................................................45

2. Terapia gênica ................................................................................................52

Capítulo 4 – DNA na identificação de pais e criminosos e na saúde .... 731. Identificação pelo DNA ..................................................................................75

2. Técnicas moleculares de identificação .........................................................78

3. Análise dos testes de DNA .............................................................................82

4. A biotecnologia e a saúde ..............................................................................85

Capítulo 5 – Biotecnologia e Meio Ambiente ..........................................1071. Consumo ....................................................................................................... 110

2. Biodiversidade ............................................................................................... 112

3. Bioprocessos ................................................................................................121

4. Biodegradação ..............................................................................................123

5. Avaliação de riscos .......................................................................................124

6. Sustentabilidade ambiental ..........................................................................126

7. Metagenômica ..............................................................................................131

8. Bioplásticos ...................................................................................................132

9. Biocombustíveis ............................................................................................133

10. Tecnologia e meio ambiente no debate sobre os limites do crescimento ................................................................................................136

Sobre o autor .................................................................................................143

Apresentação

A cada dia que passa novos e grandes avanços científicos e tecnológicos sur-gem com uso da biotecnologia, seja na agropecuária, na medicina, no meio ambiente e na indústria. Mas, como em qualquer campo da ciência, os produ-tos produzidos pela biotecnologia têm gerado muitas preocupações, dúvidas e debates, sobre a qual o governo, os pesquisadores e a população em geral apresentam opiniões muitas vezes divergentes.

Um dos motivos pelos quais a biotecnologia tem fomentado discussões, debates acalorados e até mesmo resistências por parte de muitos, têm sido o seu envolvimento em assuntos polêmicos como os transgênicos ou Organis-mos Geneticamente Modificados (OGM), a clonagem de mamíferos, pesquisas com células-tronco e terapia gênica, dentre outros. Esta polêmica e debate já ultrapassaram os muros dos institutos e laboratórios de pesquisas das univer-sidades e empresas que estão desenvolvendo seus produtos, chegando até a sociedade que também, possui o direito de apropriar-se dos conhecimentos para que seja formado nesta, cidadãos com uma formação crítica.

A falta de conhecimento científico e informações pelos formadores de opinião e da população em geral, podem provocar confusões sobre o que é ou não científico, gerar resistências aos novos produtos oriundos das novas tecnologias, assim como despertar opiniões e afirmações pouco consistentes em assuntos atuais como a liberação de soja, milho e feijão transgênico para o plantio e consumo, a clonagem animal e o uso de células-tronco e terapia gênica para fins terapêuticos.

O ensino de biotecnologia deve contribuir na formação de cidadãos responsáveis, socialmente conscientes, pois os conhecimentos sobre essa ciência, não devem ficar confinados aos laboratórios e ou até mesmo às salas de aulas, mas devem ser disseminados para toda a sociedade.

Portanto, ainda que de forma sucinta, este livro procura apresentar uma abordagem dos principais conceitos, aplicações e um pequeno deba-te ao final de cada capítulo dos aspectos éticos e perspectivas da biotec-nologia, a fim de que o leitor obtenha conhecimentos, diferentes modos de pensar, questionamentos, e consiga debater e agir que permitam o julga-mento de questões de forma consciente e científica em todos os assuntos referentes ao uso de tecnologias resultantes da manipulação do DNA.

Os autores

Capítulo 1Biotecnologia: histórico

e desenvolvimento

Biotecnologia em Debate 9

Objetivos• Introduzir os alunos à evolução histórica da biotecnologia.

• Propiciar aos alunos conhecimentos básicos sobre o surgimento da bio-tecnologia moderna.

• Compreender os fundamentos da tecnologia do DNA recombinante.

1. Biotecnologia: presente e passado 1.1 Biotecnologia e nosso dia a dia

Humm, que delícia! Bem cedinho em nosso café da manhã, quando sabo-reamos uma fatia de pão com um pedaço de queijo, ou tomamos um copo de iogurte, nem nos damos conta que por trás da fabricação do pão, do quei-jo e do iogurte estão escondidas técnicas fermentativas usadas desde muito tempo atrás. Da mesma maneira, os transgênicos estão há mais de 25 anos fazendo parte do nosso dia-a-dia, seja quando consumimos um hambúrguer que contenha soja geneticamente modificada ou ao comprarmos uma calça jeans produzida com algodão transgênico.

Vitaminas, anticorpos e remédios para combate à AIDS, kits para diag-nósticos de doenças, hormônio do crescimento (hGH) contra o nanismo, va-cina contra a Hepatite B, insulina contra o diabetes, são todos exemplos de produtos desenvolvidos pela engenharia genética ou tecnologia do DNA recombinante. O meio ambiente também entra nesta lista, com as lavouras transgênicas que promete pro-porcionar um manejo mais simples e com menos aplicações de agrotóxicos, e menor utilização de máquinas agrícolas, diminuin-do a emissão de poluentes e o consumo de água.

1.2 Homem: biotecnologia e meio ambiente

Nós seres humanos de uma maneira bem diferente dos outros seres vivos da Terra, que procuram obter apenas o suficiente para sua sobrevivência, usamos diferentes meios e formas que vão além das nossas necessidades e consumo para a nossa sobrevivência, acarretando desta maneira vários problemas no meio ambiente em que vivemos.

Figura 1.1 – A Biotecnologia e sua relação com outras Ciênciasfonte: GOOGLE, 2011

PEREIRA, A. J.10

Enquanto os micro-organismos, os animais e até mesmo as plantas mo-dificam-se apenas para adaptarem-se às várias mudanças ambientais, nós seres humanos, através do uso de nosso raciocínio, com um planejamento intelectual elaborado e aquisição de vários instrumentos ou ferramentas na execução deste planejamento, mudamos de forma intencional o ambiente a nossa volta, provocando problemas ambientais dos mais variados.

Os instrumentos usados por nós, juntamente com os processos que supor-tam às nossas maneiras de transformação do mundo, são chamados de tecno-logias. Assim, as biotecnologias, nada mais são do que tecnologias, em que uti-lizamos seres vivos ou partes deles, como instrumentos para obtermos produtos com valor para a medicina e agricultura, por exemplo. A biotecnologia se relaciona interdisciplinarmente com a biologia molecular, bioquímica, microbiologia, enge-nharia bioquímica, fisiologia, imunologia, genética, engenharia química, ciências da computação e tecnologia industrial dentre outras (Figura 1.1).

1.3 Biotecnologia das fermentações

A fim de manter a nossa sobrevivência, há milhares de anos, nossos ancestrais vêm obtendo, mesmo de forma inconsciente, alimentos e bebidas, como o queijo, iogur-te, cerveja, vinho e vinagre, com uso de métodos fermentativos. Há mais ou menos dez mil anos, nossos antepassados da re-gião do Oriente Médio, perceberam que podiam selecionar espécies selvagens de micro-organismos, plantas e animais para facilitarem seus usos na produção de ali-mentos e produção de bebidas.

Por exemplo, na produção do vinho eles utilizavam os conhecidos fermentos, que nada mais são do que um fungo conhecido como levedura, que permite a transformação de açúcares em álcool e a modificação do suco ou mosto em vi-nho. Este processo é realizado por várias reações químicas que acontecem em série, e ao final geram moléculas responsáveis pelo gosto e aromas dos vinhos tão apreciados por todos nós.

1.4 Microbiologia e fermentação

Com o uso de um microscópio rudimentar, Antony van Leeuwenhoek, conseguiu observar pela primeira vez bactérias e protozoários, para ele “pequenos animais”. Também percebeu que os micro-organismos pode-riam estar envolvidos de alguma forma na fermentação. Mas, somente no

A cerveja, produzida e consumida há uns 6.000 anos por sumérios e babilônicos é obtida usando o fungo Saccharomyces cerevisae. Os pães fabricados e consumidos mais recentemente na história utilizam também Saccharomyces cerevisae em métodos fermentativos. Em seu crescimento, a massa do pão ficava exposta à ação de leveduras, que, ao consumirem o açúcar do amido, liberavam gás carbônico. Em seguida, pedaços de massa fermentada eram preservados para acelerar o processo no dia seguinte.

Figura 1.2 – O fungo unicelular, a levedura Saccharomyces cerevisae, usado desde a antiguidade na produ-ção de pães, vinhos e cervejas fonte: GOOGLE, 2011

Existem fungos chamados de verdadeiros. Os citridiomicetos, aquáticos, com flagelo para natação nos gametas, como o Rhizidium braziliensis; os zigomicetos, não adaptados a ambientes aquáticos e com gametas sem flagelo, como Rhizopus stolonifer; os ascomicetos, com esporos compostos por estruturas chamadas ‘ascos’, como Saccharomyces cerevisae (Figura 1.2) e os basidiomicetos com esporos, formados em estruturas denominados ‘basídios’, como Agaricus campestris.

Biotecnologia em Debate 11

século XIX, Louis Pasteur mostrou capacidade fermentativa dos micro--organismos, através da ação do levedo sobre os açúcares simples como a glicose e a frutose produzindo álcool com a ação de enzimas. A partir disto, no final do século XIX, houve o desenvolvimento de vários processos industriais, obtendo-se o álcool etílico e butílico, ácido acético e acetona, e desenvolvidas metodologias para a compostagem de lixo sólido e trata-mento de água e esgoto.

Figura 1.3 – Personagens do desenvolvimento da microbiologia. John Tyndall, Robert Koch e Alexander Flemmingfonte: www.google.com

2. Breve histórico da biotecnologia moderna2.1 Principais descobertas

Para compreendermos como se desenvolveu e estabeleceu a biotecnologia moderna, podemos dizer que eles aconteceram em três fases. Na primeira etapa que compreendeu o período de 1867 do século XIX até 1967 do século XX houve a descoberta da molécula do DNA e sua síntese em laboratório, além da comercialização da penicilina. Na segunda etapa que se inicia em 1971 e termina em 1982, compreende as bases da clonagem de genes reali-zadas por Cohen e Boyer em 1971. Foi iniciada a produção de insulina huma-na pela tecnologia do DNA recombinante e clonado o hormônio de crescimen-to hGH (do inglês: Human Growth Hormony).

Na terceira fase foi possível fazer a transferência de genes e expres-sões de genes para resistência aos antibióticos em plantas, transferência de gene entre duas plantas e transferência de genes de leveduras para plantas. Foram clonados o TNF, o fator da necrose tumoral, para o trata-mento de câncer e o Fator VIII para tratamento da hemofilia, aprovação do TPA para dissolver coágulos sanguíneos, obtido por DNA recombinante, bem como o desenvolvimento de variedade de milho com elevado teor do aminoácido triptofano.

Em 1874, William Roberts observou que bactérias não cresciam na presença do fungo Penicillium, um fungo do bolor do pão. Em 1875, o médico inglês John Tyndall verificou que a presença do Penicillium inibia o crescimento bacteriano em caldo de carne. Em 1882, Robert Koch demonstrou que as bactérias eram causadoras de doenças. E por fim, em 1928, Alexander Fleming ao cultivar bactérias, algumas regiões da placa onde as bactérias cresciam não se multiplicavam, devido à presença do Penicillium que produzia o antibiótico penicilina, que matava as bactérias nessas regiões. Esta descoberta salvou e continua salvando milhares de pessoas de várias doenças, tais como a meningite, pneumonia e doenças sexualmente transmissíveis como gonorreia e sífilis (Figura 1.3).

PEREIRA, A. J.12

2.2 De Mendel ao primeiro transgênico

Usando plantas de ervilhas, de fácil ger-minação e cresci-mento foi em 1865, que o monge Gregor Mendel estabeleceu a base para a moder-na biotecnologia, ao demonstrar a que a transmissão, de ge-ração a geração, de certas características de uma planta seguia um padrão estatístico, indicando a presença de unidades de hereditariedade, hoje conhecidos como genes (Figura 1.4a).

Mas a relação entre o ácido desoxirribonucleico (DNA) e os genes só foi estabelecida em 1953, quando Francis Crick e James Watson descobriram como o DNA direciona o desenvolvimento e o crescimento de todos os organis-mos vivos (Figura 1.4b). A união das observações de Watson e Crick junto com a difração de raios-X obtidas por Rosalind Franklin e Maurice Wilkins promoveu o modelo da estrutura do DNA. A partir daí, iniciaram-se trabalhos para transferir genes, ou pedaços de DNA de um organismo para outro, o que se tornou pos-sível nos anos 80, com o aprimoramento da tecnologia do DNA recombinante que permite obter fragmentos de DNA específicos e inseri-los em locais deter-minados do genoma. Essa tecnologia levou à obtenção das primeiras plantas, animais e micro-organismos geneticamente modificados. Conseguiu-se alterar o genoma de um organismo com a inserção de pedaços de DNA exógenos, ou seja, de outro organismo, surgindo um novo ser denominado transgênico.

3. O homem manipulando a natureza3.1 Domesticação de plantas

Nós seres humanos dependemos dos produtos da natureza para obtermos os nutrientes e nos mantermos vivos. Por esta razão, os nossos antepassados nômades, comiam frutas silvestres, nozes, raízes e a carne dos animais que obtinham quando saiam para caçar. Estes coletores e caçadores consumiam apenas aquilo que era possível extrair da natureza, sem destruir ou modifi-car de forma significativa o meio ambiente quando as incertezas das secas

(a) (b)Figura 1.4 – (a) Gregor Mendel fazendo cruzamentos com ervi-lhas estabeleceu as bases da hereditariedade; b) James Wat-son e Francis Crick descreveram o modelo da molécula do DNAfonte: GOOGLE, 2011

e cheias significavam a diferença entre a fome e a sobrevivência. Mas, com o início da agricultura há mais ou menos 12 mil anos, até mesmo nas mais rudimentares sociedades, as possibilidades de sobrevivência começaram a mudar de maneira fenomenal.

Nossos ancestrais começaram a domesticar os animais e a cultivarem plantas, começaram a se fixar em suas terras e deram início à produção de alimentos, em pequenas quantidades, para suprir suas necessidades básicas. Esses pioneiros identificaram e selecionaram plantas, semeando e colhendo sementes de espécies selvagens para produzir colheitas mais abundantes e de melhor qualidade para a produção de alimentos.

3.2 Domesticação de animais

Com o desenvolvimento de terras aráveis do Oriente Médio ou “Crescente Fértil”, uma área que vai da Palestina ao Irã ocidental, há mais ou menos oito mil anos atrás, surgiu uma dependência do homem pelos cereais silvestres disponíveis nas redondezas, além de um suprimento de animais adequado a domesticação.

O animal ideal para a domesticação teria que ser dócil, com movimen-tos lentos, fácil de capturar, tolerante ao confinamento e que se reproduzisse em cativeiro sem problemas. Também ajudava se ele não fosse muito enjoado para comida e que tivesse o instinto de seguir um líder. Assim os criadores do Crescente Fértil, encontraram três animais com essas características: a ovelha, a cabra e a vaca.

4. O homem manipulando o DNA4.1 A engenharia genética

Entre nossos amigos e familiares podemos encontrar pessoas com diabetes que precisam obter insulina e aplicá-la em seus corpos para reduzir os níveis de glicose em sua circulação sanguínea. Antigamente, a insulina era extraída dos órgãos internos de animais, mas com o advento da tecnologia do DNA recombi-nante, esse hormônio pode ser produzido em grandes quantidades e usado de forma segura e eficaz através da tecnologia do DNA recombinante.

Ao falarmos de engenharia genética ou tecnologia do DNA recombinante, é importante saber que o seu desenvolvimento só foi possível após o esclarecimen-to da estrutura do DNA, e com a compreensão do código genético em que cada códon corresponde a um só aminoácido, mesmo que diferentes códons possam especificar o mesmo aminoácido; e que os dois primeiros nucleotídeos sejam em geral, suficientes para especificar um aminoácido determinado; ou seja, códons com sequências semelhantes e que especificam os mesmos aminoácidos.

Durante mais de 10 mil anos, após a última era glacial, o processo denominado domesticação, que compreende várias práticas receberam o nome de melhoramento genético clássico. O processo desenvolveu-se de uma forma independente nas regiões da Mesoamérica, do sul dos Andes, do Oriente Médio, da África, do Sudeste Asiático e da China. Essas práticas envolveram a seleção nos diversos estágios de crescimento, de mutações genéticas espontâneas que ocorriam no estado selvagem. Além disto, em todas as gerações dos organismos que estavam a sua disposição, deveria ser permitida a reprodução daqueles que apresentavam as características mais adequadas ao interesse humano, tais como: aumento na produtividade dos grãos e mudanças de cor, tamanho, gosto e textura dos frutos.

Para melhorar as espécies selvagens animais e vegetais, utilizamos a variância genética já existente nesses organismos para aumentar seu número com características úteis para nós e descartar os organismos menos interessantes para nossos objetivos. Por fim, selecionam-se variedades homogêneas entre si e as diferentes uma das outras, já que cada uma é adaptada para uma função diferente. Durante o processo de domesticação do cão, por exemplo, foram obtidas raças muito diferentes utilizadas para várias finalidades, tais como a caça, a guarda e o pastoreio de outros animais. Isto também ocorreu com os bovinos, com a cabra e com o cavalo.

Biotecnologia em Debate 13

e cheias significavam a diferença entre a fome e a sobrevivência. Mas, com o início da agricultura há mais ou menos 12 mil anos, até mesmo nas mais rudimentares sociedades, as possibilidades de sobrevivência começaram a mudar de maneira fenomenal.

Nossos ancestrais começaram a domesticar os animais e a cultivarem plantas, começaram a se fixar em suas terras e deram início à produção de alimentos, em pequenas quantidades, para suprir suas necessidades básicas. Esses pioneiros identificaram e selecionaram plantas, semeando e colhendo sementes de espécies selvagens para produzir colheitas mais abundantes e de melhor qualidade para a produção de alimentos.

3.2 Domesticação de animais

Com o desenvolvimento de terras aráveis do Oriente Médio ou “Crescente Fértil”, uma área que vai da Palestina ao Irã ocidental, há mais ou menos oito mil anos atrás, surgiu uma dependência do homem pelos cereais silvestres disponíveis nas redondezas, além de um suprimento de animais adequado a domesticação.

O animal ideal para a domesticação teria que ser dócil, com movimen-tos lentos, fácil de capturar, tolerante ao confinamento e que se reproduzisse em cativeiro sem problemas. Também ajudava se ele não fosse muito enjoado para comida e que tivesse o instinto de seguir um líder. Assim os criadores do Crescente Fértil, encontraram três animais com essas características: a ovelha, a cabra e a vaca.

4. O homem manipulando o DNA4.1 A engenharia genética

Entre nossos amigos e familiares podemos encontrar pessoas com diabetes que precisam obter insulina e aplicá-la em seus corpos para reduzir os níveis de glicose em sua circulação sanguínea. Antigamente, a insulina era extraída dos órgãos internos de animais, mas com o advento da tecnologia do DNA recombi-nante, esse hormônio pode ser produzido em grandes quantidades e usado de forma segura e eficaz através da tecnologia do DNA recombinante.

Ao falarmos de engenharia genética ou tecnologia do DNA recombinante, é importante saber que o seu desenvolvimento só foi possível após o esclarecimen-to da estrutura do DNA, e com a compreensão do código genético em que cada códon corresponde a um só aminoácido, mesmo que diferentes códons possam especificar o mesmo aminoácido; e que os dois primeiros nucleotídeos sejam em geral, suficientes para especificar um aminoácido determinado; ou seja, códons com sequências semelhantes e que especificam os mesmos aminoácidos.

Durante mais de 10 mil anos, após a última era glacial, o processo denominado domesticação, que compreende várias práticas receberam o nome de melhoramento genético clássico. O processo desenvolveu-se de uma forma independente nas regiões da Mesoamérica, do sul dos Andes, do Oriente Médio, da África, do Sudeste Asiático e da China. Essas práticas envolveram a seleção nos diversos estágios de crescimento, de mutações genéticas espontâneas que ocorriam no estado selvagem. Além disto, em todas as gerações dos organismos que estavam a sua disposição, deveria ser permitida a reprodução daqueles que apresentavam as características mais adequadas ao interesse humano, tais como: aumento na produtividade dos grãos e mudanças de cor, tamanho, gosto e textura dos frutos.

Para melhorar as espécies selvagens animais e vegetais, utilizamos a variância genética já existente nesses organismos para aumentar seu número com características úteis para nós e descartar os organismos menos interessantes para nossos objetivos. Por fim, selecionam-se variedades homogêneas entre si e as diferentes uma das outras, já que cada uma é adaptada para uma função diferente. Durante o processo de domesticação do cão, por exemplo, foram obtidas raças muito diferentes utilizadas para várias finalidades, tais como a caça, a guarda e o pastoreio de outros animais. Isto também ocorreu com os bovinos, com a cabra e com o cavalo.

PEREIRA, A. J.14

O código genético é praticamente universal, sendo o mesmo em quase todos os seres vivos e a alta capacidade de adaptação do código genético a alte-rações ambientais, permitem que um ser vivo realize a leitura do códon conforme lhe seja conveniente. Importante também é saber que as mutações podem ocor-rer em um gene codificador de uma proteína essencial ao ser vivo e que se este gene mutado estiver presente numa única cópia no genoma, ele poderá ser letal.

As técnicas envolvidas na tecnologia de DNA recombinante começa-ram a serem definidas no início do ano de 1970, com a utilização de vetores de clonagem, em geral, os plasmídeos e genomas virais, e uso das chamadas enzimas de restrição que permitem cortar o DNA em pontos específicos, iso-lando-se pedaços de ácido nucleico que podem ser introduzidos no genoma de outro organismo com moléculas idênticas de DNA.

É a chamada clonagem molecular, em que, se corta a molécula do ácido nucleico de uma célula de interesse e, numa fase posterior, se insere o fragmen-to do DNA no ácido nucleico em uma célula hospedeira compatível. Quando esta se divide, ela duplica a molécula do fragmento de DNA inserido. A primeira experiência de clonagem de DNA ocorreu em 1972 por um grupo de pesquisa-dores chefiados por Paul Berg, que recebeu o prêmio Nobel em 1980.

A partir de então, o desenvolvimento da tecnologia do DNA recombinan-te cresceu de forma exponencial. Com o aparecimento da reação em cadeia da polimerase (PCR) em 1987, tornou-se possível amplificar determinado gene a partir de pequenas quantidades de DNA.

4.2 Técnicas da Engenharia Genética

a) PCR: Reação em Cadeia da Polimerase

O princípio da PCR baseia-se nas propriedades de desnaturação e renatura-ção da molécula de DNA quando submetida a elevadas temperaturas. Assim, em temperaturas próximas dos 95ºC, as duas cadeias de DNA separam-se, voltando depois a ligar-se após o abaixamento da temperatura. A ideia chave na amplificação do DNA em tubo de ensaio é a adição de pequenas sequên-cias chamadas iniciadores ou primers, que margeiam a região que se pre-tende estudar e, de uma DNA polimerase termoestável, capaz de resistir às elevadas temperaturas alcançadas a Taq, foi encontrada num organismo que vive em fontes termais (Thermus aquaticus).

Uma reação de PCR é constituída por três passos, que se repetem cicli-camente durante algumas horas (Figura 1.5). O primeiro passo corresponde à desnaturação do DNA conseguida a uma elevada temperatura, o segundo passo à ligação dos primers às cadeias de DNA simples, e o terceiro passo à extensão, ou seja, à incorporação dos diferentes nucleotídeos (A, T, G e C) presentes no

Biotecnologia em Debate 15

tubo de ensaio pela ação da Taq, reproduzindo-se, assim, a porção da sequência de DNA que se situa entre os dois primers. Estes três passos são depois repeti-dos um determinado número de vezes (tipicamente 30 a 35 vezes), resultando em cada ciclo na duplicação da quantidade de DNA da sequência pretendida. Desta forma, o número de cópias dessa sequência é tão elevado no final da reação de PCR que pode considerar-se o conteúdo do tubo como uma solução purificada da porção pretendida do DNA do organismo em estudo.

Figura 1.5 – PCR (Reação em cadeia da polimerase): (a) molécula de DNA. (b) duas cadeias de DNA com os respectivos primers; (c) desnaturação e renaturação da mo-lécula de DNA em função de temperatura e tempo; (d) moléculas de DNA amplifica-das depois de vários ciclos.Fonte: www.google.com.

b) As enzimas de restrição e ligases

A participação das enzimas ou endonucleases de restrição é essencial para a técnica do DNA recombinante. Cada enzima possui um padrão específico de corte da molécula de DNA, resultando vários fragmentos genômicos que podem ser isolados, clonados e sequenciados. Tão importantes quanto às en-zimas de restrição são as ligases, enzimas que possuem a capacidade de ligar, covalentemente, as extremidades livres dos fragmentos de DNA, o que pode ocorrer tanto in vivo como in vitro.

Realmente estas enzimas não fazem mais do que catalisar a formação de uma ligação fosfodiester entre o terminal hidroxila 3’ e o terminal fosfato 5’ de dois nucleotídeos adjacentes, restabelecendo a continuidade estrutural do DNA. A reação de ligação do DNA in vitro reduz a susceptibilidade do ácido nucléico à degradação nucleolítica intracelular, preserva os terminais coesivos gerados pelas enzimas de restrição e permite obterem-se moléculas de DNA recombinates circulares ou lineares.

Existem vários vetores de clonagem. Os plasmídeos são moléculas de DNA extra-cromossômico, encontrados em bactérias e algumas leveduras com capacidade de duplicar de forma autônoma. Possuem geralmente genes que lhes conferem resistência a antibióticos, como a ampicilina e a tetraciclina. São estes genes que permitem fazer distinção entre células hospedeiras com DNA recombinante das células que não o possuem. Outros vetores de clonagem são os bacteriófagos, que enxertados com DNA recombinante, podem ser introduzidos por infecção na célula hospedeira. Existem também cosmídeos que são vetores mistos, com um gene que confere resistência a antibióticos.

PEREIRA, A. J.16

4.3 Construindo uma molécula de DNA recombinante

Como já referimos, a manipulação genética compreende quatro fases: escolha do fragmento de DNA a ser utilizado, corte deste fragmento, sua transferência e inserção no genoma de determinada célula e, finalmente, seleção das células que possuem as moléculas do clone desejado. Esta última fase é a que oferece maior dificuldade, por ser muito demorada, dependendo da utilização dos cha-mados bancos de DNA. Um banco de DNA possui todas as moléculas de DNA geradas pela inserção do ácido nucleico da fonte de interesse num determinado vetor, o que significa poderem existir vários tipos de bancos, conforme a nature-za da inserção e o tipo de vetor utilizado.

Assim, o tipo de banco a ser preparado vai depender do tipo de pesqui-sa em curso. Os elementos que formam os bancos genômicos são clones de DNA do genoma de determinado ser vivo, clones estes, obtidos com ve-tores, como por exemplo, bacteriófagos, que aceitam inserções de grandes tamanhos. Estas inserções têm a vantagem de permitir a obtenção de todo o genoma em um número reduzido de clones, ou, por vezes, do gene intacto em um único clone (Figura 1.6).

Figura 1.6 – Construção do DNA recombinante.

fonte: www.google.com

4.4 A clonagem molecular

Após o advento da engenharia genética, a palavra clone passou a ser usada também para fragmentos de DNA inseridos no interior de uma bactéria e pro-pagados de forma assexuada. Na biologia molecular de micro-organismos, uma colônia de bactérias é conhecida como um clone. A clonagem mole-cular consiste na propagação de moléculas de DNA idênticas e baseia-se na propagação natural de células ou indivíduos geneticamente idênticos ao

Além dos bancos de DNA, recorre-se, muitas vezes, a bancos de DNA complementar DNAc de muito menor complexidade, uma vez que contêm somente as sequências codificadoras de determinada proteína expressa no tipo célula que está sendo usado. Neste caso a identificação do clone é de muito mais simples execução. O primeiro passo para construir um banco de DNAc consiste em isolar o RNA mensageiro; em seguida este é transformado em um híbrido DNA:RNA, o que se consegue usando a transcriptase reserva; com o auxílio de uma outra enzima, a polimerase I, o RNA daquele híbrido é substituído por DNA, e só então esta fita dupla DNA:DNA é inserida num vetor e introduzida na célula hospedeira.

Continua...

▸ ContinuaçãoA identificação do clone pode ser feita por hibridização de sondas de DNA ou RNA marcadas radioativamente, com as bases complementares do clone, sendo a localização feita por autoradiografia. Quando um fragmento de ADN clonado é transcrito e traduzido in vivo, a proteína resultante pode ser identificada imunologicamente, desde que se possua o anticorpo específico, em geral, marcado com I125. Trata-se de outro processo de identificação. Com a possibilidade hoje existente de utilizar sintetizadores automáticos, a síntese de oligonucleotídeos e oligopeptideos tornou-se uma tarefa laboratorial altamente simplificada. O DNA pode ser sintetizado sob a forma de fita simples, tanto de pequeno tamanho, quanto de tamanho maior. Usando as fitas de pequeno tamanho pode introduzir- se mutações em genes. As fitas de DNA de grande tamanho (200pb) usam-se tanto como sondas, como para construir genes sintéticos que têm a enorme vantagem de possuir sítios de clivagem para as endonucleases de restrição, que não se encontram nos genes naturais, o que torna a manipulação daqueles muito mais facilitada.

Biotecnologia em Debate 17

4.3 Construindo uma molécula de DNA recombinante

Como já referimos, a manipulação genética compreende quatro fases: escolha do fragmento de DNA a ser utilizado, corte deste fragmento, sua transferência e inserção no genoma de determinada célula e, finalmente, seleção das células que possuem as moléculas do clone desejado. Esta última fase é a que oferece maior dificuldade, por ser muito demorada, dependendo da utilização dos cha-mados bancos de DNA. Um banco de DNA possui todas as moléculas de DNA geradas pela inserção do ácido nucleico da fonte de interesse num determinado vetor, o que significa poderem existir vários tipos de bancos, conforme a nature-za da inserção e o tipo de vetor utilizado.

Assim, o tipo de banco a ser preparado vai depender do tipo de pesqui-sa em curso. Os elementos que formam os bancos genômicos são clones de DNA do genoma de determinado ser vivo, clones estes, obtidos com ve-tores, como por exemplo, bacteriófagos, que aceitam inserções de grandes tamanhos. Estas inserções têm a vantagem de permitir a obtenção de todo o genoma em um número reduzido de clones, ou, por vezes, do gene intacto em um único clone (Figura 1.6).

Figura 1.6 – Construção do DNA recombinante.

fonte: www.google.com

4.4 A clonagem molecular

Após o advento da engenharia genética, a palavra clone passou a ser usada também para fragmentos de DNA inseridos no interior de uma bactéria e pro-pagados de forma assexuada. Na biologia molecular de micro-organismos, uma colônia de bactérias é conhecida como um clone. A clonagem mole-cular consiste na propagação de moléculas de DNA idênticas e baseia-se na propagação natural de células ou indivíduos geneticamente idênticos ao

Além dos bancos de DNA, recorre-se, muitas vezes, a bancos de DNA complementar DNAc de muito menor complexidade, uma vez que contêm somente as sequências codificadoras de determinada proteína expressa no tipo célula que está sendo usado. Neste caso a identificação do clone é de muito mais simples execução. O primeiro passo para construir um banco de DNAc consiste em isolar o RNA mensageiro; em seguida este é transformado em um híbrido DNA:RNA, o que se consegue usando a transcriptase reserva; com o auxílio de uma outra enzima, a polimerase I, o RNA daquele híbrido é substituído por DNA, e só então esta fita dupla DNA:DNA é inserida num vetor e introduzida na célula hospedeira.

Continua...

▸ ContinuaçãoA identificação do clone pode ser feita por hibridização de sondas de DNA ou RNA marcadas radioativamente, com as bases complementares do clone, sendo a localização feita por autoradiografia. Quando um fragmento de ADN clonado é transcrito e traduzido in vivo, a proteína resultante pode ser identificada imunologicamente, desde que se possua o anticorpo específico, em geral, marcado com I125. Trata-se de outro processo de identificação. Com a possibilidade hoje existente de utilizar sintetizadores automáticos, a síntese de oligonucleotídeos e oligopeptideos tornou-se uma tarefa laboratorial altamente simplificada. O DNA pode ser sintetizado sob a forma de fita simples, tanto de pequeno tamanho, quanto de tamanho maior. Usando as fitas de pequeno tamanho pode introduzir- se mutações em genes. As fitas de DNA de grande tamanho (200pb) usam-se tanto como sondas, como para construir genes sintéticos que têm a enorme vantagem de possuir sítios de clivagem para as endonucleases de restrição, que não se encontram nos genes naturais, o que torna a manipulação daqueles muito mais facilitada.

inicial. O experimento de clonagem gênica consiste em introduzir o gene de interesse dentro de células bacterianas e posteriormente fazer o isolamento delas em colônias.

As células de cada colônia são idênticas entre si. A clonagem molecu-lar consiste em fazer a ligação entre um fragmento de DNA, chamado inser-to, contendo o gene de interesse com outra molécula de DNA, o vetor, para formar uma quimera ou molécula de DNA recombinante. Após, a molécula de DNA recombinante é transportada para dentro de uma célula hospedeira, em geral uma bactéria, ocorrendo o processo de transformação. A célula que recebeu o DNA recombinante é chamada célula transformada, a qual sofre muitos ciclos de divisão, produzindo várias cópias do DNA recombinante.

4.5 Debatendo: vantagens e desvantagens da tecnologia do DNA recombinante

Vez por outra, alguns críticos manifestam-se, alegando que os riscos não compensam alguns benefícios obtidos pela tecnologia do DNA recombinante. Seus argumentos são: o que aconteceria com bactérias Streptococcus que recebessem um plasmídeo possuidor de um gene codificador da resistência à penicilina não encontrada nas diversas cepas daquela bactéria. Doenças como escarlatina, reumatismos e doenças renais, controlados por este an-tibiótico, passariam a ampliar o contingente das doenças resistente ao anti-biótico. A este respeito vale lembrar que a Natureza, talvez até com a ajuda do próprio homem, parece ter tomado a iniciativa, criando a oportunidade de aparecimento de uma mutação, que teria tornado um subgrupo dos estrepto-cocos resistentes à penicilina.

Membros deste subgrupo poderiam ser os responsáveis pela síndrome do choque tóxico, que preocupa os centros de controle das doenças infeccio-sas. Outro exemplo refere-se à possibilidade de cepas de E.coli, que fazem parte da flora intestinal humana adquirir a capacidade de sintetizar toxina bo-tulínica, ou determinado hormônio, situações que resultariam em óbvios resul-tados desastrosos.

Mais um exemplo, é o caso da implantação, em cepas de E. coli, de um gene de um vírus que ocasiona tumores malignos em animais de laboratório, de que poderia resultar o desenvolvimento de tumores no homem, cujo intes-tino é habitat natural daquela bactéria.

Todos estes exemplos, ou pelo menos alguns deles, parecem não le-var em consideração que é necessário o atendimento a um certo número de situações como multiplicação e sobrevivência no hospedeiro, transmissão de animal a animal, e resistência aos mecanismos de defesas do hospedeiro. Mesmo com a aceitação das desvantagens de alto risco, não é muito difí-

PEREIRA, A. J.18

cil vislumbrar as possibilidades benéficas da técnica do DNA recombinante como insulina a baixo custo, estudos de regulação da síntese de um RNA mensageiro, ou, ainda, as pesquisas in vitro da mutagenese dirigida.

Confrontando-se os benefícios com os riscos das técnicas do DNA re-combinante são sempre sujeitos a discussão: uns preferirão argumentos a favor, a outros argumentos contrários. Os próprios cientistas do DNA recombinante alertaram sobre os possíveis riscos inerentes. Mas até agora, ao contrário do que muitas vezes acontece na sociedade em geral, sabem comportar-se com a necessária responsabilidade. Naturalmente o processo não irá desenvolver-se sem contrariedades. E a ciência moderna sabe muito bem o que lhe é permitido e o que lhe é vedado. A dialética que usa é de método crítico de suas experiên-cias, o que lhe confere autoridade para saber que o seu domínio da Natureza é suficientemente utilizável na melhoria da condição humana.

As primeiras cidades foram surgindo e por consequência houve o aumento do consumo de alimentos. Neste tempo, começou a haver os desmatamentos para que houvesse campo para o desenvolvimento da monocultura, com péssimas consequências para o meio ambiente.

4.6 Debatendo: desvantagens da monocultura agrícola

A monocultura baseia-se no plantio extensivo de um único vegetal. Ela traz desvantagens tanto ambientais porque esgota o solo com o tempo e reduz a biodiversidade, quanto sociais, porque reduz o uso da mão de obra no cam-po e faz com que populações rurais migrem para as cidades. A monocultura agrícola esteve ligada no início com a produção de cana de açúcar escravista no período colonial. Na atualidade, ela está ligada à modernização e industria-lização da agricultura.

As principais vantagens da produção de um só produto são os altos ganhos de escala e uniformização da produção que permite a mecanização e a vinculação com mercados internacionais. Os problemas associados à mo-nocultura são o uso da terra em extensão e esquece-se a fertilidade natural e a estrutura do solo, e não se leva em consideração a paisagem, a biodiver-sidade e a vida social dos territórios, onde o fator ambiental é tratado como recurso, reduzido ao uso extensivo da terra.

A monocultura carece do uso de agrotóxicos, que quando utilizados em grande quantidade e em grandes extensões de terra gera grande risco am-biental. Além disso, a disseminação de uma única espécie vegetal, seja uma variedade melhorada convencionalmente ou um organismo geneticamente modificado, baseia-se na uniformização e igualdade de espécie, raça e linha-gem. Os riscos da monocultura estão ligados à ocorrência de pragas e doen-ças ou problemas climáticos que podem afetar toda a produção.

O DNA por ser uma molécula muito pequena, com apenas 2 nm (namômetros) de comprimento (1 nm = 1 milionésimo do mm), impossível de ser visto a olho nu e muito mais difícil de ser manipulado, pois não podemos enxergar moléculas individuais de DNA, mas podemos multiplicar várias moléculas dele até se tornar visível. Uma das tecnologias usadas com este objetivo é a PCR, que permite a multiplicação de um gene específico em uma pequena amostra de DNA. Com esta técnica podemos obter milhares de cópias de um gene e depois purificar o DNA do gene isolado ou detectar a presença de um gene em uma amostra.

As enzimas são utilizadas em muitos segmentos industriais, como o de alimentos e bebidas, de detergentes, têxtil, couro, celulose e papel, química fina, medicamentos e cosméticos e, ainda, em metodologia analítica e em biologia molecular. Amilases, glicose oxidase, pectinases, invertase, renina, naraginase, lipases, proteases, celulases e peroxidases são os biocatalisadores mais utilizados. Enzimas são também empregadas como medicamento, como por exemplo, a asparaginase utilizada no tratamento de leucemia (PEREIRA JR.; SILVA BOM; FERRARO, 2008).

Biotecnologia em Debate 19

Texto complementar

O vinho e a obesidadeDuas taças pequenas de vinho tinto por dia. Essa é a receita para prevenir a hiper-tensão, uma doença que ataca de forma silenciosa 30 milhões de brasileiros e pode causar derrames cerebrais, infartos e insuficiência renal. Recomenda-se aos adultos beberem as duas taças de vinho acompanhadas nas refeições, para ajudar a reduzir a absorção dos alimentos. Além disso, a comida impede o efeito inebriante do álcool. O suco de uva pode substituir o vinho, porém o consumo de dois copos diários poderia gerar outro problema: a obesidade.fonte: Adaptado da Revista Ciência Hoje, Seção Medicina, Instituto Ciência Hoje, SBPC, v. 37, p. 59, ago. 2005.

Iluminada criaçãoO vinho sempre esteve associado ao lado mais espiritual do homem e, muitas vezes, à loucura. Inspirador, quando tomado na medida certa, pode ser também o responsável por momentos menos construtivos. É capaz de potencializar a criação quando inunda uma alma apaixonada ou tornar insuportável a vida de outras. A embriaguez conduz cada indivíduo a diferentes caminhos. Uma mente confusa pode não se beneficiar dos lados mais iluminadores do vinho, ao mesmo tempo, que outras personalidades usam essa mesma luz para grandes processos criativos. De uma maneira ou de outra, ele nos modifica e permite novas percepções. O que nasce a partir de seus efeitos pode parecer loucura, mas é sempre o resultado exacerbado de mentes férteis e criativas que nos entregam o mais íntimo e profundo de si. Resta-nos tomar uma taça e tentar decifrá-las. “Beba vinho.” Fonte: CORVO (2011).

Síntese do Capítulo

Neste capítulo foi relatada a evolução histórica dos principais eventos ocorri-dos no desenvolvimento da biotecnologia. Primeiramente destacou-se a bio-tecnologia das fermentações usada há milênios pelos povos da antiguidade na produção de pães, vinhos, queijos, passando pelos experimentos de Men-del sobre as leis dos caracteres adquiridos e a descoberta da estrutura da molécula do DNA, por Watson e Crick, descobertas estas que, em conjunto, possibilitaram avanços para o surgimento da biotecnologia moderna, a Tecno-logia do DNA Recombinante.

Em seguida foram relatadas as técnicas de domesticação de plantas e animais usados pelo homem para diversas finalidades e apresentadas as van-tagens e desvantagens da tecnologia do DNA recombinante e desvantagens da monocultura agrícola.

PEREIRA, A. J.20

Leituras, filmes e sites@

CIB-CONSELHO DE INFORMAÇÕES SOBRE BIOTECNOLOGIA. O que você precisa saber sobre transgênicos. 2010. Disponível em < www.cib.org.br/pdf/guia_transgenicos_maio09.pdf

OLIVEIRA, T. H. G.; SANTOS, N.F.; BELTRAMINI, L. M. O DNA: uma sinop-se histórica. Revista Brasileira de Ensino de Bioquímica e Biologia Mole-cular, v.1, 2004. Disponível em: <http://www.sbbq.org.br/revista/viewpdf.php? artigoid=110>

BORÉM, A. A história da biotecnologia. A ciência que está surpreendendo até os mais otimistas. Biotecnologia Ciência e Desenvolvimento, n 34, p. 10-12, jan.-jun. 2005.

FREIRE-MAIA, N. Gregor Mendel: vida e obra. São Paulo: Queiroz Editor, 1995.

FREITAS, L. B.; BERED, F. Genética e evolução vegetal. Porto Alegre: Edi-tora da UFRGS, 2003.

SALZANO, F. M. DNA e eu com isso? São Paulo: Oficina de Textos, 2005.

WATSON, J. D.; BERRY, A. DNA: o segredo da vida. São Paulo: Editora Companhia das Letras, 2005.

Filmes

http://tvescola.mec.gov.br/index.php?option=com_zoo&view=item&item_id=4619 (história dos alimentos)

http://www.youtube.com/watch?v=zFm-G7geqPQ (fermentação)

(Série de Olho na Ciência (A Revolução da Biotecnologia-episódios 1-6)

http://www.youtube.com/watch?v=vUex0mGuv-s&feature=related

http://www.youtube.com/watch?v=INoAPaIOyiI&feature=related

http://www.youtube.com/watch?v=a2v2hiGhFGg&feature=related

http://www.youtube.com/watch?v=99U0NESBJEQ&feature=related

http://www.youtube.com/watch?v=-xdUMxRccEU&feature=related

http://www.youtube.com/watch?v=m3QoqPY1sMU&feature=related

http://www.youtube.com/watch?v=0wa7Ujk8ygU

Biotecnologia em Debate 21

Sites

http://www.cib.org.br/

http://www.mct.gov.br/index.php/content/view/6515.html

Textos, atividades online e para sala de aula

http://www.odnavaiaescola.com.br/

Pão, vinho e fungos.

http://chc.cienciahoje.uol.com.br/revsta/revista-chc-2003/138/pao-vinho-e--fungos-em-acao/o-pao-o-vinho-e-fungos-em-acao-0

Debate sobre monocultura agrícola

http://www.cienciamao.usp.br/dados/rec/_monoculturavoceecontraouafavor-rosiclermartinsrodr.arquivo.pdf

Atividades de avaliação

1. O que se entende por biotecnologia das fermentações?

2. Por que a domesticação de plantas e animais foi importante para o desen-volvimento da biotecnologia?

3. Pesquise sobre a vida e contribuição de Rosalind Franklin para a descober-ta da estrutura da molécula de DNA.

4. Pesquise sobre as principais contribuições de Robert Koch para a bio-tecnologia.

5. Faça uma pesquisa na internet sobre os problemas éticos relacionados com a manipulação do DNA pelo homem.

Referências

ARAGÃO, F. J. L. Organismos transgênicos: explicando e discutindo a tec-nologia. Barueri-SP: Manole, 2003.

AYDON, C. A história do homem: uma introdução a 150 mil anos de história humana. Rio de Janeiro: Editora Record, 2011.

BUIATTI, M. Biotecnologias: a engenharia genética entre biologia, ética e mercado. 1 ed. São Paulo: Edições Loyola, Edições Paulinas, 2004.

CORVO, A. Iluminada criação. Revista da Cultura. 49 ed., Publicação da Livraria Cultura, ago. 2011.

PEREIRA, A. J.22

GANDER, E. S.; MARCELLINO, L. H.; ZUMSTEIN, P. Biotecnologia para pedestres. Brasília: EMBRAPA- SPI, 1996.

GASSEN, H. G. Biotecnologia para países em desenvolvimento. Cadernos Adenauer: biotecnologia em discussão. São Paulo: Fundação Konrad Ade-nauer, v. 8, 2000.

KREUZER, H.; MASSEY, A. Engenharia genética e biotecnologia. 2 ed. Porto Alegre: Artmed, 2002.

PEREIRA J. R., N.; SILVA BOM, E.; FERRARO, M. A. Tecnologia de biopro-cessos. Rio de Janeiro: Escola de Química/UFRJ, 2008. 62 p. il. - (Séries em Biotecnologia, v. 1).

SALLES FILHO, S. L. M. Fundamentos para um programa de biotecnologia na área alimentar. Caderno Difusão Tecnológica, Brasília, v. 3, n.3, p. 379-405, 1986.

Capítulo 2Organismos Geneticamente

Modificados (OGM): plantas e animais transgênicos

Biotecnologia em Debate 25

Objetivos• Introduzir conceitos básicos e conhecimentos sobre os Organismos Ge-

neticamente Modificados, técnicas e processos de obtenção de plantas e animais transgênicos.

• Caracterizar a biossegurança, bioética e legislação vigente relacionada às plantas e animais transgênicos.

• Discutir sobre as vantagens e desvantagens dos produtos geneticamente modificados.

1. Os alimentos e os organismos geneticamente modificados (OGM)

Várias crianças, adultos, homens e mulheres, perambulam pelas ruas das nos-sas cidades em busca de um simples prato de comida. Muitos destes famintos reviram o lixo contido em recipientes nas calçadas, na esperança de encontrar restos de comida que algum morador porventura tenha jogado fora (Figura 2.1).

Uma triste realidade que cresce a cada dia diante de nossos olhos, de-vido ao aumento da população humana e principalmente da má distribuição de renda e outros fatores sociais e econômicos. Devemos ter em mente que é um fato a fome ter se agravado no planeta, mas a produção de alimentos tem sido realizada desde a chamada Revolução Verde no século passado, e mais recentemente com a chamada Revolução Biotecnológica com a grande produção de plantas transgênicas. Entretanto, muitas promessas feitas pelos defensores dos alimentos transgênicos de acabar com a fome na Terra tem sido intangíveis.

Poucas empresas controlam o essencial da comercialização de or-ganismos geneticamente modificados (OGMs).Poucos países, dentre eles, os Estados Unidos, Argentina, Canadá e China cultivam os OGMs e ape-nas as plantas OGMs de soja, algodão, canola e milho se destacam entre as que apresentam características herbicidas e inseticidas. Ao contrário do que é propagado pela mídia, os OGMs ainda não “dominaram” a agricultura mundial, pois a tecnologia é recente com aplicação em poucas plantas, que são cultivadas em poucos países e produzidas por poucas empresas.

Figura 2.1 – Uma criança se ali-mentando de sobras de alimentos.Fonte: www.google.com.

PEREIRA, A. J.26

1.1 Transformação gênica

Muitas vezes nos lugares mais inesperados encontramos pessoas que nos ajudam a darmos uma guinada em nossas vidas e firmando ótimas parcerias. Pois, foi exatamente isto que aconteceu em 1972 no Havaí, quando dois bio-químicos americanos Stanley Cohen e Herbert Boyer estavam participando de um encontro sobre plasmídeos e, resolveram unir seus conhecimentos sobre plasmídeos e enzimas de restrição para desenvolverem a tecnologia do DNA recombinante, ou engenharia genética (Figura 2.2). Eles isolaram o gene que codifica o RNA ribossômico (rRNA) de uma molécula do DNA de uma rã africana e depois inseriram esse gene no DNA da bactéria Esche-richia coli. A bactéria durante o processo de transcrição, produziu o rRNA da rã, que foi o primeiro ser vivo alterado geneticamente. Este momento foi muito importante, pois permitiu que houvesse a quebra da barreira biológica que separavam os seres vivos, com a transferên-cia de características de uma espécie para outra.

Figura 2.2 – Stanley Cohen e Herbert Boyer, os primei-ros engenheiros genéticos do mundo.Fonte: www.google.com.

Figura 2.3 – Célula de Escherichia. coli com seu cromossomo e plasmí-deo, e as estruturas que formam um plasmídeo.Fonte: www.google.com.

Plasmídeos são pequenos cromossomos circulares encontrados em bactérias que costumam conter genes de resistência a antibióticos. Eles se replicam independentemente do cromossomo principal da célula e podem ser transmitidos de uma bactéria para outra (Figura 2.3).

Biotecnologia em Debate 27

Até o momento, a engenharia genética gerou vários Organismos Gene-ticamente Modificados (OGMs) que permitiram avanços e vários impactos na sociedade humana, tanto na produção de novos medicamentos, quanto na produção de alimentos com melhor qualidade nutricional.

Da lista de OGMs fazem parte bactérias que são usadas como fábri-cas sintetizadoras de insulina humana, o hormônio de crescimento (hGH) e substâncias anticancerígenas. Além da área médica e farmacêutica, a bio-engenharia também possibilitou a produção de produtos agrícolas contendo resistência a pragas ou com maior quantidade de nutrientes. São exemplos destes produtos, a variedade de tomate ‘Flavr Savr’, a soja transgênica Roun-dup Ready e o milho Bt, dentre outros.

1.2 Como se faz um transgênico

Para se construir um transgênico é necessário: o DNA de um organismo euca-riótico contendo o gene de interesse isolá-lo pelo corte com enzimas de res-trição; o DNA de um vetor de clonagem, um plasmídeo, por exemplo, cortado pela enzima de restrição. Após é necessário produzir um plasmídeo híbrido com os fragmentos do DNA do organismo e do vetor com uso da enzima liga-se, que mantêm as extremidades dos fragmentos do DNA unidas.

As células hospedeiras, geralmente E. coli, captam o plasmídeo híbrido; e por meio da clonagem gênica a célula hospedeira é transformada, gerando várias clones do gene de interesse cada vez que a bactéria se reproduz, desta maneira o plasmídeo se reproduz junto com a multiplicação celular. Uma tria-gem é realizada para separar as células que receberam o gene de interesse das células que não contem o vetor com o gene de interesse.

Por fim, essas células se tornam capazes de transcrever e traduzir o gene de interesse na síntese da proteína codificada por este gene. Em uma modificação ge-nética, o transgene é incorporado no genoma de um organismo através de um vetor que contém muitos outros genes promotores, “terminators” e marcadores da resistência antibiótica cuja ação poderá contribuir no efeito global (Figura 2.4).

a)

b)

Figura 2.4 – Primeiros passos para obtenção de um transgênico. a) seleção do gene de interesse, b) isolamento do gene in vitro.Fonte: www.google.com

Os Organismos Geneticamente Modificados (OGMs) ou transgênicos abrangem todo animal, planta ou microrganismo em que seu material genético, DNA ou RNA, tenha sido modificado pela inserção de um ou mais genes em seu genoma por qualquer técnica de engenharia genética. Estes genes inseridos visam melhorar uma determinada característica ou produzir uma proteína que não seria naturalmente expressa pelo organismo nativo. Por exemplo, a produção no leite de cabra do hormônio insulina usada pelos diabéticos ou a resistência do milho a um determinado vírus, herbicida ou insetos.

Sementes de um determinado tipo de planta transgênica geradas pela tecnologia conhecida como “Terminator”, exterminador em inglês, são controladas por grandes empresas. Essas sementes são resultantes de modificações genéticas feitas nas plantas para produzir sementes estéreis, ou seja, que não se reproduzem. Existe um controle do uso desta técnica, pois a semente guardada da colheita, de uma variedade com tecnologia ‘Terminator’, não poderá ser usada para plantio na safra seguinte, pois esta não germinará, ela está morta (Figura 2.5).

PEREIRA, A. J.28

Figura 2.5 – A sequência do DNA a ser transferida deve conter um gene selecionado, por exemplo, o gene Bt de resistência a inseto, dois promotores eucarióticos ativos na planta, um para o gene selecionado e um para o gene marcador e, dois terminadores, um para gene selecionado e outro para o gene marcador. Fonte: www.google.com.

Considerando que o DNA nem sempre se decompõe no trânsito alimen-tar dos animais e homem, fragmentos funcionais do gene marcador de resis-tência a um antibiótico poderão sobreviver e ser absorvidos por uma bactéria intestinal que contribuirá, assim, a difundir a resistência a esse antibiótico. É deste modo que uma parte de um plasmídeo geneticamente modificado so-breviveu aos efeitos da exposição à saliva humana durante uma hora e con-seguiu transformar bactérias da boca. A saliva contém determinados fatores que aceleram a transformação de bactérias pelo DNA nu.

Figura 2.6 – Construção gênica com a inserção do novo gene no plasmídeo vetorFonte: www.google.com.

2. As plantas transgênicas

Chamam-se plantas geneticamente modificadas ou transgênicas, aquelas em que novos genes, responsáveis por características desejáveis são, após prévia identificação e isolamento a partir de diversos organismos, nelas in-corporados e expressos de modo estável. Entre vários genes com interesse agronômico destacam-se os que conferem resistência a diversos patógenos, vírus, bactérias, fungos e nematoides ou a insetos nocivos, bem como tolerân-

O primeiro transgênico criado foi a bactéria Escherichia coli, que sofreu adição de genes humanos para a produção de insulina na década de 1980. Em 1983 foi obtida a primeira planta transgênica: uma planta de tabaco resistente a um tipo de antibiótico. As plantas geneticamente modificadas resistentes a insetos, vírus e bactérias foram testadas em campo pela primeira vez em 1985. Depois vieram outras plantas e animais transgênicos, inclusive ratos, macacos, gado e cabras.

Enzimas de restrição: são enzimas bacterianas que são capazes de reconhecer, ligar-se e cortar pequenas sequencias de DNA entre nucleotídeos específicos.

Vetor: é um agente usado para carregar o gene de interesse para outra célula. Os vetores mais usados são os vírus, leveduras e plasmídeos.

Biotecnologia em Debate 29

cia a herbicidas. Os OGMs cultivados são, em 99% dos casos, de dois tipos: “OGMs herbicidas” e “OGMs inseticidas”.

Os primeiros são plantas geneticamente modificadas para metabolizar um herbicida. Os segundos são geneticamente modificados para produzir, ao longo de todo o seu ciclo e em todas as suas células, um inseticida. Há uma terceira categoria de OGMs, minoritária, que é resistente a um ataque de vírus.

Há uma preocupação de que o “promotor” usado em alimentos transgê-nicos possa se transferir para bactérias ou órgãos internos humanos. Promo-tores permanentemente ativam os genes que, de outra forma, poderiam estar desativados. Cientistas acreditam que isso possa criar efeitos imprevisíveis à saúde, incluindo crescimento celular pré-cancerígeno, encontrado nos estu-dos de alimentação animal.

2.1 Plantas transgênicas com resistência aos herbicidas

As primeiras plantas transgênicas produzidas têm genes para resistência a herbicidas, devido à facilidade de manipulação. O fumo tolerante a um herbici-da foi a primeira cultura transgênica a obter aprovação para comercialização, antes mesmo do tomate “Flavr Savr”. A resistência aos herbicidas pode ser obtida por três mecanismos diferentes:

• Através da produção excessiva do alvo bioquímico sensível ao herbicida;

• De uma alteração estrutural, resultando em uma afinidade reduzida ou in-sensibilidade ao herbicida;

• Da degradação do herbicida antes de atingir o alvo dentro da célula.

Teoricamente é possível a introdução de tolerância a qualquer herbi-cida em qualquer planta, desde que os herbicidas apresentem dentre outros aspectos, largo espectro de atuação, elevada atividade unitária, rápida inati-vação, mínima volatibilidade e mobilidade no solo, toxicidade seletiva para as plantas, e mínima ou não toxicidade para espécies animais aquáticos, aves e para o Homem. Também deve ser considerado um baixo potencial de resis-tência a herbicida pelas plantas daninhas.

A tolerância aos herbicidas obtida por meio da transgênese não resulta em tolerância a todos os herbicidas, mas somente ao herbicida ou classe de herbicidas contra o(s) qual (is) o mecanismo foi desenvolvido. Existe um risco de um possível fluxo do gene de resistência ao herbicida da planta transgê-nica cultivada para as plantas daninhas. Para minimizar o fluxo do transgene para outras plantas, podem ser usadas práticas culturais em que o plane-jamento de ensaios de campo inclua bordaduras de campo com linhas de plantas com macho-esterilidade ou androestéreis, não polinizadoras; divisão de parcelas e rotação de culturas em conjunto com as culturas existentes nas plantações vizinhas.

Pesquisadores de Harvard nos Estados Unidos conseguiram desenvolver um rato transgênico para ser utilizado em pesquisas sobre câncer. Para tal fim, eles juntaram um pedaço pequeno do plasmídeo bacteriano com um oncogene obtido anteriormente de um rato em que foi injetado um gene estranho que produziu este oncogene. Após o oncogene junto com o plasmídeo bacteriano foram injetados em óvulos fertilizados do rato e implantados em uma fêmea. Por fim, alguns filhotes apresentaram em seus cromossomos o oncogene introduzido artificialmente e foram estimulados a se cruzarem entre si para produção de ratos portadores dos oncogenes.

Oncogene é um proto-oncogene de ocorrência normal que induz a atividade da telomerase, estimula a proliferação celular e aumenta o suprimento de sangue. Neste proto-oncogene pode ocorrer uma mutação de ganho de função, por exemplo, uma função reguladora em um gene de fator de crescimento, resultando na expressão aumentada ou na secreção de um produto (Fonte: WESTMAN, 2006).

PEREIRA, A. J.30

Muitos consideram que a comercialização destas plantas promove um aumento no uso de herbicidas, enquanto outros dizem que é possível que elas provoquem uma redução ou substituição por herbicidas ambientalmente inócuos. Assim, nas plantas transgênicas com resistência a herbicidas devem ser avalia-das com cautela caso a caso, seus riscos, custos e benefícios (Figura 2.7).

Figura 2.7 – Transformação do DNA para obtenção de uma planta transgênica resis-tente à herbicida através de cultura de tecidos.Fonte: Adaptado de http://www.clinicaq.com.br.

2.2 A soja resistente ao glifosato

Várias plantas transgênicas de fumo, tomate, algodão, linho e batata, resis-tentes ao herbicida glifosato foram obtidas, ou pela introdução de uma enzima insensível ao herbicida, ou pela superprodução da enzima 5- enolpiruvatoshi-quimato 3-fosfato sintase (EPSPS). A enzima EPSPS está presente na rota de síntese dos aminoácidos aromáticos fenilalanina, tirosina e triptofano e é o sitio de ação do glifosato.

Se o herbicida glifosato for aplicado na plantação de soja, tanto as plan-tas daninhas, quanto as plantas de soja morreriam. Procurando evitar a mor-te das plantas de soja devido ao uso de herbicidas foi desenvolvida a soja transgênica resistente ao herbicida glifosato. A soja resistente ao herbicida glifosato foi obtida pela introdução no genoma da planta do gene que codifica

Quando se faz um plantio de uma cultura de soja, por exemplo, várias plantas conhecidas como ervas daninhas começam a crescer junto com a soja, disputando água, adubo e luz etc. Os herbicidas são agrotóxicos aplicados na área de cultivo para eliminar essas ervas daninhas a fim de se obter uma ótima produtividade de soja. Em geral, esses agrotóxicos matam as plantas porque inativam alguma enzima essencial no interior das células. Essas enzimas participam de reações químicas que resultam na produção de moléculas vitais para a planta, como os aminoácidos formadores das proteínas. Assim, quando se aplica o herbicida sobre as ervas daninhas, elas morrem por falta de compostos vitais.

Biotecnologia em Debate 31

a EPSPS, isolado da bactéria Agrobacterium tumefaciens estirpe CP4. A soja geneticamente modificada é capaz de metabolizar o glifosato, tornando-se imune aos efeitos destrutivos e letais do herbicida glifosato.

2.3 Plantas transgênicas resistentes a insetos

Com estudos nas plantas sobre a biossíntese e a regulação de compostos quí-micos, associados a um certo grau de resistência destas plantas a insetos, re-velou-se que esses elementos químicos encontrados nos tecidos vegetais são antibióticos, alcaloides, terpenos e proteínas. Entre as proteínas, estão incluídas enzimas quitinases, lectinas e os inibidores de enzimas digestivas. Atualmente, genes que conferem resistência a insetos podem ser introduzidos em plantas de interesse para reduzir sua suscetibilidade. Esses genes podem ser obtidos de plantas, bactérias ou de outra origem. Com base nisso, as plantas transgênicas expressando genes com atividade inseticida, representam uma nova alternativa de controle visando minimizar os danos causados por insetos-praga.

A grande maioria das plantas transgênicas resistentes a insetos expres-sa genes derivados da bactéria Bacillus. thuringiensis. Atualmente diversas culturas, tais como milho, algodão, soja, arroz e canola, dentre outras, têm sido modificadas geneticamente para expressar proteínas derivadas de Bt.

As pró-toxinas Cry, quando ingeridas pelas borboletas, por exemplo, são solubilizadas pelo pH alcalino do trato intestinal da borboleta-alvo e cli-vadas pelas proteases intestinais, tornam-se peptídeos de menor tamanho. Estes são colhidos por receptores específicos encontrados no epitélio, e ini-ciam um processo de destruição tecidual, que colabora para a paralisação muscular, levando o inseto à morte. Esta também pode ocorrer em função de uma segunda causa associada à primeira, que é a multiplicação bacteriana na hemolinfa, determinando um processo septicêmico.

Segundo alguns pesquisadores existem vantagens do uso de plantas transgênicas com Bt, como:

• Independência do controle das pragas em relação ao clima, seja chuvoso para aplicações terrestres ou ventos e chuvas para aéreas;

• Proteção de parte das plantas que são difíceis de serem atingidas com as aplicações;

• Controle permanente livrando o agricultor de vistorias e aplicações eventu-ais, além de eliminar os insetos tão logo comece a se alimentar;

• Em função dos elevados preços dos inseticidas químicos e dos custos das aplicações sucessivas, como nas culturas de algodão e tomate, as plantas transgênicas podem ser uma alternativa mais viável e econômica para o produtor. Além disso, pode-se ter ainda redução na aplicação de insetici-das, principalmente os de largo espectro.

Bacillus. thuringiensis é uma bactéria que habita naturalmente o solo e tem sido empregada há muitos anos como um inseticida microbiano por diversos agricultores, e mais recentemente vem sendo utilizado como uma nova ferramenta para o controle de pragas através da sua expressão nas plantas transgênicas. A atividade entomopatogênica desse microrganismo deve-se à presença de uma inclusão cristalina produzida durante a esporulação, as pró-toxinas. O cristal, composto por proteínas denominadas δ-endotoxina ou proteínas cristal (Cry), apresenta ação extremamente tóxica a altamente específica para larvas de insetos de três ordens: Lepidoptera, Diptera e Coleoptera, dependendo da proteína. Existem mais de 120 diferentes genes cry e as proteínas Cry estão agrupadas em 22 classes.

PEREIRA, A. J.32

2.4 Plantas transgênicas resistentes a vírus

Em diversas plantas de interesse agrícola, o controle genético de doenças é feito com o uso de variedades de plantas resistentes. Este método de controle é o preferido pelos produtores por ser mais barato e de fácil utilização. Mas, como a maioria das plantas atacadas por doenças virais não contêm resistência natural, a produção de plantas transgênicas resistentes a vírus tem sido buscada.

Essa resistência tem sido obtida principalmente através da introdução de sequências do genoma do próprio vírus, um tipo de resistência derivada do patógeno. Uma das primeiras plantas transgênicas resistente a viroses li-beradas para plantio comercial é o mamoeiro resistente ao vírus da mancha anelar (PRSV) no Havaí. Esse mamoeiro transgênico obteve resistência com a introdução de partes do gene que codifica a capa proteica do vírus PRSV. Várias outras plantas já foram aprovadas para comercialização, como abóbo-ras resistentes a três vírus e batatas resistentes a três vírus.

3. Técnicas de transformação gênica3.1 Transformação mediada por agrobactérias do gênero Agrobacterium

As bactérias Agrobacterium tumefaciens causam tumores e crescimento ce-lular descontrolado em diferentes tipos de plantas. Os tumores do colo cau-sados por estas bactérias são formados acima do nível do solo, na região do colo da planta. Isto é feito pelos plasmídios indutores do tumor, plasmídios Ti, responsáveis pela formação do tumor após a infecção da planta por A. tume-faciens. Os plasmídios-Ti, funcionam como vetores capazes de transferir seu DNA para o genoma do hospedeiro (Figura 2.8).

Esta técnica tem sido usada em transformação de soja, tomate, ervilha, algodão de gramíneas. Em determinados experimentos em tomates e alface transgênicos se realiza a inclusão de genes capazes de expressar certas pro-teínas, que ao serem ingeridas, ativam o sistema imunológico do consumidor e funciona como vacinas contra um determinado agente infeccioso, para to-lerância a herbicidas, resistência a pragas e doenças, qualidade nutricional como na retenção de ferro e produção de pró-vitamina A no arroz.

Lectinas são proteínas multivalentes com capacidade de ligar-se a carboidratos de forma a aglutiná-los, inclusive àqueles provenientes de superfícies celulares. São encontradas em tecidos de plantas, em leguminosas, como raízes, folhas, frutos e sementes. Elas têm sido identificadas como compostos inseticidas, exercendo função protetora no interior de sementes exemplificadas pelas lectinas de soja e do feijão alado. A toxicidade deste tipo de proteína em mamíferos e pássaros tem sido bem documentada, sendo registrada sua toxicidade a insetos. O mecanismo de ação seria de que a lectina ingerida causaria ruptura das células epiteliais do mesêntero, o que levaria à paralisação no transporte de nutrientes e, também facilitaria a absorção de substâncias nocivas. No entanto, o exato mecanismo de ação das lectinas ainda não está claro.

Biotecnologia em Debate 33

Figura 2.8 – Planta transgênica originada pela transformação pó Agrobacterium tumefaciens.Fonte: Adaptado de http://transgeniaemvegetais.blogspot.com.

3.2 Transformação por bombardeamento de micropartículas

Esta técnica conhecida também, como bombardeio de microprojéteis ou bio-balística (biológico + balística), o DNA inicialmente ocorre a aceleração de uma macropartícula carregada de milhões de microesferas de tungstênio ou ouro, a micropartícula. A macropartícula é propelida em direção das células-alvo em alta velocidade, porém é retida, após pequena distância, por uma malha de aço, de forma que apenas as micropartículas continuam em direção ao alvo. Uma vez dentro das células, o DNA que reveste as micropartículas se solubiliza e pode ser integrado aos cromossomos das células atingidas. A maioria das varieda-

des transgênicas comerciais hoje disponíveis foi de-senvolvida com o uso da biobalísti-ca (Figuras 2.9 e 2.10).

Figura 2.9 – Pro-dução de plantas transgênicas com uso de Agrobacte-rium e bombardea-mento com micro-projéteis.Fonte: www.google.com

Na produção de plantas transgênicas pela transferência mediada por Agrobacterium, também são utilizados discos foliares com pequeno diâmetro infectados com A. tumefaciens, portadora de plasmídios contendo o transgene. Após aproximadamente um mês de incubação em meio de cultura, plantas são regeneradas dos discos foliares. Por meio de seleção, os indivíduos transgênicos são identificados em fumo, tomate, soja, beterraba e algodão etc.

PEREIRA, A. J.34

Figura 2.10. – Técnica de bombardeamento mostrando o tecido a ser bombardeado, bombeador, cultivo de tecidos e regeneração da planta.Fonte: http://biotecnologiaegenetica.blogspot.com/ 2011/09/plantas-transgenicas.html

3.3 Transformação por microinjeção

Esta técnica foi desenvolvida para transformação gênica em animais e, depois foi aplicada às plantas. Nesta técnica, agulhas microcapilares são utilizadas na introdução de DNA. Cada célula a ser transformada precisa ser manipu-lada individualmente. Uma das vantagens deste método é que a quantidade de DNA injetado pode ser otimizada. Resultados positivos já foram obtidos em diversas espécies vegetais: milho, trigo, soja, fumo, arroz etc., bem como em animais: salmão, bovinos e suínos.

3.4 Transformação direta

A transformação por métodos diretos utilizam protoplastos, células sem pare-de celular, que servem como alvo para introdução do transgene. Ele consis-te em adicionar grandes quantidades de plasmídios quiméricos à cultura de células sem parede celular, Uma pequena proporção das células assimila os plasmídios, cuja frequência de assimilação pode ser elevada com a adição de polietileno glicol (PEG) ou com o uso de uma descarga elétrica (eletroporação).

Nenhuma barreira à transformação direta tem sido detectada, indican-do que este método pode ser utilizado praticamente em qualquer espécie. A maior dificuldade encontrada neste método é a dificuldade de regeneração de planta completa a partir de células sem parede celular.

4. Aspectos de biossegurança e bioética

Com o surgimento das técnicas de transgenia surgiram algumas preocupações com a biossegurança e a bioética. A biossegurança tem por finalidade prevenir os riscos potenciais à saúde humana, animal e ao meio ambiente, quanto a utilização de OGMss. É unânime entre melhoristas de plantas, ambientalistas, pesquisadores e a sociedade em geral a necessidade da regulamentação em

Biotecnologia em Debate 35

nível das atividades desenvolvidas, os testes e a própria liberação comercial de um organismo transgênico. A regulamentação do uso da engenharia genética e a liberação para cultivo de OGMss, já foi estabelecida em vários países, inclusi-ve o Brasil. Os ensaios de biossegurança acontecem em 4 fases:

• Caracterização molecular quando se determinam onde os genes foram integrados e como são transmitidos para a próxima geração;

• Caracterização agronômica: onde é feita a comparação das variedades geneticamente modificadas com as variedades convencionais. É feita tam-bém uma busca por diferenças entre as duas, além da característica dese-jada. É importante ressaltar que só teremos um produto se nessa fase não for identificada nenhuma característica indesejada;

• Análise de segurança alimentar, quando são analisadas as diferenças na composição das duas variedades e seus fatores nutricionais. Também acontecem experimentos com animais para verificar possíveis efeitos negativos, checando seus genes e as gerações descendentes;

• Análise de segurança ambiental quando são analisados o fluxo gênico e os efeitos sobre organismos não alvos, por exemplo, micro-organismos e insetos benéficos.

4.1 A CNTBio

Caso não sejam encontrados efeitos negativos em nenhuma dessas fases, é feito o pedido de liberação comercial à Comissão Técnica Nacional de Bios-segurança (CTNBio). O feijão GM resistente ao mosaico dourado está no úl-timo estágio de avaliação, sendo testado em campos em diferentes regiões e diferentes épocas do mesmo ano. As sementes colhidas são analisadas e comparadas entre si em um banco de dados.

O Brasil possui órgãos competentes para realizar essa avaliação. Os pro-tocolos definidos para avaliar a segurança são seguros, visto que, há mais de 20 anos, todos os experimentos que se mostraram seguros na análise também se mostraram seguros após sua liberação, ratificando a credibilidade do protocolo.

4.2 Superprodução de proteínas

A introdução de diversas cópias de um gene ou mesmo de um promotor forte pode resultar na superprodução de uma proteína, a exemplo da proteína de reserva das leguminosas.

4.3 Silenciamento de genes endógenos

A tecnologia RNAm anti-senso consiste na introdução de uma sequência complementar ao RNAm do gene de interesse. O RNAm anti-senso hibridiza com o RNAm primário, formando uma fita dupla, que bloqueia o processo de tradução. Teoricamente, o RNAm anti-senso pode ser utilizado para inibir a expressão de quaisquer genes.

Em maio de 1995 foi sancionada a Lei nº 8.974 implementando a Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio) a qual passou a integrar a estrutura do Ministério da Ciência e Tecnologia. Esta Comissão tem como propósito avaliar os riscos da utilização de transgênicos no Brasil. Em 1998 a CTNBio emitiu laudo conclusivo de biossegurança para a comercialização de soja transgênica resistente a herbicida (Round up Ready), porém uma liminar da justiça impediu o início da venda de sementes desta variedade, com alegação de que ainda restam dúvidas com relação aos impactos desses alimentos sobre o meio ambiente. A CTNBio é formada por pesquisadores de renome internacional e que são altamente qualificados para determinar os verdadeiros riscos na utilização de transgênicos no Brasil.

PEREIRA, A. J.36

4.4 Produção atual de plantas transgênicas

Em 1983 foi obtida a primeira planta transgênica, aumentando a partir daí as pes-quisas e os esforços nesta área. Atualmente cerca de 30.000 experimentos de campo já foram realizados com plantas transgênicas, com mais de 60 culturas, dez características e 45 países, dos 72% foram conduzidos nos EUA e Canadá.

Mais de 40 milhões de hectares foram plantados com transgênicos, no ano agrícola de 2000, principalmente nos EUA, China, Argentina Canadá, Austrália, México e Espanha. Os principais benefícios obtidos com o uso de transgênicos são aumento da produtividade e da qualidade nutricional e redu-ção dos custos de produção. Os riscos são com o aumento na capacidade invasora das plantas daninhas, efeitos nocivos sobre insetos não alvos e se-gurança alimentar. Acredita-se, no entanto, que no balanço risco-benefício os riscos sejam controláveis e os benefícios sejam maiores.

A biotecnologia e as plantas transgênicas, vão além da tolerância a herbici-da. Portanto, deve-se levar em consideração a nova geração de plantas que es-tão por vir e devemos considerar que esta nova geração de características como: novos teores de proteínas, novos teores e qualidades de açúcares, de ácidos gra-xos, materiais que podem inclusive causar grandes mudanças no mercado. Nós imaginamos que hoje, podemos ter uma soja com 80% de teor de ácido oleico e isso melhora a qualidade da fritura. Neste caso a soja usada para óleo no Brasil, só tem 20%, podendo perder a competitividade, pensando por esse lado, temos que ficar atentos para o risco de perdermos competitividade no mercado se não nos adequarmos às novas tecnologias. É importante desta forma, alertarmos para os benefícios da biotecnologia e das plantas transgênicas.

a) Adição de novas ou diferentes funções

Genes de outras espécies podem ser introduzidos levando novas caracte-rísticas na espécie de interesse. Já é possível a transferência de genes das leguminosas que fixam nitrogênio para as gramíneas. Com a introdução da proteína do envelope em cevada foi conferida a resistência por proteção cru-zada ao vírus BYD. A introdução da macho esterilidade facilita a fecundação cruzada em espécies com alta taxa de autofecundação.

b) Rotulagem em produtos derivados de transgênicos

Muito se tem discutido sobre o direito básico do consumidor à informação, tal como assegurado na Lei 8.078/90 do Código de Defesa do Consumidor sobre a necessidade da rotulagem de produtos que possuam organismos genetica-mente modificados (OGMs). Essa rotulagem é uma obrigação dos produtores no sentido de disponibilizar aos consumidores informação adequada e clara sobre os riscos dos produtos que estão disponíveis no mercado.

A regulamentação da biotecnologia foi realizada pela primeira vez em 1970, quando foi solicitada moratória para sua aplicação até que estudos relacionados à biossegurança fossem realizados. A partir de então, muitos regulamentos foram estabelecidos em vários países com o objetivo do controle do uso dessa tecnologia, considerando os aspectos de segurança para o homem, os animais e o meio ambiente.A OMS e vários outros grupos, expressaram preocupação de que se “os genes resistentes a antibióticos” usados em alimentos GM se transferissem para bactérias, isso poderia criar superdoenças imunes a antibióticos.

Biotecnologia em Debate 37

Apesar de a rotulagem ser um importante mecanismo de gestão de ris-cos ambientais e de direito do consumidor, a complexidade e a ambiguidade vinculada aos OGMs obstaculiza que a informação seja efetivamente clara. Porque as técnicas de transgenia têm resultados sabidamente aleatórios, o que impede que se cogite em informação certa, segura e definitiva.

A rotulagem de produtos que contêm organismos geneticamente mo-dificados não é o bastante para assegurar ao consumidor informações ade-quadas e claras sobre os riscos dos referidos produtos, quer em razão das características dos riscos ambientais e do modo como são gerados e admi-nistrados, quer em virtude da constante inobservância da obrigação de rotu-lar. Assim, a rotulagem não se apresenta como um instrumento adequado de gestão de riscos e tampouco assegura ao consumidor informações claras e adequadas à compreensão dos riscos e problemas relativos dos OGMs.

5. Debatendo: vantagens e desvantagens dos transgênicos5.1 Vantagens dos transgênicos

O alimento pode ser enriquecido com um nutriente essencial. Um feijão ge-neticamente modificado por inserção de gene da castanha do Pará passa produzir o aminoácido essencial metionina. Um arroz geneticamente modi-ficado produz vitamina A. O alimento pode prevenir, reduzir ou evitar riscos de doenças, através de plantas geneticamente modificadas para produzir vacinas, ou iogurtes fermentados com microrganismo geneticamente modi-ficado que estimulem o sistema imunológico.

A planta pode resistir ao ataque de insetos, seca ou geada. Isso ga-rante estabilidade dos preços e custos de produção. Um microrganismo ge-neticamente modificado produz enzimas usadas na fabricação de queijos e pães o que reduz o preço deste ingrediente; sem falar ainda que aumenta o grau de pureza e a especificidade do ingrediente e permite maior flexibilida-de para as indústrias; aumento da produtividade agrícola através do desen-volvimento de lavouras mais produtivas e menos onerosas, cuja produção agrida menos o meio ambiente.

5.2 Desvantagens dos transgênicos

O local em que o gene é inserido não pode ser controlado completamente, o que pode causar resultados inesperados uma vez que os genes de outras par-tes do organismo podem ser afetados. Os genes são transferidos entre espé-cies que não relacionadas, como genes de animais em vegetais, de bactérias em plantas e até de humanos em animais. A engenharia genética não respeita as fronteiras da natureza, fronteiras que existem para proteger a singularidade de cada espécie e assegurar a integridade genética das futuras gerações.

Um feijão geneticamente modificado resistente ao vírus do mosaico dourado transmitido pela mosca branca foi produzido pela Embrapa. Duas linhagens de feijão resistentes ao vírus foram produzidas por meio da técnica de RNA interferente que consiste em fazer a planta transgênica produzir fragmentos muito similares ao RNA do vírus, e permitir com que o RNA transgênico ative o mecanismo celular que leva à inativação do RNA viral, caso o vírus esteja presente. Com a inativação, o vírus não se multiplica e não há a doença.

PEREIRA, A. J.38

A uniformidade genética leva a uma maior vulnerabilidade do cultivo porque a invasão de pestes, doenças e ervas daninhas sempre é maior em áreas de monoculturas. Quanto maior for a variedade (genética) no sistema da agricultura, mais este sistema estará adaptado para enfrentar pestes, doenças e mudanças climáticas que tendem a afetar apenas algumas variedades.

Organismos antes cultivados para serem usados na alimentação es-tão sendo modificados para produzirem produtos farmacêuticos e químicos. Essas plantas modificadas poderiam fazer uma polinização cruzada com es-pécies semelhantes e, contaminar plantas utilizadas exclusivamente na ali-mentação. Os alimentos transgênicos poderiam aumentar as alergias. Muitas pessoas são alérgicas a determinados alimentos em virtude das proteínas que elas produzem. Há evidências de que os cultivos transgênicos podem propor-cionar um potencial aumento de alergias em relação a cultivos convencionais.

5.3 Riscos ambientais X ganhos ambientais

Vários riscos estão associados aos transgênicos tais como: transferên-cia gênica vertical e horizontal entre os micro-organismos; desequilíbrio nos processos de interação; efeito depressivo sobre grupos funcionais de micro-organismos; efeito depressivo sobre a macrofauna; efeito sobre a saú-de de vertebrados; a ação de OGM no ambiente é pouco conhecida; deve-se fazer o monitoramento ambiental caso a caso.

Em relação aos ganhos ambientais existentes, destacam-se: a diminui-ção do uso de agrotóxicos; desintoxicação de ambientes contaminados por agrotóxicos, metais pesados, derivados de petróleo; preservação de organis-mos não alvos e não contaminação por agrotóxicos da cadeia alimentar, len-çol freático e cursos d’água.

6. Os animais transgênicosOs animais transgênicos são obtidos com a introdução de genes de espécies diferentes da sua, alterando-se assim o seu material genético. É possível re-alizar isto com a introdução de um gene de interesse no núcleo de um óvulo que já foi fecundado. O objetivo é fazer com que o gene exógeno se expresse neste animal “hospedeiro”. Em 1982, um DNA de rato foi introduzido em um camundongo. Em janeiro de 2001 foi obtido o nascimento do primeiro primata transgênico, um macaco Rhesus chamado AnDi (inserted DNA ao contrário), que teve em seu material genético a inserção de um gene de medusa. Este experimento demonstrou a possibilidade de produzir através da transgênese, animais transgênicos com parentesco muito próximo à espécie humana.

Atualmente, já existem linhagens de animais transgênicos produzidas para serem utilizadas em pesquisas laboratoriais. Estes animais desenvolvem doenças humanas, tais como: diferentes formas de tumores, diabetes, obesida-de, distúrbios neurológicos, dentre outras. Outra possibilidade de utilização des-

Algumas contribuições para o meio ambiente dos transgênicosDesenvolvimento de bactérias envolvidas na biolixiviação de ouro e mercúrio, além de bactérias bioluminescentes, como bioindicadores de poluição ambiental. Esses organismos ajudarão no trabalho de “limpeza” do meio ambiente, combatendo as causas e consequências da poluição e da degradação ambiental. Há evidências de transferência gênica evolutiva entre planta-micro-organismos, mas é limitado. Proteína Cry1Ab em milho Bt é de lenta degradação no solo; Batata PCN diminuiu bactérias e fungos no solo, mas não alterou a ciclagem de matéria orgânica; Milho Bt não alterou a população de minhocas, nematóides, protozoários, bactéria e fungos. Plantas de Canola Bt não apresentaram nenhum efeito sobre insetos não alvo e foram eficientes contra insetos-alvo.

Biotecnologia em Debate 39

tes animais é na área de Xenotransplantes. Uma linhagem de porcos transgênicos, porcos P33, foi desenvolvida com sucesso, tendo uma alta taxa de compatibilidade com seres humanos.

Estes porcos estão sofrendo um processo de “humanização” genética. Um destes processos é o que visa tornar o endotélio de seus vasos seja menos reativo com o sangue humano, pela presença da alfa-galactose. Foi introduzido o gene que permite a síntese de uma enzima que inibe a ação desta substância. Outro processo, igualmente importante, é o que compatibiliza o sistema de complemento.

Cada uma destas alterações foi introduzida em linhagens di-ferentes de porcos P33. Em janeiro de 1998 nasceram os primeiros porcos P33 com ambas as características. Os animais transgêni-cos também podem ser utilizados para a produção de proteínas e outras substâncias, tais como hormônios (Figura 2.11).

Em animais, a produção de transgênicos tem finalidades farmacêu-ticas, em que um animal transgênico funcione como um bioreator produzindo uma determinada proteína que é secretada pelo leite, ovos ou carne, e após sua purifica-ção poderá ser utilizada na produção de medicamentos. Esta técnica baseia-se na incorporação de material genético no ovo, através do uso de microinjeção.

Como todas as células que irão formar o novo animal resultarão desta célula inicial, o gene inserido estará presente no organismo transgênico, que expressará uma determinada proteína sem prejudicar o seu bem-estar.

Texto complementar

Sobrevivência dos transgenes no homemO único estudo humano sobre alimentos transgênicos que define se um gene marca-dor de resistência antibiótica pode sobreviver no intestino e ser retido por bactérias intestinais não foi publicado até hoje. Os seus resultados podem, porém, ser encon-trados no site da agência britânica de normas alimentares (Food Standard Agency ou FSA), que encomendou esse estudo. A experiência utilizou sete pacientes submetidos a uma ileostomia – ablação do intestino grosso substituído por uma bolsa externa ligada à extremidade inferior do intestino delgado – que receberam uma refeição única contendo soja OGM. A cadeia completa do DNA foi detectada em todos os sete sujeitos e, em três deles, num nível muito significativo. O DNA do transgene não foi encontrado nas fezes. Na sua página na internet, a FSA declara que “nas condições de vida real, com voluntários humanos, nenhum material transgênico sobreviveu à pas-sagem do tubo digestivo inteiro”. Mesmo que o fato seja exato para esta experiência, é desprovido de significado porque a questão não é de saber se a digestão humana deixa o DNA inteiramente degradado na saída, mas sim de saber se um fragmento do DNA é suscetível de ser transferido, por meio da digestão, às bactérias no tubo digestivo. A questão da transferência não se coloca na saída, mas no nível dos efeitos fisiológicos dos transgenes e de seus produtos ao longo de toda a digestão... cont. Fonte: http://www.dominiopublico.gov.br/download/texto/md000028.pdf.

Figura 2.11 – Camundongos usados em transgenia.Fonte: www.google.com.

PEREIRA, A. J.40

w A grande mentira: os transgênicos vão acabar com a fome no mundoA ideia de que os transgênicos podem ajudar a combater a fome no mundo está ba-seada na falsa premissa de que faltam alimentos no mundo e de que os transgêni-cos são mais produtivos. Mas... 1. A própria FAO – Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação reconhece que “o mundo produz alimentos suficien-tes para alimentar todas as pessoas que habitam o planeta – e poderia produzir até mais”. Milhões de pessoas passam fome porque não podem pagar por alimentos ou porque não têm terras onde poderiam cultivá-los. O problema não é a quantidade de produção de alimentos, mas sim a má distribuição da renda e da terra. 2. Diversas pesquisas científicas conduzidas após anos de plantio de transgênicos provam que eles não são mais produtivos.Fonte: http://www.idec.org.br/pdf/cartilha_transgenico.pdfos

Síntese do CapítuloEste capítulo relatou sobre os principais conceitos sobre os Organismos Ge-neticamente Modificados (OGMs). Discutiu também as principais técnicas para a produção de plantas transgênicas. Discorreu acerca das principais questões sobre biossegurança e aspectos éticos e legais relacionados com a produção e liberação com os possíveis riscos das plantas transgênicas para a saúde humana, animal e o meio ambiente. Assim como fez uma breve men-ção sobre os animais transgênicos.

Atividades de avaliação

1. Quais são os métodos biotecnológicos usados para a produção de plantas transgênicas? Em que se baseiam estes métodos?

2. Existem estudos referentes sobre os efeitos dos alimentos transgênicos so-bre a saúde humana e meio ambiente?

3. Estão sendo divulgados para a sociedade os resultados dos estudos sobre os produtos transgênicos?

4. Quais são as normas legais que regulam os alimentos transgênicos?

5. Existem nos supermercados ou mercantis em sua cidade, produtos com rótulos informando sobre produtos que possuem componentes transgêni-cos? Em sua opinião basta haver a rotulagem?

6. Leia o texto “O Ensino de Ciências e a Ideia da Cidadania” de SANTOS, P. R., disponível no sítio http://www.hottopos.com/mirand17/prsantos.htm, após faça uma síntese do texto.

Biotecnologia em Debate 41

Leituras, filmes e sites@

Leituras

ODA, L. M.; SOARES, B. E. C. Biotecnologia e transgênicos. Biotecnologia no Brasil. Aceitabilidade pública e desenvolvimento econômico. Revista Parce-rias Estratégicas. Brasília, n. 10, 2001.

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FREIXO, A. B.; ABREU, J. C.; SIQUEIRA, B. S. Produtos transgênicos – aceitá-los ou não? Disponível em http://www.fae.edu/publicacoes/pdf/art_cie/art_31.pdf. Acesso em 06/11/2011.

SANTOS, P. R. dos; O Ensino de Ciências e a ideia de cidadania. Disponível em: http://www.hottopos.com/mirand17/prsantos.htm.

Vídeos

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Capítulo 3A clonagem e a terapia gênica

Biotecnologia em Debate 45

Objetivos

• Compreender as diferenças entre a clonagem reprodutiva e a clonagem terapêutica.

• Reconhecer a Terapia Gênica como tratamento de doenças.

1. Reprodução e clonagem

Cristina, uma mulher de 25 anos, sempre sonhou ter um filho, casou-se e atra-vés de exames médicos descobriu que não poderia engravidar pelos métodos naturais. Depois de muita reflexão, ela procurou uma clínica de Fertilização in vitro onde solicitou exames e realização de uma pré-seleção de um embrião do sexo masculino, antes da pré-implantação do embrião em seu útero.

A cada dia cresce o número de casais que procuram clínicas com o objetivo de reprodução assistida para obterem o tão sonhado filho. A ciência reprodutiva evolui em sua capacidade de diagnosticar doenças ainda na fase embrionária, entretanto, não podemos esquecer que além dos genes, o meio ambiente também pode influenciar nossas vidas por meio de vários fatores. Há milhares de crianças que são concebidas dentro de grandes probabilidades de atingirem a idade adulta organicamente, economicamente e socialmente sau-dável, mas que por problemas de doenças infecciosas e sequelas deixadas por estas doenças, acabam apresentando limitações físicas e intelectuais.

Desta maneira, somos levados a refletir sobre vários dilemas éticos relacio-nados com o direito de listar exigências de qualidade aos seres humanos que se-rão concebidos e da decisão de selecionar embriões e quem deverá viver ou não.

Figura 3.1 – Na técnica de Fertilização in vitro, os espermatozoides com melhores condições são “escolhidos” com a ajuda de um microscópio e cada um deles é injetado dentro de cada óvulo através de micromanipuladores acoplados aos microscópiosFonte: http://www.vivita.com.br/fertilizacao-in-vitro

A técnica de fertilização in vitro (FIV) (Figura 3.1), é o processo de se obter óvulos fecundados sem relação sexual. Os óvulos são fertilizados pelo esperma dentro de um vidro, fora do corpo. É o mais eficiente tratamento da infertilidade, quando todos os outros métodos de reprodução assistida falharam.Uma descoberta ampliou as esperanças de mulheres com problemas de engravidar realizarem seu sonho de ter um filho. Antes da descoberta, os cientistas implantavam os embriões sem saber seu estado de saúde. A descoberta recente permite selecionar os embriões mais saudáveis, antes do implante. Desta forma, aumenta as chances do embrião desenvolver e a mulher ter um bebê. Através do estudo do consumo de glicose de embriões, os cientistas em laboratório criaram uma cama de nutrientes para os embriões fecundados, a partir de óvulos e espermatozoides de casais que não conseguem engravidar naturalmente. Os especialistas em fertilidade já sabiam a quantidade precisa de glicose na solução antes de inserir um embrião, pois a glicose é a maior fonte de divisão celular e essencial para a duplicação celular que faz com que o embrião se desenvolva. Continua...

PEREIRA, A. J.46

1.1 A clonagem

Entende-se por clonagem o processo de criar um organismo geneticamente idêntico a outro pré-existente, sem recorrer à reprodução sexual, ou seja, não envolvendo a participação de um dos progenitores, seja masculino ou feminino. Dessa maneira, um clone é, então, geneticamente igual ao organismo a partir do qual foi originado. A descoberta da clonagem perde-se no tempo, uma vez que algumas técnicas de reprodução são utilizadas pelo homem há muito tem-po, como, por exemplo, a enxertia das árvores ou a reprodução vegetativa, com o replantio dos dentes de alho, não são mais do que a aplicação da clonagem para melhorar as características de uma planta (figura 3.2).

Figura 3.2 – Alho, um exemplo de planta clonada naturalmente pelo Homem há muito tempo.Fonte: http://www.tvecorural.com

Antes da clonagem com a ovelha Dolly, outros tipos de clonagem já ti-nham sido tentados em experiências feitas com anfíbios. Mas, até esta época não tinha se conseguido que o organismo clonado sobrevivesse, ele não con-seguia nem mesmo nascer, ficava somente na fase de embrião precoce. Nos animais, principalmente mamíferos, a utilização da clonagem é muito mais com-plexa e recente. A clonagem da ovelha se deu da seguinte maneira (Figura 3.3):

• Em uma célula da glândula mamária de uma ovelha foi retirado o núcleo, desprezando-se uma pequena porção do citoplasma, de forma que a maior parte da informação genética da ovelha foi retida, na herança mitocondrial.

• Após o núcleo ser retirado, ele foi colocado dentro de um óvulo de outra ovelha que o núcleo tinha sido retirado anteriormente e que possuía um citoplasma muito grande e um núcleo relativamente pequeno. Este citoplasma deste óvulo continha todos os nutrientes para o desenvolvimento do novo organismo.

• Depois de alguns procedimentos químicos, o conjunto formado pelo cito-plasma de uma ovelha e o núcleo da outra contendo o núcleo que tinha acabado de ser transferido começou a dividir-se como se tratasse de um ovo logo após a fertilização.

▸ Continuação

Ao medir o nível de glicose quatro ou cinco dias depois da fecundação, pode-se determinar o quanto foi consumido por um embrião em crescimento. Já comprovaram que os embriões mais saudáveis absorvem maior quantidade de glicose”.

A clonagem tornou-se popular com o nascimento da ovelha Dolly, em 1997. Seguiram-se, depois, outras espécies, como o macaco, a vaca, o cavalo, o cão etc. Na clonagem com a ovelha Dolly foi usada células somáticas e não as germinativas, os óvulos ou espermatozoides.

A herança mitocondrial é caracterizada por uma herança materna. A mãe transmite seu DNA a toda prole. Suas filhas, por sua vez, o transmitem, mas seus filhos não. O ovócito é bem suprido de mitocôndrias, mas o espermatozoide contém poucas e mesmo essas poucas não persistem na progênie.

Biotecnologia em Debate 47

• A partir daí desenvolveu-se até à fase de embrião, e depois foi colocado no útero de uma terceira ovelha adulta ou “ovelha de aluguel”, previamente preparada para o acolher até ao seu desenvolvimento completo. Assim, a ovelha Dolly foi uma cópia exata da ovelha adulta à qual tinha sido retirada a célula somática da glândula mamária inicial.

Figura 3.3 – Etapas usadas na obtenção do clone da ovelha Dolly.Fonte: www.google.com

1.2 A clonagem em mamíferos

Dois pesquisadores Gurdon e Uehlinger, em 1966, conseguiram produzir rãs pela transferência de núcleos de células intestinais de girinos, para óvulos sem núcleos de Xenopus. Em 1977, Ian Wilmut e seus colaboradores, com uso de cultura de células de glândulas mamárias de ovelhas da raça “Finn Dorset”, obtiveram núcleos que foram transplantados em ovócitos sem nú-cleos de ovelhas do tipo “Black Face”. Para que o processo de clonagem se concretizasse, foram feitas quase trezentas tentativas de transplante, aproxi-madamente 277 e, no final apenas uma sobreviveu.

Podemos observar também, que por meio desta técnica, o DNA não foi manipulado de forma direta e sim o núcleo, que é visível em qualquer mi-croscópio comum. Não há o rigor científico como aquele que deve ser usado na terapia gênica, em que o próprio DNA deverá ser trabalhado, cortando e emendando moléculas. Dos 277 ovos que foram obtidos, somente 29 atingi-ram o estádio de mórula ou blastocisto em seu desenvolvimento embrionário,

Em outubro de 2001 nos Estados Unidos verificaram blastocistos humanos ao microscópio, desenvolvidos a partir de zigotos humanos obtidos por clonagem. Os autores do experimento afirmaram ser esta a primeira clonagem de seres humanos, mas que não foi aceita pela comunidade científica, por não mostrarem os detalhes técnicos da experiência. Em 5 de abril de 2002, o médico italiano Severino Antinori afirmou que nos Emirados Árabes, uma paciente sua, tinha desenvolvido em seu útero um feto com 8 meses clonado por ele. Este experimento de clonagem, proibido na Europa e Estados Unidos, estaria sendo realizado secretamente em algum país asiático.

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que em seguida foram transplantados para 13 úteros de ovelhas. Por fim o que resultou foi apenas um parto com o nascimento de Dolly, em homenagem à atriz americana Dolly Parton (Figura 3.4). Outros experimentos de clonagem também foram realizados utilizando macacos, camundongos, bezerros etc.

Figura 3.4 – Ovelha Dolly, o primeiro mamífero clonado, ao lado da musa inspiradora de seu nome a atriz Dolly Partonfonte: http://www.brasilescola.com/biologia/ovelha-dolly.htm

1.3 Clonagem reprodutiva

Indivíduos geneticamente idênticos como os gêmeos monozigóticos, os clo-nes naturais, possuem individualidade própria. O meio ambiente no qual o in-divíduo vive também influencia e determina várias de nossas características. Portanto, não podemos esperar que o clone vá reproduzir exatamente, todas as características da matriz que lhe deu origem.

Atualmente, aqueles que defendem a clonagem humana defendem que essa técnica é uma boa opção reprodutiva para casais com esterilidade. Por exemplo, um homem que não produz espermatozoide poderá ter uma célula de sua de pele fundida com um óvulo sem núcleo da sua mulher e o embrião obtido, será transferido para o útero da mulher, que apesar de não contribuir com o seu material genético, vai contribuir com seu óvulo e útero (Figura 3.5).

Por razões de segurança, qualquer medicamento ou pratica médica, antes de ser aplicado nos seres humanos e serem liberados comercialmente, a clonagem deverá passar por diversos testes com uso de modelos animais. Isto se torna necessário para a clonagem com fins para a reprodução humana. Conhecemos muito pouco sobre a clonagem reprodutiva e o pouco que conhecemos demonstra que essa forma de reprodução produz efeitos indesejados em todas as espécies animais na qual foi aplicada. Pois, para cada clone aparentemente normal, são geradas dezenas de clones mal formados, que serão abortados durante a gestação, mortos ao nascimento ou alguns dias após apresentando problemas respiratórios ou cardíacos. Além disso, já aprendemos com clones animais que mesmo aqueles considerados "normais" vivem menos e são obesos.

Biotecnologia em Debate 49

Figura 3.5 – Etapas usadas na clonagem reprodutiva.Fonte: www.google.com.

Aspectos éticos da clonagem e reprodução assistida

Seguindo a Resolução Nº 06 de 30 de setembro de 2002 do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária o Conselheiro Edison José Biondi expediu um relatório a respeito da Clonagem Humana. que proíbe experiências e clona-gem de animais e seres humanos, através de um Projeto de lei, justificando que estas experiências ferem a ética e a dignidade da pessoa humana, abrindo um sério precedente para experiências muito perigosas, com criação inclusive de seres vegetativos para doação de órgãos ou outras aberrações, contrariando o princípio natural da vida.

1.4 Reprodução assistida

Em 1978, as técnicas de Reprodução Assistida tornaram-se pública com o nas-cimento de Louise Brown, o primeiro ser humano concebido por fertilização in vitro (Figura 3.5). Este tipo de reprodução trouxe esperança aos casais que por problemas anatômicos ou fisiológicos que dificultavam a aproximação e fecundação do esperma-tozoide e oócito para a formação do con-cepto ou desenvolvimento no útero da mãe. Hoje, existem clínicas que tornam as fun-ções reprodutivas perdidas ou inexistentes em um dos parceiros ou, em ambos, tra-zendo a felicidade de muitos casais ávidos por ter filhos.

A clonagem como forma de reprodução de seres humanos é internacionalmente repudiada e uma ameaça à dignidade do ser humano, da mesma forma que a tortura, discriminação racial, o terrorismo etc. A possibilidade do mal uso de uma nova tecnologia não deve ser usado como argumento definitivo para a proibição total desta. Assim, em vez de proibirmos qualquer uso das técnicas de clonagem por medo que essas sejam utilizadas para a tentativa de clonagem reprodutiva humana, precisamos urgentemente de ter mecanismos de vigilância e legislação.

Figura 3.6 – O primeiro bebê de proveta do mundo. Louise Brown nascida em 1978 no colo de sua mãe Lesley Brown.Fonte: http://nobel4.blogspot.com/2011/05/worlds-first-test-tube-baby-louise.html

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Problemas com a clonagem

Envelhecimento celular que acumula alterações celulares e mutações, o clo-ne nasce com mesma idade do doador, do ponto de vista celular, biológico. O indivíduo clonado já nasce em desvantagem, pelo envelhecimento e pelas alterações genéticas oriundas das radiações cósmicas e ionizantes.

Susceptibilidades dos clones diante de determinadas doenças. A clo-nagem bloquearia o processo de seleção natural, nesses seres, rompendo com o fenômeno que, naturalmente, permite que organismos nascidos com alterações genéticas e menor adaptação para a sobrevida e a reprodução desapareçam. Isso também se aplicaria para o caso da clonagem humana.

1.5 Clonagem terapêutica

A clonagem terapêutica ou terapia por transplante nuclear tem a finalidade de produção de células-tronco embrionárias para utilização terapêutica. Ela tem por finalidade a investigação básica ou clínica na reparação de tecidos ou órgãos danificados, e não a produção de um clone de indivíduo humano. Em outras palavras, na clonagem terapêutica o núcleo somático do paciente seria transferido para um óvulo enucleado.

O embrião clonado seria cultivado in vitro até o estágio de blastócito, quando seria dissociado para a obtenção de células-tronco embrionárias (Fi-gura 3.7). Uma das grandes possibilidades da clonagem terapêutica é ser fonte de tecidos para transplantes, já que um grande obstáculo para os transplantes de tecidos e órgãos é a histocompatibilidade entre doador e receptor. A solução para evitar a imunocompatibilidade seria a geração de células-tronco embrio-nárias geneticamente idênticas ao paciente por meio de transferência nuclear.

Figura 3.7 – Etapas da clonagem terapêutica com uso de células tronco embrionárias.Fonte: www.google.com.

Vários problemas de natureza ética emergiram, tais como os bancos de esperma, os bancos de ovócitos, os bancos de embriões e a listagem de oferta de úteros de mães de aluguel. Isto sem falar dos milhares de embriões congelados que sobraram nas incontáveis tentativas de fertilização assistida no mundo todo. Além disto, a possibilidade de mães solteiras poderem escolher os espermatozoides de indivíduos com as características físicas e intelectuais desejáveis para um herdeiro ou a possibilidade de casais homossexuais masculinos ou femininos poderem buscar espermatozoides ou ovócitos, alugando um útero para o desenvolvimento do concepto criam situações que a sociedade questiona e debate.

Biotecnologia em Debate 51

1.6 Avanços científicos proporcionados pela clonagem

A maior contribuição dada pela experiência da clonagem com a ovelha Dolly é a certeza de que uma célula de um ser adulto já formado, em condições adequadas, pode reativar os genes especializados para a formação dos di-versos órgãos de um organismo completo. Não se sabia se o desligamento dos genes, após o período da embriogênese, era algo irreversível, ou seja, se seu processo poderia ser reativado após o período de formação inicial. Isto foi confirmado, visto que a partir de uma célula mamária, conseguiu-se reativar todo o processo de diferenciação capaz de formar um novo indivíduo.

Passou-se, a saber, que quando uma célula é colocada dentro de um óvulo, todas as informações podem ser reativadas, conseguindo formar um ser completo. No entanto, soube-se que o processo ocorre, mas ainda não se tem conhecimento de como e do por quê. O maior mistério ainda permanece. É possível que a repetição do processo da clonagem (reativar os genes que estavam reprimidos), leve ao entendimento do processo de ativação e inati-vação gênica. Este será um grande passo para a descoberta de outras expli-cações acerca do fenômeno, por exemplo, do envelhecimento das células.

1.7 Debatendo: clonagem e a ética

Em 1903, Herbert J. Webber do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos sentiu a necessidade de criar termos para os fenômenos naturais que aconteciam na lavoura como as plantas que se propagam vegetativamente, não precisando de cruzamentos para sua propagação, como a batata e a cana de açúcar. Para ele a planta crescida de partes de outra planta não seria um indivíduo, mas sim partes transplantadas daquele outro indivíduo. Assim, do ponto de vista biológico, fisioló-gico e hereditário, essa planta constituiria o mesmo indivíduo. Cook, um amigo de Webber, sugeriu a palavra clon de origem grega kl’vn, que significa divisão e broto.

De acordo com Webber, os clons seriam grupos de plantas propagadas por qualquer tipo de forma vegetativa como bulbos ou enxertos, constituindo partes do mesmo indivíduo. Essa definição limitava-se às plantas e não para outros grupos de organismos. Em 1905, Charles Louis Pollard sugeriu que o termo clon fosse modificado para clone.

Em 1912, buscando uma definição mais adequada George H. Shull propôs a adoção de clone para um grupo de indivíduos que pudessem ser rastreados pela reprodução assexuada até um único ancestral comum. Em pouco tempo o termo passou a ser usado para todas as formas vivas em que há propagação de novos indivíduos de modo assexuado.

A aplicação do conhecimento sobre genética gera grandes expectati-vas, mas levanta algumas sérias questões éticas e de privacidade. Por exem-

PEREIRA, A. J.52

plo, algumas pessoas têm genes que as fazem mais susceptíveis a desen-volver determinados tipos de doenças ou distúrbios genéticos. Atualmente, já podemos detectar essas deficiências antes mesmo do nascimento. Essa possibilidade geraram vários debates, tais como: se a terapia gênica for de-senvolvida para corrigir certas deficiências, que pessoa se submeterá a ela. Se ela será reservada em grande parte somente para os mais ricos. Se ela acarretará um maior número de abortos de fetos geneticamente defeituosos.

Se os planos de saúde se recusarão a atender pessoas com certos de-feitos genéticos que possam resultar em problemas de saúde e por fim se os empregadores se recusarão a contratar as pessoas com essas característi-cas. Alguns sonham com o dia em que a engenharia genética poderá eliminar completamente a morte e o envelhecimento. À medida que células, órgãos e outras partes desgastassem ou ficassem danificadas, elas poderiam ser substituídas por outras. Essas partes poderiam ser criadas em laboratórios de engenharia genética ou de bioprodução ou, ainda, as pessoas poderiam ter um clone disponível para peças de reposição.

A Bioética foi desenvolvida calcada em cinco princípios fundamentais, a saber: a beneficên-cia, que significa fazer bem ao paciente; a não maleficência, obrigação de não infligir dano intencional no paciente; a autonomia, que se divide em duas exigências morais, a saber: a exigência de se reconhecer a autonomia de cada indivíduo, de se reconhecer o poder de governar a si mesmo, e a exigência de proteger aqueles com autonomia reduzida; a justiça, princípio que a relação equânime, justa e universal dos benefícios advindos da ciência e avanços tecnológicos; e a sacralidade da vida humana, muito embora ainda não haja consenso entre os bioeticistas, a sacralidade é externada como algo de valor e res-peito, uma vez que qualquer interferência na vida humana, seja de ordem objetiva, material, ou de ordem subjetiva, ideológica, deve ser bem avaliada, uma vez que o sagrado nos permite ver a vida como algo que deva ser preservado.

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2. Terapia gênica

A clonagem é uma técnica extremamente simples, quando comparada com a terapia gênica utilizada em humanos para tratamento de doenças gênicas, por sua vez o conhecimento dos genes responsáveis por características normais ou patológicas permite a plena aplicação dos princípios da terapia gênica na medicina, que deverá modificar os procedimentos médicos no diagnóstico e tratamento de várias doenças.

Os princípios desta terapia envolvem a introdução, no paciente porta-dor de doenças genéticas ou outras, de genes responsáveis por proteínas

Biotecnologia em Debate 53

que poderão ser benéficas. Em doenças causadas por mutações gênicas, a introdução de um gene normal poderá reverter o quadro clínico; em uma ampla gama de outros tipos de doenças, células geneticamente modificadas poderão ativar mecanismos de defesa naturais do organismo, como o siste-ma imune, ou produzir moléculas de interesse terapêutico.

Para que ela ocorra de maneira satisfatória, a Terapia Gênica neces-sita de dois fatores importantes: (a) que não ocorra efeitos indesejáveis, prin-cipalmente efeitos colaterais e (b) que o produto do gene introduzido mante-nha sua produção, em níveis desejáveis (Figura 3.8).

Figura 3.8 – Exemplo de terapia gênica aplicada ao tratamento da AIDS.Fonte: www.google.com.

Os principais alvos da Terapia Gênica são as doenças hereditárias que causam imunodeficiência (ADA), a fibrose cística, a hemofilia e o Xeroderma pigmentosumom, vários tipos de câncer: tumores cerebrais, câncer de mama, câncer colon-retal, melanoma malígno, neuroblastoma, câncer pulmonar, câncer de ovário, carcinoma de célula renal, diabetes, obesidade, produção de hormônios, desenvolvimento de vacina contra o HIV e no tratamento de doenças neurológicas como o mal de Parkinson e de Alzheimer.

No princípio, a terapia gênica teve como objetivo corrigir defeitos ge-néticos que causa uma doença e baseava-se no uso de genes na forma de fármacos, na tentativa de corrigir um defeito em um gene através de sua manipulação. Neste procedimento são utilizadas porções de DNA a fim de desempenharem a função terapêutica que seria realizada pelos medi-camentos. Mas, na atualidade, a técnica utilizada na terapia gênica para o tratamento de vários tipos de câncer, doenças vasculares e doenças infec-ciosas consiste em retirar uma porção de DNA de uma pessoa normal, ligar a um vírus, que funciona como vetor transportador desse DNA para dentro das células do paciente. Os efeitos ainda não são completamente animado-res, pois falta muito, a ser estudado e resolvido.

PEREIRA, A. J.54

Em 1989 já tinha sido realizado o pri-meiro experimento em humanos de transfe-rência gênica, com uso do gene bacteria-no de resistência ao antibiótico neomicina, a fim de marcar os linfócitos infiltrantes de tumor (TIL, tumor infiltrating lymphocyte). E em 1990, foi realizado o primeiro ensaio de terapia gênica humana para tratar o gene adenosina deaminase (ADA) causador da imunodeficiência severa combinada (IDSC) – Figura 3.9.

Existe a possibilidade de ser realizada a clonagem humana, pois do ponto de vista téc-nico, não haveria diferença em uma experiência realizada com ovelhas ou com seres humanos. Mas, por outro lado, do ponto de vista ético, a clonagem em seres huma-nos deve ser rejeitada. A clonagem humana implica em uma série de desvantagens. Vamos supor que uma pessoa escolhida para ser clonada apresentasse habilidades para as artes como a música, por exemplo. Os seus clones não apresentariam neces-sariamente as mesmas habilidades para a música e outras características artísticas do original. Isto ocorre porque os genes não são determinantes das características apresentadas pelo ser vivo, mas apenas as predispõem.

Isso é bem evidente na espécie humana, em que muitas das características dos indivíduos são formadas durante o processo de contato com o ambiente em que eles vivem nas suas relações com outros humanos, na educação, na cultura etc.

Existem também genes que são ligados e desligados quando ocorrem mudanças no ambiente. Para que o clone humano fosse totalmente idêntico ao original, seria necessário que, além da clonagem, ele fosse criado durante sua vida inteira, em cir-cunstâncias ambientais muito idênticas ao de seu doador, o que é absolutamente impossível.

Saiba mais

2.1 Tipos de terapia gênica

Os tipos de terapia gênica podem ser classificados em três grupos conforme a atividade do gene terapêutico introduzido:

• Recuperação da atividade gênica perdida por mutação para doenças mo-nogênicas causadas pela mutação de um gene, e a transferência de um novo gene para recuperar a atividade perdida.

• Aumento da atividade de genes ativos.

• Introdução de uma nova atividade gênica.

Em mamíferos, a diferença genética entre os dois sexos está em um dos 23 pares de cromossomos. Um par é sexual e 22 são autossomos. Esses 22 pares levam a informação genética para constituir o corpo (o soma) do ser, e o par de cromossomos sexual leva a informação para a determinação do sexo. A diferença entre o homem e a mulher é que o 23° par de cromossomos da mulher é formado por dois cromossomos X e o do homem por um X e um Y (sendo o cromossomo Y bem menor do que o X). Portanto, é mais fácil clonar a mulher. Hoje, a ciência ainda não conseguiu fazer isso com células masculinas, por causa dessa diferenciação. Além disso, a célula masculina encontraria muito mais dificuldade para sobreviver. Precisar-se-iam de técnicas avançadíssimas para contornar essa dificuldade. Por isso, todas as experiências realizadas até agora têm sido feitas com células do sexo feminino.

Figura 3.9 – David Vetter, “o meni-no da bolha”, possuía uma doença genética conhecida como IDSCFonte: www.google.com

Biotecnologia em Debate 55

2.2 Vetores usados na terapia gênica

Alguns vetores usados para inserção de genes em células de mamíferos:

• Lipossomos: carregam grandes pedaços de DNA, apresentam vantagens de ser direcionados, não imunogênicos; suas preparações são livres de contaminantes, e alto grau de pureza. Suas desvantagens são baixa eficiência de transfecção, leve toxicidade para a célula e não se integram no genoma do hospedeiro.

• Microinjeção direta: apresenta alta taxa de transfecção, evita degradação ci-toplasmática do material injetado, mas apresentam as desvantagens de ser trabalhoso requerendo células muito bem isoladas. Na linhagem germinativa apresenta problemas técnicos e éticos.

• Injeção de plasmídeo: plasmídeos com tamanho de 2-19 Kb podem ser facilmente transferidos, usados na vacinação gênica. Como desvanta-gens apresentam baixa expressão e seu uso se restringe a pele, o timo e músculo estriado.

• Injeção biobalística de DNA: Apresenta alta taxa de transfecção com en-trega de doses precisas, usada em vacinação gênica. Dentre suas desvan-tagens destacam-se expressão transitória, lesão considerável no centro da região atingida pelo disparo (Figura 3.10).

Figura 3.10 – As duas vias de administração de vacinas de DNA mais utilizadas: inje-ção intramuscular e biobalística.Fonte: www.google.com.

Vetores biológicos

Existem também os sistemas vetores biológicos, baseados na infecção de células por vírus. Esses sistemas são divididos em duas classes: os retrovírus e os adenovírus.

• Os retrovírus apresentam alta taxa de transdução, amplo espectro de hos-pedeiro. É um sistema muito bem estudado e conhecido, sua integração ocorre no genoma do hospedeiro.

Sabe-se que as células-tronco embrionárias são dissociadas na fase do blastócito de um embrião humano clonado. Sendo assim, a obtenção de células-tronco embrionárias envolve obrigatoriamente a destruição do embrião humano (blastócito). Desse modo, apesar da não criminalização da clonagem terapêutica, constata-se que sua aplicação estaria condicionada a permissão da utilização de células-tronco embrionárias de embriões humanos excedentes das técnicas de fertilização in vitro e não utilizados no respectivo procedimento. Assim, na clonagem terapêutica somente poderiam ser utilizados embriões inviáveis ou conservados em baixas temperaturas que sobraram das técnicas de fertilização artificial, e não produzidos com a finalidade exclusiva de serem usados na clonagem terapêutica.

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• Adenovírus se caracteriza amplo espectro de hospedeiro, células mitóticas e não mitóticas, alta eficiência de transdução e o vírus selvagem causa doença leve. Apresentam o inconveniente de serem imunogênicos com reversão para o estado selvagem, além de terem um período curto de ex-pressão gênica em células em divisão com “fuga” das proteínas virais.

O vetor retroviral foi o mais usado no início da terapia gênica clínica de-vido a sua simplicidade genômica. O genoma do retrovírus Mo-MLV (Moloney murine leukemia virus) é formado por duas fitas simples de RNA e genoma composto por três genes estruturais (gag, pol, env) e sequências terminais LTR (long terminal repeat sequence). Os retrovírus recombinantes podem ser gerados ao transfectar as células de empacotamento, que expressam os genes estruturais virais com vetor plasmidial contendo as sequências LTR, o sinal de empacotamento e o gene terapêutico. O retrovírus é usado para transferência ex vivo devido à baixa taxa de infecção in vivo, mas tem uma alta taxa in vitro nas células em divisão (Figura 3.11).

Figura 3.11 – Terapia gênica com uso de retrovírus.Fonte: www.google.com.

2.3 Terapia antisenso

Nas células existe um mecanismo apelidado de interferência de RNA (RNAi) que bloqueia a expressão gênica, impedindo que os RNAs transcritos a partir dos genes produzam as proteínas codificadas naqueles genes. Ele atua, por exemplo, quando os vírus tentam induzir a maquinaria de síntese de proteínas da célula a sintetizar suas proteínas virais.

Biotecnologia em Debate 57

2.4 Transferência citoplasmática

É um sistema decisivo de terapia gênica para evitar enfermidades genéticas mitocondriais na descendência.

2.5 Doping genético

Não há dúvidas de que o principal problema que a terapia gênica enfrenta no atual estágio de desenvolvimento é a elevada capacidade imunogênica dos vetores virais introduzidos no paciente, o que pode ser importante fator de complicação decorrente do tratamento. Ainda que vetores não virais seja uma alternativa interessante de tratamento, eles também apresentam problemas de eficácia, toxicidade e resposta inflamatória.

A terapia gênica pode ter uma aplicação muito importante no contexto esportivo, permitindo, entre outras aplicações, a reconstituição de tecidos le-sionados. Entretanto, esse tipo de tratamento pode ter um potencial risco de uso indevido por atletas que procuram melhorar o desempenho físico, como ocorre no esporte de alto nível.

As autoridades esportivas do mundo todo temem uma nova forma de do-ping que seja indetectável e, portanto, mais difícil de prevenir. Ainda que esteja sendo desenvolvida com o propósito de tratar doenças graves, a terapia gênica, assim como diversas outras intervenções terapêuticas, ela apresenta grande po-tencial de abuso entre atletas saudáveis que queiram melhorar o desempenho.

Assim como os fármacos de efeitos colaterais desconhecidos é muito provável que atletas submetam-se à terapia gênica para fins de ganho no de-sempenho competitivo mesmo sabendo que existem riscos conhecidos e que também existem riscos que ainda são desconhecidos.

Alguns tratamentos para regenerar músculos, revigorando-os e pro-tegendo-os contra o envelhecimento já são uma realidade no combate das doenças musculares. Entre esses tratamentos, há terapias que dão aos pa-cientes um gene sintético que produz por anos grandes quantidades de subs-tâncias que promovem o crescimento dos músculos.

a) Eritropoetina

Dentre os genes candidatos mais importantes para uso indevido no meio es-portivo estão a eritropoetina (EPO), os bloqueadores da miostatina, o fator de crescimento do endotélio vascular (VEGF) e outros.

Uma proteína usada na terapia genética com interesse esportivo é a eri-tropoetina (EPO), produzida pelos rins, mais precisamente pelas células adja-centes aos túbulos proximais renais. A produção da EPO é estimulada por hipo-xia. Ela atua como fator hormonal de estimulação mitótica e de diferenciação, aumentando a formação de eritrócitos maduros a partir das células progenitoras.

A vacinação gênica se baseia na administração de genes que codificam antígenos para induzir a resposta imune é realizada in vivo. Os vetores usados são os adenovírus e vírus da vacínia, bem como não virais. Por ser nova, possui uma série de obstáculos que devem ser ultrapassados para que ela possa ser posta em prática. Os retrovírus, por exemplo, apresentam baixos títulos de infecção. Neste caso, uma série de estudos está sendo feito para inserir um promotor gênico mais eficiente para aumentar a expressão do gene terapêutico. Os adenovírus, por sua vez, apresentam uma expressão gênica alta, mas que desaparece ao longo do tempo. Além disso, o gene carregado por adenovírus pode ser reconhecido pelo organismo como um agente estranho (antígenos) e serem combatidos pelo sistema imune, através da produção de anticorpos, como os plasmídeos, que são introduzidos por injeção direta, eletroporação e gene gun.

PEREIRA, A. J.58

A obtenção de eritropoetina foi possível graças à tecnologia de recombi-nação genética a partir de células de mamíferos, em que houve a inserção do gene responsável pela síntese da eritropoetina humana. A eritropoetina pro-duzida pela técnica de recombinação gênica é a alfaepoetina, indistinguível da eritropoetina natural endógena dosada na urina, no que se refere à sua atividade biológica.

Figura 3.12 – Anabolizantes e esteroides usados por atletas.Fonte: www.google.com.

Animais vertebrados como o homem apresentam hipoxia, um estado de baixo teor de oxigênio nos tecidos orgânicos cuja ocorrência é atribuída a diversos fatores. Ela pode ser causada por uma alteração em qualquer meca-nismo de transporte de oxigênio, desde uma obstrução física do fluxo sanguí-neo em qualquer nível da circulação corpórea, anemia ou deslocamento para áreas com concentrações baixas de oxigênio no ar.

b) Bloqueadores da miostatina

Em algumas raças de bois, observa-se crescimento incomum da musculatura de alguns animais, fenômeno conhecido por double muscling (Figura 3.13). Há poucos anos foi verificado que esses animais apresentavam mutações no gene da miostatina, de modo que se formava uma proteína não funcional, o que de-

monstrou que este gene inibia o crescimento da musculatura esquelética.

A miostatina inibe tanto o aumento do número de células (hiperplasia) quanto à hi-pertrofia muscular, sendo que o ganho de massa muscular decorrente do bloqueio da miostatina se dá principalmente pelo aumen-to no número de fibras musculares. Portanto, acredita-se que o bloqueio da sinalização da miostatina seja um dos candidatos de maior potencial de abuso no esporte, já que o ganho de massa muscular pode ser decisivo em di-versas modalidades esportivas.

Figura 3.13 – Gado com double muscling, devido ao bloqueio do gene da miostatina.Fonte: www.google.com.

Biotecnologia em Debate 59

Já foi descrito o caso de uma criança que apresentava fenótipo seme-lhante ao double muscling. Foi observado que essa criança também tinha de-leções no gene da miostatina. Com uso de ratos transgênicos, foi demonstra-do que a superexpressão de bloqueadores da miostatina, tais como folistatina, leva ao mesmo fenótipo de double muscling.

Não se sabe quais são exatamente os efeitos quando o bloqueio ocor-re apenas na idade adulta, período em que não se observa aumento no número de fibras musculares. Existe possibilidade de expressão dos genes inibidores da miostatina em outros tecidos musculares, como os tecidos li-sos e o cardíaco.

c) O fator de crescimento do endotélio vascular (VEGF)

A terapia gênica com VEGF, proteína que desempenha importante papel no crescimento do endotélio vascular, é uma das poucas que já utilizadas em seres humanos. A introdução do gene que codifica a VEGF em pacientes com disfunção endotelial responsável por quadros de doença arterial coronariana e doença arterial periférica tem produzido bons resultados, com formação de novos ramos vasculares.

Em atletas, a inserção vetorial do VEGF poderia produzir vasculogêne-se. Dessa maneira, o fluxo sanguíneo para todos os tecidos seria aumentado, assim como sua oxigenação e nutrição. Considerando que isso ocorra em tecidos como a musculatura esquelética e a cardíaca, pode-se esperar au-mento da produção energética, diminuição da produção de metabólitos e o retardo da fadiga. Atletas praticantes de enduro, teoricamente, seriam os mais interessados na terapia gênica com inserção do VEGF.

d) Leptina

A leptina, hormônio peptídico produzido principalmente no tecido adiposo cuja principal ação está relacionada ao controle da sensação de fome e sacieda-de, redução do consumo alimentar e consequente perda de peso, também é um candidato para abuso como doping genético.

Figura 3.14 – Camundongo obeso por uma mutação espontânea no gene da leptina (acima) e normal (abaixo).Fonte: www.sbg.br.

Um marco importante do silenciamento gênico foi alcançado quando Andrew Z. Fire e Craig C. Mello, identificaram, em vermes C. elegans, RNAs de fita dupla que funcionavam como chaves para desligar genes no RNAi. Em 2001, Thomas Tuschl, descobriu que uma versão abreviada do RNA de filamento duplo – moléculas curtas de RNAs de interferência (siRNAs) - poderia desligar genes em células de mamíferos. A partir daí vários trabalhos foram realizados. Este mecanismo tem influência sobre quase tudo que trabalhamos em ciências biológicas, das plantas ao homem.O RNA antisenso é uma poderosa ferramenta para desligar a síntese de enzimas não desejadas e controlar doenças virais, como a AIDS, por exemplo. Embora esta seja uma terapia útil, o potencial terapêutico não tem sido realizado pela ausência de transferência eficaz e pela dificuldade de selecionar potentes sequências antisenso.

Diferente dos anabolizantes e dos esteroides (Figura 3.12), quando você faz doping gênico, tem que usar um gene próprio, um gene humano. Por exemplo, uma cópia adicional do gene que codifica a eritropoetina resulta no aumento da produção de hemácias, de modo que a capacidade de transporte de O2 para os tecidos é aumentada. Esse tipo de doping é exatamente o que o atleta precisa.

PEREIRA, A. J.60

e) Endorfinas e encefalinas

As endorfinas e encefalinas são peptídeos endógenos de atividade analgésica. O uso da terapia gênica com os genes da endorfina de encefalina poderia, por-tanto, melhorar o desempenho esportivo pela diminuição da sensação de dor associada a algum tipo de lesão, fadiga ou excesso de treinamento.

Pelo menos, teoricamente, permitiria que atletas treinassem mais, ou evitaria seu afastamento temporário de treinos e competições por peque-nas lesões.

Segundo especialistas, em pouco tempo, atletas começarão a usar a manipulação genética como doping para aumentar desde os seus músculos até a sua velocidade. As técnicas que interessam aos esportistas são uma forma de utilizar as técnicas da terapia gênica para melhorar o seu desem-penho artificialmente usando um trecho de DNA que traga a receita para fabricar hormônios que turbinem seus músculos, ou outro que provoque um aumento nos glóbulos vermelhos do sangue.

Vários atletas, dispostos a ignorar os riscos para a saúde deste pro-cedimento ainda experimental, já estão procurando os cientistas para saber quando poderão usar as novas técnicas. Mas, a Agência Mundial Antidoping (Wada) alerta que ainda não existem testes para detectar o doping genético.

2.6 Doenças genéticas

As doenças genéticas sempre estiveram presentes nas populações huma-nas, mas nos últimas décadas elas tem tido maior destaque. Isto acontece porque os programas de vacinação, os antibióticos e a melhoria das condi-ções sanitárias reduziram a prevalência de doenças infecciosas, como a varí-ola, a tuberculose e a cólera, que eram responsáveis por uma alta mortalidade no início do século XX.

Uma grande parcela da população humana morre atualmente de doen-ças que têm componentes genéticos, especialmente aquelas de manifesta-ção tardia, que são mais comuns pelo aumento da expectativa de vida.

Na identificação dos genes se não existe informação a respeito do gene desejado devem ser usados os princípios genéticos básicos através do mapeamento genético executado por análise de ligação. Há ligação, quando existe uma proximidade mensurável entre genes ao longo do cromossomo. A análise de ligação verifica a co-segregação, dentro de uma família, de um gene marcador e um fenótipo para estabelecer se o marcador e a caracterís-tica estão fisicamente ligados.

Genes de muitas doenças estão presentes nos autossomos, sendo que na maioria dos casos são recessivos, pois ambos os cromossomos do par devem portar a versão com alteração para a ocorrência da doença.

Um siRNA também silencia genes, ele utiliza até mesmo uma cadeia de RNA complementar, chamada também de antisenso, para isso. Uma vez dentro da célula, um siRNA se liga a um agregado de proteínas chamado de complexo silenciador induzido pelo RNA (Risc), que retém somente a fita antisenso. Este complexo liga-se então ao RNA mensageiro-alvo, degradando-o ou evitando que funcione. Diferentemente das drogas antisenso desenvolvidas nos últimos anos, os siRNAs não atrapalham apenas um único RNA mensageiro, atuam também como catalisadores, fazendo o mesmo trabalho repetidas vezes, o que explica sua aparente potência. Portanto, o siRNA é cem ou mil vezes mais eficaz do que o antisenso.

Doping: uso de substâncias naturais ou sintéticas visando à melhora do desempenho dos atletas em competições. Este objetivo é ilícito e por isso são feitos testes de doping durante competições.

Doping genético: uso não terapêutico de células, genes, elementos genéticos ou modulação da expressão gênica com a finalidade de aumentar o desempenho atlético.

Biotecnologia em Debate 61

a) Doença de Huntington

A Doença de Huntington (DH) é uma doença degenerativa cujos sintomas são causados pela perda marcante de células em uma parte do cérebro denomi-nada gânglios da base. Este dano afeta a capacidade cognitiva (pensamento, julgamento, memória), movimentos e equilíbrio emocional. Os sintomas apare-cem gradualmente, em geral nos meados da vida, entre as idades de 30 e 50 anos. Entretanto, a doença pode atingir desde crianças pequenas até idosos.

b) Fibrose cística

A fibrose cística é um exemplo de doença genética neurodegenerativa que se manifesta precocemente. Ela atinge 1 em cada 2.500 pessoas, tornando-a a doença genética mais disseminada que existe. A sua alta taxa de incidência é ainda mais notável se considerarmos que ela é geneticamente recessiva ligada a um gene do cromossomo humano 7. Somente se uma pessoa rece-ber duas cópias mutantes do gene desenvolverá a doença.

Na maioria das doenças genéticas sabemos como diagnosticá-las, tal-vez até como evitá-las, mas não como tratá-las.

Muitas vezes, as doenças genéticas resultam numa dizimação célula a cé-lula de determinados tecidos, tais como músculos no caso da Distrofia Muscular de Duchene (DMD), células nervosas na doença de Huntington e Mal de Alzhei-mer, pois não há nenhum tipo de correção para esse tipo de deterioração.

c) Distrofia muscular de Duchene (DMD)

A distrofia muscular é a designação coletiva de um grupo de doenças muscu-lares hereditárias, progressivas, sendo sua principal característica a degene-ração da membrana que envolve a célula muscular, causando sua morte, afe-tando os músculos causando fraqueza. Essa fraqueza muscular, dependendo do tipo de distrofia, afeta grupos de músculos diferentes e tem velocidade de degeneração variável.

A distrofia muscular de Duchene é uma doença de herança recessiva ligada ao cromossomo X, resultante de alterações no gene DMD localizado no cromossomo xp21 (braço curto do cromossomo X).

No caso da doença conhecida como mal de Alzheimer, doença do cé-rebro, ocorre degeneração com atrofia progressiva das células cerebrais, é mais complexo detectar se temos um risco genético aumentado que poderá aparecer dez, vinte ou quarenta anos após fazermos um teste genético.

Apesar dos avanços científicos e tecnológicos, há ainda muitas dúvidas a respeito dos efeitos colaterais da terapia gênica. Um ponto muito importante é a possibilidade, ainda que pequena, de modificação não apenas das células somáticas, mas também das germinativas.

O uso indevido da terapia gênica, ou seja, o uso não terapêutico de células, genes e elementos gênicos, ou a modulação da expressão gênica, que tenham a capacidade de aumentar o desempenho esportivo é chamado doping genético.

Não é possível distinguir substâncias produzidas por um gene usado no doping genético de seus correspondentes naturais, e elas só são fabricadas localmente no tecido muscular. Nada chega à corrente sanguínea, portanto, não há o que detectar no sangue e na urina.

PEREIRA, A. J.62

a) Mal de Alzheimer

O mal de Alzheimer produz a perda das habilidades de pensar, raciocinar, memorizar, que afeta as áreas da linguagem e produz alterações no compor-tamento. Existem formas da doença causadas por variantes em pelo menos três genes identificados, cujo início é precoce. Felizmente são raras e corres-pondem a menos de 10% dos casos (Figura 3.15).

Figura 3.15 – Cérebro de uma pessoa sadia (esquerda) e portadora do Mal de Alzheimer (direita).Fonte: www.google.com.

A maioria das formas de Alzheimer tem início tardio, após os 60 anos, e obedece a uma herança mais complexa, dita multifatorial, pelos genes de suscetibilidade com fatores ambientais. Esses genes aumentam o risco, mas não determinam que uma pessoa irá desenvolver a doença. Alguns estudos apontam como fatores importantes para o desenvolvimento da doença:

• aspectos neuroquímicos: diminuição de substâncias através das quais se transmite o impulso nervoso entre os neurônios, tais como a acetilcolina e noradrenalina;

• aspectos ambientais como na exposição/intoxicação por alumínio e manganês;

• aspectos infecciosos como infecções cerebrais e da medula espinhal;

• pré-disposição genética em algumas famílias, não necessariamente he-reditária.

Em 1995, já possuíamos 65 genes humanos que foram isolados por meio da clonagem posicional. Entre os inúmeros sucessos podemos citar: a clonagem do gene responsável pela Distrofia Muscular de Duchenne, da Do-ença de Huntington e de susceptibilidade ao câncer de seio.

Por enquanto, o tratamento de doenças genéticas não envolve a substi-tuição de células em grande escala, como o uso das células tronco, mas pode envolver a substituição de uma proteína ausente.

A miostatina, uma proteína expressa na musculatura esquelética tanto no período embrionário quanto na idade adulta, age na regulação da proliferação das células que originam o tecido muscular (mioblastos) durante o período embrionário e a síntese proteica na musculatura esquelética durante e após o período embrionário.

Em 1997 um estudo demonstrou que a introdução do gene leptina por vetor viral produzia significativa perda de peso em camundongos, podendo também, ocorrer mutações espontâneas (Figura 3.14). Por outro lado, pode ser que o mesmo fenômeno não seja observado em humanos, já que indivíduos obesos, os quais apresentam elevada concentração plasmática de leptina, não têm apetite reduzido. Essa resistência à ação da leptina pode representar importante obstáculo para a terapia gênica com esse hormônio. Além disso, diferentemente dos modelos animais, o comportamento alimentar humano depende também de outros fatores (nutricionais, psicológicos, sociais e culturais).

As drogas analgésicas estão entre as mais consumidas por atletas, o que indica o possível interesse pela inserção desses genes. Estudos em animais demonstraram que esse tipo de terapia gênica foi capaz de diminuir a percepção de dor inflamatória.

Biotecnologia em Debate 63

c) Doença de Guacher

A doença de Guacher, que acomete 1 em cada 40 mil indivíduos, é uma do-ença rara que resulta de uma mutação no gene de glucocerebrosidase, uma enzima que ajuda a decompor certo tipo de molécula de gordura. A enfermida-de pode ser crítica, com sintomas como a dor nos ossos e anemia.

As primeiras tentativas de repor diretamente a enzima ausente foram feitas em 1974. Os resultados mostraram-se promissores, mas a enzima substituta precisava ser extraída de placentas humanas e 20 mil eram ne-cessárias para suprir a necessidade anual de um único paciente. Em 1994 uma empresa de biotecnologia começou a produzir uma forma modificada da enzima usando recombinação.

O tratamento da doença de Gaucher não combate a origem genética da enfermidade, e sim o efeito da mutação, oferecendo ao paciente a proteína vital que seu gene imperfeito é incapaz de produzir.

2.7 Terapia gênica do câncer

O câncer é produto do acúmulo de mutações nos genes das células. Existem 2 tipos de genes alvos para as mutações transformantes: os genes supres-sores de tumor ou anti-oncogenes e oncogenes. Nos tumores os genes su-pressores de tumor ou anti-oncogenes estão ausentes, perdidos ou inativos, enquanto os oncogenes estão ativados, amplificados ou superexpressos.

O risco das mutações transformantes aumenta com a exposição a agentes como raios ultravioletas, radiação ionizante, fumo, agentes oxidantes etc. Também existe a herança genética, ou seja, suscetibilidade, que é uma predisposição herdada da família.

A terapia gênica não corrige os genes defeituosos, ela apenas os reme-dia. Por exemplo, a falta de expressão de um gene supressor de tumor coloca uma nova cópia, agora normal e ativa dentro da célula tumoral. Os genes tera-pêuticos são transferidos para as células cancerosas por vírus recombinantes produzidos em laboratório, os adenovírus e os retrovírus.

a) Estratégias de tratamento

Existem várias estratégias para direcionamento dos vírus recombinantes para as células-alvo:

1. Nós podemos fabricar vírus que são reconhecidos apenas por células que possuem um receptor de membrana específico, ou seja, apenas células de carcinoma de próstata e etc.

2. Outra estratégia é produzir vírus onde o gene terapêutico tem um promotor que só será ativado na célula-alvo. Se infectar uma célula normal ou não

O tumor é resultado de um desbalanço da ativação descontrolada de genes de proliferação e da inibição de genes supressores de proliferação.

A clonagem posicional, também chamada de genética inversa ou reversa, consiste em se isolar um gene identificado unicamente por um fenótipo mutante por meio da identificação do menor fragmento de DNA que o contenha e, em seguida, identificarem-se, nesse fragmento, suas sequências codificadoras. Para essa estratégia de clonagem posicional, a priori, não se faz necessário um conhecimento prévio do produto do gene procurado nem do tecido em que ele seja expresso. Entretanto, fica claro que, quanto menos informações tivermos do gene procurado, mais a tarefa da clonagem promete ser difícil e longa.Genes de muitas doenças estão presentes nos autossomos, sendo que na maioria dos casos são recessivos, pois ambos os cromossomos do par devem portar a versão com alteração para a ocorrência da doença.

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alvo, ele não será expresso. Nesta situação a expressão do vírus depende dos fatores de transcrição presentes na célula-alvo.

Figura 3.16 – O vírus Herpex simplex provoca bolhas na região da boca de indivíduos infectados.Fonte: http://www.revolutionhealth.com/articles/herpes-simplex-virus-type-1/tp10662.

Resumidamente, as principais estratégias adotadas para terapia gênica do câncer são as seguintes:

• modificar a célula tumoral, reparando um ou mais defeitos genéticos;

• introduzir um gene indutor de resposta imune antitumoral (vacina);

• introduzir gene produtor de enzima conversora de pró-droga que induzirá sensibilidade do tumor a agentes citotóxicos;

• diminuir a sensibilidade das células normais do hospedeiro, introduzindo genes de resistência a drogas, possibilitando tratamento mais agressivo; modificação do sistema imune do hospedeiro.

Estas formas de tratamento têm sido utilizadas com certo sucesso em leucemias e linfomas, tumores cerebrais agressivos, tumores de pulmão etc. Finalmente, o implante de células não humanas geneticamente modificadas e encapsuladas em membranas semipermeáveis também vem sendo apli-cado para liberação de proteínas que apenas precisam atingir a corrente circulatória, utilizando construções contendo vetores não virais. Estas cé-lulas podem liberar, por exemplo, eritropoetina para tratamento de anemias crônicas, interleucinas etc. A vantagem deste método é o fácil cultivo e esto-cagem de linhagens celulares.

Pesquisadores utilizam genes supressores de tumor ou controladores negativos do ciclo celular para inibir o crescimento dos tumores, pois todos os tumores têm em comum divisão celular exagerada, assim um tratamento que inibe a proliferação celular pode ser utilizado em diversos tipos de cân-cer como mama, pulmão, glioblastoma (cérebro), próstata etc.

Após identificar quais os vírus são mais eficientes in vitro, na cultura de células, dá-se início o tratamento de animais de laboratórios, modelos animais (eficiência aqui significa matar as células ou induzir parada do ciclo de divisão celular ou, ainda, induzir o processo de envelhecimento celular).

A Doença de Huntington é autossômicas dominantes, pois uma única cópia do gene defectivo IT15 localizado no braço curto do cromossomo 4 (4p16.3). Este único gene é suficiente para provocar a manifestação da doença.Em algumas doenças genéticas, os sintomas manifestam-se precocemente durante a vida do indivíduo afetado. Em outras, os sintomas podem não ser expressos antes que o indivíduo atinja a meia-idade ou a velhice.

Biotecnologia em Debate 65

Após a fase pré-clínica trabalhando com modelos animais in vivo e va-lidando a droga gênica, ou seja, o vírus é realizado o protocolo de fase I para tratamento de humanos. Nesta fase, 20 pacientes recebem o tratamento com o objetivo de acompanhar possível toxicidade, efeito colateral, dose e via de administração.

A Terapia gênica precisa de um laboratório e de uma equipe acadêmica com atitude e administração de um laboratório privado voltado para o desen-volvimento de drogas. Se a meta é a produção de um medicamento que será administrado em seres humanos, não pode ser feita por laboratório de pesqui-sa comum, nem por pós-graduandos ou estudantes.

A maioria dos protocolos não passa da fase I, o que é um grande inves-timento em pesquisa.

2.8 Toxinas terapêuticas

As toxinas estão sendo usadas como possíveis agentes terapêuticos após um aprofundado estudo de seus mecanismos de ação nas células e nos or-ganismos animais. Por exemplo, a toxina botulínica é considerada atualmente como uma ferramenta terapêutica que permite tratar vários distúrbios neuroló-gicos, tais como a doença de Parkinson e esclerose múltipla, além de compli-cações urinárias e distúrbios oftalmológicos.

Na medicina a toxina botulínica purificada é usada de forma injetável. Em pequenas doses, ela bloqueia a liberação de acetilcolina nas junções neu-romusculares, como resultado, o músculo não recebe a mensagem para con-trair. Desta forma, a toxina botulínica interfere seletivamente na capacidade de contração da musculatura e, por isso, as linhas de expressão são suavizadas.

O veneno de animais peçonhentos apresenta diversidade de toxinas. Acredita-se que esta variedade seja determinada pelo processo de evolução acelerada, quando os aminoácidos constituintes nas proteínas presentes no or-ganismo são rapidamente substituídos por meio de mutações pontuais, visando favorecer a adaptação e sobrevivência desse organismo no meio ambiente.

As proteínas expressas na glãndula de veneno sofrem um aperfeiço-amento de sua estrutura por meio de mutações gênicas, seleção e outros mecanismos. Esse aperfeiçoamento possibilitou não apenas o aumento da diversidade estrutural, como também o aumento da eficiência de ação das toxinas que agirão sobre as presas e na defesa contra os predadores.

Dentre vários exemplos de toxinas de serpentes como agentes terapêu-ticos podemos citar:

• BPP, do inglês bradykinin potentiating peptides, isolados do veneno da ser-pente Bothrops jararaca (Figura 3.17). Eles pontenciam a ação farmacoló-

As causas da Doença de Alzheimer ainda não estão conhecidas, mas sabe-se que existem relações com certas mudanças nas terminações nervosas e nas células cerebrais que interferem nas funções cognitivas.Em algumas doenças genéticas, os sintomas manifestam-se precocemente durante a vida do indivíduo afetado. Em outras, os sintomas podem não ser expressos antes que o indivíduo atinja a meia-idade ou a velhice.

Um dos genes, o APO4, de suscetibilidade ao Alzheimer foi identificado. Pessoas que possuem uma mutação nesse gene sabem que, ao chegar à velhice, terão três vezes mais risco de desenvolver a doença.

Genes supressores de tumor: genes responsáveis pelo controle negativo da divisão celular, pelo processo de envelhecimento celular, morte celular e resposta a danos e estresse.

Oncogenes: genes que ativam a divisão celular, estimulam angiogênese e genes de sobrevida.

PEREIRA, A. J.66

gica da bradicinina, causando um choque vascular nas presas da serpen-te, geralmente mamíferos pequenos. Os BPP atuam na pressão arterial sistêmica, dilatação de vasos cerebrais, sistema nervoso central e vasodi-latação coronária.

Figura 3.17 – A serpente brasileira Bothrops jararaca.Fonte: www.cobrasbrasileiras.com.br.

• Reptilase® (Pentapharm Limited, Basel – Suiça), uma proteina isolada do veneno de outra jararaca, a Bothrops atrox que possui uma estrutura pro-teica homóloga à trombina (Figura 3.18), é capaz de clivar o fibrinogênio, transformando-o em fibrina. Portanto a Reptilase® é utilzada na detecção de fibrinogênio e na determinação do tempo de coagulação.

Figura 3.18 – Ação da trombina e outras substâncias na coagulação sanguínea.Fonte: www.google.com.

Diversos fatores podem provocar alterações nos genes. O mais natural é a longevidade, pois à medida que as células vivem mais, se dividem mais e têm mais chances de sofrerem mutações. Por esta razão, a incidência de câncer aumenta com a idade.

A maioria dos tumores humanos são carcinomas, ou seja, tumores derivados de células epiteliais, células que estão sempre se dividindo para repor células mortas, como pele, pulmão, próstata, mama etc.

Na maioria dos protocolos clínicos os vírus são administrados in situ, diretamente no tumor. Os vírus não ultrapassam uma ou duas camadas de células, assim sua distribuição é restrita. A transferência de uma cópia normal do gene defeituoso, por exemplo, o gene supressor de tumor p53 é frequentemente perdido em células transformadas. Nas células normais, esse gene controla a proliferação e monitora a integridade do genoma celular, devido a essas propriedades, p53 é chamado de guardião do genoma. A transferência do gene p53 é capaz de inibir o crescimento tumoral e aumentar a sensibilidade do tumor ao tratamento quimio e radioterápico.

Biotecnologia em Debate 67

Outras toxinas utilizadas como terapéuticos são o peptídeo exenatida-4, isolado do veneno do monstro Gila (Figura 3.19), um lagarto pertencente à fa-mília Helodermatidae, com perspectivas para o tratamento do diabetes tipo 2 e os peptídeos conotoxinas extraídos de caracóis marinhos do gênero Conus que são responsáveis para o controle da dor (Figura 3.20).

Figura 3.19 – O monstro Gila (Heloderma suspectum) encontrado nos EUA.Fonte: (http://pt.dreamstime.com/fotografia-de-stock-royalty-free-monstro-de-gila- image2403327)

Figura 3.20 – O caracol-do-cone (Connus pannaeus) possui um “dente” formado por quitina possuindo aspecto de um arpão cheio de microfarpas. O veneno é injetado de modo absolutamente rápido e não existe nenhuma espécie de antídoto para a presa. Fonte: www.google.com.

Síntese do Capítulo

Este capítulo apresentou uma visão geral sobre a clonagem natural, sobre as diferentes técnicas de clonagem gênica e terapêutica. Discorreu tam-bém, sobre a terapia gênica. Descreveu a terapia moderna do antisenso, o uso das células-tronco embrionárias na terapia gênica, alguns aspectos éticos relacionados com essas técnicas no tratamento de doenças.

Também explorou o Doping Genético, os genes candidatos que podem ter uso indevido no meio esportivo e algumas doenças genéticas de interesse para a terapia gênica, tais como Doença de Huntington, Fibrose cística, Dis-trofia muscular de Duchene. Doença de Gaucher e Mal de Alzheimer. Por fim salientou as principais estratégias usadas na terapia gênica do Câncer.

A transferência de genes tóxicos ou suicidas, com o objetivo de matar células do câncer utiliza o gene tk (timidina quinase derivado do vírus Herpes simplex - Figura 3.16). A estratégia é relativamente simples: apenas as células tumorais que receberam o gene tk exógeno são eliminadas após a administração de ganciclovir. A presença do gene tk nas células confere sensibilidade ao ganciclovir e o resultado esperado é a eliminação do tumor.

Gene suicida: em genética, é um gene que causa a morte da própria célula através de apoptose (morte cleular programada). Muitos são os fatores que levam à ativação destes genes, mas o principal fator celular a induzir a apoptose é a proteína p53.

Proteína p53: proteína citoplasmática, de massa molecular 53 kDa, sintetizada pela própria célula. As mutações somáticas no gene supressor tumoral p53 são encontradas em aproximadamente 50% de todos os tumores humanos.

Ganciclovir: droga usada em quimioterapia no tratamento do câncer.

PEREIRA, A. J.68

Texto complementar

Ética: discriminação genética no futuroEm 1997, o filme de ficção científica GATTACA mostrou um futuro no qual é possível não apenas fazer uma análise genética completa e rápida de qualquer indivíduo, mas programar geneticamente crianças com características desejadas. Apenas as pesso-as construídas geneticamente “válidas” teriam lugares significativos na sociedade. As crianças nascidas naturalmente, sem construção genética, seriam consideradas “não válidas” e teriam acesso apenas a trabalhos menos importantes. O personagem líder é um “não válido” que finge ser “válido”, logo ele pode ter uma carreira como viajante espacial e não como costudiado. “Agora temos a discriminação na ciência”. O próprio título, GATTACA, é um heptanucleotídeo da sequência do DNA. Discutimos como as novas tecnologias e os conhecimentos da genética médica levarão a uma nova era de medicina molecular individualizada, resultando em terapia mais efetiva e menos tóxica. A informação genética também pode ter um mau uso. Ela pode ser usada para discri-minar pessoas no emprego ou em seguros de saúde. Cada um de nós provavelmente tem seis ou mais mutações em nosso genoma, que podem nos predispor a doenças, logo todos nós seríamos classificados como “não válidos” no mundo GATTACA... cont. Fonte: WESTMAN (2006).

Terapia gênica humana: o desafio do direito frente a parâmetros de tempo e riscoComo já adiantado, há uma espécie de consenso a apontar a terapia gênica somática como lícita e legítima, sem a emergência de problemas éticos de fundo ou de dificulda-des novas que se diferenciem de debates já presentes na prática médica. A positivação legislativa tem, inclusive, inclinada nesse sentido. Sua carga “terapêutica”, em conso-nância com o princípio da beneficência, lhe daria tal estatuto. Não obstante, e com ênfase em seu viés ainda “altamente experimental”, algumas condições procedimentais são postas para que a atividade seja realizada de forma eticamente defensável.

De início, e no que tange ao princípio da autonomia e à necessidade de consenti-mento informado, importante notar seu agravamento. Como bem notam Archer e Fle-ck, o caráter experimental das intervenções acentua e potencializa riscos, acarretando, pois, uma obrigação ainda mais forte de se fornecerem informações claras, sérias, que apontem o grau de imprevisibilidade da atividade – há, de certo, uma linha de tensão entre “informação” e “experimentação” a ser bem ponderada. Ademais, dada a maior vulnerabilidade e ansiedade dos pacientes que se sujeitam a esse tipo de prática, é relevante o caráter voluntário da participação, sua autorização explícita e, fundamen-talmente, uma separação entre equipe pesquisadora e informante, para que se evitem constrangimentos ou comportamentos manipulativos sobre os candidatos.

Além disso, e já no que se refere aos princípios de beneficência e de não male-ficência, é essencial perceber que o grau de insucessos ainda existente direciona a utilização eticamente plausível apenas ou fundamentalmente para os casos de doen-ças graves – ou que ainda não possuam terapia fenotípica eficiente. Há riscos gerais como, por exemplo, a possibilidade de atingimento das células em linha germinal (ainda não completamente afastado), as dificuldades imunogênicas inerentes aos ve-tores virais e as eventuais e imprevisíveis interações genéticas; há, ademais, riscos individualizados, a variar conforme o sujeito – não é de se olvidar a morte ocorrida durante experimento realizado na Universidade da Pensilvânia, em 1999, bem como

Já foram construídos e produzidos vírus portadores de genes supressores de tumor, incluindo p53, p16ink4a, Rb, entre outros. Os vírus foram utilizados para infectar células tumorais de carcinoma de pulmão, próstata e glioblastoma derivadas de pacientes.

No Brasil, um protocolo clínico experimental de fase I é caro e, no exterior, sempre é realizado por uma universidade em parceria com uma empresa privada, interessada no desenvolvimento do produto.

Toxina botulínica: um complexo proteico purificado, de origem biológica, obtido a partir da bactéria anaeróbica Clostridium botulinum.

Doença de Parkinson: doença do sistema nervoso central que afeta a capacidade do cérebro de controlar nossos movimentos.

Esclerose múltipla: doença inflamatória sem cura que atinge as fibras nervosas responsáveis pela transmissão de comandos do cérebro a várias partes do corpo, provocando um descontrole interno generalizado.

Acetilcolina: neurotransmissor responsável por levar as mensagens elétricas do cérebro aos músculos.

Biotecnologia em Debate 69

alguns relatos de ativação de genes oncogênicos ou do desenvolvimento de uma es-pécie de leucemia em crianças francesas, em 2002.

A assunção de risco, portanto, só se justifica bioeticamente nos casos de enfermi-dades graves ou sem boas alternativas terapêuticas, não sendo adequada a realização da terapia gênica somática em moléstias relativamente controladas. É imperativo um balanceamento entre a autonomia dos sujeitos e o nível fático de riscos a que se submetem, em um cenário de primazia da noção de “risco residual” ou socialmente aceitável. Por fim, em estreita relação com as discussões anteriores, é fundamental o debate acerca do princípio de justiça.

Também nesse ponto há elementos gerais e específicos. Em visão macro, apon-tam-se questões como a distribuição dos recursos à saúde para a terapia gênica somá-tica ou o quantum a ser publicamente destinado, considerando-se elementos como seu grande potencial terapêutico e a possível minoração de gastos com a medicina convencional (já que seus efeitos são, em tese, permanentes), em contraponto com as demais necessidades sociais de menor custo e, ao menos imediatamente, de maior amplitude. Encaixam-se também nesse contexto discussões sobre a possível injustiça no acesso às novas terapias (inevitavelmente caras), a acentuar procedimentos e re-lações discriminatórias, bem como sobre a distribuição de tais centros de tecnologia avançada pelo espaço terrestre, a diminuir ou aumentar, conforme a decisão político--econômica tomada, o fosso entre ricos e pobres, beneficiados e excluídos... cont.

Fonte: PAULA (2007).

Leituras, filmes e sites@

Leituras

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NOVAIS, C. M.; PIRES-ALVES, M. PCR em tempo real. Uma inovação tec-nológica da reação em cadeia da polimerase (PCR). Revista Biotecnologia Ciência & Desenvolvimento, n. 33, 2004.

PENA, S. D. Clonagem: limites e possibilidades. Disponível em: http://www.ufmg.br/diversa/4/clonagem.htm

RAMIREZ A.; RIBEIRO, A. Doping genético e esporte. Disponível em: http://www.quimica.seed.pr.gov.br/arquivos/File/doping/BoletimEF_Doping_gen.pdf

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RINGO, J. Genética básica. Traduzido por Paulo A. Motta. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2005.

A toxina botulínica é também utilizada para tratamento em crianças com problemas musculares. Esta toxina permite, que depois de aplicada na zona em causa (ex: pernas), a criança tenha mais flexibilidade muscular. Toxinas de serpentes: os venenos das serpentes são compostos por misturas complexas de moléculas inorgânicas e orgânicas. Os componentes orgânicos são principalmente proteínas com propriedades enzimáticas, peptídeos biologicamente ativos e algumas moléculas não proteicas, que agem de forma isolada ou sinergística, interferindo em mecanismos fisiológicos, celulares e moleculares específicos.

Os componentes dos venenos das serpentes são responsáveis por distúrbios na coagulação sanguínea, hemorragias local e sistêmica, efeitos neurotóxicos, necrose tecidual, entre outros.

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Filmes

Células-tronco

Contra e a favor às pesquias com células-tronco embrionárias

http://www.youtube.com/watch?v=T-4ZSz36rEc

Terapia Gênica: Experiências

http://www.youtube.com/watch?v=riACCe6S0TI&feature=related

Clonagem: Filme “A Ilha”

Aprender, entender e pensar a biotecnologia

http://www.biotecpragalera.org.br/cd_cib/projeto.htm

Sites

http://www.tomeciencia.com.br

http://www.sbbq.org.br/revista/index.php

http://www.cienciahoje.pt/index.php?oid=40713&op=all

http://www.cienciamao.usp.br

http://www.anbio.org.br

http://www.ibram.org.br

http://www.geneticanaescola.com.br

http://www.biotecpragalera.org.br/

Atividades de avaliação

1. Pesquise em sítios da internet as descobertas mais recentes sobre o uso da terapia gênica no tratamento de doenças.

2. Na terapia gênica, alguns problemas podem inviabilizar o sucesso da tera-pia. Cite e explique dois destes problemas.

3. O que são vacinas de DNA? Como elas são administradas? Cite duas do-enças onde as vacinas de DNA estão sendo testadas?

4. Em que consiste a clonagem terapêutica e clonagem reprodutiva?

5. A clonagem pode sempre ser considerada imoral?

6. Já é possível realizar a clonagem do ser humano? Se sua resposta for sim, por que ela não foi realizada ainda?

As toxinas de veneno são consideradas um material de grande interesse no estudo de processos fisiopatológicos em que estão envolvidos e em sua possível utilização para fins terapêuticos, fármacos ou como modelo estrutural para o desenvolvimento de drogas para o tratamento de doenças humanas, assim como para aplicação na biotecnologia.

A ação anti-hipertensiva dos BPP tem sido atribuída à sua capacidade de inibir a atividade catalítica da ECA (enzima conversora de angiotensina), impedindo a angiotensina I em angiotensina II, tendo ação vasoconstritora, além de impedir a degradação da bradicinina que tem ação vasodilatadora. Desta forma a ECA é uma molécula alvo para tratamento da hipertensão.

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Referências

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Capítulo 4DNA na identificação de pais e

criminosos e na saúde

Biotecnologia em Debate 75

Objetivos

• Identificar o teste de DNA como importante ferramenta em casos de determi-nação da paternidade, investigação criminal e identificação de indivíduos.

• Ilustrar de forma breve, os principais eventos cronológicos da identificação humana.

• Conhecer as principais técnicas para identificação de pessoas na medici-na forense.

• Descrever as principais inter-relações entre a biotecnologia e saúde.

1. Identificação pelo DNA

Em uma sala de espera de um Instituto de Criminalística, várias pessoas aguardam sentadas o momento para doarem seu sangue. Em outra sala, só que fechada, do mesmo Instituto, um homem aguarda o momento de ser atendido, mas com uma segurança reforçada feita por dois policiais.

Estas pessoas deverão se submeter a uma coleta de seu material ge-nético, o DNA, que mais tarde será confrontado com o DNA retirado de evi-dências como roupa com sangue ou sêmen, sangue coletado de armas de veículos envolvidos em crimes, sangue revelado por luminol em roupas, esto-famentos ou outros revestimentos, esfregaço oral, vaginal ou anal de vítimas de violência sexual, amostras encontradas em corpos carbonizados ou em ossadas. Todo este material é preparado para se obter um perfil genético que será comparado com parentes, caso se deseje identificar o doador da amos-tra questionada, ou com o suspeito de um crime de estupro, por exemplo.

1.1 O DNA fingerprinting, identificação genômica ou datiloscopia do DNA

Nem os gêmeos idênticos, apesar de serem muito semelhantes em sua apa-rência e comportamento, não possuem as suas impressões digitais iguais. A identificação pessoal por impressões digitais de cada indivíduo começou em 1892. A partir da coleta das impressões digitais deixadas em superfícies de móveis, telefone, copo, lataria de veículo etc., o sistema judicial tem incri-

Polimorfismo: é a ocorrência em uma população ou entre populações de várias formas fenotípicas associadas a alelos de um gene.

Marcador genético:corresponde a um alelo usado como uma sonda experimental para seguir um organismo individual, um tecido, um núcleo, um cromossomo ou um gene (Fonte: GRIFFITHS et al., 2006).

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minado grande número de suspeitos. Por outro lado, um grande número de indivíduos tem se beneficiado dessa possibilidade, ao serem inocentados de acusações criminais.

Após esta fase, a investigação de paternidade e identificação de ca-sos criminais baseou-se apenas nas análises sorológicas dos polimorfismos de proteínas e grupos sanguíneos e em alguns marcadores genéticos. A descoberta do grupo sanguíneo ABO no início do século XX, e o posterior reconhecimento de que as suas frequências variavam de forma considerá-vel de acordo com a população analisada, constituíram um avanço inicial na identificação genética.

Pela primeira vez, surgiu a possibilidade de classificar os indivíduos estu-dados em classes discretas, tornando mais fácil qualquer comparação entre os indivíduos. Outros grupos sanguíneos na espécie humana foram descobertos e, se tornaram instrumentos relevantes nas primeiras tentativas de determinar pa-rentescos. Contudo, a generalização deste tipo de trabalho só foi possível com a descoberta da eletroforese de proteínas, que permitiu revelar uma quantidade de variação genética nas populações naturais até aí insuspeitada.

1.2 Eletroforese de proteínas

A eletroforese de proteínas nasceu da combinação de técnicas de sepa-ração de moléculas num campo elétrico com técnicas histoquímicas. As proteínas em solução podem adquirir carga elétrica. Dos vinte aminoácidos que compõem as proteínas, três possuem carga positiva (arginina, lisina e histidina), dois com carga negativa (ácido aspártico e ácido glutâmico) e os restantes são eletricamente neutros. Quando sujeitas a um campo elétrico, e dependendo do pH da solução em que se encontram, as proteínas adquirem carga positiva ou negativa e deslocam-se, assim, para o pólo negativo ou positivo, respectivamente.

A migração eletroforética das proteínas ocorre numa matriz sólida (géis de agarose, amido e poliacrilamida), mas porosa, que permite a sua deslocação durante o tempo em que estão submetidas a um campo elétrico. As matrizes além de separarem as proteínas pela sua carga, promovem a sua separação pelo tamanho e conformação.

Depois da eletroforese, os géis são colocados em soluções com pro-dutos químicos necessários à revelação das diferentes proteínas com ativi-dade enzimática. Permitindo a revelação e análise simultânea de várias en-zimas e dos respectivos padrões eletroforéticos (Figura 4.1). Existem vários outros tipos de coloração, incluindo aqueles que possibilitam a detecção de proteínas que não têm atividade enzimática.

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Figura 4.1 – Aspecto de uma separação eletroforética de proteínas.Fonte: www.google.com

1.3 Breve histórico da identificação humana

A evolução da ciência da identificação humana também foi demonstrada pela ocorrência de um sistema de histocompa-tibilidade mediado por antígenos na superfície dos leucócitos, o complexo HLA (histocompatibility leucocyte antigen), determi-nado por genes alélicos muito próximos localizados no braço curto do cromossomo 6, com acentuado poder de discrimina-ção individual ou determinação da individualidade genética.

Depois surgiu a tipagem molecular de material genéti-co, utilizada oficialmente pela primeira vez, em 1985, por Alec Jeffreys (Figura 4.2), na Inglaterra para a resolução de um pro-blema de imigração. Um ano após, Jeffreys com esta mesma técnica identificou o verdadeiro estuprador e assassino de duas vítimas. A partir deste caso, chamado de Enderby (Queen v. Pitchfork), a Criminalística e a Medicina Legal ganharam novo fôlego e têm empregado a técnica de tipagem molecular de DNA como potente arma no esclarecimento de diversos delitos e na identificação humana.

1.4 Sequências repetitivas do DNA

Em 1984 Alec Jeffreys, quando estudava as diferenças genéticas entre as espécies com o uso do gene da mioglobina encontrada no tecido muscular, descobriu o “fingerprinting” genético. Ele verificou que um pequeno trecho de DNA se repetia continuamente, o que já tinha sido observado anteriormente em outro gene estudado por Whyte e Wyman em 1980, onde o número des-sas repetições variava de indivíduo para indivíduo. Jeffeys também observou que esse curto trecho de DNA repetitivo aparecia não apenas no gene da mio-

Figura 4.2 – Alec Jeffreys em sua bancada ana-lisando DNA.Fonte: http://www.nlm.nih.gov/visibleproofs/galleries/cases/jeffreys.html

O FBI (Polícia Federal Americana) identificou 13 loci STR no núcleo das células de indivíduos americanos. A Interpol (Polícia Federal Britânica) identificou 10 loci STR para o Reino Unido e Europa, enquanto 9 loci STR foram identificados para as populações indígenas.

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globina, mas por todo o genoma espalhado e, embora os trechos variassem um pouco de uma repetição a outra, todos tinham em comum uma sequência curta praticamente idêntica, de cerca de 15 nucleotídeos, chamadas de minis-satélites com propriedade de serem repetidas.

Embora a grande maioria do genoma humano seja praticamente idêntico em todos os indivíduos, certas regiões apresentam variação. Esta variação pode ocorrer em qualquer parte do genoma, incluindo certas regiões que não codificam proteínas. A investigação destas regiões não codificadoras revelaram a existência de unidades de DNA repetitivas que variam em tamanho, entre os indivíduos, co-nhecida como STR (Short Tandem Repeat), relativamente fácil de ser medida e que pode ser comparada entre os diferentes indivíduos (Figura 4.3).

Figura 4.3 – As pequenas repetições em série (STRs) presentes no DNA. Fonte: www.google.com

1.5 Identificação individual e rastreabilidade

O polimorfismo se tornou generalizado e aplicado em larga escala com a des-coberta dos microssatélites e a sua análise rápida através da utilização de um sequenciador automático. Na verdade, os microssatélites são marcadores moleculares muito variáveis que normalmente exibem mais de dez alelos por população, pelo que uma bateria reduzida permite obter valores de probabili-dade de identificação individual para lá de qualquer dúvida razoável.

2 Técnicas moleculares de identificação2.1 O sequenciamento e os polimorfismos nucleotídicos simples

No final dos anos setenta, Allan Maxam e Walter Gilbert, por um lado, e Fred Sanger, por outro, descobriram dois métodos diferentes de sequenciamento do DNA. Estavam assim dados os primeiros passos no sentido de permitir a aqui-sição da informação definitiva sobre a caracterização genética dos organismos vivos. Contudo, a generalização do sequenciamento só foi possível depois da descoberta da reação de PCR e do desenvolvimento dos sequenciadores auto-máticos de elevada produtividade. Atualmente, o sequenciamento de DNA é um procedimento de rotina em todos os laboratórios de genética e biologia molecu-

As alterações genéticas são provenientes de dois processos: mutação e recombinação (“crossover”). A primeira pode induzir mudanças hereditárias no DNA e a segunda pode produzir cópias maternal e paternal de uma determinada região de DNA pelo pareamento e mudar de local estas informações durante a formação dos espermatozoides e dos óvulos.

O primeiro caso de que se tem notícia de identificação de uma pessoa pelo exame de DNA foi realizada por Alec Jeffreys na Inglaterra em 1985. Ele recolheu o esperma que havia no corpo de uma mulher que tinha sido estrupada e assassinada. Mais tarde houve outro crime semelhante e Jeffreys realizou os mesmos procedimentos recolhendo o esperma encontrado na vítima. O resultado do exame de DNA mostrou que se tratava do mesmo homem. As autoridades da região do crime forjaram uma campanha de doação de sangue com o objetivo de identificar o agressor das mulheres, mas não foi encontrado nenhum DNA semelhante do suposto criminoso, depois de todos os habitantes doarem sangue. Posteriormente, a polícia identificou no DNA de um viajante, alta semelhança no seu código genético com o DNA do estuprador.

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lar, muitas vezes automatizado com o auxílio de robôs, desde extração de DNA, passando pela preparação das reações de PCR, até terminar nos ficheiros de computador que mostram as sequências obtidas (Figura 4.4).

Figura 4.4 – Separação de um microssatélite em gel de poliacrilamida corado com Nitrato de Prata (A) e no computador (B).Fonte: www.google.com.

2.2 Obtenção do perfil de DNA

O padrão de fragmentos do DNA, ou perfil de DNA, de uma pessoa, animal, planta ou microrganismo pode ser obtido pela análise do seu material genéti-co. O procedimento, de forma simplificada, inclui sete etapas:

1. Coleta da amostra: sangue, saliva, sêmen, pêlos, dente, ossos ou qual-quer outro tecido celular ou fluido, do indivíduo.

2. Isolamento do DNA: o DNA deve ser extraído das células ou tecidos da amostra. Dependendo do método de análise utilizado, pequena quantidade de amostra pode ser suficiente, como as células descamadas da epiderme da testa do indivíduo depositadas em um boné por ele utilizado. Alternati-vamente, uma gotícula de saliva deixada em um telefone ou selo de carta pode também conter DNA suficiente para as análises.

3. Corte do DNA: a etapa seguinte é a digestão ou fragmentação do DNA com uma enzima de restrição. As enzimas Hind III e EcoR I, dentre outras, têm sido frequentemente utilizadas para esta finalidade. Após o DNA ser tratado com a enzima de restrição, ele será constituído de grande número de fragmentos de diferentes tamanhos.

4. Separação dos fragmentos: os fragmentos de DNA são ordenados por tamanho, utilizando-se a técnica da eletroforese. Tal procedimento consis-te em submeter os fragmentos do DNA, dentro de um gel, a uma corrente elétrica. O gel utilizado normalmente é feito com a agarose, substância

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extraída de algas marinhas. O gel de agarose possui consistência si-milar à da gelatina. O procedimento consiste, portanto, em depositar os fragmentos de DNA em uma canaleta (um pequeno sulco) moldada na extremidade do gel próximo do eletrodo negativo. Com a corrente elétrica, o DNA migrará dentro do gel na direção oposta, isto é, em direção ao eletrodo positivo. Os fragmentos menores de DNA migrar--se-ão mais rapidamente do que os maiores, permitindo, dessa forma, separá-los por tamanho (Figura 4.5).

5. Transferência do DNA: após a separação dos fragmentos no gel, eles são transferidos para uma membrana de náilon, por capilaridade. Uma vez fixados nessa membrana, os fragmentos podem ser manipu-lados para sua visualização.

6. Hibridização de sondas: a adição de sondas coloridas ou radioati-vas à membrana de náilon permite a visualização dos fragmentos que possuem sequência gênica complementar à da sonda. Cada sonda uti-lizada tipicamente evidencia apenas alguns dos fragmentos presentes na membrana.

7. Perfil do DNA: o perfil final do DNA é constituído após a hibridização de diferentes sondas à membrana. O resultado é um padrão de bandas de diferentes tamanhos como na Figura 4.6.

Figura 4.6 – Bandas resultantes de um teste de DNA.Fonte: www.google.com

2.3 O DNA forense

O DNA como evidência criminal ou como forma de identificação individual está revolucionando o sistema judicial. Tome-se o exemplo em que dois indi-víduos tenham sido indiciados como suspeitos de um caso de estupro. Para fins de ilustração, sejam esses dois indivíduos designados suspeitos S1 e S2. A análise de uma amostra de sêmen ou outro tecido coletado na cena do cri-me, aqui designada evidência E, pode esclarecer o caso sem a necessidade de submeter à vítima a um estresse adicional de reviver todo o episódio do estupro ao depor no julgamento, fazendo a identificação positiva do suspeito. Ademais, pode a vítima encontrar-se em um estado tão debilitado que não consiga proceder ao reconhecimento do agressor.

Figura 4.5 Análise de DNA por Eletro-forese em gel de agarose.Fonte: http://www.sobiologia.com.br/figuras/Ge-netica/eletroforese2.gif

Biotecnologia em Debate 81

A análise do DNA dos dois suspeitos e da evidência pode dirimir as dú-vidas, incriminando um dos suspeitos e inocentando o outro. Após o corte do DNA com a enzima de restrição, separação dos fragmentos pela eletroforese e transferência para a membrana de náilon, um dos possíveis padrões eviden-ciados com quatro possíveis sondas está representado na Figura 4.7.

Figura 4.7 – Perfil hipotético de DNA de dois suspeitos, S1 e S2, e da evidência E coletada no local do crime.Fonte: www.cead.ufv.br

Examinando os perfis produzidos com as quatro sondas na Figura 4.7, o suspeito S1 pode ser excluído como o autor do crime, uma vez que seu perfil de DNA é diferente daquele apresentado pela evidência E (sondas 1, 2 e 4). Tecnicamente, seria mais apropriado dizer que o suspeito S1 poderia ser excluído de ter deixado aquela evidência no local do crime. O entendimento dos criminalistas é de que a relação entre a evidência, o crime e sua autoria deve receber igual atenção. Entretanto, é inquestionável pela análise do DNA que a evidência E não possui o mesmo perfil que o suspeito S1. O DNA do suspeito S2 corresponde perfeitamente com o da evidência E nos quatro lo-cais do genoma humano analisados com as quatro sondas. Isso não significa necessariamente que o suspeito S2 é o autor do crime.

Obviamente, para saber com que convicção essa evidência deve ser considerada, é necessário conhecer com que frequência esse perfil de DNA é encontrado na população humana, e isso é uma questão de probabilidade. Após a análise do perfil do DNA com determinado número de sondas, o laboratório emite um laudo informando a probabilidade de o DNA do suspeito S2 e de a evidência E serem exatamente iguais apenas por coincidência. Normalmente, o nível de exigência estatística nessas análises é extremamente elevado, para evitar falsos positivos e negativos, sendo estes últimos muito raros.

2.4 Outros marcadores moleculares: RFLPs e RAPDs

Os marcadores moleculares RFLPs e RAPDs são utilizados nas análises de DNA. Para reconhecer os “locus” (sítios) onde ocorrem essas mutações, foi inventada a técnica de RFLP, do inglês Restriction Fragment Length Polymor-

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phism, ou “polimorfismo de comprimento de fragmento de restrição”. O método usa as enzimas de restrição, que “cortam” o DNA apenas onde existem cer-tas sequências específicas de nucleotídeos, designados pelas letras iniciais dos nomes das bases que os formam: adenina [A], citosina [C], guanina [G] e timina [T]. A enzima ECORI, por exemplo, só corta o DNA no sítio correspon-dente à sequência GG/AA. A Figura 4.8 mostra os procedimentos necessários para obter-se um RFLP. Em A, as sequências de DNA possuem os motivos GGAA que são reconhecidos pela enzima de restrição ECORI. Em B, estas enzimas cortam o DNA em fragmentos pequenos. Em C, os fragmentos de DNA resultantes da digestão enzimática são separados por eletroforese.

Figura 4.8 – Procedimentos experimentais usados para se obter RFLP. Fonte: www.google.com

3 Análise dos testes de DNA3.1 Banco de dados de DNA

O perfil de DNA é singularmente uma poderosa forma de identificação. A maioria dos países possui bancos de dados com impressões digitais, os quais são utiliza-dos em casos criminais. Nos crimes contra a propriedade, as impressões digitais podem, frequentemente, ser detectadas. Entretanto, em crimes violentos, muitas vezes nenhuma impressão digital é deixada. Tome-se o caso de estupros nova-mente. Se o estuprador tocou apenas no corpo da vítima, nenhuma impressão digital pode ser recuperada. Muitos países estão formando bancos de dados com o perfil do DNA de indivíduos com história de crimes violentos. Esses bancos de

Além dos RFLPs e RAPDs, outros tipos de marcadores moleculares têm sido utilizados em análises de DNA para fins criminais. Esses marcadores são altamente discriminatórios, faz análise de 13 regiões do genoma humano, com os “kits” disponíveis para esses marcadores, permite a emissão de laudos, que estabelecem a probabilidade de 1 para 82 bilhões, na distinção de 2 indivíduos.

Os testes de DNA também têm contribuído para a elucidação de dúvidas históricas. Um destes casos investigados pela genética molecular envolveu o ex-presidente dos EUA, Thomas Jefferson, que foi acusado em 1802 de ter tido um filho com sua escrava Sally Hemings. Este estudo feito em 1998, na Universidade de Oxford na Inglaterra, utilizou a análise de marcadores polimórficos associados ao cromossomo Y, que existe apenas nos homens e é herdado exclusivamente de pai para filho através das gerações (linha paterna). Após a análise de vários homens descendentes diretos pela linha paterna de Thomas Jefferson e Eston Hemings Jefferson (suposto filho de Sally Hemings com T.Jefferson), verificou-se que estes possuíam o mesmo tipo de cromossomo Y, isto é, com grande probabilidade T. Jefferson realmente teve um filho, não reconhecido oficialmente, com sua escrava.

Biotecnologia em Debate 83

dados servirão para identificar suspeitos pela simples comparação do perfil do DNA da evidência com aqueles nele armazenados. Entretanto, vários questiona-mentos éticos têm sido levantados com a construção desses bancos de dados.

3.2 Confiabilidade dos testes de DNA

Embora o perfil de DNA seja considerado uma prova irrefutável de identifica-ção, é necessário o estabelecimento de padrões de análise e níveis de restrin-gência nos cálculos estatísticos. Adicionalmente, os laboratórios que prestam esse tipo de serviço devem ser submetidos a testes denominados duplamente cegos, para assegurar que eles estão trabalhando com um controle de quali-dade aceitável, uma vez que o que está em jogo é a liberdade de um inocente e a sanção cabível para o autor do delito.

3.3 Precisão dos testes

Os testes de paternidade podem provar com 100% de certeza que um indiví-duo NÃO é o pai biológico da criança. No entanto, não existe nenhum teste disponível que prove com 100% de certeza que um indivíduo seja o pai bioló-gico de uma criança. Esses testes podem conferir um grau de confiança de paternidade de até 99,9%, nos casos em que a amostra de DNA da mãe, do filho e do suposto pai é analisada. Quando falta um dos genitores, como no caso de amostras somente do filho e do suposto pai ou filho e da suposta mãe, a precisão do teste pode ser igual ou pouco superior a 99%.

Análise de DNA Mitocondrial Outra ênfase tem sido dada à análise do DNA presente na organela celular denomi-nada mitocôndria em vez do DNA presente no núcleo das células. Uma vez que as células possuem grande número de mitocôndrias, em casos onde a quantidade de DNA é extremamente pequena, ou em casos onde a vítima foi carbonizada, destruin-do parcial ou completamente o DNA nuclear, a análise de DNA mitocondrial pode ser uma alternativa. Entretanto, deve-se lembrar de que a variabilidade dos perfis de DNA mitocondrial tende a ser substancialmente menor, uma vez que essa organela é de herança materna, isto é, o DNA mitocondrial de um indivíduo é exatamente idên-tico ao de sua mãe e de seus irmãos, de todos os tios por parte de mãe, da sua avó materna etc. O estudo do DNA mitocondrial foi extremamente importante na Argen-tina para identificação de crianças separadas de suas famílias após a morte dos pais durante a ditadura militar. Em apoio ao movimento Avós de Maio, vários netos que estavam sendo criados por outras famílias puderam ser recuperados pelas avós, pois tiveram seu DNA mitocondrial comprovando a relação de parentesco. Este mesmo tipo de análise foi utilizado também na identificação de corpos de vítimas de ataques terroristas do World Trade Center em Nova York.

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PEREIRA, A. J.84

3.4 Laudo do teste de paternidade

O laudo de um teste de paternidade deve ter a identificação dos indivíduos testados e suas fotografias, detalhamento dos procedimentos de coleta das amostras biológicas, descrição dos procedimentos de controle de confiden-cialidade e processamento das amostras, descrição das técnicas molecula-res utilizadas na realização do exame, identificação dos locos utilizados no exame e dos alelos encontrados em cada indivíduo testado, número de locos analisados, referência ao banco de dados utilizados na análise, as fotografias digitalizadas das análises genéticas obtidas dos laboratórios que comprovam os resultados apresentados, em casos de exclusão, os alelos paternos espe-rados não encontrados no suposto pai, que indicam que ele não poderia ser um dos genitores biológicos da criança, em casos de inclusão, as três esta-tísticas de paternidade estimadas.

3.5 Relatos genômicos

Como as características fenotípicas, a exemplo da cor de olhos, cabelo, pele, formato craniofacial etc., estão registradas no genoma, muitos cientistas fo-renses acreditam que no futuro será possível substituir o retrato falado por retratos desenhados com base na informação obtida de amostras biológicas deixadas como evidências nas cenas dos crimes.

Alguns ainda arriscam que não está muito distante a época em que programas de computador comporão automaticamente o retrato do indivíduo com base na sua propensão à obesidade e calvície, além das características típicas de aparência. Entretanto, sendo a aparência física de um indivíduo o resultado não só dos seus genes, mas também de fatores ambientais, e, ain-da, que muitas características são afetadas por um grande número de genes, alguns cientistas têm-se mantido céticos sobre os retratos genômicos.

3.6 Cuidados com a análise do DNA

Considerando que a análise de DNA é uma técnica poderosa de identifi-cação, ela deve ser utilizada de forma extremamente criteriosa. O nível de sensibilidade de alguns dos procedimentos de identificação por DNA é tão alto que as células das mãos do laboratorista ou aquelas presentes em um simples espirro podem contaminar a amostra. Dessa forma, o cuidado na coleta, custódia e manipulação da amostra são determinantes para a valida-de das análises. Por fim, o ser humano é passível de erro.

Laboratoristas podem rotular erroneamente um frasco, trocar códigos ou nomes etc. Em razão desses possíveis erros é que muitos laboratórios trabalham com procedimentos de dupla leitura em cada etapa da análise e de

O teste de DNA é a mais precisa e confiável tecnologia disponível para identificação de paternidade. Normalmente, quando se deseja a identificação de um dos pais de um indivíduo, faz-se a análise do DNA do suposto pai, da mãe e do filho. O laudo de um teste de paternidade deve claramente relatar uma destas duas alternativas:

1. O indivíduo testado está excluído e, portanto, não pode ser o pai biológico em questão.

2. O indivíduo testado não está excluído da possibilidade de ser o pai biológico em questão. A estatística no laudo deve estabelecer com que probabilidade o indivíduo pode ser o pai biológico do filho considerado.

Biotecnologia em Debate 85

preservação de parte da amostra para eventuais reanálises. Mesmo assim, enganos continuarão a acontecer, e compete ao profissional bem qualificado questionar e criticar resultados inesperados. A utilização do DNA tanto na área criminal quanto na cível, civil e mercantil, tem auxiliado o direito na sua cons-tante busca de justiça.

4. A biotecnologia e a saúde

A biotecnologia em sua interface com a saúde está relacionada com qualquer exploração tecnológica na busca de soluções para resolver problemas de saúde do homem. Seja no projeto de identificação, na exploração e avaliação da biodiversidade, onde devem ser considerados os métodos científicos e os procedimentos biotecnológicos, particularmente aqueles relacionados com a biologia celular e molecular, bioquímica, fitoquímica, fitofarmacologia, taxo-nomia clássica e bioquímica, micologia, bacteriologia, botânica, fisiologia de plantas e etnobotânica.

Na saúde humana, a biotecnologia tem um amplo espectro de aplica-ções. Ela envolve a área de genômica, com sua extensão para a terapia gê-nica. As tecnologias da indústria farmacêutica não se restringem apenas ao desenvolvimento e à produção de biofármacos e medicamentos com produ-ção de kits e reagentes para diagnóstico, mas englobam também o desenvol-vimento e a produção de vacinas, reagentes para diagnóstico.

Outra área importante da biotecnologia médica é a engenharia de teci-dos e órgãos, associada com a biologia estrutural e a biomimética. Essa área é profundamente ancorada em conhecimentos da biologia dos sistemas su-pramoleculares, da biologia celular e tecidual, da biologia do desenvolvimento e da forma, e dos sistemas integradores dos organismos superiores.

4.1 Genômica

Os avanços impressionantes da genômica nos últimos anos têm provocado efeitos consideráveis na área médica. O sequenciamento do genoma humano nos revelou que existe um numero menor do que esperado de genes identifi-cados. Portanto, a sua interatividade e os fenômenos pós-transcricionais são mais amplos e mais relevantes do que inicialmente se pensava.

Um experimento de sequenciamento por terminação de cadeia simples executado manualmente produz em torno de 400 nucleotídeos de sequência, enquanto uma única corrida em um sequenciador automático gera em torno de 750 pares de bases. Mas o tamanho de um genoma bacteriano típico é de 4.000.000 pb.

Casamento entre indivíduos de diferentes grupos étnicos ou de populações não padronizadasNesses casos, os laboratórios são obrigados a utilizar tabelas genéticas em vez de específicas para as populações em análise. Pai biológico é parente do suposto pai. Tais casos são mais graves quando o grau de parentesco é de primeiro grau ou impossíveis de serem definidos se são irmãos gêmeos idênticos.

Genômica: toda a informação hereditária de um organismo que está codificada em seu DNA, ou, em alguns vírus, no RNA. Isto inclui tanto os genes como as sequências não codificadoras.

Biomimética: área da ciência que tem por objetivo o estudo das estruturas biológicas e das suas funções, procurando aprender com a Natureza, não sobre ela, e utilizar esse conhecimento em diferentes domínios da ciência. Provém da combinação das palavras gregas bios, que significa vida e mimesis que significa imitação. De modo simples, a biomimética é a imitação da vida.

PEREIRA, A. J.86

O exome corresponde a uma pequena parte do genoma, menos de 2%, é de interesse crucial no que diz respeito à pesquisa sobre doenças genéticas, uma vez que responde por 85% das mutações. Este problema foi resolvido com o desenvolvimento de sistemas robotizados para a preparação de DNA para sequenciamento e para a execução dos experimentos de terminação de cadeias, com as sequências sendo lidas por sequenciadores automáticos que transferem os dados diretamente para um computador.

Existem dois tipos de abordagem de sequenciamento de genomas:

• shotgun approach, abordagem aleatória em que o genoma é quebrado aleatoriamente em fragmentos curtos. As sequências resultantes são exa-minadas em busca de sobreposições, utilizadas para a montagem da se-quência contínua do genoma (Figura 4.9);

• contig de clones, abordagem que envolve uma fase de pré-sequencia-mento, durante a qual é identificada uma série de clones parcialmente so-brepostos. Cada segmento do DNA clonado é sequenciado e as sequên-cias são posicionadas adequadamente no mapa de contigs, que servem para ordenar e montar a sequência genômica a partir de observações.

Figura 4.9 – Obtenção de sequências longas por shotgun e sua montagem.Fonte: www.google.com.

A era da genômica individual abrirá caminho para o uso de informações genéticas pessoais na detecção do risco de desenvolvimento de doenças. Dois grupos internacionais de pesquisadores acabam de anunciar o sequen-ciamento do DNA de um africano e de um asiático, por meio de uma técnica mais rápida e mais barata do que as usadas anteriormente.

Os dados somam-se aos genomas de dois indivíduos de ascendência eu-ropeia sequenciados anteriormente, o do geneticista J. Craig Venter (Figura 4.10) e o do biólogo James Watson, ambos em 2007. Com os novos sequenciamen-tos, os cientistas puderam comparar variações genéticas entre diferentes etnias.

A primeira etapa da análise genômica é a construção de uma biblioteca genômica de alta qualidade altamente representativa. É coletada uma grande amostra de forma de vida de interesse e tratada fisicamente para separar o DNA genômico de outros componentes da forma de vida. O DNA é extraído quimicamente, purificado e cortado. Os fragmentos são clonados em um vetor adequado (BAC, YAC). Para garantir que a biblioteca contenha os clones superpostos que englobem todo o genoma, o DNA é parcialmente digerido e os fragmentos clonados constituem uma grande amostra aleatória, tipicamente com uma média de 10 a 30 cópias por sequência.

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Continuação ▸

Um conjunto de DNA sequenciados, clonados e superpostos é chamado de contig, pois a sequência da região coberta pelos segmentos não tem espaços.

Biotecnologia em Debate 87

Figura 4.10 O americano J. Graig Venter, um dos pioneiros da genômica.Fonte: www.google.com.

Enquanto a beleza da simplicidade do código genético nos permite o uso de sistemas automatizados de sequenciamento e uma análise com-putacional da sua estrutura, a compreensão da sua função e, consequen-temente, dos desvios patológicos, envolve sistemas conceituais teóricos e operacionais muito mais complexos.

4.2 Proteômica

O termo proteômica foi introduzido em 1995 para descrever todas as proteínas que são expressas em um genoma. A Proteômica tem como alvo o estudo da estrutura e da função das proteínas, ou seja, o proteoma. É ainda mais com-plexa que a genômica, se há no genoma humano cerca de 25 mil genes, as estimativas sobre o número de proteínas chegam a 20 milhões. Deve-se res-saltar que algumas proteínas, após serem expressas pelos micro-organismos ou células modificadas, sofrem modificações pós-traducionais, combinam-se ou são ativadas ao reagir com outros elementos.

Enquanto o genoma representa a soma de todos os genes de um indiví-duo, o proteoma não é uma característica fixa de um organismo. O proteoma altera com o estado de desenvolvimento, do tecido ou mesmo sob as condi-ções nas quais o indivíduo se encontra. Portanto, há muito mais proteínas no proteoma do que genes no genoma, especialmente para eucariotos.

Através da proteômica pode-se fazer uma comparação do perfil pro-teico de uma célula cancerosa com o de uma célula sadia, ou de uma célula cancerosa cujo portador está sob tratamento médico.

Na área agronômica, há estudos proteômicos de milho, arroz, trigo, cana--de-açúcar, eucalipto entre outros, e de organismos que causam impacto econô-mico, como aquele que fixa nitrogênio atmosférico para as leguminosas, Rhizo-bium spp., ou que causam doenças em feijoeiro e citros como Xanthomonas spp.

Para estudar o proteoma, todo o conteúdo proteico de uma célula ou tecido. Na proteômica quantitativa, uma das técnicas base mais utilizadas para a separação de proteínas é a eletroforese de duas dimensões (2-D). Na eletroforese 2D, as proteínas em solução são separadas com base em duas das suas propriedades:

Até recentemente, os projetos de sequenciamento genético eram caros e limitados pelo rendimento das técnicas usadas. Por exemplo, os dados brutos para sequenciar o genoma humano, completado em 2004, foram gerados durante vários anos, a um custo de aproximadamente US$ 300 milhões. O sequenciamento do genoma individual de Craig Venter foi obtido por cerca de US$ 10 milhões e também levou bastante tempo. Já o de James Watson foi feito em dois meses, por menos de US$ 1 milhão.

PEREIRA, A. J.88

1. primeira dimensão, de acordo com o seu ponto isoeléctrico (pI) e,

2. segunda dimensão, em gel de SDS-PAGE, de acordo com o seu peso molecular (MW).

Figura 4.11 Comparação da separação de proteínas obtida por SDS-PAGE (à esquer-da) e por electroforese bidimensional (à direita).Fonte: www. http://www.e-escola.pt

4.3 Biofármacos

De maneira geral, biofármaco refere-se a proteínas recombinantes obtidas pela tecnologia de DNA ou a anticorpos monoclonais. Ao contrário dos far-moquímicos, obtidos por meio da combinação de substâncias químicas, os biofármacos geralmente envolvem o cultivo de células ou micro-organismos e sua modificação para a produção ou expressão de substâncias em condi-ções controladas.

A produção de proteínas recombinantes em grande escala já abrange os substitutos de hormônios ou mediadores intercelulares humanos e pro-teínas virais potencialmente usadas na vacinação em humanos e animais.

O uso médico de mediadores hormonais, fatores de crescimento e citocinas se desenvolveram em função de avanços consideráveis alcança-dos na compreensão de vias de sinalização intercelular e intracelular. As enzimas envolvidas foram frequentemente identificadas e caracterizadas, abrindo a possibilidade da estimulação ou inibição de suas atividades.

Antes do advento da tecnologia do DNA recombinante (DNAr), o único método conhecido de produção de proteínas era o isolamento a partir de fontes naturais. Produzia-se insulina do pâncreas triturado de porcos, fator VIII a partir de sangue humano e hormônio de crescimento proveniente da glândula pituitária de cadáveres.

Os primeiros produtos recombinantes surgiram para substituir as pro-teínas terapêuticas que já eram obtidas de fontes naturais, como a insulina, o hormônio de crescimento, o fator VIII, que apresentavam risco de seguran-ça e limitações de quantidade.

Estudos combinatórios de sequências associadas estatisticamente com certas doenças nos fornecem ferramentas potencialmente úteis em aplicações médicas imediatas da genômica. A capacidade de identificação de fatores genéticos de risco individual ou populacional para o desenvolvimento de certas patologias traz claramente benefícios na preditibilidade de riscos decorrentes de certos padrões de interação com o meio ambiente e a possibilidade de prevenção das consequências não desejadas.

O proteoma é a coleção completa de proteínas de uma célula. Os estudos proteômicos fornecem informações adicionais que não podem ser obtidas simplesmente pelo exame de um mRNA (RNA mensageiro), consequentemente de um gene, pode originar mais de uma proteína, devido ao processamento pós-tradução.

Várias pesquisas já foram ou estão sendo conduzidas no mundo na área da saúde, como o proteoma do fígado, rim, e para diferentes organismos, tais como Mycobacterium tuberculosis (agente causador da tuberculose), Plasmodium falciparum (agente causador da malária), Helycobacter pylori (agente causador da úlcera e gastrite).

Biotecnologia em Debate 89

4.4 Anticorpos monoclonais

Os anticorpos são muito úteis na biotecnologia, pois com eles é possível rea-lizar diagnósticos.

No início do século XX, Paul Ehrlich, propôs que, se fosse possível en-contrar um elemento que mirasse seletivamente em um agente causador de alguma doença, então, esse elemento poderia carregar uma toxina para esse agente. Desde sua descrição por Kohler e Milstein em 1975 (Figura 4.12), a metodologia tem sido grandemente usada e o anticorpo é alvo de vários estu-dos para diversos usos, inclusivo em terapia.

Figura 4.12 – Niels K. Jerne, Georges J.F. Köhler e César Milstein, ganhadores do Prêmio Nobel em Fisiologia ou Medicina de 1984, pelas teorias relacionadas com a especificidade no desenvolvimento e controle do sistema imune e pela descoberta dos anticorpos monoclonais.Fonte: http://www.nobelprize.org/nobel_prizes/medicine/laureates/1984.

Para a produção dos anticorpos monoclonais (Figura 4.13), primeira-mente é necessário realizar a imunização de camundongos com antígeno. Após sucessivos estímulos, cada linfócito B secretará um anticorpo especí-fico no soro, formando o conjunto de anticorpos circulantes. Logo após são extraídas as células do baço contendo os linfócitos B dos camundongos. Em seguida é feita a fusão do linfócito com uma linhagem de mieloma, resultando em um hibridoma.

Na etapa seguinte os hibridomas são colocados em meio contendo HAT. Após crescimento, os hibridomas são selecionados quando apresenta-rem afinidade do anticorpo com o antígeno, estabilidade, facilidade de cres-cimento em cultura, formação de tumor etc. Por fim, os anticorpos com as características desejáveis são coletados.

A eletroforese 2-D resulta da combinação de duas técnicas: a focagem isoelétrica (IEF- Iso Electric Focusing), seguida de uma separação por SDS-PAGE. Quando bem sucedida, obtém-se um gel de poliacrilamida contendo numerosos spots, bem separados, cada um correspondendo a uma proteína ou a uma forma proteica (Figura 4.11).

A expressão de proteínas humanas em vegetais e animais superiores é muito promissora, devendo levar à produção de complexos moleculares fisiologicamente ativos, com um rendimento produtivo muito mais importante, a baixo custo.

A produção de proteínas recombinantes envolve uma série de passos, iniciando-se com a identificação e caracterização genética da proteína e das suas propriedades bioquímicas, e a definição dos requisitos estruturais para a sua atividade funcional. A produção propriamente dita envolve a escolha do vetor de expressão, a escolha de células em função da complexidade de processamento molecular necessário para a obtenção da proteína funcional, o aperfeiçoamento do bioprocesso de produção, e a separação, purificação e preparo para o uso médico da proteína.

PEREIRA, A. J.90

Figura 4.13 – Procedimento geral de produção de anticorpos monoclonais.Fonte: www.google.com.

As primeiras versões de anticorpos monoclonais utilizados como biofár-macos eram provenientes de células de roedores (murinos). Porém, quando eram inoculados em humanos, seu sistema imunológico os identificava como antígenos e os atacava.

Para reduzir o problema, os cientistas criaram anticorpos quiméricos, que combinam as partes dos anticorpos de roedores que se ligam aos antígenos com partes de anticorpos humanos verdadeiros. Na tentativa de minimizar a resposta imunológica do corpo humano, avançou-se para a fabricação de anticorpos hu-manizados, utilizando uma parte ainda menor dos anticorpos de murinos.

Figura 4.14 – Teste de gravidez comercial baseado em anticorpos monoclonaisFonte. www.google.com

4.5 Kits de diagnóstico

A biotecnologia reduziu os custos de diagnósticos ao proporcionar a realiza-ção de testes diversos com uma única amostra de sangue. Permitiu o desen-volvimento dos chamados testes rápidos, de utilização simples e leitura fácil, substituindo com vantagens alguns testes convencionais.

As proteínas têm grande importância terapêutica, mas, por se tratar de moléculas muito grandes e complexas, até mil vezes maiores que fármacos sintéticos, não existe tecnologia para obtê-las por síntese química.

Bioprocesso: processamento de biomateriais a partir de agentes como enzimas, bactérias e leveduras. O desenvolvimento de tais processos exige conhecimentos não só de Biologia, mas também de Engenharia Química a fim aproximá-los do meio industrial.

Citocinas: moléculas proteicas, glicosiladas ou não, que enviam diversos sinais estimulatórios, modulatórios ou mesmo inibitórios para as diferentes células do sistema imunológico. Têm função na própria célula produtora, em células próximas e à distância. Atuam em concentrações baixíssimas e sua síntese habitualmente ocorre após estimulação de antígenos.

Alguns dos principais produtos comerciais à base de proteínas obtidas por DNA recombinante são para o tratamento de anemia (eritropoetina, EPO); hemofilia (fatores de coagulação VIII e IX); neutropenia (G-CSF e GM-CSF); hepatite (interferon) e infarto agudo do miocárdio (t-PA).

Biotecnologia em Debate 91

Podemos detectar atualmente muitas doenças e condições de saúde mais rápido e com maior precisão devido à sensibilidade das ferramentas de diagnóstico e técnicas da biotecnologia.

Outro segmento importante que se desenvolveu com o avanço da bio-tecnologia foi o de ensaios moleculares, com alto conteúdo tecnológico e, geralmente, de maior sensibilidade e precisão.

As sondas usadas em PCR quantitativo ou PCR em tempo real, pro-jetadas para hibridar com uma região interna de um produto da PCR, são sequências de nucleotídeos que possuem um corante repórter fluorescente (fluoróforo) anexado à extremidade 5 'e um quencher acoplado à extremidade 3'. No outro lado localiza-se a sequência do probe, e entre as duas regiões existem sequências de nucleotídeos pareadas formando um hairpin ou gram-po (Figura 4.15). A proximidade do fluoróforo com as moléculas do quencher impede a detecção de sinal fluorescente a partir da sonda.

Figura 4.15 – Estrutura de uma sonda com uma sequência de probe.Fonte: www.google.com.

Foi reduzida a necessidade de procedimentos custosos e invasivos, envolvendo cirurgias, com a utilização de testes mais confortáveis para o usu-ário. Assim, hoje é possível utilizar testes de base biotecnológica para diag-nosticar alguns tipos de câncer pela amostra sanguínea. Vários testes novos são portáteis e permitem que o médico os realize no local da consulta e decida imediatamente qual o tipo de tratamento necessário, sem que seja preciso enviar a um laboratório. Como são testes de fácil realização, baseados em cores, por exemplo, como os testes de farmácia para gravidez, não exigem pessoal qualificado, equipamentos de laboratório ou infraestrutura cara, am-pliando sua aplicabilidade.

O DNA recombinante possibilitou além do tratamento ou terapêutica, o entendimento das causas de doenças. Na sua utilização na síntese de enzimas e receptores causadores ou envolvidos em processos de doenças, facilitando o estudo de possíveis alvos para o desenvolvimento de medicamentos.

Os anticorpos naturais são produzidos por células do sistema imunológico, chamadas linfócitos, principalmente o linfócito B, para defesa do organismo contra partículas ou moléculas identificadas como corpos estranhos (antígenos). Os anticorpos monoclonais são produzidos por células artificiais chamadas de hibridomas. Uma vez desenvolvidos, esses hibridomas podem produzir, em escala industrial, anticorpos sempre idênticos em especificidade, estrutura e afinidade.

Hibridomas: células construídas pela fusão de um linfócito clonado com uma célula tumoral. Herda das células tumorais a capacidade de se replicar indefinidamente, sendo, por isso, conhecidos como células imortais.

PEREIRA, A. J.92

Projeto genoma humano (PGH)

O Projeto Genoma Humano (PGH) possibilitou a identificação e sequencia-mento de genes. Estes avanços possibilitarão o diagnóstico médico das do-enças hereditárias. Pesquisas em proteômica encontraram marcadores que indicam doenças em fase muito inicial, antes que sejam visíveis alterações celulares ou sintomas. No futuro, espera-se que, cada vez mais, que haverá testes capazes de detectar esses biomarcadores antes do início do processo das doenças.

O desenvolvimento de um reagente para diagnóstico é significativamen-te mais barato e mais rápido do que o de uma vacina ou de um medicamento. Não são exigidos testes pré-clínicos e clínicos, o que reduz significativamente o custo do desenvolvimento e abrevia muito o tempo entre as fases de desco-berta e de início do processo de produção.

4.6 Vacinas

As vacinas visam à produção de imunidade a doenças pelo estímulo à pro-dução de anticorpos específicos. Se nos expormos de forma deliberada a um antígeno, em condições nas quais a doença não pode evoluir, podemos obter, como consequência, imunidade à doença.

Apesar de serem para a saúde pública, as formas historicamente mais eficazes de se evitar doenças, o desenvolvimento e a produção de vacinas per-deram importância na estratégia da indústria farmacêutica ao longo do tempo.

A hepatite é uma doença epidêmica que age de maneira silenciosa. Muitas pessoas infectadas não desenvolvem os sintomas, mas acabam trans-mitindo o vírus para outras pessoas pelo contato com o sangue infectado.

Estima-se que até o final deste século haverá mais pessoas infectadas com hepatite C do que com Aids.

As vacinas precisam alcançar um nível de segurança extremamente elevado, pois ao contrário de medicamentos terapêuticos, utilizados para tra-tar grupos restritos de doentes, elas são ministradas a um amplo número de indivíduos ainda saudáveis. Além do requisito de segurança, as vacinas de-vem ser eficazes, estáveis e de baixo custo, para que possam atingir o objeti-vo, na maioria dos casos, de utilização universal.

Nas vacinas recombinantes, os genes produtores dos antígenos de in-teresse são inseridos em uma molécula transportadora, denominada vetor, por exemplo, um vírus de baixa virulência. O próprio vetor pode ser usado como vacina ou o antígeno pode ser expresso e purificado em laboratório e, posteriormente ser injetado.

Mieloma: câncer que se desenvolve na medula óssea, devido ao crescimento descontrolado de células plasmáticas que fazem sistema imunológico do corpo.

Quiméricos: plasmídios manipulados pela engenharia genética que passam a ser constituídos pelo seu DNA e pelo DNA estranho que lhe foram introduzidos.

Os testes de gravidez (Figura 4.14) comprados em farmácias utilizam anticorpos monoclonais que se liga a um hormônio produzido pela placenta. Estes anticorpos também são utilizados em diagnósticos de inflamação de garganta causada por estreptococos e a gonorreia.

Continua...

Biotecnologia em Debate 93

A vantagem da tecnologia da vacina recombinante, em relação aos mé-todos tradicionais, é que o vetor pode ser selecionado de acordo com carac-terísticas de segurança e produtividade, reduzindo o custo de produção. Mas, uma desvantagem é que o custo de desenvolvimento é mais elevado, por causa da necessidade de localizar, clonar e expressar no vetor os genes para os antígenos de interesse.

Figura 4.16 – Como o vírus da hepatite B infecta o organismo humano Fonte: www.google.com

Figura 4.17 – Vírus HIV em vermelho, infectando um linfócito T em azul, tamanho maiorfonte: www.google.com

As vacinas recombinantes são também desenvolvidas a partir de par-tículas proteicas virais, só que não mais retiradas do plasma de pacientes, mas produzidas por leveduras engenheiradas, nas quais são introduzidas as sequências de DNA correspondentes às sequências gênicas do vírus, a par-tir das suas proteínas de superfície. Entre os diferentes micro-organismos, a levedura, originada da massa do pão, é o mais adequado para a obtenção do antígeno de superfície da hepatite B, na produção da vacina recombinante.

As vacinas de DNA apresentam vantagens econômicas, técnicas e logísticas. Apresenta custo reduzido de produção em larga escala, controle de qualidade mais simples e não precisam ser mantidas em ambiente refri-gerado. Mas, há desvantagens associadas principalmente à possibilidade de efeitos negativos de uma integração do DNA injetado ao genoma hospedeiro.

▸ Continuação

Outras das principais aplicações de anticorpos monoclonais são para atingir seletivamente células cancerosas e diagnosticar doenças infecciosas. Há ainda potencial para seu uso em tratamento de rejeição de órgãos transplantados e doenças autoimunes.

O Brasil já produz o kit NAT HIV/HCV, teste molecular para detecção dos vírus da Aids e da hepatite C. O kit está sendo usado na triagem de bolsas de sangue na hemorrede nacional. O NAT tem a vantagem de reduzir a janela imunológica que hoje é de 21 dias para oito dias. No caso do vírus da hepatite C, o tempo será reduzido de 72 para 14 dias. Estas reduções são possíveis porque o NAT detecta o material genético dos vírus, enquanto o teste tradicional depende do surgimento de anticorpos.A produção de insumos para diagnóstico molecular da gripe influenza A (H1N1) também está sendo desenvolvida com uma tecnologia nacional para a produção dos insumos, como os primers e probes, necessária para a realização de PCR em tempo real, utilizada para detectar o material genético do vírus influenza A (H1N1) nas amostras dos pacientes.

PEREIRA, A. J.94

Essas tecnologias também podem ser usadas para o desenvolvimento das chamadas vacinas terapêuticas, cujo alvo é controlar doenças já exis-tentes. A lógica dessas vacinas é acionar o sistema imunológico para que ele mesmo seja capaz de combater e eliminar o patógeno causador da doença.

4.7 Tecnologia de tecidos e órgãos

A união entre a biologia celular, biologia estrutural, biomimética celular e ciência de materiais, nos permite produzir tecidos semissintéticos no laboratório. Estes tecidos são formados de uma estrutura de material biodegradável e células vivas. Essa área de bioengenharia médica visa à substituição terapêutica de estruturas multicelulares, teciduais ou equivalentes a órgãos. Ela pode ser também chama-da de “Medicina Regenerativa”, pois visa o reparo de tecidos lesados ou dege-nerados por substitutos funcionalmente e estruturalmente equivalentes.

A medicina regenerativa procura controlar e ampliar a capacidade natu-ral de regeneração de tecidos. A regeneração mantém naturalmente a home-ostasia tecidual, substituindo continuamente as células gastas. Os tecidos al-tamente expostos ao estresse externo são intensamente regenerados, como o epitélio intestinal ou cutâneo, assim como os tecidos caracterizados pela alta taxa de renovação contínua, como as células sanguíneas. Por outro lado, ela pode eventualmente reparar, quando necessário, os tecidos lesados por trauma, doença ou senescência.

Figura 4.18 – Pele humana artificial produzida em laboratório Fonte: http://lqes.iqm.unicamp.br

A importância crescente da Medicina Regenerativa é devida às modifi-cações demográficas e sociais. O aumento progressivo da idade média das populações humanas, e em particular das populações urbanas, gera a ne-cessidade de garantir cada vez mais a qualidade da vida, compatível com um custo e uma carga social aceitável. Calcula-se que o número de habitantes de terceira idade (65-85 anos) triplicará nos próximos 50 anos, e o número de habitantes em velhice crescente, maiores de 85 anos, será multiplicado

Probes: fragmentos de DNA ou RNA de extensões variáveis, geralmente 100-1000 bases de comprimento, usados em amostras de DNA ou RNA para detectar a presença de sequências de nucleotídeos, o DNA alvo que é complementar às sequências no probe.

NAT: do inglês Nucleic Acid Technology, Tecnologia do Ácido Nucleico.

Janela imunológica: período em que já ocorreu a infecção, mas o vírus ainda não é detectado no exame de sangue.

Biotecnologia em Debate 95

por seis. O segundo desses dois grupos consome vinte vezes mais custos da assistência médica e duas vezes mais internação hospitalar do que o primeiro.

As doenças degenerativas são a causa essencial e crescente dessa carga social, causando a deterioração da qualidade de vida e aumento dos custos da assistência médica. Por outro lado, as populações jovens, vivendo em aglomerações de alta densidade, estão mais expostas a lesões traumá-ticas. Embora numericamente menos significativas, essas lesões tem um al-tíssimo custo social, gerando frequentemente pessoas jovens debilitadas ou permanentemente incapacitadas para uma vida normal e produtiva.

A Medicina Regenerativa é individual, dirigida especificamente a cada um dos casos atendidos, no seu contexto particular. Trata-se de uma medicina indivi-dualizada, cuja ação pode envolver duas etapas, independentes ou associadas:

• bioengenharia ou engenharia tecidual: a manipulação ex vivo de células do próprio paciente, sua expansão, diferenciação e integração potencial em estruturas superiores, que serão re-introduzidas nas regiões lesadas e integradas no processo de regeneração;

• biomimética: a introdução, nas regiões lesadas, de estruturas supramole-culares, semelhantes aos elementos de matriz extracelular e mediadores intercelulares associados, facilitando a mobilização, expansão e integração de populações de células regenerativas internas, fomentando o reparo de lesões ou de regeneração e renovação de tecidos degenerados.

4.8 Medicina personalizada

Atualmente, a medicina personalizada corresponde a intervenções de base genética, mais do que em tratamentos individualizados. Um de seus pilares fundamentais é a ideia de que, se for possível identificar perfis ou tipos de pacientes, medicamentos mais adequados em eficiência e segurança podem ser desenvolvidos para esses grupos.

Na predição de doenças há necessidade do conhecimento da genéti-ca individual, a identificação precisa das existentes e a compreensão de seu estágio evolutivo.

As células-tronco de origem embrionária ou de organismo adulto, introdu-ziu novas perspectivas no tratamento celular de patologia teciduais. A possibi-lidade de cultivo de células progenitoras embrionárias (embryonic stem cells – ESC) humanas a partir de blastocistos obtidos por fecundação in vitro, permitiu propor transplantes de células embrionárias totipotentes em tecidos degenera-dos, conseguindo uma regeneração in situ de populações celulares funcionais.

Em 1998, o Food and Drug Administration (FDA) dos Estados Unidos, aprovou a primeira droga considerada farmacogenômica, o Herceptin (trastuzumab), um anticorpo monoclonal para tratamento de um tipo específico de câncer de mama, combinada com testes diagnósticos para identificação do gene causador da doença.

Apesar da rapidez com que se desenvolveu esse ramo da biotecnologia e das grandes expectativas geradas, ainda há muito que avançar. Um complicador é que poucas doenças podem ser atribuídas a um único gene defeituoso: geralmente, há vários genes envolvidos e às vezes a doença pode ser atribuída à forma como o gene ou os genes relacionam-se com o meio ambiente.

PEREIRA, A. J.96

Órgãos e tecidos de animais transgênicos

Apesar das campanhas preventivas que enfatizam a importância do controle da pressão arterial e do colesterol, de uma dieta balanceada, eliminação de hábitos sedentários e uso de cigarros, as doenças cardiovasculares continu-am matando quatro vezes mais pessoas que a AIDS e três vezes mais que o câncer de mama. A mais eficiente terapia para muitas das doenças cardíacas é o transplante.

Por meio do xenotransplante, transplante de tecido ou órgão entre di-ferentes espécies, pode se resolver o problema da falta de doadores de órgãos. O xenotransplante poderá eventualmente ser utilizado não só para pacientes cardíacos, mas também para o tratamento de doenças renais, diabetes, Parkinson, Alzheimer, incluindo até pacientes com queimadura de terceiro grau.

Recentemente, os cientistas conseguiram criar suínos geneticamente alterados para um dos genes envolvidos na rejeição de órgãos transplanta-dos. Os animais transgênicos assim obtidos possuem apenas um dos vários genes que deverão ser silenciados antes que esses animais possam ser utili-zados em larga escala como doadores de órgãos.

Figura 4.19 – Bacilo de Koch, causador da tuberculose em imagem colorizada obtida por microscopia eletrônicaFonte: http://microbiologyspring2010.wikispaces.com/Mycobacteria

Embora esse seja um procedimento ainda experimental, o xenotrans-plante é extremamente promissor diante do dilema da grande demanda e pe-quena oferta de órgãos, resultando em longas listas de espera de pacientes, além dos problemas de rejeição, mesmo quando o doador é o próprio homem.

Figura 4.20 – Porcos transgêni-cos produzidos para realização de transplantes de órgãosFonte: www.google.com

Pesquisadores franceses desenvolveram uma nova vacina que usa as chamadas ‘partículas semelhantes ao vírus’ (VLPs, na sigla em inglês) para induzir a produção de anticorpos neutralizantes do vírus da hepatite C (VHC) pelo sistema imune.As partículas VLPs são uma espécie de ‘vírus oco’, possuem as mesmas estruturas de um vírus, mas sem o material genético que o faz se replicar e causar a infecção. Ao serem injetadas na corrente sanguínea, as VLPs acionam a produção de anticorpos neutralizantes contra o vírus sem o risco de deixar a pessoa doente.

As primeiras gerações de vacinas são oriundas de vírus ou bactérias inativados (mortos) ou atenuados. Já as vacinas de segunda geração utilizam a tecnologia do DNA recombinante. Estas vacinas recombinantes geralmente são voltadas para a prevenção do mesmo tipo de enfermidades das vacinas convencionais. No entanto, representam um grande salto qualitativo, pois são mais seguras, menos passíveis de contaminação no processo produtivo e podem ser também mais eficazes.

Um exemplo de sucesso que já está disponível para uso em humanos é a vacina recombinante contra o vírus da hepatite B transmitido pelo sexo, seringas descartáveis entre outros (Figura 4.16).

Biotecnologia em Debate 97

O gene alfa 1,3 galactosil transferase codifica uma enzima importante no metabolismo de açúcares nas células dos suínos. Quando células ou órgãos de um indivíduo são transplantados para outro, o organismo receptor reconhece o tecido transplantado como corpo estranho (antígeno) e inicia a produção de anticorpos, que atacam o tecido transplantado, causando a rejeição.

Essa situação poderá ser resolvida com os animais transgênicos. Os suínos têm recebido a maior parte da atenção nas pesquisas de transplante de órgãos, porque eles são biologicamente semelhantes ao homem em vá-rios aspectos fisiológicos e não são normalmente portadores de doenças que ocorrem no ser humano.

Figura 4.21 – Macacos quiméricos produzidos a partir da mistura do có-digo genético de seis outros animaisFonte: www.google.com

4.9 Camundongos Knockouts

Os avanços na genética molecular estimulam o uso do camundongo pela possibilidade de inativar genes específicos, tornando-o importante ferramenta para a compreensão da fisiologia.

Seu emprego abriu inúmeras oportunidades de estudo das funções fisiológicas e patológicas de diversas proteínas (regulatórias ou funcionais), de modo que a possibilidade de utilização de inúmeras cepas geneticamen-te modificadas contribui com valiosas informações para diversas patologias. Dentre os camundongos modificados geneticamente encontramos os trans-gênicos e os knockout desenvolvidos pelos geneticistas moleculares Cape-chi e Evans (Figura 4.22).

Figura 4.22 – Os geneticistas Ma-rio R. Capecchi (EUA) e Martin J. Evans (Reino Unido) realizaram trabalhos que possibilitaram a cria-ção de camundongos knockouts. Fonte: www.fapesp.com.br.

Desde 1981, quando foi desenvolvida a primeira vacina contra a hepatite B, até 1987, quando foram licenciadas e comercializadas as primeiras vacinas recombinantes, a produção de vacina contra a doença era feita por meio de partículas virais isoladas e purificadas do plasma de pacientes com infecção crônica pelo vírus. Essas partículas são formadas por proteínas de superfície do vírus da hepatite B (VHB), que formam o envelope viral, e que é o antígeno. Apesar da excelente capacidade de proteção, a produção dessa vacina tem alguns fatores limitantes como o alto custo, a dependência de doadores e a eventual presença de agentes contaminantes, como o vírus HIV (Figura 4.17).

Uma nova geração de vacinas vem despertando muito interesse, as chamadas vacinas gênicas ou vacinas de DNA. Assim como nas vacinas recombinantes, os genes para o antígeno de interesse são localizados e clonados. No entanto, nesse caso, o DNA é injetado diretamente no músculo da pessoa ou animal a ser vacinado, com uma espécie de pistola de ar comprimido que espalha o DNA nas células musculares. Ao absorver o DNA com o código do antígeno de interesse, as células musculares passam a expressá-lo, desencadeando, assim, a desejada resposta imunológica.

PEREIRA, A. J.98

A técnica geral para a obtenção de camundongos knockouts acontece quando o gene mutante é inserido em células-tronco embrionárias, as quais são injetadas em um blastocisto que, por sua vez é induzido em uma fêmea. O filhote origina animais heterozigotos que, por sua vez podem originar animais knockouts homozigotos (Figura 4.23).

Figura 4.23 – Etapas da produção de camundongos knockout. Fonte: www.google.com

Os animais em que um particular gene, ou sua função, foi eliminado são cha-mados de knockout, como por exemplo, os camundongos desenvolvidos em 1993, que apresentam ausência do gene para a óxido nítrico sintetase neuronal (nNOS).

4.10 Debatendo: considerando os custos da tecnologia

Muito do sentimento negativo que cerca a tecnologia vem da ideia que a tecnologia está destruindo o ambiente. A tecnologia tem um efeito profundo em nossa relação com o mundo natural. Afinal de contas, esta é a sua in-tenção. Frequentemente utilizamos as tecnologias para nos isolarmos das realidades adversas da natureza e algumas dessas tecnologias têm efeitos prejudiciais ao meio ambiente. Por exemplo, os combustíveis fósseis que geram energia para o aquecimento e resfriamento de nossas casas poluem o ar e produzem chuva ácida.

Mas a tecnologia precisa ser incompatível com a natureza? Não neces-sariamente. Se encararmos a tecnologia como uma alternativa para a solução dos problemas da vida na terra, então a tecnologia existe na natureza. Ou-tras espécies criaram tecnologias que são harmoniosas com a natureza. Um exemplo óbvio é a conversão de radiação solar em energia química (glicose) feita pelas plantas. Esta é uma solução de um problema que todos os organis-mos vivos têm que enfrentar: obter energia.

No caso das vacinas contra o câncer, por exemplo, a ideia é que elas estimulem o sistema imunológico a detectar e atacar as células tumorais sem afetar as demais. As vacinas em desenvolvimento contra o HIV seguem o mesmo princípio, ou seja, visam restaurar ou preservar a resposta imune anti-HIV.

Homeostasia ou homeostase: propriedade dos seres vivos, de regular o seu ambiente interno para manter uma condição estável, mediante múltiplos ajustes de equilíbrio dinâmico controlado por mecanismos de regulação interrelacionados.

Senescência: processo natural de envelhecimento ao nível celular ou o conjunto de fenômenos associados a este processo. Ocorre por meio de uma programação genética que envolve deterioração dos telômeros e ativação de genes supressores tumorais. As células que entram em senescência perdem a capacidade proliferativa após um determinado número de divisões celulares

Biotecnologia em Debate 99

Os biólogos chamam as realizações tecnológicas de outros organismos de “adaptação”. As formas de adaptação que evoluíram, foram moldadas pela seleção natural. A seleção natural não se importa com políticas e economias; assim, estes fatores não dirigiram nem moldaram as soluções tecnológicas encontradas pela evolução. Assim, talvez não seja a tecnologia em si, mas sim as soluções tecnológicas que escolhemos que apresentam efeitos ambientais prejudiciais. Sabendo dos prováveis custos da tecnologia, talvez busquemos aplicação material, financeira e energeticamente mais adequadas e eficientes da biotecnologia, que levem também uma minimização dos riscos ambientais.

Mas mesmo que desenvolvamos tecnologias ambientalmente mais corretas, isso não mudará a relação entre o avanço tecnológico e a saúde ambiental. Não importa que soluções criativas, observemos em outros orga-nismos, somente uma espécie foi capaz de usar a tecnologia para aumentar o tamanho de sua população além dos limites ecologicamente sustentáveis e esta espécie somos nós. Até mesmo se nós, como outros organismos, de-senvolvermos tecnologias harmoniosas com a natureza, se nossa população continuar aumentando nas proporções atuais, somente aumentaremos a ten-são que estamos colocando sobre o planeta e sobre nós mesmos.

Isto é, na verdade, uma das formas de contribuição dos avanços da biotecnologia para o agravamento de nossos problemas atuais. A biotecno-logia nos dará o que queremos: vidas longas e saudáveis. Isto nos é atraente como indivíduos, mas o resultado será que mais pessoas viverão em um pla-neta superpovoado, usando seus recursos e gerando mais resíduos. Como espécie, deveríamos nos lembrar do provérbio ensinado no mito de Midas e o toque de ouro: tenha cuidado, pois o que você deseja – você pode conseguir.

A tecnologia altera nossa relação com a natureza de modo mais sutil do que a possibilidade de aumento da população. Ela nos separou tanto da natu-reza que esquecemos que fazemos parte do mundo natural. Não somos mais tão conscientes das reais ligações biológicas que temos com outras espécies e entre nós mesmos.

Estamos no meio de uma crise ambiental e temos que começar a mu-dar nosso modo de agir se quisermos, nós e inúmeras outras espécies, so-breviver. A perda deste senso de conexão com o mundo natural torna mais difícil as questões que estão por vir. Quanto menos nos sentimos como parte da natureza, mais pensamos que podemos romper as regras. Quanto menos soubermos sobre a natureza, mais difícil será respeitá-la. Sem respeito pela natureza e por nós mesmos, seremos capazes de fazer as escolhas necessá-rias para ponderar nossos desejos com o desejo de outras espécies?

Nossa herança evolutiva nos proporcionou uma mente racional. Como seres pensantes, questionamos, exploramos, e utilizamos nossas descobertas para controlar nosso meio ambiente e mudar coisas de acordo com nossa pre-

Tecidos altamente expostos ao estresse externo são intensamente regenerados, como o epitélio intestinal ou cutâneo, bem como tecidos caracterizados por alta taxa de renovação, como as células sanguíneas. Além disso, tecidos lesados por trauma, doença ou senescência podem ser eventualmente regenerados, quando necessário.

Em populações urbanas do Brasil, as lesões traumáticas são a primeira causa tanto da internação hospitalar quanto da morte na segunda e terceira décadas da vida dos jovens. Ambas as situações exigem terapias que possam preservar; melhorar e/ou restaurar as funções teciduais.

Um trabalho realizado pela Universidade de Granada na Espanha permitiu, pela primeira vez, elaborar pele humana artificial com uma derme composta de biomateriais de fibrina e agarose (Figura 4.18). A utilização desses biomateriais permitiu dar resistência, firmeza e estabilidade à pele. Além disso, ocorreu uma funcionalidade muito próxima da pele humana verdadeira.

PEREIRA, A. J.100

ferência. Na maioria das vezes, dirigimos estas habilidades ao exterior. É exata-mente sobre isso que ciência e tecnologia tratam. Voltar ao nosso interior para questionar, explorar, controlar e mudar não é muito fácil. Precisamos agora am-pliar o raciocínio lógico que a evolução nos permitiu e aprender a questionar os nossos valores e o nosso posicionamento perante o mundo, explorando a nós mesmos e as nossas razões, aceitando a responsabilidade por nossas ações.

Podemos fazer melhor do que tentar dissipar os problemas que criamos, tentando limpar nossa bagunça enquanto seguimos adiante. Sabemos que os problemas de amanhã podem ser previstos, em parte, a partir do nosso passado e nosso presente. Em vez de simplesmente reagir, podemos nos antecipar e pla-nejar. Mais do que outra qualquer tecnologia, a biotecnologia coloca este desafio a nossa frente. Não alcançaremos esta meta confiando somente no talento de nossa ciência. Esta tecnologia levanta perguntas filosóficas mais profundas do que a ciência sozinha pode responder. Para isso precisamos de sabedoria.

Como poderemos agir sabiamente na direção da biotecnologia? Nem a aceitação cega, nem a total rejeição são compatíveis com uma ação sábia. Ao tentarmos bloquear completamente o desenvolvimento da biotecnologia, estaremos em última instância, nos privando de possíveis escolhas. Onde está a sabedoria, se limitarmos nossas opções? Por outro lado, ignorando as implicações desta tecnologia e permitindo passivamente que ela se de-senvolva sozinha, seria quase o mesmo que afirmar que faremos com esta tecnologia o que fizemos com as outras. Ao invés disso, é do nosso maior interesse acompanhar o desenvolvimento da biotecnologia, fazendo escolhas conscientes baseadas na avaliação crítica das questões. Como fazer isto? fonte: KREUZER; MASSEY, 2002.

Síntese do CapítuloEste capítulo descreveu de forma breve um histórico dos principais eventos que ocorreram na identificação humana, desde a impressão digital até a técnica moderna conhecida como fingerprinting genômico. Discorreu também sobre as técnicas mais comumente usadas na identificação de paternidade e de suspei-tos de crimes, com o uso da tecnologia do DNA forense, de por fim, relatou os cuidados que devem ser tomados nas análises dos resultados usados nos tes-tes de identificação para evitar possíveis erros e enganos. Deu enfoque sobre a relação da biotecnologia com a saúde humana, relatando o seu espectro de aplicações no desenvolvimento dessas tecnologias desde a área de genômica, da indústria farmacêutica na produção de biofármacos e medicamentos com produção de kits e reagentes para diagnóstico. Vários temas foram destacados neste capítulo como a engenharia de tecidos e órgãos e os xenotransplantes.

Com o entendimento da biologia humana no nível molecular, podem-se identificar respostas diferentes de pacientes a uma mesma droga e predisposições individuais ou de determinados grupos a doenças específicas.

Já foram identificados inúmeros genes associados a doenças genéticas, mas o mecanismo molecular não foi ainda identificado em grande parte delas. A informação da genômica deverá proporcionar diagnósticos precoces de doenças hereditárias, como diabetes tipo I, fibrose cística, Alzheimer e Parkinson, que só eram detectáveis depois do aparecimento dos sintomas. Também, torna-se possível, com testes genéticos, identificar predisposição a alguns tipos de câncer, osteoporose, enfisema, diabetes tipo II e asma, possibilitando a prevenção dessas doenças.

Um exemplo comum de xenotransplante, em uso hoje em dia, é o das válvulas cardíacas de suínos no homem. Com o envelhecimento da população, o número de pacientes que necessitam de transplantes tem aumentado significativamente, enquanto a quantidade de doadores tem crescido apenas moderadamente.

Biotecnologia em Debate 101

Atividades de avaliação

1. Realize a atividade prática proposta no sítio: http://educar.sc.usp.br/licen-ciatura/2003/siteprojeto/2003/7_teste_paternidade_criminalistica.pdf.

2. Leia o artigo e resolva a atividade proposta no sítio: http://www.geneticana-escola.com.br/ano5vol1/MS01_001.pdf

3. O teste de paternidade usando o DNA tornou-se muito frequente hoje. No entanto, as pessoas têm muitas dú¬vidas a respeito desse tipo de exame.

As frases abaixo constam numa lista de “mitos e verdades sobre o teste de DNA” encontrada na internet (http://www.gene.com.br).

I. “O exame de DNA só pode ser feito com sangue.”

II. “Sou primo da mãe e estou com medo do resultado ser positivo, mesmo que eu não seja o verdadeiro pai.”

III. “Ele já morreu e não deixou nenhum outro parente vivo. Nunca poderei provar que ele era o pai do meu filho.”

Justifique por que cada uma das frases acima constitui um “mito”.

4. Em um acidente de avião, os corpos das vítimas fatais ficaram queimados e irreconhecíveis. Mas, os peritos conseguiram preparar, a partir de fragmen-tos de tecidos achados no local, amostras de DNA nuclear e mitocondrial de todos os mortos. Neste acidente, faleceram dois filhos de uma senhora, cada um de um casamento diferente. Qual é uma das formas usadas pelos peritos para identificar os restos mortais dos filhos dessa senhora?

5. Faça uma pesquisa sobre o método de sequenciamento desenvolvido por Maxam e Gilbert usado na década de 70 para os testes de DNA.

Texto complementarSomos todos irmãosCom o compartilhamento de parcelas consideráveis do material genético, há muito menos diferenças entre os humanos e outros seres vivos do que se imaginava anos atrás. O conceito de fraternidade universal tornou-se, portanto, uma fria realidade científica, condicionando novos imperativos éticos na conservação da biodiversidade. É difícil dizer se este conhecimento irá interromper a desenfreada destruição do meio ambiente biótico que vem ocorrendo no planeta, especialmente após a Revolução Industrial. Mas devemos salientar este ponto, na busca de uma atitude mais racio-nal com relação a essa ampla comunidade de parentesco. O contingente dos povos nativos brasileiros é reduzido, se comparado àqueles derivados de outras etnias. Isso não é por acaso. Ao longo de toda a história do Brasil, houve uma diferença marcante

O bacilo de Koch (Mycobacterium tuberculosis) (Figura 4.19), causador da tuberculose possui uma proteína conhecida como Hsp70 que age diretamente no sistema de defesa dos organismos que ela infecta. A Hsp70 pode servir como alternativa a medicamentos imunossupressores, utilizados para evitar que tecidos e órgãos transplantados sejam rejeitados pelo organismo do paciente.

Os primeiros cinco porcos transgênicos (Figura 4.20) desenvolvidos para xenotransplante pela empresa americana PPL Therapeutics nascidos em 2001 tiveram o gene alfa 1,3 galactosil transferase silenciado.

Existem riscos indiretos do xenotransplante, técnica que pode transmitir vírus e outros micro-organismos infecciosos dos animais para o homem. Os suínos são portadores de retrovírus (Porcine Endogenous Retrovirus ou PERV), mas que não lhe causam doença. Não se sabe, entretanto, o que poderia acontecer se esses vírus fossem introduzidos no homem com os órgãos transplantados.

PEREIRA, A. J.102

na taxa de crescimento populacional de ameríndios, descendentes de europeus e descendentes de africanos. Se em parte isso foi condicionado por taxas diferenciais de imigração, é também verdade que o predomínio dos eurobrasileiros foi favorecido por medidas repressivas e discriminação contra os outros dois grupos. E, no entanto, a preservação física e cultural de nossos índios é importante, não só como um teste-munho do que ocorreu no passado, como para garantir uma diversidade biológica e de costumes preciosa para todos. A diversidade é ainda um dos atributos mais funda-mentais da espécie humana. Fonte: SALZANO (2005).

Ronaldo faz exame de DNADirigindo o próprio carro, na companhia de seguranças e de um advogado, Ronaldo Nazário chegou ao Laboratório de Engenharia Molecular, na região central de São Paulo, onde se encontrou pela primeira vez com o suposto filho, Alexander Umezu, de 5 anos. Michele Umezu, mãe do menino, alega ter engravidado do jogador após um rápido envolvimento com ele em 2004. “A vida nos surpreende. Depois da tristeza pelo jogo de ontem, hoje eu conheci o Alex, uma criança linda, educada e saudável”, escreveu Ronaldo no Twitter, logo após sair do laboratório. “Agora vamos aguardar o resultado do exame e assumir as responsabilidades e os prazeres que os resultados nos derem”, completou o atleta. Dentro do laboratório, Ronaldo, Michele e Alexander passaram cerca de 50 minutos juntos. Apesar de o jogador ter chegado uma hora e meia antes do horário marcado para o exame, agendado para as 10h30, ele teve que aguardar Michele e o garoto para dar início ao procedimento. Acompanhada de uma irmã, Michele chegou com Alexander por volta das 10h. Cantarolando e saltitando pela calçada, a criança mostrou-se bem à vontade. No laboratório, os peritos colhe-ram sangue, saliva e tiraram fotografias de cada um dos envolvidos no processo, para realizar a análise de comparação de identidade genética. Ao final do teste, Ronaldo, Michele e o menino foram acomodados em uma sala de espera na entrada do labo-ratório. O grupo permaneceu no ambiente por cerca de dez minutos, na companhia de advogados, à espera de documentos. Nesse ambiente, conversaram e brincaram e Ronaldo deixou-se fotografar por funcionários do lugar na companhia do menino, que tocou nas pernas e nas mãos do suposto pai. No dia seguinte o laboratório liberou o laudo que confirmou, Ronaldo é o pai biológico de Alex. Fonte: adaptado de www.globo.com.

O século da biotecnologiaO final do século XX e início do século XXI foram marcados por profundas transforma-ções científicas e tecnológicas. Hoje já se encontra ao alcance do homem tecnologias voltadas ao desenvolvimento de espécies transgênicas, quimeras animais e clones, fabricação de órgãos humanos, novas tecnologias conceptivas, mapeamento sequen-cial do genoma humano, intervenções genéticas, experimentos com células-tronco embrionárias, experiências farmacológicas e clínicas com seres humanos, e muitos outros. Mas será que o ser humano está realmente preparado para tão significativa e aparente irrefreável revolução biotecnológica?

Jeremy Rifkin, em sua obra “O Século da Biotecnologia”, já havia expressado sua preocupação com o rápido avanço da biotecnologia, afirmando que o mapeamento de doenças genéticas poderia ensejar discussões sobre a discriminação genética pra-ticada por empregadores, companhias de seguros e escolas, além disso, outra ques-tão preocupante no século biotecnológico seria a crescente comercialização do banco de genes nas mãos de empresas do setor farmacêutico, químico e biotécnico, bem como os impactos, em longo prazo, dos organismos geneticamente planejados em contato com o meio ambiente. [...] as mudanças econômicas da história ocorreram

Biotecnologia em Debate 103

quando várias forças sociais e tecnológicas se juntaram para criar uma nova "matriz operacional". Para ele, o século biotecnológico estaria estruturado em sete importan-tes fatores, que seriam a base da nova economia. Seriam eles:1. A "capacidade de se isolar, identificar e recombinar genes", ou seja, os genes

são os recursos primários para a futura atividade econômica porque as técnicas de recombinação de DNA e outras biotecnologias permitiriam a exploração de recursos genéticos para fins econômicos específicos;

2. "Concessão de patentes de genes, linhas de células, tecido geneticamente desen-volvido, órgãos e organismos, bem como os processos usados para alterá-los", que fomentam e incentivam a exploração comercial desses recursos;

3. "Globalização do comércio", que permite o aparecimento da "Gênesis de laboratório", onde a ciência cria uma natureza bioindustrial capaz de afetar áreas que vão da agricul-tura à medicina, e que estão sendo consolidadas por "gigantescas empresas da vida";

4. "O mapeamento de aproximadamente 100 mil genes que compõe o genoma hu-mano, novas descobertas sobre a seleção genética, incluindo os chips de DNA, terapia somática de genes e a iminente perspectiva da engenharia genética em ovos humanos, esperma e células embrionárias", que levará necessariamente à redefinição da espécie humana e ao nascimento de uma civilização comercial-mente eugênica;

5. "A grande quantidade de estudos científicos sobre a base genética do compor-tamento humano e a nova sociobiologia que favorece a natureza em relação à alimentação estão promovendo um contexto favorável a uma ampla aceitação de novas biotecnologias";

6. Utilização do computador como instrumento de comunicação e organização para a administração da informação genética, que compõe a economia biotecnológica;

7. "Uma nova narrativa cosmológica sobre a evolução", que se justifica pela agrega-ção das novas tecnologias à estrutura de uma nova ordem econômica global.[...] Segundo ele: "juntos, genes, biotecnologias, patentes da vida, a indústria global da ciência da vida, a seleção do gene humano e cirurgia, as novas correntes culturais, computadores e as revisadas teorias da evolução estão começando a refazer o nosso mundo". Fonte: VICENTE (2009).

Leituras, filmes e sites@

Leituras

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A revolução dos testes de DNA. Disponível em:

Os primatas (Figura 4.21), apesar de genética e fisiologicamente mais próximos do homem, oferecem riscos adicionais nos casos de transplante. Eles são reconhecidamente portadores de doenças que ocorrem também no homem, além do fato de muitos ativistas das sociedades protetoras de animais não aceitarem a ideia de pesquisas serem realizadas com outros primatas.

As técnicas básicas usadas para a criação dos animais transgênicos são:

1) a inserção de um gene estranho em um oócito fertilizado;

2) combinação homóloga em células-tronco embrionárias que são introduzidas em um zigoto; ou seja, esses animais recebem genes de outro organismo no seu genoma.

Bibliotecas de células-tronco embrionárias para anulação de gene de camundongos estão sendo desenvolvidas, o que tornará possível uma geração mais rápida de animais knockout e sem a necessidade de análise da estrutura do gene.

PEREIRA, A. J.104

http://cienciahoje.uol.com.br/colunas/deriva-genetica/a-revolucao-dos-testes--de-dna

Testes de paternidade e maternidade em DNA. Disponível em: http://www.abcdasaude.com.br/artigo.php?670

Criação de um banco de amostras de DNA no Brasil. Disponível em:

http://www.unicamp.br/unicamp/unicamp_hoje/jornalPDF/ju376pag05.pdf

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Filmes

Teste de DNA

http://www.ufmg.br/proex/cpinfo/ufmgtube/videos/teste-de-dna/

Análise de variação em DNA- Técnicas básicas

http://vimeo.com/20846912

Vacinas parte 1

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Sites

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Capítulo 5Biotecnologia

e Meio Ambiente

Biotecnologia em Debate 109

Objetivos

• Apresentar as principais interações entre a biodiversidade e a biotecnologia.

• Descrever os principais problemas ao meio ambiente gerados pelas ativi-dades humanas.

• Apresentar informações sobre as principais metodologias da biotecnologia usadas para resolver problemas ambientais.

Introdução

Em um dia bem quente do verão brasileiro, um pesquisador estrangeiro com visto de turista entra na floresta amazônica. Após infiltrar-se em uma comuni-dade tradicional da região, ele consegue com a ajuda de um mateiro estudar várias espécies vegetais ou animais com interesse para as indústrias de remé-dios ou de cosméticos de seu país. Ele coleta exemplares e descobre, com o auxílio do habitante da floresta, seus usos e aplicações. Após obter informa-ções valiosas, volta para seu país e utiliza as espécies e os conhecimentos das populações nativas para isolarem os princípios ativos encontrados para serem usados na indústria biotecnológica de seu país.

Já em uma grande cidade brasileira, uma típica família brasileira com-posta pelos pais, dois meninos e uma menina resolveu ir a um grande shop-ping da cidade fazer compras. As crianças rapidamente pedem para os pais produtos tais como i-phones, i-pods e tablets, sendo que elas já possuem notebooks, celulares e televisores 3-D em seus quartos para desfrutarem momentos de aventura e prazer. Os pais cedem e compram os aparatos tecnológicos pedidos por seus filhos e eles voltam felizes para suas casas.

Com o aumento do consumo de energia, da água, dos minerais e dos elementos da biodiversidade tem gerado muitos problemas ambientais, como a poluição da água e do ar, a contaminação e o desgaste do solo, o desaparecimento de espécies animais e vegetais e as mudanças climáticas.

PEREIRA, A. J.110

1. ConsumoO consumo realizado pelas sociedades ocidentais modernas é socialmente injusto e insustentável. A crise ambiental tem mostrado que não é possível a incorporação de todos os seres humanos no mundo do consumo devido aos recursos naturais ser finitos.

O mundo natural tem sido explorado excessivamente e vem ameaçan-do a sua sustentabilidade (Figura 5.1), ocasionando a exaustão dos recursos naturais renováveis e não renováveis; desfiguração do solo; poluição da água e do ar e perda da diversidade, dentre outras. A exploração excessiva por sua vez não tem sido repartida de forma igualitária, sendo que poucas pessoas do planeta usufruem desta riqueza.

Figura 5.1 – Intersecção da sustentabilidade com a economia, sociedade e

meio ambiente.Fonte: http://www.inovacaotecnologica.com.br.

Além da necessidade de reconhecermos que a Terra possui limitações físicas, também, devemos reconhecer que a distribuição e acesso aos recur-sos necessários à vida humana devem ser distribuídos de maneira igualitária para todos os níveis sociais.

1.1 Consumo sustentável

O consumo sustentável enfatiza além das inovações tecnológicas e das mu-danças nas escolhas individuais de consumo, também considera as ações coletivas e mudanças políticas, econômicas e institucionais para fazer com que os padrões e os níveis de consumo se tornem mais sustentáveis.

Apesar de grandes avanços de grupos sociais, e governos, em escala local e em alguns casos de países, o consumo sustentável continua fora das discussões mundiais e ainda não foi tratado na sua complexidade pela sociedade planetária.

O papel das sociedades é de consolidar instituições que formulem, pro-movam e disseminem práticas que transcendam a ecoeficiência e ampliem a compreensão dos cidadãos sobre os limites do planeta e suas responsabilida-des para com os habitantes do futuro.

Quando praticamos um consumismo exagerado, nós acabamos centrados em nós mesmos, sem nos preocuparmos com as consequências de nossas escolhas. Buscamos conquistas materiais que acabam nos levando a um ciclo vicioso de trabalharmos e comprarmos muitos produtos supérfluos.

Sem considerar a questão social, não há sustentabilidade. Em primeiro lugar é preciso respeitar o ser humano, para que este possa respeitar a natureza. O homem é a parte mais importante do meio ambiente. Sem considerar a questão energética, não há sustentabilidade. Sem energia a economia não se desenvolve. E se a economia não se desenvolve, as condições de vida das populações se deterioram. Sem considerar a questão ambiental, não há sustentabilidade. Com o meio ambiente degradado, o ser humano abrevia o seu tempo de vida; a economia não se desenvolve; o futuro fica insustentável.

Na hora de escolhermos eletrodomésticos e eletrônicos devemos observar se eles possuem baixo consumo energético. O aumento da demanda por energia tem gerado uma grande discussão que coloca em campos opostos o crescimento econômico e a preservação dos recursos naturais. Não é possível viver sem energia, como também não é possível viver sem recursos oriundos da natureza. Por essa razão, eficiência energética é fundamental.

Biotecnologia em Debate 111

As relações entre meio ambiente e desenvolvimento estão diretamen-te relacionadas aos padrões de produção e consumo de uma determinada sociedade. Mas, em vez de transferir a responsabilidade somente para os consumidores individuais, ou se limitar a mudanças tecnológicas de produtos e serviços, deve ser incluido o processo de formulação e implantação de polí-ticas públicas com a reunião dos diferentes setores da sociedade.

1.2 Consumo verde

O consumo verde é aquele em que o consumidor busca melhor qualidade e preço, incluindo o seu poder de escolha, a variável ambiental, dando preferên-cia a produtos e serviços que não agridam o meio ambiente, tanto na produ-ção, quanto na distribuição, no consumo e no descarte final.

A ideia de um consumo verde ocorreu como resultado de uma conjun-ção de três fatores inter-relacionados:

• o ambientalismo público;

• a ambientalização do setor empresarial;

• a emergência da preocupação com o impacto ambiental de estilos de vida e consumo das sociedades.

A partir da combinação desses fatores, um conjunto de pessoas repre-sentativas da sociedade se agrega ao processo de incluir cada vez mais atores e de estimular a coresponsabilidade dos indivíduos comuns, dadas às caracte-rísticas das suas práticas cotidianas para atenuar ou agravar a crise ambiental.

1.3 Lixo tecnológico

O lixo tecnológico ou lixo eletrônico é um problema da sociedade moderna e com poucos projetos para sua resolução, podendo ser medido pela populari-zação da tecnologia em todo o planeta. Equipamentos eletrônicos usados tais como, televisores, celulares, eletrodomésticos portáteis e equipamentos de in-formática, além do uso de pilhas e baterias, acabam sendo descartados em de-pósitos de lixo. Boa parte deles são compostos por materiais altamente tóxicos como chumbo, mercúrio ou cádmio e não biodegradáveis, na qual não passam corretamente pelo processo de reciclagem, estando, assim, cada vez mais ar-mazenados nos cantos das casas e até em ruas e aterros sanitários.

Componentes de microcomputadores, como placas-mãe são com-postos de metais pesados como mercúrio, chumbo e cádmio: esses podem causar danos ao sistema nervoso; edemas pulmonares; câncer; além é claro, de serem nocivos ao meio ambiente. O material plástico das carcaças de computador leva séculos para decompor-se na natureza. Um monitor leva 300 anos para decompor-se, pouca gente sabe, mas este equipamento pode conter até 25% do seu peso em chumbo.

O termo sociedade sustentável começa a assumir uma visibilidade, e amplia o espectro de pessoas que consideram que suas ações passam a fazer parte de um repertório compartilhado por aqueles que veem na mudança de comportamentos e escolhas a possibilidade de interferir na qualidade do meio ambiente.

Sustentabilidade pode ser definida como a capacidade do ser humano interage com o mundo a fim de preservar o meio ambiente para não comprometer os recursos naturais das gerações futuras.

O consumidor verde tem a tendência de se multiplicar, pois é um indivíduo que prioriza produtos que levam em conta a dimensão ambiental. Mas, o consumo verde não tem atacado toda a equação com ênfase para a tecnologia, deixando de lado os processos de produção e distribuição, além da cultura do consumo propriamente dita.

PEREIRA, A. J.112

2. Biodiversidade

A biodiversidade é o fruto do grande laboratório do planeta Terra, que após 4,5 bilhões de anos de evolução deu origem a espécies dos distintos tipos de organismos. O Brasil é um país com grande diversidade que possui mais de 20% do total de espécies do planeta. Somente o bioma Amazônia abriga mais de 30 mil espécies vegetais. O Cerrado, a Caatinga, os Campos Su-linos, o Pantanal e a Mata Atlântica possuem uma infinidade de espécies da flora e da fauna. Desde os anos 80 do século passado, a biodiversidade tem se destacado dentre os temas ambientais do planeta, juntamente com outras questões ambientais tais como a destruição da camada de ozônio, a mudança climática global associada ao efeito estufa, à poluição dos am-bientes marítimos e a devastação das florestas.

Para o homem, os recursos naturais são de interesse econômico, pois a importância econômica da biodiversidade tem sido a cada dia, percebida e explorada. Novos produtos são desenvolvidos graças às biotecnologias, criando novos mercados. Para a sociedade, a biodiversidade é também um campo de trabalho e lucro. Desta forma, é necessário estabelecer um manejo sustentável destes recursos.

Historicamente, as áreas de aproveitamento de recursos genéticos e biológicos têm sido inúmeras, destacando-se a alimentação, a agricultura e a medicina, dentre outras aplicações. Dessa perspectiva, é principalmente como matéria-prima das biotecnologias avançadas que a biodiversidade assume hoje um caráter estratégico, valorizando-se nem tanto a vida em si, mas a informação genética nela contida. A biodiversidade investe-se assim de um duplo sig-nificado: enquanto elemento essencial de suporte à vida e enquanto reserva de valor futuro (Figura 5.2).

Figura 5.2 – Alguns exemplos da biodiversidade de plan-tas e animais brasileiros.Fonte: www.infoescola.com.

Quando se pensa nos recursos da biodiversi-dade que são utilizados para alimentação, vale dizer que muitas espécies são endêmicas, exclusivas do Brasil, como o abacaxi, a castanha do Pará, a man-dioca, o caju, a carnaúba e o amendoim. Outras, entretanto, são exóticas, oriundas de outros países, como é o caso da cana-de-açúcar, do café, do trigo, da soja, do eucalipto dentre inúmeras espécies rele-vantes para diversas atividades econômicas.

Partes da Dedaleira (Digitalis purpúrea), da Vin-ca (Catharanthus roseus), do Nim (Azadirachta indica)

Os metais pesados, com alta concentração no lixo eletrônico, têm a propriedade da bioacumulação nos organismos vivos e, dessa forma, se estender por toda a cadeia trófica, isto é, toda a cadeia alimentar, chegando ao topo onde se encontra o homem.

A companhia de aviação British Airways está produzindo biocombustível para aviões. São produzidos 60 milhões de litros de combustível para abastecer os aviões da empresa britânica. Para isso, são consumidas 500 mil toneladas de lixo por ano. Além de ser menos poluente, esse biocombustível é mais benéfico ao meio ambiente por reaproveitar o lixo comum. Normalmente, esse material permanece em aterros sanitários produzindo gás metano, um dos gases causadores do efeito estufa.

Aproximadamente 10% da riquíssima biodiversidade brasileira é conhecida. Portanto, há necessidade de se realizar um levantamento e estudo da biodiversidade para o conhecimento da grande diversidade de plantas, animais, fungos e bactérias existentes nos ecossistemas brasileiros.

Biotecnologia em Debate 113

- Figura 5.3, e uma série de outras plantas e animais, muitos deles encontrados em florestas tropicais, são utilizadas para tratar vários males e doenças. Nove dos dez principais medicamentos prescritos advêm originalmente de organismos selvagens. Perto de 2.100 das 3 mil plantas identificadas pelo National Cancer Isntitute dos Estados unidos como sendo fontes de elementos químicos que com-batem o câncer vêm de florestas tropicais.

Figura 5.3 – Flores de plantas de Dedaleira (Digitalis purpurea), Vinca (Catharanthus roseus) e Nim (Azadirachta indica) usadas para fins medicinais.

Portanto, a diversidade da vida é elemento essencial para o equilíbrio ambiental planetário, capacitando os ecossistemas a reagirem melhor às al-terações sobre o meio ambiente causadas por fatores naturais e sociais, con-siderando que, sob a perspectiva ecológica, quanto maior a simplificação de um ecossistema, maior a sua fragilidade.

Duas grandes motivações contribuíram para a problemática da perda de biodiversidade no cenário internacional e seu caráter estratégico.

A primeira relaciona-se ao aumento da percepção, pelos cientistas e por segmentos da sociedade em geral, a respeito da urgência e da importância de se tomarem medidas de maior alcance visando a resguardar a existência das diferentes formas de vida na Terra.

A segunda, talvez a mais fundamental, é compreendida no contexto da passagem de um paradigma tecnoeconômico intensivo em recursos naturais para um outro baseado em informação e no uso crescente de ciência e tecno-logia no processo produtivo.

2.1 Biopirataria

A biotecnologia entendida como a tecnologia que explora os sistemas bio-lógicos em vez dos organismos vivos, se preocupa com a preservação dos sistemas biológicos e sua diversidade. A biotecnologia apresenta promessas para a preservação da biodiversidade e tem preocupações e receio com a biopirataria e a erosão genética.

A biodiversidade oferece condições para que a própria humanidade adapte-se às mudanças operadas em seu meio físico e social e disponha de recursos que atendam a suas novas demandas e necessidades.

De acordo com o Ministério do Meio Ambiente, os produtos da biodiversidade respondem por 31% das exportações brasileiras, com destaque para café, soja e laranja. O Balanço Energético Nacional de 2010 mostraram que em 2009 o uso de bagaço de cana, de biocombustíveis líquidos, lenha, carvão vegetal e outros representaram 32,9% do consumo final de energia do país, o que juntamente com a energia das hidrelétricas e outras fontes renováveis permitiram ao Brasil ter uma matriz energética renovável de 47,3%, a mais limpa do mundo.

PEREIRA, A. J.114

No Brasil, a biopirataria começou logo após o seu descobrimento pelos portugueses quando eles se apropriaram das técnicas de extração do pig-mento vermelho do Pau Brasil que eram dominadas pelos índios, explorando o Pau Brasil, causando o risco de sua extinção.

Não existiam leis claras regulando essa prática. Algumas vezes, o pesquisador obtinha autorização informal da autoridade local ou do pro-prietário da área onde as amostras eram coletadas. Os dias do “localizar, coletar e voltar para casa” estão contados, pelo menos legalmente. Hoje isso é considerado biopirataria.

2.2 Regulamentação e patentes

A legislação brasileira se despertou recentemente para a importância da pro-teção à biodiversidade após a assinatura de dois acordos de exploração de plantas e micro-organismos da Mata Atlântica e da Amazônia com algumas multinacionais, a fim de desenvolver medicamentos. Para impedir esses acor-dos, foi publicada pelo presidente da República a medida provisória MP 2.052, em 29 de junho de 2000, regulamentando o acesso aos recursos genéticos brasileiros. Até início de 2002, continuava em tramitação no Congresso Na-cional o Projeto de Lei regulamentando o acesso aos recursos genéticos no território brasileiro, que por enquanto é regido por medida provisória.

A preservação da biodiversidade da Amazônia torna-se um desafio para o Brasil. Até agora apenas 1% de todo o potencial da região é conhecido e, por falta recursos aos fundos de amparo às pesquisas, o País é obrigado, muitas vezes, a comprar no exterior tecnologia desenvolvida a partir de uma amostra furtada da Amazônia. O Brasil tem a Amazônia, mas não a conhece e nem dispõe de recursos para conhecê-la e muito menos explorá-la. Enquanto isso, o Primeiro Mundo dispõe de recursos, reconhece o valor da Amazônia, mas não a possui e como o Brasil não tem política nem lei para regular e disciplinar a exploração da região, o único meio de acesso internacional torna-se a bio-pirataria (Figura 5.4).

Biotecnologia em Debate 115

Figura 5.4 – Galo-da-serra, uma das espécies mais cobiçadas da Amazônia pelos biopiratas.Fonte: www.inpa.gov.br.

Já se conseguiu patentear o direito de propriedade intelectual, em es-cala mundial, sobre dois compostos farmacológicos originários de plantas da Amazônia: o Rupununine, extraído de sementes do biruru (Octotea rodioei), de ação anticoncepcional; e o Cunaniol, extraído da cunani (Clibadium sylves-tre), que é estimulante do sistema nervoso.

Um grande dilema do registro de patentes de produtos naturais é que as empresas farmacêuticas aproveitam todo o conhecimento etnobiológico das populações locais e, posteriormente, cobram royalties pelo uso do medica-mento dos que também contribuíram para que esse fármaco fosse elaborado.

Até cerca de 20 anos atrás, os aspectos legais relacionados à coleta de amostras de plantas, micro-organismos e animais eram ignorados. Na maioria dos casos, o pesquisador simplesmente fazia uma excursão ao local onde as espécies de interesse estariam estar ocorrendo na natureza, coletava suas amostras e voltava ao laboratório.

Outro caso de biopirataria que ocorreu no Brasil foi o contrabando de 70.000 sementes da árvore de seringueira, Hevea brasiliensis, da região de Santarém no Pará no ano de 1876, pelo inglês Henry Wickham (Figura 5.5). As sementes foram contrabandeadas para o Royal Botanic Garden em Lon-

dres e daí, após uma seleção genética, as se-mentes foram levadas para a Malásia, África e outras destinações tropicais. Após algumas décadas a Malásia passou a ser o principal exportador mundial de látex, prejudicando economicamente o Brasil.

Figura 5.5 – Henry Wickham, biopirata inglês, con-trabandeou sementes da árvore de seringueira, Hevea brasiliensis.Fonte: www.google.com.

A despeito de seu potencial econômico e salutar, menos de 1% das 125 mil espécies de angiospermas nas florestas tropicais e apenas 1.100 das 260 mil espécies de plantas conhecidas foram examinadas quanto a suas propriedades medicinais. Uma vez identificados os ingredientes ativos nas plantas, eles podem em geral ser produzidos sinteticamente. É possível que muitas dessas espécies de plantas tropicais sejam extintas antes que possamos estudá-las.

Biopirataria: exploração, manipulação, exportação e ou a comercialização internacional de recursos biológicos que contrariam as normas da Convenção sobre Diversidade Biológica, de 1992.

O Brasil não possui dados confiáveis sobre os valores movimentados com a biopirataria. Entretanto, os cálculos feitos por organismos oficiais e organizações não governamentais (ONGs) mostram que o País perde, em média, mais de R$ 20 bilhões só com o roubo de plantas, solos, micro-organismos e a apropriação indevida dos conhecimentos das populações tradicionais. Atualmente, a biopirataria é a terceira atividade ilícita mais rentável do planeta: fica atrás apenas do tráfico de drogas ilícitas e de armas.

PEREIRA, A. J.116

2.3 Propriedade intelectual

Os direitos de propriedade intelectual sobre seres vivos ou material biológico dizem respeito à informação contida nos genes do organismo e não ao orga-nismo em si, diferenciando-se da propriedade física ou corpórea de uma dada espécie de planta ou animal.

Apesar dessa diferença, a propriedade intelectual sobre um ser vivo ou matéria biológica, pode afetar o acesso ao mesmo, ou a alguma de suas partes, bem como o uso que dele se faz, já que possibilita ao pseudoinventor o exercício de direitos de monopólio, ainda que temporário, sobre sua repro-dução e comercialização, ou a cessão desse direito em troca da cobrança de royalties.

O marco jurídico internacional da concessão de patentes para orga-nismos vivos, excluindo o homem, ocorreu quando a Suprema Corte Norte--Americana, em 1980, estabeleceu a patenteabilidade de micro-organismos engenheirados, o patenteamento da bactéria Pseudomonas produzida em la-boratório, tendo como aplicação a degradação do óleo cru, desempenhando a função de biosurfactante.

A partir daí, houve crescimento vertiginoso dos pedidos de patente na área de engenharia genética ao nível mundial, seguindo, aliás, uma tendência geral de endurecimento e padronização dos mecanismos de proteção de di-reitos sobre a propriedade intelectual.

O acordo Trade Related Intellectual Property Rights (TRIPs), firmado no âmbito da Organização Mundial do Comércio (OMC), é altamente abrangente no que se refere ao reconhecimento de direitos de propriedade intelectual nas áreas biológica e biotecnológica.

A importância da biodiversidade torna-se ainda mais evidente em situa-ções de crises, como por exemplo, quando ocorre uma epidemia em que as variedades cultivadas de uma espécie são susceptíveis ao patógeno e, não existem outras variedades resistentes. Nestas situações, normalmente o me-lhorista busca nos centros de diversidade da espécie ou em bancos de ger-moplasma fontes de resistência que possam ser utilizadas nos programas de desenvolvimento varietal. Diversas variedades de arroz, tomate, batata e vá-rias outras espécies foram desenvolvidas utilizando estes recursos genéticos.

No Brasil existe Projeto de Lei de 1995 que determina ao Poder Pú-blico preservar a biodiversidade, a integridade e a utilização sustentável do patrimônio genético do país e fiscalizar as entidades dedicadas à pesquisa e manipulação de matrial genético.

O acesso aos recursos genéticos: obtenção e utilização dos recursos genéticos, material genético e produtos derivados, em condições ex situ ou in

Na Amazônia, a apropriação indevida dos seus recursos naturais ocorre, sobretudo, graças ao interesse da indústria químico-farmacêutica internacional em querer conhecer e absorver as 20 mil espécies botânicas e as mais de 100 mil espécies de bichos, vertebrados, invertebrados e micro-organismos existentes na região.

O uso dessas plantas da Amazônia faz parte da tradição dos índios Wapixana, de Roraima, que não terão qualquer retorno financeiro da produção desses fármacos em escala comercial por laboratórios da química farmacêutica.

Em 1992, a Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e Desenvolvimento ou Eco 92, realizada no Rio de Janeiro, com a presença de representantes de 120 países, reconheceu a soberania dessas nações sobre os seus recursos genéticos. Além desse trabalho internacional, as leis nacionais de cada país regem a conservação e desenvolvimento da biodiversidade.

Biotecnologia em Debate 117

situ, existente no território nacional, dos conhecimentos das populações indí-genas e comunidades locais associadas aos recursos genéticos ou produtos derivados e dos cultivos agrícolas domesticados no Brasil, com fins de pes-quisa, bioprospecção, conservação, aplicação industrial ou aparoveitamento dentre outros estão protegidos pela Lei de 1995.

Como mecanismo jurídico de desenvolvimento da propriedade intelec-tual no Brasil, seria viável a previsão de insenção para o país do pagamento de royalties aos produtos e processos desenvolvidos por empresas transna-cionais, a partir da biodiversidade brasileira, bem como no que diz respeito às empresas transnacionais que operam nessa área de pesquisa no país, por um lado, e a participação do Brasil, por outro, nos benefícios gerados a partir da exploração de sua biodiversidade.

2.4 Banco de dados

Conforme determina a medida provisória de 2000, uma instituição estran-geira só poderá ter acesso à biodiversidade do Brasil, plantas, animais ou micróbios, sob a coordenação e responsabilidade de uma entidade de pesquisa nacional.

Em 1992, a Conferência das Nações Unidas Uma versão mais recente, a M.P. 2.126, criou o Conselho de Gestão do Patrimônio Genético (CGEN), no Âmbito do Ministério do Meio Ambiente, encarregado de implementar po-líticas e controlar o acesso aos recursos genéticos brasileiros. Essa regra de acesso à biodiversidade vale também para brasileiros que residem no exterior e precisam utilizar material da biodiversidade e dos bancos de germoplasma do Brasil. Dessa forma, só obterão direito de propriedade intelectual aqueles que seguirem as novas normas.

Entretanto, os mecanismos legais, a legislação e os processos judiciais, são difíceis de serem implementados. É mais fácil estabelecer debates polí-ticos, econômicos e éticos do que assegurar a aplicação da legislação em defesa dos recursos naturais.

2.5 Plantas terapêuticas

As plantas constituem rica fonte de produtos terapêuticos. Estima-se que ape-nas 10% das espécies vegetais já foram testadas quanto ao seu valor farma-cêutico. Cerca de 120 medicamentos comumente prescritos pelos médicos são baseados em princípios ativos extraídos das espécies vegetais. Alguns dos mais importantes medicamentos utilizados pelo homem têm sua história enraizada em extratos herbais coletados na flora silvestre; outros apenas ago-ra começam a ser descobertos.

As informações de um grupo de indivíduos acumuladas por anos, são bens coletivos; e não simplesmente mercadorias que podem ser comercializadas como qualquer objeto de mercado. Nos últimos anos, graças ao avanço da biotecnologia e à facilidade de se registrar marcas e patentes em âmbito internacional, as possibilidades de tal exploração se multiplicaram.

A organização não governamental Rede Nacional de Combate ao Tráfico de Animais Silvestres (Renctas), estima que cerca de 38 milhões de animais da Amazônia, da mata atlântica, das planícies inundadas do Pantanal Mato-Grossense e da região semiárida do Nordeste sejam capturados por traficantes de animais, que faturariam cerca de 1 bilhão de dólares ao ano. O tráfico de animais é punido, no Brasil, com prisão de seis meses a um ano, além de multa de até 5,5 mil reais por exemplar.

Recentes evidências apontam que existe um número extremamente grande de bactérias presentes na biosfera esperando o desenvolvimento de técnicas apropriadas para cultivá-las, isolá-las e descrevê-las. Algumas estimativas indicam a existência de mais de 1 milhão de diferentes espécies de bactérias no mundo.

PEREIRA, A. J.118

Figura 5.6 – Planta de Salix sp.Fonte: www.google.com

Embora o mecanismo de funcionamento da aspirina tenha sido des-vendado somente na década de 70, este medicamento tem sido usado como analgésico e promotor da elasticidade do sistema circulatório por bilhões de pessoas. Se a espécie da qual o princípio ativo da aspirina foi extraído tives-se sido extinta antes dessa descoberta, talvez o homem jamais conhecesse esse valioso medicamento. Somente os americanos consomem 80 bilhões de comprimidos de aspirina anualmente.

O medicamento N-Tense é outro exemplo de terapia de suporte consti-tuída a partir de múltiplas plantas medicinais da Amazônia, recomendado para tratamento do câncer. Algumas das espécies utilizadas neste produto incluem: Mulaca (Physalis angulata), Graviola (Annona muricata), Vassourinha (Scopa-ria dulcis), Espinheira santa (Maytenus ilicifolia), Mutamba (Guazuma ulmifo-lia), Melão amargo (Momordica charantia) dentre outras.

2.6 Erosão genética

Até a década de 1940, os centros de origem das espécies domesticadas de animais e plantas eram considerados fontes ilimitadas de variabilidade genética. Após a Segunda Guerra Mundial, a agricultura dos países em desenvolvimento sofreu profundas mudanças. De acordo com estudo realizado pela Academia Americana de Ciências, de aproximadamente 3.000 espécies vegetais utilizá-veis, somente 20 a 30 constituem a base agrícola da humanidade.

A biotecnologia pode auxiliar no diagnóstico da erosão genética dessas espécies bem antes das metodologias convencionais para levantamento das espécies em extinção. Isso pode ser feito pela quantificação da variabilidade genética que ainda existe, utilizando-se testes de DNA semelhantes aqueles

Em 1871, pela primeira vez foi outorgada uma patente para um organismo vivo, uma levedura livre de germes patogênicos, aperfeiçoando o processo de fabricação da cerveja, a Louis Pasteur, na França.

Utilizam-se hoje diferentes formas de proteção legal à propriedade intelectual relativamente à matéria viva, tais como patentes de sequências de DNA, patentes de micro-organismos, patentes de cultivares e de animais transgênicos, além de proteção de cultivares e de direitos do melhorista.

Recursos genéticos: material genético de valor real ou potencial (ou a variabilidade genética) de espécies de plantas, animais e micro-organismos integrantes da biodiversidade, de interesse socioeconômico atual ou potencial, para utilização imediata ou do melhoramento genético, da biotecnologia, ou outras ciências e/ou empreendimentos afins.

Biotecnologia em Debate 119

aplicados em criminalística e paternidade em humanos (DNA fingerprinting). No entanto, como cada tipo de organismo tem um genoma distinto, os méto-dos também devem ser particularmente desenvolvidos para cada espécie.

A identificação pelo DNA tem sido aplicada com sucesso no estudo de espécies de lobo, peixe-boi, araras, baleias, ipês-amarelos etc. Esses estudos foram utilizados em muitos casos para justificar a criação de novas áreas de proteção onde tais espécies habitam, pois o estudo da variabilidade de seu DNA já apresentava os primeiros sinais de extinção.

Figura 5.7 – Tecnologia do DNA barcoding tem proporcionado a identificação de pás-saros, insetos, dentre outros animaisFonte: www.google.com

2.7 Preservação

A cultura de células e tecidos é uma área da biotecnologia que está sendo empregada na manutenção de coleções vivas dos mais variados tipos de es-pécies vegetais e animais de importância econômica ou em extinção.

No Zoológico de San Diego nos Estados Unidos, existe o Zoo Conge-lado, onde são mantidas linhagens celulares vivas de espécies de várias fa-mílias de mamíferos, muitos em extinção. Espera-se que num futuro próximo, utilizando as técnicas de clonagem, essas células possam ser transformadas em indivíduos adultos.

A preservação da diversidade microbiana também tem sido viabilizada por técnicas biotecnológicas. Se as bactérias, vírus e fungos, tivessem de ser mantidos em seus hospedeiros tradicionais, apenas uma pequena fração da biodiversidade desses organismos poderia ser preservada.

Os bancos de preservação de bactérias (bacteriotecas) e de fungos (mi-cotecas) requerem apenas um laboratório relativamente pequeno e simples

Comunidade local e população indígena: grupo humano distinto por suas condições sociais, culturais e econômicas, que se organiza total ou parcialmente por seus próprios costumes ou tradições ou por uma legislação especial e que, qualquer que seja a sua situação jurídica, conserva suas próprias instituições sociais, econômicas, culturais ou parte delas.

Diversidade genética: variabilidade de genes e genótipos entre as espécies e dentro delas; a parte ou o todo da informação genética contida nos recursos biológicos.

Royalties: A palavra Royalty é de origem inglesa e se refere a uma importância cobrada pelo proprietário de uma patente de produto, processo de produção, marca, ou outros fins, ou pelo autor de uma obra, que permite o uso ou a comercialização do produto, durante determinado tempo, enquanto forem pagos os direitos para o proprietário.

PEREIRA, A. J.120

para a preservação desses micro-organismos. O principal objetivo desses ban-cos de micro-organismos é a preservação de espécies para estudos posteriores em laboratório, com potenciais aplicações biotecnológicas (figura 5.8).

Figura 5.8 – Os fungos Penicillium roquefortii e Penicillium camembertii são utilizados na fabricação de queijos tipos roquefort e camembert respectivamente. Fonte: www.google.com.

Bancos de germoplasma

O termo germoplasma é considerado vago e impreciso. No entanto, germo-plasma tem sido definido como todo o material hereditário de uma espécie ou, ainda, todo o patrimônio genético de uma espécie. Em outras palavras, o germoplasma é toda diversidade existente para a espécie considerada, ou seja, a biodiversidade no nível dos genes.

Na preservação de espécies vegetais por meio das suas sementes, em geral estas são armazenadas em ambientes com baixas temperaturas e umi-dade (Figura 5.9). Nessas condições, a viabilidade das sementes pode ser preservada por várias décadas. Quando há necessidade de preservação por períodos ainda mais longos ou para a preservação de alguns tipos específi-cos de tecidos vegetais utilizados em cultura de tecidos e grãos de pólen, por exemplo, a criopreservação em nitrogênio líquido a –196ºC tem sido utilizada.

Figura 5.9 – Câmara de conservação de um banco de germoplasma de

sementes na Europa.Fonte: www.google.com.

É um direito das comunidades locais e dos povos indígenas as decisões que tenham por objetivo o acesso aos recursos genéticos nas áreas que ocupam, assim como a proteção e incentivo às suas diversidades culturais, valorizando-se os seus conhecimentos, inovações e práticas sobre a conservação, uso, manejo e aproveitamento da diversidade biológica e genética.

Biotecnologia em Debate 121

3. Bioprocessos

Os processos de conversão convencionais requerem frequentemente a apli-cação de temperaturas elevadas e altas pressões, por exemplo, a incinera-ção, ao contrário dos bioprocessos que geralmente operam nas condições ambientais.

Através da tecnologia do bioprocesso são usadas células vivas ou com-ponentes de sua maquinaria bioquímica para sintetizar produtos, degradar substâncias e produzir energia (Figura 5.10).

Figura 5.10 – Procedimentos gerais usados no bioprocessamento da cana-de-açúcar para produção de açúcar e álcool.Fonte: www. google.com.

Os componentes celulares mais utilizados são as enzimas empregadas na produção de produtos químicos para gerar energia e degradar compostos poluentes. No desenvolvimento de um bioprocesso como em qualquer outro processo químico ocorrem genericamente três grupos de operações:

1. a reação,

2. as operações a montante, de preparação dos reagentes, as matérias primas,

3. e operações a jusante da reação para separação de produtos.

As operações a montante da reação para preparação das matérias--primas são algumas de caráter mecânico como moagem, mistura, enquanto outras são de caráter químico, a hidrólise ou a formulação do meio de cultivo de micro-organismos. Outras são de caráter físico, a esterilização dos caldos de cultivo ou a descontaminação do ar por processos como a filtração por membranas ou em filtros de fibras.

Também à montante da reação ocorre a seleção de micro-organismos produtivos, a sua adaptação às condições de cultivo, que determinam a fi-siologia de crescimento, a preparação dos inóculos, o desenvolvimento de meios de cultivo mais caros e quimicamente mais bem definidos, alguns mais baratos e indefinidos, derivados de agroindústrias, outros, a tecnologia de es-

Sem essa especificação, pode-se supor que o país está assumindo o risco, por um lado, da apropriação paulatina e progressiva de sua diversidade e, por outro lado, arcando com os danos ambientais inerentes a essa forma de pesquisa.

Mecanismos legais estão sendo desenvolvidos para proteger a riqueza biológica do Brasil. Esses mecanismos poderão assegurar dividendos, promover a conservação da biodiversidade e permitir o treinamento de pesquisadores compromissados com o País.

A aspirina é um dos vários exemplos de medicamento extraído de plantas. Aspirina é o nome comercial para o ácido acetilsalicílico, analgésico muito comum. Sua história inicia com o médico grego Hipócrates no século V a. C., o qual usava um pó amargo obtido da casca de Salix sp. (Figura 5.6), uma árvore da família das Salicaceae, para tratar dores e reduzir febre.

PEREIRA, A. J.122

terilização dos caldos, dentre outros, que constituem todos eles, fatores que afetam não só a produção, mas também os processos de separação.

O cultivo em bagaço tem sido bastante utilizado para a produção de enzimas celulolíticas, uma vez que o principal constituinte do bagaço de cana é a celulose. Essas enzimas podem ser recuperadas de forma razoavelmente fácil quando feito uma fermentação em estado sólido com esse resíduo. As enzimas xilanases também são produzidas em fermentação sólida em baga-ço de cana, sendo que essas enzimas irão atuar na degradação de xilanas da hemicelulose do bagaço.

Algumas frutas como a manga, a banana, o abacaxi e a laranja geram grandes quantidades de resíduos. O processamento das frutas pode gerar dois tipos de resíduos: um sólido, contendo a pele ou casca, as sementes, a castanha, e a polpa; e outro líquido, contendo a água de lavagem, e espirros de suco. A polpa é rica em açúcares, vitaminas e minerais, os quais, devido a sua natureza orgânica, são facilmente assimiláveis pelos micro-organismos. A composição desses elementos dependerá do tipo de fruta que está sendo processada. Esses resíduos são bons materiais nutritivos para o processo de metabólitos secundários de interesse industrial.

3.1 Biorreatores

Nas próximas décadas haverá uma substancial alteração nos grãos colhidos no campo, o leite tirado das vacas e os ovos produzidos pelas galinhas prova-velmente terão outros destinos, além de servirem meramente para a alimen-tação da população.

A engenharia genética produzirá variedades de espécies vegetais e li-nhagens de animais que funcionarão como biorreatores, isto é, verdadeiras fábricas para produção de fármacos, produtos químicos, plásticos, com-bustíveis e outros produtos.

A introdução de novos genes poderá alterar a qualidade e quantidade destes produtos já existentes. Por exemplo, alterando a composição dos áci-dos graxos em leguminosas, como soja, canola e amendoim, é possível de-senvolver diferentes tipos de óleos, os quais podem ser usados de forma mais saudável na dieta de pessoas com propensão a doenças cardiovasculares ou para produção de fluídos hidráulicos para fins automotivos ou industriais.

Um exemplo curioso que se encontra ainda em estudo é a produção de agentes anticoagulantes em canola. Neste projeto, os cientistas isola-ram genes que codificam para a produção de fatores anticoagulantes de sanguessuga (Figura 5.11), os quais foram, posteriormente, transferidos para a canola. Esse fator anticoagulante é sintetizado pela planta e armaze-

Bem antes do processo final de extinção, se não há número suficientemente grande de indivíduos, começa a haver um processo de endogamia, ou seja, acasalamentos consanguíneos, que podem levar, tal como na espécie humana, a aparecer indivíduos menos aptos e com defeitos genéticos.

Outro exemplo de medicamento extraído de plantas é o colírio utilizado para tratamento do glaucoma. O princípio ativo desse colírio, pilocarpina, é extraído do jaborandi (Pilocarpus pinnafolius), uma espécie nativa do Nordeste do Brasil, que era utilizada pelos indígenas da região para produzir sudorese ao mascarem suas folhas.

Espécies de plantas como o amaranto e jojoba apresentam características de alto valor econômico e, por isso, têm sido recomendadas como espécies que merecem maior atenção dos melhoristas de plantas, com o objetivo de eliminar características indesejáveis que inviabilizam a sua exploração em larga escala. O processo de erosão genética também ocorre em espécies da fauna, da flora e dos micro-organismos nativos e é o primeiro sintoma que diagnostica o caminho da espécie para a extinção. Isso é um reflexo da deterioração ambiental que leva, inicialmente, às extinções localizadas das espécies e, posteriormente, culmina com a extinção global da espécie no ambiente natural.

Biotecnologia em Debate 123

nado em suas sementes, permitindo que sua extração e purificação sejam re-lativamente fáceis. Esses agentes anticoagulantes têm importante aplicação no tratamento de doenças do sistema circulatório.

Figura 5.11 – O verme anelídeo sanguessuga. Fonte: www.infoescola.com.

4. Biodegradação

O emprego de micro-organismos e enzimas utilizados para a degradação de moléculas orgânicas pode, por exemplo, resolver problemas ambientais como o derramamento de óleo e locais com lixos tóxicos, com o uso da biorremedia-ção e fitorremediação.

4.1 Biorremediação

A biorremediação baseia-se na degradação bioquímica dos contaminantes através da atividade de populações de micro-organismos, por exemplo, as bactérias, presentes no solo contaminado. Consiste em mineralizar os po-luentes, libertando apenas substâncias inertes, como dióxido de carbono e a água.

A biorremediação utilizada atualmente é uma extensão dos trabalhos de Pasteur, que desde 1856, demonstrou que os micro-organismos poderiam ser utilizados em benefício da humanidade no tratamento de doenças e na produção de alimentos e bens de consumo. O que Pasteur não previu foi que a utilização de suas ideias poderia solucionar problemas tão atuais e graves, como a questão do tratamento e destino final dos resíduos urbanos e a reme-diação dos lixões e vazadouros.

4.2 Xenobióticos

Os processos industriais produzem compostos químicos sintéticos que por sua vez são lançados no meio ambiente indiscriminadamente. Dentre esses compostos, destacam-se os xenobióticos, como os hidrocarbonetos de petró-leo, que estão sujeitos ao metabolismo microbiano.

Um novo método de classificação denominado de DNA barcoding (Figura 5.7), permite a identificação de espécies animais por trechos de seus genomas, os quais são apresentados em forma de código de barras, está auxiliando os cientistas a descobrir e a mapear peixes e aves em todo o planeta.

A preservação da diversidade genética da mandioca é realizada em laboratórios de cultura de tecidos, onde milhares de diferentes variedades e espécies são mantidas em placas de Petri com meio de cultura.

Se as técnicas de cultura de tecidos de plantas não tivessem sido desenvolvidas, a área necessária e o custo de preservação seriam muitas vezes maiores, limitando o número de tipos que poderiam ser preservados para o futuro.

A importância da preservação da biodiversidade está também referida em livros sagrados, como a Bíblia, que relata que Noé salvou animais domésticos e selvagens da catástrofe do dilúvio.

PEREIRA, A. J.124

A degradação dos xenobióticos no solo pode ser abiótica, sem a partici-pação dos micro-organismos ou enzimas, ou biótica, o mecanismo principal, através de processos bioquímicos mediados pelos micro-organismos, sendo a contribuição relativa de cada processo dependente do composto e das con-dições químicas e físicas do solo.

A contaminação de solos com gasolina, diesel, óleos em geral e ou-tros produtos de petróleo através de vazamentos, não apenas contaminam os ecossistemas dos solos, mas é também uma potencial fonte de contaminação para os aquíferos em longo prazo (Figura 5.12). Os frequentes derramamen-tos de petróleo nos solos brasileiros vêm motivando o desenvolvimento de novas técnicas para o tratamento de descontaminação destes.

Figura 5.12 – Exemplos de poluição ambiental em diferentes locais onde a biorreme-diação pode atuar.Fonte: www, brasilescola.com

A bioremediação baseia-se em três aspectos principais:

1. existência de micro-organismos com capacidade catabólica para degradar o contaminante;

2. disponibilidade do contaminante ao ataque microbiano ou enzimático;

3. condições ambientais adequadas para o crescimento e atividade do agen-te bioremediador.

5. Avaliação de riscosA Avaliação de Risco é a aplicação de um juízo de valor para discutir a im-portância dos riscos e suas consequências sociais, econômicas e ambientais. A análise de risco envolve identificar os perigos e avaliar os riscos associados, classificar os riscos, determinar opções e tomar decisões quanto à sua redução ou eliminação e informá-los aos tomadores de decisão ao público.

As probabilidades estatísticas com base em experiências passadas, testes em animais e de outros tipos, além de estudos epidemiológicos são utilizados para estimar os riscos de tecnologias e substâncias químicas exis-tentes. Para avaliar as novas tecnologias e produtos, os avaliadores de riscos empregam probabilidades mais incertas, com base em modelos, em vez de experiências e testes reais.

Existem dois métodos básicos para conservação de germoplasma: conservação ex situ e in situ. Os bancos de germoplasma funcionam como conservação ex situ, em que uma amostra da variabilidade genética de determinada espécie é conservada em condições artificiais, fora do seu habitat.

Um exemplo típico de banco de germoplasma in situ localiza-se no oeste mexicano, onde aproximadamente 140.000 ha da Serra de Manantlan foram designados como reserva biológica de Zea diploperennis (teosinto diploide perene), um parente silvestre do milho e de importância econômica e biotecnológica para melhoramento, cuja população é periodicamente monitorada com a finalidade de verificar o risco de redução da diversidade ali presente.

Biotecnologia em Debate 125

O risco é formado por um conjunto de fatores, dentre eles a natureza do perigo, acessibilidade ou acesso de contato (potencial de exposição), carac-terísticas da população exposta (receptores), a probabilidade de ocorrência e a magnitude da exposição e das consequências (Figura 5.13).

Figura 5.13 – Diagrama representativo da caracterização dos componentes de risco.Fonte: www.yahoo.com.

A eliminação da pobreza proporcionaria mais renda às pessoas a fim de estimular o desenvolvimento econômico e reduziria a degradação ambiental. Todos ganhariam com a redução de pobreza, as pessoas, a economia e o meio ambiente.

Organismos não humanos, suas populações e ecossistemas podem ser mais suscetíveis a perigos que os humanos por diversos fatores, tais como:

• Rotas de exposição diferentes ou incompatíveis, como respirar no meio aquático, absorção através da raiz ou limpeza oral de penas e pelos.

• Sensibilidade maior a algumas substâncias, tanto por peculiaridades em seus desenvolvimentos, como fechamento de estômatos de plantas por dióxido de enxofre, ou por desconhecimento de etapas do metabolismo de outras espécies.

• Mecanismos ecossistêmicos sem análogos na saúde humana, como eu-trofização de lagos ou bloqueio de luz solar por sedimentos.

• Maior exposição de organismos não humanos por mesmas vias de expo-sição aos poluentes, como no caso de espécies unicamente piscívoras, enquanto que humanos se alimentam de uma variedade maior de víveres.

• Taxas metabólicas diferentes, em especial mais elevadas, recebendo assim ní-veis mais altos de contaminantes por unidade de massa corpórea.

• Alguns químicos são feitos especificamente para matar tipos de plantas e pragas, mas afetam outros organismos de fisiologia e hábitos semelhantes, enquanto que não causa maiores problemas a outros.

• Organismos não humanos são altamente dependentes de seu ambiente para sobreviver, mesmo quando apresentam resistência ao contaminante em si, pois

Bioprocesso: aplicação controlada de micro-organismos e organismos multicelulares (proto e metazoários) no meio ambiente ou em sistemas de tratamento de resíduos a fim de eliminar total ou parcialmente substâncias tóxicas e outros poluentes prejudiciais ao meio ou à saúde de seres vivos.

Montante: termo de geociências referente a um lugar situado acima de outro, tomando-se em consideração a corrente fluvial que passa na região. O relevo de montante é aquele que está mais próximo das cabeceiras de um curso d'água, enquanto o de jusante está mais próximo da foz.

Jusante: termo de geociências referente à região compreendida entre o observador e a foz de um curso d’água.

Nas destilarias e indústrias alcooleiras são produzidos como resíduos o bagaço, o melaço, e a vinhaça. O bagaço provém da moagem da cana-de-açúcar durante a produção do açúcar. O bagaço é um resíduo fibroso que contém celulose, hemicelulose e lignina, com conteúdo de cinzas muito baixo.

Um grande número de bactérias, leveduras e fungos são cultivados em bagaço, no entanto, fungos filamentosos, como os basidiomicetos, são os mais utilizados.

PEREIRA, A. J.126

podem ser secundariamente afetados, pela perda de habitat ou fontes de ali-mentos específicas, enquanto que humanos em países industriais podem ter alternativas para sua alimentação e moradia se estas forem comprometidas.

6. Sustentabilidade ambiental

A biotecnologia ambiental é o conjunto de métodos da engenharia sani-tária/ambiental e da microbiologia que utilizam micro-organismos, ou que conduzem ao desenvolvimento dos micro-organismos em um meio, cuja finalidade é a obtenção de um produto que proporcione benefícios ao ho-mem em seu ambiente.

Muitas toxinas que matam plantas e animais ocorrem naturalmente, mas o homem através de suas atividades vem aumentando seu acúmulo no meio ambiente. As fontes de ácidos produzidas pelas atividades humanas po-dem ocorrer nas áreas de mineração de carvão, onde compostos de enxofre reduzido, associados com o carbono, são expostos ao oxigênio atmosférico.

A extração de minérios, o processamento e o uso de recursos minerais, além de consumirem grande quantidade de energia, podem causar danos à terra, matar mineiros, erodir solos, produzir grandes quantidades de rejeitos sólidos e poluir o ar, a água e o solo.

6.1 Tratamento biológico de resíduos/efluentes

Um dos nossos recursos mais preciosos é a água doce que flui através da superfície terrestre para os rios, córregos, lagos, áreas úmidas e estuários.

No mundo, usamos 70% da água que retiramos todos os anos dois rios, lagos, aquíferos para irrigar um quinto das plantações mundiais. Essas plantações produzem cerca de 40% dos alimentos, incluindo dois terços da produção mundial de arroz e trigo. A indústria usa, por ano, 20% dessa água; as cidades e residências utilizam os 10% restantes.

A indústria e a agricultura usam uma grande quantidade de água. As principais fontes de poluição de água são agricultura, indústrias e minera-ção. As atividades agrícolas são, de longe, a principal causa de poluição de água. Os principais poluentes agrícolas são fertilizantes e pesticidas, bacté-rias de animais e resíduos de processamento de alimentos, além do sal em excesso dos solos de plantações irrigadas.

As instalações industriais são outra grande fonte de poluição da água. A mineração é uma terceira. A mineração superficial prejudica a superfície terrestre, criando uma grande fonte de sedimentos erodidos e o escoamento de substâncias químicas tóxicas.

O bagaço de uva é um dos principais resíduos da indústria produtora de vinhos. Ele já foi utilizado como único nutriente na fermentação em estado sólido para a produção de enzimas como as celulases, as xilanases e as pectinases pelo fungo Aspergillus awamori, ou também pode ser empregado na produção de ácido cítrico por Aspergillus niger.

As plantas já produzem naturalmente uma série de produtos químicos usados pela indústria na produção de medicamentos (jaborandi), corantes (urucum), tintura (soja) e óleos industriais (canola).

Bovinos, suínos, ovinos e aves têm sido geneticamente modificados para produzir diferentes proteínas com aplicação em saúde humana. Essa forma de produção de proteínas apresenta uma série de vantagens sobre os procedimentos tradicionais, incluindo os menores custos e riscos de contaminação.

Biotecnologia em Debate 127

A tecnologia nas Estações de Tratamento de Efluentes (ETEs) difere ligeiramente da tecnologia de obtenção de bioprodutos industriais.

O tratamento de efluentes pode ser dividido basicamente em dois tipos de bioprocessos básicos: lodos ativados e sistemas anaeróbios (Figura 5.14).

Figura 5.14 – Bioprocessos aplicados a ETE com lodos ativados (esquerda) e siste-mas anaeróbios de tratamento de efluentes (direita).Fonte: www.ubiotech.com.br.

Bactérias, actinomicetos, leveduras, fungos filamentosos e protozoá-rios, por sua enorme habilidade em degradar um amplo espectro de substân-cias orgânicas, têm sido cada vez mais empregados como agentes de trans-formação dos mais diferentes compostos, apresentando-se como alternativas poderosas aos métodos convencionais baseados na simples disposição e na energia térmica.

A extensão da degradação varia entre o que se denomina de biotrans-formação e mineralização.

No bioprocesso de lodo ativado, que consiste em se provocar o de-senvolvimento de uma cultura microbiológica na forma de flocos (lodos ati-vados) em um tanque de aeração, que é alimentada pelo efluente a tratar é necessário um tanque, onde é realizada a aeração que proporciona oxigê-nio aos micro-organismos e evita a deposição dos flocos bacterianos e os mistura homogeneamente ao efluente. Esta mistura é denominada “licor”. O licor é enviado continuamente a um decantador (decantador secundá-rio), destinado a separar o efluente tratado do lodo. O lodo é recirculado ao tanque de aeração a fim de manter a concentração de micro-organismos dentro de uma certa proporção em relação à carga orgânica afluente.

O sobrenadante do decantador é o efluente tratado, pronto para descar-te ao corpo receptor.

A degradação da matéria orgânica, contida em efluentes industriais, é realizada biologicamente por uma grande variedade de micro-organis-

Os poluentes xenobióticos podem ser removidos do ambiente por uma variedade de vias biológicas, químicas e físicas. Atualmente as técnicas de biorremediação, oferecem novas possibilidades para acelerar a degradação destes poluentes, quer adicionando-se os nutrientes necessários à população microbiana natural, quer adicionando culturas bacterianas mistas ou puras, que apresentem as vias metabólicas que permitam a rápida metabolização do contaminante.

Fitorremediação: emprego de plantas no controle de contaminações causadas por poluição como nas águas residuais industriais ou na absorção de metais tóxicos, solventes orgânicos ou elementos radioativos.

PEREIRA, A. J.128

mos, que agem muitas vezes de forma sinérgica. Esses micro-organismos são usados para converter matéria orgânica coloidal e carbonácea dissol-vida em biomassa.

A mineração pode prejudicar o meio ambiente através da formação de cicatrizes e fendas na superfície do solo e provocar colapso da terra acima das minas subterrâneas, tombando casas, rompendo tubulações de esgoto, de gás e fendendo sistemas de água subterrânea.

A drenagem ácida de uma mina ocorre quando a água da chuva que se infiltra na mina ou nos resíduos carrega ácido sulfúrico (H2SO4) produ-zido quando bactérias aeróbicas agem nos minerais de sulfeto de ferro dos rejeitos para os córregos e águas subterrâneas das redondezas. Isso pode contaminar as fontes de água e pode destruir algumas formas de vida aquáticas (Figura 5.15).

Figura 5.15 – Área de mineração com lençóis freáticos contaminados por resíduos.Fonte: www.google.com.

Em metalurgia e outras áreas relacionadas é utilizada a técnica de lixi-viação com a ação de um fluido percolante, sem ser necessário o beneficia-mento do minério e, em outros casos, também é usada “lixiviação inversa” para fazer a remoção de impurezas.

6.2 Biossorventes

Os metais podem ser benéficos, quando atuam como cofatores ou na com-posição de vitaminas, sendo elementos essenciais à atividade biológica. No entanto, em altas concentrações são prejudiciais. Os metais pesados são im-portantes tecnologicamente e tóxicos no ambiente

O maior risco é, de longe, a pobreza. O alto número de mortes que ela causa é resultado da desnutrição. A redução ou eliminação da pobreza melhoraria muito mais a longevidade e saúde humana do que qualquer outra medida.

Biotecnologia em Debate 129

Existem metais que apresentam efeitos prejudiciais não somente sobre a vida aquática, mas sobre toda a cadeia alimentar, através da qual tendem a acumular, multiplicando o risco envolvido e prejudicando a saúde humana. Uma alternativa para remoção de metais de efluentes vem a ser o uso de sistemas biológicos ou bioremoção. Tendo como vantagem o baixo custo, pois emprega biomassa residual ou em grande quantidade na natureza, os biossorventes.

Os biossorventes são materiais biológicos, plantas ou biomassas mi-crobianas como algas, leveduras, fungos e bactérias. Por exemplo, na alga marrom Sargassum (Figura 5.16), o alginato presente na parede celular é res-ponsável pela absorção de metais.

Figura 5.16 – Alga Sargassum e sua aglomeração no oceano.Fonte: www.google.com.

6.3 Lixiviação

O mercúrio, o arsênico, o chumbo, o cobre, o níquel, o zinco e outros metais pesados, mesmo em baixas concentrações, são tóxicos para a maioria das formas de vida. Eles são introduzidos no meio ambiente de diversas formas, principalmente como refugo de mineração e da fundição de minerais, como produtos de rejeito de processos manufaturados, como fungicidas (arseniato de chumbo) e através da queima de combustíveis com chumbo.

Na metalurgia extrativa, mais especificamente da hidrometalurgia, a lixiviação bacteriana de minérios tem sido uma alternativa para os processos convencionais. Ela baseia-se na solubilidade dos metais em soluções ade-quadas por meio de reações químicas e também de reações bioquímicas.

Biotransformação: constitui na degradação parcial de um composto e na formação de uma ou mais substâncias, que podem ou não ser menos tóxicas que o composto de origem.

Mineralização: transformação total de uma substância orgânica em outras inorgânicas, tais como dióxido de carbono e água.

O excesso de lodo, devido ao crescimento biológico, é extraído do sistema sempre que a concentração do licor ultrapassa certos valores desejáveis. Este lodo pode ser espessado e desidratado, tendo como aplicação o uso em agricultura.

Os resíduos provenientes da mineração geralmente contêm toxinas que podem ser levados e depositados em qualquer lugar por causa da erosão provocada pela água ou pelo vento.

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Figura 5.17 – Cursos d’ água drenados de minas de carvão podem ser extremamente ácidos.Fonte: www.google.com.

Dentre os efeitos dos metais pesados destacam-se interferência nas funções neurológicas dos vertebrados. Muitos metais pesados tóxicos como os particulados de cobre e níquel liberados na atmosfera em fundições, aca-bam se acumulando nos solos. Em altas concentrações eles afetam de forma negativa os musgos, os liquens e os grandes fungos. A abundância de minho-cas cai dramaticamente e a maioria das plantas vasculares também é afetada por altas concentrações destes metais.

O carvão e o óleo além de serem hidrocarbonetos eles possuem com-postos de nitrogênio e enxofre. Quando se queima o carvão e óleo, além de serem produzido dióxido de carbono (CO2) e vapor de água, são liberados óxidos de nitrogênio e de enxofre na atmosfera. Quando esses gases se dis-solvem nas gotas de chuva, eles são convertidos em ácidos e causam preci-pitação ácida (Figura 5.18).

Figura 5.18 – Formação e precipitação da chuva ácida.Fonte: www.google.com.

A chuva ácida pode diminuir também o pH do solo, aumentando a taxa de lixiviamento dos nutrientes do solo e precipita os compostos fosforosos, tornan-do os nutrientes indisponíveis para sua assimilação pelas raízes das plantas.

Bioremoção: acúmulo e concentração de poluentes de soluções aquosas (efluentes) com o uso de materiais biológicos, permitindo assim sua recuperação e ou disposição sem agressão ao meio ambiente.

Biolixiviação: consiste na utilização de micro-organismos capazes de solubilizar metais através da oxidação de sulfetos metálicos.

Percolação: operação de passar um líquido através de um meio para filtrá-lo ou para extrair substâncias deste meio.

O solo lixiviado fica demasiadamente exposto por causa de desmatamento, queimadas ou sobrepastoreio e, com a ação gradativa das chuvas vai tendo seus materiais arrastados tornando-se primeiro infértil, e depois, podendo ocasionar erosões graves (voçorocas) dependendo do tipo de solo e grau de exposição. No tratamento de resíduos, principalmente de efluentes pode ser usado a biolixiviação. A Lixiviação em geologia, chamamos ao processo de “arraste” ou “lavagem” dos sais minerais presentes no solo, caracterizando uma forma inicial de erosão, ou erosão leve.

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7. Metagenômica

Embora o entendimento de como o mundo funciona em nível molecular esteja longe de ser completo, a descoberta de novas moléculas traz importantes apli-cações na conservação e remediação ambiental, além de sua aplicabilidade na agricultura, medicina e indústria. Com a metagenômica, análise genômica da comunidade de micro-organismos de um determinado ambiente por técni-cas independentes de cultivo pode ser realizada, pois ela permite o acesso a genes de bactérias incultiváveis de inúmeros ambientes.

Na atualidade, um conjunto de novas metodologias conhecidas como metagenômica, começou a possibilitar o estudo de micro-organismos em co-munidades complexas, permitindo a percepção do que eles são capazes e como trabalham.

A metagenômica (Figura 5.19) consiste em:

• Isolar o DNA total da amostra do ambiente;

• Manipular o DNA, ou seja, fragmentar o DNA extraído;

• Ligar os fragmentos em vetores de expressão, por exemplo, plasmídios, cosmídeos ou BAC, para inserir em bactérias, transformá-las e cultivá-las;

• Construir uma biblioteca metagenômica, um conjunto de colônias transfor-madas com genoma misto;

• Análisar as diferentes colônias que poderão expressar as diferentes proteí-nas (enzimas).

Figura 5.19 – Esquema representativo das etapas usadas na metagenômica.Fonte: www.google.com.

Dependendo do seu interesse pode-se adicionar o substrato de sua en-zima no meio de cultura, algum composto tóxico na agricultura, por exemplo, e as bactérias que conseguirem degradar esse composto no meio ambiente, produzirão uma coloração diferente. Essas bactérias serão aquelas que pos-suem o gene de interesse.

A tecnologia microbacteriana oferece uma alternativa econômica para a indústria de mineração, principalmente nos casos em que depósitos minerais de alto teor estão se exaurindo e o processamento de minérios de baixo teor, pelos métodos convencionais é inviável tanto sob o ponto de vista econômico quanto o ambiental. Este processo é aplicado em escala industrial para recuperação de metais como cobre, urânio e ouro, os quais são exemplos de minerais que podem ser recuperados através de lixiviação bacteriana.

As bactérias de enxofre oxidam as formas de enxofre puro e de tiol reduzido de enxofre em sulfatos, que podem ser convertidos em ácidos sulfúricos nos cursos de água que drenam as áreas de mineração, chamadas então de drenagem ácida de mina. Em alguns lugares, a água se torna tão ácida que pode esterilizar o ambiente aquático (Figura 5.17).

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8. Bioplásticos

Vários recipientes e outros itens plásticos são jogados fora e acabam como lixo em beiras de estrada, praias e ruas.

Existem três razões para uma baixa reciclagem de plásticos:

1. é difícil isolar muitos plásticos de outros resíduos, pois as diversas resinas utilizadas em sua fabricação são difíceis de identificar, e alguns plásticos são compostos de diferentes resinas;

2. a recuperação das resinas plásticas individuais não rende muito material, pois apenas pequenas quantidades de determinada resina são utilizadas por produto;

3. o preço ajustado à inflação do petróleo utilizado para produzir petroquí-micos para a fabricação de resinas plásticas é tão baixo que o custo das resinas plásticas virgens é muito menos que o das resinas recicladas.

Obrigar que os produtos plásticos contenham determinada quantida-de de resinas plásticas recicladas não funcionará. Essa medida poderia pre-judicar a utilização de plásticos reciclados ao reduzir o peso e conteúdo do material de inúmeros itens, como sacolas e garrafas plásticas.

A maior parte dos plásticos contém estabilizantes e outras substâncias químicas que devem ser removidas antes da reciclagem.

A Cargill Dow está fabricando recipientes plásticos recicláveis e bio-degradáveis feitos de um polímero chamado polidáctilos (PLA), fabricados com açúcar e xarope de milho. Em vez de serem enviados para os aterros, esses recipientes de bioplástico poderiam ser compostados para produzir um condicionador de solo.

Os genes de Ralstonia metallidurans que codificam para a enzima responsável pela biossíntese do PHB estão sendo transferidos para o milho, uma espécie altamente eficiente na produção de biomassa, o que contri-buirá para a redução dos custos deste plástico biodegradável. A obtenção de indivíduos transgênicos, que apresentam elevada expressão deste gene, certamente colocará o plástico biodegradável de forma mais competitiva no mercado (Figura 5.20).

BAC: cromossomo artificial de bactérias, tipo de vetor de expressão.

Em áreas altamente industrializadas, o pH da chuva pode cair para um valor entre 3 e 4, o que é de 100 a 1.000 vezes a acidez da chuva natural. Em algumas regiões dos Estados Unidos, Canadá e Escandinávia, os rios e lagos nestas regiões tendem a ser oligotróficos, pobre em nutrientes minerais exigido pelas plantas verdes que pertence ao habitat aquático com baixa produtividade e seu pH ácido pode interromper o crescimento e até mesmo matar, peixes e outros organismos.

Algumas soluções para a chuva ácida são principalmente tecnológicas e econômicas como filtrar os gases nocivos dos efluentes das usinas de energia e dos automóveis e encontrar alternativas energéticas para a queima de combustíveis fósseis e reduzir a demanda total por energia.

Biotecnologia em Debate 133

Figura 5.20 – Ciclo de vida dos materiais biodegradáveis/compostáveis na reciclagem orgânica.Fonte: www.google.com.

9. Biocombustíveis

A imensa possibilidade de crescimento da produção brasileira de petróleo na plataforma continental brasileira, não garante o futuro do Brasil dentro de um quadro mundial de preocupação com as condições climáticas.

Mas, o biodiesel e o etanol produzido a partir da cana-de-açúcar, menos poluentes, e festejados como solução, já têm enfrentado várias acusações, de responsáveis pelo aumento mundial dos preços de alimentos à perda de biodiversidade no planeta. As pesquisas com o biocombustível avançam dentro dos laboratórios científicos e a contribuição do conhecimento é cada vez maior para o entendimento das implicações comerciais e ambientais que cercam esse assunto.

9.1 Álcool

A produção do álcool como substituto do petróleo constitui-se na principal arena da aplicação da biotecnologia no Brasil, uma vez que a fermentação é essencial no processo de produção. O seu impacto socioeconômico não se limita, no entanto, a questão da tecnologia de fermentação, mas alcança desde a produção de biomassa (Figura 5.21) até máquinas e equipamentos e envolve o desenvolvimento de novas tecnologias.

Uma exceção de resina plástica que compensa ser reciclada é o PET, usada em garrafas plásticas para refrigerante.

PEREIRA, A. J.134

Figura 5.21 – Exemplos de fontes de biomassa vegetal.Fonte: www.brasilescola.com.

O Programa Nacional do Álcool, pelo menos em sua fase inicial, resul-tou mais da necessidade do governo de economizar petróleo e de defesa da indústria do setor automobilístico. Mesmo assim, à medida que o programa do Álcool começou a consolidar-se, o seu impacto sob o desenvolvimento nacional de biotecnologia aumentou proporcionalmente. Isto teve reflexos diretos na área de pesquisa de fermentação, enzimas e processamento da biomassa e, indiretamente, na pesquisa de fontes de biomassa de maior rendimento.

O programa Pró-Álcool envolve diversos ministérios e comissões e es-tabeleceu uma meta de 10 bilhões e 700 milhões de litros de álcool em 1985. Deste total, as exportações correspondiam a uma pequena porcentagem.

9.2 Biodiesel

Na busca de um combustível biodegradável, foi desenvolvido o biodiesel de-rivado de fontes renováveis. Este biocombustível pode ser produzido a partir de gorduras animais ou de óleos vegetais por dezenas de espécies vegetais do Brasil, tais como mamona, girassol, pinhão manso (Figura 5.22), dendê (palma), babaçu, amendoim e soja, dentre outras.

Figura 5.22 – Sementes de mamona (Ricinus communis), girassol (Helianthus an-nuus) e de pinhão-manso (Jatropha curcas) usadas na produção de biodiesel.Fonte: www.google.com.br.

O bioplástico faz parte de um projeto interessante para a produção de polihidroxibutirato (PHB), um biopolímero biodegradável e renovável, independente do petróleo, que é realizado pela bactéria Ralstonia metallidurans (Alcaligenes eutropus).

A levedura, que é um subproduto da indústria do álcool, após ser enxuta, contém um nível proteico de 30 a 50%.

Biomassa: material constituído principalmente de origem orgânica ou vegetal.

A produção e transformação do etanol e seus subprodutos estão relacionados com as tecnologias avançadas tais como: hidrólise enzimática, engenharia genética e processamento de destilação computadorizado.

Biotecnologia em Debate 135

O biodiesel substitui total ou parcialmente o óleo diesel de petróleo em motores ciclodiesel automotivos de caminhões, tratores, camionetas, automó-veis, etc, ou estacionários, os geradores de eletricidade, calor etc.

Segundo a Lei nº 11.097, de 13 de janeiro de 2005, biodiesel é um “bio-combustível derivado de biomassa renovável para uso em motores a com-bustão interna com ignição por compressão ou conforme regulamento, para geração de outro tipo de energia, que possa substituir parcial ou totalmente combustíveis de origem fóssil”.

A transesterificação é processo mais utilizado atualmente para a pro-dução de biodiesel. Consiste numa reação química dos óleos vegetais ou gorduras animais com o álcool comum (etanol) ou o metanol, estimulada por um catalisador, da qual também se extrai a glicerina, produto com aplicações diversas na indústria química (Figura 5.23).

Figura 5.23 – Esquema geral de obtenção do biodiesel.Fonte: www.biodieselbr.com.

A partir da glicerina, a cadeia produtiva do biodiesel gera uma série de outros coprodutos (torta, farelo etc.) que podem agregar valor e se constituir em outras fontes de renda importantes para os produtores. Dentre inúmeras vantagens na utilização do biodiesel podemos destacar:

• fonte limpa e renovável de energia que vai gerar emprego e renda para o campo, pois o país abriga o maior território tropical do planeta, com solos de alta qualidade que permitem uma agricultura autosustentável do plantio dire-to; topografia favorável à mecanização e é a nação mais rica em água doce;

• é um ótimo lubrificante e pode aumentar a vida útil do motor; tem risco de explosão baixo;

• de fácil transporte e fácil armazenamento, devido ao seu menor risco de explosão;

O biodiesel pode ser usado puro ou misturado ao diesel em diversas proporções. A mistura de 2% de biodiesel ao diesel de petróleo é chamada de B2 e assim sucessivamente, até o biodiesel puro, denominado B100.

PEREIRA, A. J.136

• proporciona ganho ambiental para todo o planeta, pois colabora para dimi-nuir a poluição e o efeito estufa.

• No caso do biodiesel Eco Óleo, o produtor não compra o biodiesel, a co-mercialização é feita por meio de permuta, ou seja, o produtor entrega o girassol e recebe o Eco Óleo.

Mas, como em toda tecnologia, por não ser neutra, o uso de biodiesel apresenta algumas desvantagens como:

• grandes volumes de glicerina previstos só poderão ter mercado a preços muito inferiores aos atuais; todo o mercado de óleo-químicos poderá ser afetado.

• No Brasil e na Ásia, lavouras de soja e dendê, cujos óleos são fontes po-tencialmente importantes de biodiesel, estão invadindo florestas tropicais, importantes fontes de biodiversidade. Embora, aqui no Brasil, essas lavou-ras não tenham o objetivo de ser usada para biodiesel, essa preocupação deve ser considerada.

• Em regiões de clima muito frio, a viscosidade do biodiesel aumenta bastante. Assim como o diesel, podem ocorrer formações de pequenos cristais, que se unem e impedem o bom funcionamento do motor;

• O óxido de nitrogênio pode aumentar até 15% no uso de B100. O NOx é um grande responsável pela baixa qualidade do ar em São Paulo. A boa notícia é que com o uso de aditivos ou alteração nos motores as emissões diminuem consideravelmente.

10. Tecnologia e meio ambiente no debate sobre os limites do crescimento

[...] Do ponto de vista da escassez de materiais, algumas vias de desenvol-vimento tecnológico que muitos textos atuais de “gestão ambiental” conside-ram inovadoras, não eram propriamente novidade em meados dos anos 70. [...] o desenvolvimento de novos materiais (fibras sintéticas, plásticos etc.); a elevação da produtividade dos processos de extração; o desenvolvimento de técnicas para reutilização de sobras de materiais e de resíduos; o desenvolvimento de técnicas para utilização de recursos de minas mais profundas; o melhor aproveitamento dos recursos mais abundantes ou de recursos naturais renováveis. [...] grande parte dos problemas ambientais do mundo atual é resultado do uso de tecnologias “mais baratas” e pouco eficien-tes no uso dos recursos “(...) a poluição ambiental é apenas o resultado da decisão de adotar um método de produção menos custoso”.

[...] Não há, certamente, a esperança de se encontrar na tecnologia uma panaceia para todos os males ou de se gerar soluções definitivas para grande parte dos problemas enfrentados. Consequências insuspeitas

Biotecnologia em Debate 137

da ação humana sobre a qualidade ambiental e sobre as condições de vida são descobertas continuamente.

O avanço de nossos conhecimentos nos tem ensinado que a com-preensão sobre as causas dos problemas ambientais não cessa de evoluir e que as soluções encontradas são necessariamente transitórias. O desen-volvimento de tecnologias “mais limpas” é consequentemente, uma meta que coevolui com o próprio ideal de qualidade ambiental: é um alvo móvel.

Esta argumentação e as recomendações dela decorrentes referem--se à necessidade de gerenciamento da ciência e da tecnologia tendo em vista metas ou rumos desejáveis para as condições ambientais para o de-senvolvimento humano. Neste sentido, podem não constituir proposições exatamente originais. Não será este, pois, o primeiro nem o último trabalho a chamar atenção para o risco do reducionismo econômico no domínio das políticas públicas.

Ao retomar a ideia de que uma intervenção pública mais ampla do que aquela convencionalmente proposta é possível, desejável e neces-sária, referimo-nos, evidentemente, a uma esperança: a de incluir nas po-líticas ambientais (e de ciência e tecnologia) com vistas à promoção de tecnologias “mais limpas”, um planejamento mais ousado sobre os fins, e não apenas sobre os meios. Aqueles que julgarem esta uma esperança utópica, convém lembrar, voltando ao universo mítico, que esta foi o der-radeiro item que ficou no fundo da caixa de Pandora (CORAZZA, 2005).

Síntese do Capítulo

No presente capítulo foram discutidos os principais avanços científicos e bio-tecnológicos aplicados à preservação da qualidade ambiental. Foi relatado também, a importância dos recursos da biodiversidade brasileira, o seu uso e que a exploração da biotecnologia nas utilizações industriais e o meio ambien-te poderão contribuir para um desenvolvimento sustentável.

Também relatou que a utilização responsável dos recursos naturais e a valorização do uso de diferentes tecnologias no tratamento de resíduos e efluentes devido às atividades humanas como mineração e poluição do meio ambiente. Salientou ainda, várias alternativas ambientalmente corretas para o uso racional dos recursos naturais e matérias-primas como aqueles usados na produção de bioplásticos e biodiesel.

A Caixa de Pandora é um artefato da mitologia grega, tirada do mito da criação de Pandora, que foi a primeira mulher criada por Zeus. A "caixa" era na verdade um grande jarro dado a Pandora, que continha todos os males do mundo. Quando Pandora abriu o frasco, todo o seu conteúdo, exceto um item, foi liberado para o mundo. O item remanescente foi a esperança. Hoje em dia, abrir uma "caixa de Pandora" significa criar um mal que não pode ser desfeito.

PEREIRA, A. J.138

Atividades de avaliação

1. Como podemos conciliar a extração de princípios ativos de plantas para uso na indústria de biotecnologia e a conservação ambiental?

2. Pesquise se existe legislação específica para a proteção da fauna e flora no País e no Ceará.

3. Você aceita a posição ética de que todas as espécies têm o direito inerente de sobreviver sem a interferência humana, independentemente de terem qual-quer utilidade para os homens? Você estenderia este direito para o mosquito Aedes aegypti, que transmite a dengue e para as bactérias infecciosas?

4. Você considera que o acesso à informação leva à conscientização e a mu-danças de atitudes? Você observou alguma mudança de atitude em você a partir das informações recebidas? Quais?

5. No Brasil, quais são as leis referentes aos direitos das comunidades tradi-cionais, por exemplo, populações indígenas e quilombolas sobre os recur-sos da biodiversidade?

6. Leia o texto: “Perigo: lixo tecnológico” no sítio: http://revistaescola.abril.com.br/ciencias/fundamentos/perigo-lixo-tecnologico-426131.shtml, depois responda:

a) Quais são os metais pesados mais prejudicam nossa saúde?

b) Como o lixo acaba voltando para nossas casas?

Texto complementar

Economia e Ética: matança ou venda ilegal de espécies selvagensAlgumas espécies protegidas são mortas ilegalmente por causa de suas partes va-liosas ou são vendidas vivas para colecionadores. O crime organizado voltou-se ao contrabando de espécies selvagens em virtude dos grandes lucros envolvidos – supe-rados apenas pelos lucros do comércio internacional de drogas e armas. Pelo menos dois terços de todos os animais vivos contrabandeados em todo o mundo morrem em trânsito. Pessoas pobres lutando para sobreviver em áreas que abrigam ricas reservas de vida selvagem podem matar ou capturar tais espécies na tentativa de ganhar di-nheiro suficiente para sobreviver e alimentar suas famílias. Há outros indivíduos que são caçadores profissionais.

Para os caçadores, um gorila da montanha vivo vale US$ 150 mil, um panda gigante, US$ 100 mil, um chimpanzé, US$ 50 mil e uma arara imperial da Amazônia, US$ 30 mil. Um chifre de rinoceronte pode chegar a US$ 28.600 o quilo, pois é usado em cabos de adagas no Oriente Médio e como remédio para febre e suposto afrodisíaco na China – o

Biotecnologia em Debate 139

maior consumidor da vida selvagem no mundo – e em outras partes da Ásia. Em 1950, estima-se que havia 100 mil tigres no mundo. A despeito da proteção internacional, menos de 7.500 ainda restam nas selvas, cerca de 4.000 deles na Índia. Os tigres-de--bengala estão em risco porque a pele desses animais é vendida por US$ 100 mil em Tóquio. Com as partes do corpo de um único tigre valendo de US$ 5 mil a US$ 20 mil, não é de surpreender que a caça ilegal tenha crescido rapidamente na Índia. Sem uma ação emergente para reduzir a caça e preservar seu habitat, poucos tigres, ou nenhum restarão nas selvas dentro de 20 anos.

À medida que espécies de valor comercial se tornam ameaçadas, sua demanda no mercado negro aumenta. Isso eleva as chances de extinção prematura causada pela caça. Para os caçadores, o dinheiro que conseguem ganhar supera o pequeno risco de serem pegos, multados ou presos.Fonte: MILLER (2007).

Etanol de segunda geração com biogásO etanol de segunda geração, feito com a celulose existente no bagaço da cana-de--açúcar, é uma alternativa importante para aumentar a produção de biocombustível sem prejudicar as plantações de alimentos ou as áreas de preservação ambiental. Mas como seu processo de produção é mais caro que o do etanol de primeira geração – obtido pela fermentação da sacarose do caldo de cana-, é preciso encontrar alter-nativas para torná-lo economicamente viável.

A proposta de um grupo de pesquisadores da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) é aliar a produção do etanol de celulose à produção de biogás e usar os resíduos obtidos no processo como fonte de energia para as usinas [...]. “O bagaço de cana que sobra da fabricação do etanol de primeira geração é hoje queimado e usado pela indústria como fonte de energia elétrica ou térmica em forma de vapor. Quando usamos esse bagaço para fabricar o etanol de segunda geração, conseguimos recuperar apenas 32% da energia que seria obtida com a queima em caldeira”, disse a engenheira química Aline Carvalho da Costa, coordenadora da pesquisa.

No modelo proposto pelos pesquisadores, foi possível recuperar cerca de 65% da energia. A vantagem é o aumento da produção de biocombustível líquido, que pode ser usado para transporte e, por isso, tem um apelo econômico maior. “Além disso, o biogás e os demais resíduos podem ser usados como fonte de energia para a indústria, substituindo o bagaço”, ressaltou Costa. Além da celulose usada na produção do etanol de segunda geração, o bagaço de cana contém hemicelulose – substância composta por açúcares de cinco carbonos chamados pentoses – e lig-nina – material estrutural da planta, responsável pela rigidez, impermeabilidade e resistência dos tecidos vegetais.

Para que essa biomassa possa ser transformada em biocombustível, ela precisa passar por um pré-tratamento que separa a celulose da lignina, substância que impe-de a hidrólise. Esse é um dos passos mais caros e menos maduros tecnologicamente no processo produtivo do etanol de segunda geração. Depois disso, ainda é preciso submeter a celulose à ação de enzimas que vão quebrá-la em várias moléculas de gli-cose para que os microrganismos consigam fazer a fermentação. Esse procedimento é conhecido como hidrólise. “A lignina que sobra depois do pré-tratamento pode ser queimada e usada como fonte de energia.

O mesmo pode ser feito com o resíduo sólido que sobra após a hidrólise. Mas, quando se fala em etanol de segunda geração, a grande pergunta é: o que fazer com as pentoses? Tivemos então a ideia de transformá-las em biogás”, conta Costa. A pesquisadora explica que esse tipo de açúcar não pode ser usado na produção de

PEREIRA, A. J.140

etanol porque os microrganismos não conseguem fermentá-lo de forma eficiente. “Microrganismos geneticamente modificados conseguiriam, mas isso exigiria uma in-fraestrutura de biossegurança nas usinas que tornaria a produção inviável no cenário brasileiro atual, embora isso possa mudar a longo prazo”, disse. [...]

Por meio de um processo de digestão anaeróbica, feito por um conjunto de bacté-rias capazes de degradar a matéria orgânica, os pesquisadores conseguiram transfor-mar essas pentoses em biogás. [...].

Embora seja possível obter biocombustível a partir de praticamente qualquer biomas-sa vegetal, o Brasil tem investido no bagaço de cana por esse ser um insumo abundante e que já está na usina, dispensando gasto com transporte. “Também pesquisamos a produ-ção de etanol usando como matéria-prima a palha da cana, que representa um terço da planta e hoje não é aproveitada. Os resultados parciais têm se mostrado bastante seme-lhantes aos obtidos com a produção de etanol a partir do bagaço”, disse Costa. fonte: TOLEDO (2012).

Leituras, filmes e sites@

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MILLER JR., G. T. Ciência ambiental. São Paulo: Thomson Learning, 2007.

Vídeos

Lixo extraordinário

http://www.youtube.com/watch?v=udpDCiLrg4k

Plantas medicinais. Um saber ameaçado

http://www.youtube.com/watch?v=oVJ7SsHGH3c

Biocombustíveis e sustentabilidade

http://www.youtube.com/watch?v=fdBClP9LWDo

Biodiesel-Documentário

http://www.youtube.com/watch?v=zVD5ntYcvdk&feature=related

Biotecnologia em Debate 141

Sites

http://www.biotecnologia.com.br

http://www.cenargen.embrapa.br

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Biotecnologia em Debate 143

Sobre o autor

Álvaro Julio Pereira: é biólogo, licenciado pela Universidade Estadual de Maringá, UEM-PR. Fez Mestrado em Agronomia na área de Genética Vegetal pela Universidade Estadual de Maringá, UEM-PR e Doutorado em Genética e Melhoramento pela Universidade Federal de Viçosa-MG. É professor de ge-nética desde 2003, na Universidade Estadual do Ceará, campus da FACE-DI em Itapipoca. Tem experiência na área de Genética e Biologia Molecular, atuando principalmente nos seguintes temas: Genética molecular de micror-ganismos, vírus.

A não ser que indicado ao contrário a obra Biologia Evolutiva, disponível em: http://educapes.capes.gov.br, está licenciada com uma licença Creative Commons Atribuição-Compartilha Igual 4.0 Internacional (CC BY-SA 4.0). Mais informações em: <http://creativecommons.org/licenses/by-sa/4.0/deed.pt_BR. Qualquer parte ou a totalidade do conteúdo desta publicação pode ser reproduzida ou compartilhada. Obra sem fins lucrativos e com distribuição gratuita. O conteúdo do livro publicado é de inteira responsabilidade de seus autores, não representan-do a posição oficial da EdUECE.

Fiel a sua missão de interiorizar o ensino superior no estado Ceará, a UECE, como uma instituição que participa do Sistema Universidade Aberta do Brasil, vem ampliando a oferta de cursos de graduação e pós-graduação

na modalidade de educação a distância, e gerando experiências e possibili-dades inovadoras com uso das novas plataformas tecnológicas decorren-

tes da popularização da internet, funcionamento do cinturão digital e massificação dos computadores pessoais.

Comprometida com a formação de professores em todos os níveis e a qualificação dos servidores públicos para bem servir ao Estado,

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ral e se articulam com as demandas de desenvolvi-mento das regiões do Ceará. Bi

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