curso de gestalt-terapia - módulo i

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    PROGRAMA DE EDUCAÇÃO CONTINUADA A DISTÂNCIAPortal Educação

    CURSO DE

    Gestalt-terapia

     Aluno:

    EaD - Educação a Distância Portal Educação

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    CURSO DE

    Gestalt-terapia

    MÓDULO I

    Atenção: O material deste módulo está disponível apenas como parâmetro de estudos para estePrograma de Educação Continuada. É proibida qualquer forma de comercialização ou distribuiçãodo mesmo sem a autorização expressa do Portal Educação.  Os créditos do conteúdo aqui contidosão dados aos seus respectivos autores descritos nas Referências Bibliográficas.

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    20 EXPERIMENTOS

    21 CASAIS, FAMÍLIAS, GRUPOS

    REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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    MÓDULO I

    Raízes e Precursores

    1 ORIGEM E HISTÓRIA

    Gestalt-terapia é uma abordagem psicológica que teve sua origem na

    Alemanha. Seu nascimento oficial ocorreu com a publicação do livro “Gestalt-Teraphy”,  em 1951, escrito por Fritz Perls, Hefferline e  Goodman. A escolha do

    nome desta nova proposta de trabalho psicológico foi um processo difícil e

    controverso.

    Laura Perls  sugeriu Psicanálise Existencial, porém em razão das críticas

    sobre o pessimismo da obra de Sartre, esta ideia foi descartada pelos demais. Já

    Hefferline propunha o título Terapia Integrativa, mas também não foi aceito. O nome

    Terapia Experimental foi levantado pelo grupo, mas logo recusado.Inicialmente, Perls batizara este método de “Teoria da Concentração”, uma

    clara oposição ao método psicanalítico da livre associação. Realmente, esta teoria

    sugeria ao cliente que este se concentrasse na experiência do aqui-agora, que

    houvesse uma consciência de seu estado físico e corporal, além de utilizar os

    recursos de relaxamento e respiração. Porém, este título não refletiria a sua nova

    teoria em todos os seus aspectos. Essa sugestão estaria enfocando apenas pontos

    menores em seu arcabouço prático e teórico.

    Seria necessário encontrar um nome mais global para o método sugerido.

    Foi então que Perls  sugeriu “Gestalt-terapia”, o que não agradou a todos,

    principalmente a Laura Perls, que naquela ocasião fazia doutorado em Psicologia da

    Gestalt, e achava que o novo método proposto não tinha relação com esta teoria, a

    qual conhecia melhor que Perls. Goodman achava o termo estrangeiro e esotérico

    demais, só que era exatamente isto que agradava Perls, seu caráter provocativo e

    comercial (“marqueteiro”).

    A palavra Gestalt é amplamente adotada em todo o mundo e em todas as

    línguas, na sua forma original, uma vez que não apresenta uma tradução

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    equivalente em nenhum país. Em dicionários comuns, Gestalt apresenta o sentido

    de “figura, forma, feição”. Gestalten, que é o seu plural, significa “dar forma, dar uma

    estrutura significante, moldar, arrumar”. E ainda buscando algo que apresente umsentido de mais ação e processo, encontramos a palavra Gestaltung que pode ser

    traduzida como “formação, conformação, criação e organização”.

    Quando falamos em Gestalt estamos falando de uma teoria que veio de uma

    escola de pensamento que é a psicologia da Gestalt. Tal escola estuda como os

    seres percebem as coisas e como o campo perceptivo se organiza

    espontaneamente por meio das “boas formas” ou “gestalten fortes e plenas”.

    Esta psicologia considera que os fenômenos psicológicos, físicos, biológicose simbólicos constituem um conjunto autônomo, indivisível e articulado na sua

    configuração, organização e lei interna. Quando nos deparamos com um estímulo

    físico, tentamos compreendê-lo por meio de uma organização perceptual. Esta

    organização pode ocorrer de diversas maneiras, mas apenas uma organização

    aparecerá de cada vez. Caso você queira reorganizar sua percepção

    conscientemente, alterando o foco de percepção, isso poderá ser feito, mas sempre

    uma em cada momento.

    Por exemplo: quando vemos a Figura 1 qual é a organização predominante?

    Uma taça ou o perfil de duas pessoas, uma de frente para outra? Esta organização é

    individual e ocorrerá de cada vez, embora possa ser percebida alternadamente; uma

    vez se percebe os rostos, outra vez o vaso.

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    FIGURA 11 

    Uma taça ou dois rostos? Só a Gestalt explica...

    A percepção ocorre por uma totalidade e não por “pontos isolados”.

    Podemos destacar que a partir deste princípio estrutura-se uma máxima que servirá

    de conceito precursor da abordagem da Gestalt-terapia: “O todo é maior que a

    soma de suas partes” . 

    Este movimento conhecido como Psicologia da Gestalt, também pode serchamado de Psicologia da forma, Gestaltismo ou simplesmente Gestalt. Foi criado

    pelos psicólogos alemães Max Wertheimer   (1880-1943), Wolfgang Köhler (1887-

    1967) e Kurt Koffka (1886-1940), nos princípios do século XX.

    É importante ressaltar que muitos dos princípios estudados na psicologia da

    Gestalt são aplicados na prática clínica e teórica da própria Gestalt-terapia. Porém,

    este conceito foi primeiramente apresentado pelo filósofo austríaco Christian Von

    Ehrenfels. Seus estudos apontam para a existência de “objetos perceptivos”, comoas formas espaciais e as estruturas rítmicas, que se apresentam como “formas” ou

    relações estruturais e não se reduzem à soma de sensações precisas. Estas ideias

    estão apresentadas no livro "Sobre as qualidades formais" (1890).

    Desde a sua origem, a Gestalt-terapia, se apropriou e se nutriu, de forma

    consciente ou não, de várias correntes filosóficas e terapêuticas, não só da

    Psicologia da Gestalt, mas também da fenomenologia, do existencialismo, do

    1 FONTE: Disponível em: http://sexualidadeegestalt.blogspot.com/2009/04/o-que-e-gestalt-terapia-parte-1.html.Acesso em 01 nov. 2009. 

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    psicodrama, da psicanálise, das terapias corporais e também de filosofias orientais,

    como o budismo e o taoísmo. Daí, se tira sua principal crítica, uma vez que alguns

    autores não a consideram uma abordagem autêntica, mas sim, uma “colcha deretalhos e técnicas”.

    Utilizando seu próprio princípio, de que é necessário olhar o todo e não a

    soma de suas partes, podemos esclarecer que esta nova organização teórica

    constitui algo novo e muito autêntico. A própria genialidade de Fritz Perls  (seu

    criador) e de seus principais colaboradores, Laura Perls e Paul Goodman,  foi

    elaborar esta síntese coerente, rica, única e dinâmica.

    A teoria da aprendizagem da Gestalt também contribui para a Gestalt-terapiacom os conceitos de situação inacabada e figura-fundo. A situação inacabada

    impede a pessoa de seguir adiante e lhe trazer satisfação. O conceito de figura-

    fundo permite que o observador organize suas percepções em uma unidade mais

    forte. Este movimento pode levá-lo ao ritmo de awareness (consciência organísmica,

    ou processo de dar-se conta) e unawareness. 

    Alfred Adler, psicólogo austríaco, foi médico psiquiatra e psicanalista. Traz a

    visão de que o homem é o criador consciente de sua vida. O estilo de vida e o eu

    criativo sustentam ao sujeito uma participação única e ativa. Em consonância com o

    pensamento de Adler, a Gestalt-terapia também acredita que o homem cria a si

    mesmo, sendo que sua maior energia advém do processo de estar em aware e da

    aceitação de si mesmo.

    Otto Rank, psicanalista, discípulo de Freud por vinte anos, muda a visão da

    resistência para uma perspectiva mais construtiva e inclui o seu papel na resolução

    das partes separadas de si mesmo. “A resistência construtiva a essas alternativas

    assustadoras leva a uma nova integração criativa dessas forças classicamente

    opostas” (POLSTER, 2001, p. 315).

    Junto dessa influência, a Gestalt-terapia reconhece o poder da resistência

    criativa e não tenta extirpá-la a todo custo, e sim, mobilizá-la para uma nova

    composição pessoal, considerando sua força e fazendo com que esta fique

    integrada ao indivíduo.

    Wihelm Reich, discípulo dissidente de Freud, desperta o interesse de Perls 

    sobre o caráter do homem, que é o jeito de ser da pessoa. Reich elabora o conceito

    de couraça corporal, como uma forma de tensão muscular diante de uma repressão

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    habitual, ou seja, a mesma repressão do nível mental está ocorrendo no corpo.

    Outro aspecto importante foi o fato de que Reich ao olhar para as ações simples de

    um modo simples permite que a fenomenologia se firme de forma mais ativa. Eletraz para o setting terapêutico o comportamento cotidiano, enfatizando as

    características linguísticas, posturais, musculares e gestuais.

    Moreno, por meio do psicodrama, reconhece o poder atemporal da arte da

    dramatização como meio para o processo de mudança. Este caminho abre as

    possibilidades criativas inerentes na arte e defende a potencialidade das

    descobertas quando a pessoa participa de uma experiência, muito mais ativamente

    do que apenas falar sobre ela.A Gestalt-terapia utiliza muito o psicodrama para seus trabalhos vivenciais

     junto ao cliente, e também em situações específicas por meio de trabalhos com

    sonhos. A dramatização vai acontecendo juntando os diversos elementos do sonho

    ou da cena. O cliente vai entrando em cada papel e se identificando. É necessário

    sentir no corpo e nas emoções o impacto das imagens. Com relação ao sonho, cada

    parte é considerada como uma expressão parcial do próprio sonhador. Esta

    concepção teórica advém da visão de Jung de que os sonhos e seus simbolismos

    representam expressões criativas do eu e projeções de si mesmo. Esta ideia

    também é compartilhada pela Gestalt-terapia.

    Jung também influencia a Gestalt-terapia com o conceito de sombra que tem

    uma relação direta com a visão gestáltica de polaridades, em que a presença de um

    pólo só faz sentido na presença do outro, ou seja, os aspectos polares são

    complementares.

    Na Gestalt-terapia quanto maior é a polarização em uma das extremidades,

    mais neurótico o cliente se torna. Por exemplo, uma pessoa que se considera muito

    forte será incapaz de lidar com sua fraqueza em uma determinada situação. O

    trabalho da Gestalt-terapia será integrar as polaridades (por exemplo: força e

    fraqueza), e fazer com o cliente possa se perceber hora forte, hora fraco, e assim,

    transitar naturalmente por estas polaridades.

    Kurt Goldstein, neurologista e psiquiatra alemão foi um pioneiro da

    neuropsicologia moderna. A Gestalt-terapia foi bastante influenciada por sua teoria

    holística do organismo. A partir do seu trabalho com os soldados da Primeira Guerra

    Mundial que retornavam com lesões cerebrais e, também, da ideia de totalidade de

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    Jan Smuts, ele desenvolveu sua teoria das relações cérebro-mente. Dentro de sua

    visão há uma severa crítica à forma como a medicina lida com a sintomatologia dos

    pacientes. Seu livro mais importante, em alemão, Der Aufbau des Organismus (1934) foi publicado novamente em inglês com o nome The Organism (1995).

    Tanto para Goldstein, quanto para a Gestalt-terapia, o sintoma passa a ter

    uma função de busca de equilíbrio do organismo. Exatamente por fazer parte desta

    totalidade, o sintoma sofre a influência do organismo com um todo. O organismo tem

    uma tendência inata de autorregulação e, muitas vezes, o sintoma é a melhor saída

    que este organismo teve para se organizar em um determinado momento diante de

    uma nova situação. Esta ideia traz uma nova concepção de saúde, que é justamentea capacidade de recuperação do equilíbrio do organismo, e não mais a ideia de

    ausência de doença. Isto também influencia a percepção da neurose que passa a

    ser entendida como um processo de ajustamento criativo.

    Kurt Lewin foi um psicólogo alemão que transitou muito entre os campos

    sociais e a necessidade de pesquisa. Sua contribuição deu-se por seus trabalhos

    com dinâmicas de grupo, fortalecendo o olhar da psicologia social como ciência, e

    desenvolvendo o conceito de pesquisa-ação. Dedicando-se a áreas de processos

    sociais, motivação e personalidade.

    Para a Gestalt-terapia, sua enorme influência parte do conceito denominado

    de Teoria de Campo. Para ele, é necessário entender a personalidade como um

    campo, onde as variações individuais do comportamento humano são estabelecidas

    pela tensão entre as percepções que o indivíduo tem de si mesmo e pelo ambiente

    psicológico em que está inserido (espaço vital).

    Não podemos falar dos pressupostos e da origem da Gestalt-terapia sem

    falar da necessidade de usar a criatividade dentro do setting terapêutico. Somente

    quando há ligação clara entre o cliente e o terapeuta é que se consegue a

    transformação e a mudança do cliente. Mas este contato só vai se tornar um ato

    criativo se tiver fluência e um sentimento mútuo de transformação.

    Zinker (2007, p. 17) afirma que “a terapia criativa é um encontro, um

    processo de crescimento, em evento para a solução de problemas, uma forma

    especial de aprendizagem e uma exploração de toda a diversidade de nossas

    aspirações de metamorfose e ascendência.”

    Para a Gestalt-terapeutas o profissional é o maior bem que o cliente poderá

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    usufruir como canal, ferramenta e troca. Para isso, o próprio terapeuta precisará

    buscar a ousadia e a criatividade em sua prática diária, por meio dos experimentos,

    mas sempre baseados em sua concepção teórica.“A Gestalt-terapia é, na realidade, uma permissão para ser criativo”

    (ZINKER, 2007, p. 30). O método escolhido reforça esta ideia, que é o experimento.

    Permitir que se abram diante do terapeuta todas as possibilidades de trabalho,

    permitir tornar-se exuberante, provocando a vida em suas diversas facetas, são

    posturas essenciais de um Gestalt-terapeuta, buscando sempre ousar ao inusitado,

    e estimular a criatividade.

    2 FREDERICK PERLS E SUCESSORES

    Como foi visto no item 1 do módulo, a Gestalt-terapia é uma abordagem

    psicológica que sofreu influências de vários teóricos e ideologias diferentes. Perls,

    seu fundador, utilizou-se de um vasto arcabouço teórico, métodos, técnicas, porém,

    reformulando estas ideias em um estilo pessoal. Tanto Perls como seus sucessores

    sempre atribuíram grande atenção e valor ao estilo e à criatividade de cada

    terapêutico.

    Sua forma de construir e apresentar esta nova abordagem psicológica

    reforça esta ideia. Esta síntese específica e coerente que foi costurada em cima da

    máxima de que “o todo é bem diferente da soma de suas partes”, é uma criação

    baseada nas intuições geniais e nas crises pessoais de seu principal fundador, Fritz

    Perls (um “enfant terrible”).

    A vida de Frederick Perls costuma ser um misto de ousadia, arrogância,

    impulsividade e autenticidade. É muito comum que seus discípulos e profissionais da

    Gestalt-terapia tenham, ao mesmo tempo, os sentimentos antagônicos de orgulho e

    vergonha de seu “mentor”.

    Sua vida extremamente controversa não esconde seu caráter egoísta,

    narcisista e avarento, mas seu poder de sedução e seu exibicionismo encantavam e

    mantinham as pessoas ao seu redor. Seus papéis familiares de filho, marido e pai

    foram exercidos de forma egocêntrica e indigna. Fritz costuma repetir com orgulho a

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    definição que sua mulher tinha dele, “uma mistura de profeta e coitado”, achando-a

    perfeita e exata. Teve vários vícios em sua vida, como os três maços de Camel, LSD

    e outras drogas psicodélicas. Por toda a sua vida, Friz manteve um fascínio porgrupos marginalizados.

    A Gestalt-terapia foi marcada por uma hostilidade contra os interesses e a

    ordem burguesa. Por muitos anos, a quebra de padrões sociais, choques de valores

    e rebeldia (incluindo o uso de drogas e prazeres efêmeros) conduziram os atos tanto

    do homem Fritz quanto do pensador e articulador da abordagem da Gestalt-terapia.

    Não foi à toa que aos 75 anos de idade foi considerado o “rei dos hippies”.

    Friedrich Salomon Perls, nasceu em 8 de Julho de 1893 em um gueto judeuno subúrbio de Berlim. Seu pai, Nathan, era um comerciante charmoso e sedutor

    que viajava muito e era muito infiel. De seu pai Fritz herda seu temperamento

    irritadiço, violento e orgulhoso. Sua mãe, Amália, era uma judia devota que

    respeitava as tradições. A partir da paixão de sua mãe pelo teatro e pela ópera, Fritz

    descobre esses encantos que carrega por toda a sua vida. O casal viveu em

    constantes brigas, muitas vezes violentas, em um clima quase que de ódio.

    Fritz tinha muito ciúmes de sua irmã mais velha, Else, que era protegida pela

    mãe por ser quase cega. Diz-se que ele não chorou uma lágrima quando sua mãe e

    Else morreram em um campo de concentração. Já de sua irmã Grete, ele era

    bastante próximo, inclusive morou com ele em Nova York. Durante dez anos de

    convivência, Grete serviu como empregada para Fritz e sua esposa. Do pai, Fritz, foi

    desenvolvendo uma raiva cada vez maior, cortando laços em definitivo e não indo ao

    seu enterro. Fritz passou a vida toda duvidando de sua paternidade.

    Durante sua infância ele foi um menino muito levado e apanhava

    constantemente. Chegou a ser expulso da escola por mal-comportamento. Aos treze

    anos começou a trabalhar como aprendiz em uma loja, abandonando no ano

    seguinte, quando voltou a estudar em uma escola liberal, onde desenvolveu seu

    gosto pelo teatro. Quando adolescente, fez vários cursos de artes dramáticas, mas

    não se considerava um bom ator. Sua influência maior foi do diretor expressionista

    Max Reinhardt que acreditava no envolvimento total do ator em seu papel.

    Nos primeiros quarenta anos de vida, Perls  transitou por cidades na

    Alemanha e Áustria. Formou-se como psiquiatra e participou da Primeira Guerra

    Mundial, experiência que lhe conferiu graves sequelas dos traumas vividos,

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    chegando a manifestar sinais de despersonalização e indiferença total pelo meio.

    Após a guerra, obteve doutorado em medicina, tornando-se um

    neuropsiquiatra. Ainda interessava-se por teatro, frequentando cafés esquerdistasde Berlim, onde se envolveu com artistas anarquistas da contracultura. Neste

    momento, ele se encontra com S. Friedlaender, autor de “A indiferença criadora” que

    era um ensaio que visava a superar o dualismo kantiano desenvolvendo o conceito

    de “vazio” ou “vazio fértil”.

    Aos 32 anos, Fritz ainda era um homem dependente e inseguro, morava

    com a mãe e era desprezado pelo pai. Quando conhece Lucy, sua vida sofre uma

    grande mudança e passa a buscar experiências mais ousadas e transgredir todos ostabus. Ela mostra-lhe uma série de práticas eróticas, como: sexo a dois, três, quatro,

    exibicionismo, voyerismo, homossexualidade, etc.

    Após três processos psicanalíticos consecutivos vividos como paciente, com

    Karen Horney, Clara Happel e  Eugen Harnick, Fritz  decide “trocar o divã

    psicanalítico pelo leito conjugal”, casando-se com Lore Postner , com quem teve dois

    filhos. Durante esta transição, ele sai de Berlim e instala-se em Frankfurt. Começa a

    trabalhar com Kurt Goldstein, utilizando a psicologia da Gestalt para sua pesquisa

    com distúrbios perceptivos em pessoas com problemas cerebrais. Lá conhece Lore

    Postner , ficando conhecida mais tarde como Laura Perls.

    Inicia o último processo terapêutico com Wilhelm  Reich, quando foi

    notadamente inspirado por suas ideias sobre as couraças de caráter e a forma

    terapêutica ativa de tocar o corpo dos seus pacientes. Nesse período, estabeleceu-

    se como psicanalista.

    Após superar o medo de ser estéril, em 1931, nasce Renate, a primeira filha

    de Perls. Sua relação com ela era muito íntima e amorosa até nascer Steve, seu

    segundo filho, depois de quatro anos. Mais tarde, sua ligação com os dois filhos vai

    se desligando e a negligência a ambos vai imperar.

    Aos quarenta anos foge da Alemanha nazista, por ser judeu, e vai para

    Amsterdã. De 1934 até 1946 instala-se como psiquiatra na África do Sul, levando

    uma vida burguesa, rica, luxuosa e mundana. Fundou o Instituto Sul-africano de

    Psicanálise e tanto ele, quanto Lore tinham muitos clientes. Ainda usava as normas

    rígidas da psicanálise, cinco sessões por semana de cinquenta minutos, sem

    contato físico, visual ou social.

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    No Congresso Internacional de Psicanálise em Praga (1936), sofre várias

    decepções que o marcam pelo resto de sua vida. Primeiro, Freud, em seu encontro,

    quando foi apresentar seu trabalho e suas ideias, não demonstrou interesse e nãoteve a acolhida esperada. Segundo, durante o congresso, Reich  quase não o

    reconhece, mesmo após mais de dois anos em sessões diárias como analisando, e

    também, não se interessa por nada que ele expõe. Terceiro, foi o pouco interesse e

    aceitação geral dos seus colegas psicanalistas quando aborda a importância da

    oralidade e das modalidades de ingestão do bebê.

    Em 1942, ele publica o livro: “Ego, fome e agressão”. Ao escrever este livro,

    ele passa a desenvolver suas teses, o que seria um esboço de várias noções futurasda Gestalt-terapia, tais como: importância do momento presente, do corpo, contato

    direto e autêntico entre paciente e terapeuta, uma abordagem “holística” do

    organismo, e as ideias de uma “terapia da concentração”, compreendendo técnicas

    de visualização de utilização da primeira pessoa do singular, responsabilidade dos

    sentimentos, concentração do corpo e das sensações e observações das

    hesitações.

    Suas ideias, que ficam cada vez mais fortes a partir deste primeiro livro,

    sofreram uma grande influência de Smuts, o principal responsável por sua ida para a

    África do Sul. Ele foi o fundador do holismo, que é uma teoria elaborada a partir das

    ideias de Darwin, Gergson e  Einstein. Sua conceituação a respeito de holismo

    considera não só o próprio organismo como um todo coerente, mas um todo em

    interdependência estreita com seu meio e com o universo.

    Nos dez anos seguintes, de 1953 a 1963, Fritz fixa residência em Nova York

    e faz viagens por todos os Estados Unidos. Cada vez mais ele se interessava pela

    terapia em grupo, e na sua vida pessoal, continuava envolvendo-se com anarquistas

    e revoltados que alardeavam uma grande liberdade de costumes e praticavam

    abertamente a bissexualidade e o sexo grupal.

    Em 1950, é constituído o grupo dos sete: Isadore Fromm, Paul Goodman,

    Paul Weisz, Elliot Shapiro, Sylvester Eastman, Fritz e Laura Perls, mais tarde Halph

    Hefferlin, que poderia avalizar o grupo, por ser professor universitário, e facilitaria a

    publicação das suas teses.

    Em 1951, surge a obra coletiva “Gestalt Therapy”, e marca o início oficial da

    nova prática. Nesta época, encontra-se com Goodman, que se torna um dos

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    pensadores da nova escola, a Gestalt-terapia. Outro encontro importante ocorreu

    com Isadore Fromm, estudante de Fenomenologia, que foi um dos pilares do célebre

    Instituto de Gestalt de Cleveland. Em 1952, junto com Laura cria o primeiro instituto de Gestalt-terapia e

    começa a divulgar pelos Estados Unidos o seu novo método. Esta fase marca a

    troca de conhecimentos entre vários terapeutas, tais como: Charlotte Selver  

    inspirando-se na tomada de consciência sensorial do corpo; Moreno com quem

    praticou o psicodrama, principalmente o monodrama; Hon Hubbard que o iniciou na

    dialética ou cientologia.

    De 63 até 67 anos, instala-se na Flórida e vive um período triste e deprimido.Fica doente, com problemas cardíacos, solitário, sem amigos, e começa a sonhar

    com a aposentadoria. Pela primeira vez na vida, renuncia às atividades sexuais com

    medo de uma crise cardíaca.

    Em 1957, apaixona-se por Marty From, retoma o gosto pela vida, e chega a

    declarar que a considera a mulher mais importante de sua vida, voltando a promover

    alguns seminários na Califórnia.

    Nesta época, vivia a procura de experiências sempre novas, entregando-se

    às drogas psicodélicas e acreditando que a droga dava-lhe a “consciência cósmica”.

    Sua paixão dura pouco, pois Marty não suporta suas crises psicóticas, seu ciúme

    doentio e, após suas cirurgias de hemorroidas e próstata, acaba deixando-o por um

    amante mais jovem.

    Nos quatro anos seguintes, de 1959 a 1963, consegue renunciar às drogas e

    passa a vagar por Califórnia, Nova York, Israel e Japão. Em Israel, vive em uma

    comunidade de beatniks, onde ficou fascinado com o modo de vida dos artistas. No

    Japão, tem uma experiência dentro de um mosteiro zen, onde se frustrou por

    precisar se prostrar diante de uma estátua de Buda, comparando o zen budismo

    com a psicanálise.

    Aos 71 anos, ele fixa residência numa propriedade em Big Sur , cheia de

    fontes de águas quentes e sulfurosas, a qual batiza de Esalen. Neste local, que seria

    idealizado por Michael Murphy, para ser um Centro de Desenvolvimento do

    Potencial Humano, parecia mais um grande albergue. Após a ida de Perls  para

    Esalen, onde passou a promover seminários de demonstração e formação

    profissional em Gestalt-terapia, torna-se célebre.

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    Aos 75 anos, sua foto é exibida na capa da revista Life, intitulando-o “rei dos

    hippies”. Finalmente chegara seu momento de glória e reconhecimento. Os grupos

    que eram pequenos até então, passaram a ter centenas de pessoas, e seu “circo”,como ele próprio chamava, passando a ser considerada como demonstrações

    espetaculares, a maioria das vezes, envolvendo a técnica da “cadeira vazia”.

    Muitos especialistas passaram a frequentar e ir constantemente para Esalen, 

    tais como, Gregory Bateson (“ecologia do espírito” e double blind), Alexandre Lowen 

    (“bioenergética”), Eric Berne (análise transacional), John Lilly  (caixa de isolamento

    sensorial), Alan Watts (orientalismo), Stanislas Grof  (psicologia transpessoal), John

    Grinder  e Richard Bandler  (programação neurolinguística), entre outros.Em 1969, publica as obras “Gestalt-therapy verbatim” e “In and out the

    garbage pail”. Fritz sonhava, nesta época, em inaugurar um Gestalt-kibutz, ou seja,

    uma comunidade onde se pudesse viver a Gestalt  24 horas por dia e onde ele

    pudesse se sentir realmente em casa.

    Em junho de 1969, ele funda, junto com trinta discípulos, uma comunidade

    em um antigo hotel de pescadores à beira do lago Cowichan, na ilha de Vancouver .

    Todos participavam de sessões de terapia e/ou formação, trabalhos coletivos, mas

    deixava claro que o mestre era ele, Fritz Perls. Chegou a declarar que pela primeira

    vez na vida estava feliz e não precisava brigar com ninguém.

    Em 14 de março de 1970, aos 77 anos, morre de infarto no miocárdio, Fritz

    Perls, o principal criador e porta-voz da Gestalt-terapia, mesmo que não tenha sido

    um exímio teórico. Após a autópsia foi revelado que havia, também, um câncer de

    pâncreas. Sua morte foi tão controversa quanto sua vida, havendo, a partir daí, uma

    ruptura em duas posições, os que acreditavam, como Paulo Goodman, que Perls

    havia “traído a Gestalt” e os seus efetivos seguidores.

    Podemos dizer que há uma segunda geração de Gestalt-terapeutas, com os

    profissionais, Isadore From, Joseph Zinker, Ervin e Miriam polster , etc.

    Isadore From  foi um psicólogo da primeira geração de Gestalt-terapeutas.

    Faleceu aos 75 anos, em Nova York. Foi considerado um clínico extremamente

    talentoso, homem brilhante, íntegro, preciso e muito espirituoso. Era meticuloso e

    lúcido, embora fosse perfeitamente capaz de navegar em uma expedição nova e

    intuitiva se a situação o tocasse a tal ponto. Como um bom pesquisador

    experimental, ele considerava seus palpites como hipóteses provisórias, abertas

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    para serem confirmadas ou refutadas. Não deixou muita contribuição escrita de seus

    pensamentos e experiências. Temos apenas acesso a algumas transcrições de

    entrevistas.Desde a década de 1950, ele participava do seleto círculo que se reunia no

    apartamento de Fritz  e Laura em Manhattan. Também foi analisado, primeiro por

    Fritz Perls, depois por Laura. Seus primeiros estudos foram na área da filosofia,

    especificamente com a fenomenologia, o que contribuiu em muito para sua prática

    em Gestalt-terapia. Por mais de três décadas, ele praticou e ensinou a Gestalt-

    terapia em Nova York. Ele também viajou regularmente, tanto nos Estados Unidos

    quanto na Europa, especialmente na Alemanha e na Itália, para ações de formaçãoe grupos de supervisão.

    Sua história seguiu no rumo de dar uma direção para a Gestalt-terapia. Ele

    acreditava que as mudanças eram feitas em pequenos passos, permitindo que os

    pacientes pudessem assimilá-las mais facilmente. Porém, essas pequenas

    mudanças podem fazer diferença significativa: quando você faz uma pequena

    mudança na configuração de uma Gestalt  estabelecida, o resultado é uma nova

    configuração. A melhor fonte de suas inspirações, entretanto, foi em grande parte o

    que é imediatamente dado e, portanto, facilmente esquecido - o óbvio, por assim

    dizer. Quando ensinava ou fazia demonstrações, Isadore mostrava aos alunos como

    eles próprios deveriam fazer. Sempre com muita paciência demonstrava suas

    observações e conclusões, passo a passo, sem ter interesses em obscuridades ou

    mistificações.

    Isadore  permaneceu purista sobre a Gestalt-terapia, e neste contexto, um

    conservador. Talvez, tenha se tornado demasiadamente inflexível quanto aos

    benefícios da Gestalt-terapia em aceitar novas ideias. Seu crescente alarme, no

    entanto, veio de tendências dentro de Gestalt-terapia em si: Ele estava perturbado

    que os ensinamentos passados por Perls e com a possibilidade de que estes fossem

    confundidos com experiências de conversão.

    O casal Miriam e Ervin Polster  contribuiu com o clássico livro “Gestalt-terapia 

    Integrada” na década de 70, além de iniciarem um centro de treinamento em La

    Jolla. Ambos têm um papel ativo na Gestalt-terapia quase desde o início.

    Trabalharam diretamente com Perls  e Laura e fizeram terapia com Isadore From.

    Tiveram uma ativa atuação no Instituto Gestalt de Cleveland por quase vinte anos.

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    Depois se mudaram para Califórnia, onde se estabeleceu o Gestalt Training

    Center de San Diego. Também realizaram oficinas de formação e seminários para

    várias intuições em todo o país e fora dele.  Erving  tem um estilo efusivo eirreverente, além da capacidade de transmitir fascínio e entusiasmo. Apresenta uma

    habilidade em transformar ideias velhas em experiências inéditas.

    Miriam faleceu em 19 de dezembro de 2001 de câncer. Ela tinha um jeito

    delicado e envolvente muito evidente em seu contato humano, e se comunica de

    forma clara e precisa. Juntos ou separados, o casal, sem dúvida, contribuiu muito

    para ampliar as fronteiras da Gestalt-terapia.

    Joseph Chaim Zinker   é mestre em psicoterapia e cofundador do InstitutoGestalt, Wellfleet, Massachusetts. Ele treinou com Fritz durante a década de 1960 e

    tem mais de três décadas de experiência e desenvolvimento da Gestalt-terapia.

    Zinker   publicou diversos livros, tais como: “Motivação e a escassez de Morrer”,

    “Processo Criativo em Gestalt-terapia”, “A busca da elegância em psicoterapia” e

    “Sketches: uma antologia de ensaios, Arte e Poesia”. Também contribuiu em várias

    revistas participando do conselho editorial, tais como: “Vozes”, “The Gestalt Journal”,

    “Gestalt Review” e “Jornal da terapia de casal”. Atualmente, participa de vários

    institutos internacionais de Gestalt-terapia em todo o mundo, incluindo o Gestalt

    International Study Center   e o Centro para o Estudo de Sistemas de Sexo em

    Massachusetts.

    Um dos conceitos que Zinker  aborda constantemente em seu trabalho é a

    criatividade. Para ele, criatividade é um atributo essencial e básico para a vida das

    pessoas, e também um fator de transformação para o processo psicoterapêutico.

    Para ele, criatividade engloba os níveis abstratos e concretos, quer dizer, não basta

    apenas criar intelectualmente algo, é necessário que se realize efetivamente esta

    experiência. É necessário com isso, que tal experiência criativa seja compartilhada

    com os semelhantes. Com esta visão, o consultório passa a ser um terreno

    experiencial, pois o cliente por meio da sua liberdade investiga sua natureza interior.

    Este contato cliente-terapeuta poderá abrir um canal criativo para ambos que trará

    uma profunda capacidade de transformação, crescimento e integração.

    3 INFLUÊNCIAS FILOSÓFICAS

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    A Gestalt-terapia sofreu influência da filosofia por meio do existencialismo e

    da fenomenologia. Para entender um pouco esta diferença é necessário que seenxergue a fenomenologia como um método e o existencialismo como uma filosofia.

    Podemos dizer que a Gestalt-terapia é uma abordagem fenomenológica e

    existencialista.

    Embora Fritz pouco tenha desenvolvido e estabelecido as correlações das

    influências filosóficas sobre a Gestalt-terapia, atualmente, é quase uma “obrigação”

    de seus sucessores resgatarem esta importância que é ampla e inegável. Muito da

    Gestalt-terapia de Fritz foi criada a partir de sua prática, agora é necessário que seretome criticamente as bases filosóficas da Gestalt-terapia. Para, então, dar uma

    nova e consistente consciência teórica a nossa prática e nossos projetos.

    Em relação à fenomenologia, é necessário que haja um predomínio da

    experiência imediata, do fenômeno, ou seja, de algo que emerge em um

    determinado momento. Esta vivência deverá se apresentar da forma como é

    percebida ou sentida corporalmente, dentro do aqui-agora. O que é essencial é a

    vivência imediata. Como método, é mais importante descrever do que explicar, ou

    seja, o como precede o porquê. Os sentidos atribuídos à percepção dos eventos do

    mundo são atribuídos aos fatores irracionais e são diferentes em cada um de nós.

    Dizer que a Gestalt-terapia é fenomenológica implica em um processo em

    que a pessoa experiência o fenômeno de forma particular e única. Junto a este

    conceito está o fato de que apenas no aqui-agora tal fato será possível, oferecendo

    a esses fenômenos pessoais o existencial imediato. A sensação confere o primeiro

    nível experiencial do aqui-agora, porém manter este contato sensorial nem sempre é

    uma tarefa fácil. Dentro da concepção temporal, podemos dizer que, para a Gestalt-

    terapia, a realidade só existe no presente. Neste presente podemos incluir também

    as lembranças que são reencenadas, trazidas de volta para o presente e revividas

    concretamente. O espaço em que a pessoa vive a experiência fica limitado ao aqui,

    ou seja, o espaço que ocupa e pela amplitude dos sentidos. Podemos concluir que

    “o aqui-agora representa uma experiência de caráter altamente pessoal,

    sensorialmente ancorada neste momento de tempo, no local em que me encontro”

    (ZINKER, 2007, p. 101).

    Dentro deste contexto, a experiência precisa ser entendida como algo

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    contínuo, fluído e dinâmico, sempre focalizando o processo em andamento que a

    pessoa está se colocando. Nunca será priorizada a interpretação do fenômeno, mas

    sim, um estudo da natureza processual e mutável da experiência humana.Analisando por este prisma, a pessoa passa a ser a única autora de suas próprias

    experiências, se responsabilizando por sua realidade, encarando-a como uma

    experiência solitária e única, ou seja, apenas a própria pessoa poderá dar conta e

    experienciar a sua vida interior. Assim como, a própria validade da experiência é

    também única e inquestionável.

    Edmund Husserl (1859 - 1938) é considerado o pai da fenomenologia. Ele foi

    matemático, filósofo austríaco e aluno de Franz Bretano, de quem sofreu grandeinfluência. Para respeitar a linha temporal da construção do conhecimento

    apresentarei as ideias de Bretano  e depois de Husserl, em seguida, Scheler   que

    pode ser considerado um filósofo fenomenologista e por último Merleau-Ponty.

    Bretano  (1838 - 1917) foi precursor da fenomenologia. Diferente do

    empirismo inglês que observava vários fatos generalizando o que havia em comum,

    Bretano acreditava em um empirismo que buscava ver o que há de essencial em um

    “único caso”. Isto levará para a ideia da essência do fenômeno. Ele propõe uma

    psicologia descritiva, enfatizando o como e não o por quê. Esta ideia é bastante forte

    na Gestalt-terapia até hoje. Este pensamento ressalta a necessidade de se valorizar

    o processo associado à psicologia do ato, em oposição ao estruturalismo que

    evidenciava a psicologia dos conteúdos. A psicologia deveria estudar os processos

    mentais ou psíquicos da pessoa e não os conteúdos ou objetos físicos. Bretano trata

    da intencionalidade dos fenômenos psíquicos, num prenúncio da fenomenologia,

    desenvolvida por Husserl. A consciência não é um recipiente, mas um farol.

    Husserl vivia em um mundo onde a filosofia se volta para as ciências

    positivas (matemática, física, etc.) e a psicologia tentava ser uma ciência exata

    adotando o mesmo método das ciências naturais e abandonando a subjetividade e a

    intuição.

    Husserl não acreditava no movimento empirista de que todo o conhecimento

    advém da prática. Esta máxima fugia ao imediatismo da situação presente e entra

    no campo da abstração, uma vez que é impossível inferir cada conhecimento e sua

    prática originária. Também, não concordava com o psicologismo do final do século

    XIX, onde se reduzia tudo o que se conhecia a um fenômeno natural. Não se

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    explicava o próprio conceito das coisas, apenas o ato de se conhecer os objetos por

    meio dos mecanismos fisiológicos.

    Partindo dessas oposições e do pressuposto de que o objeto de estudo dapsicologia é diferente das outras ciências, uma vez que a vida psíquica apresenta

    um dado imediato que podemos ter acesso por meio da descrição, ele propõe que a

    Fenomenologia reúna os dados da experiência em sua totalidade (fenômeno) e o

    pensamento racional (logos).

    Ele faz da fenomenologia um método que busca a verdade partindo do

    questionamento: “como podemos perceber a verdade?” Quando tentou responder a

    esta pergunta, ele percebeu que antes de perceber a verdade, ele se deparou com acapacidade de perceber algo, ou seja, o ato mais originário é o ato de perceber algo

    que é percebido. Se o ato de perceber depende do percebido, o ato de pensar

    depende do pensando. Então, ele concluiu que a consciência é sempre “de alguma

    coisa”, sendo necessário um objeto e um foco. Quando percebe que esta

    consciência tem em vista algo, ele define que há uma intencionalidade de algo ou

    uma consciência intencional.

    O fato de que na Gestalt-terapia não há uma atitude interpretativa vem da

    compreensão fenomenológica de que os fenômenos são dados pelos nossos

    sentidos, e que estes são dotados por um sentido ou essência, uma espécie de

    “retorno às coisas mesmas”. É importante entender a necessidade de uma intuição

    originária que poderá ser revelada na busca do sentido do fenômeno pelo próprio

    cliente, por meio da identificação e integração das partes alienadas.

    Um dos fortes conceitos da Gestalt-terapia é que o aqui-agora estabelece

    suas raízes no método fenomenológico, afinal esta estrutura de “perceber o

    percebido” acontece impreterivelmente no presente, no aqui-agora. O fenômeno só

    acontece no agora.

    Outra influência grande na Gestalt-terapia de seus conceitos teóricos é a

    relação cliente-terapeuta. Baseado no fato de que a mesma estrutura

    perceber/percebido não é divisível, podemos entender que o observador/observado

    também não é, ou seja, tanto o terapeuta que “observa” quanto o cliente que é

    “observado” faz parte de uma mesma unidade. Caminhando mais um pouco dentro

    desta relação dialógica, percebemos que as duas partes (observador/observado)

    interagem e interferem neste campo. Quando paramos para descrever o observado,

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    na verdade, descrevemos a nossa relação com o observado, enfim, descrevemos

    parte de nós mesmos.

    Em relação à visão de mundo, para a Gestalt-terapia as pessoas seconstituem nas relações que criam em suas vidas. A fenomenologia, por sua vez,

    também compartilha a ideia de que o sentido das coisas não está em si, mas

    sobressai em cada relação observador/observado. É preciso entender como cada

    indivíduo vê o mundo. Afinal, o “eu inteiro” influencio e sou influenciado pelo

    contexto como um todo.

    Max Scheler   (1874 - 1928) foi um filósofo alemão que ficou conhecido por

    seu trabalho sobre fenomenologia, ética e antropologia filosófica. Scheler  desenvolveu o método fenomenológico de Husserl, chegou a conhecê-lo na

    Universidade de Viena, mas não foi seu aluno. Scheler   acreditava que a

    fenomenologia não era o nome de uma nova ciência, nem uma palavra de

    substituição para filosofia, mas uma postura espiritual.

    O centro do pensamento de Scheler   era a sua teoria do valor. De acordo

    com Scheler , o ser-valor de um objeto precede a percepção. Os valores e seus

    correspondentes opostos existem em uma ordem objetiva. Sua obra mais importante

    foi publicada em 1923, e intitulou-se “Essência e Forma da Simpatia”. Desenvolve o

    conceito referente a uma fenomenologia da afetividade na qual é a intuição

    emocional e a simpatia que permitem o contato profundo.

    Ao longo de sua vida, Scheler   apresentou diversas posturas e ideias

    contrárias, até adotar uma doutrina claramente modernista e gnóstica no final de sua

    vida. A relação do homem com o divino sofre uma reviravolta: o ser primeiro

    interioriza-se no homem no mesmo ato em que o homem se interioriza nele. O lugar,

    portanto, da autorrealização do ser, ou seja, da unidade de impulso e espírito vem a

    ser o homem, o eu, o coração do homem. Homem e Deus são correlativos: o homem

    não pode realizar o seu destino sem participar dos dois atributos do ente supremo e

    sem ser imanente a ele. Em 1954, Karol Wojtyla, posteriormente Papa João Paulo II,

    defendeu sua tese sobre "Uma avaliação da possibilidade de construir uma Ética

    Cristã baseada do sistema de Max Scheler ".

    Maurice Merleau-Ponty  (1908 - 1961), um psicólogo, antropólogo e filósofo

    francês, tem como tema fundamental de seu trabalho a relação entre o homem e o

    mundo. Afirma que a consciência é sempre um eu consagrado ao mundo. Vê o

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    sou”. Isto se revela na Gestalt-terapia em sua negligência à objetividade, à

    existência coletiva e à necessidade de teorização sistemática.

    Martin Buber  (1878 - 1965) foi um filósofo judeu que desenvolveu a categoriado diálogo. Ele pregava a necessidade de um encontro autêntico, a relação direta e

    fraterna como uma atitude integradora entre a vivência e a reflexão. A atitude Eu-Tu

    é caracterizada pelo envolvimento, reciprocidade, imediatismo, presença e

    responsabilidade; a atitude Eu-Isso é caracterizada pela separação, ou

    distanciamento, necessários para a produção teórico-científica.

    A Gestalt-terapia como uma psicoterapia baseada no encontro existencial

    seria dotada de dois movimentos: relação (Eu-Tu) e distanciamento (Eu-Isso), semos quais não se caracteriza como tal, uma vivência da teoria e uma teorização da

    vivência. Em 1923, Buber  publicou o livro: “Eu e Tu”.

    Martin Heidegger  (1889 - 1976), filósofo alemão, desenvolveu a concepção

    da análise existencial do “ser aí” ou “dasein”. Sem dúvida, foi um dos maiores

    pensadores do século XX, quer pela visão do “ser”, quer pela refundação da

    ontologia. Heidegger  influenciou muitos outros filósofos, tal como, Sartre, e foi muito

    influenciado por Husserl. Foi assistente de Husserl em Freiburg e depois professor

    na Universidade de Marburg. 

    Em 1927, Heidegger publicou o seu mais famoso trabalho “Ser e Tempo”.

    Ele considerava seu método fenomenológico e hermenêutico, porém, Husserl não

    concordava e acabaram rompendo laços.

    O trabalho hermenêutico tem como objetivo interpretar o que se mostra

    pondo à luz, o que se manifesta, mas que, no início e na maioria das vezes, não se

    deixa ver. Heidegger afirma que esta metodologia corresponde a um modelo

    kantiano, ou coperniciano da colocação ou projeção da perspectiva.

    Até o final da década de 1930, a leitura da filosofia de Heidegger estrutura-

    se sobre conceitos como Dasein (o ser-aí ou o ser-no-mundo), morte ou finitude do

    ser, valorização da angústia ou decisão por meio da dúvida existencial. Suas

    categorias básicas seriam o entendimento, pouco valorizado pela Gestalt-terapia; o

    sentimento (enfatizado pela mesma) e a linguagem (destacada por Fritz, mas pouco

    enfatizada pela Gestalt-terapia).

    Jean Paul Sartre (1905 - 1980) foi um grande nome do existencialismo, mas

    foi pouco referenciado por Fritz. Dentro da Gestalt-terapia, poderíamos nos referir a

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    sua noção de “projeto” (o homem como próprio construtor de sua essência) e de

    “responsabilidade” (habilidade de resposta), ou seja, responsabilidade pela escolha

    de seu próprio projeto, de sua parte da liberdade.

    4 HOLISMO E VISÃO SISTÊMICA

    Holismo foi um termo adotado por Jan Smuts  no seu livro “Holism and

    Evolution” de 1926. Ele definiu esta ideia como "A tendência da Natureza a formar,através de evolução criativa, ‘todos’ que são maiores do que a soma de suas

    partes". Desde Aristóteles, podemos ver as raízes desta ideia, quando em sua

    metafísica ele afirma: “o inteiro é mais do que a simples soma de suas partes”.

    Embora antiga essa concepção só tomou força a partir da década de 1980

    quando passou a ser empregada para tentar explicar um novo paradigma que

    deveria ser utilizado com o objetivo de minimizar os diversos distúrbios causados

    pelo homem na natureza. Por isso, o holismo é frequentemente associado a

    discursos ambientalistas.

    Este conceito traz uma visão de mundo integrado, como um organismo. Esta

    nova visão baseia-se na inter-relação e interdependência entre todos os fenômenos,

    sejam eles físicos, biológicos, psicológicos, sociais ou culturais. Esta proposta prevê

    uma formulação gradual de uma rede de conceitos e modelos interligados, além de

    se contrapor ao modelo mecanicista e reducionista ainda dominante na biologia e na

    medicina.

    Desde o século XVII, principalmente com as ideias de Descartes e Newton,

    o homem vem sendo comparado a uma máquina, concentrando nas propriedades

    mecânicas da matéria viva e negligenciando o estudo sistêmico da natureza do

    organismo. A descrição reducionista foi vantajosa para desenvolver um caráter

    evolutivo, e ainda é, em alguns casos, útil e necessária, porém torna-se perigosa

    quando é interpretada como uma explicação completa.

    Atualmente, a biologia traz um paradigma chamado “biologia de sistemas”, o

    qual vê o organismo como um sistema vivo e não como uma máquina. Os sistemas

    são totalidades integradas, cujas propriedades não podem ser reduzidas às de

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    unidades menores. A abordagem sistêmica enfatiza os princípios básicos de

    organização.

    O pensamento sistêmico é um pensamento de processo. Na ciênciasistêmica, toda estrutura é vista como a manifestação de processos subjacentes.

    Esta visão carrega a primeira grande diferença entre o homem e a máquina. Afinal,

    máquinas são construídas e os organismos se desenvolvem.

    Outra ideia que podemos trazer é o alto grau de flexibilidade e plasticidade

    encontradas nos organismos. Os organismos variam sua estrutura dentro de um

    limite. Este fenômeno de automanutenção é chamado de flutuação ou homeostase,

    que é um estado de equilíbrio dinâmico, transacional. Não há, portanto, doisorganismos que sejam rigorosamente idênticos, muito diferentes das máquinas que

    funcionam de acordo com cadeias lineares de causa e efeito. O funcionamento do

    organismo é guiado por modelos cíclicos de fluxo de informação, conhecidos por

    laços de realimentação. Quando um sistema é afetado, esta é usualmente causada

    por múltiplos fatores.

    Todas estas comparações entre organismos e máquinas originaram, mais

    tarde, as principais realizações da cibernética, que tinha como intenção, desde o

    início, criar uma ciência exata da mente. A cibernética sofreu influência da biologia

    organísmica e da teoria geral dos sistemas, mas logo se tornou independente,

    configurando um poderoso movimento intelectual. Nunca esquecendo a interação

    entre a biologia, matemática e engenharia.

    Uma das grandes diferenças entre as máquinas de Descartes e a

    cibernética, é que esta última prevê o conceito de realimentação em seu

    funcionamento, que passou a significar o transporte de informações presentes nas

    proximidades do resultado de qualquer processo, depois, de volta até sua fonte. Um

    padrão lógico subjacente à concepção de alimentação é a ideia de causalidade

    circular. Por outro lado, o entusiasmo entre os cientistas e o público em geral, pelo

    computador como uma metáfora para o cérebro humano tem um paralelo

    interessante no entusiasmo de Descartes e de seus contemporâneos pelo relógio

    como uma metáfora para o corpo.

    Um organismo vivo é um sistema auto-organizador, o que significa dizer que

    tem certo grau de autonomia. Sua ordem e estrutura são determinadas pelo próprio

    sistema, e não pelo meio. Porém, não significa dizer que os sistemas estejam

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    isolados do seu meio. Os sistemas interagem continuamente com o meio, mas estes

    não determinam sua organização. Os sistemas vivos são sistemas abertos, o que

    significa que é preciso manter uma contínua troca de energia e matéria com o meioambiente, a fim de permanecerem vivos. Os sistemas auto-organizadores têm um

    alto grau de estabilidade, porém, é uma estabilidade dinâmica, diferente da ideia de

    equilíbrio, pois é necessário manter uma estrutura global apesar de mudanças e

    substituições de suas partes.

    Os dois principais fenômenos dinâmicos da auto-organização são: a

    autorrenovação e a autotranscendência. O primeiro, fala da capacidade dos

    sistemas vivos de renovar e reciclar continuamente seus componentes. Diferentedas máquinas que são construídas para produzir um produto específico ou executar

    uma tarefa, o organismo se renova o tempo todo.

    O segundo, da capacidade de se dirigir criativamente para além das

    fronteiras físicas e mentais nos processos de aprendizagem, desenvolvimento e

    evolução. Os organismos apresentam uma complementaridade no seu

    funcionamento com tendências autoafirmativas e integrativas.

    Além disso, temos uma tendência fantástica dos organismos de se

    superarem. Essa superação criativa em busca da novidade leva a um

    desdobramento ordenado de complexidade e pode ser visto como uma propriedade

    fundamental da vida. Associando esta realidade com o processo terapêutico,

    podemos dizer que só poderemos ajudar o nosso cliente em seu processo de

    mudança, quando conseguirmos inserir a novidade e o interesse em sua terapia.

    É bastante difícil definir precisamente as fronteiras entre o organismo e o

    meio. Existem organismos que só podem ser considerados vivos quando estão num

    certo ambiente, como é o caso dos vírus. Por outro lado, temos exemplos de

    organismos que se integram harmoniosamente em seu meio ambiente, convertendo-

    os em ecossistemas capazes de sustentar uma grande diversidade de animais e

    plantas, como é o caso dos corais.

    Os ecossistemas tendem a ter uma convivência em que combinam

    competição e dependência, este balanço propicia um crescimento exponencial de

    sua população. As relações entre os organismos vivos são essencialmente

    cooperativas, caracterizadas pela coexistência e a interdependência, e simbióticas

    em vários graus, a fim de manter o equilíbrio. Mesmo a relação predador-presa,

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    embora seja destrutiva para a presa imediata, são geralmente benéficas para ambas

    as espécies.

    Há uma tendência dos sistemas vivos de se estruturarem por meio demúltiplos níveis, que diferem em sua complexidade. Isto pode ser visto como um

    princípio básico de auto-organização. Em cada nível de complexidade encontramos

    sistemas integrados, todos auto-organizadores, que consistem em partes menores e

    atuam como partes de totalidades maiores.

    Em cada nível existe um equilíbrio dinâmico entre tendências autoafirmativas

    e integrativas. Podemos representar estes níveis por meio de uma “árvore

    sistêmica”. Estes sistemas estratificados evoluem muito mais rapidamente e têmuma probabilidade maior de sobrevivência do que os sistemas não estratificados. O

    aspecto importante da ordem estratificada na natureza não é a transferência de

    controle, mas a organização da complexidade.

    Outro ponto importante desta ordem é a questão da morte. A

    autorrenovação do sistema maior consiste no seu próprio ciclo de nascimento e

    morte, tornando-se aspectos importantes do próprio processo auto-organizador.

    Podemos dizer, que além da morte, outro ciclo importante para a evolução é o ciclo

    reprodutivo. Sem sexo não haveria diversidade, sem morte não haveria

    individualidade.

    Dentro deste conceito de sistemas estratificados, podemos concluir que o

    planeta, como um todo, pode ser considerado como um único organismo vivo.

    Considerar Gaia como um ser planetário vivo é uma ideia que transcende

    largamente o âmbito da ciência, e reflete uma profunda consciência ecológica, que

    é, em última instância, espiritual.

    Na teoria neodarwiniana clássica, a evolução avança para um estado de

    equilíbrio, com os organismos adaptando-se cada vez mais perfeitamente ao seu

    ambiente. De acordo com a visão sistêmica, a evolução opera longe do equilíbrio e

    desenrola-se por meio de uma interação de adaptação e criação.

    Também considera que o meio é, em si mesmo, um sistema de adaptação e

    evolução. O que sobrevive é o “organismo em seu meio ambiente”. Um organismo

    que pense unicamente em termos de sua própria sobrevivência destruirá

    invariavelmente seu meio ambiente.

    A evolução precisa ser entendida de forma aberta e indeterminada. Quando

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    um sistema se aproxima do ponto crítico, ele mesmo “decide” que caminho seguir, o

    que determinará sua evolução. Na visão sistêmica, o processo evolutivo não é

    determinado pelo “acaso cego”, mas representa um desdobramento de ordem ecomplexidade que pode ser visto como um processo de aprendizagem, envolvendo

    autonomia e liberdade de escolha.

    Podemos dizer que duas etapas na evolução da vida aceleram o processo

    evolutivo. A primeira foi a reprodução sexual, com toda a sua variedade genética; e

    a segunda foi o surgimento da consciência. Este processo tornou possível substituir

    os mecanismos genéticos da evolução por mecanismos sociais, mais eficientes,

    baseados nos pensamentos conceituais e na linguagem simbólica.Quando entendemos que a mente e a matéria se aproximam, nos

    distanciamos da dicotomia cartesiana e podemos considerar que representam

    aspectos diferentes do mesmo processo universal.

    O cérebro humano é um sistema vivo por excelência e amolda-se em

    resposta às mudanças que surgem. A mente humana é capaz de criar um mundo

    interior que espelha a realidade exterior. Este domínio psicológico envolve certos

    números de fenômenos característicos da natureza humana que incluem a

    autoconsciência, a experiência consciente, o pensamento conceitual, a linguagem

    simbólica, os sonhos, a arte, a criação de cultura, senso de valores, interesse no

    passado remoto e preocupação com o futuro distante.

    Os mundos, interior e exterior, estão sempre interligados no funcionamento

    de um organismo humano. Os modelos de matéria espelham modelos da mente,

    coloridos por sentimentos e valores subjetivos. Nossas respostas ao meio ambiente

    são determinadas pelos estímulos externos, pelo sistema biológico, e também por

    nossas experiências passadas, expectativas, propósitos e a interpretação simbólica

    individual de nossa experiência perceptiva.

    Moldamos nosso meio ambiente com muita eficácia porque somos capazes

    de representar o mundo exterior simbolicamente, pensar conceitualmente e

    comunicar nossos símbolos, conceitos e ideias, utilizando a linguagem abstrata, a

    pintura, a música, e outras formas de arte.

    Ao pensarmos e nos comunicarmos, tanto lidamos com o presente, como

    nos referimos ao passado e antevemos o futuro, o que nos dá um grau de

    autonomia muito superior às outras espécies. Os seres humanos possuem

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    consciência, e estamos conscientes de nossas sensações tanto quanto de nós

    próprios como indivíduos pensantes e experientes.

    A concepção sistêmica da mente estende sua concepção para os sistemassociais e ecológicos. Então, podemos dizer que grupos de pessoas, sociedade e

    culturas têm uma mente coletiva, unificando a concepção científica e mística.

    Considera que a matéria primária e a consciência são propriedades de complexos

    modelos materiais que surgem num certo estágio da evolução biológica.

    Para entender a natureza humana, precisamos estudar as manifestações

    sociais e culturais, além das físicas e psicológicas. A fim de se adaptar às mudanças

    da vida, a espécie humana usou a consciência, o pensamento conceitual e alinguagem simbólica de que dispõe para transferir-se da evolução genética para a

    evolução social, esta mais acelerada do que a primeira.

    A grande relação entre a teoria sistêmica e a Gestalt-terapia é a concepção

    de que o todo é maior do que a soma de suas partes. Quando analisamos os

    elementos de forma isolada, as propriedades sistêmicas do fenômeno são

    destruídas, embora seja possível discernir as partes individuais em qualquer

    sistema, a natureza do todo é sempre diferente da mera soma de suas partes. As

    propriedades das partes não são propriedades intrínsecas, mas só podem ser

    entendidas dentro do contexto do todo mais amplo. O pensamento sistêmico se

    apresenta de forma contextual. É importante analisarmos que o conceito parte todo

    fica muito relacionado com as concepções, reducionista e sistêmica,

    respectivamente. Porém, é mais importante entendermos que estas concepções

    deverão ser utilizadas para a compreensão mais aprofundada da vida.

    Reducionismo e holismo, análise e síntese devem ser vistos como enfoques

    complementares. Assim, fica claro que tanto a parte influencia o todo, quanto o todo

    às suas partes.

    A evolução da consciência no homem criou a potencialidade desta espécie

    de viver pacificamente e em harmonia com o mundo natural. A evolução continua a

    oferecer esta possibilidade de escolha ao homem, caberá a ele decidir qual caminho

    ele deverá seguir. Podemos deliberadamente alterar nosso comportamento

    mudando nossas atitudes e nossos valores, a fim de readquirirmos a espiritualidade

    e a consciência ecológica que perdemos.

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    5 CONCEITO DE SAÚDE EM GESTALT-TERAPIA

    Kurt Goldstein foi um teórico que muito influenciou a Gestalt-terapia e seus

    estudos sobre os efeitos secundários das lesões cerebrais estabeleceram a base

    para o seu ponto de vista organísmico. Não temos como falar de saúde na Gestalt-

    terapia sem explicar a visão do sintoma para esta abordagem. Goldstein foi o

    primeiro teórico que passou a ver o sintoma como uma forma adaptativa, portanto

    saudável, diferente do que se pensava, até então, que seria “um sinal” de que algoestaria errado e que deveria ser eliminado.

    Não podemos falar da organização primária do organismo de Goldstein sem

    entender que esta faz parte do processo de figura/fundo. Ou seja, figura é qualquer

    processo que emerge, que tem fronteira definida e destaca-se de um fundo a partir

    de uma necessidade do próprio organismo. O fundo é contínuo e se estende por trás

    da figura. Depois, novas figuras emergem como tarefas da mudança do organismo.

    Goldstein também salientou que existem três tipos de comportamento: os

    desempenhos, que são atividades voluntárias; as atitudes, organização emocional

    mais ampla incluindo os valores, os sentimentos, os estados de ânimo, etc.; e os

    processos, que são funções corporais que só podem ser experienciadas

    indiretamente.

    Ele também aborda a diferença entre o comportamento concreto e o

    comportamento abstrato. No primeiro, reagi-se a um estímulo de maneira automática

    ou direta, já no segundo, pensa-se antes de agir. Estes dois dependem de atitudes

    contrastantes em relação ao mundo.

    Os principais conceitos apresentados por Goldstein são: o processo de

    equalização, no qual aparece como a base para o conceito de ciclo de

    autorregulação; a autorrealização é o que dá sustentação ao potencial humano e o

    “chegar a um acordo” com o ambiente (ou mundo), afinal este ambiente se impõe ao

    organismo estabelecendo uma interação entre ambiente e organismo, necessária

    para que este lhe proporcione meios pelos quais a autorrealização possa ser obtida.

    O processo de equalização consiste em fazer com que o organismo volte

    para um estado “médio” de tensão depois que um estímulo muda o equilíbrio

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    originário. Portanto, podemos dizer que a meta de uma pessoa normal não é

    simplesmente descarregar a tensão, mas equalizá-la, redistribuindo toda a energia

    necessária.A autorrealização traduz, na verdade, o único motivo que o organismo

    possui que é realizar-se, e representa a tendência criativa da natureza humana. A

    maneira como cada pessoa busca esta autorrealização varia muito conforme as

    potencialidades inatas de cada um. Estas potencialidades ou preferências dão forma

    aos fins e dirigem o desenvolvimento e o crescimento individuais. Este princípio

    orgânico torna o organismo mais desenvolvido e mais complexo.

    Com relação à interação organismo/ambiente podemos dizer que o ambienteperturba o organismo por meio de estímulos e, este, busca no próprio ambiente

    aquilo que necessita para equalizar o seu funcionamento normal.

    Porém, se a discrepância entre as metas do organismo e as realidades do

    ambiente for muito grande, o organismo entra em colapso, ou desiste de algumas

    metas e tenta realizar-se em um nível inferior de existência.

    Em conformidade com as ideias de Goldstein, Perls traz a concepção de que

    nenhum organismo é autossuficiente, e que necessita do mundo para satisfazer

    suas necessidades. Há uma interdependência do organismo e seu ambiente, dentro

    de uma realidade objetiva e uma realidade subjetiva. É a partir do mundo objetivo

    que o indivíduo cria seu mundo subjetivo.

    Partes do mundo objetivo são selecionadas de acordo com nossos

    interesses, limitadas apenas pelos instrumentos de percepções e por inibições

    sociais e neuróticas. A realidade que importa é a realidade dos interesses – a

    realidade interna e não a realidade externa.

    Relacionando estas ideias com o conceito de figura/fundo, podemos concluir

    que não percebemos a totalidade de nosso ambiente, mas ao mesmo tempo

    selecionamos objetos de acordo com nossos interesses, e estes objetos aparecem

    como figuras proeminentes contra um fundo “escuro”.

    O organismo e o mundo apresentam uma relação tão integrada que não

    podemos definir quem serve a quem; ou seja, as ações e reações que ocorrem no

    mundo e no organismo estão entrelaçadas, sem que haja uma relação de

    causalidade, ou uma simples resposta para uma pergunta.

    Em toda e qualquer investigação biológica, psicológica ou sociológica temos

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    de partir da interação entre o organismo e seu ambiente. Podemos ir, além disso,

    quando percebemos que na verdade não apenas selecionamos nosso mundo, como

    podemos ser selecionados por outras pessoas como objetos de seus interesses.Toda esta realidade sugere uma organização maior, uma realidade coletiva,

    por meio de leis, compromissos, convenções, etc. Não podemos nos esquecer

    também da realidade imaginária, em que o homem cria um mundo adicional, cheio

    de projeções. Desse modo, em qualquer estudo de ciências do homem, incluindo a

    psicoterapia, temos de falar de um campo no qual interagem pelo menos fatores

    socioculturais, animais e físicos.

    Tudo isto comprova e denota uma interdependência muito forte e dinâmicaque ocorre entre o organismo e o ambiente. Ampliando este conceito, podemos dizer

    que a própria psicologia estuda a operação da fronteira de contato no campo

    organismo/ambiente. Esta relação pode ser bem representada por meio do ciclo de

    contato sugerido por Perls,  em que há uma compreensão de um dos fenômenos

    mais importantes, a autorregulação organísmica, muito diferente da regulação de

    instintos por princípios morais ou autocontrole. O princípio que governa nossas

    relações com o mundo externo é o mesmo princípio intraorgânico de busca de

    equilíbrio, que é a autorregulação.

    Entender a abordagem holística dentro da saúde também é um novo

    movimento de quebra de paradigmas, afinal nem todas as culturas tradicionais

    abordaram a saúde desta forma. Por meio dos tempos, as culturas têm oscilado

    entre o reducionismo e o holismo em suas práticas médicas. Enquanto o foco da

    medicina científica ocidental incide sobre os mecanismos biológicos e os processos

    fisiológicos que produzem a evidência da enfermidade, a principal preocupação do

    xamanismo está relacionada com o contexto sociocultural em que a enfermidade

    ocorre, obedecendo a um enfoque psicossomático e trabalhando com o inconsciente

    coletivo e social, compartilhado por toda a comunidade.

    No âmago da medicina hipocrática, a medicina devia ser exercida como uma

    disciplina científica. As doenças não são causadas por demônios ou forças

    sobrenaturais, mas são fenômenos naturais que podem ser estudados e

    influenciados por procedimentos terapêuticos e pela conduta de vida do indivíduo,

    incluindo a influência dos fatores ambientais (ar, água, alimentos, etc.).

    A tradição hipocrática, com sua ênfase na inter-relação fundamental de

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    corpo, mente e meio ambiente, representa um ponto alto da filosofia médica

    ocidental. Estes princípios foram desenvolvidos na China antiga, muito influenciado

    pelo xamanismo, taoísmo e confucionismo.Para a medicina Chinesa, o universo inteiro, natural e social, encontra-se em

    estado de equilíbrio dinâmico, e o organismo humano é um microcosmo do universo.

    A doença é o resultado de um conjunto de causas que culminam em desarmonia e

    desequilíbrio. A finalidade da medicina chinesa é, antes, realizar a melhor adaptação

    possível do indivíduo ao meio ambiente como um todo. O paciente, para isso,

    desempenha um papel importante e ativo e é responsável pela manutenção da sua

    própria saúde. Embora o sistema chinês apresente esta concepção holística dasaúde, ainda sim negligenciou o holismo no que se refere aos aspectos psicológicos

    e sociais da doença.

    Para entender esta complexidade holística que envolve a saúde, é

    necessária compreender o conceito de saúde. Saúde é um estado de bem-estar que

    se estabelece quando o organismo funciona de certa maneira, e que reflete uma teia

    de relações entre múltiplos aspectos do fenômeno da vida. A saúde é um fenômeno

    multidimensional, que envolve aspectos físicos, psicológicos e sociais, todos

    interdependentes.

    Podemos então dizer que a saúde é uma experiência subjetiva. Baseado no

    novo paradigma da visão sistêmica a saúde é encarada como um processo

    contínuo, refletindo a resposta criativa do organismo aos desafios ambientais.

    Saúde, também pode ser entendida como um equilíbrio dinâmico que

    envolve os aspectos físicos, psicológicos e sociais do organismo, assim como suas

    interações com o meio ambiente natural e social. Este conceito de saúde é

    compatível com a concepção sistêmica de vida, com a tradição hipocrática e a

    tradição da medicina do leste asiático.

    A doença é, portanto, uma consequência de desequilíbrio e harmonia, e por

    outro lado, ser saudável significa estar em sintonia consigo mesmo – física e

    mentalmente – e com o mundo circundante.

    Como indivíduos, temos o poder e a responsabilidade de manter nosso

    organismo em equilíbrio, respeitando algumas regras de qualidade de sono,

    alimentação, exercícios e medicamentos. Atualmente, entendemos que a natureza

    psicossomática da doença subentende a possibilidade de autocura psicossomática.

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    Como exemplo, podemos citar o fenômeno do biofeedback  (vasta gama de

    processos físicos é influenciada pelos esforços mentais de uma pessoa). Algumas

    enfermidades graves exigirão um enfoque terapêutico que inclua além dos aspectosfísicos e psicológicos, o estilo de vida e a visão de mundo do paciente. Tudo isso

    como parte integrante do processo de cura.

    Acredita-se que o estresse excessivo contribua para a origem e o

    desenvolvimento da maioria das doenças, manifestando-se no desequilíbrio inicial

    do organismo.

    O pensamento sistêmico é um pensamento ambientalista, ou melhor, a

    percepção ecológica profunda traz o novo paradigma da visão de mundo holística ereconhece a interdependência fundamental de todos os fenômenos, enquanto

    indivíduos e sociedade, e a interligação dos processos cíclicos da natureza. A nova

    ciência da ecologia enriqueceu a maneira sistêmica de pensar introduzindo duas

    novas concepções – comunidade e rede.

    Comunidade ecológica é um conjunto de organismos aglutinados em um

    todo funcional por meio das suas relações mútuas. A concepção de sistemas vivos

    como redes fornece uma nova perspectiva sobre as camadas hierárquicas da

    natureza.

    Devemos considerar que os sistemas vivos são redes, interagindo à maneira

    de rede com outros sistemas. A teia da vida consiste em redes dentro de redes.

    Para esta proposta não há separação entre seres humanos e meio ambiente natural,

    concebendo os seres humanos apenas como um fio particular na teia da vida,

    baseados nos valores ecocêntricos (centralizados na Terra).

    Podemos concluir que esta percepção ecológica profunda é uma percepção

    espiritual ou religiosa, fortalecida pelas sensações de pertinência, de conexidade

    com o cosmos como um todo. Esta mudança de paradigma exige uma expansão

    nas nossas percepções, maneiras de pensar, e, principalmente, nos valores. Para

    isso, é necessário que as tendências autoafirmativas e integrativas funcionem de

    forma equilibrada.

    A partir da visão sistêmica teremos que ter em mente que um grande desafio

    do nosso tempo é a criação de comunidades sustentáveis, ou seja, ambientes

    sociais e culturais que podem satisfazer as necessidades e aspirações sem diminuir

    as chances das gerações futuras.

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    Em contrapartida, temos muitos trabalhos de corpo que podem ajudar a

    manter o equilíbrio. A terapia de trabalho de corpo baseia-se na crença de que todas

    as nossas atividades, pensamentos e sentimentos refletem-se no organismo físico,manifestando-se em nossa postura e movimentos, nas tensões e nos sinais

    corporais. Outro recurso é trabalhar padrões de respirações que refletem a dinâmica

    de todo o sistema corpo/mente.

    A Gestalt-terapia se destina a “curar” as patologias “comuns”, decorrentes da

    frustração de necessidades de nível inferior, além das metadoenças de nossa

    sociedade, os sofrimentos do espírito e das mais altas potencialidades humanas. É

    importante inspirar os clientes, propondo um modelo humano de amplo espectro,capaz de instigá-lo a almejar metas que antes não tinham compreendido e cogitado

    alcançar.

    A autorregulação organísmica é a consciência espontânea da necessidade

    dominante e sua organização das funções de contato. Numa situação de perigo,

    quando a tensão se inicia a partir de fora, a cautela e a deliberação são similarmente

    espontâneas.

    A ação autorreguladora é mais vívida, mais intensa e mais sagaz, o que

    parece espontaneamente importante de fato organiza realmente a maior parte da

    energia do comportamento.

    Porém, a experiência neurótica é também autorreguladora e se caracteriza

    por excesso de deliberação, fixação da atenção e músculos preparados para uma

    resposta específica. O self  fica impossibilitado de passar de uma energia para outra,

    a energia fica presa a uma tarefa que não pode ser completada. O neurótico tem

    uma sensibilidade ao perigo extremamente aguçada, ou seja, ele é cauteloso

    quando poderia relaxar com segurança. O que ocorre em situações de emergência é

    que fica clara a hierarquia subjacente e, assim, descobre-se “o que um homem é”.

    Podemos concluir que a autorregulação ocupa uma posição ética privilegiada,

    porque só ela guia a consciência organísmica e a força mais vigorosa. Qualquer

    outro tipo de avaliação tem de atuar com energia reduzida.

    O problema da psicoterapia é arregimentar o poder de ajustamento criativo

    do paciente sem forçá-lo a encaixar-se no estereótipo da concepção científica do

    terapeuta. É obviamente desejável ter uma terapia que estabeleça o menos possível

    uma norma, e tente retirar o máximo possível da estrutura da situação concreta, aqui

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    -agora, pois assim, podemos ter melhores esperanças de dissolver os elementos

    neuróticos.

    O sintoma é tanto uma expressão de vitalidade quanto uma “defesa” contraa vitalidade, além de representar a expressão da singularidade de um homem. O

    impulso neurótico não é unicamente negativo, ele exerceu um efeito modelador

    sobre o paciente, e não se pode explicar um efeito positivo por uma causa negativa.

    Portanto, é uma estrutura intrínseca de elementos vitais e embotadores, e que o

    melhor self  do paciente está investido nela.

    Quando simplesmente se dissolve as resistências, corre-se o risco do

    paciente tornar-se menos do que era. Dentro deste contexto, o terapeuta deve usaro método de empregar cada parte que funciona como sendo funcional, e não

    abstrair qualquer parte que funcione na situação concreta, incluindo o contexto do

    paciente e encontrando um experimento que ativará todas as partes como um todo

    do tipo exigido.

    As partes que funcionam são: a autorregulação do paciente, o conhecimento

    do terapeuta, a ansiedade liberada, a coragem e o poder criativo e formativo em

    cada pessoa.

    FIM DO MÓDULO I