chuvas ácidas: um fenómeno global€¦ · das chuvas ácidas resultam ainda protões h+, que são...
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O presente trabalho insere-se no contexto da disciplina de Físico-Química, na Escola João da Silva Correia, no
ano letivo 2019/2020 e teve como principal objetivo a compreensão do fenómeno das chuvas ácidas, sendo
por isso aqui analisadas as suas causas, consequências e ainda possíveis medidas de minimização do
fenómeno, sempre tendo em vista a mobilização dos conceitos lecionados na área da Química, relativos às
reações ácido-base.
as últimas décadas, inúmeras dinâmicas do planeta Terra têm vindo a sofrer grandes alterações
devido, à ação antrópica, que surte impactos em todos os subsistemas terrestres (biosfera,
atmosfera, geosfera e hidrosfera). O fenómeno das chuvas é assim um fenómeno, relativamente
recente, que se encontra fortemente associado à Revolução Industrial, mas que, no entanto, é já alvo de
grandes preocupações por parte dos especialistas. Neste âmbito têm vindo a ser desenvolvidos diversos
estudos sobre este fenómeno com vista à melhor compreensão do mesmo, das suas causas e consequências
nos mais diversos domínios e possíveis medidas de minimização dos riscos que acarreta.
A precipitação é a queda de água no estado líquido (chuva)
ou sólido (neve e granizo) e este é um fenómeno que se
encontra associado ao funcionamento do ciclo da água, já
que resulta da condensação do vapor de água que existe na
atmosfera. A precipitação é assim um agente da
geodinâmica externa do planeta Terra que tem grande
importância, já que se constitui como um bem essencial a
vida.
Contudo, nas últimas décadas assistimos a um fenómeno designado de chuvas ácidas, que tem vindo a
tomar porpoções cada vez maiores. Podemos dizer que a água das chuvas sempre possuiu um caráter ácido,
mesmo antes da existência da vida como a conhecemos atualmente no planeta. Considerando a escala de
pH a 25° C, água da chuva registava habitualmente valores entre 5,6 e 6,0.
Este caráter ácido resulta da presença de dióxido de carbono (CO2) na atmosfera terrestre (cerca de 0,0385%
da mesma), que ao reagir com a água da chuva
(H2O), leva à formação de ácido carbónico (H2CO3):
Contrariamente ao que possamos pensar, esta acidez das águas da chuva dita “normal” não tinha qualquer
N
CO2 (g) + H2O (l) → H2CO3 (aq)
H2CO3 (aq) + H2O (l) ⇌ HCO3- (aq) + H3O+ (aq)
HCO3- (aq) + H2O (l) ⇌ CO3
- (aq) + H3O+ (aq)
Assim, [H3O+] > [OH-] e por isso a
água da chuva assume este caráter
ligeiramente ácido
Chuvas ácidas: um fenómeno global
Inês da Cruz Batos 11ºA 2
tipo de impacto negativo em nenhum dos subsistemas terrestres, uma vez que falamos de valores de pH
bastante próximos do neutro (considerando a escala de pH a 25° C).
atividade vulcânica e principalmente a ação antrópica
vieram perturbar este equilíbrio. Ácidos fortes
passaram, assim a ser os principais responsáveis pelo
fenómeno da acidificação das chuvas, que sofreram assim uma
drástica diminuição de pH ao longo dos últimos anos e
passaram a registar valores inferiores a 5,6, considerando a
escala de pH a 25° C, podendo mesmo em alguns casos, atingir
valores entre 2,0 e 3,0.
A formação destes ácidos responsáveis pela acidificação
das chuvas está relacionada com a emissão de óxidos de
enxofre e óxidos de nitrogénio, genericamente designados
como NOX e SOx, que ao reagirem na atmosfera com
moléculas de água (H2O) e/ou moléculas de di-oxigénio
(O2) dão origem, respetivamente, a moléculas de ácido
sulfúrico (H2SO4) e de ácido nitroso (HNO2) e/ou ácido
nítrico (HNO3).
Como ocorre a formação de ácido sulfúrico?
formação do ácido sulfúrico (H2SO4) na atmosfera está fortemente associada à queima de
combustiveís fósseís e à atividade vulcânica, isto é a matéria vegetal incorpora ao longo da sua vida
enxofre (S), já que este é um nutriente essencial para as mesmas. Assim, quando mais tarde estas
mesmas plantas dão origem a combustiveís fósseís como o carvão ou o petróleo e, são posteriormente
sujeitas a reações de combustão, libertam o enxofre (S) acumulado ao longo da sua vida. Este gás passa
assim a estar disponível na atmosfera podendo reagir com outras moléculas:
Frequentemente, ocorre a formação de dióxido de enxofre (SO2) e este passa também a estar disponível na
atmosfera, sendo este então o principal responsável pela formação de ácido sulfúrico (H2SO4). Podem assim
ocorrer dois processos que irão dar origem ao ácido sulfúrico, e que apenas diferem no momento em que
esta molécula reage com a molécula de água (H2O) e de di-oxigénio (O2):
A
A
S (g) + O2 (g) → SO2 (g)
SO2 (g) + H2O (l) → H2SO3 (aq)
2 H2SO3 (aq) + O2 (g) → 2 H2SO4 (aq)
2 SO2 (g) + O2 (g) → 2 SO3 (g)
SO3 (g) + H2O (l) → H2SO4 (aq)
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Qualquer um dos processos tem como produto final o ácido sulfúrico (H2SO4), que é então o responsável
direto pela acidificação das chuvas e pelo registo dos valores de pH consideravelmente mais baixos.
Uma vez que, se trata de um ácido diprótico ocorrem duas reações de ionização. A primeira reação trata-se
de uma reação completa, já a segunda trata-se de uma reação incompleta, uma vez que o sulfato de
hidrogénio (HSO4- ) contrariamente ao caso do
ácido sulfúrico (H2SO4), trata-se de um ácido
fraco:
Como ocorre a formação de ácido nitroso e ácido nítrico?
libertação de monóxido de nitrogénio (NO) para a atmosfera ocorre maioritariamente pela
atividade da indústria metalúrgica ou pelo funcionamento do motor dos automóveis que ao
atingirem elevadas temperaturas para a combustão dos eu combustível favorecem a seguir
apresentada com os gases já presentes em grandes quantidades na atmosfera:
Mais uma vez é possível a ocorrência de dois processos que levam á libertação destes gases, sendo que no
primeiro apenas se liberta o ácido nítrico (HNO3) e no segundo ocorra a libertação tanto do ácido nítrico
(HNO3) como do ácido nitroso (HNO2):
A
H2SO4 (aq) + H2O (l) → HSO4- (aq) + H3O
+ (aq)
HSO4- (aq) + H2O (l) ⇌ SO4
2- (aq) + H3O+ (aq)
Assim, [H3O+] > [OH-] e por isso a
água da chuva assume este
caráceter ácido.
N2 (g) + O2 (g) → 2 NO (g)
2 NO (g) + O2 (g) → 2 NO2 (g)
NO2 (g) + H2O (l) → HNO3 (aq)
2 NO (g) + O2 (g) → 2 NO2 (g)
2 NO2 (g) + H2O (l) → HNO2 (aq) + HNO3 (aq)
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Larva de salamandra com desenvolvimento normal (á esquerda) e larva
de salamandra que sofreu alterações morfológicas devido á acidez da
água (á direita) – Extraído de Antunes, C., et al., 2004, p.79
O ácido nítrico (HNO3) é um ácido forte pelo que ao reagir com a água ocorre a ionização completa do
mesmo. Contrariamente, o ácido nitroso (HNO2) é um ácido fraco (Ka = 5,1 x 10-4) pelo que a reação com a
água é incompleta, conduzino igualemte á
libertação de hidrogeniões (H3O+):
+
Quais são as consequências das chuvas ácidas?
As consequências das chuvas ácidas são sentidas em todos os subsistemas terrestres e em praticamente
todas as regiões do globo. Analisamos agora alguns exemplos:
Acidificação dos rios e lagos
Os rios e os lagos são uma importante reserva de
água doce no planeta Terra que tem vindo a diminuir
nos últimos anos. A acidificação dos mesmos pela
ocorrência das chuvas ácidas, tem impactos
substanciais nas formas de via que habitam os
mesmos. A verdade é que a existência de lagos
ácidos é cada vez mais frequente e é caracterizada
pela inexistência de como as algas, peixes e outros
seres vivos, já que estes seres não resistem a
elevada acidez dos mesmos. Podemos assim
considerar que as chuvas ácidas contribuem para a
extinção de espécies.
Danificação dos monumento pela dissolução do carbonato de cálcio
Em Portugal são claramente visiveís em muitos centros históricos, diversos
monumentos feitos apartir de mármore e calcário e também estes são
vítimas do fenómeno das chuvas ácidas. A calcite é um dos minerais
constituintes do calcário e do mármore, este mineral é por sua vez
formado pelos iões de carbonato de cálcio (CaCO3). Assim, nestes casos os
iões constituintes destas rochas reagem fortemente com ácidos, mais
concretamente com os hidrogeniões (H3O+) originados em solução pelos
ácidos:
HNO3 (aq) + H2O (l) → NO3- (aq) + H3O (aq)
HNO2 (aq) + H2O (l) ⇌ NO2- (aq)+ H3O
+ (aq)
Assim, [H3O+] > [OH-] e por isso a
água da chuva assume este
caráter ácido.
CaCO3 (aq) + 2 H3O+ (aq) → Ca2+ (aq) + CO2 (g) + 3 H2O (l)
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A ocorrência destas reações leva assim à degradação de inúmeros monumentos, como é o caso do Mosteiro
da Batalha (Lisboa) ou mesmo da Catedral de Notre-Dame (Paris). Podemos assim falar numa perda de
património cultural, provocada diretamente pelas chuvas ácidas.
Acidificação dos solos:
A acidificação dos solos é outras das consequências das chuvas ácidas e a verdade é que este problema
surte grandes consequências não só ao nível da sobrevivência das plantas como também de muitos outros
microorganismos. Alguns estudos realizados têm vindo a mostrar que a presença destes ácidos nos solos
resultam numa atividade anómala de bactérias, fungos e ainda algumas enzimas.
https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/31982766 https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/32224368
Estes seres embora nós não os consigamos ver macroscópicamente, eles têm um papel preponderante no
ciclo da reciclagem da matéria orgânica e em inorgânica, pelo que a sua ativiade anómala prejudica a
sobrevivência de muitas outras formas de vida nos ecossistemas.
Por outro lado, as chuvas ácidas são ainda responsáveis pela absorção de metais pesados e outras
substâncias tóxicas para as plantas, uma vez que metais pesados, como o alumínio (Al3+) tornam-se solúveis
em solos ácidos e são assim absorvidos a nível radicular pelas plantas, levando à acumulação de grandes
quantidades dos mesmos nas plantas. Das chuvas ácidas resultam ainda protões H+, que são posteriormente
absorvidos pelas plantas em vez dos habituais iões de cálcio (Ca2+), magnésio (Mg2+) e potássio (K+), por
exemplo, que são também importantes micronutrientes para a flora terrestre.
Quais as medidas que podemos adotar para minimizar este problema?
A resolução destes problemas passa pela adoção de medidas tanto a nível pessoal, social e industrial e só a ação coletiva das identidades poderá levar a minimização das consequências deste fenómeno.
1. Promover a geração e o uso de energias limpas em detrimento dos combustíveis fósseis A formação dos ácidos fortes responsáveis pela acidificação das
chuvas está diretamente relacionada com a libertação de enxofre
proveniente da combustão de combustiveís fósseis, assim a
utilização de energias renovaveís evita a emissão de gases
poluentes.
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2. Fomentar o uso do carro elétrico e de outros veículos não poluentes
A utilização de carros elétricos e outros veículos não poluentes tem um impacto globalmente muito positivo
ambientalmente, já que evita, por exemplo a formação de monóxido de carbono, um dos percursores do
ácido nítrico e nitroso.
3. Tratamento dos gases emitidos nas indústrias de modo a
neutralizá-los
O tratamento dos resíduos industriais especialmente dos gases é uma boa
prática industrial que evita, por exemplo, a emissão de SO2 para a atmosfera.
Usualmente faz-se reagir o ácido sulfuroso (proveniente da reação do SO2
com H2O) com uma base como o hidróxido de cálcio (Ca(OH)2), evitando-se
assim a formação do
ácido sulfúrico (H2SO4):
Em conclusão, importa referir que as sociedades modernas apresentam inúmeros desafios a nível ambiental,
e as chuvas ácidas são apenas um dos problemas que devemos solucionar de modo a garantir um futuro
sustentável. Contudo, a resolução dos mais diversos problemas neste domínio implica sempre um esforço
conjunto dos governos, das autoridades e da população em geral e nunca devemos esquecer que os
interesses económicos, pessoais ou outros, contrariamente ao que tem vindo a acontecer, nunca se devém
sobrepor ao interesse comum de todos os cidadãos em preservar a única “casa” que temos, o planeta Terra.
Bibliografia: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/31982766
https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/32224368
file:///C:/Users/sesa30357/Downloads/a_importancia_do_estudo_das_chuvas_acidas.pdf
https://www3.epa.gov/airmarkets/progress/reports/air_quality_so2.html#figure1
file:///C:/Users/Utilizador/Downloads/880-3697-1-PB.pdf
https://scholar.harvard.edu/files/stavins/files/chan_et_al_so2_article_national_tax_journal_2012.pdf
H2SO3 (aq) + Ca(OH)2 → (aq) CaSO3.2H2O (s)