carnaval tinhorao

Upload: vinicius-padilla

Post on 04-Apr-2018

214 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

  • 7/31/2019 Carnaval Tinhorao

    1/3

    Trechos, sobre a histria da msica de carnaval, do livro "Pequena Histria da Msica Ppular" de Jos Ramos Tinhoro.(Editora Vozes, 3 edio, 1978)

    O carnaval brasileiro origina-se do Entrudo, reminiscncia das festas pags greco-romanas que aconteciam em dezembro e fevereiro em comemorao s colheitas, quando se permitia liberdade aos escravos, usavam-se mscaras, vestiam-se fantasias e se comiae bebia desbragadamente.

    O entrudo limitou-se, at meados do sculo XIX, a uma festa em que os escravos da Colnia e do Imprio saiam em correrias pelas ruas, sujando-se uns aos outros com farinha de trigo e polvilho, enquanto as famlias brancas, refugiadas em suas casas, divertiam-se derramando pelas janelas tinas de gua suja sobre os passantes, enquanto comiam e bebiam como os antigos num clima de quebra consentida da extrema rigidez da famlia patriarcal.

    Nestas brincadeiras no havia um mnimo de organizao que exigisse um ritmo, e muito mnos qualquer tipo de cantiga.

    A partir de 1840, quando se anuncia no Teatro So Jos um "baile de mscara como se usa na Europa, por ocasio do carnaval", que os bailes pblicos, explorados por partic

    ulares, se transformam no reduto de diverso da gente branca do Rio de Janeiro.

    A essa altura, s faltava o aparecimento de um ritmo capaz de sustentar o clima dediverso. E esse ritmo surgiu em 1844: era a dana de par enlaado europia denominadade polca. Nestes bailes de mscaras realizados da em diante com regularidade nos teatros do Rio de Janeiro, a polca imperou sobre valsas, schottisches e mazurcas,reafirmando a sua condio histrica de primeiro gnero de msica carnavalesca de salorasil. Mas s foi a partir de 1880 que a msica dos bailes de teatro passa a incluirum corpo de coros, encarregado de entoar as letras das canes.

    A passagem do entrudo para o carnaval moderno no mbito da classe mdia branca limit

    ou-se a imitar os costumes e estilo dos seus equivalentes nos pases mais desenvolvidos, no caso e na poca, alguns pases europeus.

    Era na rea popular que se verificou o processo criativo e autntico do carnaval brasileiro. Obrigado adoo de formas mais disciplinadas de brincar nas ruas, por fora e repetidas represses policiais contra o entrudo, o povo lembrou-se de paganizara estrutura das procisses, e no decorrer da segunda metade do sculo XIX apareceramos cordes.

    Os cordes, inspirados nas alas de certas procisses, onde se permitiam cantos e danas de carter dramtico, foram os primeiros ncleos de criadores da autntica msica de

    naval.

    Integrados por negros e mestios, e logo depois pelos brancos das camadas mais humildes, os cordes apresentavam-se como uma massa mais ou menos compacta de fantasiados, que, ao som de instrumentos de percusso, avanavam pelas ruas de forma mais ou menos anrquica, uma vez que cada folio danava livremente os passos que a msica lhsugeria.

  • 7/31/2019 Carnaval Tinhorao

    2/3

    A Marcha nasceu da necessidade de um ritmo marchado, necessariamente binrio, comacentuao do tempo forte, e cuja marcao deveria facilitar o avano da massa de foliprimeira marcha Abre Alas de Chiguinha Gonzaga, lanada no carnaval de 1870, parase vulgarizar, teria que esperar pelo menos 20 anos, at que os cordes deixassem de ser coisa exclusivamente de negros para admitir a mestiagem e o semi-erudismo de msicos que os transformariam em verdadeiras orquestras ambulantes.

    Em 1870, o ainda catico carnaval de rua ia ganhar uma cano especialmente adaptada ao conhecido ritmo de bumbos do chamado Z Pereira (os tocadores de bumbos enormesque, na regio do Minho, em Portugal, acompanhavam as procisses ao lado dos tocadores de gaitas de fole). Pelas dcadas de 1850 e 1860, as figuras dos portugueses tocadores de bumbos, passam a ser obrigatrias do carnaval de rua. A emulao dos grupode Z-Pereiras era feita na base da maior potncia das batidas, sem produzir qualquer espcie de msica. Em meados de 1869, uma pea de atores franceses apresenta uma cena onde as batidas do bumbo passaram a servir de acompanhamento para uma pequenacomposio. Logo os versos em francs foram substitudos e os tocadores de Z-Pereiras earam a acompanhar suas batidas cantando a letra adaptada ao gosto da maioria.

    A partir de ento, as msicas que mais agradavam, saam das revistas de teatro e ganhavam as ruas, passando a ser cantadas pelo povo no carnaval, ou eram lanadas peloscompositores annimos na Festa da Penha. Com a chegada de imigrantes e migrantesao Rio de Janeiro, aprofundou-se o caos sonoro desses carnavais do fim do sculo X

    IX, levando os folies a cantarem at trechos de peras no carnaval.

    Podemos afirmar que o clmax desta confuso musical aconteceu no carnaval de 1916, porque em 1917, Donga e Mauro de Almeida, lanaram a composio Pelo Telefone, o gnero estinado a fixar, afinal, o primeiro ritmo legitimamente carnavalesco e popularde todo o Brasil: o samba.

    A criao do samba, inicialmente muito preso aos requebrados do maxixe (ao menos quando apareciam gravados em disco), revelava-se ainda assim um pouco mais rude aoouvido das camadas mdias muito mais ligadas tradio meldica europia, do que comica herdada dos negros africanos, atravs dos seus filhos e netos, componentes das

    ltimas camadas da populao carioca.

    E eis como se explica o fato de, quase contemporaneamente ao aparecimento do samba, ter surgido a macha carnavalesca.

    Tal como havia acontecido com o samba, o ritmo da marcha j tinha aparecido, aquie al, desde o fim do sculo XIX, em algumas msicas rotuladas de tango, cano carnavaca, fadinho, etc., mas foi apenas quando a massa crescente das famlias aderiu aosbailes de carnaval com orquestras de tipo jazz-band que o ritmo ganhou conscincia de gnero musical independente.

    Fixados que foram os gneros de msica carnavalesca, um pouco antes de 1930, o sambae a marcha, toda a sua evoluo posterior s fez acompanhar, a evoluo social das clas a que se dirigiam.

    A Marcha-Rancho, lenta e buclica, compreendida como gnero de msica carnavalesca paralela marcha, ou marchinha, de andamento mais vivo e letra maliciosa ou irnica, uma criao relativamente moderna, e constitui a produo consciente de profissionais daprimeira gerao de compositores do rdio da dcada de 1930, interessados em capitaliza

  • 7/31/2019 Carnaval Tinhorao

    3/3

    o esprito musical e a beleza dos desfiles de ranchos cariocas (cordes com forte influncia dos nordestinos migrantes).

    O samba-enredo, criado pelos compositores das escolas de samba para contar em versos a histria escolhida como tema do desfile carnavalesco, surgiu em 1940 como contrapartida musical da progressiva estruturao das escolas no sentido de encenar dramaticamente seus enredos, sob a forma de uma pera-bal ambulante.