compreensão das altas habilidades/superdotação com base na análise do comportamento

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    ALGUMAS CONTRIBUIES DA ANLISE DO COMPORTAMENTO NACOMPREENSO DAS ALTAS HABILIDADES/SUPERDOTAO

    MARCELO HENRIQUE OLIVEIRA HENKLAIN1ELIZA DIEKO OSHIRO TANAKA2(Universidade Estadual de Londrina)

    Introduo

    Os efeitos de um modelo produtivo que alimenta o binmio produo-consumo, assim como ocrescimento populacional desordenado, so dois fatores marcantes da vida moderna que tm,

    presumivelmente, produzido efeitos deletrios sobre o meio ambiente e as sociedades

    humanas, de tal sorte que comum o questionamento sobre o futuro da humanidade. Emoutras palavras, os desafios que a espcie ter de enfrentar so, desta forma, de grandemagnitude.

    Neste cenrio, autores como Skinner (1974) defendem que os principais problemasenfrentados hoje pelo mundo s podero ser resolvidos se melhorarmos nossa compreensodo comportamento humano (SKINNER, 1974, P. 8). Talvez como decorrncia deste

    pensamento, outros cientistas ponderam que, de posse deste necessrio conhecimento, preciso desenvolver meios de identificar e investir no potencial criador e solucionador deproblemas das parcelas mais talentosas da populao (VIRGOLIM, 2007).Existe, portanto, um entendimento que reconhece as vantagens (para a cultura) de viabilizar aatualizao das potencialidades dos mais capazes ou talentosos (ALENCAR & FLEITH,

    2001). Como suporte adicional elaborao de recursos especiais voltados para a educaodos talentosos encontra-se o avano, ao menos em termos de documentos oficiais, das

    polticas pblicas de incluso social (FREITAS & NEGRINI, 2008) que, dentre outrosaspectos mais amplos, especificam (dentro do ambiente escolar) a importncia da escolaelaborar estratgias que permitam, minimamente, o aprendizado e acesso de todos os alunos escrita e, por conseguinte, aos saberes clssicos produzidos pela cultura.Assim, o talento ou as altas habilidades/superdotao constituem um tema que est em pauta e

    possui grande relevncia social. Apesar disso, o progresso dos debates e da elaborao depolticas pblicas para esta parcela da populao ainda enfrenta muitos percalos, como o fatode que o tema [...] ainda pouco discutido em nossas universidades(VIRGOLIM, p. 10) eque, realmente, existe uma escassez de estudos no Brasil sobre esta temtica(ALMEIDA E

    CAPELLINI, 2005, p. 55).Igualmente, as dificuldades envolvidas na identificao desta populao so motivos para a

    preocupao dos profissionais e das autoridades governamentais. Na medida em que ocorremproblemas de identificao, muitos indivduos deixam de ser contemplados pelos programasgovernamentais de atendimento a pessoas com altas habilidades/superdotao que, alis,encontram-se num estgio ainda inicial de implementao (FREITAS E NEGRINI, 2008;METTRAU E REIS, 2007).

    1Graduando do quarto ano de psicologia. Endereo: Rua Benjamin Constant, n. 1974, Centro, Londrina - PR.

    Email: [email protected] do Departamento de Psicologia Social e Institucional. Endereo: Campus Universitrio, Cx. Postal6001, CEP 86051-990, Londrina - PR. Email: [email protected]

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    Possivelmente, esses percalos tambm so produtos dos mitos que envolvem a noo desenso comum sobre altas habilidades/superdotao (RECH E FREITAS, 2005; GUENTHER,2006). E, nesse sentido, a prpria mdia, muitas vezes, d uma idia estereotipada sobre asuperdotao, vista principalmente sob a tica da pessoa academicamente precoce e capaz defeitos maravilhosos(VIRGOLIM, p. 11).Com efeito, segundo Mettrau (1997), os mitos so diversos e bastante prejudiciais. Por vezes,diz-se que os superdotados so:

    [...] eficientes demais e de que nada precisam; ora so os que criticam demais; oraso os que s ficam lendo ou estudando; ora so os que sempre sabem tudo; ora soaqueles que incomodam com sua curiosidade excessiva; ora so aqueles que sabem

    bem alguma coisa, mas no sabem outras coisas; ora so aqueles de comportamentoesquisito ou que atrapalham na escola porque vo frente, etc. (METTRAU, 1997apudALMEIDA E CAPELLINI, 2005, p. 48).

    Aliado aos mitos est a falta de consenso dentro das academias no que diz respeito definiodo termo altas habilidades/superdotao, afinal nem os prprios pesquisadores chegaram aum consenso em relao terminologia mais apropriada para ser utilizada (RECH EFREITAS, 2005, p. 297), aos mtodos e formas mais apropriadas de interpretar os resultadosdas pesquisas na rea.Ao menos em parte, esta falta de consenso reflete na realidade o carter fragmentado doconhecimento psicolgico (Figueiredo, 1991), tanto quanto a complexidade inerente ao estudodo comportamento humano, fenmeno, nas palavras de Skinner (1953/1981), mutvel, fluidoe evanescente(p. 27).De fato, s para citar dois exemplos, qual o consenso que existe na definio de termos como

    inteligncia ou criatividade? Dois temas, alis, de grande valor no estudo das altashabilidades. Desta forma, o campo de estudos das altas habilidades/superdotao caracteriza-se como terreno cientfico rido e desafiador para todos os profissionais que lidamdiretamente com os indivduos identificados como superdotados.De acordo com Virgolim (2007):

    As pessoas com altas habilidades formam um grupo heterogneo, comcaractersticas diferentes e habilidades diversificadas; diferem uns dos outrostambm por seus interesses, estilos de aprendizagem, nveis de motivao e deautoconceito, caractersticas de personalidade e principalmente por suasnecessidades educacionais (VIRGOLIM, 2007, p. 11).

    Essa diversidade na rea impe grandes dificuldades para o cientista e, de certa forma, umdistanciamento maior entre os especialistas e o senso comum., portanto, reconhecendo esta diversidade terica, as dificuldades prprias do estudo docomportamento humano e, especialmente, das altas habilidades e os mitos que obscurecem oseu estudo, que o presente trabalho pretende, com bastante cautela, proceder a uma tentativade compreenso de alguns comportamentos envolvidos no padro comportamental das altashabilidades/superdotao. Ser realizada uma interpretao desses comportamentos a partirdos recursos tericos da Anlise do Comportamento (AC).Para tanto, ser feita uma breve definio do termo altas habilidades, seguida de umaexposio bsica de alguns conceitos importantes de AC para que, por fim, seja possveldestrinchar a interpretao (bsica) que pretendemos levar a cabo.Seguramente, um dos interesses nesta abordagem introdutria do fenmeno das altashabilidades sob o enfoque comportamental est relacionado com a insistente perpetuao de

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    certos equvocos conceituais relacionados AC, os quais a descrevem como uma escola depsicologia incapaz de explicar o comportamento humano complexo. Entendemos que estaalegao seja infundada e, possivelmente, decorrente (1) ou de uma m interpretao dasalegaes behavioristas radicais, ou (2) do entendimento de que a anlise do comportamentoaplicada ainda limita-se s tcnicas de modificao de comportamentos especficos, ou (3) deum desconhecimento da atualidade e utilidade dos princpios comportamentais para acompreenso do comportamento humano, ou ainda (4) da carncia de trabalhos conhecidosque apresentem anlises comportamentais das altas habilidades.

    Desenvolvimento da reflexo

    Mas, afinal, o que se pode dizer das altas habilidades? O que ser um superdotado? SegundoVirgolim (2007), o termo altas habilidades/superdotao tem significado diferente dos

    conceitos de precocidade(quando uma habilidade se desenvolve mais cedo que o esperadopara idade), prodgio (quando a criana apresenta habilidades extremas, raras, nicas e,portanto, acima da mdia mesmo quando comparada a pessoas mais velhas e que tambmdominam essas habilidades ou conhecimentos) e genialidade (termo que est associado importncia para a humanidade e a originalidade daquilo que uma pessoa produziu em vidaseja na cincia, na arte, na filosofia ou mesmo no esporte). Alm disso, para que algum sejaidentificado como superdotado no preciso que tenha sido uma criana precoce ou prodgio,tampouco que seja um gnio. Portanto:

    [...] os termos pessoa com altas habilidades e superdotado so mais apropriadospara designar aquela criana ou adolescente que demonstra sinais ou indicaes dehabilidade superior em alguma rea do conhecimento, quando comparado a seus

    pares. No h necessidade de ser uma habilidade excepcional (VIRGOLIM, 2007, p.27).

    Nesse sentido, [...] a superdotao pode se dar em diversas reas do conhecimento humano(intelectual, social, artstica etc.), num continuum de habilidades, em pessoas com diferentesgraus de talento, motivao e conhecimento (ALENCAR E FLEITH, 2001 apudVIRGOLIM, 2007, p. 28).

    No Brasil, a legislao reconhece como pessoa que apresenta altas habilidades/superdotaotodos aqueles que apresentam grande facilidade de aprendizagem que os leve a dominarrapidamente conceitos, procedimentos e atitudes (BRASIL, 2001, ART. 5, III apudVIRGOLIM, 2007, P. 28).De posse desses conceitos, embora sejam esparsas as referncias em AC a estudos sobre altashabilidades/superdotao, acredita-se que a utilizao dos princpios comportamentais possagerar contribuies efetivas para a compreenso do tema, como j demonstrado em outrasreas de pesquisa, tais como: depresso, ansiedade, transtorno obsessivo-compulsivo,assertividade, criatividade.A AC uma abordagem psicolgica orientada por uma filosofia da cincia, o behaviorismoradical, por um programa de pesquisas emprico-experimentais dos processos deaprendizagem, a anlise experimental do comportamento, e constituda tambm por umcampo de prestao de servios psicolgicos, a anlise comportamental aplicada(TOURINHO, 2006). Seu objeto de estudo o comportamento ou, mais especificamente,relaes entre classes de estmulos e classes de respostas, ambas definidas por suas funes. Ocomportamento visto como evento natural e no como produto de um agente iniciador (de

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    uma mente no fsica e interna), tampouco como expresso de processos psicolgicosinternos.Desta forma, conforme Carvalho Neto (2003), o comportamento estudado enquanto umainterao entre um organismo biologicamente constitudo e seu ambiente (pblico e privado,histrico e imediato, social e no-social) (p. 48), e pode ser analisado funcionalmente emtermos de eventos antecedentes, respostas do indivduo e eventos conseqentes.O que o indivduofazmodifica o mundo e estas mudanas, por sua vez, constituem parte doseventos que alteram a probabilidade futura de recorrncia dessefazer. Portanto, o homem nos altera o seu ambiente como tambm afetado por estas mudanas, o que sugere umarelao de dependnciaentre aes do organismo e o contexto no qual elas ocorrem. A estarelao d-se o nome de contingncia.Certas conseqncias so definidas como reforadoras por sua caracterstica de fortalecer ocomportamento que as produziu, tornando-o mais provvel no futuro. Outras conseqncias,

    contudo, tm o efeito oposto, e diz-se que enfraquecem o comportamento, de modo a reduzira sua probabilidade de ocorrncia futura: so as punies.Os contextos nos quais um comportamento reforado assumem valor de evento sinalizadorde conseqncias reforadoras e, por este motivo, tornam a ocorrncia desse comportamentomais provvel. O mesmo processo ocorre em contextos sob os quais um determinandocomportamento foi punido. Ou seja, o contexto assume a funo de evento sinalizador de

    punio, o que torna menos provvel a ocorrncia do comportamento previamente punidonesse contexto.Outra caracterstica da anlise comportamental refere-se defesa de que o comportamento ,necessariamente, um fenmeno multideterminadoe, desta forma, um evento previsvel apenasem termosprobabilsticos, isto , pode-se prever que, dada uma determinada histria e certas

    contingncias em vigor, a ocorrncia do comportamento ser mais ou menos provvel.De posse destes conceitos iniciais, cumpre esclarecer que a determinao do que o indivduofaz depender sempre do contexto no qual ele est inserido e, no limite, das conseqnciasque seu comportamento produziu no passado (isto , de como as alteraes geradas no mundo

    pelo indivduo o modificaram). Com efeito, o passado jamais pode ser desconsiderado pelocientista comportamental, afinal ele guarda as respostas a respeito de como umcomportamento foi aprendido e como pde se desenvolver ao longo da histria do indivduo.Dito de outra forma, o passado revela a histria de reforamento e/ou punio a que umdeterminado comportamento foi submetido, e assim explica como esse comportamento foiselecionado e fortalecido.Conseqentemente, ao analista do comportamento cabe a tarefa de recorrer histria

    comportamental da pessoa no sentido de conseguir compreender o seu padrocomportamental presente. Mas, a sua preocupao com a relao organismo-ambiente no

    pode parar no passado, e, nesse sentido, o psiclogo comportamental segue seu estudo docomportamento, agora, com uma anlise das contingncias em vigor (atuais). Vale lembrarainda que o comportamento determinado em trs nveis de variao e seleo: filogentico,ontogentico e cultural (SKINNER, 1953/1981).Deste ponto de vista, analisar o fenmeno das altas habilidades implica enxerg-lo enquanto

    padro comportamental complexoproduzido por contingncias filogenticas, ontogenticas eculturais, ou seja, como resultante de certas capacidades (possibilidades de que o indivduodispe a partir de sua dotao gentica) e de aprendizagem (produto de histria ontogentica ecultural de reforos e punies).Mais especificamente, a definio propriamente dita do que ou no superdotao ou altashabilidades, depende de valores sociais, pois so eles os responsveis por estabelecer as

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    diretrizes que serviro de base para a classificao de um comportamento como hbil, til,original, bom, adequado, especial, etc. A cultura, portanto, relaciona-se s variveisambientais responsveis pelo reconhecimento e promoo de certos comportamentos etambm pela reprovao e marginalizao de outros. Definies para termos comocriatividade e inteligncia, por exemplo, tornam-se sempre relativas a parmetros scio-histrico-culturais. Conforme Guenther (2006):

    Talento, como capacidade elevada, uma abstrao ancorada nos valores vigentesem cada momento, dentro de um referencial relacionado ao que a cultura valoriza eaprecia. A escala de valores da prpria sociedade, no seu contexto e momentohistrico, por enfatizar algumas caractersticas e ignorar outras, propiciadesenvolvimento de alguns tipos de talento e permite inibio de outros (p. 21).

    Deste modo, o que ser algum altamente habilidoso ou exmio numa atividade depende, em

    grande parte, do que culturalmente aceito como ser habilidoso e do valor socialmenteatribudo atividade na qual o sujeito manifesta habilidade. Claramente, concorre tambmpara esta definio social o carter de raridade da habilidade apresentada. Por conseguinte, sersuperdotado ou apresentar altas habilidades uma classificao que depende tambm decritrios estatsticos (comparativos, portanto), isto , de quanto o indivduo, num determinadocontexto e rea de destaque, se distancia da mdia da populao. Alm disso, como j foisugerido,poder serhabilidoso depende da interao entre as possibilidades especificadas nacarga gentica do organismo e, em ltima instncia, da sua histria de aprendizagens.

    Neste sentido, seria at possvel compreender que algum dissesse que o indivduo j nasceutalentoso (ou seja, possui uma dotao gentica diferenciada ou especial), mas apenas nosentido de que ele capaz de, pois os seus interesses ou, propriamente, a materializaode

    quaisquer interesses ou talentos s pode se efetivar na relao indivduo-ambiente. Com isso,fica evidente que esses interesses ou facilidades para aprender s se mantm na exata medidaem que comportamentos de estudar, de ler, de pesquisar, possam produzir, ao longo de umahistria, e ainda no presente, conseqncias reforadoras (ou seja, conseqncias que, seja emfuno de parmetros biolgicos ou intrnsecos ao indivduo ou sociais, possuem valormantenedor e fortalecedor do comportamento).Como decorrncia desta linha de raciocnio, segue-se que o indivduo que apresenta altashabilidades no , propriamente, um superdotado ou talentoso apenas no sentido de suascapacidades ou possibilidades biolgicas, mas tambm um indivduo cuja histria deaprendizagem responsvel pelo seu padro comportamental presente.Para finalizar este momento, cumpre advertir que diante destas consideraes, deve-se tomarcuidado com o uso de certos termos para referir-se aos indivduos com altas habilidades, poiseles podem sugerir um predomnio de variveis filogenticas, em detrimento de variveisontogenticas e culturais na determinao deste complexo padro comportamental.Essa supersimplificao da explicao do comportamento pode ajudar a encobrir as variveisambientais das quais o comportamento funo, o que apenas contribuiria uma vez mais parao atraso da pesquisa cientfica na rea, assim como para a manuteno de alguns mitos arespeito das altas habilidades como, por exemplo, o mito de que a superdotao seria um dom,algo com o qual a pessoa nasce e que, portanto, o aluno com altas habilidades/superdotaono precisa de apoio na escola, pois seria, supostamente, capaz de gerar, sozinho, ascondies ideais para a sua aprendizagem ou que, talvez, nem precise aprender nada, pois jnasceu sabendo (RECH E FREITAS, 2005).

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    indivduo e que, posteriormente, sejam as conseqncias naturais as responsveis pelamanuteno e fortalecimento do seu comportamento.Desta forma, espera-se, por exemplo, que um aluno de redao precise, inicialmente, desuperviso por parte da professora (muito bem, gostei do que voc fez, isso mesmo,

    voc est melhorando, como voc poderia escrever isso de forma a ficar mais claro o seuponto de vista?), mas que, uma vez modelado o seu comportamento de redigir, ele mesmo

    consiga estar sensvel aos bons (e maus) resultados da sua redao e que, portanto, o prpriotexto (como conseqncia do seu comportamento de escrever) possa se transformar emcontrole desse comportamento.Mais uma vez, h que se considerar tambm que a prpria definio de habilidade depende,ao menos em parte, de parmetros sociais, que levam em considerao: o desempenho de umadeterminada atividade ou tarefa e o sucesso e/ou a especificidade com que o indivduodesempenha esta tarefa. A habilidade, como se disse, desenvolvida por meio de uma histria

    de reforamento dos comportamentos que esto mais prximos do parmetro de sucessosocialmente definido, e de extino ou punio dos comportamentos que se afastam destecritrio. O comportamento habilidoso, portanto, est relacionado s noes de adequabilidade,

    percia e destreza.Assim, bvio que muitas pessoas aprendem a nadar, mas dificilmente um nadador amadorconsegue ser to exmio nesta atividade quanto um profissional no que diz respeito a

    parmetros como velocidade e uso adequado (que no traga danos fsicos) dos msculos,tanto quanto ser hbil no uso de regras de etiqueta depender de uma histria de modelagemde comportamentos que esto de acordo com estas regras.

    No caso do estudo das altas habilidades, contudo, possvel que se faa referncia aocomportamento habilidoso como um comportamento inteligente ou de soluo de problemas

    (o qual, em AC, pode ser visto tambm como um comportamento criativo), como parece ser ocaso na definio de Renzulli de habilidades gerais e especficas (RENZULLI, 1986 apudVIRGOLIM, 2007). Este comportamento estudado em AC por meio do modelo derecombinao de repertrios, o qual demonstra a importncia da histria comportamental paraa aprendizagem de diferentes repertrios, e de um contexto especfico na produo de umainterconexo entre repertrios distintos que, juntos, podero solucionar um problema que seapresenta diante do sujeito (DELAGE E CARVALHO NETO, 2006).Dentre todos, o comportamento criativo, certamente, o mais desafiador dos trs repertrioscolocados sob anlise. Em AC ele pode ser compreendido pelo modelo de variabilidade(HUNZIKER, 2006). De modo geral, a interpretao mais corrente deste fenmeno postulaque todo o comportamento varia. Comportamento e ambiente nunca so os mesmos, esto em

    constante mudana (BARBOSA, 2003). Muitas vezes, as variaes do comportamento sosempre reforadas de uma mesma forma, todavia, h casos em que a variao pode resultarem conseqncias distintas que, em funo dos seus efeitos, por exemplo, originalidade eutilidade (ambos segundo parmetros sociais), podem ser reforadas diferencialmente, echamadas de criativas.

    Nesse sentido, a variao vista como um processo natural e prprio do comportamento,constituindo-se, inclusive, no substrato sobre o qual a seleo ambiental ir operar. Semvariao, como o caso para a Teoria Evolucionria de Darwin, no h seleo. Acriatividade, neste contexto, seria o resultado de uma variao cujos efeitos para umadeterminada comunidade (grupo social) atendem a critrios como utilidade, originalidade,

    beleza, entre tantos outros possveis.Interessante notar que alguns pesquisadores em AC pensavam que a variabilidade seriaapenas um resultado incidental de contingncias de reforamento intermitente ou da extino.

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    Atualmente, contudo, autores como Hunziker (2006) explicam que a variabilidade pode serdiretamente produzida por contingncias que reforcem, especificamente, a variao. Estadescoberta abre um campo de investigao que poder resultar na elaborao de estratgias dedesenvolvimento de ambientes promotores do comportamento inovador (criativo) e nacompreenso do fenmeno da criatividade.Ao considerar essas reflexes, conclui-se que um repertrio que integre um comportamentohabilidoso na realizao de uma atividade, bem como a inovao e o comprometimento, emtese, contribui para a formao de uma padro comportamental cujos efeitos (numdeterminado contexto, segundo determinados critrios sociais e numa determinada atividade)so superiores queles produzidos pela maioria da populao. Presumivelmente, esse padrocomportamental ao se distanciar da mdia de desempenhos da maioria da populao,inevitavelmente, causa o espanto e muitos mitos sobre a sua origem/existncia, tal comoocorre com as altas habilidades/superdotao.

    Alis, no que diz respeito a estar acima da mdia em alguma rea, sabe-se que justamentequando a pessoa foge aos padres de normalidade estabelecidos socialmente que algunsproblemas ou dificuldades podem aparecer. Sobretudo, no ambiente escolar, muitas crianasque apresentam altas habilidades costumam ter dificuldades de relacionamento interpessoal,

    pois os seus interesses e a sua forma de se comportar so, por vezes, to diferentes que elasacabam sendo excludas pelos demais colegas da sala de aula, ou ento, elas mesmas

    provocam a sua excluso, seja por exigirem demais dos colegas ou por no gostarem dacompanhia deles em funo, por exemplo, da disparidade entre interesses ou forma de pensar.Outro tipo de problema enfrentado na escola diz respeito relao entre o aluno que apresentaaltas habilidades/superdotao e o seu professor, que, algumas vezes, pode se sentir desafiado

    pela inteligncia da criana ou incomodado com a freqncia e dificuldade de suas perguntas

    ou com o fato de ela terminar rapidamente as atividades propostas. Nesses casos, faz-senecessrio, como primeiro passo, esclarecer para o professor como seria possvel lidarapropriadamente com estas crianas (avaliar e validar os seus interesses, ensin-las a

    pesquisar e aprender sozinhas, aproveitar os seus interesses para, caso elas acheminteressante, ajudar os demais colegas, etc.).Faz-se necessrio atentar ainda, como o faz a legislao brasileira, que o fenmeno das altashabilidades/superdotao tambm se caracteriza por uma aprendizagem rpida e eficiente, oque pode ser explicado a partir das capacidades neurobiolgicas do indivduo, bem como a

    partir de sua histria de sucessos, por exemplo, nos estudos (o que envolve mtodos de estudoe os efeitos de estudar na vida do indivduo, ou seja, a instalao e manuteno de umcomportamento de estudo depende das conseqncias que ele produz).

    luz do que foi discutido, preciso lembrar que o desenvolvimento de um determinadocomportamento habilidoso (e o comprometimento e originalidade na sua realizao), nosignifica desenvolvimento de habilidade, comprometimento e inovao para toda e qualqueratividade. importante considerar este fato, pois o indivduo que apresenta altashabilidades/superdotao no aquele que se destaca em tudo, nem mesmo dentro da escola.Pode ser que, por exemplo, na escola apresente dificuldades em algumas matrias, ao passoque brilhante em outras ou apenas em uma matria.Desta forma, preciso deixar de lado este mito de que altas habilidades/superdotaoimplicam em perfeio e/ou destreza em tudo o que a pessoa faz. Por outro lado, igualmenteimportante o abandono da idia de que as altas habilidades/superdotao, assim como acriatividade, so fenmenos raros (para poucos). Como foi visto, desenvolver comportamentohabilidoso e inovador depende (alm da gentica) da histria ambiental do indivduo.

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    Para finalizar, cumpre alertar que preciso abandonar o mito de que este indivduo podesempre aprender sozinho e que nada precisa ser feito por ele porque ele temaltas habilidades.Isso no verdade, uma vez que suas habilidades, interesses e criatividade dependero de suahistria ambiental. Portanto, cabe famlia, ao estado e a escola o arranjo de contingnciasque permitam que as crianas possam desenvolver ao mximo os seus potenciais.

    Concluso

    Sabe-se que a AC vista como uma abordagem em psicologia que busca controlar as pessoase que seria avessa liberdade humana. Todavia, essa noo no passa de equvoco, pois umdos objetivos da AC , justamente, compreender o comportamento humano por meio daidentificao de suas fontes de controle, para que ento seja possvel arranjar, de forma

    planejada, as contingncias que governaro os nossos comportamentos, o que poder permitir

    a promoo de padres de comportamento benficos para a cultura e o bem-estar humano.A partir dos conhecimentos produzidos pela cincia do comportamento (AC), seria possvel,por exemplo, planejar (e/ou tornar mais eficazes) ambientes educacionais adaptados snecessidades de alunos que apresentem altas habilidades/superdotao, assim como seria

    possvel elaborar estratgias de ensino de comportamentos altamente produtivos e criativos.

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