cultura.sul 58 14 jun 2013

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JUNHO 2013 | n.º 58 www.issuu.com/postaldoalgarve 8.907 EXEMPLARES Espaço CRIA: Criando com Energia p. 2 Grande ecrã: Mostras de cinema ao ar livre estão de regresso p. 3 Panorâmicas Uma aldeia algarvia feita da força do imaginário Contos: Sábado e depois Domingo p. 4 Mensalmente com o POSTAL em conjunto com o PÚBLICO É tempo de MED em Loulé p. 4 Sons da Jamaica com Antony B : D.R. D.R. D.R. D.R. D.R. António Rosa Mendes: O narrador implicado p. 11 p. 8 D.R. Editorial: A herança de Rosa Mendes p. 2

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• Veja o CULTURA.SUL DESTE MÊS• Sexta-feira (dia 14/6) nas bancas com o PÚBLICO e o POSTAL • Partilhe o seu caderno mensal de Cultura no Algarve • EM DESTAQUE: > EDITORIAL: A herança de Rosa Mendes > ESPAÇO CRIA: Criando com Energia, por João Mil-Homens > JUVENTUDE, ARTES E IDEIAS: Uma ideia, por Paulo Côrte-Real > ESPAÇO AGECAL: O “novo tempo” das arte e ofícios artesanais, por Marta Santos > PANORÂMICA: Senhora do Forte, uma aldeia algarveia feita da força do imaginário por Ricardo Claro > LETRAS E LEITURAS: Visões do real histórico em Lillias Fraser, por Paulo Serra > ESPAÇO ALFA: Precisão no tempo e no espaço na Natureza, por Mauro Rodrigues > CONTOS DE PRIMAVERA NA RIA FORMOSA: Sábado e depois Domingo, por Pedro Jubilot

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Page 1: CULTURA.SUL 58 14 JUN 2013

JUNHO 2013 | n.º 58

www.issuu.com/postaldoalgarve8.907 EXEMPLARES

Espaço CRIA:

Criando com Energia

p. 2

Grande ecrã:

Mostras de cinema ao ar livre estão de regresso

p. 3

Panorâmicas

Uma aldeia algarvia feita da força do imaginário

Contos:

Sábado e depois Domingo

p. 4

Mensalmente com o POSTALem conjuntocom o PÚBLICO

É tempo de MED

em Loulép. 4

Sons da Jamaica com Antony B :

d.r.

d.r.

d.r.

d.r.

d.r.

António Rosa Mendes:

O narrador implicado

p. 11

p. 8

d.r.

Editorial:

A herança de

Rosa Mendesp. 2

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14.06.2013 2 Cultura.Sul

Demasiado cedo. É sempre demasiado cedo nestas situ-ações e o adeus a António Rosa Mendes tem também esse amargo da chegada an-tes da hora devida.

Humanista, homem da Cultura e da defesa do Al-garve, Rosa Mendes é e será sempre um nome incontor-nável da região.

Deixa-nos a todos sem ex-cepção mais pobres e menos acompanhados, mas deixa--nos também herdeiros do seu legado pessoal e profis-sional e cumpre-nos honrar essa deixa que fez universal e não testamentária.

Devemos-lhe a gratidão de nos deixar colectivamen-te a sua experiência para que dela nos possamos “apode-rar”, cumprindo a natureza histórica de seres humanos e incorporando a experiên-cia que nos lega para todo o sempre.

Recordar é viver e aqui vos deixo as palavras do homem singular que era num trecho da entrevista a Rosa Mendes que o Cultura.Sul publicou em 2010:

“O passado nunca passa precisamente, porque os se-res humanos não têm Natu-reza, têm História. Nós somos feitos de passado, somos o re-sumo daquilo que está para trás de nós e, portanto, aquilo que está para trás de nós não passa na medida em que nós incorporamos todas essas ex-periências do passado.

O que sucede é que fre-quentemente nós somos muito ingratos em relação àqueles que nos antecede-ram e que construíram este mundo que herdámos. A nossa condição de humanos é sermos herdeiros. Portanto somos feitos de tempo. Pelas nossas veias não circula só o sangue, circula também o tempo. A nossa matéria é o tempo e nessa medida se queremos sinais de orien-tação em relação ao futuro temos que nos apoderar do passado”.

A herança de Rosa Mendes

Ficha Técnica:

Direcção:GORDAAssociação Sócio-Cultural

Editor:Ricardo Claro

Paginação:Postal do Algarve

Responsáveis pelas secções:• Contos da Ria Formosa:

Pedro Jubilot• Espaço ALFA:

Raúl Grade Coelho• Espaço AGECAL:

Jorge Queiroz• Espaço CRIA:

Hugo Barros• Espaço Educação:

Direcção Regionalde Educação do Algarve

• Espaço Cultura:Direcção Regionalde Cultura do Algarve

• Grande ecrã:Cineclube de FaroCineclube de Tavira

• Juventude, artes e ideias: Jady Batista• Da minha biblioteca:

Adriana Nogueira• Momento:

Vítor Correia• Panorâmica:

Ricardo Claro• Património:

Isabel Soares• Sala de leitura:

Paulo Pires

Colaboradoresdesta edição:João Mil-HomensMarta SantosMauro RodriguesPaulo Côrte-RealPaulo SerraSara Navarro

Parceiros:Direcção Regional de Cul-tura do Algarve, Direcção Regional de Educação do Algarve, Postal do Algarve

e-mail redacção:[email protected]

e-mail publicidade:[email protected]

on-line em: www.issuu.com/postaldoalgarve

Tiragem:8.907 exemplares

Criando com Energia

Chegada a Primavera, as pri-meiras andorinhas trouxeram boas notícias à Universidade do Algarve. A aprovação de quatro novos projectos euro-peus, nos quais a Divisão de Empreendedorismo e Trans-ferência de Tecnologia (CRIA) participará, 1integrando par-cerias que englobam mais de 25 entidades provenientes de oito países da bacia do Medi-terrâneo.

Quatro novos projectos, um tema em comum - a energia: o Projecto ECOFUNDING visa fa-cilitar o acesso a financiamen-to para empresas inovadoras ligadas ao sector do ambiente e da energia; o Projecto WIDER pretende fomentar a inovação na eco-contrução apoiando fi-nanceiramente PMEs com tec-nologias energéticas inovado-ras; o Projecto SMARTINMED promove a cooperação entre empresas e investigadores li-gados à área das energias re-nováveis; e por fim, o projec-to ENERGEIA, que visa apoiar o desenvolvimento de novas

empresas que despontem de projectos de investigação científicos relacionados com a energia.

A área da energia represen-ta para o Algarve um vasto manancial de oportunidades

que não têm sido eficazmen-te aproveitadas. É sobejamente conhecido o potencial da re-gião em matéria de energias renováveis, quer falemos das já tradicionais energias solar e eólica, quer se fale de formas

mais inovadoras relacionadas com o mar, seja através de ondas ou marés. Simultane-amente, o Algarve tem ainda um longo caminho a percorrer em matéria de eficiência ener-gética e conservação de ener-

gia, sendo necessário proceder a uma profunda alteração dos nossos comportamentos indi-viduais de forma a reduzir os consumos através de melhora-mentos em termos de eficiên-cia energética.

Esperamos que até 2014, através destes novos projec-tos, consigamos estimular toda a cadeia de valor ligada ao sector da energia na Região do Algarve. Sabemos desde já que serão criadas formas de estimular projectos de inves-tigação nesta área a materia-lizarem-se como ideias de ne-gócio. Iremos criar formas de identificar novas tecnologias e encontraremos formas de estimular novos empreende-dores de forma a integrá-los nesta vasta rede europeia. Ire-mos apoiar financeiramente algumas PMEs existentes com tecnologia passível de ser apli-cada no sector da construção. Procuraremos apoiar todas as empresas no processo de cap-tação de financiamento para alavancar novos negócios. E fundamentalmente, iremos estimular o debate e o inter-câmbio de experiências entre os diversos agentes da Região, públicos e privados, ligados ao sector da energia.

Ainda assim, é importan-te realçar que estes projectos são apenas os ninhos, de onde poderão nascer novas vidas. É fundamental que a comunida-de empresarial e a comunida-de científica se juntem no es-forço de levar estes projectos a bom porto. A recompensa valerá certamente a pena: es-timulo à economia, incentivo à investigação e à inovação, mais eficiência e menor dependên-cia energética. As andorinhas agradecem….

Uma ideia

Haverá algo mais poderoso que uma ideia?

As ideias encerram em si a força e a criatividade da concretização do mundo. O ritmo de vida atual leva--nos, vezes sem conta, a es-quecer a grandiosidade das ideias. De um simples esbo-ço, a uma obra pictórica ou

a um objeto arquitetónico, a ideia é o que lhe dá ori-gem. O abstrato dá lugar ao concreto. Pensando na nos-sa vida quotidiana, estamos de acordo que, objetos nela materializados dependem da qualidade, criatividade e força das ideias. Então que se apoie e cultive o surgimen-to de novas ideias, onde os jovens, graças à sua abertu-ra, disponibilidade a novas experiências e a vontade de apropriação do mundo, são os verdadeiros embaixadores do empreendedorismo.

Consubstanciadas pela Educação - um dos pilares das nações que almejam a prosperidade e o desenvol-

vimento sustentável, as artes, ao mesmo tempo que abrem novos horizontes e apontam

novos caminhos, conferem beleza ao mundo. Como par-te integrante da cultura, são um rico e importante fator de desenvolvimento imate-rial. Embora ultimamente se venha a assistir a tentativas, falsamente legitimidadas, de destruição das artes e da cultura (direi mesmo da pró-pria identidade nacional), importa lembrar que essa será uma tentativa vã, já que as artes e a cultura têm como génese uma IDEIA. As ideias não se destroem. Os homens e as mulheres podem mor-rer mas as suas ideias ficam e disseminam-se como a brisa de um novo dia. Imagina-se um mundo sem beleza?

d.r.

d.r

.

Ricardo [email protected]

Editorial Espaço CRIA

João Mil-HomensGestor de Ciência e Tecnologia no CRIA – Divisão de Empreen-dedorismo e Transferênciade Tecnologia da UAlg

Juventude, artes e ideias

Paulo Côrte-RealDocente

Page 3: CULTURA.SUL 58 14 JUN 2013

14.06.2013  3Cultura.Sul

Cineclube de TaviraProgramação: www.cineclubetavira.com281 971 546 | 965 209 198 | 934 485 [email protected]

SESSÕES REGULARES | Cine-TeatroAntónio Pinheiro | 21.30h 18 JUN | JOSÉ E PILAR, MIGUEL GONÇALVES MENDES, Portugal 2010 (125’) M/6 20 JUN | LAURENCE ANYWAYS (LAURENCE PARA SEMPRE), Xavier Dolan, Canadá/França 2012 (168’) M/12 27 JUN | ZERO DARK THIRTY (00:30 A HORA NEGRA), Kathryn Bigelow, E.U.A. 2012 (157’) M/16 28 JUN | VILLA-LOBOS: UMA VIDA DE PAIXÃO, Zelito Viana, Brasil 2000 (130’) M/12

“SONHOS”Até 21 JUN | Galeria de Arte da Associação Sociale Cultural de Almancil (ASCA)Exposição de escultura de Aldamir Filho. Desejoso de trabalhar na criação a três dimensões, aproveita ma-teriais reciclados diversos, como o ferro, a madeira, a pedra, o alumínio e outrosAg

endar

Mostras de cinema ao ar livre estão de regresso a Tavira

A grande notícia deste mês é que neste Verão estarão de volta as mostras de cinema ao ar livre! Foi uma luta exaustiva e dura, mas deu frutos. Estamos a trabalhar quase a tempo inteiro para poder oferecer-lhes um programa que ficará gravado nas vossas memórias. Mantenham-se atentos!

Até lá, mais um mês de cinema de qualidade no Cineclube de Tavira. Para quem não o viu ainda (e não só!), não percam um dos melhores filmes da história do cinema nacional: JOSÉ E PILAR, que iremos exibir pela terceira vez na terça-feira, 18 de Junho, data do terceiro aniversário do falecimento de José Saramago. A ideia é que todos os cineclubes do país o exibam no mesmo dia, Tavira foi o primeiro a responder à iniciativa.

Repetimos: a maneira mais simples, mais agradável, mais en-riquecedora e menos dispendiosa de ajudarem o Cineclube de Tavira (no passado dia 8 de Abril a nossa associação fez 14 anos) é apenas uma: desfrutem das nossas sessões de cinema de qua-lidade. O valor do nosso bilhete de entrada é e continua baixo: quatro euros para o público em geral e apenas dois para os sócios e para qualquer portador do cartão de estudante ou de sócio de Inatel. Até muito em breve!

Cineclube de Tavira

As mostras de cinema ao ar livre regressam à agenda cultural da cidade de Tavira

e do respectivo cineclube, uma vitória para a Cultura e para o Cinema

d.r.

Espaço AGECAL

O “novo tempo” nas artes e ofícios artesanais

Falemos de tempos. Tempos de escassez, do “aproveitar o que está à mão”, de mobilidade, de transmissão de conhecimentos pela via do gesto e da oralidade, do desfazer e fazer de novo, do aprendendo fazendo e operando.

Procurava-se tirar o melhor partido das matérias que o território coloca-

va à disposição, ou que dele podiam ser obtidos, por força da constante necessidade de adaptação ao meio, e onde “a necessidade faz o engenho”, as transformava com recurso a técni-cas essencialmente manuais.

Os ritmos de trabalho, descanso e celebração estavam pautados pelas tarefas laborais, numa experiência comunitária interdependente do lugar e cujas manifestações seriam ritualizadas pelas relações e afectos de parentesco, laboral e vizinhança.

Na alteração destes “mundos” laborais, ocorreram profundas transformações.

Reconfiguraram-se os usos. O “tempo das coisas” modificou... Industrializou-se, criam-se outras oportunidades, implementa-se o sis-tema de ensino formal, reflectem-se

identidades e novas questões sobre o património.

Assiste-se ao esbatimento entre ru-ral e urbano, integram-se eventuais substitutos das economias tradicio-nais, integrando processos turísticos, de mercantilização, de mobilidade, e onde a paisagem rural sem ruralida-de ganha o lugar de “paraíso perdi-do”, de retorno aos “costumes” num cenário imaginado alternativo ao quotidiano urbano.

Nestas reconfigurações, eventual-mente algumas práticas, contextos e celebrações artesanais mantêm-se e continuam a fazer sentido nestes “produtores”, partilhando a necessi-dade do colectivo e das práticas quo-tidianas, e outras que se alteram para a construção de um “novo” ou apenas “renovado” significado.

A necessidade de artes e ofícios artesanais no século XXI

Já conseguimos viver em temperatu-ras constantes de 22ºC… A casa, o carro, o escritório, as idas ao supermercado. Não necessitamos, para exercer a maio-ria das nossas tarefas do nosso quotidia-no, de agasalhos de quem necessitava para exercer o seu ofício no exterior. Deles dependia, para o seu conforto e em certa medida sobrevivência, de um agasalho quente, resistente, impermeá-vel, duradouro.

Já não temos necessidade de sermos criteriosos na selecção das matérias ve-getais que constituem a cestaria, adequa-das ao uso a que se destinavam - a cana para a cesta de derregar a cal, o esparto para a esteira de empreita de secar os fi-gos, o vime para as canastras de peixe.

Grande ecrã

Marta SantosArquitecta Membro da direcção AGECAL

“JOHN PIZZARELLI”29 JUN | 21.30 | TEMPO - Teatro Municipalde PortimãoConsiderado um dos revivalistas do Great American Songbook, o músico americano tem mais de 40 ál-buns editados, sendo o mais recente, “Double Expo-sure”, de 2012

Alterámos a necessidade. Criámos novos sentidos. Procuramos outras res-postas para os objectos.

Estas “antigas - novas” artes procuram hoje novos consumidores, encontrando frequentemente nas comunidades ex-ternas a aceitação de um repositório de “práticas populares” e de “lugar”.

Modificaram-se as motivações de con-sumo, mas valorizamos a arte e o ofício artesanal, num resgate de memória, quase que num registo etnográfico de um contexto, procuramos um sentido ecológico, procuramos histórias naquele objecto. O seu currículo vitae, onde nas-ceu, em que condições foi fabricado e sua história de vida. O seu contexto fa-miliar. E queremos transportar este “mi-cro-cosmo” do objecto para o nosso lar. Transportamos com ele os seus valores de contexto, de família, de modo de fa-brico. E damos-lhe valor. Ganha outro sentido. O nosso sentido.

Encorpamos agora novos ou “reno-vados” significados, num processo de reformulação e de reinvenção, trans-portando novas significações da sua identidade.

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14.06.2013 4 Cultura.Sul

É tempo de Med em Loulé

O Festival Med vai atrair, nos próximos dias 28 e 29, milha-res de pessoas em busca da melhor música, artesanato e gastronomia, vindo um pou-co de todo o mundo.

O evento, uma organização da Câmara de Loulé e que as-sinala este ano a sua décima edição, tem na música o prato principal e estão prometidas emoções fortes com um luxu-oso programa de actuações.

Desde logo atenções centra-das num dos fenómenos de popularidade na cena reggae

internacional, o jamaicano An-thony B, que sobe ao palco no segundo dia do evento.

Também para sábado está marcado o regresso a Portugal, após vários anos de ausência, de uma das bandas mais míti-cas das últimas duas décadas na Europa, os sempre vanguar-distas Hedningarna, da Suécia.

Divas encantam Loulé

Outro ponto alto passa por uma das mais aguardadas es-treias no festival louletano, onde dia 28, Oumou Sanga-ré sobe ao palco. A cantora do Mali é uma diva da músi-ca africana, vencedora de um grammy, mas também reco-nhecida por ser uma activista cívica pelos direitos das mu-lheres e embaixadora da Boa--Vontade da ONU.

O programa do MED 2013 faz uma aposta clara numa nova geração de cantautoras no feminino que está a impres-sionar o mercado internacio-

nal da música. Exemplos disso mesmo são as actuações da an-golana Aline Frazão e de Tuli-pa Ruiz, uma das grandes pro-messas da música brasileira.

No dia 29 é a vez da catalã Silvia Perez Cruz, estreia em território nacional de uma das artistas mais acarinha-das pelo público e pela crí-tica espanhola.

Também o contingente na-cional do Med 2013 é de alto nível e, como é habitual, pro-move alguns dos mais inte-ressantes projectos recentes

da música portuguesa. No primeiro dia de festival,

sobem ao palco os Dead Com-bo, Miguel Araújo e Samuel Úria, bem como Elisa Rodri-gues, uma das mais vibrantes vozes do jazz nacional.

Dia 29 há lugar ao fado, com Cuca Roseta, mas não só. A contagiante e contemporâ-nea celebração popular que representam as actuações dos Kumpania Algazarra ou dos Dona Gi também prometem animação. Mais intimista será decerto a actuação de Sofia Vi-tória, num projecto de home-nagem a Chico Buarque.

Por fim, para os mais resis-tentes, as duas noites do MED 2013 terminam com apelos à dança vindos dos pratos de HugoMendez “Sofrito”, bada-lado dj londrino na primeira noite, e de Batida Dj Set no sábado.

Os bilhetes diários custam 12 euros e podem ser adqui-ridos nos dias do evento no próprio local.

Oumou Sangaré, a grande diva do Mali e de África

Teatro Municipal de Faro Programação: www.teatromunicipaldefaro.pt

15 JUN | Luís de Matos, “Chaos” (magia), 21.30 horas, duração 1h30, preço: 10 € e 15 €22 JUN | Escola da Companhia de Dança do Algarve, 21.30 horas, duração 2h, preço: 10 €

Cine-Teatro LouletanoProgramação: http://cineteatro.cm-loule.pt

15 JUN | Al-Buhera canta Amália, Alain Oulman e Ricardo Valério, 21.30 horas, preço: 6 € 6 JUL | LX Comedy Club, (stand-up comedy), 21.30 horas, preço: 10 €

AMO - Auditório Municipal de Olhão Programação: www.cm-olhao.pt/auditorio

15 JUN | A Fantasia do Circo, Circo Cardinali, 16 horas, duração: 1h15, preço: 6 €22 JUN | António Zambujo - a solo (música), 21.30 horas, duração: 1h30, preço: 15 €

TEMPO - Teatro Municipal de PortimãoProgramação: www.teatromunicipaldeportimao.pt

Até 13 JUL | Sérgio Godinho e as 40 Ilustrações (exposição), de terça a sábado, das 10 às 19 horas, entrada livre19 JUN | Um espaço chamado Teatro, 19 horas, duração: 1h30, preço: 3 €21 JUN | Cinemas às 6.ªS – “Elena”, de Andrey Zvyagintsev, 21.30 horas, duração:1h50, preço: 3 €27 JUN | Um espaço chamado Teatro, 19 horas, duração: 1h30, preço: 3 €28 JUN | Cinemas às 6.ªS – “O Polícia”, de Navad Lapid, 21.30 horas, duração:1h50, preço: 3 €29 JUN | John Pizzarelli (música), 21.30 horas, duração: 1h30, preço: 12 e 14 €

Aqui há espectáculo

Luís Franco-Bastos, Ricardo Vilão, Rui Sinel de Cordes e Salvador Martinha per-correm o país em registo de comedy club. Depois de várias sessões esgotadas em vá-rias cidades o tour VOLTA EM 2013.

Nova temporada, novos textos, a mesma irreverência. A regra é que não há regras. Só piadas.

Dest

aque 6 JUL | LX Comedy Club, (stand-up comedy), 21.30 horas, preço: 10 €

Da mesma forma que o bater de asas de uma borboleta em Tóquio pode provo-car um furacão em Nova Iorque, também a presença de cada espectador se reflecte em cada representação de Luís de Matos.

Uma jornada inesquecível, plena de in-teração e mistério, repleta de feitos inexpli-cáveis que perduram na memória de cada espectador que os vive.

Os noventa minutos de espectáculo são uma combinação única da imaginação co-lectiva de todos que nele participam.

“Luís de Matos - CHAOS” é uma experiên-cia mágica sem precedentes, uma colecção de mistérios tornados realidade em cada representação, constituindo uma viagem mágica pessoal, intransmissível e memorá-vel. Ilusão ou realidade? A escolha é sua…

Dest

aque

15 JUN | Luís de Matos, “Chaos” (magia), 21.30 horas, duração 1h30, preço: 10 € e 15 €

António Zambujo vem ao AMO apre-sentar o seu mais recente álbum “Quin-to”. Disco que entrou directamente para o segundo lugar do top nacional de ven-das, depois de ter liderado o top iTunes.

Do Alentejo para o mundo, a obra de António Zambujo foi elogiada nos quatro

cantos do globo, louvada, por exemplo, no Brasil ou nos Estados Unidos.

A viagem de “Quinto” pelos palcos já começou e está prevista mais uma noi-te bem passada com um artista que tem esgotado salas de espectáculos em todo o país.

Dest

aque 22 JUN | António Zambujo - a solo (música), 21.30 horas, duração: 1h30, preço: 15 €

d.r.

John Pizzarelli estreia-se em 2013 em Portugal com três concertos. Depois de ir a Castelo Branco e Lisboa, no dia 29 de Ju-nho passa pelo TEMPO.

O mote para estes espectáculos é a apre-sentação aos portugueses do seu cool jazz tocado à guitarra.

Conhecido por interpretar baladas clássi-cas, Pizzarelli tem nas suas influências no-mes como Nat King Cole ou Frank Sinatra. Considerado um dos revivalistas do Great American Songbook, o músico americano tem mais de 40 álbuns editados, sendo o mais recente, “Double Exposure”, de 2012.

Dest

aque 29 JUN | John Pizzarelli (música), 21.30 horas, duração: 1h30, preço: 12 e 14 €

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14.06.2013  5Cultura.Sul

Logo depois de acordar fiz-me à calçada irregular das ruas estreitas a seguir o cheiro a maresia como quem procura a certeza de que na orla do grande oceano a vista ganha horizon-te aberto e prolongado.

O mar tem destas coisas, garante vistas largas, sem obstáculos e era exactamente isso que procurava para esta manhã na Senhora do Forte.

A brisa salgada podia ser a única indicação do destino que procuro, mas aqui o silêncio ambiente tem o condão de garantir que também pelo ouvido se pode buscar o caminho do mar. O ribombar das ondas que se es-praiam junto às arribas num ritmado lamber das areias brancas confirmava o caminho e rapidamente desembo-quei junto ao farol.

Sentei-me no primeiro café que en-contrei para beber o expresso da ma-nhã e afastar do corpo a sensação do peso do sono ainda há pouco aban-donado. Paguei e fiz-me de novo ao piso de calcário cinza recortado em rectângulos e dum pulo, deste para aquele lado da rua, pude ver o Atlân-tico em todo o esplendor.

O Miradouro do Farol no topo da arriba permite um olhar altaneiro so-bre o azul imenso. A ponta de terra, onde em tempos idos se construiu o guia dos navegantes, rasga o mar e põe-nos, como que por magia, na posição estranha de quem de dentro do oceano pode ver a aldeia algarvia pontilhada a branco pelo casario en-costa acima.

Há décadas que o velho torreão de ferro forjado se não cansa de, com a sua luz rodopiante, avisar os homens do mar que ali a terra se intromete pe-los domínios de Neptuno. Noite, após noite, o feixe de luz rasga o negro do firmamento e mantém afastado e em segurança quem quer passar ao largo da Senhora do Forte e indica o azimu-te para os filhos da terra se fazerem à rebentação para regressarem ao porto da aldeia sãos e salvos depois de mais uma faina.

Daqui vejo o porto e a ponte que fa-zem o caminho da beira-mar até à orla do casario. Os frutos do mar fazem este percurso a cada dia carregados pelas mulheres dos pescadores com a habilidade e a destreza de quem o faz consciente de que carrega o sustento da prole.

Hoje estão estranhamente desertos. Porto e ponte abandonados, redes e parafernália jazem na rampa do porto

semeada de barcos. Recolhidas dentro dos molhes as embarcações não mos-tram sinais de azáfama e balouçam estranhamente vazias dos homens de pele escura do sol e gretada do salitre que habitualmente as povoam.

Agora que reparo neste vazio lem-bro-me que não me cruzei com nin-guém nas ruas... também elas estão estranhamente desertas e para além da senhora que me deu o café, não vi vivalma desde que saí da cama. Estranho abandono este a que a al-deia parece ter sido repentinamente votada e é perdido nestes pensamen-tos que oiço o explodir dos aplausos

e dos vivas.Levanto o olhar a percorrer a mar-

ginal na procura dos responsáveis por tamanho alarido, que é de gen-te que se trata certamente, pois só o gentio pode encher de palmas o silêncio.

O jogo casamenteiro

Em torno do Forte da Sapata a mole humana anuncia ajuntamento invul-gar numa aldeia de brandos costumes e dum pulo me junto à festa enquan-to tento perceber a razão de tamanho burburinho.

Em três actos me faz esclarecido um filho da terra que me põe a par do Jogo da Rampa. Os aplausos são a recepção devida à primeira noiva que saiu das portas da fortaleza.

Trata-se afinal de um género de pe-ddy-paper casamenteiro que se joga apenas uma vez por ano. O momen-to alto tem início com o rebentar de um morteiro que dá a partida para a subida da rampa do forte por oito ra-pazes solteiros que têm como desafio encontrar um minúsculo papel que se encontra escondido no terraço do baluarte.

Descoberto o papel onde está es-crita a senha que lhes vai servir para encontrarem uma rapariga também solteira, rapaz e rapariga entram na fortaleza com uma chave que ela lhe entrega e dentro do forte têm de en-contrar uma veste branca de noiva que está guardada num baú, num lugar desconhecido.

Encontrada a veste, o rapaz entrega--a à companheira de jogo, sai e espera à porta que ela apareça, já vestida de noiva.

Assim que esta se apresenta, é sau-dada por todos e é-lhes apresentado pelo júri um prémio, que de ano para ano varia, sendo este entregue a am-bos. Depois, o rapaz dá-lhe um beijo na face e sela o momento com uma quadra tradicional:

A brincar te encontrei.E de noiva estás vestida!Será que eu agora acheiA mulher da minha vida?!

Há lá melhor maneira de fazer um ‘arranjinho’ que perante toda uma al-deia. A mim contam-me que o jogo já fez cair de amores os rapazolas mais afoitos nestas coisas das paixões com a mesma força com que retirou das masmorras da solidão alguns dos moços mais envergonhados da Se-nhora do Forte.

Uma visita imperdível

Tudo isto em data agendada desde há tempos imemoriais e com a pre-sença massiva da população, numa festa que atraia à aldeia centenas de visitantes para verem como aqui, por terras algarvias do concelho de Lagos, se dá mote ao amor através de uma brincadeira.

Ainda a procissão vai no adro deste dia recheado de acontecimentos em Senhora do Forte, a festa promete ser rija e faz-se de música pela banda lo-cal, Lira do Forte, e pelos cantares do grupo coral Brumas do Mar. O teatro sai à rua durante a tarde no jardim do coreto, lateral à igreja, pela mão do grupo cénico Arrebol, a que se segue o folclore que se faz de corridinho com o ritmo a ser imposto pelo ran-cho Vá de Roda.

Antes do cair da noite, tudo visto, ainda tenho tempo, afiançam-me, de subir ao Miradouro de Cima e con-templar os socalcos da aldeia serpen-teados de velhas ruas que se hão-de encher de gente como artérias por onde corre a força do imaginário da aldeia em direcção ao mar.

Um dia inesquecível este passado na única aldeia algarvia que se pode sempre ver de cima com o olhar fi-xado na maqueta feita pelas 5.300 horas de trabalho de Pedro Pacheco dos Reis e que se apresenta aos visi-tantes no Museu Municipal de Lagos.

Uma visita imperdível para quem ousar sonhar e deixar-se levar por uma aldeia que do imaginário se faz real e que comemora este mês de Ju-nho o vigésimo aniversário.

Basta passar pelo Museu de Lagos e à escala de 1/200 atrever-se a visi-tar as ruas e as gentes da Senhora do Forte.

Ricardo Claro

Senhora do Forte, uma aldeia algarvia feita da força do imaginário

A Aldeia da Senhora do Forte foi construída por Pedro Reis e doada ao Museu de Lagos

fotos: d.r.

“DANÇA COM CIGANSKI-KIUCHER”15 JUN | 21.30 | Centro Cultural de LagosGrupo apresenta um espectáculo de danças ciganas romanis dos Balcãs e Europa Central, dança cigana russa com xaile, turkish romani (Roman Havasi), fan-tasia Zíngara...

“EXPOSIÇÃO DE ARTE SACRA CREIO”Até 15 SET | Museu de PortimãoUma mostra que reúne cerca de 50 peças de arte com significativo valor artístico e religioso de diver-sas paróquias algarvias, abrangendo um período de quinhentos anosAg

endar

A povoação imaginária, em miniatura, comemora 20 anos

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14.06.2013 6 Cultura.Sul

“DIÁLOGOS LIDOS”22 JUN | 21.30 | Café-Bar Atabai - Barão de São João (Lagos)Serão cultural proporcionado por um grupo de amantes da escrita, antecedido, às 19 horas, pela abertura da II Exposição de Escultura e Pintura, no Largo da Igreja

“OS PESCADORES”TEMPORÁRIA | Museu de OlhãoExposição de fotografias de Luísa Soares Teixeira, acompanhada de textos de Raul Brandão, mostra duas narrativas sobre a cidade cubista, uma fotogra-fada na actualidade e outra publicada em 1922

Visões do real histórico em Lillias Fraser

Lillias Fraser, romance de Hélia Correia, ganhou o Prémio D. Dinis 2002 e o Prémio do PEN Clube Por-tuguês 2001. Lillias Fraser é a prota-gonista deste romance homónimo, uma criança escocesa com o dom ex-cepcional e mágico de prever a morte nas pessoas, pois quando as olha vê--as no momento da sua morte. Este poder vai salvá-la logo nas primeiras páginas do romance, pois assusta-se quando olha o pai e antecipa o seu assassinato. Claro que inicialmente a menina não compreende o que vê e aí há uma confusão ainda da persona-gem, por desconhecimento dos seus próprios dons, que se vão revelando e fortalecendo ao longo da narrati-va, e depois multiplicam-se. As visões de Lillias abrem a percepção do leitor para um tempo em que os véus são demasiado finos, permitindo “pre--ver” o futuro da mesma forma que o mundo do invisível se sobrepõe por vezes ao mundo do sensível: «Acaba-ria por acostumar-se e quando, anos depois, em Portugal, viu abater-se uma cidade inteira, levantou-se em silêncio do enxergão, fechou a trouxa e foi dormir para o jardim, sem avi-sar ninguém daquilo que iria passar--se mais à frente, de manhã. Pensou que, se falasse, criaria um estado tal de confusão que os acidentes come-çariam a acontecer antes de o terra-moto os provocar.» (p.8). Lillias Fraser escapa à batalha de Culloden e é por ver e seguir o fantasma da sua mãe, julgando-a viva, até ao castelo de Moy Hall, um sítio seguro, que a jovem permanece viva para nos contar a sua história. É o fantástico que conduz e salva Lillias ao longo da narrativa. É novamente graças ao seu dom, com o qual aprendeu a conviver, que se vol-ta a salvar no fatídico ano de 1755. Lillias tem um brilho que atrai os ho-mens e intimida as pessoas. A sua sin-gularidade é perceptível físicamente: «Tem os olhos doirados (...) Sinal de que houve bruxas na família.» (p. 43). Tem um brilho de sobrenaturalidade e mistério que irradia em seu redor

por onde passa. Chega a ser motivo de mitos e rumores. Essa luz protege--a inclusive de feras como os lobos, mantendo-os à distância (p. 89).

O verbo ver predomina no roman-ce, bem como a palavra visão ou olhos, por onde se apreende o real circundante mesmo quando Lillias duplica a sua visão, vendo este mun-do e o outro que há-de vir. O doura-do é a cor que reveste e irradia Lillias Fraser, o que reforça assim a sua graça enquanto receptáculo de um dom divino e não do Diabo, como a igreja advogava na época, tal como quando decidiu queimar parteiras e curandeiras acusando-as de bruxas, de forma a deter o poder de curar e

ajudar o povo. Silenciada aquando do episódio da batalha de Culloden por uma mulher, a crian-ça parece gravar esse comportamento para o resto da sua vida: «Fica calada, ouviste? Nunca fales. Não digas nada.» (p. 39). Lillias, no seu mutismo silencioso,

em que muito pouco fala durante todo o romance,

parece assim um símbolo da condi-ção da mulher e da sua passagem si-lenciosa pela História.

As máscaras de Lilias Fraser

Lillias Fraser vai vestindo máscaras e nomes ao longo do romance, como estratégia de sobrevivência, numa retórica de caranavalização. Temos inclusive um momento de travestis-mo, quando Lillias se faz passar por um homem, acompanhando Cilícia, a mulher maternal que a acolhe e protege, como se ela fosse um talis-mã: «Para que Lillias a acompanhasse, Cilícia fez-lhe um fato de rapaz e cor-tou-lhe o cabelo pelos ombros. “Pas-

sas por filho meu. Não abras boca.”» (p. 231).

A estrutura deste romance divide--se em três partes, que correspondem a cenários e tempos distintos: Escó-cia em 1746, Portugal em 1751 e em 1762, terminando num lugar incer-to/utópico. Há um arco temporal de dezasseis anos em Lillias Fraser, livro--personagem que surgiu à autora no seguimento de um episódio biográ-fico narrado no livro, quando visita Culloden, cenário com que se inicia a história. O narrador confunde-se as-sim com o autor, e fala-nos sobre um passado histórico a partir do presen-te, recriando ou reconstituindo o pas-sado numa narrativa que se assume como uma efabulação, onde decor-rem ainda incursões do mágico. A voz do/a próprio/a narrador/a ocorre em diversos momentos: «Estive no cam-po de batalha de Culloden em 1999, a meio de Abril, um dia após as co-memorações» (p. 13). Estas intrusões do narrador servem não só para nos despertar da ilusão de estarmos mer-gulhados numa história que ocorre noutro tempo como para nos tornar conscientes de que toda a História, tal como toda a ficção literária, é uma leitura a partir da perspectiva ou da

moldura do real do presente, em que o leitor se insere. O narrador situa o leitor claramente num contexto pós--moderno, assentando-nos bem os pés na terra mesmo no início do ro-mance, ao falar-nos da sua presença na cafetaria e no museu do memorial histórico, bem como quando refere a existência do site na Internet sobre Culloden (p. 17). Mas, da mesma for-ma que o historiador não pode visi-tar o passado para saber, em primeira mão, como este aconteceu, o narra-dor também não detém todas as pe-ças do puzzle que ele próprio narra. O narrador enquanto instância tipi-camente omnisciente chega mesmo a brincar com as suas próprias limi-tações, numa constante atestação de ignorância: «Se alguém ouviu gemer os soterrados e se benzeu ao despejar os caldeirões, isso não sei.» (p. 139).

E se por várias vezes relacionámos o dom sobrenatural de Lillias com o de Blimunda, que em Memorial do Convento era capaz de ver o interior das pessoas em jejum, Lillias ao che-gar a terras portuguesas encontrar--se-á efectivamente com Blimunda, criando-se assim um inovador e apra-zível jogo de ficções. A descrição que é feita de Blimunda reforça a sua aura de sobrenaturalidade, enquanto apa-rição que emana de um outro mun-do/livro: «A mulher riu. Tinha um tão claro riso que Lillias julgou, por um momento, achar-se rodeada de crianças. No entanto, apesar do seu cabelo, ainda muito escuro, e do seu rosto, liso e moreno, onde brilhava a sugestão de emulsões orientais, vinha dela uma esplêndida velhice. Atravessara o tempo e convencera--o a separar-se dela para sempre. (p. 280). Lillias Fraser, por seu lado, fará também uma aparição especial no romance As Luzes de Leonor (2011), de Maria Teresa Horta. Neste último romance, o nome da personagem é Lilias Fraser, com um l, e parece ter surgido devido a um comentário ca-sual de Hélia Correia com Maria Te-resa Horta, quando se aperceberam que o tempo de ambas as narrativas era coincidente. Esta situação é ex-tremamente curiosa e desmistifica um pouco o processo da escrita em que tudo tem de ter um significado oculto. Aparentemente, Hélia Correia terá pedido à poetisa e escritora Ma-ria Teresa Horta para ser madrinha deste livro, As luzes de Leonor, e em resposta Maria Teresa Horta pediu--lhe Lillias Fraser de empréstimo.

Paulo SerraInvestigador da UAlgassociado ao CLEPUL

Letras e Leituras

d.r.

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14.06.2013  7Cultura.Sul

“A FANTASIA DO CIRCO”15 JUN | 16.00 | Auditório Municipal de OlhãoEspectáculo conta com a participação de grandes artista nacionais e internacionais que farão a delícia dos mais pequenos, como só o circo consegue fazer!

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Precisão no tempo e espaço na Natureza

Quando olhamos para a Natu-reza, parece-nos tudo um bocado desorganizado, mas na verdade ela tem por debaixo da sua pele uma arquitectura tão precisa que por vezes até assusta quando co-meçamos a pensar verdadeiramen-te sobre ela. Mesmo que o Homem plante as suas estruturas na paisa-gem, ela modifica-se e adapta-se criando equilíbrio, para sustentar um sistema. Este equilíbrio é for-mado por padrões que se repetem ao longo do tempo, 365 dias por ano, uma vez que o planeta Terra roda em função da proximidade da Lua e do Sol. Com tanta preci-são no espaço e no tempo, basta

aos fotógrafos aproveitar estes padrões que se repetem de ano para ano para capturar os seus melhores momentos que podem ser antecipados com uma precisão quase diária e nos mesmos sítios do costume. Não quer dizer que possa carregar a mochila com as suas lentes favoritas e partir para a aventura do desconhecido en-contrando aleatoriamente beleza em sítios improváveis, o que será certamente recompensador, mas também pode ser uma perda de tempo a longo prazo e nos tempos que correm, tempo é dinheiro. Já na parte da composição da foto-grafia de Natureza, tentem sempre preenchê-la com elementos inte-ressantes, obriguem o olhar a des-cobrir tudo o que vos apaixonou naquele local que visitaram, per-cam tempo com os seus padrões, texturas, cores e linhas. Em termos de equipamento prefiram objec-tivas grandes angulares, macro e teleobjectivas de grande alcance. Consultem a Meteorologia dias antes, utilizem igualmente um referenciador GPS para cataloga-

rem locais, adquiram galochas e protecções para a câmara e não se esqueçam dos filtros, tripé e

flash para compensar as sombras quando necessário. Agora, façam favor de ser curiosos, investiguem

os padrões da Natureza e pla-neiem as vossas fotografias com antecipação.

d.r.

Espaço ALFA

Mauro RodriguesSecretário da ALFA

Momento

Dream onFoto de Vítor Correia

“MÚSICA NAS IGREJAS”15 JUN | 18.00 | Pousada do Convento da Graça - TaviraConcerto de fado por Inês Graça. A artista tem viaja-do com frequência até ao Luxemburgo, Alemanha e Bélgica, onde tem realizado diversos espectáculos junto das comunidades portuguesas

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14.06.2013 8 Cultura.Sul

Sábado e depois Domingo

Sábado na cidade

Cheguei ontem já muito tarde no dia que já tinha descido rumo a outro sul. Estava cansado. E não aguentei mais que dois ou três poemas de ‘Ob-servação do Verão’ de Gastão Cruz. E logo as pálpebras começaram a ceder nos últimos versos de Anoitecer em Buenos Aires «(…) ainda inexistente no tempo de uma vida/vivendo no espaço que não teve o seu tempo,/e tarde volta do tempo onde não este-ve.» Belo lugar para embrulhar o sono neste outro lugar adormecido (a ‘ve-neza de tédios’ de Álvaro de Campos) bem longe dessa morada de Borges, tão distante como se situasse noutro mundo. E na verdade é lá que fica…

Despertei para a manhã clara ao som de agitadas ‘delichon urbicum’ de asa negra atarefadas nas suas construções. E elas sim, voltam sem-pre nesta estação. Já eu, verdadeiro ‘pássaro urbano’, há muito que não migrava até estas paragens de sul, en-volto nas minhas desconstruções…. Ao sair de casa encontrei mesmo uma andorinha morta sobre o pas-seio. Mas por nenhuma destas ou de outra qualquer razão se acabará a pri-mavera deste fim-de-semana.

Durante algumas horas estarei aqui retido num dolente terraço, obser-vando à volta o casario de telhados de tesoura, recortado sobre um rio que quase ninguém por aqui sabe porque tem dois nomes, ou onde um acaba para o outro começar. Fico remen-dando versos que também tu alinha-rias, se estivesses como eu, nem que por um dia, num lugar como este. Espreito a rua através das frestas da reixa das portas típicas da cidade. As pessoas que passam numa terna lentidão vão, entre parcas palavras, respirando desse ar impregnado de salmoura.

Percorrendo o corredor de volta para a cozinha deparo-me com essa coluna de madeira já tão antiga. Paro. Resto-me a observá-la como se nun-ca tivesse reparado nela antes. Saben-do bem, tão bem, que ainda eu era muito pequeno e já ela existia aqui na casa que herdei dos meus avós. Quan-tos anos terá? Ou quantos anos terei? O que é a idade… e a antiguidade? Nem somos o que temos, nem temos o que somos. E cada vez sinto mais

que quero ter menos coisas. Cada vez menos quero ser mais coisas. Neste mundo sem idade podemos perder--nos e contradizer-nos, que ninguém quer saber.

A quadrícula da janela que dá para o quintal da vizinha mostra-me um jacarandá livrando-se das suas violá-ceas flores em campânula, lançadas displicentemente em voo planado rumo ao chão, tornando-o peganhen-to. Assim impregnando estes os úl-timos dias primaveris do seu aroma doce e melado. 

Mas saio de casa, na tentativa de descobrir novos sons e diferentes to-nalidades de luz. Nada como apro-veitar a manhã bem cedo quando os sentidos estão mais despertos e o bur-

burinho do trânsito e das gentes de sábado ainda não se faz sentir. Atra-vessando a ponte, olho para o lado da barra e pressinto as praias longínquas como o engenheiro de Tavira em ‘A Passagem das Horas’. A brisa surpre-ende de leste. O rio até parece que secou, não fosse lembrar-me que a lua de cheia que está, trará na tarde de logo uma aguada que subirá as margens e se insinuará aos passeios ribeirinhos, donde será fotografado por diversas vezes.

Chego à praça central. Cruzo--me com um homem, não muito idoso, de calcões de cáqui, cami-sa em padrão florido, de máquina fotográfica pendurada ao pescoço caída sobre o peito. Dirige-me um simples ‘good morning’. E no en-tanto reconheço que outras duas

palavras assim tão inesperadamen-te ditas, mais sábias que estas, não poderia esperar. Que um dia bom será sempre o que se pode desejar a um qualquer homem.

Passo sob as arcadas observando os títulos dos jornais sobre a banca, onde um roufenho transístor a pi-lhas compete em ruído com o dis-curso sempre igual dos homens que discutem o sexo dos penáltis da úl-tima jornada. Curvando aí à esquer-da, quase à esquina, entro agora na pequena loja que estranhamente subsiste para cá do tempo, bastando abrir as portas para se afirmar contra todos os que a acham inconsequente, nesta era que passa voraz no caminho da evolução. (Sim!?… mas que evo-lução? Para que novo tempo vai?).

Mas existe. Aqui. Assim sem mais ex-plicações. Não se repita um Porquê? Porque é simplesmente. Só porque há coisas que teimam por ser assim sim-ples e indiscretas. Só por existir por si. É uma livraria assim irreconhecível para os de esta época. Dirão que mais parece um cubículo com livros. Mas o que é uma livraria senão um templo abandonado aos que ainda creem/leem. O que é a literatura senão uma contínua história de emoções des-regradas. E agora tenho os dois pés uns dois passos adentro, pisando o já um pouco gasto chão de ladrilho de Stª Catarina. E estático me fico. Pois um homem dorme debruçado sobre um pilha de livros. Quantos sábios anciões terão tido este privilégio de assim levar um tempo de viver e mor-rer sobre os seus objectos de todos os desejos e suplícios. E que muito bom

intelectual do século XX não o teria desejado para si.

Esta tarde de sábado derrama a sua prostração sobre as ruas duma cida-de já de si presa numa imobilidade remota. Mas essa falta de solicitações impele o transeunte para um ser que é remetido à busca do tempo perdi-do. Que é sempre infligido à memó-ria, mesmo de quem se viu feliz numa era de um dia de um ontem qualquer. Ainda que por toponímias diferentes das dos passos por ora transmuda-dos. Deambular quase que perdi-do. São os olhos que enquadram os pormenores da paisagem, como se fotografassem. Esse exercício permi-te descobrir insignificantes objectos como um catavento artesanal, ou um espanta-espíritos, que poucas pessoas

reparam no movimento dos dias so-brepostos. Coisas que não existiam antes. Para então passarem a existir.

Ao fim da tarde subo à açoteia e oiço o mar de levante. Por vezes a sua brisa envolve a reminiscência dos pomares andaluzes plantados por mouros de antanho. Enrolo um cigarro, e de repente é como se ouvisse uma voz ancestral a can-tar ao sol, acompanhada da flauta celestial de Sérgio Mestre e à gui-tarra marroquina dedilhada por Telmo Palma… Absorvo a emoção num prato de figos frescos. E des-ta vista de este aqui, o mais inopi-nado não é a cor, o odor, o som. Mas no que a visão sendo sempre nítida a todos, será simplesmen-te dissemelhante o que vai no seu discernir ao mirá-la. 

Domingo na praia

Aproveitar o dia. Sair na direcção do mar, nessa hora matutina de quase não-nuvens desfilando livres, em que a luz incandescente da orla marítima não tem igual neste lado do paraíso. Destas penínsulas pro-metidas resta o que não foi tocado pela mão do homem, ou aquilo que ainda consegue por enquanto ficar fora do seu alcance. Como o vai e vem das marés remexendo as areias que formam e disformam línguas, traçando as passagens da corrente. São os encantos naturais o que mes-mo assim resta para o olhar.

Descer à praia. Desejar por tudo um levante que me expurgue num mar morno e espumoso. Impingir o

calor vigoroso deste sol na pele de corpos que se imunizam. Na duna frente ao mar, recebe-se da mare-sia um odor a limos no ar. Tiro os óculos mesmo sem conseguir su-portar o tremeluzir do sol a pino, para ir mergulhar. Ando nas ondas bebendo pequenos goles de água. Saio para a toalha, cabelos ao ven-to, molhados. Fumo um cigarro e deitado na areia começo a sonhar as conchas que quero levar.

Tudo está enfim calmo numa luz dolente. Como se não houvesse ama-nhã. Este dia parece não querer sair do lusco-fusco. As águas estão pa-radas como se a maré não quisesse quebrar esse espelho deitado. Como se a felicidade fosse apenas isto de ficar olhando a tamanha beleza da hora crepuscular, infinitamente…

Pedro [email protected]

Contos de Primavera na Ria Formosa

d.r.

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14.06.2013  9Cultura.Sul

Biblioterapia?

A ideia de associar o livro a uma capacidade terapêutica remonta às antigas civilizações (egípcia, grega e romana), que consideravam as suas bibliotecas espaços dotados de sacra-lidade, um repositório de textos cuja leitura possibilitaria um alívio das en-fermidades – o que revela que a Medi-cina e a Literatura/Filosofia sempre an-daram a par no cuidado com o ser. Na Índia recomendava-se a leitura indivi-dual como componente do tratamento médico e, desde o século XIX, nos Esta-dos Unidos a leitura personalizada em hospitais afirmou-se como coadjuvante no processo de recuperação do doente.

Bebendo quer na teoria aristotélica sobre a catarse, quer nos contributos de vários autores contemporâneos (Proust, Freud, Husserl, Sartre, Merle-au-Ponty, Wolfgang Iser e outros), a partir do século XX surgiu então, for-malmente, o conceito de Biblioterapia. Esta abordagem implica o uso de ma-teriais de leitura que nutram a saúde mental, a presença de um profissional que atue como mediador da leitura e um público-alvo que aceite participar num programa de leitura.

Podem discernir-se, grosso modo, dois tipos de biblioterapia: a clínica, implementada por profissionais ha-bilitados que lidam com pacientes com patologias psíquicas/comporta-mentais acentuadas; e a chamada de desenvolvimento ou evolutiva, aplica-da por professores, bibliotecários, ani-madores e outros agentes não clínicos/informais no sentido de estimular e proporcionar um desenvolvimento (inter)pessoal e uma atualização in-terna harmoniosos a um público ge-neralista à partida saudável.

Falar em leitura com função te-rapêutica não se coaduna com uma visão restritiva da palavra “terapia” (quando vista apenas numa óptica curativa), mas sim com uma aceção mais abrangente e plural. Aliás, o sen-tido primário da palavra “terapeuta” é o de aquele que cuida (e previne). E as palavras, como que dotadas de cor-poreidade, são um dos instrumentos essenciais de modelação, reinvenção e tratamento da psique, pois conven-cem, emocionam, questionam, in-fluenciam, provocando efeitos múl-tiplos, irrepetíveis e surpreendentes, como o poeta Eugénio de Andrade tão bem captou: “são como um cristal as palavras, algumas um punhal, um in-cêndio, outras orvalho apenas”.

A Biblioterapia propõe assim práticas de leitura que proporcionem a interpre-tação ativa dos textos pelo leitor, mo-derando as emoções, permitindo livre curso à imaginação e proporcionando a reflexão, seja pela catarse, humor, iden-tificação, projeção, introjeção ou intros-peção – componentes que são ativadas no recetor do texto literário pela natu-reza ímpar da Literatura, feita de fição, função estética, linguagem metafórica, intemporalidade, universalidade, com-prometimento e literariedade.

A importância do diálogo

Daí também a importância central que é conferida na Biblioterapia ao di-álogo: a troca de impressões e reflexão crítica em grupo, a posteriori, acerca do que foi lido/ouvido/dramatizado é essencial, podendo essa dinâmica ser verbal e/ou através de gestos, de-senhos, expressões faciais, melodias, fotografias ou outra manifestação não-verbal de apreço, indiferença ou rejeição face ao conteúdo apresentado.

É justamente a descoberta de sig-nificado pelo leitor que faz o texto literário se configurar como um cui-dado com o ser, como uma maneira de visar a saúde, pois a criação age como estímulo, afloramento, des-vendamento, apelo, diálogo e preen-chimento de algo que falta no rece-tor – no fundo, como uma retoma e reinvenção do leitor.

O método biblioterapêutico tem sido largamente utilizado, com resul-tados muito relevantes, sobretudo no continente americano, em contextos como hospitais, prisões, asilos, lares de acolhimento, centros comunitá-rios, bem como no tratamento de problemas psicológicos em crianças, jovens, adultos, deficientes físicos, doentes crónicos e outros indivídu-os com dependências várias.

A aplicação da Biblioterapia – ainda pouco visível e consistente em Portugal – pressupõe um estudo e conhecimen-to prévio aturados e sistemáticos dos públicos-alvo, bem como a adoção de uma prática regular e continuada com os grupos em causa. Requer ainda, por parte dos seus agentes, um domínio só-lido, abrangente e atualizado da pro-dução literária disponível no mercado, de modo a identificar/tipificar textos, dotados de potencial estético-semân-tico, que permitam trabalhar terapeu-ticamente tópicos/temas diversificados aos níveis lúdico, reflexivo, relaxante, crítico, onírico, metafísico, etc.

Mas, antes de tudo, torna-se funda-mental que a Biblioterapia se assuma como uma atividade eminentemente interdisciplinar, que deve ser conjuga-da dinamicamente com áreas como a Educação, Medicina, Enfermagem, Psi-cologia, Psiquiatria, Biblioteconomia e Literatura, quer ao nível da formação profissional e académica disponível, quer das intervenções operadas em contextos práticos.

Arte e Arqueologiaentre a objetividade e a afetividade

O diálogo, histórico e permanente, entre artistas e arqueólogos e a, cada vez mais frequente, colaboração de artistas nos projetos de investigação arqueológica leva-me – no âmbito do meu trabalho – a questionar a natureza desta relação, o status do artista para a arqueologia e o interesse dos arqueo-lógos na prática artística.

Ao longo da história, é comum de-pararmo-nos com artistas que se ins-piraram na arqueologia ou que encon-traram afinidades entre os processos criativos e os processos de trabalho da arqueologia. Nos últimos dez ou quin-ze anos, tornou-se frequente, especial-mente no Reino Unido, encontrar ar-queólogos que procuram no trabalho de artistas contemporâneos fontes de informação interpretativa.

De carácter interdisciplinar, o meu trabalho procura, através de uma liga-ção entre a investigação arqueológica e a produção artística, a criação de ob-jetos escultóricos que se aproximem das formas de cerâmica pré-histórica, distinguindo-se destas pela alteração da escala, por uma manipulação ori-ginal dos esquemas decorativos e pela ruptura com a funcionalidade.

Centrada no caráter reflexivo e sub-jetivo da cultura material, proponho o desenvolvimento de novos métodos, menos científicos e mais estéticos, em que o olhar dos artistas pode ser inte-grado na metodologia arqueológica, com vista a desenvolver novos modos de ver e registar, de pensar e represen-tar, de comunicar e expor.

Esta conexão, entre arte e arqueolo-gia, pode ser um campo muito fértil para a criação de escultura contempo-rânea. A partir da investigação sobre os possíveis pensamentos, decisões, motivações e ideias existentes por trás de cada objecto e da reprodução dos respectivos processos tecnológicos, poderá a arte contemporânea (re)en-contrar novas linguagens plásticas, algumas das quais há muito perdidas.

Entre outras coisas, a interface en-tre arte contemporânea e arqueologia pode gerar novas perspectivas sobre o estatuto do objeto, a partir de um novo olhar sobre a cultura material. Um olhar estético que, ao contrário do tradicional e mais científico olhar

arqueológico, não está subjugado ao projeto de explicar o passado, mas ape-nas de o interpretar.

A negociação entre a objetividade versus afetividade (emoção estética) é talvez aquela que ao mesmo tempo pode separar e unir arte e arqueologia num novo paradigma. As questões de afeto estético e beleza, que estão na base da arte, são frequentemente se-cundárias à objetividade do processo

de escavação, documentação, pesquisa, registo, reconstrução e representação arqueológica. No entanto, é compre-ensível que os arqueólogos, nas suas autorizadas auto-representações de mundos materiais objectivos, achem atraente a relação entre artista e arque-ológo, na medida em que ela permite estabelecer, em simultâneo, uma auto-ridade crítica e objectiva, característica da arqueologia, e incluir a componente acrítica do afeto, característica da arte, na perpetuação de uma aura no pro-cesso arqueológico contemporâneo.

Ainda que ciente das diferenças en-tre as disciplinas, acredito que as pro-postas culturais da arte contemporânea podem constituir um instrumento va-lioso para a análise arqueológica, assim como o conhecimento de trabalhos ar-queológicos sobre as culturas passadas se tem, ao longo da história, mostrado revelador para a prática artística.

Neste sentido, penso que ambas as disciplinas podem recorrer à inter-pretação e ao pensamento criativo, envolvendo-se em atos de intuição, re-conhecendo padrões e relacionando observações e ideias previamente não associadas, incidindo tanto na objetivi-dade como na subjetividade, no mate-

rialismo como no idealismo.Não espero que os artistas se tornem

arqueólogos, nem que os arqueólogos se tornem artistas, cada disciplina tem a sua própria agenda. Não obstante, defendo que se podem aplicar os co-nhecimentos específicos de cada uma num trabalho comum, em que as duas disciplinas se justaponham na procura de um espaço e de um diálogo coeso, num contínuo campo de interação

simbiótica entre práticas, numa expe-riência conjunta que ultrapasse a sim-ples visita recíproca.

Tal como acontece com a prática artística contemporânea, a meu ver, é crucial que o trabalho da arqueolo-gia não se limite à análise hermética do passado, mas se envolva também na pluralidade e multivocalidade do pensamento contemporâneo.

Há muito que os artistas compreen-deram que a transgressão das frontei-ras disciplinares e a resistência a cate-gorizações leva a um desenvolvimento disciplinar, visando o crescimento e possibilitando uma ontologia trans-versal.

A interdisciplinaridade leva, geral-mente, à criação de pensamento origi-nal. Rumo a um novo território intelec-tual, a prática interdisciplinar implica assumir riscos, criar rupturas, dar saltos, abdicar, quebrar convenções, renunciar à facilidade de continuar dentro do que é expectado e, claro, do que é aceite.

Penso que, tal como a arte, a arqueo-logia e os estudos patrimoniais podem beneficiar ao localizar-se num campo expandido, num contexto mais alarga-do, que é simultaneamente arqueoló-gico, histórico e artístico.

Espaço ao Património Sala de leitura

d.r.

Sara NavarroEscultoraCIEBA / Secção de Investigação e de Estudos em Ciências da Arte e do Pa-trimónio – Francisco de HolandaF a c u l d a d e d e B e l a s A r t e s da Universidade de Lisboa

Paulo PiresProgramador Cultural no Departa-mento Sociocultural do Município de [email protected]

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14.06.2013 10 Cultura.Sul

ALFA promove concurso para amantes da fotografia

A ALFA – Associação Livre Fotó-grafos do Algarve, em parceria com a FNAC, está a lançar um concurso de fotografia aberto a todos quantos queiram participar. Olhar a Vida é o tema e o valor global dos prémios atinge os 1.500 euros.

Com o intuito de “promover a cria-tividade e a divulgação da arte foto-gráfica”, a ALFA decidiu, assim, criar um concurso de fotografia que se pretende anual e em que a primeira edição termina com a exposição dos trabalhos premiados em Novembro, na FNAC do AlgarveShopping.

A entrega dos trabalhos, associada a um simplificado processo de candi-datura, abre a 15 de Junho e decorre até 19 de Agosto, data em que se co-memora o Dia Mundial da Fotografia.

Para participar há um custo de ins-crição de dez euros e cada concorrente deve enviar cinco fotografias, das quais devem ser obrigatoriamente autores.

Não obstante, os direitos de autor estão salvaguardados e, como tal, os trabalhos apresentados não ficam a pertencer aos organizadores da ini-ciativa. Assim, os registos fotográficos a enviar devem ser reproduções, fi-cando as fotos originais em posse do autor, e serão avaliadas por um júri composto por três elementos.

As reproduções devem ser enviadas para o endereço de correio electróni-co, [email protected].

Prémios totais no valor de 1.500 euros

Para além da natural motivação, e tratando-se de um concurso, há pré-

mios para os vencedores, mas não só. O primeiro classificado do concurso vai ter direito a um prémio no valor de 725 euros, composto por um che-que-compra no valor de 150 euros e 500 impressões A4, que podem ser feitas ao longo de um ano.

Nos mesmos moldes há ainda pré-mios para segundo, terceiro, quarto e quinto classificados, cujo valor dos prémios se cifra nos 330 euros, 165 euros, 57,5 euros e 28,75 euros res-pectivamente.

Há ainda um prémio especial

ALFA - Jovem Talento, no valor de 180 euros, para incentivar a partici-pação de jovens entre os 15 e os 25 anos, prémio constituído por um cheque-formação ALFA no valor de 150 euros, um polo personalizado e um calibrador de cor.

Os membros do júri podem ainda atribuir menções honrosas aos tra-balhos cuja qualidade o justifique.

Para mais informações está dis-ponível o endereço electrónico www.alfa.pt.

Pedro Ruas / Ricardo Claro

Na senda da Cultura

d.r.

Pedro Jubilot lança “Postais da Costa Sul”

Recentemente lançado e rapida-mente esgotado, este foi o destino do primeiro livro de Pedro Jubilot, “Postais da Costa Sul”, que reúne um conjunto de textos escritos entre o Verão de 2011 e o de 2012, entre-tanto divulgados através das redes sociais para amigos e seguidores e agora eternizados em livro.

Pequenos textos ficcionados, escri-tos em prosa poética, que descrevem paisagens e, sobretudo, vivências na costa sul em pequenos fragmentos que retratam a passagem do tempo junto ao litoral.

Editado com o aspecto de um pos-tal, com a horizontalidade caracte-rística da paisagem infinita do mar da nossa costa e escrito de forma es-pontânea, o livro está ainda recheado com fotos de “uma paisagem a que não se pode ficar indiferente”, da au-toria do primo do autor, Jorge Jubilot.

Apresentação com casa cheia

A apresentação do livro decorreu no passado dia 8 de Junho, na Biblio-teca Álvaro de Campos, e, perante uma plateia repleta de amigos, cou-be a Vítor Cardeira fazer as honras de uma obra que faz “renascer a melan-colia dos postais”, pela pena de um autor que “tem público, mas a quem faltava um livro”, sublinhou, sem dei-xar de mencionar que, apesar de se estrear agora, Pedro Jubilot é já “um escritor relativamente conhecido”.

Para Vítor Cardeira, o livro “Postais da Costa Sul” chega tarde, mas ante-vê que deve ser apenas o primeiro

de outros que Pedro Jubilot pode vir a trazer a público, uma vez que diz saber que o autor “tem muito e bom material que deve ser aproveitado e se encontra engavetado”.

Pedro Jubilot, professor e amante de diversas artes, membro da Casa Álvaro de Campos e colaborador do Cultura.Sul, lembrou que a obra agora lançada “não foi pensada para ser um livro”, mas que resultou de um trabalho de pesquisador, “como um caderno de campo onde anotava vivências e paisagens, que publicava quando chegava a casa”, referiu.

No final da apresentação houve espaço para a leitura performativa de alguns “fragmentos” por parte de Manuel Santos e Luísa Teixeira, que deliciaram os presentes.

Pedro Ruas / Ricardo Claro

A primeira edição do Festival Sér-gio Mestre superou as expectativas e juntou miúdos e graúdos, amigos e familiares do homenageado, tavi-renses e turistas, num dia em cheio, repleto de música e actividades cul-turais para todos os gostos, num cer-tame com uma dimensão artística como há muito não se via na cidade.

A organização, a cargo da Associa-ção Rock da Baixa Mar, com o apoio da Câmara de Tavira e de dezenas de voluntários, ofereceu a todos quan-tos se deslocaram à parte velha da cidade, no passado domingo, o que de melhor se faz na cultura nacional, aglomerando um conjunto de even-tos multi-culturais que culminaram com muita e boa música no renasci-do Parque Municipal.

A festa começou logo cedo e num evento dedicado aos mais peque-nos, pais e filhos tiveram no interior do Castelo uma oportunidade para

descobrir sons, músicas e sensações ritmadas que fizeram as delícias dos petizes e respectivos ‘papás’, babados como não podia deixar de ser.

À tarde o cruzamento de artes manteve-se e, antes mesmo das mais aguardadas vozes subirem aos dife-rentes palcos do festival, houve lugar para cinema documental, demons-tração culinária e oficina de danças tradicionais.

No final da tarde, o burburinho nas ruas de calçada vila-a-dentro aumen-tava e as vozes dos fadistas da terra atraíam cada vez mais espectadores e curiosos. Em frente ao Palácio da Ga-leria, Márcio Gonçalves, Aurora Gon-çalves, Anysabel e Emanuel Furtado cantaram e encantaram.

Noite de arromba atrai centenas

Ainda antes do cair da noite e quando muitos já se juntavam para

os inevitáveis comes e bebes caracte-rísticos destes certames, tempo ainda para reunir familiares e amigos numa exposição de fotografia dedicada a Serginho Mestre, que teve lugar no

RefCafé, e onde foram lidos textos do próprio e que serviram de aperitivo para a grande reunião de homena-gem prestes a começar.

Os OrBlua deram início a uma noite

onde a boa música fez jus aos perga-minhos dos artistas que, a solo ou em conjunto, foram subindo ao palco.

A noite fresca rapidamente aque-ceu quando Viviane subiu ao palco. Estava dado o início a um encontro raro, com mais nostalgia para alguns, mas muita alegria para todos.

Seguiram-se actuações de artistas como João Afonso, Filipa Pais, Zeca Medeiros e Vitorino. Todos com es-tórias em comum com Sérgio Mes-tre, num legado musical que marcou gerações.

Entre uma música e um copo de tinto quem melhor que os Marenos-trum para voltar a aquecer um recin-to de onde, mesmo madrugada den-tro, ninguém arredava pé.

Sérgio Mestre foi assim recordado e promete regressar para o ano, uma vez mais, sob a sua forma preferida a música.

Pedro Ruas / Ricardo Claro

Festival Sérgio Mestre agita Tavira

Concurso visa promover a criatividade

Pedro Jubilot

Viviane prestou homenagem a Sérgio Mestre

pedro ruas

pedro ruas

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14.06.2013  11Cultura.Sul

António Rosa Mendes, uma figura ímpar da Cultura

Ao António Rosa Mendes: o narrador implicado

«Gozemos intensamen-te a companhia dos nos-sos amigos, até porque não podemos saber por quanto tempo o faremos. Pensemos também quantas vezes os deixámos para partir em lon-gas viagens, quantas vezes estivemos sem os ver embo-ra morando na mesma terra: compreendemos deste modo que, mesmo estando eles vi-vos, não aproveitámos a sua companhia a maior parte do tempo».

Abro esta rubrica com uma citação das Cartas a Lucílio, 63, do romano Séneca (que viveu há 2000 anos – de 4 a.C. a 65 da nossa era – e que, en-tre outras coisas, foi advoga-do, professor, orador, escri-tor e filósofo), como ponto de reflexão sobre o recente falecimento, a 4 de junho, de António Rosa Mendes (tam-bém ele advogado, professor, orador, escritor e também um pouco filósofo).

À parte pequenas referên-cias em algumas edições, nunca dediquei um número à categoria ensaio – que deve ser a maior parte da minha biblio-teca – talvez por assumir que não teria um interesse tão am-plo entre os leitores deste su-plemento Cultura.Sul, como a ficção e a poesia.

Esta é, pois, uma boa oca-sião para desfazer o equívoco, trazendo uma obra de Antó-nio Rosa Mendes, historiador e ensaísta. Muitas mais escreveu, mas esta, publicada em 2009, na Gente Singular (editora se-diada em Olhão e da qual era um dos sócios fundadores), tem características muito par-ticulares, de História contada com literatura.

Olhão fez-se a si próprio

Há cerca de quatro anos, tive a boa ventura de assistir ao lançamento deste livro, em Olhão, na Biblioteca Munici-pal daquela cidade. A apre-sentação de Fernando Paulo Custódio foi muito entusias-mante e as palavras do autor ainda mais, despertando-me a vontade de imediato o ler. Foi uma agradável surpresa. Normalmente, os ensaios es-critos em português (o mesmo não se pode dizer de alguns americanos ou ingleses) pro-curam apresentar os factos de

uma forma anódina, reduzin-do ao mínimo a interferência do autor, que, praticamente, se anula em afirmações secas e austeras, apoiadas em fon-tes seguras, que o protegem de acusações de infidelidade.

Neste ensaio, António Rosa Mendes não receia possíveis detratores, pois a sua obra é irrepreensível no uso das tais fontes seguras, que são referi-das, quer na Bibliografia final quer ao longo do texto, em pe-quenas notas laterais que faci-litam a leitura de quem se in-teressar por saber mais. E se os romances históricos, obras de

ficção com aparência de Histó-ria (muitas vezes, resultado de sérias buscas em bibliotecas e arquivos), continuam na moda (há uns anos falava-se que iam desaparecer, mas a verdade é que tanto autores como pú-blico continuam a mostrar apetência por saber como terá sido o nosso passado), a história em forma de literatu-ra não é muito cultivada, mas é isso que temos neste Olhão fez-se a si próprio. A escrita de António Rosa Mendes é litera-tura: uma escolha vocabular variada, fecunda e minuciosa, dando conta de pormenores

que nos fazem viver a história e a História; uma poeticidade na prosa; uma intencionalida-de de efeitos no recetor; um narrador implicado, que dá a sua opinião, que se questiona sobre os feitos que está a con-tar e que envolve o leitor nas suas emoções.

Todo o livro é um retrato ví-vido de Olhão, desde quando não passava de «Uma praia e um poço» (cap.1) até à criação do concelho, como se pode ler no «Epílogo. O concelho, tercei-ro separatismo» (pp. 100-104)

Emoção, emoção, emoção

É difícil o leitor não se emo-cionar com este livro. O narra-dor parece que presenciou to-dos os factos, de tal modo nos embrenha nas tramas que vai tecendo, através de uma esco-lha vocabular que nos aproxi-ma das épocas narradas.

Foi difícil selecionar alguns trechos, pois a obra nunca per-de o fôlego, num todo com sentido, numa linha que não se quebra, tal como a vontade do povo aí pintado. Tomemos alguns exemplos do capítulo 6, «A fábrica da igreja» (pp. 26-27), que abri ao acaso. Aqui, entremeando expressões po-pulares («Os senhores cóne-gos ficaram de cara à banda»), pois que populares são os he-róis da narrativa («um bando de míseros marítimos que ou-saram resistir e desafiar a au-toridade eclesiástica e civil»), António Rosa Mendes usa di-versas figuras de estilo que re-alçam o sentimento: sem que tenha necessariamente havido intenção, encontramos rima, dando relevo à afirmação da constituição da freguesia («Do-ravante Olhão, já freguesia, de pleno direito existia»); uma anáfora intensifica a ausência do objeto maior que iria pon-tificar a local («Faltava o prin-cipal, faltava o símbolo maior da jubilosa paróquia, faltava a matriz»); uma prosopopeia termina o capítulo, dando a sensação da crescente identi-ficação da gente com a terra que construíam («e a fachada

já lá estava, orgulhosa e altero-sa, dominando o cenário sobre a praia e as mesquinhas palho-tas ao derredor, encarando so-branceira o mar ao fundo»).

Um narrador implicado

Este narrador não é nem quer ser indiferente, pois assu-midamente implica-se com os documentos que consultou, de tal maneira que discute com as suas fontes, como com Sil-va Lopes (ver a sequência da citação), ou com o engenheiro francês Charles Bonnet, autor de uma Memória de 1850 que escreveu «O algarvio é contra-bandista por natureza», ao que o narrador, depois de o citar, interpela: «Por natureza, senhor engenheiro!? Similar exagero comete Silva Lopes quando, na sua Corografia, de 1841, pretende que os olha-nenses» tiraram proveitos do cerco de Gibraltar, de modo a «‘que em 1790 já tinham trans-formado as cabanas em casas’. Ainda por muitos e bons anos persistiram em Olhão bastas cabanas, senhor corógrafo!» (pp. 44-45). Ou ainda quando Sebastião Brito Cabreira afir-ma em Lisboa que, «‘pelo ver e presenciar sabe que’», em Olhão, não havia «‘tropa algu-ma francesa, e mais não disse’. Viram e presenciaram?! (…) Admitindo que ‘na ocasião’ estava em Faro, viram e pre-senciaram o que em Olhão se passou? Ora, ora…» (p. 69).

Esta vontade de repor a verdade histórica não acon-tece para glória pessoal do narrador: o herói deste livro é o povo olhanense, ao qual o autor não regateia qualidades maiores, como valentia, arro-jo, inteligência, determinação, que levaram a que Olhão se fi-zesse a si próprio.

Na leitura deste livro senti-mos a presença quente e viva de António Rosa Mendes ao nosso lado, parecendo que es-tamos a ouvi-lo com o seu en-tusiasmo e a sua voz impres-siva, tão sua característica. E assim ele continuará sempre na nossa memória.

d.r.

Da minha biblioteca

Adriana NogueiraClassicistaProfessora da Univ. do [email protected]

“COPACABANA - PANORAMAS DO RIO”Até 14 SET | Museu Municipal / Palácio da Galeria - TaviraInserida no Ano do Brasil, a exposição conta a his-tória da evolução e transformação da cidade impe-rial novecentista, ainda de hábitos provincianos, na grande e cosmopolita “cidade maravilhosa” do séc. XX, o Rio de JaneiroAg

endar

“EXPOSIÇÃO DE PINTURA - AFRICANA”Até 26 JUL | Centro Cultural de LagosNa temática e na abordagem a África podemos inter-ligar a pintura de Neusa Negrão na multidisciplinari-dade das vivências culturais e no encontro de civiliza-ções que os portugueses fomentaram no século XVI

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14.06.2013 12 Cultura.Sul

Primeiro andamento: A ru-ína como pretexto – À medi-da que percorre as ruínas, o visitante é levado por perso-nagens históricas que lhe vão contando as suas recordações, e o espaço arruinado é conver-tido em espaço de encenação. O arqueólogo do século XIX, que relata a descoberta do sí-tio; a domina que conduz a vi-sita à casa senhorial; a escrava que conta, nas antigas termas, como preparava o banho da sua senhora; o culto às nin-fas recordado por uma jovem crente. São histórias de outros tempos contadas na primeira pessoa, para descobrir e disfru-tar a villa romana. Até final de junho, o projeto Visitas Ence-nadas, para grupos mediante prévia marcação, é realizado às terças, quintas e sábados (às 10h30 e às 14h30) por um grupo de alunos do curso de artes performativas da Escola Secundária Pinheiro e Rosa, de Faro, numa parceria de estágio

profissional com a DRCAlgarve.Segundo andamento: O sí-

tio como pretexto – O projeto Amatores in situ: o Mundo An-tigo visto pelos que o amam, resulta de um desafio lançado à DRCAlgarve pelo Departa-mento de Artes e Humanida-des da Faculdade de Ciências Humanas e Sociais da Univer-sidade do Algarve. Um ciclo de sessões que têm lugar até final do ano, às terceiras sextas-fei-ras de cada mês, ao final da tarde (18h30), na Casa Rural de Milreu. Tendo como con-

vidados, em cada sessão, pes-soas que amam (os amatores) o Mundo Antigo e a ele têm dedicado parte da sua vida e interesses, o ciclo inclui leitu-ras de excertos de obras de au-tores clássicos escolhidas pelos oradores, e/ou debates subor-dinados a temas da Antigui-dade, procurando dinamizar esse conhecimento no próprio espaço arqueológico, de modo a haver uma aproximação do «dito/ouvido» ao «visto».

Terceiro andamento: A pai-sagem como pretexto – O pro-

jeto Palato (aqui já tratado na edição de abril do Cultura.Sul), parte do cruzamento de pes-quisas no domínio das Artes Visuais, com os conhecimen-tos da dieta tradicional, a ino-vação gastronómica e a inves-tigação ligada ao património

cultural (material e imaterial), Abordando os comportamen-tos de aprovisionamento, con-servação, confeção e consumo dos recursos alimentares e da dieta ao longo do tempo, com um olhar criativo sobre a pai-sagem, o projeto propõe uma

série de ações performativas, Cozinhando na Paisagem, em monumentos onde a informa-ção sobre o território envolven-te se traduz no conhecimento da dieta de época e no seu cru-zamento com comportamen-tos de consumo e distribuição da sociedade contemporânea, procurando valorizar fatores paisagísticos e patrimoniais. Já no próximo sábado, 15 de junho, numa infraestrutura improvisada, o artista (Jorge Rocha), em conjunto com um investigador do monumento (João Pedro Bernardes), desen-volverá uma acção performa-tiva num formato talk show. Cozinha ao vivo, com trans-missão em directo na internet, colocando os públicos (físicos e virtuais) em sinestesia.

Direção Regional de Cultura do Algarve

O passado em cena, ou da convivência da contemporaneidade com a ruína antiga

Espaço cultura

Três conceitos distintos aproximam o visitante aos processos de transformação e mudança dos espaços, do sítio e da paisagem na villa romana de Milreu, em Estoi. Numa fusão entre o ensino, as artes performativas, a gastrono-mia e o conhecimento dos autores clássicos, converte-se a ruína em plataforma temática ligada à cultura e à criação artística, que pro-cura também promover a coesão social

d.r.

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