certa noite, num estábulo…. certa noite, num estábulo…
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Certa noite, num estábulo…. Certa noite, num estábulo…
Certa noite, um vento muito forte levantou-se sobre as colinas de Belém
As ovelhas que ali pastavam e os pássaros que ali viviam procuraram rapidamente refúgio sob as oliveiras ou entre os ramos.
Mas uma pomba branca
procurou abrigo
debaixo do telhado de
um estábulo.
A sua chegada encheu de alegria o coração da velha vaquinha que ali vivia. - Sabes, já estou velha, não tenho forças para puxar o arado - explicou a vaquinha. - Mas aborreço-me aqui sozinha. Só o meu dono é que me vem visitar, de vez em quando. - Diz-me, pomba, por acaso não o vês a caminho?
- Infelizmente não - respondeu a pomba. - Só vejo as oliveiras que dançam com o vento e uma lebre enregelada à procura da entrada da sua toca.- E se fosses dizer-lhe para vir para o meu estábulo? -disse a vaquinha. - Aqui dentro estará abrigada.
E quando a lebre se refugiou entre os seus cascos, a vaquinha aqueceu-a com o seu bafo.
No entanto, como esperava ver o seu dono, voltou a pedir:- Diz-me pomba; não vês mesmo ninguém a aproximar-se?-Infelizmente não - respondeu a pomba. - Apenas vejo as oliveiras a lutar contra o vento, nuvens espessas a cobrir o céu e dois cabritinhos à procura do seu pastor.- Aqui há tanto espaço. Diz-lhes para entrarem - disse a vaquinha
E quando os cabritinhos se refugiaram entre os seus cascos, a vaquinha aqueceu-os com o seu bafo
No entanto, como ainda esperava ver o seu dono, voltou a pedir:- Diz-me pomba, não vês mesmo ninguém a aproximar-se?
-Infelizmente não - respondeu a pomba. - Apenas vejo, entre os ramos das oliveiras fustigados pelo vento, os pássaros que tentam proteger-se dos flocos de neve que começam a cair.
- Voa até lá e diz-lhes para se refugiarem aqui, antes que a neve os sepulte debaixo do seu manto.
Quando sentiram o calor do estábulo espalhar-se pelas suas asas, os pássaros começaram a voar de uma viga para outra. Ao ouvir os seus trinados, a vaquinha ficou feliz.
Mas como continuava sem saber do seu dono, voltou a perguntar:- Diz-me pomba, de certeza que não vês ninguém a aproximar-se?-Infelizmente não - respondeu a pomba. - Vejo somente as ovelhas que tentam sacudir das suas costas a neve que agora cai com força.-Voa até lá e diz-lhes que ainda temos algum espaço - disse a vaquinha. - É certo que ficaremos um pouco apertados, mas ninguém deve ficar ao relento numa noite fria como esta.
Quando a última ovelha entrou no estábulo, a noite envolvia já as colinas à volta de Belém.Mas como a velha vaquinha mantinha uma réstia de esperança, de novo perguntou pelo seu dono:- Diz-me pomba, não vês a luz trémula da candeia do meu dono a aproximar-se, na escuridão?
- Sim! Vejo uma luz que se aproxima! - respondeu
a pomba, entusiasmada, - mas vem lá alta, no céu,
e deixa atrás de si um rasto brilhante.
- Será o meu dono a descera colina com uma grande tocha? Pomba branca, peço-te: vai dizer-lhe que estou à espera dele - exultou a vaquinha.- Eu não vejo o teu dono- retorquiu a pomba, - apenas esta luzresplandecente que agora paira sobreo estábulo.
De súbito, o vento
parou de soprar. Então
a voz de um anjo
ecoou:
“Neste estábulo vive
uma vaquinha de bafo
forte e quente. À
espera do seu dono, a
todos oferece abrigo.
Até o burro carregado
e cansado que neste
instante avança pelo
caminho virá a pedir-
lhe hospedagem.”
No estábulo fez-se silêncio. E foi no silêncio que se ouviu o suspiro da velha vaquinha.-O estábulo já está cheio… Não há lugar para mais nenhum animal – disse, desolada.
Mas como tinha um coração bom, não era capaz de negar abrigo ao pobre burro carregado e cansado.
Por isso, disse à pomba: Voa até ele e diz-lhe que lhe cedo o meu lugar. Vou rebentar a corda que me prende e dormirei lá fora, à porta.
Só que a vaquinha já era velhinha e as forças não eram muitas. Em vão tentava libertar-se do forte laço que a prendia quando a porta se abriu, empurrada por mão humana. Por uma segundo a vaquinha alegrou-se pensando que se tratava do seu dono. Mas não era a voz do seu dono que perguntava se havia espaço para mais três…
- Para quatro - arrulhou, feliz, a pomba. - Montada no burro vem uma jovem que está prestes a dar à luz.No estábulo todos se alegraram. Todos menos a vaquinha. Não, ela já não era o animal possante de outrora, capaz de rebentar com a corda mais forte. Agora estava fechada num estábulo, incapaz de oferecer guarida até a um bebé.
Ao verem a sua tristeza, os outros animais disseram-lhe:- Não te preocupes. Nos damos-lhes o nosso lugar - e a lebre, os cabritinhos e as ovelhas abandonaram o estábulo, um a um.
- Se ao menos o meu dono chegasse, ele podia libertar-me de laço. Pomba branca, tens a certeza que não o vês? - perguntou mais uma vez a velha vaquinha.
Desta vez a pomba não respondeu. Só muito mais tarde, quando um choro de bebé ecoou no estábulo, ela, arrulhou, docemente:- Vejo uma criança deitada nas palhinhas. Está despida e precisa de ti. A velha vaquinha baixou os olhos e o seu coração encheu-se de felicidade. Aproximou-se do bebé e aqueceu-o com o seu bafo.
Foi então que escutou a voz do seu dono que, comovido, lhe dizia:- A partir desta noite nunca mais estarás só. De todas as colinas à volta de Belém virão pastores e camponeses. Virão adorar a este menino, que será para sempre o teu, o nosso, verdadeiro mestre.
Título: Certa noite, num estábuloAutor: Guido ViscontiIlustração: Alessandra ClimatoribusEditora: Livros Horizonte