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4º Simpósio Internacional de Pesquisa em Educação Matemática
29, 30 de junho e 01 de julho de 2015
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In: Anais do Simpósio Internacional de Pesquisa em Educação Matemática, 4º, 2015, Ilhéus, Anais..., Ilhéus, Bahia, Brasil. p.2657-2668. ISSN 2446-6336.
CONTRIBUIÇÕES DE PROFESSORES FORMADORES SOBRE O
CONHECIMENTO PROFISSIONAL DOCENTE EM ÁLGEBRA
Karina Aguiar Alves1
Universidade Federal do ABC
Marieli Vanessa Rediske de Almeida2
Universidade Federal do ABC
Thais Helena Inglêz Silva3
Universidade Federal do ABC
Evonir Albrecht4
Universidade Federal do ABC
RESUMO
Este trabalho apresenta resultados de pesquisa desenvolvida no âmbito do projeto “Conhecimento Matemático para o Ensino de Álgebra: uma abordagem baseada em perfis conceituais”, vinculado ao Programa Observatório da Educação (OBEDUC) e tem por objetivo apresentar uma investigação sobre os conhecimentos docentes que formadores de professores mobilizam ao falar sobre Álgebra durante uma entrevista semiestruturada. Para tanto, apresenta-se, inicialmente, as ideias de Lee Shulman, sobre os Conhecimentos Profissionais Docentes, as quais irão subsidiar a análise de três questões provenientes de entrevistas realizadas com quatro professores do Ensino Superior. Para nossas análises, tomamos por base as categorias Conhecimento Específico do Conteúdo e Conhecimento Curricular, ambas propostas neste referencial. Foi possível perceber, na fala dos professores, críticas ao atual sistema de ensino, à profundidade do currículo e ao tecnicismo presente no Ensino de Álgebra. Quanto ao Conhecimento Específico de Álgebra, percebemos que a delimitação desta área não é claramente explicitada e que, apesar de na Educação Básica os professores declararem a Álgebra e a Geometria como áreas bem distintas - ainda que uma possa ser usada como instrumento para a outra - não conseguem construir a mesma diferenciação para o Ensino Superior. As reflexões advindas dessas análises fomentam a necessidade de se repensar a formação docente, de forma a contribuir para um aperfeiçoamento profissional que ofereça aos futuros professores possibilidades de construir relações entre o conteúdo e sua
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prática pedagógica, no que se refere aos processos de ensino e de aprendizagem de Álgebra. Palavras chave: Conhecimento Profissional Docente. Ensino de Álgebra. Formação de Professores.
INTRODUÇÃO
A proposta desenvolvida neste trabalho situa-se dentro dos objetivos de
pesquisa almejados pelo projeto “Conhecimento Matemático para o Ensino de
Álgebra: uma abordagem baseada em perfis conceituais”. Este projeto está
vinculado ao Programa Observatório da Educação (OBEDUC), sob coordenação do
Professor Dr. Alessandro Jacques Ribeiro e é subsidiado pela Coordenação de
Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES - edital 049/2012). O
referido projeto tem como objetivo investigar os conhecimentos mobilizados por
professores ao ensinar Álgebra na Educação Básica, utilizando-se para isso, de uma
abordagem baseada em perfis conceituais (MORTIMER, 2000). Como etapa
constante ao desenvolvimento do projeto e uma necessidade advinda dos estudos
bibliográficos, emergiu de nossas reflexões a necessidade de compreender a
concepção de Álgebra que professores formadores de professores possuem. Com
esta finalidade, desenvolvemos um roteiro com nove questões que versam sobre
diferentes temas relacionados à prática docente.
Inicialmente o grupo de pesquisa empreendeu estudos em duas grandes
temáticas, a saber: concepções de Álgebra relacionadas ao Ensino e Conhecimento
Profissional Docente. Este trabalho baseia-se na segunda temática, onde elegemos
os trabalhos de Shulman (1986,1987) para subsidiarem a construção do roteiro que
fora utilizado para guiar as entrevistas realizadas com os professores. Trazemos
aqui a análise das respostas a três perguntas das entrevistas, pautadas no
referencial teórico adotado.
No que tange as concepções de Álgebra, as análises das respostas que
abarcam essa perspectiva foram apresentadas no XII EPEM - Encontro Paulista de
Educação Matemática – realizado em maio de 2014, em Birigui-SP (SILVA; SOUZA;
SILVA; RIBEIRO; 2014). Ademais, optou-se pela divisão e análise das questões em
dois trabalhos, um voltado para o Conhecimento Pedagógico do Conteúdo e o outro,
Alves; Almeida; Silva; Albrecht
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para o Conhecimento Específico do Conteúdo e Conhecimento do Conteúdo e o
Currículo. É neste último âmbito que este trabalho figura.
Neste artigo trazemos nossa discussão das principais ideias contidas no
artigo de Shulman de 1986 que contribuíram para a formulação e interpretação dos
resultados apresentados. A escolha por esse referencial deve-se, em grande parte,
por seu pioneirismo ao considerar o Conhecimento Pedagógico indissociável do
Conhecimento sobre o Conteúdo, e ao identificar o papel decisivo da Universidade
na segmentação destas duas áreas de conhecimento. Conforme Shulman (1986):
Em Ramus, Method and the Decay od Dialogue, o padre Walter Ong (1958) apresenta uma consideração sobre o ensino na universidade medieval no capítulo intitulado “The pedagogical Juggernaut”. Ele descreve um mundo de ensino e aprendizagem naquelas universidades, onde ao invés de separar o conteúdo da pedagogia (o que é conhecer de como ensinar), não há distinção alguma entre eles. Conteúdo e pedagogia são partes de um corpo indistinguível de compreensões. (SHULMAN, 1986, p. 6)
O presente trabalho objetiva explicitar alguns aspectos presentes na fala dos
professores entrevistados, para assim, construirmos sua relação com os referenciais
adotados. As traduções utilizadas foram realizadas pelos autores deste artigo, a fim
de facilitar a compreensão e uniformizar as nomenclaturas das categorias
apresentadas por Shulman em seus trabalhos.
REFERENCIAL TEÓRICO
Apresentamos a seguir uma revisão dos trabalhos de Lee Shulman estudados
por nosso grupo. As ideias deste autor sobre o Conhecimento do Conteúdo,
apresentadas nos artigos de 1986 e 1987, tem sido estudadas nas mais diversas
áreas e entre as maiores contribuições do autor está a compreensão do
conhecimento do conteúdo como conhecimento-chave para a profissão docente.
Shulman (1986) buscou inicialmente traçar um panorama a respeito dos
testes que os professores necessitavam realizar para trabalhar como docentes nos
Estados Unidos, durante o século XIX. Para o autor, a preocupação com o conteúdo
era muito grande, conforme constatou em suas investigações: “Noventa a noventa e
cinco por cento dos testes são sobre conteúdo, o assunto a ser ensinado, ou o
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conhecimento básico necessário que o professor deveria possuir para ensinar”.
(SHULMAN, 1986, p. 5). Segundo ele, já nos anos 1980, a capacidade de ensinar
passou a ter maior destaque no momento da contratação dos professores, em
detrimento dos conhecimentos referentes aos conteúdos. Isso se deve, segundo
Shulman, à valorização, por parte dos formuladores de políticas públicas, de
aspectos comportamentais dos professores que contribuíssem para que os alunos
obtivessem melhor desempenho acadêmico, valorização esta justificada pela grande
quantidade de pesquisas sobre o tema. Entretanto, Shulman destaca que a
valorização dos comportamentos do professor nas pesquisas realizadas terminou
por ignorar um aspecto central: o conteúdo.
Tal falta de foco no conteúdo foi denominada por Shulman e seus colegas de
problema do “paradigma perdido”. Trata-se da ausência de investigações sobre
como os professores aprendem aquilo que precisam ensinar, de onde vem o seu
conhecimento, os exemplos, as explicações. Shulman aponta, desta forma, que as
pesquisas da área não contemplavam estas questões e assim, os principais
questionamentos não eram formulados, causando o que ele denominou “ponto cego”
nas pesquisas em Ensino.
A partir destas constatações, Shulman propõe, ainda no artigo de 1986, que o
conhecimento do conteúdo de ensino possa ser dividido em três categorias distintas:
(a) Content Knowledge ou Conhecimento Específico do Conteúdo, (b) Pedagogical
Content Knowledge ou Conhecimento Pedagógico do Conteúdo e (c) Curricular
Knowledge ou Conhecimento Curricular.
O Conhecimento Específico do Conteúdo refere-se à “quantidade e
organização do conhecimento na mente do professor” (SHULMAN, 1986, p. 9). Além
de saber como algo acontece, o professor deve saber por que acontece de tal forma,
como garantir que aconteça, quando a crença nessa justificativa pode ser
estremecida ou negada e, além disso, espera-se que o professor tenha capacidade
de distinguir entre conteúdos centrais e conteúdos periféricos a serem trabalhados.
O Conhecimento Pedagógico do Conteúdo trata daqueles aspectos do
conteúdo mais pertinentes ao seu Ensino. A fim de exemplificar tal conceito,
Shulman (1986) cita nesta categoria, o conhecimento de temas que são ensinados
com maior frequência em cada área, as melhores formas de representação de
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ideias, melhores analogias, exemplos, explicações, como tornar o assunto mais
compreensível para os alunos.
Na categoria Conhecimento Curricular estão os conhecimentos do professor a
respeito do currículo. Para Shulman (1986) o currículo é uma gama de programas
concebidos com vistas ao ensino de tópicos específicos, em níveis específicos, e
inclui o conhecimento sobre a utilização de materiais didáticos em situações
específicas. O conhecimento curricular conta ainda com dois outros aspectos: o
conhecimento horizontal do currículo, que inclui a capacidade de trabalho
interdisciplinar; e o conhecimento vertical do currículo, que abrange os conteúdos
estudados nos anos anteriores e posteriores na disciplina ministrada pelo professor.
Em seu artigo de 1987, Shulman continua enfatizando os conhecimentos
docentes, especificamente o que ele denominou Knowledge Base of Teaching ou
Repertório de Conhecimentos para o Ensino e aponta que poucos estudos
especificavam o caráter deste conhecimento. O autor apresenta, no referido
trabalho, um argumento que busca responder questões referentes às bases para a
profissionalização do Ensino.
Shulman (1987) destaca dois de seus projetos principais, um que buscava
entender como jovens professores aprendem a ensinar, retomando algumas
discussões já realizadas no artigo de 1986, no qual teve oportunidade de
acompanhar a evolução dos participantes, de alunos a professores, e que destacou
um complexo corpo de conhecimentos e habilidades necessários à função de
ensinar. Paralelamente a este trabalho, em 1987, o autor desenvolveu um outro
estudo com professores veteranos, a fim de comparar os resultados. Para ele, tais
estudos mostraram que o conhecimento e habilidades demonstrados
ocasionalmente pelos professores mais jovens podem ser observados mais
naturalmente naqueles professores mais experientes, porém, a pergunta que
persistiu foi “o que os professores sabem (ou não) que os permite ensinar de forma
particular?”. Para Shulman, observar professores experientes ensinando a partir dos
mesmos materiais que causam dificuldade aos professores mais jovens,
proporcionou clareza quanto aos tipos de conhecimentos e habilidades necessários
para ensinar. Da mesma forma, o foco no ensino de tópicos particulares possibilitou
aprender tipos particulares de Conhecimento do Conteúdo e estratégias
pedagógicas que interagem na mente dos professores.
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Shulman (1987) nos diz que se o conhecimento dos professores pudesse ser
organizado em um livro ou em uma enciclopédia, certamente incluiria as seguintes
categorias: Conhecimento do Conteúdo, Conhecimento Pedagógico Geral,
Conhecimento Curricular, Conhecimento Pedagógico do Conteúdo, Conhecimento
sobre os Estudantes, Conhecimento de Contextos Educacionais e Conhecimento de
Objetivos Educacionais.
Ressaltamos que nosso trabalho analisa respostas de uma entrevista,
elaborada como uma atividade inicial de coleta de dados, de nossas investigações.
Sendo assim, visto que optamos por realizar entrevistas mais diretas e sucintas,
decidimos adotar, na análise do Conhecimento Profissional Docente dos
entrevistados, o artigo de Shulman de 1986, no qual acreditamos que as categorias
do artigo de 1987 já estejam, ainda que indiretamente, incluídas.
METODOLOGIA
Como apresentado, este trabalho é um subproduto de investigações
realizadas em um projeto de pesquisa maior, que tem por objetivo investigar o
conhecimento matemático para o Ensino de Álgebra. No primeiro ano de
investigações, o grupo de pesquisa debruçou-se sobre duas frentes de trabalho,
prioritariamente: a concepção de Álgebra adotada pelo grupo, fundamentada na
literatura, e os conhecimentos docentes envolvidos no Ensino de Álgebra, tomando-
se por base as categorias apresentadas no trabalho de Shulman (1986). Para o
estudo destes dois focos de interesse, além dos referenciais teóricos, buscou-se
apreender, da experiência profissional de professores tanto de Ensino Superior
quanto da Educação Básica, elementos de discurso ou da prática que pudessem
contribuir para ampliar o nosso entendimento.
Assim sendo, a primeira investigação proposta pelo grupo, além dos estudos
teóricos, foi a realização de entrevistas com professores do Ensino Superior,
preferencialmente que lecionassem em cursos de licenciatura, a fim de investigar as
concepções de Álgebra e os conhecimentos docentes de formadores de professores
mobilizados ao falar sobre Álgebra. Para isto, foi elaborado pelo grupo um roteiro
com nove questões, buscando abarcar as duas grandes temáticas do projeto.
Alves; Almeida; Silva; Albrecht
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O roteiro produzido foi utilizado para entrevistar quatro professores que
lecionam no Ensino Superior, de um total de sete professores indicados pelos
próprios integrantes do grupo. A indicação destes professores foi feita pela facilidade
de acesso, pela proximidade com os integrantes do grupo e pela disponibilidade de
conceder a entrevista. Ainda assim, não foi possível contatar dois deles e um
terceiro declarou não se sentir à vontade para participar da pesquisa, por não estar
ativamente atuando na formação de professores. As entrevistas foram realizadas em
data, horário e local agendados com os quatro participantes, geralmente conduzidas
por dois integrantes do grupo de pesquisa e foram gravadas em áudio para posterior
transcrição. Vale ressaltar que, antes da realização das entrevistas foi levantado um
breve perfil dos quatro professores, que apresentaremos a seguir.
As entrevistas foram transcritas e analisadas conjuntamente, buscando
identificar convergências e divergências nas respostas dos professores para cada
uma das nove questões. Com base nesta primeira análise, pôde-se identificar quais
questões melhor convinham à investigação de cada fator de interesse - concepções
de Álgebra e Conhecimentos Profissionais Docentes. Como anteriormente
mencionado, que neste trabalho interessamo-nos, especificamente, pelo
Conhecimento Específico e Conhecimento Curricular, ficando a cargo de um terceiro
trabalho a análise das questões que promovem discussões acerca do Conhecimento
Pedagógico do Conteúdo. Tendo em vista esta divisão, neste trabalho analisaremos
as questões 2, 3 e 8, que são apresentadas a seguir.
Quanto ao perfil dos professores entrevistados, P1 é doutor em Educação
Matemática e professor na Pós-Graduação em uma instituição particular. P2 é
doutor em Matemática Aplicada e leciona em uma instituição pública e duas
particulares. P3 tem experiência com educação nos ensinos Fundamental, Médio e
Superior e, atualmente, leciona em uma instituição particular e é coordenador do
Colegiado de Licenciatura em Matemática. Já P4 é professor em uma universidade
pública, doutorado na área de álgebra e possui mais de vinte anos de experiência
em cursos de bacharelado e licenciatura em Matemática. Consideramos que, apesar
de não serem utilizados como elementos de análise neste trabalho, os perfis dos
professores contêm relevantes informações para uma pesquisa que tem como
referencial teórico os Conhecimentos Profissionais Docentes.
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ANÁLISE DAS QUESTÕES
As questões foram analisadas contrapondo-se as respostas dos quatro
professores. Sempre que foi conveniente, optamos por trazer os trechos transcritos
das entrevistas e, por vezes, sintetizamos as ideias dos professores quando os
trechos mostravam-se demasiadamente longos, tomando o cuidado de usar as
mesmas palavras que os entrevistados usaram para expressar suas opiniões.
Apresentamos, na sequência, as questões 2, 3 e 8 e uma descrição das respostas,
seguidas por uma análise das mesmas.
2) Em sua opinião quando uma atividade matemática pode ser caracterizada como
sendo do campo da álgebra?
Ao responder esta questão, os professores P2 e P3 dizem que a incógnita
caracteriza uma atividade como sendo especificamente do campo da álgebra. P3, de
forma mais geral, afirma que “a matemática, na minha opinião, a matemática não se
separa”, no sentido em que “qualquer atividade matemática tá no campo da Álgebra”
porque problemas aritméticos podem ser resolvidos algebricamente e os conteúdos
matemáticos são interdependentes P2, por sua vez, elenca conteúdos como a
resolução de matrizes, sistemas, equações de segundo grau, todos como
especificamente algébricos e conclui, ainda, que “muita coisa é álgebra, tirando
geometria e trigonometria”. Esta visão é muito semelhante a de P1, que afirma que
“a matemática escolar é álgebra ou geometria” e também traz uma visão abrangente
de álgebra, chegando a dizer que tudo é álgebra na matemática e que o objetivo
principal da matemática escolar é chegar ao conceito algébrico de função. P4 é
enfático ao dizer que “a álgebra é a linguagem da equação”, respondendo à
pergunta afirmando que uma atividade é do campo da álgebra quando apresenta
uma equação.
Esta questão foi elaborada com o objetivo de identificar conceitos algébricos e
identificar a compreensão que esses professores possuem sobre Álgebra,
abrangendo, portanto, o Conhecimento Específico do Conteúdo. Acreditamos que as
respostas obtidas atendem às expectativas e destacamos que alguns elementos
desta categoria, como a habilidade de justificar procedimentos algébricos, por
exemplo, não fazem parte do escopo da questão.
Alves; Almeida; Silva; Albrecht
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Identificamos, na fala dos professores, conceitos característicos do campo da
Álgebra, tais como: função, incógnita e equação, considerados conceitos centrais no
Ensino de Álgebra. Aparecem ainda outros conceitos, ditos periféricos, tais como
matrizes e sistemas de equações. Tal distinção entre conceitos centrais e periféricos
é percebida pela ocorrência destes termos, sendo que os primeiros aparecem na
fala de todos os professores entrevistados. Cabe ressaltar ainda que encontramos
divergências quanto a delimitação do campo da Álgebra, como será evidenciado na
análise da última questão.
3) Qual seu entendimento sobre o currículo de álgebra na educação brasileira?
Os professores P2 e P4 alegaram ter pouco conhecimento sobre o currículo.
P4 atribui esse fato ao seu maior envolvimento com a pesquisa em matemática pura;
já P2 afirma que apesar de possuir pouco conhecimento sobre o currículo, acredita
que os conteúdos de Álgebra trabalhados nas escolas são poucos, mas suficientes.
Segundo ele:
também não sei se precisaria mais do que é dado, porque o
que é interessante da álgebra, que são as estruturas algébricas
que generaliza os problemas em todas as áreas, né? (...) isso
não interessa pra uma pessoa que não quer fazer matemática,
né? Então é pouco, mas eu acho que é o suficiente. (P2)
Já os professores P1 e P3 apresentam críticas ao currículo, principalmente
em relação ao ensino mecanizado, que transforma a matemática em conteúdos
estanques e fórmulas desconexas. P1 acrescenta que “o currículo é muito amplo,
mas não tem profundidade nenhuma” e atribui este problema principalmente à
formação do professor, dizendo que “o professor precisa conhecer. Enquanto o
professor não conhecer o que ele dá, ele se pauta pelo livro”. Sugere que uma forma
de reverter esta falha é investir na formação de professores, especialmente através
da parceria da Universidade com as escolas. P3 também enfatiza o papel do
professor, citando os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) e indicando que o
professor precisa ensinar e não “mecanizar” o aluno. Para ele, o papel central da
matemática não é a aprendizagem dos conteúdos por si só, mas sim o significado
que o aluno atribui às coisas, principalmente as relacionadas ao cotidiano.
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Nosso objetivo com essa questão era identificar a compreensão dos
professores formadores de professores sobre o currículo de Álgebra da Educação
Básica e Superior. Apesar de não identificarmos conhecimentos pontuais sobre o
currículo, conseguimos perceber outros aspectos oportunos a este objetivo, como
críticas ao atual sistema de ensino, à profundidade do currículo e ao tecnicismo
presente no Ensino de Álgebra. Identificamos na fala de P1 a necessidade de o
professor conhecer os conteúdos específicos de sua disciplina, o que vai ao
encontro das ideias de Shulman, uma vez que o professor necessita desse
conhecimento para julgar o que é mais adequado para sua prática profissional.
Ainda sobre os conhecimentos relacionados ao currículo, podemos trazer
para esta análise, alguns elementos encontrados nas respostas dos professores à
questão 5, que versava sobre o melhor momento para introdução da Álgebra. Nesta
questão, três dos professores entendem que a álgebra é introduzida nos anos finais
do Ensino Fundamental, inclusive P2, que aponta o ensino de Álgebra a partir das
equações, no sétimo ano, conforme currículo do Estado de São Paulo, e P3, que
ressalta que o ensino de álgebra deve começar quando a base de aritmética estiver
completa, o que depende da maturidade e não da idade dos alunos. Apenas para P1
o pensamento algébrico acompanha a criança desde a infância, como “quando você
trabalha com operações ela percebe se somar mais um, conseguirá mais números”.
Encontramos nesta questão aspectos mais pontuais relacionados ao currículo
da Educação Básica, o que nos permite traçar consonâncias com o que Shulman
denomina de Conhecimento Curricular. Ainda assim, essas consonâncias são rasas
por não abarcarem o Conhecimento Vertical e Horizontal do currículo. Isso pode
decorrer da natureza do instrumento de coleta dessas informações, uma vez que a
entrevista não propicia momentos para uma reflexão mais apurada das respostas.
Salientamos que o desconhecimento do currículo da educação básica, que
pôde ser notado na resposta de dois dos professores, provavelmente compromete a
formação de futuros professores.
8) Qual é a distinção que você faz entre a álgebra, a análise e a geometria?
Três dos professores declaram que, em algum grau, não há distinção entre as
áreas da matemática. Para P3, tratam-se de “estratégias diferentes de chegar nos
mesmos resultados”. P1 e P2 apresentam diferentes objetivos para cada área, mas
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entendem que elas estejam interconectadas. Para P1 “a análise vai estudar mais os
problemas de continuidade. Trabalha essencialmente com problemas de
continuidade, que é diferente da Álgebra que está estudando as estruturas, mas está
totalmente ligada”. P4 é o que mais distingue as áreas, dizendo que “a álgebra ela
vai mais sozinha, ela tem vida própria...”, enquanto concorda com P2 quando esta
diz “a análise matemática, pra mim, é como se você passasse a limpo todo o cálculo
diferencial e integral”. Os três professores que identificam diferenças entre as três
áreas, mesmo que de objetivos, apresentam dificuldades em diferenciar a geometria.
O enfoque nessa questão era identificar, dentro do Conhecimento Específico
do Conteúdo, como os professores delimitam as três grandes áreas da Matemática
do Ensino Superior. Percebemos, no entanto, que esta delimitação não é claramente
exposta pelos professores e notamos uma contradição, uma vez que, apesar de na
Educação Básica os professores declararem a Álgebra e a Geometria como áreas
bem distintas - ainda que uma possa ser usada como instrumento para a outra - não
conseguem construir a mesma diferenciação para o Ensino Superior.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Os trabalhos de Shulman são relevantes para o nosso projeto de pesquisa
por contextualizar, delimitar e embasar os trabalhos sobre Conhecimento
Profissional para o Ensino. A adoção desse referencial nos permite aderir a uma
visão de conhecimento e de ensino baseadas no conjunto de conhecimentos
construídos através da prática, da academia e da pedagogia presentes no cotidiano
do exercício da profissão docente.
As análises das respostas dos professores da Educação Superior nos
permitem inferir alguns aspectos que podem comprometer a formação de futuros
professores, tais como alguns reducionismos, generalizações e o pouco
conhecimento do currículo da Educação Básica. Estes são fatores presentes na fala
dos entrevistados, dos quais seu conhecimento se faz de grande importância para
assegurar uma boa formação para o futuro professor. Cabe salientar que as críticas
ao sistema atual de ensino e sua estruturação estiveram presentes na fala de alguns
dos entrevistados e a formação continuada fora apontada como uma das
alternativas para viabilizar o constante aperfeiçoamento profissional.
Contribuições de professores formadores sobre o conhecimento profissional docente em Álgebra
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As reflexões advindas dessas análises fomentam a necessidade de repensar
a formação docente, de forma a contribuir para um aperfeiçoamento profissional que
ofereça aos futuros professores possibilidades de construir relações entre o
conteúdo e sua prática pedagógica. Ainda há, na cultura acadêmica dos grandes
centros universitários, um desprezo do conhecimento pedagógico, aqui entendido
como o conjunto de conhecimentos sobre o currículo e ensino, em relação ao
conhecimento do conteúdo. Isso pode ser observado na fala dos entrevistados, no
que se refere ao conhecimento sobre o currículo, onde não há uma correlação entre
os conteúdos ensinados na Universidade e os ensinados na Educação Básica,
causando um distanciamento sobre os conteúdos trabalhados nesses dois níveis de
Ensino.
Com o intuito de prosseguirmos ampliando as concepções de Álgebra para o
Ensino e o Conhecimento Profissional Docente, nosso grupo vem trabalhando com
diferentes instrumentos de coleta de dados com professores da Educação Básica,
sobre a importância dos conhecimentos adquiridos na Universidade para sua prática
docente. Posteriormente, pretendemos traçar um quadro comparativo entre as
concepções trazidas desses dois diferentes grupos de professores. Com isso,
ambicionamos obter uma reflexão mais aprofundada sobre a formação de
professores de matemática nos atuais moldes do Ensino Superior.
REFERÊNCIAS
MORTIMER, E. F. Linguagem e formação de conceitos no ensino de ciências. Belo Horizonte: UFMG, 2000. 383p.
SHULMAN, L. S. Those who understand: Knowledge growth in teaching. Educational Researcher, v. 15, n. 2, p. 4-14, 1986.
SHULMAN, L. S. Knowledge and teaching: foundations of the new reform. Harvard Educational Review, Harvard, v. 57, n. 1, p. 1-22, 1987.
SILVA, E. A.; SOUZA, M. L.; SILVA, T. H. I; RIBEIRO, A. J. Uma compreensão de álgebra construída pelo olhar das concepções de professoras de Ensino Superior. In: ENCONTRO PAULISTA DE EDUCAÇÃO MATEMÁTICA, XVII, 2014, São Paulo. Anais... Biriguí: SBEM-SP: IFSP, 2014. p. 314-327.