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  • iNSTlTUTO HISTRICO E GEOGRF;CO DE PIRACICABA

    DlRETORlA (2002 , 200'1

    Curr.prinoo a Lei Ml.Inicpaf n~ 2.150 de 18 de dezemblo 00 1974, edita a SlJa

    11" Re....is!3 do lHG?

    Prcs.oonle P.ALi,)UMONT r.'08RE FERRAZ

    V;,:ePresidente ?AUlO CELSO BASSETTI

    l' Secreliuio RUY NORBERTO OEHUAEYER

    COSI;, 2'Senelrio

    CEcLlO EUAS NETTO l' Tesoureiro

    FLV,O RIZZOlO 2~ Tesoureiro

    \'VALDEMAR ROWANO

    Ofa0L">f

    ANTN:O HENRiQUE DE CARVALHO

    COCENZA

    Bibliolecria

    MARlYTHEREZ!NHA GERMANO

    PEi e

    GeolllilC(! de Piradcaba

    Ano Xl. 2004 Nmero 11

    o IHGP UfI'1;;1 publicao do Insll!u!o Histrico e. Geogrfico de Pira6:aba

    INSTITUTO HISTRICO E GECY"..R.FICO DE PIRACICABA CIWJ 50.853.&78000 148 Rua do ROS;;IO, 1S1 134001S0 PiwcicatmSP BraSil Telelone: (19) 3~3'::811 E'lrai!: Ihgp@-i,gcom.br

    EDITORAO E IMPRESSO Grfita e Edirora Oegaspa:i R BaliJO de Piraclcamirim, i925 Fone/Fax: {19}3433 0 6746 13A16-15O PiracicabaSP Emau: graf;c~f:!spari@le:!f;:u:om_br

    INSTITUTO HISTRICO E GEOGRFICO DE PIRACICABA

    Sumrio

    +- Antnio de P~ldu Primcirns Eleies Computndoriz.ldas no Brasil ................... '""' .... 28

    Frederico Pimentel-Gomes

    Sitlos Arqueolgicos de Pracic:ib:l e Rcgi50 ""..........,...." ........ ".. 29

    Pedro Chiarfoi Nela

    '" Fonna;10 Profissionnl no Contcx!o dn GlobaHza.lo" ..... ,""..... " .. 33 Jaime Patricio Sepu/veda Figlleroa

    lvaro Paulo Sga .... ,. ................... _......... , ... ., ......... " .............. " ....... 40

    Francisco de ,Issis Ferraz de ,Hefla

    '" Cidades Histricas do Vale do Paraba ........ ,"'".... "." ............. 0 4.3

    Joo Llls F}'(l!fclti

    " Piracicaba no Ah'otCcer do Sculo XIX - Memrias dn Rua do Porjo e de lima Chamin Solil,rla , ............... "._ ._............ , .. 48 Hugo Pedro earrar/ore

    ... A lmportl\cia da Imigra50 Japonesa na organiza:io do Espao Geogrfico Piracicabano .................................... " ..... ., .................. 54

    'fi .Uaria Dall'fr de Souzer Dezrm

    +' O Cunml: Manjfcswo Fo!c1rkn Caipira dn Regifio de Piracicaba e a Rcprcscnta50 Social na Era da Globnli7..a50 ..061 Dilw" Castilho e Wenceslau Castilho

    * O EllSillO da Gcograin COlltribuindo pmn n Inscrfio da Educa;10 Ambiental no Ensino Fundnlncntal ............... ,,, ........ 70 Rena/a Cltiori/li Alves Bueno

    Cap'l: Ali Papel" Comullica.Jl0, Impresso c Papclarhl. Fone: 3434~5758

    http:GlobaHza.lomailto:Ihgp@-i,gcom.br

  • ANTNIO DE PDUA (TOTE), O fiLHO DO RIO

    PIRACICABA

    Marly Therezinha Germano Perecin 1

    Resumo Antnio de Pdua (Tote), foi o mais popular dos

    piracicabanos beira rio, o mais conhecido morador do Largo dos Pescadores e da Rua da do Porto. Faleceu h dez anos (11/01/1994), deixando imensa saudade naqueles que o conheceram de perto e o admiravam. Em vida foi pescador, operrio metalrgico, seresteiro e poeta. Eximia nadador, c ,nhecedor de todos os segredos do rio Piracicaba, foi quem r;,ais salvou vidas de afogamento na Rua do Porto e quem mais prestou servios no recolhimento de corpos dos afogados. Guardava uma f inabalvel no Divino Esprito Santo e nos poderes milagrosos da sua Bandeira. Mas, causava admirao o seu desmesurado amor pelo rio que o viu nascer, crescer e morrer. ..

    guisa de Introduo quero aclarear as expresses utilizadas neste texto: Caipira e Cultura Caipira. Por Caipira, entenda-se o habitante do interior da Capitania de So Paulo, durante os sculos XVI, XVII e XVIII, em correlao ao Caiara, habitante do litoral. No guarda a menor relao semntica com o imbecil, o atrasado, o mendigo, o roceiro ou a figura estereotipada do Jeca Tatu. O verdadeiro caipira da Capitania de So Paulo foi o produtor de uma cultura regional especfica, a Cultura Caipira, conquanto povoador em expanso no Planalto Paulista, tornou-se portador da civilizao que lhe deu o nome, embora como agente social estivesse sujeito dinmica das transformaes ao longo dos sculos posteriores.

    1" Ex~Presidente do IHGP e Doutora em Histria pela USP.

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    Restaram, no sculo XX, os chamados Lenis de Cultura Caipira (Antnio Cndido) ou os seus Bolses (Ada Natal Rodrigues), em todas as reas brasileiras de antgo povoamento paulista, das quais o Vale Mdio do Tiet, com seus importantes afluentes como o Capivari, o Piracicaba e o Sorocaba, conservam marcantes vestgios. Portanto, h letrados e iletrados, brancos, negros e caboclos, santos e doutores que se manifestam portadores de traos daquela cultura e que passam por caipiras, muitas vezes, a contragosto: outros carregam a expresso por bairrismo ou interesse. Para os leigos, venho esclarecer que no h nada, absolutamente, de pejorativo em dizer-se caipira, muito pelo contrrio. Neste ensaio, a respeito da cultura dos antigos piracicabanos, fao algumas consideraes sobre a sua importncia no processo de construo da nossa identidade cultural, enquanto esboo uma homenagem a Antnio de Pdua, Tote, um dos seus mais dignos representantes no sculo XX.

    UM DIA ... Numa tera-feira, 11 de janeiro de 1994, um pesado

    esquife, coberto com o pavilho das 13 listras da me-terra paulista, sobre o qual descansava a bandeira simbolo do Divino Esprito Santo, deixou, solenemente, a velha morada do Largo dos Pescadores. Levava, em seu funreo receptculo, os restos mortais da memorvel figura piracicabana, Tote, no rumo da sua ltima morada, o Cemitrio da Saudade. Na partida, o cortejo percorreu a avenida Beira Rio, propiciando a derradeira experincia daquele que, em vida, foi o cone da Rua do Porto e da cultura caipiracicabana (ou seja, a antiga cultura paulista de Piracicaba).

    Senti o que parecia se confirmar nas expresses fisionmicas dos seus amigos, gente annima, de todos os matizes, representando o que de mais expressivo havia no povo piracicabano. Naquele mesmssimo instante, percebi que se virava uma das mais belas pginas da Histria de Piracicaba e que se enterrava com Tote a parte mais afetiva da memria do rio.

    Partia daquela morada simples, implantada no primeiro segmento da antiga rua do Picado (a Rua Moraes Barros), aquele que em vida tanto amou as tradies cultu

  • rais paulistas; que alimentou pela intuio um verdadeiro laboratrio de sociologia e folclore; que coordenou com carinho e zelo as mais belas festanas da cultura e das tradies caipiracicabanas, Os seus tesouros, nesta vida, foram a dedicadssima esposa, Maria Vitalina, o filho Valdir, a neta Dbora e a bisneta Jssica, Entre os seus poucos bens materiais, inclumos a casa humilde, a famosa coleo de canivetes, os passarinhos, o caderno de versos (era poeta) e a Bandeira do Divino Esprito Santo - histrica e milagrosa,

    Tote era homem de vida simples, negligenciava a camisa e os sapatos, dispensava quase tudo, exceto a gentileza e a cortesia com que acolhia aqueles que o procuravam, Por ser um referencial na rua do Porto, muitos o visitavam por mera curiosidade, outros por verdadeira amizade, de forma que, para no faltar a sagrada hospitalidade caipira, a porta e a janela da sua morada ficavam permanentemente escancaradas, Um pouco dado glutonaria, apreciava muitssimo as rodas de samba (o samba paulista), as modas de viola e o repertrio dos trovadores. Mas, a cada instante, extravasava a sua paixo pelo rio Piracicaba, que conhecia na palma da mo, acima e abaixo do espelho d' gua. Foi pescador, entre os melhores, e exmio nadador. Incontveis foram os casos em que salvou de afogamento os incautos que se arriscavam nas guas do rio. Ningum retirou das grotas do rio tantos corpos de afogados quanto ele. De tanto circularem verses a respeito das suas faanhas, transformou-se em mito, ainda em vida,

    Quando, a meu pedido, passava a contar os antigos causos, as memrias da sociedade a que pertencia, os episdios vividos na infncia e na juventude, caprichava descrevendo os confrontos dos valentes, os desafios com a policia e as cenas passionais que presenciou ao longo da sua intimidade com a Rua do Porto. Era uma enciclopdia sobre o rio, suas coisas e sua gente. Consultei-o, inmeras vezes, quando estava escrevendo o meu livro Ypi (Maria dos Anjos), romance histrico, propedutico fundao de Piracicaba.

    Certa vez, Tote confessou-me que a sua primeira preocupao, ao levantar-se da cama, a cada manh, era acorrer janela da sua casa e observar o rio Piracicaba, Queria, diariamente, certificar-se de que ele ainda l se achava, como

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    h milnios, devendo assim permElnecer, enquElnto os homens maus o deixarem e os bons no o salvarem. S depois de conferir a paisagem encantada, comeava o seu dia, feito de simplicidades e muita prosa.

    Bom lembrete para a sua biografia dizer que foi operrio da MAUSA, e dos bons. Teria desfrutado da sua aposentadoria, no cultivo da paixo pelo rio e pelas coisas piracicabanas, no fosse a enfermidade que o levou, aos sessenta e seis anos. Enfrentou o seu calvrio no hospital, por muitos dias, at s 5h30 da tinda manh de 11 de janeiro, quando expirou do corpo cansado. Era um homem de f inabalvel, ardente devoto do Divino Esprito Santo. Sabemos que nem sempre foi compreendido pelo que fazia, teve as suas quizlias e os seus desgostos. Mas, partiu para um novo Tempo e uma nova Vida, leve como pssaro, talvez, levando na boca o sabor dos peixes do velho rio e na alma a sensibilidade dos versos escandidos, ali mesmo, junto ao Largo dos Pescadores, a cavaleiro do Piracicaba.

    A imagem materna sempre foi muito forte em suas lembranas. D' Antnia Malagueta de Pdua falecera em 1957, aos 49 anos de idade, deixando o filho nico, que lhe guardou amor filial, sofreu imensa saudade e lhe dedicou muitos versos conservados num caderno de poesias. Com o consentimento da esposa, gravamos parte de uma delas A minha Mezinha: Mame quanta saudade,! Hoje sinto da senhora! Mais passo hora rezando! Aos ps de Nossa Senhora! Pedindo para uma santa! A outra santa ajudar! Que ilumine todos os caminhos! Por onde devo passar ...

    o CIDADO A morada de Tole acabou se tornando ponto de visita

    obrigatria dos intelectuais e dos admiradores da natureza, junto Rua do Porto; ainda, dos vizinhos e das velhas amizades o que restava da folclrica sociedade do rio; dos antigos bardos e menestris caipiracicabanos, conseqentemente, dos profissionais da TV e dos turistas. Buscavamna, oportunisticamente, os polticos em perodos eleitoreiros, naqueles momentos crticos da caa aos votos. Tole recebeu muitos tapinhas nas costas, e, at, promessas de tratamento mdico, mas, no se deixava iludir; conhecia de sobejo o corao dos homens e as suas veleidades. Extrema

  • mente hospitaleiro, recebia todo o mundo em sua sala de visitas, degrau abaixo do nvel do Largo, cho de cimento e dotada da particularidade do mobilirio de tijolos vista, assim construdo prova de enchentes, para no desgostar Maria Vitalina, que reclamava das invases peridicas do rio.

    Tote era um homem calmo, tranqilo no falar, bem humorado. Tinha, l, as suas manias, uma delas, de arrepiar, porque extraa os prprios dentes com canivete! No entanto, era sensvel de corao, capaz de comover-se, at s lgrimas, em ternura, pelo seu rio ou ralar-se de saudades da sua mezinha e do outro filho falecido na infncia. Nos ltimos anos, no deixava o seu posto, junto porta da casa, observando o Largo dos Pescadores, guardando o rio Piracicaba; correspondia a todos os que lhe acenavam da rua. Muitas vezes, aps as minhas andanas pelo parque da Rua do Porto, adentrei a sua morada para longas prosas e, ali, acabei conhecendo os seus familiares, os seus amigos, os grandes cantadores, entre eles, os Irmos Bueno (Abel, Antenor e Joo).

    No raro, levei para conhec-lo personalidades do mundo intelectual, que foram recebidas com a maior deferncia e sentaram-se em sua sala. Um destes foi o socilogo Valter Carvalho, que to bem o soube compreender e do qual se tornou amigo e inconteste admirador. Nunca o vi rancoroso, mas era respeitado pela sua valentia, sendo notrio que, num enfrentamento pra valer, derrubava de nove a dez contendores. Conheci-lhe o lado lrico, o corao enorme e meigo, o lar hospitaleiro, compartilhado com uma admirvel mulher, mida, forte e trabalhadeira. Tote foi o ltimo dos genuinos caipiracicabanos, o smbolo da Rua do Porto e da sua antiga cultura.

    Pude testar-lhe o amor por Piracicaba e o seu civismo, por ocasio das festividades de Primeiro de Agosto, promovidas nos anos de 90, 91 e 92 pela Comisso de Eventos Cvicos. Por trs anos consecutivos, realizvamos uma aula de Histria de Piracicaba, ao vivo, com dezenas de atores voluntrios caracterizados de personagens das diversas fases da evoluo da cidade: vivenciava-se a fundao, o traslado para a margem esquerda, a subida esplanada da Matriz pela rampa do Picado de Mato Gros-

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    50. A Diocese de Piracicaba prestigiava a iniciativa, atravs do Monsenhor Jorge Miguel Simo, presente no ato da margem direita (a fundao da comunidade), do Bispo Diocesano, D. Eduardo Koaik, que, pessoalmente, celebrava Missa na Catedral, aps o ato do encerramento do desfile histrico.

    Tote, por sua vez, participava da cerimnia do Largo dos Pescadores. Bastava a sua presena consagrada e histrica, mas fazia questo de homenagear a cidade aniversariante interpretando composies suas. Em 1992, reuniu outros menestris, entre eles, o querido Cobrinha (Vi trio ngelo Cobra), famoso seresteiro piracicabano. Nunca deixava de retribuir alegria ou civismo com a sua forte emoo.

    Certa feita, recebi das suas mos o presente valiosssimo, que me acompanha vida afora, em palestras ou visitas culturais, - uma legtima, mas, destroada, Bandeira do Divino Esprito Santo, que meu marido restaurou. Foi esta bandeirinha caipira que serviu de modelo ao estandarte aristocrtico que tremula na Casa do Alferes e na Matriz de Nossa Senhora da Candelria, em Itu, a capital histrica dos paulistas do Vale Mdio do Tiet. Atravs dos sculos, a fora viva da f ali se manteve e ela j se encontra carregada de fitas, ex-votos dos ituanos por graas alcanadas, enquanto percorre anualmente as ruas da cidade nas procisses de Pentecostes e Corpus Christi.

    Falar de Tote trazer baila a Festa do Divino Espirito Santo de Piracicaba. Na tarde do Encontro, Tote e o seu grupo folclrico abriam com brilhantismo as comemoraes no Largo dos Pescadores. Nos dois ltimos anos, quase no podendo andar, regia a festana sentado, enquanto o povo apreciava as evolues do folclore, a destreza dos bailarinos no samba de roda, no samba de leno, na congada, na cana verde ou na afinao da cantoria. Era um expert, nada se concertava sem a sua regncia, mesmo entre os mais e)(perientes e veteranos do grupo.

    Pena! O Largo dos Pescadores acha-se vazio da sua presena fsica. Machuca o corao, tratar do nunca mais!

  • o CONHECIMENTO DO RIO E DOS SEUS ATRIBUTOS

    Acompanhada por Pedro Chiarini e Tote, em 1991, fiz um passeio memorvel aos arredores do Vaivm e do Salto, do qual restaram alguns apontamentos. Acostumada por meu pai, Nestor Soares Germano, desde a infncia, a percorrer com respeito religioso o parque da Rua do Porto, confesso que se haviam infiltrado no meu imaginrio figuras de linguagem que se converteram em mistrios intrigantes.

    Por que se diz Praia das Vacas ao afloramento diabsico entre o Salto e o Vaivm? - Tote respondeu-me que, nas estiagens, os animais do Palacete Boyes iam al se apascentar. - Por que to perigoso pescar ou caar cascudo na itaipava do Vaivm? - Tote explicou-me que nas anfractuosidades do estrado pedregoso do rio formam-se as incontveis tocas de cascudos. O perigo est em prender o p numa delas ou escorregar e acabar caindo no canal, que profundo, nele escorrendo as guas com grande velocidade, mesmo na estiagem. Nos limites do Vaivm, a grande itaipava abaixo do Salto (itopava, dizia ele), fica a Boca, local situado a cavaleiro do clebre Poo (o poo enfeitiado!). Trata-se de logradouro perigoso, estratgico, timo para pescar dourado, quando o rio era limpo no passado. Naqueles tempos, nem era preciso esperar pela piracema, bastava se situar na Boca, lanar uma poita (um peso) no fundo do rio para prender o barco e aguardar, havendo por retaguarda, o formoso Salto; em frente, a Rua do Porto e sua graciosa curva. Como havia muito peixe ruim que atrapalhava a pescaria, era s ir selecionando, at o dourado fisgar!

    Pescar na Boca podia dar sorte e render, mas a correnteza que apanha o pescador, bem no centro do rio, pode arrast-lo para o Poo. Minha imaginao sempre teceu mistrios a respeito do poo enfeitiado: E, al, o que existe?

    Nada de mais - respondia-me. Apenas um paredo e um banco de areia.

    Encafifei-me. Pode? Sei que no pouco, pois abaixo do nvel d' gua, levanta-se a prumo um negro e sinistro paredo de pedra. Forma-se o rodamoinho ou jupi, movi-

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    menta perigosssimo das guas que tudo sugam para baixo. L no fundo s existe mesmo areia, mas, quem cair neste poo, e no for de complexo muito forte, se no souber nadar como peixe, estar para sempre perdido! Todo aquele que for arrastado no turbilho acabar regorgitado nas imediaes, mas ser tarde demais.

    O rio devolve o corpo sem vida! acrescentava Tote, que tantas vezes resgatara os afogados da Rua do Porto. Justamente, em funo deste perigo, todo o cuidado pouco, para quem deseja pescar, remar ou nadar nas imediaes.

    Quem no nasceu ontem, sabe das fabulosas piracemas do rio Piracicaba, at coisa de trinta anos. Sabemos que, por cento e cinqenta anos, a sociedade da Rua do Porto viveu em funo do rio e dos seus frutos. Sou filha, neta, bisneta e trineta de pescador, mas solicitei ao Tote que me explicasse, rapidamente, a metodologia pesqueira, aplicada in loco. Aqui seguem algumas dicas, de quando o rio era cheio de vida.

    Dourado se pescava de vara em rodada, manhzinha ou ao cair da tarde. O barco ia descendo, lentamente, a Rua do Porto, enquanto a isca se achava preparada no anzol. Bem sei, era a pescaria predileta do meu pai! Podia-se pescar de barranco ou de vau. Neste ltimo caso, entravase n' gua altura do joelho, usando-se a vara. Piracanjuba se fisgava, tendo coquinho (fruto) por isca. Podia-se tarrafear, mas era proibido porque a pesca se tornava predatria. Bom expediente era servir-se do pindacuema. Tratava-se de um bambu fincado no barranco, o qual sustentava uma corda, em que se afixava o anzol isca do. Um sino, preso ao bambu, tocava quando o peixe era fisgado. Bastava deix-lo n' gua, at o dia seguinte, ou ir busc-lo para a janta, se havia pressa. H variaes sobre o pindacuema, mas o modelo bsico este. Outro mtodo a pesca de espinhei, que requer muitos anzis iscados e afixados ao longo de uma corda comprida que atravessava a largura do rio.

    Pescar na Rua do Porto e no Salto, nas dcadas de trinta, quarenta e, at, cinqenta, era um xtase para os amantes da natureza, uma festa para os aficionados, conquanto um exerccio vocacional de piracicabanismo e um ofcio profissional para quem vivesse das ddivas do rio. Justamente por isso, poucos rios so to amados pela sua comunidade.

  • AS DDIVAS DO RIO Naqueles tempos, a natureza era farta e grandiosa,

    associando vida e beleza, Havia cento e cinqenta anos que o rio Piracicaba, de rara piscas idade, alimentava a sua colnia de pescadores e a pequena sociedade local, Estas mantinham-se como um dos frteis e resistentes bolses da antiga cultura, legitimamente paulista, tipicamente do Vale Mdio do Tiet, especificamente piracicabana nos seus modos de ser, pensar e sentir, agir e fazer.

    Pescava-se, divertidamente, no Salto, pois ali se praticava a coleta manual de peixe! Ou melhor, podia-se pescar de guarda-chuva, se este fosse ingls! Porque formavam-se grandes poas, onde os peixes pululavam, ou crregos violentos que os arrastavam, Era s escolher as melhores piavas, as piracanjubas ou os belos lambaris, Havia diversas variedades de mandis (amarelo, choro e mandichinga), de corimbats (uvus e papa-terras), de cascudos (chinelo, pintado, bugio e preto), Era s se servir, resguardando o cuidado para com os ferres dos mandis,

    Havia o bate-bunda, pescaria sui generis, praticada ao cair da noite, Um lampio, afixado na frente do bote, atraia os peixes do fundo para a superfcie, enquanto o movimento infundido com o peso do corpo e a subseqente batida, no piso do barco, assustavam o cardume, fazendo saltar os peixes para fora d' gua,O lenol esticado num varal sobre o barco, servia de anteparo trajetria do salto, vindo cair os peixes no piso, engrossando a coleta. Tal pescaria era rendosa e divertida, dispensando-se as linhas e os anzis,

    Na Rua do Porto havia uns pesqueiros providenciais, Na curva graciosa, junto chamada Casa do Povoador, quase entrada do Vaivm, localizava-se a parada do peixe, Isto porque a fartura era tamanha, dado o afluxo dos cardumes que ali se apertavam, diminuindo a velocidade para lograr encaixar-se no rumo do Salto, O rio Piracicaba era prodigiosamente piscoso! Os ingazeiros beira d' gua forneciam precioso alimento, as gratas e o capim das margens atraiam os cardumes de peixes menores que, ali, se escondiam para dormir, Tambm havia fartura acima do Salto: piavas, cascudos e corimbats,

    Tote conhecia a fundo a morfologia do rio Piracicaba, desde o Salto, at a Barra, no lhe escapando da memria

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    os seu canais, as suas curvas, os seus estreitos, as ilhas, as pedras traioeiras, os poos e os jupis, A nomenclatura pitoresca, desde o Salto, at vinte quilmetros abaixo, fazia parte do seu vocabulrio cotidiano: Moralo, Morro do Enxofre, Paredo do Bongue, Caixo, Ondas, Ondinhas, Corumbata, Pedra Branca, Jatob, etc, Infelizmente, no era to loquaz como eu desejava e, muitas vezes, acabava coadjuvado pela querida Maria Vitalina, que, alm de possuir excelente memria, era boa interlocutora,

    A riqueza deste rio respondia por um modus vivendi e por uma mentalidade caracterstica, Gente afamilhada, morando nas casinhas de fachada para o rio, crianas nadando e aprendendo a metodologia pesqueira com os pais, mulheres que se tornavam exmias cozinheiras, trabalhando os frutos da pesca, Ficaram clebres as fritadas dos lambaris (e vivinhas) e pequiras, das postas de mandis, competindo com os ensopados de cascudos, os assados em telha de barro das carnes preciosas dos pacus, dourados, pintados, os bolinhos das ovas de corimbat e os cuscuzes de peixe, Culinria que se justapunha s delicias da tradio do Oeste Paulista e que no renegava a boa caninha,

    Havia superstio e preconceito para com certos peixes, como o ja, lido por ser o boi do rio; porque a sua carne era mal afamada pela crendice de que produzia feridas no corpo e desenvolvia a temida lepra, Entre a populao desocupada, ao cair da tarde, contavam-se causas e assucedidos, mistrios de assombrao, que nunca subiam esplanada da Matriz, embora fossem de antigo conhecimento da sociedade, Aos contadores de causos pareciam familiares a Mula-sem-cabea e a Inhala-seca, alm dos mal-assombrados da Loca de Pedras, do Vaivm e do Bongue, Ensaiava-se uma cultura local pitoresca e apelativa do sobrenatural.

    Quantos pescadores profissionais, durante geraes, mantiveram as suas famlias com o produto do comrcio de peixe, sado das guas do rio Piracicaba! Ainda assim, sobrava o bastante para os aficionados da diverso, os diletantes da pesca, At 1950, nas ruas da cidade podiamse encontrar moleques vendendo as fieiras ou as cambadas de peixe fresco e no Mercado Municipal as bancas ofe

  • reciam o produto a grosso, mas que se tornava, exatamente, a mais fina das iguarias numa mesa! No h piracicabano que no seja pescador ou que no aprecie a carne de peixe, que no morra de amores pelo Salto ou que no se perca na contemplao da Rua do Porto.

    A Sociedade do Rio Tote participava de uma sociedade singular, curiosa,

    um verdadeiro man para os pesquisadores. Onde os grandes pescadores eram respeitados, tinham status invejvel, a meio da comunidade; o pitoresco corria por conta de certos tipos conhecidssimos, populares. Guardava na memria os seus nomes e apelidos: Pefnia (Estefnia), Firmino Cara-suja, Chico Manduca. Antnio Perdiz, lio Cascudo, Queixada, Mola Fraca, Zico Caramujo.

    Alguns destes me pareceram bem estranhos, como Lazinho do Brejo, residente no Largo dos Pescadores, o qual tinha por hbito receber as pessoas, que lhe batiam porta, com uma foice nas mos. Maria Petua era mulher com fama de valente, porque costumava bater em homens. linha comrcio de peixes, adquirindo o produto junto aos pescadores para revend-lo no mercado municipal, e, apesar de analfabeta, tornou-se admiradora da literatura de cordel e de folhetins, que O'. Antnia Malagueta de Pdua, pacientemente, lia em voz alta. Maria Petua teve um tristssimo fim, vindo a morrer leprosa, deixando, tambm doente, o filho Bigu.

    Em minha infncia conheci alguma coisa deste lado pitoresco, humano, e, s vezes, triste, da Rua do Porto. Desde os quatro anos de idade, comecei a perder-me no encantamento do rio, nos seus entardereceres, nas suas enchentes assustadoras. Ainda repasso as cenas de pesca, as conversas do meu pai e seus amigos, junto aos barcos coloridos e enfileirados na margem esquerda. Revejo as crianas descalas e sem camisa, nadando, os moleques aprendendo a lidar com as manhas do rio, associando a experincia dos mais espertos prpria ousadia nas pedras do Vaivm.

    Conheci muitas festividades, profanas e religiosas: festas de casamento, festas juninas e a maior de todas elas, a do Divino Esprito Santo. Esta era integralizadora, reunin-

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    do a sociedade de massa em Piracicaba, tanto a urbana como a ribeirinha e a rural. Era a maior e a mais importante das celebraes piracicabanas, dado o seu ritual folclrico, em terra ou sobre as guas, os seus componentes histricos e o sincretismo religioso, combinados e manifestos no tradicional Encontro das Bandeiras proporcionado pelos seus marujos experientes, acolitados por pequenos marinheiros cumpri dores de promessas, e anjos. a festa da resistncia caipira ou das estruturas que remanescem

    Ainda nos meados do sculo XX, a fantstica procisso na Rua do Porto afigurava-se a melhor amostragem da sociedade piracicabana, identificando nos rituais do povo e no seu fervor religioso, no seu respeito pela Bandeira milagrosa, conduzida pelos festeiros, o que de mais belo sobrava da civilizao dos velhos caipiras da terra paulista. A isto tudo se associava o estouro das baterias de fogos e dos rojes de vara, a musicaria da Banda do Maestro Peterman, que descia furiosa a rua Moraes Barros, sob arcos de bambus, as alegres rodadas de boa pinga nos diversos botequins, as danas, entre elas o cateret, os desafios dos repentistas e o cururu. Tudo se processando debaixo das soberbas tardes de sbado, no espao que medeia entre o Salto e a primeira curva do rio.

    Forante os festejos do Divino, sei que havia bailes, uns mais familiares, outros menos e que sempre se respeitavam certas regras, antes de se partir para a valentia. Contou-me Tote: -dama do stio no dava tbua (sic). - Desafetos e valentes podiam entreverar-se sada de um botequim, preferindo, via de regra, a arma branca. - A faca nunca falha!, - segredou-me -. Portanto, perigos havia. Isto tudo, para no falar das enfermidades malignas, endmicas beira rio, principalmente o tifo e a maleita, que ceifavam vidas nos perodos posteriores s enchentes. No fosse a Bandeira do Divino Esprito Santo a percorrer os lares, a passar sobre os leitos dos enfermos, a proteger as crianas, que a comunidade beira rio se sentia perdida. Grandes mdicos humanitrios houve no passado, Dr. Alfredo Cardoso, Dr. Samuel de Castro Neves, alm das benzedeiras, mas unicamente a Bandeira salvava.

    Por a se percebe que havia toda uma maneira de ser, de pensar e de sentir, em funo do rio e da cultura

  • local. Era, por sua vez, uma Cultura que, dificilmente, subia a rua Moraes Barros. Os antigos piracicabanos de origem que desciam para desfrut-Ia, levando consigo outros aficionados e raros intelectuais como os professores Roger Bastide, em seu estgio pela USP, Paulo Duarte e Alceu Maynard de Arajo, piracicabano de origem. Joo Chiarini muito pela divulgao desta cultura, pois, l embaixo, tinha grandes amigos, era respeitado e chamado de Professor, deitava lampejos de sabedoria. Era o grande folclorista de Piracicaba. Cresci ouvindo falar desse moleque inteligente que o meu pai ensinou a nadar no Clube de Regatas; posteriormente, nos tornamos grandes amigos.

    A Cultura chamada Caipiracicabana A Rua do Porto recebeu, tardiamente, os benefcios

    da urbanizao. At cerca de trinta anos atrs, jazia semi abandonada dos poderes pblicos, sem calamento nem asfalto. O Largo dos Pescadores era de terra batida, como no tempo das mones do Avanhandava. So relativamente recentes as transformaes que alteraram o velho estilo de vida e o tradicional modus vvend.

    As crianas recebiam pouca escolaridade, bastando algumas luzes no Grupo Escolar Francisca de Castro, alguns rudimentos no exercicio da escrita e da leitura. Os homens adultos se dedicavam lida no rio, poucos se incluam no operariado da Fbrica Boyes ou do Engenho CentraL As mulheres criavam os filhos que j nasciam nadando no rio, limpavam os peixes, cuidavam da bia. Os moradores ribeirinhos serviam-se de um lxico sincopado, enriquecido de gria e expresses prprias, dotadas de fontica ritmada, moduladas aos sons do Vaivm e do Salto. Ainda se empregam expresses idiomticas redundantes, como subi pr cima (o rio) e desc pr baixo (do Salto). Outras soavam estranhas como amarriu (cordo de sapato) e tora (pedao de alguma coisa, fosse rapadura, linha, po l.

    Numa das nossas entrevistas, perguntei ao Tote quais eram os critrios pelos quais se avaliava a valentia de um caboclo na Rua do Porto. - No era no faco - respondeume. - Era pela coragem de praticar a pescaria no Salto. Mas no era pelo prprio Salto e sim, pelo desafio de ter de

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    atravessar, sucessivamente, trs regos perigosos at chegar aos bons pesqueiros. O primeiro, era o rego da Fbrica Boyes; o segundo, era o rego da bosta (que lanava os esgotos do centro da cidade no rio Piracicaba); o terceiro, era o rego da usina Luiz de Queiroz.

    A admirao por um membro da sociedade ribeirinha advinha do seu desempenho em funo dos seus conhecimentos sobre o rio, da sua coragem pessoal, do seu arrojo no Salto e no Vaivm, da sua hablidade de pescador, do seu manuseio com os sonds, as varas de pesca e as tarrafas, do comando dos botes e dos motores. Havia pilo tos e proeiros famosos como o Angelim, que eram solicitados pelos aficionados, a participar das inesqueciveis pescarias, rio abaixo.

    O prottipo desta cultura ribeirinha era o caboclo calado, s vezes dotado de fortes traos inditicos, srio, mas esperto, afvel, bom de papo, quando se sentia vontade, apegado sua religio e a sua f no Divino Espirito Santo. Tote era assim. Respeitoso, escolhia bem as palavras; corts, no deixava de dizer tudo o que precisava ser dito para no falhar a inteligibilidade da comunicao. Certa feita, contou-me uma anedota que devia ser corrente entre os pescadores e barqueiros das imediaes do Largo dos Pescadores, sempre to assediados por aqueles curiosos e forasteiros que desejavam passear de barco. Era sobre um daqueles tipos afetados, delicados e maneirosos, que, ao sentir o barco jogando no meio do canal, perguntou assustadio, ao remador: - O senhor nunca perdeu nenhum passageiro? - Quar". nunca! Quando ele cai pur aqui, nis cata ele na curva: s isper Ireis dia, int o f arrebent.

    Tote tinha alma de poeta, apesar de haver sido preparado pela me para ser pescador. F oi Da. Antnia Malagueta de Pdua que ele dedicou os mais inspirados versos do seu caderno manuscrito. Nos ltimos anos, andava muito fragilizado em razo da enfermidade, amargurava-se com o destino do rio, ralava-se da saudade dos bons tempos, chorava facilmente. Foi entre lgrimas que me declamou a estrofe complementar quela poesia, intitulada, minha Mezinha:

    Mame, at um dia!Em que a morte vier me buscar! Mesmo sendo no infinito! Inda vamos nos abraar.

  • Lgrimas e confidncias de lado, chegamos questo do velho e legendrio Salto. - Ento verdadeiro que o Salto adormece, uma vez ao dia? - Verdade, sem quebra nem falha, s no tem hora pra acontecer- Como pode?Claro que pode. - A fantstica realidade, eu prpria constatei, naquela tera-feira, quando o seu fretro buscou passagem, velozmente, pela Avenida Beira-Rio. O velho Salto dormiu s 16h15, optando pela inconscincia a sangrar de dor ante a perda do filho do rio que partia para sempre. Vi, ouvi e gravei para contar. Exatamente como diziam.

    Ao cair de uma tarde belssima de vero, Tote despedia-se do seu amado rio, da Rua do Porto, do Largo dos Pescadores e da sociedade que dignificou em vida. Os amigos renderam-lhe as ltimas homenagens, as pombinhas da Irmandade do Divino Esprito Santo se recolheram aos telhados..Mais tarde, o Salto acordou para prantear a sua imensa tristeza. Tentei consolar a Maria Vitalina, que ficou solitria com a sua saudade, embora corajosa, soleira da casa vazia. Subi a rua Moraes Barros repassando as minhas lembranas particulares, agora transformadas em memria, daquele que foi o smbolo da Rua do Porto e da Cultura Caipiracicabana.

    Num ficcional improvisado, posso narrar a pressa com que os anjos transmitiram a notcia da sua chegada Corte Celestial. De todos os cantos, acorrendo os velhos amigos que o precederam na Etemidade: os caboclos de ps nus, cabelos escorridos curumim, olhos apertados, pelo tanto de sangue de bugre; os negros, os mulatos e os brancos. No faltaram os representantes da extinta colnia de pescadores e da camaradagem do rio: Angelim, Onofre, Rei, Fermino, Joozinho e Raimundo. Chegavam acompanhados dos tipos populares, Maria Petua, Lazinho do Brejo, dos famosos cantadores, liderados pelo maior dos bardos que conheci, Pedro Chiquito. Muitos analfabetos nesta vida, ombreavam com os luminares da Inteligncia piracicabana: Alceu Maynard deArajo, Joo Chiarini, os dois irmos Diehl: Dr. Jac e o professor Julinho, os dois primos, Jos Maria Ferreira e Valter Carvalho. Admiradores forasteiros tambm se faziam presentes: Amadeu Amaral, Cornlio Pires e Ada Natal Rodrigues.

    Anjos trigueiros, negros, caboclos, cacheados, pixains afinavam os instrumentos e as vozes, acelerando os batu

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    ques para o definitivo concerto. Entre relmpagos e coriscos, voz poderosa houve por comunicar estar chegando o poeta, o Imperador do Divino, o pescador, o operrio, o filho do rio Piracicaba. Pde ocorrer que os anjos msicos se atropelassem com os anjos cantores no instante de decidir sobre o melhor das batidas na congada, do acertar os passos no cate ret ou de apurar os desafios nos versos do cururu. Ele estava chegando na forma astral que melhor se coadunava ao meu imaginrio, a de moleque descalo, sem camisa, a dar topadas pelos seixos da Rua do Porto, desejoso de banhar-se nas guas lustrais. Um ltimo detalhe: estava carregando a milagrosa Bandeira do Divino Esprito Santo e peda, humildemente, licena para entrar.

  • GUISA DE

    PREFCIO

    Nos meus tempos de criana houve uma campanha tremenda feita contra a molstia chamada "amarelo" que atingia a quase totalidade da povoao rural. Basta dizer que, dentre os moradores do meu bairro, apenas um escapou inclume ao exame de fezes.

    Monteiro Lobato, escritor de renome, tomou a si a propaganda contra essa molstia, por meio de um folhetim no qual narra a biografia de um pobre matuto atacado por tal doena. Um mdico casualmente visitou-o em sua choupana e lhe receitou o medicamento apropriado, completando o restabelecimento da sade com a receita de um fortificante, muito usado na poca.

    Com isso restabeleceu-se, comeou a trabalhar com entusiasmo, causando inveja ao italiano vizinho a sua propriedade.

    Enriquecido, resolveu ampliar a propaganda do medicamento. do fortificante "Biotnico Fontoura".

    O folhetim ficou muito conhecido entre os alunos rurais, permanecendo gravado em minha memria, tanto que isso me levou a verter para o Latim. o folheto inesquecvel do incomparvel escritor da lngua lusitana.

    Os leitores, j sexagenrios, que foram meus alunos nos ginsios da cidade, podero entender bastante o latim ali usado.

    Prot. Guilherme Vitti

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  • 1. Guilherme Vitti, scio fundador, Ex-Presidente do Instituto Histrico e Geogrfico de Piracica

    ba.

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    JECA TATU

    Verso Latina feita pelo Prof. Guilherme Vitti'

    JECA, TATU cognominatus, pauper rusticus erat qui domicilium suum in casa herbis tecta habitabat. Cum macerrima atque foeda conjuge, cum palidis tristibusque filiis vitam in aegestate maxima degebat. Incoxatus, tabaci longas fistulas exhauriens, vitam animo fracto traducebat. In silva venari, folia tenera ex palmis extrahere, fructus silvestres legere solebat, sed notionem brassicae stirpem deponendi, quae post domuculam suam erat, non habebat.

    Fluebat prope domun rivulus, in quo pisces parvulos interdum captabat. Hoc modo vivebat.

    Oolore afferretur si quis casae egestatem videret. Non instrumenta, non vestimenta, nulla commoditas. scamnium, criba rupta, sclopetum pessimum tantum ei erant.

    Omnes transeuntes murmurabant: - Quam pigerrimus homo!

    11

    Jeca Valetudo sic infirma era! quod, cum lignaret, in lignarum fasciculum ferendo, hominum risum movebat. Ita inflexus ambulabat, ut si magnam molem pondus ferreI.

    - Cur grandem fascem una non affers? Eum quondam aliquis quaesivit.

    Jeca, barbam sua scabens, respondit: - Non tanti est! Ei omnia tanti non erant. Tanti non erat domum

    reficere, hortum non facere, arbores fructiferas non serere,

  • vestem non reconcinare. Solum aquam ardentem haurire operae pretium erat.

    - Cur bibis, Jeca? Interrogabant. - Bibo memorias admittendas causa. - Ad quas res admittendas? - Calamitates vilae. Tum omnes transeuntes clamabant: Non solum piger eSI, sed etiam ebrius.

    111

    Jeca multa jugera terrae erant, sed ex eis fructum capere nesciebal. Omnibus annis, paucum oryzae et faseoli, ulias curcubitarum sUrpes tantummodo serebat. Circa domunculam suam, ullos porcellos et raras gallinas creabat. Sed sus et aves vitam eorum ordinarent, quod Jeca eos non nutrireI. Qua de causa, porcellus nunquam fareiebat, et gailinae paucum ovo rum ponebanL

    Erat eliam Jeca canis scaber macerque, Joculus cognominatus, comes fidusque amicus. Cui, quod para si ti multi in lumbis erant, multum paliebatur. Etsi animal gemeret, ei tamen Jeca non medebalur. Curnam? Pigritiae, fracti animi causa ...

    Homines, cum id viderent, naso eum suspendentes, clamabant:

    - Quam inutilis homo! Ne quidem canis parasitos extraheret velit l

    IV

    Aquam ardentem bibere et in sole se ponere tantum cupiebat Jeca. Ita canem juxta se habens, horas multa dormitabal. Vitam transire, herbam crescere, casam cadere ei parvi intereral.

    Laborare nolebat. In propinquo, agricola italicus, satis dives habitabat, qui per diem laboraba!. Interrogantibus quare illum vicinum non imitaretur, respondebat:

    - Plantare tanti non es!! Formicae omnia devoranl. - At cum formicae in rure italici vicni non sunt? - Q uia eas destru il! - Cur idem non ag's?

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    Rusticus, caput scabens, per dentes sputans, semper eadem excusatioonem afferebat:

    - Non tanti esl... - Non solum pger est, sed eliam bibulus et slultus,

    omnes ciamabant.

    v

    Quondam medicus, cum ad ejus casam pluviae causa pervensset, miseram lantam miratus es!. Ut ruslcus tam enxsanguem atque macrum vdissel, eum inspciendi consilium capt.

    - Jeca amice, lu in morbo es. - Forsilan sit. Ex capite laboro, lassiludinem inifinilam

    el pecloris dolorem, Qui In tergo reddil, sentio. - Id ipsum esl! Anchilostomyase laboras. - Anchi... quid? - In te pallidus morbus est, intellexistine? Hic morbus

    a mults non distinclus de febri rescidva. Tum nonne febris rescidiva? - Ulique. Islo morbo nomina plura sunt, nam sanguinis

    defectonem, languorem el anmi infirmitalem morbi llius provocai, sed di versus es!.

    Febris rescidiva per Iremorem cognoscitur, nam febris, ad certum lempus semper superveniens, sudorem copiosum provoca!. Qui febris rescidiva laborat, medicamento Maleitosan Fontoura nominato, convalescit, Qui anchilostomyase patitur, anchilostomina Fontoura se curaI. A te morbum depulsurus.

    VI

    Medicus ei medicamentum, anchilostaminam Fontoura Appelatum, praescrpsit, ut sic sorberet: Sex plulas bene mane et, postero die, alteras sex.

    - lta age, bis septimana interposta. Nisi, post duas horas quam medicina adhibita fuit, defaecatus eris, purgativum sorbe. Parem calceamentorum et aliquas lagenas corporativorum, nomine Biotonco, eme, excalceatus ne ambulavers, neque aquam ardentem biberis, ntellexistine?

    - Utique, domine!

  • Sic age, medicus redarguil, domo egredens. Jam non pluil, etdvesfies lanquam vcnus italicus. Ad septimanam redbo.

    - Usque in d tempus, domine medice. Jeca cogitans factus esl. Verbs scentiae non

    credebal, sed postremo, medicinam et eliam parem calceorum stridulorum emi!. Primo magnum damnum fuil, quia omna conculcabat. Ad tempus se assuefect.

    VII

    Ub medicus redivit, Jeca, gratia medcamenlorum Anchiloslamnae et Botonc Fontoura, sals convaluerat.

    Medcus, oculorum amplificatore, rem, quae de intestnis ejus ejecla erat, ei monstravit.

    - Vide, Jeca, Quales vermculos in ventre tuo procreabas! Hi sunt anchilostomi, vermes in paludibus viventes, qui, in pedes penetrando el carnem perforando, ad instestina pervenniunt. Ibi, intestins adhaerescunt el nfirmum laedunt. Anchilostominam medcamentum sorbentes, anchilostomi e ventre tuo exibunt. Calceorum usu, anchilostomi humi corpus non penetrabunt. lia faciens, elle aliqus lagenis corporativorum Botonici, ovis lacteque corroborans, morbus non redibit.

    Jeca ore hianti mirans: - Angeli gratias tibi agant, domine medice! Jeca vero, vermculos in pedes penetrare credere

    noluit. Tantummodo cognito crederet. Medicus eum advertere tentavit. Et cum eum in umidum locum, post domum inferrel:

    - Calceum tolle, stac parum ambula. Jeca ei oboedivit. - Nunc huc veni. Pedem super genu pone. Nunc

    pellem per oculorum amplificatorem inspce. Jeca, nstrumentum inspiciens, nonnullos vermiculos,

    in pellem suam inter spiramenta jam penetrare percepit. Miser obumbratus, maxime oculos aperiens, clamavil: - Verum est, tamen! Quspiam diceri!! - Namque id es!, Jeca, alque in poslerum de scienta

    noli dubilare. -Ita semper agam! Densceps, domina scientia locuta,

    Jeca jusjurandum dabi!! Apage! Nullo tempore aquam ardenti utar, ne remedium quideml...

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    VIII

    Vere, omnia a medico praevisa evenerunt Post tres menses, nem o Jeca recognoscerel. Ad santatem perductus Anchilostomina et Biotonco medicamentis, bellus, ccloratus, fortis tanquam taurus, faclus eral.

    Jam piger non araI. Cum securem caperet, arbores contremiscebant. Pan, pan, pan ... longum pertempus sonus aUdiebatur, el arbores altssimas nullo modo resistere poterant.

    Tum animi plenus, nemus ut solum tribus jugeris exerceret, cecidit.

    Eucaliptos etiam, n campis paludosis statuit, et domum reconcinnavit, el suillam haram, et aviarius gallinarum conslruxit. Homo impiger, sic furiose taborabat, uI italicum vicinum in admirationem traducerel.

    - Paulisper requiesce, amice!. .. hoc modo erumpes ... transeuntes clamabat.

    - Tempus mihi recuperandum est, securem, tenens respondebal. Cupio italico Iinguam occludere.

    IX

    Jeca, Qui timidus fuerat, strenuus vir factus esl. Nihil jam timebat, ne fellem uncam quidem. Quondam, in silvam ingressus, insolitam vocem felinam audivit.

    - Felis unGia esl! Et cultrum nullum mecum porto ... at animum non demisit. IIlam firmiter exspectavit. Cum fera in eum impetum fecit, in rostro ejus talem pugnum impegit, ut bestia, ictus sopita humi volveretur. Jeca rursus progressus, collo percipiens animal, idem extrangulavit.

    - Mene cognovisti, improba! Tum cogitas in infirmum ebrium te laborare? Certor fias a me medicamenta Anchilostominam et Biotonicum sumpta esse, el nunc stridulus calceis uti ...

    Comes illius, cum verba ista audiret, non magis de aliquare scire volens, fugam maturavit...

    Dictum esl etiamnunc bestiam currere ...

  • x

    Olim cun lignarelur, vix Ires ramusculos portabat; nunc subridens,ul si enorme pondus locus essel, fasces virgarum, quae in admoirationem sul adducebant, transferebat.

    - Jeca amice, hoc modo errumpes, dicebant. Ubinam una ferre lantum ligni visum est?

    - Debilis ille jam non sumi Id mihi facillime eSI, rusticus ridens respondebat.

    UI domum incrementum poposcit, eodem modo egit. Tum in silva ingentes arbores secavit, eas scalpsit et inter brachia in domus aream attulit.

    - Vi illius hominis, qui Anchilostominam et Biotonicum mecidamenta sorbuit, stridolosis calceis utitur, ne quidem haustum unum aquae ardentis bibit, arbores convincam.

    Italicus, cum id contemplaretur, caput fricans: - Nisi diligens ero, aiebat, ille veterator me superavit.

    Per Bacchum..

    XI

    Tunc agros ejus contemplari jucundum era!. Aratris el bobus emplis, antequam sementes faceret, terram emolliebat. Unde faclum esl ut oryza el faseoli viridentes pervenirent.

    Italicus miratus, ore aperto clamabat: - Nunquam agros pulchriores conlemplavi. Nunc Jeca paul um, modo anliquo, non serebat.

    Tantummodo lia quam maximam sala cupiebat, ui regionis incolis invidiam incuteret.

    Si quis eum interrogaret cur tantas sementes faceret, redarguebat;

    Quia nunc homo pecuniosissimus esse volo. Totas terras meas colam. Postea, duos fundos ingentes erigam -Fundum Anchilostominam et Fundum Bio!onicum, Imo vero, regionis praefectus ero.

    Et nemo amplius dubitabat. Italicus clamabat: - Et reipsa conde!, et in regione praefectus eriL Per

    la Madonna!... Eo tem pore, cum medicus iIIac transiret, de ejus

    mulatione multum miratus est. Is, spes fuerat, ui convalescerei, sed non adeo.

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    Jeca medicum amantissime excepit, uxorem liberosque ei tradidit. Pueri robusti crescere, ludentes vivere, hilares tanquam passeres. lbi omnibus animalibus calceamenta erant

    Illi rustico tanta tides in calceaments, ut calceis etiam pecora in pedibus utebatur. Sic etiam gallinae, anates, sues, omne pecus gallus, vero, calceis cum calcaribus.

    - Hoc plus aequo, domine Jeca, medicus inquit, quia naturam adversus est!

    - Plane intelligo, nam huic rusticae initum tacere desidero. Huc venientes atque videntes nunquam tabulas obliviscantur.

    XII

    In brevi spatio exitus splendidi fuere. Ita porcorum grex ncrevt, ut multi, eos mirantes, longe pervenirent.

    Jeca autoucurrum emit et, pro more antiquo, sues in emporium cito vehebat via autucurru buccinans: ton-ton ... fon-fon...

    Itinera pessma, sumpto suo, refecta sunt. Jeca dubias santatis jam esse arbtratur. Tantummodo

    emendationes, progressus, res americanae animo sua erant Cito ad lectionem instituit, domum suam libris implevit, denique britannicae linguae lilteratorem accepit.

    - Britannorum sermonem eloqui cupio, Civitates Foederatae Americae visurus, aiebat.

    Magister narrabat: - Nunc Jeca tantum lingua britannica loquitur. Ab eo

    non dicitur sus, sed big, hen ... Nihil de aqua ardenti. Prius diabolum videre, quam

    poccilum aquae ardentis sumere.

    XIII

    Jeca vix fasciculos tabaci sibi specialiter sugebat et, in arabicis equis consessus, agros suos inspiciebat.

    - Quis eum olim vidisset, quis nunc videret! Quantum mutatus ab illo! Peregrinus et in loquela videtur!

    In fundo Biotonico res multae erant: agri fenestellarum, pulcherrima pomaria poma varia habentia,

  • imo vero bombycis procreatio; Jeca sata mororum immensa posuit.

    - Nemo suspitionem habet, quantum malorum hi vermiculi humanae genti molestias deferentes provocanL et pulveratione terabat.

    Hoco modo vitam suam sanando rusticos degit. Cum mortuus est unum de nonaginta annos natus, statuam ejus non posuerunt, nec laudationes in diurnaliis habuit. At nemo eo tranquillissimus mortuus est. Officium suum usque ad mortem fecit.

    XIV

    Pueri, ne fabulae memoriam amiseritis; dum adoleveritis, Jeca imitamini. Cum fundorum domini eritis, colonos sanaveritis, Quod praeter magnum beneficium eis, negotium optimum vobis erit. Labor eorum triplo augebatur. Natio magna est amplitudine, neque incolarum numero, Magna fit labore et genere populi suL Salus, autem populi m''lgna virtus, Ex ea omnia mana!. Sed remedium excellens, tEAibilem pestem tollens, quas manus pretiosas ab labore discedit, Anchilostomina vocatur.

    Ita, medicamentum sanitatis, custos maximus, quod animum, vim et roborem addit, Biotonicus Fontoura nominatur.

    Finis

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    PIRACICABA Ano XI 2004

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  • 1. Frederico Pimentel Gomes, Ex~Presidente do IHGP, Professor Catedrtico da Esalq (aposentado).

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    PRIMEIRAS ELEiES

    COMPUTADORIZADAS NO

    BRASIL

    Frederico Pimentel-Gomes'

    bem sabido que as eleies brasileiras mais recentes usaram urnas eletrnicas e tiveram seus resultados publicados em poucas horas, graas s facilidades de comunicao e clculo disposio dos eleitores e da Justia Eleitoral. Esta situao, to boa para esse importante e essencial funcionamento das eleies brasileiras, teve comeo em Piracicaba, como se divulgou no nmero de outubro do Almanaque de Piracicaba 2002-2003, fascculo 18, pgina 414, publicado pelo Jornal de Piraccaba e pelo Instituto Histrico e Geogrfico de Piracicaba, sob a responsabilidade do jornalista Cecilio Elias Netto. Mas essa notcia ignora a colaborao essencial dada pelo Departamento de Matemtica da ESALQ e pelo Prof. Dr. Roberto Simionato Moraes, utilizando o computador do Departamento (o primeiro chegado em Piracicaba, e o mais utilizado desde sua instalao). Esta omisso deve-se ao fato de que Ceclio se baseou apenas na informao jornalstica da poca, que incompleta. Mas a verdade que sem o Professor Roberto, utilizando o computador do Departamento de Matemtica e o do grupo Dedini, tal resultado no teria sido obtido em 1976.

    de justia ressaltar esse pioneiro da Informtica em Piracicaba e no Brasil, no progresso importante com que nossa cidade e nosso Pas contriburam para as modernas facildades de votao e de apurao das eleies em todo o mundo.

  • STIOS ARQUEOLGICOS DE PIRACICABA E REGIO

    Pedro Chiarini Neto'

    Piracicaba: regio geogrfica propicia para a fixao do ser humano bem antes dos civilizados aqui chegarem e fundarem um ncleo habitacional constituindo famlia. Foi hbitat natural de seres como o indio e at o homem prhistrico.

    Comprovar isto fcil e, ao mesmo tempo, difcil. Porque?

    A sanha e ignorncia, falta de divulgao informativa ou a pressa de se enriquecer monetariamente ou politicamente, aliada ao desinteresse dos rgos governamentais, falou e fala mais alto, tornando-nos cegos, surdos e mudos, desprezando a nossa histria, a nossa subsistncia como a nossa sobrevivncia. Porque dos erros do passado que construmos o futuro.

    fato comprovado da imprensa falada e escrita de noticirios ou relatos de boca a boca da descoberta de vestgios da presena do ndio e do homem pr-histrico aqui na regio; igaabas (urna morturia indgena), cacos de louas, pontas de flechas, machado. facas e at anterior a isto.

    Lugar privilegiado, propicio, onde se encontra de tudo: caa, pesca em abundncia, alm de terras frleis de tima qualidade com raizes, folhas e frutos em que se plantando tudo d, com muitos cursos d'gua e aguadas necessrias sobrevivncia e locomoo.

    Terrenos altos e protegidos das invases de gua e propicios a observaes de longas distncias; matas extensas com rvores de grande porte e de madeiras nobres. Piracicaba j nasceu com tudo para ser grande I

    1. Pedro Chiarini Neto Professor e sco Titular do Instituto Histrico e Geograflco de Piracica~ ba.

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    Existia, 2cima da Casa do Povoador, um paredo natural de pedras diabsicas, com inscries rupestres ideogrficas do homem pr-histrico (que viveu antes do ndio) - indicavam onde se ellcontrava alimento. Muitos estranhos e desconhecidos (que devem ter ficado ali por sculos sem que ningum saiba quem os fez). Sinais estes que, se tivessem se tornado pblicos e preservados, atrairiam grande nmero de pesquisadores nacionais e internacionais pra decifr-los.

    Mas... um alc2ide piracicabano mandou implod-Io e aproveitar o que sobrou para a construo da piscina do clube de Regatas de Piracicaba e do paredo de arrimo da avenida Beira Rio. Apesar das explicaes de um professor catedrtico de Arqueologia da USP e do professor Archimedes Dutra, o alcaide debochou de todos os presentes dizendo que aquilo era: arranhaduras de jacar nas pedras para afiar as unhas. Eu estava presente quando tudo isso aconteceu. Tivemos que tirar os moldes s pressas e hoje esto reproduzidos em gesso na Cidade Universitria, em So Paulo.

    Tambm tenho notcia de outro paredo com inscries ideogrficas perto da cidade, mas ... temi torn-Ias pblicas e localiz-Ias para que no fossem transformadas em suvenires.

    Quando menino ouvia-se falar muito nuns bolses de pedras acima da Casa do Povoador para captura de peixes na poca das cheias, que coincidia com a poca da piracema, construdos por nossos antepassados. Tive informaes sobre a oca de pedras, gruta existente no incio da rua Luiz de Queiroz; lugar de bom barro, pedras e prximo a pesqueiro, continha muitos rabiscos (inscries).

    Na poca da destruio do paredo com inscries, o professor da USP nos contou que na cidade universitria, no museu de Arqueologia, existe um dolo de pedra imitando um animal (tigre) encontrado em nossa regio.

    O pesquisador e colecionador senhor Jair Vitti encontrou nas regies dos bairros de Santana e Santa Olmpia vrias centenas de machados, pontas de flechas, facas de pedras, j expostos em vrios lugares.

    Na Usina So Francisco, perto da vila de Tupi, encontrou-se material indgena. Na pedreira perto da ponte de

  • ferro de rtemis, segundo relato do Professor Ansio Godinho, encontravam-se pontas de flechas, facas e o mais, quebrados ou inacabados, talvez um local de fabricao.

    Na fbrica de tecidos Aretuzina, em uma das suas reformas, foram encontradas vrias igaabas, todas destrudas pela crena de que continham tesouros indgenas.Em um posto de gasolina na rua Tiradentes ao cavoucarem um fosso, para inserir um tanque de combustvel, foram encontradas duas: mas a ignorncia imperou mais uma vez, pois, todos queriam levar um pedacinho como lembrana, o que foi impedido pelo dono, que mandou construir uma proteo em volta e cobri-Ias com uma laje de concreto reforado, existente at hoje no local.

    Na regio do bairro Recreio e Tabela, no stio da famlia Boaretto, perto da Usna Costa Pnto, no meio de um pasto, existe uma abertura que a entrada de uma caverna. Dizem os mais antigos da regio que, em 1932, na Revoluo Constitucionalista, trs revolucionrios, fugindo das tropas do governo que os procuravam, se esconderam al.Quando saram, anunciaram na regio que, l dentro, numa das salas exista muito material indgena At hoje no se tem notcia de que algum ou instituio hstricocultural procurou verificar a veracidade.

    O professor, historiador e artista plstico Archimedes Dutra possua uma urna intacta, encontrada perto de seu rancho no trecho do rio Iguau, hoje de posse do Museu Histrico e Pedaggico Prudente de Morais.

    No bairro Marins, no stio do Sr, Antnio Berto, a uma distncia do ribeiro que d nome ao bairro e do rio Piracicaba, regio alta com boa visibilidade, livre da invaso das guas, encontrei uma urna morturia (hoje na casa de minha irm) e mais doze mil cacos de louas indgenas, pontas de flecha, faca, todos pintados ou trabalhados com baixo relevo, o que demonstra um certo grau de cultura da tribo que o produziu, Est hoje de posse do Institulo histrico e Geogrfico de Piracicaba A igaaba por mim encontrada ficou exposta na vitrine do Jornal de Pracicaba e fo motvo de uma reportagem de primeira pgna da edio de 19/10/1956,

    H notcias de que em outros stios dos dois lados do ribeiro Marins tambm foram encontrados vestgios da presena de ndios,

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    Freqentando o rio desde 1945,acompanhando meu pai, Dr. Nelson Chiarini, um pescador inveterado, eram motivos de referncia duas ilhas: Ilha das Flechas e Ilha da Sepultura.

    Porque essas denominaes? Segundo o que consta, no sei se por escrito ou de boca, de gerao a gerao, o relato este: quando os mononenses subiam o Rio Piracicaba em baleles vindos da vila de So Paulo, em direo ao Forte de Igualemi, levando annas, munies, vesturios e suprimentos alimentares, eram tocaiados pelos ndios na primeira ilha - Ilha das Flechas e os mortos eram enterrados na segunda - Ilha da Sepultura. Meu pai dizia que l existia uma cruz de ferro e pescadores encontraram nesse trecho um arcabuz exposto no Jornal de Piracicaba, pertencente ao professor Alberto Thomazi, e uma garrucha com data de 1960, em mos do professor Archimedes Dutra.

    Tambm na margem direita do rio existiam vestigios de uma rampa milenar (antecede a chegada do homem branco Amrica) segundo relato da historiadora e professora Marly Therezinha Germano Perecin em artigo no Jornal de Piracicaba 01/08/2002, no caderno 0-15.

    Quando menino, ainda visitava muito o Clube de Cincias, do saudoso Professor Moacir Dinis, num prdio localizado onde hoje se encontra a escola de msica, na Rua Santa Cruz, que terminou em nada. Seu acervo estupendo, com muito material arqueolgico, ficou tempo sob a guarda do Professor Demosthenes dos Sanlos Correia na Escola Sud Mennucci, inclusive bonecos de barro feitos por nossos antepassados de origem desconhecida.

    A verdade que em nossa regio existiram e existem muitos vestgios imemoriais do homem pr-histrico e do ndio, com vrios graus de cultura, bastando para isso examinarmos o que sobrou desses vestgios, o que ai foi achado e coletado. Isso um alerta s instituies scio culturais e cientficas ou histricas para que conscientizem a populao a no destruir e avisar quando acontecer um achado em um local, para que sejam preservados.

    Tanta prova assim, mereceria at um museu especialmente feito para isso, pois o nosso museu no nosso!Vocs sabiam que o Museu Prudente de Morais no nosso? Pertence a Universidade de So Paulo. Amanh ele pode ser transferido! E da?

  • A FORMAO PROFISSIO

    NAL NO CONTEXTO DA

    GLOBALlZAO

    Jaime Patricio Sepulveda Figueroa'

    Apresentao Com o presente texto, pretende-se encaminhar uma

    reflexo sobre as condies recentes que abarcam a esfera da formao profissionalizante, no contexto das relaes sociais do trabalho na sociedade de hoje.

    A anlise da histria recente da relao da educao com o mundo do trabalho, deve levar em conta o processo de globalizao da economia como um dos grandes determinantes nas transformaes dos modos de produo.

    Os novos processos produtivos modificam as relaes sociais do trabalho, gerando condies que criam novas demandas quanto ao conhecimento que o trabalhador deve possuir para concorrer a uma vaga no mercado de trabalho.

    Assim, pergunta-se: Diante das novas condies histricas para a realizao do trabalho, quais so as mudanas no processo de concepo do pensamento que emerge no mbito da formao profissionalizante, impostas pela globalzao?

    Incomoda o fato de termos uma escola formadora de profissionais que, diante das mudanas do trabalho, ainda pOuco contribui para que o trabalhador reconhea na realidade objetiva da qual faz parte, quais so as suas ferramentas para defender seus direitos e superar a alienao.

    Formao profissional hoje: possibilidades e problemas

    O desenvolvimento tcnico obtido pela inveno da mquina no sculo XVIII, deu inicio ao processo de aliena

    1, Professor de Geogra~ fia pela Vnesp de Rio Claro, com especializa~ o em Histria pela Unimep. Membro Tjtular do Instituto HistriCo e Geogrfico de Piracicaba.

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  • 2. Moraes Neto, Benedlto R de, Marx, Taylor Q Ford. As foras produfvas em discusso. p. 45.

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    o dO trabalhador, na medida em que, ao realizar apenas uma parte da produo de um determinado bem, passou a viver uma relao de estranhamento com o produto final de seu ofcio. 2

    No final do sculo XIX, uma nova forma de organizao do trabalho, o taylorismo, surgiu da utilizao de principios cientficos aplicados aproduo fabril, separando, definitivamente, os processos de concepo e de planejamento da produo, do setor produtivo de mercadorias propriamente dito,

    Henry Ford, na virada do sculo XIX para o sculo XX, cria a linha de montagem, e a fragmentao do trabalho iniciada com a revoluo industrial, negava mais uma vez ao trabalhador o direito conscincia do processo de concepo da produo, do qual faz parte apenas como fora produtora,

    Com o passar do tempo, tornou-se necessrio encontrar, no mercado de trabalho, sujeitos capacitados para a execuo de tarefas especficas dentro do espao fabril, a fim de dirigir as mquinas, Foi assim que nasceram as primeiras escolas profissionalizantes na Europa ainda no sculo XIX, Buscou-se, ento, estabelecer uma formao profissional que buscava ajustar o trabalhador s demandas do mercado, dentro de uma perspectiva produtivista,

    A escola profissionalizante surgiu para dar suporte reproduo do capital, e tornou-se a matriz produtora da mercadoria fora de trabalho, Assim, a educao profissionalizante atua, desde ento, como disciplinadora da mo-de-obra, utilizando uma metodologia que, pode-se dizer, tratou de adestrar as massas urbanas para o trabalho,

    Na escola de modelo laylorista-fordista, a populao passa a ser instruida a fragmentar o conhecimento, o que impede o trabalhador de compreender e de ter dominio da complexidade da organizao do trabalho, Segundo Enguta, a obsesso de fada escola lay/orista eliminar qualquer vestgio de trabalho intelectual ou funes de concepo da oficina, do escrilrio, etc" para constitu-los em monoplios da direo, ou seja, do capital e seus comparsas, ( Enguita, 1993,p,194)

    Desta forma, preciso esclarecer para o leitor que a lgica do capitalismo age sobre as condies histricas de

  • realizao do trabalho, fato que se reflete sobre o pensamento pedaggico que circula nas escolas formadoras de mo-de-obra especializada. Esta mentalidade subordina a educao profissionalizante aos interesses do mercado.

    Hoje, a globalizao da economia em curso, coloca as foras produtoras diante do problema do desemprego. As empresas, na inteno de superar a rigidez do esquema fordista de produo', que compromete o processo de acumulao capitalista, sofisticam-se avanando na eficincia e na agilidade da produo de suas mercadorias, pois se utilizam cada vez mais de modernas tecnologias com grande capacidade de simplificar o trabalho.

    Em sua fase atual, o capitalismo transpe as fronteiras nacionais e pulveriza a possibilidade de colapso generalizado. Milhes de desempregados aumentam, dia aps dia, os bolses de pobreza em todo o mundo. Kurz ( 1992, p. 186) expressa bem esse quadro de angstia das populaes excluidas :

    o jogo do mercado mundial, que absorveu e assimilou todas as outras formas, j no permite que os perdedores voltem depois para a casa em sossego, mas sim est destruindo sucessivamente para eles toda possibilidade de uma existncia digna. Quando esses homens, povos, regies e Estados perceberem que nunca mais tero alguma chance de vencer e que as futuras derrotas inevitveis os privaro de qualquer possibilidade de viver, lanaro, mais cedo ou mais tarde, o tabuleiro no cho e dispensaro todas as regras da chamada civilizao mundial. Essas regras democrticas da razo mundial burguesa e iluminista so em sua essncia abstratas e insensveis, pOis seu verdadeiro fundamento o automovimento do dinheiro, abstrato e privado de sensibilidade, movimento que faz nascer suas leis histricas destrutivas e as executa mecanicamente at o terrivel fim.

    o novo modo de produo industrial, est sendo denominado de modo de produo flexvel, caracteriza-se, ainda, pela busca de novos mercados, novas fontes de ener

    3. Harvey, David. C()ndi~ o Ps~Moderna. p. 136140.

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    gia e pela desestruturao dos sindicatos organizados pelos operrios, na medida em que a produo se especializa em novos setores da indstria, e, principalmente, porque contraIa servios terceirizados, liberando as empresas dos custos e da responsabilidade para com os encargos sociais dos empregados.

    A anlise do desempenho das novas tecnologias que se inserem no contexto da reestruturao produtiva do setor industrial, tem demonstrado que o efeito desse processo, por um lado, eliminar postos de trabalho, porque o trabalho complexo transformado em trabalho simples, fato que diminui o custo com a fora de trabalho, mas, por outro lado, faz emergir novas necessidades dentro do espao da fbrica: apesar de reduzir a massa operria, exige-se do trabalhador, uma maior capacidade de abstrao e de reflexo sobre os processos produtivos.

    Neste ponto, preciso reconhecer que no se pode acreditar que o trabalhador da fbrica est por desaparecer, pois, como aponta Antunes (2002, p. 62), no possvel perspectvar, nem mesmo num universo distante, nenhuma possibilidade de eliminao da c/asse-que-vive-dotrabalho ( os grifas so do autor l. O trabalho vivo, ainda que reduzido em nmeros absolutos no setor industrial, passa por uma renovao no que diz. respeito a qualificao exigida para este setor da economia. E esta caracterstica fundamental para compreender como a globalizao, atravs, principalmente, da forte concorrncia entre os mercados, acaba por mpar mudanas para a classe trabalhadora.

    No panorama da produo flexvel, segundo Machado ( 1992, p. 15), o aspecto relevante desse processo, que com a flexiblizao funconal um novo perfil de qualificao da fora de trabalho parece emergir e, em linhas gerais, pode-se dizer que esto sendo postas exigncias como: posse de escolaridade bsica, de capacidade de adaptao a novas situaes, de compreenso global de um conjunto de tarefas e das funes conexas, o que demanda capacidade de abstrao e de seleo, trato e interpretao de informaes.

    Frigotto (1992, p. 48) em texto intitulado As mudanas tecnolgicas e educao da classe trabalhadora: politecnia, pofivalncia ou qualificao profissional?, alerta

  • que as transformaes que suscitam uma demanda por maior e mais profunda qualificao profissional de um trabalhador, no rompem com a lgica de excluso social do capitalismo, pois:

    Se na verdade no d para negar que essas mudanas tecnolgicas configuram uma nova qualidade, preciso ar7rmar que elas no conr7guram um processo revolucionrio, na medida que se do sob a lgica das relaes sociais marcadas pela excluso. Por isso a forma de insero no processo produtivo bem diversa nos pases subdesenvolvidos. Tiata-se de uma relao subordinada, mas tambm excludente no interior do capitalismo avanado.

    Assim, nas relaes sociais do trabalho mediadas peJo capitalismo, a qualificao da fora de trabalho constitui-se numa determinao social, ou seja, numa mercadoria especial atravs da qual se extra mais-valia. E a formao profissional, quando norteada pelas regras do capital, contLbui para a manuteno desse processo, pela excluso e tambm pela alienao do trabalhador.

    Estudos recentes de Accia Kuenzer, comprovam que a nova relao entre a educao e as atividades laborais, no contexto da introduo de novas tecnologias nos processo produtivos, e de mudanas na organizao social do trabalho, mantm os trabalhadores nas mesmas condies de dependncia do capital, e de quem possuidor de um saber tcnico incompleto, mal articulado, apesar de a indstria difundir um discurso baseado na tendncia por uma demanda tcnica mais complexa.

    A respeito das novas competncias que se passam a exigir dos trabalhadores, Kuenzer ( 2002, p. 80 ) aponta que:

    No mbito da pedagogia toyotista, as capacidades mudam e so chamadas de competncias. Ao invs de habilidades psicofsicas, fala-se em desenvolvimento de competncias cognitivas complexas, mas sempre com o objetivo de atender s exigncias do processo de valorizao do capital. Nes-

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    te sentido, as ferramentas que buscam superar os obstculos decorrentes da fragmentao do trabalho, em particular no que diz respeito a todas as formas de desperdcio, tais como multitarefa ou o controle de qualidade feito pelo trabalhador, no tm como objetivo reconstruir a unidade rompida, mas evitar todas as formas de perda e assim ampliar as possibilidades de valorizao do capital.

    Entretanto, Frigotto ( 1992, p, 21 ) aponta o saber politcnico, conhecimento que pressupe o domnio da tcnica num nvel intelectual, como um dos caminhos para a superao das relaes sociais de excluso, e para o qual se exige uma total reestruturao da formao bsica nos cursos que profissionalizam, sem o que se inviabi/iza a possibilidade da autonomia necessria educao continuada e qualificao de tipo novo ( .. ,j,

    E o mesmo autor, ( Frigotto, 1992, p, 47 ) em texto intitulado As mudanas tecnolgicas e educao da classe trabalhadora: politecnia, polvalncia ou qualificao profissional?, afirma:

    (.. .) para aqueles que ( .. j se situam na perspectiva da superao das relaes sociais de excluso, a concepo de formao politcnica , sem dvida, uma compreenso que, no espao contraditrio, busca romper com a perspectiva do adestramento j nas condies vigentes,

    Levando-se em conta o contraditrio contexto da globalizao, que impe novas demandas s propostas pedaggicas dos cursos de ensino profissionalizante, devem-se aprofundar as pesquisas que discutem o papel da formao denominada hoje por pOlitcnica, na medida em que, historicamente, leva, como considera Frigotto, a um caminho para a superao da alienao do trabalhador. Neste sentido, a discusso deve buscar propostas de formao profissionalizante que no estejam comprometidas com as novas ( e com as tradicionais) formas de acumulao de capital, mas preocupada com a melhoria na qualidade do ensino brasileiro,

  • Bibliografia

    ANTUNES, RICARDO. Adeus ao trabalho? : ensaio sobre as metamorfoses e a centraldade do mundo do trabalho. So Paulo: Cortez, 2002.

    ENGUITA, MARIANO F. Trabalho, Escola e Ideologia. Marx e a Crtica da Educao. Porto Alegre: Artes Mdicas, 1993.

    FRIGOTTO, GAUDNCIO (org.). Educao e Crise do Trabalho: Perspectivas de Final de Sculo. Petrpolis, RJ: Vozes, 1998.

    FURTADO, CELSO. O Mito do Desenvolvimento Econmico. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1996.

    HARVEY, DAVID. Condio Ps-Moderna. So Paulo: Loyola, 1989.

    KURZ, ROBERT. O Colapso da Modernizao. 5. Ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1992.

    LOMBARDI, Jos Claudinei (Org.). Capitalsmo, Trabalho e Educao. Campinas: Autores Associados, HISTEDBR, 2002.

    MACHADO, LCIA R. de SOUZA & FRIGOTTO, GAUDNCIO ( Org. ) Trabalho e Educao. Campinas, SP: Papirus: Cedes; SP : Ande: Anped, 1992. Coletnea CBE

    MORAES NETO, BENEDITO R. de, Marx, Taylor e Ford. As Foras Produtivas em discusso. So Paulo: Brasiliense, 1989.

    SEVERINO, ANTONIO JOAQUIM. Educao, Histria e Sujeito. So Paulo: Olho d'gua, 2001.

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  • 1. Membro titular do !ns~ tituto Histrico e Geogrfico de Piracicaba.

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    LVARO PAULO SGA

    Francisco de Assis Ferraz de Mello (')

    Conheci lvaro Paulo Sga na dcada de 1940. Nossa amizade se tomou intima a partir de 1954, quando ingressei na Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz, para trabalhar como professor. Ele era desenhista da instituio.

    Eu pertenci a um grupo de pesquisadores da rea de nutrio mineral de plantas. Muitos resultados de nossas pesquisas foram ilustrados pelo artista em belssimas aquarelas.

    Em 1962 publicamos, na Sua, um livro sobre nutrio de plantas, que continha as aquarelas mencionadas. Foi muito bem recebido nos meios acadmicos. Em 1964 e 1967 apareceram as edies brasileiras, que tiveram idntico sucesso. Dessa forma, as aquarelas e o nome do Sga foram difundidos em universidades e institutos de pesquisa do Brasil e do Exterior, sobretudo das Amricas e da Europa.

    Aps a aposentadoria do artista, em 1974, visitei-o muitas vezes em sua residncia. Boas horas de conversa. Ainda o vejo em sua cadeira de couro tranado.

    Sga foi genial. Estudou msica, tocou e construiu violinos. Fez interessantes miniaturas em madeira. Trabalhou com cobre. Foi escultor, tendo obtido o primeiro prmio dessa modalidade, em 1965, no Salo de Belas Artes de Piracicaba.

    Embora mais conhecido por suas pinturas a leo, fez belos trabalhos a grafite, bico de pena, carvo, aguada e aquarela.

    A dcada de 1930 foi-lhe fecunda na aquisio de conhecimentos artsticos. Estudou desenho e pintura com o

  • Frei Paulo Maria de Sorocaba e com Antnio Pacheco Ferraz. Cursou tambm, por algum tempo, como aluno ouvinte, a Escola de Belas Artes de So Paulo. Era exigente em relao aos materiais que utilizava na pintura: preferia telas de linho e tintas estrangeiras de boa qualidade.

    Sga pertenceu excelente escola de pintores realistas de Piracicaba, tendo se destacado como paisagista, embora exercitasse, tambm, outros gneros, como interiores, natureza morta, retrato e nu artistico.

    O seu desenho era timo, tanto o tcnico como o artstico. Usava corretamente a perspectiva, o que pode ser observado exausto nas paisagens que pintou, sobretudo as realizadas em Ouro Preto, cidade mineira muito procurada por pintores piracicabanos por causa da topografia acidentada, que obrigava, com freqncia, a utilizao de pontos de vista mltiplos.

    Colorista de grandes predicados, trabalhava to bem as cores baixas quanto as luminosas, tendo sido, neste caso, mestre nos amarelos e laranjas. Foi tambm eficiente nos contrastes claro-escuro.

    Esse pintor humilde exibiu pouco a sua arte, no tendo sido intensa a sua participao em sales. Mas, por convite, foi o primeiro a expor no Salo de Artes Plsticas Erma/inda Otoni da Souza Queiroz, da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz, da Universidade de So Paulo, em 1984.

    Pouco aps sua morte, foi montada uma exposio de trabalhos seus na Casa de Artes Plsticas Miguel Arcanjo B. Assumpo Dutra. O XXXIX Salo de Belas Artes de Piracicaba prestou-lhe merecida homenagem, expondo alguns de seus trabalhos.

    Sga se afastou muito cedo do convvio de seus amigos pintores perdendo o contato com a evoluo do ambiente artistico pracicabano. Isolou-se, Nos ltimos anos de sua vida, em plena vaorizao das obras de artes, vendia belos quadros por preos aviltantes,

    Quando um estudioso se dispuser a escrever a histria das artes plsticas em Piracicaba colocar lvaro Paulo Sga no lugar que lhe cabe, de destaque, por seu mritos,

    Sga foi um artista fecundo, Boa parte de seus trabalhos est espalhada nos livros e publicaes de profes

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    sores da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz. A maioria de seus quadros a leo est em colees particulares em Piracicaba. A Esalq possui vrios deles.

    Durante o periodo em que concorreu ao Salo de Belas Artes de Piracicaba foi distinguido com: Premio Aquisio (1963), 3 Prmio (1967), 2 Prmio (1968), Medalha de Prata (1977) e 1 Prmio, em escultura (1965).

    Por ocasio de sua aposentadoria, em 1974, aps 36 anos de servio, recebeu voto de louvor da Congregao da Esalq pelo valiosssimo trabalho prestado.

    lvaro Paulo Sga foi aluno de Oscar Pereira da Silva, em pintura, e de Batista Ferri, em escultura. Foi patrono da Cadeira ocupada por Cesarino Alvino Sga, da Academia Piracicabana de Letras, e condecorado com a Medalha e Diploma do Bi-Centenrio de Piracicaba, em 1969.

    No Museu Luiz de Queiroz existe uma sala destinada a homenagear o artista e que contm vrios de seus trabalhos, como pinturas, desenhos, esculturas, maquetes, miniaturas, trabalhos em cobre e violinos.

    No meu entendimento, duas coisas foram muito prejudiciais ao artista: o temperamento forte, irascvel s vezes, e o vicio da bebida. O temperamento impediu-lhe o convvio sadio com colegas pintores. Entretanto, tinha afeio especial por Frei Paulo, antigo mestre a quem retratou, e por Antnio Pacheco Ferraz, seu padrinho de casamento. Por outros no se afeioava tanto, sendo Arquimedes Dutra, talvez, um quase desafeto.

    Uma coisa deve ser mencionada: Sega enviuvou relativamente moo, no auge da fora do trabalho artstico. Nunca mais se casou. Dedicou-se criao da filha, na poca ainda menina, sem permitir a interveno de ningum. sua moda.

    Na velhice, uma catarata o incomodou muito. Chegou a operar um dos olhos. E, mais adiante, uma ou mais internaes hospitalares por motivos de sade e de bebida. A bebida, que o acompanhou por muitos anos, ps-lhe fim arte, encerrando uma carreira que poderia ter sido mais brilhante.

    Faleceu em Piracicaba no dia 7 de julho de 1991.

  • Cidades Histricas do Vale do Paraba

    Joo Lus Franchi'

    Dedicatria A Joo Baptista, meu pai e amigo, saudade hoje e

    sempre.

    Resumo O Vale do Paraba paulista exibe uma variedade enor

    me de paisagens, refletindo sucessivos ciclos econmicos, com reas de intensa atividade comercial e industrial, ou reas de riqussima histria e cultura, reflexo da ocupao humana que se intensificou em 1636, com a fundao de Taubat.

    Palavras-chave Geografia regional; desenvolvimento e preservao;

    Vale do Paraba e turismo regional.

    O Vale do Paraba ocupa a poro leste do Estado de So Paulo, sendo partilhado com os Estados do Rio de Janeiro e Minas Gerais. Localiza-se numa rea de relevo tercirio relativamente recente, entre as pores cristalinas conhecidas como Serra do Mar e Serra da Mantiqueira. O Rio Paraba do Sul drena toda a regio, nascendo junto Serra da Bocaina e seguindo em direo s terras fluminenses.

    Historicamente, uma das reas de ocupao humana mais antiga do Estado, tendo como centro irradiador a cidade de Taubat, fundada em 1635. De Taubat saram bandeirantes com destino regio das minas, sendo que a bandeira comandada por Antonio Rodrigues Arzo

    1. o autor epiracicabano e Ilcenciado em Geografia pela UnesplRio Claro

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    atingiu a regio aurfera de Ouro Preto em 1692 ( Salgado, 1978 ).

    Uma sucesso de ciclos econmicos transformou a paisagem valeparaibana ao longo dos sculos, destacandose inicialmente o ciclo da minerao - que, apesar de ter seu auge nas regies aurferas de Minas Gerais, teve repercusso no Vale, como uma rea de retaguarda de alimentos e entrepostos de tropeiros que faziam o transporte do valioso metal entre Minas e o litoral fluminense, particularmente Parati. Posteriormente, veio a cana-de-acar, e nas primeiras dcadas do sculo XIX, chegou a cultura cafeeira, vinda de terras do Rio de Janeiro, e encontrando nas reas de Mares de Morro ento recoberta pela exuberante Mata Atlntica, o locai propcio para a sua expanso.

    O ciclo cafeeiro do Vale do Paraiba compreendeu o perodo entre 1830 e 1890, e era baseado no trabalho escravo. Durante boa parte do 11 Imprio, a regio era a mais rica do Pais, inclusive com moeda prpria. Com a vinda do caf para o chamado Oeste Paulista, a regio chegou ao final do sculo XIX em decadncia, com o esgotamento dos solos e eroso, o fim do trabalho escravo e a falncia de muitos bares do caf. Desta poca urea, restam as fazendas e o casario colonial, hoje explorados pelo turismo rural.

    Segundo dados do SEADE ( 1985 ), entre os anos de 1850/1860, o Vale do Paraba era responsvel por 65% da produo paulista de caf; em 1920, esse indice cai para pouco mais de 3%, mostrando a mudana do eixo cafeeiro, que havia se deslocado para o Oeste Paulista.

    Aps algumas dcadas de decadncia econmica, o Vale do Paraiba paulista ressurge novamente em meados do sculo XX, com a inaugurao da Via Dutra, ligando as duas maiores metrpoles brasileiras. Paralelamente a isso, ocorreu o inicio de um novo ciclo, o da industrializao, seguido quase simultaneamente com o ciclo tecnolgico, onde macios investimentos estatais e internacionais transformaram o Vale numa das mais prsperas regies industriais e de tecnologias de ponta do Brasil.

    Os ramos aeronutico, aeroespacial ,de telecomunicaes, eletrnico, automobilstico e de armamentos se fazem presentes no parque industrial e tecnolgico regional.

  • Interessante fenmeno estudado pela cincia geogrfica a ocupao do Vale do Paraba paulista. O fenmeno da industrializao e o surto tecnolgico ocorreu exatamente no eixo rodovirio da Via Dutra, desenvolvendo cidades como So Jos dos Campos, Taubat, Jacarei, Caapava e Pndamonhangaba. As cidades ao norte deste eixo, sob o domno da Serra da Mantiqueira, tem no turismo a sua principal fonte de renda, destacando-se as cidades de Campos do Jordo, Santo Antnio do Pinhal e So Bento do Sapuca. Ao sul do eixo da Dutra, abrangendo a rea dos chamados Mares de Morro, encontramos cidades histricas que no foram atingidas pelo surto tecnolgico e industrial e que tm, em suas tradies, folclore e patrimnio histrico, a oportunidade de serem inseridas num modelo de desenvolvimento sustentvel. So quatorze municipios, a saber: Bananal, Arape, So Jos do Barreiro, Areas, Silveiras, Queluz, Cunha, So Lus do Paraitlnga, Lagoinha, Redeno da Serra, Natividade da Serra, Santa Branca, Paraibuna e Jambeiro.

    So cdades de pequeno porte, de populao rural ainda expressiva e que tm no turismo histrico, ecolgico e rural, a possibilidade de sarem da estagnao em que entraram desde o fim do ciclo valeparaibano do caf, pois no foram atingidas pela industrializao, que ocorreu no Vale do Paraba aps a segunda metade do sculo XX.

    Na obra Cidades Mortas, de Monteiro Lobato, lemos: a quem em nossa terra percorre tais e tais zonas, vivas outrora, hoje mortas, ou em via disso ... ali tudo foi, nada . No se conjugam verbos no presenle. Tudo pretrito... Transfiltrou-se ( o caf) para o Oesle, na avidez de novos assaltos virgindade da terra nova. So relatos de uma regio que teve sua fase urea, e que, nas primeiras dcadas deste sculo, vivia em pleno esquecimento.

    Interessante fenmeno que esta estagnao foi a responsvel pela preservao de valioso patrimnio arquitetnico, testemunho do ciclo cafeeiro, fenmeno parecido ao que ocorreu em Parati, cidade fluminense que tem uma longa ligao histrica, econmica e cultural com esses municipios estudados,

    Segundo Nicolletti ( 1997 ), as estratgias para o desenvolvimento do turismo devem seguir algumas regras bsicas, alm da interao dos municpios envolvidos:

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    I - avaliao do ramo turstico desejvel: histrico, cultural, rural, ecolgico, etc;

    II - perfil adequado do turista: famlia, jovens, terceira idade, esportistas, esotricos, estudantes, universitrios, etc;

    111- ecoturismo sustentvel, com a preservao das reas naturais, no caso, a Mata Atlntica;