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Propriedade Fundador Director Editor Co-editor Conselho Editorial Endereço / Address Publicidade Apoios Design Gráfico e Paginação Pré-impressão e Impressão Sociedade Portuguesa de Ciências Veterinárias NIPC - 501 334 327 João Viegas Paula Nogueira José Pimentel de Carvalho Yolanda Vaz José Alexandre Leitão Cristina Lobo Vilela José Robalo Silva José Pedro Lemos José Oom Vale Henriques Luís Anjos Ferreira Telmo Pina Nunes Edifício da Escola Superior de Medicina Veterinária Rua Gomes Freire 1169-014 Lisboa – Portugal Tel. +351 213580222, Fax +351 213580221 Internet: http://rpcv.fmv.utl.pt Sociedade Portuguesa de Ciências Veterinárias Faculdade de Medicina Veterinária, Universidade Técnica de Lisboa Maria José Beldock Sersilito – Empresa Gráfica, Lda. Travessa Sá e Melo, 209 Gueifães - Apartado 1208 4471-909 Maia Lisboa Ano 107º Vol. CIII Nº 567-568 pp 113 - 248 Jul - Dez 2008 Publicação Semestral Tiragem 1000 exemplares Preço 25,00 Euro A Revista Portuguesa de Ciências Veterinárias foi fundada em 1902 É permitida a reprodução do conteúdo desta revista The reproduction of the contents of this publication is permitted Desejamos estabelecer permutas com outras publicações We wish to establish exchange with other publications Os trabalhos submetidos para publicação são analisados por especialistas Papers submitted for publication are peer reviewed REVISTA PORTUGUESA CIÊNCIAS VETERINÁRIAS DE

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Sociedade Portuguesa de Ciências Veterinárias NIPC - 501 334 327

João Viegas Paula Nogueira

José Pimentel de Carvalho

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Edifício da Escola Superior de Medicina VeterináriaRua Gomes Freire1169-014 Lisboa – PortugalTel. +351 213580222, Fax +351 213580221Internet: http://rpcv.fmv.utl.pt

Sociedade Portuguesa de Ciências Veterinárias

Faculdade de Medicina Veterinária, Universidade Técnica de Lisboa

Maria José Beldock

Sersilito – Empresa Gráfica, Lda.Travessa Sá e Melo, 209 Gueifães - Apartado 1208 4471-909 Maia

Lisboa • Ano 107º • Vol. CIII • Nº 567-568 • pp 113 - 248 • Jul - Dez 2008

Publicação SemestralTiragem 1000 exemplaresPreço 25,00 Euro

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R E V I S T A P O R T U G U E S A

CIÊNCIAS VETERINÁRIASDE

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Índice

Artigos de revisão

Quando separar o vitelo recém-nascido da vaca leiteira? Uma revisão dos efeitos sobre bem-estar animal, produção leiteira e reproduçãoWhen to separate the new-born dairy calf? A review of the effects on welfare, milk production and reproductionGeorge Stilwell

A produção de ovinos Damara e Dorper e de caprinos silváticos em sistemas extensivos deprodução na AustráliaThe production of Damara and Dorper sheep and feral goats in extensive production systems in AustraliaAndré Martinho de Almeida

Demodicose caninaCanine demodicosisJosé Pedro A. Leitão, João Paulo A. Leitão

Memórias científicas originais

Estudo parasitológico em bovinos leiteiros da microrregião do Caparaó, Espírito Santo,BrasilParasitological study in dairy cattle of Caparaó microregion, Espírito Santo State, BrazilPedro I. F. Junior, Larissa C. Demoner, Barbara R. Avelar, Louisiane C. Nunes,Dirlei M. Donatele, Isabella V. F. Martins

Lesões renais intersticiais e tubulares na leishmaniose visceralRenal lesions in interstitium and tubule in visceral leishmaniasisLeopoldina A. Gomes, Hiro Goto, José L. Guerra, Ana L. B. Mineiro, Silvana M. M. S. Silva,Francisco A. L. Costa

Avaliação clínica neonatal por escore Apgar e temperatura corpórea em diferentescondições obstétricas na espécie caninaCanine neonatal clinical evaluation through Apgar score and body temperature under distinct whelping conditionLiege C. G. da Silva, Cristina F. Lúcio, Gisele A. L. Veiga, Jaqueline A. Rodrigues,Camila I. Vannucchi

Flora bacteriana aeróbia em otites caninasAerobic bacterial flora of the canine otitisA. C. P Silveira, C. D. R.Roldão, S. C. A Ribeiro, P. F. A. Freitas

Mieloencefalite protozoária eqüina em equinos nativos do município de Bagé-RS, sul doBrasilEquine protozoal myeloencephalitis in horses from Bagé, southern BrazilLuciana A. Lins, Friedrich Frey Junior, Maria Elisabeth Aires Berne, Carlos E. W. Nogueira

Effects of two phytotherapics formulations containing Glycine max (L.) Merr on generalreproductive performance in Wistar rats Efeitos de duas preparações fitoterápicas contendo Glycine max (L.) Merr sobre o desempenho reprodutivo de ratos WistarClarissa Boemler Hollenbach, Carlos Eduardo Bortolini, Juliana Machado Batista da Silva,Emanuel Boemler Hollenbach, Lucas Hirtz, Fernanda Bastos de Mello,João Roberto Braga de Mello

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Parasitismo intestinal em avestruzes (Struthio camelus australis Linnaeus, 1786) da RegiãoSul do Estado do Espírito Santo, no ano de 2006Intestinal parasitism on ostriches (Struthio camelus australis Linnaeus, 1786) from SouthRegion of Espírito Santo State, in 2006André M. B. Batista, M. Angélica V. da Costa Pereira, Gilmar F. Vita

Pesquisa de hemoprotozoários em aves de rapina (ordens Falconiformes e Strigiformes) emcentros de recuperação em PortugalStudy of haemoprotozoa in birds of prey (orders Falconiformes and Strigiformes) inwildlife rehabilitation facilities in PortugalN. G. Santos, M. C. Pereira, P. M. Melo, L. M. Madeira de Carvalho

Enumeração de Escherichia coli em carne bovina e de aves através de metodologia miniaturizada utilizando-se "eppendorf" e caldo fluorogênicoEnumeration of Escherichia coli in meat and poultry by using a miniaturized methodology"eppendorf" and fluorogenic brothRobson M. Franco, Samira P. S. Mantilla, Analy M. O. Leite

Ocorrência de Escherichia coli em suínos abatidos nos Estados do Rio de Janeiro, MinasGerais, Paraná e Santa Catarina utilizando diferentes metodologias de isolamentoOccurrence of Escherichia coli in pigs slaughtered in the states of Rio de Janeiro, MinasGerais, Paraná and Santa Catarina using different methodologies of isolationRobson M. Franco, Samira P. S. Mantilla, Raquel Gouvêa, Luiz A. T. de Oliveira

Controle microbiano em linha de produção de queijos Minas frescal e RicotaMicrobial control in line of "Minas frescal" and "Ricota" cheese productionVidiany A. Q. Santos, Catharina C. P. de Carvalho, Tânia M. V. Gonçalves,Fernando L. Hoffmann

Caso clínico

Severe aortic stenosis in a Persian kitten Estenose aórtica severa em um gato PersaMarlos G. Sousa, João Paulo da E. Pascon, Alexandre M. de Brum, Priscila A. C. Santos,Aparecido A. Camacho

Complexo hiperplasia endometrial cística-piometra em uma cadela tratada com acetato demedroxiprogesterona como método contraceptivoCystic endometrial hyperplasia-pyometra complex in a mongrel bitch treated with medroxyprogesterone acetate as a contraceptive methodHanniele R. Moreira, Stefânia A. Miranda, Adriel B. de Brito, Washington L. A. Pereira,Sheyla F. S. Domingues

Suplemento

Elie Metchnikoff na Ilha da Madeira

Ciências Veterinárias 2008 | IV Congresso da SPCV | I Congresso Ibérico deEpidemiologia Veterinária

Vida associativa

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Quando separar o vitelo recém-nascido da vaca leiteira? Uma revisão dosefeitos sobre bem-estar animal, produção leiteira e reprodução

When to separate the new-born dairy calf? A review of the effects on welfare, milk production and reproduction

George Stilwell*

Centro de Investigação Interdisciplinar em Sanidade Animal, Faculdade de Medicina Veterinária, TULisbon. Av. da Universidade Técnica, Alto da Ajuda, 1300-477, Lisboa, Portugal

R E V I S T A P O R T U G U E S A

CIÊNCIAS VETERINÁRIASDE

ARTIGO DE REVISÃO

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Resumo: Existem várias variantes quanto ao momento de separação do vitelo recém-nascido da vaca leiteira. As razõespara a adopção de uma ou outra estratégia dependem quasesempre de circunstâncias práticas, como o tipo de instalação oudisponibilidade de mão-de-obra. No entanto, existem outrosfactores que deveriam ser levados em conta na escolha domomento óptimo para se fazer a separação. São exemplos: osefeitos sobre produção leiteira, sobre o crescimento do vitelo,sobre o comportamento, sobre o reassumir da actividade reprodutiva, e sobre a imunidade. Adicionalmente é tambémcrucial abordar as questões éticas relacionadas com o bem-estarda vaca e do vitelo. Este tema tem-se relevado de crescenteimportância na imagem que as explorações leiteiras transmitempara o público em geral e para os consumidores de produtoslácteos em particular. Porque a separação da cria ao nascimentoé um assunto que frequentemente suscita reacções negativas, éimportante que se revejam os efeitos que as várias abordagenspodem ter sobre o bem-estar da vaca e do vitelo.Neste artigo propomos rever os conhecimentos actuais sobre osefeitos da separação vitelo-mãe desde o momento do parto atésemanas após o nascimento. O objectivo é proporcionar as basescientíficas para uma escolha mais criteriosa do método.

Summary: There are several ways to handle the dairy cattlepost-partum regarding the time calves should stay with theirdam. The reasons usually behind each strategy are related tomanagement circumstances, namely man-power availability andfacilities. However, there are several other aspects that should beaddressed and should influence the decision in each farm. Forexample, milk yield, calf growth, future fertility, behaviour andcow and calf immunity. Additionally ethic concerns should betaken in account because animal welfare is a growing concernfor European consumers, and cow-calf separation a very sensitive issue. This paper discusses the consequences of different suckling systems regarding milk production, udderhealth, reproduction and behaviour of high producing dairycows and also the effects on growth, health and behaviour of thecalves. The main objective is to provide scientific data that willallow the veterinarian and the farmer to choose the best systemsfor their farms.

Introdução

Um inquérito realizado nos EUA mostra que cercade 52% das explorações separa o vitelo imediatamenteapós o parto, 22% fazem-no depois do vitelo mamarmas antes das 12 horas, 16% separam entre as 12 e as24 horas e cerca de 10% deixa mãe e cria por mais de24 horas (USDA APHIS, 2002). Números maisrecentes (USDA-APHIS, 2007) não mostram grandesdiferenças com mais de 40% das explorações adeixarem o vitelo mamar o primeiro colostro na vaca.Se bem que não existam estudos em Portugal quegarantam os números, diríamos que as proporçõesserão bastante parecidas no nosso país. Em contraste,em alguns países europeus (Grã-Bretanha e paísesnórdicos), onde a produção de leite biológico tem umacrescente expressão, o número de animais que ficamcom as mães durante dias ou semanas é bastante mais significativo. Por exemplo na Suécia as exploraçõesprodutoras de leite orgânico têm de deixar os viteloscom as mães durante pelo menos 4 dias (KRAV, 2007) e na Dinamarca pelo menos 24 horas. O mesmo acontece em sistemas pouco intensivos de países emvias de desenvolvimento, em que as condições permitem a criação do vitelo com a mãe associado auma ou duas ordenhas diárias (Pérez-Hernandez et al.,2002; Perea-Ganchou et al., 2005).

As razões por detrás da escolha do momento de separação variam muito de exploração para explo-ração e são muitas vezes de índole prática, como porexemplo, a ausência de mão-de-obra disponível paravigiar o parto e separar imediatamente o vitelo; a tentativa de poupar a intervenção humana, permitindoque o vitelo tome o colostro directamente da mãe; ouo tipo de maternidade que não permite a manutençãodo vitelo com a mãe (parques com cubículos, porexemplo). Uma outra razão que leva alguns produtoresa deixar o vitelo algumas horas com a vaca, é a ideiaque a absorção de anti-corpos pelo vitelo é superior seeste mamar na mãe. Raramente existem razões éticas,

*Correspondência: [email protected]: + 351 918476200

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de bem-estar, de sanidade ou de rendimento futuro ajustificar a opção.

O momento de separação pode influenciar, de umaforma mais ou menos pronunciada e prolongada, umasérie de aspectos:

- A imunidade activa dos vitelos e da vaca devidoessencialmente aos altos níveis de cortisol e baixa produção de interferon após a separação (Hudson etal., 1976; Hickey et al., 2003).

- A libertação de diversas hormonas (ocitocina, prolactina, gonadotrofinas, cortisol, hormona docrescimento etc.), que afectam a produção leiteira e ocrescimento.

- A imunidade passiva de origem materna, já que osvitelos nascem agamaglobulinémicos e precisam daingestão do colostro nas primeiras horas de vida paragarantir uma resistência suficiente contra a maioriados agentes infecciosos do seu ambiente (Hafez eLimeweaver, 1968; Bovine Alliance on Managementand Nutrition, 2001). Resultados do inquérito americano que já se referiu (USDA-APHIS, 2002)mostram que mais de 60% dos produtores fornece oprimeiro colostro a partir de um balde, 35% confia naamamentação directa e menos de 5% força a ingestãodo colostro através de sondas esofágicas. Estesnúmeros demonstram que são poucos os produtoresque confiam na capacidade do vitelo em mamar atempo na mãe ou então preferem não arriscar e dão-lhes directamente o colostro.

- O comportamento do vitelo. Vitelos habituados amamar podem ter maior dificuldade em habituar-se àalimentação artificial ou, em contraste, aqueles quenão mamam podem ter a tendência em chupar emobjectos e noutros animais.

- O comportamento da vaca – a agressividade, aansiedade, o medo, a recusa em cumprir certas condutas (e.g. entrar na ordenha, etc.). Estas altera-ções de comportamento podem, inclusive, conduzir àocorrência de mastites por evitarem a descida do leitena ordenha.

- A visão ética da exploração de leite e a imagemque esta reflecte para o exterior.

Estes são, de um modo geral, os aspectos que serãoanalisados para cada uma das hipóteses de actuação.Por facilidade de exposição pretendemos reunir asestratégias de separação em 4 grupos:

a) imediato,b) precoce (depois da ingestão do colostro – entre as

4 e as 12 horas após o parto), c) médio (até aos 3 dias),d) tardio (manutenção do vitelo com a mãe durante

semanas). Este último método parece-nos ser raro ouinexistente em Portugal, mas encontra cada vez maisadeptos noutros países, especialmente onde a pro-dução de leite biológico ou orgânico começa a teralguma expressão (KRAV, 2007). Por esta razão vale apena referir aqui as suas vantagens e desvantagens.

Separação imediata

A separação logo após o nascimento é o único método exequível em explorações pequenas e médiasonde não existem maternidades ou estas apresentamcondições inadequadas à manutenção da cria com amãe. É também a estratégia preferida por muitasexplorações de grandes dimensões. No entanto, éóbvio que nem sempre é possível garantir a remoçãoimediata do vitelo, especialmente se o parto ocorrer ànoite.

As razões mais frequentemente apresentadas peloprodutor para escolher esta estratégia são: falta deinstalações ou má higiene destas, o risco de ocorrên-cia de traumatismos para a cria, a dúvida que podeficar quanto à ingestão do colostro no tempo e quanti-dade certa, a necessidade de introduzir a vaca nogrupo de lactação com melhor acesso à ordenha e aideia de que o estabelecimento de um elo mãe-filhoconduz a maiores dificuldades no maneio futuro deambos. Muitas destas conclusões baseiam-se emobservações empíricas.

Em contraste, este método é aquele que maioresreservas provoca no público, como está reflectido emcriticas efectuadas às explorações de leite por organis-mos de defesa dos direitos dos animais (ver nota derodapé)*.

Para conseguir avaliar e comparar os resultados dosestudos efectuados convém primeiro perceber qual é omomento crítico para a separação, já que os resultadosmostram que há um período de maior sensibilidadepara o desenvolvimento do elo maternal (Hundson eMullord, 1977). Estes autores referem que 5 minutosde contacto são o suficiente para se formar o elo vitelo-vaca que se mantêm mesmo se forem separadosdurante 12 horas e depois reunidos. Ao fim de 24horas a vaca ainda mostra sinais de stress da separação, mas não reconhece o vitelo (Hudson eMullord, 1977). Se o contacto não for efectuado nasprimeiras 5 horas após o parto, mais de 50% das vacas não forma elo maternal com as suas crias. Isto demonstra que se estabelece uma ligação forte desde cedo, mas apenas durante as primeiras horas pós-parto.

A alternativa à amamentação é, quase sempre, aadministração do colostro através de balde, com ousem tetinas. Em certos casos e circunstâncias poderáser necessário entubar o vitelo e fornecer desta formaa quantidade adequada de colostro. O fornecimento de

* A criação de vacas leiteiras e toda a produção de leite dependem daseparação da mãe e da sua cria. Os seus bebés são-lhes retirados para queos humanos bebam o leite que lhes era destinado (…) As vacas podemchamar durante dias pelas suas crias recém-nascidas que lhes são retiradas. As vitelas também chamam continuamente pelas mães. Depoisdos bebés lhes serem retirados, as vacas são "ordenhadas" por máquinasvárias vezes ao dia, retirando-lhes o leite que devia ter sido o alimentodos seus filhos. (In: www.animaisexcepcionais.org).A separação da vaca e do vitelo logo à nascença é uma forma de os tratarcomo objectos (In: www.animalfreedom.org).

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leite far-se-á, depois da fase de colostro, através debalde, tetinas, distribuidor computorizado ou alimen-tador (pia) comum a um grupo. Todas estas técnicas,mesmo aquelas em que é usada uma tetina, não satis-fazem o instinto de sugar que os vitelos demonstram(Broom, 1978). Esta é a razão porque muitas vezes osvitelos alimentados artificialmente procuram chuparobjectos ou partes do corpo dos outros vitelos (orelhas, umbigo, focinho). Isto poderá conduzir ainfecções umbilicais, otites e obstruções ou úlcerasabomasais por tricobenzoares.

Quanto à transmissão de imunidade passiva, osdados resultantes dos estudos científicos são por vezescontraditórios. Alguns estudos efectuados em vitelosseparados logo após o nascimento e alimentados porbalde, mostram que os níveis de IgG de origem materna são, em média, superiores àqueles que seencontram nos que são amamentados pelas mães(Besser et al., 1991; Franklin et al., 2003), enquantooutros estudos demonstram que os níveis de anticorpos são mais elevados nos vitelos que mamaram nas vacas (Selman et al., 1971; Stott et al.,1979; Quigley et al., 1995). Esta aparente contradiçãopoderá estar relacionada com um mau maneio após aseparação (atraso na ordenha da mãe, falta de paciência na administração do colostro a vitelos maisdebilitados, mistura de leites, etc…) e que podem conduzir a falhas na transmissão de imunidade passiva nos vitelos separados imediatamente após oparto. A comparação da amamentação com a adminis-tração por entubação (Besser et al., 1991) mostrou quehavia muito menos vitelos com falha de imunidadepassiva no segundo grupo. Estudos recentes parecemdemonstrar que é a quantidade e qualidade do colostroadministrado, e não tanto o método em si, que influencia a quantidade de anticorpos absorvida(Godden, 2008).

A separação imediata do vitelo parece ter efeitosobre a capacidade de sociabilizar e estabelecer laçosde hierarquia nas vitelas ou novilhas. Os efeitos alongo prazo do isolamento das vitelas de qualqueroutro animal desde o nascimento parecem ser: maiordificuldade na socialização com outros animais, o queconduz a posições mais baixas na hierarquia e, quando comparadas com vitelas que foram criadasjunto às mães, menor produção de leite (Broom, 1978;Jensen et al., 1998; Krohn et al., 1999). Nenhumdestes estudos consegue esclarecer se estas diferenças resultam da falta de contacto com a mãe ou com outros vitelos.

Em termos dos efeitos da separação imediata sobreas vacas, esta parece aumentar os comportamentosorais (cheirar e lamber a palha das camas, restos deplacenta e líquidos amnióticos) seguindo-se de maiorgrau de inactividade (Lidfors, 1996b; Krohn, 2001).Lidfors et al. (1996b) mostraram que, durante o período de estudo, as vacas separadas imediatamentecomparadas com as que ficavam 5 dias com os vitelos,

estavam mais tempo deitadas (608 vs 301 minutos),estavam mais tempo a comer (188 vs 122 min) e maistempos a cheirar o ambiente (130 vs 14 min). Não seencontraram diferenças entre vitelos na actividade eexibição de outros comportamentos.

Não parece existir diferença no momento da expulsão da placenta quando foram comparadas vacascom separação imediata ou ao fim de 10 dias (Metz,1987).

Separação precoce – após ingestão docolostro (menos de 24 horas)

A separação após amamentação pode ser uma alternativa para vacarias que aproveitam o facto parareduzir a necessidade de alterações na rotina diária eassim restringir a mão-de-obra. Esta é a prática emmais de 30% das explorações dos EUA segundo omais recente inquérito nacional (USDA-APHIS,2007). Com esta atitude "deixam" para a vaca o ónusde garantir a ingestão do colostro suficiente. Estemétodo exige maternidades espaçosas, com boascamas e uma densidade animal pouco elevada.

Selman et al. (1971) e Petrie (1984) afirmam quemanter os recém-nascidos com as mães durante asprimeiras 24 horas favorece a ingestão mais precoce ede maior quantidade de colostro e que isto favorece asobrevivência futura dos vitelos. Stott et al. (1979)sugerem que esta maior taxa de sobrevivência é explicada não só pela maior quantidade de colostroingerida, mas também pela maior absorção deimunoglobulinas em vitelos amamentados pelas mães.

Como desvantagem surge o facto de ser difícil assegurar que a ingestão do colostro se fez emcondições adequadas. As razões que podem conduzira uma fraca transmissão da imunidade passiva deorigem maternal são: dificuldade da vaca em se levantar devido, por exemplo, à exaustão, hipocal-cémia ou paralisia de parto; prostração da cria porcausa de distócias, partos prolongados, vitelos pesados, etc.; desvios no instinto maternal (mais frequente em primíparas); troca de "mãe", levando aque o vitelo mame noutras vacas do grupo; má qualidade do colostro devido a mastites; ou ainda, máconformação do úbere que impede o bom acesso dosvitelos aos tetos (Edwards et al., 1982; Ventorp eMichanek, 1991; Wesselink et al., 1999). Lidfors(1996a) demonstrou que 32% das vitelas não conseguem mamar nas primeiras 4 horas mesmo apósum parto fácil e Selman et al. (1970) referem que 15a 40% dos vitelos não encontram o teto da vaca antesdas 6 horas. Será, por isso, de supor que uma percenta-gem significativa de vitelos não faça a absorção deIgG antes das 6 horas (momento em que começa adiminuir a capacidade de absorção de anticorpos pelointestino do recém-nascido). Estes inconvenientes justificam os níveis de falha de imunidade passiva

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acima dos 30% que têm sido encontradas em váriosestudos (Wesselink et al., 1999; Weaver et al., 2000;Bovine Alliance and Management Nutrition, 2001) eque acontecem mais frequentemente do que se julgaapesar de se ter demonstrado que os vitelos queficavam com as vacas levantavam-se mais cedo e apresentavam maior actividade (Lidfors, 1996a).

Outros riscos de manutenção do vitelo com a mãeaté mais tarde são: possibilidade de traumatismos(pisadelas etc.) e transmissão mais fácil de agentesinfecciosos (Cryptosporidium, E.coli, Salmonella etc.)que podem existir nas camas e úberes das vacas.

A manutenção do vitelo com a mãe durante poucosminutos é o suficiente para se formar um elo muitoforte (Hudson e Mullord, 1977). Depois de 5 minutosde contacto com o vitelo já se notam sinais do stressde separação, nomeadamente através do aumento dosníveis do cortisol plasmático da vaca e vocalizações(Hudson et al., 1976).

O comportamento da vaca separada do vitelo depoisde se ter estabelecido o elo mas antes das 24 horas temdemonstrado resultados diferentes, se bem que sejadifícil comparar o desenho experimental de muitosdestes estudos devido às variações nas condições e naduração do contacto mãe-cria. Por exemplo, a separação ao fim de 10 horas após parto não causouinquietude na vaca, mas aumentou comportamentosde manutenção (Houwing et al., 1990) enquanto que acomparação do comportamento de vacas separadasdos vitelos ao fim de 2 horas com o comportamentode vacas que ficaram com vitelos durante 2 a 3 dias,não mostrou diferenças em sinais de ansiedade eprocura da cria (Kurosaki et al., 1983). A comparaçãodo comportamento durante as 2 horas após o partomostrou que as vacas que ficavam com os vitelosdeitavam-se menos, vocalizavam mais e estavammenos tempo inactivas, do que as que viram os vitelosserem removidos logo após o nascimento (Lidfors,1996b). Por outro lado os vitelos apresentaramaumento da frequência cardíaca e mais movimentos deorelhas e da cabeça ao ouvir a "voz" da mãe em com-paração com ruídos neutros (Marchant-Forde et al.,2002). Stehulova et al. (2008) demonstrou que ossinais de stress eram muito menores quando as vacaseram transferidas imediatamente para outro edifício,em estabulação livre com a restante manada, em vez de serem mantidas na maternidade ou onde conseguiam ver ou ouvir o vitelo.

É preciso relembrar que todos estes resultados sereferem apenas às raças leiteiras, essencialmenteHolstein-Frísia e Sueca-vermelha, já que será deesperar comportamentos diferentes nas raças de carne.

Separação média – ao fim de 2 a 5 dias

Este é um método usado raramente nas exploraçõesportuguesas pois implica dedicação prolongada das

maternidades, maior mão-de-obra e, na perspectiva doprodutor, implica maiores riscos para a saúde do vitelo (observações pessoais). Isto apesar de estudosconfirmarem que, nas condições de campo, manter ovitelo com a mãe durante mais de 24 horas reduz otempo até o vitelo de levantar, beber leite, defecar eurinar (Metz e Metz, 1986; Edwards e Broom, 1985)para além de garantir maiores níveis de IgG, desdeque o vitelo mame nas primeiras horas. Franklin et al.(2003) demonstraram que os vitelos que ficaram comas mães durante 3 dias eram desmamados mais cedo,apesar de não haver diferenças em ganhos médiosdiários e peso ao desmame.

O facto do vitelo mamar alguns litros durante algunsdias (fase do colostro) não influencia o rendimentodirecto da vaca pois esse leite não é aproveitado paraconsumo humano. O rendimento a médio prazo também não parece ser afectado apesar de alguns trabalhos mostrarem que a libertação de prolactina eocitocina em resposta à máquina de ordenha é menore mais lenta nos primeiros dias pós-parto quando asvacas estão a amamentar (Akers e Lefcourt, 1984).Outro estudo não encontrou diferenças na produção,condição corporal ou incidência de mastites em vacasseparadas imediatamente, ao fim de 1 dia ou de 4 dias(Weary e Chua, 2000). Em contraste, há indicações deque a amamentação poderá ter efeitos positivos sobrea fisiologia e comportamento da vaca a longo prazo –maior libertação de ocitocina na ordenha, maioresníveis de insulina, menores níveis de cortisol, pressãoarterial mais baixa e comportamento mais calmo(Lupoli et al., 2001).

A separação do vitelo ao fim de três dias conduziua alguns sinais subtis de stress na vaca, como seja oaumento momentâneo da frequência cardíaca, maisvocalizações e mais tempo a olhar para fora do parque(Hopster et al., 1995). Não houve alterações do cortisol plasmático. Os autores também demonstraramque as vacas estavam mais tempo a comer depois deseparadas, mas concluíram que isto se devia ao factoda manjedoura ser no mesmo local onde se colocavampara olhar para fora do parque (Hopster et al., 1995).Lidfors (1996a) mostrou que, depois da separação dosvitelos às 96 h, as vacas que amamentaramvocalizaram mais, ruminaram menos e deitaram-semenos do que as testemunhas separadas imediata-mente após o parto. Outros estudos mostraram que aseparação ao fim de dois dias causa alterações nosparâmetros normais de alimentação e de sono de vacas(Ruckebush, 1975) e que as vacas separadas aos 4 diasexibem mais chamamentos (4 vezes mais) e com sonsde intensidade diferente das vacas não separadas(Weary e Chua, 2000). Em contraste, um outro traba-lho mostrou que duas em quinze vacas não reagiram àseparação e que seis em quinze só o fizeram durante20 minutos (Lidfors, 1996b).

Os efeitos sobre o vitelo da separação média não são muito evidentes. É admitido que os vitelos reco-

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nhecem a mãe pelo chamamento dos 4 aos 7 dias deidade, mas só a reconhecem visualmente a partir do 8ºdia (Sambraus, 1971). Isto não quer dizer que não seforme um elo materno antes disso, mas provavelmentesignifica que a ligação não é suficientemente fortepara provocar reacções extremas quando a separaçãose faz antes desse período. A variação individual notempo necessário para se estabelecer o elo podeexplicar alguns dos resultados contraditórios. Porexemplo, os vitelos de um estudo não mostraramsinais de procurar ou chamar pela mãe quando separa-dos às 96 h e colocados numa box mesmo em frenteao parque da mãe (Lidfors, 1996b) enquanto que umoutro mostrou comportamentos de frustração e stressdurante alguns minutos após a separação de vitelosamamentados durante 4 dias (Sadem e Braastad,2005). Observando os vitelos nas suas caixas indivi-duais depois de períodos variáveis com as mães foidemonstrado que aqueles que eram separados maistarde exibiam mais movimentos, estavam mais tempoem pé e punham mais tempo a cabeça fora da box(Weary e Chua, 2000). Poderá também ser significati-va a observação de comportamentos positivos, comointeragir, lamber, mamar, etc., quando se reuniramnovamente vacas e vitelos que tinham sido separadosdurante algumas horas (Sadem e Braastad, 2005).

Esta disparidade, ou a pouca relevância dos sinaisde stress que sucedem a separação, pode resultar dedois factores: não foram estudados e medidos os sinaismais significativos, ou a raça Holstein-Frísia não émuito afectada pela separação. Estes dados são interessantes se comparados com aqueles que resul-tam das mesmas observações em vacas de carne emregime extensivo onde os sinais fisiológicos e comportamentais são muito evidentes e prolongados.

Separação tardia – manutenção prolongada do vitelo com a mãe

Geralmente a manutenção prolongada do vitelo coma mãe não exclui a ordenha da vaca leiteira pelosmétodos mecânicos usuais, sendo a estratégia maisfrequente deixar o vitelo mamar duas vezes ao diaseguido da ordenha. O sistema de deixar os viteloscom a mãe durante períodos longos após o parto não éhabitual em Portugal, no entanto, porque temnumerosos defensores noutros países e porque poderáser obrigatório nos sistemas de produção de leitebiológico, parece-nos importante referir alguns dosefeitos imediatos e a longo prazo sobre a vaca e cria.

Um dos maiores receios quanto à manutenção dosvitelos com as mães durante semanas após o parto é aredução na produção leiteira ao longo desse período eainda as alterações fisiológicas (atraso na descida doleite) e comportamentais (mais irrequietas na ordenhaetc.). Se bem que alguns estudos demonstrem variações das produções (ver abaixo), há autores que

indicam não haver diferença em produção ou comportamento na ordenha entre vacas separadas às24 horas ou aos 14 dias (Flower e Weary, 2001). Estesresultados foram idênticos independentemente daparidade. Outros estudos indicam que não há diferenças estatisticamente significativas nos níveis deocitocina entre animais ordenhados após amamentar eaqueles que são apenas ordenhados (Tancin et al.,2001) apesar de terem encontrado pequenas reduçõesnos níveis de ocitocina nas primeiras ordenhas após aseparação ou quando as vacas eram ordenhadas napresença do vitelo. Foi sugerido que as cabeçadas dovitelo no período anterior à ordenha conduz a umamais completa descida do leite (Hafez e Limeweaver,1968) podendo mesmo favorecer e estimular a produção futura (Haley et al., 1998).

Comparando animais a amamentar durante 6 semanas enquanto também são ordenhados 3 ou 6vezes ao dia, com vacas que apenas são ordenhadas,descobriu-se que os animais a amamentar têm níveissuperiores de hormonas de crescimento e IGF-I,iguais níveis de ocitocina e prolactina, maior ingestãode matéria seca (apenas grupo das 6 ordenhas) e maiorperda da condição corporal (Bar-peled et al., 1995;Tancin et al., 2001). Mas o resultado mais surpreen-dente foi a demonstração de que as vacas ordenhadas3 vezes ao dia enquanto amamentam conseguiramproduções leiteiras globais superiores às que apenasforam ordenhadas 3 vezes ao dia. Mais recentementede Passilé et al. (2008) contestaram estas conclusõesao demonstrar que não havia vantagem em termos deprodução entre vacas que amamentavam e eramordenhadas duas vezes ao dia durante as primeiras 9 semanas pós-parto e aquelas que eram apenas ordenhadas. Os autores sugerem que os níveis maisbaixos de ocitocina encontrados na ordenha das vacasque também amamentavam, justificava essa diferença.

A possibilidade de que a separação depois de váriosdias ou semanas juntos pudesse influenciar a produçãoe saúde dos animais, também foi investigada. Após aseparação definitiva do vitelo que esteve com a vaca3-4 semanas, descobriu-se que a produção leiteira, osníveis de ocitocina e a velocidade da descida do leitesó foram menores na primeira ordenha após a sepa-ração (Tancin et al., 1995). Um outro estudo mostrouque os níveis de prolactina e ocitocina em resposta àmáquina de ordenha eram iguais aos 9 e 23 dias depoisda retirada de um vitelo que tinha estado com a mãedurante uma semana comparado com vacas na mesmafase da lactação, mas que tinham sido separadas logoapós o parto (Akers e Lefcourt, 1984). Comparando aprodução das vacas que continuam a amamentar osseus vitelos durante 10 dias com as que foram apenasordenhadas desde o parto, mostrou-se uma menor produção durante os cinco dias após a separação (-1,8kg/dia), mas a mesma produção global nos primeiros95 dias de lactação (Metz, 1987). O mesmo foi con-cluído num outro estudo (Walch, 1974) que comparou

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produção até à secagem de vacas separadas precoce-mente ou que amamentaram os vitelos por períodoslongos (6 a 12 semanas) – a produção foi 15% superior nas que se mantiveram com os vitelos e aincidência de mastites foi menor. Esta informaçãoparece indicar que as vacas que se mantêm com os filhos recuperam alguma produção após a separação,provavelmente devido aos factores fisiológicos e comportamentais positivos que já foram descritos.

O risco da separação tardia ameaçar o bem-estar davaca e cria é uma possibilidade a ter em conta. Asvacas separadas ao fim de 14 dias apresentaram maischamamentos, movimentos aleatórios e olhar para oexterior do parque, do que os animais-controlo(Flower e Weary, 2001). O mesmo aconteceu com osvitelos.

A comparação de vitelos amamentados durante 10dias com os separados imediatamente após o partodemonstrou que não existia diferença na velocidade dehabituação ao balde, mesmo sem ajuda humana(Metz, 1987). Os vitelos mantidos com as mãesdurante as primeiras semanas pós-parto, mostrarammaiores níveis de ocitocina (com conhecido efeitoanti-stress), enzimas gastro-intestinais, crescimentomais rápido, menores níveis de cortisol e um limiar detolerância à dor mais elevado (Lupoli et al., 2001).Também foram demonstrados indicadores de que amanutenção das vitelas com a mãe pode ter vantagensa longo prazo sobre a saúde e rendimento. Por exemplo, vitelas separados mais tarde foram tratadosmenos vezes para diarreia (Weary e Chua, 2000) ecresceram três vezes mais (Flower e Weary, 2001). Aprodução leiteira de novilhas que foram amamentadaspor longos períodos pela mãe, apresentam melhoresproduções quando entram em lactação (Krohn, 1999).Outros trabalhos com vitelas amamentadas pelas mãesdurante 42 dias demonstraram que maior altura aogarrote, maior ganho de peso, menor idade aoprimeiro parto e uma tendência para maior produçãode leite (Bar-Peled et al., 1997) Ainda mais interes-sante é a informação de que vitelos não separados,mas que não mamavam directamente na mãe, apresen-taram maior taxa de crescimento (Krohn, 2001). Rothet al. (2008) demonstraram que os animais amamenta-dos pelas mães durante 13 semanas, quer sejam mantidos permanentemente com a vaca ou apenaspara mamarem, mostravam menos necessidade dechuparem em objectos ou nuns nos outros.

Os vitelos separados ao fim de 14 dias mostraramum relacionamento social mais intenso com animaisestranhos às 6 semanas de idade quando comparadoscom aqueles que foram isolados ao fim de 1 dia(Weary e Chua, 2000). Os vitelos amamentados poruma vaca nas primeiras semanas de vida mostrarammais actividade social do que os que foram isolados ànascença (Le Neidre e Sourd, 1984). Esta diferença foimais evidente em animais de raça Saller do queFrisian o que parece demonstrar que a genética

também terá alguma influência. Alguns autores sugerem que presença maternal durante algum tempoapós o nascimento é importante para aprendizagemsocial e reduz a timidez (Krohn et al., 1999).

Os efeitos do momento de separação sobrereprodução futura

Uma outra questão frequentemente suscitada na discussão da validade ou não da manutenção dos vitelos com a mãe, é o reassumir da actividade hormonal reprodutiva e portanto a influência sobre osíndices reprodutivos da vaca. Numa altura em que senota a infertilidade generalizada das vacas super--produtoras, poderá ser importante analisar até queponto este tipo de estratégia poderá alterar a situação.Não existem muitos estudos em vacas leiteiras sobreesta questão e por isso as conclusões são ainda confusas e contraditórias. No entanto, grande partedos estudos efectuados em raças de carne mostra quehá uma correlação directa entre a presença do vitelo amamar e o atraso no momento do primeiro cio.

Em vacas leiteiras, a condição corporal, os níveis deestradiol, de progesterona, de glucocorticóides, deprolactina e de FSH não mostraram diferenças duranteos 14 dias pós-parto em vacas que amamenta-ram/ordenhadas ou foram apenas ordenhadas. Noentanto, a amplitude e frequência dos picos de LHnos13 dias após-parto foram menores em vacas a ama-mentar (Carruthers et al., 1980b). Isto pode explicaratraso na primeira ovulação que se demonstrou nessesanimais. No mesmo sentido um outro estudo confir-mou que as vacas que amamentaram os vitelosenquanto eram ordenhadas duas vezes ao dia,mostraram um maior intervalo parto – 1ª ovulaçãopós-parto (39,7 versus 21,2 dias) do que vacas apenasordenhadas. Também a frequência e a amplitude dospicos de LH foram menores aos 7 e 14 dias pós-partonas vacas que amamentaram (Carruthers e Hafs,1980a). No entanto, não foram encontradas diferençasno tempo até concepção. Outros autores tambémdemonstraram diferenças entre vacas a amamentar evacas controlo no tempo até primeiro cio – 44 vs 31dias (Krohn et al., 2001) e 66 vs 41 (Thomas et al.,1981) – mas não encontraram diferenças no tempo atégestação. Estes resultados parecem indicar que, apesardo retomar da actividade hormonal completa se fazermais tarde nas vacas a amamentar, a fertilidade é melhor quando finalmente são inseminadas.

Em contraste, Metz (1987), mostrou um reassumirda actividade reprodutiva mais cedo nas vacas separadas imediatamente após o parto (intervaloparto-1º cio mais curto), mas também a um menorintervalo parto-concepção comparado com as vacasque amamentaram as crias (66 vs 97 dias).

Um estudo efectuado no México (Perez-Hernandezet al., 2002), com vacas de duplo propósito que eram

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ordenhadas uma vez ao dia na presença do vitelo edepois amamentavam vitelos durante o resto do dia,demonstrou que atrasar a amamentação por 8 horasapós a ordenha manual, reduz o intervalo parto-1º cioe parto-1ª ovulação.

Conclusões

Definir a melhor estratégia para separação do viteloda mãe depende do peso que se dá aos diversos factores envolvidos. Por exemplo, o peso dos valoreséticos e de bem-estar são muito importantes em algunspaíses europeus sendo por isso de esperar que umperíodo de manutenção do vitelo com a mãe se mantenha ou prolongue.

Parece ser consensual que o bem-estar dos vitelos, emesmo das vacas, é melhor se os dois se mantiveremjuntos durante muitas semanas, mas não perece ser tãoóbvio quando se compara a separação imediata com amanutenção durante o período de colostro (1 a 3 dias).Nestes últimos casos os riscos sanitários e o stress daseparação são desvantagens que podem ultrapassar osbenefícios da amamentação. Por outro lado pareceestar comprovado que a produção leiteira global, asaúde do úbere e mesmo os índices reprodutivos nãosão afectados nas vacas que amamentam os vitelosdurante várias semanas.

Finalmente é também de levar em conta o facto de,nalguns tipos de exploração, o método consideradoideal para o bem-estar não ser exequível ou poderconduzir a problemas mais graves.

Ou seja, apesar da abundância de estudos sobre oassunto não parece ser possível estabelecer qual o método que associe as maiores vantagens para obem-estar animal e para o rendimento da exploração.Aliás as recomendações da EFSA sobre este tema,emanadas do relatório final do Working Group inDairy Cow Welfare (in Press) comprovam exacta-mente isso: "The duration and management of theperiod during which calves should remain with thecow after parturition should be further studied" e "Theoptimal time and procedure for separating the calffrom the cow needs to be further investigated."

No entanto, a apresentação que aqui se fez dos estudos mais relevantes permitirá ao produtor escolhermais racionalmente o método que melhor se adapta àssuas condições, aos seus desejos e às eventuaisexigências dos seus clientes.

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A produção de ovinos Damara e Dorper e de caprinos silváticos em sistemas extensivos de produção na Austrália

The production of Damara and Dorper sheep and feral goats in extensive production systems in Australia

André Martinho de Almeida*

IICT – Centro de Veterinária e Zootecnia & CIISA – Centro Interdisciplinar de Investigação em Sanidade Animal, Faculdade de Medicina Veterinária, Av. da Universidade Técnica, 1300-477 Lisboa

R E V I S T A P O R T U G U E S A

CIÊNCIAS VETERINÁRIASDE

ARTIGO DE REVISÃO

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Resumo: A pecuária australiana tem sido caracterizada desde oinício da colonização europeia por um predomínio de produçãode lã tendo como base a criação de ovinos de raça merina. Aolongo da última década, uma série de factores, nomeadamenteuma redução dos preços da lã e o aumento dos custos com atosquia, têm contribuído para que estes sistemas tendam a sersubstituídos por outros menos convencionais: nomeadamente aprodução de ovinos de raças de pelo e a exploração de caprinossilváticos. Os objectivos deste artigo são descrever as alteraçõesque afectam os sistemas extensivos tradicionais de produção delã na Austrália e quais as soluções apresentadas localmente porcientistas, técnicos de extensão e agricultores.

Summary: Australian animal production is characterized sincethe begining of the European colonization by a predominance ofwool production based on Merino stock. Over the last decade, aseries of factors, with special reference to a drop in wool pricesand an increase in shearing costs, has lead to the search foralternative small ruminant production systems such as the useof hair sheep breeds (Dorper and Damara) or feral goats. The objective of this paper is to describe the advantages andinconveniences of such an evolution.

Introdução

Factores limitantes de natureza ambiental, económica,técnica, bem-estar e maneio animal condicionam edefinem os sistemas de produção animal em qualquerregião do mundo. Os ecossistemas mediterrânicos, emespecial os europeus em que Portugal se insere, têmuma série de elementos em comum com as designadasregiões semi-desérticas de continentes tão distantescomo a Austrália, os Estados Unidos ou a América doSul. Será lícito pois pensar que as evoluções e alterações de variada ordem que afectam essas regiõesterão repercussões e poderão constituir exemplos deinteresse extremamente relevantes para os sistemasprodutivos existentes na Europa do Sul e concreta-mente Portugal. O melhor exemplo do anteriormente

referido tem sido a aceitação e o êxito que variedades de plantas pratenses desenvolvidas naAustrália têm tido em países como Espanha, França,Portugal, África do Sul ou Estados Unidos. Os objec-tivos deste artigo são descrever as alterações que afectam os sistemas extensivos tradicionais de produçãode lã na Austrália e quais as soluções apresentadaslocalmente por cientistas, técnicos de extensão eagricultores. Este artigo resulta de um período de permanência do autor no Dryland Research Institutedo Department of Agriculture of the Government ofWestern Australia, Merredin (WA, Austrália) nosmeses de Setembro a Novembro de 2007.

A pecuária australiana caracteriza-se pela existênciano país de três tipos maioritários de sistemas de explo-ração de terra, diferenciados entre si essencialmentepela pluviosidade de cada uma dessas regiões (verFigura 1a). Esses três sistemas são: a) zonas de pluviosidade elevada; b) zonas de produção de trigo eovinos merino e c) zonas de pastorícia em sistemas deranching. Para informações detalhadas sobre os váriossistemas de exploração de terra na Austrália recomen-da-se a leitura de Jayasuriya (2007). A localização dostrês tipos de sistemas encontra-se descrita na Figura 1b.

O sistema existente em zonas de pluviosidade elevadas caracteriza-se por uma produção animal evegetal de tipo intensivo, nomeadamente culturas deelevada rentabilidade como frutos, milho ou a produção de vinhos para exportação. No que dizrespeito à produção animal caracteriza-se pela produção leiteira (raça Frísia), produção de carne bovina (animais de raças do tronco britânico como oAngus) e produção de ovinos merino (ver exemplaresnas Figuras 2a e 2b) e de raças britânicas para produção de lã e carne (Jayasuriya, 2007).

O segundo sistema conjuga as produções de umcereal, usalmente trigo para exportação com a produção de lã, utilizando-se animais de raça merinoaustraliano. As rotações envolvidas neste tipo de *Correspondência: [email protected]

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sistemas são muito simples e incluem uma sucessãode 2-3 anos de cultivo de um cereal de inverno, seguido de uma cultura forrageira, habitualmentelupinos e de um número varíavel de anos comopastagem para ovinos. A principal produção deste sistema é o trigo, seguido da lã (Jayasuriya, 2007).

A produção extensiva de ruminantes em sistemas deranching é uma das mais conhecidas aptidões dapecuária da Austrália. Tal produção está baseada na criação de bovinos de raças zebuínas ou de ovinos deraça merina em regime extensivo em propriedades degrande dimensão e utilizando-se àreas não aptas para aprodução de culturas agrícolas, tais como as ilustradasna Figura 2c (Bindon e Jones, 2001; Chapman et al.,1996; Khairo et al., 2007; Rovira, 1992).

As propriedades existentes no sistema de ranchingsão conhecidas localmente por stations (estações)envolvendo áreas de muitos milhares de hectares. Asestações são a forma dominante de produção pecuáriaem grande parte do continente australiano envolvendo,áreas em quase todos os estados: o interior e os 2/3norte da Austrália Ocidental, o Território do Norte, oInterior e o Norte de Queensland, o interior daAustrália do Sul, Nova Gales do Sul e Victoria. Talregião é conhecida localmente por outback.

O maneio dos animais nas estações é extremamentesimplificado na medida em que consiste apenas na reco-lha dos animais uma vez por ano para a marcação ouferra e consequente transporte para o mercado (bovinos)ou para a tosquia (ovinos), sendo que os animais sãodeixados soltos pela estação durante todo o ano alimen-tando-se de pastagens e arbustos expontâneos (Bindon eJones, 2001; Chapman et al., 1996; Khairo et al., 2007;Rovira, 1992).

No que respeita aos ovinos e como já referido, a raçausada neste sistema, assim como no de trigo e ovinos éa raça merino australiano. A principal produção destaraça é obviamente a lã, sendo que a carne é consideradaum subproduto, na medida em que apenas se aprovei-tam para produção de carne os animais de refugo comcarcaças de reduzido ou nulo valor comercial. O regimeextensivo de ranching impossibilita a prática de activi-dades de maneio como as castrações ou o acabamento,comuns em outros sistemas de engorda de ovinos,nomeadamente no sistema trigo e ovinos (Rovira, 1992).

A necessidade de alternativas à raçamerina na Austrália

Ao longo da última década, tem-se assistido a umasérie de factores de natureza exógena que têm condi-cionado fortemente a produção de lã australiana.

O mais importante desses factores consiste na quedado preço da lã ao produtor que se tem vindo a verificar.Essa queda do preço, faz com que muitas das unidadesde produção já não sejam tão rentáveis como seriam háalguns anos atrás, pelo que muitos produtores ponde-

ram a conversão das actividades das suas estações.Por outro lado, os elevados custos com mão-de-obra

de tosquia têm aumentado de forma significativarecentemente contribuindo igualmente e à semelhançado que se tem verificado noutros países desenvolvidospara a perda de interesse de actividades relacionadascom a produção de lã. A este factor junta-se a impos-sibilidade de se conseguir equipas de tosquiadorespara a época da tosquia dada a falta de interesse dejovens pela actividade e a reforma dos tosquiadoresexistentes, apesar do nível dos ordenados ser muitosuperior aos de outros trabalhadores agrícolas. Para colmatar esse facto recorre-se frequentememte à impor-tação sazonal de mão-de-obra estrangeira, nomeada-mente da Nova Zelândia, prática que se tem no entantorevelado insuficiente, dadas as necessidades.

Um outro factor que tem contribuído de forma significativa para a reconversão das exploraçõesextensivas tem sido uma sequência de vários anos deseca, factor agravado por expectáveis alteraçõesclimáticas motivadas pelo aquecimento global que seesperam para os proximos anos. A seca limita por umlado as disponibilidades de pastagem e água para osanimais domésticos e por outra leva à migração deanimais selvagens como o canguru vermelho ou a emaprovenientes de zonas desérticas para zonas depastagem onde competem com os animais domésticos.Predadores como os dingos tendem igualmente aseguir as migrações de animais selvagens e a aumentara predação sobre animais domésticos.

Finalmente, razões de bem-estar animal, têm levadoa que a prática de mulesing, necessária nas condiçõesde exploração australianas, esteja a ser progressiva-mente abandonada (Lee e Fisher, 2007; Petherick,2006). O mulesing é comum em muitas zonas daAustrália e consiste na remoção por meio de umobjecto cortante das pregas de pele em redor da caudado ovino merino. Tal prática tem como objectivoimpedir que determinadas espécies de moscas dafamília Calliphoridae (conhecidas localmente porblow flies) depositem os seus ovos na lã nessa área docorpo do animal e dessa forma impedir que as larvasse alimentem dos tecidos do hospedeiro (Townsend,1987). Este problema provoca perdas substanciais namedida em que os animais afectados perdem condiçãocorporal e a sua recuperação é extremamente díficil ecara em condições extensivas. O mulesing permiteassim impedir a fixação dos ovos das moscas e o desen-volvimento da parasitose. No entanto, e dado ser reali-zado sem recurso a anestesia, tem encontrado forteoposição junto de activistas de direitos dos animais eprevê-se que seja uma prática proibida em todos osEstados e Territórios Australianos a partir de 2010(Blackman, 2005; James, 2006; Palmer, 2004).

A conjunção destes factores faz com que muitosprodutores estejam a perder o interesse pela produçãode merinos e procurem soluções alternativas que lhespermitam melhorar os seus rendimentos. Tais soluções

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passam pela adopção de novas raças de pequenosruminantes e novos nichos de mercado, externos aomercado tradicional de lã australiano. As referidassoluções passam pois pela reconversão progressiva deum sector baseado na produção de lã para um sectorde produção de carne. Actualmente duas grandesalternativas estão a ser ensaiadas: a substituição doefectivo merino por raças ovinas mais rústicas,

nomeadamente as raças Damara e Dorper ou a consti-tuição de um efectivo caprino doméstico.

As raças ovinas Damara e Dorper

A raça Damara tem como origem animais de caudagorda e desprovidos de lã (ovinos de pêlo) existentesna Namíbia e criados pelas tribos Himba, Sjimba eHerero. A instalação dos primeiros colonos alemãesno Sudoeste Africano (Namíbia) em finais do séculoXIX terá deslocado estas tribos para o Norte daNamíbia, e possivelmente para o Sul de Angola. Emmeados do século XX a Namíbia encontrava-se sobadministração sul africana, existindo a chamada "linhavermelha", que impedia a passagem de animais doNorte da Namíbia para o Sul por motivos sanitários.Havia no entanto quem se dedicasse ao contrabandode animais através desta linha. Em 1954, uma apreensãode cinquenta animais ilegais por parte dos serviçosveterinários levou ao seu envio para a estação zootécni-ca de Omatjenne, onde principiou o desenvolvimentodesta raça nos moldes actuais, sendo que em 1986 seformou a Associação de Criadores de Damara daÁfrica Austral (de notar que na época a África do Sulmantinha ainda a administração da Namíbia obtida nasequência da primeira guerra mundial). Em 1990(independência da Namíbia) a raça tinha-se já espalhado por todo o território da Namíbia, bem comoalgumas regiões mais desérticas da África do Sul(Campbell, 1995; Du Toit, 2007).

O ovino Damara (ver Figura 3) poderá ser considera-do um animal de tamanho grande em que ambos ossexos têm cornos em forma de espiral, pernas compri-das e acumulação de gordura ao nível da cauda. As

Figura 1 - Pluviosidade e Sistemas de exploração de terra na Austrália. a- Distribuição da pluviosidade anual no continente australiano (adaptadode Australian Meteorology Bureau); b - Sistemas de exploração de terra naAustrália com ênfase para a produção de lã. Cada ponto azul representa aprodução de 100 toneladas de lã (Adaptado de Department of Agricultureof Western Australia, State Government, Perth).

Figura 2 - Merino Australiano (a e b) e paisagem típica das regiões de exploração de ruminantes em sistema de ranching (c). a e b – Merredin Shire,Western Australia; c – Shire of Westonia, Western Australia.

Figura 3 - Aspectos fenotípicos de ovinos de raça Damara. a – Carneiro Damara; b – Aspectos da cauda gorda em ovinos Damara; c - Heterogeneidadede pelagens em ovinos Damara. Merredin Shire, Western Australia

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cores do Damara são muito variadas, indo do preto aobranco, passando pelo castanho e ruão, tanto uniformecomo malhados. O pelo é curto ainda que durante oInverno e nos animais jovens um pelo mais compridosurja ocasionalmente (Campbell, 1995).

O ovino Damara está particularmente bem adaptadoàs condições semi-desérticas em que evoluiu. É reputada por possuir uma elevada resistência ao calor,capacidade de percorrer grandes distâncias e resistên-cia a doenças e parasitas. Outra das características particulares destes animais prende-se com o seu forteinstinto gregário o que possibilita um melhor maneioem condições extensivas e reduz as perdas devido aataques de animais selvagens como chacais em Áfricae dingos na Austrália. A este propósito deve-se aindareferir o forte instinto de protecção das ovelhas quefrequentemente investem contra predadores, cães e atépessoas para protegerem os borregos (Du Toit, 2007).

De todas as raças de cauda gorda, a raça Damara éprovavelmente aquela que terá uma expressão comer-cial mais significativa. A raça Damara tem sido aolongo da última década exportada para a Austrália,onde se tem vindo a afirmar como uma alternativapara os sistemas extensivos locais (Fleet et al., 2002),ainda que haja uma forte resistência à sua introduçãona medida em que a introdução acidental da sua fibraem lotes de lã fina para os mercados de exportaçãotenda a desvalorizar esses mesmos lotes (Fleet et al.,2001; Fulwood et al., 2002).

Tal como o Damara, o ovino Dorper (ver Fgura 4) éuma raça oriunda da África do Sul. Esta raça surgiunos anos 20 do século XX, em resposta ao aumento daprocura de carne de borrego em Inglaterra, que porsua vez aceitava bastante mal os animais de caudagorda até então muito utilizados na África do Sul. Odesenvolvimento do Dorper deu-se na estação deGrootfontein e envolveu cruzamentos de Dorset Horncom animais de raça Persa de cabeça Preta. O Dorperdeveria possuir boa prolificidade, qualidades de carcaça aceitáveis, produzir um borrego de abate (parao mercado inglês) com 4 a 5 meses em condições deprodução extensivas, resitência ao frio da estação secae ao calor da estação chuvosa, capaz de se reproduzirdurante todo o ano e de se alimentar de arbustos egramíneas de escasso valor nutritivo e ainda a ausênciade lã. Actualmente existem dois tipos de Dorpers, o de

cabeça negra e o de cabeça branca, sendo o primeirobastante mais difundido do que o segundo. O ovinoDorper (ver Figura 4) poderá ser considerado um animal de tamanho médio grande desprovida decornos, conformação maciça e excelente conformaçãode carcaça. Possui uma pelagem homogénea comcorpo branco e cabeça preta. O pelo comprido doInverno tende a cair no início da Primavera (Milne,2000; De Waal e Combrinck, 2000).

Esta raça permitiu elevar de forma significativa osrendimentos da ovinicultura nas regiões do interior daÁfrica do Sul, espalhando-se por todo o país, assimcomo pela Namíbia. Na década de 60 existiam já doismilhões de animais e hoje existem na África do Sulmais de 7 milhões de animais. Para além da Namíbia,encontram-se igualmente explorações com estes animais em toda a África Austral. Foi igualmenteexportada para o Brasil – onde à semelhança do caprino Boer, desperta bastante interesse dos criadoresnos estados do Nordeste – para a Austrália, Israel,Arábia Saudita, México, Canadá e Estados Unidos(Milne, 2000; De Waal e Combrinck, 2000).

No contexto australiano, estas raças apresentam paraos produtores várias vantagens: 1) Não necessitam deser ser tosquiadas pois são desprovidas de lã. Destaforma evitam-se os gastos em tosquia, necessários eobrigatórios em sistemas baseados na raça merina; 2)São raças bastante rústicas, oriundas de zonas desérti-cas da África do Sul possuem uma reputação de estarmelhor adaptadas a condições de escassez de água e depastagem. Por outro lado o seu perfil alto e esguio(Damara) permite-lhe percorrer maiores distâncias embusca de alimento; 3) Ao contrário das raças ovinaseuropeias, a raça Damara inclui na sua dieta uma pro-porção bastante grande de folhas e ramagens de arbus-tos, e cascas de árvore, podendo pois ser consideradoum browser à seme-lhança dos animais da espécie cap-rina; 4) Ao ter instintos gregários e de protecção muitodesenvolvidos, são capazes de impedir de forma eficaza acção de predadores como o dingo (cão selvagem australiano); 5) A ausência de lã e a forma da caudaimpedem que ovos e larvas de moscas se fixem no seucorpo, tornado assim desnecessária a prática demulesing; 6) No caso do Damara que se trata de umovino de cauda gorda, semelhante aos existentes noMédio Oriente, a sua carcaça é muito apreciada nessas

Figura 4 - Ovinos Dorper. a – borregos dorper; c – detalhe da cabeça de um borrego dorper de cabeça preta; c – borrego dorper. Merredin Shire,Western Australia

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regiões. O ovino Damara possui assim um elevado valorpara exportação nomeadamente para os países árabesprodutores de petróleo e com elevado poder de comprae que realizam importações significativas de bens ali-mentares, nomeadamente de animais vivos para abatesegundo o ritual Halal. A raça Dorper não possui caudagorda mas tem uma excelente conformação o que atorna particularmente adequada à exportação de car-caças para os mercados tradicionais de carne ovinaautraliana: Reino Unido, Europa Continental e Américado Norte (Burt et al., 2004).

Na Figura 5a apresentam-se as proporções de ovinosmerino e de outras raças nos vários estados australianos,assim como um total nacional. Como é patente, a pro-porção de animais merino é muito superior em todosos estados (de 68 a 92%), sendo que a de ovinos não merinos ronda os 8-32% consoante o estado. No estado da Austrália Ocidental, essa proporção ronda os10%, sendo que os ovinos de cauda gorda (comdestaque para os Damara), constitutem já 4% do efectivo. Uma proporção considerável, se se tiver emconta que a introdução dos primeiros animais decauda gorda se realizou em meados da década de1990.

Performances produtivas de ovinosDamara e Dorper na Austrália Ocidental

As características produtivas da raça Dorper encon-tram-se amplamente estudadas sendo de destacar a título de interesse a revisão sobre o assunto de Cloete etal. (2000). Já a raça Damara e suas performances é emgrande parte desconhecida, tanto na África do Sul comofora dela. Na Austrália, os dados produtivos de ambasas raças são relativamente escassos e de difícil acesso, namedida em que grande parte do conhecimento gerado aonível de ensaios experimentais se encontra disperso porrelatórios oficiais dos serviços e revistas técnicaslocais. Há a destacar os trabalhos de Kilminster (2007)que compara a performance reprodutiva e de cresci-mento de animais de raça Damara, Dorper e MerinoAustraliano e que parecem indicar uma superioridadedas duas raças Damara e Dorper face aos Merinos(taxas de natalidade de 88, 93 e 22% respectivamente),para aquele ensaio e ano em particular. No que respeitaao crescimento dos borregos, há a destacar um pesovivo aos 40 dias de 17,8 kg, 18,6 kg e 15,7 kg para borregos machos Damara, Dorper e Merino respectiva-mente. Em fêmeas esses valores são respectivamente de17,1 kg, 20,3 kg e 14,2 kg. Aos cinco meses, os borregosmachos pesavam 32,6 kg, 38,5 kg e 31,0 kg paraDamara, Dorper e Merino respectivamente, o que setraduz num ganho médio diário entre as duas idades de134, 181 e 139 g/dia. As fêmeas aos 5 meses pesavamuma média de 29,6 kg para a raça Damara, 36,7 kg para araça Dorper e 28,2 kg para a raça Merino, com os ganhosmédios diários respectivos de 114, 149 e 127 g/dia.

Dado que grande parte destes animais são exporta-dos vivos, os dados de qualidade da carcaça são aindamais escassos. É de destacar no entanto os dados publicados por Scanlon et al. (2008) que parecemapontar, em borregos de 7-8 meses das três raças anteriormente mencionadas, para rendimentos de carcaça de 39,8% em merino, 43,9% em Dorper e42,7% na raça Damara.

Os caprinos silváticos

Salvo raras excepções, nomeadamente mamíferosmarinhos e morcegos, os mamíferos placentários apenas foram introduzidos na Austrália aquando dacolonização humana. Alguns dos animais domésticosintroduzidos pelo homem escaparam ao seu controle eestabeleceram populações selvagens ou silváticas. Omais antigo desses animais é um canídeo chamadodingo e com origem nos cães domésticos asiáticos,tendo colonizado o continente Australiano há cerca de4.000 anos com os primeiros aborígenes. A coloniza-ção europeia iniciada no século XVIII conduziu àintrodução, deliberada ou acidental, de váriosmamíferos e aves, essencialmente de proveniênciaeuropeia. A mais conhecida dessas introduções foi ado coelho que a partir de alguns animais libertados

Figura 5 - Proporções relativas de tipos de ovino nos Estados Australianose no da Austrália Ocidental. a - Proporções relativas de ovinos de raçamerina e restantes no cômputo geral do efectivo australiano total e porestado. WA – Austrália Ocidental (Western Australia); SA – Austrália doSul (South Australia); QLD – Queensland; NSW – Nova Gales do Sul(New South Wales); VIC – Victoria e Tas – Tasmânia. b - Proporções rela-tivas de ovino merino, de cauda gorda (e cruzamentos) e dorper / raçasinglesas (e cruzamentos) no estado da Austrália Ocidental. Adaptado deBurt et al. (2004) e Curtis et al. (2009).

a

b

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numa quinta no leste do país se estabeleceu num curtoespaço de tempo uma população de vários milhões deanimais. Outras introduções ocorreram no entantocomo a da raposa vermelha o que levou à extinção devárias espécies endémicas, nomeadamente, répteis emarsupiais. No que respeita aos animais domésticos,várias espécies foram introduzidas na Austrália: dromedários, cavalos, burros e búfalos de água (animais usados para movimentar cargas e que o usodo automóvel revelou desnecessários, tendo sidoabandonados pelos seus proprietários), mas tambémporcos e principalmente cabras (Wilson, 1992).

À semelhança dos suínos, animais da espécie caprina foram libertados na costa australiana no séculoXVIII por marinheiros com vista ao aumento dasdisponibilidades alimentares em caso de naufrágio. Àmedida que a colonização se estendia ao interior também as cabras acompanharam os pioneiros comofornecedoras de leite e carne de baixo custo. Noentanto, intencional ou acidentalmente, muitos dessesanimais escaparam aos seus proprietários, estabale-cendo-se assim uma população silvática não só nocontinente australiano como em pequenas ilhas adjacentes e na Tasmânia (Mahood, 1983). A dis-tribuição das cabras silváticas engloba a totalidade dosestados de Nova Gales do Sul e Victoria, a metadeOeste da Austrália Ocidental, o sul de Queensland, oleste da Austrália do Sul e do Território do Norte,assim como o norte e o leste da Tasmânia (ver Figura6). Com efeito apenas as zonas verdadeiramentedesérticas do centro do país ou as zonas de florestatropical do norte de Queensland e do Território doNorte não possuem estes animais, assim como algu-mas zonas de reservas naturais onde a sua populaçãotem sido controlada (Sharp et al., 1999). O governo

australiano estima que cerca de 2,3 a 2,6 milhões decaprinos silváticos existam no país, sendo que no esta-do da Austrália Ocidental (WA) esses números sejamde 750.000 (28 a 32%).

As cabras exercem uma pressão notável sobre oecossistema. Alimentam-se de espécies vegetaisautóctones, gramíneas, arbustos e árvores. Em situações de seca e de sobrepastoreio, as cabrasdestroem a vegetação autóctone, competem com osanimais selvagens e gado doméstico (nomeadamenteovinos), conspurcam as fontes de água e contribuemdesta forma para o aumento da erosão e da desertifi-cação em zonas ecologicamente muito frágeis e a suaerradicação exige um esforço bastante grande porparte das autoridades (Sharp et al., 1999).

A cabra silvática austaliana é frequentemente considerada como uma raça ou tipo. No entanto, dadaa sua origem em múltiplas e desconhecidas raças e atotal ausência de critérios de selecção, verifica-se umaelevada heterogeneidade de animais: pelo compridoou curto; côr do preto ao branco; tamanho muito variado. Na Figura 7a apresenta-se um dos tipos deanimais que se podem encontrar na AustráliaOcidental. No entanto, é de destacar a extrema adap-tabilidade das cabras silváticas às duras condiçõesaustralianas, que faz com que sobrevivam em grandenúmero, mesmo em condições de seca que provocamelevada mortalidade em ovinos domésticos.

Dado que a maioria dos colonizadores da Austráliaera proveniente das ilhas britânicas, país onde o consumo de carne de caprino não é a pimeira escolha,ao contrário dos países mediterrânicos, nunca se estabeleceu um circuito comercial interno de carne decaprino. Esse facto, assim como a inacessibilidade e a parca população de grande parte do interior australiano poderá explicar o elevado número de animais existentes. Uma vez que historicamente sempre se previligiaram as trocas comerciais com aantiga metrópole, nunca se estabeleceu igualmente ummercado externo de carne caprina. Assim, os caprinosforam sempre considerados uma espécie a erradicarou a pelo menos tentar controlar (Parkes et al., 1994).

Ao longo dos últimos quinze anos a situação tem-sealterado na medida em que a procura de carne de caprino tem aumentado de forma significativa emdeterminados mercados asiáticos (nomeadamenteTaiwan, Singapura, Malásia e Coreia), assim como omercado hispânico nos Estados Unidos da América ouos países do Golfo Pérsico. Esse aumento da procuralevou a que Austrália seja actualmente o maior exporta-dor de caprinos do mundo tendo no entanto uma procu-ra interna muito reduzida (Ferrier e McGregor, 2002).

A exportação de carne caprina assenta essencialmen-te numa "actividade de extracção" das cabras silváticas,ou seja na recolha dos animais nas estações em que elesse encontram, de forma muito semelhante à praticadana obtenção de carne de outros animais como porexemplo o canguru cinzento (Thompson et al., 2002).

Figura 6 - Distribuição geográfica das cabras silváticas na Austrália.WA – Austrália Ocidental (Western Australia); NT – Território do Norte(Northern Territory), SA – Austrália do Sul (South Australia); QLD –Queensland; NSW – Nova Gales do Sul (New South Wales); VT –Victoria e Tas – Tasmânia (Adaptado de Department of Environment andHeritage, Canberra, Austrália).

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A recolha de cabras silváticas faz-se com recurso acercados móveis no interior dos quais se colocam pontos de abeberamento (ver figuras 7b e 7c). A entrada nos cercados faz-se apenas por meio de portasunidireccionais que impedem a saída dos animais. Oscaprinos são assim recolhidos e transportados parasacrifício por camião (mercados asiático e norte--americano) ou para exportação de animais vivos(mercados do médio Oriente).

Performances produtivas de caprinos silváticos

As performances produtivas dos caprinos silváticosaustralianos são muito heterogéneas e têm sido alvo detrabalhos de investigação de variados autores, envol-vendo sistemas de extração como o anteriormentedescrito (Thompson et al., 2002). Recentemente tem--se procurado melhorar o rendimento e a confomaçãodas carcaças através do cruzamento de cabras silváticas australianas com machos de raça Boer(Mills et al., 2002; Kleeman et al., 2002; Sumarmonoet al., 2002). De igual forma têm-se realizado experi-ências de cruzamento com animais de raça Saanen(Mcosker et al., 1998; Husain et al., 2000). Em ambasas situações tem-se registado um aumento das performances zootécnicas dos animais cruzados

comparativamente aos animais silváticos pelo que seráde esperar que num futuro próximo estes cruzamentosse tornem prática comercial comum. Na Tabela 1 apre-senta-se uma súmula de um conjunto de parâmetrosprodutivos de caprinos silváticos, obtida a partir dasreferências acima citadas. Os valores permitirão a suacomparação tanto com sistemas de exploração comcaracterísticas similares, assim como com sistemasmenos extensivos, nomeadamente de outras regiões doglobo. Finalmente, na Figura 8, apresentam-se curvasde crescimento para animais de raça silvática australiana e de animais cruzados de Boer. Tanto naFigura 8 como na Tabela 1, é patente a vantagem emtermos zootécnicos dos cruzamentos de animais boercom animais siváticos.

Conclusões

A produção de lã merina tem sido a base da pecuária australiana ao longo dos últimos 150 anos,utilizando-se para tal sistemas de exploração exten-sivos. Recentemente, tem surgido a necessidade de substituição desses sistemas de exploração por outrosbaseados em raças que requeiram menores inputs eque exijam menos atenção por parte dos produtores.Estes sistemas priveligiam o mercado de exportação,com particular relevância para mercados emergentes

Figura 7 - Caprinos silváticos australianos. a - Exemplar de caprino silvático australiano em liberdade; b e c – detalhes dos cercados usados para acaptura de caprinos silváticos. Shire of Shark Bay, Western Australia.

Tabela 1 - Parâmetros Produtivos de caprinos silváticos australianos e seus cruzamentos

Parâmetro Produtivo Valor alcançado Referência

Taxa Fertilidade caprino silvático puro 93,4 % Kleeman et al. (2000)

Cabritos por cabra prenha cap. Silvático puro 1,58 Kleeman et al. (2000)

Taxa Sobrevivência de cabritos silváticos puro 91,1 % Kleeman et al. (2000)

Cabritos silváticos p/100 cabras silváticas à cobrição com macho silvático 132 Kleeman et al. (2000)

Taxa Fertilidade caprino silvático cruzado Boer 93,4 % Kleeman et al. (2000)

Cabritos por cabra prenha cap. Silvático cruzado macho Boer 1,55 Kleeman et al. (2000)

Taxa Sobrevivência de cabritos silváticos cruzados Boer 89,1 % Kleeman et al. (2000)

Cabritos silváticos p/100 cabras silváticas à cobrição com macho Boer 129 Kleeman et al. (2000)

Ganho Médio Diário cabrito silvático (8 semanas) 130 g/dia McCosker et al. (1998)

Ganho Médio Diário cabrito silvático cruzado Boer (8 semanas) 150 g/dia McCosker et al. (1998)

Ganho Médio Diário cabrito silvático cruzado de Saanen (8 semanas) 145 g/dia McCosker et al. (1998)

Rendimento de carcaça (326 dias) 50,8 % Sumarmono et al. (2002)

Percentagem de músculo (326 dias) 71,9 % Sumarmono et al. (2002)

Rácio Músculo / Osso (326 dias) 4,2 Sumarmono et al. (2002)

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Almeida AM RPCV (2008) 103 (567-568) 127-134

como o Sudeste Asiático ou as nações Árabes doGolfo Pérsico. Esta situação é extremamente interes-sante e poderá ser considerada como um exemplo deevolução e adaptabilidade de sistemas produtivos praticados em zonas semi-desérticas que, se exceptuarmos as devidas salvaguardas sanitárias,encontram paralelo noutras zonas do globo nomeada-mente a África Austral, o Sudoeste dos EstadosUnidos da América o Nordeste do Brasil, a ÁsiaCentral ou mesmo a bacia do Mediterrâneo.

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Figura 8 - Curvas de crescimento de animais de raça silvática e cruzadosde Boer (nos dois casos em ambos os sexos), dos 45 aos 495 dias.Adaptado de Mills et al. (2000).

Pes

o vi

vo (

Kg)

Idade (dias)

Silvático

Boer xSilvático

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Demodicose canina

Canine demodicosis

José Pedro A. Leitão1, João Paulo A. Leitão2*

1União Zoófila, Rua Padre Carlos dos Santos, São Domingos de Benfica, Lisboa2Centro Médico Veterinário de Cabeço de Mouro, Rua António Tomás Botto, lote3, loja1, Urbanização Cabeço de Mouro.

2785-008 São Domingos de Rana

R E V I S T A P O R T U G U E S A

CIÊNCIAS VETERINÁRIASDE

ARTIGO DE REVISÃO

135

Resumo: A demodicose canina (DC) surge pela multiplicaçãoexagerada de ácaros do género Demodex. Existem três espéciesdescritas de Demodex no cão, sendo a D. canis a mais frequente.No desenvolvimento da doença interferem vários factores quecondicionam um desequilíbrio na regulação da população dos ácaros na pele, no qual a predisposição hereditária e a imunidade celular têm um papel chave. A observaçãomicroscópica do produto da raspagem cutânea permite, salvoalgumas excepções, obter um diagnóstico definitivo e rápido. Apossível presença de outras patologias em simultâneo deve serinvestigada pois influencia o sucesso terapêutico. Estãodescritas várias formas de apresentação de DC, as quais ditamqual a abordagem diagnóstica e terapêutica a adoptar. O tratamento é, na maioria dos casos, bem sucedido e existempoucas recidivas se se cumprirem os protocolos terapêuticos e oseguimento adequado.

Summary: Canine demodicosis (CD) emerges from exageratedproliferation of demodectic mites. D. canis is the most frequentof the three species of Demodex mites in the dog. The course ofdisease depends on multiple factors, wich may disrupt the regulation of skin mite populations. Immunity and genetics playan important role in the development of CD. Skin scrapingsoffers a quick and easy diagnosis in most cases. Concurrent diseases should be investigated as they influence the treatmentoutcome. CD has different clinical presentations. Diagnosticapproach and terapeutics depends on the age of onset of diseaseand affected body surface. Prognosis is often good and fewrelapses occurs if apropriated treatment protocol and follow-upare taken.

Introdução

A demodicose canina (DC), dermatite resultante damultiplicação excessiva de ácaros do género Demodexna pele dos cães, é uma doença multifactorial onde apresença do ácaro se conjuga com factores genéticos e imunológicos do animal (Griffin et al., 1993). A raspagem da pele em profundidade permite com facilidade a detecção de ácaros do género Demodexem cães afectados por esta doença (Mathet et al.,

1996). O tratamento depende das formas de apresen-tação da doença, é geralmente bem sucedido mas podeser bastante difícil e prolongado.

Etiologia

A DC resulta da proliferação excessiva de ácaros do género Demodex (Figura 1) na pele dos cães(Guaguère, 1991).

Além de D. canis foram relatadas mais duas espécies de Demodex no cão: uma forma curta deno-minada D. cornae, e uma forma longa denominada D.injai (Tabela 1) (Medleau e Hnilica, 2006). A "formacurta" apresenta características morfológicas distintas

*Correspondência: Tel/Fax: + 351 214456566

Tabela 1 - Dimensões das três espécies do género Demodex (Ferrer,1997; Scott et al., 2001; Gross et al., 2005)

Demodex canis Demodex cornae Demodex injaiMacho adulto 90-148 µm 334-368 µm

40-250 µm abdómen largo e truncado

Fêmea adulta40-300 µm

Figura 1 - Raspagem de pele. Note-se a multiplicação excessiva deácaros D. canis (objectiva 10x) (original).

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e habita preferencialmente o estrato córneo da epiderme (Nesbitt e Ackerman, 1998; Gross et al.,2005) (Figura 5). Na maioria dos casos encontra-seem associação com D. canis (Scott et al., 2001). Osácaros da espécie Demodex injai parecem habitar osfolículos pilosos e as glândulas sebáceas (Mueller e

Bettenay, 1999; Gross et al., 2005) (Figura 6). Até àdata só está descrito na DC generalizada adulta, espe-cialmente nas raças terriers e seus cruzamentos(Medleau e Hnilica, 2006). O West Highland WhiteTerrier parece ter a maior incidência (Medleau eHnilica, 2006). O modo de transmissão destas espé-cies é ainda desconhecido (Medleau e Hnilica, 2006).

Ciclo de vida

O ciclo de vida de D. canis é homoxeno, temduração aproximada de 18 a 35 dias e compreende 4estádios evolutivos: ovo fusiforme; larva hexápoda(Figura 2); ninfa e adulto, ambos octópodes (Nesbitt eAckerman, 1998) (Figuras 3 e 4). O ácaro habita osfolículos pilosos, as glândulas sebáceas ou, mais rara-mente, as glândulas sudoríparas apócrinas, alimentan-do-se de células, secreções e detritos epidérmicos(Mur, 1997). A presença do ácaro em localizaçõesextra cutâneas (linfonodos superficiais e profundos,parede intestinal, baço, rins, bexiga, pulmões, tiróide,sangue, leite, urina e fezes) resulta da drenagem linfática e sanguínea após ruptura folicular (Scott etal., 2001; Gross et al., 2005). Em condições clínicas,os ácaros da espécie D. canis não sobrevivem fora dosfolículos pilosos, na superfície corporal ou fora dohospedeiro (Ferrer, 1997).

Transmissão

A transmissão de D. canis ocorre por contacto directo da progenitora para a sua ninhada, ou entre oscachorros da ninhada, durante as primeiras 48 a 72horas pós-parto (Scott et al., 2001; Gross et al., 2005).A transmissão intra-uterina parece não acontecer pois

Figura 2 - Raspagem de pele. Larva e adulto de D. canis (objectiva 40x)(original).

Figura 4 - Raspagem de pele. Ninfa de D. canis (objectiva 40x) (original).

Figura 3 - Raspagem de pele. Fêmea adulta e ovo de D. canis(objectiva 40x) (original).

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em cachorros abortados ou nascidos por cesariana eseparados das mães infectadas não foi possíveldemonstrar ácaros (Leitão e Oliveira, 2003). O modode transmissão de D. injai e de D. cornae não são conhecidos. A DC não é considerada contagiosa entreanimais saudáveis após o período neonatal, uma vezque a convivência entre cães com demodicose genera-lizada e cães saudáveis em ambiente confinado ou ainoculação de soluções contendo ácaros na pele deanimais saudáveis não produzem doença evolutiva(Mathet et al., 1996). Quaisquer lesões que surjamcuram espontaneamente (Nesbitt e Ackerman, 1998).D. canis não é considerado contagioso para gatos ouseres humanos (Tilley and Smith, 2004).

Patogenia

D. canis está presente em pequeno número comocomensal na pele e nos condutos auditivos em cercade 30% a 80% dos cães saudáveis, mas apenas algunsdesenvolvem a doença (Paradis, 2000; Gross et al,2005). O agente etiológico não é, portanto, o respon-sável exclusivo pela patologia (Paradis, 2000).Nalguns animais, a pele constitui um habitat favorável para a rápida reprodução e crescimento deD. canis, gerando a demodicose (Scott et al., 2001).As condições específicas que favorecem esta prolife-ração anormal são apenas parcialmente conhecidas(Griffin et al., 1993). Parece tratar-se de uma doençamultifactorial onde factores genéticos e imunológicos,parasitários e bacterianos, ecológicos cutâneos eambientais se conjugam de forma intrincada (Leitão eOliveira, 2003). Os conceitos actuais assentam sobre acoexistência de uma supressão da imunidade celular ede uma predisposição hereditária (Griffin et al.,1993).

A predisposição hereditária tem sido suportada pelamaior prevalência da doença em cães de raça pura, porcertas raças serem mais afectadas do que outras, pela

associação da DC com outras doenças hereditárias emBeagles (ex. deficiência em factor VII) e por nas ninhadas afectadas parte ou a totalidade dos cachorrosapresentarem DC generalizada (Scott et al., 2001). Asraças com presisposição para demodicose segundoHill, (2002) são: Boston Terrier, Jack Russel Terrier,Scottish Terrier, Boxer, Bulldog, Chihuahua, Dalmata,Daschund, Doberman pinscher, Dogue alemão, Galgoafegão, Malamute do Alasca, Old English Sheepdog,Pointer, Shar-pei, Weimaraner, West Highland WhiteTerrier. A eliminação dos animais demodécicos ouportadores do ácaro (progenitores e crias) dos progra-mas de reprodução permitiu a redução ou mesmo aerradicação da doença em alguns canis de reprodução(Scott et al., 2001). A análise da incidência de DC emalguns canis de criação (Collies e Beagles) sugereuma transmissão hereditária autossómica recessiva(Scott et al., 2001; Gross et al., 2005).

Uma disfunção imunitária desempenha um papelfundamental na patogenia da DC (Mathet et al., 1996).A DC generalizada pode ser induzida por adminis-tração de soro anti-linfócito ou de altas doses de corticosteróides e é observada em até 8% dos cãesadultos com hiperadrenocorticismo (Nesbitt eAckerman, 1998). No entanto, uma imunossupressãogeneralizada não explica a maioria dos casos de DC(Scott et al., 2001). Neste caso, cachorros com DCgeneralizada deveriam desenvolver infecções virais,pneumonias ou outras infecções sistémicas (Scott et al., 2001). Da mesma forma, cães adultos com neoplasias, sobretudo do sistema linforreticular, ou submetidos a tratamentos imunossupressores deveriam desenvolver DC (Scott et al., 2001).Adicionalmente, cães com DC são capazes de desencadear uma resposta humoral normal quandovacinados contra esgana - hepatite infecciosa canina(Scott et al., 2001).

Estudos sobre as populações de linfócitos envolvidos na DC sugerem uma responsabilidade doslinfócitos T citotóxicos activados por uma irregulari-

Figura 5 - Raspagem de pele. Demodex cornae (objectiva 40x) (original).

Figura 6 - Raspagem de pele. Demodex injai (objectiva 10x) (original).

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dade na função dos linfócitos T helper (Scott et al.,2001; Gross et al., 2005). Documentou-se ainda umadiminuição na produção de interleucina 2 (IL-2) e do número de receptores para IL-2 nos linfócitos circulantes (Mathet et al., 1996; Rhodes et al., 2004).Estes dados indicam um defeito no processamento eapresentação dos antigénios de D. canis que conduz auma resposta inadequada dos linfócitos T helper tipo 1(Scott et al., 2001). Julga-se que este defeito nos linfócitos T específicos para D. canis tem uma componente hereditária de expressão variável (Scott et al., 2001). A investigação nesta área permitirá compreender melhor a patogenia e desenvolver novas formas de tratamento. A criação de modelos biológicos (usando enxertos de pele de cão em ratosde laboratório) parece ser um avanço no estudo daimunopatologia da demodicose (Scott et al., 2001).

Vários factores predisponentes para a DC generali-zada, tais como a administração de fármacos imunos-supressores (ex: anti-neoplásicos, corticosteróides,progestagéneos), doenças sistémicas graves, stresstransitório (cirurgia, estro, parto, lactação) e infecçãopor Dirofilaria sp. ou Trichuris vulpis, têm sido sugeridos ou documentados (Griffin et al., 1993;Rhodes et al., 2004). Apesar de não ter sido estabele-cida em definitivo uma relação de causalidade, diversas doenças metabólicas ou potencialmenteimunossupressoras têm sido associadas a casos de DCgeneralizada no cão adulto: hiperadrenocorticismoespontâneo ou iatrogénico, hipotiroidismo, diabetesmellitus, neoplasias malignas, leishmaniose, blastomi-cose e outras micoses profundas (Medleau e Hnilica,2006). Num estudo a propósito do tratamento de 22casos de DC generalizada no cão adulto, Guaguèredemonstrou a existência de uma patologia subjacenteem 77,3% dos casos (Guaguère, 1991). Duclos et al.(1994) e Lemarié e colaboradores (1996) obtiveramresultados semelhantes (Ferrer, 1997).

Não parece haver predisposição sexual nem influência da castração no desenvolvimento de umaDC (Leitão e Oliveira, 2003; Gross et al., 2005).

Sinais clínicos

A DC pode ser classificada segundo a apresentaçãoclínica e a idade de início (Nesbitt e Ackerman, 1998).Na prática, a sobreposição é comum.

De acordo com a apresentação clínica são reconhe-cidos três tipos de DC: DC localizada (DCL), DC generalizada (DCG) e pododermatite demodécica(PD).

A DCL representa cerca de 90% dos casos de DC, é mais frequente em cães jovens (até 12 meses) e caracteriza-se pelo desenvolvimento de pequenasáreas de alopecia (até seis) bem circunscritas, comdescamação e eritema variáveis, geralmente não pruriginosas (Niemand e Suter, 1992; Rhodes et al.,2004; Gross et al., 2005) (Figuras 7 e 8). Podem surgirhiperpigmentação e comedões (Mathet et al., 1996).Afecta sobretudo a face, a região periocular e ascomissuras labiais, o pescoço e os membros anteriores, mas qualquer área do corpo pode estarenvolvida (Ferrer, 1997; Rhodes et al., 2004; Gross etal., 2005). A piodermite secundária é rara (Paradis,2000). A evolução é benigna e na maioria dos casos(cerca de 90%) há resolução espontânea em 6 a 12semanas (Griffin et al., 1993; Rhodes et al., 2004). Arecidiva é rara mas as lesões podem aparecer e desa-parecer no decurso de vários meses (Scott et al.,2001). Cerca de 10% dos casos de DCL evoluem paraDCG, nalguns casos tão rapidamente que a formalocalizada passa despercebida (Ferrer, 1997; Rhodeset al., 2004). A otite externa ceruminosa bilateral (otitedemodécica - OD), com ou sem prurido associado, éuma apresentação muito rara nesta forma e pode ser a

Figura 7 - DC Localizada juvenil numa cadela com 6 meses de idade.Lesão focal alopécica, descamativa e eritematosa na cabeça (original).

Figura 8 - DC Localizada adulta num Pequinês com 8 anos de idade.Envolvimento do pescoço com lesão alopécica eritematosa (original).

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única manifestação clínica da doença, necessitandotratamento específico (Nesbitt e Ackerman, 1998).Não foram demonstradas alterações imunológicas emcães com DCL (Gross et al., 2005). No entanto, umdefeito genético imunitário de expressão focal podeestar presente na DCJ localizada permitindo a suaevolução para a forma generalizada (Gross et al.,2005).

A DCG, mais frequente em cachorros até aos 18meses, é uma das dermatopatias mais severas doscanídeos, podendo aparecer generalizada logo de início ou sob a forma, mais comum, de múltiplaslesões mal circunscritas que se agravam com o tempo(Scott et al., 2001; Gross et al., 2005) (Figuras 9 e 10).Considera-se a existência de DCG sempre que hajammuitas lesões localizadas (mais que 12), envolvimentode toda uma região corporal (ex: face) ou envolvi-mento completo de duas ou mais extremidades podais(Medleau e Hnilica, 2006). Casos intermédios, com 6 a 12 lesões localizadas, devem ser avaliados deforma individual (Scott et al., 2001). A DCG afecta sobretudo a cabeça, o tronco e os membros(Knottenbelt, 1994; Gross et al., 2005) (Figura 11). Oabdómen é a região menos afectada, possivelmente

pela menor densidade pilosa (Scott et al., 2001). A ODacompanha com frequência o envolvimento facial maspode ser a única manifestação clínica de DCG (Griffinet al., 1993; Gross et al., 2005) (Figura 12). A peleafectada pode apresentar eritema, edema e seborreia,descamação, comedões, liquenificação, hiperpigmen-tação, pústulas, erosões, crostas ou ulceração(Medleau e Hnilica, 2006). Ao longo do tempo, aslesões crescem e coalescem, dando lugar a grandesáreas afectadas (Mathet et al., 1996; Gross et al.,2005). A piodermite secundária, comum na DCG,acompanha-se de graus variados de prurido. O autotraumatismo agrava as lesões primárias (Griffin etal., 1993; Gross et al., 2005). Com a foliculite e afurunculose surgem lesões pio-hemorrágicas comexsudados abundantes e formação de crostas espessase aderentes, em especial na cabeça, pescoço e regiãoperianal (Scott et al., 2001). Podem mesmo gerar-setrajectos fistulosos e com o mínimo traumatismoocorrer perda de tecido cutâneo (Mathet et al., 1996;Gross et al., 2005). O dono pode optar pela eutanásiadevido à gravidade das lesões (Mathet et al., 1996).Animais com piodermite profunda podem revelarsinais de septicémia com febre, anorexia, letargia e

Figura 9 - DCG juvenil numa cadela com 5 meses de idade.Distribuição multifocal de lesões alopécicas, eritematosas e descamati-vas na cabeça, pescoço e membros (original).

Figura 11 - DCG juvenil numa cadela com 6 meses de idade. Lesões defurunculose com eritema, alopecia e seborreia (original).

Figura 12 - Mesmo animal da figura anterior mostrando otite demodé-cica associada a envolvimento facial grave (original).

Figura 10 - DCG juvenil num Dogue de Bordéus com 12 meses deidade. Distribuição generalizada de lesões alopécicas, eritematosas edescamativas (original).

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debilitação (Gross et al., 2005; Medleau e Hnilica,2006). A linfadenopatia periférica é geralmente marcada e generalizada (Niemand e Sutter, 1992).

Staphylococcus intermedius é a bactéria isoladacom maior frequência (Scott et al., 2001). Outras bactérias importantes incluem Pseudomonas aerugi-nosa (causando piodermite grave e especialmenterefractária ao tratamento na PD) e Proteus mirabilis(Scott et al., 2001).

Podem surgir formas atípicas caracterizadas pormúltiplos nódulos (com 2 a 3 mm de diâmetro) oualopecias focais bem demarcadas, sobretudo nas raçasbraquicefálicas como o Bulldog inglês, o Boxer ePittbull Terriers, bem como no Shar-pei (Scott et al.,2001; (Gross et al., 2005) (Figura 13).

A PD, quando ocorre isoladamente, pode ser o resul-tado de DCG que curou completamente com excepçãodas extremidades podais ou ser a única manifestação daDC (Mur, 1997; Gross et al., 2005) (Figura 14). Uminquérito rigoroso permite distinguir os dois casos(Lopez, 1998). Apesar da doença estar confinada às extremidades podais, alguns destes cães têm populações de ácaros mais numerosas que o normal naszonas de pele clinicamente saudável (Scott et al., 2001).Caracteriza-se por uma dermatite papulonodular comeritema, edema e dor, prurido, alopecia, hiperpigmen-tação, liquenificação, seborreia, crostas, pústulas, bolhas e fístulas envolvendo as áreas digital, interdigi-tal e palmar/plantar (Nesbitt e Ackerman, 1998; Grosset al., 2005). Esta apresentação é particularmentepropensa a infecção bacteriana secundária, podendotornar-se crónica e resistente ao tratamento (Mur,1997). Algumas raças são especialmente afectadas pelodesconforto e dor da PD: Bobtail, Cão da Terra Nova,Dogue Alemão e São Bernardo (Scott et al., 2001).

As infestações por D. injai caracterizam-se tipicamente por seborreia oleosa sobretudo na regiãodorsal do tronco mas podem surgir outras lesões comoalopecia, eritema, hiperpigmentação e comedões(Medleau e Hnilica, 2006).

Segundo a idade em que surge, a DC pode ser designada como juvenil ou adulta (Ferrer, 1997).

A DC juvenil (DCJ) é tipicamente observada em cãesdesde as 6 semanas até aos 12 a 18 meses de vida(Nesbitt e Ackerman, 1998). A grande maioria apresen-ta a forma localizada mas alguns exibem a forma generalizada desde a infância (Nesbitt e Ackerman,1998). Parece haver maior incidência nos cães de portemédio ou grande. A DC generalizada juvenil (DCGJ)pode ser causada por D. canis bem como por D. cornae(Medleau e Hnilica, 2006). Julga-se que resulta de umdefeito genético na resposta imunitária específica contra D. canis (Scott et al., 2001).

A DC adulta (DCA) pode ser causada pelas trêsespécies de Demodex e surge em cães com mais de 2anos de idade (após os 4 anos segundo alguns autores)(Guaguère, 1991). Nestes casos, doenças concomi-tantes devem estar presentes para romper o equilíbrioque permitiu durante anos a existência de ácaros dogénero Demodex como parte da fauna cutânea normal,promovendo a rápida multiplicação do parasita(Ferrer, 1997). Embora alguns casos relatados representem animais que "transportaram" a doençanão diagnosticada desde a idade juvenil, a maioriaresulta de condições imunossupressoras na idade adulta (Ferrer, 1997). A história clínica deve permitirdiferenciar as situações.

Diagnóstico

O método diagnóstico de eleição da DC é a observação microscópica do produto da raspagem de pele. O tricograma e a histopatologia de biópsias de pele podem ser úteis em determinados casos. Osdados epidemiológicos (idade, raça, existência de outros membros da ninhada afectados, história familiar da doença), a anamnese (idade em que surgiua doença, evolução, resposta a terapêuticas anteriores)e o exame clínico permitem obter informação adi-cional importante para elaborar o plano terapêutico.

A raspagem de pele, além do diagnóstico, permite amonitorização do animal ao longo do tratamento(Bensignor, 2002). Todas as lesões de pele, sugestivas

Figura 13 - Forma nodular de demodicose canina numa AmericanStaffordshire Terrier com cerca de 5 meses de idade (original).

Figura 14 - Pododemodicose no mesmo animal da figura 10.Tumefacção digital devido a furunculose secundária a demodicose generalizada (original).

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ou não de DC, devem ser objecto de raspagem e obser-vação microscópica em pequena ampliação (Leitão eOliveira, 2003). As raspagens devem ser profundas eextensas, evitando zonas de elevada fragilidade (ahemorragia produzida prejudica a interpretação), comfibrose ou hiperqueratose acentuada (a probabilidadede captar ácaros nas raspagens é reduzida) (Medleau eHnilica, 2006). Por vezes é necessária a sedação paraobter boas raspagens, sobretudo em áreas difíceiscomo os lábios, as pálpebras e os espaços interdigitais(Griffin et al., 1993). O diagnóstico assenta nademonstração de elevado número de ácaros adultosvivos ou de um elevado rácio entre formas imaturas(ovo, larva e ninfa) e formas adultas (Mur, 1997). Ademonstração de um ácaro ocasional não oferece odiagnóstico mas não deve ser ignorada pois é raroencontrar D. canis na pele de cães saudáveis (Ferrer,1997). Raspagens adicionais devem ser realizadas emdiversos outros locais antes de considerar improvávela existência de DC (Scott et al., 2001). Embora a raspagem de pele seja um teste rápido e simples, écomum observar cães com DC que tiveram raspagensde pele negativas para ácaros (Scott et al., 2001).

Apesar da sua menor sensibilidade, o tricograma possibilita a recolha de material para diagnóstico emáreas de difícil execução da raspagem (periocular, peri-nasal e interdigital) (Bensignor, 2002). Para a recolhados pêlos devem ser seleccionadas zonas de pele comhiperqueratose superficial e folicular. O teste pode sernegativo em casos de infestação ligeira e nunca devesubstituir a raspagem de pele na monitorização do animal (Mueller et al., 2000; Scott et al., 2001).

Quando diversas raspagens negativas são obtidas deum Shar-Pei ou de cães com hiperqueratose ou fibrosecutâneas, em especial na região interdigital, a histopa-tologia deve ser realizada antes de descartar a DC(Griffin et al., 1993; Mueller et al., 2000; Gross et al.,2005). Mesmo não sendo demonstrados ácaros, a pelede cães com DC apresenta padrões histopatológicoscaracterísticos (foliculite mural, dermatite nodular efoliculite e furunculose supurativas) (Nesbitt e Acker-man, 1998; Gross et al., 2005; Bettenay et al., 2006).

A realização de hemograma, perfil bioquímico sérico, urianálise, exame fecal para helmintas epesquisa de Dirofilaria sp. permite a avaliação maiscompleta do estado do animal e mesmo suspeitar oudiagnosticar uma eventual doença sistémica concomi-tante. Esta avaliação deve ser realizada em todos os cãescom mais de dois anos com DCG, em cães que nãorespondem ao tratamento ou que apresentam recidivada doença. Cães com DCG adulta devem realizar testesde função da tiróide e das glândulas adrenais. Casosprecoces de hiperadrenocorticismo podem ter apenasexpressão dermatológica (incluindo DCG) sem quaisquer alterações laboratoriais ou sinais sistémicosclássicos (Griffin et al., 1993). Em cerca de 30% a 60%dos casos não é possível determinar uma patologiaassociada no momento do diagnóstico, sendo prudenteimplementar uma vigilância regular, já que doençassistémicas graves ou neoplasias podem evidenciar-sesemanas ou meses depois (Mathet et al., 1996).

Diagnóstico diferencial

As situações a considerar mais frequentemente parao diagnóstico diferencial são: piodermite bacteriana(superficial ou profunda), dermatofitose, hipersensi-bilidade (dermatite por alergia à picada de pulga,hipersensibilidade alimentar, atopia, dermatite de contacto) e doenças cutâneas imunomediadas (complexo pemphigus, lúpus eritematoso sistémico,dermatomiosite facial) (Niemand e Sutter, 1992;Rhodes et al., 2004; Gross et al., 2005). A raspagemde pele bem realizada é usualmente diagnóstica, peloque a DC não deverá ser confundida com outrasdoenças (Leitão e Oliveira, 2003).

Raspagens de pele positivas para D. canis nãodevem impedir a realização de outros exames derma-tológicos como o exame micológico cultural e acitologia cutânea. Animais com DC e outras doençasconcomitantes têm sido identificados pelos autores(Figura 15 e 16). A citologia cutânea torna-se útil paradirigir a antibioterapia empírica ou sugerir a necessidade

Figura 15 - DCG associada a dermatofitose num cão com 6 anos deidade. Lesões multifocais coalescentes com alopecia, descamação ehiperpigmentação (original).

Figura 16 - DCG adulta associada a hiperadrenocorticismo num cãocom 10 anos de idade. Lesões multifocais coalescentes com alopecia,seborreia e hiperpigmentação. Note-se a distensão abdominal e a atrofiamuscular das coxas (original).

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absoluta de antibiograma (caso evidencie bastonetesGram negativos). A leishmaniose pode coexistir com aDC (Oliveira et al., 2002). Os autores já diagnos-ticaram quatro cães com DCG e leishmaniose concomitantes e sugerem a pesquisa de Leishmaniaspp., sobretudo nas regiões onde a doença é endémica.

Tratamento

Embora o tratamento varie com a forma de apresen-tação da doença, alguns princípios gerais são comuns(Mathet et al., 1996).

O uso de fármacos corticosteróides, em qualquerdose ou forma de apresentação, está contra-indicadojá que o seu efeito imunossupressor pode levar à progressão da doença da forma localizada à formageneralizada (Hill, 2002). Exceptuam-se as situaçõesque implicam risco de vida para o animal (Scott et al.,2001; Hill, 2002).

A piodermite bacteriana, o prurido e a seborreiadevem ser controlados, quer se institua ou não umtratamento acaricida específico (Medleau e Hnilica,2006). O uso de colares isabelinos ou de T-shirts ajudaa minimizar o autotraumatismo resultante do prurido eo agravamento da piodermite (Griffin et al., 1993). Ouso de anti-inflamatórios não esteróides no maneioinicial da piodermite ajuda a controlar o prurido aoreduzir a inflamação, a dor e o edema muitas vezespresentes. Quando o prurido é intenso associamosanti-histamínicos sem que surjam efeitos colaterais.

A gravidade e a extensão da infecção bacterianasecundária condicionam o tratamento da piodermite.Nas piodermites superficiais localizadas, o uso dechampôs à base de clorohexidina (2% a 4%)(peso/volume) ou de peróxido de benzoílo (2,5%)(peso/volume) pode ser suficiente (Griffin et al.,1993). Vários autores preferem o peróxido de benzoí-lo pelas propriedades antibacteriana, antisseborreica e antipruriginosa, auxiliando ainda na expulsão do conteúdo dos folículos pilosos (efeito de flushing)(Hill, 2002; Rhodes et al., 2004). A antibioterapiasistémica deve ser associada nas piodermites generali-zadas ou profundas (Hill, 2002).

O controlo da piodermite e da seborreia, ainda quenão seja total até que os ácaros sejam eliminados, per-mite reduzir a irritação cutânea, melhorar a penetraçãodos acaricidas tópicos e diminuir a imunodepressãoprovocada pelo componente bacteriano secundário(Scott et al., 2001).

A recuperação da DC depende, pelo menos emparte, de um bom estado geral. Devido ao carácterimunodepressivo que acompanha a DC, os cuidadosbásicos de saúde como a nutrição, a desparasitação e avacinação não devem ser descurados (Paradis, 2000).A vacinação é geralmente adiada até que a piodermiteseja controlada. Qualquer patologia associada merecetratamento imediato (Mathet et al., 1996).

Tratamento da DCL

O tratamento da DCL assenta em quatro premissasimportantes: é uma forma benigna que resolve espontaneamente em cerca de 90% dos casos; o seutratamento não previne a progressão para a forma generalizada nos restantes 10%; a percentagem decura de animais tratados e não tratados não diverge eas recidivas são raras. De acordo com as premissasreferidas e pelo risco de selecção de estirpesresistentes aos acaricidas específicos, o seu uso não érecomendado no tratamento da DCL (Scott et al.,2001). O tratamento, a realizar algum, deve ser conservativo à base de peróxido de benzoílo (gel,loção, creme, champô), aplicado 2 a 3 vezes ao dia eno sentido de crescimento do pêlo, ou rotenona eantibioterapia em caso de piodermite (Medleau eHnilica, 2006).

A raspagem de pele cada 4 semanas após o diagnós-tico (com ou sem tratamento) permite monitorizar aevolução da doença. Nas lesões em regressão, as ras-pagens mostram poucas formas imaturas ou adultas.Se as lesões progridem ou se a contagem de ácarosaumenta, incluindo a relação formas larvares/formasadultas, há progressão para a forma generalizada da doença e o tratamento acaricida específico estáindicado (Griffin et al., 1993; Hill, 2002).

Tratamento da DCG

Apesar do conhecimento sobre a doença ter evoluídoconsideravelmente nos últimos anos, continua a seruma doença de difícil tratamento, com frequênciaoneroso e desgastante para o proprietário (Scott et al.,2001). A discussão acerca da etiopatogenia, da gravi-dade dos sinais clínicos, dos tratamentos disponíveis edo prognóstico da DCG, permite obter confiança e ummaior envolvimento do dono, essencial para o sucessodo tratamento. A compreensão dos critérios de cura(clínica, parasitológica e definitiva) é fundamental.

A eficácia do tratamento é monitorizada por raspa-gens de pele cada 2 a 4 semanas, idealmente semprenos mesmos locais (Paradis, 2000).

O tratamento deve ser prolongado por pelo menosmais 30 dias (60 dias para reduzir as recidivas) após aobtenção das primeiras raspagens de pele negativassimultaneamente em 6 a 8 locais diferentes. São entãorealizadas novas raspagens. Se forem negativas, otratamento pode ser interrompido. Se as raspagensainda revelarem ácaros, o tratamento deve continuarpor mais 30 dias (60 dias quando se trata de recidivas)seguido de novas raspagens (Scott et al., 2001; Hill,2002; Rhodes et al., 2004).

A cura parasitológica é conseguida quando as raspagens de pele não revelam ácaros (vivos ou mortos) em qualquer estádio de desenvolvimento. Acura definitiva é alcançada quando são obtidas raspa-gens negativas 4 semanas após a cura parasitológica edepois cada 3 meses por um período de 12 meses

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(Griffin et al., 1993). Note-se que a cura clínica antecede em semanas a meses a cura parasitológica eque muitas recidivas se devem à paragem precoce dotratamento (Carlotti et al., 1996). A reavaliação frequente permite reconhecer o desenvolvimento derecidivas e instituir o tratamento adequado antes doagravamento das lesões (Griffin et al., 1993; Hill,2002).

Entre 30% a 50% dos cães com DC com menos de1 ano de idade e em bom estado geral curam espon-taneamente com tratamento sintomático (Paradis,2000). Nestes casos há redução da contagem de ácarose melhoria clínica progressivas. Caso contrário, a curaespontânea é improvável e o tratamento acaricidaespecífico está indicado. Cães com DCG e mais de 1ano de idade necessitam sempre tratamento acaricida(Scott et al., 2001).

Existem poucos fármacos eficazes contra ácaros dogénero Demodex pelo que há que utilizá-los comprudência. O tratamento da DCG baseia-se no uso deacaricidas como o amitraz (tratamento tópico) e algu-mas lactonas macrocíclicas sistémicas (tratamentosistémico). Apenas a milbemicina oxima e a moxi-dectina estão licenciadas pelo Instituto Nacional daFarmácia e do Medicamento (INFARMED) para otratamento da DC, pelo que o proprietário deve autorizar a utilização de fármacos não licenciados.

Tratamento tópico (amitraz)

Apesar de não licenciado pelo INFARMED paraeste fim, o amitraz continua a ser uma opção no trata-mento da DCG. Esta formamidina, com actividadeagonista α2-adrenérgica e inibidora das monoami-noxidases e da síntese das prostaglandinas, possuiuma acção acaricida baseada na perturbação da trans-missão nervosa (antagonista ao nível dos receptoresda octopamina) (Hugnet et al., 1996; Rhodes et al.,2004).

O amitraz é aplicado sob a forma de banho, pordiluição aquosa da emulsão comercial. Para maxi-mizar os resultados do uso do amitraz, algumas medidas preparatórias são indispensáveis:

1. Cães de pêlo médio/longo devem ser sujeitos atosquia completa, rente e regular de forma a melhoraro contacto da solução aquosa de amitraz com a pele ea sua penetração nos folículos pilosos (Hill, 2002).

2. Remoção de todas as crostas. Nalguns casos énecessária a tranquilização ou mesmo anestesia, já que a remoção de crostas espessas e aderentes poderevelar-se muito dolorosa. O uso de agentes sedativosagonistas α2-adrenérgicos (ex: medetomidina, xilazina, benzodiazepinas) pode causar toxicidade sinergística e deve ser evitado. Caso contrário, a aplicação do amitraz deve ser adiada por 24 horas.

3. Banho completo com champô antisseborreico eantibacteriano, idealmente antes de cada tratamentocom amitraz. O banho em sistema de whirlpool

(corrente suave de água) é benéfico. Estes procedi-mentos, essenciais para um contacto óptimo da medicação com a pele afectada, podem conferir à peleum aspecto irritado. De seguida, o animal é gentil-mente enxugado com uma toalha para não haverdiluição adicional da solução de amitraz na água retida na superfície corporal (Hill, 2002). Outra opçãoé aplicar o banho 12 a 24 horas antes da solução deamitraz, embora a desejada actividade de flushingfolicular possa ser perdida neste intervalo.

4. A solução de amitraz deve ser aplicada continua-mente em todo o corpo (nas zonas afectadas e nãoafectadas) por um período mínimo de 10 minutos. Asextremidades podais devem ficar submersas ouenvolvidas por um pano embebido na solução e suave-mente massajadas, especialmente em caso de PD(Hill, 2002). O amitraz deve permanecer na pele porduas semanas. A secagem com toalha ou a suaremoção através de banhos, incluindo a água da chuvaou de piscinas está contra-indicada (Hill, 2002). Se as condições climatéricas constituírem um riscoimportante para infecções respiratórias, o uso desecador de ar quente ou a exposição a um radiador estásugerido, embora o calor possa agravar o eritema e oprurido. Se não for possível manter o animal secoentre as aplicações de amitraz, a aplicação seguintepode ser antecipada.

5. A solução de amitraz deve ser usada imediata-mente após a sua preparação. O amitraz, por oxidaçãoe acção dos raios ultravioletas, degrada-se em N-metilformamidina, substância muito mais tóxica do que a original. A solução de amitraz deve ser conservada num recipiente opaco bem fechado earmazenada ao abrigo da luz (Griffin et al., 1993;Ferrer, 1997; Scott et al., 2001). Embalagens fora deprazo, com depósito ou abertas há algum tempo nãodevem ser utilizadas (Nesbitt e Ackerman, 1998).

O consenso mais generalizado consiste em iniciar o tratamento com aplicações quinzenais de amitraz na concentração de 0,025% (peso/volume). Este protocolo permite obter percentagens de cura de 60%a 80% em cães com DCG e idade inferior a 18 meses(Nesbitt e Ackerman, 1998). Nos casos não respon-sivos ou quando após 8 a 10 tratamentos não se obtêmraspagens negativas, está indicado aumentar a frequência do tratamento para semanal, mantendo aconcentração a 0,025% (peso/volume) ou subindopara 0,05% a 0,100% (peso/volume). Esta alteraçãopoderá ser indicada mais cedo se o quadro clínico seagrava ou se as contagens dos ácaros aumentam ounão diminuem (Griffin et al., 1993).

Nos casos refractários aos tratamentos quinzenaisou semanais, recomenda-se utilizar outros fármacosacaricidas (ex: lactonas macrocíclicas sistémicas) ouusar o amitraz a 0,125% (peso/volume) em dias alter-nados em cada metade do corpo (Mathet et al., 1996).Num estudo realizado por Medleau e Willemse(1995), este protocolo mostrou uma percentagem de

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cura de 81% (38/47) nos cães com DC não tratadosanteriormente com amitraz e de 75% (18/24) noscasos refractários ao tratamento quinzenal ou semanal(Griffin et al., 1993; Nesbitt e Ackerman, 1998). Aduração média do tratamento foi de 3,7 meses e nãofoi observada toxicidade grave (Mathet et al., 1996;Nesbitt e Ackerman, 1998).

Acredita-se que até 20% dos casos não atingem ras-pagens negativas ou recidivam quando o tratamento ésuspenso (Scott et al., 2001). Alguns casos requeremtratamentos a cada 2 a 4 semanas por toda a vida paracontrolar a população de ácaros e manter o animal assintomático (Griffin et al., 1993).

Um estudo de Christophe Hugnet et al. (2001)avaliou a eficácia da aplicação semanal de solução deamitraz a 1,25% (peso/volume) associada à adminis-tração de antídotos (atipamezol e yohimbina) no tratamento da DCG. Este estudo mostrou uma percentagem de cura de 100% em 8 cães com DC comidades compreendidas entre os 4 meses e os 12 anos,previamente resistentes a múltiplos tratamentos deamitraz. O número médio de banhos necessário para acura parasitológica foi de 3 (2-5). O seguimento alongo prazo permitiu registar a ausência de recidiva 6a 36 meses após o último banho e por 12 ou maismeses em seis cães. É essencial testar este protocolonum número elevado de cães com DCG antes de serrecomendado (Hugnet et al., 2001).

A OD e a PD podem ser especialmente resistentesaos tratamentos com a solução aquosa. Vários autoresrecomendam a aplicação de amitraz em diluições (volume/volume) desde 1:9 até 1:60 em parafinalíquida ou propilenoglicol duas a três vezes por semana nas extremidades podais e no interior dos condutos auditivos (Knottenbelt, 1994; Rhodes et al.,2004). No caso de OD isolada, alguns autores suge-rem a utilização de uma solução ótica ceruminolíticaantes de recorrer ao amitraz já que o potencial paraototoxicidade ainda não foi suficientemente estudado.Protocolos similares são sugeridos para lesões localizadas, de forma diária ou em dias alternados(Nesbitt e Ackerman, 1998).

Vários autores recomendam que a primeira aplicação do tratamento tópico seja realizada na clínica veterinária, não só pela necessidade de umbom tratamento preparatório mas também comoforma de demonstração para o dono. A vigilância doanimal por um período de 12 a 24 horas permitereconhecer rapidamente efeitos adversos do tratamento (Griffin et al., 1993; Scott et al., 2001).

Os efeitos secundários mais comuns são sedaçãotransitória (pode durar 12 a 24 horas, sobretudo apóso primeiro tratamento) e prurido de intensidade variável nas primeiras aplicações. O aparente agrava-mento dos sinais clínicos não deve conduzir à interrupção do tratamento. À solução aquosa de amitraz deve adicionar-se um emoliente e hidratantepara minimizar o efeito secante. Irritação cutânea,

letargia e midríase são menos frequentes e tendem areduzir com os tratamentos seguintes. Outros efeitossecundários incluem reacções alérgicas (urticária eedema), vómito, diarreia, hiperglicémia, hipotermia,vasoconstrição, bradicárdia, convulsões e morteaguda. Deve aplicar-se uma pomada oftálmica nosolhos dos animais para proteger da acção irritante doschampôs e do amitraz (Booth e McDonald, 1998;Adams, 2001; Rhodes et al., 2004).

Cachorros com menos de 4 meses de idade, cãesgeriátricos ou debilitados e raças miniatura são maissujeitos ao desenvolvimento de reacções adversas.Nestes casos, o tratamento deve iniciar-se comsoluções mais diluídas [ex: 0,0125% (peso/volume)],reduzir o tempo de contacto com a solução ou tratarapenas metade do corpo de cada vez. A concentração,o tempo de contacto e a extensão da superfície corporal tratada são gradualmente aumentados se osprimeiros tratamentos são bem tolerados (Griffin etal., 1993; Booth e McDonald, 1998). O amitraz estácontra-indicado em cães de raça Chihuahua, em cãesdiabéticos e também em fêmeas gestantes (por nãohaver estudos de avaliação dos efeitos reprodutivos)(Booth e McDonald, 1998; Tennant, 2005).

Ocasionalmente, os efeitos secundários tornam-seprogressivamente mais severos com os tratamentos(Scott et al., 2001). A administração de yohimbina(0,1 mg/kg IV) ou atipamezol (0,2 mg/kg IM) estáindicada para reduzir ou reverter as reacções adversasimportantes. A atropina beneficia alguns animais maspode induzir arritmias cardíacas e potenciar a hipomotilidade gastrointestinal (Booth e McDonald,1998; Nesbitt e Ackerman, 1998). Se se pretende manter o tratamento com amitraz após reacções adversas intensas, o uso profiláctico de yohimbina (30 µg/kg SC 15 a 30 minutos antes de cada aplicação,seguido de 10 µg/kg SC cada 3 horas, segundonecessário, após o banho) está recomendado (Scott et al., 2001).

Os tratamentos com amitraz devem ser realizadosem local bem ventilado e com uso de protecção pelotratador (luvas, máscara e avental). Deve ser evitado ocontacto com os animais logo após o tratamento(Booth e McDonald, 1998). O amitraz é suspeito deser um agente carcinogénico para seres humanos.Mulheres grávidas e diabéticos não devem manipularo medicamento (Pucheu-Haston, 1999; Hillier et al.,2004). Dermatite de contacto, náuseas, vómitos,cefaleias do tipo enxaquecas, tonturas e episódiosasmatiformes podem afectar o tratador, mesmo quenão haja contacto cutâneo com a solução (toxicidadepor inalação). Os efeitos são mais prováveis em pessoasmedicadas com inibidores da monoaminoxidase (ex:antidepressivos tricíclicos, anti-hipertensores e anti-histamínicos) (Griffin et al., 1993). A solução concen-trada de amitraz é inflamável até que se dilua em águapelo que não deve ser manipulada próximo de faíscasou chamas (Tennant, 2005).

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Alguns autores advogam que o uso de coleirasimpregnadas com amitraz a 9% (peso/peso) pode sereficaz em cães até 20 kg. A região cervical do animaldeve ser tosquiada para permitir o contacto óptimo dacoleira com a pele e a coleira deve ser renovada cada2 semanas durante o tratamento. Segundo os mesmosautores, para cães pequenos, pode ser tão eficaz comoa ivermectina (0,6 mg/kg/dia PO). Ainda, o uso combinado de coleira impregnada com amitraz e deivermectina pode ter efeito sinergístico (Rhodes et al.,2004; Medleau e Hnilica, 2006).

Tratamento sistémico

Algumas lactonas macrocíclicas como a ivermectina,a milbemicina oxima e a moxidectina têm actividadecontra ácaros do género Demodex. Estes fármacosactuam nos invertebrados estimulando a libertaçãopré-sináptica do ácido gama-amino-butírico e poten-ciando a sua ligação aos seus receptores, provocandoo bloqueio neuromuscular, paralisia e morte do para-sita (Kwochka et al., 1998). Para alguns autores,aumentam a penetração dos iões de cloro no neuróniopós-sináptico pela elevada afinidade pelos canaiscloro-glutamato (Guaguère, 1996; Paradis, 2000).

O uso destes fármacos está indicado em casosresistentes ao amitraz, quando o amitraz produzreacções adversas inaceitáveis ou quando a sua aplicação se torna um problema para os donos (por sermuito laborioso, implicar bastantes cuidados e serpotencialmente tóxico). A sua administração a cachorros com menos de 12 semanas de idade deve ser rodeada de cuidados adicionais (Nesbitt eAckerman, 1998).

Devido à sua acção microfilaricida, os cães devemapresentar resultados negativos nos testes de pesquisade Dirofilaria sp. antes de iniciarem o tratamento comestes fármacos (Ferrer, 1997). Cães com DCG adultaou PD respondem menos do que cães com DCG juvenil (Nesbitt e Ackerman, 1998). A duração médiade tratamento com as lactonas macrocíclicas é de 4meses (3-9). O tratamento deve ser continuado porpelo menos 1 mês após a cura parasitológica (2 a 3meses para os casos que demoram mais a responder).A milbemicina oxima é mais dispendiosa mas temmenor potencial tóxico que a ivermectina e a moxi-dectina. A moxidectina é mais lipofílica que a ivermectina e deve ser usada com precaução em animais magros ou debilitados (Paradis, 2000).

Ivermectina

As formulações de ivermectina sob a forma de solução injectável e pasta oral são susceptíveis de administração oral a canídeos de forma não licen-ciada. O sabor destas formulações pode ser muitodesagradável para alguns cães, induzindo salivaçãointensa e perda do medicamento, sendo recomendadoo uso de engodos. A ivermectina administrada na dose

de 0,3-0,6 mg/kg/dia PO tem mostrado percentagensde cura entre 83% e 100% (Scott et al., 2001). Nasdoses superiores, as percentagens de cura são maiselevadas e as recidivas menos frequentes (0% a 26%),mesmo nos casos previamente refractários ao tratamento com amitraz. Está recomendado iniciar a administração de ivermectina na dose de 0,1mg/kg/dia e incrementar em 0,1 mg/kg/dia até umadose máxima de 0,6 mg/kg/dia para minimizar o riscode efeitos secundários (Lopez, 1998; Nesbitt eAckerman, 1998; Hill, 2002). A duração média dotratamento até à completa resolução é de 10 a 12 semanas (Mathet et al., 1996) (Figuras 17 e 18). Asreacções adversas à ivermectina incluem midríase,anorexia, hipersiália, tremores, letargia, depressão,ataxia, distúrbios comportamentais, cegueira,decúbito e mesmo coma e morte nos casos muitograves (Booth e McDonald, 1998; Medleau et al.,1996; Hill, 2002). Surgem habitualmente 4 a 12 horasapós a administração, são raras e na maioria dos casosresolvem em alguns dias com a redução da dose ou asuspensão da administração (Medleau et al., 1996).Alguns casos necessitam de tratamento de suporte quepode incluir fluidoterapia endovenosa, administraçãode carvão activado, alimentação forçada e prevençãode úlceras de decúbito (Ristic et al., 1995). A administração de fisiostigmina e de picrotoxina também está sugerida nas intoxicações graves(Guaguère, 1996). A intoxicação pode surgir porsobredosagem ou por reacção idiossincrática.

Numa investigação do Washington State UniversityCollege of Veterinary Medicine em Collies demons-trou-se que a sensibilidade acrescida aos efeitos neurotóxicos da ivermectina resulta de uma mutaçãopor delecção do gene MDR1 (gene Multiple DrugResistance 1) (Mealey et al., 2001). Esta mutaçãoprovoca uma deslocação de fase que gera uma stopcodon prematura no gene MDR1, resultando numaproteína (glicoproteína-P) gravemente truncada, nãofuncional. Ensaios com murganhos knockoutMDR1a(-/-) demonstraram que a glicoproteína-Ptransporta activamente a ivermectina do tecido cerebral para a circulação periférica, impedindo a suaacumulação e a sua toxicidade neste tecido (Dicato etal., 1997). Nos Estados Unidos da América, aprevalência desta mutação nos Collies é relativamentealta: 22% são homozigóticos para o alelo normal(MDR1 selvagem/selvagem), 42% são heterozigóticosportadores (MDR1 selvagem/mutante) e 35% sãohomozigóticos para o alelo mutante (MDR1mutante/mutante) (Mealey et al., 2002). Dados semelhantes foram registados a partir de Collies deFrança e da Austrália (Margo, 2007). Esta mutação foitambém demonstrada nas raças Pastor Australiano,Pastor das Shetland, Pastor Alemão branco, entre outras. Os animais homozigóticos para o gene mutanteexibem sensibilidade à ivermectina, os heterozigóticospoderão ser sensíveis e os homozigóticos para o gene

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normal não são sensíveis à neurotoxicidade da iver-mectina. A ivermectina está por isso contra-indicadanos homozigóticos para o gene MDR1 mutante já quepodem desenvolver reacções adversas graves mesmocom doses únicas muito baixas (0,1 mg/kg) (Mealey etal., 2001, 2002). Nos heterozigóticos, o seu uso deveser muito prudente. A sensibilidade acrescida estátambém descrita no Bobtail (Nesbitt e Ackerman,1998). A sensibilidade a outras avermectinas emCollies e noutras raças de cães pastores também foireferida (Tranquilli et al., 1991; Plumb, 2002). Sem oacesso a este tipo de informação, o uso das avermecti-nas nas raças sensíveis identificadas reveste-se de umrisco importante, facto que deve ser compreendido eaceite pelo proprietário. Dados preliminares de umestudo sobre a administração de ivermectina (0,45-0,6mg/kg) em dias alternados sugerem que o tratamentodiário pode não ser necessário. A associação do trata-mento tópico semanal com amitraz à administraçãooral diária de ivermectina pode desencadear neuroto-xicidade grave (Scott et al., 2001; Rhodes et al.,2004).

Milbemicina oxima

A milbemicina oxima usada na dose de 0,5-2mg/kg/dia PO, mostra percentagens de cura de 15% a92% (Nesbitt e Ackerman, 1998; Scott et al., 2001).As doses mais elevadas estão associadas com as melhores percentagens de cura. O tratamento dura emmédia 3 meses (Nesbitt e Ackerman, 1998). Este protocolo parece ser bem tolerado nas raças sensíveisà ivermectina (Garfield e Reedy, 1992; Hill, 2002). Asreacções adversas (estupor, ataxia e tremores transi-tórios) são raras e desaparecem com a interrupção dotratamento (Paradis, 2000).

Moxidectina

Existe pouca informação sobre o uso da moxidectina.Administrada na dose de 0,2-0,4 mg/kg/dia PO,mostra percentagens de cura entre 88% e 100%

(González et al., 1998). A duração do tratamento variade 2 a 5 meses (Lopez, 1998). As reacções adversas(anorexia, letargia, tremores, ataxia e estupor) sãoraras e passageiras (Paradis, 2000). Está tambémdisponível sob a forma de spot on com 2,5%(peso/volume) de moxidectina para o controlo dedemodicose (causada por D. canis), na dose de 0,1ml/kg preconizando 2 a 4 aplicações a cada 4 semanas, mas não especificando qual a forma dadoença (Bayer, 2003). Apesar do fabricante reportaruma redução de 97,84% no número de ácaros nos cãestratados com este regime, no final do estudo foramencontrados ácaros num número significativo de cães(Bayer, 2003). Muitos autores acreditam que a moxi-dectina neste regime não é eficaz para o tratamento da DCG, recomendado mais estudos para avaliar aeficácia de regimes não autorizados (Bonagura eTwedt, 2009).

Doramectina

Há relatos de que a doramectina na dose de 0,6mg/kg SC uma vez por semana é eficaz na DC compercentagens de cura de cerca de 85%. As reacçõesadversas (midríase, letargia, cegueira e coma) sãoraras (Medleau e Hnilica, 2006; Bonagura e Twedt,2009).

Em todos os trabalhos publicados, a percentagem decura clínica excede a verdadeira percentagem de cura,com recidivas em 10% a 45% dos casos. As recidivaspodem surgir em qualquer altura mas são mais observadas nos primeiros 3 meses após o fim dotratamento, possivelmente por tratamento insufi-ciente. Se a recidiva surge nos primeiros 3 meses, otratamento mais vigoroso (dose e/ou frequência) como mesmo fármaco pode levar à cura. Se o segundotratamento falha ou se a primeira recidiva ocorre 9 oumais meses após o fim do tratamento, provavelmentetratamentos adicionais com o mesmo fármaco nãoconduzem à cura. Fármacos alternativos devem serusados.

Com os tratamentos actuais nem todos os cães comDC alcançam a cura. Nestes casos, o dono pode escolher entre o tratamento crónico de manutenção e aeutanásia. Os autores acompanham dois casos emtratamento com ivermectina em dias alternados (0,6mg/kg) há cerca de 3 anos sem que tenham manifesta-do sinais de toxicidade. Outros autores relatam algunscasos de tratamento oral cada 2 a 3 dias com ivermectina ou milbemicina oxima por períodos de 4ou mais anos, igualmente sem efeitos secundários(Scott et al., 2001).

Imunoestimulantes

O uso de imunoestimulantes inespecíficos para melhorar a resposta ao tratamento específico de DC éadvogado por alguns. Um medicamento imunológico

Figura 17 - O mesmo cão da figura 10, 87 dias após o início do trata-mento. Note-se a melhoria significativa (original).

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recente à base de Propyonibacterium acnes e E. coli,que induz a activação de macrófagos, a proliferação ediferenciação de linfócitos B e a produção de citoquinas, vem colmatar uma lacuna na estratégia detratamento da DC. A utilização deste produto comocoadjuvante ao protocolo convencional acaricida podepermitir reduzir a sintomatologia e o período de recuperação da DC (Calier, 2006).

Prognóstico

O prognóstico varia com o tipo de demodicose, aidade de início da doença e a presença de patologiasconcomitantes. Os casos de DCL são mais benignosdo que os casos de DCG. A DCG juvenil tem prognós-tico menos grave do que a DCG adulta. Os resultadosterapêuticos parecem variar em função da patologiaassociada. As causas iatrogénicas e as causas nãoidentificadas têm melhor prognóstico (100% e 80% depercentagens de cura, respectivamente) do que ohiperadrenocorticismo espontâneo (57,1%) ou ohipotiroidismo (25%). O tempo necessário para a curaparasitológica parece depender da carga parasitáriainicial (Guaguère, 1991).

Prevenção

A ovario-histerectomia está recomendada por duasrazões: por a doença poder exacerbar ou recidivaraquando do estro e por afastar as fêmeas afectadas daslinhas de reprodução. (Nesbitt e Ackerman, 1998;Hill, 2002). Apesar de a American Academy ofVeterinary Dermatology recomendar desde 1981 aesterilização dos animais com DCG e dos reprodutoresque geram ninhadas afectadas, enquanto o carácterhereditário da doença não for definitivamente provadoserá difícil implementar esta medida no universo doscriadores de raças puras (Mathet et al., 1996; Gross etal., 2005).

Conclusão

A DC é uma doença parasitária cutânea grave resul-tante da multiplicação exagerada de ácaros do géneroDemodex na pele dos cães. Das três espécies deDemodex spp. descritas, a espécie D. canis é a maisfrequentemente diagnosticada. Os ácaros do géneroDemodex são habitualmente comensais. Um distúrbiona regulação da sua população resulta numa multipli-cação exagerada e no aparecimento da doença. Pensa--se que em cães jovens até 1 de idade este distúrbioestá relacionado com um defeito genético na respostaimunitária específica contra o ácaro. Nos cães adultosparece estar relacionado com outras doenças quedebilitem o sistema imunitário. A observação

microscópica do produto de raspagem cutânea é oprincipal meio de diagnóstico. Em casos particulares abiópsia ou o tricograma são necessários para o diagnóstico. A DC pode manifestar-se por diversasapresentações clínicas de acordo com a idade de inícioda doença (forma juvenil ou forma adulta) e com aárea corporal afectada (forma localizada ou formageneralizada). A anamnese permite, na maioria doscasos, a sua distinção. A DC localizada e a DC juvenilsão mais benignas do que a DC generalizada e a DCadulta. O tratamento da DC localizada é sobretudoconservativo, baseado na aplicação tópica de champôse cremes anti-sépticos, evitando o uso de fármacosacaricidas. O tratamento da DC generalizada baseia-seno uso de acaricidas como o amitraz (tratamento tópico) e algumas lactonas macrocíclicas sistémicas(tratamento sistémico). O amitraz aplicado em soluçãoaquosa sobre a pele dos cães com demodicose permitepercentagens de cura elevadas. A utilização das lactonas macrocíclicas revolucionou a abordagem terapêutica, melhorando as percentagens de cura e tornando o tratamento mais cómodo. Em todos oscasos a piodermite associada deve ser tratada. Apesardas elevadas percentagens de cura podem surgirrecidivas em 10% a 20% dos casos. A investigação dosfactores genéticos e imunitários envolvidos na DCpode permitir o desenvolvimento de novos fármacospara o seu tratamento.

Figura 18 - O mesmo cão da figura 8 após tratamento. Note-se a recu-peração clínica completa (original).

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Estudo parasitológico em bovinos leiteiros da microrregião do Caparaó,Espírito Santo, Brasil

Parasitological study in dairy cattle of Caparaó microregion, EspíritoSanto State, Brazil

Pedro I. F. Junior, Larissa C. Demoner, Barbara R. Avelar, Louisiane C. Nunes,Dirlei M. Donatele, Isabella V. F. Martins*

Universidade Federal do Espírito Santo - Departamento de Medicina Veterinária, Centro de Ciências Agrárias, CEP 29500-000, Alegre, Espírito Santo, Brasil

R E V I S T A P O R T U G U E S A

CIÊNCIAS VETERINÁRIASDE

RPCV (2008) 103 (567-568) 151-156

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Resumo: No período de Março de 2007 a Abril de 2008 foramavaliados aspectos das parasitoses de bovinos de 51 propriedades da microrregião do Caparaó, localizada noEspírito Santo, Brasil. Para avaliação foram coletadas amostrasde fezes, sangue e realizados esfregaços sanguíneo de vacas em lactação e bezerros, ambos escolhidos aleatoriamente, erealizados inquéritos epidemiológicos com os proprietários dasfazendas visitadas. Após a coleta, as amostras foram encami-nhadas para processamento no Laboratório de DoençasParasitárias, localizado no Hospital Veterinário da UniversidadeFederal do Espírito Santo. Tais amostras foram processadasseguindo a técnica de MacMaster modificada e coproculturapara identificação dos gêneros dos parasitos. As lâminas comesfregaços sanguíneos foram coradas para observação dehemoparasitoses. Foram analisadas 10% dos animais de cadapropriedade, totalizando 359 animais, sendo 186 vacas e 173bezerros. Dos animais avaliados, 163 (45,4%) tiveram resulta-dos negativos na contagem de ovos por gramas de fezes (OPG)e 196 (54,6%) estavam positivos no exame. Dos bezerros avaliados, 120 (69,36%) apresentaram diagnostico positivo aoexame de fezes, resultado que confirma a maior prevalência doparasitismo nos bezerros. As coproculturas revelaram a presença predominante do gênero Haemonchus. No exame doesfregaço sanguíneo 29% dos animais que foram avaliadosestavam positivos para Babesia spp e ou Anaplasma marginale.Com base nos dados observados no inquérito realizado, notou-se a necessidade da assistência técnica mais ativa nas propriedades estudadas, diminuindo problemas no controle parasitário.

Palavras-chave: bovinos, parasitoses, inquérito

Summary: From March 2007 to April 2008, this study evaluatedaspects of cattle parasitosis at 51 properties of Caparaó microre-gion, Espirito Santo State, Brazil. Samples of stool, blood andblood smears were collected from dairy cows and calves, selected at random. Interviews of the owners of the farms were carried out. Samples were sent to the Laboratory of ParasiticDiseases, located in the Veterinary Hospital of the Universidade

Federal do Espírito Santo. Samples of faeces were processedusing the MacMaster modified technique and fecal cultures toidentify the parasites genus. Slides with blood smears werestained for hemoparasites diagnosis. 10% of animals of eachproperty were evaluated, totalizing 359 animals, being 186 cowsand 173 calves. Of the animals tested, 163 (45.4%) had negativeresults in egg counting (EPG) and 196 (54.6%) were positive.Of the calves evaluated, 120 (69.36%) had positive diagnosticexamination of the stool, a result that confirms the higher prevalence of parasitism in calves. The fecal cultures revealedthe presence of Haemonchus. In blood smears examination, 29% were positive to Babesia spp. and Anaplasma marginale.The survey data identified the need for a more active technicalassistance in the properties studied, specially to control para-sites, reducing related problems.

Keywords: cattle, parasites, survey

Introdução

A microrregião do Caparaó é composta pelosmunicípios de Alegre, Irupi, Iúna, Ibitirama, Dores doRio Preto, Divino de São Lourenço, Guaçui, MunizFreire e São José do Calçado, localizada no sul doestado do Espírito Santo, Brasil. A produção leiteiranesta região chega a 46.696.000 litros de leite por ano(IBGE, 2007), possuindo uma grande importância naeconomia estadual.

Os prejuízos causados por parasitos se fazem presentes através da ação direta e indireta, refletindonum menor ganho de peso, maior mortalidade, menorrendimento da carcaça, menor produção de leite, gas-tos com antiparasitários, com mão de obra e outrosparâmetros de produtividade (Scott, 1998).

O efeito do parasitismo na produção animal pode ser reduzido mediante alterações no manejo daspastagens e dos animais e com a aplicação de anti-helmínticos. Para que tais procedimentos possamser realizados, é necessário conhecer a biologia dosparasitos dos bovinos da região (Furlong et al., 1985;

*Correspondência: [email protected] Fax: + 55 (28) 3552 8960

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Junior PIF et al. RPCV (2008) 103 (567-568) 151-156

Lima, 2000). Parte da fase do ciclo desses parasitosocorre no meio ambiente e entre vários fatores, comoclimáticos, genéticos e características das pastagens,estão diretamente envolvidos no desenvolvimento e nasobrevivência das larvas nas pastagens e na manu-tenção das infecções nos animais (Lima et al., 1997).

No Brasil, alguns estudos epidemiológicos foramencontrados na literatura pesquisada, como estudos deprevalência de parasitoses, como Avila et al. (2002)com coccídios, Soares et al. (2000) com babesiose eOliveira et al. (2001), Pimentel Neto e Fonseca (2002)e Araújo e Lima (2005) com helmintoses. No estadodo Espírito Santo apenas Repossi Junior et al. (2006)publicaram dados epidemiológicos referentes às para-sitoses em bovinos de leite, porém o presente trabalhoobjetivou avaliar a situação das parasitoses em bovinosleiteiros na microrregião do Caparaó, Espírito Santo,buscando traçar um programa de controle estratégicopara a região.

Material e métodos

Durante o período de Março de 2007 a Abril de 2008,51 propriedades leiteiras foram visitadas, na qualforam distribuídas cinco fazendas para cada um dosmunicípios da microrregião do Caparaó, utilizando-sea técnica de amostragem aleatória simples. Para oagendamento das visitas utilizou-se listagem obtida docadastro do Instituto de Defesa Agropecuária eFlorestal do Espírito Santo (IDAF-ES) e dasSecretarias Municipais de Agricultura. Os produtoresforam contatados por telefone para confirmação desua atividade na produção de leite.

Foram analisados 10% dos animais e cada propriedade, totalizando 359 animais, escolhidosaleatoriamente, sendo 186 vacas e 173 bezerros. Osanimais, inicialmente foram examinados clinicamente,em seguida coletadas amostras fecais diretamente daampola retal e foi realizada a coleta de sangue da veiajugular e de sangue periférico em vasos de pequenocalibre locali-zado no pavilhão auricular de cada animal. Após a coleta, os esfregaços sanguíneos foramfixados em metanol a 10%. As amostras de fezes,sangue e as lâminas fixadas foram encaminhadas parao Laboratório de Doenças Parasitárias da Universi-dade Federal do Espírito Santo. As amostras de fezesforam processadas seguindo a técnica de MacMaster(Gordon e Whitlock, 1939) modificada para contagemde ovos por grama de fezes (OPG) e realizada a copro-cultura (Robert e O’Sullivan, 1950) para identificaçãodos gêneros dos helmintos. As lâminas fixadas nometanol foram coradas pelo Giemsa para posterioravaliação da presença das hemoparasitoses emmicroscópio óptico.

Nas visitas às propriedades foi realizada uma entre-vista ao proprietário ou responsável pela criação,baseada em questionário pré-formulado sendo

realizada sempre pelo mesmo entrevistador e semintervenção nas respostas, caracterizando um estudoobservacional. As variáveis avaliadas no inquéritoforam: existência de assistência técnica, utilização dosprodutos parasiticidas, assim como a aplicação dosmesmos e o critério utilizado para tais aplicações. Aimportância e aspectos relacionados ao controle parasitário, como os princípios ativos mais utilizadosnos métodos químicos de controle, a quantidade deaplicações efetuadas anualmente, as medidas demanejo utilizadas foram também registadas. Tal comoo conhecimento de resistência parasitaria e a obser-vação desta nas propriedades.

Com os dados obtidos e a realização dos exames dosanimais, foram calculadas as prevalências parasitosbem como analisados os fatores relacionados ao cont-role parasitário nas propriedades.

Resultados

Dos 369 animais avaliados, 163 (45,4%) animaisapresentaram resultados negativos na contagem deovos por gramas de fezes (OPG) e 196 (54,6%)estavam positivos no exame. Dentre os parasitosencontrados nos animais, 92 (25,62%) apresentaramovos de estrongilideos, 45 (12,53%) apresentaram coccidios, 55 (15,32%) apresentaram ovos deestrongilideos e coccídios, 9 (2,50%) apresentaramovos de Moniezia e 7 (1,94%) apresentan ovos deTrichuris (Figura 1). Dos bezerros avaliados, 120(69,36%) apresentaram diagnostico positivo ao examede fezes, sendo 103 (85,83%) positivos para ovos dotipo Strongyloidea e 83 (69,16%) para oocistos de coccidios. As coproculturas revelaram a presença predominante do gênero Haemonchus (54,90% daspropriedades), porém foram encontradas larvas também

Figura 1 - Prevalência dos parasitos de bovinos leiteiros da microrregiãodo Caparaó, Espírito Santo, no período de Março de 2007 a Abril de2008.

%

Strongyli

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Strongyli

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+ Cocc

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Coccid

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Moniezia

sp.

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p.

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de nematóides dos gêneros Cooperia, Oesophagos-tomum e Trichostrongylus.

No exame do esfregaço sanguíneo, foram avaliados182 animais, 100 vacas em lactação e 82 bezerros, noqual 29% dos animais avaliados apresentaram-se positivos para Babesia sp e ou Anaplasma marginale.Desses positivos 39%, 39% e 20% estavam parasitadospor Babesia sp, Anaplasma marginale ou por ambos,respectivamente. Os resultados mostraram que 32%dos bezerros avaliados, apresentavam alguma dessashemopasitoses enquanto nas vacas em lactação foramencontradas 29% com Babesia spp e ou Anaplasmamarginale.

Os dados do questionário mostraram que apenas44% das propriedades contam com assistência técnicade médico veterinário, inclusive com relatos de que aescolha dos produtos parasiticidas é realizada em 46% pelo proprietário e em apenas 22% dos casos por médico veterinário. Quando questionados sobre aimportância e aspectos de controle das parasitoses,88% dos proprietários responderam ser o carrapato aprincipal parasitose do rebanho e 92% afirmaram queutilizam algum método de controle parasitológico. Noentanto, 40%, dos entrevistados, confirmam que nãousam medidas de manejo associadas, inclusive comutilização de esterqueiras, relatado por apenas 12%dos proprietários, e consórcio com eqüinos em 68% das propriedades. No controle químico das para-sitoses, os produtos à base de ivermectina foram citados por 62% dos proprietários, sendo que 80% confirmaram utilizar controle para helmintos,carrapatos e moscas, em 72% dos casos baseando-seapenas no aspecto dos animais. A vermífugação ocorremenos de três vezes ao ano em 46% das propriedades,o tratamento carrapaticida em mais de cinco vezes aoano em 44% e o tratamento mosquicida em menos detrês vezes em 38% dos casos. Os proprietários respon-deram ter conhecimento sobre resistência parasitáriaem 62% das respostas e afirmaram ter o problema emsua propriedade em 56% dos casos (Tabela 1).

Discussão

A maioria dos trabalhos encontrados na literaturaestá em concordância com os dados do presente estudo quando se trata do mesmo tipo de clima(Araújo et al., 1992; Guimarães et al., 2000; Oliveiraet al., 2001; Repossi Junior et al., 2006). RepossiJunior et al. (2006) estudando a prevalência de para-sitoses no município de Alegre, Espírito Santo,relataram que 100% das propriedades apresentaramanimais positivos para oocistos de coccidios e ovos de Strongyloidea, dados que diferiram do presenteestudo, pois os autores avaliaram apenas amostras em bezerros, afirmando ainda que é na faixa etária de 1 a 18 meses que os animais mais apresentam asinfecções por parasitos gastrintestinais. Este dado corrobora o presente estudo que demonstrou queaproximadamente 70% dos bezerros apresentaramdiagnóstico positivos ao exame de fezes, em sua maio-ria oocistos de coccidios e ovos tipo Strongyloidea.

No presente estudo o gênero Haemonchus predominou nas coproculturas, concordando com osresultados de Guimarães et al. (2000), que relatamtambém Trichostrongylus, Cooperia e Oesophagosto-mum. Outros autores relatam o gênero Cooperia comopredominante (Grisi e Nuemberg, 1971; Araújo et al.,1992; Serra-Freire et al., 1995; Oliveira et al., 2001;Araújo e Lima, 2005; Repossi Junior et al., 2006)porém todos estes citaram o aparecimento de larvas deHaemonchus sp.

No exame do esfregaço sanguíneo, 29% dos animaisavaliados apresentaram-se positivos para Babesia sppe ou Anaplasma marginale, com valores de 32% dosbezerros infectados, resultados que diferem deBarcellos et al. (2005) que relataram a presença deapenas três animais positivos para a Babesia (3,0%) e 12 para Anaplasma (12,1%), em 99 amostras processadas no município de Alegre, ES e deRodrigues-Vivas et al. (2000) relatado por Barcelloset al. (2005) que relataram 2,78% para B. bovis, 1,23%

Tabela 1 - Respostas mais frequentes dos produtores de bovinos leiteiros ao controle de parasitoses na microrregião do Caparaó,Espírito Santo

Respostas ao questionário Percentual de respostas positivas

Assistência técnica de médico veterinário 44 %

Escolha dos produtos parasiticidas realizada pelo proprietário 46 %

O carrapato como a principal parasitose do rebanho 88 %

Utilização de métodos de controle de parasitoses 92 %

Utilização de controle químico para helmintos, carrapatos e moscas 80 %

Controle realizado com base apenas no aspecto físico dos animais 72 %

Utilização de produtos a base de ivermectina no controle químico 62 %

A vermífugação menos de três vezes ao ano 46 %

O tratamento carrapaticida em mais de cinco vezes ao ano 44 %

O tratamento mosquicida em menos de três vezes ao ano 38 %

Conhecimento sobre resistência parasitária 62 %

Presença de resistência parasitária na propriedade 56 %

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para B. bigemina e 15,79% para A. marginale em bovinos em Yucatan, México. Pela comprovação dapresença de carrapatos transmissores da babesiose naspropriedades e das próprias respostas dos produtoresquanto a ocorrência dessas doenças nos rebanhos, ésabido que esta prevalência é maior do que a relatada,como comprovado por outros autores em outrasregiões através de exames sorológicos (Soares et al.,2000). Isso ocorre porque a técnica de esfregaço sanguíneo é um método que possui uma maior eficiência diagnóstica da doença na fase aguda (Boseet al., 1995).

Os dados do questionário mostraram que menos da metade das propriedades conta com assistência técnica veterinária. Martins (2005), num estudo emHaras no estado do Rio de Janeiro, relatou que apenas3,6% das propriedades de eqüinos não tem assistênciatécnica, talvez pela cultura de que as criações de eqüinos normalmente demandam maiores custos e oscavalos, maiores cuidados, o que não ocorre normal-mente para bovinos.

A maioria dos proprietários respondeu ser o carrapato a principal parasitose do rebanho, tendo sido percebido pelos produtores de Passos, MG sua importância com relação aos prejuízos biológicoscausados pela espécie B. microplus (Rocha et al.,2006). No estudo de Martins (2005) a parasitose considerada mais importante para os criadores deeqüinos também foi a infestação por carrapatos(78,6%). Este resultado sugere que os responsáveispelos animais visualizam macroscopicamente os car-rapatos, o que normalmente não acontece para oshelmintos. De acordo com Rocha et al. (2006), aquiloque pode ser observado por inspeção direta é bempercebido, como no caso dos carrapatos. Assim, comoas helmintoses são na maioria das vezes subclínicas,não são percebidas, o que tem coerência com a poucaimportância dada pelos mesmos à verminose, alémdessas necessitarem de diagnóstico laboratorial, o queraramente é solicitado pelo produtor subestimando aimportância das infecções.

A maioria dos proprietários afirmou que utilizammétodos de controle parasitológico e poucos confir-mam que não usam medidas de manejo associadas. As praticas de manejo associadas são essenciais aocontrole parasitário. No estudo de Martins (2005)foram avaliadas diferentes práticas para o auxílionesse controle como consórcio de ruminantes nopasto, rotação de pastagem, limpeza de pasto e a retirada das fezes das baias, medida esta preconizadapor vários outros autores, com alguns preconizando aretirada de fezes inclusive dos pastos, sendo conside-rada por Singer et al. (1999) uma técnica altamenteeficaz para diminuir a contaminação dos animaisporém é sabido que no Brasil é uma técnica não utilizada por ser inviável. No entanto, deve-se considerar que a maioria das pesquisas que relacio-nam práticas de manejo ao controle de helmintos

ocorre em países de clima temperado, onde devido avariações climáticas a sobrevivência das larvas podeser menor e assim viabilizar estas práticas.

O uso de esterqueiras, relatado neste trabalho por apenas 12% dos proprietários corrobora os dados deRepossi Junior et al. (2006) e Martins (2005) que afirmaram que na maioria das propriedades estudadas asfezes retiradas dos currais eram despejadas diretamentenas capineiras, sem passar pelo processo de composta-gem, o que facilita a reinfecção dos animais. E mesmoas propriedades que possuem esterqueiras, devem fazero uso correto das mesmas, seguindo o tempo e tempera-tura de adequada de estocagem das fezes.

O consórcio com eqüinos foi relatado na maioriadas propriedades. Este fato também foi relatado peloscriadores de eqüinos que consorciam animais comruminantes na maioria das propriedades (Martins,2005). Esse consórcio é benéfico para a pastagem,porém deve-se ter cuidados com infecções das espé-cies comuns que parasitam esses animais. O nema-tóide Trichostrongylus axei, tendo sido relatado noBrasil em altas infecções quando se usa consórciodesses animais e não se preocupa com a rotação deacordo com o tamanho da pastagem, justificado pelohábito diferente de cada espécie de apreender os alimentos espécies (Bagnola-Junior et al., 1996).

O princípio ativo mais utilizado no controle das parasitoses para os produtores, ouvido neste estudo,foi a ivermectina, semelhante ao que ocorreu nos estudos de Repossi Junior et al. (2006) também paraparasitoses de bovinos de leiteiros e de Martins (2005)para helmintoses de eqüinos. Rocha et al. (2006)citam o amitraz e a cipérmetrina como os mais citadosno controle do carrapato bovino, sendo as avermectinascitadas em terceiro lugar.

A maioria dos produtores afirma fazer controle deparasitoses e o faz baseando-se apenas no aspecto dosanimais, o que confirma os resultados encontrados porRepossi Junior et al. (2006) que também relataram talfato. Rocha et al. (2006) também afirmam que 64%dos proprietários afirmaram fazer o controle de carra-pato quando os animais estão muito infestados. Nopresente estudo também foi verificado que a maioriados produtores não calcula a dose dos medicamentoscom base no peso dos animais, fato também observa-do por Rocha et al. (2006) que constataram que apenas 24% dos produtores afirmaram usar a bulapara o calculo da dose, e também observado porMartins (2005), que relataram que 67,9% dos proprie-tários adotam sempre a mesma dose de vermífugospara adultos e metade desta para potros. Santos-Filho(1999) também estudando bovinos verificou a não utilização de critérios técnicos para estabelecer peso edosagem, o que pode estar favorecendo a ineficiênciados tratamentos e o surgimento de resistência anti-helmíntica.

A vermífugação ocorre menos de 3 vezes ao ano em46% das propriedades, o tratamento carrapaticida em

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mais de 5 vezes ao ano na maioria dos casos, dadosque se assemelham aos encontrados por Rocha et al.(2006) que relataram média de 12 vezes ao ano, comvariação de 8 a 24 vezes, o que os autores considera-ram excessivo.

Os proprietários entrevistados neste estudo respon-deram ter conhecimento sobre resistência parasitária.No estudo de Rocha et al. (2006), 76% entendiam queo mecanismo pelo qual ocorre a perda de eficiênciados produtos carrapaticidas é por criar resistência,porém a maioria não sabia como isso acontece.

Observando os dados presentes no inquérito, nota-se que apesar do uso de anti-parasitários nas propriedades, as prevalências das parasitoses foramaltas, principalmente nos bezerros, o que mostra que ouso desses produtos está sendo incorreto, dificultandoo controle parasitário das parasitoses no rebanho. Hánecessidade da assistência técnica mais ativa nas propriedades estudadas, diminuindo problemas nocontrole parasitário, principalmente quando se trata dautilização de critérios técnicos para a realização dotratamento dos animais e para a implementação demedidas de manejo associadas ao controle químicoeficazes para a situação de cada propriedade.

Agradecimentos

A FAPES, pelo apoio financeiro ao projeto e de bolsas dos estudantes; ao IDAF e Secretarias munici-pais de agricultura, pelo apoio no contato com os produtores; e aos produtores rurais da microrregião doCaparaó pela disponibilidade.

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Lesões renais intersticiais e tubulares na leishmaniose visceral

Renal lesions in interstitium and tubule in visceral leishmaniasis

Leopoldina A. Gomes1, Hiro Goto2, José L. G. Guerra3, Ana L. B. Mineiro4,

Silvana M. M. S. Silva5, Francisco A. L. Costa6*

1Centro de Ciências Agrárias, Universidade Federal do Piauí2Departamento de Medicina Preventiva, Faculdade de Medicina e Instituto de Medicina Tropical, Universidade de São Paulo

3Departamento de Patologia Experimental e Comparada, Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia, Universidade de São Paulo

4Centro de Ciências Agrárias, Universidade Federal do Piauí5,6Departamento de Clínica e Cirurgia Veterinária, Centro de Ciências Agrárias, Universidade Federal do Piauí

Campus da Socopo, 64049-550 Teresina-PI

R E V I S T A P O R T U G U E S A

CIÊNCIAS VETERINÁRIASDE

RPCV (2008) 103 (567-568) 157-163

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Resumo: Neste estudo foram avaliadas as lesões renais intersticiais e tubulares de 55 cães infectados naturalmente porLeishmania (L.) chagasi, cinco cães controles não infectados e32 hâmsteres infectados experimentalmente e sacrificados aos7, 15 e 90 dias. Tecido renal foi colhido e processado paraanálise histopatológica, análise morfométrica e ultra-estrutural.11 cães foram submetidos a dosagens de creatinina no soro eproteína e creatinina na urina. Nefrite intersticial foi observadaem 45 e lesões tubulares em 51 cães. O infiltrado inflamatóriointersticial ocupava maior área nas regiões cortical e medularnos animais infectados e naqueles com glomerulonefrite membranoproliferativa e glomerulonefrite de alterações míni-mas. Em hâmster, nefrite intersticial progressiva foi observadasomente nos grupos de 15 e 90 dias pós-infecção. Na prova defunção renal, seis cães revelaram proteinúria e destes, três apre-sentaram níveis elevados de creatinina no soro. Os resultadosmostraram que lesões tubulares e intersticiais renais sãopróprias da LV, progridem com o tempo de infecção e podemprovocar perda da função renal.

Palavras-chave: leishmaniose visceral, nefrite intersticial, cão,hâmster.

Summary: This study evaluated the renal alterations of interstitium and tubule of 55 naturally infected dogs byLeishmania (L.) chagasi, 5 non-infected dogs and 32 experi-mentally infected hamsters sacrificed to the 7, 15 and 90 dayspos-infection. Samples of renal tissue were processed to histopathologic, morphometric and ultraestructural study. In 11 dogs dosages of creatinine in the serum and protein andcreatinine in the urine were performed. Interstitial nephritis wasobserved in 45 and tubular injuries in 51 dogs. The morphome-tric analyses revealed that the interstitial inflammatory infiltratewas higher in the cortical and medullar region in the infectedanimals compared to the non-infected controls. The area ofinterstitial inflammatory infiltratrate was higher in the dogswith membranoproliferative glomerulonephritis and minorglomerular abnormalities. In hâmsters, progressive interstitialnephritis was observed in the groups of 15 and 90 days pos-infection. Prove of renal function revealed protein in the

urine in six dogs and of these three present elevated levels ofcreatinine in the serum. The results of this study showed thatinterstitial and tubular injuries are proper of the visceral leishmaniasis, progress with the time of infection and can causeloss of the renal function.

Keywords: visceral leishmaniasis, interstitial nephritis, dog,hâmster.

Introdução

A Leishmaniose visceral (LV) é causada no Brasilpelo protozoário Leishmania (Leishmania) chagasi(Lainson e Shaw, 1987). Após a infecção inicial o parasito dissemina-se pelo organismo, comprome-tendo, principalmente, órgãos do sistema fagocíticomononuclear (SFM), onde a presença do parasito éabundante (Marzochi et al., 1981), mas outros órgãos,também, são comprometidos, embora a presença doparasito seja escassa (Duarte, 2000).

Apesar de ser rara a presença de parasitos nos rinsna LV, as lesões renais são freqüentes tanto no homem(Andrade e Iabuki, 1972; Duarte et al., 1983; Dutra etal., 1985) quanto no cão (Benderitter et al., 1988;Macianti et al., 1989; Poli et al., 1991; Costa et al.,2003) e no modelo experimental de hâmster (Mathiaset al., 2001), podendo resultar em grave comprometi-mento da função renal (Ettinger e Feldman, 1997).

Embora existam claras evidências do comprometi-mento renal, pouco se conhece sobre as alteraçõesrenais intersticiais e tubulares na LV, em seus aspectoshistopatológicos, morfométricos e ultra-estruturais(Caravaca et al., 1991). O aprofundamento das investigações sobre as lesões renais na LV permiteentender a natureza, a extensão e a gravidade damesma, bem como permite fornecer parâmetros parauma classificação mais adequada.

A nefrite intersticial, do ponto de vista fisiopa-*Correspondência: [email protected]: (86) 3215-5760; Fax: (86) 3215-5753

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tológico, é uma lesão importante (Olsen et al., 1986),pois a alteração da função renal está mais relacionadacom alterações intersticiais, do que com alteraçõesglomerulares (Bohle et al., 1987). Contudo, no casoparticular da leishmaniose visceral canina (LVC), ainterferência de outros processos patológicos, concomitantemente à nefrite intersticial devida à LV,como a exposição dos rins a drogas (Linton et al.,1980) e enfermidades (Tisher e Brenner, 1994;Kootstra et al., 1998), que fogem ao controle em casosde infecção natural por Leishmania (L.) chagasi, nãodeixa claro se a lesão do interstício renal é específicada enfermidade ou é decorrente de um processosecundário de lesão. Para avaliar melhor esta questão,nesta pesquisa foi utilizado, além do cão, o modeloexperimental de hâmster, por meio do qual se pôdefazer um melhor controle e acompanhamento dainfecção e das condições de saúde dos animais.

O presente trabalho teve como objetivo avaliar asalterações intersticiais e tubulares dos rins de cães naturalmente infectados e de hâmsteres experimental-mente infectados pela Leishmania (L.) chagasi, demodo a classificar as lesões, avaliar sua extensão, seusreflexos sobre a função renal e a dinâmica da evoluçãodas alterações.

Material e métodos

Foi analisado tecido renal de 60 cães, dos quais 55apresentavam-se naturalmente infectados porLeishmania (L.) chagasi e cinco eram controles nãoinfectados. Os animais eram todos adultos, machos oufêmeas, de idades e raças diferentes, e muitos sem raçadefinida, provenientes da Gerência de Controle deZoonoses do município de Teresina no estado do Piauíe selecionados de uma população estimada em 61.536cães (Fundação Municipal de Saúde, 1998).

Foram analisados também tecido renal de hâmsteres(Mesocricetus auratus), infectados por inoculaçãointraperitoneal com 2 x 107 amastigotas de Leish-mania (L.) chagasi, amostra MHOM/BR/72/cepa 46 e sacrificados aos 7, 15 e 90 dias pós-infecção. Osgrupos foram compostos, respectivamente, por oito,seis e oito animais, com idades entre 45 e 60 dias,mantidos no biotério do Centro de Ciências Agráriasda Universidade Federal do Piauí (CCA/UFPI), comração e água à vontade.

O diagnóstico de LVC foi confirmado pela detecçãode anticorpos anti-Leishmania no soro, por teste deimunofluorescência indireta (Collins, 1995) e ELISA(Evans et al., 1990) e exame parasitológico em esfre-gaço de pele, baço e linfonodo poplíteo e cultura dematerial da medula óssea esternal, baço e linfonodopoplíteo (Evans et al., 1990; Berman, 1997). De doisanimais, foram isoladas leishmânias e enviadas aoInstituto Evandro Chagas de Belém do Pará para caracterização do parasito por meio de anticorpos

monoclonais. Em hâmsteres, o diagnóstico de LV foi determinado pela presença de amastigotas emesfregaços de baço e fígado corados por Giemsa.

Foram realizadas dosagens bioquímicas no soro utilizando kits do LABTEST (Labtest DiagnósticaS.A., Lagoa Santa, MG., Brasil). A concentração deproteína na urina foi avaliada pelo método deBradford modificado (Bradford, 1976) e com o uso do"kit" LABTEST (Labtest Diagnóstica S.A., LagoaSanta, MG., Brazil) foram avaliadas as concentraçõesde creatinina (catálogo Nº.35) e colesterol (catálogoNº. 60) no sangue e creatinina na urina (catálogo Nº. 35).

Os fragmentos de rins foram fixados em solução de Duboscq-Brasil por 60 minutos e, em seguida, conservados em formol a 10% tamponado com fosfato 0,01M pH 7,4 (formol tamponado). O tecidorenal foi processado segundo técnicas de rotina e oscortes corados com hematoxilina-eosina (H-E), ácidoperiódico de Schiff (PAS), tricrômico de Masson(TM), ácido periódico prata metanamine (PAMS) evermelho-congo (VC).

Cortes de rim de cães de aproximadamente 3 a 4 µmde espessura, corados com H-E, foram submetidos aanálise morfométrica utilizando analisador de imagemcomputorizado Leica Qwin D-1000, versão 4.1(Cambridge, UK) do Setor de Patologia animal doCCA/UFPI. Foi capturado um mínimo de 20 campospor corte de tecido renal de cada animal, tanto daregião cortical quanto da região medular. Desse total,foram selecionados, aleatoriamente, de 20 a 50 campos por fragmento de tecido renal por animal, paraanálise morfométrica do infiltrado inflamatório emcães controles não infectados e em cães com padrõesdiversos de glomerulonefrite, previamente diagnosti-cadas e descritas por Costa et al. (2003) como segue:glomerulonefrite de alterações mínimas (GNAM),glomeruloesclerose segmentar focal (GESF),glomerulonefrite proliferativa mesangial (GNPM) eglomerulonefrite membranoproliferativa (GNMP).Nos campos selecionados foram mensuradas as áreascorrespondentes à presença de células inflamatóriasem comparação à área total de cada campo.

Tecido renal de cães e de hâmsteres foram submetidos, também, à técnica de imunohistoquímica,utilizando anticorpo policlonal de camundongo anti-Leishmania (L.) amazonensis e o sistema deamplificação "Catalyzed Signal Amplification (CSA),system" e "EnVision, peroxidase" (Dako Corporation,código K4000, Carpinteria, USA). A revelação foifeita com 0.3 mg/ml 3,3’-diaminobenzidina (SigmaChemical Co., St. Louis, MO) em PBS e a contracolo-ração com hematoxilina de Harrys.

Na avaliação histopatológica, ao microscópio deluz, foram analisadas as alterações renais intersticiaise tubulares, de forma semi-quantitativa, de acordocom a localização, distribuição e intensidade daslesões, numa escala de 0 a 5, onde 0 = normal, 1 =

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mínima ou duvidosa; 2 = média; 3 = moderada; 4 =moderadamente severa; 5 = severa (Tisher e Brenner,1994).

Tecido renal de cão foi fixado em glutaraldeído a2% em tampão fosfato a 0,1 M, pH 7.4, posterior-mente pós-fixados em tetróxido de ósmio a 1%, lavados em solução salina e incubados "overnight" emsolução aquosa de acetato de uranila a 0,5%. Asamostras foram desidratadas em concentrações crescentes de acetona e embebidas em araldite 502(Polysciences, Warrington, PA). Os cortes ultrafinosforam corados com citrato e acetato de uranila paraanálise em microscópio eletrônico de transmissão(Modelo E.M. 201, Philips).

Os resultados quantitativos e semi-quantitativosforam analisados no programa estatístico Sigma Stat, por testes não-paramétricos: a) método deKruskal-Wallis para análise de variância; b) métodode Mann-Whitney para comparação entre dois grupos.Havendo diferença significante, aplicava-se o teste deDunn, para comparação múltipla de grupos. Adotou--se o nível de significância de p < 0,05.

Resultados

Foram detectados anticorpos anti-Leishmania emtodos os cães, exceto no grupo controle e o título variou de 1:40 a 1:1280. Foram observadas Leishma-nias em esfregaços de linfonodo poplíteo ou medulaóssea esternal de cães e em esfregaços de baço e fíga-do de hâmsteres. Nos animais controles, não foramdetectadas leishmânias. De dois cães, leishmâniasforam recuperadas, cultivadas e caracterizadas comoLeishmania (L.) chagasi, pelo Instituto EvandroChagas de Belém do Pará.

Em onze cães nos quais foi avaliada a função renal,seis (54,5%) revelaram proteinúria (taxa de proteína:creatinina > 1,0); três mostraram creatinina no soroelevada (creatinina > 1,0 g/dl) e, em dois casos, foramobservadas taxas elevadas de colesterol (colesterol >210,0 g/dl) (Costa et al., 2003).

A análise dos rins dos 60 cães revelou que somentenove (15%) não apresentaram alterações histopatoló-gicas; 45 (75,0%) apresentaram nefrite intersticial e51 (85,0%) apresentaram alterações tubulares. Lesõessimultâneas de nefrite intersticial e lesões tubularesforam observadas em 49 (81,7%) animais. As alterações nos animais controles, quando presentes,limitaram-se a um infiltrado de células inflamatóriasintersticiais de intensidade mínima. As lesões obser-vadas nos cães infectados variaram de intensidademínima a severa e consistiram de congestão e reaçãoinflamatória intersticial com presença, predominante,de células mononucleadas, caracterizadas comomacrófagos, linfócitos e, mais raramente, células plasmáticas; eram de distribuição focal nas regiõescortical, córtico-medular e medular. As lesões locali-

zavam-se abaixo da cápsula renal, nas regiões peritubular, intertubular, periglomerular e perivascular(Figura 1).

Na maioria dos casos, os focos inflamatórios apresentaram-se intercalados por regiões de fibroseintertubular e perivascular na região cortical (Figura2) e raros casos de calcificação dos túbulos coletoresna região medular. Em hâmsteres as lesões interstici-ais progrediram dos 15 aos 90 dias pós-infecção eeram similares às encontradas em cães, mas, difer-entemente do que foi observado nesta espécie, nogrupo de hâms-teres com 90 dias de infecção, haviadeposição de amilóide na parede dos túbulos contor-nados proximais (Figura 3).

Dos 51 cães com alterações tubulares 38 (63,2%)apresentaram atrofia tubular, 35 (58,2%) apresen-

Figura 1 - Rim. Cão infectado naturalmente pela Leishmania (L.) chagasi. Infiltrado inflamatório intersticial de células mononucleadas,intertubular, de intensidade severa(seta). H-E. 140 x.

Figura 2 - Rim. Cão infectado naturalmente pela Leishmania (L.)chagasi. Proliferação de tecido conjuntivo intersticial (cor azul) na cortical de intensidade severa. TM. 140 x.

Figura 3 - Rim. Hamster infectado experimentalmente por Leishmania(L.) chagasi. Parede de túbulos com depósito de amilóide (setas). VC.140 x.

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taram cilindros hialinos (Figura 4), 28 (46,6%) apresentaram degeneração hidrópica, 25 (41,6%)apresentaram degeneração hialina goticular, sete(11,6%) com dilatação tubular e três (5%) apresen-taram calcificação. Observaram-se, também, célulasepiteliais tubulares de tamanho reduzido e hiperco-radas, sugerindo apoptose.

Antígeno de Leishmania foi detectado no interstíciorenal em 95% dos cães infectados e em todos os hâmsteres. O antígeno apresentou-se, principalmente,sob padrão celular em células do infiltrado mononu-clear intersticial, em células epiteliais tubulares e, em menor proporção, como material extracelular particulado.

A análise ultra-estrutural do interstício renal de cãesrevelou a presença de fibroblastos em atividade comprodução de fibras colagéneas e presença de célulasnecróticas (Figura 5). No epitélio dos túbulos proximaisfoi observado a presença de material eletro-denso(gotas protéicas) e edema de mitocôndria (Figura 6).

A análise morfométrica realizada em tecido renal,corado com H-E, de quarenta e sete cães, revelou que o infiltrado inflamatório intersticial ocupava umaárea maior da região cortical (p = 0,00; teste de Mann-Whitney) (Figura 7) e da região medular (p =0,00; teste de Mann-Whitney) nos animais infectados, comparados aos animais do grupo controle. A análiserealizada entre os animais controles não infectados eos cães infectados com padrões de glomerulonefritepreviamente definidos (Costa et al., 2003), revelouque a área ocupada pelo infiltrado inflamatório inter-sticial era maior nos cães com glomerulonefrite mem-branoproliferativa (p = 0,002; teste de Kruskal-Wallise Dunn) e glomerulonefrite de alterações mínimas (p = 0,002) quando comparados ao grupo controle(Figura 8).

Figura 4 - Rim. Cão infectado naturalmente pela Leishmania (L.) chagasi. Presença de cilindros hialinos (seta) em túbulos renais. PAS.140 x.

Figura 5 - Rim. Cão infectado naturalmente por Leishmania (L.) chagasi. Necrose intersticial, restos celulares (seta larga) e proliferaçãode colágeno (seta fina). ME.

Figura 6 - Rim. Cão infectado naturalmente por Leishmania (L.) chagasi. Edema de mitocôndria (seta). ME. Aumento: 10000 x.

Figura 7 - Análise morfométrica da área de infiltrado inflamatóriointersticial em tecido renal de cães controles não infectados e infectados por Leishmania (L.) chagasi. Analisados 50 campos daregião cortical / animal. N = número de animais por grupo, p = 0,00.(Teste de Mann-Whitney).

Figura 8 - Análise morfométrica da área de infiltrado inflamatóriointersticial renal em cães controles não infectados e infectados porLeishmania (L.) chagasi. Analisados 50 campos da região cortical /caso. N = número de casos por grupo, p = 0,002 em relação ao grupocontrole não infectado. (Testes de Kruskal Wallis e Dunn).

N = 42

N = 5

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Discussão

Os títulos de anticorpos anti-Leishmania não apresentaram relação com as manifestações clínicas daenfermidade; animais com baixa titulação apresentaramsintomas evidentes da doença e animais com alta titulação apresentaram poucos sintomas ou eram assintomáticos.

A presença de amastigotas, vistas no exame citológico, era mais evidente em linfonodo poplíteo do que em medula óssea de cão e em baço do que emfígado de hâmsteres.

A análise da função renal revelou que nos animaiscom proteinúria, creatinemia e hipercolesterolemia,nefrite intersticial e alterações tubulares estavam presentes. Na ausência de nefrite intersticial e alterações tubulares, mesmo com presença de glomeru-lonefrite, não havia alterações da função renal, o queindica que a nefrite intersticial é uma lesão grave. Sabe--se que em lesões do tecido renal, é observada umamaior relação entre as alterações intersticiais e tubulares e a presença de insuficiência renal, do queentre a severidade da lesão glomerular e o comprometi-mento da função excretora do rim (Bohle et al., 1987).No presente estudo esta relação entre lesões interstici-ais e tubulares e insuficiência renal foi observada.

A diferença no padrão da alteração intersticial do cão,onde não foi detectada a presença de amiloidose, emrelação ao modelo experimental de hâmster, onde foidetectada a presença de amiloidose, parece decorrer dealterações do sistema retículo-endotelial do hâmster,devido a fatores como: superistimulação do sistemaimune provocada pela elevada carga parasitária, com oaparecimento de amiloidose inespecífica (Brito et al.,1975); alta dose de antígeno usado na indução dainfecção experimental (Benderitter et al., 1988), ou àvia de inoculação intraperitoneal (Duarte, 1978) usadapara reproduzir a doença. Essa via é completamentediferente da via de infecção natural que é feita atravésda pele por um vetor, como ocorreu com os cães desteestudo, a Lutzomia longipalpis (Magil, 1995), que possui propriedades intrínsecas importantes nadefinição do quadro evolutivo da doença (Donnelly etal., 1998; Yin et al., 2000).

A análise histopatológica e ultra-estrutural revelaramque muitas lesões, destacando-se o infiltrado inflama-tório celular, atrofia e fibrose, eram de natureza grave,pois provocaram alterações celulares (Tisher e Brenner,1994) que levaram seis dos 11 cães, em que foram realizadas provas de função renal, a manifestarem proteinúria.

Deve-se salientar que nefrite intersticial em cães éuma lesão frequentemente encontrada, pois a mesmaestá presente no decurso de várias enfermidades queacometem essa espécie ao longo da vida (Jubb et al.,1994; Oliveira et al., 2005; Camargo et al., 2006).Contudo, no presente estudo as observações sugeremque tais lesões estavam associadas à leishmaniose

visceral, pois em 95% dos cães e em todos os hâmsteresfoi detectada a presença de antígeno de leishmânia emcélulas do infiltrado inflamatório intersticial e em células epiteliais tubulares, não sendo encontrado nosanimais controles. Amastigotas íntegras no interstíciorenal não foram detectadas em nenhum dos casos, revelando que a presença do parasito no rim é bastanterara. Visto que não foram detectadas amastigotas norim, nem por histopatologia e nem por imunohisto-química, a presença do antígeno de Leishmania foi fundamental para estabelecer relação entre a infecçãoleishmaniótica e as lesões intersticiais no tecido renaldos animais analisados.

Mesmo não tendo sido possível um controle ou conhecimento prévio das condições sanitárias e nutricionais em que viviam os cães deste estudo, quepudessem descartar a possibilidade de outras infecções,pois se tratavam de animais de rua que foram captura-dos para o controle da leishmaniose visceral e da raivaurbana, o estudo em hâmsteres, em que tal controlepôde ser feito, revelou alterações intersticiais e tubulares similares àquelas encontradas nos cães,demonstrando que a nefrite intersticial observada éprópria da leishmaniose visceral.

Células epiteliais tubulares mostraram-se de tamanhoreduzido e hipercoradas, provavelmente, devido à condensação citoplasmática, cariólise e picnosenuclear, o que permitiu classificá-las, pelo aspecto morfológico, como células em apoptose, conformedefinido por Zeiss (2003). A participação de apoptoseno mecanismo de lesão é um evento bem conhecido emvários processos patológicos renais (Wong et al., 2001).Apoptose é evidente nos rins em casos de cisto renal,inflamação intersticial e glomerulonefrite, cicatrizaçãoe esclerose renal (Mené e Amore, 1998), tendo grandeimportância na regulação do número de células durantea indução e resolução de uma lesão (Ortiz et al., 2000).Em outras enfermidades, como nas leptospiroses, temsido observado apoptose de células epiteliais tubularesde rim (Carvalho, 2005).

Os rins possuem grandes reservas funcionais e amanifestação de insuficiência renal somente é observa-da quando 2/3 ou 3/4 do tecido renal de ambos osórgãos está comprometido (Tisher e Brenner, 1994). No presente estudo, a análise morfométrica revelou a presença de nefrite intersticial em todos os 47 cães, significantemente maior na região cortical que namedular, entretanto a prova de função renal, realizadaem 11 animais, revelou manifestação de insuficiênciarenal em apenas seis (54,5%), o que demonstra que em quase metade dos animais (45,5%) a lesão não foisuficientemente extensa para comprometer a funçãorenal. Tendo em vista que não foi possível avaliar otempo de infecção dos cães, por se tratar de infecçãonatural, não foi possível estabelecer, nesta espécie,relação entre a gravidade da lesão renal e a progressãoda infecção; mas no modelo experimental de hâmster,onde a lesão se agravou com o tempo de infecção, essa

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relação pôde ser observada, o que permitiu inferir que ocomprometimento renal, pela sua gravidade, pode sercausa de morte de animais com leishmaniose visceral,como tem sido sugerido por outros autores (Keenan etal., 1984). Não foi observada diferença significante daárea de nefrite intersticial nos grupos com padrões distintos de glomerulonefrite, o que leva a acreditar que a nefrite intersticial não está relacionada e nãoinfluencia o tipo de glomerulonefrite presente na leishmaniose visceral.

Conclusões

Os resultados obtidos revelaram que a leishmaniosevisceral provoca lesões renais intersticiais e tubularesgraves, específicas da doença, estreitamente relacio-nadas com alteração da função renal, independente dapresença de alterações glomerulares. As lesões renaisprogridem com o tempo de infecção e são capazes de comprometer área de tecido renal suficiente paraprovocar perda da função do órgão.

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Avaliação clínica neonatal por escore Apgar e temperatura corpórea em diferentes condições obstétricas na espécie canina

Canine neonatal clinical evaluation through Apgar score and body temperature under distinct whelping condition

Liege C. G. da Silva1*, Cristina F. Lúcio1, Gisele A. L. Veiga1, Jaqueline A. Rodrigues1,Camila I. Vannucchi2

1Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia, Universidade de São Paulo (FMVZ – USP)

2Departamento de Reprodução Animal da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia, Universidade de São Paulo (FMVZ – USP)

R E V I S T A P O R T U G U E S A

CIÊNCIAS VETERINÁRIASDE

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Resumo: Em medicina veterinária, a mortalidade neonatal nas primeiras semanas de vida alcança percentuais próximos a30%. A inabilidade em proceder a correta análise clínica e odéficit no conhecimento técnico-científico são os principaisresponsáveis pelos elevados índices reportados. Neste trabalho,objetivou-se padronizar a avaliação clínica neonatal por meio doescore Apgar e temperatura corpórea em neonatos caninosnascidos sob diferentes condições obstétricas. Foram estudados48 neonatos caninos, alocados em três grupos: grupo A – euto-cia; grupo B – distocia materna; grupo C – cesariana. Aos 0, 5e 60 minutos do nascimento foram avaliados: temperatura retal,freqüências cardíaca (FC) e respiratória (FR), coloração demucosas, tônus muscular e irritabilidade reflexa. Às cinco últimas análises foram atribuídas notas (0-2), conferindo aosneonatos o escore Apgar (0-10). Os dados foram analisados utilizando-se ANOVA e Newman-Keuls (p≤0,05). Houve quedasignificativa da temperatura retal e hipotermia ao longo dos 60minutos para todos os grupos. Aos 0 e 5 minutos, a temperaturacorporal do grupo C foi inferior aos demais. Neonatos nascidospor cesariana apresentaram menor vitalidade aos 0 e 5 minutospós-natal, como conseqüência dos agentes anestésicos. A FC,tônus muscular e irritabilidade reflexa foram superiores nogrupo B imediatamente ao nascimento, em função da maior liberação de corticóides por estresse fetal. A avaliação isoladada FR não foi precisa para identificar possíveis alterações respiratórias, sendo recomendado associá-la a outros métodossemiológicos e exames complementares. A inspeção demucosas demonstrou ser uma variável pouco fidedigna parapredizer neonatos com graus leves de alterações cardiorrespi-ratórias. Em contraste aos demais filhotes, os nascidos de cesariana apresentaram cianose imediatamente ao nascimento.

Summary: It is known that canine mortality rate is up to 30%in the first weeks of life. Technical and scientific deficit relatedto veterinary neonatology is conspicuous. The aim of this studywas to standardize neonatal clinical evolution through the Apgarscore and body temperature under distinct obstetric condition.

Forty-eight canine neonates were allocated into 3 groupsaccording to whelping condition: group A – eutocia; group B –maternal dystocia; group C – cesarean section. Immediatelyafter birth, 5 and 60 minutes later, the following assessmentswere performed: Apgar score (0-10; heart beat, respiratoryeffort, muscle tone, reflex irritability and mucous color) andrectal temperature. Data were analyzed using ANOVA andNewman-Keuls at p≤0.05. There was a significant reduction inrectal temperature and hypothermia for all groups along the 60 minutes of birth. Group C neonates presented lower bodytemperature at birth and 5 minutes later. Cesarean section newborns showed lower vitality, as a consequence of fetal cardiorespiratory and nervous depression caused by anestheticagents. Muscle tone, heart rate and reflex irritability were higher in group B immediately at birth because of an increasedcorticosteroids release due to the fetal stress. Respiratory ratewas not accurate to predict respiratory distress; hence detailedpulmonary auscultation should be performed. Mucous membra-ne color assessment was not reliable for the diagnosis of superficial to mild cardio-respiratory alterations. Cesarean section newborns presented cyanosis immediately after birth,however all evolve satisfactorily at 5 minutes of life.

Introdução

O período neonatal para a espécie canina corresponde ao intervalo de tempo entre o nascimentoe o décimo quarto dia de vida. A esta fase atribui-seexpressivas adaptações a inúmeros fatores simultanea-mente ao desenvolvimento de funções vitais não efetuadas durante a vida intra uterina, como a respi-ração pulmonar previamente de responsabilidade placentária. Estima-se que a mortalidade neonatal nasprimeiras semanas de vida em Medicina Veterináriaseja de 30% (Freshman, 1998). Em análise comparati-va, o índice de mortalidade de filhotes caninos nascidos de parto eutócico é de 5,55%; significativa-mente menor aos nascidos de distocia, com percentualde 33% (Moon et al., 2001). Em casos de cesariana

*Correspondência: [email protected];[email protected] Tel: 00 (55) 11-3091-1423

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eletiva ou emergencial na espécie canina, Moon et al.(2000) constataram perda neonatal de 6 a 11%,durante a primeira semana de vida. Em geral, diversassão as causas para morte neonatal, desde defeitos congênitos ou genéticos, desnutrição, condições desaúde materna inadequadas, enfermidades infecciosasou parasitárias, falhas de assistência ao parto ou distocias, senilidade materna ou neonatos nascidos defêmeas multíparas (Davidson, 2003) e, ainda, falha nodiagnóstico e tratamento das afecções neonatais.

A avaliação clínica dos recém-nascidos, bem comoa definição da conduta terapêutica adotada figuramcomo expressivos desafios ao médico veterinário. Ainabilidade em proceder ao exame físico minuciosoassociada à carência do conhecimento técnico-cientí-fico em Neonatologia Veterinária corroboram o diagnóstico impreciso e o tratamento empírico das afecções e justificam os elevados índices de mortalidade apresentados. O neonato não deve serconsiderado como a miniatura do indivíduo adulto e acompreensão de suas características fisiológicas singulares é condição sine qua non para o sucesso terapêutico.

Em Medicina, a avaliação da vitalidade neonatal aonascimento é freqüentemente realizada por meio doescore Apgar. Tal parâmetro, criado em 1952 pelamédica anestesiologista Virginia Apgar, avalia as principais funções vitais durante os primeiros minutosde vida e permite a indicação de métodos preventivosou corretivos das alterações encontradas. Yeomans etal. (1985) afirmam que o escore Apgar pode auxiliarna diferenciação de neonatos hígidos e severamentecomprometidos. Em Medicina Veterinária, são escas-sos os estudos que consolidem o escore Apgar paradiferentes espécies animais. Algumas adaptações sugerem a avaliação da freqüência cardíaca, atividaderespiratória, tônus muscular, coloração de mucosas evocalização ao nascimento (Moon et al., 2000). Emrecente estudo, Veronesi et al. (2009) avaliaram a confiabilidade do escore Apgar modificado emrecém-nascidos caninos, correlacionando-o com a viabilidade neonatal e o prognóstico de sobrevivênciaimediata. Como resultado, constataram que 88,2% dosneonatos com escore Apgar inferior a 7 sobreviveramapós a instituição de tratamento médico adequado.Ademais, a mortalidade neonatal foi significativa-mente superior nos animais com escore Apgar abaixode 7. Todavia, o tipo de parto não afetou o percentualde mortalidade, como atestado em estudos anteriores(Moon et al., 2000; Moon et al., 2001). O escoreApgar pode variar de 0 a 10 e para a espécie equina,considera-se ideal ao nascimento valores entre 9 e 10.Notas entre 6 e 8 indicam asfixia moderada e sugere--se adotar medidas de estimulação neonatal (Vaala etal., 2006).

Neonatos caninos são incapazes de manter a tem-peratura corpórea estável, visto que os reflexos devasoconstrição e a capacidade de produzir tremores

são afuncionais ao nascimento. Ainda, possuem escasso tecido adiposo subcutâneo, superfície corpórea relativamente extensa e imaturidadehipotalâmica (Johnston et al., 2001). As respostasfisiopatológicas à hipotermia incluem bradicardia,falência cardiovascular, injúria cerebral e atonia gastrintestinal (Johnston et al., 2001). No períodoneonatal, temperaturas ambientais inferiores a 27 ºCcausam hipotermia e quando superiores a 33 ºC eassociadas a elevados índices de umidade relativa doar (85 a 90%) presdispõem a graves problemas respi-ratórios (Prats e Prats, 2005). Veronesi et al. (2009)constataram que a manutenção da temperatura ambiental em 32 ºC garantiu a normotermia dosrecém-nascidos, com valores de temperatura corpóreaentre 35,5 ºC e 36,5 ºC. Destarte, o correto manejoambiental é essencial para o controle da temperaturacorpórea do neonato.

Estudos aprofundados concernentes à fisiologia do recém-nato, bem como sua evolução clínica noperíodo pós-parto imediato devem fomentar o aprimoramento da Neonatologia Veterinária. Destamaneira, os objetivos deste estudo foram: avaliar oselementos clínicos adotados pelo escore Apgar e atemperatura corpórea de neonatos caninos à primeirahora de vida e comparar tais variáveis em diferentescondições de parto (eutocia, distocia vaginal e cesariana).

Materiais e métodos

Para o presente experimento, foram utilizadosquarenta e oito neonatos das raças Bulldog, GoldenRetriever, Labrador, Cavalier King Charles Spainel,Chow-chow e Doberman nascidos de gestações normais e a termo. Deste número amostral, vinte eramnascidos em eutocia (Grupo EUT), oito oriundos dedistocia materna (hipotonia ou atonia uterina) (GrupoDIST) e vinte nascidos por cesariana (Grupo CES). Oprotocolo anestésico para as operações cesarianas constituiu da sedação com acepromazina (0,02 mg/kg)associada ao tramadol (1 mg/kg), indução anestésicacom propofol (1 mg/kg) e anestesia epidural comcloridrato de bupivacaína (0,5 mg/kg) associado aofentanil (3 g/kg). Para tratamento da inércia uterina,adotou-se administração intravenosa lenta de 1-3 UIde ocitocina e 150-500 mg/animal de gluconato decálcio em solução fisiológica.

Simultâneo à reanimação neonatal, ao nascimento,após cinco e sessenta minutos, foram aferidos tempe-ratura corpórea (TC), freqüência cardíaca (FC), freqüência e esforço respiratórios (FR), inspecionadosa coloração da mucosa gengival, tônus muscular e irritabilidade reflexa, atribuindo-lhes notas de 0 a 2,conforme Quadro 1. A somatória das notas específicasde cada variável conferiu aos neonatos o escore Apgartotal de 0 a 10. O tônus muscular foi avaliado pela

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capacidade do neonato em flexionar membros e musculatura abdominal quando em posição ventro--dorsal, enquanto a irritabilidade reflexa foi observadapor meio da resposta neonatal à manipulação duranteo exame clínico. Os intervalos de referência adotadospara FC, FR e TC foram 180 a 250 bpm, 15 a 40 mpme 34,4 a 36,0 ºC, respectivamente (Moon et al., 2000).Durante a primeira hora de vida, os neonatos forammantidos junto à mãe ou abrigados em caixa de isopor,sem a incidência de calor artificial.

Os dados foram submetidos à análise de variânciapara medidas repetidas (ANOVA). O teste deNewman-Keuls foi utilizado como método comple-mentar de comparações múltiplas, com níveis de sig-nificância iguais ou menores a 5% (p ≤ 0,05).

Resultados

Foram observadas diferenças estatísticas do escoreApgar entre os grupos e tempos estudados, comodemonstrado na Tabela 1. Houve significativo aumentodos valores de Apgar no decorrer da primeira hora de

vida, independente do tipo de parto. Entretanto, osneonatos nascidos de cesariana apresentaram escoreinferior aos demais indivíduos imediatamente aonascimento e após cinco minutos.

Neonatos nascidos em eutocia e cesariana apresen-taram discreta bradicardia ao nascimento. Para oGrupo EUT houve significativa melhora após cincominutos. Não houve diferença estatística temporalpara os demais grupos (Tabela 2).

Todos os grupos apresentaram FR dentro do intervalo de normalidade, como demonstrado naTabela 3. Após uma hora, a FR dos neonatos nascidosem eutocia foi significativamente maior aos de cesa-riana. A auscultação pulmonar ao nascimento indicouirregularidade do padrão respiratório, com alteraçãono intervalo entre as inspirações associada à presençade ruído respiratório de moderado a intenso e episó-dios de agonia respiratória em 77,2% dos neonatosnascidos em eutocia, 87,5% para os de distocia e em65% de cesariana. Aos cinco e sessenta minutos pós-natais tais percentuais diminuíram para 27,3 e 5% parao Grupo EUT; 62,5 e 12,2% para o Grupo DIST e 40e 10% para o Grupo CES, respectivamente.

Quadro 1 - Parâmetros adotados para o escore Apgar de vitalide neonatal em Medicina Veterinária

Escore0 1 2

Freqüência Cardíaca Ausente Bradicárdica Presente e normalFC < 180 bpm FC = 180-250 bpm

Esforço Respiratório Ausente Irregular Regular e vocalizaçãoFR < 15 mpm FR = 15-40 mpm

Tônus muscular Flacidez Alguma flexão FlexãoIrritabilidade Reflexa Ausente Algum movimento HiperatividadeColoração de mucosas Cianose e palidez Cianose Rósea

Tabela 1 - Médias e desvios-padrão dos valores de Apgar aos 0,5 e 60 minutos do nascimento para os grupos EUT, DIST e CES

Escore ApgarTempo pós-natal Grupo EUT Grupo DIST Grupo CES0 minuto 7,4 ± 1,76aA 7,75 ± 1,04aA 5,1 ± 1,57aB

5 minutos 9,25 ± 0,72bA 9,12 ± 0,64bcA 7,6 ± 1,15bB

60 minutos 9,75 ± 0,44c 9,87 ± 0,53c 8,85 ± 0,87c

ab na mesma coluna indicam diferença estatística (p ≤ 0,05).AB na mesma linha indicam diferença estatística (p ≤ 0,05).

Tabela 2 - Médias e desvios-padrão da FC (bpm) aos 0,5 e 60 minutos do nascimento para os grupos EUT, DIST e CES

Freqüência Cardíaca (bpm)Tempo pós-natal Grupo EUT Grupo DIST Grupo CES0 minuto 164 ± 37,95aB 201 ± 35,34A 164 ± 34,20B

5 minutos 198 ± 35,15b 204 ± 17,20 181 ± 24,9060 minutos 198 ± 27,50b 209 ± 14,17 189 ± 27,60ab na mesma coluna indicam diferença estatística (p ≤ 0,05).AB na mesma linha indicam diferença estatística (p ≤ 0,05).

Tabela 3 - Médias e desvios-padrão da FR (mpm) aos 0,5 e 60 minutos do nascimento para os grupos EUT, DIST e CES

Freqüência Respiratória (mpm)Tempo pós-natal Grupo EUT Grupo DIST Grupo CES0 minuto 36 ± 10,21 34 ± 12,15 29 ± 9,785 minutos 40 ± 11,70 34 ± 5,66 35 ± 6,2160 minutos 43 ± 7,60A 36 ± 12,26AB 31 ± 9,07B

AB na mesma linha indicam diferença estatística (p ≤ 0,05).

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Os valores de temperatura corpórea neonatal apre-sentaram significativa queda ao longo da primeira horade vida para todos os grupos estudados (Gráfico 1). Aonascimento, os indivíduos nascidos por via vaginal(Grupos EUT e DIST) apresentaram-se hipertérmicos.Após cinco minutos, somente os neonatos nascidos deeutocia mantiveram a normotermia, os demais já apre-sentavam hipotermia. Aos sessenta minutos pós-natal,todos os animais encontravam-se em hipotermia, inde-pendente do tipo de parto.

Ao nascimento, apenas 30 e 38% dos neonatosnascidos em eutocia e distocia, respectivamente, apresentaram mucosas cianóticas, em contraste aos85% dos nascidos de cesariana. Todavia, após cincominutos, o percentual de cianose decresceu para 5,12,5 e 16% nos respectivos grupos EUT, DIST e CES.Aos sessenta minutos do parto, acima de 80% dosneonatos apresentaram mucosas normocoradas emtodos os grupos avaliados (Gráfico 2).

Ao nascimento, neonatos nascidos em distocia apresentaram tônus e irritabilidade mais acentuadosque os demais grupos (Gráficos 3 e 4). Por outro lado,aproximadamente 40% dos recém-nascidos de cesarianas receberam baixo escore (nota 0) para asvariáveis tônus muscular e irritabilidade reflexa logoapós o parto. A avaliação aos cinco minutos mostrouque neonatos nascidos em distocia tendem a perdertônus muscular, porém o restabelecem aos sessentaminutos do parto.

Discussão

O período de transição da vida fetal para a extra--uterina impõe ao recém-nascido a necessidade deajustar-se rapidamente a novas funções, tais comoadaptações cardiovasculares e respiração espontânea.Neonatos nascidos via vaginal receberam escoreApgar significativamente superior aos de cesariananos primeiros minutos de vida. Sabe-se que a aneste-sia epidural, em comparação a protocolos que adotamagentes anestésicos voláteis, acarreta menor depressãodos reflexos neurológicos neonatais (Luna et al.,2004). Veronesi et al. (2009) não encontraram diferença no escore Apgar de recém-nascidos oriundos de parto vaginal em comparação aos nasci-dos por cesariana, com a dministração de propofol (2 a 4 mg/kg), isofluorano e bloqueio linear combutorfanol. Ainda assim, devido às características físico-químicas da maioria dos medicamentosanestésicos (baixo peso molecular, alta capacidade dedifusão, rápida solubilidade lipídica e baixo grau deionização), todos são potencialmente capazes deatravessar a barreira hematoplacentária e suscitardepressão fetal em diferentes graus (Thurmon et al.,1996).

Com relação ao aparelho circulatório, o períodoneonatal imediato é caracterizado por expressivasadaptações. Em distocias maternas ou fetais, o períodode isquemia uteroplacentária mais prolongado podeacarretar hipóxia fetal, hipercapnia e acidosemetabólica (Vestweber, 1997). A acidose lática possuiação depressora direta sobre a contratilidade e débitocardíacos que, no animal adulto, pode ser compensadapela estimulação simpática do miocárdio por aumentoda FC (Robertson, 1989). Entretanto, Grundy (2006)afirmou que este mecanismo compensatório é ineficiente em neonatos, em razão do incompleto

Gráfico 1 - Evolução da temperatura corpórea (ºC) aos 0,5 e60 minutos do nascimento para os neonatos dos grupos EUT,DIST e CES

Gráfico 3 - Evolução do tônus muscular aos 0,5 e 60 minutosdo nascimento para os grupos EUT, DIST e CES

Gráfico 4 - Evolução da irritabilidade reflexa aos 0,5 e 60minutos do nascimento para os grupos EUT, DIST e CES

Gráfico 2 - Coloração das mucosas aos 0,5 e 60 minutos donascimento para os grupos EUT, DIST e CES

ab no mesmo grupo indicam diferença estatística (p ≤ 0,05).AB no mesmo momento de avaliação indicam diferença estatística (p ≤ 0,05).

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desenvolvimento do sistema simpático. Como resul-tado, o coração é incapaz de aumentar sua força contração e o débito cardíaco depende precipuamenteda freqüência de contração do miocárdio. Vivan et al.(2009) constataram que a dosagem de lactato nosangue do cordão umbilical imediatamente ao nasci-mento é um indicador seguro da viabilidade neonatal,com valores significativamente superiores em indiví-duos que evoluíram para o óbito. Recém-nascidoscom valores de lactato próximos a 10 mMfaleceram precocemente, já ao longo da primeira horade vida. Os resultados de FC aferidos neste estudoconfrontam as citações prévias. Ao nascimento, a FC de indivíduos nascidos em distocia foi significa-tivamente superior aos demais. Admite-se que a compressão das artérias uterinas e vasos umbilicaisem situações de pouca contratilidade miometrial(hipotonia ou atonia) não seja prolongada e a induçãode hipóxia e acidose fetal seja mais branda. Emsomatória, a adoção de medicamentos ecbólicosacelerou o parto e asseverou a higidez neonatal.Supõe-se que a administração parenteral de gluconatode cálcio para cadelas do grupo DIST tenha elevado aFC fetal e a neonatal, pois estudos em MedicinaHumana relatam elevação na FC fetal em mães sub-metidas a 1 mg de gluconato de cálcio endovenoso porhipocalcemia intra-parto (Hagay et al., 1986).

O disparo para o início da respiração pulmonar emneonatos ocorre por estímulos táteis, térmicos e édecorrente da moderada privação de oxigênio duranteo parto. A expansão dos pulmões pelo ar promove adiminuição da resistência vascular local, aumento dofluxo sangüíneo, elevação da oxigenação do sangue erápida absorção dos fluidos pulmonares fetais(Vestweber, 1997). Durante a primeira inspiração,somente parte dos alvéolos são inflados e, portanto,qualquer influência pode comprometer a adequadaexpansão alveolar. A discreta taquipnéia observadaaos sessenta minutos do nascimento para o grupo EUTocorreu possivelmente como mecanismo compen-satório às restrições de trocas gasosas pulmonares.Neonatos nascidos em distocia apresentaram evoluçãomais lenta do padrão respiratório. A ausência do estímulo compressivo do canal vaginal nos neonatosnascidos por cesariana reduz a respiração reflexa e,em associação à depressão respiratória decorrente dosagentes anestésicos, pode ser a causa para o maioracúmulo de fluidos no interstício pulmonar. Criançasnascidas de cesariana podem apresentar estresse respi-ratório transitório, por não reabsorverem o fluido pulmonar de maneira eficaz (Solas et al., 2001). Aavaliação isolada da FR não se mostrou precisa paraidentificação de recém-natos com possíveis alteraçõesrespiratórias, pois tal variável não apresentou compor-tamento estável nas populações estudadas, indepen-dente da condição de parto. Finister et al. (2005)relataram que o escore Apgar não deve ser aplicadopara avaliação da hipóxia neonatal humana, todavia é

um método confiável para a definição da viabilidadeneonatal imediatamente ao parto e da eficácia daressuscitação. Sendo assim, é recomendado associar aFR à auscultação minuciosa dos campos pulmonares ea outros exames mais específicos na avaliação do aparelho respiratório, como a análise hemogasométrica.

Em recém-nascidos, a termorregulação não é totalmente desenvolvida e respostas fisiológicas àhipotermia incluem bradicardia, falência cárdio-vas-cular, falha da sucção e parada gastrintestinal,desidratação e morte (Johnston et al., 2001). A temperatura mais elevada imediatamente após o partonos grupos EUT e DIST denota a influência da temperatura materna, superior no trabalho de parto em comparação às fêmeas submetidas à anestesia ecesariana. Como resposta à hipotermia e à condiçãopecilotérmica, o primeiro reflexo neonatal a se desen-volver é o termotropismo positivo, presente nosprimeiros quatro dias de vida e essencial para estabe-lecer o vínculo do recém-nascido com a mãe e a ninhada (Prats e Prats, 2005).

Neonatos hígidos devem apresentar mucosas de coloração rósea intenso. Quando cianóticas, sinalizamsevera hipoxemia (Spreng, 2004). Como citado anteriormente, neonatos provenientes de cesarianaapresentam depressão respiratória e discreto estímuloà respiração reflexa. Desta meneira, a troca gasosaocorrida durante as primeiras inspirações é menos eficiente e acarreta severa hipóxia e cianose central.Contudo, aos cinco minutos do nascimento somente16% dos neonatos do grupo CES apresentavammucosas de coloração cianótica, apesar da depressãocardiorrespiratória associada aos agentes anestésicosempregados. A inspeção de mucosas aparentesmostrou-se uma variável pouco fidedigna na identifi-cação de neonatos com graus leves de alterações car-diorrespiratórias. Para tal avaliação, recomenda-se aanálise dos gases sangüíneos, como pO2, pCO2 e SO2.

As variáveis tônus muscular e irritabilidade reflexaexprimem o grau de depressão do sistema nervosocentral neonatal. Neonatos nascidos por via vaginaldemonstraram excelente evolução destas variáveis,com notas máximas para a maioria dos neonatos noprimeiro momento de avaliação. O prolongado período em que os fetos permaneceram no útero ou canal vaginal em distocia induziu a liberação decorticosteróides. O estresse gerado é responsável peloestímulo do sistema nervoso simpático e acarretouaumento da FC, da irritabilidade reflexa e do tônusmuscular imediatamente ao nascimento.

Com base nos resultados obtidos, o escore Apgardemonstrou ser um método diagnóstico eficiente naavaliação inicial do neonato. Como meio de triagem, oescore Apgar adaptado à Medicina Veterináriacolaborou para a identificação de alterações inespecí-ficas do período neonatal imediato, como por exemplodepressão e alterações respiratórias. A associação dascinco variáveis estudadas asseverou maior amplitude à

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avaliação clínica dos recém-nascidos. A avaliação isolada da FR não permitiu estabelecer o diagnósticodas possíveis alterações respiratórias, sendo recomen-dado associá-la à auscultação minuciosa de campospulmonares e a exames complementares, como radiografia torácica e hemogasometria sangüínea. Ainspeção isolada das mucosas aparentes demonstrouser um recurso semiológico pouco fidedigno na iden-tificação de neonatos com graus leves de alteraçõescardiorrespiratórias, entretanto ao associá-la àsdemais variáveis do escore Apgar obtém-se maioracurácia na identificação de distúrbios gerais.Neonatos nascidos em distocia materna por hipotoniauterina apresentaram maior vitalidade imediatamenteapós o parto, em função do estresse fetal mais prolon-gado, em contraste àqueles nascidos de cesariana,deprimidos pela ação dos medicamentos anestésicos.Neonatos caninos apresentaram comportamentopecilotérmico, com significativa queda da temperatu-ra corpórea no decorrer da primeira hora de vida,independente da condição obstétrica.

Agradecimentos

À Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de SãoPaulo, pelo auxílio financeiro para a realização desteexperimento. Processos: 06/52766-3, 06/59315-7.

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Flora bacteriana aeróbia em otites caninas

Aerobic bacterial flora of the canine otitis

A. C. P. Silveira*, C. D. R. Roldão, S. C. A Ribeiro, P. F. A. Freitas

Universidade Federal de Uberlândia – Uberlândia/MG, Brasil

R E V I S T A P O R T U G U E S A

CIÊNCIAS VETERINÁRIASDE

RPCV (2008) 103 (567-568) 171-175

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Resumo: O presente trabalho teve como objetivo estudar bacteriologicamente otites clínicas em cães, determinando a freqüência das bactérias e a sensibilidade bacteriana frente adiferentes antimicrobianos, por meio de um antibiograma. Foiavaliada a influencia do sexo, raça e idade dos animais nas otitesbacterianas. Foram analisados 231 cães com sinais clínicos deotite e em 89,2% foram isoladas bactérias, com prevalência de Staphylococcus epidermidis (31,5%) e Staphylococcusaureus (20,7%). Houve maior isolamento bacteriano nas otitesclínicas na faixa etária de 1 a 3 anos em animais sem raçadefinida e em cães da raça Pastor Alemão, não havendo diferença entre os sexos. Kanamicina (93,9%), Cloranfenicol(85,2%), Gentamicina (85,2%) e Amicacina (81,9%) foram osantibióticos que promoveram uma atividade antimicrobianasobre as bactérias isoladas.

Palavras-chave: canina, otite, flora bacteriana

Summary: The objective of the present work was the bacteriological study of otitis in dogs, with the assessment ofbacteria frequency and sensitivity to antibiotics, as well as thecharacterization of the ill animals in relation to sex, breed andage. Dogs with clinical signals of otitis (n=231) were analyzedand in 89.2% bacteria were isolated; with Staphylococcus epidermidis in 31.5% and Staphylococcus aureus in 20.7%.Dogs in the age class of 1 to 3 years old had higher prevalenceof bacterial isolation. The SRD and German Shepherd breedswere the most affected and there were no differences betweensex. Kanamycin (93.9%), Chloramphenicol and Gentamicin(85.2%) and Amikacin (81.9%) were the antibiotics with betterantimicrobial activity on the isolated bacteria.

Keywords: canine, otitis, bacterial flora

Introdução

A otite canina, um dos principais motivos de consultas desta espécie a médicos veterinários, causaefeitos de grande desconforto ao paciente e ao proprietário, tais como vocalização, nervosismo, agitação, dor, prurido, secreção e odor, sendo impres-cindível à busca por uma cura rápida (Tuleski, 2007).Resulta de qualquer inflamação do conduto auditivocom numerosos agentes etiológicos envolvidos efatores predisponentes que se relacionam com ainfecção (Greene, 1993), sendo uma síndrome que freqüentemente reflete uma doença dermatológicasistêmica (Jacobson, 2002).

São causadas por fatores primários, predisponentese perpetuantes (August, 1993; Logas, 1994). Os fatoresprimários compreendem: hipersensibilidade alterada(Curtis, 2004), presença de parasitas, presença de corpos estranhos, desordens de ceratinização, imuno-patias (Oliveira, 2004), tumores e pólipos auriculares(Little e Lane, 1989), celulite juvenil (Carlotti, 2003).Os fatores predisponentes incluem: conformação dasorelhas, morfologia do conduto auditivo, maceraçãodo epitélio, limpeza excessiva das orelhas (Griffin,1996), doenças sistêmicas, alterações climáticas(Harvey et al., 2004), adenites anais e febre (Oliveira,2004). Já os fatores perpetuantes são: infecção bacte-riana e/ou fúngica no conduto auditivo, cicatrizaçõescrônicas ou infecção subclínica (Leite, 2000).

É considerada a doença de orelha mais comum emcães e gatos. Estima-se que em torno de 5 a 20% doscães apresentam otite (August, 1988) e que sua preva-lência seja ainda maior em regiões que apresentamclima tropical como o da cidade de Uberlândia, MinasGerais, Brasil, provavelmente próxima a 30 ou 40%(Logas, 1994). Além disso, autores discutem que suaincidência pode variar de acordo com raça, idade esexo dos cães.

O diagnóstico deve ser realizado mediante umexame sistemático e completo de todo animal, o qualdeve sempre incluir anamnese, exame físico, otoscopiae citologia da secreção auricular, realizando-se sempreque possível cultura microbiana e antibiograma

*Correspondência: [email protected]: + 55 (34) 3237-6174

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(Matousek, 2004). Desta forma, poder-se-á recomen-dar para o tratamento de otites bacterianas infecciosasos produtos comerciais otológicos adequados, queapresentem maior eficácia. O uso à revelia desses produtos, sem a realização prévia de cultura micro-biana e do devido antibiograma, aumenta o risco domicrorganismo envolvido na infecção mostrar-seresistente ao antimicrobiano contido no mesmo epoderá ainda induzir o desenvolvimento da cronici-dade infecciosa, aumentando ainda a possibilidade deresistência bacteriana devido às subdosagens (Tuleski,2007).

Assim sendo, o objetivo deste trabalho foi identi-ficar a microbiota bacteriana presente nas otites infec-ciosas caninas, bem como avaliar a susceptibilidadedestes agentes infeciosos a diferentes antimicro-bianos. Possibilitou, ainda, verificar a distribuição decasos de otites por meio da obtenção de dados epide-miológicos sobre essa afecção, tais como raça, sexo efaixa etária predominante.

Material e métodos

Durante o período de Agosto de 1986 a Dezembrode 2002 foram enviadas 231 amostras de otite para oLaboratório de Doenças Bacterianas da UniversidadeFederal de Uberlândia (UFU), provenientes de cães(94 fêmeas e 137 machos) atendidos no HospitalVeterinário da UFU, localizado na cidade deUberlândia, Minas Gerais, Brasil.

Base física da investigação clínico-laboratorial

A investigação clínico-laboratorial teve como baseos cultivos microbianos obtidos e os testes de sensi-bilidade realizados a partir de amostras da secreçãoauricular de cães com sinais clínicos de otite, sendo osprocedimentos microbiológicos realizados de formapadronizada.

Critérios técnicos para inclusão das amostras

Os critérios para inclusão da amostra otológica nainvestigação clínico-laboratorial foram: amostras desecreção otológica de paciente canino, acompanhadasde dados referentes à idade, sexo e raça do cão,encaminhadas para cultura bacteriana, provenientesdo Hospital Veterinário da UFU.

Foram desconsiderados fatores como: cronicidadeda doença, medicações prévias ou em andamento,doenças dermatológicas ou sistêmicas concomitantes,otite média, bem como número de amostras por animal.

Colheita das amostras

As amostras de secreção auricular foram colhidascom auxílio de zaragatoa estéril após a limpeza dopavilhão auricular com solução fisiológica de NaCl a

0,9%, o qual foi enviado ao laboratório logo após acolheita, ou imerso em meio de transporte de Stuart,mantido em temperatura ambiente ou refrigeração, eenviado ao laboratório em até 24 horas a partir domomento da colheita.

As colheitas realizadas pelos clínicos veterináriosdo Hospital Veterinário da UFU foram procedidas no ambulatório, sem sedação, introduzindo-se umzaragatoa estéril dentro do canal auditivo vertical, como cuidado de não contaminá-lo por meio do contatocom o pavilhão externo.

Citologia e cultura bacteriana

As amostras, recolhidas por meio de zaragatoasestéreis, após a limpeza do pavilhão auricular comsolução fisiológica de NaCl a 0,9%, eram semeadasem caldo simples, e 24 horas após eram cultivadas emmeios de cultura para bactérias aeróbias. Após isso, asbactérias, representadas na Tabela 4, foram classifi-cadas de acordo com Osbaldiston (1975) cuja técnicabaseia-se, de maneira geral, no conhecimento: dacapacidade da bactéria em crescer em ágar sangue eem ágar de MacConkey; da coloração das colônias emágar de MacConkey; da utilização da glicose e produção de H2S em ágar TSI; da reação de catalase;da coloração de Gram; do lugar de isolamento e animal hospedeiro.

Para cada bactéria isolada, foram feitas provas desensibilidade aos antibióticos, segundo a técnica preconizada pela Organização Mundial da Saúde(OMS) (1961) durante o período de coleta dos dados(para justificar o não uso da técnica atualmente preconizada pela OMS), estando expostas na Tabela 6.

Teste de sensibilidade bacteriana

Para realização dos testes de sensibilidade in vitro,utilizou-se o método de difusão em disco único (Bauer et al., 1966), testando-se sete antimicrobianos:ampicilina; amicacina; gentamicina; tetraciclina; cloranfenicol; sulfazotrin e kanamicina.

Epidemiologia da otite em cães

Os dados epidemiológicos observados nesta investigação referentes a sexo, faixa etária e raça docão foram avaliados conforme:

1) Sexo: verificou-se a proporção de casos de otiteem cães machos ou fêmeas, submetendo-se esses valores à análise estatística.

2) Faixa etária: os animais foram classificados emquatro faixas etárias:

- grupo ‘A’: até um ano de idade;- grupo ‘B’: acima de um ano até três anos;- grupo ‘C’: acima de três até sete anos;- grupo ‘D’: acima de sete anos.3) Raça: os animais foram classificados com relação à

raça, submetendo os valores obtidos à análise estatística.

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Análise estatística

Para determinar a relação entre otites bacterianas e sexo, raça e idade dos animais aplicou-se a prova do Qui-Quadrado (Spiegel, 1993) com nível de significância de 0,05.

Resultados e discussão

Do total de 231 amostras submetidas à cultura bacteriana, 206 (89,17%) apresentaram crescimentobacteriano, enquanto que 25 (10,83%) resultaram emcultivos bacterianos negativos corroborando com osachados de Fachini (1981); Magalhães et al. (1985);Zanabria e Ruiz (1988). Entretanto, Ribeiro et al.(2000) ressaltam que a demonstração da presença de bactérias no conduto auditivo não significa necessariamente que estes microrganismos sejampatógenos primários totalmente responsáveis pelodesenvolvimento da otite. Quanto ao sexo, não houvediferença estatisticamente significativa entre machos efêmeas (p=0,00) (Tabela 1).

Em relação às raças, a maioria dos casos de otite foiem cães SRD (Sem Raça Definida) e Pastor Alemão,com 40,69% e 34,63% do total (Tabela 2), respectiva-mente, concordando com as colocações expostas por Magalhães et al. (1985) que observaram uma predominância de otite bacteriana nos SRD e PastorAlemão, justificando estes dados como decorrente do menor número de exemplares das raças Cocker

Spaniel e Poodle (terceira e quarta maiores ocorrên-cias) no nosso meio, onde a preferência recai sobre oscães de guarda. Já quanto a faixa etária, encontrou-seque, 40,26% dos casos ocorreram entre 1 e 3 anos deidade; 27,7% entre 3 e 7 anos; 17,5% em cães acimade 7 anos e 14,29% em filhotes menores de 1 ano(Tabela 2), diferindo dos resultados expostos porMacy (1992), que cita que a otite externa é observadamais freqüentemente em cães entre 5 e 8 anos deidade.

As bactérias mais recorrentes no isolamento bacteriano foram Staphylococcus epidermidis eStaphilococcus aureus com 31,47% e 20,71% da ocorrência total, seguidos pela Enterobacter spp eEscherichia coli, com 12,35% e 10,35, respectiva-mente (Tabela 3). Estes dados são ratificados em partepor Fachini (1981), Cerri et al. (1983), Woody e Fox(1986) e Muller e Heusinger (1994).

Tabela 2 – Distribuição de casos de otite clínica, de acordo com raça e idade, em 231 cães com otite atendidos no Hospital Veterinárioda Universidade Federal de Uberlândia – Minas Gerais, Brasil, de Agosto de 1986 a Dezembro de 2002

Raça Número de animais com otite clínica / idade (anos)

< 1 % 1 a 3 % 3 a 7 % > 7 % TOTAL %

SRD* 15 6,5 39 16,89 24 10,39 16 6,93 94 40,69

Pastor alemão 11 4,76 32 13,85 25 10,82 12 5,2 80 34,63

Poodle 02 0,87 02 0,87 04 1,73 03 1,3 11 4,76

Cocker spaniel 01 0,43 02 0,87 01 0,43 05 2,17 09 3,90

Doberman 02 0,87 04 1,73 01 0,43 -- -- 07 3,03

Dálmata -- -- 04 1,73 02 0,87 -- -- 06 2,60

Fila -- -- 03 1,3 03 1,3 -- -- 06 2,60

Teckel 01 0,43 01 0,43 01 0,43 -- -- 03 1,30

Pequinês -- -- -- -- 02 0,87 01 0,43 03 1,30

Pastor belga -- -- 01 0,43 -- -- 01 0,43 02 0,87

Rotweiller -- -- 02 0,87 -- -- -- -- 02 0,87

Pinsher 01 0,43 -- -- -- -- 01 0,43 02 0,87

Setter inglês -- -- -- -- 01 0,43 -- -- 01 0,43

Fox terrier -- -- -- -- -- -- 01 0,43 01 0,43

Husky siberiano -- -- 01 0,43 -- -- -- -- 01 0,43

Boxer -- -- 01 0,43 -- -- -- -- 01 0,43

Weimaraner -- -- -- -- -- -- 01 0,43 01 0,43

Yorkshire -- -- 01 0,43 -- -- -- -- 01 0,43

Total 33 14,29 93 40,26 64 27,7 41 17,75 231 100%

Tabela 1 – Distribuição de casos de otite clínica, de acordo como sexo, em 231 cães com otite atendidos no Hospital Veterinárioda Universidade Federal de Uberlândia, Uberlândia – MinasGerais, Brasil, de Agosto de 1986 a Dezembro de 2002

Sexo Isolamento Bacteriano

Positivo % Negativo % Total

Fêmeas 84 89,36% 10 10,64% 94

Machos 122 89,05% 15 10,95% 137

Total 206 89,17% 25 10,83% 231

p=0,00 < 0,05 - não significativo

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Tabela 3 – Freqüência de bactérias isoladas em caso de otiteclínica, em cães atendidos no Hospital Veterinário daUniversidade Federal de Uberlândia, Uberlândia – MG. Agostode 1986 a Dezembro de 2002

Bactérias Número %

Staphylococcus epidermidis 79 31,47

Staphylococcus aureus 52 20,71

Enterobacter spp 31 12,35

Escherichia coli 26 10,35

Proteus spp 18 7,17

Citrobacter diversus 15 5,97

Bacillus spp 10 3,98

Aeromonas spp 06 2,40

Micrococcus spp 04 1,60

Streptococcus viridans 03 1,20

Alcaligenes spp 02 0,80

Streptococcus faecalis 01 0,40

Acinectobacter spp 01 0,40

Streptococcus B hemolítico 01 0,40

Corynebacterium pyogenes 01 0,40

Arizona spp 01 0,40

Total 251 100

Por meio dos testes de sensibilidade aos antibióticos,verificou-se que as bactérias mais freqüentemente iso-ladas foram mais sensíveis a Kanamicina (93,93%),Cloranfenicol e a Gentamicina (85,21%), e aAmicacina (81,88%) (Tabela 4), diferindo em partedos resultados observados por Magalhães et al.(1985), nos quais os microorganismos mais isoladosforam mais sensíveis a Gentamicina, Amicacina eNitrofurano.

Tabela 4 – Eficiência dos antibióticos aos agentes microbianosmais comumente isolados de cães com otite clínica atendidos noHospital Veterinário da Universidade Federal de Uberlândia,Uberlândia – MG. Agosto de 1986 a Dezembro de 2002

Antibióticos S. epidermidis S. aureus Total

SEN % SEN % SEN %

Kanamicina 12/14 85,71 15/15 100 31/33 93,93

Cloranfenicol 61/69 88,40 43/50 86 121/142 85,21

Gentamicina 57/69 82,60 49/51 96,07 121/142 85,21

Amicacina 55/69 79,71 38/45 84,44 113/138 81,88

Sulfazotrim 38/51 74,50 24/35 68,57 78/111 70,27

Tetraciclina 48/66 72,72 34/46 73,91 91/132 68,93

Ampicilina 25/62 40,32 17/48 35,41 54/129 41,86

A ausência de um acompanhamento laboratorial notratamento das otites pode levar a um desenvolvimentode resistência aos agentes causadores, e conseqüente-mente ocasionar uma terapêutica insuficiente, causandomuitas vezes uma recidiva ou até a cronicidade doprocesso. No entanto, em muitas situações nas quaisestes estudos laboratoriais não sejam possíveis, sugere-se o uso dos medicamentos que mais freqüen-temente têm demonstrado eficiência geral.

Conclusão

Em 89,17% foram isoladas bactérias com prevalênciade Staphylococcus epidermidis (31,47%) e Staphylo-coccus aureus (20,71%), na faixa etária de 1 a 3 anosem animais sem raça definida e em cães da raça PastorAlemão, não havendo diferença entre os sexos.

Kanamicina (93,93%), Cloranfenicol (85,21%) eGentamicina (85,21%) e Amicacina (81,88%) foramos antibióticos que promoveram uma atividade antimi-crobiana sobre as bactérias isoladas.

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Mieloencefalite protozoária eqüina em equinos nativos do município deBagé-RS, sul do Brasil

Equine protozoal myeloencephalitis in horses from Bagé, southern Brazil

Luciana A. Lins1*, Friedrich Frey Junior1,Maria Elisabeth Aires Berne2, Carlos E. W. Nogueira1

1Departamento de Clínicas Veterinária/FV-UFPel2Departamento de Parasitologia Animal/FV-UFPel

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CIÊNCIAS VETERINÁRIASDE

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Resumo: A Mieloencefalite Protozoária Eqüina (MEP) é umadoença neurológica infecciosa causada pelo protozoárioSarcocystis neurona. O objetivo deste estudo foi avaliar a presença de anticorpos anti-S. neurona no soro e líquidocefalorraquidiano de cavalos Puro Sangue Inglês nativos domunicípio de Bagé-RS no sul do Brasil. Foram avaliados 970eqüinos, dos quais 27 (2,8%) apresentavam histórico de incoordenação motora. Estes foram acompanhados clínica esorologicamente para a presença de MEP. Na avaliação clínicadestes animais, 10 (37%) apresentaram alteração clínica neurológica durante o exame e presença de anticorpos anti-S.neurona no soro e líquido cefalorraquidiano. Outros 8 (29,6%)animais também demonstraram soropositividade para o agente,mas não apresentaram alterações clínicas compatíveis com adoença. Sete (26%) dos animais soropositivos eram nascidos e criados em Bagé-RS no sul do Brasil, o que indica que ocorre infecção por S. neurona em animais desta região, sendonecessário conhecer e eliminar os fatores de risco envolvidos natransmissão deste protozoário.

Palavras-chave: Mieloencefalite Protozoária Equina, Sarco-cystis neurona, Western blot

Summary: Equine Protozoal Myeloencephalitis (EPM) is aninfectious neurologic disease caused by Sarcocystis neuronaprotozoan. This paper evaluates the presence of anti-S. neuronaantibodies in the serum and cerebrospinal fluid fromThoroughbred horses raised in the Bagé city, in southern Brazil;970 horses were evaluated, of which 27 (2,8%) presented history of lack of coordination. Those signs led to clinical andserological examination of the horses in order to collect evidence of EPM. At the clinical evaluation, 10 (37%) presented neurological alteration and the presence of anti-S.neurona antibodies in the serum and cerebrospinal fluid. Eight(29,6%) animals also presented serum reaction, without showing clinical evidence of the disease. Seven (26%) of thesehorses were born and raised in Bagé city in the southern Brazil,showing that the S. neurona infection occurs in this region, indicating the need to know and eliminate the risk factorsinvolved in the transmission of this protozoan.

Keywords: Equine Protozoal Myeloencephalitis, Sarcocystisneurona, Western blot

Introdução

A Mieloencefalite Protozoária Eqüina (MEP) é umadoença neurológica infecciosa muitas vezes fatal(Mayhew, 1999), causada pelo protozoário Sarcocystisneurona (Blythe et al., 1997; MaCkay et al., 2000). O hospedeiro definitivo do parasito é o gambá, que infesta-se ao ingerir sarcocistos presentes na mus-culatura do hospedeiro intermediário, provavelmenteaves. Após a ingestão dos sarcocistos contendo bradizoítos, estes alcançam o intestino delgado, onderealizam a reprodução sexuada, dando origem aooocisto. Este rompe a célula e é eliminado no ambiente já esporulado (esporocisto) juntamente comas fezes do hospedeiro. O cavalo infecta-se pelaingestão do esporocisto com alimentos ou água. Apósingestão ocorre liberação de esporozoítos no intestinodelgado e inicia-se a reprodução assexuada noendotélio vascular (Mackay et al., 2000). A apresen-tação clínica pode ser de forma aguda ou crônica,dependendo do estágio da enfermidade (Dubey et al.,1996), envolvendo principalmente alterações naandadura do animal, sendo a incoordenação motora,fraqueza e atrofia muscular os sinais típicos da MEP(Mayhew, 1999).

O diagnóstico da MEP não deve ser baseado apenasnos sinais clínicos porque estes são comuns a diversasdoenças do sistema nervoso. O diagnóstico pode serfeito através do teste de Western Blot, utilizando osoro ou o fluido cerebroespinhal do animal. O resul-tado positivo do teste no soro sangüíneo indica aexposição do animal ao parasita, enquanto que o resultado positivo no fluido cerebroespinhal indicaque o parasita penetrou na barreira hematoencefálicaestimulando uma resposta imune local. A presença de anticorpos específicos no líquido cefalorraquidiano

*Correspondência: [email protected] Quinze de Novembro, n° 1550-Centro, Pelotas-RS, BrasilCEP 96015-000Tel: +55 (53) 92416001

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é mais sugestiva de infecção, porém pode ocorrerresultado falso-positivo se no momento da coleta houver contaminação da amostra com sangue (Furr,2006). Também é utilizado um teste de PCR para detecção do DNA de S. neurona no líquidocefalorraquidiano, porém este teste apresenta menorsensibilidade, provavelmente porque merozoítos intactos raramente circulam no líquor e o DNA livredo parasito é rapidamente destruído por ação enzi-mática (Dubey et al., 2001).

A maior incidência de MEP ocorre nas Américas,em países como Estados Unidos, Canadá, Brasil eArgentina. Casos de MEP também foram diagnostica-dos em países da Europa, África do Sul e Ásia, porémem animais importados de países do hemisfério oeste(Mayhew e Greiner, 1986; Ronen, 1992; Lam et al.,1999). A distribuição da MEP ocorre de acordo com adistribuição do gambá, principal hospedeiro definitivode S. neurona (Dubey, 2000). Em estudo conduzidoem diferentes regiões do Brasil, Hoane et al. (2006)encontraram 69,6% dos eqüinos reagentes. Estesresultados demonstram uma alta exposição dos cavalos no Brasil aos esporocistos de S. neurona,sendo aproximadamente o dobro da soroprevalênciaencontrada na América do Sul em um estudo prévio.Porém, estes dados não são conclusivos em afirmarque os animais soropositivos tiveram esta reação noBrasil, ou se vieram de outros países já infectados. Porisso, foi proposto o presente estudo com o objetivo dedetectar a presença de anticorpos anti-S. neurona nosoro e líquido cefalorraquidiano de eqüinos nascidos ecriados no município de Bagé-RS, avaliando a relaçãoda presença de anticorpos com o aparecimento desinais clínicos.

Material e métodos

Durante 12 meses, foram avaliados 970 eqüinos daraça Puro Sangue Inglês provenientes de três propriedades criatórias do município de Bagé -RS, nosul do Brasil. Os animais que apresentaram históricode incoordenação motora foram submetidos à ava-liação clínica e sorológica para caracterização da presença de infecção por S. neurona.

A avaliação clínica constou de histórico, anamnesee exame clínico geral e específico do sistema nervoso.O exame específico do sistema nervoso foi conduzidopara se detectar alguma alteração neurológica. Nesteexame foi realizada avaliação do comportamento,estado mental, postura, avaliação dos nervos crania-nos, andadura e propriocepção, além da inspeção geralpara evidenciar possível assimetria, conforme descritopor Mayhew (1989). Somente os animais que apresentaram alterações neurológicas foram avaliadospor sorologia.

Para a realização da sorologia para S. neurona,trimestralmente foi realizada coleta de sangue sem

anticoagulante dos animais que apresentaram altera-ções neurológicas. O soro sanguíneo foi separado eenviado ao Laboratório de referência nos EUA-Neogen®- para verificar a presença de anticorpos anti-S. neurona através de Western Blot.

A pesquisa de anticorpos anti-S. neurona no líquidocefalorraquidiano foi realizado nos animais quemostraram sinais clínicos compatíveis com alteraçãoneurológica e foram positivos para pesquisa de anti-corpos anti-S. neurona no soro, desta forma buscandoa confirmação do resultado obtido na sorologia.

Resultados

De 970 animais avaliados 27 (2,8%) apresentaramhistórico de incoordenação motora e foram acompa-nhados para a pesquisa de S. neurona. Deste total, 12eram potros com idades entre 3 e 16 meses, todosnascidos em Bagé e 15 éguas com idades entre 10 e 15anos, a maioria delas com histórico de viajem aosestados do Paraná, São Paulo e Rio de Janeiro. Na avaliação clínica dos 27 animais, 10 (37%) demonstraram sintomatologia clínica de alteraçõesneurológicas no momento do exame e destes, 9 (90%)demonstraram sorologia positiva para o agente noWestern Blot sérico, sendo 1 (1%) fraco positivo. Os10 animais que demonstraram sinais clínicos foramsubmetidos à avaliação do líquido cefalorraquidianopor Western Blot, sendo os 10 (100%) positivos paraS. neurona.

Dos 17 (63%) animais que não demonstraram sintomatologia neurológica durante o exame, 2(11,8%) foram positivos e 6 (35,3%) foram fraco-positivos no Western Blot sérico, como pode ser observado na Tabela 1.

Dentre os 27 equinos submetidos à avaliaçãosorológica, 18 (66,6%) apresentaram reação positivapara o agente, sendo que 7 (39%) deles eram potrosnascidos e criados em Bagé-RS.

Discussão

De acordo com Furr (2006), o Western Blot parapesquisa de anticorpos específicos para S. neuronaapresenta até 90% de sensibilidade e especificidade,porém, a presença de anticorpos no soro indica apenaso contato do animal com o agente, e não a presença dadoença clínica. A presença de anticorpos contra S.neurona no fluido cérebro-espinhal é mais sugestiva à infecção, porém não é definitivo (Furr, 2006). Neste estudo, os 10 animais que apresentaram sintomatologia clínica neurológica tiveram o líquoranalisado por Western Blot a fim de se obter um resul-tado comparativo com o soro. Todos os animaisdemonstraram presença de anticorpos anti-S. neuronano líquor.

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O diagnóstico da MEP é observado com maior freqüência em cavalos mais velhos, mostrando quecom o passar da idade o animal tem maior probabili-dade de entrar em contato com o agente causadordesta enfermidade (Blythe et al., 1997). Entre as 15éguas avaliadas, 11 (73,3%) apresentaram soro reativi-dade para S. neurona. Este percentual elevado refletea exposição aos fatores de risco que estes animais sofreram durante a vida, principalmente noscentros de treinamento. O estresse gerado pelos trans-portes e gestações pode propiciar o desenvolvimentoda doença, conforme foi descrito por Saville et al.(1999). Porém, estes dados não permitem afirmar queexistiu a soro reação para S. neurona em cavalos nosul do Brasil, já que grande parte destas éguas repro-dutoras mantidas nos centros de manejo nesta regiãodo país é oriunda de outros estados e países.

Entretanto, dos 12 potros avaliados, 3 (25%) apresentaram diagnóstico clínico, sorológico e dolicor positivo para MEP. Como estes animais nasceram e foram criados na região de Bagé, pode-se

afirmar que desenvolveram a infecção na região, jáque, diferente dos outros animais, estes nunca saíramdo local. Quatro (33,3%) animais também nascidos naregião, apesar de não apresentar sinais clínicos foramsoro reagentes, demonstrando que tiveram contatocom S. neurona, porém não contraíram a doença.Confirmando a observação de Furr (2006), quedescreve que embora seja freqüentemente a exposiçãoa esse protozoário, é baixa a porcentagem de animaisque desenvolvem a doença clínica.

Conclusão

Com base nestes dados é possível afirmar queocorre infecção por S. neurona em eqüinos criados nomunicípio de Bagé-RS no sul do Brasil, já que sete(39%) dos animais que foram soropositivos para esteprotozoário nasceram e foram criados nesta região.

Estes dados demonstram a importância de se conhe-cer a epidemiologia para trabalhar na eliminação dos

Tabela 1 - Sinais clínicos, presença de anticorpos anti-S. neurona soro e líquor por Western Blot em 27 eqüinos da região sul do RioGrande do Sul

Sinaisclínicos

01 Negativo Negativo Negativo Negativo NR

02 Fraco-Positivo Negativo Fraco-Positivo Fraco-Positivo NR

03 + Positivo Positivo Positivo Positivo Positivo

04 + Positivo Positivo Positivo Positivo Positivo

05 + Positivo Positivo Positivo Positivo Positivo

06 Negativo Negativo Negativo Negativo NR

07 + Positivo Positivo Positivo Positivo Positivo

08 Negativo Negativo Negativo Negativo NR

09 Fraco-Positivo Negativo Fraco-Positivo Fraco-Positivo NR

10 Fraco-Positivo Fraco-Positivo Fraco-Positivo Fraco-Positivo NR

11 Negativo Negativo Negativo Negativo NR

12 + Positivo Positivo Positivo Positivo Positivo

13 + Fraco-Positivo Fraco-Positivo Fraco-Positivo Fraco-Positivo Positivo

14 Fraco-Positivo Fraco-Positivo Fraco-Positivo Fraco-Positivo NR

15 + Positivo Positivo Positivo Positivo Positivo

Sinaisclínicos

01 + Positivo Positivo Positivo Positivo Positivo

02 Fraco-Positivo Fraco-Positivo Fraco-Positivo Fraco-Positivo NR

03 Negativo Negativo Negativo Negativo NR

04 Negativo Negativo Negativo Negativo NR

05 Positivo Positivo Positivo Positivo NR

06 Positivo Positivo Positivo Positivo NR

07 Negativo Negativo Negativo Negativo NR

08 Negativo Negativo Negativo Negativo NR

09 Fraco-Positivo Fraco-Positivo Negativo Fraco-Positivo NR

10 Negativo Negativo Negativo Negativo NR

11 + Positivo Positivo Positivo Positivo Positivo

12 + Positivo Positivo Positivo Positivo Positivo

NR – Não Realizado*As 4 colunas identificadas como "soro" correspondem a colheitas seriadas com intervalos de 3 meses

Égua Soro* Soro* Soro* Soro* Líquor

Potro Soro* Soro* Soro* Soro* Líquor

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fatores de risco envolvidos na infecção, evitando oacesso de hospedeiros transmissores às instalaçõesutilizadas pelos eqüinos.

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Effects of two phytotherapics formulations containing Glycine max (L.)Merr on general reproductive performance in Wistar rats

Efeitos de duas preparações fitoterápicas contendo Glycine max (L.) Merrsobre o desempenho reprodutivo de ratos Wistar

Clarissa Boemler Hollenbach1*, Carlos Eduardo Bortolini1,Juliana Machado Batista da Silva1, Emanuel Boemler Hollenbach1, Lucas Hirtz1,

Fernanda Bastos de Mello2, João Roberto Braga de Mello1

1Departamento de Farmacologia, Instituto de Ciências Básicas da Saúde (ICBS). Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Av. Sarmento Leite n° 500, sala 204, 90046-900, Porto Alegre, RS, Brazil

2Universidade Estadual do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, RS, Brazil

R E V I S T A P O R T U G U E S A

CIÊNCIAS VETERINÁRIASDE

RPCV (2008) 103 (567-568) 181-187

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Abstract: The soybean Glycine max (L.) Merr contentsisoflavones, which are powerful phytoestrogens that can influence many biochemical and physiological processes andthat occur naturally in plants. This paper reports the effects oftwo phytotherapics formulations containing Glycine max (L.)Merr on general reproductive performance in female rats. Thefemales were treated before and during mating, pregnancy andlactation using tree different doses. Half of the pregnant femaleswere submitted to a cesarean section on the 21st day of pregnancy while the remaining females were allowed to givebirth. The data showed that the phytotherapics formulationscaused change in the growth in pre-mating increased the number of resorptions and interfered in reproductive rates asmeasured according to the doses tested.

Keywords: Glycine max, phytoestrogens, reproduction, fertili-ty, rats

Resumo: A soja Glycine max (L.) Merr contém isoflavonas,compostos naturais das plantas, poderosos fitoestrógenos quepodem influenciar muitos processos bioquímicos e fisiológicos.Neste trabalho são testados os efeitos de duas formulaçõesfitoterápicas contendo Glycine max (L.) Merr sobre o desempenho reprodutivo de fêmeas de ratos Wistar. As fêmeasforam tratadas antes e durante o acasalamento, gestação e lactação utilizando três diferentes doses das formulações.Metade das fêmeas gestantes foi submetida a uma cesariana no21º dia de gestação e o restante das fêmeas pariu a termo. Osdados mostraram que as formulações fitoterápicas alteraram ocrescimento pré-acasalamento, aumentaram no número de reabsorções e modificaram as taxas reprodutivas mensuradas deacordo com as dosagens testadas.

Palavras-chave: Glycine max, fitoestrógenos, reprodução, fertilidade, ratos

Introduction

Isoflavones are phenolic compounds and chemicalswidely distributed in the plant kingdom. The concen-trations of these compounds are relatively larger inlegumes and, in particular, in the soybean Glycine max (L.) Merr, with various biological properties(antioxidant activity, inhibition of enzyme activity andothers) that can influence many biochemical and physiological processes. The chemical structure ofisoflavones is similar to that of estrogen, such as 17 ß-estradiol (Setchell, 1998).

Estrogens are responsible for feminine characteristics,reproductive control pregnancy and also influence theskin, bones, the cardiovascular system and immunity(Tapiero et al., 2002). The properties of estrogen andanti-estrogen of phytoestrogens depends on its concentration, on the concentration of endogenous sexsteroids as well as the specific target organ involved inthe interaction with the estrogens receptors(Nachtigall, 2001).

Regarding the usage in peri-menopause, multicenterstudies have produced contradictory results. In a studywith 145 postmenopausal women receiving a diet rich in phytoestrogens for 12 weeks Brzezinski and Schenker (1997) concluded that menopausesymptoms were decreased by 50%, while hot flushes and vaginal dryness fell by 54% and 60%, respectively. Albertazzi et al. (1998), and Upmalis et al. (2000), carrying out multicenter, double-blind,randomized, placebo-account studies concluded thatphytoestrogens decreased vasomotor symptoms andthe incidence and severity of heat waves. Secreto et al.(2004), conducting a multicenter, double-blind, randomized study concluded, in turn that isoflavonesand melatonin have not shown any advantage as

*Correspondence: [email protected] Boemler Hollenbach – Rua da República, nº 604/6,Cidade Baixa, Porto Alegre, RS, BrazilTel: + 55 (51) 32091249

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compared to the placebo in relieving menopausesymptoms.

The best documented effects of isoflavones arerelated to activity on reproduction. In that regard, soybean and its isoflavones are classified asendocrinal disrupters.

Adverse effects of soy-containing foods and soycomponents on reproductive processes of animalshave been reported. Histopathological changes inovarian and uterine administration of genistein andreduced fertility of exposed females are reported inrats (Nagao et al., 2001), while Chan (2009) foundthat 1–10 M genistein has injury effects on mouseoocyte maturation, fertilization, and subsequentembryonic development.

A systematic review conducted by Huntley and Ernst(2004), regarding the use of soy in the treatment ofmenopause symptoms showed that of 13 multicenterstudies, ten were included within acceptable criteria.Of the ten, four studies suggested that the preparationsof soybeans were beneficial in the treatment of peri-menopausal symptoms, six showed negative results.Based on the survey of these studies, Huntley andErnst (2004) concluded that there is some evidence ofefficacy of preparations of soybeans for the treatment of symptoms of menopause, but because of the heterogeneity of results it is difficult to establish adefinitive postulation.

Reproductive toxicity tests are conducted to determine the direct effects of a chemical on theprocess of reproduction of mammals. The aim of thisstudy was to evaluate the reproductive toxicity of soyon the fertility and reproductive performance ofWistar rats as recommended by guidelines defined bythe Food and Drug Administration (FDA), and theOrganization for Economic Cooperation andDevelopment (OECD).

Material and methods

Phytotherapic formulations

The phytotherapic formulations used in the experiments were acquired in local drug stores. Theformulations contained the batch number, date ofmanufacture and were within the sell-by date.Corporate names: Phytotherapic I: Ache LaboratóriosFarmacêuticos S/A and Phytotherapic II: HerbariumLaboratório Botânico Ltda. The declared compositionin the package leaflet of Phytotherapic I: dry Glycineextract max (L.) Merr. 40% = 150 mg and ofPhytoterapic II: extract max Glycine (L.) Merr 40% =75 mg. The phytotherapic formulations were obtainedthrough the dilution of the contents of the capsules ofthe medicine, using distilled water as a vehicle. Thedoses were prepared according to the manufacturers’recommendations.

Experimental animals

The 24 males and 72 females of albino Wistar ratsused in the present study were kept under constantconditions: on a daily light cycle of 12 h light/12 hdark, room temperature 21 ºC ± 1 ºC, and 50% ± 5%relative humidity. The animals received a standard pelleted diet (Nuvilab CR1®, Paraná, Brazil) and tapwater ad libitum during all the experiment. All ratswere adapted to the conditions of our animal quartersfor 3 weeks before starting the experiment. Breeding,housing and experimental procedures followed theguidelines published in the NIH Guide for Care andUse of Laboratory Animals and obeyed currentBrazilian laws and were in accordance with currentBrazilian regulations including approval by the EthicsCommittee in search of Universidade Federal do RioGrande do Sul.

Mating procedure

Males were housed individually per cage with woodshavings as bedding. Three virgin females were placedinto a cage of one male for 2 h each day (7:00–9:00o’clock) and vaginal smears were evaluated for sperm.The first 24-h period following the mating procedurewas called day 0 of pregnancy if sperm was detectedin the smear. The mating procedure was repeated fromMonday to Friday for 3 weeks.

Treatment

The animals were divided in six experimental groups,one control group (CG), which received vehicle (n=32)and six groups (GPI1, n=32; GPI2, n=28; GPI3, n=24;GPII1, n=32; GPII2, n=20; and GPII3, n=12) that weretreated with three concentrations of the two Phytothe-rapic were administered as the therapeutic dose, a solution equivalent to five times the therapeutic doseand a solution equivalent to 10 times the therapeuticdose (4.3 mg/kg, 21.5 mg/kg and 43 mg/kg, respective-ly). All experimental groups were treated by gavageevery day. The females were treated before mating (14days) and during mating (21 days), pregnancy (21days), and lactation periods (21 days). The males weretreated for 91 days before mating (70 days) and duringmating (21 days).

Evaluation of the animals

All males and females were evaluated for weightdevelopment and signs of toxicity. Pregnant femaleswere observed for weight gain, signs of dystocia, post-implantation loss and prolonged duration ofpregnancy. Litter size, litter weight, sex ratio wererecorded.

Cesarean section

On day 21 of pregnancy half of the females wereanaesthetized with tiletamin/ zolazepan 50% and

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euthanized by decapitation. The gravid uterus wasweighed with contents. Resorptions as well as livingand dead fetuses were counted. The number ofimplantation sites was determined. All the livingfetuses were immediately weighed, numbered withmarker pen, examined for externally visible malfor-mations and fixed in a 5% formalin solution.

Lactation

The other pregnancy females were allowed to givebirth to their offspring. At weaning (postnatal day 21)all dams were anaesthetized and euthanized by decapitation and underwent postmortem examination.All major organs were macroscopically inspected andweighed (liver, heart, spleen, kidneys, ovaries anduterus). The organs were fixed in a 10% neutralbuffered formalin solution for routine processing andlight-microscopic evaluation.

Index analyzed

- Mating index: number of sperm positive females/number of mated females X 100;

- Pregnancy index: number of pregnant females/number of sperm positive females X 100;

- Delivery index: number of females delivering/number of pregnant females X 100;

- Birth live index: number of live offspring/numberof offspring delivered X 100;

- Viability index: number of live offspring at lactation day 4/number of live offspring delivered

X 100;- Weanling index: number of live offspring at day

21/number of live offspring born X 100;- Post-implantation loss index: number of implanta-

tion sites-number of live fetuses/number of implanta-tion sites X 100.

Statistical analysis

Data were analyzed by one-way analysis of variance. The Bonferroni test was used to test differences between groups. Proportions were analyzed by the Chi-square test. Statistical evaluationwas performed using the SPSS and EXCEL programs,and a difference was considered statistically signifi-cant at P < 0.05.

Results

Body weight changes and toxicity in female rats

The female rats treated orally with Phytotherapic Iand Phytotherapic II in three doses during prior to mating, at mating, pregnancy and lactation, as 21.5 mg/kg and 43 mg/kg suffered changes in thegrowth in prior the mating period. No statistically significant differences among control group andPhytotherapic I and Phytotherapic II treated groupswere found with regard to maternal and offspringweight changes during the pregnancy and lactationperiod (Table 1). There were no differences in both

Table 1 - Weight development (g) of female rats orally treated with Phytotherapic I (A) and Phytotherapic II (B), with three doses4.3, 21.5 and 43 mg/kg, respectively, GPI1 (n= 32), GPI2 (n= 28), GPI3 (n= 24), GPII1 (n= 32), GPII2 (n= 20) and GPII3 (n= 12),during pregnancy and lactation period (p= pregnancy, L= lactation)

Days of pregnancy and

lactation period (A)

1p 213.9 ± 3.4 223.2 ± 4.5 234.1 ± 6.1 233.8 ± 6.3

7p 227.3 ± 4.1 235.8 ± 5.2 248,0 ± 5.9 244.8 ± 6.4

14p 245.3 ± 4.3 254.6 ± 5.6 243.4 ± 5.7 269.3 ± 6.1

21p 291.7 ± 4.8 299.3 ± 5.6 254.7 ± 6.3 282.3 ± 5.7

1L 229.3 ± 5.3 226.1 ± 5.1 - 245.4 ± 6.3

7L 241.9 ± 4.7 236.9 ± 5.2 - 257.1 ± 6.5

14L 248.8 ± 4.3 256.1 ± 5.9 - 268.4 ± 6.3

21L 243.1 ± 4.9 253.3 ± 5.3 - 267.4 ± 6.1

Days of pregnancy and

lactation period (B)

1P 213.9 ± 3.4 223.2 ± 4.5 224.4 ± 5.1

7P 227.3 ± 4.1 235.8 ± 5.2 237.4 ± 5.9

14P 245.3 ± 4.3 254.6 ± 5.6 244.4 ± 6.3

21P 291.7 ± 4.8 299.3 ± 5.6 259.1 ± 5.8

1L 229.3 ± 5.3 226.1 ± 5.1 227.6 ± 6.1

7L 241.9 ± 4.7 236.9 ± 5.2 235.5 ± 5.9

14L 248.8 ± 4.3 256.1 ± 5.9 245.3 ± 6.8

21L 243.1 ± 4.9 253.3 ± 5.3 244.2 ± 6.2

Values are given as means ± SE. Data were analyzed by ANOVA. Days of pregnancy and days of lactation are indicated by subscripts P and Lrespectively. No significant difference among groups was observed.

Control GPI1 GPI2 GPI3

Control GPII1 GPII2

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absolute and relative organs weight among the groups(Table 2).

Outcome of fertility tests

Statistically significant differences were observed in the mating index (the proportion of females impregnated by male rats) only when Phytotherapic Iwas administered at the highest dose (43 mg/kg) ascompared to the control group. Statistically signifi-cant differences were observed in the pregnancy index(the proportion of pregnant females and females withsperm positive) only when Phytotherapic II was used

at the highest dose as compared to the control group(Table 3). There was statistical difference amongPhytotherapic I and II as compared to the controlgroup in the post-implantation loss index. The otherindexes are shown in Tables 4 and 5. The index ofdelivery was statistically different from the controlgroup using both phytotherapics as the 21.5 mg/kgdose. The indexes of weaning and viability were different only when Phytotherapic I was used as 21.5 mg/kg and 43 mg/kg doses, when compared tothe control group. Concerning the index of viability,Phytotherapic I differed from control group in the 21.5 mg/kg dose. Regarding birth rates, only the

Table 2 - Relative organ weight (%) from dams treated before the mating, at mating, pregnancy and lactation periods, withPhytotherapic I (A) and Phytotherapic II (B)

Relative organ weight (%) Control GPI1 GPI2 GPI3

(A) (n = 7) (n = 5) (n = 2) (n = 1)

Heart 0.73 ± 0.02 0.79 ± 0.03 0.77 ± 0.04 0.80 ± 0.02

Spleen 0.47 ± 0.01 0.54 ± 0.02 0.52 ± 0.02 0.61 ± 0.02

Liver 10.3 ± 0.33 10.3 ± 0.47 9.7 ± 0.36 8.9 ± 0.14

Right kidney 0.84 ± 0.01 0.89 ± 0.01 0.76 ± 0.02 0.89 ± 0.02

Left kidney 0.80 ± 0.03 0.83 ± 0.02 0.74 ± 0.03 0.43 ± 0.03

Right ovary 0.06 ± 0.01 0.07 ± 0.02 0.05 ± 0.01 0.07 ± 0.01

Left ovary 0.07 ± 0.02 0.06 ± 0.01 0.04 ± 0.01 0.07 ± 0.01

Uterus 0.37 ± 0.11 0.48 ± 0.04 0.42 ± 0.03 0.41 ± 0.05

Relative organ weight (%) Control GPII1 GPI2

(B) (n = 7) (n = 5) (n = 2)

Heart 0.73 ± 0.02 0.74 ± 0.02 0.73 ± 0.03

Spleen 0.47 ± 0.01 0.44 ± 0.02 0.42 ± 0.02

Liver 10.3 ± 0.33 10.0 ± 0.54 9.82 ± 0.25

Right kidney 0.84 ± 0.01 0.85 ± 0.01 0.80 ± 0.02

Left kidney 0.80 ± 0.03 0.81 ± 0.02 0.79 ± 0.03

Right ovary 0.06 ± 0.01 0.04 ± 0.02 0.05 ± 0.01

Left ovary 0.07 ± 0.02 0.05 ± 0.01 0.04 ± 0.01

Uterus 0.37 ± 0.11 0.49 ± 0.03 0.43 ± 0.03

Data are given as means ± SE. Data were analyzed by ANOVA. No significant difference among groups was observed.

Table 3 - Outcome of fertility tests (%) in rats treated with Phytotherapic I (A) and Phytotherapic II (B)

Outcome (A) Control GPI1 GPI2 GPI3

Mated females (n) 24 24 10 10

Mated males (n) 8 8 7 5

Sperm-positive females (n) 18 13 7 3

Pregnant females (n) 13 12 7 3

Mating Index (%) 69.2 46.5 70 30a

Pregnancy Index (%) 81.25 92.3 100 66.6a

Post-implantation loss Index (%) 0 3,6 4 21a

Outcome (B) Control GPII1 GPII2 GPI3

Mated females (n) 24 24 9 10

Mated males (n) 8 8 5 5

Sperm-positive females (n) 18 6 2 3

Pregnant females (n) 13 6 2 0

Mating Index (%) 69.2 22.2a 22a 37.5a

Pregnancy Index (%) 81.25 100 100 0a

Post-implantation loss Index (%) 0 11.1a 8a 0

Data were analyzed by Chi-square test. a Significantly different (P > 0.05) from control group.

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highest dose of Phytotherapic II showed statisticallysignificant difference in relation to the control group.

Discussion

The results obtained in the present study suggestedthat female fertility was affected by continuous treat-ment with Phytotherapic I and Phytotherapic II, for 14days prior to mating and during the mating period. Theindex of mating presented statistic difference amongthe groups treated with the three Phytotherapic IIdoses, as compared to the negative control group,while the groups treated with Phytotherapic I this wasobserved only when the highest dose was used. The indexes of pregnancy have presented statistic difference among the groups related to the controlgroup in the highest dose of Phytotherapic II.

In this study, the exposure of the females to phy-totherapics formulations I (GPI) and II (GPII) in threedoses, 4.3 mg/kg, 21.5 mg/kg and 43 mg/kg, before

mating did not alter the absolute weight of the repro-ductive organs uterus and ovaries, The same wasobserved for the other organs evaluated (liver, kidneyand spleen). No macroscopic signs of toxicity wereobserved in the organs examined. However, the gain inbody weight before mating was altered in GPI2, GPI3and GPII1, GPII2, GPII3 differed significantlybetween the treated groups and the control. During theperiod of gestation and lactation the growth of femalestreated was not altered. The same was observed for theabsolute weight of the reproductive organs. Similarly,no macroscopic signs or histopathological lesionswere detected in the organs analyzed.

Adverse alterations in the nonpregnant femalereproductive system have been observed at dose levelsbelow those that resulted in reduced fertility or pro-duced other overt effects on pregnancy or pregnancyoutcomes (Sonawane and Yaffe, 1983; Cummings andGray, 1987).

The preimplatation period of pregnancy is consid-ered to be an ‘all-or-none’ period, the period during

Table 4 - Reproductive index (%) from dams treated with Phytotherapic I (A) and Phytotherapic II (B), to give birth

Reproductive index (A) Control GPI1 GPI2 GPI3

Nº (dams) pups (7) 47 (5) 36 (2) 13 (2) 15

Number of pups per litter 10.2 ± 1.6 10.2 ± 0.8 7.3 ± 1.8 7.5 ± 1.8

Pups body weight 5.6 ± 0.14 6 ± 0.2 5.4 ± 0.3 6 ± 0.5

Delivery index 100% 100% 50%a 100%

Birth live index 100% 87.5% 83% 100%

Viability index 100% 97.7% 60%a 100%

Weanling index 98.4% 95.3% 0%a 61.5%a

Reproductive Index (B) Control GPII1 GPII2

Nº (dams) pups (7) 47 (4) 13 (1) 9

Number of pups per litter 10.2 ± 1.6 5.3 ± 1.5 9

Pups body weight 5.6 ± 0.14 5.3 ± 0.1 6 ± 0.3

Delivery index 100% 100% 50%a

Birth live index 100% 100% 55.5%a

Viability index 100% 95.5% 100%

Weanling index 98.4% 90.9% 100%

Data were given as means ± SE and proportions. Proportions were analyzed by Chi-square test. Data are given as means ± SE were analyzed byANOVA. a Statistically significant difference from the control group was considered when P > 0.05.

Table 5 - Reproductive index (%) from dams treated with Phytotherapic I (A) and Phytotherapic II (B), and parameters evaluated atthe caesarian section performed on pregnancy day 21

Reproductive index (A) Control GPI1 GPI2

Nº (dams) pups (5) 61 (8) 69 (3) 22a

Gravid uterus weight (g) 68.35 ± 8.0 74.24 ± 4.6 33.05 ± 9.2a

Litter size 10.2 ± 1.6 10.2 ± 0.8 7.3 ± 1.8

Pups body weight (g) 4.8 ± 0.1 5.11 ± 0.05 3.5 ± 0.8

Nº of pups with external malformations - - -

Reproductive index (B) Control GPII1

Nº (dams) pups GC- GI1

Gravid uterus weight (g) (5) 61 (2) 17a

Litter size 68.35 ± 8.0 64.21 ± 3.6

Pups body weight (g) 10.2 ± 1.6 10.2 ± 0.8

Nº of pups with external malformations 4.8 ± 0.1 5.17 ± 0.6

Data are given as mean ± SE. Data were analyzed by ANOVA. a Significantly different (P > 0.05) from control group.

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which maternal exposure to exogenous agents maycause either embryo lethality or normal developmentof the embryo with a normal fetus at delivery(Lemonica et al., 1996).

The administration of both phytotherapic at dosesinvestigated did not affect the duration of pregnancyand the number of pups born from females treatedwith GPI, but it interfered in the birth rate when thelargest dose of Phytotherapic II was used (GPII),showing statistically significant difference in relationto the control group. In females who suffered cesare-an section on the 21st day of pregnancy, both groupstreated with phytotherapics, GPI2 (21.5 mg/kg) andGPII1 (4.3 mg/kg), in the highest doses used, no difference in the number of pups was observed incomparison to the control group.

In the number of implants, there were significantdifferences between the groups treated in comparisonwith the control group. In the both phytotherapic allthe doses used were post-implantation losses; however,in GPI the highest dose, the 43 mg/kg dose caused themost losses.

In another study, rats treated with hydroalcoholicextract from Lantana camara var. aculeata, for 14 daysprior to mating, at mating, gestation and lactation wereevaluated as to the overall reproductive performance.The increase in post-implantation loss index was statistically different from the control and LC 3 andLC 7 groups, suggesting that the extract inducedembryotoxicity in these groups, without any sign ofmaternal toxicity. The tendency to an increase in thepost implantation loss reported in that study may haveoccurred due to a toxic effect of the extract on theembryo (Mello et al., 2005).

An investigation on the effects of the presence ofgenistein concentrations in the diet of Sprague--Dawley rats from the seventh day of pregnancythrough the end of breastfeeding showed that evenindices of human exposure are capable of producingreduction in the weight of litter, hyperplasia of alveolar ducts of the mammary glands of females,mature abnormal vaginal cells, among other effects.The conclusion was that the consequence of exposureto genistein has effects on multiple tissues sensitive toestrogen in females (Delclos et al., 2001).

The rates of birth and viability were statistically different from the control group. GPI2 and GPII2 weredifferent in the rate of birth. Considering the rate ofviability, only the GPI2 revealed statistically signi-ficant difference as compared to the control group.

Kang et al. (2002) investigated the exposure ofSprague-Dawley rats to concentrations of genisteinconsistent with those obtained in humans. The use ofgenistein (0.4 mg/kg and 4 mg/kg) during gestationand lactation on reproductive variables of F1 showedthat the number of pups born alive, sites of deployment,proportion between the sexes, year-genital distance,vaginal opening of the channel were not affected.

The administration of the two phytotherapic formu-lations containing soybean Glycine max (L.) Merrbefore mating, at mating, pregnancy and lactation, inthe groups GPI2, GPII2, GPI3 and GPII3 (doses 21.5mg/kg and 43 mg/kg) caused change in the growth inprior to mating, caused increase in the number ofresorptions and modification of the reproductive ratescalculated.

Given the range of potential effects of soy and its components and the potential for increase in the consumption of products containing soy, it is important to carry out comprehensive toxicologicalevaluations of these agents to better understand thepotential adverse effects that could result from theiruse. A growing body of toxicological data on theisoflavones in rodents is accumulating, which con-firms the importance of dose, time, target organ, routeof administration and context and the species on theeffects.

Phytoestrogens act as natural estrogenic agonists orantagonists occupying prominent place in the group ofendocrine disrupters. So far, studies in vitro and invivo showed no consistent results regarding the possi-bility that the phytoestrogens could mimic estrogenicactions in all target organs (Clapauch et al., 2002).

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Parasitismo intestinal em avestruzes (Struthio camelus australis Linnaeus,1786) da Região Sul do Estado do Espírito Santo, no ano de 2006

Intestinal parasitism on ostriches (Struthio camelus australis Linnaeus,1786) from South Region of Espírito Santo State, in 2006

André M. B. Batista1, M. Angélica V. da Costa Pereira1*, Gilmar F. Vita2

1Setor de Parasitologia, Hospital Veterinário, Centro de Ciências e Tecnologias Agropecuárias, Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro (UENF)

2Fundação Estadual do Norte Fluminense (FENORTE)/Parque de Alta Tecnologia do Norte Fluminense (TECNORTE),Graduando do Curso de Ciências Biológicas da Universidade Castelo Branco (UCB)

R E V I S T A P O R T U G U E S A

CIÊNCIAS VETERINÁRIASDE

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Resumo: O avestruz (Struthio camelus australis Linnaeus,1786) é originário da África e foi introduzido no Brasil na década de 90. Apesar de serem aves bastante resistentes, estasapresentam grande disposição a desenvolver doenças, principal-mente parasitárias. Nossa pesquisa, nesse mérito, teve entãocomo propósito primário, realizar exames coproparasitológicose subseqüentemente identificar a presença de ovos de endopara-sitas intestinais, verificar possibilidades de contaminaçõescruzadas entre espécies animais e viabilizar a melhor escolha de procedimentos para o seu manejo, combate e profilaxia.Após todo o experimento, ficou evidenciado nas análises dediagnóstico, a existência de oocistos de Isospora sp. e ovos deAlaria sp., Ascaris sp., Baylisascaris sp., Strongyloides sp. e tricostrongilídeos. Desta forma, nossa pesquisa termina comprovando a existência de ovos de endoparasitas intestinaispertencentes a outras espécies animais em fezes de avestruzes,que o parasitismo/parasitose se mostra menor quanto maior foras condições sanitárias e de manejo e que os gêneros de para-sitas encontrados deveu-se provavelmente ao trânsito de outrasespécies no plantel.

Palavras-chave: Avestruz, endoparasitoses intestinais, métodosde diagnóstico

Summary: The ostrich (Struthio camelus australis Linnaeus,1786), which originates from Africa, was introduced in Brazil inthe 1990’s. Whilst these birds are considered to be extremelyresistant, they present a tendency to develop diseases, particularly the parasitic ones. This study aimed to carry outcoproparasitological tests in ostriches and to identify the presence of eggs of intestinal endoparasites to verify the possibility of cross contaminations among animal species and to make the best choice for their handling, as well as control andprophylaxis. Analyses demonstrated the presence of Isosporasp. oocysts, as well as Alaria sp., Ascaris sp., Baylisascaris sp.,Strongyloides sp. and trichostrongylides eggs. As such, ourresearch demonstrated the presence of intestinal endoparasiteeggs that belong to other animal species in ostrich feces.

Parasite infection was observed to be lower when animals weremaintained under better sanitary conditions and handling, furthermore, the parasite genera encountered were probablypassed on due to the presence of other species in pens.

Keywords: Ostrich, intestinal endoparasitosis, diagnosticmethod

Introdução

O avestruz (Struthio camelus australis Linnaeus,1786), Ostrich na língua inglesa, é pertencente aogrupo das ratitas (aves não voadoras) sendo originárioda África (Namíbia Botswana, África do Sul). Seunome provém de duas importantes características dosavestruzes: correr em zigue zague para escapar depredadores (Struthio) e ser altamente resistente à faltade água (camelus) (Giannoni, 2004).

Estas aves são bastante resistentes a doenças, tendouma ótima capacidade de adaptação. São criadas comsucesso em países como Canadá, Estados Unidos daAmérica, Europa, Israel e Austrália, e suportam bemtemperaturas muito baixas ou muito altas (Duane eMary, 1996; Cooper e Horbanczuk, 2002).

Tem grande potencial para ser criado com sucessono Brasil, graças a sua rusticidade, excelente adaptação e produtividade nas condições de nossopaís, que por sua vez possui enormes áreas disponíveispara construção de inúmeros plantéis, e ainda contacom excelente clima e qualidade de terras paraimplantação desta atividade (Souza, 2004).

A importância econômica da avaliação da população parasitológica destas aves se faz muito significante pela incerteza da dimensão do impactodestes parasitas na criação de avestruzes. O aspectomais importante a ser considerado é se tais parasitasobservados são ou não específicos de avestruzes, e se

*Correspondência: [email protected]: +55 (22) 2739-6370

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sua patogenicidade é também estendida a outras espécies de animais comumente criados no nosso país,tais como outras aves e mamíferos. Também paira adúvida se estes parasitas são recentes ou não, e até queponto pode influenciar na saúde humana (Reissig etal., 2001; Gordo et al., 2002).

Avestruzes podem ser acometidos por uma amplagama de parasitas, como o Toxoplasma gondii, quetem as aves como hospedeiros secundários (Foreyt,2005; Hove e Mukaratirwa, 2005). Os parasitas dogênero Entamoeba acometem peixes, anfíbios,mamíferos e pássaros, entretanto, já foram detectadosa presença de trofozoítas e cistos de Entamoeba emamostras de fezes de avestruzes em fazendas naEuropa (Espanha). Estudos posteriores avaliaram características morfológicas destes cistos encontrados,e indicam uma nova espécie de Entamoeba nestas aves(Diaz et al., 2000; Gordo et al., 2004).

Como para outras espécies animais, a maior partedos parasitas referidos no avestruz encontram-se naspenas e no trato gastrointestinal (Gordo et al., 2002;Foreyt, 2005). Sendo estas aves também parasitadaspor Culicoides sp., notabilizados em fazendas deavestruzes em Botswana, África (Mushi et al., 1999).

Análises experimentais já identificaram 29 espéciesde parasitas nos avestruzes, incluindo-se trematóides,cestóides e nematóides.

Gordo et al. (2002) identificaram uma espécie decestóide em seus experimentos, o Houttuynia struthio-nis, encontrando proglotes em aves mortas e em fezesde pintos da mesma criação analisada. Observou-seainda fases adultas do parasita em aves adultas eproglotes na superfície fecal dos animais mais jovens.Dentre os parasitas, as helmintoses se destacam comoimportantes causadores de doenças, sendo algumasespécies responsáveis por taxas de mortalidade de até50% entre filhotes (Bonadiman et al., 2006).

Através do panorama exposto, nossa pesquisa objetivou a realização de exames coproparasitológicos,tendo como propósito primário identificar a presençade ovos de endoparasitas intestinais, numa contribuiçãoà tão diversificada literatura, verificando também aspossibilidades de contaminações cruzadas entre espécies animais, e viabilizando a melhor escolha de procedimentos para o seu manejo, combate e profilaxia.

Material e métodos

Foram realizadas duas coletas de amostras de material fecal de avestruzes no período entre julho aoutubro de 2006, com intervalo médio de dois meses(julho/setembro) entre elas, em uma propriedade rural,localizada na região sul do estado do Espírito Santo,Brasil, cujo sistema de criação adotado é o semi-inten-sivo. A propriedade apresenta uma área de grandeextensão, aproximadamente 50 hectares, com criação

de avestruzes há mais de 10 anos, todos originários deBotswana, África. Existe nesta propriedade a presençade outras espécies animais, como é o caso de suínos,bovinos, ovinos, cães, gatos e aves, os quais circulamlivremente pela localidade, inclusive com acesso aospiquetes dos avestruzes.

A mesma possui assistência médico-veterinária,presença de rodolúvio, esquemas estratégicos dedesparasitação, registro no Ministério da Agricultura,Pecuária e Abastecimento (MAPA) e boas condiçõessanitárias, segundo a normativa vigente para tal atividade (Instrução Normativa Conjunta, 2003).

Em cada coleta obteve-se 45 amostras, provenientesde três grupos planejados, assim definidos: filhotes(15 dias a seis meses), engorda (10 a 18 meses) ereprodução (superior a dois anos), totalizando um totalde 270.

As fezes frescas dos avestruzes foram extraídasdiretamente do chão, seguindo o protocolo determina-do por Hoffmann (1987), ou seja, sempre evitando acoleta de materiais com sujidades, retirando apenas aspartes superiores e internas das amostras. As mesmasforam acondicionadas em potes coletores de fezesdevidamente etiquetados, mantidas à temperatura de 4 °C, com auxílio de caixa térmica e gelo para o transporte.

Após esse procedimento, foram direcionadas aoSetor de Parasitologia do Laboratório de SanidadeAnimal, Centro de Ciências e TecnologiasAgropecuária, Universidade Estadual do NorteFluminense Darcy Ribeiro (UENF). Cada amostra foisubmetida aos métodos de análises qualitativas WillisMolley e Sedimentação Simples (Hoffmann, 1987;Bowman, 1995). Posteriormente, as mesmas foramconduzidas ao microscópio óptico, onde através deaumentos de 4, 10, 40 e 100X, os ovos dos parasitaspresentes foram observados, analisados e devidamentediagnosticados, de acordo com critérios estabelecidospor Keith (1953), Freitas (1981), Ueno e Gonçalves(1998) e Sequeira e Amarante (2002).

Resultados

Nas amostras fecais obtidas de ambas as coletas,foram diagnosticados: 1) no grupo de filhotes - oocistosde Isospora sp., ovos de Baylisascaris sp. eStrongyloides sp.; 2) no grupo de engorda - oocistosde Isospora sp., ovos de Alaria sp., Baylisascaris sp.,Strongyloides sp. e tricostrongilídeos; e, 3) no grupode reprodução - oocistos de Isospora sp., ovos deAlaria sp., Ascaris sp. e Strongyloides sp. (Tabela 1).

Na tabela apresentada é possível observar o grau de eliminação de ovos de parasitas em cada fase de criação.

Para melhor compreensão dos resultados obtidos,consideramos as legendas classificatórias: ++++ graumáximo, +++ grau elevado, ++ grau médio e + grau

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mínimo, como quantidade de ovos eliminados de parasitas diagnosticados nos métodos aplicados.

Os valores de quantidades demonstrados acima sãoapenas aparentes, sem qualquer afirmação numérica,uma vez que neste trabalho não se contou com a realização da técnica de ovos por grama de fezes(OPG), mas tomou como parâmetro o número aparentede ovos de parasitas por campo microscópico.

Ficaram evidenciadas as boas condições em que osavestruzes se encontravam alojados nesta propriedaderural.

Os pintos eram alocados em creche que possuía umaárea aberta e outra coberta, onde os comedouros eramafastados do chão e dos bebedouros, e as fezes dasaves removidas diariamente. Nesta creche não haviasuperlotação de animais. Ficavam alojadas nesta áreaas aves de um dia até três meses, sendo esta fase davida dos avestruzes crucial para sua sobrevivência,uma vez que são nestas idades que surgem os maioresproblemas em relação ao surgimento de doenças eproblemas como diarréia e impactação. Nesta propriedade, as taxas de mortalidade de pintos deavestruz estavam entre 10 e 15%, e na maioria dasvezes a perda das aves se dava por casos de fraturas eimpactação, não sendo muito observado casos de diarréias entre os filhotes.

Com relação às condições dos grupos de engorda,foi possível observar que as aves se encontravam emboas condições de saúde, sem sinais clínicos de alterações patológicas, além de ser possível notar asboas condições higiênicas e de manejo. Tambémobservou-se que os grupos eram bastante amplos, oque é ideal para o desenvolvimento destas aves, umavez que estas são corredoras e precisam se exercitar

para um bom desenvolvimento muscular, principal-mente das coxas e dorso, partes nobres e mais valorizadas.

Já os grupos de reprodução, apresentavam-se bastante grandes, com área de pastagem e ótimascondições de higiene e sanidade animal. Esta explo-ração adota o sistema de casais e não de trios ou grupos de animais, o que além de reduzir bastante oestresse por parte das aves (competição por fêmeas,comida, sombra, entre outras), facilita bastante omanejo e monitoramento de cada casal em especial.Como os machos desta espécie tendem a "eleger" umafêmea como predileta, e como conseqüência disto,tende a realizar mais coberturas nesta, o sistema decasais evita o problema de ovos não fecundados, comoé comum ocorrer entre fêmeas que são criadas emgrandes grupos. Ovos inférteis significam menos filhotes e maiores custos com incubadora, mão deobra e energia elétrica.

Discussão

Os avestruzes são aves que tem o hábito de se alimentar de praticamente quase tudo que está à disposição, graças ao seu paladar pouco desenvolvidoe ao hábito de engolir direto o alimento. Também écomum entre os filhotes o hábito de se alimentar defezes dos avestruzes adultos (coprofagia) e algumasvezes de outros animais, e por isso estes são freqüen-temente acometidos por uma ampla gama de parasitas.A infecção, na maioria das vezes se dá de forma direta, ou seja, no momento em que a ave ingere ovosou larvas infectantes de parasitas, presentes em folha-

Tabela 1 – Ovos de parasitos diagnosticados, com seus devidos graus de infecção, obtidos das amostras fecais de avestruzes, deambas as coletas, nos piquetes de filhotes, engorda e reprodução

Ovos de parasitos Infecção

Primeira coleta Segunda coleta

Piquetes de filhotes

Baylisascaris sp. - +

Strongyloides sp. +++ +++

Oocistos de Isospora sp. ++ ++

Piquetes de engorda

Alaria sp. + +

Baylisascaris sp. ++ ++

Ostertagia sp. + +

Strongyloides sp. +++ +++

Oocistos de Isospora sp. ++ +++

Piquetes de reprodução

Ascaris sp. ++ ++

Alaria sp. + +

Strongyloides sp. ++++ +++

Oocistos de Isospora sp. +++ +++

++++ = grau máximo; +++ = grau elevado; ++ = grau médio; + = grau mínimo.

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gens, que compõem parte de sua alimentação naforma de volumoso, que chega a compor até 70% desua alimentação em algumas explorações. Destaforma, o tipo de manejo e sistema de criação adotadopelas explorações influencia de maneira direta nosníveis de infestação por parasitas do trato gastroin-testinal (Giannoni, 2004).

Alguns estudos já mostraram que os avestruzes sãoaves bastante vulneráveis a diversos tipos de parasitas,principalmente os que parasitam o intestino, uma vezque outros órgãos não parecem albergar taxas signi-ficativas de parasitas. Mesmo quando em grandequantidade, a presença de parasitas nestas aves podenão ser acompanhada de sinais clínicos característicos,o que torna ainda mais interessante e importante àanálise das amostras de fezes (Barton e Seward, 1993;Gordo et al., 2002; Foreyt, 2005; Bonadiman et al.,2006).

Nesta pesquisa foram observados oocistos deIsospora sp. em pouca quantidade aparente, ovos deAscaris sp., Baylisascaris sp. e Strongyloides sp. emmédia quantidade, e Alaria sp. e tricostrongilídeos empequena quantidade.

O gênero Strongyloides sp. está presente em outrasespécies, como o caso dos bovinos e ovinos, e comoesta propriedade conta com a presença destes animaiscom acesso direto à área reservada aos avestruzes,parecem estes estarem adquirindo tais parasitosatravés destas outras espécies. Parasitos destesgêneros foram freqüentemente encontrados emamostras de fezes de avestruzes em estudos anteriores(Barton e Seward, 1993; Huchzermeyer et al., 2000;Martins et al., 2005; Bonadiman et al., 2006).

Baylisascaris sp. também foi diagnosticado nesteexperimento, talvez pelo mesmo motivo do gêneroanterior, ou seja, as condições falhas de manejo estãofavorecendo sua sobrevivência entre os avestruzes. Poreste parasito ter potencial de acometer o homem, sefaz necessária à realização de mais estudos sobre elese a adoção de medidas de controle e erradicaçãodestes parasitos (Willians et al., 1997; Kohek Junior,1998).

Outros ovos diagnosticados foram do gêneroAscaris, parasita gastrointestinal bastante difundido. Éfreqüentemente observado em aves domésticas, comoperus, galinhas, entre outras (Shivaprasad, 2002;Foreyt, 2005). Já foi identificado em peixes, répteisaquáticos e mamíferos marinhos, demonstrando aampla gama de possíveis hospedeiros (Nadler eHudspeth, 2000). Este parasita compete com o hospedeiro pelos nutrientes, podendo debilitar as avespor ele acometidas, retardando o crescimento, sendoque, as aves mais jovens são mais suscetíveis ainfecções (Aguilar et al., 2005). Como já descrito porCooper (2005) e Foreyt (2005), os avestruzes podemter seu trato gastrointestinal parasitado por estahelmintose.

Oocistos de Isospora sp. foram, assim como nosdemais, diagnosticados nesta pesquisa, uma possívelexplicação para a existência de tais ovos nas amostras,pode ser o fato de que cães e gatos transitam nesta áreae os vermicidas da linha pet de maneira geral não semostrarem eficientes no seu combate (Katagiri eOliveira-Sequeira, 2007; Lorenzini et al., 2007). Então,apesar de existir algum programa de desparasitação,pode não estar sendo eficaz para este tipo de parasita.

Alguns ovos de tricostrongilídeos foram diagnosti-cados, reforçando a hipótese de que a presença decabras e ovelhas, tenha influenciado na parasitose dosavestruzes (Mattos et al., 1992, 2003).

Neste estudo foram diagnosticados ovos dotrematóide Alaria sp., em quantidade pequena, poisforam visualizados apenas alguns. Estes trematóidesjá foram estudados em experimentos anteriores e diagnosticados através de métodos qualitativoscomuns em animais como martas, gatos e cães, entreoutros carnívoros (Rigonatto et al., 2000). A presençadeste tipo de ovo nas amostras fecais sugere que osavestruzes ao co-existirem com gatos domésticosestão se infectando. A não ocorrência de sinais clínicoscaracterísticos da infecção por parte destes parasitas,como é o caso de diarréia, algumas vezes com sangue,não os isenta da possibilidade de estarem infectados(Rigonatto et al., 2000).

As doenças parasitárias das aves em geral são causadas por protozoários, nematóides, trematóides,cestóides e ectoparasitos, que são responsáveis porperdas consideráveis em um plantel (Aguilar et al.,2005). Parece haver entre os avestruzes uma maiorpré-disposição a doenças nas aves jovens, principal-mente com idades entre um dia a três meses (Carrer etal., 2004). As medidas de higiene efetuadas demaneira correta, assim como o manejo destas aves edesparasitação regular são fundamentais na prevençãoe combate às parasitoses. O ideal seria que houvesseum diagnóstico coproparasitológico e posteriormenteuma terapia de desparasitação em intervalos predeter-minados e repetições subseqüentes periodicamente.

Desta forma, nossa pesquisa termina estabelecendoas seguintes conclusões: 1) ficou comprovada comoobjetivo primário a identificação da presença de ovosde endoparasitas intestinais pertencentes a outrasespécies animais em fezes de avestruzes; 2) os mesmos podem se comportar tanto como hospedeirosdefinitivos, quanto como hospedeiros paratênicos dediversos gêneros de parasitas; 3) alguns gêneros deparasitas encontrados deveu-se provavelmente ao trânsito de outras espécies nos piquetes; 4) quantomelhor as condições sanitárias e de manejo, menor aquantidade de parasitoses/parasitismo encontrada; e, 5) devido à inexistência de literatura e por ser aestrutiocultura uma inovação no Brasil, torna-seimprescindível maiores estudos, uma vez que algunsde seus parasitas exóticos em nosso país, podemacometer inclusive o ser humano.

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Pesquisa de hemoprotozoários em aves de rapina (ordens Falconiformes eStrigiformes) em centros de recuperação em Portugal

Study of haemoprotozoa in birds of prey (orders Falconiformes andStrigiformes) in wildlife rehabilitation facilities in Portugal

N. G. Santos1, M. C. Pereira2, P. M. Melo3, L. M. Madeira de Carvalho4

1Pygargus, Serviços Veterinários Lda, Rua de Goa, 108, 4830-589 Póvoa de Lanhoso, tel: 91-9251736, fax: 253-634239 ([email protected])

2Av. República, A5, R/C E, 4830 Póvoa de Lanhoso3Centro de Recuperação de Aves Silvestres do Parque Florestal de Monsanto

Estrada do Barcal, Monte das Perdizes, Parque Florestal de Monsanto 1500 Lisboa4Centro Interdisciplinar de Investigação em Saúde Anima, Faculdade de Medicina Veterinária,

Universidade Técnica de Lisboa (TULisbon), Pólo Universitário do Alto da Ajuda, Avenida da Universidade Técnica, 1300-477 Lisboa ([email protected])

R E V I S T A P O R T U G U E S A

CIÊNCIAS VETERINÁRIASDE

RPCV (2008) 103 (567-568) 195-200

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Resumo: Estudou-se a infecção por hemoprotozoários em avesde rapina das Ordens Falconiformes e Strigiformes alojadas emdois Centros de Recuperação portugueses. Foram analisadas113 aves de 15 espécies de rapinas diurnas e 4 espécies de rapinas nocturnas. Foram identificadas duas espécies do GéneroLeucocytozoon (L. toddi e L. ziemanni) e seis espécies doGénero Haemoproteus (H. elani, H. nisi, H. noctuae, H. syrnii,H. tinnunculi e H. tytoni). Todas as associações parasita-hos-pedeiro encontradas estavam descritas na literatura. A taxa deprevalência de amostras positivas a pelo menos um agente foi de20,4%, 15,9% para Leucocytozoon spp. e 5,3% paraHaemoproteus spp.. A prevalência de amostras positivas paraLeucocytozoon spp., foi significativamente maior emStrigiformes do que em Falconiformes. Todos os outros factoresanalisados não afectaram de forma significativa a percentagemde amostras positivas de cada um dos Géneros de hemoproto-zoários identificados. O significado geográfico, parasitológico,clínico e epidemiológico destes resultados é discutido, tendo ematenção a importância que estes parasitas podem assumir emaves de rapina de vida livre ou em cativeiro.

Palavras-chave: aves de rapina, hemoprotozoários, Leucocy-tozoon, Haemoproteus, recuperação de fauna selvagem

Summary: The infection of birds of prey (order Falconiformesand Strigiformes) by haemoprotozoa was studied in two portuguese wildlife rehabilitation facilities. 113 birds belongingto 15 species of diurnal birds of prey and 4 species of nocturnalbirds of prey were sampled. Two Leucocytozoon species (L.toddi and L. ziemanni) and six Haemoproteus species (H. elani,H. nisi, H. noctuae, H. syrnii, H. tinnunculi and H. tytoni) wereidentified. All host-parasite relationships found were alreadydescribed in the literature. Prevalence rate of samples positivefor at least one agent was 20.4 %, 15,9 % for Leucocytozoonspp. and 5.3 % for Haemoproteus spp. Leucocytozoon preva-lence rate was significantly higher in Strigiformes than inFalconiformes. All the other determinants studied didn’t affectapparent prevalence rate. These results are discussed in terms ofgeography, parasitology, clinics and epidemiology, concerningboth free-living and captive populations of birds of prey.

Keywords: birds of prey, haemoprotozoa, Leucocytozoon,Haemoproteus, wildlife rehabilitation

Introdução

O termo "aves de rapina" é utilizado para designaras aves das Famílias Falconidae (falcões), Accipitridae(abutres, águias, milhafres e outros) e Strigidae(mochos e corujas). Os estudos sobre parasitologia deaves de rapina são escassos em Portugal, comexcepção de alguns trabalhos sobre hemoprotozoáriosefectuados no início do século XX (Bettencourt eFrança, 1907; França, 1912). Embora pioneiros a nívelmundial, estes estudos permaneceram no esquecimentopraticamente até à actualidade, seguindo a tendênciageral do continente europeu até à década de 1980(Bennett et al., 1982). Mais recentemente, foram apre-sentados alguns dados relativamente ao parasitismopor hemoprotozoários em aves de rapina a nívelnacional (Madeira de Carvalho et al., 1997; Rebêlo,2006).

De um modo geral, os hemoprotozoários são considerados pouco patogénicos para aves de rapina,no entanto foram implicados em casos de mortalidadeem juvenis no ninho, aves debilitadas e em populaçõessem contacto prévio com os parasitas (Olsen e Gaunt,1985; Jenkins et al., 1989; Peirce, 1989; Ashford etal., 1990; Hunter et al., 1997; Peirce et al., 2004;Valkiunas, 2005). Existe alguma evidência de queestes parasitas podem diminuir os índices reprodutivosdas aves e, segundo alguns autores, podem ser consi-derados como agentes de selecção natural das espécies(Korpimaki et al., 1993; Hakkarainen et al., 1998; Solet al., 2003; Marzal et al., 2005; Tomé et al., 2005).

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Após os trabalhos pioneiros de Bettencourt e França(Bettencourt e França, 1907, França, 1912), pre-tendeu-se com este estudo uma primeira abordagemsistemática ao tema em Portugal, conglutinando diverso material e resultados já apresentados (Madeirade Carvalho et al., 1997). O trabalho foi realizado combase em aves de rapina presentes em Centros deRecuperação, pela impossibilidade de conseguir umaamostra significativa destas aves em liberdade. Esteestudo teve por objectivos a identificação de espéciesde hemoprotozoários envolvidas e das associaçõesparasita-hospedeiro, a determinação da sua prevalênciaem aves de rapina alojadas em Centros de Recuperaçãoportugueses e a verificação do efeito de algumas variáveis, como a época do ano, na prevalência do parasitismo. Com este trabalho esperamos preencheralgumas lacunas nesta área da Parasitologia dos animais silvestres em geral e das aves de rapina emparticular, bem como proporcionar dados de interessepara os profissionais responsáveis na reabilitação emanutenção destas aves em cativeiro.

Material e métodos

O estudo foi desenvolvido nos Centros deRecuperação do Parque Nacional da Peneda-Gerês(PNPG) e do Parque Natural da Ria Formosa (PNRF),com base nas aves de rapina presentes (OrdemFalconiformes e Strigiformes, respectivamente rapinasdiurnas e nocturnas). O trabalho incluiu aves em fasede recuperação e aves irrecuperáveis (aves cujacondição física ou comportamental não permite a sualibertação na natureza), desde que os animais se apresentassem clinicamente estáveis. Os trabalhos decampo decorreram entre Novembro de 1995 e Marçode 1997.

As aves foram capturadas nos seus alojamentos,com auxílio de um camaroeiro e luvas de couro, e posteriormente manipuladas com contenção física e avisão obstruída por um caparão. Após o exame doestado geral, foram colocadas em decúbito dorsal,com uma das asas em extensão. Em cada ave foi colhida uma pequena quantidade de sangue (até 0,1 ml) a partir da veia braquial, com seringas de 1 ou5 ml e agulhas 23 G de 30 mm de comprimento. Osangue colhido foi utilizado para efectuar entre 1 e 4esfregaços por escorregamento, os quais foram fixa-dos por dessecação numa primeira fase e por imersãoem metanol puro numa segunda fase, sendo entãocorados pelo corante de Giemsa. Em seguida foramobservados ao microscópio óptico (Olympus CH2),durante 30 minutos, na ampliação 1000 x, e os para-sitas presentes identificados de acordo com Bennett ePeirce (1988), Bishop e Bennett (1989), Peirce et al.(1990) e Bennett et al. (1992).

Foram colhidas amostras em 113 aves pertencentesa 19 espécies (15 de rapinas diurnas e 4 de rapinas

nocturnas). No PNRF foram analisados 67 aves, e noPNPG os restantes 46.

Os factores registados foram a espécie, época doano e hora da colheita da amostra. Estes factoresforam registados como variáveis qualitativas categóri-cas (espécie, época do ano) ou quantitativas discretas(hora). A época do ano foi definida como Verão/épocade reprodução (Abril a Julho), Inverno (Outubro aJaneiro) e Intermédia (Fevereiro, Março, Agosto eSetembro). A hora da colheita da amostra foi agrupada em 08.00-11.59 h, 12.00-15.59 h e 16.00-19.59 h.

Os dados de estatística descritiva foram obtidos como programa "Microsoft Excel 97®". As diferenças deprevalências de acordo com a Ordem e Família dasaves estudadas, tipo de alojamento, época de colheitae hora do dia foram analisadas pelo método do χ2 comum grau de significância de 0,05, com o programa"STATISTIX 7® for Windows, 2000, AnalyticalSoftware Version 7.0®.

Resultados

Os hospedeiros observados, Géneros de hemoproto-zoários assinalados e as respectivas prevalênciasaparentes estão descriminadas no Quadro 1. As espécies de hemoprotozoários infectantes e de hospedeiros infectados estão listadas nos Quadros 2 e 3, respectivamente para os Falconiformes eStrigiformes. Alguns exemplares dos GénerosLeucocytozoon e Haemoproteus estão assinalados nasFotos 1 a 4.

A percentagem de amostras positivas a pelo menosum agente foi de 20,4%, sendo esta proporção de9,9% para os Falconiformes e de 63,6% para osStrigiformes. A diferença de taxa de prevalência entre Falconiformes e Strigiformes foi altamente significativa (p<0,01). Nos Falconiformes, não foramobservadas diferenças significativas entre as famíliasAccipitridae e Falconidae (p=0,740), nem entre as trêsespécies hospedeiras mais frequentes na amostra,Águia de asa redonda Buteo buteo, Águia cobreiraCircaetus gallicus e Peneireiro de dorso malhadoFalco tinnunculus (p=0,341).

Também não foram encontradas diferenças significativas na prevalência consoante o Centro deRecuperação de alojamento (p>0,05). A prevalênciade amostras positivas foi mais baixa no 4º trimestre emais elevada no 3º, sobretudo devido às infecções porLeucocytozoon, enquanto as de Haemoproteussão mais comuns no 2º trimestre (Gráfico 1). Noentanto as diferenças não foram significativas(p=0,135).

A percentagem de amostras positivas a Haemo-proteus foi mais elevada nas amostras colhidas nas últimas horas do dia (Gráfico 2), no entanto adiferença não foi significativa (p>0,05).

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Tabela 1 - Hospedeiros, Géneros de hemoprotozoários assinalados e percentagem de positivos

Hospedeiro N Infectados Infectados por Infectados por Infectados por

(%) Leucocytozoon Haemoproteu hemoprotozoário

(%) (%) não identificado

(%)

Aquila chrysaetus – Águia real 1 0 0 0 0

Accipiter gentilis – Açor 6 2 (33,3) 2 (33,3) 1 (16,7) 0

Aegypius monachus – Abutre negro 1 0 0 0 0

Buteo buteo – Águia de asa redonda 34 5 (14,7) 5 (14,7 ) 1 (2,9) 0

Circaetus gallicus – Águia cobreira 11 0 0 0 0

Circus pygargus – Tartaranhão cinzento 3 0 0 0 0

Gyps fulvus – Grifo 2 0 0 0 0

Hieraaetus fasciatus – Águia de Bonelli 1 0 0 0 0

Hieraaetus pennatus – Águia calçada 5 0 0 0 0

Milvus migrans – Milhafre preto 7 0 0 0 0

Milvus milvus – Milhafre real 1 0 0 0 0

Total Accipitridae 72 7 (9,7) 7 (9,7) 2 (2,8) 0

Falco biarmicus – Falcão alfeneque 1 0 0 0 0

Falco peregrinus – Falcão peregrino 1 0 0 0 0

Falco subbuteo – Falcão tagarote 3 1 (33,3) 0 0 1 (33,3)

Falco tinnunculus – Peneireiro dorso malhado 13 1 (7,7) 0 1 (7,7) 0

Total Falconidae 19 2 (10,5) 0 1 (5,3) 1 (5,3)

Total Falconiformes 91 9 (9,9) 7 (7,7) 3 (3,3) 1 (1,1)

Asio flammeus – Coruja do nabal 3 2 (66,7) 1 (33,3) 1 (33,3) 0

Bubo bubo – Bufo real 14 8 (57,1) 8 (57,1) 0 0

Strix aluco – Coruja do mato 3 3 (100) 2 (66,7) 1 (33,3) 0

Tyto alba – Coruja das torres 2 1 (50,0) 0 1 (50,0) 0

Total Strigiformes 22 14 (63,6) 11 (50,0) 3 (13,6) 0

Total geral 113 23 (20,4) 18 (15,9) 6 (5,3) 1 (0,9)

Gráfico 1 - Taxa de prevalência de Haemoproteus eLeucocytozoon por trimestre

Gráfico 2 - Taxa de prevalência de Haemoproteus eLeucocytozoon ao longo do dia

% p

ositi

vos

% p

ositi

vos

Figura 1 e 2 - Gametócitos de Haemoproteus elani em Águia de asa redonda (Buteo buteo), em esfregaços corados pelo Giemsa.Objectiva de 100 X (Original)

HaemoproteusLeucocytozoon

HaemoproteusLeucocytozoon

1º trimestre 2º trimestre 3º trimestre 4º trimestre

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Os resultados foram idênticos ao analisar a taxa deprevalência amostral do Género Leucocytozoon, isto é,apenas foram assinaladas diferenças significativasentre Ordens taxonómicas (p<0,01). Por outro lado, apercentagem de amostras positivas do GéneroHaemoproteus não apresentou diferenças significati-vas entre grupos taxonómicos (Ordem ou Família) ouqualquer outro dos factores analisados.

Foram encontrados dois casos de infecção mista, umpor Leucocytozoon toddi e Haemoproteus nisi numAçor (Accipiter gentilis) e outro por Leucocytozoontoddi e Haemoproteus elani numa Águia de asa redonda (Buteo buteo).

Discussão

Do total de 113 aves de rapina examinadas, 20,4%estavam infectadas com hemoprotozoários, com umataxa de prevalência de amostras positivas de 9,9% emFalconiformes e 63,6% em Strigiformes. O GéneroLeucocytozoon foi identificado em 15,9% da amostrae o Género Haemoproteus em 5,3% da amostra.

Em trabalhos efectuados com aves de rapina em

França, foram assinalados 29 a 39% de Falconiformesinfectados por hemoprotozoários, valores superioresaos registados no presente estudo. Nos rastreiosfranceses, a espécie que apresentou uma taxa deprevalência mais elevada foi também a Águia de asaredonda (Buteo buteo), embora com níveis muitosuperiores (44 a 69%) comparativamente aos assinalados em Portugal. No entanto, estes autoresencontraram uma taxa de prevalência em Strigiformes(24 a 43%) inferior à reportada no presente estudo(Lepoutre, 1982; Mikaelian e Bayol, 1991; Fromont,1993).

Krone et al. (2001) encontraram, em aves de rapinaalojadas em Centros de Recuperação alemães, umataxa de prevalência semelhante à do presente estudopara Falconiformes (11%), mas muito inferior paraStrigiformes (13%). Este facto é particularmente evidente no Bufo real (Bubo bubo), em que essesautores não encontraram hemoprotozoários em nenhuma das 8 aves estudadas.

Sacchi e Prigioni (1984), citados por Krone et al.(2001), referem 22% de Falconiformes e Strigiformesinfectados em Itália. Em Espanha, Muñoz et al. (1999)encontraram uma taxa de prevalência muito superior

Figura 3 e 4 - Gametócitos de Leucocytozoon ziemanni em Bufo real (Bubo bubo), em esfregaços corados pelo Giemsa. Objectivade 40 X (Original).

Tabela 2 - Distribuição de espécie de hemoprotozoário por hospedeiro e associações parasita-hospedeiro em Falconiformes.

Hospedeiro Leucocytozoon Haemoproteus Haemoproteus Haemoproteus

toddi nisi elani tinnunculi

Accipiter gentilis – Açor 2 1 0 0

Buteo buteo – Águia de asa redonda 5 0 1 0

Falco tinnunculus – Peneireiro de dorso malhado 0 0 0 1

Total 7 1 1 1

Tabela 3 - Distribuição de espécie de hemoprotozoário por hospedeiro e associações parasita-hospedeiro em Strigiformes.

Hospedeiro Leucocytozoon Haemoproteus Haemoproteus Haemoproteus

ziemanni syrnii noctuae tytoni

Asio flammeus – Coruja do nabal 1 0 1 0

Bubo bubo – Bufo real 8 0 0 0

Strix aluco – Coruja do mato 2 1 0 0

Tyto alba – Coruja das torres 0 0 0 1

Total 11 1 1 1

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em Falconiformes (46,3%) mas inferior emStrigiformes (30,5%). No Japão, 17 de 30 aves de rapina nocturnas admitidas num Centro deRecuperação estavam infectadas por hemoproto-zoários, principalmente Haemoproteus, mas não foidetectada infecção em 19 Falconiformes (Murata,2002).

Lepoutre (1982), Muñoz et al. (1999) e Krone et al.(2001) referem taxas de prevalência mais elevadaspara o Género Leucocytozoon comparativamente aHaemoproteus, em Falconiformes, à semelhança doregistado no nosso estudo. No entanto, Mikaelian eBayol (1991) apresentam prevalências superiores paraHaemoproteus. Krone et al. (2001) referem prevalên-cias semelhantes para Leucocytozoon e Haemoproteusem Strigiformes, em desacordo com o que encontrámosnos Centros de Recuperação portugueses. De referirque, em Espanha, Peirce et al. (1983) apenas encon-traram rapinas infectadas com Leucocytozoon eMuñoz et al. (1999) encontraram uma prevalência deLeucocytozoon muito superior, quer em Falconiformesquer em Strigiformes.

Em Portugal, Tomé et al. (2005) encontraramLeucocytozoon ziemanni, numa população selvagemde Mocho galego (Athene noctua) no sul de Portugal,numa percentagem de 41%. Enquanto mais de 80%das aves adultas desta população tinham infecçõespatentes, menos de 10% dos juvenis estavam namesma situação. A composição etária da amostra estudada pode assim influenciar a prevalênciaamostral.

Estes dados parecem confirmar a hipótese de que aprevalência de Leucocytozoon decresce de norte parasul no continente europeu, embora apenas emFalconiformes (Peirce, 1981). Uma variação geográ-fica semelhante também foi proposta para o GéneroLeucocytozoon no continente americano, mas nãopara Haemoproteus, o qual apresenta uma distribuiçãomais homogénea (Greiner et al., 1975). Este fenómeno pode ser explicado pela ubiquidade do principal vector de Haemoproteus (insectos do GéneroCulicoides), ao contrário do vector de Leucocytozoon(insectos da família Simuliidae), cujas necessidadesde habitat são mais restritas, nomeadamente quanto acursos de água corrente. No entanto foi sugerido que, na Europa, também Leucocytozoon pode sertransmitido por Culicoides (Ashford et al., 1991).

O facto de não termos encontrado diferenças significativas na prevalência de Leucocytozoon entreos dois Centros de Recuperação, um situado numhabitat propício para Simuliidae (PNPG, com muitosrios de montanha) e outro num habitat desfavorável(PNRF, numa zona costeira plana) sugere que ainfecção não ocorre nos Centros de Recuperação, masque as aves dão entrada nos mesmos já infectadas.

Os nossos dados sugerem também que a época doano parece afectar a prevalência da infecção porhemoprotozoários em aves de rapina, embora de

forma estatisticamente não significativa. O aumentomuito marcado da sua prevalência na época de repro-dução, verificado em aves em liberdade, pode estarassociado com mudanças hormonais e com o desviode recursos energéticos para a actividade reprodutiva(Ashford et al., 1990, 1991; Fromont, 1993; Deerenberget al., 1997; Valkiunas, 2005). O facto das aves pornós estudadas se encontrarem em cativeiro, compouca actividade de natureza reprodutiva, podeexplicar a redução da amplitude desta flutuaçãosazonal da prevalência. No entanto Krone et al. (2001) detectaram diferenças sazonais na prevalência dehemoprotozoários em Águias de asa redonda (Buteobuteo) alojadas em Centros de Recuperação naAlemanha.

Todas as associações parasita-hospedeiro por nósencontradas já estavam descritas na literatura(Fromont, 1993). Não foi encontrada sintomatologiaassociada à infecção por hemoprotozoários em nenhu-ma das aves incluídas neste estudo, nomeadamenteanemia e emagrecimento, como referido por outrosautores.

Neste estudo reportamos dados sobre o parasitismopor hemoprotozoários em aves de rapina alojadas emCentros de Recuperação em Portugal, onde se destacauma taxa de infecção de nível médio, cerca de 20%, ea alta taxa de infecção das aves de rapina nocturnas(Ordem Strigiformes), cerca de 64%. O facto de estasrapinas estarem infectadas em maior percentagempoderá, por um lado, ser consequência da sua maioractividade noctívaga e, por outro, da sua nidificaçãoem buracos nas árvores e edifícios, coincidindo com amaior actividade dos vectores destes hemoproto-zoários e com locais que podem constituir microbió-topos óptimos para o desenvolvimento destes mesmosvectores.

Atendendo à importância deste tipo de parasitas emtermos de ecologia, evolução e conservação das avesde rapina, é fundamental obter dados tanto sobreespécimes em liberdade como sobre aves em centrosde recuperação, para determinar a influência dostresse de cativeiro, incluindo a manipulação, nofavorecimento de infecções por hemoprotozoários ena sua expressão em termos clínicos.

Agradecimentos

Aos responsáveis pelos Centros de Recuperação doPNRF e do PNPG por terem permitido o acesso àsaves em recuperação, e aos respectivos tratadores porterem auxiliado na colheita das amostras. Ao Centrode Investigação Interdisciplinar em Sanidade Animal,Faculdade de Medicina Veterinária da UniversidadeTécnica de Lisboa (CIISA/FMV) por ter financiadoeste estudo e ao seu Coordenador, Professor DoutorLuís Manuel Morgado Tavares, pelo interesse mani-festado no desenvolvimento deste trabalho.

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Enumeração de Escherichia coli em carne bovina e de aves através demetodologia miniaturizada utilizando-se "eppendorf" e caldo fluorogênico

Enumeration of Escherichia coli in meat and poultry by using a miniaturized methodology "eppendorf" and fluorogenic broth

Robson M. Franco1*, Samira P. S. Mantilla2, Analy M. O. Leite3

1Departamento de Tecnologia de Alimentos da Universidade Federal Fluminense2Higiene Veterinária e Processamento Tecnológico de Produtos de Origem Animal da UFF

3Universidade Federal do Rio de Janeiro

R E V I S T A P O R T U G U E S A

CIÊNCIAS VETERINÁRIASDE

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Resumo: A Escherichia coli é considerada um patógeno emergente e pode ocasionar doenças de origem alimentar desintomas brandos até quadros mais graves como a colite hemorrágica. Estas bactérias estão presentes no trato gastro-intestinal dos animais, sendo comum a contaminação da carcaçae cortes de carne durante o abate e o processamento. Ametodologia tradicional de enumeração de E. coli em alimentosé muito demorada e dispendiosa, por conseguinte, métodosminiaturizados vêm sendo pesquisados por diversos cientistasna área de microbiologia. Além disso, vem ocorrendo grandeinteresse pelos métodos microbiológicos que visem a reduçãode gastos na aplicação das técnicas analíticas laboratoriais ali-mentícias, desde que apresentem sensibilidade e especificidadeda metodologia tradicional. Nesta pesquisa, a partir de amostrasde acém (inteiro e moído) e de carne de aves, enumerou-se coliformes totais e E. coli através de metodologia miniaturizadae comparou-se os resultados com os padrões estabelecidos pelalegislação brasileira. Das amostras de carne bovina e de avesanalisadas, 13,33% e 20% respectivamente, apresentaram-sefora do padrão estabelecido. Metodologias rápidas e miniaturi-zadas apresentam vantagens sobre a metodologia tradicionalcom diminuição dos custos e menor tempo de análise, proporcionando um diagnóstico fidedigno e com maior rapidez.

Summary: Escherichia coli is considered an emergingpathogen and can cause food-borne illnesses from mild symptoms to the most serious such as hemorrhagic colitis.These bacteria are present in the gastrointestinal tract of animalsand are common to contamination of carcasses and cuts of meatduring slaughter and processing. The traditional method of enumeration of E. coli in food is very time consuming andexpensive, therefore, miniaturized methods are beingresearched by several scientists in the field of microbiology.Furthermore, much interest has occurred by microbiologicalmethods to reduce costs of the application of analytical techniques laboratory products, provided that they have sensitivity and specificity of traditional methodology. In thisresearch, from chuck steak samples (whole and ground) meatand poultry, it listed total coliform and E. coli through minia-turized methodology and compared the results with the

standards established by Brazilian legislation. Samples of beefand poultry examined, 13.33% and 20% respectively, showed up outside the established standard. Rapid and miniaturizedmethods have advantages over the traditional methodology withlower costs and shorter time of analysis, providing an accuratediagnosis and more quickly.

Introdução

A carne bovina é considerada um alimento deorigem animal com elevado teor de proteínas de altovalor biológico, necessárias para a manutenção doestado hígido. Porém, ao cominuir esse alimentonobre com alto valor nutricional, muitos fatorespodem colaborar em comprometer este alimento nosaspectos de inocuidade, pois a moagem ao aumentar a área de superfície, facilita o crescimento e desenvolvimento microbiano. Aliado a este fato, a altamanipulação com baixo padrão higiênico-sanitáriopermite a multiplicação bacteriana e o desenvolvi-mento de bactérias patogênicas como E. coli. A carnede aves é também um alimento de alto valor nutritivoe de grande importância à viabilidade orgânica e recuperação das funções fisiológicas. Porém, devido àexcelente composição nutricional, é um alimentomuito perecível.

Como a Agência Nacional de Vigilância Sanitária(ANVISA), através da Resolução RDC nº 12, de 02 dejaneiro de 2001 (Brasil, 2001), exige a enumeração de coliformes como prova analítica para liberação de carnes bovinas e de aves para consumo, essa enumeração em produtos cárneos é largamentepesquisada por diversos autores na área de microbio-logia, e muitos deles detectaram altas contagensdessas bactérias em carnes bovinas e de aves comodescrito por Leite et al. (1988), Costa et al. (2000),Delú et al. (2006) e Cardoso et al. (2005).

A Escherichia coli é a espécie predominante entre*Correspondência: [email protected]: +55 (21) 26283221/ 26299542/ 88828287

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os diversos microrganismos anaeróbios facultativosque fazem parte da microbiota intestinal de animais desangue quente. O significado da sua presença nos alimentos indica contaminação microbiana de origemfecal e, portanto condições higiênicas insatisfatórias; e o outro aspecto a ser considerado é que diversas linhagens são comprovadamente patogênicas para oHomem e os animais. A enumeração laboratorial de E.coli auxilia na detecção do perigo potencial de umatoxinfecção alimentar através da água e dos alimentosfornecidos ao consumo (Franco e Landgraf, 1996).

O método tradicional da técnica de tubos múltiplospara detecção de coliformes totais e termotolerantes élaborioso e demorado, pois envolve várias etapas presuntiva e confirmativa, levando no mínimo 48horas para identificação presuntiva. Recentemente,novos métodos vêm sendo desenvolvidos como formaalternativa para os métodos convencionais, baseadosna tecnologia de substratos específicos marcados comindicadores cromogênicos e/ou fluorogênicos. Aincorporação desses substratos em um meio seletivopode eliminar a necessidade de subculturas e posteriores testes bioquímicos para identificação decertos microrganismos (Manafi, 2000). SegundoBastholm et al. (2008) e Nikaeen et al. (2009), a bioluminescência baseada em atividade enzimáticapode reduzir potencialmente o tempo de análise debactérias indicadoras, tais como coliformes, em águapotável.

A enumeração de E. coli em alimentos deve ser realizada de forma rápida e fidedigna para que o laudomicrobiológico seja expedido o quanto antes para aliberação do produto no mercado. Desta forma, métodos miniaturizados vêm sendo pesquisados pordiversos cientistas na área de microbiologia. Ao invésda metodologia tradicional de enumeração de coli-formes, que demora em torno de uma semana paraconcluir-se o diagnostico, outros meios de cultuta vêmsendo utilizados para agilizar o procedimento como oCaldo "Fluorocult".

O meio "Fluorocult Broth" é um caldo de enriquecimento seletivo para a detecção simultânea de coliformes totais e E. coli em água e em alimentos.Através da adição de um substrato cromogênico, 5-bromo-4-cloro-3-indolil-D-galactopiranoside (X-GAL), que é quebrado pelos coliformes, e um subs-trato fluorogêncio, 4-metilumberiferi-D-glucoronide(MUG), que é muito específico para E. coli, adetecção simultânea de coliformes totais e E. coli épossível. Este método agiliza o diagnóstico proporcio-nando um resultado em até 24 h de incubação. A presença de coliformes é indicada pela coloraçãoverde azulada do caldo e a E. coli pela fluorescênciaquando visualizada sob iluminação ultavioleta.Posteriormente, a reação do indol confirma a presençade E. coli (Merck, 2007).

Algumas autoridades internacionais em microbiolo-gia alimentar industrial têm desenvolvido trabalhos

enfatizando métodos rápidos, miniaturizados e deautomação para que sejam validados e aceitos interna-cionalmente, tais como os descritos por: Fung e Cox(1981), Cox et al. (1984), Fung et al. (1984), Fung etal. (1988), Ligugnana e Fung (1990).

Nos trabalhos acima aludidos, as modificaçõesinseridas nos métodos aplicados na indústria e comercialização de alimentos, são sumariadas emcinco categorias: aperfeiçoamento da amostragem epreparação das amostras; miniaturização dos procedi-mentos convencionais e desenvolvimento de "kits"para diagnósticos; modificações nos procedimentosde contagem de células viáveis; desenvolvimento denovos métodos para estimar a população microbiana e identificar microrganismos por instrumentos e métodos sofisticados.

Os objetivos desta pesquisa foram enumerar coliformes totais e Escherichia coli, a partir de carnebovina e de aves, comparando os resultados obtidosfrente aos padrões de identidade e qualidade nacionaisvigentes, constantes na Resolução RDC nº 12 e avaliara eficiência da metodologia rápida e miniturizada e domeio fluorogênico para enumeração destas bactérias.

Material e métodos

Foram analisadas quinze amostras de carne bovinainteira, onde o corte selecionado foi o acém, e quinzeamostras desta carne moída adquiridas em estabeleci-mentos comercias incluindo supermercados eaçougues de diferentes níveis sociais do município deNiterói – RJ, totalizando trinta amostras de acém etambém trinta amostras de coxas de frango obtidas emabatedouros e supermercados do Município do Rio deJaneiro, RJ.

As análises bacteriológicas foram realizadas no laboratório de Controle Microbiológico de Produtosde Origem Animal da Faculdade de Veterinária daUniversidade Federal Fluminense, onde foram realiza-dos a enumeração de coliformes totais e de bactériasda espécie Escherichia coli.

Neste projeto foram efetuadas algumas mudançasoperacionais nas técnicas laboratoriais, objetivandomaior rapidez e economia no diagnóstico bacterio-lógico. Os tubos de ensaio foram substituídos por"eppendorf", utilizaram-se pipetadores automáticosacoplados com pontas esterilizadas para preparo einoculações de 0,1 mL (100 µL) das diferentesdiluições em 1 mL (1000 µL) do meio caldo seletivo"Fluorocult". As pontas contidas em "rack" apropriados foram esterilizadas em autoclave a 121 ºC/15 minutos, tal como os meios de cultura, cujo controle da esterilização era confirmado com ouso de ampolas (bioindicador). Foram utilizados 0,9 mL de solução salina peptonada 0,1% paradiluições em série, em "eppendorf" ao invés de 9 mLdesta solução; os meios de cultura foram acondiciona-

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dos assepticamente no volume de 1 mL (1000 µL) aoinvés de 10 mL, em tubos "eppendorf" , no momentode uso. A tabela de Mac Crady (Tabela 1) foi utilizadapara o cálculo do número mais provável. Entretanto, aunidade subamostral permaneceu original (25 ghomogeneizada em 225 mL), isto é, a proporção entrea alíquota semeada e a solução diluente permaneceuconstante 1:10 para não ocorrerem resultados falsonegativos.

A metodologia utilizada para enumeração, isolamen-to e identificação de Escherichia coli foi a descrita porMerck (2000) onde foram pesados assepticamente

25 g da amostra e homogeneizados juntamente com225 mL de solução salina peptonada a 0,1% em"stomacher". Prosseguiu-se fazendo as diluições 10-2,10-3, 10-4,10-5, 10-6 e 10-7. Foram semeadas séries de três"eppendorf" contendo cada um 1 mL (1000 µL) domeio "Fluorocult LMX Broth Modified acc. toMarrafi and Osmer". A incubação foi a 35-37 ºC por 24-48 horas e logo após procedeu-se a leitura einterpretação do teste. Foi determinado o NúmeroMais Provável (NMP), tanto para coliformes totaiscomo para fecais, de acordo com os "eppendorf" posi-tivos. Os "eppendorf" que apresentaram fluorescência

Tabela 1 - Tabela de Mac Crady utilizada para a determinação do número mais provável

Número de Tubos Positivos NMP/g ou mL Intervalo Confiança (95%)

0,1 0,01 0,001 Inferior Superior

0 0 0 <3,0 -.- 9,5

0 0 1 3,0 0,15 9,6

0 1 0 3,0 0,15 11

0 1 1 6,1 1,2 18

0 2 0 6,2 1,2 18

0 3 0 9,4 3,6 38

1 0 0 3,6 0,17 18

1 0 1 7,2 1,3 18

1 0 2 11 3,6 38

1 1 0 7,4 1,3 20

1 1 1 11 3,6 38

1 2 0 11 3,6 42

1 2 1 15 4,5 42

1 3 0 16 4,5 42

2 0 0 9,2 1,4 38

2 0 1 14 3,6 42

2 0 2 20 4,5 42

2 1 0 15 3,7 42

2 1 1 20 4,5 42

2 1 2 27 8,7 94

2 2 0 21 4,5 42

2 2 1 28 8,7 94

2 2 2 35 8,7 94

2 3 0 29 8,7 94

2 3 1 36 8,7 94

3 0 0 23 4,6 94

3 0 1 38 8,7 110

3 0 2 64 17 180

3 1 0 43 9 180

3 1 1 75 17 200

3 1 2 120 37 420

3 1 3 160 40 420

3 2 0 93 18 420

3 2 1 150 37 420

3 2 2 210 40 430

3 2 3 290 90 1000

3 3 0 240 42 1000

3 3 1 460 90 2000

3 3 2 1100 180 4100

3 3 3 >1100 420 -.- Fonte: Brasil, 2003

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verde azulada na presença da luz ultravioleta eramconsiderados coliformes fecais. Por outro lado, os quedemonstraram somente coloração verde azulada, eramtidos como coliformes totais. Para a confirmação,realizou-se a prova do indol nos "eppendorf"Fluorocult positivos, pingando-se gotas de reativo deKovacs sobre o cultivo. Aqueles cultivos que apresen-taram um anel vermelho na superfície foram consider-ados positivos para E. coli.

Resultados e discussão

Para melhor entendimento dos resultados encontradosnas provas analíticas deste experimento, sugere-se aconsulta da Tab. 2 onde consta que, na amostra decarne bovina inteira o número de coliformes totaisvariou de 2,8x102 NMP/g a >1,1x107 NMP/g, e o decoliformes termotolerantes variou de <3 NMP/g a1,5x105 NMP/g. As quinze amostras de carne bovinainteira (100%) apresentavam-se contaminadas por E.coli patogênicas.

Nesta mesma tabela, observa-se para a amostramoída que o número de coliformes totais variou de2,1x102 NMP/g a >1,1x107 NMP/g, e o de coliformestermotolerantes variou de 4,0x10 NMP/g a 7,5x105

NMP/g.Além dos coliformes totais oriundos de ambientes

não fecais, a presença de E. coli, indica que tambémhouve contaminação de origem fecal na produção,processamento, armazenamento inadequado dasamostras e/ou falta de higiene dos manipuladores,

podendo indicar até a presença de enteropatógenos edeterioração potencial do alimento.

De acordo com a Resolução RDC número 12, de 02de janeiro de 2001 (Brasil, 2001), a qual aprova oRegulamento sobre padrões microbiológicos para alimentos, a tolerância para amostra indicativa de coliformes termotolerantes para carne refrigerada é nomáximo 104. Assim sendo, verifica-se que 13,33% dasamostras inteiras apresentaram contaminação por coliformes termotolerantes acima do permitido. Emrelação às amostras moídas, não existe um padrãoespecífico para a quantidade de coliformes termotole-rantes presente na amostra, entretanto comparando-secom a amostra inteira, 26,66% das amostras moídasmostraram-se contaminadas com número acima domáximo permitido.

Kasnowski (2004) apresentou resultados semelhantesquando analisou amostras de carne bovina (alcatra)inteira e moída, através da utilização do caldo"Fluorocult", onde a variação do resultado da enume-ração de coliformes totais e termotolerantes foirespectivamente de 4,0x103 NMP/g a 1,1x106 NMP/ge 0 NMP/g a 2,4x103 NMP/g para carne interia e de4,4x103 NMP/g a 2,5x107 NMP/g e 0 NMP/g a 3,0x105 NMP/g para moída. Leite et al. (1988) analisou diferentes alimentos e observou que 100% asamostras examinadas apresentaram coliformes totaisem contagens significativas e 56% tiveram NMP decoliformes termotolerantes acima de 5,0x102 NMP/g,inclusive as amostras de carne moída que apresen-taram 3,5x104/g coliformes. Resultados semelhantesem análise bacteriológicas de carne bovina também

Tabela 2 - Resultados das análises de coliformes a partir de amostras de cortes de carne bovina (acém, peça inteira e moída)

Amostras inteiras Amostras moídas

CT(NMP) CTer(NMP) CT(NMP) CTer(NMP)

NMP/g NMP/g NMP/g NMP/g

1 3,6x104 1,5x102 1 2,9x103 4,3x102

2 2,8x102 1,5x10 2 1,2x104 9,x102

3 2,4x104 2,3x10 3 >1,1x107 4,3x10

4 5,3x104 7,5x10 4 2,3x103 9,3x10

5 >1,1x107 1,1x10 5 >1,1x107 4,3x10

6 5,3x105 1,5x104 6 2,1x105 7,5x104

7 2,1x104 4,3x10 7 2,1x102 7,0x10

8 2,1x105 1,5x105 8 4,3x103 2,3x103

9 1,5x104 2,3x10 9 3,9x104 3,0x102

10 1,9x105 7,0x103 10 4,4x105 3,0x103

11 >1,1x107 4,0x102 11 >1,1x107 4,0x10

12 1,5x106 7,0x103 12 >1,1x107 7,5x105

13 1,1x107 4,0x102 13 >1,1x107 2,3x104

14 >1,1x107 0,9x10 14 >1,1x107 2,1x104

15 1,5x104 <3 15 4,2x105 4,0x10

MÉDIA 3,1x106 1,2x104 4,5x106 5,8x104

CT – Coliformes totaisCTer – Coliformes termotolerantesNMP – Número mais provávelNMP/g –Unidades Formadoras de Colônia por grama de alimento

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foram encontradas por Costa et al. (2000) ao verificarem que 10% das 30 amostras estavam conta-minadas com coliformes totais, 90% com coliformestermotolerantes e 40% positivas para E. coli.

Conforme resultados encontrados demonstrado naTab. 3, a média do NMP de coliformes termotole-rantes nas amostras de carne de aves analisadas foi9,8x105 NMP/g, variando de <3 NMP/g a 2,9x107

NMP/g, ocorrendo em doze amostras (40%). Na contagem de coliformes totais, a média foi 2,0x107

NMP/g com valores variando de <3 NMP/g a >2,4x108 NMP/g, sendo que somente uma (3,33%)amostra apresentou o menor valor.

Das treze amostras positivas para E. coli, nove(69%) foram adquiridas em abatedouros clandestinos,evidenciando que os cuidados com as práticas higiêni-cas muitas vezes são negligenciados, confirmando operigo da comercialização da carne clandestina e anecessidade de uma inspeção sanitária eficiente.

Dentre as amostras de carne de aves analisadas, 24

(80%) enquadraram-se nos padrões de qualidade eidentidade da legislação vigente, consideradaspróprias para o consumo. Enquanto que seis (20%),obtiveram contagem de E. coli superior ao estabeleci-do pelo padrão (104 NMP/g), sendo cinco delas(83%), provenientes de abatedouros sem inspeção.Delú et al. (2006), avaliaram as condições higiênico-sanitárias de trinta amostras de cortes de frango resfriados, comercializados em dez estabelecimentosdiferentes do município de Lavras - MG e revelaramque 100% das amostras estavam contaminadas comcoliformes totais e fecais, porém dentro dos padrõesestabelecidos pela legislação. Cardoso et al. (2005)também avaliaram a qualidade microbiológica de 29 carcaças e 35 cortes de frango oriundos de abatedouros avícolas de São Paulo, e os valores mínimos e máximos do NMP para coliformes fecaispor grama de carcaça (<3 NMP/g e 9,6x102 NMP/g) ecortes de frango (<3 NMP/g e 11,2 x102 NMP/g) obtidos foram bem mais baixos que o presente

Tabela 3 - Resultados das análises de coliformes de amostras de coxas de frango

Amostra Origem CT (NMP) CTer(NMP)

NMP/g NMP/g

1 Trailer 1,1x105 2,4x104

2 Aviário 2,3x103 2,3x103

3 Supermercado 4,0x103 <3,0

4 Supermercado <3,0 <3,0

5 Supermercado 2,7x104 <3,0

6 Açougue >1,1x106 <3,0

7 Supermercado 4,3x103 9,0x102

8 Supermercado 4,0x102 <3,0

9 Supermercado 1,1x104 7,0x103

10 Supermercado 3,5x104 1,1x104

11 Trailer 2,1x108 2,9x107

12 Açougue 1,1x105 9,3x104

13 Açougue 1,1x107 2,9x105

14 Supermercado 4,0x103 <3,0

15 Supermercado >1,1x106 <3,0

16 Açougue >1,1x107 <3,0

17 Supermercado 2,4x108 <3,0

18 Açougue 6,2x102 <3,0

19 Feira 2,4x105 4,3x103

20 Supermercado 2,3x103 <3,0

21 Supermercado 4,3x104 <3,0

22 Supermercado 1,5x104 <3,0

23 Supermercado 2,8x104 2,3x103

24 Feira 2,0x105 9,3x103

25 Feira >1,1x108 9,3x103

26 Supermercado 2,9x105 <3,0

27 Aviário 2,4x107 4,3x104

28 Aviário 4,0x102 <3,0

29 Feira 2,4x105 <3,0

30 Açougue 9,3x103 <3,0

Média 2,0x107 9,8x105

CT – Coliformes TotaisCF – Coliformes termotolerantes

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trabalho, todas consideradas próprias para o consumo.A metodologia rápida e miniaturizada mostraram-se

eficiente para enumeração de coliformes totais e E.coli nas amostras de carne bovina e de aves, podendoser utilizada de forma rotineira nas pesquisas micro-biológicas de alimentos por ser um método mais rápido,econômico e com sensibilidade e especificidadesemelhantes a metodologia tradicional. Estudo préviorealizado por Beloti et al. (2002) em amostras de leite,também revelou eficiência do caldo "Fluorocult" paraenumeração de coliformes, com a vantagem de serfacilmente utilizado e requerer menor tempo deanálise do que a metodologia convencional. Gleissleret al. (2000) e Suwansonthichai e Rengpipat (2003)compararam a eficiência destes métodos rápidos comos convencionais em amostras de água do mar ecamarão, respectivamente, e concluíram que o meio"Fluorocult" é sensível e específico na determinaçãode E. coli, sendo uma alternativa apropriada na enu-meração deste microrganismo.

Manafi e Kremsmaier (2001) compararam dife-rentes meios de cultura fluorogênicos/cromogênicospara detecção de E. coli O157:H7 com o ágar conven-cional Mac Conkey Sorbitol e relataram que na análisede amostras de alimentos, o ágar Mac Conkey Sorbitolapresentava 57,3% de resultados falso positivos,enquanto que o ágar "Fluorocult" O157:H7 6,2%,indicando comportamento insatisfatório do ágar convencional.

Na pesquisa realizada por Mantilla et al. (2005)onde comparou-se a eficiência do método fluoro-gênico (meio "Fluorocult") utilizando-se tubos"eppendorf" para a enumeração de coliformes fecaiscom a metodologia tradicional em amostras de frangoresfriadas, foi comprovada a inexistência de diferençaestatisticamente significativa entre os dois métodos,concluindo-se, assim, que este método rápido pode serutilizado para a enumeração de coliformes fecais, possuindo a vantagem de ser um método mais práticoe econômico.

E de acordo com o resultado obtido por Bastholm etal. (2008) em seu estudo, a análise de água potávelapresentou resultados comparáveis para enumeraçãode coliformes através da técnica tradicional, Colilert-18 e da bioluminescência com o Caldo "Fluorocult".

No trabalho desenvolvido por Dogan et al. (2002),comparou-se a metodologia tradicional (tubos múltiplos com o Caldo LST) para enumeração de E.coli com o método fluorogênico rápido (MUG) em500 amostras de alimentos. Foi encontrada uma conformidade entre os dois métodos em 81,8% dasamostras analisadas, em 16,2% das amostras houveum resultado numericamente maior no método fluorogênico. De acordo com a análise estatística realizada por esses autores, através do coeficiente decorrelação de Pearson e teste do qui-quadrado, foiconstatada uma diferença significativa entre os doismétodos, indicando que o método rápido foi mais

confiável que o tradicional, visto que das 500amostras analisadas, 409 (81,8%) apresentaram resultados idênticos para os dois métodos, enquanto81 (16,2%) apresentaram valores mais elevados nacontagem bacteriana pelo método rápido e apenas 10(2,0%) apresentaram maiores valores de contagempelo método tradicional.

Nikaeen et al. (2009) comparou o desempenho de caldo LMX ("Fluorocult") como um ensaio enzimático com a metodologia tradicional dos tubosmúltiplos para a detecção de coliformes em amostrasde água potável. Das 50 amostras testadas, 8 (16%) e7 (14%) continham coliformes totais e E. coli, comoindicado pelas duas técnicas. Embora em média, acontagem de coliformes totais e E. coli foi mais altasno método LMX, não houve diferença significativa.Esses autores concluíram que o ensaio enzimáticodemonstrou ser um método rápido e menos dispendioso, permitindo a detecção simultânea de coliformes totais e E. coli.

Conclusões

Verificou-se que 13,33% das amostras de carne bovina inteiras apresentaram contaminação por coliformes termotolerantes acima do permitido pelalegislação brasileira, não sendo consideradas aptaspara consumo. Em relação às amostras moídas, nãoexiste um padrão específico para este grupo bacteria-no, entretanto comparando-se com a amostra inteira,26,66% das amostras moídas mostraram-se contami-nadas com número acima do máximo permitido.

Das treze amostras de carne de frango, 24 (80%) seenquadraram nos padrões de qualidade e identidade dalegislação vigente, enquanto que seis (20%), obtiveramcontagem de E. coli superior ao estabelecido pelopadrão (104), sendo portanto, impróprias ao consumo.Fato este, que deve servir como alerta às autoridadessanitárias, sendo motivo de maior fiscalização aosestabelecimentos, principalmente sobre os clandestinos.

A metodologia miniaturizada foi eficaz na enume-ração de coliformes totais e termotolerantes quer sejaem amostras inteiras e moídas de carne bovina e decarne de aves, pois em nenhuma delas ocorreu resultado falso negativo. Nesta metodologia pode serobservado que o NMP do coliforme total foi sempresuperior ao NMP do coliforme termotolerante, o queconclui-se que além de coliformes totais oriundos deambientes não fecais, também houve contaminação noprocessamento tecnológico de obtenção das amostraspor coliformes termotolerantes que denotam contami-nação de origem fecal.

Além disso, a miniaturização tornou o procedimentotécnico mais fácil e minimizou os riscos de manipu-lação; as pontas e pipetas automáticas otimizaram atécnica por reduzir o tempo no preparo das diluições e

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os riscos de acidentes quando se trabalha com pipetasde vidro; a redução dos volumes de solução salinapeptonada de 9 mL para 0,9 mL (900 µL) e dos meiosde cultura de 10 mL para 1 mL (100 µL), econo-mizaram em 10 vezes as quantidades utilizadas,reduzindo os custos.

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Ocorrência de Escherichia coli em suínos abatidos nos Estados do Rio deJaneiro, Minas Gerais, Paraná e Santa Catarina utilizando diferentesmetodologias de isolamento

Occurrence of Escherichia coli in pigs slaughtered in the states of Rio deJaneiro, Minas Gerais, Paraná and Santa Catarina using different methodologies of isolation

Robson M. Franco*, Samira P. S. Mantilla, Raquel Gouvêa, Luiz A. T. de Oliveira

Universidade Federal Fluminense

R E V I S T A P O R T U G U E S A

CIÊNCIAS VETERINÁRIASDE

RPCV (2008) 103 (567-568) 209-218

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Resumo: No mundo inteiro, ultimamente tem ocorrido surtosde doenças transmissíveis por alimentos tendo como agente etiológico cepas de Escherichia coli, colocando em alerta oserviço de vigilância sanitária de alimentos e a comunidadecientífica, havendo necessidade de suporte para inspeção sanitária de métodos de análises bacteriológicas em produtos deorigem animal, para diagnóstico completo e definitivo. Apesquisa teve como objetivo enumerar, isolar e identificar sorogrupos de E. coli em 100 amostras de suínos abatidos emmatadouro mediante aplicação de quatro metodologias diferentes. Entre os tipos de amostras comestíveis analisadas,aquelas que apresentaram menor e maior enumeração de E. coliforam as da cavidade torácica e as da cavidade pélvica respecti-vamente. O método que possibilitou o isolamento de maiornúmero de colônias foi o de Mehlman e Lovett (1984) modificado. Foram isolados sorogrupos EPEC, EIEC e EHEC.A reação de polimerase em cadeia demonstrou a presença deestirpe O157:H-. A presença dos sorogrupos de E. coli nasamostras comestíveis, ressalta a necessidade de se colocar emprática o sistema nacional e internacional da inocuidade de produtos de origem animal, para que a carne suína não sejaveiculadora de enfermidades transmissíveis por alimentos,tendo como agente etiológico sorogrupos patogênicos ou oportunistas de E. coli, e que através de dejetos industriais, nãotratados, estas cepas, inclusive O157:H-, não seja inserida nacadeia alimentar.

Palavras-chave: Escherichia coli, comparação de métodos,carne suína

Summary: Recently, throughout the world, there have been outbreaks of diseases transmissible through food, whose etiological agents are variants of E. coli, putting food safetyservices and the scientific community on alert, with the consequent need to support the sanitary inspection services withmethods of bacteriological analysis of products of animal

origin, for complete and definitive diagnosis. This study aimedto enumerate, isolate and identify serum groups of E. coli in 100 samples of swine collected in slaughterhouse through application of four different methodologies. Among the types ofsamples analyzed, those that had lower and higher enumerationof E. coli were the thoracic cavity and pelvic cavity respectively.The method which allowed the isolation of the highest numberof colonies was that of Mehlman and Lovett (1984) modified.The serum groups EPEC, EIEC and EHEC were isolated. Thepolymerise chain reaction technique showed the presence ofvariant O157:H-. The presence of serum groups of E. coli in thesamples highlights the need to put into practice the national andinternational system of safety of products of animal origin, sothat pork will not be a source of illness caused by etiologicalagents such as pathogen or opportunistic E. coli, and thatthrough non-treated industrial waste these variants, includingO157:H-, do not contaminate the food chain.

Keywords: Escherichia coli, comparative methods, pork meat

Introdução

A carne suína pode sofrer contaminações e possíveis alterações bacterianas em função de fatoresintrínsecos e extrínsecos tais como: sanidade animal,criação zootécnica (raça, tipo de manejo, alimentação,prevenção de doenças pelo uso adequado de vacinas);pH, potencial de oxi-redução e umidade da própriacarne. Estes fatores podem determinar contaminaçõescruzadas, resultando em carnes com elevada cargabacteriana e possível contaminação de origem fecal,onde a Escherichia coli se destaca no cenário nacionale internacional como um microrganismo de importân-cia em sanidade animal, higiênico-sanitária e saúdecoletiva.

A espécie bacteriana denominada Escherichia coli éum bastonete Gram negativo, não esporulado, oxidasenegativa, móvel por flagelos peritríquios ou nãomóvel, anaeróbia facultativa capaz de fermentar a

*Correspondência: [email protected]: + 55 (21) 2629 9045

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glicose e a lactose com produção de ácidos e gases,pertencente à família Enterobacteriaceae (Acha eSzyfres, 2001).

Com base nos fatores de virulência, manifestaçõesclínicas, epidemiologia e sorotipagem, as estirpes deE. coli consideradas patogênicas são agrupadas emcinco classes: EPEC (E. coli enteropatogênica clássica), EIEC (E. coli enteroinvasora), ETEC (E.coli enterotoxigênica), EHEC (E. coli entero-hemor-rágica) e EAggEC (E. coli enteroagregativa), sendoque a E. coli patogênica pode ser diferenciada das variedades não patogênicas através da imunologia e deoutros métodos incluindo a sorotipagem essencialpara os estudos epidemiológicos (Trabulsi e Toledo,1989).

No Brasil, EPEC é responsável por cerca de 30%dos casos de diarréia aguda em crianças pobres comidade inferior a seis meses, com predominância dossorotipos O111:[H-], O111:[H2], O119:H6 e O55:H6.As bactérias pertencentes ao grupo ETEC são importantes causas de diarréia. A doença atinge pes-soas de todas as faixas etárias, sendo considerados umdos principais agentes etiológicos da chamada "diarréia dos viajantes", acometendo indivíduos quese locomovem de áreas desenvolvidas para regiõescom problemas de saneamento básico (Franco eLandgraf, 2008).

A Escherichia coli sorotipo O157:H7, tida comouma bactéria emergente, causa um quadro agudo decolite hemorrágica, através da produção de grandequantidade de toxina, provocando severo dano àmucosa intestinal. O quadro clínico é caracterizadopor cólicas abdominais intensas e diarréia, inicial-mente líquida, mas que se torna hemorrágica na maioria dos pacientes. A doença é auto-limitada, comduração de 5 a 10 dias. Aproximadamente 15% dasinfecções por E. coli O157:H7, especialmente em crianças menores de cinco anos e idosos, podem apresentar uma complicação chamada SíndromeHemolítica Urêmica (SHU), caracterizada por destrui-ção das células vermelhas do sangue e falência renalque pode ser acompanhada de deterioração neurológicae insuficiência renal crônica (Divisão de Doenças deTransmissão Hídrica e Alimentar, 2009).

As técnicas convencionais de cultivo compreendema fase de recuperação da célula danificada, enriqueci-mento seletivo, plaqueamento seletivo e técnicasorológica para a detecção específica de Escherichiacoli produtora de diarréia (diarreiogênica). Inúmerosmeios líquidos são usados para enriquecimento seletivo de Escherichia coli. Os mais comumente usados são caldo EC e caldo lauril sulfato; que possuem agentes seletivos como verde brilhante e bile,e lauril sulfato de sódio respectivamente (Merck,1994). Usa-se ainda caldo MacConkey e caldo GN(Varnam e Evans, 1996).

O sorotipo O157:H7 possui características fenotípi-cas que são utilizadas no desenvolvimento de meios

seletivos para seu isolamento. MacConkey-sorbitolágar foi desenvolvido para isolamento e identificaçãopresuntiva deste sorotipo incapaz de fermentar o sorbitol em 24 horas (CDC, 2000).

A Reação de Polimerização em Cadeia (PCR) é ummétodo rápido, sensível e específico, freqüentementeusado para determinar a presença de patógenos emhumanos, bovinos e alimentos. Recentemente,numerosos grupos têm desenvolvido protocolos PCRmultiplex usando dois ou mais pares de "primer" paraaumentar a especificidade para identificação deEscherichia coli O157:H7, mantendo sua habilidadeem detectar outros sorotipos (Franco & Landgraf,1996; Gomes et al., 1999). De acordo com Kawasakiet al. (2009), a PCR é um método valioso de avaliaçãorápida para a detecção de E. coli O157:H7 em alimen-tos, incluindo produtos cárneos.

Após a reflexão da importância que a E. coli vemocupando na higiene de produtos de origem animal, naanálise de perigos e pontos críticos de controle e nocontrole de qualidade bacteriológica desses produtos,foi desenvolvida pesquisa com objetivo de avaliar aocorrência de Escherichia coli em 100 amostras desuínos abatidos em matadouros e isolar e identificarsorogrupos de E. coli, mediante aplicação de quatrometodologias diferentes: método 1 - Enumeração decoliformes, onde utilizou-se a metodologia descritapor Hitchins et al. (1995) e Kornacki e Johnson(2001); método 2 - Método SimplateTM para coli-formes totais e Escherichia coli, o qual seguiu asrecomendações descritas por Townsend et al. (1996);método 3 - Isolamento e diferenciação de estirpesenterohemorrágicas (EHEC) e Escherichia coliO157:H7, onde utilizou-se a metodologia preconizadapela Merck (1996); método 4 - Pesquisa de colôniasde Escherichia coli enteropatogênica que utilizou-se ametodologia descrita por Mehlman e Lovett (1984)com algumas modificações.

Material e métodos

Foram analisadas, após a divisão de 20 animais emmeias carcaças, 100 amostras de carne suína, sendo 20amostras da região interna da papada (correspondenteà área de ferida de sangria), 20 de pleura e músculosintercostais (cavidade torácica entre 4ª e 7ª costelas),20 da cavidade pélvica (região sub-sacral próxima àbase da cauda), 20 de linfonodos mesentéricos e 20 defezes da região íleo-ceco-cólica de suínos escolhidosaleatoriamente, abatidos em abatedouro frigorífico,sob a Inspeção Estadual, clinicamente saudáveis e julgados aptos para o consumo após inspeção "ante epost - mortem", e provenientes dos estados do Rio deJaneiro (Magé e Rio Bonito), Minas Gerais, Paraná eSanta Catarina. Sendo que os linfonodos mesentéricose fezes que foram obtidas antes da divisão, em bolsasplásticas para "stomacher" esterilizadas. Dos dife-

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rentes pontos de obtenção das amostras, somenteforam semeadas subamostras da parte carnosa, pois aparte gordurosa sempre foi retirada assepticamente,através de bisturis e lâminas esterilizadas edescartáveis. No caso dos linfonodos houve a totalseparação do "epíploon" e gordura.

As amostras foram, então, identificadas, numeradase transportadas sob refrigeração (em caixa isotérmicasob ação indireta do gelo) ao laboratório onde forammantidas congeladas a -18 ºC, em conformidade como armazenamento das carnes suínas, até o momentoem que foram descongeladas "over night", emgeladeira, a 2 ºC para serem analisadas bacteriologica-mente.

Foram utilizados quatro métodos, no método 1 (enumeração de coliformes) utilizou-se a metodologiadescrita por Hitchins et al. (1995) e Kornacki eJohnson (2001). Esta metodologia foi usada nasamostras de carne da região interna da papada corres-pondente à área de ferida de sangria, da cavidade torácica entre 4ª e 7ª costelas, e da cavidade pélvicapor estar em concordância com o protocolo dospadrões microbiológicos de identidade e qualidadevigentes (Brasil, 2001). Essa metodologia é divididaem teste presuntivo onde 25 gramas da amostra foramhomogeneizadas com 225 mL de Solução FosfatadaTamponada (SFT) de Butterfield e realizaram-se asdiluições e o Caldo Lauril Sulfato (CLS), teste confir-mativo onde o subcultivo de cada tubo positivo deCLS foi transferido para tubos contendo Caldo VerdeBrilhante Bile Lactose "VBBL" e tubos com CaldoEC contendo um tubo de Durham invertido. Analisou--se a produção de gás, registrando-se os tubos positivos de cada diluição a partir dos quais foi calcu-lado o Número Mais Provável (NMP) de coliformestotais e termotolerantes por grama da amostra, conforme Tabela 1. Posteriormente, realizou-se o testecompleto onde usou-se o Ágar Eosina Azul deMetileno Lactose, de onde foram selecionadas colônias típicas e procedeu-se a bacterioscopia porimersão para verificar-se a presença de bastões Gramnegativos. Foram realizadas as seguintes provas bioquímicas: Ágar SIM, Ágar Tríplice Açúcar Ferro,Agar Citrato de Simmons. Vermelho de metila, VogesProskauer, oxidação e fermentação do sorbitol, oxidação e fermentação do manitol, oxidação e fermentação da celobiose, descarboxilação da l-orniti-na, Ágar EPM, Ágar MILI. As colônias típicas foramestocadas em caldo Infusão Cérebro Coração com20% de glicerol à temperatura de -20 ºC, para emseguida serem sorotipadas. Para a soroaglutinação emplaca com anti-soros poli e monovalentes seguiu-se ametodologia descrita por Ewing (1986). A confir-mação bioquímica dos isolados foi verificada pelo sistema API20 E utilizado conforme especificação dofabricante.

O método 2 (Método SimplateTM para coliformestotais e Escherichia coli) seguiu as recomendações

descritas por Townsend et al. (1996), sendo usada nasmesmas amostras de carne suína citadas para o método 1. A tampa da base da placa do Simplate foiremovida em condições de esterilidade, sendo doismililitros do homogeneizado vertidos na plataformacentral da base da placa e imediatamente foram adicionados 10 mL do meio para coliformes totais eEscherichia coli. O conteúdo da placa (homogeneiza-do + meio) foi distribuído uniformemente pelas con-cavidades girando-se gentilmente a placa no sentidohorário e anti-horário. Procedeu-se à incubação dasplacas invertidas por 24 horas à 37 ºC. Após esteperíodo, as concavidades coloridas (do laranja ao vermelho) foram contadas e consideradas positivaspara coliformes totais. Paralelamente, a placa foiexposta à radiação ultravioleta a para contagem dasconcavidades fluorescentes consideradas positivaspara Escherichia coli. As concavidades coloridas quenão fluoresciam foram positivas para coliformestotais, porém negativas para Escherichia coli. Onúmero de concavidades coloridas e o número de concavidades fluorescentes foi comparado com atabela de NMP para obter-se o NMP de coliformestotais e Escherichia coli, respectivamente.

No método 3 (Isolamento e diferenciação de estirpes enterohemorrágicas (EHEC) e Escherichiacoli O157:H7), utilizou-se a metodologia preconizadapela Merck (1996), sendo aplicado nas mesmasamostras de carne suína citadas para o método 1 etambém nos linfonodos mesentéricos e fezes da regiãoíleo-ceco-cólica. Para o preparo, 25 gramas de cadatipo de amostra que foram acondicionadas em bolsa"stomacher" e adicionadas de 225 mL de caldo LaurilSulfato sendo homogeneizadas. O homogeneizado foiincubado por 24 horas à 37 ºC e foram semeados 0,1 mL do subcultivo crescido no caldo, na superfíciede Agar Escherichia coli O157:H7 fluorocult em pla-cas. As colônias sorbitol negativas ou positivas foramanalisadas mediante uma lâmpada Ultra Violeta comreferência à formação de fluorescência. As colôniassorbitol negativas ou positivas, com ou sem fluorescência e isoladas, foram identificadas porbiotipificação e testes sorológicos conforme descritosanterioremente.

Para o método 4 (Pesquisa de colônias deEscherichia coli enteropatogênica) utilizou-se ametodologia descrita por Mehlman e Lovett (1984)com algumas modificações, sendo analisada as mesmas amostras referidas no método 2. As amostrasanalisadas foram pesadas em 25 gramas e acondicio-nadas em bolsa "stomacher", adicionadas de 225 mLde Caldo Infusão Cérebro Coração. O homogeneizadofoi transferido para um frasco Erlenmeyer de capaci-dade de 500 mL e incubado por três horas à 35 ºC paraa recuperação das células danificadas. Foi feita asemeadura direta em placas contendo Ágar EosinaAzul de Metileno Lactose seg Levine, ÁgarMacConkey Sorbitol, Ágar Telurito Cefixima Sorbitol

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MacConkey, Ágar Escherichia coli O157:H7Fluorocult e Ágar "Hemorrhagic colitis" isento de MUG. Sendo todos os meios incubados por 18 - 24 horas à 35 ºC. Posteriormente foi feito um enriquecimento seletivo para isolar Escherichia colienteropatogênica com o Caldo Triptona Fosfato comdupla concentração e incubados à 44 ºC ± 0,2 ºC por20 horas. O subcultivo crescido no Caldo foi semeadonos mesmos meios utilizados na semeadura direta. Porfim foi realizada a biotipificação conforme anterior-mente descrito.

A colônia sorotipada como EHEC foi testada paraPCR, utilizando-se PCR multiplex para os genes"shiga toxin" stx1, stx2, eaeA sendo PCR1 segundoChina et al. (1996) e PCR2 segundo Paton e Paton(1998) no Laboratório de Microbiologia e Imunologiada Faculdade de Ciências Médicas da Universidade doEstado do Rio de Janeiro (UERJ), usando-se a amostrade Escherichia coli K-12DH5∝ como controle negativo e as amostras Escherichia coli E40705(O157:H7, stx1/eaeA) e Escherichia coli E30138(O157:H7, stx2/eaeA) como controles positivos, sendoestas oriundas da CPHL-UK.

Para a amplificação dos genes que codificam a subunidade A de stx1, a subunidade A stx2 (incluindoas variantes conhecidas de stx2) e a região do gene quecodifica eaeA, foram utilizados os "primers" descritosoriginalmente por China, Pirson e Mainil (1996).Estes "primers" foram originalmente denominadosstx1-F(5’AGA GCG ATG TTA CGG TTT G 3’) e stx1-R(5’ TTG CCC CCA GAG TGG ATG 3’); stx2-F(5’ TGG GTT TTT CTT CGG TAT C3’); stx2-R(5’ GAC ATT CTG GAC TCT CTT 3’) e EP1(5’ AGGCTT CGT CAC AGT TG 3’) e EP2 (5’ CCA TCG TCACCA GAG GA 3’) para eaeA. O produto da amplifi-cação da seqüência stx1 consiste em um fragmento deDNA com peso molecular de 388 pb, da seqüênciastx2 em fragmento de 807 pb da seqüência eaeA emfragmento de 570 pb. A análise dos fragmentos amplificados procedeu-se em eletroforese, em gelagarose a 1,8% por 50 minutos em 130v/130mA, combrometo de etídeo (5 mg/mL). Para aumentar a densidade do DNA, facilitar a dispersão das bandas eacompanhamento da corrida acrescentou-se o coranteazul de bromofenol. Observaram-se os brancos emaparelho transiluminador e fotografaram-se as bandasem câmara polaróide.

Resultados

Enumeração de coliformes, coliformes fecais eEscherichia coli – métodos 1 e 2

Nas amostras da região interna da papada corres-pondente à área de ferida de sangria para o método 1a variação de coliformes, coliformes fecais eEscherichia coli foi respectivamente < 2 UFC/g a

46 UFC/g, < 2 UFC/g a 33 UFC/g e de ausência a 33 UFC/g, sendo que cinco (25%) amostras, quatro(20%) amostras e quatro (20%) amostras estavam contaminadas por coliformes, coliformes fecais eEscherichia coli, respectivamente. Para fins estatísti-cos o NMP < 2 UFC/g foi considerado como zero,pelo fato de tal resultado oferecer a combinação de 0 – 0 – 0 na primeira, segunda e terceira séries, respec-tivamente, significando ausência de crescimento(Tabela 1). O NMP de coliformes fecais foi o mesmode Escherichia coli, pois todos coliformes fecaisforam identificados como Escherichia coli.

O NMP para o método 2 teve variação, respectiva,de coliformes totais e Escherichia coli de zero (ausência) a 28 UFC/g e de zero (ausência) a 18 UFC/g, nas amostras. Cinco (25%) amostrasestavam contaminadas por coliformes totais eEscherichia coli.

As amostras da cavidade torácica entre 4ª e 7ª costelas apresentaram-se contaminadas por coli-formes, as demais estavam isentas deste grupo. Emnenhuma das amostras foram encontrados coliformesfecais ou Escherichia coli. Para o método 2, duas(10%) amostras apresentaram-se contaminadas porcoliformes totais (dois coliformes por amostra) e emnenhuma amostra foi detectada a presença de coliformes fecais ou Escherichia coli.

Pelo método 1, para as amostras da cavidade pélvica, os coliformes, coliformes fecais e Escherichiacoli, variaram respectivamente de < 2 UFC/g a 1600UFC/g, de < 2 UFC/g a 1600 UFC/g e de ausência a 1600 UFC/g, cujo percentual de contaminação ocorreu em 14 (70%) amostras para os respectivosmicrorganismos. O NMP dos coliformes fecais foi omesmo de Escherichia coli e todos os coliformesfecais foram identificados como Escherichia coli.Considerando-se o método 2, o NMP para coliformestotais e Escherichia coli, variou de zero a 276 UFC/g,e de zero a 195 UFC/g, respectivamente; sendo queem treze (65%) amostras foram encontrados osmicrorganismos em questão.

Isolamento e diferenciação de estirpes enterohemorrágicas (EHEC) e Escherichia coliO157:H7 – método 3

O número de colônias suspeitas de Escherichia colinas diferentes amostras pelo método 3, foram asseguintes: na região interna da papada correspondenteà área de ferida de sangria 18 (sendo nenhuma EHEC e nem EPEC), na cavidade torácica entre 4ª e 7ª costelas 20 (sendo nenhuma EHEC e nem EPEC); nacavidade pélvica 24 (sendo nenhuma EHEC e nemEPEC); nos linfonodos mesentéricos 36 sendo 1EPEC e nas fezes 48 sendo 1 EHEC, deixando claroque dentre os tipos de amostras que são usadas paraconsumo, àquelas oriundas da cavidade pélvica apre-sentaram maior número de colônias confirmadas,

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Tabela 1- Tabela de Mac Crady utilizada para a determinação do número mais provável

Número de Tubos Positivos NMP/g ou mL Intervalo Confiança (95%)

0,1 0,01 0,001 Inferior Superior

0 0 0 <3,0 -.- 9,5

0 0 1 3,0 0,15 9,6

0 1 0 3,0 0,15 11

0 1 1 6,1 1,2 18

0 2 0 6,2 1,2 18

0 3 0 9,4 3,6 38

1 0 0 3,6 0,17 18

1 0 1 7,2 1,3 18

1 0 2 11 3,6 38

1 1 0 7,4 1,3 20

1 1 1 11 3,6 38

1 2 0 11 3,6 42

1 2 1 15 4,5 42

1 3 0 16 4,5 42

2 0 0 9,2 1,4 38

2 0 1 14 3,6 42

2 0 2 20 4,5 42

2 1 0 15 3,7 42

2 1 1 20 4,5 42

2 1 2 27 8,7 94

2 2 0 21 4,5 42

2 2 1 28 8,7 94

2 2 2 35 8,7 94

2 3 0 29 8,7 94

2 3 1 36 8,7 94

3 0 0 23 4,6 94

3 0 1 38 8,7 110

3 0 2 64 17 180

3 1 0 43 9 180

3 1 1 75 17 200

3 1 2 120 37 420

3 1 3 160 40 420

3 2 0 93 18 420

3 2 1 150 37 420

3 2 2 210 40 430

3 2 3 290 90 1000

3 3 0 240 42 1000

3 3 1 460 90 2000

3 3 2 1100 180 4100

3 3 3 >1100 420 -.-

Fonte: Brasil, 2003

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Tabela 2 - Eficiência dos diferentes tipos de meios empregados no método 4 (semeadura direta e enriquecimento) nos diferentes tiposde amostras, para isolamento de E. coli

Tipo Tipo EMB Mac Mac TC- O157:H7 HC35°C HC44,5°C Total

de amostra de semeadura Lac Sorb Smac (colônias)

Direta 6 4 2 0 0 4 4 20

Enriquecimento 28 26 16 2 11 7 11 101

Direta 0 0 0 0 0 0 0 0

Enriquecimento 30 24 20 6 22 30 21 153

Direta 10 6 0 0 0 0 0 16

Enriquecimento 22 48 34 10 57 28 39 238

Direta 12 6 11 0 0 6 6 41

Enriquecimento 33 42 42 0 48 27 30 222

Direta 18 24 12 0 12 24 12 102

Enriquecimento 30 42 36 6 36 42 36 228

Total 189 222 173 24 186 168 159 1121

Meio de cultura Desvio padrão Mediana Média *

EMB 4,09 30 26,6 a

Mac Lac 10,71 42 36,4 a

Mac Sorb 11,08 34 29,6 a

TC-Smac 3,89 6 4,8 b,c

O157:H7 18,70 36 34,8 a,c

HC 35 °C 12,59 28 26,8 a

HC 44,5 °C 11,45 30 27,8 a

* Letras iguais: não há diferenças; e letras diferentes; têm diferenças estatíticas significativas (p<0,05)

Sendo:A- Região interna da papada correspondente à área de ferida de sangriaB- Cavidade torácica entre 4ª e 7ª costelas (pleura e músculos intercostais) C- Cavidade pélvica (região sub-sacral próxima à base da cauda) D- Linfonodos mesentéricos (região íleo-ceco-cólica)E- Fezes (região íleo-ceco-cólica)

porém, nenhuma delas pertence às categorias EPECou EHEC.

Pesquisa de Escherichia coli enteropatogênica(Mehlman e Lovet, 1984c) modificado – método 4

Encontra-se na Tabela 2 o número de colônias deEscherichia coli confirmadas por tipo de amostra nométodo acima mencionado, onde o número de colô-nias isoladas por enriquecimento sempre foi superiorao número de colônias isoladas por plaqueamentodireto.

O meio Ágar Escherichia coli O157:H7 e MeioMacConkey sorbitol apresentaram número maior eigual de sorogrupos identificados entre os meios deplaqueamento testados. Pela análise de variância osdados não apresentaram diferença significativa entresi.

Na Tabela 3 é encontrado o número de colônias suspeitas e confirmadas pelos métodos um, três e quatro onde no método 4 sempre houve maior númerode colônias suspeitas e confirmadas pela semeadura,após enriquecimento, do que pela semeadura direta,sendo que das 1584 colônias suspeitas, 59,47%

(942/1584) foram confirmadas.Pela análise estatística houve diferença significativa

(p<0,05) entre os tipos de métodos utilizados no isolamento e identificação de Escherichia coli. Taisdiferenças entre os métodos pelo teste de Tukey-Kramer, ocorreram entre Met1cT X Met4B, Met1cF XMet4B, Met3 X Met4B. Considerando-se que entre osmétodos testados, o método 4 foi o que apresentou omaior número de colônias confirmadas.

Na Tabela 4 é encontrado o número de colônias isoladas em cada um dos meios de plaqueamento seletivo quer seja por plaqueamento direto quer porenriquecimento em cada tipo de amostra pesquisada.Pela análise de variância houve diferença estatísticasignificativa (p<0,05) entre a semeadura direta eenriquecimento independentemente do tipo de meiode plaqueamento usado. Não ocorreu diferençaestatística significativa entre os tipos de meios usadosnas semeaduras entre os diferentes tipos de amostrasanalisadas. Isto possivelmente, foi prejudicado pelagrande quantidade de zeros (resultados negativos).

Pelo método de Tukey-Kramer houve diferença(P<0,05) entre: EMB e TC-SMAC, MAC-LAC e TC-SMAC, MAC SORB e TC-SMAC, TC-SMAC eO157:H7.

Utilizou-se PCR em apenas um isolamento identifi-

A

B

C

D

E

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Tabela 3 - Ocorrência de colônias H2S (+) e de sorogrupos de Escherichia coli identificados nos diferentes métodos analíticosbacteriológicos aplicados

Método Total Colônias Colônias (+) Sorologiade colônias H2S (+) nos T.B. EPEC EIEC EHEC Total

Mét.1 CT 66 39 27 0 0 0 0

Mét.1 CF 78 17 61 0 0 0 0

Mét.2* 0 0 0 0 0 0 0

Mét.3 264 118 146 1 0 1 2

Mét.4A 306 121 185 2 1 0 3

Mét.4B 1584 642 942 9 3 0 12

2298 937 1361 12 4 1 17

* Mét2 foi excluído da análise estatística por diferença discrepante dos demais, por apresentar valores iguais a zero.

Método Desvio padrão Mediana Média * *

Mét.1 CT 27,39 33 33,00 a

Mét.1 CF 36,56 39 39,00 a

Mét.3 107,57 132 132,50 a

Mét.4A 126,43 153 153,75 a,b

Mét.4B 653,36 792 795,00 b

* * Letras iguais; não há diferenças; e letras diferentes: têm diferenças estatísticas significativas (p<0,05).

Tabela 4 - Eficiência dos diferentes tipos de meios empregados no método 4 (semeadura direta e enriquecimento) nos diferentes tiposde amostras, para isolamento de E. coli.

Tipo Tipo EMB Mac Mac TC- O157:H7 HC35°C HC44,5°C Total

de amostra de semeadura Lac Sorb Smac (colônias)

Direta 6 4 2 0 0 4 4 20

Enriquecimento 28 26 16 2 11 7 11 101

Direta 0 0 0 0 0 0 0 0

Enriquecimento 30 24 20 6 22 30 21 153

Direta 10 6 0 0 0 0 0 16

Enriquecimento 22 48 34 10 57 28 39 238

Direta 12 6 11 0 0 6 6 41

Enriquecimento 33 42 42 0 48 27 30 222

Direta 18 24 12 0 12 24 12 102

Enriquecimento 30 42 36 6 36 42 36 228

Total 189 22 17 24 186 168 159 1121

Meio de cultura Desvio padrão Mediana Média *

EMB 4,09 30 26,6 a

Mac Lac 10,71 42 36,4 a

Mac Sorb 11,08 34 29,6 a

TC-Smac 3,89 6 4,8 b,c

O157:H7 18,70 36 34,8 a,c

HC 35°C 12,59 28 26,8 a

HC 44,5°C 11,45 30 27,8 a

* Letras iguais: não há diferenças; e letras diferentes; têm diferenças estatíticas significativas (p<0,05).

A

B

C

D

E

cado sorologicamente como EHEC-O157, pois apesar do mesmo apresentar-se como sorbitol positivoe MUG positivo, comportou-se negativamente frenteaos sorogrupos pertencentes às categorias (EPEC A,EPEC B, EPEC C, EIEC A e EIEC B). A sorologiapositiva foi também confirmada em testagem noLaboratório de Microbiologia e Imunologia daFaculdade de Ciências Médicas da Universidade doEstado do Rio de Janeiro (UERJ), sendo em seguidacorroborada com a identificação de cepa O157:H- porPCR nesta mesma Universidade.

Discussão

A ocorrência das categorias de Escherichia coli foirelativamente baixa, sendo este resultado similar aosencontrados por outros pesquisadores ao estudaremEscherichia coli em produtos cárneos. Reis et al.(1980) encontraram Escherichia coli patogênica em5%, 7,5% e 10% de amostras de quibe, hambúrguer e salsicha, respectivamente. Franco et al. (1991)encontraram baixíssima freqüência do sorogrupo O15em carne crua bovina das 306 colônias testadas.

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Lenahan et al. (2008), coletou amostras fecais desuínos e amostras de suabes de carcaça em quatromatadouros de suínos irlandês objetivando analisarama presença de E. coli O157: H7 essa não foi encontrada nos suabes das carcaças. Entretanto, SanJuan et al. (2007) ao determinarem as condiçõesmicrobiológicas durante o processo de abate de ummatadouro municipal do México, verificou que das158 amostras analisadas, coliformes totais e E. coliforam detectados na maioria das amostras, sendo maisabundante na linha de abate de suíno que do bovino.

Nesta pesquisa, nas amostras comestíveis analisadaspelos métodos 1 e 2, que foram positivas, o NMP decoliformes totais foi na maioria das vezes superior aode Escherichia coli concordando com pesquisa desenvolvida por Laubach et al. (1998) em carne decabeça de suíno.

No presente trabalho, para as amostras da regiãointerna da papada correspondentes à área de ferida desangria os achados estabelecem que houve corre-spondência entre ausência e presença de coliformes eEscherichia coli, entre as amostras, pelos métodosempregados, entretanto, em 95% dos casos, no método 1, o NMP de coliformes e Escherichia coli foisuperior ao do método 2, embora o método 2 não caracterizasse a presença de coliformes fecais. AResolução RDC nº 12 (Brasil, 2001) não estabelecepadrões qualitativos ou quantitativos para quaisquertipos de coliformes entre as amostras comestíveisinvestigadas, recomendando que, caso seja determi-nada a presença de Escherichia coli, deve constar nolaudo analítico.

Geralmente, as carnes oriundas da ferida de sangriasão usadas para a produção de embutidos, entretanto,em muitos casos são usadas para consumo humano "innatura", que sugere o procedimento analítico destasamostras. Matsubara (2005) avaliou as condiçõeshigiênico-sanitárias de 240 meias-carcaças de suínosrealizando a contagem de coliformes totais e deEscherichia coli em três regiões pré-definidas (facelateral externa do pernil, do peito e da papada) e verificou-se coliformes totais em 98,7% e Escherichiacoli em 90,7% das meias-carcaças analisadas. A partirde seus dados estatísticos, observaram-se que nãohouve diferença entre a contaminação de coliformestotais nas diferentes regiões analisada, porém, houvediferença para a contagem de E. coli, sendo mais elevada na papada, no pernil e por último, no peito.

Os métodos 3 e 4 de enriquecimento das amostras aserem pesquisadas quanto a presença de Escherichiacoli foram comparados entre si. No método 3 ocorreumaior recuperação e confirmação de isolados deEscherichia coli que no método 4 por semeadura direta; porém, no método 4, com enriquecimento,independentemente do meio usado e temperatura deincubação, o número de isolados suspeitos e confir-mados foi sempre foi maior. Nestes procedimentosanalíticos o método 4 apresentou maior número

de colônias confirmadas em relação ao número de isolados triados, e o meio com maior percentual derecuperação foi MAC LAC (54,2%) confirmando,como indica a técnica original, que o uso do MACLAC apresentou bons resultados para determinação deEscherichia coli em alimento, tal como ocorreu comas amostras em epígrafe.

Na aplicação dos métodos 3 e 4, o enriquecimentonão seletivo das amostras tem como objetivo revitalizar as células danificadas objetivando melhoreficácia na determinação da microbiota em questão.Esta afirmação torna-se fundamentada, pois no método 3 e no método 4 com enriquecimento, ao sercomparado o número de colônias suspeitas e confir-madas nos meios de plaqueamento seletivo com omeio de plaqueamento no método 1 e na detecção pelométodo 2, os números de colônias naqueles métodossão bem mais superiores que nestes. O método 4 porsemeadura direta apresentou crescimento menor. Taisobservações deixam claro que o enriquecimento teveimportância na estimativa de um maior número decolônia suspeita e confirmada nos testes bioquímicos.Entre os métodos aplicados, observa-se que oenriquecimento não seletivo também foi fundamentalna recuperação e confirmação de colônias típicas deEscherichia coli. Os meios MAC LAC e HC a 35 °C foram os mais apropriados por apresentaremmaior número de colônias suspeitas e confirmadasbioquimicamente.

Comparando-se os tipos de amostras comestíveispesquisadas entre si observa-se que independente dométodo aplicado, as amostras da cavidade pélvicaapresentaram maiores valores bacteriológicos. Aspesquisas nacionais não revelam estudo colimétricoem carnes de suíno na área anatômica em questão,contudo quando Gill et al. (1995) procederam estudosemelhante em carcaça bovina, embora com métodode coleta diferenciado e meio similar, também sugeri-ram, como nossos achados, que esta área seja a maiscontaminada entre as outras pesquisadas. Gill e Jones(1998) ao enumerarem Escherichia coli em carcaçasuína pelo método de "zaragatoa" na região anatômicacorrelacionada com esta pesquisa sugeriram, também,contaminação elevada.

Os linfonodos podem conter microbiota muitointensa e diversificada. Nesta pesquisa conforme consta na Tabela 3, a suspeita e confirmação deEscherichia coli em linfonodos mesentéricos forammaiores, no total geral, considerando-se os métodos 3 e 4 aplicados aos demais tipos de amostras cárneasanalisadas, mostrando que este órgão pode ser umveiculador de microbiota para os diferentes nichosecológicos, quando do rompimento de sua cápsuladurante as fases de processamento tecnológico deabate.

Apesar da utilização do MUG seja atualmente muito divulgada não foram encontrados trabalhosdeterminando a presença de Escherichia coli por

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fluorescência, em meios de plaqueamento, emamostras originárias de suínos. Foi observado nesteexperimento que o meio ágar Escherichia coliO157:H7 em cuja composição, possui o MUG, quando comparado com os meios tradicionalmenteutilizados como ágar EMB, ágar MacConkey lactose,ágar MacConkey sorbitol, não ocorreu diferençaestatística significativa. Estes resultados vão em desencontro com os descritos por Venkateswaran et al.(1996) onde afirmam que o MUG adicionado ao meioágar bile vermelho violeta, tornou-o duas vezes maiseficaz que o ágar EMB para isolar Escherichia coli emprodutos cárneos, muito embora o meio agarEscherichia coli O157:H7 não tenha a mesma composição básica que o ágar bile vermelho violeta.

Ao aplicar-se o método sorológico em paralelo comaplicação da PCR, muitas das vezes os resultadospodem ser conflitantes, pois a reação cruzada oudivergente pode existir, tal proposição é colocada emdiscussão por Aleksic et al. (1992) que ao pesquisa-rem o esquema de biotipificação para Escherichia coliO157:H7 concluíram que dez (25,6%) das estirpes deEscherichia coli produtoras de SLT foram sorbitolpositivas e não reconhecidas em placas MacConkeysorbitol e relatam que as duas estirpes sorotipadascom O157 foram sorbitol e glucuronidase positivasnão foram produtoras de SLT. Estas afirmações apresentam paralelismo à amostra aqui isolada comoEHEC-O157:H-, em resultados, pelo fato de que osorogrupo apresentou, no meio de plaqueamento ágarEscherichia coli O157:H7 colônias esverdeadas nãose caracterizando como sorbitol positivas, porémforam diagnosticadas como positivas, para este car-boidrato, nas provas bioquímicas e comportaram-secom glucuronidase positivas, sem produzir SLT noestudo de PCR.

Conclusões

As amostras de carne suína oriundas da área de ferida de sangria que apresentaram contaminação porcoliformes, coliformes fecais e Escherichia coliquando analisadas pelos métodos 1 ou 2 devem serconsideradas impróprias para o consumo ou para uso industrial, entretanto a Resolução RDC nº12(Brasil, 2001) não estabelece padrões para o germe em questão. Todas as amostras de pleura e músculosintercostais que apresentaram ausência de coliformes,coliformes fecais e Escherichia coli pela prova analíti-ca do método 1, devem ser consideradas próprias paraprocessamento ou consumo; entretanto aquelas emque o método 2 revelou a presença de coliformestotais e ausência de Escherichia coli, devem ser consideradas impróprias para o consumo ou usoindustrial. As amostras da região sub-sacral próxima àbase da cauda que possuíam coliformes, coliformesfecais e Escherichia coli, quer seja pelo método 1 e 2,

devem ser consideradas processadas em condiçõesinadequadas na aplicação das Boas Práticas (origemda matéria prima, higiene e processamento) e nãodevem ser consumidas ou processadas industrialmente.

O método 3, ao ser aplicado nas diferentes amostraspermitiu revelar a confirmação de EPEC e EHEC emamostra de linfonodos e fezes, respectivamente.

A fase de enriquecimento no método 4, indepen-dentemente do tipo de amostra analisada permitiu umarecuperação significativamente maior de colônias de Escherichia coli, sendo o meio Mac Lac seguido do EMB os que apresentaram maiores números decolônias isoladas. Esta fase ainda permitiu uma recuperação significativamente maior de colônias deEPEC, EIEC, e na detecção de amostras comestíveis enão comestíveis contaminadas por grupos de Esche-richia coli.

As amostras de pleura e músculos intercostais analisadas não apresentaram nenhuma cepa EPEC,EIEC ou EHEC, sendo portanto consideradas emcondições próprias de consumo.

O meio ágar Escherichia coli O157:H7 apesar de serindicado para isolamento e diferenciação de estirpesenterohemorrágicas (EHEC) e Escherichia coliO157:H7, conforme ocorreu o isolamento da cepaO157:H- na amostra de fezes pelo método 3, aindaofereceu condições próprias para o isolamento deestirpes EPEC em amostra de linfonodos mesentéricos.

A cepa sorotipada como EHEC O157 foi confirma-da como O157:H- em PCR.

A presença de Escherichia coli em alimentos e Escherichia coli O157:H-, O157:H7, ressalta a necessidade de se colocar em prática o sistema na-cional e internacional de inocuidade dos alimentosobjetivando eliminar do abastecimento os alimentospara o consumo humano e os animais enfermos ouportadores assintomáticos, cuja carne possa transmitirenfermidades aos comensais.

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Controle microbiano em linha de produção de queijos Minas Frescal eRicota

Microbial control in line of "Minas Frescal" and Ricotta cheese production

Vidiany A. Q. Santos*, Catharina C. P. de Carvalho,Tânia M. V. Gonçalves, Fernando L. Hoffmann

Laboratório de Microbiologia de Alimentos - Departamento de Engenharia e Tecnologia de Alimentos - UNESPCampus de São José do Rio Preto – São Paulo – Brasil

R E V I S T A P O R T U G U E S A

CIÊNCIAS VETERINÁRIASDE

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Resumo: Queijos frescos como o Minas Frescal e a Ricota apresentam elevada actividade de água e diversidade nutri-cional, factores que propiciam a proliferação de microbiotaoportunista, reduzindo a segurança destes alimentos. Diversosmicrorganismos são propostos como bioindicadores de contaminação da matéria-prima e/ou do produto pronto para oconsumo. Nesse contexto, este trabalho teve por objectivo,avaliar as condições higio-sanitárias de uma linha de processa-mento de queijos Minas frescal e Ricota, localizada em São Josédo Rio Preto - São Paulo - Brasil, analisando, conforme o fluxograma de fabrico, as seguintes etapas: água, leite pasteuri-zado, coalho (complexo enzimático coagulante), coalhada, soroe queijos logo após o processamento e com cinco dias de vidade prateleira. Para tanto, foram efetuadas as seguintes análises:contagem de bactérias aeróbias mesófilas e Staphylococcusaureus, determinação do número mais provável (NMP) de coliformes totais e fecais, pesquisa de Escherichia coli,Salmonella spp. e Listeria monocytogenes. A água e o coalhoencontraram-se de acordo com os padrões preconizados pelalegislação brasileira, para todos os bioindicadores. Em relaçãoao leite houve desacordo em duas amostras, somente para coliformes fecais. A legislação brasileira (Brasil, 2001) nãoestabelece padrões para a coalhada e soro, porém os resultadosapresentaram contagens elevadas para todos os microrganismos,excepto para Salmonella spp. Os queijos, nos tempos zero ecinco dias de vida de prateleira, não atenderam aos padrões paraStaphylococcus aureus, coliformes fecais e E. coli. Tais contaminações podem estar relacionadas com falhas no processo de higienização e a não aplicação das boas práticas defabrico.

Palavras-chave: Queijo Minas Frescal, Ricota, microorganis-mos, DTA

Abstract: Fresh cheeses, as "Minas Frescal" and Ricotta, havehigh water activity and nutritional diversity, factors that makethe development of opportunist microorganisms favorable,reducing the safety of these foods. Several microorganisms areproposed as bioindicators of raw material and/or contaminatedproduct, ready for consumption. In this context, the aim of this

study was to evalute the hygienic-sanitary conditions of aRicotta and "Minas Frescal" cheese processing line, situated inSão José do Rio Preto, SP, Brazil. The analysis was performedin six collections, according to the manufacturing steps, water,pasteurized milk, rennet, curd, whey and cheeses right after the processing and with five days of shelf life. For this, the following analyses were carried out: mesophilic aerobic bacte-ria and Staphylococcus aureus count, determination of the mostprobable number (MPN) of total and detection of Escherichiacoli, Salmonella spp. and Listeria monocytogenes detection.Water and curd were in accordance with the standards recom-mended by Brazilian legislation for all bioindicators. In relationto milk, two collections showed thermotolerant coliforms,which did not meet the required standards. Microbiologicalparameters are not established and there are not standards forcurd and whey, however, the results were high for all themicroorganisms, except for Salmonella spp. Cheeses rangingfrom zero to five days of shelf life, were not in accordance withthe standards, namely for Staphylococcus aureus, thermotolerantcoliforms and Escherichia coli. Such contamination can berelated to mistakes in the hygienization process and lack ofapplication of good manufacturing practices.

Keywords: Minas fresh cheese; Ricotta cheese; microorganism;DTA

Introdução

A indústria brasileira de produtos lácteos temimportância sócio-económica, em especial no fabricode queijos, ocupando o sexto lugar em produçãomundial, com 945 mil toneladas em 2006 (EmpresaBrasileira de Pesquisa Agropecuária - Embrapa,2006).

Dentre os queijos frescos, ou com elevada umidade,destacam-se o Minas frescal e a Ricota. São produtosmuito consumidos pelo reduzido teor de gordura ebaixo custo, sendo bastante indicados em dietas comrestrições em lípidios, além de serem acessíveis àmaioria das classes sociais (Lisita, 2005).

O queijo Minas frescal é um dos derivados lácteos

*Correspondência: [email protected] Cristóvão Colombo, 2265, Bairro: Jardim NazarethCEP: 15054-000 Tel.: + 55 (17) 3221 2200, ramal: 2714

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mais apreciados no Brasil, sendo o estado de MinasGerais o maior produtor com cerca de 30.000toneladas por ano (Pereira et al., 2006). Segundo aAssociação Brasileira das indústrias de queijos -ABIQ, em 2007 a produção deste queijo foi de 33.075toneladas.

Este queijo é definido como fresco, obtido porcoagulação enzimática do leite por meio da adição decoalho e/ou outras enzimas coagulantes apropriadas,complementada ou não pela ação de bactérias láticasespecíficas (Portaria n.146/1996).

De acordo com Portaria n.146 (1996) e Campos etal. (2006) o queijo Minas frescal é classificado comoum queijo macio, semi-gordo (25,0% - 44,9%), ricoem cálcio, fósforo e vitamina A. Apresenta tambémreduzida porcentagem de cloreto de sódio (1,4 - 1,6%), pH pouco ácido (5,1 - 5,6) e alta umidade (> 55,0%), consistência mole, cor esbranquiçada, formato cilíndrico, odor suave e característico, comvida útil de até 15 dias sob refrigeração (Portarian.146, 1996); Gonzalez et al., 2000; Hoffmann, et al.,2002).

A Ricota é um queijo de origem italiana, constituídobasicamente de lactoalbumina e lactoglobulina.Também tem grande aceitação pelos consumidores,principalmente por apresentar teores reduzidos degordura e sal (Raimundo et al., 2005).

Com base na legislação brasileira (Portaria n.146,1996), é considerada como um produto obtido porcoagulação ácida das proteínas do soro, sendo permi-tido adicionar até 20,0% de leite ao volume total.

Deve ter formato cilíndrico, peso de 300 g a 1 Kg,crosta rugosa, consistência mole, não pastosa, friável,textura fechada, cor branco-creme, odor e saborpróprios. O rendimento médio situa-se em torno de4,0 a 5,0% (Portaria n.146, 1996; Piccoli et al., 2005).

A população microbiana contaminante descrita paraestes tipos de queijos podem incluir microrganismospertencentes ao grupo dos coliformes, Salmonellaspp., Listeria monocytogenes e Staphylococcus aureus(Nicolau et al., 2001).

A presença destes microrganismos no alimento,assim como de contaminantes químicos e físicos, podeestar relacionada com a má qualidade da matéria--prima e a adoção de técnicas higiénicas inadequadas,que comprometem a segurança do produto (Portaria n. 46/1998; Timm et al., 2004).

As indústrias de pequeno porte produtoras de queijos são uma importante fonte de geração deempregos em todo o país. Essas empresas, de formageral, apresentam pouca ou nenhuma orientação sobreas BPF, muitas vezes devido à falta de acesso a essasinformações, as quais são imprescindíveis para agarantia da qualidade de seus produtos.

Conforme o exposto e levando-se em conta a popularidade e as excelentes características destesprodutos para o desenvolvimento microbiano, torna-seimportante avaliar as condições higio-sanitárias de

uma linha de processamento de queijos Minas frescale Ricota, localizada em São José do Rio Preto – SP –Brasil.

Materiais e métodos

Obtenção das amostras

Este trabalho foi desenvolvido no Laboratório deMicrobiologia da Universidade Estadual Paulista -UNESP. As recolhas foram efectuadas a uma fabricade lacticinios de pequeno porte, produtor de queijosMinas frescal e Ricota, localizado no município deSão José do Rio Preto – SP, de acordo com o fluxograma de fabrico descrito na figura 1. Foramefectuadas recolhas nas seguintes etapas: água, leitepasteurizado, coalho, coalhada, soro e queijos Minasfrescal e Ricota logo após o processamento (t0) e comcinco dias de vida de prateleira (t5). As recolhas foramrealizadas semanalmente durante três meses, pelopróprio examinador, ao longo da linha de produção(com vestimenta adequada e autorização previa da empresa), sob condições assépticas e levadas parao laboratório para analise imediata. As recolhas constaram de 6 (seis) repetições, cada uma delas emduplicata.

Preparo das amostras

A partir de 10 g ou 10 mL de cada recolha forampreparada em água destilada estéril, a diluição mãe(10-1) e as diluições decimais sucessivas, utilizando omesmo diluente, sendo utilizadas quando necessário.

Análises microbiológicas

A contagem de bactérias aeróbias mesófilas foi efetuada apenas nas amostras de água. A determi-nação do Número Mais Provável (NMP) de coliformes totais, fecais e a pesquisa de Escherichiacoli foram realizadas para a água, leite pasteurizado,coalho, coalhada, soro e queijos Minas frescal eRicota. A contagem de Staphylococcus aureus e apesquisa de Salmonella spp. foram realizadas paratodas as amostras citadas anteriormente, exceto para a água. A pesquisa de Listeria monocytogenes foi realizada somente para os queijos Minas frescal ericota (Silva et al., 2007).

Contagem de bactérias aeróbias mesófilas

Foram pipetados assepticamente 1 mL das diluiçõespreviamente preparadas e colocados em placas dePetri estéreis devidamente identificadas. Adicionou-sea seguir 15 mL de Ágar Padrão para Contagem (PCA- Merck), e após a homogeneização, incubaram-se a35 ºC por 24 e 48 horas. Após a contagem de colôniascalculou-se o número de unidade formadoras de colônias por unidade de volume (Silva et al., 2007).

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Contagem de Staphylococcus aureus

Transferiu-se assepticamente 0,1 mL de cada diluiçãopara a superfície do Ágar Baird-Parker (BP - Merck),suplementado com emulsão de gema de ovo e teluritode potássio. O inóculo foi espalhado em todo o meiocom ansa de Drigalsky esterilizada. Em seguida as placas foram incubadas em estufa a 35 ºC por 24-48horas. Após a incubação, contam-se as colonias para secalcularem as UFC que se apresentam de cor negra,brilhantes, com uma zona de precipitação na sua periferia e circundadas por halo claro. A confirmaçãodo resultado foi feita por meio do teste de catalase,coagulase e também pela coloração de Gram para a verificação da morfologia celular (Silva et al., 2007).

Determinação do número mais provável (NMP) decoliformes totais

Foi utilizada a técnica dos tubos múltiplos empre-gando-se o Caldo Lauril Sulfato (Merck), comincubação a 35 ºC durante 48 horas.

Determinação do NMP de coliformes termotolerantes

Empregou-se o método dos tubos múltiplos, utilizando-se o Caldo EC (Merck) com incubação a44,5 ºC durante 24 horas. A determinação do NMP decoliformes totais e termotolerantes foi realizadaempregando-se a tabela de Hoskins.

Pesquisa de Escherichia coli

A partir das culturas de coliformes em Caldo EC,que apresentaram gás no interior do tubo de Durham,retirou-se uma alíquota de inóculo, a qual foi semeadapor esgotamento em placas contendo Ágar EosinaAzul de Metileno (EMB - Merck). Após incubaçãopor 24 h à 35 ºC. As colônias que apresentaram coloração negra com brilho verde metálico, foram isoladas e submetidas aos testes bioquímicos de indol,IMVIC (indol/vermelho de metila/Voges-Proskauer/citrato) (Silva et al., 2007).

Recepção do leitein natura

Pasteurização do leite (500 L)à 65 ºC/30 min

Resfriamento à 37 ºC

Adição de (300 ml) coalholíquido Estrela

Coagulação 45 min

Corte e mexedurada massa (cubos de 2-3 cm)

Repouso e decantação da massa (5-6 min)

Salga diretamente na massa (9 kg/ 500 L)

Remoção do soro

Soro à 65 ∞C + 20% de leite pasteurizado

Aquecimento a 85 ºC

Adição de ácido acético (5,5 L)

Coagulação à 100 ºC

Corte e mexedura da massa

Enformagem

Refrigeração à 7-9 ºC

Enformagem

Refrigeração à 7-9 ºC

Figura 1 - Fluxograma de fabrico dos queijos Minas frescal e Ricota adotado pelo laticínio.

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Pesquisa de Salmonella spp.

Em 225 mL de Caldo Lactosado (LB - Merck)foram homogeneizados, respectivamente 25 g/25 mLde cada amostra. Depois da incubação a 35 ºC por 24horas, 1 mL de cada cultivo foi transferido para tuboscontendo 9 mL de Caldo Selenito Cistina (CBS -Merck). Após 24, 48 e 120 horas realizaram-sesementeiras em placas de Petri contendo ÁgarSalmonella Shigella (SSA - Merck). As colônias queapresentaram coloração creme com ou sem centronegro, foram submetidas ao teste sorológico (Silva etal., 2007).

Pesquisa de Listeria monocytogenes

Foram adicionados 25 g/25 mL de cada amostra em225 mL de Caldo de Enriquecimento para Listeriamonocytogenes (LEB - Merck) sendo homogeneiza-dos e incubados a 35 ºC por 24 e 48 horas. Após operíodo de 24 horas, foram retiradas alíquotas de 0,1 mL e inoculadas em tubos contendo o Caldo deEnriquecimento Secundário de Fraser (Dfico), osquais foram incubados a 35 ºC por 24 horas.

Após a incubação, uma alíquota dos Caldos deEnriquecimento para Listeria monocytogenes e Caldode Enriquecimento Secundário de Frasier foramsemeadas por esgotamento em duas placas de Petricontendo Ágar Seletivo Palcam-Listeria (Dfico) eincubadas a 35 ºC em microaerofilia, por 24 e 48horas. As colônias típicas de Listeria monocytogenes,apresentam-se com coloração verde claro, pequenas,esféricas, quase transparentes e circundadas por halonegro (Silva et al., 2007).

Resultados e discussão

Os padrões microbiológicos para os microrganismostestados nas diferentes etapas de processamento estãoapresentados no Quadro 1. Os resultados das análisesmicrobiológicas de água, leite pasteurizado, coalho,coalhada, soro e queijos Minas frescal e Ricota, logoapós o processamento (t0) e com cinco dias da data defabricação (t5), estão apresentados respectivamentenos Quadros 2, 3, 4, 5, 6, 7 e 8.

Água

Na legislação brasileira há recomendação quanto àcontagem de bactérias aeróbias mesófilas e ausênciade padrão para coliformes totais em água (Portarian.518/2004), conforme apresentado do Quadro 1.

Para bactérias aeróbias mesófilas, duas amostrasapresentaram valores acima do indicado pela legislaçãobrasileira (Portaria n. 518/2004), com contagens de5,39 e 2,74 log UFC/100 mL, totalizando 33,3%, conforme demonstrado o Quadro 2. Para coliformestotais, verificou-se resultado elevado apenas em uma

amostra avaliada (16,6%), com 1,11 log NMP/100mL. Para coliformes fecais e pesquisa de Escherichiacoli obteve-se ausência em todas as amostras testadas.

A água utilizada pelo estabelecimento não é obtidada rede pública, e portanto, deve ser submetida a trata-mento por cloração periódica. Os resultados obtidosindicam a ocorrência de falhas no tratamento, comopor exemplo, a ausência de clorador nos reservatóriosou utilização inadequada do mesmo. Durante a coletados dados, observou-se que há a presença de cloradornos reservatórios da empresa, porém, este não é utilizado de forma periódica.

Para coliformes fecais e E. coli, a legislação federalestabelece ausência em 100 mL da amostra (Portarian. 518/2004). Neste estudo, verificou-se que todas asamostras encontravam-se de acordo com o preconizado(Quadro 1).

Marçal et al. (1994), ao avaliarem a potabilidade daágua consumida em residências, verificaram que 36%das amostras foram satisfatórias. Os maiores índicesde contaminação foram para coliformes totais (64%) efecais (25%), indicando que os mesmos poderiam seroriundos das redes de fornecimento.

Em contrapartida, Alves et al. (2002), ao analisaremas condições higio-sanitárias de água para consumo,verificaram que 5,5% das amostras coletadas apresen-taram contaminação por coliformes totais e 94,5%estavam aptas para o consumo. Resultado satisfatório,uma vez que a presença de microrganismos como a E.coli podem causar danos a saúde do consumidor.

Leite pasteurizado

Com relação a Staphylococcus aureus, verificou-sevalores elevados em uma (16,6%) das seis amostrastestadas, com 5,3 log UFC/mL, conforme demonstradono Quadro 3.

Lisita (2005), ao analisar amostras de leite pasteuri-zado, obteve valores de < 10 a 1,0 x 101 UFC/mL paraStaphylococcus coagulase positiva, os quais são inferiores aos encontrados neste trabalho.

Para coliformes fecais, verificou-se valores acimado preconizado pela legislação brasileira (Quadro 1)em 33,3% das amostras analisadas, com valores de1,30 e 3,04 log NMP/mL (Quadro 2). Verificou-seainda, presença de Escherichia coli em 50 % dasamostras avaliadas.

Catão e Ceballos (2001), ao avaliarem quinzeamostras de leite pasteurizado, constataram a presençade coliformes totais em 46,6% e fecais em 60,0%,resultado semelhante ao observado neste estudo.

Entre os microrganismos que comprometem a qualidade sanitária dos produtos de origem láctea, o S.aureus e os coliformes são importantes patógenos esua presença no leite pasteurizado reafirma aimportância da pasteurização adequada, bem como daadoção de técnicas higiênico-sanitárias satisfatórias.

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Quadro 1 - Padrões microbiológicos vigentes, segundo a Portaria n. 518/ 2004 e a Resolução RDC n. 12/2001, para os microrganismos testados nas diferentes etapas da linha de processamento dos queijos Minas frescal e Ricota

Amostras Bactérias S. aureus Coliformes Coliformes E. coli Salmonella spp. Listeriaaeróbias mesófilas totais fecais monocytogenes

Log Log Log Log Pres./aus. Pres./aus. Pres./aus.UFC/mL/g UFC/mL/g NMP/mL/g NMP/mL/g

Água 5 x 102 - - aus./ aus./ - -

100 mL 100 mL

Leite

Pasteurizado - - - máx. 4 - aus./ -

25 mL

Coalho - - - máx. 5 - aus./ -

25 mL

Massa - - - - - - -

Soro - - - - - - -

Queijo Minas máx. 5x102 - máx. 5 x102 - aus./25 g aus./25 g

frescal

Ricota - máx. 5x102 - máx. 5 x102 - aus./25 g aus./25 g

Quadro 2 - Resultados das análises microbiológicas efetuadas nas diferentes amostras de água

Amostras Bactérias aeróbias Coliformes Coliformes Escherichiamesófilas totais fecais coli

(Log UFC / mL) (Log NMP / 100 mL) (Log NMP / 100 mL) (- / +)

1 2,49 1,11 0 ( - )

2 1,65 0 0 ( - )

3 5,39 0 0 ( - )

4 1,66 0 0 ( - )

5 0,95 0 0 ( - )

6 2,74 0 0 ( - )

Quadro 3 - Resultados das análises microbiológicas efetuadas nas diferentes amostras de leite pasteurizado

Amostras Staphylococcus Coliformes Coliformes Escherichia Salmonellaaureus totais fecais coli spp.

(Log UFC / mL) (Log NMP / mL) (Log NMP / mL) (- / +) (- / +)

1 0,95 0,30 0,30 ( - ) ( - )

2 0,95 0,60 0,30 ( - ) ( - )

3 0,95 0,30 0,30 ( - ) ( - )

4 2 0,30 0,30 ( - ) ( - )

5 0,95 0,30 0,30 ( - ) ( - )

6 1,39 0,30 0,30 ( - ) ( - )

Quadro 4 - Resultados das análises microbiológicas efetuadas nas diferentes amostras de coalho

Amostras Staphylococcus Coliformes Coliformes Escherichia Salmonellaaureus totais fecais coli spp.

(Log UFC / mL) (Log NMP / mL) (Log NMP / mL) (- / +) (- / +)

1 0,95 0,30 0,30 ( - ) ( - )

2 0,95 2,17 0,30 ( - ) ( - )

3 1,04 3,04 1,30 ( + ) ( - )

4 5,30 1,63 0,60 ( + ) ( - )

5 0,95 0,30 0,30 ( - ) ( - )

6 0,95 3,04 3,04 ( + ) ( - )

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Coalhada

Apesar da inexistência de padrões microbiológicospara coalhada, esta apresentou valores elevados paratodos os microrganismos avaliados, exceto paraSalmonella spp., a qual foi ausente (Quadro 5).

Para Staphylococcus aureus, observou-se, valoreselevados para três das amostras analisadas, com contagens de 7,14; 5,82 e 5,75 log UFC/g, conformedemonstrado no Quadro 5.

Ao contrário do obtido neste estudo, Lisita (2005), aoavaliar a presença de S. coagulase positiva em quatroamostras de coalhada de queijo Minas frescal, verificouausência deste bioindicador em todas as amostras.

Segundo Leite et al. (2005), a presença de S. aureusem derivados lácteos, ocorre normalmente, por pasteurização inadequada ou contaminações nas etapas de produção ou pós-processamento.

Com relação aos coliformes totais, observou-se valores elevados em todas as amostras testadas comvalores de 2,66 a 3,04 log UFC/g, conforme apresen-tado no Quadro 5. Para coliformes fecais observou-sevalores elevados para três amostras (50%), com valores de 1,32; 1,87 e 2,32 log UFC/g. A presença deEscherichia coli foi confirmada em 83,3% dasamostras testadas.

Os resultados obtidos para esta etapa do processa-mento, indicam falta de cuidados higiênico-sanitáriosdurante a manipulação da matéria prima, o que podelevar a maior proliferação de microrganismospatogênicos e consequentemente a ocorrência dedoenças transmitidas por alimentos.

Para coliformes totais e fecais resultados elevadostambém foram verificados por Lisita (2005), verifican-do para coliformes totais valores de 3,38, 1,95 e 3,38 log

NMP/g e fecais de 3,38, 1,95, 3,38 e 2,38 log NMP/g.

Soro

Conforme apresentado no Quadro 6, verificou-separa Staphylococcus aureus resultados elevados emtrês das amostras testadas, com contagens de 6,17,5,75 e 9,08 logUFC/mL. Estes resultados indicamcontaminações pós-processamento, uma vez que amatéria prima apresentou de forma geral, baixas contagens para este microrganismo.

Para coliformes totais foram obtidos valores altosem cinco das amostras analisadas, com valores de 3,04e 2, 66 log NNP/mL conforme demonstrado no Quadro6 e para fecais, apenas duas foram positivas, com valores de 1,87 e 1,44 log NMP/mL. Em todas asamostras avaliadas, não foi detectada a presença deSalmonella spp.

A presença de coliformes nestas amostras de sororessalta ainda mais, a falta de cuidados higio--sanitários adotados pelos manipuladores, durante amanipulação dos queijos e também da inadequadahigienização dos equipamentos/utensílios. Tal compor-tamento é preocupamente pois tais microrganismospodem ocasionar infecções de origem alimentar.

Resultados semelhantes aos verificados nesse estudo, foram observados por Nicolau et al. (2001),avaliando oito amostras de soro de queijo Minas frescal, verificaram a presença de coliformes totais em62,5% e fecais em 37,5%.

Em contrapartida, Chiappini et al. (1995), aoavaliarem 30 amostras de soro de queijos quanto à presença de coliformes totais e fecais, verificaram queestas apresentaram-se em condições insatisfatóriassomente para coliformes totais.

Quadro 5 - Resultados das análises microbiológicas efetuadas nas diferentes amostras de coalhada

Amostras Staphylococcus Coliformes Coliformes Escherichia Salmonellaaureus totais fecais coli spp.

(Log UFC / mL) (Log NMP / mL) (Log NMP / mL) (- / +) (- / +)

1 1,99 3,04 0,30 ( - ) ( - )

2 2 3,04 0,60 ( + ) ( - )

3 7,14 3,04 1,87 ( + ) ( - )

4 5,82 2,66 0,84 ( + ) ( - )

5 5,75 2,66 1,32 ( + ) ( - )

6 1,99 3,04 2,32 ( + ) ( - )

Quadro 6 - Resultados das análises microbiológicas efetuadas nas diferentes amostras de soro

Amostras Staphylococcus Coliformes Coliformes Escherichia Salmonellaaureus totais fecais coli spp.

(Log UFC / mL) (Log NMP / mL) (Log NMP / mL) (- / +) (- / +)

1 0,95 3,04 0,30 ( - ) ( - )

2 0,95 3,04 0,30 ( - ) ( - )

3 6,17 3,04 1,87 ( + ) ( - )

4 5,75 2,66 0,30 ( - ) ( - )

5 3,38 0,30 0,30 ( - ) ( - )

6 9,08 3,04 1,45 ( + ) ( - )

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Queijo Minas frescal

As amostras de queijo Minas frescal avaliadas, apresentaram nos tempos zero e cinco dias, contagensacima do estabelecido pela legislação brasileira (5,0 x102 UFC/g) para Staphylococcus aureus, em duas(33,33%) e cinco (83,33%) das amostras estudadas,conforme demonstrado no Quadro 7 (Resolução n.12/2001).

Barros et al. (2004), também verificaram valoreselevados para este microrganismo, onde das 30amostras testadas, 27% encontravam-se acima do limite estabelecido pela legislação brasileira.

Resultados semelhantes aos verificados neste estudo foram observados por Ávila et al. (2002), analisando 33 amostras de queijo Minas frescal emdiferentes períodos de vida de prateleira, observaramque, 24,24% destas encontravam-se acima do estabe-lecido legalmente para S. coagulase positiva.

Com relação a coliformes totais, nos tempo zero ecinco dias de fabricação, verificou-se valores elevadosem todas as amostras avaliadas, com resultados de3,04 log NMP/mL, conforme demonstrado no Quadro7. Não foram detectadas Salmonella spp. e Listeria

monocytogenes em nenhuma das amostras analisadas.Para coliformes fecais, observaram-se valores acima

do permitido legalmente em 16,7% das amostras notempo zero, indicando possíveis falhas durante a manufatura do produto e/ou manipulação inadequada(Resolução n. 12/2001). No tempo cinco, não foramobservados valores acima do preconizado, conformeapresentado no Quadro 7. Foi observada positividadepara E. coli em 50% das amostras no tempo zero e33,33% no tempo cinco, conforme descrito no Quadro 7.

Resultados inferiores aos obtidos neste trabalhoforam verificados por Loguercio e Aleixo (2001), aoanalisarem 30 amostras de queijo Minas frescal,observaram que somente uma (3,33%) apresentoucontagem para coliformes fecais superior a 103 UFC/g.

Ricota

Para Staphylococcus aureus as amostras de Ricota,nos tempos zero e cinco dias, apresentaram percen-tuais acima do estabelecido pela legislação (5,0 x 102

UFC/g) em 16,67%, com valores de 2,95 e 4,65 logUFC/g, conforme demonstrado no Quadro 8.

Carnicel et al. (2003), ao submeterem 26 amostras

Quadro 7 - Resultados das análises microbiológicas efetuadas nas diferentes amostras de queijo Minas frescal - tempo (t): 0 e 5 dias

Amostras Staphylococcus Coliformes Coliformes Escherichia Salmonella Listeriaaureus totais fecais coli spp. monocytogene

(Log UFC / mL) (Log NMP / mL) (Log NMP / mL) (- / +) (- / +) (- / +)

1 t0 1,99 3,04 0,30 ( - ) ( - ) ( - )

t5 5,04 3,04 0,30 ( - ) ( - ) ( - )

2 t0 1,99 3,04 0,30 ( - ) ( - ) ( - )

t5 3,27 3,04 0,30 ( - ) ( - ) ( - )

3 t0 1,99 3,04 2,07 ( + ) ( - ) ( - )

t5 9 3,04 0,30 ( - ) ( - ) ( - )

4 t0 7 3,04 2,17 ( + ) ( - ) ( - )

t5 5,32 3,04 0,95 ( + ) ( - ) ( - )

5 t0 5,45 3,04 0,30 ( - ) ( - ) ( - )

t5 5,98 3,04 0,30 ( - ) ( - ) ( - )

6 t0 1,99 3,04 3,04 ( + ) ( - ) ( - )

t5 1,99 3,04 1,96 ( + ) ( - ) ( - )

Quadro 8 - Resultados das análises microbiológicas efetuadas nas diferentes amostras de ricota - tempo (t): 0 e 5 dias

Amostras Staphylococcus Coliformes Coliformes Escherichia Salmonella Listeriaaureus totais fecais coli spp. monocytogene

(Log UFC / mL) (Log NMP / mL) (Log NMP / mL) (- / +) (- / +) (- / +)

1 t0 1,99 0,30 0,30 ( - ) ( - ) ( - )

t5 1,99 0,95 0,30 ( - ) ( - ) ( - )

2 t0 2 0,30 0,30 ( - ) ( - ) ( - )

T5 1,99 0,30 0,30 ( - ) ( - ) ( - )

3 t0 1,99 0,30 0,30 ( - ) ( - ) ( - )

t5 4,65 3,04 0,84 ( + ) ( - ) ( - )

4 t0 2,95 3,04 0,30 ( - ) ( - ) ( - )

t5 1,99 0,30 0,30 ( - ) ( - ) ( - )

5 t0 1,99 0,30 0,30 ( - ) ( - ) ( - )

t5 1,99 0,30 0,30 ( - ) ( - ) ( - )

6 t0 1,99 3,04 3,04 ( + ) ( - ) ( - )

t5 1,99 3,04 0,47 ( + ) ( - ) ( - )

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de Ricota à análise quanto à presença de S. coagulasepositiva, verificaram que destas, 88,46% encon-traram-se acima do estabelecido pelo padrão legal.

Quanto à presença de coliformes totais, verificaram-se valores altos em duas amostras nostempos zero e cinco dias, com valor de 3,04 logMNP/g para ambos, conforme demonstrado no Quadro8. Para coliformes fecais, verificou-se que 16,70% das amostras no tempo zero, estiveram acima do estabelecido pela legislação brasileira (Resoluçãon.12/2001).

Raimundo et al. (2005), ao analisarem amostras deRicota, obtiveram para coliformes fecais percentual de83,3% acima do padrão vigente.

Com relação à positividade para E. coli, obteve-se16,7% das amostras nos tempos zero e cinco dias. Poroutro lado, não foi detectada a presença de Salmonellaspp. e Listeria monocytogenes nas amostras avaliadas.

Conclusão

Diante dos resultados obtidos por meio da avaliaçãomicrobiológica nas diferentes etapas da linha deprocessamento de queijos Minas frescal e Ricota, épossível inferir que, as amostras de água apresentarampositividade para coliformes totais e valores acima dopreconizado para bactérias aeróbias mesófilas; emleite pasteurizado, soro, coalhada, queijos Minas frescal e Ricota verificou-se a valores elevados para S. aureus e coliformes fecais na maioria das amostrasanalisadas. Não foi observada a presença deSalmonella spp. e Listeria monocytogenes em nenhuma das amostras estudadas. A presença demicrorganismos como E. coli e S. aureus nas etapas eprodutos avaliados, podem desencadear surtos dedoenças transmitidas por alimentos e devem ser motivo de preocupação por parte das autoridades desaúde pública. Vale destacar também, que a indústriaem questão deve adotar práticas higiênico-sanitáriasadequadas a fim de reduzir tais contaminações.

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Severe aortic stenosis in a Persian kitten

Estenose aórtica severa em um gato Persa

Marlos G. Sousa1*, João Paulo da E. Pascon2, Alexandre M. de Brum3,Priscila A. C. Santos2, Aparecido A. Camacho2

1College of Veterinary Medicine and Animal Science, The Federal University of Tocantins (UFT),Campus of Araguaína, Brazil

2College of Agricultural and Veterinary Sciences, São Paulo State University (UNESP),Campus of Jaboticabal, Brazil

3College of Veterinary Medicine, University of Franca (UNIFRAN), Franca, Brazil

R E V I S T A P O R T U G U E S A

CIÊNCIAS VETERINÁRIASDE

CASO CLÍNICO

229

Summary: A case of severe aortic stenosis in a kitten is reported. Although no obvious clinical signs were observed initially, congestive left heart failure developed seven monthslater. On presentation, severe pulmonary edema was diagnosedand an incidental thrombus within the enlarged left atrium wasdisclosed on echocardiographic examination. Clinical featuresand diagnostic methods are discussed in this paper.

Keywords: congenital heart disease, echocardiography, thromboembolism, concentric hypertrophy, pulmonary edema

Resumo: Relata-se um caso de estenose aórtica severa em um gato Persa. Apesar da inexistência de sinais clínicos inicialmente, desenvolveu-se insuficiência cardíaca congestivasete meses após o atendimento inicial, sendo diagnosticadoedema pulmonar e, ao exame ecocardiográfico, um trombo incidental no interior do átrio esquerdo dilatado. Neste artigo,são discutidas as características clínicas e os métodos diagnós-ticos empregados nesse caso de cardiopatia congênita.

Palavras-chave: doença cardíaca congênita, ecocardiografia,tromboembolismo, hipertrofia concêntrica, edema pulmonar

Introduction

Aortic stenosis is a congenital narrowing of the leftventricular outflow tract, aortic valve, or supravalvularaorta (Bolton and Liu, 1977; Liu, 1977; Kienle, 1998).Wherever it is located, obstruction to left ventricularoutflow increases left ventricular systolic pressure,resulting in concentric hypertrophy of the left ventri-cle (Sisson et al., 2000).

Although reported as one of the most common congenital heart disease in dogs, aortic stenosis hasonly been described in a few cats (Liu, 1968; Stepien

and Bonagura, 1991; King, 1997). To date, Harpster(1986) has documented this defect to count for only6% of all congenital heart disease in domestic felines.

The increased left ventricular systolic pressure propels blood at a higher velocity across the stenoticarea, thereby resulting in a turbulent flow that is associated with a systolic ejection murmur (Boltonand Liu, 1977; Stepien and Bonagura, 1991), whichmay eventually be accompanied by a soft diastolicmurmur secondary to aortic valve insufficiency(Sisson et al., 2000).

Clinical signs may be absent in many mildly-to-moderately affected patients, and most affected cats arerecognized when an ejection murmur is auscultated atthe time of initial vaccinations (Bonagura, 1994;Kienle, 1998). In severely affected animals, exertionalfatigue, syncope, and even signs related to congestiveheart failure may be observed (Stepien and Bonagura,1991; Kienle, 1998).

Definitive diagnosis of aortic stenosis requiresangiocardiography, or echocardiography (Bonagura,1994). A fibrous obstructing lesion, left ventricularconcentric hypertrophy, and post-stenotic dilatationmay be observed on two-dimensional echocardiogra-phy (Belerenian, 2007; Ferraris, 2007). Dopplerechocardiography should reveal an increased peakvelocity of aortic flow. In dogs, Sisson et al. (2000)documented that aortic velocity over 2.2 m/s is regarded as indicative of aortic stenosis, whereas incats, Stepien and Bonagura (1991) reported that peakaortic velocity greater than 2 m/s might suggest a narrowed aortic tract.

As documented in literature, aortic stenosis is anuncommon congenital heart defect in cats. Therefore,the aim of this paper is to report a case of severe aortic stenosis in an initially asymptomatic Persiankitten, followed by the development of left atrialthrombus and signs of congestive heart failure.

* Correspondence: [email protected] 153, Km 112, Campus EMVZ/UFT, Araguaína, TO, Brazil,77804-970Tel: +55 (63) 2112 2113; Fax: +55 (63) 2112 2136

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Sousa MG et al. RPCV (2008) 103 (567-568) 229-232

Case description

A 5-month-old male Persian kitten weighing 2.5 kgwas brought to consultation for initial vaccination.Except for a grade 3/6 systolic ejection murmur heardbest over the left basilar region and radiating both cranially and dorsally, no obvious abnormalities werefound on physical examination.

The caretaker noted that the kitten had an adequateappetite and was as active as its sibling. Although thecat had demonstrated normal behavior and physicalactivity with no overt medical conditions, ancillaryexams were requested to investigate the murmur.Thoracic radiographs disclosed a normal cardiac silhouette and no evidence of congestive heart failure.Cardiac examination consisted in a 6-lead computeri-zed electrocardiogram and echocardiography withDoppler examination. Only sinus tachycardia wasdocumented on electrocardiography (200 bpm).Echocardiography was performed from the rightparasternal and left apical locations. On two-dimen-sionally-guided M-mode echocardiography, a mildlydecreased left ventricular systolic diameter (0.55 cm),decreased left ventricular diastolic diameter (1.26cm), and increased fractional shortening (56%) wereconsistent with mild left ventricular concentric hyper-trophy. Left atrial diameter was within the referencerange. On the apical five-chamber view, a severelyincreased peak aortic velocity (6.03 m/s) was identi-fied using continuous-wave Doppler (Figure 1). Basedon the echocardiographic findings, the diagnosis ofaortic stenosis was established.

Four months later, the cat was brought to theVeterinary Teaching Hospital for a follow-up consul-tation. On presentation, he weighed 4.7 kg, was veryactive and his owner reported no abnormalities sincewe last saw him. We auscultated a grade 4/6 systolicejection murmur, still radiating cranially and dorsally,but the remainder of the physical examination find-ings were unremarkable. M-mode echocardiographyshowed a moderate left atrial enlargement (1.74 cm,with a left atrium-to-aorta ratio of 2.3), increasedinterventricular septal thickness in systole (0.98 cm)and diastole (0.89 cm), and decreased left ventricularsystolic (0.55 cm) and diastolic diameter (1.00 cm).Color-flow and spectral Doppler demonstrated a high-velocity turbulent flow across the aorta.

Three months later, the cat was presented to theVeterinary Teaching Hospital emergency service with acute difficulty in breathing and tachypnea. Onphysical examination, the patient had mildly cyanoticmucous membranes, and was tachypneic, dyspneic,and tachycardic. Peripheral pulse rate matched theheart rate at 210 pulses/minute. Cardiac sounds wereinaudible over pulmonary crackles and wheezes.Lateral radiographs showed severe pulmonary edemaand left atrial enlargement. Short-term emergencytherapy was immediately initiated and included

furosemide and a nitroglycerin transdermal patchplaced over a shaved area on lateral thorax. The patientwas continually supplemented with 100% oxygen via a face mask, resulting in improvement in the colorof the mucous membranes. An ultrasonographicexamination of the heart disclosed a large thrombus(approximately 0.94 x 0.52 cm) (Figure 2) inside theseverely enlarged left atrium (2.38 cm). Due to respi-ratory distress, the echocardiogram was not fully performed. Therefore, no measures of left ventricularchamber and aortic peak velocity were done at thistime.

Although every effort was made to treat pulmonaryedema, cardiopulmonary arrest occurred about threehours after initial presentation.

Figure 1 – Continuous-wave Doppler interrogation at initial presentation showed a severely increased peak aortic velocity (6.03m/s) and a turbulent flow across the aortic valve (arrow). (Ao: Aorta;LA: left atrium; LV: left ventricle).

Figure 2 – Echocardiographic findings in a kitten with aortic stenosis:Left atrial thrombus (between arrows) seen on the long-axis view. (LA:left atrium; RA: right atrium; LV: left ventricle).

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Sousa MG et al. RPCV (2008) 103 (567-568) 229-232

Discussion

Congenital cardiac disease comprises about 10% ofcardiology cases in domestic mammals (Keirstead etal., 2002). In cats, however, congenital heart diseasesare less common, counting for approximately 0.02%to 0.1% of hospital admissions (Goodwin, 2001).Although rare, some reports of congenital fixed aorticstenosis in cats exist (Liu, 1968; Stepien andBonagura, 1991).

Although no clinical signs were observed at initialpresentation, a congenital heart disease was suspecteddue to a loud systolic ejection murmur loudest overthe left basilar region. Cote et al. (2004) reported thatmany murmurs detectable in overtly healthy catsappear to be caused by a latent structural heart disease.Because young animals can have physiologic or innocent heart murmurs, it is important to considerthat, in general, loud heart murmurs are indicative ofcardiac disease (Kittleson, 1998). Therefore, ancillaryexams were requested to confirm the suspected heartpathology.

Initial thoracic radiographs did not show any abnor-malities. Left ventricular enlargement and widening ofthe mediastinum (poststenotic dilatation) may bedetected by radiography in severely affected animals(Liu, 1968; Bolton and Liu, 1977; Stepien andBonagura, 1991). In some cases, however, thoracicradiographs may be normal (Sisson et al., 2000). Onlysinus tachycardia was observed on the electrocardio-gram. Although the electrocardiogram is generallynormal in dogs with subaortic stenosis, severelyaffected dogs may eventually have ventricular prema-ture contractions (Kienle, 1998). Nevertheless, we didnot observe any abnormality in nearly three minutes ofECG recording in this cat.

The suspected congenital heart anomaly was confirmed by Doppler echocardiography. The highlyincreased velocity across aortic valve is the definitivediagnosis of aortic stenosis (Stepien and Bonagura,1991; Ferraris, 2007), which has been recognized tooccur in subvalvular, valvular, and supravalvularforms in cats (Kienle, 1998). Also, an incompletesubaortic stenotic ring was detected at necropsy in onecat (King et al., 1988). The obstruction was assumedto be fixed rather than dynamic owing to the lack of adelayed systolic peak in the continuous-wave Dopplertracing of the left ventricular outflow tract (Thomas etal., 1984; Kienle, 1998). Chronic pressure overloadassociated to a normal or enhanced myocardial func-tion resulted in secondary left ventricular concentrichypertrophy, which is usually appreciated in modera-tely-to-severely affected animals (Kienle, 1998).Interestingly, no poststenotic dilatation was recog-nized. In dogs, however, the dilatation may be slightbefore 6 months of age (Kienle, 1998), which is like-ly to be similar in affected cats.

Due to questionable or unproven value, medical

therapy was not initiated in this kitten (Fox, 1991;Bonagura, 1994). Although the kitten was asympto-matic and had no electrocardiographic abnormalities,the owner was informed of the possibility of starting abeta-adrenergic receptor blocking drug and anangiotensin-converting enzyme inhibitor empirically(Kienle, 1998; Sisson et al., 2000; Belerenian, 2007),since a severely increased gradient was measuredacross aortic valve. By decreasing heart rate and cardiac contractility, beta-blockers may reducemyocardial oxygen demand and increase coronaryperfusion, thereby reducing the occurrence of malignant arrhythmias (Kienle, 1998). However, thisoption was declined and only restriction to vigorousexercise was recommended.

Cats with cardiac disease are prone to developthromboembolism (Laste and Harpster, 1995; Smithand Tobias, 2004). In general, the thrombus is formedin the enlarged left atrium due to blood stasis,endothelial damage, and altered coagulability (Pionand Kittleson, 1989; Bonagura, 1994). In the casereported herein, the abnormal diastolic filling patternas a consequence of concentric hypertrophy and ventricular stiffness resulted in left atrial enlargement,therefore predisposing for thrombogenesis (Bonagura,1994; Kienle, 1998). On presentation, however, thethrombus had not caused clinical abnormalities andwas an incidental finding. The thrombus within leftatrium was large enough to be easily observed onstandard long-axis four-chamber and short-axis views.Although reports of intracardiac thrombi exist (Venco,1997), we did not find any report of intracardiacthrombus formation in a cat with aortic stenosis.

Conclusion

Although rare, aortic stenosis may occur in cats.Loud heart murmurs auscultated in overtly healthy kittens may indicate a congenital heart disease.Therefore, clinicians are reminded to perform adetailed physical examination prior to routine vaccinations or exams. Also, cats with aortic stenosisand enlarged left atrium should be considered at risk for developing intracardiac thrombi and eventhromboembolism.

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Complexo hiperplasia endometrial cística-piometra em uma cadela tratadacom acetato de medroxiprogesterona como método contraceptivo

Cystic endometrial hyperplasia-pyometra complex in a mongrel bitch treated with medroxyprogesterone acetate as a contraceptive method

Hanniele R. Moreira1, Stefânia A. Miranda1, 3, 4, Adriel B. de Brito1,Washington L. A. Pereira2, 3, Sheyla F. S. Domingues1, 2*

1Laboratório de Biologia e Medicina de Animais Domésticos e Silvestres da Amazônia (BIOMEDAM), Faculdade de Medicina Veterinária, Campus de Castanhal, Universidade Federal do Pará (UFPA)

Rua Hernane Lameira, 532, Castanhal, Pará, Brasil - CEP: 68743- 0502Medicina Veterinária, Instituto de Saúde e Produção Animal, Universidade Federal Rural da Amazônia (UFRA)

Presidente Tancredo Neves, 2501, Belém, Pará, Brasil - CEP: 66077-5303Programa de Pós-Graduação em Ciência Animal, UFPA. Rua Augusto Correa, 01, Belém, Pará, Brasil - CEP: 66075-900

4Bolsista da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES)

R E V I S T A P O R T U G U E S A

CIÊNCIAS VETERINÁRIASDE

CASO CLÍNICO

233

Resumo: O objetivo deste estudo foi relatar o caso clínico, osachados ultrassonográficos e histopatológicos do complexohiperplasia endometrial cística - piometra (HEC-P) em umacadela sem raça definida, tratada pelo proprietário com medroxiprogesterona durante três anos sem a orientação médica veterinária, bem como mostrar a importância da utiliza-ção do exame ultrassonográfico na clínica veterinária para o diagnóstico precoce de HEC associada ou não à piometra,quando métodos contraceptivos com análogos da progesteronaforem empregados.

Palavras-chave: Cadela, medroxiprogesterona, ultrassono-grafia, complexo hiperplasia endometrial cística-piometra

Summary: The aim of the current study was to report the clinical case, ultrasonographic and histopathologic findings ofcystic endometrial hyperplasia-pyometra complex (CHE-P) in a mongrel bitch, which the owner treated with medroxypro-gesterone acetate, continuously, during three years without veterinary’s orientation, as well as to demonstrate the impor-tance of using exams like ultrasonography in veterinary clinicfor early diagnosis of CEH associated or not to pyometra, whencontraceptive methods like progesterone acetate analog wereemployed.

Keywords: Bitch, medroxyprogesterone acetate, ultrasonogra-phy, cystic endometrial hyperplasia-pyometra complex

Introdução

Nos últimos anos, métodos de prevenção ou interrupção da gestação vêm sendo descritos para ocontrole populacional de cães e gatos e, entre essesmétodos estão o cirúrgico (Brunckhorst et al., 2000), o

imunológico (Lopes et al., 2005) e o hormonal(Brunckhorst et al., 2000; Oliveira e Marques Jr, 2006).Atualmente, os tratamentos hormonais com análogosda progesterona, como o acetato de medroxi-proges-terona, são utilizados na Medicina Veterinária visando acontracepção de cadelas e gatas (Kim e Kim, 2005;Oliveira e Marques Jr, 2006). A exposição à proges-terona por períodos prolongados associada a infecçãobacteriana pode resultar em hiperplasia endometrialcística e o surgimento de piometra (HEC-P) (Hidalgo etal., 1986; Grooters, 1994).

A HEC é uma enfermidade polissistêmica que podeser aguda ou crônica (Dow, 1957; Kennedy e Miller,1993), sendo a HEC-P uma causa comum de mortes emfêmeas da espécie canina (Hardy, 1980; Arthur et al.,1989; Coggan et al., 2004). Histologicamente, a HEC-P caracteriza-se por hiperplasia do endométrio, infil-tração de células inflamatórias em todas as camadasteciduais do útero: endométrio, miométrio e perimétrio(Dow, 1957; Kennedy e Miller, 1993). Ocorre um acú-mulo de exsudato no lúmen uterino e nas glândulasendometriais (Feldman e Nelson, 1996), bem como umaumento no tamanho e número destas glândulas (DeBosschere et al., 2001), a dilatação das mesmas confereo aspecto cístico (Johnson, 1992).

Para o diagnóstico da HEC-P, a ultrassonografia (US)bidimensional (2D) em modo B pode ser utilizada, porpermitir a visualização detalhada do conteúdo intralu-minal, bem como das camadas teciduais e contornosuterinos (Nyland, 2002), sendo empregada no diagnós-tico de doenças do sistema reprodutor, como a endome-trite e a HEC associada ou não à piometra (Gonzalez etal., 2003) e, de outros diagnósticos quando há presençade material intraluminal uterino, como a mucometra,hidrometra e hemometra (Nyland, 2002).*Correspondência: [email protected]

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Moreira HR et al. RPCV (2008) 103 (567-568) 233-238

O uso da US como um procedimento de diagnósti-co por imagem na medicina veterinária é de grandeimportância por não ser invasivo, não causar efeitobiológico prejudicial, ser seguro para o paciente e parao operador, sendo possível executá-la sem a necessi-dade de medidas de segurança específicas (King,2006).

O objetivo deste trabalho foi relatar o caso clínico e os respectivos achados ultrassonográficos e histopatológicos da HEC-P em uma cadela sem raçadefinida (SRD), que foi tratada a critério do proprie-tário com medroxiprogesterona por três anos, sem aorientação do Médico Veterinário, assim como,chamar a atenção para a importância da incorporaçãode exames complementares, como a US, à rotina daclínica veterinária para subsidiar o diagnóstico precoce da HEC, associada ou não à piometra, quando métodos contraceptivos à base de análogos daprogesterona forem empregados.

Material e métodos

Uma cadela sem raça definida (SRD), com 10 anosde idade, pesando 9 kg e não castrada foi atendida noLaboratório de Biologia e Medicina de AnimaisDomésticos e Silvestres da Amazônia (BIOMEDAM),Faculdade de Medicina Veterinária, UniversidadeFederal do Pará (UFPA), por apresentar, segundo oproprietário, sinais de anorexia, apatia, gemidos,êmese, tenesmo, poliúria, polidpsia e edema vulvarcom eliminação de secreção vaginal mucopurulentade odor pútrido. O proprietário relatou que adminis-trava medroxiprogesterona à fêmea como método contraceptivo por 3 anos consecutivos, a cada 4 meses,sem a prescrição de um Médico Veterinário.

O exame clínico da fêmea foi conduzido, estenden-do-se com a colpocitologia, posteriormente com acoleta de sangue para hemograma completo, e, adicionalmente, realizou-se a US transabdominal.Para a US, procedeu-se uma ampla tricotomia dasregiões abdominal e pélvica. Em seguida, aplicou-se àpele um gel de transmissão hidrossolúvel para ultras-som (Aquasonic® 100, Parker Laboratories, INC.,Fairfield, New Jersey, USA), com o objetivo de assegurar um bom contato entre o transdutor e a peledo animal.

A US foi realizada com o ultrassom PHILIPS modelo HDI 4000 (Philips Medical Systems, Bothel,WA, EUA), equipado com um transdutor linear multi-frequencial de 5–12 MHZ e dispositivos DopplerColorido e Doppler de Fluxo. O útero foi localizadocom a US 2D em modo B, usando a bexiga urináriavisualmente anecóica como órgão de referência. Como auxílio do Doppler Colorido, as artérias uterinasdireita e esquerda foram identificadas lateralmente aolongo de cada corno uterino. Em seguida, o Dopplerde Fluxo foi acionado para a obtenção do amostral do

Doppler pulsátil, registro das ondas de fluxo e cálculode ambos índices de resistividade (IR) e de pulsatili-dade (IP), sendo estes calculados automaticamentepelo software do ultrassom de acordo com asseguintes fórmulas propostas por Pourcelot (1974) eGosling et al. (1974), respectivamente:

IR = Pico de velocidade sistólica – Velocidade diastólica final

Pico de velocidade sistólica

IP = Pico de velocidade sistólica – Velocidade diastólica final

Velocidade média do ciclo

A partir dos achados ultrassonográficos indicativosde HEC-P, a fêmea foi submetida à ovariohisterecto-mia. Fragmentos do útero foram fixados em formoltamponado a 10%, inclusos em parafina e seccionadosa uma espessura de 5 µm, sendo posteriormente coradospelo método de Hematoxilina-Eosina (H-E) paraexame histopatológico.

Resultados e discussão

No presente caso, a HEC-P provavelmente decorreudo uso prolongado e indiscriminado de medroxipro-gesterona. De acordo com Gobello et al. (2003), esseprocesso pode se desenvolver após o uso de proges-terona que promove o bloqueio do estro. Estudosexperimentais conseguiram reproduzir esta patologiapor meio da inoculação intra-uterina de Escherichiacoli, durante simulação do diestro com benzoato deestradiol e acetato de megestrol em cadelas ovariecto-mizadas (Arora et al., 2006). Portanto, é crucial o papel representado pela progesterona exógena na manifestação de alterações uterinas, que levarão aodesenvolvimento da HCE.

O histórico clínico do presente caso corrobora como que é descrito na literatura disponível sobre HEC-P(Bigliardi et al., 2004), uma vez que as queixas maisfreqüentes dos proprietários de animais com estadoença consistem em vômito, anorexia, depressão,eliminação de secreção vaginal purulenta, que podeestar presente em até 75% das cadelas com HEC-P(Hardy e Osborne, 1974), poliúria e polidipsia, sendoesses dois últimos sinais uma forma compensatória dadiminuição da capacidade de concentração tubularrenal (Birchard e Sherding, 2003).

Ao exame físico não foram evidenciadas alteraçõesna auscultação cardiopulmonar. A coloração dasmucosas, o tempo de preenchimento capilar e a temperatura retal estavam normais. A febre é um achado variável e freqüentemente está ausente(Birchard e Sherding, 2003). Entretanto, Johnson(1992) descreve que animais com HEC-P geralmenteapresentam a temperatura retal normal, porém os queestão com septicemia ou endotoxemia podem estarhipotérmicos. Durante a palpação abdominal, a fêmeademonstrou acentuada sensibilidade e o abdômenestava aumentado de tamanho devido ao acúmulo de

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líquido no lúmen uterino.A colpocitologia confirmou o histórico de secreção

vaginal mucopurulenta. Essa técnica, além do baixocusto é de fácil execução, sendo importante a sua realização durante o exame físico para a detecção dasecreção recorrente do trato reprodutor feminino,visto que as secreções podem não estar visíveis nomomento da chegada da paciente ao consultório,como aconteceu nesse relato.

Com relação aos achados hematológicos, o eritro-grama apresentou apenas uma discreta redução nonúmero de eritrócitos com valores de 4,8 x 1012/L(Valor referencial: 5,5-8,5 x 1012/L) e aumento doVCM (87,5 fL) e HCM (29,2 pg), considerando osvalores de referência de 60-72 fL e 19,9-24,5 pg,respectivamente (Meyer et al., 1995). O leucogramaapresentou-se sem alterações. O hemograma em cadelas com HEC-P geralmente indica um leucogramatipicamente inflamatório, caracterizado por neutrofiliaextrema com desvio à esquerda regenerativo (Johnson,1992; Birchard e Sherding, 2003), porém pode ocorrerleucograma normal que está geralmente associadocom cérvix aberta (Birchard e Sherding, 2003), ondehá eliminação de secreção vaginal purulenta prove-niente do útero.

No exame de US 2D em modo B, foram eviden-ciadas as seguintes alterações: cornos uterinos direitoe esquerdo com contornos levemente irregulares ediâmetros aumentados medindo 2,52-2,59 cm e 1,5-1,9 cm (Figura 1A), respectivamente; presença deconteúdo anecóico no lúmen uterino; e endométriorepleto de lesões multifocais papiliformes hiperecói-cas e císticas anecogênicas (0,99 cm) (Figura 1B).Considerando os achados ultrassonográficos, foi possível demonstrar que a US 2D em modo B é umexame importante para o diagnóstico da HCE-P, porpossibilitar a visualização da espessura do endométrioe do diâmetro uterino, bem como a presença de líquido no lúmen uterino e de hiperplasia cística dasglândulas endometriais, conforme também já descritopor Bigliardi et al. (2004). Bigliardi et al. (2004)ressaltam ainda que quando os sinais clínicos HEC-Psão severos é necessário realizar um exame ultras-sonográfico para diagnósticar o grau das lesões.

As lesões multifocais papiliformes hiperecóicas e císticas anecogênicas presentes no endométrio foramvisualizadas com bordos ricamente vascularizadosfacilmente evidenciada pela US 2D em modo B asso-ciada ao Doppler Colorido (Figuras 1C e 1D). Com oUS 2D em modo B, associada ao Doppler Colorido eDoppler de Fluxo (Triplex Doppler) foram obtidos osvalores de 0,82 e 0,99; 2,31 e 3,78 para os IR e IP deambas as artérias uterinas direita e esquerda, respecti-vamente (Figuras 1E e 1F). Em cadelas adultas na fasede anestro, Miranda et al. (2007) descreveram que nãoocorrem diferenças estatísticas entre os IR e IP dasartérias uterinas direita e esquerda, sendo as médiasdesses índices as seguintes: 0,87 ± 0,01 e 3,00 ± 0,2.

Figura 1A - Exame Ultrassonográfico. US 2D em modo B mostrandosecção longitudinal do corno uterino com acentuado aumento de tamanho.

Figura 1B - US 2D em modo B do corno uterino em secção longitudinalmostrando o endométrio com lesões císticas anecóicas (seta branca pre-enchida) e espessamento papiliforme hiperecóico (seta branca pontilhada)

Figura 1C - US 2D em modo B associada ao Doppler Coloridodemonstrando o corno uterino em secção longitudinal com lesão papiliforme endometrial apresentando bordos vascularizados.

Figura 1D - US 2D em modo B associada ao Doppler Coloridodemonstrando o corno uterino em secção transversal com lesões císticas apresentando bordos acentuadamente vascularizados de fácil evidenciação pelo Doppler Colorido.

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aumentado de tamanho com artérias uterinas (AU) eseus ramos congestos, hiperêmicos e dilatados (Figura2A). O endométrio apresentava-se espessado comzonas de hipertrofia papilomatosas (Figura 2B) e presença de conteúdo mucopurulento intraluminal.

O estudo histopatológico revelou hiperplasia doepitélio de revestimento uterino, configurando um

Figuras 1E e 1F - Triplex Doppler das artérias uterinas (AU) direita(E) e esquerda (F). Os índices de resistividade (IR) e pulsatilidade (IP)da AU direita estão normais (0,82 IR e 2,31 IP), enquanto que na AUesquerda estes índices encontram-se aumentados (0,99 IR e 3,78 IP),demonstrando uma vasoconstrição na AU esquerda com aumento daresistência no fluxo sanguíneo.

A elevação ou a diminuição dos IR e IP são resultantesda diminuição ou aumento do fluxo sanguíneo,respectivamente, sendo que ambas as situações podemser em decorrência de possível processo patológico(Domingues et al., 2007), como observou-se no resul-tado desse trabalho, em que se configurou umaassimetria do fluxo sangüíneo uterino, onde a AUesquerda apresentou IR e IP aumentados, demonstran-do uma vasoconstrição neste vaso com aumento daresistência no fluxo sanguíneo.

No procedimento cirúrgico (ovário-histerectomia)constatou-se que o útero apresentava-se aumentado detamanho, conforme observado no exame ultrassono-gráfico. Confirmando a importância da avaliação dosistema reprodutor da fêmea por meio da US para aescolha do tratamento, pois na HEC, com ou sempiometra, o tratamento indicado é a ovário-histerecto-mia (Johnson, 1992; Birchard e Sherding, 2003;Lyman, 2003). Bigliardi et al. (2004) relataram quenunca obtiveram sucesso no tratamento comprostaglandina e antibióticos em casos severos deHEC, sendo estes medicamentos utilizados somenteem casos mais brandos da doença. Porém o que deter-mina se o tratamento deve ser clínico ou cirúrgico é acondição em que o animal se encontra no momento doexame clínico, além da idade da paciente (Birchard eSherding, 2003) e da importância para o proprietáriode preservar a capacidade reprodutiva do animal(Allen, 1995). Vinte dias após a cirurgia houve a recuperação total da paciente.

Nos casos onde é de interesse do proprietário manter a integridade do aparelho reprodutor e, conse-qüentemente, a capacidade reprodutiva da cadela,optando-se pelo uso de derivados de progesteronacomo método contraceptivo, é aconselhável que sefaça um acompanhamento ultrassonográfico periódicopor um Médico Veterinário, visto que qualquer patolo-gia indesejada (endometrite, mucometra, HEC-P, entreoutras) pode vir a ser diagnosticada precocemente.

No exame macroscópico foi observado o útero

Figura 2 - (A) Útero após ovário-histerectomia (amostra preservada em formol). Observa-se o útero aumentado de tamanho. Artéria uterina (AU) eseus ramos congestos, hiperêmicos e dilatados. (B) Endométrio com aspecto papiliforme e presença de secreção mucopurulenta.

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aspecto papiliforme com projeções para o lume,incluindo as glândulas endometriais; no interstíciohouve predomínio de macrófagos e de células neutrofílicas (Figura 3). Ainda no tecido conjuntivoendometrial, os vasos mostraram-se túrgidos porsangue, e presença de áreas hemorrágicas e de fibro-plasia. Além da hiperplasia do epitélio superficial e glandular endometrial, observou-se destruição deglândulas e muitas mostraram-se com distensão cística do lúmen por exsudato mucoso (Figura 4) ecélulas piocitárias. O miométrio encontrava-se comvasos congestos e perimétrio sem alterações. Noakeset al. (2001) e Chu et al. (2002) consideram que essasalterações na estrutura do endométrio canino podemser associadas com degeneração do epitélio luminal,hiperplasia endometrial cística, piometra, o que nopresente caso atribui-se à HEC-P em conseqüência daadministração de altas doses de medroxiprogesteronacomo método contraceptivo, por período prolongado.

Frente à freqüente ocorrência na clínica veterináriade pequenos animais do complexo HEC-P, cadelas

submetidas ao uso prolongado de análogos da progesterona como método contraceptivo devem sermonitoradas por exames ultrassonográficos, uma vezque a ultrassonografia possibilita o diagnóstico deHEC-P, antes mesmo que exames laboratoriais(hemograma) indiquem a presença desta patologia,possibilitando a escolha do melhor tratamento. Daí aimportância do acompanhamento ultrassonográficoperiódico do sistema reprodutor da fêmea pelo médico veterinário, quando métodos contraceptivosforem empregados. Vale também ressaltar que a orientação de um profissional médico veterináriocapacitado é imprescindível para a prescrição demétodos contraceptivos.

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Figura 3 - Fotomicrografia de HEC crônica. Hiperplasia da glândulaendometrial com projeções papiliformes no lume (setas). O tecido conjuntivo perigrandular densamente infiltrado por neutrófilos emacrófagos (A). H.E. 40x.

Figura 4 - Fotomicrografia de HEC crônica. Denso infiltrado inflamatório endometrial (A). Varias glândulas endometrias com distensão cística (B). O epitélio do lume uterino hiperplásico e comformações polipóides (setas). H.E. 20x.

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Suplemento

DA REVISTA PORTUGUESA DE CIÊNCIAS VETERINÁRIASVol. CIII · Nº 567-568

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Elie Metchnikoff na Ilha da Madeira

António Martins Mendes1 e Alexandre Cameira Leitão2

1Faculdade de Medicina Veterinária, TULisbon. Avenida da Universidade Técnica, 1300-477 Lisboa2Instituto de Investigação Científica Tropical, CVZ - CIISA. FMV - Avenida da Universidade Técnica, 1300-477 Lisboa

R E V I S T A P O R T U G U E S A

CIÊNCIAS VETERINÁRIASDE

SUPLEMENTO

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Elie Metchnikoff (Kharkoff, 1845 – Paris, 1916) foilaureado em 1908 com o Prémio Nobel da Medicina,em reconhecimento pelos seus trabalhos sobre imunidade.

A ideia de apresentar esta nota surgiu quando um de nós remexendo nos restos do que foi a esplêndidabiblioteca da Escola Superior de Medicina Veterináriaque ainda se encontravam no sótão do edifício da Ruade Gomes Freire, deparou com um maço do BoletimInternacional do Instituto Oswaldo Cruz. Num dosnúmeros existia uma biografia do seu patrono e, nesseescrito, o autor afirma que Oswaldo Cruz, fundadordo internacionalmente conhecido Instituto de Mangui-nhos, Rio de Janeiro, enquanto estudava no InstitutoPasteur de Paris, conversava com Metchnikoff em português que ele aprendera na Ilha da Madeira(Coura, 1994).

Evidentemente que para nenhum de nósMetchnikoff era um desconhecido mas a sua estadiana Madeira foi uma surpresa. Decidimos então apro-fundar o assunto. O "Elucidário Madeirense"(Augusto da Silva e Azevedo de Meneses, 1984) ou"As Ilhas de Zargo" (Pereira, 1967) nada referem.Infelizmente não nos foi possível deslocarmo-nos aoFunchal para consultar os respectivos ArquivosHistóricos. Contudo ficámos com a ideia de que,provavelmente, pouco ou nada encontraríamos. Todasas obras respeitantes à Imunologia e à Microbiologia,com maior ou menor destaque, continuam a referirMetchnikoff e o seu trabalho fundamental, mas ficam-se por aí. Para este escrito, baseámo-nos nabiografia escrita por Olga Metchnikoff (1920) e nodiscurso de agradecimento proferido pelo próprioquando lhe foi atribuído o Prémio Nobel da Medicina,em 11 de Dezembro de 1908, bem como na biografiaque o acompanha em "Nobel Lectures" (Sem autor,1967).

Vejamos então. Elie Metchnikoff (a forma francesado seu nome que ele usou durante os últimos 25 anosda sua vida) foi um zoologista e biologista, nascidonuma pequena aldeia perto de Kharkoff, na Ucrânia,ao tempo parte integrante do Império Russo, a 16 deMaio de 1845. Seu pai era oficial da guarda imperialrussa e proprietário de terras. Elie foi o último dosseus cinco filhos. Sua mãe era judia e Metchnikoff foi

educado nessa religião. Mais tarde porém, afirmou-seateu e elegeu o racionalismo e a ciência como suareligião. Depois dos estudos nas escolas primária esecundária, matriculou-se na Universidade deKharkoff realizando uma licenciatura em CiênciasNaturais de quatro anos, em apenas dois. Desde muitocedo se sentira atraído pelo estudo da Natureza, sendofortemente influenciado pela leitura da "Origem dasespécies" de Charles Darwin, publicada em Novembrode 1959, tinha Metchnikoff 14 anos. De 1864 a 1867realizou uma viagem de estudo por várias cidades daEuropa, trabalhando em Zoologia e Botânica.Finalmente, em Nápoles e em colaboração comKowalevsky, estudando a reprodução dos chocos(género Sepia) lançou as bases da Embriologia. Em1867 apresentou na Universidade de S. Petersburgotese de Doutoramento consagrada à sua teoria dos folhetos embrionários. Foi depois admitido comodocente da nova Universidade de Odessa e, em 1870,foi nomeado Professor titular de Zoologia da mesmaUniversidade. Entretanto, em Janeiro de 1869, em S. Petersburgo, casara em primeiras núpcias comLudmilla Feodorovitch que sofria de uma tuberculosetão avançada que foi levada para a cerimónia numacadeira de rodas. Durante os anos seguintes passoudiversos períodos nas costas do Mediterrâneo, reali-zando estudos da fauna marítima e procurando umclima mais favorável para a saúde de sua esposa.

Naquele tempo a Madeira era afamada pelo seuclima temperado. Foram os ingleses os primeiros quea privilegiaram como aconselhável para a cura dasdoenças pulmonares. A propósito deste assunto, JessieEdith Hutcheon, membro da Royal GeographicalSociety, Londres, escrevia num livro dedicado àMadeira (Hutcheon, 1928): «Há cinquenta anos aMadeira era considerada como possuidora de umclima favorável para os doentes de tuberculose e rece-bia muitos inválidos para uma longa permanência.Arrendavam-se quintas, traziam-se pianos e outrosbens de conforto da Inglaterra». O mesmo autor citauma Miss North que num dos seus livros, em suaopinião, dava uma imagem talvez pouco correcta doFunchal desse tempo: «Apesar da maravilhosa belezade tudo quanto nos rodeava, ela [uma sua prima quevivia no Funchal com o marido tuberculoso] fazia-me

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compaixão por estar rodeada de tantos inválidos semesperança. Ouvia tosses e gemidos em todos os ladose via as faces exangues dos doentes que eram trans-portados em redes cobertas com colchas brancas aosombros de dois homens como se fossem cadáveres».

Muito diferente era a imagem expressa pelos naturaisda Ilha que falavam da admirável alegria e do espíritodos inválidos, das "garden-parties" e dos passeios acavalo – os dois grandes atractivos dos que ainda nãohaviam perdido de todo a esperança. Para Hutcheon,no entanto, tudo isso estava já muito distante. Dessestempos passados ficara somente a memória expressanas lápides das sepulturas. E é o referido autor que nosdá uma curiosa imagem do cemitério britânico, talcomo o encontrou: «... o cemitério britânico, situadona rua do Dr. Vieira, é uma comovente mancha, umjardim diferente, onde, à sombra de palmeiras eciprestes, jazem os estrangeiros do outro lado do mar;a chuva dourada da begónia vetusta reveste amorosa-mente as paredes de cores cintilantes, com as montanhas à volta fazendo guarda. Choca-nos ler asidades de tantas jovens vidas adormecidas que vieramà Madeira à procura de saúde e somente encontraramum túmulo».

Mas, para além de ingleses, naquele tempo,cidadãos de outras nacionalidades, incluindo portu-gueses, procuravam na Madeira cura para a suadoença. Embora um pouco à margem deste escrito,damos dois exemplos. A princesa D. Maria Amélia,filha única da Imperatriz do Brasil, viúva de D. Pedro I(do Brasil) que em 1852 morreu tuberculosa noFunchal. Sua mãe, D. Amélia, ao deixar o Funchalescrevia a D. Maria II de Portugal comunicando-lhe a resolução de mandar construir nessa cidade um hos-pício para tuberculosos pobres que ficasse teste-munhando o carinho e o apoio que ambas haviamrecebido dos seus bons habitantes. Como sinal dereconhecimento passou também a existir no Funchal arua da Imperatriz. Com o passar do tempo o hospícioedificado transformou-se num asilo para criançasdesamparadas e assim se mantém na actualidade.Outro caso a referir é o do escritor Júlio Diniz,pseudónimo literário do médico Joaquim GuilhermeGomes Coelho que terminou o curso na EscolaMédico-cirúrgica do Porto em Julho de 1861, ondeveio a ser lente substituto, secretário e bibliotecário.Em 1866 procurou na Madeira alívio para a tubercu-lose que se tinha manifestado já no segundo ano dalicenciatura. Não encontrou grandes melhoras masefectuou várias viagens entre Lisboa, Porto e Funchal.Morreu no Porto em 12 de Setembro de 1871, com 31 anos de idade. Nas suas permanências no Funchalnão encontrara cura para a doença que lhe matara amãe e os seus 8 irmãos. Pensa-se que alguns dos seuslivros ou, mais provavelmente, "Os Fidalgos da CasaMourisca" tenham sido escritos, pelo menos parcial-mente, no Funchal.

Com o decorrer dos tempos a Madeira deixou de ser

considerada como uma estação climática para doentespulmonares transformando-se numa alternativa àRiviera. Passou então a ser visitada por pessoasseduzidas pelo seu clima temperado no Inverno e,mais ainda, durante o Verão, transformando-se numaestância turística internacional.

Mas regressemos a Metchnikoff. Durante 5 anos feztudo quanto lhe foi possível para salvar a vida de suaesposa. A última tentativa foi o Funchal. Ludmillatinha ouvido falar dos efeitos mágicos dos ares daMadeira nos casos de tuberculose e agarrou-se a essaideia como a uma tábua de salvação. Não encontrámosa data da chegada do casal à Ilha. Partilharam o arren-damento de uma casa com jardim com um jovemRusso, de nome Mertens, que tinha viajado no mesmobarco. Olga Metchnikoff (1920) descreve uma dicoto-mia angustiante entre o conforto do lar num lugar deincomparável beleza natural, toda perfumes e flores, eestas duas jovens vidas, uma que se esvaía e outra quese entregava a uma batalha inútil para a salvar.Ludmilla, que já tinha ilustrado diversos trabalhoscientíficos de Metchnikoff, desenhava flores, lia einteressou-se pelas crianças pobres da Ilha. Metchni-koff que antes de partir para a Madeira tinha obtidosubsídio da Sociedade dos Amigos das CiênciasNaturais de Moscovo, sentia-se na obrigação de obterresultados mas a costa escarpada batida pelas ondasdificultava-lhe o acesso ao seu objecto de estudo, afauna marinha. Entregou-se ao estudo da embriologiados miriápodes (Metchnikoff, 1872), até entãodesconhecida. Mas, por dificuldades técnicas, estestrabalhos foram uma fonte de desespero. Nestas circunstâncias, o pessimismo natural de Metchnikoff,que escrevera um dia numa carta a sua mãe: «...comosabe, não sou dado a olhar para a vida com óculos cor-de-rosa...», acentuava-se. Entretanto, no segui-mento de um trabalho que tinha publicado antes de irpara a Madeira sobre "A educação do ponto de vistaantropológico", escreveu um artigo intitulado "O tempo para o casamento" no qual discutia as consequências do aumento progressivo, por razõesculturais e civilizacionais, do tempo que decorre entrea puberdade e o casamento. Mais tarde veio a retomareste assunto numa publicação que teve grande impactona comunidade científica da época (Metchnikoff,1903). Equacionou demitir-se de todos os cargos eabrir uma pequena livraria no Funchal para poder ficarindependente e junto a sua esposa, mas as suas difi-culdades financeiras inviabilizaram o projecto.Deslocou-se a Tenerife em busca de matéria para umartigo e regressou logo que lhe foi possível para juntode sua esposa. Nada se tinha alterado e Metchnikofftinha de regressar a Odessa. Pediu a sua cunhada quefosse para a Madeira e quando ela chegou confiou asduas irmãs a Mertens, com quem tinha desenvolvidoestreita amizade, e aos cuidados do Dr. Goldschmidt.Partiu para Odessa no Outono de 1872. Más notícias,contudo, fizeram-no regressar ao Funchal em finais

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de Janeiro de 1873. Ludmilla estava gravementedoente e faleceu a 20 de Abril. Para Metchnikoff a suamorte foi um choque muito intenso. Ao desgosto juntaram-se perturbações visuais, que o impediam de trabalhar ao microscópio. Desesperado, fez umatentativa de suicídio ingerindo uma elevada quanti-dade de ópio. Mas sobreviveu. Voltou aos seus estudossobre as raças humanas e obteve financiamentos paraduas Missões nas estepes de Astrakan.

Em 1875 casou-se em Odessa com OlgaBelokopytova. Olga em 1880 fez uma grave infecçãode Febre Tifóide e Metchnikoff, que estava ainda comgraves problemas de saúde, voltou a tentar o suicídio,dando-lhe uma forma de experiência científica. Auto-infectou-se com sangue de doentes de FebreRecorrente procurando demonstrar que a doença eratransmissível pelo sangue. A infecção foi muito gravemas, mais uma vez, sobreviveu.

Em 1882 demitiu-se da Universidade de Odessa, noperíodo perturbado que se seguiu ao assassinato deAlexandre II, e regressou a Messina para trabalhar nolaboratório onde realizara os seus trabalhos deEmbriologia. Retomou então os seus estudos sobre afauna pelágica e o desenvolvimento embrionário dosorganismos. Quando observava células móveis naslarvas transparentes de estrelas-do-mar pensou queelas deveriam ser consideradas como uma parte dasdefesas desses organismos. Para testar a sua hipóteseintroduziu no corpo das larvas alguns pequenos espinhos de uma tangerineira que havia sido prepara-da como árvore de Natal para seus filhos. No diaseguinte observou que os espinhos estavam cercadospelas células móveis e, sabendo que quando surgeuma inflamação nos animais com aparelho vascular os leucócitos saem dos seus vasos, admitiu que elas deviam também envolver e digerir as bactérias quetivessem entrado no organismo. Ao regressar a Odessapassou por Viena e expôs as suas ideias ao Professorde Zoologia da respectiva Universidade, Dr. Claus,que em reposta ao pedido de sugestão de um termogrego para designar "célula devoradora" lhe sugeriu"fagocito". Em 1883, encorajado pelos investigadoresalemães Kleinenberg e Virchow, que tinham estadopresentes em Messina aquando dos seus estudos, publicou nos Trabalhos do Instituto de Zoologia daUniversidade de Viena uma notícia sobre as reacçõescelulares dos animais invertebrados, na qual aparece,pela primeira vez a palavra fagócito (Metchnikoff,1883a) e, nesse mesmo ano, um outro sobre a fagoci-tose em alguns vertebrados (Metchnikoff, 1883b).Ainda no Outono desse ano apresentou em Odessa oseu primeiro trabalho sobre a fagocitose.

A interpretação do fenómeno da fagocitose e adedução do seu significado na defesa do organismoeram o oposto da teoria estabelecida na época. Mesmoantes da primeira publicação de Metchnikoff sobre ofenómeno que agora se passava a designar fagocitose(Metchnikoff, 1880), a ingestão de partículas inertes,

eritrócitos e até de agentes infecciosos tinha já sidoobservada (ver Ambrose, 2006). Todavia a maioria dasopiniões defendia que o fenómeno promovia a disper-são dos agentes infecciosos pelo organismo e era, portanto, deletério. Poucos admitiam um papel dedefesa. Mas a hipótese de Metchnikoff ia mais longe ecolocava a fagocitose no centro da inflamação e daimunidade. Alterou completamente a sua personali-dade, abandonou o pessimismo e procurou evidênciasexperimentais para a sua teoria. A primeira confir-mação terá sido a observação de que os esporos dosfungos que atacavam os crustáceos de água doce dogénero Daphnia eram atacados pelos respectivosfagocitos. Estudou depois o carbúnculo interno e viuque as estirpes mais virulentas não eram atacadaspelos leucócitos enquanto que as mais atenuadas oeram. Por fim, em 1900, apresentou ao CongressoInternacional, em Paris, o conjunto dos resultados devinte anos de investigação, rebatendo sistematica-mente as posições dos seus opositores e, convicto dasolidez das suas deduções, começou a escrever o seulivro "A imunidade nas doenças infecciosas"(Metchnikoff, 1901).

Mas regressemos um pouco atrás. Em 1885, emconsequência da descrição da vacina anti-rábica porLouis Pasteur e sua equipa, a municipalidade deOdessa encarregou N. Gamaleia de estudar o novométodo de tratamento, em Paris. Após o seu regresso,a mesma municipalidade e o governo de Kherson fundaram o Instituto Bacteriológico de Odessa eentregaram a direcção científica a Metchnikoff,Gamaleia e Bardach. Na cidade gerou-se uma grandehostilidade contra as vacinações anti-rábicas eMetchnikoff pensou que a causa do mau ambiente queestava enfrentando seria devida ao facto de ele não sermédico. Escreveu então a Pasteur, que também não oera, pedindo-lhe conselho, e Pasteur em resposta ofereceu-lhe um laboratório no seu Instituto. Em 1888foi nomeado director do Serviço de MicrobiologiaMorfológica do Instituto Pasteur, em 1890 entrou para o grupo de redacção dos Annales de l’ Institut Pasteur e em 1904 foi nomeado subdirector doInstituto Pasteur, lugares que desempenhou até ao seufalecimento.

Durante o que se pode considerar primeiro períodono Instituto, além de continuar o seu trabalho sobre afagocitose, publicou numerosos textos sobre a embrio-logia dos invertebrados com destaque para os insectose as medusas. Em colaboração com Émile Roux estudou a sífilis e descobriu que era transmissível aomacaco. Deu igualmente muita atenção ao estudo dasdoenças infecciosas, ao microbismo intestinal – queconsiderava uma podridão no interior dos organismossuperiores – e ao problema do envelhecimento. É hojeconsiderado o pioneiro também da gerontologia.Desenvolveu a teoria de que a senilidade era a conse-quência do desenvolvimento de algumas das bactériasintestinais. Para controlar esse desenvolvimento

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recomendava uma dieta rica em leite fermentado porbacilos que produzem uma grande quantidade deácido láctico. Ele mesmo seguia essa dieta para grandeestranheza de muitos dos seus contemporâneos que oapelidavam de "russo comedor de iogurte", maspensemos na profusão e popularidade actuais de leitesfermentados para percebermos a razão que lhe assistia.

Durante a sua vida recebeu numerosas distinções,tais como: Doutor em Ciências Honorário pela Univer-sidade de Cambridge, a medalha Copley da RealSociedade da qual era Membro, Membro Honoráriodas Academias de Medicina e das Ciências de Paris,Membro Honorário da Academia de Medicina de S.Petersburgo e em 1908 foi distinguido com o prémioNobel de Fisiologia e Medicina, juntamente com PaulEhrlich, pelos seus trabalhos sobre a Imunidade.

Com a idade a sua personalidade adquire aspectospitorescos. Diz-se que usava galochas e um chapéu--de-chuva durante todo o ano, sem atender ao passardas estações. Os seus bolsos estavam sempre cheios depapéis com apontamentos científicos, usava sempre omesmo chapéu e quando se excitava sentava-se sobreele. Depois de 1913 começou a sofrer de frequentesalterações cardíacas. A guerra de 1914-1918 provocou-lhe grandes perturbações. Faleceu noHospital do Instituto Pasteur, em Paris, a 16 de Julhode 1916.

Hoje, estamos certos de que Metchnikoff se sentaria sobre o seu chapéu se assistisse à verificaçãomolecular do que pôde deduzir através das lentes meiosujas do seu microscópio.

Bibliografia

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Augusto da Silva F e Azevedo de Meneses C (1984). Elucidário madeirense. 3ª edição. Secretaria Regional da Educação e Cultura, Funchal.

Coura JR (1994). Great lives at Manguinhos. Memórias do Instituto Oswaldo Cruz. Vol. 89 (Janeiro-Março) páginas I a VI.

Hutcheon JE (1928). Things seen in Madeira. Seeley, Service & Co. Limited. London.

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Metchnikoff E (1880). Über die intracelluäre Verdauung bei Coelenteraten, Zoologischer Anzeiger, 56: 261–263.

Metchnikoff E (1883a). Untersuchungen über die intra-celluläre Verdauung bei wirbellosen Tieren. Arbeiten d Zool Instituts zu Wien, 2: 14.

Metchnikoff E (1883b). Untersuchung über die mesoder-malen Phagocyten einiger Wirbeltiere. Biologisch Centralblatt, 18: 560, Bd. III.

Metchnikoff E (1901). L'immunité dans les maladies infectieuses. Masson, Paris.

Metchnikoff E (1903). The Nature of Man: Studies in Optimistic Philosophy. Tradução inglesa de P. Chalmers Mitchell. Heinemann, Londres.

Metchnikoff O (1920). Vie d’Elie Mectchnikoff 1845-1916. Librairie Hachete, Paris, França.

Pereira ECN (1967). Ilhas de Zargo. 3ª edição. Câmara Municipal do Funchal, Funchal.

Sem autor (1967). Nobel Lectures, Physiology or Medicine 1901-1921. Elsevier Publishing Company, Amsterdam.

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CIÊNCIAS VETERINÁRIAS 2008IV Congresso da SPCV I Congresso Ibérico de Epidemiologia Veterinária

INRB – INIA/Fonte Boa, Vale de Santarém, 27, 28 e 29 de Novembro de 2008

R E V I S T A P O R T U G U E S A

CIÊNCIAS VETERINÁRIASDE

SUPLEMENTO

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A Sociedade Portuguesa de Ciências Veterenárias(SPCV) organizou, em colaboração com o InstitutoNacional de Recursos Biológicos INRB - INIA/FonteBoa, as Sociedades Científicas sectoriais, a SociedadeEspanhola de Epidemiologia Veterinária, os Cursos deMedicina Veterinária e as Associações Profissionais, oCongresso Ciências Veterinárias 2008, que reuniu oIV CONGRESSO DA SPCV e o I Congresso Ibéricode Epidemiologia Veterinária.

O evento teve lugar no INRB - INIA/Fonte Boa,Vale de Santarém, nos dias 27, 28 e 29 de Novembroe contou com a presença de cerca de 320 participantes.

O Congresso contou ainda com a contribuição decientistas convidados de reconhecido mérito nacionale internacional, nomeadamente:

- Segurança Alimentar: Dr. Sérgio Rodeia (EuropeanFood Safety Agency)

- Qualidade Alimentar: Engª. Ana Soeiro (Ex-IDRH, MADRP)

- Epidemiologia e Medicina Veterinária Preventiva:Prof. Kenton Morgan (Univ. Liverpool, UK)

- Patologia: Prof. Peter Moore (University of Davis,USA)

- Formação Veterinária: Prof. Cristina Vilela (FMV-UTL).

A responsabilidade das sessões de especialidadeesteve a cargo das Sociedades ou Associações acimareferidas, tendo a seguinte distribuição:

- Animais de Companhia: Associação Portuguesados Méd. Veterinários Especialistas em Animais deCompanhia (APMVEAC)

- Aquacultura: Faculdade de Medicina Veterinária/UTL (FMV-UTL)

- Avicultura: Secção Portuguesa da AssociaçãoMundial de Ciência Avícola (SPAMCA)

- Buiatria: Associação Portuguesa de Buiatria(ABP)

- Epidemiologia: Sociedade Portuguesa deEpidemiologia e Medicina Veterinária Preventiva(SPEMVP) e Sociedad Espanola de EpidemiolgiaVeterinaria

- Segurança Alimentar: SPCV e FMV-UTL- Equinos: Associação dos Médicos Veterinários de

Equinos (AMVE)- Genética e Melhoramento: Sociedade Portuguesa

de Recursos Genéticos Animais (SPRGA)- Patologia: Sociedade Portuguesa de Patologia

Animal (SPPA)- Pequenos Ruminantes: Sociedade Portuguesa de

Ovinotecnia e Caprinotecnia (SPOC)

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- Reprodução: Sociedade Portuguesa de Repro-dução Animal (SPRA)

- Microbiologia: SPCV- Suínos: Sociedade Científica de Suinicultura (SCS)- Formação: SPCV.

Para a organização do evento, contou-se com oapoio de várias organizações. Os apoios institucionaisforam fornecidos por: INRB - INIA/FonteBoa, Ordemdos Médicos Veterinários, Direcção Geral deVeterinária, Câmara Municipal de Santarém eFaculdade de Medicina Veterinária - UTL.

Os patrocínios e outros apoios foram dados pelasseguintes empresas: CEVA - Saúde Animal, MerialPortuguesa - Saúde Animal, Laboratórios Pfizer,

Alltech Portugal, Arbuset, Bayer Portugal SA -Divisão Animal, Iapsa Portuguesa Pecuária, Vetlima,Vétoquinol Unipessoal, Atral Cipan, Agroquisa,Bioconsulting, Elanco, TNA - Tecnologia e NutriçãoAnimal Lda e Valormed.

O sucesso do Congresso, traduzido pelo elevadonúmero de trabalhos submetidos e pela afluência decongressistas, confirma o interesse da comunidadeveterinária pela realização periódica de um congressode ciências veterinárias combinando as várias áreas deintervenção profissional e constituindo-se como umaocasião excepcional de encontro e de partilha deexperiência entre as várias áreas de conhecimentomédico-veterinárias.

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Vida Associativa

Movimento de sócios

De 1 de Julho a 31 de Dezembro de 2008 foramadmitidos os sócios que a seguir se indicam.Efectivos: 2410 Patrícia Alexandra Curado QuintasDinis Poeta, 2413 Mário Fernandes da Silva, 2414José Bernardo Archer de Menezes Castro Fraga.Estudantes: 2411 Susana Alexandra Ruivo dos SantosCastro, 2412 Diogo Filipe Pereira Marques, 2415Maria Goreti Gaspar de Oliveira Cardoso, 2416Carolina Sant' Ana da Silva Rebelo, 2417 CláudiaFilipa Ferreira Ramos Alves.

Necrologia

No segundo Semestre de 2008, deixaram infeliz-mente a nossa companhia os colegas FernandoAugusto da Silva Teixeira, sócio nº 1202, falecido emNovembro e João Inácio Barata Freixo, sócio nº 852,a 2 de Dezembro. Chegou também agora ao nossoconhecimento o falecimento, em Fevereiro passado,de João Mendonça Braga, sócio nº 629. Às suasfamílias as nossas sentidas condolências.

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