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O PROFESSOR PDE E OS DESAFIOSDA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE
2009
Produção Didático-Pedagógica
Versão Online ISBN 978-85-8015-053-7Cadernos PDE
VOLU
ME I
I
A CAPOEIRA COMO FORMA DE INTERVENÇÃO SOCIAL E
RESISTÊNCIA CULTURAL
ANÉSIO SURMACZ
PROJETO DE INTERVENÇÃO
NA ESCOLA
A CAPOEIRA COMO FORMA
DE INTERVENÇÃO SOCIAL E
RESISTÊNCIA CULTURAL
Ficha Catalográfica Produção Didático-PedagógicaProfessor PDE/2010
TítuloA Capoeira Como Forma de Intervenção Social e
Resistência Cultural
AutorAnésio Surmacz
Escola de AtuaçãoColégio Estadual Dr. Afonso
Alves de Camargo
Município da escola Rio Azul
Núcleo Regional de Educação IratiOrientador Oséias de Oliveira
Instituição de Ensino Superior UNICENTROÁrea do Conhecimento História
Produção Didático-Pedagógica Caderno TemáticoRelação Interdisciplinar Educação Física e Artes
Público Alvo ( indicar o grupo com o qual o professor PDE desenvolveu
o trabalho: professores, alunos, comunidade...)
3º Ano do Ensino Médio
Localização (identificar nome e endereço da escola de implementação)
Colégio Estadual Dr. Afonso Alves de Camargo, Ensino
de Primeiro e Segundo Graus/Rua Cafieiro
Corsi,S/NApresentação:
A presente intervenção pedagógica vem a colocar-se como ponto de partida para uma melhor compreensão da capoeira e da forma como este vem se refletindo dentro da cultura do povo brasileiro e, consequentemente na escola. A capoeira vista como uma manifestação da cultura afro-descendente no país, sendo um esporte, luta, dança totalmente brasileira tem chamado a atenção em todo o mundo, porém sua prática nem sempre evidencia sua importância histórica. O presente estudo vem procurar refletir acerca da realidade histórica da capoeira, desde seu início até a prática atual, além de objetivar trazer este esporte, luta, dança, jogo para dentro do contexto pedagógico do Colégio Estadual Dr. Afonso Alves de Camargo, colocando os alunos em contato com a prática. A metodologia enfatizará o ensino através de oficinas onde os educandos realizarão estudos históricos, prática da capoeira e análise de obras de arte.
Palavras-chave Capoeira, história, análise.
SUMÁRIO
A CAPOEIRA: DE AMEAÇA À ORDEM PÚBLICA À SÍMBOLO DA CULTURA NACIONAL ..................... 9
CAPOEIRA: UM POUCO DE HISTÓRIA ............ 17
Escravidão .............................................................19
Marginalidade ........................................................24
Academias ..............................................................26
Bimba e Pastinha ..................................................... 27
A CAPOEIRA NA ATUALIDADE ....................... 29
A musicalidade ......................................................30
Principais movimentos da capoeira ........................39
Batizado e graduação .............................................42
A capoeira no Paraná .............................................44
OBRAS DE ARTE INSPIRADAS NA CAPOEIRA ...47
LIVROS RECOMENDADOS .............................. 51
6
SITES RECOMENDADOS ..................................55
REFERÊNCIAS ..................................................57
É capoeira na briga / é roda da vida
É a festa do povo / é revolta contida
Mas é o brotar do novo / é esperança florida
Capoeira é história /é povo é dor
Mas do que nunca vitória / mistério de amor
É a fonte infinita / de um povo que canta
Sua história que vive /Dando a volta por cima
É a volta do mundo / é a força unida
Tânia Leal e Dasa
A CAPOEIRA: DE AMEAÇA À ORDEM PÚBLICA À SÍMBOLO DA
CULTURA NACIONAL
Oséias de oliveira1
Notada em muitas instâncias de nosso dia-a-dia, a capoeira
tem sido entendida como uma prática cultural da sociedade
brasileira, que se expandiu de tal forma que tem sido identificada
até como um símbolo da cultura brasileira no exterior. Mas não
somente estes aspectos, apontam a relevância da capoeira em
nossa sociedade; as mudanças pelas quais esta prática cultural
atravessou até a sua atual afirmação e reconhecimento como
patrimônio imaterial da cultura nacional denotam a grande
relevância dessa prática social e os agentes a ela relacionadas
como formadores da sociedade.
Por constituir-se como uma manifestação cultural,
portanto, a capoeira foi passível de apropriações, redefinições
e, principalmente, de transformações. Ocupando lugar de
1 Professor Dr. Em História. Docente do Departamento de História - UNICENTRO - Irati - PR. Coordenador do Núcleo de Estudos Étnicorraciais.
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interesse entre historiadores, sociólogos, antropólogos,
educadores e professores de educação física, a capoeira
perpassou as instâncias acadêmica, educacional, política e foi
além, instalou-se também nas áreas relacionadas ao teatro, ao
cinema e à publicidade.
A compreensão do Instituto do Patrimônio Histórico e
Artístico Nacional (IPHAN) acerca da necessidade de registro,
declaração e reconhecimento da capoeira como patrimônio
imaterial do Brasil e da humanidade alargou ainda mais
o caráter fluido dessa prática social e ajudou consolidá-la
também como uma expressão artística.
Seja como uma atividade praticada em academias,
como esporte ou lazer, nos clubes e ruas, ou então, como
jogo ou dança, a capoeira representa uma série de mudanças
ocorridas ao longo da História do país, no que diz respeito aos
seus agentes sociais, suas práticas culturais, à religiosidade e
sua musicalidade.
A capoeira foi inicialmente identificada como uma prática
associada à resistência dos negros à escravidão, mas também
houve quem percebesse a sua associação com a observação
da natureza. Os golpes e os nomes dos movimentos foram
entendidos como uma tradução da relação intrínseca que
seus praticantes possuíam com o meio ambiente.
Desde a segunda metade do século XVIII e primeira
metade do século XIX, encontramos referências sobre a
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capoeira nos relatos dos viajantes e nas ilustrações de artistas
europeus, que percorreram o Brasil. É importante destacar
nestas observações da capoeira que ela era vista como uma
prática que incluía a participação das mulheres e de plateia;
estava presente nos cortejos fúnebres, era descrita, as vezes,
como uma prática que incluía uma algazarra a céu aberto na
qual dois indivíduos se precipitavam um contra o outro, tal
como fazem os bodes, quando um tenta derrubar o outro
com sua cabeça, evitando o ataque por meio de saltos.
Dessa forma, não foi difícil a compreensão da
capoeira e seus praticantes como uma perturbação ou
ameaça à ordem pública. Os praticantes, identificados
como indivíduos que preferiam usar mais a cabeça e os
golpes com os pés do que o bastão ou a espada, foram
criminalizados e entendidos como bandidos e baderneiros,
em nome de uma noção de organização e ordem pública
na sociedade brasileira do século XIX.
Assim, a capoeira foi duramente perseguida e reprimida
pela polícia, que enquadrava seus praticantes a partir do
Capítulo específico sobre os Vadios e Capoeiras. No artigo
402, do recém-implantado Código Penal da República, de
1890, a capoeiragem é definida como um ato de “fazer nas
ruas e praças públicas exercícios de agilidade e destreza
corporal”, ainda era entendida como “correrias com armas
ou instrumentos capazes de produzir uma lesão corporal,
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provocando tumulto ou desordens, ameaçando pessoa certa
ou incerta, ou incutindo temor de algum mal”. O importante
nesta definição era a preocupação com uma noção de ordem
pública que poderia ser ameaçada pela capoeiragem.
A pena estabelecida para tal crime era prisão de um a
dois meses. Se o capoeirista fosse associado a algum grupo,
ou malta, como se entendia na época, a pena se agravava.
Aos líderes, então, a pena era aplicada em dobro. Se houve
a reincidência, a penalidade poderia chegar a três anos, a
serem cumpridos em colônias penais em ilhas marítimas ou
então em regiões de fronteira.
Para completar o quadro da descrição da criminalização
da capoeira, nos casos em que houvesse homicídio, ou
alguma lesão corporal, ou fosse entendido como perturbação
da ordem, da segurança pública, ou mesmo da tranquilidade
e o capoeira fosse encontrado com armas, à ele era incorrida
as penas para esse crime de forma acumulada.
Neste contexto, a capoeira era descrita como um
costume bárbaro de negro, o praticante era visto como um
indivíduo aventureiro, astucioso, soturno e aterrador. Por isso,
as autoridades a caracterizavam como uma ameaça também
ao progresso social.
O percurso das transformações da capoeira até atingir
o status de símbolo nacional, ainda inclui a sua significação
no início do século XX como algo exótico, quando ocorre
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um movimento de reconhecimento e revalorização
de aspectos da cultura brasileira, principalmente das
manifestações populares. Pesquisadores e artistas,
novamente, percorreram o país no interesse de conhecer,
divulgar e inventariar as práticas culturais do Brasil e, dessa
forma, a capoeira é entendida como uma manifestação
integrante do folclore nacional.
Ao londo da primeira metade do século XX, os movimentos
migratórios de populações nordestinas ajudaram na expansão
de um estilo de capoeira praticada nessa região.
Durante a década de 1970, é marcante na história das
transformações da capoeira a sua absorção pela Confederação
Brasileira de Pugilismo, que a enquadrou na modalidade de
arte marcial, ou seja, um esporte de combate ou luta, com
regras fixas, uniforme e uma ética própria da prática desportiva.
Mas ainda era considerado um esporte, de agentes sociais,
associado às comunidades vistas como podres ou periféricas,
relacionado com as populações afrodescendentes.
Os anos de 1980, representam um outro momento
de grande expansão da capoeira, quando os grupos de
praticantes começam a se organizar juridicamente em
instituições caracterizadas como escolas. Neste momento
acentua-se uma postura de africanização da compreensão
histórica da capoeira, seus instrumentos e musicalidade. Há
um desejo de visita às raízes, de forma que, as cordas de sisal
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substituem as tarraxas dos tambores. Prolifera o número de
mestres e os mais antigos são revalorizados.
O papel do mestre é singular na capoeira; ele é
responsável pelo fortalecimento da tradição; constitui-
se como o representante de um saber decorrente de uma
trajetória, como aluno (ou discípulo), de convivência e
aprendizado da prática da capoeira. Aqueles que possuem
um caráter auto-didata dessa prática contribuem para a
multiplicação de estilos.
Ocorre na capoeira de um aluno se desvincular de
um grupo e iniciar um novo já como mestre e, desta forma,
reivindicar um outra tradição ou estilo. Mas é importante
destacar que o mestre distingui-se por sua condição de
representante, seja de uma tradição ou de uma instituição,
então, para tal ele precisa ter essa condição reconhecida
e atribuída por uma federação, grupo ou entidade como
portador de um saber envolvendo a capoeira.
Essa proliferação de mestres caracteriza mais um traço
marcante da capoeira, que consiste na sua heterogeneidade
de movimentos, rituais e ritmos por onde é praticada.
Percebemos essa condição desde o momento em que o
Mestre Bimba selecionou algumas técnicas, descartou outras,
incluiu novos golpes e estabeleceu a capoeira regional,
destacada pela inciativa didática do mestre, pela disciplina
imposta, pela inovação e ética desportiva.
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Já com o mestre Pastinha notamos uma valorização
da tradição, por meio do jogo lento, ritual e com ênfase nas
ladainhas. Neste estilo, as origens africanas são revisitadas no
sentido de identificar uma continuidade da prática de tinha
relação com os angolanos que aportaram no Brasil e, portanto,
poderia ser considerada como capoeira de Angola.
Assim, a resignificação da memória para a afirmação de
uma tradição histórica e a apropriação de diversos saberes,
sejam eles africanos, afro-brasileiros, caribenhos ou mesmo
de outras práticas sociais, esportivas ou artísticas, insere a
capoeira em uma condição de multiplicidade de significados,
maneiras e formas de se ser praticada. Por isso, o número
de seus praticantes expandiu-se tanto ao ponto de ser vista
como um fenômeno de cultura de massa em escala mundial.
Há quem a veja como um bom exemplo da globalização da
cultura brasileira, ou cultura internacional popular, uma vez
que seus traços são percebidos desde os países do leste e
norte da Europa até os da América do Norte.
De prática cultural identificada como uma ameaça à
ordem pública, a capoeira se transformou em um aspecto
da cultura brasileira que integra o esporte, o combate, mas
essencialmente a tradição, a cultura, a memória, a arte, o
movimento, a música, a dança e a brincadeira.
Esse potencial da capoeira, de atravessar muitos
segmentos da sociedade, foi percebido; hoje ela também
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se manifesta como um poderoso instrumento de inclusão
social e reeducação de menores que cometem infrações na
sociedade, por exigir um comprometimento ético, regras
bem estabelecidas, repeito à autoridade e saber do mestre,
além de muita disciplina.
No entanto, a capoeira é muito mais do que um
esporte, ela integra uma dimensão da cultura nacional,
relacionada com um saber cotidiano e uma tradição, que
lhe possibilita uma fluidez na prática, garantindo que seja
usada inclusive para a educação da diversidade e relações
étnicorraciais no Brasil.
CAPOEIRA: UM POUCO DE HISTÓRIA
Não existe um posicionamento preciso acerca da origem
da capoeira, muitas são as divergências, desde a criação do
vocábulo capoeira, até as origens da luta. Alguns historiadores
afirmam que a capoeira é nascida na África, outros acreditam
que ela veio como um grito de liberdade dos negros nas
senzalas, alguns a definem como originária dos quilombos, e,
ainda oriunda das maltas do Rio de Janeiro.
Os registros históricos com maior solidez, por sua vez só
se fazem presentes após a chegada de D. João VI na Colônia
Portuguesa, incluindo os registros policiais, onde o, assunto
capoeiragem era frequente.
Segundo Nestor Capoeira2 , um dos mais renomados
estudiosos do assunto, pode-se perceber claramente, que,
ao contrário do que se afirma, a capoeira não foi uma luta
disfarçada em dança. Aparentemente ela fazia parte da
cultura africana que havia de desenvolvido em solo brasileiro,
2 In: Capoeira: os fundamentos da malícia. (1992).
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juntamente com o candomblé e outras manifestações, mas
até 1800, suas práticas não totalmente eram proibidas.
A história da capoeira passa por três momentos:
escravidão, marginalidade e academia. Nestes encontram-se
ideias totalmente antagônicas dos historiadores.
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Escravidão
Olha o negro sofrendo/da terra colhendo/suor prá viverChibata descendo/fazendo romper/da carne do negro/
Sangue vai correr/ olé lê/ sangue vai correr
O desembarque dos escravos negros no Brasil na
segunda metade do século XVI iniciou no país uma das maiores
violências contra a humanidade. Nesse processo, um grande
número de pessoas oriundas de diversas tribos africanas foi
condenado à escravidão, fazendo de nossas terras o palco
para uma vergonhosa atuação.
Tudo que os negros possuíam foi deixado para trás: suas
famílias, sua história, suas posses e sua própria forma de viver.
As novas terras impunham uma nova forma de sobrevivência.
A mistura de culturas, línguas, costumes e crenças possibilitou
o surgimento de uma nova cultura: a cultura africana no Brasil.
Alguns grupos rivais dentro da África, acabaram se unindo
através da escravidão no Brasil. As bases dessa cultura firmou-
se em fortes tradições, na música, na dança, na culinária e na
impossibilidade de liberdade. Como uma das manifestações
dessa cultura surge a capoeira, ou como era chamada, a
capoeiragem. A forma exata de como surgiu, onde e quando
não se encontra determinada, mas os dados históricos
apresentados levam a crer no surgimento da capoeira como
manifestação cultural do negro escravo.
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Ressalta-se que o negro trazido para o Brasil vinha
destinado a ser mão de obra para as lavouras de café e cana de
açúcar, além da mineração, posteriormente veio o surgimento
do escravo doméstico. Nos grandes centros urbanos, como
Salvador, Recife e Rio de Janeiro havia ainda os “negros de
ganho”, escravos que exerciam atividades diversas e ao fim
do dia repassavam um valor pré-fixado ao seu dono.
Em busca da alforria que podia ser concedida caso o
escravo conseguisse comprá-la, os negros trabalhavam dia
após dia e segundo Muniz Sodré3 , era de interesse dos
administradores coloniais que realizassem manifestações
de sua cultura, como uma forma de fuga da realidade da
escravidão, considerando ainda que tais manifestações
acentuassem as rivalidades tribais, dividindo os escravos,
afastando-os, o que mostrava claramente o receio que seus
proprietários tinham de uma rebelião unida.
A comunidade branca acabava por permitir o que
considerava inofensivo, mas desconhecia que destes espaços
mínimos de liberdade, os negros formavam associações onde
podiam realizar seus rituais, envolvimentos particulares e
até pequenas poupanças para alforria, tudo sob os olhares
cuidadosos dos senhores e da Igreja.
3 Idem 1.
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Nesse cenário aporta à corte portuguesa de D. João VI,
que auxiliada pela Inglaterra, fugia de Napoleão Bonaparte
que havia invadido Portugal. Foi um dos mais marcantes
fatos da história no período colonial. A população carioca era
composta de mais de 50% de negros, sendo que se aproximava
de setenta mil habitantes no total. A corte portuguesa possuía
quatro mil e quinhentas pessoas, aproximadamente, o que
revelou um grande impacto. Além disso, a colônia que era
totalmente deixada de lado passa a ser o centro do Império.
Para adaptar a vida da corte, D. João ordenou mudanças
radicais na Colônia, o que incluiu uma grande repressão aos
escravos, maior inclusive do que aquela que estes já sofriam
desde 1.500. Para que isso fosse possível, montou a chamada
“Guarda Real”, liderada pelo Major Vidigal, personagem este
que se destacava por ser exímio capoeira.
Nas cidades, os escravos concentravam-se em grupos,
chamados de maltas, que dominavam setores, numa espécie
de território. A capoeira era utilizada na luta para defender
estes territórios ou delimitá-los e ainda para ascender dentro
do grupo. Não registros históricos de que a capoeira tenha
sido utilizada como arma contra os senhores de escravos e
nem nas fugas para os quilombos. Com a abolição do tráfico
negreiro, em 1850, pela Lei Eusébio de Queiroz, a comunidade
negra acabou por conscientizar-se que não poderia voltar para
a áfrica, era necessário viver no Brasil e fazer dele sua casa.
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A busca pela alforria torna-se mais constante e os escravos
libertos são muitos. Em 1860, as maltas já se constituíam
de pessoas de todas as cores e de várias nacionalidades.
Segundo Nestor Capoeira, trinta por cento dos praticantes de
capoeira que eram presos era estrangeiro. As maltas cariocas
possuíam então toda espécie de má fama, constituídas por
diversas pessoas inclusive militares e aristocratas. Foi dentro
dessas maltas que a capoeira era ensinada e praticada, longe
da visão romântica dos capoeiristas da atualidade.
Seus praticantes eram perseguidos, presos e condenados
a pena de açoites, caso fossem escravos e deportados, caso
estrangeiros. Mesmo assim os capoeiras figuram em vários
momentos da história. Na Bahia, lutaram pela Independência,
no Rio de Janeiro, em junho de 1828, ajudaram a dominar
forças mercenárias, na “revolta dos Mercenários”, e de uma
forma peculiar na “Guerra do Paraguai”.
Convocados nas prisões ou nas ruas do Rio de Janeiro
de onde eram tirados à força, os capoeiras colaboraram com
as forças armadas na guerra onde Brasil, Argentina e Uruguai
combateram o Paraguai. Aos escravos era feita a promessa
de liberdade ao retorno da guerra. O “Batalhão de Zuavos”,
especialista na utilização de armas brancas e em enfrentar os
inimigos no combate corpo-a-corpo era composto por hábeis
capoeiras, foram responsáveis por vitórias expressivas e
também por difundir o mito de “guerreiro brasileiro”. Ao fim do
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conflito, os capoeiras que voltaram ao Rio de Janeiro, vieram a
trabalhar como policiais ou participar das maltas cariocas. As
maltas aterrorizaram o Rio de Janeiro por décadas, dominando
territórios, lutando entre si, assustando os cidadãos. Eram as
maltas quem mandava nas ruas cariocas.
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Marginalidade
É verdade, meu colega/ com toda diplomaciaPrendero o capoeira/ dentro da delegacia
Pra dar depoimento/daquilo que num sabia
Com a abolição da escravatura em 1.888, o número
de integrantes das maltas cresceu. Com a Proclamação da
República em 1889, o medo das maltas cresceu, o Estado
Republicano tinha conhecimento que apenas dominaria as
ruas se as maltas deixassem de existir, com isso, colocou a
capoeira na marginalidade, através do Código Penal da
República. O capítulo XIII, intitulado “dos vadios e capoeiras”
e seus artigos condena a prática da capoeira e a participação
em maltas. A influência das maltas era tanta que a própria
Princesa Isabel possuía sua “Guarda Negra”, composta por
uma malta de capoeiras. Estes atuavam ainda nos comícios
contra os republicanos, onde eram contratados para desfazê-
los e perturbá-los.
O período da marginalidade da capoeira encontra-
se diferenciado nas regiões brasileiras de maior atuação da
capoeira, ou seja, Pernambuco, Rio de Janeiro e Salvador.
No Rio de Janeiro o movimento das maltas foi dizimado
pelo primeiro chefe de polícia da República, Sampaio Ferraz,
o “Cavanhaque de Aço”, que era também um capoeira.
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Em Pernambuco, as maltas foram extintas perto de 1.912,
juntamente com o surgimento do frevo, este uma herança
da capoeira. Eram as maltas que iam à frente dos carnavais
pernambucanos.
Na Bahia, as maltas já haviam se dissipado na época da
Guerra do Paraguai e a capoeira baiana havia se distanciado
da carioca, pois não se detinha apenas na luta, e se associado
a outros elementos como a música, a dança, jogos e rituais.
Dessa forma acabou por armazenar sua tradição como
valorização da cultura negra, como o que aconteceu com o
candomblé. Sobreviveu assim às perseguições e manteve-se
praticada até a liberação nas academias
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Academias
O fim da proibição da capoeira e sua prática nas
academias vêm através de Getúlio Vargas, em 1934. Vargas
desejava constituir uma identidade cultural para o Brasil e
viu na capoeira uma forma de valorizar o povo. Juntamente
com a liberação da capoeira, liberou a prática dos cultos
afro-brasileiros. Porém permitiu que estes fossem realizados
apenas nas academias e em lugares fechados. A prática em
praças e lugares públicos continuou proibida.
Desse período até a atualidade a capoeira tem se
mantido assumindo faces diversas e participando de
discussões.
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Bimba e Pastinha
Aê viva seu Bimba Camarada / Lê lê ô viva seu Pastinha camará
Passa bem ou passa mal / Tudo na vida é passar Só não passa a saudade /De Seu Bimba camará Aê aê
Foi muito bondoso / Foi também muito amoroso Mas na capoeira / Seu Pastinha não foi bobo /Aê aê
Deixando de lado a violência das maltas, a capoeira
assume um novo momento. Uma nova perspectiva passa a
vigorar na capoeira, nela mestre Bimba e mestre Pastinha
são as figuras mais importantes, sendo considerados até a
atualidade como os maiores nomes da capoeira mundial.
Mestre Bimba, Manuel dos Reis Machado, fundou
a primeira academia de capoeira em 1.932, o Centro de
Cultura Física e Luta Regional da Bahia, sendo que chegou
a apresentar uma roda de capoeira para o próprio Getúlio
Vargas em 1.953. foi o precursor da capoeira regional, sendo
que este estilo foi muito criticado pois muitos consideravam
que havia perdido a origem. Mas sem dúvida foi através de
Mestre Bimba que a capoeira começou a ganhar espaço na
sociedade.
Mestre Pastinha, Vicente Ferreira Pastinha, fundou
o Centro Esportivo de Capoeira Angola em 1940, onde
ensinava acapoeira mais próxima das tradições, seu método
de ensino também era adequado às necessidades de serem
aceitas pela sociedade da época.
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Foram as atividades destes mestres que acabou por
dividir a capoeira em Angola e Regional.
Após a década de 1970, a capoeira passou a ser
difundida em todo o país e em outros países, assumiu
ainda outro estilo; a capoeira contemporânea, uma mescla
dos estilos anteriores e que muito de se utiliza dos saltos e
movimentos rápidos.
A CAPOEIRA NA ATUALIDADE
Distante da marginalidade a capoeira atual permanece
com sua tradição definida pela Angola e Regional apenas
como raízes, mas pratica-se Contemporânea. Muitos são os
debates acerca dos resgates culturais da capoeira, de suas
tradições, mas na verdade, a capoeira é vista agora como
um jogo, uma dança, uma luta e está presente em todos os
Estados do Brasil, sendo que na Bahia, é inclusive utilizada
como atrativo turístico.
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A musicalidade
Berimbau tá chamando olha a roda formando
vá se benzendo para entrar o toque é de Angola
São Bento pequeno, Cavalaria, Iúna a mandinga do jogo o molejo da esquiva
é prá não cochilar Capoeira é ligeira, ela é brasileira, ela é de matá
As rodas de capoeira sempre se utilizaram da cadência
de sons para marcarem seus movimentos, os instrumentos
utilizados são, contudo controversos. Acredita-se que
inicialmente a roda era formada ao som de atabaques e
pandeiros, o berimbau seria posteriormente adaptado para a
capoeira. Outras vertentes acreditam que o berimbau já era
utilizado desde o início da capoeira. As referências históricas
encontram-se nas telas de DEBRET e RUGENDAS, onde não
se evidencia o uso do berimbau.
A música está presente para a realização da roda de
capoeira. Tem a função de ensinar e conduzir os jogadores,
obedece a uma ordem criada entre os capoeiristas. Além dos
ritmos e melodia, existem ainda, os textos das canções.
A ladainha é o canto inicial, que pode ser épico ou não.
Nunca se joga durante a ladainha. Os capoeiras, acocorados
ao pé do berimbau, aguardam a chula, ou canto de entrada.
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Os jogadores se cumprimentam quando se inicia um corrido
ou uma quadra.
A música também deixa lugar para criações inspiradas
no jogo. Em suas letras expressam-se os fundamentos da arte
da capoeira, bem como suas lendas e tradições. O berimbau
geralmente assume a posição de comando. É ele quem mais
se destaca na bateria da capoeira. Geralmente são três:
gunga, médio e viola também conhecidos como berra boi,
contra-gunga e viola, entre outras denominações. Além do
berimbau utiliza-se o caxixi, o tabaque, o agogô, o reco-reco
e o pandeiro.
Instrumentos musicais da capoeira
Fonte: arquivo pessoal
Os toques do berimbau são diversos e suas variações
executadas pelo tocador definem como o jogo será realizado
dentro da roda. Os mais conhecidos são:
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Angola - São Bento Grande
São Bento Pequeno - Angolinha
Iúna - Lamento
Amazonas - Cavalaria
Santa Maria - Benguela
Idalina - Maculelê
Samba de Roda - Samba de Angola
São Bento Grande de Bimba - Samango
Valsa - Samba de Enredo
São Bento Corrido – Choro
Cada toque tem ainda seu próprio significado:
1. Toque de angola: específico do jogo de Angola. É
lento, cadenciado, batido no atabaque, tem um sentido triste.
É feito para o jogo de dentro, jogo baixo, perigoso, rente ao
chão, bem devagar.
2. Angolinha: variação pouco mais rápida do toque
de angola serve para aumentar o ritmo ao mudar o jogo.
3. São Bento Pequeno: toque para jogo solto, ligeiro,
ágil, de exibição técnica.
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4. São Bento Grande: toque original da capoeira
Regional. É muito usado em apresentações públicas, rodas de
rua, batizados e outros eventos e também nas rodas técnicas
das academias para testar o nível de agilidade dos alunos.
5. Toque de iúna: É usado apenas para o jogo dos
mestres. No toque de Iúna não há canto.
6. Lamento: É o toque fúnebre da capoeira. Usado
apenas em funerais de mestres.
7. Amazonas: toque festivo usado para saudar mestres
visitantes e seus alunos. Usado em batizados e encontros.
8. Cavalaria: É o toque de alerta máximo ao
capoeirista. É usado para avisar o perigo no jogo, a violência
e a discórdia na roda. Na época da escravidão, era usada
para avisar aos negros capoeiras da chegada do feitor e na
República, da polícia montada.
9. Santa Maria: É o toque usado quando o jogador
coloca a navalha no pé ou na mão.
10. Benguela: É o mais lento toque de capoeira
regional, usado para acalmar os ânimos dos jogadores.
Os cantos utilizados na capoeira são:
Chula: define-se como uma cantiga curta, normalmente de improviso que faz apresentação ou identificação. Entoa-se pelo cantador para fazer
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a abertura de sua composição. Em geral louvam-se os mestres, as origens, os lugares em que está, fatos históricos ou lendas e mitos inerentes a roda de capoeira. Pode ser utilizada como introdução para os corridos e para as ladainhas. Na chula oferece-se um refrão para o coro.
Corrido: esta é a cantiga que apressa o ritmo e que se caracteriza pela junção do verso do cantador com as frases do refrão repetido pelo coro total ou parcialmente, dependendo do tempo que o cantador dá entre os versos que canta. O cantador faz versos curtos e simples que são a toda hora repetidos e o conjunto deles é usado como refrão pelo coro.
Quadra: é uma estrofe curta de apenas quatro versos simples, seu conteúdo pode variar, tornando-se uma brincadeira com os membros da roda, fazendo alertas, ou referindo-se a lendas e tradições do jogo, de acordo com o desejo do compositor.
Ladainha: exclusividade do jogo de Angola, não é utilizada na capoeira Regional. É uma oração cantada em versos e repetida pelo coro. Cantam-se antes do início do jogo, quando os capoeiras ficam ao pé do berimbau, ao sinal do início, todos podem ser desafiados.
Alguns exemplos de cantos4:
Ladainha:Eu já vivo enjoado
De viver aqui na terraOh! Mamãe eu vou pra lua
Falei com minha mulherEla então me respondeu
Nós vamos se Deus quiser
4 Disponíveis em http://www.leilapassini.com/lagoaazul/index3.html
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Vamos fazer um ranchinhoTodo cheio de sapê
Amanhã às sete horasNós vamos tomar caféEu que nunca acreditei
[...] Não posso me conformarVem a lua, vem a terraVem a terra para o mar
Tudo isso é conversaPra comer sem trabalhar
Ê galo cantouÊ menino é bom
Ê sabe jogarÊ sabe jogar
QuadraVou ligar pra você
Alô, alô MariaVou dizer que te amo
Que no final do ano eu vou pra Bahia Capoeira de Angola, Regional
Iúna e MaculelêIsso tá no meu sangue
Pra perto de mim só faltava você Vou ligar pra você
Alô, alô MariaVou dizer que te amo
Que no final do ano eu vou pra Bahia [...]
A voz de um lamentoVer um jogo de São Bento
Explode meu coração Vou ligar pra você
Alô, alô MariaVou dizer que te amo
Que no final do ano eu vou pra Bahia [...]
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ChulaIaiá! Acende o candeeiro!
Só a luz ofuscante da candeiaE o clarão da lua cheia
É que faz o terreiro clarear!Iaiá! Acende o candeeiro! Iaiá, Iaiá!
Só a luz ofuscante da candeiaE o clarão da lua cheia
É que faz o terreiro clarear! Hoje tem festa nos quilombos dos palmares
Já se ouve pelos ares o som estridente do tamborIoio, ioio! No rabo de arraia certeiro
No jogo de angola rasteiro[...]
Quem paga o pato é o capitão do matoNa luta do bem contra o mal
Iaiá, iaiá! Oi, Iaiá, iaiá! Oi, Iaiá, iaiá! O balançar na barra da saia
Levante e sacode a poeira do chão Oi, abre a roda que agora o pau vai comerDo samba angolano, na ginga do maculelê Oi, quem tem sangue de quilombo não cai
Finge que vai, mas não vai, risca seu nome no ventoRei Ganga Zumba vem dar início ao festejoSua voz é um lampejo que comanda o ritual
O seu lamento era um grito de guerraEscova sobre a terra, tornando o quilombo imortal
[...]
CorridoXô, xô meu canário
Meu canário é cantadorXô, xô meu canário
Foi embora e me deixouXô, xô meu canário
Meu canário é da AlemanhaXô, xô meu canário
Nego velho também apanha[...]
Xô, xô meu canário Meu canário é da Alemanha
Xô, xô meu canário Alemão que me mandou
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Xô, xô meu canário Meu canário é cantador
Algumas músicas de capoeira são de domínio público,
consideradas tradicionais, como por exemplo:
Na Bahia tem um côcoChama côco de sinháÉ preciso duas pedrasPra esse côco quebrar
Oi, côco que tem dendêCôco que tem dendê
Côco mironga que vem da BahiaMestre Traíra, Pastinha, Aberrê
Oi, côco que tem dendêCôco que tem dendê
Venha cá besouro pretoVou lhe fazer um pedidoDá um couro nesse negroPra deixar de ser atrevido
Dendê, dendê Dendê da água amarela
Dá um couro nesse negroQue eu não sou moleque
Que barulho é esseÉ um tal de zum, zum, zum
Foi Manduca da PraiaQue acabou de matar umQuando a polícia chegou
Foi um tal de auê, auêVamos embora seu moçoQue essa luta é pra valer
A volta que o mundo deuA volta que o mundo dá
A volta do mundo é grandeAinda vamos se encontrarA volta que o mundo deuA volta que o mundo dá
Se você é capoeiraAbre a boca pra cantar
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Oi me dá meu dinheiroOi me dá meu dinheiro valentãoOi me dá meu dinheiro valentãoQue no meu dinheiro ninguém
põe a mão
Oi dendê, oi dendêDendê oi, de maré
Oi princesinha do marOi princesinha de maréEu vou dizer a Dendê
Sou homem não sou mulherEu vou dizer a Dendê
Sou homem não sou mulher
Eu não sou daqui / Marinheiro só
Eu não tenho amor / Marinheiro só
Eu sou da Bahia / Marinheiro sóDe São Salvador / Marinheiro só
Oh marinheiro, marinheiro / Marinheiro só
Quem me ensinou a nadar / Marinheiro só
Foi o tombo do navio / Marinheiro só
Ou foi o balanço do mar / Marinheiro só
Lá vem, lá vem / Marinheiro sóEle vem cantando / Marinheiro
sóTodo de branco / Marinheiro sóCom seu bonezinho / Marinheiro
só
Lava, lava lavadeiraA roupa do capoeira
Porque hoje é domingoAmanhã segunda-feira
Hoje a roda é no BonfimAmanhã tem na Ribeira
Oi, vai ter roda de sambaE jogo de capoeira
Moleque toma cuidadoCom o tombo da ladeira
Sua roupa está limpaCoitada da lavadeira
Nota: pode-se observar nos cantos, tanto nos tradicionais, corridos,
chulas, ladainhas e quadras a presença de nomes de mestres
conhecidos, além de vários elementos da própria capoeira.
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Principais movimentos da capoeiraCapoeira é defesa, ataque
a ginga de corpo e a malandragem, Capoeiraé defesa, ataque
a ginga de corpo e a malandragem
Após a formação, o entoar dos cantos tradicionais da
capoeira, os praticantes entram na roda e o jogo começa.
Todos os movimentos são característicos de uma luta por
aproximação, onde os adversários não desferem diretamente
os golpes, mas sim guardam certa distância, só mantendo
contato corporal nos momentos exatos da defesa e ataque.
Segundo Carneiro, o jogo é mais uma sucessão de negaças,
uma experimentação da guarda do oponente que um
efetivamente um combate. É a ginga que dá a aparência de
uma dança ao jogo, pois os adversários encontram-se em
constante movimento. Os movimentos utilizados em grande
parte já estão incorporados na capoeira e, como em todo
o jogo capoeirista, é necessário manter sempre o contacto
visual com o adversário. Em todos os movimentos a destreza
é mais importante que a força.
Entre os principais movimentos pode-se citar:
Ginga: é o movimento básico de Capoeira. o capoeirista não se fixa numa posição, ele está sempre em movimento.
40
Aú: praticamente é a roda ou estrela, utilizada na ginástica. Na capoeira Regional é utilizado para fugir ou enganar o oponente.
Aú Angola: é semelhante ao Aú Regional, mas apenas é utilizado na capoeira Angola diverge do Aú Regional pelo fato de se flexionarem os joelhos no momento da execução.
Cocorinha: um método evasivo que consiste na forma de evitar pontapés circulares efetuados em curta distância. Neste movimento, a mão toca no solo mantendo o equilíbrio.
Rolê: trata-se de uma forma de movimentação.
Chapa de Costas: movimento de Capoeira Angola. Consiste num pontapé, efetuado de costas para o adversário, normalmente de forma a atingir a cabeça ou o tronco do oponente.
Benção: um pontapé frontal, utilizado quer na Capoeira Regional quer na Capoeira Angola. É um movimento de força, realizado com a flexão do joelho. O Capoeirista levanta a joelho, deixando o adversário sem a certeza se este irá fazer a Benção, o Martelo ou qualquer outro pontapé frontal.
Ponteira: parecido com a Benção, mas trata-se de um movimento diferente, bem mais rápido e imprevisível. O capoeirista não levanta o joelho, mas levante logo a perna num movimento arqueado, buscando atingir o peito ou estômago do oponente.
Meia Lua de Frente: levanta-se a perna mais solta na hora da ginga e roda-a em forma de um semicírculo, com os braços em sentido contrário.
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Rabo de Arraia ou Meia Lua de Compasso: como na Meia Lua de Frente, levanta-se a perna e roda-se de modo a se fazer um semicírculo, mas com ambas as mãos no chão e com as costas voltadas para o oponente.
Armada: um pontapé rodado parecido com uma Meia Lua, onde além da rotação da perna ocorre a rotação do corpo.
Martelo: um golpe Regional, forte, rápido e destemido, consiste em um pontapé com elevação do joelho.
Bananeira: apoio nas mãos, com as pernas para cima, consiste em atirar os pés no contra o rosto ou peito do oponente.
Chapa de pá: busca alcançar com a planta do pé, a cabeça ou o peito do adversário.
Rasteira: em posição meio sentada descreve-se um arco com um das pernas de modo a atingir os pés do oponente.
Tesoura: busca-se derrubar o adversário, saltando neste com as pernas de forma a entrelaçar seu corpo
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Batizado e graduaçãoEu escolhi a capoeira,
porque ela me escolheu,Olhei pra ela ela sorriu
e naquele instante me escolheu!
Ao iniciar a prática da capoeira em uma academia
ou um grupo, o aluno é denominado “pagão”. Isto quer
dizer que ele ainda não foi “batizado”. É no batizado que
ele realiza o primeiro contato com os outros integrantes
do grupo, bem como seu mestre. Recebe sua primeira
graduação, ganha um apelido e um padrinho na capoeira,
que é a pessoa que jogou com ele durante o batizado. O
apelido, tradicional na capoeira, refere-se à lembrança dos
tempos em que os capoeiras precisavam esconder seus
nomes para praticar a arte.
O sistema de graduação na capoeira varia de grupo para
grupo. Muitas escolas e academias de capoeira possuem
seu próprio sistema de graduação. Mas a Confederação
Brasileira de Capoeira, considera como oficial o sistema de
graduação que utiliza as cores da bandeira nacional para
designar o estágio em que se encontra o praticante. As cores
seguem na ordem verde, amarelo, azul e branco, inclusive
mesclando-se e aparecem nos cordões que são utilizados
pelos atletas. Os cordões são amarrados do lado direito.
Segundo a Confederação seguem a seguinte disposição:
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A capoeira no Paraná
O Estado do Paraná adentrou o universo da capoeira
juntamente com o mestre Burguês, do Grupo Muzenza. De
acordo com o site oficial do grupo Muzenza, Antonio Carlos
de Menezes, nascido em Laranjeiras, Sergipe, mudou-se antes
de completar um ano de idade para o Rio de Janeiro. Quando
cursava a 6ª série no colégio Evangélico em Ramos ao lado
da Escola de Samba Imperatriz Leopoldinense, teve o seu
primeiro contato com a capoeira através de um capoeirista
chamado China, de uma forma bastante difícil. China era
conhecido por bater em todos. O menino Antonio, com doze
anos de idade, resolveu aprender capoeira para não apanhar
mais de China e de ninguém.
Começou a praticar a capoeira utilizando um livro
chamado “Capoeira sem Mestre”, comprado pelo amigo
Nelson com o qual começaram a treinar os primeiros
movimentos, no morro do Alemão, Rio de Janeiro. Veio o
desejo de praticar capoeira realmente, ao assistirem as rodas
do mestre Mintirinha. Identificaram-se com o estilo de luta de
seu irmão, Paulão, que iniciava suas aulas com o mestre Silas
no clube do Bolinha. Estes fundadores do Grupo Muzenza.
Como eram pobres e não possuíam condições de pagar a
academia, passaram a juntar sucata e venderam, o dinheiro
foi suficiente para pagar três meses de academia, como pagar
45
adiantado era raro na época, os mestres acharam que eles
eram ricos e os batizaram como “Conde” e “Burguês”, sendo
que posteriormente, Conde se afastou da capoeira. Burguês
superou diversas dificuldades sociais e financeiras e instalou o
Grupo Muzenza no sul do país. Entre as conquistas de Mestre
Burguês, encontra-se:
A fundação da Federação Paranaense de Capoeira em 1985;
Foi um dos fundadores da Confederação Brasileira de Capoeira em 1992,
Fundação da Superliga Brasileira de Capoeira em 1998, da qual é presidente.
Publicação do livro O estudo da Capoeira, em 1978;
Publicação do livro Cânticos da Capoeira, em 1982.
Gravação de mais de vinte 20 CDs de capoeira editados, sendo um deles gravado no Canadá.
Criação de um jornal com a finalidade de resgatar a tradição da capoeira, em 1995
Ministrou cursos em mais de 25 países.
Antônio Carlos de Menezes chega a Curitiba, Paraná
em outubro de 1975, decidido a fundar um núcleo do
Grupo Muzenza no Sul do Brasil. Havia desenvolvido uma
46
metodologia própria, que visava reavivar as raízes da capoeira,
disseminando seus estudos em diversos locais, desde quartéis
a comunidades carentes. Até a atualidade de 15.000 alunos,
já passaram pelo Grupo Muzenza de Curitiba. O grupo se
faz presente em 26 estados brasileiros, e 25 países, sendo
que realiza extensa pesquisa acerca do tema, visando melhor
fundamentar-se no esporte.
OBRAS DE ARTE INSPIRADAS NA CAPOEIRA
A capoeira nos moldes atuais é sem dúvida atraente aos
olhos dos expectadores, o que também ocorreu em antigas
épocas. Longe da era da imagem digital, artistas retrataram a
capoeira em suas obras. Essas obras nos dão na atualidade,
uma perspectiva daquilo que foi a capoeira na época.
A obra denominada “Negros lutando, Brasil” foi pintada
em aquarela pelo inglês Augustus Earle, entre 1821 e 1823.
Nela aparecem dois homens negros envolvidos em uma
luta, realizando movimentos próprios da capoeira. Ao fundo
aparecem um homem negro sentado ao chão, como que se
protegendo de algum movimento mais brusco da luta dos
personagens centrais uma mulher negra com um filho no colo
também observa a luta. Do lado esquerdo aparece a figura de
um policial branco saltando uma cerca para aparentemente
interromper a luta, o que lhe transmite um caráter de
marginalidade.
Esta obra pode ser visualizada no seguinte endereço:
<www.capoeira-palmares.fr/histor/earle_pt.htm>.
48
Jean-Baptiste Debret(1768-1848), foi um pintor francês
que esteve no Brasil com a Missão Artística Francesa, acredita-
se que ficou no Brasil entre 1816 e 1831, onde ensinou arte
e dedicou-se à pintura. Retratou em suas telas, sobretudo
a sociedade brasileira, com a forte presença dos escravos.
A partir de suas obras pode-se verificar muitos aspectos da
sociedade colonial. Suas obras foram publicadas no livro:
“Viagem pitoresca e histórica ao Brasil’.
Na obra “Enterro do filho de um rei negro” pode-se
observar os negros volteadores, que eram os capoeiras da
época, que abriam os enterros com exibições. Na sequencia
do enterro seguem pessoas de ambos os gêneros e o corpo
do filho do rei. esta obra se encontra disponível no endereço:
<http://www.mre.gov.br/dc/textos/revista14-mat3.pdf>.
Outra pintura de Debret mostra um velho tocando
Berimbau, observa-se que nestas pinturas o berimbau não
está associado à capoeira, o que leva a crer que este fato
ocorreu depois de 1.900. Na obra o pintor retrata além do
tocador de berimbau, várias mulheres que carregam objetos
parecidos com cestos em suas cabeças, além de um menino
que se coloca próximo ao velho. Esta obra pode ser visualizada
no seguinte endereço: <http://www.mre.gov.br/dc/textos/
revista14-mat3.pdf>.
Johan Moritz Rugendas (1802-1858) foi um pintor
alemão nascido em Augsburg. Chegou ao Brasil, em 1821, na
49
expedição do barão de Langsdorff, tinha como objetivo viajar
e coletar material para pinturas e desenhos. Pintou paisagens
e cenas do cotidiano. Escreveu o livro “Viagem pitoresca ao
Brasil”. É de autoria de Rugendas a mais antiga obra pintada
acerca da capoeira: “Jogar capoeira ou Dança da guerra” , a
obra “São Salvador” também retrata, acredita-se, um jogo de
capoeira, ambas datam de 1834.
Na obra “Jogar capoeira” percebe-se um grupo de
pessoas que instigam a a dança ou luta, retratada pelos
personagens centrais, que são dois homens negros fortes e
robustos. Outras pessoas de ambos os gêneros assistem ao
espetáculo. Um homem toca um tambor marcando os passos,
outro combina batendo palmas. Ao redor se percebem
mulheres, sendo que uma está cozinhando e outra transporta
um cesto com frutas. A obra pode ser visualizada no endereço:
<http://www.centroreferenciacapoeiracarioca.net/fotos.
php>.
Na obra “São Salvador”, Rugendas retrata uma típica
cena onde aparecem dois homens praticando a capoeira,
acredita-se sendo observado por algumas pessoas. Estas
pessoas são típicas da região e todas afro-descendentes. Esta
obra está disponível em: <http://www.nestorcapoeira.net/
galeria.htm>.
LIVROS RECOMENDADOS
AREIAS, A. O que é Capoeira. São Paulo: Brasiliense, 1993.
Almir das Areias faz um retrospectivo histórico acerca
da capoeira, além de retratar sua diversidade nos principais
centros. Areias, ainda trata da Capoeira em São Paulo, da
forma como esta cidade recebeu o esporte.
CAPOEIRA, N. Capoeira: os fundamentos da malícia. Rio de Janeiro: Record, 1992.
______. O pequeno manual do jogador de capoeira. São Paulo: 1988.
Nestor capoeira é na atualidade um dos maiores
estudiosos da Capoeira. Seus estudos são imparciais e
mostram um olhar acerca do tema que vem de encontro com
os posicionamentos românticos dos praticantes do esporte.
O autor praticante da capoeira foi o primeiro a difundir o
esporte na Europa.
52
CARNEIRO, E. Capoeira. Rio de Janeiro: FUNARTE, 1997.
______. Dinâmica do folclore. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1965.
As obras de Edison Carneiro, estudioso da cultura afro
brasileira e baiana, remetem uma visão de como esta contribuiu
com a formação da cultura brasileira. O livro Capoeira traz
uma descrição do jogo da capoeira, retratando sua história
e descrevendo passo a,passo todos seus elementos em uma
linguagem própria e voltada para o tema.
Rego, W. Capoeira Angola: ensaio sócio-etnográfico. Salvador: Itapoan, Salvador, 1968.
Esta obra é reconhecida como fundamental para o estudo
da capoeira. Infelizmente é muito rara, não existindo cópias
digitais. O autor foi um grande e conceituado estudioso da
cultura afro.
SOARES, C. E. L. A capoeira escrava e outras tradições rebeldes no Rio de Janeiro (1808-1850). Campinas: Unicamp, 2001.
O historiador Carlos Eugenio Líbano Soares descreve
e analisa a trajetória da capoeira escrava e de outras
manifestações de rebeldia na cidade do Rio de Janeiro, no
53
começo do século XIX. Nesta obra documenta a evolução da
capoeira no contexto político e cultural, tratando inclusive
sobre o papel dos capoeiristas nos movimentos políticos e
nos conflitos de rua.
SITES RECOMENDADOS
Portal Ao Brasil, disponível em: <http://www.aobrasil.com/capoeira/>.
Este site apresenta além de informações sobre
a capoeira, gifs animados em 3D, com os principais
movimentos da capoeira.
Associação Lagoa Azul de capoeira, disponível em: <http://www.leilapassini.com/lagoaazul/index3.html>.
Site oficial do Grupo Capoeira Lagoa Azul trás entre
outras informações, diversos cantos de capoeira e permite
que os usuários ouçam diversos toques de berimbau.
Site oficial da Confederação Brasileira de capoeira, disponível em: <http://www.capoeiradobrasil.com.br/confederacao.html>.
Refere-se ao site a confederação brasileira de capoeira
56
Portal Capoeira Jogo da Vida, disponível em: <http://ube-164.pop.com.br/repositorio/35645/meusite/index.html>.
Site oficial do grupo de capoeira Jogo da Vida. Site com
informações diversas acerca da capoeira, onde se encontra
ainda a história da capoeira como uma luta de liberdade
contra o sistema escravocrata.
Portal Muzenza capoeira, disponível em: <http://www.muzenza.com.br/port/pesq_bibl.php>.
Site oficial do grupo Muzenza. Site com um histórico
coerente da capoeira, indicando muita pesquisa pelo autor.
Exemplo raríssimo. Contém ainda várias informações.
REFERÊNCIAS
AREIAS, A. O que é capoeira. São Paulo: Brasiliense, 1993.
AUGUSTUS, E. 1821, 1824. Desenvolvido por associação de capoeira palmares de Paris. Disponível em: <http://www.capoeira-palmares.fr/histor/earle_pt.htm>. Acesso em: 29 jan. 2010.
ASSOCIAÇÃO Capoeira Lagoa Azul, desenvolvido por Leila Passini. Disponível em:<http://www.leilapassini.com/lagoaazul/index3.html>. Acesso em: 30 jan. 2010.
CAPOEIRA, N. Galeria, iconografia e fotos. <Disponível em: http://www.nestorcapoeira.net/galeria.html>. Acesso em: 29 jan. 2010.
______. Capoeira: os fundamentos da malícia. Rio de Janeiro: Record, 1992.
______. O pequeno manual do jogador de capoeira. São Paulo: 1988.
CARNEIRO, E. Capoeira. Rio de Janeiro: FUNARTE, 1997.
______. Dinâmica do folclore. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1965.
58
CONDURU G. F. As metamorfoses da capoeira: contribuição para uma história da capoeira. Disponível em: <http://www.mre.gov.br/dc/textos/revista14-mat3.pdf>.Acesso em: 01 fev. 2010.
CONFEDERAÇÃO Brasileira de Capoeira, desenvolvido por Me. Valentim Rodolfo Mussarelli. Disponível em: <http://www.capoeiradobrasil.com.br/confederacao.htm>. Acesso em: 30 jan. 2010.
DEBRET, J. B. Viagem pitoresca e histórica ao Brasil. Belo Horizonte: Itatiaia, 1989.
EARLE, A. Negros lutando no Brasil. Aquarela sobre papel 16,5 x 25,1 centímetros, Coleção Rex Kivell Nan; NK12/103. Museu da Austrália. disponível em: <http://catalogue.nla.gov.au/Record/2320520>.
FILHO, L. T. F.; SCHERER, A. A capoeira angola como prática socializadora. In: Ciência em movimento. Porto Alegre: Universitária IPA, 2004.
ICONOGRAFIA. Desenvolvido por Centro de referência da Capoeira Carioca. Disponível em: <http://www.centroreferenciacapoeiracarioca.net/fotos.php>. Acesso em: 28 jan. 2010.
INSTRUMENTOS de Capoeira, desenvolvido por Portal São Francisco. Disponível em: <http://www.portalsaofrancisco.com.br/alfa/capoeira/instrumentos-da-capoeira.php> Acesso em: 30 jan. 2010.
IÓRIO, L. S.; DARIDO, S. C. Capoeira e Educação Física: implicações à pratica pedagógica. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2005.
59
PESAVENTO, S. J. História e história cultural. Belo Horizonte: Autêntica, 2003.
SILVA, J. M. F. A linguagem do corpo na capoeira. Rio de Janeiro: Sprint. 2003.
SOARES, C. E. L. A capoeira escrava e outras tradições rebeldes no Rio de Janeiro (1808-1850). Campinas: Unicamp, 2001.
VIEIRA, L. R. O jogo da capoeira: corpo e cultura popular no Brasil. Rio de Janeiro: SPRINT, 1988.