caso clínico (5)c

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CFS, 17a, masc., trabalhador braçal ação de indenização HISTÓRICO DO ACIDENTE : O reclamante trabalhava em garimpo para exploração de pedras (por meio de túneis subterrâneos), município de Malacacheta/MG. Suas atividades básicas consistiam do transporte manual de pedras do interior da mina para a superfície (através de carrinho de mão), além de observar o funcionamento do compressor. Relata que no dia 07/03/2002, data do acidente, por volta das 08:00 horas, após a colocação dos explosivos na mina, o empregado responsável pelos mesmos, ateou fogo na bateria da frente, enquanto coube ao autor acender o pavio do explosivo situado na retaguarda (mais próxima à entrada), abandonando rapidamente, ambos, o interior da mina. Percebeu-se, a seguir, a explosão apenas da bateria da frente. Como ao aproximar o isqueiro do pavio o reclamante imediatamente abandonou o interior da mina (sem constatar a presença de faíscas no pavio, sic), comentou a possibilidade de não tê-lo acendido direito, sendo então ordenado o seu retorno ao interior da mina para completar o serviço. Ao entrar no subsolo e aproximar-se do explosivo, cumprindo a determinação, ocorreu, entretanto, a detonação, atingindo diretamente o periciado. Foi socorrido pelos colegas de trabalho e levado até em Itambacurí (empreiteiro vizinho emprestou o veículo para o transporte) e daí para Teófilo Otoni, onde recebeu assistência médica no Hospital Santa Rosália (fl. 23). Sofreu esmagamento da mão esquerda (feita amputação), fraturas expostas dos dedos da mão direita (tratamento cirúrgico), contusão com lesão ligamentar do joelho direito (cirurgia e enxerto de pele), trauma ocular (retirada de corpo estranho) e feridas contusas na face, tronco e membros superiores e inferiores (realizadas suturas e enxertos de pele). Além da amputação da mão esquerda, da presença de cicatrizes diversas pelo corpo e do afundamento no joelho direito, evoluiu com perda da visão do olho esquerdo (sic). Não recebeu nenhum benefício do INSS (não era segurado). Ainda não voltou para a escola e está sem trabalhar.

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Page 1: Caso Clínico (5)c

CFS, 17a, masc., trabalhador braçal

ação de indenização

HISTÓRICO DO ACIDENTE:

O reclamante trabalhava em garimpo para exploração de pedras (por meio de

túneis subterrâneos), município de Malacacheta/MG. Suas atividades básicas

consistiam do transporte manual de pedras do interior da mina para a superfície

(através de carrinho de mão), além de observar o funcionamento do compressor.

Relata que no dia 07/03/2002, data do acidente, por volta das 08:00 horas,

após a colocação dos explosivos na mina, o empregado responsável pelos mesmos,

ateou fogo na bateria da frente, enquanto coube ao autor acender o pavio do

explosivo situado na retaguarda (mais próxima à entrada), abandonando

rapidamente, ambos, o interior da mina.

Percebeu-se, a seguir, a explosão apenas da bateria da frente. Como ao

aproximar o isqueiro do pavio o reclamante imediatamente abandonou o interior da

mina (sem constatar a presença de faíscas no pavio, sic), comentou a possibilidade

de não tê-lo acendido direito, sendo então ordenado o seu retorno ao interior da mina

para completar o serviço. Ao entrar no subsolo e aproximar-se do explosivo,

cumprindo a determinação, ocorreu, entretanto, a detonação, atingindo diretamente o

periciado.

Foi socorrido pelos colegas de trabalho e levado até em Itambacurí

(empreiteiro vizinho emprestou o veículo para o transporte) e daí para Teófilo Otoni,

onde recebeu assistência médica no Hospital Santa Rosália (fl. 23). Sofreu

esmagamento da mão esquerda (feita amputação), fraturas expostas dos dedos da

mão direita (tratamento cirúrgico), contusão com lesão ligamentar do joelho direito

(cirurgia e enxerto de pele), trauma ocular (retirada de corpo estranho) e feridas

contusas na face, tronco e membros superiores e inferiores (realizadas suturas e

enxertos de pele).

Além da amputação da mão esquerda, da presença de cicatrizes diversas pelo

corpo e do afundamento no joelho direito, evoluiu com perda da visão do olho

esquerdo (sic). Não recebeu nenhum benefício do INSS (não era segurado). Ainda

não voltou para a escola e está sem trabalhar.

Page 2: Caso Clínico (5)c

EXAME PERICIAL DIRECIONADO:

O reclamante é menor, possuindo atualmente 17 anos de idade. Teve doenças

comuns da infância (sarampo, catapora, furunculose). Queixa-se de dores e estalos

no joelho e de que não enxerga mais com o olho esquerdo.

Durante a entrevista mostrou-se orientado no tempo e espaço, com atenção ememória preservadas, pensamento lógico com base na razão, sem alterações desenso-percepção e com conduta coerente.

Ao exame apresenta cicatrizes irregulares distribuídas pela face (em torno dos

olhos, orelha direita, queixo e pescoço), tronco (região peitoral, ombro e braço

direito), ambas as coxas (áreas hipocrômicas, regiões doadoras de pele para

enxertos) e joelho direito (afundamento da face medial e cicatrizes hipertróficas). A

pálpebra inferior do olho esquerdo encontra-se aderida à córnea. Ao tampar o olho

direito o periciado descreveu não enxergar os dedos do examinador (a uma distância

de um metro). Amputação da mão esquerda na altura do punho, com coto bem

constituído (há, porém, sensibilidade dolorosa). Há nítida hipotrofia muscular do

braço e antebraço esquerdo. Mão direita apresenta deformidades, com desvio lateral

e avulsão da unha da falange distal do 5º dedo e anquilose da articulação

interfalangeana distal do 4º dedo (com área de enxerto e perda parcial da unha), com

demais dedos preservados. Deambulação (em marcha normal) preservada, mas

agacha-se com leve dificuldade. (fotografias do exame do autor anexada ao laudo.

Há também fotos nas fls. 28 - 40).

IMPRESSÃO DIAGNÓSTICA PERICIAL:

Seqüelas anátomo-funcionais de trauma complexo ocorrido no trabalho, comamputação do da mão esquerda, deformidades da mão e joelho direito, perda davisão do olho esquerdo e cicatrizes corporais diversas .

COMENTÁRIOS:

Page 3: Caso Clínico (5)c

Os achados acima descritos são de caráter permanente. O nexo causal entre

as lesões e o evento esta documentado e comprovado (fls. 25, 42 – 71 ), nada mais

havendo que exija argumentação da perícia.

O dano laboral deve ser caracterizado a partir da análise da REPERCUSSÃODO DANO FÍSICO/FUNCIONAL sobre o exercício de DETERMINADA ATIVIDADELABORATIVA, desempenhada pela periciado anteriormente a lesão. Deve-se,também, levar em consideração fatores extrínsecos à lesão, como idade, sexo, graude instrução, capacidade e possibilidade de reinserção no mercado de trabalho, entreoutros.

Para nortear e quantificar o dano físico e laboral do caso em tela, a perícia

se vale do que estabelece a CIRCULAR N.º 029, de 20 de dezembro de 1991, da

Superintendência de Seguros Privados (SUSEP), em sua “TABELA PARA

CÁLCULO DA INDENIZAÇÃO EM CASO DE INVALIDEZ PERMANENTE”. Esta

tabela traz no campo “INVALIDEZ PERMANENTE PARCIAL”, os seguintes

percentuais indenizatórios (dentre outros):

Perda total da visão de um olho..................................................... 30%

Perda total do uso de uma das mãos..............................................60%

Perda total do uso de um dos dedos mínimos........................ ......12%

Perda total do uso de um dos dedos anulares.................................9%

Anquilose total de um dos joelhos...................................................20%

Encontrando-se o dano listado na tabela, mas havendo, porém, perda funcionalparcial (caso dos dedos da mão direita e do joelho), aplica-se o seguinte dispositivo(§ 1º do art.5º):

§ 1º Não ficando abolidas por completo as funções do membro ou órgão lesado,

a indenização por perda parcial é calculada pela aplicação, à percentagem

prevista na tabela para sua perda total, do grau de redução funcional

apresentado. Na falta de indicação da percentagem de redução, e sendo

informado apenas o grau dessa redução (máximo, médio ou mínimo), a

indenização será calculada, respectivamente, na base das percentagens de

75%, 50% e 25%.

Page 4: Caso Clínico (5)c

Assim, considerado o percentual de redução funcional do 4º e 5º dedos da mão

direita em GRAU MÉDIO e a do joelho direito em GRAU MÍNIMO, obtêm-se o

seguintes percentuais:

5º dedo: 50% (redução funcional parcial em grau médio) X 12% (perda total do

uso do dedo mínimo) = 6%;

4º dedo: 50% (redução funcional parcial em grau médio) X 9% (perda total do uso

do dedo anular) = 4,5%;

Joelho direito: 25% (redução funcional p0arcial em grau mínimo) X 20% (perda

total do uso do joelho) = 5%

Havendo concomitância de lesões no mesmo ou em diferentes órgãos,segmentos e funções, acumulam-se os percentuais de incapacidade, conformeprevê o disposto no § 3º do art.5º:

§ 3º Quando do mesmo acidente resultar invalidez de mais de um membro ouórgão, a indenização deve ser calculada somando-se as percentagensrespectivas, cujo total não pode exceder a 100% (cem por cento).

Sendo assim, o percentual de incapacidade do autor pode ser assim

expressado:

Percentual final de incapacidade = 60% (amputação da mão esquerda) + 30%

(cegueira do olho esquerdo) + 6% (redução funcional em grau médio do dedo

mínimo) + 4,5% (redução funcional em grau médio do dedo anular) + 5% (redução

funcional em grau médio do joelho direito) = 105,5%. A considerar 100% (CEM

PORCENTO).

Por fim, há de se lembrar ainda que, em que pese ser a perda ou redução

funcional o principal determinante da incapacidade laborativa, não é o único. Na

avaliação desta, cabe também ponderar outras circunstâncias, tais com o futuro

acesso do acidentado ao mercado de trabalho (deficiências aparentes constituem

freqüentemente situações desclassificantes no exame pré-admissional), a idade

(quando a incapacidade ocorre num indivíduo jovem, interceptam-se ou limitam-se as

possibilidades de progressão profissional), o grau de instrução, entre outras.

Page 5: Caso Clínico (5)c

Quanto ao dano estético, em que pese não haver regras rígidas paraquantificação do mesmo, é passível de gradação, indo da perda anatômica de umafalange ou do aspecto desagradável, passando por deformações e alterações da core do aspecto da pele, chegando a extremos de grandes deformações, lesõesulceradas crônicas, constituindo o que se pode chamar de aspecto repugnante.Assim pode-se considerar, indicativamente, o prejuízo estético em grau muito leve,leve, moderado, acentuado e muito acentuado.

No caso em tela, a perícia entende que, face as evidentes deformidades,

decorrente principalmente da amputação da mão (mas também com cicatrizes na

face e deformidades na mão restante e no joelho direito) em indivíduo jovem, ocorreu

um prejuízo estético em grau muito acentuado, posto que se apresenta com

marcante aleijão, salvo outro entendimento deste douto Juízo.

CONCLUSÃO:

Com base nos elementos e fatos expostos e analisados, conclui-se que o

acidentado é portador de uma INCAPACIDADE FÍSICO/FUNCIONAL

PERMANENTE.

O percentual desta incapacidade, sugerido e avaliado de acordo com o

disposto na circular N.º 29/91 da Superintendência de Seguros Privados (SUSEP),

corresponde a 100% (CEM POR CENTO), isto é, eqüivalente a uma INVALIDEZ

TOTAL E PERMANENTE (tendo-se em vista que a soma dos prejuízos funcionais

parciais em diferentes órgãos e/ou segmentos ultrapassa a 100%).

O dano estético pode ser avaliado em grau muito acentuado, posto que se

apresenta de forma óbvia e marcante o aleijão, em indivíduo jovem.