compêndio de ensaios jurídicos: temas de direito do patrimônio cultural - v. 01, n. 05
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Tradicionalmente, o Direito é reproduzido por meio de “doutrinas”, que constituem o pensamento de pessoas reconhecidas pela comunidade jurídica em trabalhar, academicamente, determinados assuntos. Assim, o saber jurídico sempre foi concebido como algo dogmático. É possível, à luz da tradicional visão empregada, afirmar que o Direito é um campo no qual não se incluem somente as instituições legais, as ordens legais, as decisões legais; mas, ainda, são computados tudo aquilo que os especialistas em leis dizem acerca das mencionadas instituições, ordens e decisões, materializando, comumente, uma “meta direito”. No Direito, a construção do conhecimento advém da interpretação de leis e as pessoas autorizadas a interpretar as leis são os juristas.Contudo, o alvorecer acadêmico que é presenciado pelos Operadores do Direito, que se debruçam no desenvolvimento de pesquisas, passa a conceber o conhecimento de maneira prática, utilizando as experiências empíricas e o contorno regional como elementos indissociáveis para a compreensão do Direito. Ultrapassa-se a tradicional visão do conhecimento jurídico como algo dogmático, buscando conferir molduras acadêmicas, por meio do emprego de métodos científicos. Neste aspecto, o Compêndio de Ensaios Jurídico objetiva disponibilizar para a comunidade interessada uma coletânea de trabalhos, reflexões e inquietações produzida durante a formação acadêmica do autor. Debruçando-se especificamente sobre a temática de Direito do Patrimônio Cultural, o presente busca trazer para o debate uma série de assuntos contemporâneos e que reclamam maiores reflexões.TRANSCRIPT
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TAU LIMA VERDAN
RANGEL
COMPNDIO DE ENSAIOS
JURDICOS: TEMAS DE DIREITO
DO PATRIMNIO CULTURAL
V.
01
N.
05
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COMPNDIO DE ENSAIOS JURDICOS:
TEMAS DE DIREITO DO PATRIMNIO
CULTURAL
(V. 01, N. 05)
Capa: Cndido Portinari, Gado (1938).
ISBN: 978-1517022389
Editorao, padronizao e formatao de texto
Tau Lima Verdan Rangel
Projeto Grfico e capa
Tau Lima Verdan Rangel
Contedo, citaes e referncias bibliogrficas
O autor
de inteira responsabilidade do autor os conceitos aqui
apresentados. Reproduo dos textos autorizada
mediante citao da fonte.
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A P R E S E N T A O
Tradicionalmente, o Direito reproduzido por
meio de doutrinas, que constituem o pensamento de
pessoas reconhecidas pela comunidade jurdica em
trabalhar, academicamente, determinados assuntos.
Assim, o saber jurdico sempre foi concebido como algo
dogmtico. possvel, luz da tradicional viso
empregada, afirmar que o Direito um campo no qual
no se incluem somente as instituies legais, as ordens
legais, as decises legais; mas, ainda, so computados
tudo aquilo que os especialistas em leis dizem acerca das
mencionadas instituies, ordens e decises,
materializando, comumente, uma meta direito. No
Direito, a construo do conhecimento advm da
interpretao de leis e as pessoas autorizadas a
interpretar as leis so os juristas.
Contudo, o alvorecer acadmico que
presenciado pelos Operadores do Direito, que se
debruam no desenvolvimento de pesquisas, passa a
conceber o conhecimento de maneira prtica, utilizando
as experincias empricas e o contorno regional como
elementos indissociveis para a compreenso do Direito.
Ultrapassa-se a tradicional viso do conhecimento
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jurdico como algo dogmtico, buscando conferir
molduras acadmicas, por meio do emprego de mtodos
cientficos. Neste aspecto, o Compndio de Ensaios
Jurdico objetiva disponibilizar para a comunidade
interessada uma coletnea de trabalhos, reflexes e
inquietaes produzida durante a formao acadmica do
autor. Debruando-se especificamente sobre a temtica
de Direito do Patrimnio Cultural, o presente busca
trazer para o debate uma srie de assuntos
contemporneos e que reclamam maiores reflexes.
Boa leitura!
Tau Lima Verdan Rangel
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S U M R I O
Tessituras ao Programa Nacional do Patrimnio
Imaterial (PNPI): breves explicitaes ............................... 06
O Sistema Nacional de Informaes e Indicadores
Culturais (SNIIC) em exame: singelas ponderaes Lei
n 12.343/2010 ...................................................................... 43
O Plano Nacional de Cultura em anlise: primeiros
comentrios Lei n 12.343/2010 ....................................... 73
O Plano de Ao para as Cidades Histricas:
apontamentos ao instrumento integrado para a gesto do
patrimnio cultural com enfoque territorial ...................... 110
Explicitaes ao Plano de Preservao de Stio Histrico
Urbano (PPSH): apontamentos Portaria n 299/2004 do
IPHAN ................................................................................. 141
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TESSITURAS AO PROGRAMA NACIONAL DO
PATRIMNIO IMATERIAL (PNPI): BREVES
EXPLICITAES
Resumo: O objetivo do presente discorrer acerca
do Programa Nacional do Patrimnio Imaterial
(PNPI). Em sede de comentrios introdutrios,
cuida salientar que o meio ambiente cultural
constitudo por bens culturais, cuja acepo
compreende aqueles que possuem valor histrico,
artstico, paisagstico, arqueolgico, espeleolgico,
fossilfero, turstico, cientfico, refletindo as
caractersticas de uma determinada sociedade. Ao
lado disso, quadra anotar que a cultura identifica
as sociedades humanas, sendo formada pela
histria e maciamente influenciada pela natureza,
como localizao geogrfica e clima. Com efeito, o
meio ambiente cultural decorre de uma intensa
interao entre homem e natureza, porquanto
aquele constri o seu meio, e toda sua atividade e
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percepo so conformadas pela sua cultural. Ao
lado disso, a cultura brasileira o resultado daquilo
que era prprio das populaes tradicionais
indgenas e das transformaes trazidas pelos
diversos grupos colonizadores e escravos africanos.
O conceito de patrimnio histrico e artstico
nacional abrange todos os bens moveis e imveis,
existentes no Pas, cuja conservao seja de
interesse pblico, por sua vinculao a fatos
memorveis da Histria ptria ou por seu
excepcional valor artstico, arqueolgico,
etnogrfico, bibliogrfico e ambiental.
Palavras-chaves: Patrimnio Cultural Imaterial.
Programa Nacional. Salvaguarda.
Sumrio: 1 Ponderaes Introdutrias: Breves
notas construo terica do Direito Ambiental; 2
Comentrios concepo de Meio Ambiente; 3 Meio
Ambiente e Patrimnio Cultural: Aspectos
Introdutrios; 4 Ponderaes Proeminncia do
Instituto do Registro como mecanismo de
preservao dos Bens Culturais Imateriais; 5
Tessituras ao Programa Nacional do Patrimnio
Imaterial (PNPI): Breves Explicitaes
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1 PONDERAES INTRODUTRIAS: BREVES
NOTAS CONSTRUO TERICA DO DIREITO
AMBIENTAL
Inicialmente, ao se dispensar um exame acerca
do tema colocado em tela, patente se faz arrazoar que a
Cincia Jurdica, enquanto um conjunto multifacetado de
arcabouo doutrinrio e tcnico, assim como as robustas
ramificaes que a integram, reclama uma interpretao
alicerada nos plurais aspectos modificadores que
passaram a influir em sua estruturao. Neste alamir,
lanando tona os aspectos caractersticos de
mutabilidade que passaram a orientar o Direito, tornou-
se imperioso salientar, com nfase, que no mais subsiste
uma viso arrimada em preceitos estagnados e
estanques, alheios s necessidades e s diversidades
sociais que passaram a contornar os Ordenamentos
Jurdicos. Ora, infere-se que no mais prospera o
arcabouo imutvel que outrora sedimentava a aplicao
das leis, sendo, em decorrncia dos anseios da populao,
suplantados em uma nova sistemtica.
Com espeque em tais premissas, cuida
hastear, com bastante pertinncia, como flmula de
interpretao o prisma de avaliao o brocardo jurdico
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'Ubi societas, ibi jus', ou seja, 'Onde est a sociedade, est
o Direito', tornando explcita e cristalina a relao de
interdependncia que esse binmio mantm1. Destarte,
com clareza solar, denota-se que h uma interao
consolidada na mtua dependncia, j que o primeiro
tem suas balizas fincadas no constante processo de
evoluo da sociedade, com o fito de que seus Diplomas
Legislativos e institutos no fiquem inquinados de
inaptido e arcasmo, em total descompasso com a
realidade vigente. A segunda, por sua vez, apresenta
estrutural dependncia das regras consolidadas pelo
Ordenamento Ptrio, cujo escopo primevo assegurar
que no haja uma vingana privada, afastando, por
extenso, qualquer rano que rememore priscas eras em
que o homem valorizava a Lei de Talio (Olho por olho,
dente por dente), bem como para evitar que se robustea
um cenrio catico no seio da coletividade.
Ademais, com a promulgao da Constituio
da Repblica Federativa do Brasil de 1988,
imprescindvel se fez adot-la como macio axioma de
sustentao do Ordenamento Brasileiro, precipuamente
1 VERDAN, Tau Lima. Princpio da Legalidade: Corolrio do
Direito Penal. Jurid Publicaes Eletrnicas, Bauru, 22 jun.
2009. Disponvel em: . Acesso em 15 ago.
2015.
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quando se objetiva a amoldagem do texto legal, genrico
e abstrato, aos complexos anseios e mltiplas
necessidades que influenciam a realidade
contempornea. Ao lado disso, h que se citar o voto
magistral voto proferido pelo Ministro Eros Grau, ao
apreciar a Ao de Descumprimento de Preceito
Fundamental N. 46/DF, o direito um organismo vivo,
peculiar porm porque no envelhece, nem permanece
jovem, pois contemporneo realidade. O direito um
dinamismo. Essa, a sua fora, o seu fascnio, a sua
beleza2. Como bem pontuado, o fascnio da Cincia
Jurdica jaz, justamente, na constante e imprescindvel
mutabilidade que apresenta, decorrente do dinamismo
que reverbera na sociedade e orienta a aplicao dos
2 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Acrdo em Arguio de
Descumprimento de Preceito Fundamental N. 46/DF. Empresa
Pblica de Correios e Telgrafos. Privilgio de Entrega de
Correspondncias. Servio Postal. Controvrsia referente Lei
Federal 6.538, de 22 de Junho de 1978. Ato Normativo que regula
direitos e obrigaes concernentes ao Servio Postal. Previso de
Sanes nas Hipteses de Violao do Privilgio Postal.
Compatibilidade com o Sistema Constitucional Vigente. Alegao de
afronta ao disposto nos artigos 1, inciso IV; 5, inciso XIII, 170,
caput, inciso IV e pargrafo nico, e 173 da Constituio do Brasil.
Violao dos Princpios da Livre Concorrncia e Livre Iniciativa. No
Caracterizao. Arguio Julgada Improcedente. Interpretao
conforme Constituio conferida ao artigo 42 da Lei N. 6.538, que
estabelece sano, se configurada a violao do privilgio postal da
Unio. Aplicao s atividades postais descritas no artigo 9, da lei.
rgo Julgador: Tribunal Pleno. Relator: Ministro Marcos Aurlio.
Julgado em 05 ag. 2009. Disponvel em: . Acesso em
15 ago. 2015.
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Diplomas Legais e os institutos jurdicos neles
consagrados.
Ainda neste substrato de exposio, pode-se
evidenciar que a concepo ps-positivista que passou a
permear o Direito, ofertou, por via de consequncia, uma
rotunda independncia dos estudiosos e profissionais da
Cincia Jurdica. Alis, h que se citar o entendimento
de Verdan, esta doutrina o ponto culminante de uma
progressiva evoluo acerca do valor atribudo aos
princpios em face da legislao3. Destarte, a partir de
uma anlise profunda dos mencionados sustentculos,
infere-se que o ponto central da corrente ps-positivista
cinge-se valorao da robusta tbua principiolgica que
Direito e, por conseguinte, o arcabouo normativo
passando a figurar, nesta tela, como normas de cunho
vinculante, flmulas hasteadas a serem adotadas na
aplicao e interpretao do contedo das leis, diante das
situaes concretas.
Nas ltimas dcadas, o aspecto de
mutabilidade tornou-se ainda mais evidente, em especial,
quando se analisa a construo de novos que derivam da
Cincia Jurdica. Entre estes, cuida destacar a
ramificao ambiental, considerando como um ponto de
3 VERDAN, 2009, s.p.
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congruncia da formao de novos iderios e cnones,
motivados, sobretudo, pela premissa de um manancial de
novos valores adotados. Nesta trilha de argumentao,
de boa tcnica se apresenta os ensinamentos de
Fernando de Azevedo Alves Brito que, em seu artigo,
aduz: Com a intensificao, entretanto, do interesse dos
estudiosos do Direito pelo assunto, passou-se a desvendar
as peculiaridades ambientais, que, por estarem muito
mais ligadas s cincias biolgicas, at ento era
marginalizadas4. Assim, em decorrncia da
proeminncia que os temas ambientais vm, de maneira
paulatina, alcanando, notadamente a partir das ltimas
discusses internacionais envolvendo a necessidade de
um desenvolvimento econmico pautado em
sustentabilidade, no raro que prospere, mormente em
razo de novos fatores, um verdadeiro remodelamento ou
mesmo uma releitura dos conceitos que abalizam a
ramificao ambiental do Direito, com o fito de permitir
que ocorra a conservao e recuperao das reas
degradadas, primacialmente as culturais.
4 BRITO, Fernando de Azevedo Alves. A hodierna classificao do
meio-ambiente, o seu remodelamento e a problemtica sobre a
existncia ou a inexistncia das classes do meio-ambiente do
trabalho e do meio-ambiente misto. Boletim Jurdico, Uberaba,
ano 5, n. 968. Disponvel em: .
Acesso em 15 ago. 2015.
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Ademais, h de ressaltar ainda que o direito
ambiental passou a figurar, especialmente, depois das
dcadas de 1950 e 1960, como um elemento integrante da
farta e slida tbua de direitos fundamentais. Calha
realar, com cores quentes, que mais contemporneos, os
direitos que constituem a terceira dimenso recebem a
alcunha de direitos de fraternidade ou, ainda, de
solidariedade, contemplando, em sua estrutura, uma
patente preocupao com o destino da humanidade5.
Ora, da se verifica a incluso de meio ambiente como um
direito fundamental, logo, est umbilicalmente atrelado
com humanismo e, por extenso, a um ideal de sociedade
mais justa e solidria. Nesse sentido, ainda, plausvel
citar o artigo 3., inciso I, da Carta de 1988 que abriga
em sua redao tais pressupostos como os princpios
fundamentais do Estado Democrtico de Direitos: Art.
3 - Constituem objetivos fundamentais da Repblica
Federativa do Brasil: I - construir uma sociedade livre,
justa e solidria6.
Ainda nesta esteira, possvel verificar que a
5 MOTTA, Sylvio; DOUGLAS, Willian. Direito Constitucional Teoria, Jurisprudncia e 1.000 Questes 15 ed., rev., ampl. e
atual. Rio de Janeiro: Editora Impetus, 2004, p. 69. 6 BRASIL. Constituio (1988). Constituio (da) Repblica
Federativa do Brasil. Braslia: Senado Federal, 1988. Disponvel
em: . Acesso em 15 ago. 2015.
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construo dos direitos encampados sob a rubrica de
terceira dimenso tende a identificar a existncia de
valores concernentes a uma determinada categoria de
pessoas, consideradas enquanto unidade, no mais
prosperando a tpica fragmentao individual de seus
componentes de maneira isolada, tal como ocorria em
momento pretrito. Com o escopo de ilustrar, de maneira
pertinente as ponderaes vertidas, insta trazer colao
o entendimento do Ministro Celso de Mello, ao apreciar a
Ao Direta de Inconstitucionalidade N. 1.856/RJ, em
especial quando destaca:
Cabe assinalar, Senhor Presidente, que os
direitos de terceira gerao (ou de
novssima dimenso), que materializam
poderes de titularidade coletiva atribudos,
genericamente, e de modo difuso, a todos os
integrantes dos agrupamentos sociais,
consagram o princpio da solidariedade e
constituem, por isso mesmo, ao lado dos
denominados direitos de quarta gerao
(como o direito ao desenvolvimento e o
direito paz), um momento importante no
processo de expanso e reconhecimento dos
direitos humanos, qualificados estes,
enquanto valores fundamentais
indisponveis, como prerrogativas
impregnadas de uma natureza
essencialmente inexaurvel7.
7 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Acrdo proferido em Ao
Direta de Inconstitucionalidade N 1.856/RJ. Ao Direta De
Inconstitucionalidade - Briga de galos (Lei Fluminense N 2.895/98) -
Legislao Estadual que, pertinente a exposies e a competies
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Cuida reconhecer, dessa maneira, que os
direitos encampados sob a rubrica da terceira dimenso
guardam ntima relao com a promoo da
solidariedade, dispensando ateno ao iderio de unidade
de indivduos, considerados enquanto coletividade e no
isoladamente. Tm primeiro por destinatrios o gnero
humano mesmo, num momento expressivo de sua
afirmao como valor supremo em termos de
existencialidade concreta8. Com efeito, os direitos de
terceira dimenso, dentre os quais se inclui ao meio
ambiente ecologicamente equilibrado, positivado na
Constituio Federal de 1988, emerge com um claro e
tangvel aspecto de familiaridade, como pice da evoluo
e concretizao dos direitos fundamentais.
entre aves das raas combatentes, favorece essa prtica criminosa -
Diploma Legislativo que estimula o cometimento de atos de
crueldade contra galos de briga - Crime Ambiental (Lei N 9.605/98,
ART. 32) - Meio Ambiente - Direito preservao de sua integridade
(CF, Art. 225) - Prerrogativa qualificada por seu carter de
metaindividualidade - Direito de terceira gerao (ou de novssima
dimenso) que consagra o postulado da solidariedade - Proteo
constitucional da fauna (CF, Art. 225, 1, VII) - Descaracterizao
da briga de galo como manifestao cultural - Reconhecimento da
inconstitucionalidade da Lei Estadual impugnada - Ao Direta
procedente. Legislao Estadual que autoriza a realizao de
exposies e competies entre aves das raas combatentes - Norma
que institucionaliza a prtica de crueldade contra a fauna Inconstitucionalidade. . rgo Julgador: Tribunal Pleno. Relator:
Ministro Celso de Mello. Julgado em 26 mai. 2011. Disponvel em:
. Acesso em 15 ago. 2015. 8 BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 21 ed.
atual. So Paulo: Editora Malheiros Ltda., 2007, p. 569.
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2 COMENTRIOS CONCEPO DE MEIO
AMBIENTE
Em uma primeira plana, ao lanar mo do
sedimentado jurdico-doutrinrio apresentado pelo inciso
I do artigo 3 da Lei N. 6.938, de 31 de agosto de 19819,
que dispe sobre a Poltica Nacional do Meio Ambiente,
seus fins e mecanismos de formulao e aplicao, e d
outras providncias, salienta que o meio ambiente
consiste no conjunto e conjunto de condies, leis e
influncias de ordem qumica, fsica e biolgica que
permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas.
Pois bem, com o escopo de promover uma facilitao do
aspecto conceitual apresentado, possvel verificar que o
meio ambiente se assenta em um complexo dilogo de
fatores abiticos, provenientes de ordem qumica e fsica,
e biticos, consistentes nas plurais e diversificadas
formas de seres viventes. Consoante Silva, possvel
considerar o meio ambiente como a interao do
conjunto de elementos naturais, artificiais e culturais que
propiciem o desenvolvimento equilibrado da vida em
9 BRASIL. Lei N. 6.938, de 31 de Agosto de 1981. Dispe sobre a
Poltica Nacional do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de
formulao e aplicao, e d outras providncias. Disponvel em:
. Acesso em 15 ago. 2015.
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todas as suas formas10.
Nesta senda, ainda, Fiorillo11, ao tecer
comentrios acerca da acepo conceitual de meio
ambiente, coloca em destaque que tal tema se assenta em
um iderio jurdico indeterminado, incumbindo, ao
intrprete das leis, promover o seu preenchimento. Dada
fluidez do tema, possvel colocar em evidncia que o
meio ambiente encontra ntima e umbilical relao com
os componentes que cercam o ser humano, os quais so
de imprescindvel relevncia para a sua existncia. O
Ministro Luiz Fux, ao apreciar a Ao Direta de
Inconstitucionalidade N. 4.029/AM, salientou, com
bastante pertinncia, que:
[...] o meio ambiente um conceito hoje
geminado com o de sade pblica, sade de
cada indivduo, sadia qualidade de vida, diz
a Constituio, por isso que estou falando
de sade, e hoje todos ns sabemos que ele
imbricado, conceitualmente geminado com
o prprio desenvolvimento. Se antes ns
dizamos que o meio ambiente compatvel
com o desenvolvimento, hoje ns dizemos, a
partir da Constituio, tecnicamente, que
no pode haver desenvolvimento seno com
o meio ambiente ecologicamente
equilibrado. A geminao do conceito me
10 SILVA, Jos Afonso da. Direito Ambiental Constitucional. So
Paulo: Malheiros Editores, 2009, p.20. 11 FIORILLO, Celso Antnio Pacheco. Curso de Direito
Ambiental Brasileiro. 13 ed., rev., atual e ampl. So Paulo:
Editora Saraiva, 2012, p. 77.
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parece de rigor tcnico, porque salta da
prpria Constituio Federal12.
denotvel, desta sorte, que a
constitucionalizao do meio ambiente no Brasil
viabilizou um verdadeiro salto qualitativo, no que
concerne, especificamente, s normas de proteo
ambiental. Tal fato decorre da premissa que os robustos
corolrios e princpios norteadores foram alados ao
patamar constitucional, assumindo colocao eminente,
ao lado das liberdades pblicas e dos direitos
fundamentais. Superadas tais premissas, aprouve ao
Constituinte, ao entalhar a Carta Poltica Brasileira,
ressoando os valores provenientes dos direitos de terceira
dimenso, insculpir na redao do artigo 225, conceder
amplo e robusto respaldo ao meio ambiente como pilar
integrante dos direitos fundamentais. Com o advento da
12 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Acrdo proferido em
Ao Direta de Inconstitucionalidade N 4.029/AM. Ao Direta de
Inconstitucionalidade. Lei Federal N 11.516/07. Criao do Instituto
Chico Mendes de Conservao da Biodiversidade. Legitimidade da
Associao Nacional dos Servidores do IBAMA. Entidade de Classe
de mbito Nacional. Violao do art. 62, caput e 9, da
Constituio. No emisso de parecer pela Comisso Mista
Parlamentar. Inconstitucionalidade dos artigos 5, caput, e 6, caput
e pargrafos 1 e 2, da Resoluo N 1 de 2002 do Congresso
Nacional. Modulao dos Efeitos Temporais da Nulidade (Art. 27 da
Lei 9.868/99). Ao Direta Parcialmente Procedente. rgo
Julgador: Tribunal Pleno. Relator: Ministro Luiz Fux. Julgado em 08
mar. 2012. Disponvel em: . Acesso em 15 ago.
2015.
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Constituio da Repblica Federativa do Brasil de 1988,
as normas de proteo ambiental so aladas categoria
de normas constitucionais, com elaborao de captulo
especialmente dedicado proteo do meio ambiente13.
Nesta toada, ainda, observvel que o caput do artigo
225 da Constituio Federal de 198814 est abalizado em
quatro pilares distintos, robustos e singulares que, em
conjunto, do corpo a toda tbua ideolgica e terica que
assegura o substrato de edificao da ramificao
ambiental.
Primeiramente, em decorrncia do tratamento
dispensado pelo artfice da Constituio Federal, o meio
ambiente foi iado condio de direito de todos,
presentes e futuras geraes. encarado como algo
pertencente a toda coletividade, assim, por esse prisma,
no se admite o emprego de qualquer distino entre
brasileiro nato, naturalizado ou estrangeiro, destacando-
se, sim, a necessidade de preservao, conservao e no-
13 THOM, Romeu. Manual de Direito Ambiental: Conforme o
Novo Cdigo Florestal e a Lei Complementar 140/2011. 2 ed.
Salvador: Editora JusPodivm, 2012, p. 116. 14 BRASIL. Constituio (1988). Constituio (da) Repblica
Federativa do Brasil. Braslia: Senado Federal, 1988. Disponvel
em: . Acesso em 15 ago. 2015: Art. 225. Todos tm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado,
bem de uso comum do povo e essencial sadia qualidade de vida,
impondo-se ao Poder Pblico e coletividade o dever de defend-lo e
preserv-lo para as presentes e futuras geraes.
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poluio. O artigo 225, devido ao cunho de direito difuso
que possui, extrapola os limites territoriais do Estado
Brasileiro, no ficando centrado, apenas, na extenso
nacional, compreendendo toda a humanidade. Neste
sentido, o Ministro Celso de Mello, ao apreciar a Ao
Direta de Inconstitucionalidade N 1.856/RJ, destacou
que:
A preocupao com o meio ambiente - que
hoje transcende o plano das presentes
geraes, para tambm atuar em favor das
geraes futuras [...] tem constitudo, por
isso mesmo, objeto de regulaes
normativas e de proclamaes jurdicas,
que, ultrapassando a provncia meramente
domstica do direito nacional de cada
Estado soberano, projetam-se no plano das
declaraes internacionais, que refletem, em
sua expresso concreta, o compromisso das
Naes com o indeclinvel respeito a esse
direito fundamental que assiste a toda a
Humanidade15.
15 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Acrdo proferido em
Ao Direta de Inconstitucionalidade N 1.856/RJ. Ao Direta De
Inconstitucionalidade - Briga de galos (Lei Fluminense N 2.895/98) -
Legislao Estadual que, pertinente a exposies e a competies
entre aves das raas combatentes, favorece essa prtica criminosa -
Diploma Legislativo que estimula o cometimento de atos de
crueldade contra galos de briga - Crime Ambiental (Lei N 9.605/98,
ART. 32) - Meio Ambiente - Direito preservao de sua integridade
(CF, Art. 225) - Prerrogativa qualificada por seu carter de
metaindividualidade - Direito de terceira gerao (ou de novssima
dimenso) que consagra o postulado da solidariedade - Proteo
constitucional da fauna (CF, Art. 225, 1, VII) - Descaracterizao
da briga de galo como manifestao cultural - Reconhecimento da
inconstitucionalidade da Lei Estadual impugnada - Ao Direta
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O termo todos, aludido na redao do caput
do artigo 225 da Constituio Federal de 1988, faz
meno aos j nascidos (presente gerao) e ainda
aqueles que esto por nascer (futura gerao), cabendo
queles zelar para que esses tenham sua disposio, no
mnimo, os recursos naturais que hoje existem. Tal fato
encontra como arrimo a premissa que foi reconhecido ao
gnero humano o direito fundamental liberdade,
igualdade e ao gozo de condies de vida adequada, em
ambiente que permita desenvolver todas as suas
potencialidades em clima de dignidade e bem-estar.
Pode-se considerar como um direito transgeracional, ou
seja, ultrapassa as geraes, logo, vivel afirmar que o
meio-ambiente um direito pblico subjetivo. Desta
feita, o iderio de que o meio ambiente substancializa
patrimnio pblico a ser imperiosamente assegurado e
protegido pelos organismos sociais e pelas instituies
estatais, qualificando verdadeiro encargo irrenuncivel
que se impe, objetivando sempre o benefcio das
presentes e das futuras geraes, incumbindo tanto ao
procedente. Legislao Estadual que autoriza a realizao de
exposies e competies entre aves das raas combatentes - Norma
que institucionaliza a prtica de crueldade contra a fauna Inconstitucionalidade. . rgo Julgador: Tribunal Pleno. Relator:
Ministro Celso de Mello. Julgado em 26 mai. 2011. Disponvel em:
. Acesso em 15 ago. 2015.
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22
Poder Pblico quanto coletividade considerada em si
mesma.
Assim, decorrente de tal fato, produz efeito
erga omnes, sendo, portanto, oponvel contra a todos,
incluindo pessoa fsica/natural ou jurdica, de direito
pblico interno ou externo, ou mesmo de direito privado,
como tambm ente estatal, autarquia, fundao ou
sociedade de economia mista. Impera, tambm,
evidenciar que, como um direito difuso, no subiste a
possibilidade de quantificar quantas so as pessoas
atingidas, pois a poluio no afeta to s a populao
local, mas sim toda a humanidade, pois a coletividade
indeterminada. Nesta senda, o direito integridade do
meio ambiente substancializa verdadeira prerrogativa
jurdica de titularidade coletiva, ressoando a expresso
robusta de um poder deferido, no ao indivduo
identificado em sua singularidade, mas num sentido
mais amplo, atribudo prpria coletividade social. Com
a nova sistemtica entabulada pela redao do artigo 225
da Carta Maior, o meio-ambiente passou a ter
autonomia, tal seja no est vinculada a leses
perpetradas contra o ser humano para se agasalhar das
reprimendas a serem utilizadas em relao ao ato
perpetrado. Figura-se, ergo, como bem de uso comum do
-
23
povo o segundo pilar que d corpo aos sustentculos do
tema em tela. O axioma a ser esmiuado, est atrelado o
meio-ambiente como vetor da sadia qualidade de vida, ou
seja, manifesta-se na salubridade, precipuamente, ao
vincular a espcie humana est se tratando do bem-estar
e condies mnimas de existncia. Igualmente, o
sustentculo em anlise se corporifica tambm na
higidez, ao cumprir os preceitos de ecologicamente
equilibrado, salvaguardando a vida em todas as suas
formas (diversidade de espcies).
Por derradeiro, o quarto pilar a
corresponsabilidade, que impe ao Poder Pblico o dever
geral de se responsabilizar por todos os elementos que
integram o meio ambiente, assim como a condio
positiva de atuar em prol de resguardar. Igualmente,
tem a obrigao de atuar no sentido de zelar, defender e
preservar, asseverando que o meio-ambiente permanea
intacto. Alis, este ltimo se diferencia de conservar que
permite a ao antrpica, viabilizando melhorias no meio
ambiente, trabalhando com as premissas de
desenvolvimento sustentvel, aliando progresso e
conservao. Por seu turno, o cidado tem o dever
negativo, que se apresenta ao no poluir nem agredir o
meio-ambiente com sua ao. Alm disso, em razo da
-
24
referida corresponsabilidade, so titulares do meio
ambiente os cidados da presente e da futura gerao.
3 MEIO AMBIENTE E PATRIMNIO CULTURAL:
ASPECTOS INTRODUTRIOS
Em sede de comentrios introdutrios, cuida
salientar que o meio ambiente cultural constitudo por
bens culturais, cuja acepo compreende aqueles que
possuem valor histrico, artstico, paisagstico,
arqueolgico, espeleolgico, fossilfero, turstico,
cientfico, refletindo as caractersticas de uma
determinada sociedade. Ao lado disso, quadra anotar que
a cultura identifica as sociedades humanas, sendo
formada pela histria e maciamente influenciada pela
natureza, como localizao geogrfica e clima. Com
efeito, o meio ambiente cultural decorre de uma intensa
interao entre homem e natureza, porquanto aquele
constri o seu meio, e toda sua atividade e percepo so
conformadas pela sua cultural. A cultura brasileira o
resultado daquilo que era prprio das populaes
tradicionais indgenas e das transformaes trazidas
pelos diversos grupos colonizadores e escravos
-
25
africanos16. Desta maneira, possvel ponderar que a
proteo do patrimnio cultural se revela como
instrumento robusto da sobrevivncia da prpria
sociedade.
Nesta toada, ao se analisar o meio ambiente
cultural, enquanto complexo macrossistema,
perceptvel que algo incorpreo, abstrato, fludo,
constitudo por bens culturais materiais e imateriais
portadores de referncia memria, ao e
identidade dos distintos grupos formadores da sociedade
brasileira. Meirelles anota que o conceito de patrimnio
histrico e artstico nacional abrange todos os bens
moveis e imveis, existentes no Pas, cuja conservao seja
de interesse pblico, por sua vinculao a fatos
memorveis da Histria ptria ou por seu excepcional
valor artstico, arqueolgico, etnogrfico, bibliogrfico e
ambiental17. Quadra anotar que os bens compreendidos
pelo patrimnio cultural compreendem tanto realizaes
16 BROLLO, Slvia Regina Salau. Tutela Jurdica do meio
ambiente cultural: Proteo contra a exportao ilcita dos
bens culturais. 106f. Dissertao (Mestrado em Direito) Pontifcia Universidade Catlica do Paran, Curitiba, 2006.
Disponvel em:
. Acesso em 15 ago. 2015, p.
15-16. 17 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro,
38 ed. So Paulo: Editora Malheiros, 2012, p. 634.
-
26
antrpicas como obras da Natureza; preciosidades do
passado e obras contemporneas.
Nesta esteira, possvel subclassificar o meio
ambiente cultural em duas espcies distintas, quais
sejam: uma concreta e outra abstrata. Neste passo, o
meio-ambiente cultural concreto, tambm denominado
material, se revela materializado quando est
transfigurado em um objeto classificado como elemento
integrante do meio-ambiente humano. Assim, possvel
citar os prdios, as construes, os monumentos
arquitetnicos, as estaes, os museus e os parques, que
albergam em si a qualidade de ponto turstico, artstico,
paisagstico, arquitetnico ou histrico. Os exemplos
citados alhures, em razo de todos os predicados que
ostentam, so denominados de meio-ambiente cultural
concreto. Acerca do tema em comento, possvel citar o
robusto entendimento jurisprudencial firmado pelo
Ministro Ruy Rosado de Aguiar, ao apreciar o Recurso
Especial N 115.599/RS:
Ementa: Meio Ambiente. Patrimnio
cultural. Destruio de dunas em stios
arqueolgicos. Responsabilidade civil.
Indenizao. O autor da destruio de dunas
que encobriam stios arqueolgicos deve
indenizar pelos prejuzos causados ao meio
ambiente, especificamente ao meio
-
27
ambiente natural (dunas) e ao meio
ambiente cultural (jazidas arqueolgicas
com cermica indgena da Fase Vieira).
Recurso conhecido em parte e provido.
(Superior Tribunal de Justia Quarta Turma/ REsp 115.599/RS/ Relator: Ministro
Ruy Rosado de Aguiar/ Julgado em
27.06.2002/ Publicado no Dirio da Justia
em 02.09.2002, p. 192).
Diz-se, de outro modo, o meio-ambiente
cultural abstrato, chamado, ainda, de imaterial, quando
este no se apresenta materializado no meio-ambiente
humano, sendo, deste modo, considerado como a cultura
de um povo ou mesmo de uma determinada comunidade.
Da mesma maneira, so alcanados por tal acepo a
lngua e suas variaes regionais, os costumes, os modos
e como as pessoas relacionam-se, as produes
acadmicas, literrias e cientficas, as manifestaes
decorrentes de cada identidade nacional e/ou regional.
Neste sentido, possvel colacionar o entendimento
firmado pelo Tribunal Regional Federal da Segunda
Regio, quando, ao apreciar a Apelao Cvel N
2005251015239518, firmou entendimento que expresses
tradicionais e termos de uso corrente, trivial e
disseminado, reproduzidos em dicionrios, integram o
patrimnio cultural de um povo18. Ora, cuida reconhecer
18 BRASIL. Tribunal Regional Federal da Segunda Regio.
-
28
que esses aspectos constituem, sem distino,
abstratamente o meio-ambiente cultural. O patrimnio
cultural imaterial transmite-se de gerao a gerao e
constantemente recriado pelas comunidades e grupos em
funo de seu ambiente19, decorrendo, com destaque, da
interao com a natureza e dos acontecimentos histricos
que permeiam a populao.
Acrdo proferido em Apelao Cvel N 2005251015239518. Direito
da propriedade industrial. Marca fraca e marca de alto renome.
Anulao de marca. Uso compartilhado de signo mercadolgico
(MEGA). I Expresses tradicionais e termos de uso corrente, trivial e disseminado, reproduzidos em dicionrios, integram o
patrimnio cultural de um povo. Palavras dotadas dessas
caractersticas podem inspirar o registro de marcas, pelas
peculiaridades de suas expresses eufnicas ou pela sua inegvel
repercusso associativa no imaginrio do consumidor. II fraca a marca que reproduz a ltima letra do alfabeto grego (Omega),
utilizado pelo povo helnico desde o sculo VIII a.C., e inserida pelos
povos eslavos no alfabeto cirlico, utilizado no Imprio Bizantino
desde o sculo X d.C. O propsito de sua adoo , inegavelmente, o
de fazer uso da familiaridade do consumidor com o vocbulo de uso
corrente desde a Antiguidade. III Se uma marca fraca alcanou alto renome, a ela s se pode assegurar proteo limitada, despida do
jus excludendi de terceiros, que tambm fazem uso do mesmo signo
merceolgico de boa-f e em atividade distinta. Nessas
circunstncias, no h a possibilidade de o consumidor incidir erro
ou, ainda, de se configurar concorrncia desleal. IV Apelao parcialmente provida to-somente para ajustar o plo passivo da
relao processual, fazendo constar o Instituto Nacional de
Propriedade Industrial INPI como ru, mantida a improcedncia do pedido de invalidao do registro da marca mista OMEGA (n
818.522.216), classe 20 (mveis e acessrios de cozinha), formulado
por mega S.A. rgo Julgador: Segunda Turma Especializada.
Relator: Desembargador Federal Andr Fontes. Julgado em
25.08.2007. Disponvel em: . Acesso em 15 ago.
2015. 19 BROLLO, 2006, p. 33.
-
29
O Decreto N. 3.551, de 04 de Agosto de 200020,
que institui o registro de bens culturais de natureza
imaterial que constituem patrimnio cultural brasileiro,
cria o Programa Nacional do Patrimnio Imaterial e d
outras providncias, consiste em instrumento efetivo
para a preservao dos bens imateriais que integram o
meio-ambiente cultural. Como bem aponta Brollo21, em
seu magistrio, o aludido decreto no instituiu apenas o
registro de bens culturais de natureza imaterial que
integram o patrimnio cultural brasileiro, mas tambm
estruturou uma poltica de inventariana,
referenciamento e valorizao desse patrimnio. Ejeta-se,
segundo o entendimento firmado por Fiorillo22, que os
bens que constituem o denominado patrimnio cultural
consistem na materializao da histria de um povo, de
todo o caminho de sua formao e reafirmao de seus
valores culturais, os quais tm o condo de
substancializar a identidade e a cidadania dos indivduos
insertos em uma determinada comunidade. Ao lado do
exposto, necessrio se faz salientar que o meio-ambiente
20 BRASIL. Decreto N 3.551, de 04 de Agosto de 2000. Institui o
Registro de Bens Culturais de Natureza Imaterial que constituem
patrimnio cultural brasileiro, cria o Programa Nacional do
Patrimnio Imaterial e d outras providncias. Disponvel em:
. Acesso em 15 ago. 2015. 21 BROLLO, 2006, p. 33. 22 FIORILLO, 2012, p. 80.
-
30
cultural, conquanto seja artificial, difere-se do meio-
ambiente humano em razo do aspecto cultural que o
caracteriza, sendo dotado de valor especial, notadamente
em decorrncia de produzir um sentimento de identidade
no grupo em que se encontra inserido, bem como
propiciada a constante evoluo fomentada pela ateno
diversidade e criatividade humana.
4 PONDERAES PROEMINNCIA DO
INSTITUTO DO REGISTRO COMO MECANISMO
DE PRESERVAO DOS BENS CULTURAIS
IMATERIAIS
Cuida anotar que o registro do bem cultural de
natureza imaterial, para ser considerado vlido e
legtimo, reclama harmonia com o ordenamento jurdico
vigente. Com efeito, o Texto Constitucional consagra em
seu bojo a definio acercam de quais bens constituem o
patrimnio cultural brasileiro, estabelecendo, por via de
consequncia, as normas de proteo a esse patrimnio,
consoante afixa a redao do artigo 21623. verificvel
23 BRASIL. Constituio (1988). Constituio da) Repblica Federativa do Brasil. Braslia: Senado Federal, 1988. Disponvel em: . Acesso em 19 jul. 2013: Art. 216. Constituem patrimnio cultural brasileiro os bens de natureza material e imaterial, tomados individualmente ou em
-
31
que o dispositivo em comento faz expressa referncia aos
bens portadores de identidade, ao e memria dos
diferentes grupos da sociedade brasileira. Desta feita,
possvel salientar, oportunamente, que a Carta de
Outubro de 1988 no estrutura a sociedade brasileira
como um todo homogneo, mas como uma sociedade
multifacetada, constituda por diferentes grupos, cada
um portador de identidades e de modos de criar, fazer e
viver especficos.
Com efeito, o posicionamento dotado de
proeminncia na medida em que o Texto Constitucional,
com clareza solar, sublinha que o seu interesse no est
centrado apenas em proteger objetos materiais que
gozem valor acadmico, mas tambm os bens de natureza
material ou imaterial portadores de referncia
identidade de cada grupo formador da sociedade
brasileira. Ora, cada um dos diversos grupos, assim como
seus modos de fazer, criar e viver, objetivo de proteo
conferida pelo Ente Estatal. Ao lado disso, a Carta de
1988 apresenta caracterstico forte os ideais republicanos
conjunto, portadores de referncia identidade, ao, memria dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira, nos quais se incluem: I - as formas de expresso; II - os modos de criar, fazer e viver; III - as criaes cientficas, artsticas e tecnolgicas; IV - as obras, objetos, documentos, edificaes e demais espaos destinados s manifestaes artstico-culturais; V - os conjuntos urbanos e stios de valor histrico, paisagstico, artstico, arqueolgico, paleontolgico, ecolgico e cientfico.
-
32
e democrticos, refletindo em toda s as matrias nela
versadas esses corolrios, at mesmo porque estrutura -
se como escopo fundamental entalhado na Constituio o
de edificar uma sociedade livre, justa e solidria. Desta
feita, a concepo em testilha informa a maneira por
meio da qual o Estado deve proteger e promover a
cultura. Ademais, ao tratar da poltica cultural e da
democracia cultural, Jos Afonso da Silva assinala:
A questo da poltica cultural est
exatamente no equilbrio que se h de
perseguir entre um Estado que imponha
um a cultura oficial e a democracia
cultural. A concepo de um Estado
Cultural no sentido de um Estado que
sustente uma cultura oficial no atende,
certamente, a uma concepo de
democracia cultural. A Constituio, como
j deixamos expresso antes, no deixa
dvidas sobre o tema, visto que garante a
liberdade de criao, de expresso e de
acesso s fontes da cultura nacional. Isso
significa que no pode haver cultura
imposta, que o papel do Poder Pblico
deve ser o de favorecer a livre procura das
manifestaes culturais, criar condies de
acesso popular cultura, prover meios
para que a difuso cultural se funda nos
critrios de igualdade. A democracia
cultural pode-se apresentar sob trs
aspectos: por um lado, no tolher a
liberdade de criao, expresso e de
acesso cultura, por qualquer forma de
constrangimento ou de restrio oficial;
antes, criar, condies para a efetivao
dessa liberdade num clima de igualdade;
-
33
por outro lado, favorecer o acesso
cultura e o gozo dos bens culturais
massa da populao excluda24.
Nesta linha, ainda, cuida mencionar que a ao
cultural pblica se apresenta como absolutamente
imprescindvel democratizao da cultura, sendo
considerada como o procedimento que propiciai a
convergncia e o alargamento do pblico, tal como a
extenso do fenmeno de comunicao artstico,
consoante o iderio de que a poltica cultural ,
juntamente com a poltica social, um dos modos
utilizados pelo Estado contemporneo para assegurar sua
legitimao, ou seja, para oferecer como um Estado que
vela por todos e que vale para todos. Ao lado disso, em
razo da proteo cultural se fazer conjuntamente com o
Estado e a sociedade, pode-se destacar que o Texto
Constitucional afixou que o Poder Pblico, com a
colaborao da comunidade, promover e proteger o
patrimnio cultural brasileiro, lanando mo, para
tanto, de inventrios, registros e tombamentos, alm
de outras formas de acautelamento e preservao.
Infere-se que, dentre os instrumentos
previstos para se proteger os bens culturais brasileiros,
24 SILVA, Jos Afonso da. Ordenao Constitucional da Cultura. So Paulo: Malheiros Editores, 1998, p. 209-210.
-
34
encontra -se o instituto do registro, cuja regulamentao se
d pelo Decreto N. 3.551, de 04 de Agosto de 200025,
que institui o Registro de Bens Culturais de Natureza
Imaterial que constituem o patrimnio cultural
brasileiro, cria o Programa Nacional do Patrimnio
Imaterial e d outras providncias. Imperioso se faz
assinalar que a criao do instituto do registro est
vinculada a di versos movimentos em defesa de uma
compreenso mais ampla no que se refere ao
patrimnio cultural brasileiro. No Brasil, a publicao
do Decreto 3.551/2000, insere-se numa trajetria a que
se vinculam as figuras emblemticas de Mrio de
Andrade e de Alosio Magalhes, mas em que se incluem
tambm as sociedades de folcloristas, os movimentos
negros e de defesa dos direitos indgenas26, como bem
observa Maria Ceclia Londres Fonseca. Igualmente,
o instituto em comento reflete as rei vindicaes dos
grupos de descendentes de imigrantes das mais
diversas procedncias, alcanando, desta maneira, os
25 BRASIL. Decreto N 3.551, de 04 de Agosto de 2000. Institui o
Registro de Bens Culturais de Natureza Imaterial que constituem
patrimnio cultural brasileiro, cria o Programa Nacional do
Patrimnio Imaterial e d outras providncias. Disponvel em:
. Acesso em 15 ago. 2015. 26 FONSECA, Maria Ceclia Londres. Para alm da pedra e cal: por uma concepo ampla do patrimnio cultural in: ABREU, Regina; CHAGAS, Mrio (orgs.). Memria e patrimnio: ensaios contemporneos. Rio de Janeiro: DP&A, 2003, p. 62.
-
35
excludos do cenrio do patrimnio cultural brasileiro,
estruturada a partir de 1937.
Nesta esteira, evidencia-se que o registro tem
por finalidade reconhecer e valorizar bens da natureza
imaterial em seu processo dinmico de evoluo,
viabilizando uma apreenso do contexto pretrito e
presente dessas manifestaes em suas distintas
verses. Mrcia SantA nna, ao discorrer acerca do
instituto em comento, coloca em realce que no um
instrumento de tutela e acautelamento anlogo ao
tombamento, mas um recurso de reconhecimento e
valorizao do patrimnio imaterial, que pode tambm
ser complementar a este27. Ora, neste cenrio, o registro
corresponde identificao e produo do
conhecimento acerca do bem cultural de natureza
imaterial, equivalendo a documentar, pelos meios
tcnicos mais adequados, o passado e o presente dessas
manifestaes, em suas plurais facetas, possibilitando,
a partir de uma fluidez das relaes, o amplo acesso ao
pblico. Nesta perspectiva, o escopo manter o registro
da memria dos bens culturais e de sua trajetria no
27 SANTANNA, Mrcia. A face imaterial do patrimnio cultural: os novos instrumentos de reconhecimento e valorizao in: ABREU, Regina; CHAGAS, Mrio (orgs.). Memria e patrimnio: ensaios contemporneos. Rio de Janeiro: DP&A, 2003, p. 52.
-
36
tempo, eis que este o mecanismo apto a assegurar a
sua preservao.
Em razo da dinamicidade dos processos
culturais dinmicos, as mencionadas manifestaes
desbordam em uma concepo de preservao di versa
daquela da prtica ocidental, no podendo ser alicerada
em seus conceitos de permanncia e autenticidade. Os
bens culturais de natureza imaterial, a partir do
esposado, so emoldurados por uma dinmica de
desenvolvimento e transformao que no pode ser
engessado nesses conceitos, sendo mais importante,
nas situaes concretas, o registro e a documentao do
que interveno, restaurao e conservao. Acrescente-
se, ainda, que os bens escolhidos para registro sero
inscritos em livros denominados: (i) Livro de registros
dos saberes, no qual sero registrados os conhecimentos
e modo de fazer; (ii) Livro das formas de expresso, o
qual conter as manifestaes literrias, musicais,
plsticas, cnicas e ldicas; (iii) Livro dos lugares, no
qual se inscrever as manifestaes de espaos em que
se concentram ou mesmo reproduzem prticas
culturais coletivas; e, (iv) Livro das celebraes, no
qual sero lavradas as festas, rituais e folguedos,
consoante afixa o Decreto N. 3.551, de 04 de Agosto
-
37
de 200028.
5 TESSITURAS AO PROGRAMA NACIONAL DO
PATRIMNIO IMATERIAL (PNPI): BREVES
EXPLICITAES
Em sede de apresentao, O Programa
Nacional do Patrimnio Imaterial (PNPI), institudo
pelo Decreto N. 3.551, de 04 de Agosto de 200029, que
institui o Registro de Bens Culturais de Natureza
Imaterial que constituem o patrimnio cultural
brasileiro, cria o Programa Nacional do Patrimnio
Imaterial e d outras providncias, viabiliza projetos de
identificao, reconhecimento, salvaguarda e promoo
da dimenso imaterial do patrimnio cultural, com
respeito e proteo dos direitos difusos ou coletivos
relativos preservao e ao uso desse patrimnio. um
programa de apoio e fomento que busca estabelecer
parcerias com instituies dos governos federal,
estaduais e municipais, universidades, organizaes no
28 BRASIL. Decreto N 3.551, de 04 de Agosto de 2000. Institui o
Registro de Bens Culturais de Natureza Imaterial que constituem
patrimnio cultural brasileiro, cria o Programa Nacional do
Patrimnio Imaterial e d outras providncias. Disponvel em:
. Acesso em 15 ago. 2015. 29 Ibid.
-
38
governamentais, agncias de desenvolvimento e
organizaes privadas ligadas cultura e pesquisa.
Entre as atribuies do PNPI, est a
elaborao de indicadores para acompanhamento e
avaliao de aes de valorizao e salvaguarda do
patrimnio cultural imaterial. Ao lado disso, cuida
apontar que o Programa foi criado para implementar a
poltica de inventrio, registro e salvaguarda de bens
culturais de natureza imaterial, e contribuir com a
preservao da diversidade tnica e cultural do pas e
disseminao de informaes sobre o Patrimnio
Cultural Brasileiro a todos os segmentos da sociedade.
Outros objetivos so a captao de recursos e promoo
da formao de uma rede de parceiros para preservao,
valorizao e ampliao dos bens que compem o
patrimnio cultural brasileiro, alm do incentivo e apoio
s iniciativas e prticas de preservao desenvolvidas
pela sociedade.
Nas diretrizes da poltica de apoio e fomento
do PNPI esto previstas a promoo da incluso social e
a melhoria das condies de vida de produtores e
detentores do patrimnio cultural imaterial, e medidas
que ampliem a participao dos grupos que produzem,
transmitem e atualizam manifestaes culturais de
-
39
natureza imaterial nos projetos de preservao e
valorizao desse patrimnio. Nesta esteira de exposio,
a promoo da salvaguarda de bens culturais imateriais
deve ocorrer por meio do apoio s condies materiais
que propiciam a existncia desses bens e pela ampliao
do acesso aos benefcios gerados por essa preservao, e
com a criao de mecanismos de proteo efetiva dos
bens culturais imateriais em situao de risco.
REFERNCIA:
BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito
Constitucional. 21 ed. atual. So Paulo: Editora
Malheiros Ltda., 2007.
BRASIL. Constituio (1988). Constituio (da)
Repblica Federativa do Brasil. Braslia: Senado
Federal, 1988. Disponvel em:
. Acesso em 15 ago. 2015.
___________. Decreto N 3.551, de 04 de Agosto de
2000. Institui o Registro de Bens Culturais de Natureza
Imaterial que constituem patrimnio cultural brasileiro,
cria o Programa Nacional do Patrimnio Imaterial e d
outras providncias. Disponvel em:
. Acesso em 15 ago. 2015.
___________. Instituto do Patrimnio Histrico e
Artstico Nacional. Disponvel em:
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___________. Lei N. 6.938, de 31 de Agosto de 1981.
Dispe sobre a Poltica Nacional do Meio Ambiente, seus
fins e mecanismos de formulao e aplicao, e d outras
providncias. Disponvel em:
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___________. Superior Tribunal de Justia.
Disponvel em: . Acesso em 15 ago.
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___________. Tribunal Regional Federal da Segunda
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BRITO, Fernando de Azevedo Alves. A hodierna
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Acesso em 15 ago. 2015.
BROLLO, Slvia Regina Salau. Tutela Jurdica do
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exportao ilcita dos bens culturais. 106f.
Dissertao (Mestrado em Direito) Pontifcia Universidade Catlica do Paran, Curitiba, 2006.
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MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo
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___________. Ordenao Constitucional da Cultura.
So Paulo: Malheiros Editores, 1998.
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do Direito Penal. Jurid Publicaes Eletrnicas,
Bauru, 22 jun. 2009. Disponvel em:
. Acesso em 15 ago. 2015.
-
43
O SISTEMA NACIONAL DE INFORMAES E
INDICADORES CULTURAIS (SNIIC) EM EXAME:
SINGELAS PONDERAES LEI N 12.343/2010
Resumo: O objetivo do presente est assentado na
anlise do Sistema Nacional de Informaes e
Indicadores Culturais (SNIIC), institudo pela Lei
n 12.343, de 02 de dezembro de 2010. Cuida
salientar que o meio ambiente cultural
constitudo por bens culturais, cuja acepo
compreende aqueles que possuem valor histrico,
artstico, paisagstico, arqueolgico, espeleolgico,
fossilfero, turstico, cientfico, refletindo as
caractersticas de uma determinada sociedade. Ao
lado disso, quadra anotar que a cultura identifica
as sociedades humanas, sendo formada pela
histria e maciamente influenciada pela natureza,
como localizao geogrfica e clima. Com efeito, o
meio ambiente cultural decorre de uma intensa
interao entre homem e natureza, porquanto
aquele constri o seu meio, e toda sua atividade e
percepo so conformadas pela sua cultural. A
cultura brasileira o resultado daquilo que era
prprio das populaes tradicionais indgenas e das
transformaes trazidas pelos diversos grupos
-
44
colonizadores e escravos africanos. Nesta toada, ao
se analisar o meio ambiente cultural, enquanto
complexo macrossistema, perceptvel que algo
incorpreo, abstrato, fludo, constitudo por bens
culturais materiais e imateriais portadores de
referncia memria, ao e identidade dos
distintos grupos formadores da sociedade
brasileira. O conceito de patrimnio histrico e
artstico nacional abrange todos os bens moveis e
imveis, existentes no Pas, cuja conservao seja
de interesse pblico, por sua vinculao a fatos
memorveis da Histria ptria ou por seu
excepcional valor artstico, arqueolgico,
etnogrfico, bibliogrfico e ambiental.
Palavras-chaves: Patrimnio Cultural. Sistema
Nacional de Informaes e Indicadores Culturais.
Tutela Jurdica.
Sumrio: 1 Ponderaes Introdutrias: Breves
notas construo terica da Ramificao
Ambiental do Direito; 2 Comentrios concepo
de Meio Ambiente; 3 Meio Ambiente e Patrimnio
Cultural: Aspectos Introdutrios; 4 O Sistema
Nacional de Informaes e Indicadores Culturais
(SNIIC) em exame: Singelas Ponderaes Lei n
12.343/2010
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1 PONDERAES INTRODUTRIAS: BREVES
NOTAS CONSTRUO TERICA DA
RAMIFICAO AMBIENTAL DO DIREITO
Inicialmente, ao se dispensar um exame acerca
do tema colocado em tela, patente se faz arrazoar que a
Cincia Jurdica, enquanto um conjunto multifacetado de
arcabouo doutrinrio e tcnico, assim como as robustas
ramificaes que a integram, reclama uma interpretao
alicerada nos plurais aspectos modificadores que
passaram a influir em sua estruturao. Neste alamir,
lanando tona os aspectos caractersticos de
mutabilidade que passaram a orientar o Direito, tornou-
se imperioso salientar, com nfase, que no mais subsiste
uma viso arrimada em preceitos estagnados e
estanques, alheios s necessidades e s diversidades
sociais que passaram a contornar os Ordenamentos
Jurdicos. Ora, infere-se que no mais prospera o
arcabouo imutvel que outrora sedimentava a aplicao
das leis, sendo, em decorrncia dos anseios da populao,
suplantados em uma nova sistemtica.
Com espeque em tais premissas, cuida
hastear, com bastante pertinncia, como flmula de
interpretao o prisma de avaliao o brocardo jurdico
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'Ubi societas, ibi jus', ou seja, 'Onde est a sociedade, est
o Direito', tornando explcita e cristalina a relao de
interdependncia que esse binmio mantm30. Destarte,
com clareza solar, denota-se que h uma interao
consolidada na mtua dependncia, j que o primeiro
tem suas balizas fincadas no constante processo de
evoluo da sociedade, com o fito de que seus Diplomas
Legislativos e institutos no fiquem inquinados de
inaptido e arcasmo, em total descompasso com a
realidade vigente. A segunda, por sua vez, apresenta
estrutural dependncia das regras consolidadas pelo
Ordenamento Ptrio, cujo escopo primevo assegurar
que no haja uma vingana privada, afastando, por
extenso, qualquer rano que rememore priscas eras em
que o homem valorizava a Lei de Talio (Olho por olho,
dente por dente), bem como para evitar que se robustea
um cenrio catico no seio da coletividade.
Ademais, com a promulgao da Constituio
da Repblica Federativa do Brasil de 1988,
imprescindvel se fez adot-la como macio axioma de
sustentao do Ordenamento Brasileiro, precipuamente
30 VERDAN, Tau Lima. Princpio da Legalidade: Corolrio do
Direito Penal. Jurid Publicaes Eletrnicas, Bauru, 22 jun.
2009. Disponvel em: . Acesso em 13
mar. 2015, s.p.
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quando se objetiva a amoldagem do texto legal, genrico
e abstrato, aos complexos anseios e mltiplas
necessidades que influenciam a realidade
contempornea. Ao lado disso, h que se citar o voto
magistral voto proferido pelo Ministro Eros Grau, ao
apreciar a Ao de Descumprimento de Preceito
Fundamental N. 46/DF, o direito um organismo vivo,
peculiar porm porque no envelhece, nem permanece
jovem, pois contemporneo realidade. O direito um
dinamismo. Essa, a sua fora, o seu fascnio, a sua
beleza31. Como bem pontuado, o fascnio da Cincia
Jurdica jaz, justamente, na constante e imprescindvel
mutabilidade que apresenta, decorrente do dinamismo
que reverbera na sociedade e orienta a aplicao dos
31 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Acrdo em Arguio de
Descumprimento de Preceito Fundamental N. 46/DF. Empresa
Pblica de Correios e Telgrafos. Privilgio de Entrega de
Correspondncias. Servio Postal. Controvrsia referente Lei
Federal 6.538, de 22 de Junho de 1978. Ato Normativo que regula
direitos e obrigaes concernentes ao Servio Postal. Previso de
Sanes nas Hipteses de Violao do Privilgio Postal.
Compatibilidade com o Sistema Constitucional Vigente. Alegao de
afronta ao disposto nos artigos 1, inciso IV; 5, inciso XIII, 170,
caput, inciso IV e pargrafo nico, e 173 da Constituio do Brasil.
Violao dos Princpios da Livre Concorrncia e Livre Iniciativa. No
Caracterizao. Arguio Julgada Improcedente. Interpretao
conforme Constituio conferida ao artigo 42 da Lei N. 6.538, que
estabelece sano, se configurada a violao do privilgio postal da
Unio. Aplicao s atividades postais descritas no artigo 9, da lei.
rgo Julgador: Tribunal Pleno. Relator: Ministro Marcos Aurlio.
Julgado em 05 ag. 2009. Disponvel em: . Acesso em
13 mar. 2015.
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Diplomas Legais e os institutos jurdicos neles
consagrados.
Ainda neste substrato de exposio, pode-se
evidenciar que a concepo ps-positivista que passou a
permear o Direito, ofertou, por via de consequncia, uma
rotunda independncia dos estudiosos e profissionais da
Cincia Jurdica. Alis, h que se citar o entendimento
de Verdan, esta doutrina o ponto culminante de uma
progressiva evoluo acerca do valor atribudo aos
princpios em face da legislao32. Destarte, a partir de
uma anlise profunda dos mencionados sustentculos,
infere-se que o ponto central da corrente ps-positivista
cinge-se valorao da robusta tbua principiolgica que
Direito e, por conseguinte, o arcabouo normativo
passando a figurar, nesta tela, como normas de cunho
vinculante, flmulas hasteadas a serem adotadas na
aplicao e interpretao do contedo das leis, diante das
situaes concretas.
Nas ltimas dcadas, o aspecto de
mutabilidade tornou-se ainda mais evidente, em especial,
quando se analisa a construo de novos que derivam da
Cincia Jurdica. Entre estes, cuida destacar a
ramificao ambiental, considerando como um ponto de
32 VERDAN, 2009, s.p.
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congruncia da formao de novos iderios e cnones,
motivados, sobretudo, pela premissa de um manancial de
novos valores adotados. Nesta trilha de argumentao,
de boa tcnica se apresenta os ensinamentos de
Fernando de Azevedo Alves Brito que, em seu artigo,
aduz: Com a intensificao, entretanto, do interesse dos
estudiosos do Direito pelo assunto, passou-se a desvendar
as peculiaridades ambientais, que, por estarem muito
mais ligadas s cincias biolgicas, at ento era
marginalizadas33. Assim, em decorrncia da
proeminncia que os temas ambientais vm, de maneira
paulatina, alcanando, notadamente a partir das ltimas
discusses internacionais envolvendo a necessidade de
um desenvolvimento econmico pautado em
sustentabilidade, no raro que prospere, mormente em
razo de novos fatores, um verdadeiro remodelamento ou
mesmo uma releitura dos conceitos que abalizam a
ramificao ambiental do Direito, com o fito de permitir
que ocorra a conservao e recuperao das reas
degradadas, primacialmente as culturais.
33 BRITO, Fernando de Azevedo Alves. A hodierna classificao do
meio-ambiente, o seu remodelamento e a problemtica sobre a
existncia ou a inexistncia das classes do meio-ambiente do
trabalho e do meio-ambiente misto. Boletim Jurdico, Uberaba,
ano 5, n. 968. Disponvel em: .
Acesso em 13 mar. 2015.
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Ademais, h de ressaltar ainda que o direito
ambiental passou a figurar, especialmente, depois das
dcadas de 1950 e 1960, como um elemento integrante da
farta e slida tbua de direitos fundamentais. Calha
realar que mais contemporneos, os direitos que
constituem a terceira dimenso recebem a alcunha de
direitos de fraternidade ou, ainda, de solidariedade,
contemplando, em sua estrutura, uma patente
preocupao com o destino da humanidade34. Ora, da se
verifica a incluso de meio ambiente como um direito
fundamental, logo, est umbilicalmente atrelado com
humanismo e, por extenso, a um ideal de sociedade
mais justa e solidria. Nesse sentido, ainda, plausvel
citar o artigo 3., inciso I, da Carta Poltica de 1988 que
abriga em sua redao tais pressupostos como os
princpios fundamentais do Estado Democrtico de
Direitos: Art. 3 - Constituem objetivos fundamentais da
Repblica Federativa do Brasil: I - construir uma
sociedade livre, justa e solidria35.
Ainda nesta esteira, possvel verificar que a
34 MOTTA, Sylvio; DOUGLAS, Willian. Direito Constitucional Teoria, Jurisprudncia e 1.000 Questes 15 ed., rev., ampl. e
atual. Rio de Janeiro: Editora Impetus, 2004, p. 69. 35 BRASIL. Constituio (1988). Constituio (da) Repblica
Federativa do Brasil. Braslia: Senado Federal, 1988. Disponvel
em: . Acesso em 13 mar. 2015.
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construo dos direitos encampados sob a rubrica de
terceira dimenso tende a identificar a existncia de
valores concernentes a uma determinada categoria de
pessoas, consideradas enquanto unidade, no mais
prosperando a tpica fragmentao individual de seus
componentes de maneira isolada, tal como ocorria em
momento pretrito. Com o escopo de ilustrar, de maneira
pertinente as ponderaes vertidas, insta trazer colao
o entendimento do Ministro Celso de Mello, ao apreciar a
Ao Direta de Inconstitucionalidade N. 1.856/RJ, em
especial quando destaca:
Cabe assinalar, Senhor Presidente, que os
direitos de terceira gerao (ou de
novssima dimenso), que materializam
poderes de titularidade coletiva atribudos,
genericamente, e de modo difuso, a todos os
integrantes dos agrupamentos sociais,
consagram o princpio da solidariedade e
constituem, por isso mesmo, ao lado dos
denominados direitos de quarta gerao
(como o direito ao desenvolvimento e o
direito paz), um momento importante no
processo de expanso e reconhecimento dos
direitos humanos, qualificados estes,
enquanto valores fundamentais
indisponveis, como prerrogativas
impregnadas de uma natureza
essencialmente inexaurvel36.
36 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Acrdo proferido em
Ao Direta de Inconstitucionalidade N 1.856/RJ. Ao Direta De
Inconstitucionalidade - Briga de galos (Lei Fluminense N 2.895/98) -
Legislao Estadual que, pertinente a exposies e a competies
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Quadra anotar que os direitos alocados sob a
rubrica de direito de terceira dimenso encontram como
assento primordial a viso da espcie humana na
condio de coletividade, superando, via de consequncia,
a tradicional viso que est pautada no ser humano em
sua individualidade. Assim, a preocupao identificada
est alicerada em direitos que so coletivos, cujas
influncias afetam a todos, de maneira indiscriminada.
Ao lado do exposto, cuida mencionar, segundo Bonavides,
que tais direitos tm primeiro por destinatrios o gnero
humano mesmo, num momento expressivo de sua
afirmao como valor supremo em termos de
existencialidade concreta37. Com efeito, os direitos de
terceira dimenso, dentre os quais se inclui ao meio
entre aves das raas combatentes, favorece essa prtica criminosa -
Diploma Legislativo que estimula o cometimento de atos de
crueldade contra galos de briga - Crime Ambiental (Lei N 9.605/98,
ART. 32) - Meio Ambiente - Direito preservao de sua integridade
(CF, Art. 225) - Prerrogativa qualificada por seu carter de
metaindividualidade - Direito de terceira gerao (ou de novssima
dimenso) que consagra o postulado da solidariedade - Proteo
constitucional da fauna (CF, Art. 225, 1, VII) - Descaracterizao
da briga de galo como manifestao cultural - Reconhecimento da
inconstitucionalidade da Lei Estadual impugnada - Ao Direta
procedente. Legislao Estadual que autoriza a realizao de
exposies e competies entre aves das raas combatentes - Norma
que institucionaliza a prtica de crueldade contra a fauna Inconstitucionalidade. . rgo Julgador: Tribunal Pleno. Relator:
Ministro Celso de Mello. Julgado em 26 mai. 2011. Disponvel em:
. Acesso em 13 mar. 2015. 37 BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 21 ed.
atual. So Paulo: Editora Malheiros Ltda., 2007, p. 569.
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ambiente ecologicamente equilibrado, positivado na
Constituio de 1988, emerge com um claro e tangvel
aspecto de familiaridade, como pice da evoluo e
concretizao dos direitos fundamentais.
2 COMENTRIOS CONCEPO DE MEIO
AMBIENTE
Em uma primeira plana, ao lanar mo do
sedimentado jurdico-doutrinrio apresentado pelo inciso
I do artigo 3 da Lei N. 6.938, de 31 de agosto de 198138,
que dispe sobre a Poltica Nacional do Meio Ambiente,
seus fins e mecanismos de formulao e aplicao, e d
outras providncias, salienta que o meio ambiente
consiste no conjunto e conjunto de condies, leis e
influncias de ordem qumica, fsica e biolgica que
permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas.
Pois bem, com o escopo de promover uma facilitao do
aspecto conceitual apresentado, possvel verificar que o
meio ambiente se assenta em um complexo dilogo de
fatores abiticos, provenientes de ordem qumica e fsica,
38 BRASIL. Lei N. 6.938, de 31 de Agosto de 1981. Dispe sobre a
Poltica Nacional do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de
formulao e aplicao, e d outras providncias. Disponvel em:
. Acesso em 13 mar. 2015.
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e biticos, consistentes nas plurais e diversificadas
formas de seres viventes. Consoante os ensinamentos
apresentados por Jos Afonso da Silva, considera-se
meio-ambiente como a interao do conjunto de
elementos naturais, artificiais e culturais que propiciem o
desenvolvimento equilibrado da vida em todas as suas
formas39.
Nesta senda, ainda, Fiorillo40, ao tecer
comentrios acerca da acepo conceitual de meio
ambiente, coloca em destaque que tal tema se assenta em
um iderio jurdico indeterminado, incumbindo, ao
intrprete das leis, promover o seu preenchimento. Dada
fluidez do tema, possvel colocar em evidncia que o
meio ambiente encontra ntima e umbilical relao com
os componentes que cercam o ser humano, os quais so
de imprescindvel relevncia para a sua existncia. O
Ministro Luiz Fux, ao apreciar a Ao Direta de
Inconstitucionalidade N. 4.029/AM, salientou, com
bastante pertinncia, que:
(...) o meio ambiente um conceito hoje
geminado com o de sade pblica, sade de
39 SILVA, Jos Afonso da. Direito Ambiental Constitucional. So
Paulo: Malheiros Editores, 2009, p.20. 40 FIORILLO, Celso Antnio Pacheco. Curso de Direito
Ambiental Brasileiro. 13 ed., rev., atual e ampl. So Paulo:
Editora Saraiva, 2012, p. 77.
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cada indivduo, sadia qualidade de vida, diz
a Constituio, por isso que estou falando
de sade, e hoje todos ns sabemos que ele
imbricado, conceitualmente geminado com
o prprio desenvolvimento. Se antes ns
dizamos que o meio ambiente compatvel
com o desenvolvimento, hoje ns dizemos, a
partir da Constituio, tecnicamente, que
no pode haver desenvolvimento seno com
o meio ambiente ecologicamente
equilibrado. A geminao do conceito me
parece de rigor tcnico, porque salta da
prpria Constituio Federal41.
denotvel, desta sorte, que a
constitucionalizao do meio ambiente no Brasil
viabilizou um verdadeiro salto qualitativo, no que
concerne, especificamente, s normas de proteo
ambiental. Tal fato decorre da premissa que os robustos
corolrios e princpios norteadores foram alados ao
patamar constitucional, assumindo colocao eminente,
ao lado das liberdades pblicas e dos direitos
41 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Acrdo proferido em
Ao Direta de Inconstitucionalidade N 4.029/AM. Ao Direta de
Inconstitucionalidade. Lei Federal N 11.516/07. Criao do Instituto
Chico Mendes de Conservao da Biodiversidade. Legitimidade da
Associao Nacional dos Servidores do IBAMA. Entidade de Classe
de mbito Nacional. Violao do art. 62, caput e 9, da
Constituio. No emisso de parecer pela Comisso Mista
Parlamentar. Inconstitucionalidade dos artigos 5, caput, e 6, caput
e pargrafos 1 e 2, da Resoluo N 1 de 2002 do Congresso
Nacional. Modulao dos Efeitos Temporais da Nulidade (Art. 27 da
Lei 9.868/99). Ao Direta Parcialmente Procedente. rgo
Julgador: Tribunal Pleno. Relator: Ministro Luiz Fux. Julgado em 08
mar. 2012. Disponvel em: . Acesso em 13 mar.
2015.
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fundamentais. Superadas tais premissas, aprouve ao
Constituinte, ao entalhar a Carta Poltica Brasileira,
ressoando os valores provenientes dos direitos de terceira
dimenso, insculpir na redao do artigo 225, conceder
amplo e robusto respaldo ao meio ambiente como pilar
integrante dos direitos fundamentais. Com o advento da
Constituio da Repblica Federativa do Brasil de 1988,
as normas de proteo ambiental so aladas categoria
de normas constitucionais, com elaborao de captulo
especialmente dedicado proteo do meio ambiente42.
Nesta toada, ainda, observvel que o caput do artigo
225 da Constituio Federal de 198843 est abalizado em
quatro pilares distintos, robustos e singulares que, em
conjunto, do corpo a toda tbua ideolgica e terica que
assegura o substrato de edificao da ramificao
ambiental.
Primeiramente, em decorrncia do tratamento
dispensado pelo artfice da Constituio Federal, o meio
42 THOM, Romeu. Manual de Direito Ambiental: Conforme o
Novo Cdigo Florestal e a Lei Complementar 140/2011. 2 ed.
Salvador: Editora JusPodivm, 2012, p. 116. 43 BRASIL. Constituio (1988). Constituio (da) Repblica
Federativa do Brasil. Braslia: Senado Federal, 1988. Disponvel
em: . Acesso em 13 mar. 2015: Art. 225. Todos tm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado,
bem de uso comum do povo e essencial sadia qualidade de vida,
impondo-se ao Poder Pblico e coletividade o dever de defend-lo e
preserv-lo para as presentes e futuras geraes.
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ambiente foi iado condio de direito de todos,
presentes e futuras geraes. encarado como algo
pertencente a toda coletividade, assim, por esse prisma,
no se admite o emprego de qualquer distino entre
brasileiro nato, naturalizado ou estrangeiro, destacando-
se, sim, a necessidade de preservao, conservao e no-
poluio. O artigo 225, devido ao cunho de direito difuso
que possui, extrapola os limites territoriais do Estado
Brasileiro, no ficando centrado, apenas, na extenso
nacional, compreendendo toda a humanidade. Neste
sentido, o Ministro Celso de Mello, ao apreciar a Ao
Direta de Inconstitucionalidade N 1.856/RJ, destacou
que:
A preocupao com o meio ambiente - que
hoje transcende o plano das presentes
geraes, para tambm atuar em favor das
geraes futuras (...) tem constitudo, por
isso mesmo, objeto de regulaes
normativas e de proclamaes jurdicas,
que, ultrapassando a provncia meramente
domstica do direito nacional de cada
Estado soberano, projetam-se no plano das
declaraes internacionais, que refletem, em
sua expresso concreta, o compromisso das
Naes com o indeclinvel respeito a esse
direito fundamental que assiste a toda a
Humanidade44.
44 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Acrdo proferido em
Ao Direta de Inconstitucionalidade N 1.856/RJ. Ao Direta De
Inconstitucionalidade - Briga de galos (Lei Fluminense N 2.895/98) -
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O termo todos, aludido na redao do caput
do artigo 225 da Constituio Federal de 1988, faz
meno aos j nascidos (presente gerao) e ainda
aqueles que esto por nascer (futura gerao), cabendo
queles zelar para que esses tenham sua disposio, no
mnimo, os recursos naturais que hoje existem. Tal fato
encontra como arrimo a premissa que foi reconhecido ao
gnero humano o direito fundamental liberdade,
igualdade e ao gozo de condies de vida adequada, em
ambiente que permita desenvolver todas as suas
potencialidades em clima de dignidade e bem-estar.
Pode-se considerar como um direito transgeracional, ou
seja, ultrapassa as geraes, logo, vivel afirmar que o
meio-ambiente um direito pblico subjetivo. Desta
Legislao Estadual que, pertinente a exposies e a competies
entre aves das raas combatentes, favorece essa prtica criminosa -
Diploma Legislativo que estimula o cometimento de atos de
crueldade contra galos de briga - Crime Ambiental (Lei N 9.605/98,
ART. 32) - Meio Ambiente - Direito preservao de sua integridade
(CF, Art. 225) - Prerrogativa qualificada por seu carter de
metaindividualidade - Direito de terceira gerao (ou de novssima
dimenso) que consagra o postulado da solidariedade - Proteo
constitucional da fauna (CF, Art. 225, 1, VII) - Descaracterizao
da briga de galo como manifestao cultural - Reconhecimento da
inconstitucionalidade da Lei Estadual impugnada - Ao Direta
procedente. Legislao Estadual que autoriza a realizao de
exposies e competies entre aves das raas combatentes - Norma
que institucionaliza a prtica de crueldade contra a fauna Inconstitucionalidade. . rgo Julgador: Tribunal Pleno. Relator:
Ministro Celso de Mello. Julgado em 26 mai. 2011. Disponvel em:
. Acesso em 13 mar. 2015.
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feita, o iderio de que o meio ambiente substancializa
patrimnio pblico a ser imperiosamente assegurado e
protegido pelos organismos sociais e pelas instituies
estatais, qualificando verdadeiro encargo irrenuncivel
que se impe, objetivando sempre o benefcio das
presentes e das futuras geraes, incumbindo tanto ao
Poder Pblico quanto coletividade considerada em si
mesma.
Assim, decorrente de tal fato, produz efeito
erga omnes, sendo, portanto, oponvel contra a todos,
incluindo pessoa fsica/natural ou jurdica, de direito
pblico interno ou externo, ou mesmo de direito privado,
como tambm ente estatal, autarquia, fundao ou
sociedade de economia mista. Impera, tambm,
evidenciar que, como um direito difuso, no subiste a
possibilidade de quantificar quantas so as pessoas
atingidas, pois a poluio no afeta to s a populao
local, mas sim toda a humanidade, pois a coletividade
indeterminada. Nesta senda, o direito integridade do
meio ambiente substancializa verdadeira prerrogativa
jurdica de titularidade coletiva, ressoando a expresso
robusta de um poder deferido, no ao indivduo
identificado em sua singularidade, mas num sentido
mais amplo, atribudo prpria coletividade social.
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Com a nova sistemtica entabulada pela
redao do artigo 225 da Carta Maior, o meio-ambiente
passou a ter autonomia, tal seja no est vinculada a
leses perpetradas contra o ser humano para se
agasalhar das reprimendas a serem utilizadas em
relao ao ato perpetrado. Figura-se, ergo, como bem de
uso comum do povo o segundo pilar que d corpo aos
sustentculos do tema em tela. O axioma a ser
esmiuado, est atrelado o meio-ambiente como vetor da
sadia qualidade de vida, ou seja, manifesta-se na
salubridade, precipuamente, ao vincular a espcie
humana est se tratando do bem-estar e condies
mnimas de existncia. Igualmente, o sustentculo em
anlise se corporifica tambm na higidez, ao cumprir os
preceitos de ecologicamente equilibrado, salvaguardando
a vida em todas as suas formas (diversidade de espcies).
Por derradeiro, o quarto pilar a
corresponsabilidade, que impe ao Poder Pblico o dever
geral de se responsabilizar por todos os elementos que
integram o meio ambiente, assim como a condio
positiva de atuar em prol de resguardar. Igualmente,
tem a obrigao de atuar no sentido de zelar, defender e
preservar, asseverando que o meio-ambiente permanea
intacto. Alis, este ltimo se diferencia de conservar que
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permite a ao antrpica, viabilizando melhorias no meio
ambiente, trabalhando com as premissas de
desenvolvimento sustentvel, aliando progresso e
conservao. Por seu turno, o cidado tem o dever
negativo, que se apresenta ao no poluir nem agredir o
meio-ambiente com sua ao. Alm disso, em razo da
referida corresponsabilidade, so titulares do meio
ambiente os cidados da presente e da futura gerao.
3 MEIO AMBIENTE E PATRIMNIO CULTURAL:
ASPECTOS INTRODUTRIOS
Quadra salientar que o meio ambiente cultural
constitudo por bens culturais, cuja acepo
compreende aqueles que possuem valor histrico,
artstico, paisagstico, arqueolgico, espeleolgico,
fossilfero, turstico, cientfico, refletindo as
caractersticas de uma determinada sociedade. Ao lado
disso, quadra anotar que a cultura identifica as
sociedades humanas, sendo formada pela histria e
maciamente influenciada pela natureza, como
localizao geogrfica e clima. Com efeito, o meio
ambiente cultural decorre de uma intensa interao
entre homem e natureza, porquanto aquele constri o seu
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62
meio, e toda sua atividade e percepo so conformadas
pela sua cultural. A cultura brasileira o resultado
daquilo que era prprio das populaes tradicionais
indgenas e das transformaes trazidas pelos diversos
grupos colonizadores e escravos africanos45. Desta
maneira, a proteo do patrimnio cultural se revela
como instrumento robusto da sobrevivncia da prpria
sociedade.
Nesta toada, ao se analisar o meio ambiente
cultural, enquanto complexo macrossistema,
perceptvel que algo incorpreo, abstrato, fludo,
constitudo por bens culturais materiais e imateriais
portadores de referncia memria, ao e
identidade dos distintos grupos formadores da sociedade
brasileira. Meirelles anota que o conceito de patrimnio
histrico e artstico nacional abrange todos os bens
moveis e imveis, existentes no Pas, cuja conservao seja
de interesse pblico, por sua vinculao a fatos
memorveis da Histria ptria ou por seu excepcional
45 BROLLO, Slvia Regina Salau. Tutela Jurdica do meio
ambiente cultural: Proteo contra a exportao ilcita dos
bens culturais. 106f. Dissertao (M