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Consumo de álcool na gravidez. Uma perspectiva
ética.
Miguel RicouUnidade de Ética e Psicologia do
Serviço de Bioética e Ética Médica daFaculdade de Medicina da Universidade do Porto
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PESSOA E AUTONOMIA
• A pessoa é livre, pelo que a sua autonomia deve ser respeitada
•O consentimento informado é então um pressuposto fundamental da relação clínica
"uma intervenção no campo da saúde só deverá ser efectuada após a pessoa o permitir, dando para tal o
seu consentimento livre e informado” (CPHRDHB,1996)
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PESSOA E AUTONOMIA
• O tratamento compulsivo não se aplica à pessoa dependente, e muito menos à mulher grávida que mantém consumos de álcool
•todo o papel dos profissionais de saúde deve centrar-se na prevenção, através da informação e da confrontação dos comportamentos da pessoa em relação às suas consequências
•a pessoa é livre, mas só poderá de facto sê-lo se dispuser de todos os conhecimentos necessários para uma decisão consciente e informada
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COMUNICAÇÃO E INFORMAÇÃO
• A educação para a saúde constitui, nos dias de hoje, um veículo primordial na intervenção ao nível dos cuidados de saúde
•a autoridade racional-legal
•comunicar é muito diferente de informar
•o profissional, sob pena de não corresponder às necessidades da pessoa, fica sujeito à obrigação de possuir competências que lhe permitam ajudar o doente na sua procura de informação indispensável ao exercício da sua autonomia
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COMUNICAÇÃO E INFORMAÇÃO
• a percepção da vulnerabilidade pessoal constitui um iniciador importante dos comportamentos preventivos, pelo que será fundamental aumentar a consciência individual de cada um sobre os riscos para a saúde associados a determinados comportamentos
•Cada um de nós funciona através de um conjunto de crenças racionais e irracionais
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COMUNICAÇÃO E INFORMAÇÃO
• As novas informações referentes aos riscos de determinado comportamento tendem, pois, a ser simplificadas através da sua comparação com ideias mais familiares. Desta forma, mesmo quando a informação é adequada, os riscos percebidos poderão ser desvalorizados por estas crenças irracionais
•a confrontação do indivíduo poderá ser um processo de contrariar esta minimização dos riscos, promovendo a adopção de comportamentos mais adequados
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COMUNICAÇÃO E INFORMAÇÃO
•O consumo de álcool está muitas vezes associado a falsos conceitos sobre as suas propriedades, o que poderá levar à adopção, como que inconsciente, de comportamentos nocivos
•o envolvimento da família é importante
•ainda que a disponibilidade do profissional seja reduzida, avaliando o problema de uma forma global, teremos que questionar se não ficará mais dispendioso tratar as consequências dos comportamentos irresponsáveis
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INVESTIGAÇÃO/ACÇÃO•Esse projecto visou, na sua essência, avaliar a importância da influência dos profissionais de saúde, sobretudo o médico de família, no controlo de comportamentos de consumo de álcool, considerando que se torna fundamental a prevenção a este nível com vista ao futuro da criança em gestação.
•Ricou, M; Salgado, J; Alves, C; Duarte, I; Teixeira, Z; Barrias, J; Nunes, R.
•Apoio Fundação GlaxoSmithKline para as Ciências da Saúde
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PROCESSO DE AVALIAÇÃO
•Contacto com o director do centro de saúde
•Abordagem aos médicos de família
•Obtenção do consentimento junto da mulher grávida: 1) confidencialidade dos resultados da entrevista; 2) objectivos do estudo em causa; 3) metodologia do estudo, 4) possíveis implicações do estudo, e 5) estrutura da entrevista
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PROCESSO DE AVALIAÇÃO
•O estudo mereceu a aprovação, no plano ético, da Direcção do Serviço de Bioética e Ética Médica da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto
•foi também chamada a atenção para a necessidade da máxima sinceridade nas respostas, assegurando, mais uma vez, à pessoa, que estes não teriam nenhum tipo de implicações
•foi assegurado que os resultados do estudo estariam, no futuro, disponíveis no respectivo Centro de Saúde
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METODOLOGIA
•A amostra foi recolhida em vários centro de saúde do norte do país, por licenciados em psicologia recrutados para o efeito, que receberam o mesmo tipo de formação
•Evitar variáveis parasita e constrangimentos nas respostas
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METODOLOGIA
•No sentido de categorizar as respostas a fim de possibilitar uma análise mais coerente dos resultados consideraram-se as seguintes classificações:
•o consumo excessivo foi considerado a partir das 30 gramas de álcool puro por dia
•sobre o tipo de efeitos, positivos ou negativos, do álcool na gravidez, os efeitos positivos foram considerados como “percepção incorrecta” e os efeitos negativos como “percepção correcta”
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METODOLOGIA
•sobre a especificidade dos efeitos, consideraram-se duas categorias: “percepção correcta dos efeitos” e “percepção incorrecta dos efeitos”. Dentro da primeira, considerámos: “prejudica o feto”, “deficiência”, “aborto”, “atraso no desenvolvimento”, “alterações no sistema nervoso”, “prejudica o sistema circulatório”, “causa problemas”, “dificuldades de aprendizagem”, “dependência na criança”, “síndroma alcoólica fetal” e “colesterol no bebé”.
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METODOLOGIA
•No que diz respeito à fonte de informação, consideraram-se as respostas “não se lembra” como não havendo fonte de informação identificada. À resposta “outros” correspondem os familiares ou amigos como fontes de informação
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RESULTADOS
•A amostra foi constituída por 295 mulheres grávidas
•A média de idades é de cerca de 28 anos
•10,5% das mulheres da amostra têm entre 16 e 20 anos
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RESULTADOS
Gráfico 4. Classe Social
3,70%9,80%
49,20%
2%
35,30%
0%
10%
20%
30%
40%
50%
Classe alta Classe média-alta Classe média Classe média-baixa Classe baixa
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RESULTADOS
Gráfico 5 - Meses de gravidez
1
5,4
12,5
16,6
13,9 13,2
10,211,2
15,9
0
5
10
15
20
1 2 3 4 5 6 7 8 9Meses de gravidez
Perc
enta
gem
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RESULTADOS
• cerca de 58% das participantes consomem habitualmente bebidas alcoólicas
• cerca de 20% das mulheres mantém o consumo de álcool durante a gravidez
• Verifica-se uma associação estatisticamente significativa entre o consumo de álcool anterior à gravidez e durante a mesma (Qui-Quadrado=47,446, p<0,001)
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RESULTADOS
Gráfico 7 - Manutenção do consumo de álcool no grupo de mulheres que consumiam antes
da gravidez
33,1
66,9
0
20
40
60
80
Sim Não
Per
cent
agem
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RESULTADOS
Gráfico 8 - Tipo de consumo de álcool antes da gravidez em função do consumo ou abstinência
durante a gravidez
63,6
14,9
36,4
77,6
0
20
40
60
80
Sim Não
Antes da gravidez mantinha consumos excessivos?
Perc
enta
gem Consome bebidas
alcoólicas durantea gravidez
Não consomebebidas alcoólicasdurante agravidez
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RESULTADOS
• a gravidez está associada a uma moderação do consumo (Qui-Quadrado=19,558, p<0,001)
• com a gravidez há uma diminuição significativa no consumo de álcool, mas as mulheres com consumos prévios excessivos apresentam maior dificuldade em moderar ou abster-se do consumo (Qui-Quadrado=1,636, p=0.201)
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RESULTADOS
Gráfico 12 - Percepção geral sobre os efeitos do álcool na gravidez
92,5
6,1 1,40
20
40
60
80
100
Adequada Inadequada Não responde
Per
cent
agem
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RESULTADOS
Gráfico 9 - Fontes de informação indicadas
38,3
44,7
13,2
49,2
3,4
05
101520253035404550
Per
cent
agem
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RESULTADOS
Gráfico 13 - Principais fontes de informação em função da
adequação dessa mesma informação
100 10092,9 90
73,9
0 07,1 10
26,1
0
20
40
60
80
100
120
Onde obteve essa informação?
Perc
enta
gem
Percepçãoadequada
Percepçãoinadequada
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RESULTADOS
Gráfico 14 - Percepção sobre os efeitos específicos do álcool na gravidez
73,2
26,8
0
20
40
60
80
Específicos Inespecíf icos
Tipo de percepção sobre os efeitos
Per
cent
agem
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RESULTADOS
Gráfico 15 - Principais fontes de informação em função do conhecimento dos efeitos específicos do álcool na gravidez
82,4 82,171,7
4030,4
17,6 17,928,3
6069,6
0
20
40
60
80
100
Onde obteve essa informação?
Per
cent
agem
Percepçãoadequada dosefeitos específicosPercepçãodesadequada dosefeitos específicos
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RESULTADOS
Gráfico 16 - Fonte de informação em função do consumo de bebidas alcoólicas durante a gravidez
17,625
0
21,730,4
82,475
100
78,369,6
0
20
40
60
80
100
Onde obteve essa informação?
Per
cent
agem
Consome álcooldurante agravidez
Não consomeálcool durante agravidez
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RESULTADOS
Gráfico 17 - Percepção geral correcta ou incorrecta sobre os efeitos do álcool em função
do consumo de bebidas alcoólicas durante a gravidez
16,8
83,2
54,545,5
0
20
40
60
80
100
Sim Não
Consumo de álcool durante a gravidez
Perc
enta
gem Percepção correcta
sobre os efeitos doálcool na gravidez
Percepção incorrectasobre os efeitos doálcool na gravidez
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RESULTADOS
• Enquanto nos quadros anteriores encontrámos associações, no que diz respeito à relação entre a fonte de informação indicada pelos sujeitos da amostra e o consumo de álcool durante a gravidez, verificámos que as variáveis são independentes (Qui-quadrado=2,890, p=0,576)
• Podemos, no entanto, afirmar que existirá uma associação moderada entre a percepção de que o álcool é negativo para a gravidez e a abstinência ao seu consumo (V de Cramer=0,249, p<0,001)
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RESULTADOS
Gráfico 18 - Conhecimento dos efeitos negativos do álcool em função do consumo de bebidas
alcoólicas durante a gravidez
17,1
82,9
26,6
73,4
0
20
40
60
80
100
Sim NãoConsumo de álcool durante a
gravidez
Per
cent
agem
Conhece os efeitosnegativos do álcool nagravidez
Não conhece os efeitosnegativos do álcool nagravidez
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RESULTADOS
• Curiosamente, no que diz respeito à relação entre o conhecimento dos efeitos específicos do álcool na gravidez e o consumo durante a mesma, esta não se apresenta, ainda que esteja próxima, como estatisticamente significativa (Qui-quadrado=3,272, p=0,070)
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RESULTADOS
• No que concerne ao consumo de álcool por parte dos familiares, verificamos que 77,3% das mulheres têm pelo menos um familiar com padrões de consumo excessivo de álcool
• 48,8% tem um pai que bebe excessivamente • 41,4% casou-se com uma pessoa com os mesmos padrões
de consumo • 8,5% tem uma mãe que bebe em demasia• 31,5% tem um irmão consumidor excessivo• 9,5% tem um outro familiar, com quem habita, com
consumo excessivo
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RESULTADOS
(Qui-quadrado=7,286, p<0,05)
Gráfico 29 - Classe social em função do consumo de bebidas alcoólicas durante a
gravidez
10 16,6 27,3
90 83,4 72,7
020406080
100
Classe social
Perc
enta
gem Consome álcool
durante agravidez
Não consomeálcool durante agravidez
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
• o simples conhecimento da realidade não será suficiente para a alteração dos comportamentos, pelo que se deduz não bastar saber que o álcool pode ter efeitos nocivos durante a gravidez
• Mais importante, será discutir com a pessoa sobre os seus próprios hábitos e sobre as suas dificuldades em alterá-los, de forma a promover as mudanças de atitude. No fundo, compreendê-la, aceitá-la e ajudá-la.
• A inexistência de um profissional que consiga cumprir com este papel, seguramente por dificuldades relacionadas com os recursos disponíveis, poderá estar na base desta realidade que se assume como assustadora
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DISCUSSÃO DOS RESULTADOS
• Os padrões de consumo familiares encontrados chamam ainda mais a atenção para a gravidade do problema
• a existência de uma associação entre a bebida e o consumo de tabaco e de café, vem ainda complicar mais este quadro
• nos casos onde um padrão de abuso seja uma realidade, e em que a pessoa se disponha a querer deixar de consumir determinada substância, uma intervenção específica que vise auxiliar a pessoa a caminhar em direcção à abstinência, é prioritária no trabalho com mulheres grávidas