dinÂmica demogrÁfica e sua relevÂncia econÔmica e
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DINÂMICA DEMOGRÁFICA E SUA RELEVÂNCIA ECONÔMICA E SOCIAL NO BRASIL:
IMPLICAÇÕES PARA O PROGRAMA UNFPA 2011-2015
18 fevereiro, 2011
(Versão Preliminar)
George Martine José Eustáquio Diniz Alves
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ÍNDICE
1) Introdução .......................................................................................................................2
2) Panorama econômico e político......................................................................................2
3) Panorama Sócio-Demográfico........................................................................................3
a. Fecundidade, Saúde Sexual e Reprodutiva...........................................................5
b. Mudanças na estrutura etária, bônus demográfico e mudanças nos arranjos
familiares.................................................................................................................10
c. Migração, urbanização e desenvolvimento regional...........................................14
4) Panorama social: redução da pobreza e da desigualdade de renda...........................19
a. Pobreza e Desigualdade..........................................................................................19
b. Mercado de trabalho e renda.................................................................................21
c. Crescimento da classe média..................................................................................22
5) A dinâmica demográfica e as desigualdades de gênero no Brasil...............................25
a. Saúde........................................................................................................................25
b. Educação..................................................................................................................29
c. Mercado de trabalho..............................................................................................30
d. Uso do tempo...........................................................................................................35
e. Espaços de poder.....................................................................................................36
6) População, desenvolvimento e ambiente........................................................................37
7) Considerações Finais e Sugestões...................................................................................41
8) BIBLIOGRAFIA.............................................................................................................45
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1) Introdução
O Brasil passou por grandes transformações demográficas, econômicas, sociais, ambientais e culturais
nas últimas décadas. Depois do fracasso da década perdida e do baixo dinamismo da década de 1990, o
país voltou a apresentar crescimento econômico na primeira década do século XXI, desta vez com
redução da pobreza e diminuição das desigualdades sociais. A atual década se inicia com um novo
governo, inserido num contexto favorável, mas que também enfrenta novos e velhos reptos. O objetivo
deste texto é de situar o programa do UNFPA dentro do contexto destas transformações, enfocando os
desafios e as oportunidades que delas decorrem para o terreno de população e desenvolvimento.
O texto começa traçando um breve panorama da economia internacional e de como o Brasil se posiciona
atualmente diante da conjuntura mundial. Em seguida, aborda a dinâmica demográfica – crescimento,
composição e distribuição – assim como suas influências sobre o processo de desenvolvimento. Analisa
a evolução das políticas de saúde sexual e reprodutiva e o quadro de mudanças nas relações de gênero
no país. Apresenta o quadro de redução da pobreza no Brasil e de melhoria do mercado de trabalho.
Discute as principais políticas sociais de proteção social. Trata dos desafios colocados ao meio
ambiente. Apresenta algumas considerações sobre os avanços e desafios para a próxima década, em
especial para o quinquênio 2011-2015.
Por fim, o texto sugere algumas iniciativas para a programação do UNFPA nos próximos quatro anos no
que se refere ao seu diálogo político e às suas ações dentro do contexto dos temas colocados na CIPD do
Cairo, de 1994, e da metas dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio. Em síntese, considera-se que
o Brasil apresenta condições demográficas e econômicas favoráveis para a redução do peso da sua
tradicional pobreza e desigualdade e para melhorar a qualidade de vida das pessoas e a sustentabilidade
ambiental. A compreensão da trajetória dos fenômenos demográficos é crucial para a orientação das
políticas sociais e econômicas que possam contribuir para a contínua elevação dessa qualidade de vida
dos segmentos desfavorecidos da população brasileira.
2) Panorama econômico e político
Depois da crise econômica e social da década perdida (anos 1980) e do baixo crescimento da década de
1990, a economia brasileira voltou a apresentar um ritmo mais acelerado de aumento do PIB na primeira
década do século XXI, particularmente na média dos anos 2004-2010, quando cresceu a 4,5% ao ano. O
novo cenário da economia internacional tende a reduzir as disparidades internacionais de renda entre as
nações. Essa nova dinâmica tem impacto nas taxas de crescimento interna, na reconfiguração da
estrutura produtiva do país e na capacidade do Estado brasileiro de manter suas políticas sociais. Ao
contrário das anteriores, a crise econômica de 2008-2009 teve efeitos diferenciados, atingindo com mais
severidade as economias mais ricas. As projeções para o Brasil são positivas, no que se refere à próxima
década. Do ponto de vista populacional, o país terá, nos próximos anos, as menores taxas de
dependência demográfica da sua história. O desempenho econômico favorável cria sinergia com os
avanços políticos e sociais, possibilitando a superação dos principais entraves ao desenvolvimento
sustentável e inclusivo.
Se, por um lado, as perspectivas econômicas brasileiras geram um otimismo moderado, por outro,
persistem problemas preocupantes relacionados, por exemplo, com a dimensão da dívida interna, as
deficiências de infraestrutura, o peso das desigualdades sociais e as mazelas do processo democrático.
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Paralelamente, o aumento do mercado interno tem atraído capitais externos, o que provoca valorização
cambial e agrava os problemas da chamada “desindustrialização”. Também traz desafios maiores para a
proteção do meio ambiente e da biodiversidade. A persistência de grandes bolsões de pobreza,
conjugado com a persistência de altos níveis de desigualdade, constituem uma obstáculo formidável para
o takeoff do desenvolvimento sustentável. Apesar de avanços recentes, o Brasil ainda tinha 39,6 milhões
de pessoas com renda domiciliar per capita inferior às linhas de pobreza em 2009. Isto é um montante
equivalente a toda população da Argentina. O país também contabilizava 13,5 milhões de pessoas
indigentes, um montante equivalente a toda a população do Equador. Recentemente, celebrou-se, pela
primeira vez, uma redução nos níveis de desigualdade no país, mas o Índice de Gini de 0.543, calculado
em 2009, ainda coloca o Brasil como um dos mais desiguais do mundo. O crescimento econômico só
traz benefícios para o país se vier acompanhado de desenvolvimento social e ambiental, numa
perspectiva de direitos.
A partir de 1994, o Brasil entrou em uma rota de consolidação da democracia com desenvolvimento
econômico e redução da pobreza e das desigualdades sociais. As eleições de 2010 consolidaram os 25
anos de democracia formal do país. Mas, se é inegável que houve melhorias quantitativas na
administração democrática do país, o mesmo não aconteceu em termos qualitativos. Os constantes casos
de corrupção, a multiplicação de partidos sem ideologia ou programa e a consequente rifa de cargos
administrativos essenciais, sem priorização da competência executiva, mostram que o Brasil ainda tem
um longo caminho para aperfeiçoar a democracia. Porém, não resta dúvida de que a atual situação de
estabilidade política e econômica é rara na história do Brasil. A principal promessa do novo governo é
dar prosseguimento ao processo democrático, com ampliação das políticas sociais e erradicação da
pobreza extrema. A consideração das diversas dinâmicas demográficas é crucial no planejamento e na
realização destas propostas.
3) Panorama Sócio-Demográfico
A dimensão, assim como o estagio atual da trajetória de crescimento da população brasileira,
conjuntamente com a sua composição e sua distribuição espacial, representa um trunfo potencial
importante para o país no momento histórico atual. O Brasil é, sem dúvida, um pais grande, não somente
em sua dimensão física e seus recursos naturais, mas também em termos demográficos. O Gráfico 1
mostra que a população brasileira passou de 52 milhões de habitantes em 1950, para 191 milhões em
2010. Ou seja, a população quase quadruplicou em 60 anos, devido à disparidade entre suas Taxas
Brutas de Natalidade (TBN) e suas Taxas Brutas de Mortalidade (TBM).
Na década de 40, o incremento decenal de população era em torno de 10 milhões. No período entre 1970
a 2000, esse número girava em torno de um aumento de 26 milhões de pessoas a cada década. Mas,
entre 2000 e 2010, esse incremento intercensitário diminuiu para 20 milhões de habitantes. Nas
próximas duas décadas, esse número tende a diminuir rapidamente e deve passar a ser negativo a partir
de 2030. A população rural tem diminuído em termos absolutos desde 1970. A população urbana teve,
na última década, o seu crescimento menor desde a década de 70.
As regiões Sudeste, Nordeste e Sul, as três mais populosas, perderam ligeira participação relativa entre
1970 e 2010, enquanto as regiões Norte e Centro-Oeste, as duas com menores densidades demográficas,
ganharam participação relativa. O censo 2010 também mostrou que foram as cidades entre 100 mil e 2
milhões de habitantes que apresentaram os maiores ganhos relativos, enquanto as cidades com menos de
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100 mil habitantes e as megacidades do Rio de Janeiro e São Paulo perderam participação relativa na
população total. Ou seja, detecta-se certa tendência ao reequilíbrio das tendências anteriores marcadas
pela concentração progressiva nas maiores cidades do Sudeste.
Gráfico 1: Evolução da população, por situação de domicílio, e das Taxas Brutas de Natalidade (TBN) e Taxas Brutas de Mortalidade (TBM), Brasil, 1950-2010
Fonte: Censos demográficos do IBGE e UN/ESA. World Population Prospects: The 2008 Revision
Em retrospecto, ainda se discute o peso relativo dos efeitos dinamizadores e das conseqüências
negativas do crescimento demográfico acelerado experimentado durante o século XX. Nesse momento,
entretanto, o que mais interessa é o seguinte:
1) O Brasil é atualmente o quinto maior país do mundo em termos populacionais, o que lhe
proporciona dimensões invejáveis de mercado interno, base tributária, força de trabalho, etc.. Por
outro lado, a persistência de altos níveis de pobreza e desigualdade reduz essa vantagem
potencial;
2) O ritmo de crescimento vegetativo da população total já caiu de maneira extraordinária e deve
ficar negativo a partir de mais duas décadas, devido à rápida queda da fecundidade. No passado,
o crescimento populacional elevado temperava as taxas de crescimento econômico; na corrente
década, porém, a população deve crescer a apenas 0,8% ao ano. Entretanto, a redução da
fecundidade é apenas parte da história: persistem problemas significativos de acesso à saúde
reprodutiva de qualidade para uma parcela significativa da população;
3) A atual fase de maior estabilidade populacional apresenta novos desafios, nos quais a
preocupação com quantidade cede espaço a considerações de composição e qualidade;
4) A estrutura da população por sexo e idade encontra-se atualmente em condições muito
favoráveis. Bem aproveitada essa conjuntura, pode facilitar o takeoff do desenvolvimento, mas a
falta de políticas adequadas para aproveitar esse momento histórico único pode, na realidade, ter
efeitos contrários;
5) O país experimentou um processo de urbanização precoce, acelerado e doloroso. Entretanto,
nesta etapa, o país se encontra numa situação privilegiada frente à maioria dos outros países em
desenvolvimento, os quais estão apenas iniciando sua transição urbana. Entretanto, na prática, as
condições sociais e ambientais urbanas das cidades brasileiras, produto de políticas inadequadas
no passado e no presente, reduzem essa vantagem comparativa.
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Em suma, o país está sendo, pelo menos em potencial, beneficiado de diversas maneiras pelo momento
demográfico. A combinação dessas dinâmicas já foi elemento essencial das melhorias sócio-econômicas
experimentadas pelo país nos últimos anos e poderia representar uma contribuição extraordinária para os
esforços de desenvolvimento atualmente em curso no país. Entretanto, para aproveitar plenamente essas
conjunturas, é necessário entender as dinâmicas em jogo e ajustar algumas políticas estratégicas. Os
próximos segmentos oferecem maiores detalhes a respeito das tendências demográficas e suas interfaces
com processos sócio-econômicos. Também apontam para lacunas remanescentes nas políticas públicas
que obstaculizam o pleno aproveitamento das tendências demográficas.
a. Fecundidade, Reprodução e Políticas de Saúde Sexual e Reprodutiva
As transformações econômicas e sociais ocorridas no Brasil, especialmente durante as décadas 50 e 60
do século XX, provocaram o início de um rápido declínio na Taxa de Fecundidade Total (TFT). O
processo de desenvolvimento foi consubstanciado na urbanização, industrialização, assalariamento em
substituição à economia de subsistência, monetarização da economia, ampliação da cesta de consumo,
redução da pobreza, diminuição da mortalidade infantil, inserção da mulher no mercado de trabalho,
aumento dos níveis de educação formal e maiores exigências de qualificação da força de trabalho. Todos
esses processos estão entre as transformações estruturais que possibilitaram a reversão do fluxo
intergeracional de riqueza e induziram a redução do número médio de filhos por mulher.
Entre as transformações institucionais que contribuíram para a queda das taxas de fecundidade
encontram-se também os seguintes: a ampliação das políticas públicas na área da saúde e da
medicalização da sociedade, a extensão da educação e da previdência (inclusive BPC e aposentadoria
rural), a expansão do crédito, o desenvolvimento das telecomunicações, a ampliação do processo de
secularização, a diversificação dos arranjos domiciliares, o progresso na legislação familiar e as
mudanças nas relações de gênero e o empoderamento das mulheres. Por sua vez, a redução da
fecundidade possibilitou a maior inserção feminina nos níveis superiores de educação e no mercado de
trabalho, além de viabilizar a arrancada do desenvolvimento e a redução da pobreza, ao reduzir a razão
de dependência demográfica em nível micro e macroeconômico.
O Gráfico 2 mostra que a TFT passou de 6,3 filhos por mulher, em 1960, para 2,4 filhos no ano 2000,
chegando ao nível de reposição (2,1 filhos por mulher) em 2005 e ficando em torno de 1,9 filhos por
mulher no final da década. Como aponta a linha de tendência (exponencial), pode-se prever a
continuidade dessa queda. O Gráfico também mostra que o número anual de bebês (nascidos vivos)
havia aumentado até atingir o máximo de pouco mais de 4 milhões de nascimentos em1984, quando se
iniciou uma redução do número anual de nascidos vivos no Brasil. Na segunda metade da primeira
década do século XXI, esse número é menor do que aquele referente a 1960.
A redução na quantidade de nascidos vivos no Brasil é ainda mais significativa se considerarmos que o
número de mulheres em período reprodutivo continua aumentado ano a ano, devido às altas taxas de
fecundidade do passado; essa coorte de mulheres em idades reprodutivas só deve apresentar redução a
partir de 2025. As estimativas apontam para o início do declínio absoluto da população brasileira para a
década de 2030, a menos que houver um fluxo de migração internacional que compense a reversão das
taxas brutas de mortalidade e natalidade.
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Gráfico 2: Taxa de Fecundidade Total (TFT) e número anual de nascidos vivos Brasil, 1960-2009
Fonte: Censos demográficos, PNADs e projeção da população do IBGE, revisão 2008
Embora a taxa de fecundidade média esteja em torno de 1,9 filhos por mulher, como indicou a
PNAD/2009, os diferenciais no padrão de fecundidade por nível sócio-econômico ainda são muito
grandes. O Gráfico 3 mostra que a fecundidade é mais elevada nas parcelas da população de baixa
renda, embora os diferenciais estejam se reduzindo à medida que a fecundidade atinge taxas reduzidas.
O quintil mais baixo de renda apresentava fecundidade de 4,9 filhos por mulher em 1992, passando para
3,4 filhos por mulher em 2009. Já o quintil mais alto de renda, apresentava fecundidade de 1,5 filhos por
mulher em 1992, caindo ainda mais para 1,0 filho por mulher em 2009.
Gráfico 3: Taxa de Fecundidade Total (TFT) por quintil de renda (com correção), Brasil, 2009
Fonte: IPEA, Comunicado da Presidência nº 64. PNAD 2009 – 13 de outubro de 2010
Mesmo com fecundidade abaixo do nível de reposição, o padrão da fecundidade brasileira segue uma
estrutura rejuvenescida. Ou seja, enquanto as mulheres com maiores níveis educacionais apresentam
fecundidade mais tardia, as mulheres com menores níveis de escolaridade apresentam fecundidade
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bastante precoce. Assim, ao contrário da “segunda transição demográfica” da Europa, a transição no
Brasil se deu com um grande rejuvenescimento das taxas de fecundidade. No país nasciam em média
mais de 600 mil crianças (20% do total) de mães menores de 20 anos (Berquó e Cavenaghi, 2005).
Entretanto, a tendência de aumento da fecundidade destas mulheres, apresentada na década de 90, se
inverteu na primeira década do século XXI, segundo os dados de várias fontes (PNAD, SINASC e
Registro Civil).
Embora os diferenciais de fecundidade tenham se reduzido, ainda existem diferenças significativas entre
grupos sociais, e a fecundidade desejada não coincide com a fecundidade observada. O Gráfico 4 mostra
que, em 2006, o número ideal de filhos para o total de mulheres em período reprodutivo era de 2,1 filhos
por mulher. Para as mulheres com zero ou um filho, o número ideal estava abaixo de dois filhos e para
as mulheres com dois ou mais filhos nascidos vivos, entre 2 e 3 filhos. A comparação dos Gráficos 3 e 4
sugere que a fecundidade observada das mulheres dos quintís mais altos de renda está abaixo da
fecundidade desejada; enquanto isso, a fecundidade observada das mulheres do quintil mais baixo de
renda está acima da fecundidade desejada. Portanto, o caso do Brasil apresenta fecundidade indesejada,
não somente por excesso, mas também por falta.
Gráfico 4: Número ideal de filhos para o total de mulheres por número de filhos vivos, Brasil, 2006.
Fonte: Berquó, E., Lima, L.P., PNDS-2006, Relatório final, p. 147.
A mídia e os formuladores de políticas públicas, comumente, têm dado muito destaque à questão da
gravidez indesejada e da fecundidade em excesso ao número desejado, fato que ocorre com mais
frequência entre a população pobre e nos grupos com baixos níveis educacionais. Mas pouca atenção
tem sido dada para a fecundidade indesejada por falta, isto é, o número cada vez maior de mulheres que
estão tendo menos filhos do que o número desejado. A última projeção do IBGE (2008) mostra que o
número de mulheres no período reprodutivo vai começar a declinar por volta de 2025 e a TFT deve estar
em 1,5 filhos por mulher na década de 2020. Este fato coloca a perspectiva de um rápido declínio
populacional a partir da década de 2030, o que é reforçado por projeções do IPEA (Camarano e Kanso,
2009).
Diversos autores já mostram preocupação com os supostos efeitos negativos do decréscimo populacional
a partir de 2030. A validez dessa preocupação é discutível e vai ser afetada, tanto pelo comportamento
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da migração internacional em direção ao Brasil – e é legítimo esperar um aumento desses movimentos
se o Brasil lograr a trajetória econômica e social positiva que as próprias entidades governamentais estão
projetando – como pela experiência dos países desenvolvidos em lidar com seus processos de
envelhecimento populacional e crescimento negativo.1 Desde agora, os estudos demográficos devem
jogar um papel essencial, tanto no acompanhamento dos processos em curso naqueles países, como na
projeção de tendências e na preparação de políticas proativas adequadas ao caso brasileiro.
De qualquer forma, a fecundidade indesejada por falta é um problema de efetivação dos direitos
reprodutivos. Muitas mulheres passam a ter menos filhos do que o desejado pelas dificuldades de
garantir uma vida de qualidade para as crianças e pela dificuldade de conciliar o trabalho produtivo e
reprodutivo. Neste sentido, as políticas sociais em geral e, em particular, as políticas de conciliação
trabalho e família vão ser cada vez mais importantes para a recuperação da fecundidade, caso chegar a
níveis muito abaixo da reposição.
Já a fecundidade indesejada por excesso reflete o tradicional problema da falta de acesso aos serviços de
saúde sexual e reprodutiva e de acesso aos métodos contraceptivos no momento, na quantidade e na
forma demandada pela população de baixa renda. A falta de acesso aos serviços de saúde sexual e
reprodutiva é tipicamente um problema de classe social, pois as parcelas mais abastadas da população
podem suprir suas necessidades nesta área via o mercado privado, que trata este direito como uma
transação econômica comum, dentro das regras da oferta e procura por serviços.
O Brasil já avançou bastante na legislação que trata do planejamento reprodutivo. O Planejamento
Familiar passou a ser tratado numa perspectiva de direitos com o lançamento do Programa de
Assistência Integral à Saúde da Mulher (PAISM), em 1983, que concebia a questão da saúde da mulher
de forma integral, não se detendo exclusivamente nas questões de concepção e contracepção. Em 1988,
foi aprovada a Constituição Federal, em cujo § 7º, do artigo 226 esta escrito que o “planejamento
familiar é livre decisão do casal, competindo ao Estado propiciar recursos educacionais e científicos
para o exercício desse direito, vedada qualquer forma coercitiva por parte de instituições oficiais ou
privadas”. Em 1996 foi aprovada a Lei n. 9.263, que regulamenta o § 7º do art. 226 da Constituição
Federal, o qual trata da questão do planejamento familiar no Brasil. Em 1999, foi publicada a Portaria nº
048, do Ministério da Saúde, para estabelecer normas de funcionamento e mecanismos de fiscalização
para execução de ações de planejamento familiar pelas instâncias gestoras do Sistema Único de Saúde.
Em 2005, já no governo Lula, o Ministério da Saúde e a Secretaria Especial de Políticas para as
Mulheres (SPM) lançaram a “Política Nacional de Direitos Sexuais e Direitos Reprodutivos” cujos
objetivos eram: a) Ampliação da oferta de métodos anticoncepcionais reversíveis no SUS – o Ministério
da Saúde se responsabilizando pela compra de 100% dos métodos anticoncepcionais para os usuários do
SUS (até então, o Ministério era responsável por suprir de 30% a 40% dos contraceptivos - ficando os
outros 70% a 60% a cargo das secretarias estaduais e municipais de saúde); b) Ampliação do acesso à
esterilização cirúrgica voluntária no SUS, aumentando o número de serviços de saúde credenciados para
a realização de laqueadura tubária e vasectomia, em todos os estados brasileiros; c) Introdução de
1 Até 1980, o Brasil era um receptor líquido de migração internacional e passou a ser um país com saldo líquido negativo nas últimas
décadas. De acordo com dados do Ministério de Relações Exteriores, um total de 3.040.993 brasileiros vivia no exterior em 2009. Porém, a
redução do ritmo de crescimento da população economicamente ativa e o crescimento da economia e do emprego podem fazer o fluxo
internacional se inverter mais uma vez.
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reprodução humana assistida no SUS (Brasil, 2005 e 2006). Em 2007, o governo Federal lançou a
“Política Nacional de Planejamento Familiar”, que tem como meta a oferta de métodos contraceptivos
de forma gratuita para homens e mulheres em idade reprodutiva e estabelece também que a compra de
anticoncepcionais seja disponibilizada na rede Farmácia Popular (UNFPA, 2008).
Segundo balanço do Ministério da Saúde (período 2003-2010), as compras de pílulas anticonceptivas
passaram de 8,1 milhões de cartelas em 2003 para 50 milhões de cartelas em 2009. A compra de DIU
passou de 41,7 mil unidades para 300 mil unidades, no mesmo período. O número de vasectomias
passou de 19,1 mil, em 2003, para 34,1 mil em 2009. A distribuição anual de preservativos passou de
119,7 milhões de unidades no período 2000-2003 para 465,2 milhões entre 2007-2009. Foram instaladas
máquinas de preservativos em escolas para oferecer meios de prevenção aos jovens. Em termos de
valores, o investimento em pílulas e contraceptivos alcançou R$ 72,2 milhões em 2010, comparado com
R$ 10,2 milhões em 2003.
Inegavelmente, houve avanços na oferta de serviços de saúde sexual e reprodutiva no Brasil. Mas os
problemas de logística ainda atrapalham a adequada disponibilidade dos meios de regulação da
fecundidade e de acesso à saúde reprodutiva. A universalização dos serviços de saúde sexual e
reprodutiva continua sendo tarefa imprescindível para reduzir a gravidez não desejada e não planejada e
para libertar a sexualidade dos constrangimentos da reprodução intempestiva, especialmente para as
mulheres mais pobres e das regiões mais distantes dos grandes centros urbanos. O número de
atendimentos pré-natal no SUS passou de 8,6 milhões em 2003, para 19,4 milhões em 2009. A
proporção de gestantes que realizaram 7 ou mais consultas de pré-natal passou de 43,7% para 55,8%,
entre 2000 e 2007. Esta ampliação possibilitou a redução da mortalidade materna, embora
provavelmente sem conseguir atingir a meta do quinto Objetivo de Desenvolvimento do Milênio
(ODM), de 35 óbitos por 100 mil nascidos vivos, em 2015.
O Gráfico 5 mostra a razão de mortalidade materna – que estima a frequência de óbitos femininos
ocorridos até 42 dias após o término da gravidez, atribuídos a causas ligadas à gravidez, ao parto e ao
puerpério – em relação ao total de nascidos vivos.
Gráfico 5: Razão de mortalidade materna (por 100 mil nascidos vivos) ajustada, Brasil, 1990-2007
Fonte: IPEA. Relatório Nacional de Acompanhamento – ODM, Brasília, março 2010
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A razão de mortalidade materna havia sido estimada em 140 óbitos por 100 mil nascidos vivos em 1990
e para 75 óbitos em 2007. Entretanto, um estudo recente realizado por um consórcio de organismos
internacionais sugere que a mortalidade materna no Brasil teria caído ainda mais, pois estimou a
mortalidade materna do Brasil em 58 por 100 mil nascidos vivos em 2008 (WHO, 2010:23). O certo é
que, no período de 1990 a 2007, houve redução significativa em todas as principais causas de morte
materna. Os óbitos maternos por hipertensão foram reduzidos em 62,8%; por hemorragia, 58,4%; por
infecções puerperais, 46,8%; por aborto, 79,5% e por doenças do aparelho circulatório complicadas pela
gravidez, parto e puerpério, 50,7%. Reduções adicionais da mortalidade materna, a níveis de um dígito
como nos países desenvolvidos, exigiria não somente melhorias na extensão e qualidade dos serviços de
saúde, inclusive de saúde reprodutivo, mas também reduções significativas nos níveis de pobreza e
desigualdade e a melhoria das condições de vida da população, especialmente daqueles setores mais
pobres concentrados em favelas urbanas.
A questão do aborto legal no Brasil foi bastante discutida na campanha das eleições presidenciais de
2010. Certamente, o tema da discriminação do aborto e do atendimento ao aborto legal devem voltar à
discussão pública no próximo quinquênio. Na verdade, existe uma forte relação entre a meta de
universalização dos serviços de saúde sexual e reprodutiva e a redução do número de abortos, que
acontecem por conta do alto número de gravidezes não desejadas. A redução da gravidez indesejada
pode contribuir para a redução do número de abortos, além de reduzir o custo do sistema de saúde com
as sequelas provocadas pelo aborto inseguro.
b. Mudanças na estrutura etária: bônus demográfico, juventude e arranjos
familiares
O rápido descenso da fecundidade descrito no item anterior gerou conseqüências que vão muito além da
redução do ritmo de crescimento populacional. Os impactos desse declínio na estrutura populacional
mudaram radicalmente a composição da sociedade brasileira, trazendo benefícios potenciais e algumas
inquietações no curto prazo, assim com responsabilidades adicionais no médio prazo. O Gráfico 6
apresenta a distribuição por sexo e idade da população brasileira no último Censo Demográfico.
Gráfico 6: Distribuição por sexo e idade da população brasileira, 2010
Fonte: Censo demográfico de 2010, do IBGE
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O Gráfico mostra que o Brasil passou de uma população jovem para uma população que está mais
concentrada nas idades adultas. Inevitavelmente, a estrutura vai evoluir com certa rapidez para uma
população envelhecida. Essas mudanças na estrutura etária da população, provocadas pela transição
demográfica do país constituem uma das principais forças que tem atuado no sentido de propiciar um
ambiente favorável ao crescimento econômico e à redução das desigualdades e da pobreza.
O principal impacto dessa mudança no curto prazo é refletido na razão de dependência. O Gráfico 7
mostra que a razão de dependência demográfica no Brasil vem caindo desde 1980, enquanto a
percentagem da população em idade ativa – PIA (população de 15-64 anos) sobre a população total vem
aumentando. Segundo Alves (2008), o chamado bônus demográfico ocorre no período em que a PIA
(em percentagem) é maior do que a Razão de Dependência (em percentagem). Desta forma, o que se
nota é que a diferença entre as duas curvas vem aumentando desde meados da década de 1990 e deve
continuar aumentando até 2020, abrindo a janela de oportunidade demográfica.
A menor razão de dependência demográfica tem efeitos macroeconômicos e microeconômicos. No
plano macro, a menor razão de dependência possibilita a melhora da relação entre o número de pessoas
em idade ativa e pessoas em idades dependentes. Havendo crescimento econômico e geração de
emprego no país, esta situação favorece o aumento da poupança agregada e a geração de recursos
disponíveis para o aumento das taxas de investimento, condição essencial para a decolagem (takeoff)
econômica. Quanto maior o crescimento econômico e a geração de emprego em termos quantitativos e
qualitativos (trabalho descente), maior é a formação de capitais e recursos necessários para o
crescimento econômico, o investimento em infra-estrutura física, social e humana.
Gráfico 7: Razão de dependência demográfica e percentagem da População em Idade Ativa (PIA), Brasil: 1980-2030
Fonte: Projeção da população do Brasil por sexo e idade: 1980-2050, IBGE, 2008
No plano micro, ocorre algo semelhante, pois a menor razão de dependência no seio da família permite
que os adultos acumulem recursos para investimento em capital humano, em si próprio e nos filhos,
melhorando as condições de procura por trabalho produtivo e melhores condições de renda e consumo,
rompendo com o ciclo intergeracional de pobreza. O crescimento econômico (com geração de emprego)
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e o bônus demográfico, quanto ocorrem juntos, formam um círculo virtuoso capaz de romper com o
círculo vicioso das armadilhas da pobreza (poverty trap).
Existem diversos estudos sobre as mudanças na estrutura etária e o bônus demográfico no Brasil e na
América Latina, mostrando como os processos demográficos contribuem para o desenvolvimento
econômico (Martine, Carvalho e Árias, 1994; Carvalho e Wong, 1995; Rios-Neto, 2005; Turra e
Queiroz, 2005; Hakkert, 2007). Por exemplo, o crescimento da PIA e a redução da Razão de
Dependência contribuíram para o crescimento dos segmentos de renda média, conforme mostrado mais
adiante neste texto.
Dentre os fatores que contribuíram para a redução da pobreza e o aumento da classe média estão as
mudanças na dinâmica familiar e o aumento da entrada da mulher no mercado de trabalho. A diminuição
do tamanho das famílias, o crescimento do número de casais sem filhos e de casais de dupla renda, como
a família DINC (Duplo Ingresso, Nenhuma Criança o “Double income, no kids”) fazem com que exista
maior parcela de renda disponível para o investimento e o consumo das famílias. Na verdade, o Brasil
está passando por grandes mudanças nas famílias e nos domicílios, que potencializam mudanças sociais
importantes.
O Gráfico 8 mostra que a família hegemônica, constituída por um casal com filhos, diminuiu de 62,8%
para 49,9% entre 1992 e 2009. Cresceram as famílias constituídas pelos casais sem filhos – de 11,7%
para 16,2% - e as monoparentais femininas que passaram de 12,3% para 15,4% no mesmo período.
Também houve um aumento dos arranjos unipessoais, tanto femininos quanto masculinos.
Gráfico 8: Distribuição dos arranjos familiares brasileiros pelo tipo de arranjo, 1992 e 2009
Fonte: PNADs 1992 e 2009, segundo Comunicado da Presidência IPEA Nº 64, outubro de 2010
As transformações nas famílias foram acompanhadas pela redução do número de pessoas por domicílios
e pelo aumento do número de cômodos nos domicílios (mostrando que existe mais disponibilidade de
cômodos por pessoa). A percentagem de domicílios com 5 ou mais cômodos passou de 52%, em 1970,
para cerca de 70%, em 2009. Já o número médio de moradores por domicílio passou de 5,3 pessoas, em
1970, para 3,8 pessoas, em 2000 e chegou a 3,3 pessoas, segundo o censo 2010. Os dados iniciais do
13
censo 2010 também indicam que enquanto a população brasileira cresceu 12,3%, na última década, o
número de domicílios particulares aumentou em 25%, o que deve ter contribuído para a redução do
déficit habitacional (somente com a divulgação dos resultados da amostra se poderá calcular o tamanho
do déficit de moradias). O censo 2010 também indicou a existência de mais de 6 milhões de domicílios
vagos, além de quase 4 milhões de domicílios para uso ocasional.
No curto e médio prazos, portanto, o desafio econômico é investir em recursos humanos e gerar
atividades produtivas num ritmo compatível com a expansão da PIA durante o período do bono
demográfico. Por sua vez, essa preocupação com a inclusão produtiva da população jovem se insere
dentro de um contexto social mais amplo – a transição para a vida adulta.
No Brasil, como no resto da América Latina, observa-se a iniciação de certos comportamentos a uma
idade mais jovem, junto com o retardamento de diversas etapas da transição da juventude para a vida
adulta. Por um lado, a iniciação sexual tende a ser mais precoce que em gerações anteriores. Isto tem
sido acompanhado, no passado, por aumentos significativos na gravidez de adolescentes, fato que
inevitavelmente alterou a trajetória de muitas jovens na sua transição à vida adulta. Nos últimos anos, a
maior incidência de gravidez entre adolescentes tem se restringido mais às populações de baixa renda e
com menos acesso à educação sexual e à saúde reprodutiva.
Por outro lado, os jovens de hoje saem mais tarde da escola, entram mais tarde no mercado de trabalho,
custam mais a sair da casa dos pais e se casam mais tarde do que as gerações anteriores (Camarano,
2006). A postergação desses eventos críticos no caminho em direção à vida adulta, assim como o
crescimento da participação simultânea na escola e no trabalho tornou esse processo de transição mais
complexo e heterogêneo. A maior escolaridade das mulheres e a maior participação no mercado não as
liberou completamente dos moldes tradicionais de comportamento. A postergação da vida adulta
centrada no binômio trabalho/família, e as dificuldades do exercício da cidadania no contexto de grandes
desigualdades sociais, pode ser um dos fatores que leve os jovens, particularmente do sexo masculino, a
buscar sua identidade na associação com gangs e com a criminalidade violenta. Estes fatores estariam na
base das elevadas taxas de mortalidade de jovens analisadas em outro segmento deste texto.
Observa-se, portanto, que o aproveitamento da janela de oportunidade representado pelo bônus
demográfico não depende apenas de investimentos produtivos e de melhoria da situação educacional,
mas também de uma re-adequação da transição social para a vida adulta. É fundamental que existam
oportunidades de trabalho, empregos decentes e inserção produtiva dos jovens. É preciso ter maior
articulação entre a universidade, a sociedade e as empresas para que os jovens não desperdicem os
melhores anos da juventude.
A médio e largo prazos, porém, o desafio é outro – como conviver com a expansão acentuada da
população idosa, a elevação da razão de dependência e as mudanças no perfil da demanda por serviços
de saúde e de seguridade social? Como mostram os problemas enfrentados pelos países desenvolvidos,
onde a população idosa já constitui de 15 a 25% da população total, não se pode esperar até que esta
situação se concretize para começar a tomar as providências necessárias. É preciso ir criando, desde
agora, os ativos e os mecanismos que vão permitir fazer essa transição etária de maneira harmoniosa.
Em primeiro lugar é fundamental garantir o pleno emprego para que as pessoas possam ter renda e criar
ativos na idade produtiva, que possam servir de base para uma vida saudável e ativa na terceira idade.
14
Em segundo lugar, o sistema de proteção social do país precisa garantir mecanismo de apoio à
população mais carente que não tem mecanismos de capitalização via mercado.
No atual momento, os recursos transferidos no âmbito da seguridade social no Brasil vêm apresentando
uma participação crescente na formação da renda das famílias. O crescimento da cobertura e o aumento
do valor dos benefícios da seguridade social têm tido um papel cada vez mais destacado no sistema de
proteção social no país, especialmente para a população idosa e para as pessoas portadoras de
deficiência. A expansão da cobertura e o aumento do valor dos benefícios do BPC/LOAS têm um
impacto considerável sobre a redução da pobreza, pois beneficia pessoas e famílias de baixa renda e
principalmente dos municípios pequenos das regiões menos desenvolvidas do Brasil. Ao mesmo tempo,
muitos destes beneficiários do BPC passam a ser arrimos das suas famílias, possibilitando um acesso
mínimo à renda monetária que também desempenha um papel de dinamizador relevante (via efeito
multiplicador) da atividade econômica em localidades menos desenvolvidas (Barros, 1999; Beltrão,
2005; Camarano, 2005).
Entretanto, a médio e longo prazo, o crescimento acelerado do contingente de idosos e de inválidos vai
inviabilizar esse tipo de ação assistencial na escala requerida se não forem adotadas, desde já, políticas
visando aumentar a contribuição e não se fizerem os ajustes atuariais necessários no sistema
previdenciário. Ampliar a base dos contribuintes é um mecanismo essencial para elevar as receitas
previdenciárias. Mas também é preciso reduzir as fraudes do sistema, a falta de controle das
aposentadorias especiais e a generosidade que possibilita aposentadorias precoces.
c. Migração, urbanização e desenvolvimento regional
No início do século XX, apenas uma pequena fração da população brasileira residia nas cidades. Mas a
população urbana chegou aos 50% do total em meados da década de 1960, ultrapassou os 80% no ano
2000 e chegou a 84,4% no ano 2010. A migração interna e a urbanização representaram alguns dos
principais componentes e dinamizadores das transformações sociais, econômicas, demográficas,
culturais e políticas vividas pelo Brasil no século XX.
Durante o período 1930 a 1980, os movimentos migratórios no Brasil foram marcados por duas
tendências opostas de dimensões diferenciadas. Por um lado, o país experimentou três movimentos
sucessivos de migração rural-rural em direção às fronteiras agrícolas do momento. Assim, nas décadas
de 30 e 40, observaram-se movimentos em direção à fronteira do Paraná; nas décadas de 50 e 60, os
movimentos se dirigiram mais para o Centro-Oeste e o Maranhão enquanto que, nas décadas de 70 e 80,
a direção preferencial era a fronteira amazônica. Nos três casos, a migração rural-rural era composta por
uma maioria de homens movidos pela vontade de ter acesso a terras agrícolas.
Enquanto isso, os movimentos rural-urbanos foram estimulados pela adoção de um modelo de
industrialização via substituição de importações, depois da crise econômica mundial de 1929. Em
seguida, foram intensificados pelo aumento do crescimento vegetativo que resultou da redução
progressiva da mortalidade e pelos resultados de outras políticas públicas visando beneficiar o
crescimento industrial e a melhoria das condições de vida nas cidades. O número de localidades urbanas
e a proporção da população total residente nelas cresceram rapidamente. Os fluxos se concentraram no
Sudeste, e particularmente em São Paulo, centro do novo dinamismo industrial. A adoção de um modelo
de modernização agrícola conservador pelo governo militar que tomou o poder em 1964, visando
15
aumentar a produtividade sem alterar a estrutura social predominante, utilizando para isso o crédito
subsidiado, resultou na expulsão massiva do campo de pequenos produtores de todo tipo, provocando
uma aceleração da migração rural-urbana, conforme mostrado na Tabela 1. Um total de 41 milhões de
migrantes rural-urbanos foi buscar novas oportunidades de emprego e sobrevivência nas localidades
urbanas entre 1940-80. Este número equivale a mais da metade do crescimento populacional do país no
período.
Tabela 1: Estimativas da migração rural–urbana líquida (em milhões), por sexo, Brasil 1940–2000
Sexo 1940–
1950*
1950–
1960*
1960–
1970#
1970–
1980#
1980–
1990º
1990–
2000º
Homens Na Na 6.6 8.6 4.0 4.3
Mulheres Na Na 7.0 8.8 5.2 5.2
Total 3.0 7.0 13.6 17.4 9.2 9.5
Migrantes rural-urbanos como % da
população rural no início da década
10% 21% 35% 42% 24% 27%
Fonte: Calculado com base nos dados dos diversos Censos Demográficos do IBGE * Martine (1987: 60–61); #Carvalho e Garcia (2002), tabelas 92, 185 e 284 ; º Rodriguez e Busso (2009: 120)
Como resultado dessas transformações, conforme pode ser observado no Gráfico 9, o Brasil em 1950 já
tinha avançado para um nível de urbanização (i.e. - % da população total residindo em áreas urbanas)
que somente hoje foi conseguido pelos continentes da Ásia e da África.
Gráfico 9 – Evolução do Nível de Urbanização, Brasil, África e Ásia, 1950-2050
Fonte: United Nations, 2010a
Assim, na segunda metade do século 20, o Brasil experimentou uma das mais aceleradas transições
urbanas da história mundial. Esta transformou rapidamente um país rural e agrícola em um país urbano e
metropolitano, no qual grande parte da população passou a morar em cidades grandes. Uma das
características mais marcantes do processo de urbanização ao longo do período 1930-80 foi justamente a
concentração progressiva da população urbana em cidades cada vez maiores. Hoje, dois quintos da
população total residem em uma cidade de pelo menos um milhão de habitantes.
0%
20%
40%
60%
80%
100%
19
50
19
55
19
60
19
65
19
70
19
75
19
80
19
85
19
90
19
95
20
00
20
05
20
10
20
15
20
20
20
25
20
30
20
35
20
40
20
45
20
50
Brasil
África
Ásia
16
Em suma, o período 1930-80 foi marcado principalmente por um processo constante de crescimento
urbano e de concentração da população em cidades cada vez maiores. Em termos regionais, esse
aumento se concentrava na região Sudeste, especialmente nas cidades do Rio de Janeiro e São Paulo que
foram ganhando participação relativa na população total do país. Ao longo do período econômico
marcado pela industrialização via substituição das importações – ou seja, de 1930 até a década de ’80 –
a migração rural-urbana no Brasil registrou saldos líquidos negativos do Nordeste e saldos positivos da
região Sudeste, em especial, do estado de São Paulo. As mulheres predominavam nessa migração,
tornando as áreas urbanas fortemente femininas e as áreas rurais fortemente masculinas.
Esse processo era movido por diferentes etapas do processo de desenvolvimento nacional e nutrido pelo
crescimento demográfico que alimentava o estoque de migrantes-em-potencial nas áreas rurais. Nas
últimas décadas, porém, na medida em que a população urbana vem aumentando de tamanho, o
crescimento vegetativo da população residente nas próprias cidades passou a representar uma parcela
maior do aumento demográfica nas localidades urbanas do que a migração rural-urbana. Atualmente, o
crescimento vegetativo representa mais de dois terços de todo o crescimento urbano. Esse fato é de
grande importância política, pois realça a futilidade de políticas que, até hoje, pretendem impedir ou
retrasar o crescimento urbano via medidas que tentam dificultar o assentamento de migrantes.
Depois de meio século de urbanização concentradora, o Censo Demográfico de 1991 revelou uma
interrupção significativa dessa tendência que parecia, até então, inexorável. Assim, a taxa de
crescimento urbano caiu de 4,2% a.a. na década de 70 para 2,6% na de 80. Todas as categorias de
tamanho de cidades sofreram uma redução, mas a queda foi mais significativa nas cidades
metropolitanas. Na década de 70, as dez maiores aglomerações tinham se responsabilizado por 41% de
todo o crescimento urbano nacional; na de 80, essa proporção caiu para 30%. O ritmo frenético de
urbanização e de metropolização que tinha perdurado ao longo de meio século havia finalmente sido
interrompido, para surpresa de todos. Essa queda na velocidade do crescimento e da concentração
urbana persistiu também durante a década de 90 e deve continuar no século XXI, embora os dados
pertinentes ainda não estejam disponíveis.
Ao mesmo tempo, observou-se uma redução da tendência da concentração de atividade econômica e
população na região Sudeste. A partir dos anos 80, a urbanização passou a apresentar uma tendência de
desconcentração regional, com o Sudeste perdendo posição para o Centro-Oeste e o Norte. Na
atualidade, esses fluxos tradicionais se modificaram. Inclusive, observa-se um refluxo importante da
migração partindo agora do Sudeste para o Nordeste. A região metropolitana de São Paulo perdeu
participação para o interior do estado de São Paulo e para o resto do país. Entre os diversos fatores que
podem ter contribuído para essa mudança no padrão de urbanização brasileira, três merecem ser
destacados: a queda acelerada da fecundidade, a crise econômica que assolou a região na década de 80 e
em parte da década de 90, e a culminação de um processo natural de desconcentração da atividade
produtiva (Martine e McGranahan, 2010).
Por outro lado, o processo de desconcentração relativo observado nas décadas de 80 e 90 não deve
ofuscar a continuação do predomínio das grandes metrópoles no cenário urbano nacional. Mesmo nessas
duas décadas de crescimento reduzido, as nove Regiões Metropolitanas tiveram um aumento
populacional absoluto maior que o aumento verificado nas próximas 52 cidades juntas, conforme mostra
a Tabela 2.
17
Tabela 2: Crescimento absoluto e relativo das Regiões Metropolitanas e outras aglomerações urbanas, Brasil 1980–1991 e 1991–2000
Tipo de Grande Concentração Urbana Taxa de crescimento
Anual
Incremento absoluto (em
000s)
1980–1991 1991–2000 1980–1991 1991–2000
Regiões Metropolitanas (9) 2,00 1,99 8.387 8.290
Núcleos das RMs 1,36 1,10 3.612 2.693
Periferia das RMs 2,79 3,68 4.775 5.597
Outras aglomerações metropolitanas (17) 3,31 2,79 3.942 3.675
Outras aglomerações não-metropolitanas
(35)
3,21 2,33 4.367 3.435
Fonte: IBGE, Censos Demográficos, apud Baeninger (2004), tabela 2, e Torres, 2002, tabela 1, p. 149
Vale observar também que o arrefecimento do crescimento metropolitano foi basicamente um fenômeno
de estagnação nos municípios-núcleos, pois as periferias das grandes metrópoles persistiram num ritmo
acelerado de crescimento. Esses subúrbios continuam atraindo migrantes de baixa renda até hoje,
inclusive aqueles vindo de outras áreas da própria cidade. Não surpreende o fato de que as periferias
concentram os maiores problemas de favelização, assentamentos informais, infra-estrutura precária,
conflitos ambientais, desorganização social e violência. Na média, a população das periferias das nove
Regiões Metropolitanas tem uma renda equivalente a 56% da renda dos habitantes do município núcleo
(Torres, 2002).
Julgado em termos do número e tamanho de cidades, do peso das cidades na geração do PIB e do
desenvolvimento da rede urbana, pode-se dizer que a urbanização brasileira já atingiu um grau elevado
de maturidade. A maioria da sua população vive em cidades grandes que compõem uma rede urbana
extensa e diversificada. São cidades que já não crescem a ritmos apressados como no passado, mas que
geram 90% do PIB nacional. No contexto da economia mundial globalizada, na qual as cidades,
especialmente as maiores, levam uma vantagem competitiva, essa concentração deveria representar um
ganho comparativo importante. Entretanto, essa vantagem pode estar sendo prejudicada pelas
dificuldades sociais e ambientais que caracterizam muitas cidades brasileiras.
A maioria da população urbana de baixa renda no Brasil vive em lugares e moradias inadequados,
devido à ausência de medidas apropriadas para preparar e acomodar o crescimento urbano. Esse descaso
caracteriza a expansão urbana das últimas oito décadas e ainda persiste nos dias de hoje. Apesar de
muitas décadas de crescimento rápido e da proliferação de favelas em quase todas as cidades, os
assentamentos informais têm sido tratados como problemas transitórios de ordem pública que vão
desaparecer sozinhos com o “desenvolvimento”, ou que precisam ser eliminados. Na maioria dos casos,
o poder público somente se intromete para tentar impedir esse crescimento. Muitos anos depois da
instalação dos assentamentos, porém, são frequentemente geradas pressões para tentar “resolver” esses
cancros e/ou para angariar os votos da população que vive nele. Essas atitudes negativas em relação aos
18
assentamentos informais são coerentes com as normas e valores de uma sociedade desigual que,
historicamente, raramente tem priorizado as necessidades e os problemas de sua população mais pobre.
Parte do problema reside na oposição ideológica e política tradicional ao crescimento urbano. As
iniciativas governamentais, seja em nível federal, estadual ou local, sempre tenderam a retardar ou
impedir o crescimento urbano em vez de ordená-lo. Estudos recentes sugerem que, em muitos lugares, a
ausência de uma atitude proativa em relação às necessidades de moradia dos pobres representa muito
mais que apatia. Tem sido parte de um esforço explícito e sistemático por parte de tomadores de decisão
locais para obstruir o assentamento e a permanência de pobres, especialmente migrantes, nas suas
cidades. Nesta linha, diversos municípios têm adotado a prática de dificultar o acesso à compra de lotes,
inclusive impondo regulamentos utópicos e irrealistas com relação ao tamanho mínimo do lote, com a
clara intenção de afastar compradores de baixa renda. Outras medidas, como recusar o acesso à água,
saneamento, transporte e outros serviços são utilizadas para impedir a vinda de migrantes e o
crescimento urbano (Feler e Henderson, 2008).
Esse tipo de iniciativa de parte do poder público local tem implicações que extrapolam os seus efeitos
imediatos sobre a migração. No curto prazo, os pobres têm que “se virar” para encontrar um espaço para
morar: na melhor das hipóteses, a população de baixa renda é obrigada a comprar terrenos a preços mais
elevados de provedores “informais.” Os outros menos afortunados estabelecem suas residências
precárias em lugares ilegais, inadequados ou perigosos, tais como em áreas de proteção ambiental,
encostas de morros, terrenos contaminados ou à beira de rios, sempre sujeitos à instabilidade ou ao
despejo e vulnerável às intempéries climáticas. A falta de uma moradia fixa num lugar adequado está na
raiz da incapacidade de se beneficiar de tudo que a cidade pode oferecer em termos de emprego,
serviços e bem-estar.
Práticas como essas que limitam a acesso da população mais pobre à cidade infringem os direitos
básicos desse grupo, mas também têm outras implicações notáveis de maior alcance. Favorecem o
crescimento de bairros marginalizados e insalubres em qualquer parte da cidade. Isto contribui para a
vulnerabilidade e para a multiplicação de ambientes insalubres, ao mesmo tempo em que favorece a
desorganização social e a criminalidade. Também contribui para a degradação ambiental e está na raiz
das grandes calamidades públicas, como esta que acaba de destruir a região serrana próxima ao Rio de
Janeiro. Tudo isto afeta a capacidade das cidades para competir por investimentos e, portanto, acaba
reduzindo a geração de emprego e a base fiscal nessas localidades.
Para reverter as tendências atuais que favorecem a continuada expansão de setores informais, teriam que
ser adotadas duas iniciativas que são difíceis de implementar numa sociedade marcada pelo privilégio e
pela desigualdade e na qual se trata os bairros pobres como cancros. Primeiro, teriam que ser abolidas
essas medidas que discriminam explicitamente contra o assentamento de populações mais pobres. Ao
mesmo tempo, os mercados de terra distorcidos que caracterizam as áreas urbanas teriam que ser
regulados e a população pobre protegida de maneira positiva contra as práticas abusivas de
especuladores imobiliários e de empresários do setor informal. Segundo e ainda mais importante, o setor
público precisaria tomar uma atitude proativa em relação às necessidades futuras de solo urbano para a
população mais pobre. A maioria das cidades dispõe de terras aptas que estão sendo mantidas em
reserva por especuladores. Medidas enérgicas teriam que ser tomadas para taxar essas propriedades
especulativas e viabilizar a sua integração ao mercado formal.
19
Em suma, muitos dos problemas ambientais enfrentados pelas cidades brasileiras são intimamente
ligados com questões sociais e os dois têm suas origens na falta de uma postura proativa da sociedade
brasileira e do poder público com relação ao crescimento urbano. Reverter a postura histórica de descaso
com a situação do contingente mais numeroso no crescimento urbano do país e adotar políticas mais
adequadas visando a acomodação do crescimento urbano inevitável tornaria as cidades brasileiras mais
humanas, mais sustentáveis e mais competitivas. Tal reversão exige a realização de um processo de
conscientização junto a políticos e administradores urbanos para que eles passem a aceitar e aproveitar o
dinamismo do crescimento. Por sua vez, isto exige análises e informações atualizadas referentes à
forma, localização e composição do crescimento urbano. No atual momento, a atenção deve ser
concentrada no ordenamento e na humanização do crescimento nas periferias urbanas das maiores
cidades.
4) Panorama social: redução da pobreza e da desigualdade de renda
a. Pobreza e Desigualdade
A pobreza sempre fez parte da história brasileira. Sendo um fenômeno multidimensional e complexo, a
pobreza pode ser medida de diversas maneiras. O Gráfico 10, que mostra o percentual de pessoas com
renda domiciliar per capita igual ou inferior à linha de pobreza e igual ou inferior à linha de indigência
ou extrema pobreza, para o Brasil, entre os anos de 1976 e 2009.
Gráfico 10: Percentual de pessoas com renda domiciliar per capita inferior às linhas de pobreza e indigência, Brasil: 1976-2009
Fonte: IPEADATA, 2009, com base nos dados das PNADs do IBGE Nota: não houve aplicação da PNAD nos anos de 1980, 1991, 1994 e 2000.
Observa-se que o percentual de pobres no país se manteve em torno de 40% até 1993. Somente após o
Plano Real de 1994 é que houve uma queda mais consistente do nível de pobreza, o qual perdurou com
níveis pouco abaixo de 35% entre 1995 e 2003. Contudo, a queda mais consistente da pobreza aconteceu
nos anos recentes, pois o nível caiu para menos de 30% em 2006 e atingiu o recorde de baixa de 21,4%,
em 2009. Uma queda consistente em relação à proporção de indigentes também aconteceu a partir de
2004, e, pela primeira vez, o percentual ficou abaixo de 10%, em 2006, chegando a 7,3% em 2009. Ou
seja, a pobreza e a indigência continuaram caindo, mesmo com os impactos da crise econômica mundial
20
e com a redução do PIB per capita no Brasil. Em grande, isto se deve às políticas sociais adotadas e
sugere que esta tendência deva continuar no quinquênio 2011-2015.
Em termos absolutos, o número de pobres no Brasil passou de 49,2 milhões em 1995, para 58,3 milhões
em 2003, e só a partir desta data passou a apresentar redução absoluta, chegando a 39,6 milhões de
pessoas em 2009, montante equivalente à população da Argentina. O número absoluto de indigentes era
de 20,8 milhões em 1995, passou para 24,3 milhões em 2003 e baixou para 13,5 milhões em 2009,
montante equivalente a toda a população do Equador. Portanto, a pobreza e a indigência estão se
reduzindo em termos relativos e absolutos, mas os números ainda representam um obstáculo grave para
o desenvolvimento sustentável no país.
Os avanços econômicos e sociais descritos acima no Brasil também tiveram seu significado prático
diminuído por um grau muito elevado de desigualdade. Os dados apresentados no Gráfico 11 mostram
que, pela primeira vez, o país apresentou algum progresso nesse terreno durante os últimos anos. O
coeficiente de Gini, que mede o grau de concentração da renda, sempre foi muito alto no Brasil, em
torno de 0,60. Contudo, a partir do ano 2001, observa-se uma queda contínua da desigualdade até atingir
um coeficiente de 0,543 em 2009, o menor nível desde o início da série.
Gráfico 11: Coeficiente de Gini da renda domiciliar per capita, Brasil: 1976-2008
Fonte: IPEADATA, 2010, com base nos dados das PNADs do IBGE
Os dados referentes à queda da concentração da renda por domicílios apresentam tendências similares.
A parcela da renda apropriada pelo estrato de 1% mais rico da população (em torno de 14% da renda
total domiciliar) era superior à parcela apropriada pelos 50% mais pobres (em torno de 12%) na segunda
metade da década de 1990. Já na atual década, diminuiu um pouco a parcela apropriada pelo estrato 1%
mais rico – de 13,9% em 2001 para 12,1% em 2009 – enquanto subiu a parcela apropriada pelos 50%
mais pobres – de 12,6% para 15,5% no mesmo período. Essa queda recente da desigualdade surpreendeu
os estudiosos do assunto, já que a desigualdade parecia um fato impossível de se mudar no Brasil.
Entretanto, já surgem estudiosos otimistas com o processo de redução da desigualdade de renda (Soares,
2008:5). De qualquer forma, a desigualdade brasileira continua sendo uma das mais altas do planeta e o
desenvolvimento nacional somente poderá ser atingido com uma diminuição drástica deste indicador.
21
b. Mercado de trabalho e renda
O crescimento econômico, juntamente com a transição demográfica, possibilitou um aproveitamento
maior do potencial produtivo da força de trabalho brasileira. O Gráfico 12 mostra que a População
Economicamente Ativa (PEA) passou de 43,2 milhões em 1980 (representando 36,3% da população
total) para 101,1 milhões em 2009 (representando 53% da população total). Nota-se que o percentual de
pessoas ocupadas ou procurando trabalho (PEA) cresceu bastante nas últimas décadas, representando
uma elevação do percentual dos “produtores” e uma redução dos “dependentes” no conjunto da
população. Isto significa que o mercado de trabalho está contribuindo para a geração de riqueza e para a
redução da pobreza. Segundo o Ministério do Trabalho, com base nas informações do Cadastro Geral de
Emprego e Desemprego (Caged) e da Relação Anual de Informações Sociais (Rais), o número de
empregos formais no Brasil passou de 28,7 milhões, em 2002, para 43,5 milhões, em 2010. Nos últimos
8 anos, houve a criação de cerca de 15 milhões de empregos com carteira de trabalho.
O crescimento do emprego, especialmente aquele com carteira assinada ou com contribuição à
previdência, foi responsável pelo aumento da massa salarial que se manteve estagnada entre 1998 a 2002
(com valor aproximado de R$ 36 bilhões), mas passou a crescer ano a ano a partir de 2003. Sem dúvida,
a trajetória de crescimento do emprego e da massa salarial foi um dos motivos que contribuiu para a
redução da pobreza e da desigualdade no chamado “qüinqüênio virtuoso” (2004-2008) brasileiro. Após a
crise de 2009, o nível de emprego e renda voltou a subir em 2010, reforçando o processo de inclusão
social.
Gráfico 12: População total e População Economicamente Ativa (PEA) como percentagem da população total, Brasil: 1980-2009
Fonte: IBGE, Censos demográficos 1980, 1991 e 2000 e PNAD, 2009
Outras informações complementares indicam uma grande redução da PEA de menor escolaridade
(analfabetos até 3 anos de estudo) e também uma pequena redução do grupo de 4 a 10 anos de estudo.
Ao mesmo tempo houve um crescimento significativo da PEA com maior escolaridade (11 anos e mais),
que passou a ser o maior grupo da PEA a partir de 2009. Sem dúvida, uma força de trabalho mais
educada é essencial para uma economia mais produtiva e com melhor qualidade de vida para todos.
Resta, porém, a questão da qualidade da educação brasileira; a posição ocupada pelo Brasil nos testes
22
internacionais de leitura, ciência e matemática mostra repetidamente o fosso que ainda existe nesse
particular, em relação a muitos outros países, desenvolvidos ou em desenvolvimento.
Os últimos anos da década passada foram marcados pelo crescimento do emprego formal (ganho de
direitos legais) e redução do desemprego. Considerando as taxas médias anuais, a queda no desemprego
foi de 12,3% em 2003, para 7,9% em 2008, e para 6,7% em 2010. Embora o Brasil ainda esteja longe de
atingir o “pleno emprego decente”, o novo quinquênio (2011-2015) começa com o melhor cenário dos
últimos 30 anos. Já existem diversos líderes empresariais reclamando da escassez de mão-de-obra (FSP,
27/12/2010). Porém, embora o Brasil possa apresentar “apagão” de mão-de-obra em alguns setores
específicos da produção que precisam de alguma força de trabalho mais especializada ou em regiões que
contam com investimentos elevados para projetos especiais, o país ainda conta com crescimento
absoluto da PIA e tem uma grande parcela da população fora da PEA ou em situação de informalidade
(isto é especialmente válido para a força de trabalho feminina). Uma escassez relativa desse fator de
produção, a mão-de-obra, pode contribuir para a elevação da produtividade do trabalho e melhorar a
renda média do país. Para administrar o país em situação de pleno emprego, o atual governo precisa
garantir uma gestão macroeconômica adequada, com responsabilidade fiscal, o que poderia acelerar o
processo de erradicação da pobreza, sem grandes pressões sobre a inflação.
c. Crescimento da classe média
O crescimento do emprego e da renda, conjugado com a redução do desemprego e das desigualdades
sociais tem permitido a formação de um mercado de consumo de massas e o crescimento do poder de
compra de parcelas cada vez maior da população brasileira. A pesquisa “A Nova Classe Média", da
FGV, coordenada por Néri (2008), mostra a emergência da nova classe média como um fenômeno que
aconteceu paralelamente à redução da pobreza. Em 1993, a classe média (ou classe C) representava
pouco menos de um terço da população brasileira (30,9%), ficou em torno de 36,5% entre 1995 e 2003,
passando, entre 2004 e 2008, de 42,26% para 51,89% do total de famílias. Pela primeira vez, o Brasil
pode ser definido como um país de “classe média”.
O fato é que houve uma aceleração do processo de mobilidade social ascendente durante os últimos anos
no Brasil, o que possibilitou o crescimento das classes A, B e C e uma diminuição das classes D e E. A
ampliação do consumo tem uma relação com a dinâmica demográfica, pois a redução da pobreza e o
crescimento da classe média contribuem para reduzir o tamanho das famílias. Arranjos familiares
menores e com menor razão de dependência, por outro lado, contribuem para a maior inserção da
mulher no mercado de trabalho, o que aumenta o poder de consumo das famílias. Existe, pois, uma
dupla determinação, com o crescimento do poder de consumo das famílias contribuindo para a redução
da fecundidade e o menor número de filhos (especialmente aqueles de 0 a 14 anos) colaborando para
maior renda per capita da família.
Os programas sociais têm sido importantes nesta mobilidade social. Com a crise econômica e a perda de
dinamismo do mercado de trabalho ocorrida na chamada “década perdida”, e sua prolongação durante a
década de 1990, os diversos governos brasileiros do período foram ampliando seus programas sociais,
visando mitigar as condições de pobreza do país. Para unificar os diversos programas existentes e
responder às questões de segurança alimentar previstas no Programa Fome Zero, foi criado no Brasil,
em 2003, durante o primeiro governo Lula, o Programa Bolsa Família (PBF).
23
O PBF é um programa de transferência direta de renda com condicionalidades (TRC), desenhado para
favorecer famílias em situação de pobreza e exclusão social, buscando garantir o direito básico à
alimentação e o exercício da cidadania, por meio do reforço ao acesso aos direitos elementares à
educação e à saúde, visando contribuir para que as famílias consigam romper o ciclo da pobreza entre as
sucessivas gerações. Ao contrário do BPC que beneficia mais as pessoas idosas e as pessoas com
deficiência, o PBF beneficia mais as famílias com filhos até 17 anos. Contudo o valor do benefício é
bem menor do que o do BPC e os reajustes não seguem o reajuste do salário mínimo. No ano de 2008, o
benefício médio mensal do PBF foi de R$ 80,00, o que representa cerca de 20% do valor do salário
mínimo (R$ 415,00), prevalecente na maior parte do ano.
O Gráfico 13 mostra a evolução do número de famílias beneficiadas pelo PBF e o montante de recursos
aplicados. Nota-se que já em 2003, ano da unificação dos diversos programas anteriores e de criação do
PBF, foram beneficiadas 3,6 milhões de famílias. Este número chegou a 12,9 milhões de famílias em
2010. Os recursos aplicados passaram de R$ 3,4 bilhões, em 2003, para R$ 13,1 bilhões em 2010. O
crescimento no número de famílias foi de 458% e o crescimento dos recursos de 485%, entre 2003 e
2010.
Gráfico 13: Número de famílias beneficiadas e recursos aplicados pelo PBF, Brasil: 2003-2010
Fonte: MDS, 2010. http://www.mds.gov.br/saladeimprensa/balanco-mds-2003-2010/bolsa-familia
Para o Brasil como um todo, 19,5% dos domicílios recebia o benefício. De modo geral, pode-se dizer
que os Estados menos desenvolvidos são os que apresentam os maiores percentuais de beneficiários do
PBF, enquanto os Estados mais desenvolvidos apresentavam os menores percentuais, sendo que São
Paulo tinha 8% dos domicílios com famílias beneficiárias. O Estado de Santa Catarina é o que
apresentava o menor percentual de domicílios com famílias beneficiárias (6,9%), enquanto o Maranhão
apresentava um percentual de 47,6%.
Os benefícios do Programa Bolsa Família são transferidos preferencialmente para as mulheres, sejam
elas as responsáveis pelo domicílio (em famílias monoparentais femininas) ou na condição de cônjuge.
Segundo avaliação do Cedeplar (2007) a transferência dos recursos para as mulheres aumenta o seu
“empoderamento”, mais no sentido de maior autonomia decisória quanto à alocação e uso de
determinados recursos domiciliares do que no sentido de maior igualdade de relações de gênero, com
24
efeito sobre a alocação dos recursos para os filhos residentes no domicílio. Considera-se que existe uma
relação positiva entre o poder de barganha das mulheres e uma melhor alocação de recursos para os
membros mais vulneráveis dos domicílios: as crianças. Segundo Cunha (2007): “Ao optar pela mulher
como responsável por receber o benefício, o Bolsa Família se transformou num importante instrumento
de autonomia e ‘empoderamento’ das mulheres. Esse gesto simples representa independência,
autonomia e cidadania para muitas delas”.
Contudo, diversos estudos sobre programas de transferência de renda mostram que privilegiar a mulher
como titular do benefício, ao invés de promover a autonomia feminina, pode fortalecer o papel
tradicional da mulher como dona de casa e cuidadora do lar, jogando nas costas da família a principal
responsabilidade pelo combate à pobreza: “Los programas refuerzan la división social de género en
donde las mujeres tienen que ser antes de todo buenas madres. La mujer esta considerada de manera
muy tradicional, sirviendo a su familia, guardiana de los valores de virtud moral, altruismo, sacrificio:
es un ‘ser para otros’” (Arriagada e Mathivet, 2007, p. 30).
Uma avaliação do Impacto do Programa Bolsa Família feita pelo Cedeplar (2007) considerou que as
famílias beneficiárias do PBF aumentaram seus gastos com alimentação, vestuários e educação infantil,
apresentando menor probabilidade de desnutrição infantil. As crianças têm menor evasão escolar e
maior tempo dedicado ao estudo; entretanto, o estudo não encontrou menores taxas de reprovação. A
cobertura de vacinação e de atendimento ao pré-natal não apresentou diferenças significativas para o
Brasil entre beneficiários e não beneficiários. Quanto à participação laboral, os resultados apontaram
diferenças positivas em termos da proporção de adultos ocupados no domicílio, indicando uma maior
participação no mercado de trabalho dos beneficiários do Programa, não confirmando a hipótese de
desincentivo ao trabalho (“efeito preguiça”). Contudo, foi constatada menor participação das mulheres
beneficiárias na força de trabalho.
Outra avaliação realizada pelo IBASE (2008), teve como foco a Segurança Alimentar e Nutricional das
Famílias Beneficiadas. A pesquisa confirmou também que os entrevistados declaram que o dinheiro do
PBF é gasto principalmente com alimentação, material escolar, vestuário e remédios. Na alimentação,
cresceu principalmente o consumo de proteínas de origem animal, leite e seus derivados, e no geral,
aumentou a dieta de alimentos de maior densidade calórica e menor poder nutritivo, fato que contribui
para a prevalência do excesso de peso e a obesidade.
A constatação dos efeitos positivos do PBF é geral, mas a criação de “portas de saída” para a população
pobre ainda é uma expectativa que não foi contemplada de forma adequada. Para que haja a verdadeira
erradicação da pobreza é preciso que se articulem as políticas de transferência de renda com a formação
de capital social e com uma política de pleno emprego produtivo e decente, articuladas com medidas de
conciliação entre trabalho e família, justiça de gênero e a universalização da educação brasileira. Só
assim a população pobre deixará de ser tutelada, atingirá a maioridade na vida social e conquistará a
emancipação individual e familiar, produzindo os seus próprios meios de vida, se construindo como
sujeito autônomo e solidário (Alves e Cavenaghi, 2009).
O PBF foi criado e ampliado em uma época marcada por altas taxas de desemprego, na qual a parcela
da população vivendo em condições de insegurança alimentar era muito alta. Contudo, para o próximo
quinquênio, a economia brasileira deverá manter níveis de atividade próximos do pleno emprego e o
problema da fome e da desnutrição tem se tornado menos grave do que o problema da obesidade. Nesta
25
situação é preciso repensar uma forma de articulação entre o PBF e a qualificação profissional e a
intermediação do emprego.
5) A dinâmica demográfica e as desigualdades de gênero no Brasil
A transição de uma sociedade patriarcal para uma sociedade pós-patriarcal, caracterizada por mudanças
significativas nas relações de gênero, assim como pelo crescimento da autonomia e o empoderamento
das mulheres, se situa entra as maiores transformações ocorridas na história brasileira recente. Durante a
maior parte do século XX, o país conviveu com os princípios discriminatórios e patriarcais do Código
Civil de 1916. Somente com a Constituição Federal de 1988 consagrou-se a igualdade entre homens e
mulheres como um direito fundamental. O princípio da igualdade entre os gêneros foi endossado no
âmbito da sociedade e da família. Estes avanços possibilitaram não apenas a redução das desigualdades
de gênero, mas como mostraram Alves e Correa (2009), já se registram no país “desigualdades reversas”
de gênero, além de crescentes desigualdades intra-gênero.
Para formular políticas adequadas visando a equidade de gênero, é preciso considerar não apenas os
aspectos que mantém a mulher em situação de desvantagem social, mas também as desigualdades em
sentido contrário, ou seja, aquelas que desfavorecem o sexo masculino, além das desigualdades entre
homens e entre mulheres.
a) Desigualdades de gênero na saúde
O aumento da esperança de vida, para ambos os sexos, é uma pré-condição para o desenvolvimento
econômico e social de qualquer país. A realização do potencial dos indivíduos só poder ocorrer
plenamente quando se supera a mortalidade precoce que ceifa a vida de homens e mulheres. O Gráfico
14, mostra os dados sobre a esperança de vida ao nascer, por sexo, no Brasil. Para ambos os sexos, a
esperança de vida passou de 70,5 anos no ano 2000 para 73,2 anos em 2009. No mesmo período, os
homens passaram de 66,7 anos para 69,4 anos e as mulheres de 74,4 anos para 77 anos.
Gráfico 14: Esperança de vida ao nascer, por sexo, Brasil – 2000-2009
Fonte: Ministério da Saúde/Datasus. IDB 2010
26
Portanto, a diferença de cerca de 7,5 anos a favor das mulheres tem se mantido na última década. Estas
diferenças de gênero prevalecem também em termos regionais, embora tenha se notado, para ambos os
sexos, um processo de convergência entre a esperança de vida das diferentes regiões, ainda que o
Nordeste continue bem abaixo das demais. O Norte segue a média nacional e as regiões Centro-Oeste,
Sudeste e Sul apresentam as taxas mais elevadas, sendo que esta última mantém a dianteira por todo o
período. As mulheres do Nordeste, em 2006, mesmo estando atrás das demais mulheres do país, tinham
esperança de vida maior do que a dos homens de todas as regiões do Brasil (Alves e Correa, 2009).
Segundo o Sistema de Informações sobre Nascidos Vivos – SINASC – do Ministério da Saúde, a razão
de sexo dos nascidos vivos no país tem permanecido em torno de 105 meninos para cada 100 meninas.
Ou seja, nascem 5% a mais de homens do que mulheres. Porém, a sobremortalidade masculina no Brasil
– diferentemente do que acontece na Ásia – se manifesta desde o primeiro ano de vida. Seria preciso
realizar estudos mais aprofundados para saber se essas diferenças se devem a fatores biológicos ou a
fatores sociais, como a negligência no cuidados dos bebês e crianças. O Gráfico 15 mostra que a
mortalidade infantil, do sexo masculino, em 1995-2000, era de 38,6 mortes no primeiro ano de vida para
cada 1.000 nascimentos de meninos e, para o sexo feminino, de 29,4 mortes por 1.000 meninas nascidas
vivas. Estes números caíram, respectivamente, para 26,9 por mil e 19,9 por mil, no quinquênio 2005-10.
Gráfico 15: Mortalidade infantil (0-1 ano) e na infância (0-5 anos), por sexo, Brasil, 1995-00 a 2045-50
Fonte: UN/ESA. World Population Prospects: The 2008 Revision. Visitado em 27/12/2010
A sobremortalidade masculina continua ao longo do ciclo de vida e tem se acentuado, de tal forma que a
razão de sexo tem se tornado cada vez menor, criando um superávit crescente de mulheres no Brasil. O
Gráfico 16 mostra que, até 1980, existia certo equilíbrio na razão de sexo no país (próxima de 100). A
partir dos anos 80, porém, o superávit de mulheres no país iniciou um processo de ampliação, o que
contrasta com o superávit de homens no mundo (razão de sexo acima de 100).
Em grande parte, a feminização da população brasileira pode ser explicada pelo aumento das mortes por
causas externas (acidentes de trânsito e violências) que atinge, em maior proporção, os homens e tem
afetado a dinâmica demográfica do Brasil a partir dos anos de 1980. O Gráfico 17 mostra o número de
óbitos por causas externas, por sexo, entre 1991 e 2010. Nota-se que o número de mortes masculinas
ficou acima de 100 mil por ano na última década e o número de mortes femininas ficou acima de 20 mil
27
a partir de 2004. Nos 20 anos em questão, morreram 2.010.426 homens contra apenas 400.914 mulheres,
uma proporção de 5 para 1.
Gráfico 16: Razão de sexo no Brasil e no mundo e superávit de mulheres no Brasil, 1950-2050
Fonte: UN/ESA. World Population Prospects: The 2008 Revision. Visitado em 27/12/2010
Segundo dados dos censos demográficos, o Brasil possuía um superávit de 1,86 milhões de mulheres em
1991, 2,67 milhões em 2000 e 3,95 milhões em 2010. Portanto, o superávit feminino aumentou em 2,1
milhões entre 1991 e 2010. Neste período, o número de mortes por causas externas foi de 2,01 milhões
para os homens e de 400,9 mil para as mulheres. Portanto, a sobremortalidade masculina por causas
externas foi de 1,6 milhões entre 1991 e 2010, o que representa 77% do aumento do superávit feminino
na população brasileira, no período. Estima-se que o superávit de mulheres chegue a 7 milhões no ano
2050. Depois da Rússia, o Brasil é, entre as grandes nações, o país mais feminino do mundo. O excesso
de mulheres está concentrado nas áreas urbanas e é crescente com o avanço das idades.
Gráfico 17: Número de óbitos por causas externas, por sexo, Brasil, 1991-2010
Fonte: Ministério da Saúde - Sistema de Informações sobre Mortalidade – SIM. Visitado 28/12/2010
Nota: 2009 = dados preliminares; 2010 = estimativa.
28
No ano de 2008 (últimos dados desagregados disponíveis), o sexo masculino representou 83% do total
de mortos em acidentes, homicídios e outras causas externas. Os acidentes mataram 47.354 homens
(42,6%), as violências 52.258 homens (47,1%) e as mortes de intenção indeterminada e demais causas
ceifaram a trajetória de outros 11.453 homens (10,4%). Os homicídios eliminaram a vida de 45.064
homens em 2008. As mortes entre o sexo masculino se concentravam na faixa dos 20 aos 39 anos
(50,4%) e entre os homens de cor parda (48,1%), segundo dados do Ministério da Saúde (2010). No
caso das mulheres, a maioria (12.978 mortes, o que representou 57,8% do total de mortes femininas das
mortes por causas externas) deveu-se aos acidentes. As violências vêm em segundo lugar, com 5.781
óbitos, representando 25,8% do total de mortes femininas. O perfil etário e étnico das mulheres que
perderam a vida por causas externas é diferente. Do total de vítimas femininas, 33,8% tinham 60 anos ou
mais, sendo a maioria (53,3%) de cor branca.
Os óbitos por causas externas não são fatalidades biológicas, mas sim mortes que poderiam ser evitadas
com ações de infra-estrutura e educação para prevenir acidentes e políticas públicas para diminuir a
violência. O custo social destas mais de 130 mil mortes anuais por causas externas no Brasil é
incalculável. Os pais perdem os filhos que criaram com sacrifício e carinho. Esposas e maridos perdem
seus cônjuges. Filhos perdem seus pais. Famílias são dilaceradas e colocadas em situação de
vulnerabilidade. Empresas perdem seus empregados e a sociedade perde seus cidadãos quando estão nas
idades mais produtivas em termos econômicos, sociais e culturais.
Além disto, existem outros custos para a sociedade e para o sistema de saúde, pois as internações por
causas externas representaram cerca de 8% do total de internações em 2008, o quinto maior motivo de
hospitalizações. Isso significa que, para cada morte, outras sete pessoas são internadas. São muitos anos
de vida perdidos pela mortalidade ou morbidade. Os orçamentos dos ministérios da saúde e da
previdência são os mais afetados. Portanto, existe uma desigualdade reversa de gênero, com os homens
sendo as principais vítimas das mortes por causas externas. Mas o desequilíbrio também acontece,
mesmo que em menor proporção, devido à sobremortalidade masculina por AIDS.
O Gráfico 18 mostra o número de óbitos por AIDS, por sexo, e a percentagem de mortes femininas, no
Brasil, entre 1991 e 2010. Nota-se que o número de mortes masculinas atingiu o máximo em 1995, com
11.599 óbitos e começou a cair até chegar em 7.753 óbitos em 2009/2010. O número de mortes
femininas passou de 1.229 óbitos em 1991, para 3.828, em 1996, caindo ligeiramente nos anos seguintes
e atingindo o máximo de 4.060 óbitos, em 2009/2010. Nos vinte anos em questão, morreram 163.447
homens e 65.257 mulheres, por causa da AIDS. O percentual de óbitos femininos dobrou ao longo do
período, passando de 17%, em 1991, para 34%, em 2010. Mesmo assim, ainda morrem 2 homens para
cada mulher e, nas duas décadas referidas no Gráfico, morreram no total quase 100 mil homens a mais
do que mulheres.
Nota-se que no Brasil existe uma inversão no excedente populacional nos grupos etários quinquenais.
Até os 24 anos, a pirâmide populacional mostra um superávit de homens. A partir dos 25 anos passa a
existir um superávit crescente de mulheres. Esta inversão também ocorre nos EUA, mas as mulheres
passam a ser maioria apenas após os 40 anos de idade. No caso da China, o superávit feminino só
acontece depois dos 70 anos. Esta inversão “precoce” no caso brasileiro se deve às mortes por causas
externas.
29
Gráfico 18: Número de óbitos de AIDS, por sexo, percentagem de mortes femininas, Brasil, 1991-2010
Fonte: Ministério da Saúde - Sistema de Informações sobre Mortalidade – SIM. Visitado 28/12/2010 Nota: 2009 = dados preliminares; 2010 = estimativa.
Este desequilíbrio na razão de sexo da população adulta brasileira traz diversas conseqüências ainda não
suficientemente estudadas. Um desequilíbrio que já pode ser notado acontece no mercado matrimonial,
especialmente nas áreas urbanas que concentram maior percentual da população feminina. A chamada
“pirâmide da solidão”2 é uma constatação de que o número de mulheres sozinhas (sem cônjuge) cresce
com o avanço da idade e se deve à sobremortalidade masculina.
b) Desigualdades de gênero na educação
A educação é outra área em que houve um grande avanço no posicionamento das mulheres e hoje existe
uma desigualdade reversa contundente, com o sexo feminino apresentando maiores níveis educacionais
do que o sexo masculino em todos os níveis educacionais. Embora a educação brasileira esteja abaixo da
média e da qualidade daquela de outros países com o mesmo nível de desenvolvimento, os dados
mostram uma evolução geral positiva, com redução das desigualdades regionais, raciais, situação de
domicílio, e outras.
Em termos de desigualdades de gênero, os homens tinham 5,1 anos médios de estudo em 1992 e
passaram para 7,4 anos em 2009 (aumento de 44%). Já as mulheres tinham 5,2 anos de estudo em 1992,
e passaram para 7,7 anos em 2009 (aumento de 47%). Portanto, as mulheres possuem níveis médios de
instrução maiores do que os dos homens e esta diferença está aumentando. Isto é o exemplo clássico de
desigualdade reversa, pois as mulheres tiveram maiores dificuldades de acesso à escola na maior parte
dos 500 primeiros anos da história do Brasil, mas ultrapassaram os homens e estão ampliando a
vantagem conquistada.
O processo de reversão das desigualdades de gênero no Brasil aconteceu ao longo de décadas (Beltrão e
Alves, 2009). As mulheres brasileiras ainda são maioria entre a população analfabeta, mas isto se
2 Expressão cunhada pela Dra Elza Berquó ao identificar a tendência ao crescimento da proporção de mulheres sós nas
idades mais avançadas.
30
explica pelo peso das gerações mais idosas, nas quais as mulheres eram fortemente discriminadas em
termos educacionais. Nas gerações mais jovens, as mulheres conseguiram superar os homens no ensino
fundamental e, especialmente, no ensino médio e superior. Neste último, 60% dos formandos são do
sexo feminino. Mais recentemente, a partir de 2004, as mulheres são maioria também entre os titulados
dos cursos de doutorado no Brasil.
Em síntese, os dados mostram que as mulheres tiveram ganhos educacionais inequívocos nas últimas
décadas. A despeito da qualidade da educação brasileira, a análise dos diferenciais de educação entre
homens e mulheres, mostra que o “sexo fraco” está cada vez mais forte, quando o assunto é níveis de
escolaridade. Em outras dimensões sociais e econômicas da sociedade, particularmente no mercado de
trabalho, os diferenciais de gênero ainda são grandes, com as mulheres em desvantagem. Mas quando se
trata de observar o hiato de gênero na educação, o Brasil já superou as metas estabelecidas na CIPD do
Cairo/1994 e nos Objetivos do Desenvolvimento do Milênio. Hoje, nesta área, as desigualdades são
reversas. O desafio atual é incrementar a educação dos homens e melhorar a qualidade da educação para
ambos os sexos.
c) Desigualdades de gênero no mercado de trabalho
Embora as mulheres tenham revertido as desigualdades de gênero na educação, ainda não conseguiram
eliminar as desigualdades de gênero no mercado de trabalho, mesmo que os hiatos de atividade e
rendimento tenham se reduzido. O desenvolvimento econômico e social de um país depende do pleno
emprego dos insumos produtivos disponíveis e do crescimento da produtividade dos fatores de
produção, especialmente das mulheres que são mais da metade da população e possuem dificuldades
para uma inserção de qualidade no mercado de trabalho.
O Brasil apresentou um grande crescimento da População Economicamente Ativa (PEA) nas últimas 6
décadas. A PEA total passou de 17,1 milhões de pessoas, em 1950, para quase 101,1 milhões de
pessoas, em 2009 (aumento de 5,9 vezes). A PEA masculina passou de 14,6 milhões para 56,7 milhões
(incremento de 3,9 vezes), enquanto a PEA feminina teve uma elevação extraordinária, passando de 2,5
milhões, em 1950, para 44,4 milhões, em 2007 (crescimento de 17,8 vezes). Parte desta expansão deve-
se a mudanças metodológicas nos instrumentos de coleta do censo e das pesquisas domiciliares, mas a
tendência de aumento de longo prazo é inegável e são as mulheres a principal força por detrás do
crescimento da força de trabalho no Brasil.
O Gráfico 19 mostra o comportamento das taxas de atividade, para homens e mulheres, entre 1950 e
2009. Observa-se redução das taxas masculinas, que passaram de 80,8% em 1950, para 72,3% em 2009,
e o aumento das taxas femininas, que passaram de 13,6% para 52,7%, no mesmo período. A linha do
Gráfico mostra a tendência de decréscimo do hiato de gênero, já que existe um processo de
convergência no nível de inserção de ambos os sexos na população economicamente ativa.
Evidentemente, o aumento da participação feminina no mercado de trabalho não eliminou os problemas
de segregação ocupacional e discriminação salarial, embora estes tenham sido abrandados, como será
visto mais adiante.
Alguns estudiosos consideram que este aumento da participação feminina no mercado de trabalho
ocorreu em função da necessidade de uma complementação da renda familiar por parte das mulheres
(cônjuges ou filhas), em uma situação de redução do rendimento per capita. Contudo, como mostraram
31
Alves e Correa (2009), esta argumentação não considera que as mulheres continuam se inserindo no
mercado de trabalho nos momentos de aumento da renda domiciliar e são, principalmente, aquelas com
maior nível educacional (e com salários acima do salário mínimo) que possuem as maiores taxas de
atividade, inclusive as que moram sozinhas.
Gráfico 19: Taxas de participação na PEA, por sexo, Brasil – 1950-2009
Fonte: IBGE. Censos Demográficos de 1970, 1980, 1991 e 2000 e PNAD 2009
O Gráfico 20 mostra que, na última década, houve significativa melhora do nível educacional da
população ocupada. Para a força de trabalho feminina, o grupo de mulheres com 11 ou mais anos de
estudo é maioria, empatando em termos absolutos e relativos com os homens de mesmo nível
educacional. Um fato que merece destaque é que, para o conjunto da PEA com 11 anos ou mais de
estudo, as mulheres superaram os homens neste segmento mais escolarizado, sendo que, em 2009, já
existiam mais de 20 milhões de mulheres com mais de 11 anos de estudo na PEA.
Gráfico 20: Percentagem da PEA por grupos de anos de estudo, por sexo, Brasil, 2001-2009
Fonte: PNADs 2001 a 2009.
32
Em termos de remuneração, entretanto, as mulheres continuam muito atrás dos homens, embora existam
diferenças regionais significativas. O Gráfico 21 mostra o valor do rendimento médio mensal das
pessoas de 10 anos ou mais de idade (em Reais), por sexo e segundo as 5 regiões do Brasil, entre 2001 e
2009. Nota-se, pelas colunas, que o hiato de gênero do rendimento mensal (diferença do rendimento de
homem e mulher sobre o rendimento total) diminuiu um pouco ao longo da década em questão. Os
maiores rendimentos são encontrados entre os homens do Sul, Sudeste e Centro-Oeste e os menores
entre as mulheres do Norte e Nordeste. Mas as mulheres do Sudeste e Centro-Oeste ganhavam mais, em
nível agregado, do que os homens do Norte e Nordeste. Isto mostra que as desigualdades de gênero são
perpassadas por desigualdades regionais e devem ser consideradas para se entender as desigualdades
intra-gênero. Por exemplo, as desigualdades, em termos de rendimento, são maiores entre homens e
mulheres do Sudeste do que no Nordeste. Porém, as mulheres do Sudeste, ganham mais do que os
homens do Nordeste, a despeito das maiores desigualdades de gênero na região Sudeste.
Gráfico 21: Valor do rendimento médio mensal de todos os trabalhos das pessoas de 10 anos ou mais de idade (em Reais), ocupadas na semana de referência, por sexo e região, 2001-2009
Fonte: PNADs 2001 a 2009.
Os diferenciais de rendimento entre homens e mulheres precisam considerar o efeito da menor jornada
de trabalho remunerado das mulheres (em função da maior jornada de trabalho não remunerado na
economia do cuidado). O Gráfico 22 mostra a relação entre rendimento-hora da população feminina em
relação à masculina, segundo classes de anos de estudo. Observa-se que as mulheres ganham menos do
que os homens, porém esta diferença tem diminuído. Em 1998, as mulheres recebiam 81,9% do
rendimento dos homens e passaram a receber 84,1% em 2008. Nota-se que os diferenciais de
rendimento por gênero aumentam com o nível de escolaridade, o que pode estar relacionado com a
dificuldade das mulheres ocuparem ou manterem os postos de decisão e administração e também ao fato
de que estes diferenciais são maiores nas gerações com mais tempo de ocupação.
Outro fator que contribui para as desigualdades de gênero é que o grau de informalidade e o desemprego
das mulheres tem se mantido mais elevado do que o dos homens durante a década passada, embora a
População Economicamente Ativa (PEA) feminina tenha crescido mais rapidamente do que a masculina.
Um dos fatores que contribui para o desequilíbrio entre oferta e demanda é a segregação ocupacional
que torna o leque de profissões femininas mais estreito do que o masculino. Assim, ao oferecer mais
33
opções para os homens, o mercado atingiria um equilíbrio em um nível mais baixo de desemprego para
os homens, enquanto a disputa pelas poucas ofertas de emprego feminino torna o desemprego das
mulheres e a informalidade um fenômeno mais frequente.
Gráfico 22: Relação entre rendimento-hora da população feminina em relação à masculina, segundo classes de anos de estudo - Brasil, 1998 e 2008
Fonte: IPEA. Relatório Nacional de Acompanhamento – ODM, Brasília, março 2010
Este quadro poderia mudar na medida em que houvesse um quadro de pleno emprego na economia. De
fato, como mostra o Gráfico 23, o grau de informalidade no mercado de trabalho e o desemprego
vinham diminuindo de 2004 a 2008. A crise do ano 2009 não aumentou o grau de informalidade, nem de
homens e nem de mulheres. Neste sentido, para o período em questão, não tem fundamento a afirmação
de que a entrada da mulher no mercado de trabalho é acompanhada por “perda de direitos legais”.
Porém, houve uma elevação da taxa de desemprego para ambos os sexos.
Gráfico 23: Grau de informalidade: percentagem de pessoas de 10 anos e mais de idade, ocupadas na semana de referência e que não contribuíram para a previdência, por sexo, Brasil, 2002-2009
Fonte: PNADs 2001 a 2009.
34
O nível de inserção da força de trabalho masculina chegou próxima do pleno emprego no final de 2010.
Se a economia continuar crescendo e gerando emprego no ano de 2011, haverá pouco espaço para
redução do desemprego masculino, o que tenderá a favorecer a força de trabalho feminina que será a
reserva de mão-de-obra disponível nos próximos anos. Se houver crescimento econômico no próximo
quinquênio (2011-2015), as mulheres tendem a ganhar com a melhoria do mercado de trabalho, podendo
haver redução do desemprego e da informalidade da PEA feminina (especialmente das jovens), além de
redução das disparidades salariais. Portanto, um novo ciclo de crescimento econômico pode ser
fundamental para a redução das desigualdades de gênero no mercado de trabalho.
Os dados acima mostram que, embora ainda persistam desigualdades que desfavorecem as mulheres no
mercado de trabalho, as diferenças de gênero têm diminuído ao longo dos anos. Para completar esta
análise é preciso considerar a política de previdência social que pode ter o poder de amenizar as
desigualdades do mundo do trabalho.
A Tabela 3 mostra que, mesmo sendo um contingente minoritário no mercado de trabalho, as mulheres
predominam entre a população coberta pela previdência social. Considerando-se somente os
aposentados, os homens são maioria, passando de 7,6 milhões em 2001, para 9,3 milhões em 2009.
Entre os pensionistas, as mulheres são ampla maioria, passando de 3,7 milhões em 2001, para 4,3
milhões em 2009. Somando-se os aposentados e pensionistas, as mulheres eram 10,2 milhões em 2001 e
passaram para 13,1 milhões em 2009, enquanto os homens correspondiam a 8,1 milhões e 10,2 milhões,
no mesmo período. Entre as pessoas que acumulam aposentadoria e pensão, o sexo feminino também
predomina e as mulheres já somavam 1,6 milhões de pessoas nesta situação, em 2009. Pode-se
considerar que a política previdenciária brasileira tem um desenho pró-mulher, já que as meulheres, em
média, contribuem por menos tempo e passam mais tempo na situação de beneficiárias, quer seja como
aposentadas ou pensionistas.
Tabela 3: Número de pessoas aposentadas e/ou pensionistas (em mil), segundo sexo, Brasil – 2001-2009
Fonte: IBGE/. Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios – PNAD 2001 a 2009
Categorias Sexo 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009
Total 15.333 16.176 16.920 17.663 18.214 19.077 19.955 22.784 23.359
Homem 8.065 8.363 8.763 8.735 9.047 9.201 9.623 9.862 10.236
Mulher 10.232 10.762 11.216 11.311 11.823 12.000 12.503 12.922 13.123
Total 13.252 13.829 14.328 14.206 14.531 14.853 15.273 16.195 16.522
Homem 7.627 7.907 8.235 8.201 8.403 8.557 8.771 9.082 9.329
Mulher 5.625 5.922 6.093 6.005 6.128 6.296 6.502 7.113 7.192
Total 4.059 4.202 4.416 4.567 4.856 4.757 5.292 4.783 4.894
Homem 341 347 395 406 477 437 642 531 597
Mulher 3.718 3.855 4.021 4.160 4.379 4.321 4.651 4.252 4.297
Total 986 1.094 1.235 1.273 1.482 1.590 1.561 1.807 1.943
Homem 97 108 133 128 166 207 210 249 310
Mulher 889 985 1.102 1.146 1.316 1.383 1.351 1.557 1.633
Total de
aposentados e
pensionistas
Somente
aposentados
Somente
pensionistas
Aposentados e
pensionistas
35
d) Desigualdades de gênero no uso do tempo
A literatura mostra que as mulheres estão inseridas em menor número do que os homens nas atividades
produtivas remuneradas e possuem jornadas mais curtas de trabalho (Alves e Correa, 2009). Mas o
contrário acontece com as atividades não remuneradas e os afazeres domésticos. Quando se trata dos
trabalhos realizados na esfera da reprodução, mas que não são contabilizados na população
economicamente ativa, as mulheres são ampla maioria.
Segundo a PNAD/2005, 109,2 milhões de pessoas de 10 anos ou mais de idade declararam exercer
atividades relacionadas com os afazeres domésticos, no Brasil; deste conjunto, 71,5 milhões eram
mulheres. Em termos absolutos, é a população adulta de 25 a 49 anos de idade que mais realiza afazeres
domésticos. Não obstante, considerando a população em cada grupo etário, observa-se que é a
população de 50 a 59 anos de idade que despende maior parte do seu tempo em afazeres domésticos
(24,3 horas semanais). As desigualdades de gênero na realização dessas atividades são ainda mais
visíveis quando se considera a população total de acordo com o sexo e os grupos de idade. Verificou-se
que somente 51,1% dos homens realizam afazeres domésticos enquanto que, entre as mulheres, esse
percentual é de 90,6%. É no Nordeste que se observa a menor participação dos homens nos afazeres
domésticos (46,7%), enquanto que no Sul se evidencia a maior taxa (62%). Uma possível explicação
para esta participação um pouco mais baixa dos homens nordestinos nos afazeres domésticos pode estar
ligada aos aspectos culturais locais, que valorizam o “machismo” já que existe uma forte correlação
positiva entre a realização de afazeres domésticos e sexo feminino (Soares e Sabóia, 2007).
No Gráfico 24, verifica-se que, no total, as mulheres dedicavam 25,1 horas semanais aos afazeres
domésticos, contra 10,2 horas dos homens, em 2009. A análise por grupos etários mostra que o tempo
dedicado aos afazeres domésticos cresce à medida que aumenta a idade para ambos os sexos. Isto
porque os filhos que moram com os pais dedicam menos tempo aos afazeres domésticos. Mas o
destaque mais contrastante é a grande diferença no tempo dedicado aos afazeres domésticos, por sexo.
Além disto, apenas 49% dos homens contra 88,2 das mulheres fazem trabalhos domésticos.
Gráfico 24: Número médio de horas semanais gastas em afazeres domésticos das pessoas de dez anos ou mais de idade, por sexo, segundo grupos de idade, Brasil – 2009
Fonte: IBGE, PNAD 2009 (microdados)
36
A sobrecarga de trabalhos domésticos (ou da economia do cuidado) contribui para reduzir a inserção da
mulher na PEA, para a menor jornada diária e para a maior presença feminina nos empregos informais.
A dupla ou tripla jornada feminina é um dos elementos centrais da desigualdade de gênero entre
atividades produtivas e reprodutivas. Por exemplo, famílias com muitos filhos pequenos exigem maior
presença feminina no cuidado de seus membros, já que existe uma divisão sexual do trabalho que limita
o potencial produtivo das mulheres ao responsabilizá-las pela economia do cuidado. O direito da mulher
ao emprego remunerado tem obtido apoio crescente, inclusive de organizações empresariais. Klaus
Schwab, fundador e Chefe-executivo do World Economic Fórum, de Davos, na Suíça, escreveu o
seguinte no prefácio do relatório do Global Gender Gap Index (GGGI):
“Durante o ano passado, o mundo passou pela maior recessão, em quase um século. É claro que
a recuperação vai exigir, entre outras coisas, o melhor do talento, das idéias e da inovação.
Portanto, é mais importante agora do que nunca que os países e as empresas prestem atenção a
um dos fundamentais pilares do crescimento econômico de que dispõem: as habilidades e os
talentos dos recursos humanos do sexo feminino” (2009, p. V).
A economia do cuidado envolve a criação dos filhos, a guarda das crianças, a atenção com os parentes
idosos ou com necessidades especiais, as atividades de educação, saúde e dos afazeres domésticos,
assim como a convivência das pessoas que cuidam umas das outras e do ambiente natural. No entanto,
da economia do cuidado depende toda a reprodução humana e, portanto, a própria existência da
produção e do mercado.
Segundo o informe da CEPAL, “Que tipo de Estado? Que tipo de igualdade?” a conciliação entre a vida
profissional e familiar baseada na redistribuição das tarefas de cuidado entre o Estado, o mercado e as
famílias continua a ser o ponto cego das políticas públicas da América Latina e do Caribe. Existe um
lapso entre as obrigações legais para com o cuidado de ambos os cônjuges em relação com seus
descendentes e ascendentes e as normas, os serviços, a infraestrutura e as provisões disponíveis para sua
realização. Nesta situação, as desigualdades de gênero são evidentes. Segundo Alicia Bárcena,
Secretária Executiva da CEPAL, na apresentação do documento, não será possível conseguir igualdade
de trabalho para as mulheres enquanto não for resolvida a carga de trabalho não remunerado e de
cuidados que recai historicamente sobre elas.
Portanto, existe a necessidade de articulação entre as esferas da produção e da reprodução e do sistema
de emprego e o cuidado das famílias e indivíduos. Na perspectiva da titularidade dos direitos, as
políticas públicas devem garantir o acesso ao emprego, ao mesmo tempo em que provê serviços públicos
para aqueles que dão e recebem cuidados. Conciliar trabalho e família é fundamental para que haja uma
maior equidade entre homens e mulheres e para que a articulação entre Estado, Família e Mercado possa
se dar em benefício das pessoas e da ascensão social ascendente de todos, com equidade de gênero
(Alves e Martine, 2010).
e) Desigualdades de gênero nos espaços de poder
Os avanços que as mulheres brasileiras conseguiram na educação, no mercado de trabalho, nos esportes,
na previdência e na sociedade como um todo ainda não se traduziram em aumentos significativos nas
diversas esferas dos espaços de poder público e privado. Porém, houve uma grande novidade no ano de
2010, pois o Brasil elegeu a primeira mulher para a Presidência da República, cargo máximo do poder
público do país. Esta eleição não deixa de ser surpreendente, pois o Brasil tem uma das participações
37
mais baixas do mundo de mulheres na Câmara Federal de Deputados (ocupa o 140º no ranking mundial
da participação política – IPU/2010). A eleição de Dilma Rousseff colocou o Brasil entre o seleto clube
de 16 países que têm mulheres no comando máximo da política.
A presidenta Dilma indicou nove mulheres para o ministério que tomou posse em 01/01/11. A presença
de nove mulheres no primeiro escalão, entre 37 ministros, significa um espaço de 24% para o sexo
feminino, o que é um recorde histórico para os padrões brasileiros. Contudo, ficou muito abaixo da meta
de um gabinete paritário que é um objetivo da campanha 50/50 (Women’s Lobby 50/50 Campaign for
Democracy). Já na América Latina foi aprovado, em 2007, o chamado “Consenso de Quito” que foi um
acordo assinado pelo Brasil na 10ª Conferência Regional sobre a Mulher da América Latina e do Caribe,
ocorrida no Equador. Nesta Conferência regional foi reforçada a idéia de que a paridade de gênero é
essencial para o desenvolvimento e a democracia.
Evidentemente, o Brasil está muito longe de atingir a paridade de gênero nos espaços de poder. Mas o
povo brasileiro deu um passo à frente na luta por uma maior igualdade de gênero ao sufragar com 2/3 do
total de votos as duas mulheres candidatas em 2010 à Presidência: Dilma Rousseff com 47,7 milhões de
votos, e Marina Silva com 19,6 milhões de votos.
O censo demográfico de 2010 indicou que o Brasil tinha 3,95 milhões de mulheres acima do número da
população masculina. Já o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) mostrou que havia um excedente de 5
milhões de mulheres no eleitorado. O maior número do TSE se deve ao fato do eleitorado abarcar a
população acima de 16 anos, sendo que o superávit da população masculina, no Brasil, está abaixo de 20
anos. Ou seja, o envelhecimento da população brasileira tende a fortalecer a força do voto feminino.
Porém este poder de voto das mulheres não tem se traduzido em conquista de cadeiras no parlamento ou
no executivo. A lei de cotas que estabelece um mínimo de 30% para as candidaturas de cada sexo não
tem sido respeitada pelos partidos. As mulheres são cerca de 12% nas Câmaras Municipais, 13% nas
Assembléias Legislativas, 15% no Senado, 9% nas prefeituras e 7,2% nos governos estaduais.
A presidenta Dilma Rousseff disse em seu discurso de vitória que pretende honrar as mulheres e lutar
por igualdade de oportunidade para ambos os sexos. No ano de 2012 – quando se comemora 80 anos da
conquista do direito de voto feminino - vai haver eleições municipais. Pode ser um bom momento para
se garantir paridade de gênero na disputa aos cargos de vereadores nas eleições municipais e começar a
conquista de espaços no poder a partir da base municipal.
6) População e Desenvolvimento Sustentável no Brasil
Não há dúvidas de que as mudanças climáticas provocadas pelo aumento acelerado da emissão de gases
de efeito estufa constituem uma ameaça crescente para a humanidade. A concentração de CO2 na
atmosfera passou de cerca de 280 ppm (partes por milhão) em 1800, para 294 ppm em 1900, 310 ppm
em 1950 e 370 ppm no ano 2000. O aumento de CO2 ficou em torno de 5% no século XIX, também de
5% na primeira metade do século XX, mas chegou a quase 20% na segunda metade do século XX.
Portanto, o maior aumento de concentração de gases de efeito estufa coincidiu com o período de maior
crescimento da economia internacional.
38
A primeira década deste século já bateu todos os recordes de temperatura e foi a mais quente dos últimos
160 anos (quando se tem registros das variações térmicas mundiais). Eventos climáticos severos estão se
acelerando à medida que as crescentes concentrações de gases do efeito estufa alteram a nossa atmosfera
global. Em 2011, o Brasil foi novamente uma das vítimas destas calamidades de proporções bíblicas que
assolam segmentos do nosso habitat terrestre com freqüência e intensidade crescentes.
No mundo inteiro, o crescimento econômico é considerado essencial para reduzir a pobreza e alcançar o
“desenvolvimento”. Ou seja, o crescimento é bom para a geração de emprego e para a inclusão social.
Entretanto, o aumento da produção e do consumo nos moldes atuais amplia os desafios em relação aos
problemas ambientais do país e do mundo. O rápido desenvolvimento da economia verde e a mudança
da cultura de consumo são medidas essenciais e urgentes para controlar a trajetória do aquecimento
global e para evitar expor a biosfera e as gerações futuras a significativos riscos ambientais e de escassez
ecológica.
No Brasil, a relação entre consumo e aumento de CO2 ainda é ocultado pelos efeitos devastadores do
desmatamento. Segundo o Inventário Nacional de Emissões e Remoções Antrópicas de Gases de Efeito
Estufa a contribuição brasileira atual nas emissões de CO2 advém principalmente do desflorestamento.
Em 2005, das 1,57 bilhões de toneladas de CO2 lançadas pelo Brasil na atmosfera (69% a mais do que o
registrado em 1990) 76,3% vieram da mudança no uso da terra e de florestas e 22% da queima de
combustíveis fósseis e emissões fugitivas do setor energia.
Portanto, controlar o desmatamento é uma política fundamental para a mitigação do efeito estufa no
Brasil. A estimativa é que o país possui uma área de aproximadamente 5,2 milhões de km2 de matas, ou
60,7% do território brasileiro coberto por florestas naturais (principalmente Amazônia, Cerrado e
Caatinga). No caso da Amazônia Legal, os últimos dados do monitoramento apontam para uma redução
do desmatamento e a meta do governo é de reduzir o índice de desmatamento na Amazônia em 80% até
2020 (IPEA, 2010).
Ao mesmo tempo, porém, a combinação do tamanho populacional brasileiro com suas perspectivas de
rápido crescimento econômico representa uma ameaça muito maior no médio e longo prazo. Se a pegada
ecológica brasileira crescer no mesmo ritmo e atingir os níveis atuais dos países mais desenvolvidos, o
Brasil terá um impacto muito forte sobre o meio ambiente, dado seu peso demográfico.
Nas discussões atuais sobre o aquecimento global, o crescimento populacional aparece frequentemente
como um dos grandes responsáveis pelas mudanças climáticas, mas, ao contrário dos outros, imagina-se
que este é um culpado que poderia ser facilmente reduzido via programas massivos de planejamento
familiar. A realidade é bem mais complexa, mas não cabe abordá-la novamente aqui (ver Martine,
2009). Por outro lado, é relevante examinar aqui o efeito do crescimento e da distribuição populacional
brasileira sobre as mudanças ambientais para identificar possíveis linhas de ação política na perspectiva
demográfica.
A população brasileira cresceu 10 vezes no século XX, passando de pouco mais de 17 milhões de
habitantes, em 1900, para 170 milhões, em 2010. Foi um dos maiores aumentos populacionais do
mundo, o que não impediu que a economia crescesse em níveis elevados. O PIB brasileiro cresceu 127
vezes no século XX. Portanto, a renda per capita brasileira cresceu 12,7 vezes, no período. Se
considerarmos que a pegada ecológica é proporcional à renda, o impacto da população brasileira sobre o
39
meio ambiente não foi de 10 vezes, mas sim mais próximo das 127 vezes do crescimento do PIB no
século passado (Alves e Bruno, 2006).
Entretanto, para as próximas décadas, conforme discutido anteriormente, a fecundidade brasileira já se
encontra em níveis abaixo de reposição, seu ritmo de crescimento populacional é decrescente e, em duas
décadas mais, seu volume absoluto deverá começar a declinar. Segundo projeção do IPEA (Camarano e
Kanso, 2009) a população brasileira chegaria ao máximo de 207 milhões em 2030 e começaria a
diminuir em seguida, chegando a 205 milhões, em 2040. O crescimento atual é essencialmente inercial,
ou seja, se deve mais ao tamanho do contingente feminino em idades reprodutivas – resultado da alta
fecundidade em gerações anteriores – do que às taxas de fecundidade atual.
Portanto, no caso brasileiro, muito pouco se pode fazer em termos de alterar a relação entre tamanho
populacional e impactos ambientais. É verdade que ainda existe uma demanda insatisfeita por
contraceptivos que deveria ser objeto de medidas mais eficazes por parte da saúde pública, mas atender
essa demanda no Brasil pouco alteraria o nível da fecundidade ou o ritmo de crescimento. Porém, o
crescimento da economia nos próximos 40 anos deve ser bem maior. Os prognósticos variam nos
detalhes, mas é cada vez mais generalizada, entre analistas nacionais e estrangeiros, a crença de que a
economia brasileira vai apresentar um crescimento econômico significativo nas próximas décadas. Isto
inevitavelmente coloca temas relacionados com o desenvolvimento da economia verde e com mudanças
na cultura do consumo (e, portanto, do próprio modelo de desenvolvimento) na pauta de discussão.
O crescimento urbano e a urbanização também costumam ser apontados como fatores centrais no
aumento de emissões de gases que contribuem para o efeito estufa. Por um lado, é fato inegável que as
cidades concentram a maior parte da população, da produção e do consumo. Ou seja, as cidades são o
motor e a manifestação mais visível do padrão de civilização que caracteriza o estágio atual da
humanidade. Em nível agregado, a população urbana é mais rica e mais consumidora do que a
população rural, apesar da existência de numerosas e vultosas favelas. Isto não significa que a
concentração populacional seja, em si, negativa para o meio ambiente. Ao contrário, a concentração
populacional traz importantes benefícios para a redução do consumo energético, é fonte de
desenvolvimento tecnológico e de pensamento inovador. Por outro lado, a dispersão dessa população no
espaço, nos mesmos níveis de renda e consumo, aumentaria muito a pegada ecológica. Estudos recentes
indicam que a emissão per capita das cidades, inclusive de grandes cidades como São Paulo, é menor
que a da média dos países em que são localizados (Dodman, 2009).
Outra preocupação frequentemente referida na literatura ecológica é a suposta devastação causada pela
expansão da mancha urbana. De fato, as cidades brasileiras ocupam um espaço relativamente
importante, situando-se apenas atrás dos EUA, da China e da Rússia em termos da quantidade de
hectares ocupados por cidades (Angel 2011: 43). Entretanto, essa mancha urbana é menos preocupante
pela quantidade do que pela qualidade. No total, as áreas urbanas brasileiras ocupam menos de 0,5% de
sua área total e em torno de 6% de sua área agricultável (Angel, 2011:42-44). Por outro lado, a expansão
desordenada das áreas urbanas, nutrida pela especulação imobiliária e pela ausência de previsão para as
necessidades de solo para a população mais pobre – que termina também infringindo matas, morros,
várzeas, nascedouros, e até reservas ecológicas – eventualmente causa danos enormes que poderiam ser
evitados com um planejamento do uso sustentável do espaço.
40
Os problemas sociais e ambientais das cidades brasileiras estão nitidamente interligados. Ambos têm
suas origens na mesma raiz – a falta de uma atitude proativa e realista com relação ao crescimento
urbano e o descaso com os problemas do maior grupo social, isto é, a população de baixa renda. Grande
parte da população urbana de baixa renda vive em lugares e moradias inadequados, devido ao descaso
público com esse grupo e a conseqüente ausência de medidas apropriadas para preparar e acomodar o
crescimento urbano rápido. Na falta de uma orientação espacial e de um manejo ambiental adequado,
esse crescimento rápido acentua a degradação de recursos naturais de terra, água e vegetação. A falta de
serviços básicos nos assentamentos urbanos contribui para problemas de saúde ambiental,
particularmente aqueles ligados à água e ao saneamento.
O acesso a serviços adequados de água e esgoto, para o conjunto do país, tem melhorado aos poucos; o
percentual da população urbana com abastecimento de água com canalização interna proveniente de
rede geral passou de 82,3%, em 1992, para 91,6%, em 2008. A cobertura dos serviços de esgotamento
sanitário, porém, é bem inferior ao acesso à água potável. Nas áreas urbanas, a cobertura da coleta de
esgotamento sanitário por rede geral ou fossa séptica chegou a 80,5% da população, em 2008. Mas
existem grandes diferenciais sociais, regionais e por situação de domicílio (rural e urbano).
Considerando-se o acesso simultâneo aos dois tipos de serviço de saneamento básico, o porcentual da
população urbana servida por água canalizada de rede geral no interior do domicílio e esgotamento
sanitário de rede geral ou fossa séptica passou de 62,3%, em 1992, para 76,0%, em 2008 (IPEA, 2010).
Portanto, houve avanços, mas ainda existe uma lacuna a ser preenchida.
No que se refere ao déficit habitacional, a redução da fecundidade, a maior diversidade dos arranjos
familiares e o aumento do número de moradias fizeram a média de pessoas por domicílio cair de 3,8
pessoas, em 2000, para 3,3 pessoas, em 2010. Os dados divulgados ainda não permitem calcular as
carências de habitação, mas tudo indica que houve redução do déficit habitacional do país.
Outro aspecto a ser considerado na relação população e mudanças climáticas é o efeito das mudanças na
composição da população. Na fase atual, conforme discussão anterior, o número de famílias sem filhos,
ou com apenas um ou dois filhos, está crescendo rapidamente no país. Ceteris paribus, as DINKs
consomem bastante mais per capita pelo fato de ter duas fontes de ingressos e não ter que gastar com a
criação de filhos. Da mesma forma, casais com só um ou dois filhos têm muito menos gastos
obrigatórios (saúde, educação, roupas, equipamentos, lazer, etc.) que famílias grandes. Este fato é um
dos elementos que torna complexa a relação entre números populacionais e impactos ambientais.
Nesse mesmo sentido, o envelhecimento da população a médio e longo prazos altera bastante a relação
entre população e impactos ambientais. Grande parte da juventude atual consome relativamente pouco,
devido ao fato de que a maioria ainda surge das classes sociais menos abastadas. Entretanto, se forem
confirmadas as projeções otimistas a respeito do crescimento econômico e se houver uma continuação
da tendência à redistribuição de renda, grande parte desta juventude estará consumindo em níveis bem
mais elevados quando atingir a faixa de 40 a 60 anos. Finalmente, o inevitável crescimento da população
idosa terá efeitos bastante diferentes dependendo do grau de desenvolvimento e níveis de renda
alcançados até aquele período. Os estudos mostram que o envelhecimento da população em países ricos
favorece uma redução de emissões ligada à diminuição do consumo, mas tende a aumentar as emissões
na medida em que os avanços na área de saúde exigem um desenvolvimento tecnológico cujos processos
de produção implicam na geração de mais gases de estufa (Jiang e Hardee, 2009).
41
7. Considerações finais
O capitulo III da CIPD do Cairo, de 1994, quando trata da “Integração demográfica e estratégias de
desenvolvimento” afirma que:
“As atividades diárias de todos os seres humanos, de comunidades e de países se inter-
relacionam com a mudança de população, com os sistemas e níveis do uso de recursos naturais,
com a situação do meio ambiente e o ritmo e a qualidade do desenvolvimento econômico e
social. Há um consenso geral de que a pobreza generalizada e persistente e graves injustiças
sociais e em razão do sexo têm significativa influência nos parâmetros demográficos como
crescimento, estrutura e distribuição da população e, por sua vez, são por eles influenciadas. Há
também um consenso geral de que sistemas insustentáveis de consumo e produção estão
contribuindo para o uso insustentável de recursos naturais e para a degradação ambiental
assim como para o aumento das injustiças sociais e da pobreza com as conseqüências, acima
mencionadas, para parâmetros demográficos”.
Os oito objetivos do milênio buscam traçar metas para a superação da pobreza, com melhoria nas
condições de saúde e educação, busca da equidade de gênero e o compromisso com a sustentabilidade
ambiental. Para cumprir as metas sociais e ambientais da CIPD do Cairo e dos ODMs, a relação entre
população, desenvolvimento e meio ambiente não pode ser vista apenas pelo lado do tamanho e do ritmo
de crescimento da população. A estrutura etária, a composição das famílias e dos domicílios e a
distribuição espacial, são fatores fundamentais (Martine, 2009).
Neste sentido, o cenário brasileiro é, pelo menos potencialmente, bastante positivo. O Brasil vive o seu
melhor momento demográfico, com a população reduzindo o ritmo de crescimento, com redução da
razão de dependência, diminuição do número de moradores por domicílio e com uma relação favorável
entre os três grupos etários que são os alvos de três políticas públicas fundamentais: crianças e jovens
(educação), adultos (emprego) e idosos (previdência social).
A população atual do Brasil é muito menor do que aquela que existiria se não tivesse havido redução do
tamanho das famílias. A queda da fecundidade tem provocado duas mudanças positivas na estrutura
etária brasileira. Em primeiro lugar, tem possibilitado a redução do número absoluto e relativo de
crianças e jovens em idade escolar, favorecendo as políticas de universalização das creches e da
educação infantil, além de facilitar os investimentos na melhoria da qualidade do ensino. Em segundo
lugar, a nova estrutura etária brasileira aumentou o percentual de pessoas em idade produtiva e reduziu a
carga de dependência demográfica. Esta situação favorável tem permitido a elevação das taxas de
poupança e de investimento, contribuindo para o crescimento econômico e para a redução da pobreza e
das desigualdades sociais.
A seguir, destacam-se alguns aspectos da análise realizada neste texto que podem ter uma relevância
mais direta com a atuação do UNFPA no Brasil durante o próximo período programático, seja em
termos de orientar o diálogo político (policy dialogue) com as autoridades brasileiras e/ou com outras
entidades da comunidade internacional, seja para a definição de determinadas linhas de atuação visando
oferecer apoios específicos para o processo de desenvolvimento brasileiro.
42
a) Erradicação da miséria
O Brasil já cumpriu a meta 1 dos ODMs de erradicar a extrema pobreza pela metade (quando medida em
termos de US$ 1,25 PPP). Porém, a situação econômica do país permite traçar metas mais amplas. O
governo de Dilma Rousseff, já na sua primeira semana, começou a desenhar um programa para
erradicação da miséria nos próximos quatro anos. A primeira tarefa vai ser definir quem é e onde está a
população vivendo na extrema pobreza (ou miséria). Pelos dados do IPEA, o número de pessoas
consideradas “indigentes” no país estava em torno de 13,5 milhões em 2009. Os dados e as análises
demográficos são fundamentais na aferição da demanda e na avaliação do êxito dos programas sociais.
O sucesso do Brasil nesta área poderia ter um grande efeito comparativo para os países em
desenvolvimento e o Brasil poderia utilizar como exemplo na cooperação Sul-Sul.
b) Universalização da educação e melhoria da qualidade do ensino
Como visto anteriormente, a população brasileira em idade escolar está se reduzindo em termos
absolutos. Isto favorece ao processo de universalização da educação e a melhoria da qualidade de
ensino, se constituindo em um bônus demográfico educacional (Soares, 2008). Se as metas do Plano
Nacional de Educação (PNE), para período 2011/2020, forem colocadas em prática o Brasil poderá dar
um grande salto na formação dos cidadãos brasileiros e possibilitar um grande investimento em capital
humano, com o consequente ganho de produtividade e a melhoria geral da qualidade de vida das
pessoas, das famílias e do país. Por exemplo, a criação de creches, além de possibilitar avanços
cognitivos das crianças, em geral, possibilita uma maior inserção produtiva das mães e,
consequentemente, a redução da pobreza. A identificação das brechas e das oportunidades é baseada na
análise de dados demográficos atualizados e espacializados.
c) Universalização dos serviços de saúde sexual e reprodutiva e o crescimento
populacional
A universalização dos serviços de saúde sexual e reprodutiva é uma meta da CIPD do Cairo e dos
ODMs. O Brasil avançou muito nos serviços de saúde sexual e reprodutiva. Cresceu o número de
mulheres que utilizam algum método contraceptivo e que tem acompanhamento pré-natal, mas o acesso
é diferenciado de acordo com a posição social (Arilha e Berquó, 2009). A despeito da ampliação dos
investimentos do Ministério da Saúde nesta área, existem muitos problemas de logística e a população
mais pobre e mais distante dos grandes centros urbanos não consegue satisfazer suas necessidades de
acesso aos métodos contraceptivos. O resultado é um alto índice de gravidez indesejada por excesso, isto
é, muitas mulheres pobres e com baixa escolaridade acabam tendo mais filhos do que desejam. Por outro
lado, existem muitas mulheres com maior escolaridade e maiores níveis de renda que estão tendo menos
filhos do que desejam, pela dificuldade de conciliar trabalho e família. Desta forma, o Brasil possui
fecundidade indesejada por excesso e por falta. Cabe à política de saúde reprodutiva tentar reduzir este
hiato no sentido de fazer coincidir a fecundidade observada com a fecundidade desejada. Isto é direito
reprodutivo.
Por outro lado, é importante fazer uma análise e acompanhamento da redução do crescimento
populacional, pois começa a surgir uma discussão sobre o despovoamento, a escassez de mão de obra e
a necessidade de re-incentivar a fecundidade. Nessas discussões, é importante trazer a análise dos
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processos e inércias demográficas, assim como a experiência dos países desenvolvidos que já estão
lidando com o decréscimo populacional antes de lançar novas políticas.
d) Políticas de conciliação trabalho família
A sobrecarga de trabalho das mulheres nas tarefas reprodutivas e não remuneradas é uma das mais fortes
características da desigual divisão sexual do trabalho. Em geral, as mulheres trabalham mais do que os
homens quando se soma trabalho produtivo e reprodutivo, mas os homens predominam nos trabalhos
produtivos e remunerados. Neste sentido, as políticas nesta área precisam incentivar a participação dos
homens nos trabalhos reprodutivos e aliviar a carga de dupla jornada feminina. As políticas de
conciliação trabalho e família precisam considerar as especificidades do trabalho de cada sexo e buscar
formas mais equitativas de relações de gênero na família e no mercado de trabalho.
e) Redução do nível de violência e de mortes por causas externas
Como visto em detalhe anteriormente, os homens são as principais vítimas das mortes por causas
externas, enquanto as mulheres são as principais vítimas da violência doméstica. Cerca de 1,6 milhões
de homens morreram por causas violentas (homicídios, acidentes de trânsito, etc.) entre 1991 e 2010.
Este fato é responsável por grande parte do superávit de mulheres existentes no Brasil e pelo
desequilíbrio na razão de sexo, com sérias consequências econômicas, sociais e demográficas. Assim, é
preciso avançar no diagnóstico e nas soluções para conter a violência e buscar eliminar as causas das
mortes por causas externas, para ambos os sexos. Em particular, é preciso dar atenção à
sobremortalidade masculina e aos danos que isto causa para toda a sociedade, sem desconsiderar o
combate à violência doméstica ou a tradicional preocupação com a mortalidade materna.
f) Planejamento urbano e assentamentos precários
A população urbana no Brasil passou de 12,8 milhões, em 1940, para 160,8 milhões em 2010. Foi um
crescimento de 12,6 vezes em 70 anos, ou de 3,7% ao ano. Foi também um crescimento desordenado,
sem planejamento e com alto índice de segregação espacial e social da população, comandado pela
especulação imobiliária e marcado pelo descaso com as necessidades do contingente mais numeroso no
crescimento urbano – os pobres. As camadas pobres da população ocupam assentamentos precários e
não usufruem efetivamente do direito à cidade, principalmente quando se considera os conceitos de
cidades inteligentes, cidades sustentáveis e cidades educativas.
É necessário re-orientar os políticos e planejadores, seja em nível federal, estadual ou municipal para a
necessidade de acomodar o crescimento urbano que, embora minorado, continua significativo e
inevitável. Duas considerações são primordiais nesse sentido – fazer um planejamento do uso
sustentável do espaço (tarefa na qual dados demográficos e a utilização de instrumentos como o SIG são
essenciais) e prever as necessidades de solo e infra-estrutura para os pobres, pois estes constituem o
contingente populacional mais numeroso no crescimento urbano.
g) Apoio à economia verde (de baixo carbono) e inclusiva
O padrão de produção e consumo adotado nas economias mais avançadas nos últimos 200 anos, e
difundido para todos os países do mundo, tem provocado a depauperização do Planeta, com grande
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agravamento das condições ambientais. Portanto, as formas tradicionais de produção e consumo
precisam ser urgentemente reconfiguradas.
A cidade do Rio de Janeiro vai ser palco da Conferência das Nações Unidas sobre desenvolvimento
sustentável, Rio + 20, que acontecerá em maio de 2012. O capítulo 5 da Agenda 21, da Rio/92, já
reconhecia que “O crescimento da população mundial e da produção, associado a padrões não
sustentáveis de consumo, aplica uma pressão cada vez mais intensa sobre as condições que tem nosso
planeta de sustentar a vida”.
As questões da dinâmica demográfica não podem ficar de fora da discussão sobre a Economia Verde e
Inclusiva que vai ser o tema central da Rio + 20. A humanidade precisa encontrar maneiras de se auto-
regular e de reinventar sua organização social e econômica, garantindo a convivência harmônica com
todas as formas de vida da Terra. Os demógrafos podem dar uma grande contribuição na busca de
soluções para a construção de uma economia verde e inclusiva.
h) Produção de dados e análises demográficas
A utilização dos dados do censo em nível nacional, regional, estadual, municipal e intra-municipal será
fundamental para os formuladores de políticas públicas e os diretores de planejamento estratégico do
setor público e das empresas fundamentarem seus planos de ação de curto e longo prazo.
O IBGE divulgou os primeiros dados do censo 2010 em dezembro passado. Até o meio de 2011 devem
ser divulgados os dados do universo e, posteriormente, os dados da amostra que vão possibilitar traçar
um retrato detalhado da realidade brasileira. Estes dados são fundamentais para o desenho das políticas
públicas e para o planejamento estratégico público e privado.
Os demógrafos podem dar uma grande contribuição para a sociedade brasileira na medida em que
analisam os dados do censo 2010, relacionando estas informações com outros registros administrativos e
com outras pesquisas domiciliares. Um grande desafio é melhorar os sistemas de coleta de estatísticas
públicas ao mesmo tempo em que garante a integração dos vários sistemas existentes. Seria preciso
incentivar o trabalho conjunto dos diversos agentes governamentais responsáveis pela coleta de
estatísticas e os institutos e universidades que utilizam suas bases de dados.
Para a maioria das contribuições que podem advir da programação sugerida aqui, vai ser necessário
garantir e expandir o uso das bases de dados existentes, o uso do instrumental estatístico, as novas
técnicas de geo-referenciamento e a capacidade de análise teórica das ciências social e demográfica.
45
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