desafios do mundo do trabalho no centro e periferia · fazem parte de um mercado produtivo como...
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Desafios do Mundo do Trabalho no Século XXI e a EJA.
Challenges to the World of Work in the XXI Century and
adult education.
¹ Prof. Lucimar Bordignon
CEEBJA – Profª Maria Deon de Lira
² Prof. Sandro Marlus Wambier
Universidade Federal do Paraná - UFPR
Resumo
Este trabalho busca discutir a organização da sociedade em que estamos
inseridos, a qual se caracteriza pela constante dinâmica em sua estrutura
econômica, política e social, bem como as transformações e os desafios
impostos ao mundo do trabalho, à medida que essa sociedade vai se
estruturando. O método utilizado é o da pesquisa-ação e visa estabelecer uma
análise mais abrangente dessa dinâmica na atualidade, a partir de três ações
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¹ Prof. da Rede de Ensino Público do Paraná e participante do Programa de Desenvolvimento da Educação – PDE, no período de 2008/2009.² Prof. da Universidade Federal do Paraná e orientador deste trabalho.
principais, conforme Stringer (1996): “Pesquisar e observar para reunir as
informações e construir um cenário; pensar, para explorar, analisar e
interpretar os fatos; e agir, implementando e avaliando as ações.” Para isso, a
necessidade de se resgatar aspectos das transformações ocorridas no seio do
mundo do trabalho, desde as mais remotas civilizações até os dias atuais. O
trabalho sempre foi a referência essencial e necessária no processo de
estruturação das sociedades e o meio indispensável para a sobrevivência das
mesmas. Porém, a partir da consolidação do modo de produção capitalista,
quando a força de trabalho passa a ser encarada como valor de troca, quando
a precarização, informalidade e lumpenização tornam-se práticas constantes e
com a evolução da técnica principalmente, essa força de trabalho vai sofrendo
um profundo processo de degradação, favorecendo a estruturação de um
modelo de organização produtiva onde a força de trabalho torna-se
praticamente descartável, ou seja, não deixa de existir, porém, perde seu
caráter essencial e imprescindível e vai gradativamente sendo substituída pela
tecnologia. Compreender esse processo é criar a possibilidade de desmistificar
o modo como os homens reais produzem suas condições reais de existência, a
forma como produzem e reproduzem as relações que estabelecem entre si e
com a natureza. Os homens, neste contexto, distinguem-se uns dos outros,
pelo fato de possuírem ou não a propriedade dos meios de produção. É a
propriedade ou não, dos meios de produção, que determina a classe social a
que pertencem e consequentemente sua luta, posição política e ideológica.
Palavras-chave: mundo do trabalho, valor de troca, precarização, degradação,
informalidade, lumpenização, meio de produção, ideologia.
Summary
This article discusses the organization of society in which we operate,
which is characterized by constant dynamic in its economic structure, political
and social as well as the changes and challenges the world of work, as the
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company is expanding. The method used is that of action research and aims to
establish a more comprehensive analysis of this dynamic in the news, from
three main actions, as Stringer (1996): "Search and look to gather information
and build a scenario, think, explore, analyze and interpret the facts, and act,
implementing and evaluating stocks." Therefore, the need to rescue aspects of
the changes occurring within the world of work, from the most remote
civilizations to the present day. The work has always been the essential and
necessary in the process of structuring and corporate means necessary to their
survival, however, from the consolidation of the capitalist mode of production,
when the workforce is now seen as an exchange value, when the uncertainty,
informality and lumpenization become constant practices and developments in
technology especially, this workforce is undergoing a profound process of
degradation, favoring the structuring of a model of productive organization
where the work force becomes practically disposable, that is, it still exists,
however, loses its essential and vital and is gradually being replaced by
technology. Understanding this process is to create the opportunity to demystify
how real men produce their real conditions of existence, the way they produce
and reproduce the relations they establish with each other and with nature. The
men in this respect, they differ from each other, because they own the property
of the means of production. Is the property or not, the means of production,
which determines the social class they belong to and hence their struggle, the
political and ideological.
Keywords: world of work, exchange value, impoverishment, degradation,
informality, lumpenization, means of production, ideology.
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1 Introdução
Os trabalhadores produzem riqueza, mas não usufruem dela,
aumentam a produção de bens, mas não podem consumi-los. Fazem parte de
um mercado produtivo como força de trabalho manual, precarizada e embora
sendo produtores de riqueza, são excluídos dos resultados que essa
exploração do trabalho produz. Porém, somente os trabalhadores serão
capazes de “criar um mundo novo, revelar a nova vida, recordar que existe um
limite, uma fronteira para tudo, menos para o sonho humano. Moldar com as
mãos o mundo, revelar com os olhos a vida, recordar nos sonhos aquilo que
virá.”
“O mundo que fotografo é o do trabalho e o dos trabalhadores.”
³ Sebastião Salgado
A história tem demonstrado ao longo do tempo que, as exigências para
o homem contemporâneo são cada vez maiores em termos de uma formação
que lhe permita compreender e atuar na dinamicidade que representa o mundo
do trabalho hoje, não como um mero coadjuvante, mas enquanto sujeito
político e produtivo em conformidade com suas necessidades de sobrevivência.
É nesse contexto que se coloca a importância da apropriação do
conhecimento. Um saber que vise não somente o desenvolvimento de
habilidades e competências, mas que considere o homem em todas as suas
possibilidades, em sua totalidade.
E é este conhecimento, tão importante nos dias de hoje, que passa a ser
visto como instrumento essencial e necessário no processo de transformação
da sociedade. Na criação de meios favoráveis à luta para a construção da
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³ Sebastião Ribeiro Salgado é um fotógrafo brasileiro reconhecido mundialmente por seu estilo único de fotografar. Nascido em Minas Gerais, é um dos mais respeitados fotojornalistas da atualidade.
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hegemonia das classes trabalhadoras e na formação da consciência política
dessas classes, transformando-se dessa forma, em instrumento de
contestação e atuação por parte dos trabalhadores na sociedade onde vivem
contribuindo na construção de um projeto de sociedade menos desigual.
1.1 As Relações de Trabalho na História
Na história da humanidade as relações de trabalho atingiram os mais
variados estágios de organização e estruturação, desde as primitivas,
escravistas, servis, etc., até atingir o estágio atual, onde predominam as
relações capitalistas ou assalariadas de produção. Em todos eles, com raras
exceções, sempre se observou a exploração intensiva da força de trabalho.
Mais especificamente no modo capitalista de produção, esta exploração tem se
dado de uma forma cruel e intensiva, como nunca se observou na história das
relações de trabalho. Neste modelo de organização econômica, o trabalhador
vende sua força de trabalho de acordo com as condições do mercado. A força
de trabalho passa a ser utilizada como valor de troca. Prática esta intensificada
com o advento da evolução tecnológica a qual propiciou, ainda mais, acúmulo
de capital por uma minoria que, em nome da valorização do capital, tem
contribuído para degradar as relações sociais, submetendo a força de trabalho
a condições precárias de trabalho e de subsistência e também acelerado o
processo de degradação ambiental.
“... a utilização predatória do meio ambiente nunca foi tão dramaticamente verificada e, ao mesmo tempo, tão alertada e tão deliberadamente desrespeitada, como provam, entre os principais países poluidores, os EUA. À ampliação das fontes e canais informativos entre agentes de decisão, seguiu-se, desastrosamente, uma imensa concentração de poder e seu uso unilateral por interesses governamentais bélicos atendendo, ademais à sanha de grupos anônimos de especuladores financeiros, cuja capacidade de manipulação de capital lhes permite alterar o destino das nações.Frente a essa concentração de poder e de riquezas, não se tem notícia, pelo menos nos ‘períodos de paz’, de tantas e tamanhas atrocidades contra a natureza humana, como as que presenciamos atualmente: a crescente quantidade de pessoas vivendo abaixo da linha da miséria no mundo não é mais um fato isolado de países molestados pelas últimas guerras coloniais, mas se apresenta nas estatísticas das grandes potências, cujas classes, em todos os níveis sociais, têm assistido a conflitos,
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contravenções e atos de violência num grau de perversidade ainda não compreensível.” (PINTO, Geraldo Augusto. p.08)
No capitalismo, como bem observou Marx, a força de trabalho foi
transformada em uma mercadoria e o processo de acumulação de capital
ocorreu paralelamente à intensificação da exploração sofrida pelo trabalhador e
ao intenso uso de tecnologia de ponta. É importante salientar, no que se refere
especificamente ao uso de recursos tecnológicos que, as tecnologias que
circulam o mundo não são homogêneas e de última geração. Os países de
terceiro mundo têm acesso a tecnologias obsoletas ou semi-obsoletas, já
abandonadas pelas nações que possuem uma posição predominante na
divisão internacional do trabalho no planeta. Esse movimento se explica
através de um processo complexo, dialético e contraditório entre a produção e
a circulação das mercadorias. Mészáros em “Para Além do Capital” afirma que
o modo de produção capitalista apresenta uma tendência de reduzir
drasticamente as práticas produtivas voltadas para a durabilidade das
mercadorias produzidas.
“Desse modo, a sociedade se mantém como um sistema produtivo manipulando até mesmo a aquisição dos chamados ‘bens de consumo duráveis’ que necessariamente são lançados ao lixo (ou enviados a gigantescos ferros-velhos, como os ‘cemitérios de automóveis’ etc.) muito antes de esgotada a vida útil.” (MÉSZÁROS, 2002, p. 640).
Ao proletário, não detentor dos meios de produção, impõe-se a condição
de vender a sua força de trabalho como meio de garantir a sua sobrevivência e
como fonte geradora de lucro, atendendo aos interesses do capital. Sua mão-
de-obra transforma-se em mercadoria como qualquer outro artigo do comércio
e, portanto, está igualmente sujeita a todas as vicissitudes da concorrência, a
todas as flutuações do mercado.
Diante desse quadro onde se vislumbra um acelerado processo de
produção e acumulação de capital e uma intensa exploração e degradação da
força de trabalho, uma análise interressante a ser feita, refere-se à relação
entre o trabalho e o tempo livre do trabalhador. Na atualidade, a grande
preocupação consiste em "estar empregado" (ainda mais depois deste quadro
de demissões mundiais devido à crise de recessão ou diminuição da meta de
crescimento de alguns países) e pouco se fala/reflete sobre a relação do
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trabalhador com o ócio no sistema capitalista - tornando-se quase um tabu tal
questão. Aos detentores do capital, na maioria das vezes, a preocupação com
a saúde física e mental da força de trabalho é relegada a segundo plano.
Estabelece-se como prioridade a intensificação da produção, ora aumentando
a jornada de trabalho, ora mantendo a jornada, porém, intensificando a
produção. Vislumbrado esse quadro, cabem algumas questões: Como criar a
possibilidade do tempo livre numa sociedade em que este é gerido pelo
capital? Existe alguma saída no sentido de mudar esta situação de modo que o
trabalhador possa usufruir de condição favorável de lazer e com isso melhorar
sua condição de vida? Estariam dispostos, os donos do capital, a discutir estas
questões intrigantes da contemporaneidade? E mais, melhorar as condições de
lazer influenciaria numa melhora significativa da produção? Estas são questões
que devem nos intrigar e acima de tudo, nos fazer refletir sobre e buscar
soluções para esse que se constitui num grave problema que a humanidade
enfrenta em virtude das imposições do capital.
Problematizar estas e outras questões no que se refere às atividades
produtivas dentro da esfera atual da nossa sociedade, constitui-se numa
excelente ferramenta para a criação de conceitos que transformem a própria
posição/atitude de nossos estudantes diante das relações de trabalho.
Problematizar estas e outras situações possibilita um contato mais crítico do (a)
educando (a) com a lógica do trabalho, mesmo quando ainda se encontra fora
da rotina que envolve o mercado. Permite, também, uma prévia concepção,
mais realista, das relações de trabalho, podendo transformar a preparação de
cada um para o mercado e até mesmo levá-lo (a) a pensar e repensar novos
rumos para sua preparação/formação intelectual. Abolindo-se, também, a idéia
de uma formação exclusivamente voltada para o mercado de trabalho de
acordo com a lógica do capital. Criando a possibilidade de formação de uma
força de trabalho não enquadrada somente nas perspectivas do sistema, mas
com potencial para redirecionar os rumos da sociedade onde vive buscando
uma condição menos desigual, para além da igualdade jurídica, ou seja, uma
igualdade substantiva, material, voltada para a emancipação do trabalho.
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2 O Mundo do Trabalho no Centro e na Periferia
É interessante se observar como a compreensão sobre o mundo do
trabalho vem sofrendo alterações no decorrer da história. Fazer uma análise
das relações impostas pelo mundo do trabalho e dos desafios em relação ao
mesmo no século XXI constitui-se numa tarefa, deveras, complexa visto que
muitas são as teorias que tentam dar conta de explicar essa problemática que
se intensifica no pós Revolução Industrial, porém, nem sempre com a clareza
necessária. Dentre essas correntes de pensamento merecem destaque as
ideias de Hegel e Marx em virtude de seus posicionamentos completamente
diferenciados em relação ao assunto. O idealismo hegeliano remete a uma
compreensão da história do mundo do trabalho vista não somente como uma
mera sucessão de fatos, mas sim, como uma análise da consciência adquirida
pelas ações humanas, é a partir das ações que se estabelece a consciência,
ou seja, a constituição do mundo ideal que vai sendo construído na ação. Já
Marx aponta com mais objetividade a ideia de que as relações de trabalho
construídas historicamente são relações de exploração de dominantes sobre
dominados, onde o trabalhador, dominado, é quem cria, a partir da exploração
de sua força de trabalho, uma possibilidade de lucro ao dominante, mas que
não usufrui desse lucro.
Tomando por base a visão marxista como referencial, destaca-se
também a possibilidade de se fazer uma análise do trabalho a partir da relação
centro e periferia capitalista. Utilizando-se a categoria – luta de classes como
conceito norteador, cria-se a possibilidade de análise partindo-se do
pressuposto de que, nos países pobres ou periféricos, a exploração da força de
trabalho esteve no passado e está no presente, direcionada a atender os
interesses de lucro do capital externo, a partir da intensificação da exploração
dessa força de trabalho. Nos países ricos ou centrais, o objetivo principal é
atingir a maior produtividade possível, com o menor custo possível, ou seja,
emprego de alta tecnologia, com produção acelerada e utilização de mão-de-
obra em escala cada vez menor. Nesses países, o “palco de guerra” entre
capital e força de trabalho tende mais a uma difícil luta de trincheiras e de
posições do que uma batalha de movimentos e ofensivas relâmpagos. A
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combinação encontrada atualmente nos EUA – redução dos postos de trabalho
no setor produtivo, aumento do emprego de trabalho simples no setor de
distribuição e serviços, elevada taxa de desemprego e aumento da intensidade
do trabalho – deve ser tomada enquanto tendência para décadas. No centro
capitalista, desemprego e subemprego avançam formando pólos de pobreza.
Nos EUA, nos setores de agricultura, pesca e reflorestamento, para se ter uma
idéia, 24% da força de trabalho empregada é constituída por imigrantes ilegais,
trabalhadores desprovidos de qualquer sistema de proteção e seguridade. Na
Europa, os índices de desemprego insistem em manter-se elevados, pondo em
xeque um histórico, e até recente, modelo de pleno emprego, e expondo
elementos crescentemente reveladores da pauperização.
István Mészáros em sua obra “Para Além do Capital” sugere a
elaboração de uma teoria de transição quando se propõe a analisar a crise
estrutural do sistema de capital, teoria que deveria encabeçar, segundo ele,
toda a agenda teórica do marxismo para o nosso tempo.
“Uma tarefa desafiadora, pois vários são os aportes para a formulação de uma pauta investigativa: a crescente dicotomia entre a riqueza da produção (meios de produção e capacidade de trabalho) e a produção da riqueza enquanto valorização do capital; produção que leva à alienação do trabalho humano e ao fetiche do capital materializado no valor de troca. Desperdício consumista do centro capitalista que além do consumo de bens e serviços, incorporou a subutilização dos meios de produção e da força de trabalho.” (MÉSZÁROS, 2002).
O que se percebe hoje, com a crise estrutural do sistema de capital, não
é somente essa realidade periférica sendo afetada, há também o surgimento
de focos de grandes desigualdades em países ricos, os quais se viam ou se
consideravam inatingíveis até bem pouco tempo atrás. Destacam-se aí os
casos dos Estados Unidos e de alguns países europeus. Esses países sempre
se colocaram acima do bem e do mal em relação às demais economias
mundiais, ditando as regras da política-econômica mundial e submetendo os
demais à condição de meras colônias, obrigando-os a exercer o papel de
complemento de suas economias. No entanto, o que se observa, é que os
países ricos, ou melhor, as economias de centro em geral, passam por um
momento de crise e de insegurança extremamente delicados. As oscilações
políticas e econômicas do sistema capitalista muito têm contribuído para que o
mundo do trabalho, nesses países, passe por um dos piores momentos de sua
história. São criadas expectativas negativas de que toda e qualquer
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conseqüência dessas oscilações do mercado devam recair sobre a força de
trabalho, ou seja, sobre aqueles que vivem do trabalho, afetando
significativamente sua condição humana enquanto produtores e consumidores
de riqueza.. O sistema capitalista, desde sua gênese até os dias atuais, quando
atingiu seu grau máximo de acumulação e exploração com a consolidação dos
monopólios, proporciona esse tipo de prática, ou seja, ao mesmo tempo em
que produz riquezas, também produz exclusão e insegurança, e isso afeta não
somente a força de trabalho dos países periféricos, mas também dos países
centrais.
Para se compreender de uma forma mais abrangente as contradições
que permeiam o mundo do trabalho a nível mundial, por mais despretenciosa e
simples que possa parecer uma análise nesse sentido, faz-se necessário
observar alguns aspectos que demonstram as situações específicas da China e
dos EUA na atualidade. Esses países bem representam as contradições
vivenciadas pelo capitalismo no século XXI. A abertura da China ao capitalismo
resultou em transformações profundas na economia, na política e na cultura
daquele país. Intensificou-se as relações voltadas para o processo de produção
e acumulação de capital, trazendo como consequência uma exploração
exagerada de sua força de trabalho. Já nos EUA, foram quase U$ 500 bilhões
em gastos correntes e logísticos em armamentos somente no ano de 2008,
gastos que não geraram melhorias nas condições de vida dos trabalhadores,
constituindo-se nas mais avançadas forças produtivas mobilizadas para a
geração de forças crescentemente destrutivas. O que se percebe, nos dois
casos abordados, é que os interesses do capital estão acima de qualquer outra
possibilidade, ou seja, o lucro é o que move os objetivos do capital
transformando-se num verdadeiro vilão anti-humanista.
2.1 Trabalho e Mais-valia
Um outro referencial que precisa ser observado com atenção devido às
implicações e presença constante e crescente tanto no centro quanto na
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periferia capitalista, é a questão da 4mais-valia. No centro, considerando o
aumento da jornada de trabalho, ela se manifesta basicamente de duas
maneiras: uma delas ligada ao aumento do exército industrial de reserva de
mão-de-obra e a outra, através da flexibilização da legislação trabalhista. Neste
último caso, o que se percebe é que foram abortados os processos de
regulação das relações jurídicas de trabalho, particularmente em relação à
estabilidade e à jornada de trabalho, ou seja, flexibilizaram-se as legislações
para facilitar a atuação do capital de uma forma mais contundente,
desrespeitando as condições mínimas de trabalho e ampliando as
possibilidades de lucro. Vale ressaltar que, tanto nos EUA quanto na Europa,
áreas do capitalismo com características semelhantes em muitos aspectos, a
média de horas de trabalho vem aumentando gradativamente ano a ano,
atingindo todo tipo de assalariado e nem sempre significando aumento nos
ganhos dos trabalhadores e melhorias nas suas condições de vida e trabalho.
Na periferia, há a ocorrência da mais-valia a partir do aumento da
jornada de trabalho; flexibilização da legislação trabalhista; burocracia de
Estado associada ao capital; existência de uma extraordinária superpopulação
relativa de tipo latente (Marx) - são centenas de milhões de camponeses à
disposição para o assalariamento (êxodo rural) e também através da
desorganização da estrutura sindical. Essa imensa massa de trabalhadores
das regiões periféricas encontra-se à margem do sistema produtivo, não
somente através de uma exclusão vazia e superficial, a da chamada
“cidadania” (burguesa), mas também e principalmente, através de uma
exclusão sistêmica, ou seja, excluídos como consumidores dos meios de
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4A mais-valia é uma categoria marxiana que explica os modos de apropriação do produto do trabalho humano: “A mais-valia produzida pelo prolongamento da jornada de trabalho chamo de mais-valia absoluta; a mais-valia que, ao contrário, decorre da redução do tempo de trabalho e da correspondente mudança de proporção entre os dois componentes da jornada de trabalho chamo de mais-valia relativa.” (MARX, 1985, p.251).
subsistência necessários e como produtores, como realizadores de trabalho.
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Esse aumento do número de horas trabalhadas ou, a manutenção da
jornada, porém, com aumento da produtividade, tem se constituído numa
contradição vivenciada pela força de trabalho tanto no centro quanto na
periferia capitalista, visto que em nenhum dos casos, o aumento da jornada ou
da produtividade, tem representado ganhos reais para a força de trabalho.
A ofensiva do capital sobre o trabalho está sendo capaz de elevar a
extração de trabalho excedente através da ampliação média da jornada de
trabalho, quase sempre sem alteração do montante despendido em capital
variável (mais-valia absoluta).
“(...) verificamos que as magnitudes relativas do preço da força de trabalho e da mais-valia, são determinadas por três circunstâncias: 1) a duração do trabalho ou a magnitude extensiva do trabalho; 2) a intensidade normal do trabalho ou a sua magnitude intensiva, segundo a qual dada quantidade de trabalho é despendida em determinado espaço de tempo; 3) finalmente, a produtividade do trabalho, segundo a qual a mesma quantidade de trabalho fornece no mesmo tempo uma quantidade maior ou menor de produto, dependendo do grau de desenvolvimento das condições de produção.” (MARX, 1994, p.596).
A intensificação dessas contradições tem se manifestado, no sentido
mais amplo do modo de produção capitalista, como crise estrutural. Essa crise
estrutural ocorre em virtude de um controle cada vez maior do capital sobre o
trabalho, estabelecendo relações cada vez menos sujeitas às mediações do
Estado e políticas públicas (livre negociação). O que se percebe é que o
processo de valorização do capital é cada vez mais dependente dos elementos
extra-econômicos, favoráveis à acumulação e mediadores de contradições
internas ao modo de produção capitalista.
3 Educação e Trabalho
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E quanto ao sistema educacional, o que esperar dele nesse
emaranhado de contradições do século XXI? É importante ressaltar que, no
contexto das imposições capitalistas, ele tem passado por muitas
transformações ao longo do tempo, acompanhando, infelizmente, os interesses
de uma minoria, representantes da classe hegemônica detentora do capital.
Sempre esteve mais preocupado em legitimar o domínio e o poder desta
classe, criando as condições para a estruturação e consolidação do poder da
mesma. Já para as massas, tem reservado as mazelas, úteis para a
constituição de uma mão-de-obra barata e descartável, submetida às
imposições de um sistema de rapina e que, diante dessa situação, infelizmente,
se coloca sem perspectivas de uma guinada expressiva em sua estrutura, pelo
menos a curto e médio prazo.
Diagnosticado esse quadro, constata-se que é preciso uma retomada
urgente das diretrizes educacionais, onde a educação dê mais crédito a si,
como um pilar importante, não o único, no processo de reestruturação da
sociedade e principalmente nas discussões que envolvam o mundo do
trabalho. E o que é mais significativo, deixe de ser a legitimadora do poder da
elite e se transforme, de vez, no sustentáculo ideológico responsável por uma
maior qualificação e valorização da força de trabalho; observando, analisando,
apontando e criando perspectivas para que uma transformação possível e de
fato efetivamente se concretize. Ela precisa ser emancipadora e realizar-se na
totalidade, sem a preocupação em desenvolver competências e habilidades
nos trabalhadores, de modo a atender às necessidades e objetivos de um
sistema econômico preocupado somente em satisfazer seus desejos mais
perversos e excludentes – o lucro a qualquer custo.
“O processo educativo, escolar ou não, é reduzido à função de produzir um conjunto de habilidades intelectuais, desenvolvimento de determinadas atitudes, transmissão de um determinado volume de conhecimentos que funcionam como geradores de capacidade de trabalho e, consequentemente, de produção [...]. A educação passa, então, a constituir-se num dos fatores fundamentais para explicar economicamente as diferenças de capacidade de trabalho e, consequentemente, as diferenças de produtividade e de renda.” (FRIGOTTO, 1989, p.41).
Os educadores precisam perceber que fazem uma grande diferença
nessa transformação tão esperada pela sociedade. Criar a possibilidade de
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reverter à situação de domínio do saber teórico sobre o prático, porém,
lembrando sempre que o saber prático por si só não basta, é necessário uma
inter-relação entre os saberes para que se crie bases sólidas para um efetivo
processo de mudança na sociedade, tornando-a menos desigual. Ao
trabalhador, deve ser reservado o direito de usufruir do saber teórico e à
sociedade em geral, valorizar o saber prático produzido pelos trabalhadores.
Neste momento da história da humanidade, quando as novas tecnologias
da informação e da produção estabelecem os rumos da sociedade global, é
preciso criar possibilidades de qualificação real da força de trabalho, para que
ela possa se inserir num mercado cada vez mais competitivo em virtude da
corrida tecnológica. Essa maior qualificação acarretará na possibilidade de uma
melhor remuneração e em contrapartida, numa melhora da condição de vida do
trabalhador. Nesse contexto, o papel da escola precisa ser repensado de modo
a intervir nesse necessário processo de mudança. A estrutura da escola até
então, tem desempenhado a seguinte função: propicia qualificação ao rico e
este por sua vez exerce atividades de controle, de poder, ditando as regras
sociais. Já o pobre, trabalhador, como não tem possibilidade de uma
qualificação condizente com sua real necessidade, até pela sua própria
condição econômica que o leva a ingressar precocemente no mercado de
trabalho, é obrigado a submeter-se à ordem estabelecida. Trabalhar muito
(muitas horas), receber pouco, sem usufruir daquilo que ele próprio produz. É
mais que necessário, é imprescindível e urgente uma mudança de rumo se
quisermos uma sociedade menos desigual.
Convém ressaltar que, para esse contingente de trabalhadores,
sabidamente excluídos do processo de escolarização formal, a única
alternativa de apropriação do saber sobre o trabalho, de forma sistematizada,
em sua dimensão de totalidade, é a escola, apesar de seus limites. Configura-
se, deste modo, a necessidade premente de se propor formas de educação
para o ensino desse contingente de trabalhadores que já foi ou está sendo
absorvido pelo processo produtivo, bem como daqueles que sequer
conseguem nele ingressar. Esta premência se evidencia ao considerar-se que,
aproximadamente 85% deles não têm acesso à formação profissional e 92% da
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população economicamente ativa ocupada, tem acesso apenas à prática do
trabalho e não ao saber sobre o trabalho. A educação do trabalhador constitui-
se em um imenso espaço vazio que não tem sido assumido efetivamente nem
pelo sistema de ensino, nem pelo Sistema Nacional de Formação de força de
trabalho. Resta saber como avançar concretamente, a partir da construção de
um Projeto Político Pedagógico comprometido com a educação do trabalhador
no processo de construçao de sua hegemonia. Esta é a proposta que tem
norteado as pesquisas, os debates e as práticas de um grupo de educadores
brasileiros que têm se dedicado à linha de investigação que se convencionou
chamar de Educação e Trabalho - 5Acacia Kuenzer.
Sendo as Relações de Trabalho um dos conteúdos estruturantes
propostos pela SEED no Ensino Médio e diante das evidentes dificuldades de
escolarização de grande parte dessa força de trabalho, faz-se necessário um
olhar mais comprometido em relação ao uso dos recursos da História Oral
como objeto de investigação e teorização. É importante valorizar o
conhecimento que este aluno-trabalhador trás para dentro da sala de aula,
podendo o mesmo ser usado como um ponto de partida para, posteriormente,
se introduzir o conhecimento formal. Resgatar esse tipo de saber é criar a
possibilidade de valorizar, de re-inserir essa grande parcela da sociedade que
durante muito tempo tem ficado de fora do processo educativo. A partir de
entrevistas, depoimentos, relatos de experiências dos trabalhadores, torna-se
possível uma reflexão mais abrangente e profunda sobre as questões que
envolvem o mundo do trabalho, o trabalhador e a sua relação no mercado.
Introduzir referenciais bibliográficos e relacioná-los ao cotidiano do aluno-
trabalhador é uma forma de aproximar o conhecimento formal do prático,
utilizando o trabalho como princípio e o mundo do trabalho como meio,
tornando sua articulação possível.
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5Acacia Zeneida Kuenzer é professora titular da Universidade Federal do Paraná. Tem experiência na área de Educação, com ênfase em Educação e trabalho, educação tecnológica, formação de professores e ensino médio.
3.1 Práticas Possíveis na Implementação
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Um exemplo concreto desse tipo de atividade e que fez parte das
diversas práticas utilizadas durante o processo de implementação desse
projeto na escola, foi a utilização do Mito de Sísifo. Este mito apresenta o
trabalho como castigo para os gregos antigos e sua utilização como referencial
torna-se muito interessante à medida que oferece a oportunidade de análise do
mito em si e sua comparação com a situação real vivenciada pelos alunos-
trabalhadores.
Tendo como objetivo problematizar a função que os alunos
desempenham em relação ao mundo do trabalho, a leitura e análise do referido
mito, viabilizou um processo de discussão a respeito dessa problemática e
possibilitou uma reflexão crítica mais profunda dos mesmos a esse respeito.
Questões como: - O que vai definir que um trabalho seja mais bem visto que
outros? Nascemos pré-determinados a ocupar posições sociais pré-definidas
no mundo do trabalho? - surgiram nas discussões. Por meio desse trabalho
reflexivo dos alunos e de suas respostas, que nem sempre foram as
esperadas, visto que alguns ainda acreditavam que as posições no mundo do
trabalho eram previamente definidas e de certa forma imutáveis, conseguiu-se,
apesar das dificuldades, pensar e repensar algumas questões pertinentes ao
mundo do trabalho.
Foi interessante perceber que, apesar de todas as dificuldades de
acesso às informações que os alunos-trabalhadores enfrentam e também
devido às ameaças sofridas por eles, de acordo com relatos deles próprios, nos
locais onde desenvolvem suas atividades profissionais, foi possível detectar
conclusivamente que suas posições dentro da hierarquia trabalhista podem ser
transformadas.
É importante se ter claro que, encaminhar discussões mais concretas a
respeito das questões pertinentes ao mundo do trabalho a partir de relatos das
experiências dos próprios alunos-trabalhadores, pode trazer resultados
significativos. É interessante selecionar partes destes relatos e editá-los como
textos a serem analisados em sala, objetivando uma melhor assimilação e
compreensão dos conteúdos relacionados ao tema que se está querendo
abordar. Essas falas servem de referenciais e de elementos relevantes na
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percepção dos fatos do presente, possibilitando ao aluno o estabelecimento de
discussões pautadas em questões relacionadas ao mundo capitalista, tais
como: a globalização, terceirizações, enfim, o chamado processo de produção
flexível ao qual estão inseridos e assim, problematizando toda a complexidade
do mundo do trabalho, sentindo-o bem próximo, pois a sua realidade, o seu
cotidiano é a referência, onde os próprios trabalhadores fazem observações e
atribuem significados a essa dinâmica que é característica do mundo do
trabalho contemporâneo.
Essa proposta de trabalho investigativo, recurso ainda pouco utilizado
pelos professores, apresenta mais e novas fontes de pesquisa no intuito de
conferir, acrescentar e enriquecer o trabalho e assim, interagir com a realidade
social e, ao mesmo tempo, conduzir à prática de uma pesquisa participativa,
valorizando a construção coletiva do conhecimento. Para melhorar a
capacidade de compreensão e expressão do educando, é função da escola a
elaboração de um projeto político pedagógico coletivo, um currículo reflexivo
com metodologias alternativas, garantindo aos alunos acesso às informações
que permitam a construção do conhecimento. O professor, nesse sentido, tem
um papel fundamental. É ele o articulador, o agente ativo que intervém no
processo educacional.
Nesse sentido, é importante apontar algumas sugestões que podem
estimular uma reflexão mais profunda entre alunos e professores, tendo em
vista uma melhor compreensão do tema proposto.
• Automatismos – novas tecnologias – sociedade da informação e do
conhecimento.
• Competitividade econômica, globalização, desemprego estrutural, exclusão
social.
• Desigualdade social com cortes de gastos com as políticas sociais
• O emprego dependente das capacidades individuais, da adaptação do
indivíduo ao meio e às condições de trabalho oferecidas.
17
• O sucesso como responsabilidade individual.
• A principal característica do sistema de acumulação flexível é a
informatização do processo produtivo. Com a informatização das máquinas o
sistema de supervisão é realizado pela própria máquina, havendo um aumento
de controle sobre a mercadoria e sobre o trabalhador.
• O sistema de acumulação flexível se apóia na flexibilidade das relações de
trabalho, dos produtos e padrões de consumo.
• O sistema de acumulação flexível não está preocupado com o homem, com
sua realização pessoal, mas sim com o lucro.
Diante de todo esse arsenal de informações convém um relato mais
detalhado a respeito do processo de implementação do mesmo. A escola –
CEEBJA Maria Deon de Lira foi onde ocorreu todo o processo de
implementação, tendo como público alvo, jovens e adultos do Ensino Médio,
inseridos ou não no mercado de trabalho.
O processo de implementação inicia-se com a coleta de dados a partir de
relatos e experiências dos alunos, tendo em vista a relação dos mesmos com o
mercado de trabalho e também com o estudo de textos selecionados para a
abordagem da temática. Interessante observar a heterogeneidade de situações
apresentadas pelo grupo em questão, suas histórias, suas experiências e
acima de tudo, suas expectativas em relação à entrada e/ou permanência no
mercado de trabalho.
Chama atenção o fato de que, mesmo sendo alunos da EJA, portanto
adultos, muitos desconhecem completamente questões relevantes ao mercado
de trabalho, como leis trabalhistas, por exemplo.
Outro aspecto que se apresenta de forma clara, é o processo de
exploração a que são obrigados a se submeter, tendo em vista as suas
próprias condições de trabalho. Muito interessante observar as reações dos
mesmos quando confrontados os referenciais teóricos utilizados e a realidade
vivenciada por eles. No início, reações de revolta, insegurança e
posteriormente, a partir de um embasamento teórico mínimo, perspectivas e
18
atitudes de coragem para enfrentamento e auto-estima para discutir a sua
própria condição.
A realização de uma feira de profissões se constituiu num momento
muito importante nesse sentido. Uma atividade dessa envergadura possibilita
aos alunos a oportunidade de expressar os seus sentimentos em relação às
suas atividades profissionais, discutindo e ampliando horizontes no sentido de
resgatar o valor social de seu trabalho e não somente aspectos relacionados
ao valor de troca imposto pelo mercado de trabalho.
Fica evidente que o trabalhador encontra-se subjugado a uma condição
de sistema, onde o que lhe falta efetivamente é o conhecimento para buscar
melhores condições. Uma certeza, o papel do professor assume uma
importância vital nesse processo de construção e resgate da auto-estima do
aluno-trabalhador.
São esses os contornos dramáticos observados no seio do próprio
sistema: sem escolarização não há chances de se inserir; com escolarização
as poucas chances de inserção se dão “por baixo”, através das mais variadas
formas de precariedade (informalidade incentivada, estágio compulsório,
terceirização, etc.).
Nas discussões, foi possível detectar alguns mecanismos de regulação
desse problema, porém, o que se apresenta de uma forma mais contundente,
explícita, é o que se refere ao processo de secundarização da importância da
educação, isso em se tratando de Educação de Jovens e Adultos. Este se dá
na maior parte das vezes via esvaziamento de conteúdos, aligeiramento de
etapas e estreitamento dos objetivos escolares. Em suma, o ganho em
quantidade (maior escolarização) fica prejudicado e anulado pela perda em
qualidade, pois à medida que os objetivos da educação vão se restringindo ao
atendimento das demandas do mercado de trabalho, a conseqüência imediata
é uma escolarização estreita e limitada aos interesses da classe que não
depende dessa educação, uma vez que não vivem do próprio trabalho.
É interessante observar que, apesar de tudo já relatado, o aluno-
trabalhador da EJA, em geral, deposita na escola as suas esperanças e
perspectivas de uma melhora imediata em sua situação profissional. Diante
disso, substitui a possibilidade de uma melhor formação, de longo prazo, por
19
uma formação emergencial, aligeirada e determinada pela lógica capitalista, ou
seja, uma formação que o ajude, o mais depressa possível, a ingressar no
mercado de trabalho, mas que geralmente não oferece a qualificação
necessária para que possa nele se manter.
É sabido que o aligeiramento da formação responde a um anseio, tanto
do aluno-trabalhador, quanto do mercado de trabalho. Isso implica, por
hipótese, numa migração de estudantes do ensino regular para a EJA,
buscando nesta uma formação menos criteriosa e mais rápida.
4 Conclusão
No entanto, nem tudo está perdido. É claro que fatos como os relatados,
ocorreram e ainda ocorrem no seio desta modalidade educacional, porém, o
contrário também é uma realidade presente e marcante e precisa ser
elucidada. Hoje é possível se observar e de forma crescente, a presença de
alunos e professores na EJA, comprometidos com diferentes visões em relação
ao que deve ser entendido como educação dentro desse sistema. E que
diferentes visões seriam essas? Uma educação que não vise à solução
imediata de problemas, visando atender necessidades dos trabalhadores
(emprego imediato) e mão-de-obra barata para o capitalista. Mas sim, a
constituição de uma nova realidade de educação onde a escola e os
educadores estejam mais bem preparados para intervir no processo
educacional e com isso criar as reais condições pra uma melhor qualificação da
força de trabalho.
O trabalhador do século XXI precisa estar ciente de que, com o
desenvolvimento dos sistemas de comércio e produção, a luta pelo controle do
trabalho humano intensificou-se. Os donos do capital concentram cada vez
mais a posse sobre os instrumentos de trabalho, as terras e matérias-primas,
restando aos trabalhadores a venda de seus conhecimentos, experiência e
força de trabalho. Para o trabalhador, a partir de então, somente habilidade e
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competência para executar tarefas não será mais suficiente. As exigências
de precisão nos prazos de entrega e a qualidade dos produtos devido à
concorrência e competição por novos mercados, fará com que a necessidade
de ampliação do conhecimento, envolvido no âmbito da produção, passe a ser
assumido como prioridade estratégica pelos capitalistas empregadores, não
restando outra saída ao trabalhador senão a capacitação/qualificação.
É preciso situar a EJA nos contextos da Educação Geral e das Relações
Sociais decorrentes do modo de produção capitalista. Resgatar e compreender
a importância da EJA dentro do novo cenário criado pela Globalização. Tornar
urgente a necessidade de ultrapassar o processo de secundarizaçao da
importância da educação/conhecimento imposto pelo capital ou mercado e
superar, de uma vez por todas, entraves como: esvaziamento de conteúdos,
aligeiramento de etapas e estreitamento dos objetivos escolares.
Quando a educação se restringe ao atendimento das demandas do
mercado de trabalho, a consequência imediata é uma escolarização estreita e
limitada aos interesses da classe que não depende dessa educação para se
manter no poder. O ganho em quantidade (rápida escolarização) fica
prejudicado e anulado pela perda em qualidade.
Do ponto de vista dos interesses da classe trabalhadora, essa nova
realidade do sistema educacional exige um preparo maior da escola e dos
educadores, no sentido de garantir as condições para uma formação de caráter
emancipador.
Se a construção do ser social depende das mediações sociais próprias
das relações de produção, cabe à escola consolidar o conhecimento através de
mediações culturais que preparem o aluno-trabalhador (no caso da EJA) para a
vida e o trabalho numa perspectiva para além do caráter alienador da
sociedade de classes. É preciso lembrar que a Educação de Jovens e Adultos
é hoje uma realidade no sistema educacional brasileiro. Poderá servir para
reproduzir os interesses da classe dominante ou para democratizar o acesso
ao saber sistematizado.
É importante que cada vez mais se discuta em sala de aula os problemas
enfrentados pelos trabalhadores na sociedade capitalista atual, possibilitando
que os educandos reflitam sobre seu papel enquanto sujeitos e também como
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parte dessa classe trabalhadora, no presente ou no futuro. Através de
questionamentos, debates, enfim, troca de ideias é que podemos caminhar
para a formação de sujeitos mais conscientes de suas realidades e
consequentemente mais bem preparados para enfrentar os desafios do mundo
globalizado. Se a luta é necessária, que tome o trabalho como princípio, a
educação como meio e a felicidade coletiva como o fim último do esforço da
humanidade.
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