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111 XVIII Seminário Internacional de Formação de Professores para o MERCOSUL/CONE SUL De 03 a 05 de novembro de 2010 Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC. Florianópolis – Santa Catarina – Brasil BRASIL O CURSO DE FORMAÇÃO DE DOCENTES EM NÍVEL MÉDIO, NA MODALIDADE NORMAL NO ESTADO DO PARANÁ: UM OLHAR SOBRE A PRÁTICA DE ENSINO ALMEIDA, Marcia Aparecida Silita de Faculdade Anglo-Americano-Brasil. ALMEIDA, Janaina Aparecida de Mattos Universidade Estadual do Oeste do Paraná Brasil MARTINS, Fernando José Universidade Estadual do Oeste do Paraná-Brasil [email protected] Resumo As políticas neoliberais que alteram o contexto econômico mundial a partir da década de 1990 atingem, também, o setor educacional no estado do Paraná. Isso se manifestou de diferentes formas como a precarização das relações de trabalho, a redução de investimentos governamentais na educação e a determinação do encerramento dos cursos profissionais, entre os quais o de formação de docentes. Alguns resistiram e se mantiveram funcionando mesmo tendo sua carga horária reduzida. A partir de 2004, novas políticas são adotadas e os cursos são reformulados. Neste novo modelo a Prática de Formação (Estágio Supervisionado) ganha espaço e importância. Este estudo retrata a pesquisa realizada em um colégio estadual que oferta o curso de formação de docentes em nível médio. Palavras-chave: Formação de professor. Políticas para formação de professores em nível médio. Estágio supervisionado. Intr odução Nas últimas décadas, nos cursos de formação de docentes, o Estágio Supervisionado como componente curricular foi desenvolvido a partir de diferentes conceitos, de acordo com o momento histórico, as características dos cursos e suas

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XVIII Seminário Internacional de Formação de Professores para o MERCOSUL/CONE SUL De 03 a 05 de novembro de 2010 Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC. Florianópolis – Santa Catarina – Brasil

BRASIL

O CURSO DE FORMAÇÃO DE DOCENTES EM NÍVEL MÉDIO, NA

MODALIDADE NORMAL NO ESTADO DO PARANÁ: UM OLHAR SOB RE A

PRÁTICA DE ENSINO

ALMEIDA, Marcia Aparecida Silita de

Faculdade Anglo-Americano-Brasil. ALMEIDA, Janaina Aparecida de Mattos

Universidade Estadual do Oeste do Paraná Brasil MARTINS, Fernando José

Universidade Estadual do Oeste do Paraná-Brasil

[email protected]

Resumo

As políticas neoliberais que alteram o contexto econômico mundial a partir da década

de 1990 atingem, também, o setor educacional no estado do Paraná. Isso se manifestou

de diferentes formas como a precarização das relações de trabalho, a redução de

investimentos governamentais na educação e a determinação do encerramento dos

cursos profissionais, entre os quais o de formação de docentes. Alguns resistiram e se

mantiveram funcionando mesmo tendo sua carga horária reduzida. A partir de 2004,

novas políticas são adotadas e os cursos são reformulados. Neste novo modelo a Prática

de Formação (Estágio Supervisionado) ganha espaço e importância. Este estudo retrata

a pesquisa realizada em um colégio estadual que oferta o curso de formação de docentes

em nível médio.

Palavras-chave: Formação de professor. Políticas para formação de professores em

nível médio. Estágio supervisionado.

Intr odução

Nas últimas décadas, nos cursos de formação de docentes, o Estágio

Supervisionado como componente curricular foi desenvolvido a partir de diferentes

conceitos, de acordo com o momento histórico, as características dos cursos e suas

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finalidades. A temática é objeto de estudo de conceituados educadores como Pimenta

(2004; 2006), André (2001) e Lima (2004), que consideram o estágio um importante

componente curricular na formação de professores, uma vez que, contribui para o

conhecimento e melhoria do entendimento da real problemática do processo de ensino-

aprendizagem.

Este texto busca fazer alguns apontamentos acerca do tema a partir de estudos

bibliográficos e da análise do curso de formação de docentes, em nível médio, na

modalidade normal, em um colégio da rede pública estadual do Paraná, no município de

Foz do Iguaçu.

Apresenta-se dividido em momentos: a primeira parte trata-se de um breve

histórico do curso de formação de docentes em nível médio nas últimas duas décadas no

estado do Paraná, suas modificações e alterações em função de determinadas políticas

educacionais adotadas; a segunda parte aborda as diferentes concepções de estágio a

partir de pesquisadores que se dedicam ao tema; no terceiro momento apresenta

pesquisa realizada no colégio pesquisado e as intervenções realizadas junto à

comunidade escolar e os resultados desse processo.

1 Histórico do curso de formação de docentes no Estado do Paraná, nas duas

últimas décadas.

De acordo com as análises apontadas por Mészaros (2002); Antunes (2004);

Oliveira (2004); Pinto (2007), a crise estrutural que atingiu o capitalismo na segunda

metade do século XX obrigou o sistema a reorganizar suas formas de produção como

modo de garantir sua sobrevivência uma vez que o sistema produtivo baseado nos

princípios do taylorismo/fordismo já não atendia as necessidades constantes de elevação

dos níveis de acumulação do capital.

A busca por soluções para crise do capitalismo encontra nos princípios

econômicos liberais uma possibilidade. Na medida em que tais princípios são retomados

e aplicados na economia há consideráveis mudanças não só no modo produtivo e nas

relações de trabalho como nos mais diferentes setores da sociedade, inclusive no âmbito

educacional.

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Em meados da década de 1990 o Estado do Paraná adotou mudanças nos rumos

da educação seguindo a lógica neoliberal para as políticas sociais que introduzem

mecanismos de mercado no setor educacional acompanhando a tendência que

caracterizava aquele momento histórico, de adequação desta às necessidades do

capitalismo de acumulação flexível.

Foi nos anos de 1990 [...] que a reestruturação produtiva do capital desenvolveu-se intensamente em nosso país, através da implantação de vários receituários oriundos da acumulação flexível e do ideário japonês, com a intensificação da lean production, do sistema de Just-in-time, kanban, do processo de qualidade total, das formas de subcontratação e de terceirização da força de trabalho. (ANTUNES, 2004, p.18).

A reestruturação produtiva chegou ao chão da escola paranaense concretamente

a partir de 1995, com a gestão Lerner (1995-2002), pode-se afirmar que a educação

pública sofreu todas as mudanças oriundas do setor produtivo. Em relação aos Cursos

Profissionalizantes essas mudanças ficaram evidentes quando em outubro de 1996, a

Secretaria de Estado da Educação do Paraná determinou o fechamento das matrículas de

todos os cursos profissionalizantes, inclusive o Magistério, ao mesmo tempo em que

propõe o Programa de Melhoria e Expansão do Ensino Médio (PROEM) que previa a

estruturação do Ensino Profissionalizante como “Pós-Médio”, desvinculando o Ensino

Médio do Ensino Profissional. O referido programa tinha o propósito de redefinir o

ensino médio no Estado adaptando-o às novas exigências do mercado seguindo as

determinações dos organismos externos que o financiavam. Esse período foi marcado,

também, pela precarização das relações de trabalho com a contratação de professores

temporários e por uma organização pedagógica inspirada nas teorias de administração

da Qualidade Total.

Outra medida tomada neste momento foi a criação da PARANATEC – Agência

para o Desenvolvimento do Ensino Técnico do Paraná; uma agência com características

e funções privadas que se tornou responsável pela expansão dos cursos

profissionalizantes no Estado e por dar aporte institucional público para o setor privado

que passa a ofertar o ensino profissional. Isso, de certa forma, exclui um número

significativo de educando de baixa renda, sem condições de pagar por essa formação.

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No entanto o fechamento dos cursos profissionalizantes não se deu sem

resistências e, algumas escolas não obedeceram às orientações da Secretaria de Estado

da Educação (SEED), mantendo seus cursos funcionando. Essa luta teve a participação

direta de diretores, coordenadores, professores e da comunidade que entendiam que

cabia ao poder público – Estado- a manutenção dos cursos na perspectiva em que

vinham ocorrendo, associando a formação humana e profissional.

Em todo o Estado quatorze escolas resistiram e mantiveram seus cursos de

Magistério, mesmo sob ameaças e fortes pressões da Secretaria de Estado da Educação

e, conseqüentemente, do braço estendido do estado representado pelo do Núcleo

Regional de Educação.

Os cursos de magistério que permaneceram sendo ofertados tiveram a matriz

curricular alterada e a sua carga horária total foi reduzida. O Estágio passa a ser

denominado “Docência”, ficando limitado apenas ao 4º ano, com carga horária de

240h/aula. Tal mudança representou, no entendimento desse estudo, uma grande perda

de qualidade dos cursos.

Apesar das constantes pressões essas escolas resistiram e ganharam credibilidade

e o respeito da sociedade local onde estão inseridas, de acordo com relatos dos

professores em reuniões pedagógicas e leitura da Proposta Curricular do Curso de

Formação de Docentes (2004, 2006) em que é apresentado um histórico do curso

normal no estado do Paraná.

1.1. A retomada do curso de formação de docentes

Em 2003, assume o governo do Estado do Paraná Roberto Requião da Silva e

Mello, com isso, definiu novas políticas para a educação paranaense, o que de acordo

com as propostas de governo iria por fim a quase uma década de uma orientação

educacional declaradamente liberal, adotando como a tendência pedagógica da SEED a

pedagogia histórico-crítica, proposta por Dermeval Saviani no inicio da década de 1980.

Trata-se de uma tendência pedagógica progressista e cujo pressuposto é o materialismo

histórico dialético.

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[...] a concepção pressuposto nesta visão da pedagogia histórico-crítica é o materialismo histórico, ou seja, a compreensão da história a partir do desenvolvimento material, da determinação das condições materiais da existência humana (SAVIANI, 1997, p. 88).

Da mesma forma incluiu-se nas propostas da secretaria a oferta do curso de

Formação de Docentes em Nível Médio, anteriormente denominado curso de

Magistério. Este continua a ser ofertado nos estabelecimentos que resistiram ao seu

fechamento e passa a ser ofertado em outros estabelecimentos, inclusive na forma de

aproveitamento de estudos, destinados àqueles que já concluíram o Ensino Médio.

Entendeu-se, neste momento, que a necessidade de profissionais para o exercício da

docência na Educação Infantil e Séries Iniciais do Ensino Fundamental poderia ser

suprida com os profissionais formados em nível médio, como prevê a LDB, Lei 9394/96

de 20 de dezembro de1996, no Artigo 62:

A formação de docentes para atuar na educação básica far-se-á em nível superior, em cursos de licenciatura, de graduação plena, em universidades e institutos superiores de educação, admitida, como formação mínima para o exercício do magistério na educação infantil e nas quatro primeiras séries do ensino fundamental, a oferecida em nível médio, na modalidade Normal (LDB, 1996).

Cabe ressaltar aqui que, ao mesmo tempo em que retoma o curso de formação de

docentes em nível médio a secretaria de educação do estado busca a expansão de vagas

para esta formação no ensino superior, junto à Secretaria de Estado da Ciência e

Tecnologia, por entender o primeiro como a formação inicial, ainda necessária, já que o

Direito à Educação no Ensino Superior Público ainda não está garantido à todos.

Ocorre, então, uma reformulação do curso na sua totalidade, o que contou com a

participação de representantes das escolas que mantiveram o curso, profissionais da

secretaria de educação e de diversas universidades e que ocorreu em vários encontros no

decorrer do ano de 2003 na cidade de Curitiba.

A nova proposta, ainda experimental, que passa a vigorar em 2004, é calcada

numa visão educacional em que o trabalho é o eixo do processo educativo, e tem a

práxis como principio curricular conforme explicitado na proposta pedagógico

curricular do curso, elaborada coletivamente no momento de sua reformulação e

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publicada pela Secretaria de Estado da Educação do Paraná. Alguns ajustes foram feitos

na matriz curricular e a proposta definitiva do curso é publicada no ano de 2006.

Dentro dessa nova reorganização do Curso Normal em nível médio há um

componente curricular que aparece como eixo central nas discussões dos educadores a

prática de ensino, o estágio supervisionado dos futuros professores da educação básica,

cuja perspectiva tinha se reduzido ao último ano do curso e de forma estreitamente

precarizada.

1.2. O Estágio na atual organização do curso

Na atual organização do curso de formação de docentes, que tem uma carga

horária total de 4800h/aula, a disciplina de Estagio Supervisionado foi contemplada

com 800 horas/aula, distribuídas nas quatro séries do curso.

A proposta da Pratica de Formação (Estágio) estabelece um eixo temático para

cada uma das quatro séries do curso, a partir das quais o trabalho pedagógico deve

ocorrer de forma a permitir a participação das demais disciplinas da série no processo de

teorização, problematização, elaboração de hipóteses e busca de soluções para as

questões pedagógicas de forma a se chegar à compreensão do trabalho educativo.

[...] o trabalho educativo é o ato de produzir, direta e intencionalmente, em cada indivíduo singular, a humanidade que é produzida histórica e coletivamente pelo conjunto dos homens (SAVIANI, 1997, p.17).

De acordo com o projeto do curso de Formação de Docentes as temáticas que

norteiam o trabalho da Prática de Formação (Estágio) em cada série são as seguintes:

a. na primeira série: os sentidos e significados do trabalho do

professor/educador;

b. na segunda série: a pluralidade cultural, as diversidades, as desigualdades

e a educação;

c. na terceira série: condicionantes da infância e da família no Brasil e os

fundamentos da educação infantil;

d. na quarta série: as experiências práticas de ensinar.

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O trabalho a ser desenvolvido em cada uma das séries deve envolver atividades

de visitas às diferentes instituições de ensino, observações a partir de roteiros

previamente elaborados, problematização de situações diversas, leituras para

fundamentação teórica, investigação de aspectos da realidade, elaboração de relatórios,

entre outras atividades que contribuam para a compreensão da especificidade do

trabalho educativo.

O que se busca é a realização de práticas pedagógicas que não se limitem à

simples repetição de práticas já existentes. É fundamental que o contexto social,

político, econômico onde essas práticas são realizadas sejam compreendidas, bem como

a escola nos seus aspectos internos e externos. O que permitirá aos futuros professores o

entendimento da práxis pedagógica e da natureza do trabalho do professor. Pois, como

aponta Pimenta (2004); Lima (2004):

O reducionismo dos estágios às perspectivas da prática instrumental e do criticismo expõe os problemas na formação profissional docente. A dissociação entre teoria e prática aí presentes resulta em um empobrecimento das práticas nas escolas, o que evidencia a necessidade de explicitar por que o estágio é teoria e prática (e não teoria ou prática) (PIMENTA, 2004, p.41).

No cotidiano da formação de professores pode-se observar o trabalho isolado de

determinadas disciplinas, dificultando o desenvolvimento da visão de totalidade. O que

se deve fazer presente ao longo de todo o processo é a identificação das finalidades da

educação, os porquês, as interferências, a análise de situações relacionadas ao ensinar e

ao aprender. Neste sentido o Estágio pode se constituir num espaço da práxis. O

momento de relação entre toda a fundamentação teórica e as situações reais dos

diferentes ambientes escolares.

A práxis só se concretiza na efetivação da atividade prática. Não é uma atividade

nem puramente teórica, nem puramente prática.

A práxis se apresenta como uma atividade material, transformadora e adequada a fins. Fora dela, fica a atividade teórica que não se materializa, na medida em que é atividade espiritual pura. Mas, por outro lado, não há práxis como atividade puramente material, isto é, sem a produção de fins e conhecimentos que caracteriza a atividade teórica (Vasquez, 2007, p. 237).

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A educação não pode se reduzir ao utilitarismo, ao imediatismo; a educação é

um processo de formação, de humanização. Tem, portanto, uma finalidade, uma

intencionalidade explicita ou não. Da mesma maneira, a formação de professores

apresenta essas mesmas características.

2 As práticas de estágio: desafios

Pesquisas realizadas por Pimenta (2006) apontam diferentes etapas na realização

do Estagio: observação, participação e intervenção. Na primeira situação o aluno

compara a realidade apreendida em sala de aula do curso de formação com as situações

reais da escola, que não se limitam ao processo de ensino-aprendizagem, mas envolve

os diferentes aspectos da escola. Na segunda situação o estagiário participa mais

ativamente das atividades escolares, auxiliando o professor no desenvolvimento das

atividades docentes. Na terceira situação o estagiário assume a regência da sala de aula

ou de projetos, o que pode ocorrer com a cooperação com a professora, ou não.

Todas as situações citadas acima são importantes para a compreensão das

relações que se estabelecem no interior da escola e que não se limitam ao processo de

ensino-aprendizagem. É preciso estabelecer vínculos entre os diferentes conhecimentos

e a realidade da escola, considerando o contexto no qual ela está inserida.

Segundo Pimenta, (2004):

Esse conhecimento envolve o estudo, a análise, a problematização, a reflexão e a proposição de soluções às situações de ensinar e aprender. Envolve experimentar situações de ensinar, aprender a elaborar, executar e avaliar projetos de ensino não apenas nas salas de aula, mas também nos diferentes espaços da escola. Por isso, é importante desenvolver nos alunos futuros professores habilidades para o conhecimento e a análise das escolas, bem como das comunidades onde se insere, (PIMENTA, 2004, p.55).

O desafio que se apresenta ocorre durante o processo de formação: articular o

que se teoriza e o que se pratica, considerando-se que o trabalho docente é coletivo. O

trabalho escolar é resultado de ações coletivas de um grupo de profissionais, inseridos

em um determinado contexto institucional, histórico, cultural, político e econômico.

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Embora o estágio tenha fundamental importância na formação docente não pode ser a

única disciplina responsável por inserir o aluno no universo real das instituições de

ensino. Essa preocupação deve permear todo o processo de ensino-aprendizagem.

Outro aspecto a ser considerado é que as práticas de estágio estão subordinadas a

uma concepção de estágio que, segundo Pimenta (2004), se dividem em três modelos:

a- A prática como imitação de modelos – se caracteriza pela realização de estágio a partir da observação de professores mais experientes e da reprodução ou reformulação de suas práticas; b- A prática como instrumentalização técnica – se caracteriza pelo domínio do fazer, por meio da utilização de determinadas técnicas, sem a reflexão sobre a teoria correspondente. c- O estágio como pesquisa e a pesquisa no estágio – se caracteriza pelo estabelecimento de relações entre todos os elementos que constituem a espaço escolar e as ações ali desenvolvidas, a problematização e a investigação em busca de novos conhecimentos.

A pesquisa que se desenvolveu partiu desses pressupostos supra citados e buscou

a compreensão de como as atividades de estágio se desenvolvem no decorrer do curso

de formação de docentes além de, coletivamente, analisar e propor possíveis alterações

dessa realidade.

3 Pesquisa:

Ao longo dos anos de 2008 e 2009, investigou-se a prática do estágio no curso

de formação de docentes. Inicialmente fez-se a análise do projeto do curso e do projeto

de estágio; professores e coordenadores foram questionados acerca das práticas

pedagógicas realizadas e, a partir destas informações foi traçado uma proposta de

discussão ao tema investigado. As ações realizadas dizem respeito à ampliação de

conhecimentos sobre o estágio, uma vez que as investigações apontaram uma lacuna no

que se refere a esse aspecto. Isso se deu por meio de reuniões para discussão da temática

em diferentes momentos.

Iniciando a pesquisa na escola fez-se uma analise sobre o currículo do curso

em especial atenção a disciplina de prática de ensino. Posteriormente, a leitura dos

documentos aplicou-se um questionário com os professores para todos os professores da

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escola uma vez que havia sido constatado pouco conhecimento do assunto, o que gerava

uma série de questionamentos dos professores e da direção sobre a carga horária e os

encaminhamentos feitos pelos professores do curso de formação, uma vez, que o

Colégio pesquisado atende também ao ensino fundamental - séries finais e ensino

médio. O que chegava, inclusive, a gerar desconfianças e constrangimentos, pois o

estágio era considerado por muitos professores que não trabalham com o Curso

Profissionalizante como desnecessário e “enrolação”.

Na primeira reunião Contrariamente ao esperado, muitos professores não tinham

conhecimento de tais documentos, não haviam participado de sua elaboração por não

fazerem parte do quadro de funcionários na época ou não tiveram interesse de consultá-

los, embora os mesmos estivessem à disposição. Muitas dúvidas foram esclarecidas,

especialmente àqueles profissionais que não atuam nas disciplinas específicas do curso

ou mesmo que atuam na escola, em outro nível de ensino. A partir daí observou-se um

outro olhar para o estágio, por parte desses sujeitos.

Aqui, evidencia-se que a participação nos processos decisórios da instituição,

bem como na elaboração dos documentos que direcionam o trabalho docente é de

fundamental importância para que os envolvidos se percebam como sujeitos do

processo, responsáveis pelo desenvolvimento de um trabalho que é coletivo e não

individual. Veiga (2004) ao se referir à elaboração do projeto político pedagógico, e que

certamente se aplica à elaboração de outros documentos que tem como propósito a

condução do trabalho pedagógico na escola.

A etapa seguinte da intervenção foi mais específica, e que envolveu os

professores da disciplina de estágio, foi à elaboração conjunta do planejamento anual

para cada uma das séries do curso. A discussão teve como referencia a proposta

curricular para o curso de formação de docentes elaborada pela SEED/PR, na ocasião da

sua reestruturação. Vários apontamentos foram feitos pelos docentes em relação à

organização das atividades destinadas a cada série, mas, a mais significativa foi a

incoerência entre a matriz curricular e os temas propostos para cada série, além de uma

ênfase demasiada para a Educação Infantil em detrimento das séries iniciais do Ensino

Fundamental. Foram necessários dois encontros posteriores para que o planejamento

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anual de cada série pudesse ser elaborado, considerando a grande quantidade de

propostas apresentadas. Algumas alterações foram feitas a fim de atender as

especificidades do alunado e as características das instituições que recebem os

estagiários. Ao final o trabalho, sempre contando com a participação da grande maioria

dos professores, foi concluído e sistematizado pelos coordenadores de curso e de

estágio.

Ainda no primeiro semestre de 2009, iniciou-se um grupo de estudos destinado

aos professores do curso de formação de docentes, cujos objetivos foram a) Analisar as

Políticas Públicas em relação o Proposta Pedagógica Curricular do Curso de Formação

de docentes da Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental, em nível

médio na modalidade normal para rede estadual de ensino paranaense; b) Analisar as

diretrizes presentes na Proposta Pedagógica Curricular do Curso de Formação de

Docentes da Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental, em nível médio

na modalidade normal para rede estadual de ensino paranaense para a Prática de

Formação – Estágio Supervisionado; c) Discutir e apontar caminhos para as questões da

Prática de Formação - Estágio Supervisionado buscando estabelecer relações entre as

práticas cotidianas e a fundamentação teórica; d) Promover estudo e ciclos de debates

sobre a temática da Prática de Formação de Professores ampliando as possibilidades de

intervenção nas práticas pedagógicas da escola pública.

O grupo de estudos foi organizado como projeto de extensão da universidade –

Unioeste. Embora tenha ocorrido ampla divulgação do curso e o convite tenha se

estendido a todos os profissionais da escola, apenas um pequeno número de pessoas

demonstrou interesse e participou efetivamente das suas seis etapas. Ao investigar as

razões da pouca participação constatou-se que cerca de cinqüenta por cento dos

professores que ministram aulas de estágio e de outras disciplinas específicas do curso

de formação de docentes não fazem parte do quadro efetivo de professores da SEED,

são contratados por tempo determinado por meio de Processo Seletivo Simplificado

(PSS), ou são profissionais lotados em outras escolas e que assumem aulas em caráter

extraordinário para ampliar sua carga horária semanal. A questão foi discutida pelos

participantes do grupo de estudos e algumas observações foram feitas: a) o fato de não

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haver vinculo efetivo com a escola faz com que os professores não se sintam parte

integrante do processo; b) Não há interesse em participar de cursos fora do horário de

trabalho por não ocorrer benefícios para a carreira; c) os professores não dão

continuidade no trabalho que se iniciou no ano anterior; há grande rotatividade e troca

de professores que chega a comprometer o trabalho do grupo.

Neste aspecto, é possível identificar que a precarização das relações de trabalho

citada no início deste texto, que marcaram a segunda metade da década de 1990 e o

início deste século, persistem. A educação paranaense ainda apresenta um número

significativo de profissionais atuando nas escolas com vínculo empregatício temporário.

Outra questão levantada pelo grupo de estudos é a carência de material

bibliográfico para atender as necessidades de uma formação adequada aos alunos. Na

ocasião da reestruturação do curso a SEED assumiu o compromisso de ampliação do

acervo da biblioteca no que se refere às áreas específicas da docência. Isso, no entanto,

não se concretizou o que obriga os professores a improvisar, uma vez que grande parte

dos alunos não dispõe de recursos financeiros para aquisição de toda bibliografia

indicada nas diferentes disciplinas específicas.

No entanto, os estudos e discussões demonstraram que a ausência de clareza em

relação às concepções de estágio e a pouca fundamentação teórica sobre a temática por

parte dos professores é o principal problema para o entendimento do trabalho que se

realiza. Esse fator dificulta que se estabeleçam relações entre as diferentes disciplinas,

tanto específicas quanto as do núcleo comum, com as atividades de estágio e o trabalho

acaba por ocorrer de maneira fragmentada.

Outra questão que merece destaque é o posicionamento tomado por muitos dos

professores participantes da pesquisa e do grupo de estudos, em relação ao seu papel

como sujeito do processo de ensino-aprendizagem. Evidenciou-se que ocorre certa

apatia quando o assunto é buscar soluções para os problemas que se apresentam. Há

uma espera permanente de que as soluções sejam determinadas por agentes externos à

escola, quer seja o Núcleo Regional de Educação, quer a Secretaria de Estado da

Educação. Tal posicionamento, talvez, possa ser explicado pela ausência quase que total

de capacitações específicas para os professores do curso de formação de docentes que

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acabam se sentindo desamparados e, também, pela escassez de recursos pedagógicos

específicos. Por outro lado, há um grupo bastante comprometido com a melhoria do

curso e preocupado para que o projeto pedagógico do curso seja, efetivamente,

compreendido por todos e se torne realidade enquanto prática pedagógica

transformadora.

Consideraçoes finais:

O estudo ora realizado aponta para o histórico recente da educação paranaense e

do curso de formação de docentes em nível médio, na modalidade normal, destacando

os diferentes momentos que marcaram sua trajetória nos últimos anos e um olhar a

prática de ensino. As mudanças de concepções que marcaram os diferentes governos

deixaram marcas profundas na escola, uma vez que não houve participação efetiva dos

docentes e das comunidades escolares em geral nas decisões relativas ao processo

educacional. A eles coube apenas se adaptar e, em alguns poucos casos, resistir.

Naquilo que se refere especificamente ao curso de formação de docentes

pesquisado, ainda há um longo trabalho a ser realizado no interior da escola para se

compreendam as possibilidades de transformações a partir dos sujeitos que realizam

diariamente a ação docente. A continuidade dos estudos passou a ser uma intenção do

grupo que começa a se perceber como atores do processo, capazes de tomar decisões

sobre suas práticas e, consequentemente, de alterá-las sem necessidade de intervenções

externas.

Referências Bibliográficas:

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XVIII Seminário Internacional de Formação de Professores para o MERCOSUL/CONE SUL De 03 a 05 de novembro de 2010 Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC. Florianópolis – Santa Catarina – Brasil

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