deliberaÇÃo do conselho de administraÇÃo da … · 2016-07-19 · responsável sobre o estado...

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1 Mod.016_01 DELIBERAÇÃO DO CONSELHO DE ADMINISTRAÇÃO DA ENTIDADE REGULADORA DA SAÚDE VERSÃO NÃO CONFIDENCIAL Considerando que a Entidade Reguladora da Saúde nos termos do n.º 1 do artigo 4.º dos Estatutos da ERS, aprovados pelo Decreto-Lei n.º 126/2014, de 22 de agosto exerce funções de regulação, de supervisão e de promoção e defesa da concorrência respeitantes às atividades económicas na área da saúde nos setores privado, público, cooperativo e social; Considerando as atribuições da Entidade Reguladora da Saúde conferidas pelo artigo 5.º dos Estatutos da ERS, aprovados pelo Decreto-Lei n.º 126/2014, de 22 de agosto; Considerando os objetivos da atividade reguladora da Entidade Reguladora da Saúde estabelecidos no artigo 10.º dos Estatutos da ERS, aprovados pelo Decreto-Lei n.º 126/2014, de 22 de agosto; Considerando os poderes de supervisão da Entidade Reguladora da Saúde estabelecidos no artigo 19.º dos Estatutos da ERS, aprovados pelo Decreto-Lei n.º 126/2014, de 22 de agosto; Visto o processo registado sob o n. º ERS/006/2016; I. DO PROCESSO I.1. Origem do processo 1. A ERS tomou conhecimento do teor da reclamação, inicialmente tratada em sede do processo de reclamação n.º REC/3745/2015, subscrita, em 8 de janeiro de 2016, pelas netas do utente A., na qual é referido que foi negado o direito de acompanhamento ao utente A. no Serviço de Urgência (SU) do Hospital Senhora da Oliveira Guimarães (doravante Hospital de Guimarães). 2. Após análise da referida exposição, foi aberto o processo de avaliação n,º AV/09/2016, sendo que o Conselho de Administração da ERS, por despacho de 26 de

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1 Mod.016_01

DELIBERAÇÃO DO CONSELHO DE ADMINISTRAÇÃO DA

ENTIDADE REGULADORA DA SAÚDE

VERSÃO NÃO CONFIDENCIAL

Considerando que a Entidade Reguladora da Saúde nos termos do n.º 1 do artigo 4.º dos

Estatutos da ERS, aprovados pelo Decreto-Lei n.º 126/2014, de 22 de agosto exerce

funções de regulação, de supervisão e de promoção e defesa da concorrência respeitantes

às atividades económicas na área da saúde nos setores privado, público, cooperativo e

social;

Considerando as atribuições da Entidade Reguladora da Saúde conferidas pelo artigo 5.º

dos Estatutos da ERS, aprovados pelo Decreto-Lei n.º 126/2014, de 22 de agosto;

Considerando os objetivos da atividade reguladora da Entidade Reguladora da Saúde

estabelecidos no artigo 10.º dos Estatutos da ERS, aprovados pelo Decreto-Lei n.º

126/2014, de 22 de agosto;

Considerando os poderes de supervisão da Entidade Reguladora da Saúde estabelecidos

no artigo 19.º dos Estatutos da ERS, aprovados pelo Decreto-Lei n.º 126/2014, de 22 de

agosto;

Visto o processo registado sob o n.º ERS/006/2016;

I. DO PROCESSO

I.1. Origem do processo

1. A ERS tomou conhecimento do teor da reclamação, inicialmente tratada em sede do

processo de reclamação n.º REC/3745/2015, subscrita, em 8 de janeiro de 2016,

pelas netas do utente A., na qual é referido que foi negado o direito de

acompanhamento ao utente A. no Serviço de Urgência (SU) do Hospital Senhora da

Oliveira – Guimarães (doravante Hospital de Guimarães).

2. Após análise da referida exposição, foi aberto o processo de avaliação n,º

AV/09/2016, sendo que o Conselho de Administração da ERS, por despacho de 26 de

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janeiro de 2016, determinou a abertura do processo de inquérito em curso, com o

propósito de averiguar se o estabelecimento visado cumpre e cumpriu as normas e

procedimentos no que respeita ao direito ao acompanhamento do utente, tal qual ele

se encontra configurado nos artigos 12.º e seguintes da Lei n.º 15/2014, de 21 de

março, que consolida a legislação em matéria de direitos e deveres do utente dos

serviços de saúde.

I.2. Da reclamação e da resposta do prestador

3. Na referida reclamação, as netas do utente A. referem que foi negado o direito de

acompanhamento no SU do Hospital de Guimarães ao seu avô, de 99 anos de idade,

totalmente dependente, o qual viria a falecer no decorrer desse episódio.

4. Concretamente, é referido na reclamação o seguinte:

“[…]

Vimos por este meio expor uma situação flagrante ocorrida no dia 07 de Janeiro

de 2016, tendo lugar no Hospital N. Srª da Oliveira - Guimarães. Nesse referido

dia, o nosso avô A., deu entrada por volta das 09h30 nos serviços deste hospital,

com problemas respiratórios.

É de referir, que o utente, neste caso nosso avô, tinha no momento 99 anos, […] é

de nosso direito (…) acompanhá-lo durante o período em que o doente se

encontra no serviço de urgência. Assim o tentamos fazer por diversas vezes ao

longo do dia, embora sem sucesso visto que, o serviço das urgências deste

hospital negou a entrada de um qualquer acompanhante dando como justificação

as novas e recentes regras implementadas pelo hospital. Regras que passo a

citar:

"O acompanhante entra com o doente no momento da admissão e sai logo que o

doente esteja acomodado" - como é que um doente de 99 anos sem falar e andar

pôde ficar "acomodado" num corredor, sozinho sem um acompanhante? "O

horário de visitas é o seguinte: 10 horas; 12 horas: 14 horas; 16 horas: 18 horas:

20 horas e 22 horas", "Estas visitas são coordenadas pelos enfermeiros das

respectivas unidades e terão a duração de 10 minutos" - como sabemos o serviço

de urgências está sempre sujeito a grande afluência lotando rapidamente, tal

como foi o caso, ora tendo cada visita a duração de 10 minutos como é que nesse

espaço de tempo o acompanhante pode ver o seu familiar e falar com o médico

responsável sobre o estado de saúde do mesmo?

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"No horário das 22 horas às 8 horas, é da responsabilidade do médico e

enfermeiros da unidade decidir a presença e visita dos acompanhantes" - Estando

esta decisão a cargo da equipa médica presente, como se justifica que às 20h00

os mesmos tenham proibido a entrada de um acompanhante?

"O chefe de equipa reserva-se no direito de suspender as visitas nos períodos de

maior afluência ou sempre que haja comprometimento de procedimentos técnicos

com segurança pelos doentes" - Como é possível o chefe de equipa poder

suspender o direito de um acompanhante, quando o doente é bastante debilitado?

Depois de analisado e refutado as normas internas deste hospital, podemos

concluir assim que o hospital sobrepôs-se às normas implementadas no Portal da

Saúde, barrando a entrada a qualquer acompanhante sendo para isso necessária

a presença de um agente da autoridade. Só com a presença deste, é que foi

possível a entrada de um familiar. Ambos, o familiar e o agente, foram

encaminhados para um gabinete onde reuniram com o chefe de equipa, que não

tinha conhecimento de que doente se tratava tendo pedido para aguardarem, de

modo a poder averiguar o estado do doente. De seguida, o chefe de equipa

acompanhada pela médica que estava de serviço nas urgências, dirigiram-se ao

familiar tendo a médica dado a notícia do seu falecimento.

Queremos com esta carta tentar de alguma forma apurar responsabilidades visto

que, desde o final da tarde até à hora da sua morte, nos foi consequentemente

barrada a entrada não nos deixando sequer despedir do nosso avô, quando

tínhamos o pleno direito de o ter acompanhado nas suas últimas horas de vida.

[…]”.

5. Em resposta à reclamação, por carta remetida às reclamantes, em 10 de fevereiro de

2016, o prestador o seguinte:

“[…]

(…) permitimo-nos recordar que o Sr. A., residente em […], deu entrada no SU no

dia 7 de janeiro de 2016, […].

Admitido ao SU, foi ainda triado de acordo com a Triagem de Manchester (sendo

este um procedimento padronizado) tendo-lhe sido atribuída pulseira amarela.

Conforme procuramos transmitir nas várias conversas tidas com a família, o Sr. A.

teve de facto acompanhamento, intermitente (como não poderia deixar de ser),

durante o tempo de permanência no SU. O mesmo foi prestado pelos

profissionais, por elementos da família e pela funcionária do Lar.

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O acompanhamento prestado, intermitente, deve-se apenas às limitações de

espaço e de fluxos do SU, e ao excesso de procura nesta altura do ano (picos de

gripe), situação essa também prevista na lei, pois como compreenderão visa a

proteção de todos os utentes e não a negação de acesso a visitas.

(…) foram imediatamente instaurados todos os procedimentos e diligência tidos

por adequados para o apuramento do efetivamente sucedido.

[…]”.

I.3 Diligências

6. No âmbito da investigação desenvolvida pela ERS, realizaram-se, entre outras, as

diligências consubstanciadas em:

a. Pesquisa no Sistema de Registo de Estabelecimentos Regulados (SRER)

da ERS, de onde se retirou que Hospital de Guimarães é um

estabelecimento prestador de cuidados de saúde que está registado sob o

n.º 112086, e sito na Rua dos Cutileiros - Creixomil, em Guimarães;

b. Pedido de elementos ao Hospital de Guimarães, datado de 22 de janeiro de

2016, e respetiva resposta.

II. DOS FACTOS

7. Considerando a reclamação apresentada, onde era referida a existência de uma

limitação ao exercício do direito de acompanhamento no SU do Hospital de

Guimarães, em especial, a situação ocorrida com o utente A., em virtude das medidas

adotadas pelo prestador alegadamente limitarem o exercício de um tal direito;

8. E considerando a consequente abertura do presente processo de inquérito, em 22 de

janeiro de 2016, a ERS remeteu um pedido de elementos ao prestador, tendo em

vista a obtenção de esclarecimentos adicionais, com o seguinte conteúdo:

“[…]

1. Se pronunciem, de forma completa e fundamentada, sobre o conteúdo da

exposição, tendo presente a Lei n.º 15/2014, de 21 de março,

nomeadamente, o disposto nos artigos 12.º e seguintes;

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2. Cópia do regulamento interno e/ou de todos os procedimentos/protocolos

internos em vigor especificamente referentes ao direito de acompanhamento

no serviço de urgência, nomeadamente as “novas e recentes regras

implementadas” a que as exponentes fazem referência no documento em

anexo;

3. Envio de identificação do utente (nome completo, número de utente) e cópia

do relatório do episódio de urgência da utente (Alert), em 7 de janeiro de

2016;

4. Informação relativa à distribuição de cores nos termos da Triagem de

Manchester, por referência ao universo de utentes atendidos no serviço de

urgência nos dias 6/7/8 de janeiro de 2016, no período compreendido entre as

8h e as 00h;

5. Informação relativa ao número de profissionais (médicos e enfermeiros), com

indicação das especialidades respetivas, presentes no serviço de urgência no

dia 7 de janeiro de 2016;

6. Informação sobre eventual processo de inquérito interno aberto pelo

Conselho de Administração do Hospital, bem como cópia de todos os

elementos já disponíveis;

7. Procedam ao envio de quaisquer esclarecimentos complementares julgados

necessários e relevantes à análise do caso concreto.

[…]”.

9. Por resposta rececionada em 19 de fevereiro de 2016, veio o Hospital de Guimarães

prestar os seguintes esclarecimentos:

“[…]

1. Relativamente ao episódio subjacente à questão supra, ampla e

deficientemente noticiado nos meios de comunicação social, corresponde à

verdade que, no dia e hora em questão, faleceu no SU deste Hospital um

utente de cerca de 100 anos (na realidade, 99 anos).

2. Não corresponde à verdade, no entanto, que ao referido utente tenha sido

negado o exercício do direito do acompanhamento, como decorre garantido pela

legislação citada.

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3. Na realidade, compulsados os elementos perfuntoria e imediatamente

disponíveis sobre a questão, relativamente ao utente, episódio, dia e hora que a

questão sob resposta encerra, resulta de forma clara e evidente que o utente (i)

foi admitido ao SU devidamente acompanhado, e (ii) teve vários momentos de

verificação e controle do seu estado de saúde por vários profissionais do HSOG a

trabalhar no âmbito do referido SU (cfr. elementos clínicos adiante juntos nos

elementos peticionados);

4. O que se nos afigura suscetível de ter sido interpretado como um impedimento

ao exercício do direito de acompanhamento trata-se na realidade da uma má

leitura e interpretação de norma interna, constante do SU no período em curso, e

que visa apenas garantir a melhor capacidade assistencial a todos os utentes que

recorrem aos serviços do HSOG, regulando também, e necessariamente para

este efeito, o fluxo de acompanhantes de todos e cada um dos utentes do SU do

HSOG.

5. Medida essa que, como bem se alcança e melhor se demonstrará, se encontra

dentro dos limites da Lei e existe para a proteção da saúde dos utentes e para

garantia da prestação dos melhores cuidados de saúde aos mesmos, e nunca

como impedimento absoluto ao acompanhamento dos utentes.

6. Partindo do princípio regra estatuído no diploma que regula a matéria em

questão (cfr. o n.° 1 do art. 12.° da Lei n.° 15/2014, na redação atual - disponível

em

(http://www.portaldasaude.Pt/portal/conteudos/informacoes+uteis/direitos+deveres

/direito+acompanhamento.htm -), o qual dispõe que:

Nos serviços de urgência do SNS, a todos é reconhecido e garantido o direito de

acompanhamento por uma pessoa por si indicada, devendo ser prestada essa

informação na admissão pelo serviço.

7. Este mesmo princípio encontra devida correspondência, respaldo e

densificação no corpo do regulamento de visitas e outros acessos do HSOG

(versão de 18.12.2015), nomeadamente no disposto no seu n.° 2 do artigo 3.°,

entre outras disposições mais ou menos específicas ao longo do referido

regulamento.

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8. Este princípio não é, no entanto e como se sabe, absoluto, admitindo

derrogações também consagradas no diploma, sempre em prol da defesa dos

direitos dos utentes e da prestação de cuidados aos mesmos.

9. O contexto de produção desta norma interna, específica para os SU, prende-se

com a necessidade de introduzir adaptações materiais e humanas na organização

do HSOG por forma a contemplar as orientações tutelares decorrentes do Plano

de Contingência de Temperaturas Extremas, Módulo de Inverno, aprovado pelo o

Despacho n.° 34/2015 de 9 de setembro (em anexo), que por sua vez reforça a

importância do Despacho n.° 4113-A/2015 e n.° 1/2015 de 10.11, e que especifica

algumas medidas para implementação deste Plano, com produção de efeitos

imediatamente e por período que abrange o dia 07 de janeiro de 2016;

10. A capacidade assistencial do HSOG assenta em variáveis como a procura dos

serviços do estabelecimento em determinado momento, os recursos materiais e

humanos disponíveis para a locação e outros, sendo o período em causa, por

definição, de afluxo anormal ao SU (exemplificativamente

http://rr.sapo.pt/informacao

detalhe.aspx/www.aedfrance.org/swf/swf/swfs/www.oecd.orQ/informacao

detalhe.aspx?fid=31&did=135455)

11. Em período e circunstâncias em que (i) o HSOG está obrigado a garantir a

melhor capacidade assistencial a todos os utentes, e sem que (ii) alguma vez haja

liminarmente sido recusado o direito a acompanhamento por parte dos utentes,

mas instituídas regras para impedir entropias nos fluxos dos SU,

12. Não pode senão considerar-se adequada, justa e proporcional a norma-

medida que baliza o exercício legítimo do direito a acompanhamento, por forma a

serem prestados os melhores cuidados de saúde a todos os utentes carenciados,

e em seu benefício.

(…)

(…) o Conselho de Administração deliberou pela instauração de procedimento de

inquérito e nomeação de instrutor, encontrando-se pendente a notificação deste.

Oportunamente remeteremos a V.as Ex.as os elementos constantes desse

processo (deliberação de instauração e nomeação de instrutor).

[…]”.

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10. Do documento intitulado “Identificação dos Acompanhantes no Serviço de Urgência

(SU)”, datado de 26 de novembro de 2014, resulta que “Sempre que seja necessário

por motivo de prestação de cuidados pode ser solicitado ao acompanhante que se

retire do interior do SU” (6.4);

11. E, bem assim, que, “Em casos excecionais, como a sobrelotação e falta de condições

de segurança para a prestação de cuidados no SU, pode o Chefe da Equipa, ou na

sua ausência, o Enf. Responsável de turno ou outro profissional mandatado para tal,

decidir pelo não acompanhamento dos utentes tendo em vista a qualidade dos

cuidados prestados e as condições de segurança para profissionais e utentes” (6.6).

12. No que respeita ao documento intitulado “Procedimento Específico do Serviço de

Urgência – Informação aos Acompanhantes”, documento não datado, consta o

seguinte:

“[…]

De acordo com o n.º 1 do artigo 12.º e do n.º 1 do artigo 14.º da Lei 15/2014, o SU

do Hospital de Guimarães reconhece o direito ao acompanhamento do doente por

uma pessoa por si indicada, bem como garante que o acompanhamento não

comprometa as condições e requisitos técnicos para a prestação de cuidados de

saúde com segurança e qualidade.

Ainda assim, e considerando a afluência de doentes a este serviço, o regime de

presença e visitas para o acompanhante do doente no serviço de urgência passa

a ter as seguintes regras:

1- O acompanhante entra com o doente no momento da admissão e sai logo que

o doente esteja acomodado;

2- O horário de visitas é o seguinte: 10 horas; 12 horas: 14 horas; 16 horas: 18

horas; 20 horas e 22 horas;

3- Estas visitas são coordenadas pelos enfermeiros das respetivas unidades e

terão a duração de 10 minutos;

4- Poderá ser permitida a permanência de um acompanhante junto do doente:

A) Com alteração do estado de consciência

B) Com deficiência

C) Caso o estado clínico do doente se altere

D) Outras situações, devendo sempre ser objeto de avaliação e autorização pelo

chefe de equipa ou, na sua ausência, pelo enfermeiro responsável de turno;

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5 - No horário das 22 horas às 8 horas, é da responsabilidade do médico e

enfermeiros da unidade decidir a presença e visita dos acompanhantes.

6- O chefe de equipa reserva-se no direito de suspender as visitas sempre que haja

comprometimento de procedimentos técnicos com segurança para os doentes.

7- Esta medida não se aplica à pediatria.

Nota: este procedimento é temporário, podendo ser alterado a qualquer momento,

logo que as condições o permitam”.

[…]”.

13. Conforme tabela dos doentes admitidos nos dias 6, 7 e 8 de janeiro de 2016 no SU,

resulta que, no dia dos factos (dia 7), foram 327 o número de doentes admitidos e,

especificamente no que respeita às cores atribuídas, foram 67 o número de utentes

triados com “cor amarela” (67).

14. Constatando-se, da análise dos dados relativos aos dias 6 e 8, que o dia 7 de janeiro

foi aquele em que se verificou um número mais reduzido quer de doentes admitidos

na globalidade, quer de doentes triados com “cor amarela”.

15. Por sua vez, no Regulamento do Serviço de Urgência, cuja última alteração data de

11 de novembro de 2014, mais concretamente, no artigo 25.º, é referido que “Todos

têm direito a ser acompanhados por uma pessoa por si indicada, de acordo com a

legislação em vigor” (n.º 1) e que “As adequações da legislação à realidade do CHAA

estão descritas na norma “Identificação dos Acompanhantes no Serviço de Urgência”

[…]” (n.º 2);

16. Já no artigo 26.º, n.º 13, é mencionado que “O acompanhamento de doentes no S.U.

obedecerá a norma própria decorrente da lei em vigor e das normas da instituição.

Contudo, o Chefe de Equipa e o Enfermeiro Responsável de Turno têm autonomia,

para sempre que considerem que está em causa o atendimento adequado dos

doentes e a segurança dos profissionais do S.U., o limitarem ou impedirem

transitoriamente”.

III. DO DIREITO

III.1. Das atribuições e competências da ERS

17. De acordo com o n.º 1 do artigo 4.º e o n.º 1 do artigo 5.º, ambos dos Estatutos da

ERS aprovados pelo Decreto-Lei n.º 126/2014, 22 de agosto, a ERS tem por missão a

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regulação, supervisão, e a promoção e defesa da concorrência, respeitantes às

atividades económicas na área da saúde dos setores privados, público, cooperativo e

social, e, em concreto, da atividade dos estabelecimentos prestadores de cuidados de

saúde.

18. Sendo que estão sujeitos à regulação da ERS, nos termos do n.º 2 do artigo 4.º dos

mesmos Estatutos, todos os estabelecimentos prestadores de cuidados de saúde, do

sector público, privado, cooperativo e social, independentemente da sua natureza

jurídica;

19. Consequentemente, o Hospital de Guimarães é um estabelecimento prestador de

cuidados de saúde registado no SRER da ERS sob o n.º 112086.

20. As atribuições da ERS, de acordo com o n.º 2 do artigo 5.º do dos Estatutos da ERS

compreendem “a supervisão da atividade e funcionamento dos estabelecimentos

prestadores de cuidados de saúde, no que respeita […entre outros] [ao] cumprimento

dos requisitos de exercício da atividade e de funcionamento, [à] garantia dos direitos

relativos ao acesso aos cuidados de saúde, à prestação de cuidados de saúde de

qualidade, bem como dos demais direitos dos utentes”.

21. No que toca à alínea a) do n.º 2 do artigo 5.º dos Estatutos da ERS, a alínea c) do

artigo 11.º do mesmo diploma estabelece ser incumbência da ERS “assegurar o

cumprimento dos requisitos legais e regulamentares de funcionamento dos

estabelecimentos prestadores de cuidados de saúde e sancionar o seu

incumprimento”.

22. No que se refere, por outro lado, ao objetivo regulatório previsto na alínea b) do n.º 2

do artigo 5.º e alínea c) do artigo 10.º dos Estatutos da ERS, de garantia dos direitos

e legítimos interesses dos utentes, a alínea a) do artigo 13.º do mesmo diploma

estabelece ser incumbência da ERS “monitorizar as queixas e reclamações dos

utentes e seguimento dado pelos operadores às mesmas”.

23. Já a alínea a) do artigo 12º refere que “incumbe à ERS assegurar o direito universal e

equitativo à prestação de cuidados de saúde nos serviços e estabelecimentos do

Serviço Nacional de Saúde”.

24. Para tanto, a ERS pode assegurar tais incumbências mediante o exercício dos seus

poderes de supervisão, consubstanciado, designadamente, no dever de zelar pela

aplicação das leis e regulamentos e demais normas aplicáveis, e ainda mediante a

emissão de ordens e instruções, bem como recomendações ou advertências

individuais, sempre que tal seja necessário, sobre quaisquer matérias relacionadas

com os objetivos da sua atividade reguladora, incluindo a imposição de medidas de

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conduta e a adoção das providências necessárias à reparação dos direitos e

interesses legítimos dos utentes – cfr. alíneas a) e b) do artigo 19.º dos Estatutos da

ERS.

25. Tal como configurada, a situação denunciada poderá não só traduzir-se num

comportamento atentatório dos legítimos direitos e interesses dos utentes, incluindo

quer o direito dos utentes do SNS de acompanhamento no SU, quer o direito a que os

cuidados de saúde sejam prestados humanamente e com respeito pelo utente, mas,

também, na violação de normativos que à ERS cabe acautelar na prossecução da

sua missão de regulação da atividade dos estabelecimentos prestadores de cuidados

de saúde, conforme disposto no n.º 1 do artigo 5.º dos Estatutos da ERS.

26. Ora, perante este enquadramento, resulta a necessidade de análise dos factos, tal

como denunciados, sob o prisma de uma eventual limitação ou restrição do direito de

acompanhamento, tal e qual o mesmo se encontra consagrado no artigo 12.º e

seguintes da Le n.º 15/2014, de 21 de março;

27. A qual, por sua vez, está relacionada com o funcionamento e o cumprimento de

protocolos, regras e procedimentos nos Serviços de Urgência no estabelecimento

hospitalar do SNS referenciado na reclamação.

III.2 Do direito de acesso universal ao serviço público de saúde

28. O direito à proteção da saúde, consagrado no artigo 64.º da Constituição da

República Portuguesa (doravante CRP), tem por escopo garantir o acesso de todos

os cidadãos aos cuidados de saúde, o qual será assegurado, entre outras obrigações

impostas constitucionalmente, através da criação de um serviço nacional de saúde

universal, geral e, tendo em conta as condições económicas e sociais dos cidadãos,

tendencialmente gratuito.

29. Dito de outro modo, a CRP impõe que o acesso dos cidadãos aos cuidados de saúde

no âmbito do SNS deve ser assegurado em respeito pelos princípios fundamentais

plasmados naquele preceito constitucional, designadamente a universalidade,

generalidade e gratuitidade tendencial.

30. Por sua vez, a Lei de Bases da Saúde, aprovada pela Lei n.º 48/90, de 24 de agosto,

em concretização da imposição constitucional contida no referido preceito, estabelece

no n.º 4 da sua Base I que “os cuidados de saúde são prestados por serviços e

estabelecimentos do Estado ou, sob fiscalização deste, por outros entes públicos ou

por entidades privadas, sem ou com fins lucrativos”, consagrando-se nas diretrizes da

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política de saúde estabelecidas na Base II que “é objetivo fundamental obter a

igualdade dos cidadãos no acesso aos cuidados de saúde, seja qual for a sua

condição económica e onde quer que vivam, bem como garantir a equidade na

distribuição de recursos e na utilização de serviços”.

31. Bem como estabelece na sua Base XXIV como características do SNS:

“a) Ser universal quanto à população abrangida;

b) Prestar integradamente cuidados globais ou garantir a sua prestação;

c) Ser tendencialmente gratuito para os utentes, tendo em conta as condições

económicas e sociais dos cidadãos”.

32. No respeitante à vertente qualitativa, o acesso aos cuidados de saúde deve ser

compreendido como o acesso aos cuidados que, efetivamente, são necessários e

adequados à satisfação das concretas necessidades dos mesmos.

33. O que significa que a necessidade de um utente deve ser satisfeita mediante a

prestação de serviços consentâneos com o estado da arte e da técnica, e que sejam

os reputados como necessários e adequados, sob pena do consequente

desfasamento entre procura e oferta na satisfação das necessidades.

34. Cumprindo, por isso, analisar se o comportamento adotado pelo Hospital de

Guimarães foi suficiente para garantir o cumprimento do dever prestação de cuidados

necessários e atempados que lhe é imposto.

III.3. Do enquadramento legal da prestação de cuidados – dos direitos e interesses

legítimos dos utentes

35. A necessidade de garantir requisitos mínimos de qualidade e segurança ao nível da

prestação, dos recursos humanos, do equipamento disponível e das instalações, está

presente no sector da prestação de cuidados de saúde de uma forma mais acentuada

do que em qualquer outra área.

36. As relevantes especificidades deste setor agudizam a necessidade de garantir que os

serviços sejam prestados em condições que não lesem o interesse nem violem os

direitos dos utentes.

37. Efetivamente, a qualidade tem sido considerada como um elemento diferenciador no

processo de atendimento das expectativas de clientes e utentes dos serviços de

saúde.

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38. Particularmente, a assimetria de informação que se verifica entre prestadores e

consumidores reduz a capacidade de escolha dos últimos, não lhes sendo fácil avaliar

a qualidade e adequação do espaço físico, nem a qualidade dos recursos humanos e

da prestação a que se submetem quando procuram cuidados de saúde.

39. Por outro lado, os níveis de segurança desejáveis na prestação de cuidados de saúde

devem ser considerados seja do ponto de vista do risco clínico, seja do risco não

clínico.

40. No que ao risco clínico diz respeito, as causas mais frequentes de lesões radicam no

uso de medicamentos, nas infeções e nas complicações peri operatórias.

41. Estes eventos adversos, em grande parte evitáveis, são passíveis de provocar danos

na pessoa doente, sendo certo que os custos sociais e privados neles implicados são

de tal importância, que as principais organizações de saúde, como a OMS,

incrementaram planos de ação para a prevenção e um controlo mais eficaz sobre os

acontecimentos danosos associados aos cuidados e procedimentos de saúde

prestados.

42. O utente dos serviços de saúde tem direito a que os cuidados de saúde sejam

prestados com observância e em estrito cumprimento dos parâmetros mínimos de

qualidade legalmente previstos, quer no plano das instalações, quer no que diz

respeito aos recursos técnicos e humanos utilizados.

43. Os utentes dos serviços de saúde que recorrem à prestação de cuidados de saúde

encontram-se, não raras vezes, numa situação de vulnerabilidade que torna ainda

mais premente a necessidade dos cuidados de saúde serem prestados pelos meios

adequados, com prontidão, humanidade, correção técnica e respeito.

44. Sempre e em qualquer situação, toda a pessoa tem o direito a ser respeitada na sua

dignidade, sobretudo quando está inferiorizada, fragilizada ou perturbada pela

doença.

45. A este respeito encontra-se reconhecido na LBS, mais concretamente na sua alínea

c) da Base XIV, o direito dos utentes a serem “tratados pelos meios adequados,

humanamente e com prontidão, correção técnica, privacidade e respeito”.

46. Quando o legislador refere que os utentes têm o direito de ser tratados pelos meios

adequados e com correção técnica está certamente a referir-se à utilização, pelos

prestadores de cuidados de saúde, dos tratamentos e tecnologias tecnicamente mais

corretas e que melhor se adequam à necessidade concreta de cada utente.

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47. Ou seja, deve ser reconhecido ao utente o direito a ser diagnosticado e tratado à luz

das técnicas mais atualizadas, e cuja efetividade se encontre cientificamente

comprovada, sendo porém óbvio que tal direito, como os demais consagrados na

LBS, terá sempre como limite os recursos humanos, técnicos e financeiros

disponíveis – cfr. n.º 2 da Base I da LBS.

48. Por outro lado, quando na alínea c) da Base XIV da LBS se afirma que os utentes

devem ser tratados humanamente e com respeito, tal imposição decorre diretamente

do dever dos estabelecimentos prestadores de cuidados de saúde de atenderem e

tratarem os seus utentes em respeito pela dignidade humana, como direito e princípio

estruturante da República Portuguesa.

49. De facto, os profissionais de saúde que se encontram ao serviço dos

estabelecimentos prestadores de cuidados de saúde devem ter redobrado cuidado de

respeitar as pessoas particularmente frágeis pela doença ou pela deficiência.

50. Efetivamente, sendo o direito de respeito do utente de cuidados de saúde um direito

ínsito à dignidade humana, o mesmo manifesta-se através da imposição de tal dever

a todos os profissionais de saúde envolvidos no processo de prestação de cuidados,

o qual compreende, ainda, a obrigação de os estabelecimentos prestadores de

cuidados de saúde possuírem instalações e equipamentos, que proporcionem o

conforto e o bem-estar exigidos pela situação de fragilidade em que o utente se

encontra.

51. Quanto ao direito do utente ser tratado com prontidão, o mesmo encontra-se

diretamente relacionado com o respeito pelo tempo do paciente, segundo o qual

deverá ser garantido o direito do utente a receber o tratamento necessário dentro de

um rápido e predeterminado período de tempo, em todas as fases do tratamento.

52. Refira-se ademais que, a relação que se estabelece entre os estabelecimentos

prestadores de cuidados de saúde e os seus utentes deve pautar-se pela verdade,

completude e transparência em todos os aspetos da mesma.

53. Sendo que tais características devem revelar-se em todos os momentos da relação.

54. Nesse sentido, o direito à informação – e o concomitante dever de informar – surge

aqui com especial relevância e é dotado de uma importância estrutural e estruturante

da própria relação criada entre utente e prestador.

55. Trata-se de um princípio que deve modelar todo o quadro de relações atuais e

potenciais entre utentes e prestadores de cuidados de saúde e, para tanto, a

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informação deve ser verdadeira, completa, transparente e, naturalmente inteligível

pelo seu destinatário.

56. Só assim se logrará obter a referida transparência na relação entre prestadores de

cuidados de saúde e utentes.

57. A contrario, a veiculação de uma qualquer informação errónea, a falta de informação

ou a omissão de um dever de informar por parte do prestador são por si suficientes

para comprometer a exigida transparência da relação entre este e o seu utente.

58. E nesse sentido, passível de distorcer os legítimos interesses dos utentes.

59. Na verdade, o direito do utente à informação não se limita ao que prevê a alínea e) do

n.º 1 da Base XIV da Lei de Bases da Saúde (LBS), aprovada pela Lei n.º 48/90, de

24 de agosto, para efeitos de consentimento informado e esclarecimento quanto a

alternativas de tratamento e evolução do estado clínico.

60. Pressupõe, também, entre outros, o dever de informação sobre possíveis quebras ou

impedimentos na continuidade da prestação do cuidado de saúde, in casu, o tempo

de espera para o atendimento médico.

61. Esta comunicação deve ser realizada em tempo útil, para assegurar que o utente não

é prejudicado, no percurso para o restabelecimento do seu estado de saúde.

62. Garantindo assim o cabal direito de o utente ser humanamente tratado, pelos meios

adequados, com prontidão e correção técnica tal como descrito na alínea c) do n.º 1

da Base XIV da Lei n.º 48/90, de 24 de agosto (LBS).

III.4 Do direito ao acompanhamento nos serviços de urgência

63. Em 21 de março de 2014, foi aprovada a Lei n.º 15/2014, de 21 de março, que

revogou a Lei nº 33/2009, de 14 de julho, e a Lei n.º 106/2009, de 14 de setembro.1

64. Conforme resulta do seu preâmbulo e do disposto no seu artigo 1.º, o diploma visa a

consolidação dos direitos e deveres dos utentes dos serviços de saúde, não alterando

significativamente o regime anterior, mas antes aportando uma melhor clarificação

para a ordem jurídica vigente.

65. Assim, a Lei n.º 15/2014, de 21 de março, passou a apresentar, de forma clara e

integrada, as regras gerais de acompanhamento do utente dos serviços de saúde,

bem como as regras específicas de acompanhamento da mulher grávida durante o

1 Diplomas que fixavam o quadro normativo aplicável ao direito de acompanhamento, até à entrada

em vigor da Lei n.º 15/2014, de 21 de março.

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parto e do acompanhamento em internamento hospitalar, tudo aspetos que se

encontravam antes dispersos nas Leis n.º 14/85, de 6 de julho, Lei n.º 33/2009, de 14

de julho, e Lei n.º 106/2009, de 14 de setembro.

66. Diga-se que, de acordo com o n.º 1 do artigo 12.º do antedito diploma, “Nos serviços

de urgência do SNS, a todos é reconhecido e garantido o direito de acompanhamento

por uma pessoa por si indicada, devendo ser prestada essa informação na admissão

pelo serviço.”

67. Continua o artigo 13.º da mesma Lei que “nos casos em que a situação clínica não

permita ao utente escolher livremente o acompanhante, os serviços devem promover

o direito de acompanhamento, podendo de acordo com a lei, solicitar a demonstração

do parentesco ou da relação com o utente, invocados pelo acompanhante”.

68. Todavia, a Lei também refere que a natureza do parentesco ou da relação com o

utente não pode ser invocada para impedir o acompanhamento.

69. Por outro lado, os limites ao direito de acompanhamento estão expressamente

consagrados, existindo um elenco restrito de limites:

“[…] Não é permitido acompanhar ou assistir a intervenções cirúrgicas e a outros

exames ou tratamentos que, pela sua natureza, possam ver a sua eficácia e

correção prejudicadas pela presença do acompanhante, exceto se para tal for

dada autorização expressa pelo clínico responsável […]

O acompanhamento não pode comprometer as condições e requisitos técnicos a

que deve obedecer a prestação de cuidados médicos”.

70. Sendo certo que, nestes casos, “[…] compete ao profissional de saúde responsável

pela prestação de cuidados de saúde informar e explicar ao acompanhante os

motivos que impedem a continuidade do acompanhamento.”.

71. O artigo 15.º, por sua vez, faz referência aos direitos e deveres dos acompanhantes,

e salienta-se aqui não só o dever de urbanidade, como o respeito pelas indicações

dadas pelo profissional de saúde, quando devidamente fundamentadas.

72. Mas, em especial, o direito do acompanhante a ser devidamente informado, em

tempo razoável, sobre a situação do doente, nas diferentes fases do atendimento.

73. Ainda, e tal como já referido, a Lei n.º 15/2014, de 21 de março, vem também

estabelecer o regime para Acompanhamento em internamento hospitalar de crianças,

pessoas com deficiência, pessoas em situação de dependência e pessoas com

doença incurável em estado avançado e em estado final de vida em hospital ou

unidade de saúde – cfr. artigos 19.º a 23.º da Lei n.º 15/2014, de 21 de março.

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74. Para efeitos dos presentes autos, atente-se no artigo 20.º, o qual estatui que

“pessoas com deficiência, pessoas em situação de dependência e pessoas com

doença incurável em estado avançado e em estado final de vida em estabelecimento

de saúde têm direito ao acompanhamento permanente de ascendente, descendente,

cônjuge ou equiparado e, na sua ausência ou impedimento destes ou por sua

vontade, de pessoa por si designada.”.2

75. Refira-se, igualmente, e à semelhança do já previsto nos diplomas entretanto

revogados acima citados, que a Lei n.º 15/2014, de 21 de março, consagra, no n.º 1

do seu artigo 31.º, não só a obrigação de adaptação dos serviços de urgência do SNS

ao direito de acompanhamento, “de forma a permitir que o utente possa usufruir do

direito de acompanhamento sem causar qualquer prejuízo ao normal funcionamento

daqueles serviços”.

76. Mas, outrossim, que “o direito de acompanhamento nos serviços de urgência deve

estar consagrado no regulamento da respetiva instituição de saúde, o qual deve

definir com clareza e rigor as respetivas normas e condições de aplicação”.

III.5. Da anterior intervenção regulatória da ERS

77. A este propósito, recorde-se que, no âmbito do Processo de Inquérito n.º

ERS/7/2015-G, a ERS emitiu deliberação dirigida ao então Centro Hospitalar do Alto

Ave, E.P.E., a qual, porém, não incidiu especificamente sobre o direito ao

acompanhamento dos utentes, mas sobre as condições de funcionamento do SU e o

cumprimento das regras de triagem e Manchester3;

78. Embora tal deliberação se referisse à necessidade de o prestador dever igualmente

garantir, em permanência, que, na prestação de cuidados de saúde aos utentes, e em

concreto no SU, sejam respeitados os direitos e interesses legítimos dos utentes,

nomeadamente, o direito aos cuidados adequados e tecnicamente mais corretos, que

devem ser prestados humanamente e com respeito pelo utente, em conformidade

com o estabelecido no artigo 4º da Lei n.º 15/2014, de 21 de março.

2 Note-se que, nestes casos, não existe qualquer tipo de limitação ao acompanhamento, referindo-

se a lei às condições em que esse acompanhamento deve ser exercido, isto é, com respeito pelas instruções e regras técnicas relativas aos cuidados de saúde. Encontra-se também vedado o acompanhamento nas intervenções cirúrgicas, bem como a tratamentos em que a presença do acompanhante seja prejudicial para a correção e eficácia dos mesmos, com exceção para aqueles atos para a qual foi dada a autorização do clínico responsável. – cfr. artigos 21.º e 22.º da Lei n.º15/2014, de 21 de março.

3 Instrução consultável em www.ers.pt.

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III.6. Da análise da situação concreta

79. A situação em análise na presente deliberação visa avaliar se o Hospital de

Guimarães se encontra a cumprir os normativos referentes ao direito de

acompanhamento dos utentes no SU.

80. Estando, assim, a atuação da ERS sobre a situação em causa delimitada pelas suas

atribuições e competências, designadamente, no que toca a “assegurar o

cumprimento dos critérios de acesso aos cuidados de saúde” e “garantir os direitos e

interesses legítimos dos utentes”.

81. No que se refere ao acompanhamento do utente no episódio ocorrido no SU do

Hospital de Guimarães, no dia 7 de janeiro de 2016, foi possível apurar dos factos

trazidos ao processo que o prestador restringiu/condicionou/limitou o direito de

acompanhamento daquele pelas suas netas, sendo esse, aliás, um comportamento

que se encontra inclusivamente regulamentado nas suas normas e procedimentos

internos, conforme resposta do próprio prestador à ERS.

82. Neste contexto, referiram as reclamantes o seguinte:

“(…) é de nosso direito (…) acompanhá-lo [ao utente] durante o período em que o

doente se encontra no serviço de urgência. Assim o tentamos fazer por diversas

vezes ao longo do dia, embora sem sucesso visto que, o serviço das urgências

deste hospital negou a entrada de um qualquer acompanhante dando como

justificação as novas e recentes regras implementadas pelo hospital (…)”.

83. O prestador começa por dizer que “Não corresponde à verdade (…) que ao referido

utente tenha sido negado o exercício do direito do acompanhamento. (…) o utente (i)

foi admitido ao SU devidamente acompanhado, e (ii) teve vários momentos de

verificação e controle do seu estado de saúde por vários profissionais do HSOG a

trabalhar no âmbito do referido SU”.

84. Desde logo, do trecho citado parece resultar um equívoco por parte do prestador

quanto à noção de “acompanhamento”, porquanto faz alusão ao acompanhamento do

utente “por vários profissionais do HSOG”.

85. Isso mesmo decorre também da resposta enviada pelo prestador às reclamantes, na

qual é referido que “Conforme procuramos transmitir nas várias conversas tidas com

a família, o Sr. A. teve de facto acompanhamento, intermitente (como não poderia

deixar de ser), durante o tempo de permanência no SU. O mesmo foi prestado pelos

profissionais, por elementos da família e pela funcionária do Lar”.

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86. Uma vez mais, e pese embora se faça agora referência à família do utente, o

prestador volta a mencionar os profissionais de saúde e outros funcionários.

87. Ora, como é óbvio, o acompanhamento aqui em causa, e talqualmente se encontra

consagrado na Lei n.º 15/2014, de 21 de agosto, diz respeito àquele que é realizado

não por profissionais médicos, mas sim por pessoas do círculo familiar e pessoal do

utente.

88. Quanto ao acompanhamento propriamente dito, o prestador referiu, em resposta à

utente, que “O acompanhamento prestado, intermitente, deve-se apenas às

limitações de espaço e de fluxos do SU, e ao excesso de procura nesta altura do ano

(picos de gripe), situação essa também prevista na lei, pois como compreenderão

visa a proteção de todos os utentes e não a negação de acesso a visitas”.

89. Reiterando o prestador tal entendimento na resposta enviada à ERS:

“[…]

4. O que se nos afigura suscetível de ter sido interpretado como um impedimento

ao exercício do direito de acompanhamento trata-se na realidade da uma má leitura

e interpretação de norma interna, constante do SU no período em curso, e que visa

apenas garantir a melhor capacidade assistencial a todos os utentes que recorrem

aos serviços do HSOG, regulando também, e necessariamente para este efeito, o

fluxo de acompanhantes de todos e cada um dos utentes do SU do HSOG.

5. Medida essa que, como bem se alcança e melhor se demonstrará, se encontra

dentro dos limites da Lei e existe para a proteção da saúde dos utentes e para

garantia da prestação dos melhores cuidados de saúde aos mesmos, e nunca

como impedimento absoluto ao acompanhamento dos utentes.

6. Partindo do princípio regra estatuído no diploma que regula a matéria em

questão (cfr. o n.° 1 do art. 12.° da Lei n.° 15/2014 (…)

7. Este mesmo princípio encontra devida correspondência, respaldo e densificação

no corpo do regulamento de visitas e outros acessos do HSOG (versão de

18.12.2015), nomeadamente no disposto no seu n.° 2 do artigo 3.°, entre outras

disposições mais ou menos específicas ao longo do referido regulamento.

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8. Este princípio não é, no entanto e como se sabe, absoluto, admitindo

derrogações também consagradas no diploma, sempre em prol da defesa dos

direitos dos utentes e da prestação de cuidados aos mesmos.

9. O contexto de produção desta norma interna, específica para os SU, prende-se

com a necessidade de introduzir adaptações materiais e humanas na organização

do HSOG por forma a contemplar as orientações tutelares decorrentes do Plano de

Contingência de Temperaturas Extremas, Módulo de Inverno, aprovado pelo o

Despacho n.° 34/2015 de 9 de setembro (em anexo), que por sua vez reforça a

importância do Despacho n.° 4113-A/2015 e n.° 1/2015 de 10.11, e que especifica

algumas medidas para implementação deste Plano, com produção de efeitos

imediatamente e por período que abrange o dia 07 de janeiro de 2016;

(…)

11. Em período e circunstâncias em que (i) o HSOG está obrigado a garantir a

melhor capacidade assistencial a todos os utentes, e sem que (ii) alguma vez haja

liminarmente sido recusado o direito a acompanhamento por parte dos utentes, mas

instituídas regras para impedir entropias nos fluxos dos SU,

12. Não pode senão considerar-se adequada, justa e proporcional a norma-medida

que baliza o exercício legítimo do direito a acompanhamento, por forma a serem

prestados os melhores cuidados de saúde a todos os utentes carenciados, e em

seu benefício.

[…]”.

90. Efetivamente, o acompanhamento dos utentes não é um direito absoluto, podendo

estar sujeito a limitações.

91. Todavia, tal é admissível apenas e só nos casos taxativamente previstos no artigo

14.º, mormente no seu n.º 2, da Lei n.º 15/2014, de 21 de março.

92. Com efeito, a lei apenas limita o direito de acompanhamento nos seguintes casos:

“(i) Não é permitido acompanhar ou assistir a intervenções cirúrgicas e a outros

exames ou tratamentos que, pela sua natureza, possam ver a sua eficácia e correção

prejudicadas pela presença do acompanhante, exceto se para tal for dada autorização

expressa pelo clínico responsável;

(ii) O acompanhamento não pode comprometer as condições e requisitos técnicos a

que deve obedecer a prestação de cuidados médicos”.

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93. No caso concreto, está em causa o acompanhamento de um utente masculino de 99

anos, totalmente dependente, com patologias várias e em estado muito débil,

referindo-se-lhe as reclamantes como “(…) estando num estado muito crítico não

podendo sequer falar e andar, deste modo conclui-se (…) que era um doente

bastante debilitado/dependente, precisando assim de uma constante presença do seu

lado”.

94. Circunstancialismo, de resto, reconhecido pelo próprio prestador, que, na resposta às

reclamantes, se referem ao utente como “(…) detentor de múltiplas comorbilidades,

com sequelas de AVC (…), apresentando um quadro de dificuldade respiratória,

embora sem necessidade de Oxigénio”.

95. Apesar de estar prevista na lei a possibilidade de introdução de limites ao direito de

acompanhamento, tal não pode volver-se em regra aplicável de forma irrestrita em

toda e qualquer situação e sem a necessária ponderação circunstanciada a cada

caso concreto.

96. Nem mesmo nas situações em que se verifique uma grande afluência de doentes e

dos respetivos acompanhantes.

97. Se isto vale em tese, tanto mais vale, em especial, nas situações em que os utentes

se encontram assaz fragilizados, quer pela sua idade ou condição clínica, quer pela

situação de dependência em relação a terceiros.

98. Esse é o caso do utente A., com 99 anos de idade, totalmente dependente e com

patologias várias.

99. Aspetos que concorrem, no caso concreto, para uma situação generalizada de

debilidade da utente que eleva ao máximo as exigências inerentes ao direito de

acompanhamento.

100. Algo, de resto, expressamente visado pelo legislador no arrazoado do artigo 20.º da

Lei n.º 15/2014, de 21 de março.

101. No limite, e olhando o caso concreto, ou seja, a específica e debilíssima condição

de alguém como o utente A., o acompanhamento deste utente por familiares teria

sempre, em qualquer caso, de existir, e de modo permanente.

102. Tal não ocorreu, algo reconhecido pelo próprio prestador, que qualificou esse

acompanhamento como “intermitente”.

103. Não obstante, recaía sobre o prestador o ónus de, nos presentes autos, concretizar

e clarificar as razões que, em concreto, levaram ao condicionamento do

acompanhamento ao utente.

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104. Ora, o prestador limita-se a aduzir considerações vagas e de ordem genérica,

nomeadamente, a necessidade de cumprimento com as orientações decorrentes do

Plano de Contingência de Temperaturas Extremas, Módulo de Inverno (aprovado pelo

Despacho n.º 34/2015, de 9 de setembro) e o facto de a data dos acontecimentos (7

de janeiro de 2016) se localizar num período “(…) por definição, de afluxo anormal ao

SU”.

105. Ora, para além do carácter genérico destas considerações, acresce que, conforme

tabela dos doentes admitidos nos dias 6, 7 e 8 de janeiro de 2016 no SU (tabela

enviada pelo próprio prestador), o dia dos factos (dia 7) nem foi dos dias em que se

verificou uma maior afluência.

106. Ao invés, foi mesmo o dia com o menor número de doentes admitidos (327) e,

especificamente no que respeita às cores atribuídas, com o menor número de utentes

triados com “cor amarela” (67).

107. Considerados estes fatores, verifica-se que o prestador não adequou o seu

comportamento ao regime jurídico estabelecido na Lei n.º 15/2014, de 21 de março,

não justificando, ademais, em concreto, os motivos para a restrição do direito de

acompanhamento a um utente em situação tão precária como o utente A..

108. Não foi possível apurar o grau de limitação injustificada do direito de

acompanhamento do utente, na medida em que enquanto as reclamantes referiram

que lhes foi pura e simplesmente negado todo e qualquer acompanhamento.

109. O prestador argumentou ter permitido um acompanhamento “intermitente”.

110. No entanto, é seguro que não foi garantido, em pleno, o direito de

acompanhamento ao utente em causa.

111. Não tendo o prestador trazido conhecimento da ERS qualquer situação excecional

– das legalmente admissíveis e previstas nos n.os 1 e 2 do art. 14.º – que justificasse,

em concreto, o condicionamento do direito de acompanhamento a um utente de 99

anos com as debilidades em causa e num estado de dependência total.

112. De facto, a mera afluência acrescida de utentes e respetivos acompanhantes ao

serviço de urgência, por si só, não vale, à luz do artigo 14.º, como fundamento

admissível para a limitação, sem mais, do direito de acompanhamento.

113. Admite-se que, no dia em causa, possa ter existido uma “afluxo acrescido” que,

pela sua natureza imprevista, possa ter afetado, negativamente, o SU do prestador.

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114. No entanto, sempre se dirá que, estando em causa um serviço dinâmico como SU,

este, pelas suas características, está sempre sujeito, por natureza, a alguma

imprevisibilidade.

115. Reitere-se: para um utente na situação do utente A., não é admissível uma

limitação do direito de acompanhamento como a que se verificou nos presentes

autos.

116. Mais, o prestador não informou e explicou aos acompanhantes os concretos

motivos – mesmo que não legalmente admissíveis, como acima referido – para a

restrição ao acompanhamento, contra o que preceitua o n.º 3 do artigo 14.º.

117. Apenas os remetendo para a existência de regras internas que legitimavam,

alegadamente, o condicionamento ou restrição do direito de acompanhamento,

nomeadamente, as constantes do documento “Procedimento Específico do Serviço

de Urgência – Informação aos Acompanhantes”.

118. Pelo que forçoso é concluir que, no caso sub judice, se verificou uma violação do

direito ao acompanhamento, agravada pela situação de carência e debilidade física

da utente em questão e pela não comunicação aos acompanhantes dos motivos, em

concreto, para a restrição do acompanhamento.

119. Ademais, cumprirá ainda referir que, apesar da situação concreta versar sobre o

direito ao acompanhamento no SU, o Hospital de Guimarães terá sempre a obrigação

de cumprir todas as regras constantes da Lei n.º 15/2014, de 21 de março,

designadamente, também no que toca ao “acompanhamento da mulher grávida” e ao

“acompanhamento em internamento hospitalar”.

120. Em face de todo o exposto, torna-se premente que o Hospital de Guimarães

conforme a sua conduta em estrito cumprimento da Lei n.º 15/2014, de 21 de março,

no que especificamente se refere ao direito de acompanhamento dos utentes.

121. Desde logo devendo proceder à alteração/revisão das suas normas e

procedimentos internos, de forma a que os mesmos passem a estar em conformidade

com o disposto na lei.

Vejamos.

122. Do documento intitulado “Identificação dos Acompanhantes no Serviço de Urgência

(SU)”, datado de 26 de novembro de 2014, resulta que “Sempre que seja necessário

por motivo de prestação de cuidados pode ser solicitado ao acompanhante que se

retire do interior do SU” (6.4).

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123. E, bem assim, que, “Em casos excecionais, como a sobrelotação e falta de

condições de segurança para a prestação de cuidados no SU, pode o Chefe da

Equipa, ou na sua ausência, o Enf. Responsável de turno ou outro profissional

mandatado para tal, decidir pelo não acompanhamento dos utentes tendo em vista a

qualidade dos cuidados prestados e as condições de segurança para profissionais e

utentes” (6.6).

124. Por sua vez, do documento intitulado “Procedimento Específico do Serviço de

Urgência – Informação aos Acompanhantes” consta o seguinte:

“[…]

(…) o regime de presença e visitas para o acompanhante do doente no serviço de

urgência passa a ter as seguintes regras:

1- O acompanhante entra com o doente no momento da admissão e sai logo que o

doente esteja acomodado;

2- O horário de visitas é o seguinte: 10 horas; 12 horas: 14 horas; 16 horas: 18 horas;

20 horas e 22 horas;

3- Estas visitas são coordenadas pelos enfermeiros das respetivas unidades e terão a

duração de 10 minutos;

4- Poderá ser permitida a permanência de um acompanhante junto do doente:

A) Com alteração do estado de consciência

B) Com deficiência

C) Caso o estado clínico do doente se altere

D) Outras situações, devendo sempre ser objeto de avaliação e autorização pelo chefe

de equipa ou, na sua ausência, pelo enfermeiro responsável de turno;

5 - No horário das 22 horas às 8 horas, é da responsabilidade do médico e enfermeiros

da unidade decidir a presença e visita dos acompanhantes.

6- O chefe de equipa reserva-se no direito de suspender as visitas sempre que haja

comprometimento de procedimentos técnicos com segurança para os doentes.

7- Esta medida não se aplica à pediatria.

Nota: este procedimento é temporário, podendo ser alterado a qualquer momento, logo

que as condições o permitam”..

[…]”.

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125. Finalmente, o artigo 26.º, n.º 13, do Regulamento do Serviço de Urgência, cuja

última alteração data de 11 de novembro de 2014, preceitua que “O

acompanhamento de doentes no S.U. obedecerá a norma própria decorrente da lei

em vigor e das normas da instituição. Contudo, o Chefe de Equipa e o Enfermeiro

Responsável de Turno têm autonomia, para sempre que considerem que está em

causa o atendimento adequado dos doentes e a segurança dos profissionais do S.U.,

o limitarem ou impedirem transitoriamente”.

126. Resulta à evidência que o vertido nestes documentos, sobretudo nos últimos dois

citados, praticamente transforma a exceção em regra e vice-versa.

127. Isto é, transforma a limitação do acompanhamento em regime geral ou, pelo

menos, como regime de que o prestador pode lançar mão sempre que entender

necessário.

128. Quando não é essa, como já explanado, a letra e o espírito do regime gizado pelo

legislador no artigo 12.º e seguintes da Lei n.º 15/2014, de 21 de março.

129. Entre outras menções exemplificativas, atente-se, desde logo, no trecho “4- Poderá

ser permitida a permanência de um acompanhante junto do doente (…)”.

130. A utilização do verbo “Pode” indicia, precisamente, a ideia de que a regra é a da

limitação do acompanhamento e a exceção a possibilidade, situada na esfera

discricionária do prestador, de o acompanhante permanecer junto do doente.

131. Concluindo, os citados documentos (sobretudo os últimos dois) enfermam de

desconformidades em relação ao regime do direito acompanhamento do utente

vazado no artigo 12.º e seguintes da Lei n.º 15/2014, de 21 de março, mais

especificamente no que diz respeito à regra (direito ao acompanhamento) e exceção

(limites a esse direito) vigentes para esse regime.

IV. AUDIÊNCIA DOS INTERESSADOS

132. A presente deliberação foi precedida de audiência escrita dos interessados, nos

termos e para os efeitos do disposto no artigo 122.º do Código do Procedimento

Administrativo, aplicável ex vi artigo 24.º dos Estatutos da ERS, tendo, para o efeito,

sido chamados a pronunciar-se, relativamente ao projeto de deliberação da ERS, a

reclamante e o prestador envolvido.

133. Decorrido o prazo concedido para a referida pronúncia, a ERS rececionou a

pronúncia do prestador Hospital da Senhora da Oliveira, E.P.E., efetuada mediante o

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envio de ofício datado de 30 de março de 2016 (ref.ª n.º 41/CA), bem como a

pronúncia da reclamante, a qual deu entrada na ERS em 31 de março de 2016.

IV.1 Da pronúncia do prestador Hospital da Senhora da Oliveira, E.P.E.

134. Em sede de audiência de interessados, veio o prestador pronunciar-se, no que de

relevante comporta nesta sede, nos seguintes termos:

“[…]

1. Discordando respeitosamente dos pressupostos e conclusões segundo as

quais se adianta haver sido negado o direito de acompanhamento no SU do

Hospital de Guimarães, constata-se para os devidos efeitos que não procedeu a

ERS, em sede de inquérito, à audição sobre os factos de nenhum dos

profissionais envolvidos no episódio,

2. O que não deixa de causar estranheza (…);

(…)

4. Sobre os factos, de referir que o utente em causa (de género masculino, com

99 anos, e não feminino como decorre dos pontos 99 e 118 do projeto de

deliberação), de acrescentar apenas que o quadro clínico do utente apresentava à

data as seguintes evidências mais sobressalientes:

i. Utente que se encontrava residente num lar,

(…).

5. Pelo que, de acordo com um princípio de verdade material, inquisitório e

apuramento real do sucedido, desde já se requer, sobre a questão da existência

ou não de acompanhamento no SU da urgência, seja ouvida a funcionária do lar

onde o utente residia (…).

6. A qual atestará seguramente do que vimos afirmando, e que em suma síntese

corresponde a não ter havido qualquer limitação ilegítima ou desproporcional no

acompanhamento do utente em questão.

7. A talho [sic] de foice, diga-se que também se nos afigura a despropósito a

referência no artigo 77. do processo de Inquérito que correu termos sob a ref.ª

ERS/7/2015-G, uma vez que a factualidade subjacente e as matérias tratadas

correspondem a questões completamente diversas (…).

(…)

27 Mod.016_01

11. (…) quanto ao equívoco (cfr.ponto 84) por parte do HSOG sobre o que

significa acompanhamento não existe, não obstante exista [sic] consabidamente

dois tipos de acompanhamento aos utentes: aquele stricto senso [sic], prestador

por familiares e acompanhantes, e o acompanhamento por parte dos prestadores

e colaboradores do HSOG, inerente à prestação de cuidados de saúde

(acompanhamento clínico).

12. A ambos foi dada competente resposta, como se evidenciou nas respostas

aos familiares do utente, e da ERS;

13. Ambos (…) foram intermitentes, de acordo com os recursos, o quadro clínico e

as necessidades paulatinamente demonstradas;

(…)

19. (…) não se pode sufragar o entendimento segundo o qual se declara:

“110. No entanto, é seguro que não foi garantido, em pleno, o direito de

acompanhamento ao utente em causa…”.

20. (…) ao contrário do que vem afirmado (…) o HSOG informou e explicou aos

acompanhantes os concretos motivos para a restrição ao acompanhamento,

conforme preceitua o n.º 3 do artigo 14.º.

(…)

26. Sem prejuízo de se encontrar, em face das conclusões da proposta de

deliberação, a analisar mais profundamente as suas normas internas (…)

27. No sentido de avaliar da oportunidade e conveniência de deixar mais evidente

a conformidade com o disposto no quadro legal aplicável, informando-se no

decurso do presente procedimento das conclusões entretanto apuradas.

[…]”.

IV.2 Da pronúncia da reclamante

135. Por seu turno, a reclamante pronunciou-se nos seguintes termos:

“[…]

Chegou-nos às mãos uma resposta cuidada e bastante detalhada por parte da

Entidade Reguladora de Saúde, mostrando que houve uma preocupação em

analisar toda a situação e todo o procedimento que o hospital teve para com esta

situação.

28 Mod.016_01

(…) podemos perceber que o hospital insiste em dizer que houve um

acompanhamento ao doente, quando isso de facto não aconteceu privando assim

o meu avô debilitado de ter alguém de família a gerir o que de mais importante ele

necessitava naquele momento.

(…) a enfermeira que no dia a seguir reuniu conosco nem sequer nos conseguiu

explicar o sucedido e o porquê de o meu avô não ter o acompanhamento da

família (…).

Repete-se inúmeras vezes afirmando que nunca foi negado o acompanhamento

ao meu avô, e creio que o facto de repetir isto convictamente é para se tentar

convencer e no fundo ilibar qualquer culpa que o hospital possa ter na deficiente

conduta das regras de visita (…).

(…) houve realmente um grande erro por parte deste hospital ao restringir a

entrada permanente de familiares. (…) Existiu na realidade uma violação de

direitos para com o utente e para com os familiares, visto que o hospital foi contra

a lei impondo as suas próprias regras que prevaleceram acima da lei e não tendo

sequer a decência de explicar o porquê do não acompanhamento por parte de

familiares. Foram violados todos os direitos do utente mesmo quando a família

tentou chamar à razão o hospital mostrando as leis que estariam do seu lado.

[…]”.

IV.3 Análise dos fundamentos da pronúncia do prestador

136. Cumpre analisar os elementos invocados na pronúncia do prestador, aferindo da

suscetibilidade dos mesmos infirmarem ou alterarem a deliberação projetada.

137. As declarações prestadas foram consideradas e ponderadas pela ERS.

138. Relativamente à alegação de que “Sobre os factos, de referir que o utente em causa

(de género masculino, com 99 anos, e não feminino como decorre dos pontos 99 e

118 do projeto de deliberação),(…)”,

139. Refira-se que, como elementarmente decorre do conteúdo do projeto de

deliberação, desde a sua primeira página (em que o utente é identificado pelo nome

completo…) até à última, se trata de um utente do sexo masculino, constituindo tais

menções (a pontos 99 e 118) meros lapsus calami.

140. No que respeita à pronúncia do prestador de que “desde já se requer, sobre a

questão da existência ou não de acompanhamento no SU da urgência, seja ouvida a

funcionária do lar onde o utente residia (…)”,

29 Mod.016_01

141. Importa frisar – se é que tal se mostra necessário – que o acompanhamento aqui

em causa não diz respeito ao prestado pelos funcionários do lar onde o utente residia;

142. Mas sim ao que não foi plenamente assegurado, como manda a lei, aos familiares

do utente no SU do prestador.

143. Familiares, esses, que são, de resto, os subscritores da reclamação que está na

génese do presente processo de inquérito.

144. Quanto à solicitação do prestador no sentido da funcionária do referido lar ser

inquirida, da análise de todos os elementos fatuais presentes nos autos não se lobriga

a necessidade ou conveniência em encetar tal procedimento, porquanto quer da

reclamação, quer da pronúncia do prestador em sede de processo de avaliação

(prévio à instauração do presente processo de inquérito);

145. É possível concluir como estando manifestamente aclarado o ocorrido na data dos

factos.

146. Sem prejuízo do que acabou de ser referido, não se deixe de salientar (e estranhar)

como o prestador, depois de solicitar tal inquirição, em nenhum momento identifica a

funcionária em causa pelo seu nome e morada.

147. Quanto ao ponto 7 da pronúncia do prestador, reitera-se o que, muito

cristalinamente, se destrinçou no projeto de deliberação notificado ao prestador:

“(…) no âmbito do Processo de Inquérito n.º ERS/7/2015-G, a ERS emitiu deliberação

dirigida ao então Centro Hospitalar do Alto Ave, E.P.E., a qual, porém, não incidiu

especificamente sobre o direito ao acompanhamento dos utentes, mas sobre as

condições de funcionamento do SU e o cumprimento das regras de triagem e

Manchester4;

Embora tal deliberação se referisse à necessidade de o prestador dever igualmente

garantir, em permanência, que, na prestação de cuidados de saúde aos utentes, e em

concreto no SU, sejam respeitados os direitos e interesses legítimos dos utentes,

nomeadamente, o direito aos cuidados adequados e tecnicamente mais corretos, que

devem ser prestados humanamente e com respeito pelo utente, em conformidade

com o estabelecido no artigo 4º da Lei n.º 15/2014, de 21 de março”

148. Quanto à asserção de que “(…) não obstante exista [sic] consabidamente dois tipos

de acompanhamento aos utentes: aquele stricto senso [sic], prestador por familiares e

4 Instrução consultável em www.ers.pt.

30 Mod.016_01

acompanhantes, e o acompanhamento por parte dos prestadores e colaboradores do

HSOG, inerente à prestação de cuidados de saúde (acompanhamento clínico).

12. A ambos foi dada competente resposta, como se evidenciou nas respostas aos

familiares do utente, e da ERS;”

149. Cumpre esclarecer que, não obstante essa elementar evidência, o único “tipo” de

acompanhamento de que a ERS cuida e se ocupa no âmbito da sua intervenção

regulatória é, logicamente, o prestado por acompanhantes nos termos do artigo 12.º e

seguintes da Lei n.º 15/2014, de 21 de março.

150. Da pronúncia do prestador sobressai a reiteração de dois elementos já analisados e

valorados pela ERS no seu projeto de deliberação.

151. Por um lado, o prestador volta a reconhecer que o acompanhamento foi apenas

intermitente.

152. Quando, como já sublinhado, atentas as particulares circunstâncias do utente

(idade e condição clínica), se exigia, no caso concreto, que esse acompanhamento

tivesse sido permanente e pleno.

153. Sendo esse, de resto, o modo como o direito de acompanhamento se encontra

previsto e é postulado pela lei, apenas se admitindo limitações em casos excecionais

e devidamente fundamentos.

154. Por outro lado, o prestador volta a não demonstrar o porquê de, em concreto, ter

sido limitado o direito de acompanhamento ao utente, o qual, como repetidamente é

reconhecido pelo prestador, foi meramente “intermitente”.

155. Ora, se o acompanhamento é intermitente, não é, por definição, permanente e

pleno.

156. Relativamente, ainda, à afirmação de que “(…) o HSOG informou e explicou aos

acompanhantes os concretos motivos para a restrição ao acompanhamento (…)”,

157. Recorda-se que não só o prestador disso não informou e concretizou na pronúncia

enviada à ERS quando inquirida em sede do processo de avaliação que precedeu o

presente processo de inquérito;

158. Como, note-se, volta a não o fazer em sede de audiência de interessados.

159. Na verdade, o prestador limita-se a dizer que “informou e explicou”, não fazendo

qualquer tipo de prova do alegado.

160. Talqualmente consta do projeto de deliberação e aqui se reitera:

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“O prestador não informou e explicou aos acompanhantes os concretos motivos –

mesmo que não legalmente admissíveis, como acima referido – para a restrição ao

acompanhamento, contra o que preceitua o n.º 3 do artigo 14.º.

Apenas os remetendo para a existência de regras internas que legitimavam,

alegadamente, o condicionamento ou restrição do direito de acompanhamento,

nomeadamente, as constantes do documento “Procedimento Específico do Serviço

de Urgência – Informação aos Acompanhantes”.

161. Finalmente, o prestador informa que irá “avaliar da oportunidade e conveniência” em

alterar e/ou rever os seus documentos internos conforme instrução constante do

projeto de deliberação emitido.

162. A este respeito, urge clarificar que, em matéria das instruções legalmente emitidas

pela ERS, não cabe aos prestadores ponderar da sua oportunidade ou conveniência,

muito menos da sua necessidade.

163. Aos prestadores incumbe o dever legal de as acatar e executar, apenas

beneficiando de uma margem de autonomia no meio (mas não no fim) escolhido para

lhes dar cumprimento.

164. Em caso contrário, e de acordo com a lei e os Estatutos da ERS em vigor, os

prestadores incorrem em responsabilidade contraordenacional por desrespeito de

norma ou de decisão da ERS que, no exercício dos seus poderes regulamentares, de

supervisão ou sancionatórios, determinem qualquer obrigação ou proibição (artigo

61.º dos Estatutos da ERS).

165. Finalizando, o prestador não aduziu argumentos novos e/ou relevantes em sede de

audiência de interessados.

166. Assim se concluindo, pois, que a pronúncia do prestador não altera o conteúdo do

projeto de deliberação elaborado, razão pela qual a deliberação se deve manter no

sentido do projeto tal como emitido e regularmente notificado.

IV.4 Análise dos fundamentos da pronúncia da reclamante

167. Cumpre analisar os elementos invocados na pronúncia da reclamante aferindo da

suscetibilidade dos mesmos infirmarem ou alterarem a deliberação projetada.

168. As declarações prestadas foram consideradas e ponderadas pela ERS.

169. Da análise do teor do mesmo resulta que não só a reclamante não refuta o vertido

no projeto de deliberação da ERS, como confirma e reitera o teor da reclamação

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original, cuja análise por parte da ERS gerou as considerações expendidas no

sobredito projeto de deliberação.

170. Por outro lado, não são aduzidos argumentos novos e/ou relevantes.

171. Concluindo, a pronúncia da reclamante não altera o conteúdo do projeto de

deliberação elaborado, razão pela qual a deliberação se deve manter no sentido do

projeto tal como emitido e regularmente notificado.

V. DECISÃO

172. Tudo visto e ponderado, o Conselho de Administração da ERS delibera, nos termos

e para os efeitos do preceituado na alínea a) do artigo 24.º e das alíneas a) e b) do

artigo 19.º dos Estatutos da ERS, aprovados pelo Decreto-Lei n.º 126/2014, de 22 de

agosto, emitir uma instrução ao Hospital Senhora Oliveira – Hospital de Guimarães,

E.P.E. nos seguintes termos:

a) O Hospital Senhora Oliveira – Hospital de Guimarães, E.P.E. deve garantir, em

permanência, o direito de acompanhamento do utente dos serviços de saúde, de

acordo com as regras e orientações a cada momento aplicáveis, designadamente,

de acordo com a Lei n.º 15/2014, de 21 de março;

b) O Hospital Senhora Oliveira – Hospital de Guimarães, E.P.E. deve proceder à

alteração e/ou revisão das suas normas e procedimentos internos (nomeadamente,

os documentos “Identificação dos Acompanhantes no Serviço de Urgência (SU)”,

“Procedimento Específico do Serviço de Urgência – Informação aos

Acompanhantes” e “Regulamento do Serviço de Urgência”) em matéria de direito ao

acompanhamento, por forma a que estes passem a respeitar, na íntegra, o

estipulado no artigo 12.º e seguintes da Lei n.º 15/2014, de 21 de março;

b) O Hospital Senhora Oliveira – Hospital de Guimarães, E.P.E. deve garantir que

todo e qualquer procedimento por si adotado seja capaz de promover, junto de

todos os utentes, a informação completa, verdadeira e inteligível sobre todos os

aspetos relativos ao direito de acompanhamento do utente dos serviços de saúde,

para o efeito devendo, designadamente, afixar informação relevante, em local

acessível aos utentes, sobre o direito de acompanhamento do utente dos serviços

de saúde;

c) O Hospital Senhora Oliveira – Hospital de Guimarães, E.P.E. deve garantir, em

permanência, através da emissão e divulgação de ordens e orientações claras e

33 Mod.016_01

precisas, que os procedimentos a adotar para cumprimento da instrução sejam

corretamente seguidos e respeitados por todos profissionais de saúde;

d) O Hospital Senhora Oliveira – Hospital de Guimarães, E.P.E. deve dar

cumprimento imediato à presente instrução, bem como dar conhecimento à ERS,

no prazo máximo de 30 dias após a notificação da presente deliberação, dos

procedimentos, medidas e auditorias adotados quer para cumprimento da presente

instrução.

173. A instrução ora emitida constitui decisão da ERS, sendo que a alínea b) do n.º 1 do

artigo 61.º dos Estatutos da ERS, aprovados em anexo ao Decreto-Lei n.º 126/2014,

de 22 de agosto, configura como contraordenação punível in casu com coima de €

1000,00 a € 44 891,81, “[….] o desrespeito de norma ou de decisão da ERS que, no

exercício dos seus poderes regulamentares, de supervisão ou sancionatórios

determinem qualquer obrigação ou proibição, previstos nos artigos 14.º, 16.º, 17.º,

19.º, 20.º, 22.º, 23.º ”.

174. Mais delibera o Conselho de Administração da ERS, nos termos e para os efeitos do

preceituado na alínea b) do artigo 19.º dos Estatutos da ERS, aprovados pelo

Decreto-Lei n.º 126/2014, de 22 de agosto, proceder à apensação do presente

processo de inquérito ao processo de monitorização n.º PMT/001/2016, para garantia

de que a atuação do Hospital Senhora Oliveira – Hospital de Guimarães, E.P.E. se

coaduna com o quadro legal supra apresentado no que se refere à efetivação do

direito dos utentes do acompanhamento, nomeadamente, no âmbito do seu Serviço

de Urgência.

175. A versão não confidencial da presente deliberação será publicitada no sítio oficial da

Entidade Reguladora da Saúde na Internet.

O Conselho de Administração.

11 de abril de 2016.