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DIREITO PROCESSUAL CIVIL III 葡京法律的大学 RUI PINTO 大象城堡 | 2016/2017

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DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

葡京法律的大学 RUI PINTO

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Não dispensa

a consulta dos

manuais

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Índice

I – Introdução ............................................................................................................. 12

A – Fundamento. Princípios e fontes ......................................................................... 12

§1.º - Fundamento constitucional e material .......................................................................... 12

Justificação constitucional .................................................................................................... 12

Realização coativa da prestação ........................................................................................... 13

Fundamento material; o direito à execução ....................................................................... 14

Âmbito processual ................................................................................................................. 16

Natureza jurídica. Remissão ................................................................................................. 19

§2.º - Princípios gerais e privativos .......................................................................................... 19

Princípios gerais ..................................................................................................................... 19

Princípios privativos .............................................................................................................. 22

B – Objeto e espécies de execução ........................................................................... 24

§3.º - Pedido ................................................................................................................................ 24

Objeto imediato ..................................................................................................................... 24

Espécies de pedidos executivos pelo objeto mediato ....................................................... 25

Execução específica e execução não específica ................................................................. 26

§4.º - Causa de pedir................................................................................................................... 27

Discussão doutrinal. Posição ................................................................................................ 27

Conclusão: aquisição do direito à pretensão de prestação ............................................... 28

III – Condições de ação ............................................................................................ 30

A – Título executivo .................................................................................................. 30

§5.º - Generalidades ................................................................................................................... 30

Conceito, natureza e funções ............................................................................................... 30

Função constitutiva ............................................................................................................... 34

Características e classificação ............................................................................................... 35

§6.º - Sentença condenatória ..................................................................................................... 37

Âmbito primário .................................................................................................................... 37

Âmbito eventual ..................................................................................................................... 38

1. Obrigações prejudicadas de fonte legal: admissibilidade de execução de condenação implícita ... 38

2. Posições negatórias ............................................................................................................... 39

3. Posição pessoal .................................................................................................................... 40

4. (Conclusão): o artigo 703.º, n.º2 CPC ................................................................................ 41

Simples declaração judicial do direito ................................................................................. 42

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Execução provisória .............................................................................................................. 43

Obtenção aparentemente desnecessária de ação declarativa ........................................... 47

§7.º - Documentos privados ..................................................................................................... 47

Requisitos comuns ................................................................................................................. 47

Requisitos específicos na execução de obrigações futuras (artigo 707.º CPC) ............. 48

Limites objetivos .................................................................................................................... 52

Prescrição da obrigação cartular .......................................................................................... 55

§8.º - Documentos avulsos........................................................................................................ 59

Título judiciais impróprios .................................................................................................... 59

Outros títulos judiciais impróprios ...................................................................................... 62

Títulos particulares................................................................................................................. 62

Títulos administrativos .......................................................................................................... 62

B – Obrigação exigível e determinada ...................................................................... 63

§9.º - Generalidades. Exigibilidade .......................................................................................... 63

Natureza e sentido dos requisitos da obrigação exigível, certa e líquida ....................... 63

Exigibilidade, em especial ..................................................................................................... 65

§10.º - Determinação ................................................................................................................. 67

Generalidades ......................................................................................................................... 67

Certeza ..................................................................................................................................... 67

Liquidez ................................................................................................................................... 68

Consequências da iliquidez da obrigação ........................................................................... 73

IV – Pressupostos processuais .................................................................................. 75

A – Pressupostos relativos ao Tribunal ..................................................................... 75

§11.º - Competência internacional ........................................................................................... 75

Introdução ............................................................................................................................... 75

Normas internas de competência internacional ................................................................ 75

§12.º - Competência interna ...................................................................................................... 79

Competência em razão da matéria e da hierarquia ............................................................ 79

Competência em razão da forma e do valor ...................................................................... 80

2. No quadro da nova Lei de Organização do Sistema Judiciário (LOSJ) ............................... 81

Competência em razão do território ................................................................................... 82

Extensão de competência na cumulação de execuções .................................................... 86

Competência convencional .................................................................................................. 87

§13.º - Regime de incompetência ............................................................................................. 87

Incompetência internacional ................................................................................................ 87

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Incompetência interna ........................................................................................................... 88

B – Pressupostos relativos às partes .......................................................................... 88

§14.º - Personalidade e capacidade judiciária .......................................................................... 88

Requisitos ................................................................................................................................ 88

Regime da falta de personalidade, da incapacidade e representação irregular .............. 89

§15.º - Legitimidade processual singular; interesse processual ............................................ 90

Generalidades ......................................................................................................................... 90

Credor e devedor ................................................................................................................... 90

Execução sub-rogatória......................................................................................................... 94

Terceiros à dívida ................................................................................................................... 94

Regime da ilegitimidade singular.......................................................................................... 98

Interesse processual ............................................................................................................... 98

§16.º - Legitimidade processual plural ..................................................................................... 99

Generalidades ......................................................................................................................... 99

Litisconsórcio necessário: ..................................................................................................... 99

Litisconsórcio voluntário .................................................................................................... 102

Litisconsórcio superveniente .............................................................................................. 102

a. Doutrina......................................................................................................................... 103

b. Jurisprudência ............................................................................................................... 104

c. Posição pessoal ............................................................................................................. 105

§17.º - Patrocínio judiciário ..................................................................................................... 106

Âmbito ................................................................................................................................... 106

Regimes da falta ou irregularidade de patrocínio judiciário ........................................... 106

C – Pressupostos relativos ao objeto ........................................................................ 107

§18.º - Pressupostos gerais ...................................................................................................... 107

Positivos ................................................................................................................................ 107

Negativos .............................................................................................................................. 108

§19.º - Pluralidade de objetos processuais ............................................................................ 111

Cumulação de pedidos ........................................................................................................ 111

Coligação ............................................................................................................................... 114

Regime da pluralidade ilegal de execuções ....................................................................... 115

PROCEDIMENTO DE EXECUÇÃO DE PAGAMENTO DE QUANTIA CERTA

.................................................................................................................................. 116

I – Fase Introdutória ................................................................................................ 116

A – Formas procedimentais ..................................................................................... 116

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§26.º - Processo comum e processos especiais .................................................................... 116

Processo comum .................................................................................................................. 116

Processos especiais .............................................................................................................. 120

B – Forma ordinária (citação prévia à penhora) ...................................................... 121

I – Impulso processual ............................................................................................................ 121

§27.º - Ato de impulso (Requerimento Executivo) ............................................................. 121

Conteúdo ............................................................................................................................... 121

Formalidades ........................................................................................................................ 122

Apresentação ........................................................................................................................ 123

Custas, despesas e apoio judiciário .................................................................................... 127

Especialidades da apresentação de requerimento de execução de sentença ............... 127

II – Distribuição, admissão, despacho liminar e citação ..................................................... 130

§28.º - Distribuição e admissão .............................................................................................. 130

Distribuição. Controle administrativo liminar (admissão) ............................................. 130

Controle liminar administrativo ......................................................................................... 131

Efeitos do recebimento ....................................................................................................... 133

§29.º - Despacho liminar ......................................................................................................... 133

Regime anterior à reforma de 2013 ................................................................................... 133

Regime posterior à reforma de 2013 ................................................................................. 134

Conteúdo ............................................................................................................................... 134

Despacho sucessivo ............................................................................................................. 136

§30.º - Citação ........................................................................................................................... 137

Introdução ............................................................................................................................. 137

Regime anterior à reforma de 2013 ................................................................................... 137

Regime posterior à reforma de 2013 ................................................................................. 139

Ato de citação ....................................................................................................................... 139

III – Oposição à execução ...................................................................................................... 142

§31.º - Caracteres ...................................................................................................................... 142

Funcionalidade ..................................................................................................................... 143

Consequência da acessoriedade ......................................................................................... 143

§32.º - Objeto mediato ............................................................................................................. 144

Pedido .................................................................................................................................... 144

Causa de pedir ...................................................................................................................... 145

§33.º - Procedimento ............................................................................................................... 156

Generalidades ....................................................................................................................... 156

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Impulso inicial ...................................................................................................................... 157

Contestação e sequência sumária ....................................................................................... 160

Saneamento, instrução, discussão e julgamento .............................................................. 161

Sentença................................................................................................................................. 163

§34.º - Efeitos da sentença final ............................................................................................. 163

Sentença de forma ............................................................................................................... 163

Sentença de mérito .............................................................................................................. 164

Relações com outros objetos processuais ........................................................................ 169

Limites subjetivos da eficácia decisória ............................................................................ 171

C – Forma sumária (dispensa de citação prévia à penhora) .................................... 173

§35.º - Pressupostos ................................................................................................................. 173

Antes da reforma de 2013................................................................................................... 173

Depois da reforma de 2013 ................................................................................................ 174

§36.º - Especialidades ............................................................................................................... 175

Tramitação inicial ................................................................................................................. 175

Citação ................................................................................................................................... 176

Oposição à execução e à penhora ..................................................................................... 177

Oposição à execução de requerimento de injunção, em especial ................................. 177

Responsabilidade do exequente ......................................................................................... 180

II – Penhora .............................................................................................................. 182

A – Objeto e sujeitos ................................................................................................. 182

§37.º - Delimitação primária ................................................................................................... 182

Funcionalidade. Objeto ....................................................................................................... 182

Âmbito subjetivo; bens em poder de terceiro ................................................................. 183

§38.º - Limites substantivos .................................................................................................... 184

Responsabilidade .................................................................................................................. 184

Disponibilidade e transmissibilidade ................................................................................. 192

§39.º - Impenhorabilidades objetivas ..................................................................................... 194

Impenhorabilidades absolutas. A impenhorabilidade da Constituição da República. O

direito à habitação ................................................................................................................ 194

Impenhorabilidades relativas .............................................................................................. 195

Impenhorabilidades parciais ............................................................................................... 196

§40.º - Dívidas conjugais ......................................................................................................... 204

Enquadramento material .................................................................................................... 204

Execução de dívida comum ............................................................................................... 208

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Execução de dívida própria ................................................................................................ 212

Execução de dívida comunicável ....................................................................................... 216

§41.º - Proporcionalidade e adequação ................................................................................. 229

Proporcionalidade ................................................................................................................ 229

Adequação; relação com o princípio da proporcionalidade .......................................... 232

B – Atos preparatórios ............................................................................................. 236

§42.º - Indicação de bens ......................................................................................................... 236

Introdução ............................................................................................................................. 236

Legitimidade ......................................................................................................................... 236

Efeitos.................................................................................................................................... 240

§43.º - Consulta do registo informático de execuções ........................................................ 241

Início ...................................................................................................................................... 241

Consulta do registo informático de execuções ................................................................ 242

§44.º - Identificação e localização dos bens .......................................................................... 243

Momento; dispensa .............................................................................................................. 243

Informação ao exequente. Indicação sucessiva de bens. Frustração ............................ 244

C – Ato de penhora .................................................................................................. 244

§45.º - Penhora de bens imóveis ............................................................................................ 244

Objeto .................................................................................................................................... 244

Ato de penhora..................................................................................................................... 245

Depositário ........................................................................................................................... 247

§46.º - Penhora de bens móveis ............................................................................................. 249

Ato de penhora..................................................................................................................... 249

Depositário ........................................................................................................................... 251

§67.º - Penhora de direitos ...................................................................................................... 253

Regime comum .................................................................................................................... 253

Pluralidade de penhoras sobre o mesmo crédito ............................................................ 259

Créditos incorporados ......................................................................................................... 259

Rendimentos periódicos ..................................................................................................... 262

Saldos bancários ................................................................................................................... 264

Quotas sociais, lucros e quotas de liquidação .................................................................. 271

§48.º - Penhora de direitos reais em comunhão ou em sobreposição de direitos sobre

patrimónios autónomos e de expectativas de aquisição ..................................................... 271

Direitos em comunhão e sobre patrimónios autónomos .............................................. 272

Direitos reais de gozo sobrepostos ................................................................................... 273

Direitos e expectativas de aquisição .................................................................................. 274

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D- Auto, notificação e vicissitudes .......................................................................... 278

§50.º - Auto e notificação ........................................................................................................ 278

Auto de penhora .................................................................................................................. 278

Notificação: ........................................................................................................................... 278

§51.º - Vicissitudes .................................................................................................................... 279

Frustração (total e parcial) e renovação ............................................................................ 279

Substituição e reforço .......................................................................................................... 280

Redução ................................................................................................................................. 281

Sub-rogação objetiva superveniente (artigo 823.º CC) ................................................... 281

Suspensão e extinção ........................................................................................................... 281

E – Efeitos e natureza jurídica ................................................................................ 283

§52.º - Funções da penhora. Indisponibilidade material absoluta ..................................... 283

Generalidades; sub-funções ................................................................................................ 283

Indisponibilidade material absoluta: inibição ou condicionamento dos poderes de

exercício material do direito ............................................................................................... 284

§53.º - Indisponibilidade jurídica relativa: ineficácia relativa dos atos de disposição ou de

oneração ..................................................................................................................................... 286

Introdução ............................................................................................................................. 286

Natureza jurídica: ineficácia ................................................................................................ 287

Objeto .................................................................................................................................... 287

Proporcionalidade ................................................................................................................ 289

Âmbito temporal: atos posteriores à penhora, incluindo o seu registo ....................... 292

Provisoriedade ...................................................................................................................... 293

§54.º - Preferência..................................................................................................................... 293

Relação jurídica de prevalência .......................................................................................... 294

Conversão retroativa do arresto em penhora .................................................................. 294

§55.º - Natureza jurídica .......................................................................................................... 295

Doutrina ................................................................................................................................ 295

Posição pessoal ..................................................................................................................... 297

F – Impugnação ...................................................................................................... 299

§56 – Generalidades; oposição à penhora ............................................................................ 299

Generalidades ....................................................................................................................... 299

Oposição à penhora ............................................................................................................. 299

§57.º - Protesto do ato de penhora ........................................................................................ 304

Aspetos gerais ....................................................................................................................... 304

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Legitimidade ......................................................................................................................... 307

Prova ...................................................................................................................................... 308

Procedimento ....................................................................................................................... 309

§58.º - Embargos de terceiro .................................................................................................. 309

Aspetos gerais ....................................................................................................................... 310

Causa de pedir ...................................................................................................................... 310

Qualidade de terceiro .......................................................................................................... 333

Pedido .................................................................................................................................... 334

Procedimento ....................................................................................................................... 335

Efeitos da sentença final de mérito ................................................................................... 342

§59.º - Ação de reivindicação e protesto pela reivindicação .............................................. 342

Ação de reivindicação .......................................................................................................... 342

Protesto pela reivindicação ................................................................................................. 346

§60.º - Arguição de nulidade, simples requerimento e reclamação ................................... 347

Reclamação dos atos do agente de execução ................................................................... 347

Simples requerimento .......................................................................................................... 347

§61.º - Apelação e reclamação ................................................................................................ 348

Apelação ................................................................................................................................ 348

Reclamação ........................................................................................................................... 348

III – Intervenção do cônjuge e reclamação de créditos ......................................... 349

A – Citação. Intervenção do cônjuge ...................................................................... 349

§62.º - Citação e intervenção................................................................................................... 349

Citação do cônjuge e credores reclamantes ..................................................................... 349

Intervenção do cônjuge....................................................................................................... 354

B – Reclamação de créditos .................................................................................... 357

§63.º - Função e objeto ............................................................................................................ 357

Função. Estatuto pessoal .................................................................................................... 357

Pedido .................................................................................................................................... 362

Causa de pedir ...................................................................................................................... 362

§64.º - Procedimento ............................................................................................................... 369

Intervenção ........................................................................................................................... 369

Articulados ............................................................................................................................ 371

Saneamento, julgamento e decisão .................................................................................... 373

§65.º - Graduação ..................................................................................................................... 377

Regras aplicáveis ................................................................................................................... 377

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IV – Pagamento ....................................................................................................... 378

A – Venda ................................................................................................................ 378

§66.º - Introdução. Procedimento .......................................................................................... 378

Introdução ............................................................................................................................. 378

Atos preparatórios ............................................................................................................... 381

Determinação de comprador e do valor concreto de aquisição. Entrega do preço ... 383

Atos finais ............................................................................................................................. 390

Entrega do produto da venda ............................................................................................ 391

§67.º - Direitos de terceiro sobre a venda ............................................................................. 392

Preferências reais .................................................................................................................. 392

Direito de remição ............................................................................................................... 393

Promessa real ........................................................................................................................ 394

§68.º - Regime de eficácia. Natureza jurídica........................................................................ 397

Introdução. O caráter processual dos pretensos efeitos obrigacionais ........................ 397

Efeitos materiais principais ................................................................................................. 398

Efeitos materiais acessórios ................................................................................................ 404

Momento da eficácia ........................................................................................................... 406

Vícios materiais .................................................................................................................... 407

Vícios processuais ................................................................................................................ 411

Natureza jurídica .................................................................................................................. 413

B – Pagamento executivo e voluntário; outros modos de pagamento .................... 415

§69.º - Pagamento forçado e voluntário ................................................................................ 415

Pagamento voluntário (remição da execução) ................................................................. 415

Pagamento forçado .............................................................................................................. 420

§70.º - Outros métodos de pagamento ................................................................................. 421

Entrega de dinheiro ............................................................................................................. 421

Adjudicação .......................................................................................................................... 422

Consignação de rendimentos ............................................................................................. 425

PROCEDIMENTO DE EXECUÇÃO PARA ENTREGA DE COISA CERTA .. 427

I – Execução comum .............................................................................................. 427

§77.º - Objeto e regime. Fase inicial ...................................................................................... 427

Objeto. Regime aplicável .................................................................................................... 427

Fase introdutória .................................................................................................................. 427

Oposição à execução ........................................................................................................... 427

§78.º - Execução específica ..................................................................................................... 427

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Apreensão e entrega ............................................................................................................ 427

Citação do cônjuge .............................................................................................................. 427

Impugnação .......................................................................................................................... 427

Vícios da entrega judicial .................................................................................................... 427

Efeitos da procedência ........................................................................................................ 427

§79.º - Execução sucedânea .................................................................................................... 427

Pressupostos e momento .................................................................................................... 427

Procedimento ....................................................................................................................... 427

PROCEDIMENTO DE EXECUÇÃO PARA PRESTAÇÃO DE FACTO ........... 428

§86.º - Objeto, princípios e estrutura executiva ................................................................... 428

Objeto .................................................................................................................................... 428

Especificidades estruturais .................................................................................................. 428

§87.º - Prestação de facto fungível ......................................................................................... 428

Objeto .................................................................................................................................... 428

Execução específica ............................................................................................................. 428

Execução sucedânea ............................................................................................................ 428

§88.º - Prestação de facto infungível ...................................................................................... 428

Execução específica ............................................................................................................. 428

Execução sucedânea ............................................................................................................ 428

§89.º - Prestação de facto negativo ........................................................................................ 428

Objeto .................................................................................................................................... 428

Procedimento ....................................................................................................................... 428

1. Execução de facto repristinável.................................................................................. 428

2. Execução de facto não repristinável .......................................................................... 428

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I – Introdução1

A – Fundamento. Princípios e fontes

§1.º - Fundamento constitucional e material

Justificação constitucional: a raiz do processo civil é o conflito entre os sujeitos da

ordem jurídica. O conflito pode ser definido como a contraposição entre sujeitos de

pretensões incompatíveis relativamente à mesma posição jurídica reconhecida pelo Direito.

Essa contraposição de pretensões pode traduzir-se numa violação da posição jurídica em

causa, como pode traduzir-se numa ameaça de uma violação. A atividade de resolução, i.e.,

de extinção, do conflito consiste na tutela. Na perspetiva do sujeito vitorioso a tutela não é

somente um modo de garantir o exercício da respetiva posição jurídica, mas é-o estando

presente uma violação a essa posição ou ameaça à mesma. O Estado tem o monopólio da

dirimição dos conflitos por meio das normas do processo, in casu do processo civil,

relativamente aos conflitos sobre posições jurídicas privadas. Fala-se, então, em função ou

garantia jurisdicional de justiça a cargo do Estado pela via judiciária. A esse monopólio

corresponde na esfera jurídica individual um direito à tutela jurisdicional sediado no artigo

20.º, n.º1 CRP, i.e., o direito a uma solução jurídica dos conflitos, conexa com a garantia de

efetivação dos direitos e liberdades fundamentais (artigo 2.º CRP), assumida como uma das

tarefas fundamentais do Estado na alínea a) do artigo 9.º CRP. Justamente no plano

constitucional, a jurisprudência, quer do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, quer

do Tribunal Constitucional tem afirmado que o direito à tutela jurisdicional do artigo 20.º,

n.º1 CRP implica uma tutela efetiva ou complexa, nomeadamente uma tutela executiva.

Assim, no Ac. TC n.º 1169/96, 20 setembro 1996, declara-se que se compreende no direito

ao acesso aos tribunais, previsto no artigo 20.º CRP, o

«direito a um processo de execução, ou seja, o direito a que, através do órgão jurisdicional de

desenvolva e efetive toda a atividade dirigida à execução da sentença proferida pelo tribunal».

Todavia, em bom rigor, tal decorre do n.º4 do artigo 20.º CRP: ao estabelecer que a decisão

em prazo razoável deve ser obtida mediante processo equitativo essa garantia significa, entre

outras derivações que um processo é justo porque procurou cumprir a sua funcionalidade

material de garantia dos direitos subjetivos e interesses legalmente protegidos, cometida ao

direito à tutela jurisdicional. Tal idoneidade funcional do processo traduz-se tanto numa

exigência de tutela jurisdicional efetiva (artigo 268.º, n.º4 CRP) pelo seu conteúdo, como pela

oportunidade temporal (n.º4 do artigo 20.º CRP), como pela execução das medidas de tutela

cujos efeitos não se possam produzir pela simples prolação da decisão – a efetividade de

execução. Se não houvesse uma garantia de execução, todas as garantias feitas valer na fase

declarativa não teriam servido para nada como bem nota Quilleré-Majzoub. Essa inutilidade

redundaria, segundo a decisão do TEDH Hornsby/Grécia (19/3/1887), numa preterição da

garantia da igualdade entre as partes, já que uma sentença não executada é uma sentença que

1 PINTO, Rui; Manual da Execução e Despejo; Coimbra Editores; 1.ª Edição, Agosto 2013.

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permanece inoperante em detrimento de uma parte. O caráter essencial da garantia de

efetividade de execução na economia do direito à tutela jurisdicional, configurado pelos

critérios do processo equitativo, confirma-se no modo como o TEDH procede ao cômputo

do prazo razoável, como exige o artigo 6.º, n.º1 CEDH e artigo 20.º, n.º4 CRP. Efetivamente,

o TEDH tem uma visão qualitativamente funcional e quantitativamente global do acesso à

tutela, no que Favreu designa ser uma interpretação finalista da Convenção: o processo

engloba a fase declarativa, a eventual fase de recursos e a eventual fase executiva. Por isso, o

prazo continuará, até ao termo completo do respetivo procedimento, daqui resultando que,

por exemplo, nas obrigações pecuniárias só com o pagamento por via da ação executiva o

direito acha a sua realização efetiva. A garantia de execução tem uma aceitação doutrinal

tanto entre nós, em autores como Gomes Canotilho e Rui Medeiros, como no Direito

Constitucional estrangeiro. Muito justamente, no artigo 2.º, n.º2 CPC garantem-se pelo

prisma objetivo da situação jurídica e não pelo prisma do sujeito titular, de que a todo o

direito, exceto quando a lei determine o contrário, corresponde a ação adequada a fazê-lo

reconhecer em juízo, a prevenir ou reparar a violação dele e a realizá-lo coercivamente.

Garante-se, pois, a realização coativa dos direitos através do Estado.

Realização coativa da prestação: a necessidade de uma realização coativa dos direitos

resulta dos limites dos meios de tutela declarativa, numa abordagem preliminar. No processo

declarativo, a que alude o artigo 10.º, n.º2 CPC, o efeito jurídico requerido, seja a simples

apreciação, seja a condenação, seja a constituição, situa-se, sempre, no estrito plano jurídico.

Por outras palavras, as ações declarativas visam a produção de um título jurídico judicial para

a pretensão material do autor. Esse título judicial é a sentença e o seu valor objetivo e

subjetivo é ditado pelo regime dos limites do caso julgado. Nuns casos esse título concorre

com o título que o autor já apresentava, maxime, o contrato, pois é meramente enunciativo

de efeitos que já decorriam daquele. Ora, esse efeito jurídico pode ser autónomo e suficiente

para resolver o litígio, como sucede nos pedidos de simples apreciação e constituição. Pode

falar-se assim em satisfação unilateral da pretensão do autor. Contudo, isso já não sucede

para um efeito cominatório, i.e., quando o tribunal impõe ao réu um comando, ordem ou

mandamento de atuação (condenação) na prestação de uma coisa ou de um facto (artigo 10.º,

n.º3, alínea b) CPC). Descobre-se aqui a necessidade funcional de um ulterior momento de

execução pelo réu do comando de atuação. Manifestamente deve falar-se aqui em satisfação

bilateral da pretensão do autor. Ora, pode muito bem o réu não realizar a prestação, apesar

de ter contra si uma sentença com trânsito em julgado. O direito à tutela jurisdicional do

artigo 20.º CRP, concretizado no direito de ação, impõe então, pelas razões constitucionais

já aludidas, uma competência dos tribunais para, nos limites dos direitos, liberdades e

garantias constitucionais, a execução forçada do título jurídico judicial. Daí a definição

presente no artigo 10.º, n.º3 CPC de que as ações executivas são aquelas em que o autor

requer as providências adequadas à reparação efetiva do direito violado. Importa ter algum

cuidado com a literalidade em presença. O termo efetivo exprime o hiato entre a imposição

do comando de atuação ao réu e a sua realização. Como, numa perspetiva normativa, escreve

Lebre de Freitas, pela ação executiva passa-se da declaração concreta da norma jurídica para

a sua atuação prática, mediante o desencadear do mecanismo da garantia. Todavia, o

comando de atuação pode ser decretado para prevenir uma ameaça de violação do direito,

como sucede numa ação inibitória ou numa ação cautelar. Uma e outra podem impor

condenações (artigos 878.º, 378.º e 384.º CPC). Também o incumprimento de qualquer

dessas condenações carece de ser imposto coativamente. Inevitavelmente, na falta de

preceitos executivos privativos, a execução de uma cautela condenatória segue, as regras

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executivas, que lhe sejam mais adequadas ao objeto e às finalidades em causa. Em conclusão,

numa primeira e provisória apreciação, pode dizer-se que as ações executivas surgiriam como

aquelas em que o autor requer as providências adequadas à realização efetiva de um comando

de atuação do réu enunciado num título judicial. Esta apreciação e restritiva e processual,

porém. O que deve ser levado em conta é o fundamento material da execução.

Fundamento material; o direito à execução:

1. Objeto e conteúdo: o processo civil exprime uma adequação ao Direito material,

pelo que apenas pode dar o que este contiver: é necessário garantir a possibilidade de

o seu titular exercer todas as faculdades que se contêm nos direitos e interesses

legalmente protegidos, escreve Teixeira de Sousa. Relembre-se que o Direito

Processual é um Direito pelo qual se realiza o Direito substantivo, i.e., é instrumental

a este, mas é, por isso mesmo, um Direito adjetivo porque dá eficácia aos direitos ou

interesses dos sujeitos da ordem mas não os produz. Por isso, fala-se no artigo 2.º,

n.º2 CPC, na realização coativa dos direitos. Impõe-se, por isso, perguntar se há um

fundamento material para o momento processual da execução. Para tal temos de

inquirir do fundamento material da própria condenação judicial, i.e., da imposição

judicial ao réu de um comando de atuação, nos termos que já decorriam de um

anterior título substantivo. Ora, as ações de condenação e, mais latamente, qualquer

procedimento que termine na imposição de um comando de atuação à parte passiva,

consubstanciam, no plano material e na esteira de Grunsky, o exercício de um direito

subjetivo ou poder jurídico, conforme o caso, a uma prestação. Na verdade, tanto

podemos estar na presença de um autónomo direito relativo, como sucede com um

direito de crédito, como pode tratar-se do exercício de pretensões reais ou pessoais

fundadas em direitos subjetivos absolutos, reais ou pessoais, consubstanciando

poderes sem autonomia. Neste sentido, pode dizer-se que o réu de um procedimento

condenatório é sempre devedor lato sensu de uma prestação. Mas o exercício desse

direito ou poder subjetivo não se esgota apenas num poder de interpelar, judicial ou

extrajudicialmente, a parte devedora para cumprir e mesmo de obter contra ela um

réu do comando judicial de atuação – a sentença de condenação. Não: o exercício

desse direito ou poder subjetivo encerra ainda um poder de execução forçada, i.e., de

impor-lhe o cumprimento contra a sua vontade. O Código Civil enuncia esse direito

ou poder à execução. Efetivamente, o artigo 817.º CC enuncia que não sendo a

obrigação voluntariamente cumprida, tem o credor o direito de exigir judicialmente

o seu cumprimento e de executar o património do devedor, nos termos declarados

no Código Civil e nas lei de processo. Já se a prestação consistir na entrega de coisa

determinada, o credor tem a faculdade de requerer, em execução, que a entrega lhe

seja feita (artigo 827.º CC). Por seu turno, estatui o artigo 828.º CC que o credor de

prestação de facto fungível tem a faculdade de requerer, em execução, que o facto

seja prestado por outrem à custa do devedor, enquanto segundo o artigo 828.º CC se

o devedor estiver obrigado a não praticar algum ato e vier a praticá-lo, tem o credor

o direito de exigir que a obra, se obra feita houver, seja demolida à custa do que se

obrigou a não fazer. Portanto, o direito à execução não é exterior ao direito

exequendo: é um exercício desse mesmo direito. Todavia, na lição de Teixeira de

Sousa, este direito de execução resulta da incorporação da pretensão num título

executivo, o qual é constitutivo daquele direito de execução. Um título é executivo

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porque atribui exequibilidade a uma pretensão; antes dele, pode haver direito à

pretensão, mas sem exequibilidade. Como se verá, esse título tanto pode ser um título

jurídico judicial, mas também um título jurídico extrajudicial nos casos e termos

legalmente fixados (artigo 703.º CPC). A não recondução dos títulos jurídicos apenas

à sentença mostra que a necessidade da ação de execução não se pode explicar com

a simples insuficiência processual da ação declarativa para só por si dar uma tutela

final. Em ótica levar-nos-ia à conclusão errada de que uma ação de execução é uma

continuação de uma ação de declaração o que nem sempre sucede. Não: a

necessidade da ação de execução justifica-se com a natureza prestacional do objeto

da pretensão, necessariamente bilateral, logo passível de não ser cumprida, como está,

precisamente, no artigo 817.º CC. Por outras palavras, o problema é, antes de mais,

substantivo: o credor tem um título jurídico de aquisição do direito a uma pretensão

– contrato, letra – mas ipso factum isso não equivale ao cumprimento e pode, nem

sequer, no plano formal, ser suficiente para a imposição forçada da pretensão. Será a

lei a determinar se, no plano formal, aquele título jurídico gerador do crédito é dotado

também de força executiva ou se terá o direito de ser conhecido em prévia ação

declarativa.

2. Natureza. Noção de ação executiva: segundo Teixeira de Sousa, a exigência do

título executivo como condição formal de exequibilidade não transforma a pretensão

exequenda num direito de natureza pública contra o Estado, em que o Estado estaria

obrigado a uma prestação de execução. É certo que o Estado que, com o seu poder

de autoridade, pode realizar os atos de execução da prestação, como a penhora, a

venda e pagamento ou a apreensão e entrega. Todavia, o direito à execução

permanece como um direito de natureza privada que não pode ser exercido sem o

empregado dos meios coativos do Estado. Por outras palavras, a natureza pública

dos meios de tutela coativa, não contamina a natureza privada do objeto dessa tutela,

i.e., o direito à execução de uma pretensão. É fazendo uso da ação executiva que esse

direito de ação é exercido: a ação executiva é aquela em que o autor requer como

efeito jurídico as providências adequadas à realização de um direito/poder a uma

prestação enunciado num título legalmente suficiente. Deste modo, no plano

substantivo as ações executivas são as adequadas a produzir a satisfação final do

titular de um direito/poder a uma prestação. E, portanto, dada a instrumentalidade

do processo, pode concluir-se que nas ações executivas o efeito jurídico requerido

situa-se ainda no plano do cumprimento ainda que forçado, pois, como bem escreve

Lebre de Freitas, a satisfação do credor na ação executiva é conseguida mediante a

substituição do tribunal ao devedor. Anselmo de Castro via aqui, justamente, na

realização da prestação por meios coativos uma sub-rogação do devedor. Essa

mesma instrumentalidade dita que as obrigações naturais não poderão,

procedentemente, ser objeto de tutela executiva porquanto a sua própria natureza

exclui a realização coativa (artigo 404.º CC).

3. Irrenunciabilidade: o direito à execução é antecipadamente irrenunciável: o credor

não pode com eficácia jurídica, antes da pendência da execução, renunciar

unilateralmente à execução da dívida ou acordar com o devedor idêntica cláusula. Tal

seria uma renúncia aos direitos ao cumprimento e à indemnização por mora, o que

o artigo 809.º CC não admite. Mas pode o credor vincular-se a não executar o

devedor durante certo prazo (pactum de non exequendo)?

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a. Lebre de Freitas: afirma a sua ilicitude no plano geral, enquanto modalidade

de renúncia à execução, salvo se, da interpretação negocial, resultar que as

partes quiseram fixar novo prazo de cumprimento da obrigação;

b. Teixeira de Sousa: tem um ponto de vista essencialmente diverso; admitir

que credor e devedor acordem antes da execução um termo ad quem para a

sua instauração ou mesmo a prévia exclusão da execução, por similitude com

a desistência de uma execução pendente.

c. Somos de opinião de que o artigo 809.º CC não parece permitir cláusulas

dispositivas de ação anda não exercido, ainda que por mútuo consenso. O

artigo 809.º CC não proíbe a desistência da instância já aberta, obviamente,

mas proíbe a renúncia da instância, tanto absoluta, como temporária, por um

pactum de non exequendo. Uma e outra são análogas no seu desvalor/valor

perante o legislador.

Âmbito processual:

1. Execução proprio sensu e improprio sensu. Noção de ação executiva stricto

sensu: importa distinguir a ação executiva de realidades próximas nos seus termos.

Assim, deve chamar-se à colação a distinção que alguns autores fazem entre:

a. Execução em sentido próprio;

b. Execução em sentido impróprio ou lato: qualquer decisão judicial –

mesmo uma sentença proferida numa ação de mera apreciação ou numa ação

constitutiva – suscetível de ser executada (com Teixeira de Sousa) mediante

atos materiais executivos praticados por órgãos não judiciais (Anselmo de

Castro). E seriam ainda execuções impróprias os atos de execução de

despachos judiciais interlocutórios. Apesar da terminologia algo comum, é

bom de ver que o que é idêntico é apenas o cumprimento de um direito

enunciado num título jurídico – maxime, uma sentença – mediante a realização

de atos materiais.

A partir desta constatação uma profunda diferença no plano substantivo emerge de

imediato: na execução latu sensu não se trata de impor coativamente ao devedor a

prestação. E por isso daqui decorre uma diferença estrutural entre execução própria

e imprópria, ao nível do próprio objeto processual. Para que se possa entender esta

última afirmação, considerem-se as dificuldades de qualificação da ação de execução

específica, prevista no artigo 830.º CC.

a. Para alguma doutrina (Teixeira de Sousa) a ação de execução específica

só em sentido impróprio poderia ser tida como ação executiva, dado ser uma

ação constitutiva.

b. Salvo o devido respeito, discordamos: é de natureza jurídica

completamente diversa a mera alteração do registo, v.g., para a inscrição do

estado civil de divorciado(a), da constituição judicial de um contrato de

compra e venda. O primeiro é um efeito absolutamente excluído do objeto

do processo, i.e., do pedido do autor e da sentença; o segundo efeito integra

o objeto do processo, i.e., é justamente o pedido deduzido pelo autor, e

integra, por isso, o objeto da sentença. O primeiro efeito não está sujeito ao

caso julgado; o segundo efeito está sujeito ao caso julgado. Tal não pode ser

descurado.

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Efetivamente, é verdade que se trata de uma ação declarativa, já que, aplicando a

delimitação atrás operada, o efeito jurídico pretendido – produção dos efeitos da

declaração negocial omitida pelo promitente faltoso – obtém-se pela prolação de um

título jurídico judicial que o enuncie. E trata-se de uma ação declarativa constitutiva,

em face do artigo 10.º, n.º3, alínea c) CPC. Mas, por outro lado, é uma ação executiva

em sentido próprio pois a própria sentença é adequada a produzir a satisfação final

do crédito do promitente fiel. A causa de pedir da execução específica é o contrato e

o pedido é um efeito jurídico que consubstancia o exercício de um poder potestativo

substantivo incorporado no direito de crédito e cujo objeto – o suprimento da

declaração negocial omissa – é uma providência adequada à realização coativa de um

direito/poder a uma prestação. A dificuldade em classificar a ação de execução

específica como ação executiva proprio sensu radica no caráter formal da oposição entre

declaração e execução: aparentemente não poderia realização coativa de prestação

por via declarativa. Não será assim. O termo execução denomina sempre no plano

substantivo a realização coativa de um direito a uma prestação, mas, este sentido

próprio, tanto pode ter um sentido amplo, como restrito, em razão do meio

processual corrido.

a. O sentido amplo corresponde exatamente ao próprio âmbito do seu

fundamento material: ações executivas são todas aquelas em que o autor

requer como efeito jurídico as providências adequadas à realização coativa de

um direito/poder a uma prestação enunciado num título legalmente

suficiente, seja qual for o meio processual. Neste sentido, uma ação

constitutiva como a de execução específica é uma ação executiva; também ela

realiza coativamente o direito à prestação de um credor reconhecido na

sentença de execução específica. Efetivamente, o efeito da sentença de

execução específica é imposto e completado unilateralmente e a providência

adequada é a própria emissão do título judicial sentença. É esta a providência

adequada e não outra porque o objeto da prestação é a prática de um facto

jurídico imaterial.

b. O sentido estrito corresponde ao âmbito das ações executivas não

declarativas: aquelas em que o autor requer como efeito jurídico as

providências adequadas à realização coativa de um direito/poder a uma

prestação enunciado num título legalmente suficiente, por meio de atos

materiais, como a penhora, a venda de bens e o subsequente pagamento, a

apreensão e entrega de coisa, a prestação do facto ou, se necessário, a

demolição da coisa. Estas últimas são as ações que serão objeto do nosso

estudo. Como veremos, estas tanto podem ter autonomia, como serem uma

fase de uma ação mista, como, ainda, um simples ato executivo no seio de

uma ação declarativa.

2. Execução civil: a execução de que estamos a tratar é a execução civil, tendo por isso

o âmbito primário e o âmbito secundário ou residual do próprio processo civil em

geral: pode ser utilizada sempre que o direito à prestação pertença à ordem jurídica

privada ou não encontre, no ordenamento jurídico, outra forma de realização

jurisdicional (Teixeira de Sousa), respetivamente. A par da execução civil existem,

assim, outras execuções pelas quais se realizam coativamente os direitos a uma

prestação que não caiba no âmbito material jusprocessual civil:

a. Execução por custas (artigos 35.º e 36.º RCP);

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b. Execução laboral (artigos 88.º a 98.º CPT);

c. Execução fiscal (artigos 148.º e seguintes CPPT);

d. Execução de sentença administrativa (artigos 157.º a 179.º CPTA);

e. Execução para pagamento de prestação pecuniária, entrega de coisa

certa ou prestação de facto fungível a uma pessoa coletiva pública, ou

por força de ato administrativo ou por ordem desta (artigos 154.º a 157.º

CPA).

Mas, mesmo no âmbito da ordem jurídica privada encontramos outra ação executiva:

o processo de insolvência, do CIRE. É considerado em situação de insolvência o

devedor que se encontre impossibilitado de cumprir as suas obrigações vencidas

(artigo 3.º, n.º1 CIRE). Podem então requerer a declaração de falência o próprio

devedor, o órgão social incumbido da administração da pessoa coletiva, ou, se não

for o caso, a qualquer um dos seus administradores, quem for legalmente (artigos

18.º, n.º1, 19.º e 20.º CIRE). Decretada em sentença a falência entra-se, então, na

liquidação e venda do património que compõe a massa insolvente aos credores que

reclamem os seus créditos. No plano dos efeitos jurídicos pretendidos também a

insolvência é uma execução de créditos pecuniários, sendo esse o sentido a dar às

obrigações da noção do artigo 3.º, n.º1 CIRE. Não está insolvido o sujeito que não

realiza, voluntariamente ou por impossibilidade, prestações de facto ou de entrega de

coisa, v.g., no âmbito de um contrato de prestação de serviços ou de fornecimento.

E no plano do procedimento também a execução para pagamento de quantia certa e

a insolvência partilham uma mesma sequência na execução – apreensão, reclamação

e graduação, venda e pagamento. Contudo, o pagamento será feito segundo um rateio

entre os credores: todos ganham e todos perdem. Há, todavia, profundas diferenças

materiais entre a execução civil comum e a execução por insolvência.

a. A insolvência postula uma impossibilidade de cumprimento da

universalidade das obrigações pecuniárias do devedor que se hajam

vencido (artigo 3.º, n.º1 CIRE). A execução para pagamento de quantia

certa pressupõe, sem prejuízo de cumulação de execuções (artigos 709.º a

711.º CPC) um crédito vencido, sem cuidar de saber se o incumprimento se

deu por impossibilidade generalizada ou não. Na execução para pagamento

de quantia certa o devedor ainda pode satisfazer do direito do credor; na

insolvência não se podem satisfazer todos os direitos de todos os credores.

Por isso, na ação executiva faz-se valer o direito à prestação pecuniária na

íntegra, enquanto tal – i.e., é uma ação de cumprimento – enquanto na

primeira faz valer à prestação pecuniária que for possível.

b. A insolvência é uma execução universal (artigo 1.º CIRE) no plano dos

créditos – cumulados, necessariamente – e dos credores abrangidos –

estão coligados. Por isso, a execução por insolvência de um dado património

tenderá a ser a execução fiscal. Estas distinções são válidas se pensarmos que

mesmo que todos os credores de um devedor o demandassem em tantas

execuções autónomas nem por isso estaríamos na insolvência. Ou seja: uma

execução universal não é a soma de várias execuções singulares.

c. Há significativas diferenças processuais: a insolvência produz o próprio

título executivo ao contrário da ação executiva. Efetivamente se a execução

comum pressupõe um título prévio que lhe serve de base (artigo 10.º, n.º5

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CPC), a liquidação da massa insolvente pressupõe uma prévia sentença de

insolvência, nos termos do artigo 36.º CIRE, completada com a declaração

de verificação de créditos reclamados (artigos 36.º, alínea j) 128.º, 129.º, n.º1

e 2, 140.º e 173.º CIRE).

d. Há prevalência da insolvência sobre quaisquer outras diligências

executivas, sejam em execuções executivas, sejam em providências

cautelares:

i. Na graduação de créditos não será atendida a preferência resultante de hipoteca

judicial, nem a proveniente da penhora, mas as custas pagas pelo autor ou

exequente constituem dívidas da massa insolvente (artigo 140.º, n.º3 CIRE);

ii. A declaração de insolvência determina a suspensão de quaisquer diligências

executivas ou providências requeridas pelos credores da insolvência que atinjam os

bens integrantes da massa insolvente (artigo 88.º, n.1º, 1.ª parte CIRE).

iii. A declaração de insolvência obsta a instauração ou ao prosseguimento de qualquer

ação executiva intentada pelos credores da insolvência; porem, se houver outros

executados, a execução prossegue contra estes (artigo 88.º, n.º1, 2.ª parte CIRE);

iv. Durante os três meses seguintes a data da declaração de insolvência, não podem

ser propostas execuções para pagamento de dívidas da massa insolvente e as ações,

incluindo as executivas, relativas as dívidas da massa insolvente correm por apenso

ao processo de insolvência, com exceção das execuções por dívidas de natureza

tributária (artigo 89.º CIRE).

Natureza jurídica. Remissão: a maioria da doutrina qualifica a ação executiva como

momento do exercício da função jurisdicional. No entanto, ela porventura, integra a atividade

administrativa do Estado. Micheli assim o defendeu e ultimamente o Ac. TC nº. 427/2009,

17 setembro, sobre a execução de penas parece ser, indiretamente, nesse sentido. A questão

está relacionada com a natureza jurídica dos atos do agente de execução, pelo que remetemos

uma tomada de posição para depois da análise do regime destes atos.

§2.º - Princípios gerais e privativos

Princípios gerais:

1. Estruturantes: o processo civil rege-se por vários princípios que tivemos já ensejo

de conhecer em sede de processo declarativo, arrumados nas categorias de princípios

estruturantes e princípios instrumentais: aqueles necessariamente presentes,

impostos pela Constituição, estes eventualmente consagrados, dependentes do

legislador ordinário. Importa agora mostrar a sua presença na ação executiva. São

estruturantes ou necessários os princípios da igualdade das partes, do contraditório,

da legalidade da decisão, da publicidade e da prevalência funcional. São instrumentais

ou eventuais os princípios dispositivo, da oficialidade, inquisitório e da oficiosidade,

da cooperação, da preclusão e auto-responsabilidade das partes e da legalidade das

formas. É quase ocioso mostrar a presença destes princípios nos processos

declarativos acessórios que correm apensados à tramitação executiva – as oposições

à execução e à penhora (artigos 728.º, 784.º e 785.º e, ainda, 856.º CPC), a reclamação

de créditos (artigos 788.º e seguintes CPC) e os embargos de terceiro (artigos 342.º e

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seguintes CPC). O que é decisivo constar que a tramitação executiva, propriamente

dita, estrutura-se de modo contraditória e com respeito pela igualdade entre as partes.

Antes de mais vigora também em sede executiva o artigo 4.º CPC que enuncia que o

tribunal deve assegurar, ao longo de todo o processo, um estatuto de igualdade

substancial das partes. Levantam-se, porém, dúvidas pois alguns afirmam um contra-

princípio de favor creditório e que concluir que a igualdade das partes é, no processo

executivo, meramente formal. Por seu turno, o princípio do contraditório dita que,

embora assente num título jurídico que favorece o exequente, o processo executivo

é um processo que se desenvolve em comparticipação entre exequente e executado.

Assim, ao requerimento executivo do exequente (artigo 724.º CPC) pode o executado

opor a sua defesa por meio de oposição à execução (artigo 728.º CPC); na verdade,

o executado é citado para pagar ou opor-se à execução (artigo 726.º, n.º6 CPC). Só

que a oposição à execução não tem a mesma função na tramitação desempenhada

pela contestação na ação declarativa: esta é necessária para determinar o sentido final

da sentença declarativa; aquela não dita se o direito existe ou não mas se pode ou não

haver execução na perspetiva do executado. Ou seja: a primeira é funcionalmente

necessária e a segunda é funcionalmente eventual. Mas há outros elementos de

contraditoriedade. Por exemplo, ao ato de penhora, realizado pelo agente de

execução em favor do exequente, pode o executado opor-se (artigos 784.º e 785.º

CPC) ou pode dele um terceiro defender-se (artigo 342.º CPC); ou ainda o despacho

do agente de execução sobre a modalidade e termos da venda dos bens pressupõe a

prévia audição dos interessados nessa mesma venda (artigo 812.º, n.º1 CPC). No

entanto, conhece-se uma importante exceção ou moderação ao princípio do

contraditório nos atos executivos: é possível a prática de atos executivos – a penhora

– sem audição prévia do executado nos casos de execução na forma sumária (artigo

550.º, n.º2 CPC). Já o princípio da legalidade da decisão vale tanto para os despachos

do juiz da execução – v.g. despacho liminar (artigo 726.º CPC), despacho

superveniente (artigo 734.º CPC) –, como para as decisões do agente de execução –

v.g., apreciação da exigibilidade da obrigação, redução da penhora de salário (artigos

804.º, n.º1 e 824., n.º5 CPC de 2012), escolha da modalidade de venda (artigo 812.º

CPC). Um e outro devem, em regra, decidir segundo a lei, pelo que deverão na

fundamentação de Direito indicar, interpretar e aplicar as normas jurídicas

correspondentes (artigo 607.º, n.º3 CPC). No entanto, tal como no processos

declarativo, o princípio da legalidade da decisão conhece limites nos juízos de

equidade, de que é exemplo a suspensão da entrega de imóvel arrendado para

habitação, por doença do ocupante (artigo 863.º CPC). Por outro lado, os atos do

processo executivo não são secretos, sejam os atos de dedução de pretensões – v.g.

o impulso processual por meio de requerimento executivo (artigo 724.º CPC) ou o

pedido de substituição de bens penhorados (artigo 751.º, n.º7 CPC) –, sejam os atos

executivos da penhora, venda e pagamento. Vale a regra geral do artigo 163.º, n.º1

CPC de que o processo civil é público, salvas as restrições previstas na lei, o que

implica o direito de exame e consulta dos autos na secretaria e de obtenção de cópias

ou certidões de quaisquer peças nele incorporadas, pelas partes, por qualquer pessoa

capaz de exercer o mandato judicial ou por quem revele interesse atendível (n.º2 do

mesmo artigo). Visto o processo ser essencialmente eletrónio (artigo 712.º CPC), a

publicidade assegura ao interessado que possa consultar informaticamente o

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processo (artigo 22.º Portaria 114/2008, 6 fevereiro e Portaria n.º 280/2013, 26

agosto), mas, ao mesmo tempo, exige o artigo 131.º, n.º5 CPC que se mostrem

respeitadas as regras referentes à proteção de dados pessoais e se faça menção desse

uso. No entanto, paradoxalmente, nos anos recentes, a existência de dois sistemas

eletrónios – o CITIUS do Estado e o SISAAE dos Agentes de Execução – leva a que

os atos processuais se achem divididos pelos dois. Acresce ainda que, porventura,

nem sempre o sistema SISAAE é de efetiva consulta pelos interessados em clara

violação do artigo 163.º, n.º1 CPC e da Constituição. Finalmente, o princípio da

prevalência funcional tem particular acuidade no processo executivo: cada ato é

devido ou admissível se apresentar-se justificado para a finalidade executiva, sob pena

de inutilidade, nos termos do artigo 132.º CPC. Além disso, o ato terá a forma mais

adequada à função, conforme o artigo 131.º, n.º1 CPC. Para o tal processo poderá

conhecer atos na forma oral, atos concentrados e atos praticados perante o agente de

execução, sem a mediação de funcionário judicial ou de documentos escritos – por

exemplo, a consulta do registo informático de execuções, preparatórios da penhora

(artigo 749.º, n.º1 CPC). É este princípio que fundamenta, nomeadamente, que,

como já notámos, possa dar-se a ocorrência de penhora antes da citação do

demandado, ao abrigo da forma sumária dos artigos 550.º, n.º2 e 856.º, n.º1 CPC.

Trata-se de um típico fenómeno de sumarização em favor da celeridade necessária à

eficácia concreta do processo.

2. Instrumentais: o processo civil executivo é, como o processo declarativo, um

processo assente na disponibilidade das partes sobre a instância. Cabe ao credor dar

o impulso processual pelo requerimento executivo (artigo 724.º CPC). Por outro lado,

podem as partes produzir negócios jurídicos com efeito sobre a lide:

a. Materiais: novação objetiva (artigo 857.º CC), remissão da obrigação (artigo

863.º, n.º1 CC);

b. Processuais:

i. Comuns: desistência da instância ou do pedido, ao abrigo dos artigos

848.º e 873.º CPC);

ii. Executivos: limitação da responsabilidade objetiva do devedor (artigo

735.º, n.º1 CPC); acordo entre as partes sobre certo ato executivo

(artigo 760.º, n.º2, 769.º, n.º1 e 806.º, n.º1 CPC).

Mas, ao exercerem-se na ação executiva poderes de autoridade do Estado, ela

apresenta-se com fortes traços de oficialidade, pois incumbe ao agente de execução

praticar, sem necessidade de requerimento de parte, os atos necessários à execução

que sejam da sua competência, como a citação, a penhora, a venda e o pagamento

(artigos 719.º, n.º1 e 6.º, n.º1 CPC por interpretação extensiva). A execução é ainda

um processo fortemente sujeito ao princípio da legalidade ou pré-determinação legal

do procedimento. Na verdade, não podem as partes determinar a sequência

processual executiva, pois essa é ditada pelo título executivo, e o juiz apenas o pode

no uso do princípio da adequação formal, de expressão prática muito reduzida (artigo

547.º CPC). Além disso, as partes não podem apresentar títulos executivos que não

sejam os previstos no artigo 703.º CPC ou com menos requisitos que os exigidos.

Todavia, há vários atos do agente de execução que, por serem, discricionários, trazem

alguma flexibilidade ao sistema executivo, como por exemplo, alguns aspetos da

ordem de penhora dos bens (artigo 751.º, n.º1 CPC) e das modalidades de venda

(artigo 812.º, n.º1 CPC). O princípio geral da cooperação entre partes e tribunal

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(artigo 7.º CPC), traduz-se num dever de litigância de boa fé do artigo 8.º CPC), cuja

violação pode levar a responsabilidade civil por litigância de má fé (artigo 542.º CPC).

Este princípio está particularmente presente num processo em que a obtenção de

dados sobre património é central e em que há riscos associados à prática de atos

materiais de autoridade nos bens do executado. Por isso, não somente rege o regime

comum da litigância de má fé, nomeadamente, na indicação de bens para penhora

por parte do exequente como, ainda, estão previstos regimes cominatórios

específicos por litigância de má fé. É o caso do disposto no artigo 750.º, n.º1, 2.ª

parte CPC: o executado tem o dever jurídico-processual de indicar bens à penhora

quando notificado para isso, sob pena de cominação (sanção descobertos). O mesmo

sucede com o disposto no artigo 858.º CPC relativamente ao exequente

(responsabilidade civil, criminal e sujeição a multa no caso de procedência de

oposição à execução sem citação prévia do executado, havendo culpa). Ainda o

mesmo princípio de cooperação impõe ao tribunal um dever de prevenção

corporizado no despacho de aperfeiçoamento nos termos do artigo 726.º, n.º4 CPC,

ao agente de execução o dever de informar o exequente de todas as diligências

efetuadas, assim como do motivo da frustração da penhora (artigo 754.º, n.º1, alínea

a) CPC) e ao executado ou terceiro o dever de apresentação da coisa penhorada, sob

pena de litigância de má fé e responsabilidade criminal (artigo 767.º, n.º2 CPC).

Finalmente, por ser um processo sujeito ao princípio do dispositivo, as partes têm o

ónus de realizar os atos processuais num certo momento do processo e num certo

prazo sob pena de caducidade ou preclusão, respetivamente. Em todo o caso, boa

parte dos atos do processo executivo não é das partes mas do agente de execução,

correlativamente com a expressão significativa que o princípio da oficialidade aqui

conhece.

Princípios privativos: podem isolar-se princípios privativos à ação executiva?

1. Teixeira de Sousa: aponta-lhe características essenciais: além da especialização a que

aludimos atrás, fala na formalização: a execução corre baseada num único documento,

que é o título executivo (artigo 10.º, n.º5 CPC). E isso é certo. Aponta ainda a coação:

ao ser um momento de exercício do ius imperii, formado num ponto formal de

legitimação, podem ser impostas medidas de coação ao executado e aos terceiros que

não colaborem com a realização coativa da prestação. Essas medidas são muito

diversas: multas, indemnização, execução de quantias não depositadas, sanção

pecuniária compulsória, arresto de bens.

2. Alguns autores (como Manuel de Andrade e novamente Teixeira de Sousa)

assinalam como identitário da ação executiva o que designam como favor creditoris: a

execução seria um processo sem igualdade material de fundo entre credor e

exequente e devedor executado, prevalecendo a posição daquele sobre a deste. No

dizer de Lebre de Freitas, a atuação da garantia dum direito subjetivo pré-definido

leva a que o executado não goze de paridade de posição com o exequente. Assim,

notas desse princípio seriam:

a. A eventual dispensa de citação prévia à penhora;

b. Ser, por regra, da responsabilidade do exequente a designação do

agente de execução;

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c. E, bem assim, a titularidade exclusiva do poder de promover a

destituição do agente de execução (artigo 719.º, n.º4 CPC);

d. A colocação das questões que mereçam um tratamento declarativo

fora da própria linha procedimental executiva e a sua contenção em

processos apensados, estruturalmente autónomos embora

funcionalmente acessórios, como a oposição à execução ou à penhora;

e. A não suspensão da execução por oposição à execução, em regra

(artigo 733.º, n.º1 CPC);

f. A manutenção da penhora mesmo quando foram procedentes

incidentes como o da substituição dos bens penhorados por outros

(artigos 740.º, n.º2 e 751.º, n.º6 CPC);

g. Regimes de revelias com efeitos cominatório pleno ou de tipo

injuncional (v.g. artigos 741.º, n.º2, in fine, 773.º, n.º3, 791.º, n.º4 e 792.º,

n.º3 CPC);

h. Eventual restrição das intervenções de terceiros provocadas pelo

executado ou espontâneas do seu lado.

Este favor creditoris decorre do próprio postulado intrínseco da execução: a parte ativa,

não pretende ter um direito, mas exerce já um direito, demonstrado no título

executivo. Neste sentido, a execução é do e para o credor. Na verdade, o favor creditoris

é, afinal, a expressão nos atos materiais da natureza forçada da execução está ínsita

no artigo 817.º CC. Em todo o caso, deve-se dizer a este respeito que, o

favorecimento material da parte ativa não é exclusivo da execução: também no

processo declarativo a simples circunstância de o autor poder escolher o tempo,

termos e objeto da ação o favorecem. Um outro princípio é o da patrimonialidade da

execução: o objeto dos atos executivos são sempre situações jurídicas ativas

patrimoniais no domínio do devedor, ou coisa corpóreas ou prestações de facto. Os

bens de personalidade, como a integridade física e a liberdade não são objeto da

ingerência executiva. A patrimonialidade é, justamente, o princípio enunciado no

artigo 817.º CC, mas também nos artigos 827.º, 828.º e 829.º CC. Como Teixeira de

Sousa escreve, as medidas coativas empregues na execução devem ceder perante

certos direitos fundamentais do executado. O domicílio deve ser respeitado e mesmo

a doença pode suspender a execução. Finalmente, ainda que seja patrimonial no seu

objeto, a execução deve ser, no seu âmbito, proporcional. A execução traduz-se

essencialmente numa restrição à posse sobre a coisa ou ao exercício de direitos

privados e, mesmo, em ineficácia de atos dispositivos. Mais: podem mesmo bens do

executado serem vendidos ou adjudicados a terceiro ou aos credores. Por isso, os

atos executivos de penhora e de apreensão de coisas e os ulteriores atos de venda ou

de entrega apenas devem ser os estritamente adequados a satisfazer a pretensão do

autor e as acessórias pretensões de custas. Nesse sentido, o disposto no artigo 735.º,

n.º3 CPC enuncia o princípio na sede da penhora, embora ele esteja sempre presente

em toda a realização de atos materiais: a penhora limita-se aos bens necessários ao

pagamento da dívida exequenda e das despesas previsíveis da execução. E ainda o

artigo 813.º, n.º1 CPC determina que a requerimento do executado, a venda dos bens

penhorados sustar-se-á logo que o produto dos bens já vendidos seja suficiente para

pagamento das despesas da execução, do crédito do exequente e dos credores com

garantia real sobre os bens já vendidos. E no novo CPC, o artigo 751.º, n.º2 CPC

determina que o agente de execução deverá respeitar as indicações do exequente

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sobre os bens que pretende ver prioritariamente penhorados, salvo se elas ofenderem

o princípio da proporcionalidade da penhora.

Estamos perante características isoladas das normas ou perante verdadeiros princípios? Um

princípio apresentar um valor normativo diretivo que permita resolver dúvidas

interpretativas e lacunas de normas concretas. Ou seja, na dúvida normativa devem

prevalecer os valores legislativos ou rationes ínsitos ao princípio. O favor creditoris, a

proporcionalidade e a patromonialidade são, assim, princípios. Questões como a

admissibilidade de intervenções de terceiros, a reconvenção em oposição à execução, os

limites e objeto da penhora devem ser vistas sempre pelo prisma daqueles princípios.

Também a formalização, entendida como dependência da execução da existência e eficácia

de um documento – o título executivo – de modo que os seus limites e objeto se medem por

este, é um princípio. Na dúvida sobre uma dada pretensão executiva, eventualmente acessória,

devemos sempre indagar se podemos, ainda que indiretamente, reconduzi-la ao título

exequendo. A coação é comum a várias normas concretas mas não é um princípio. O seu

caráter gravoso e de ius imperii não permite expansões normativas para além das soluções

positivadas. Enfim, a especialização é comum a qualquer ação, em face do caráter comum

dos artigos 130.º e 131.º CPC – não há ações que não sejam especializadas – e é uma faceta

do princípio da prevalência funcional, não sendo aliás absoluta.

B – Objeto e espécies de execução

§3.º - Pedido

Objeto imediato: o pedido deduzido na ação executiva (artigo 724.º, n.º1, alínea f) CPC)

é o efeito pretendido pelo exequente por meio dos tribunais: a realização coativa da prestação.

Dada a instrumentalidade do processo, nas ações executivas o efeito jurídico pretendido

corresponde, tendencialmente, à mesma situação de vantagem que adviria do cumprimento

espontâneo do devedor. É esse o seu objeto mediato. E, por isso, o objeto mediato do pedido

será, tendencialmente, o objeto da prestação devida, com a diferença de a mesma ser realizada

coativamente. E naturalmente, dada aquela instrumentalidade, o direito apenas poderá ser

exercido depois do vencimento (artigo 713.º CPC), pois antes dele não está o devedor

obrigado a cumprir. A realização coativa da prestação consiste na realização de atos materiais

de ingerência na esfera do devedor, dado ser contra a sua vontade. Nisto há uma diferença

em relação ao efeito jurídico típico de uma ação declarativa que é puramente jurídico: a

produção de um título jurídico, seja de certificação da existência de um direito, seja de

alteração da esfera jurídica das partes, seja de imposição de um comando de atuação (artigo

10.º, n.º2 e 3 CPC). Em suma, o pedido de realização coativa da prestação é um pedido de

cumprimento específico ou in natura da prestação. Escrevemos que o objeto do pedido será,

tendencialmente, o objeto da prestação, com a diferença de a mesma ser realizada

coativamente. Efetivamente, nem sempre se dá essa coincidência entre o objeto pretendido

e o objeto mediato da execução. Verificada a impossibilidade legal ou prática de obtenção da

mesma vantagem que adviria do cumprimento espontâneo do devedor pode o credor

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pretender um efeito jurídico sucedâneo, enquanto objeto imediato. Nestes casos, o pedido

de cumprimento específico da prestação dá lugar a um pedido de cumprimento por

equivalente. Como se verá de seguida, esse efeito sucedâneo será o pagamento de quantia

pecuniária.

Espécies de pedidos executivos pelo objeto mediato:

1. Tripartição objetiva da execução. Concretizando, podemos arrumar os pedidos

executivos em função do objeto mediato. O objeto mediato é referido pelo legislador

como o fim da execução. O fim da execução corresponde a um diferente efeito

jurídico requerido pelo credor, ditado pelo objeto da prestação, a que corresponde

uma específica sequência de atos processuais. Assim, lê-se no artigo 10.º, n.º6 CPC

que o fim da execução para o efeito do processo aplicável, pode consistir no

pagamento de quantia certa, na entrega de coisa certa ou na prestação de um facto,

quer positivo, quer negativo. Trata-se de um esquema tripartido de execuções que

remonta, pelo menos, ao Código de Processo Civil de 1876. Se, nas ações declarativas,

pode ser feito valer qualquer direito, nas ações executivas apenas as pretensões ao

pagamento de quantia pecuniária, à entrega de uma coisa, ou à realização de um facto

podem ser tuteladas. Tal acontece, não por força de uma intenção restritiva do

Direito Processual, mas pela natureza dos comportamentos passíveis de ser exigidos

a outrem no exercício de um direito a uma prestação. Na verdade, está-se sempre

perante a realização de um facto, mas o seu objeto determina a sequência de atos

materiais adequados à sua realização coativa. De entre as várias espécies, a execução

para pagamento de quantia certa serve de modelo para as restantes, a ela se

recorrendo na falta de normas especiais (artigo 551.º, n.º2 CPC). Além disso, quer a

execução para entrega de coisa certa, quer a execução para prestação de facto, podem

a dado momento, ser convertidas em execução para pagamento de quantia certa

(artigos 867º e 869.º CPC). Subjacente a esta centralidade para pagamento de quantia

certa está o princípio da patrimonialidade da execução, no seu sentido estrito de

pecuniariedade. Trata-se, afinal, da patrimonialidade material comum das obrigações,

em especial, e dos direitos a uma prestação, em geral, estabelecida pelo artigo 601.º

CC.

2. Pagamento de quantia certa: se o objeto da prestação é a entrega de quantia

pecuniária, em execução dessa obrigação pecuniária, vale a sequência processual da

execução para pagamento de quantia certa dos artigos 724.º a 898.º CPC. Nela o

efeito jurídico pedido pelo credor é, precisamente, o pagamento da quantia, se

necessário por via executiva, obtendo, assim, o exequente o mesmo resultado que

com a realização da prestação, que segundo o título executivo, lhe é devida. Por isso,

sem prejuízo de o devedor pode pagar voluntariamente, o ius imperii do Estado vai

concretizar-se nos atos instrumentais ao pagamento forçado: apreensão de bens, sem

o concurso da vontade do executado (i.e. penhora), seguida da sua venda. Por fim,

nas obrigações de moeda específica deve distinguir-se se o devedor se comprometeu

a pagar em moeda metálica ou em valor dessa moeda (artigo 552.º CC), afastando-se

assim por via contratual a possibilidade pagamento em notas. No primeiro caso,

cumpre-se uma cláusula ouro-efetivo. A eventual execução será para entrega de coisa

certa – a moeda específica. O mesmo se diga se o dinheiro for considerado coisa

infungível: então trata-se de obrigações monetárias pelo que correrá execução para

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entrega dessa coisa certa. No segundo caso, cumpre-se uma cumpre-se uma

obrigação ouro-valor, com duas variantes:

a. O devedor cumpre entregando um quantitativo em moeda corrente, correspondente à moeda

específica ou de certo metal. A eventual execução será para pagamento de quantia

certa em euros, sem prejuízo da necessidade de prévia liquidação desse valor

de equivalência com a moeda específica;

b. O devedor cumpre entregando a moeda específica ou de certo metal corresponde a um

quantitativo em moeda corrente. A execução será para entrega de coisa certa – a

moeda específica – sem prejuízo da necessidade de prévia liquidação da sua

equivalência com a moeda corrente.

3. Entrega de coisa certa: o princípio da patrimonialidade da execução, deve ainda ser

aplicado, mutatis mutandis, quando o objeto da prestação é a entrega de uma coisa.

Aqui já não se trata de executar o património do devedor, i.e., bens na sua titularidade,

mas de executar um bem que está na sua posse, causal ou formal, mas em face da

qual o credor tem um direito prevalecente. Ora, se pode o credor apreender um bem

do devedor e vendê-lo, por maioria de razão pode apreender um bem que é seu ou

sobre o qual tem um direito que pode opor ao devedor. Vale, então, o já referido

artigo 827.º CC pelo qual se a prestação consistir na entrega de coisa determinada, o

credor tem a faculdade de requerer, em execução, que a entrega lhe seja feita, regendo

a sequência processual da execução para entrega de coisa certa dos artigos 859.º a

867.º CPC. Nela o efeito jurídico pedido pelo credor é a entrega da coisa na posse

do executado, pois esse seria o resultado a que se atingiria com o cumprimento. Tal

como na penhora o Estado apreende bens, mas para posterior entrega ao exequente

que sobre eles invoca um direito. Podemos, assim, falar numa patrimonialidade em

sentido amplo.

4. Prestação de facto: já na execução para prestação de facto, a coisa não é o centro

da execução – a título instrumental, na penhora, ou a título final, na apreensão para

entrega de coisa certa – mas uma organização de meios por parte do devedor que o

concurso da sua própria vontade pode gerar. Efetivamente, uma coisa é o devedor

ter de entregar o automóvel vendido, outra é ter de entregar reparado o automóvel

vendido; uma coisa é o devedor ter de pagar uma quantia, outra é ter de realizar uma

obra em cumprimento de uma empreitada. Aqui o princípio da patrimonialidade

esgota a sua potencialidade, pois que a organização de meios enquanto tal não se

encontra, naturalmente, no ativo do executado. Ao mesmo tempo, o devedor não

pode ser compelido ao cumprimento (nemo potest praecise cogita ad factum). Valem, então,

aqui os artigos 828.º e 829.º CC. Em conformidade, o credor, seguindo a sequência

processual dos artigos 868.º a 878.º CPC, requererá perante o executado, como efeito

jurídico, a prestação por outrem, se o facto for fungível, bem como a indemnização

moratória a que tenha direito, ou a indemnização do dano sofrido com a não

realização da prestação, sendo infungível. Sendo o facto negativo pode requerer a

demolição da obra.

Execução específica e execução não específica: do que acabou de se escrever

entender-se-á que nem sempre se dá a coincidência entre o objeto devido da prestação e o

objeto efetivo da execução:

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1. Quando exista essa coincidência está-se perante uma execução específica.

Assim, podem ser executadas especificamente as prestações cujo objeto é indiferente

ao incumprimento:

a. A prestação de entrega de coisa certa;

b. A prestação de facto fungível por terceiro, ainda que mediata ou

indireta;

c. A prestação de facto negativo, quando represtinável por via de

demolição ou outro ato de reposição do estado inicial.

2. Quando não exista, trata-se de uma execução não específica ou por

equivalente, caso em que, dado o princípio da patrimonialidade da execução, o

objeto será uma quantia certa, substitutiva da prestação. Podem ser executadas não

especificamente as prestações cujo objeto não é indiferente ao incumprimento:

a. A prestação de facto infungível;

b. A prestação de facto não represtinável.

A possibilidade de concretização do objeto devido está dependente dos limites da própria

realização não voluntária de uma prestação alheia. E a prestação de entrega de quantia

pecuniária?

1. Teixeira de Sousa: trata-se de uma execução não específica porque esta prestação

pode ser cumprida com qualquer moeda com curso legal, retirada do património do

devedor ou obtida através da alienação desse património ou de uma parcela dele. No

mesmo sentido, Remédio Marques.

2. Lebre de Freitas: entende que se trata de uma forma de execução específica indireta

por antes do pagamento ter de ocorrer uma apreensão e uma venda de bens para

ulterior pagamento.

3. Com o devido respeito, temos de discordar de ambos os pontos de vista. De

imediato, o caráter fungível das obrigações pecuniárias impede que, sem mais, se

afirme um caráter não específico da execução, pois, em regra, o efeito pretendido

pelo exequente é a mesma entrega de quantia em que se consubstancia o pagamento

– logo, a satisfação do crédito. Esse pagamento tanto pode ser por entrega de

dinheiro em espécie, consignação de rendimentos ou por entrega do produto da

venda (artigos 798.º e 803.º, n.º1 CPC). Nesses casos a execução para pagamento de

quantia certa é específica. No entanto, assim não será, efetivamente, se a satisfação

for feita por meio de adjudicação dos bens penhorados, conforme os artigos 795.º,

n.º1 e 799.º CPC. Somente nessa eventualidade a execução para pagamento de

quantia certa não é específica.

§4.º - Causa de pedir

Discussão doutrinal. Posição: a causa de pedir é o facto jurídico de onde decorre o

efeito jurídico pretendido (pretensão). A causa de pedir não é um quid jurídico,, i.e., não é o

direito subjetivo em crise, nem um mero facto. A causa de pedir são os factos jurídicos

concretos de que o autor deduz o efeito jurídico, i.e., os factos jurídicos constitutivos do

efeito jurídico pretendido. Uma vez que na execução o efeito jurídico pretendido junto do

tribunal é a realização coativa da prestação cabe perguntar de onde o autor deduz esse efeito

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jurídico. O ponto não é pacífico. Alguns defendem que a causa do pedido executivo é o título

jurídico, judicial ou extrajudicial, que segundo o artigo 10.º, n.º1 CPC, serve de fundamento

à ação cumprindo a função de título executivo. Assim seguiram, no passado, Alberto dos

Reis, Lopes Cardoso e Anselmo de Castro e, recentemente, alguma jurisprudência. Por sua

vez,

1. Teixeira de Sousa escreve que a causa de pedir da ação executiva é a causa debendi,

sendo esta o incumprimento. Assim, o Emérito Mestre indica como causa de pedir

na execução da prestação correspondente à quantia mutuada não restituída o próprio

fundamento deste dever de restituição, isto é, o incumprimento do contrato de

mútuo.

2. Também Lebre de Freitas escreve que a ação executiva pressupõe o

incumprimento da obrigação.

3. Com o devido respeito, discordamos destas soluções: a causa de pedir da

execução não é nem o título executivo, nem o incumprimento. O título executivo é

apenas um documento, i.e., a forma – legal ou voluntária – de um facto jurídico. Esse

facto jurídico é o facto de aquisição pelo exequente de um direito a uma prestação.

E até pode suceder que o mesmo facto de aquisição esteja titulado de modo múltiplo

– por exemplo, em reconhecimento de dívida (artigos 458.º, n.º1 CC e 703.º, n.º1,

alínea b) CPC) e em sentença condenatória (artigos 10.º, n.º3, alínea b) e 703.º, n.º1,

alínea a) CPC). Neste sentido, a jurisprudência, como a do Ac. STJ 18 janeiro 2009

/99ª1037, enuncia que na execução a causa de pedir não se confunde com o título –

é a obrigação exequenda; o título não só a incorpora como a demonstra, mas não é

a obrigação exequenda. Mas, rectius: a causa de pedir não é sequer a obrigação em si

mesma mas o facto aquisitivo do respetivo direito à prestação, de crédito, real ou

pessoal, correlativo dessa obrigação. É esse facto que deve decorrer do título

executivo e não o facto do incumprimento. É certo, porém, que em face do artigo

817.º CC parece exigir-se, além do facto aquisitivo da pretensão, o facto de não ser a

obrigação voluntariamente cumprida. Todavia, tal como na ação declarativa o autor

não tem de alegar e provar o incumprimento para obter procedência, de igual modo

na ação executiva o exequente não de fazer constar o incumprimento do título, nem

de o alegar. Ora, tal significa que, na verdade, caberá ao executado invocar o facto

oposto do cumprimento como facto extintivo (artigos 729.º, alínea g) e 731.º CPC).

Em conclusão: a lei exige que o credor demonstre que a obrigação é certa, líquida e

exigível, mas não que uma obrigação foi cumprida (artigo 713.º CPC).

Também na execução de títulos de crédito a causa de pedir é, naturalmente, o facto aquisitivo

do direito à prestação pecuniária – cambiária, diga-se – e não a relação subjacente (causa

debendi) correspondente a esse direito (artigos 1.º LULL e 458.º CC). Essa constituição do

direito cambiário é o saque ou emissão do título. E, por isto, pode afirmar-se que a causa

debendi não é coincidente com a causa de pedir na execução cambiária.

Conclusão: aquisição do direito à pretensão de prestação: em suma, confirma-se

na análise da causa petendi da ação executiva que o fundamento material desta é, afinal, o

mesmo fundamento material da ação condenatória: o facto de aquisição pelo exequente de

um direito a uma prestação. Como já se dissera, agora com mais rigor dogmático, desse facto

aquisitivo deduzem-se tanto pretensões de interpelação para cumprimento, judicial ou

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extrajudicialmente, ao devedor, como pretensões de imposição de comando judicial de

atuação, como de execução forçada.

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III – Condições de ação

A – Título executivo

§5.º - Generalidades

Conceito, natureza e funções:

1. Introdução: a exigência legal de título executivo e de obrigação certa, líquida

e exigível: toda a execução tem por base um título, pelo qual se determinam o fim e

os limites da ação executiva, lê-se no artigo 10.º, n.º5 CPC. Ao mesmo tempo os

artigos 725.º, n.º1, alínea d) e 855.º, n.º2, alínea a) CPC estatui que a secretaria (forma

ordinária) ou o agente de execução (forma sumária) recusa receber o requerimento

quando não seja apresentado título executivo ou sua cópia, ou seja manifesta a

insuficiência do título ou cópia (só no Código velho). Além disso, o artigo 726.º, n.º2,

alínea a) CPC determina um despacho liminar de indeferimento quando seja

manifesta a falta ou insuficiência do título, causa essa que pode também conduzir,

até ao primeiro ato de transmissão de bens penhorados, a uma extinção

superveniente da execução, ao abrigo do artigo 734.º, n.º1 CPC. Enfim, tanto a falta,

como a insuficiência, como a inexequibilidade de título são fundamento de oposição

à execução (artigo 729.º, alínea a) CPC). Por outro lado, o título deve demonstrar

uma obrigação, que se pede que seja certa, líquida e exigível. Assim, o artigo 713.º

CPC determina que a execução princípia pelas diligências, a requerer pelo exequente,

destinadas a tornar a obrigação certa, exigível e líquida, se o não for em face do título

executivo. A falta destes carateres impede a execução da pretensão, como se

depreende da leitura dos artigos 724.º, n.º1, alínea h), 725.º, n.º1. alíneas a) e c) e 726.º,

n.º2, alínea c), 729.º, alínea e), 734.º, n.º1e 855.º, n.º2, alínea a) CPC.

a. Anselmo de Castro e alguma jurisprudência qualificam a exigência de título

executivo e de obrigação certa, líquida e exigível como pressuposto

processuais específicos.

b. Outra orientação – Palma Carlos, Castro Mendes, Lebre de Freitas –

designa-os como pressuposto formal e pressuposto material/substancial da

ação executiva, respetivamente.

c. Teixeira de Sousa, radicando nessa orientação, ensina que o primeiro

constitui a exequibilidade extrínseca e o segundo a exequibilidade intrínseca,

respetivamente.

Concretizando melhor, para Lebre de Freitas tanto o título executivo, quanto a

verificação da certeza, exigibilidade e liquidez da obrigação são pressupostos

processuais específicos da ação executiva. O título é um pressuposto processual, sem

prejuízo da sua articulação com o direito exequendo. Por seu turno, a certeza, a

exigibilidade e liquidez dir-se-ia que melhor lhes cabe a qualificação de condições da

ação executiva, mas que são requisitos autónomos quando não resultem presumidas

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pelo título executivo, mas apenas são requisitos autónomos quando não resultem

presumidas pelo título executivo, caso em que são exigências de complemento do

título e que apenas ao executado caberá impugnar a par dos demais carateres da

obrigação. Ao contrário, a certeza, exigibilidade e liquidez quando não constem do

título, carecendo de ser objeto de verificação autónoma, são, como o titulo,

pressupostos processuais. Enfim, a liquidez integraria o próprio título executivo em

dois casos, em que sem ela não há título:

a. Na execução de sentença genérica (artigo 706.º, n.º6 CPC);

b. Na execução de documento particular (suprimida no novo código).

Todavia, Lebre de Freitas acaba por aderir a algum do pensamento de Teixeira de

Sousa. Assim, escreve que a pretensão é intrinsecamente exequível quando sem si,

reveste as características de que depende a sua suscetibilidade de constituir o

elemento substantivo do objeto da ação executiva, para o que basta ter como objeto

uma prestação que seja certa, líquida e exigível. Já o título condiciona a exequibilidade

extrínseca da prestação ao permitir, de modo autónomo em relação ao direito a que

se refere, a execução da prestação sem verificação da ocorrência do facto constitutivo

do direito. Os factos modificativos ou extintivos teria o executado de os trazer pela

oposição à execução. Nenhuma das soluções é completamente satisfatória, com o

devido respeito. É que ou não articulam a natureza da exigência de título e de

obrigação certa, líquida e exigível com a questão da causa de pedir e mesmo do

interesse processual ou aproximam-se em demasia dos pressupostos processuais

esvaziando o sentido material daqueles requisitos. Vamos ver o regime respetivo e,

bem assim, os respetivos princípios para melhor entendermos a natureza jurídica das

duas realidades.

2. Conceito de título executivo. Função de certificação: o que é e qual é a natureza

jurídica do título executivo? Ultrapassadas as teses que defendem tratar-se de um ato

jurídico, deve considerar-se que o título executivo é um documento, i.e., a forma de

representação de um facto jurídico. Essa função de representação não é dada pelas

normas substantivas, máxime, do Código Civil, mas pelas próprias normas

processuais, in casu pela verificação dos requisitos descritos no artigo 703.º CPC. Ou

seja, como escreve Anselmo de Castro um documento é título executivo por causa

de condições formais predeterminadas na lei, e nas quais a força probatória do título

não intervém, qua tale, condições essa que para o legislador são base da aparência ou

da probabilidade do direito. Qual é o facto jurídico representado? O facto que

constitui a causa de pedir do pedido executivo: o facto aquisitivo do direito à

prestação. O título nuns casos incorpora em si mesmo esse facto aquisitivo, mas já

em outros casos o título enuncia ou reconhece o facto aquisitivo. O título executivo

é, assim, o documento pelo qual o requerente de realização coativa da prestação

demonstra a aquisição de um direito a uma prestação, nos requisitos legalmente

prescritos. No dizer de Salvador da Costa trata-se do instrumento documental legal

de demonstração da obrigação exequenda. E, portanto, cumpre, antes de mais, nesta

representação uma função de certificação da aquisição do direito à prestação pelo

exequente. Esta função não é uma função probatória em sentido próprio, pois nada

há a apreciar no plano dos factos por parte do tribunal ou agente de execução. É

certo que, sendo um documento, o seu valor probatório é o do correspondente tipo

de documento – autêntico, autenticado ou simples. Mas esse valor probatório é

próprio de uma ação declarativa, incidental ou autónoma: nesta ação terá a parte de,

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nos termos do Direito probatório material e processual, demonstrar a realidade dos

factos que alega (artigo 341.º CC). O cumprimento do ónus da prova será uma das

condições necessárias à procedência da pretensão de ação ou de defesa. Ora na ação

executiva um tal ónus apenas surge lateralmente, máxime, na oposição à execução:

aqui o valor do título enquanto meio de prova determinará que seja, nomeadamente,

o executado a ter de provar a falsidade respetiva ou a veracidade da letra ou assinatura,

nos termos comuns. E, por outro lado, esse mesmo documento pode ser sempre

utilizado como meio de prova documental da dívida numa ação judicial.

Diversamente, para efeitos de condição formal da execução, o título, como se disse,

cumpre uma representação que não é dada pelas normas substantivas, máxime, do

Código Civil, mas pelas próprias normas processuais, in casu pela verificação dos

requisitos descritos no artigo 703.º CPC. E é-o porquanto não se está na ação

declarativa onde a apresentação do documento concorreria para a produção de um

título judicial, mas num momento posterior no ciclo de tutela dos direitos: no

momento de uso de um título para a realização coativa do direito nele declarado.

Portanto, o título não é a causa de pedir mas demonstra-a, como já atrás enunciamos.

Essa representação permite, pela apresentação do título, a execução da obrigação:

demonstrada, nestes termos exigentes, a causa de pedir, pode ser deduzido o pedido

de realização coativa da prestação autorizado pelo princípio geral do artigo 817.º CC.

Ou seja, a demonstração da aquisição do direito a prestação segundo a

forma/formalidades fixadas na lei permite a dedução de um pedido executivo.

3. Função de delimitação: a função de certificação do título executivo justifica uma

outra função. A saber: certificado o direito ou poder a uma prestação, dada a

instrumentalidade da execução perante o direito subjetivo, ela fica determinada tanto

na sua causa de pedir, como no seu pedido, i.e., na realização coativa, pelo conteúdo

do título. É esse o sentido do referido no artigo 10.º, n5.º CPC. Sucessivamente, o

título executivo ao determinar a causa de pedir e o pedido determinará no plano

objetivo o objeto da prestação – entrega de quantia certa, pagamento de quantia e

prestação de facto – e o seu quantum, e, por este, a medida da penhora ou da apreensão.

No plano subjetivo o título executivo determinará, indiretamente, a regra cardinal da

legitimidade para se ser parte na execução – e, por consequência, quem são os

terceiros –: credor e devedor em face do título (artigo 53.º CPC) ou seus sucessores

(artigo 54.º, n.º1 CPC). Secundariamente, também os pressupostos processuais da

competência e legitimidade, são fixados em face do título. Em suma o título

determina porquê, contra quem e para quê o credor requer a execução. Trata-se da

função delimitadora consagrada no artigo 10.º, n.º5 CPC e apontada por Teixeira de

Sousa: o âmbito e subjetivo da ação executiva é delimitado pelo título executivo.

4. Pressupostos processuais e condições de procedência executiva. Natureza

processual do título executivo e da obrigação exigível e determinada:

condição de ação: no processo executivo em sentido próprio, i.e., na realização

coativa da prestação por atos materiais, não há juízos de procedência proprio sensu, ou

se quisermos, juízos de procedência com valor de caso julgado material. Esta nossa

afirmação tem de ser entendida com vários esclarecimentos. O juízo de procedência

material é próprio da via declarativa, ou seja, a decisão sobre se a pretensão do autor

deve prevalecer sobre a defesa do réu. Daí a afirmação de Lebre de Freitas de que a

categoria da condição da ação, requisito de procedência da ação, enquanto elemento

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da previsão da norma material que o tribunal aplica tem a ver mais com a definição

do direito, própria da ação declarativa do que com a sua realização coativa. No

processo executivo está-se já no exercício de um direito reconhecido por procedência

de uma pretensão e, por isso, não há condições materiais de procedência que relevem

nele mesmo e juízos de absolvição/condenação no pedido. Na verdade, esse juízo

de absolvição/condenação no pedido já teve lugar na ação declarativa prévia ou está

consumido por título executivo extrajudicial. Um juízo de procedência sobre a

existência do próprio direito exequendo nos termos enunciados no título é, em regra,

vedado: os juízos de procedência surgirão nos apensos declarativos ou extintivos,

face aos elementos dos autos, na execução de título negocial, e que seja de

conhecimento oficioso produzirá, eventualmente, um despacho liminar com valor de

julgado formal (artigo 726.º, n.º2, alínea c) CPC). No entanto, a execução tem causa

de pedir e pedido, como já demonstrámos. E, justamente, no plano procedimental,

ele assenta sempre num ato postulativo, portanto, dirigido ao Estado: a realização

coativa de uma prestação. Como tal conhece, como todo o ato postulativo, a sua

própria possibilidade de procedência ou de improcedência do pedido. Todavia, essa

procedência é instrumental da procedência declarativa, efetiva ou presumida por

título extrajudicial. Ela, por si, nada certifica, antes impõe- Essa instrumentalidade é

assegurada pelo título executivo. Em concreto, a causa de pedir da execução, ao ser

a mesma da condenação, perde qualquer sentido de necessidade de demonstração no

estrito procedimento executivo, pois ela conhecerá sempre uma expressão formal

por meio do título executivo: o título demonstra-a, enquanto não for

procedentemente impugnado na oposição à execução. Pelo contrário, se o direito

substantivo ainda tiver de ser declarado, por não decorrer do título, não poderá ser

executado. Como escreve Teixeira de Sousa, a causa de pedir não preenche a mesma

função no processo declarativo e no processo executivo: naquele cumpre uma dupla

função como elemento de individualização da situação alegada pelo autor e de

delimitação dos factos que vão servir de base à apreciação da procedência e nesta não

está em discussão a existência da obrigação exequenda, pelo que a causa de pedir só

serve para individualizar essa mesma obrigação. De igual modo, também o pedido

executivo é, por sua vez, um pedido coberto para efeitos materiais prévios alcançados

pelo título que lhe serve de base. Daqui decore que a ação carece sempre de

apresentação de um título, sob pena de recusa ou de indeferimento liminar ou

superveniente. E será esse documento que, como escreve Lebre de Freitas, fará a

articulação com o direito exequendo, o qual não pode ser um qualquer mas uma

obrigação certa, líquida e exigível. E, por isso, na ação executiva o juiz ou o agente

tratarão de apurar se estão ou não reunidas estas condições para os atos materiais de

execução. A sua apresentação ou a sua ausência determinam, respetivamente, a

manutenção ou extinção da execução. Deveremos, por isso, reconduzir o título e a

obrigação a pressupostos processuais como no essencial defende Lebre de Freitas e

negar que a execução conheça condições de ação. Não: a exigência de título ou de

certeza e liquidez da obrigação constitui claramente um requisito de tipo diferente

dos pressupostos processuais. Estes, como no processo declarativo, são condições

de conhecimento do pedido executivo: se, por exemplo, o tribunal for incompetente

não deverá sequer conhecer da exequibilidade. Em suma: respeitam à relação

processual. Ora, o título executivo e a obrigação não são pressupostos processuais,

pois não respeitam à relação processual. O título não determina se o tribunal pode

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conhecer do pedido do credor autor; pelo contrário, o título e a obrigação não são

pressupostos processuais, pois não respeitam à relação processual. O título não

determina se o tribunal pode conhecer do pedido do credor autor; pelo contrário, o

título e a obrigação respeitam à relação material e determinam se o tribunal pode ou

não satisfazer o pedido do credor de realização coativa da prestação, ou seja, a

procedência do pedido executivo. Por isso, o título executivo constitui uma condição

de ação. Neste sentido foi, e bem, o Ac. STJ 4 abril 2006/ 06ª736 quando considerou

que a omissão de de verificação atempada da recusa de pagamento de cheque, exigida

pelo artigo 40.º LUC para que se posse instaurar a execução traduz a ausência de uma

verdadeira condição da ação, porque o título não possui um dos requisitos

necessários à exequibilidade. Concretizando, esta afirmação, tendo em conta o

conteúdo do pedido deduzido nesta ação e a necessidade de certificação documental

da causa de pedir, pode dizer-se que o título executivo tem a natureza jurídica de

condição formal da realização coativa da prestação. Por seu turno, como se

demonstrará, também a obrigação ser exigível tem a natureza jurídica de condição

material da realização coativa da prestação – mas não a certeza e a liquidez, como se

verá adiante. Sobre estas condições de ação, quale tale, poderão ser poderão ser

proferidos juízos de verificação ou não verificação – da exequibilidade do documento,

da liquidez da obrigação. Estes não são juízos com sobre a própria dívida, como

sucede numa ação de declaração, portanto. Proferidos em despacho liminar ou

sucessivo (artigo 726.º e 734.º CPC) ou em sentença que conhece da oposição à

execução, esses juízos não terão mais do que valor de caso julgado formal, enquanto

pronúncia sobre se aquela execução conhece das condições que permitem a sua

admissibilidade. Deste modo, as decisões sobre o título e os caracteres da obrigação

não iniquinam só por si, o direito exequendo. Tal é, aliás, coerente com a nossa

anterior negação de natureza de causa de pedir – i.e., de facto constitutivo – do título

executivo. Portanto, é possível isolar funcionalmente na execução a categoria da

condição de ação atinente à procedência. Todavia, é uma procedência meramente

formal, independente da procedência declarativa e, por isso, sem valor de julgado

material. Será este aspeto procedimental, de procedência com mero valor de julgado

formal, que terá induzido a doutrina a ver nele um pressuposto processual, ainda que

específico, nos termos do artigo 620.º, n.º1 CPC.

Função constitutiva: que função específica cumpre esta condição formal de realização

coativa da prestação dada ao título executivo?

1. Teixeira de Sousa: na esteira de Alberto dos Reis, responde que o título executivo

cumpre uma função constitutiva (nulla executio sine titolo): ele atribui a exequibilidade a

uma pretensão, possibilitando que a correspondente prestação seja realizada através

das medidas coativas impostas ao executado pelo tribunal. Portanto, o título

executivo ao demonstrar a aquisição de um direito a uma prestação, nos termos

legalmente tabelados, constitui o direito à execução: somente a demonstração da

aquisição do direito a prestação segundo a formalidades fixadas na lei permite a

dedução de um pedido executivo.

2. Justamente Manuel de Andrade, dizia que o título executivo se tratava de um

documento dotado de execução aparelhada. E assim é, a realização forçada da

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prestação apenas pode ter lugar nos exatos termos e condições formais fixados pela

lei, não existindo um valor de exequibilidade autónomo, prévio ao título.

Em conclusão: a produção/emissão do título executivo – documento representativo de um

facto aquisitivo – é ela mesma o facto constitutivo do direito à realização coativa da prestação.

Características e classificação:

1. Tipicidade e literalidade (suficiência e autonomia): é o legislador que, de modo

imperativo, fixa que documentos podem cumprir função de título executivo. Vale

para eles uma regra de tipicidade, segundo Teixeira de Sousa. No nosso Código

aquela fixação legislativa consta do artigo 703.º CPC. Trata-se de um artigo que tem

sofrido significativas alterações nas últimas duas décadas. Este rol é completado pelos

artigos 704.º a 708.º CPC, além de legislação avulsa. Seja como for, trata-se de um rol

taxativo, não se admitindo o seu alargamento por interpretação extensiva e, muito

menos, por analogia. Podem as partes determinar que outros documentos possam

valer como título executivo A apontada tipicidade ou taxatividade do artigo 703.º

CPC, impõem uma resposta negativa. Por outro lado, as partes também não podem

retirar força executiva a títulos a que lei confira esse valor. É certo que Manuel de

Andrade defendia que não se considera excluída a validade das cláusulas tendentes a

privar de força executiva os títulos negociais, cláusulas essas que seriam, pelo menos,

fundamento bastante para que, recorrendo ao processo declaratório, não obstante

estar munido de um título judicial, o autor não incorra na sanção cominada no artigo

536.º CPC, do pagamento de custas. Todavia, o artigo 809.º CC parece não o permitir

no Direito Civil hodierno. Mais do que isso trata-se de normas imperativas, não

estando sujeitas à disponibilidade das partes. Teixeira de Sousa alude ainda à

suficiência e à autonomia do título executivo. Porventura, pode reconduzir-se esta

suficiência a esta autonomia à literalidade, apontada por alguma jurisprudência. A

característica da suficiência significa que o título pode cumprir toda a função seja de

delimitação, seja constitutiva, seja de certificação sem necessidade de elementos

complementares e, em particular, de mais processo declarativo. Por isso, ensina

Lebre de Freitas que o juiz pode conhecer oficiosamente da questão da conformidade

ou desconformidade entre o título e o direito que se pretende executar. Trata-se de

uma suficiência possível ou tendencial, porém. Assim, quanto à obrigação exequenda

pode ela ser certa, líquida e exigível em face do título; mas se o não for a lei permite

diligências processuais preliminares e complementares de acertamento qualitativo e

quantitativo da obrigação e, bem assim, de demonstração da sua exigibilidade nos

artigos 713.º e seguintes CPC. Quanto à causa ou fundamento da obrigação

exequenda, se ela não constar do título deverá ser alegada no requerimento, como se

demonstrará adiante: não pode deixar de se alegar a causa de pedir, i.e., a aquisição

do direito à prestação, sob pena de ineptidão ex vi artigo 186.º, n.º2, alínea a) CPC.

Mais: tratando-se de título executivo negocial parece decorrer do artigo 726.º, n.º2,

alínea c) CPC a necessidade de prova mínima do facto constitutivo. Finalmente, na

lição de Teixeira de Sousa o título executivo goza de autonomia em face do seu

conteúdo: a exequibilidade do título é independente da exequibilidade da pretensão.

Formalmente, a lei distingue, entre documento e conteúdo, nomeadamente na

separação entre, de um lado, inexistência/inexequibilidade do título (artigo 729.º,

alíneas a) e b) CPC) e, do outro, factos impeditivos, modificativos ou extintivos

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(artigo 729.º, alínea g), 1.ª parte CPC). Pode, assim, haver título, v.g., como uma

sentença ou um contrato, e a obrigação estar extinta ou ainda não ser exigível. No

entanto, esta autonomia não é absoluta. Por um lado, uma invalidade formal do

próprio negócio é também um vício formal do próprio título. Na lição de Teixeira

de Sousa a invalidade formal do negócio jurídico afeta não só a constituição do

próprio dever de prestar, como a eficácia do respetivo documento como título

executivo. Por outro lado, concordamos com Lebre de Freitas quando nota que uma

invalidade substantiva ou factos modificativos ou extintivos supervenientes à

constituição do título – i.e., toda a desconformidade entre o título e a realidade

substantiva – pode e deve ser conhecida pelo juiz, desde que a sua causa seja de

conhecimento oficioso e resulte do próprio título, do requerimento inicial de

execução, da ação de oposição à execução ou de facto notório ou de conhecimento

oficioso pelo juiz em virtude do exercício das suas funções. Tanto a invalidade formal,

como a desconformidade material de conhecimento oficioso serão conhecidas

sempre que a lei imponha ao juiz que analise o processo. Tal dever de análise da causa

está nomeadamente tabelado em despacho liminar (artigo 726.º, n.º2, alínea c) CPC),

em despacho eventual do artigo 734.º CPC e, em decisões – liminares, saneadoras ou

de sentença – dos apensos declarativos ou de incidentes, como o de habilitação.

2. Classificação: os títulos executivos podem ser classificados por mais do que um

critério:

a. Quanto à natureza da entidade autora dos efeitos jurídicos temos:

i. Títulos executivos públicos: temos:

1. Títulos executivos judiciais;

2. Títulos executivos judiciais impróprios;

3. Títulos executivos administrativos.

ii. Títulos executivos privados:

1. Títulos executivos autênticos;

2. Títulos executivos particulares, autenticados e simples.

b. Um segundo critério consiste em tomar a sentença por referência,

separando entre:

i. Títulos judiciais impróprios ou parajudiciais:

ii. Títulos extrajudiciais.

O título judicial é a sentença, i.e., a decisão, tendencialmente final no plano

do procedimento, de conhecimento de uma pretensão de resolução de um

litígio com valor de caso julgado material. Os títulos extrajudiciais, privados

e administrativos, dispensam um prévio processo judicial ou contraditório o

que leva alguns autores italianos a verem, por isso, nessa dispensa de prévio

processo judicial uma forma de tutela. Por seu turno, um título judicial

impróprio enuncia um comando de atuação, também conhecido por injunção

de cumprimento de uma obrigação pelo devedor, no quadro de um

procedimento – de injunção ou monitório – de exercício do direito de ação

e de garantia do contraditório da parte contrária, sem valor de caso julgado

material.

c. Um terceiro critério consiste em ter em conta o efeito material do título

executivo em face do direito à prestação: pode distinguir-se entre:

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i. Títulos executivos constitutivos da aquisição do direito à prestação;

ii. Títulos executivos recognitivos da aquisição do direito à prestação.

d. Quanto ao seu valor como categoria legal: podemos arrumar os títulos

executivos em:

i. Títulos executivos típicos;

ii. Títulos executivos avulsos.

§6.º - Sentença condenatória

Âmbito primário:

1. Decisões judiciais condenatórias: o título executivo judicial corresponde, no

plural do artigo 703.º, n.º1, alínea a) CPC, às sentenças condenatórias. Sempre se escreveu

que a respetiva colação, na reforma de 1961, em substituição da expressão sentenças de

condenação, idêntica à constante do artigo 10.º, n.º3, alínea a) CPC, não seria inocente.

Manifestamente quis evitar-se qualquer sinonímia com as sentenças proferidas em

ações declarativas de condenação (artigo 10.º, n.º3, alínea b) CPC). Se então se terá

querido incluir a condenação em custas, e outras condenações acessórias – que em

rigor atualmente cobertas pelo artigo 705.º, n.º1 CPC – a alínea a) abrange agora não

apenas as decisões proferidas em ação condenatória, mas qualquer sentença judicial

em ação de simples apreciação ou em ação constitutiva, imponha uma ordem de

prestação ou comando de atuação ao réu, de modo incondicional. Portanto, cabem

aqui:

a. As sentenças de ação de condenação a título exclusivo, finais ou em

saneador-sentença;

b. A parte condenatória de ação de simples apreciação em que o pedido

de reconhecimento da existência/inexistência de um facto/direito o

autor tenha cumulado um pedido de condenação;

c. A parte condenatória de ação constitutiva em que ao pedido de

constituição, modificação ou extinção de uma situação jurídica o autor

tenha cumulado um pedido de condenação.

Ao contrário, estão, normalmente excluídas pela doutrina, as sentenças de simples

apreciação, porque não impõem um comando de atuação, e as sentenças constitutivas

porque não carecem de ulterior colaboração do réu quanto ao efeito que produzem.

Umas e outras cumprem, pela simples prolação da sentença, o efeito pretendido pelo

autor. No plano da competência as sentenças condenatórias tanto podem ser

sentenças pelos tribunais comuns, como por tribunais arbitrais. Quanto a estes o

artigo 705.º, n.º2 CPC determina que as decisões proferidas pelo tribunal arbitral são

exequíveis nos mesmos termos em que o são as decisões dos tribunais comuns. Tal

é confirmado pelo artigo 26.º, n.º2 LAV/86 e pelo artigo 42.º, n.º7 LAV/2011. No

entanto, a sua especificidade traduz-se em fundamentos adicionais de impugnação

em sede dos artigos 730.º CPC e 48.º LAV/2011. Considerando o plano da

legitimidade/fundamentação pode também ser uma sentença homologatória de

confissão de pedido, de transação, de plano de insolvência (artigos 192.º, 196.º, 214.º

e 217.º CIRE). Naturalmente que deve ser uma sentença homologatória condenatória,

mas a pré-existência de um negócio processual não lhe altera a natureza de sentença,

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ainda que determine específicos fundamentos de oposição à execução (artigo 729.º,

alínea i) CPC) e o negócio processual subjacente possa ser objeto de impugnação

autónoma (artigo 291.º, n.º2 CPC) e de recurso de revisão (artigo 696.º, alínea d)

CPC). O título executivo é a própria sentença e não o negócio subjacente. Por fim,

no plano da eficácia temporal, uma sentença condenatória pode também ser uma

medida cautelar não especificada que imponha uma ordem de atuação, de pagamento

de quantia certa, de entrega de coisa ou de prestação de facto, positivo ou negativo.

Trata-se de uma verdadeira sentença, ema com um caso julgado material provisório.

2. Extensão às condenações acessórias: no plano formal são equiparadas às

sentenças condenatórias, os despachos e quaisquer outras decisões ou atos de

autoridade judicial que condenem no cumprimento duma obrigação (artigo 705.º,

n.º2 CPC). É o que sucede com a decisão, autonomizada em despacho ou integrante

de uma qualquer sentença, que imponha o pagamento das custas processuais,

abrangendo taxa de justiça, encargos e custas de parte (artigos 527.º, n.º1 e 529.º, n.º1

CPC). O mesmo se diga quanto à condenação no pagamento de multa e/ou o

pagamento de indemnização por litigância de má fé, nos termos do artigo 542.º, n.º1

CPC.

Âmbito eventual:

1. Obrigações prejudicadas de fonte legal: admissibilidade de execução de

condenação implícita: tem-se discutido se, além de decisões de condenação

proferidas pelo juiz na ação declarativa, se poderiam ainda executar obrigações que,

embora para elas o autor não tenha pedido condenação no cumprimento e sobre as

quais não houve pronuncia judicial expressa, se teriam constituído na esfera jurídica

do réu como resultado da procedência do pedido. A questão tem sido colocada

relativamente à execução de juros moratórios legais não compreendidos na sentença

de condenação, mas é muito mais ampla. Assim,

a. Alberto dos Reis, mais tarde seguido por Lopes Cardoso, entendia que na

expressão sentenças condenatórias o Código quis abranger todas as sentenças em

que o juiz expressa ou tacitamente impõe a alguém determinada

responsabilidade, máxime, as sentenças constitutivas. Anselmo de Castro

entendia que da expressão legal estariam somente excluídas da força

executiva as sentenças proferidas em ações de mera apreciação. Na verdade,

teriam ainda força executiva as sentenças das ações constitutivas típicas de

certos processos especiais como os de expropriação por utilidade particular

e as ações de preferência. Numas e noutras está sempre implícita a execução

subsequente.

b. Na doutrina recente, Teixeira de Sousa tem entendido que pode haver

sentenças de simples apreciação ou constitutivas que contenham, de forma

implícita, a condenação num dever de cumprimento, podendo , nesse caso

servir de título executivo. A condenação implícita ocorre quando o pedido

não deduzido não teria utilidade económica distinta e, por isso, se tivesse tido

lugar a sua efetiva dedução, estar-se-ia perante uma cumulação aparente.

c. Por seu turno, Lebre de Freitas começa por enunciar que é duvidosa,

perante o princípio do dispositivo, a figura da condenação implícita, porém

configurável na medida em que se tenha também por deduzido um pedido

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implícito. Assim, se é certo que o efeito constitutivo da sentença produz-se

automaticamente, nada restando dele para executar, pode vir-se a executar

uma decisão condenatória expressa ou implícita, que com ele se pode cumular.

Generalizando, a ideia de condenação implícita é aceitável quando pela

sentença haja sido constituída uma obrigação cuja existência não dependa de

qualquer outro pressuposto. Já nas ações de simples apreciação, escreve

Lebre de Freitas que vigorando o princípio do dipositivo, compreende-se que

tal sentença não possa ser objeto de execução. No mesmo sentido, se

pronunciaram Remédio Marques, Abrantes Geraldes e Amâncio

Ferreira: a fórmula condenatória não precisa de ser explícita, bastando a

necessidade de execução resultar do contexto da sentença, no dizer deste

último autor.

Nos tribunais

a. foi paradigmático o Ac. STJ 27 maio 1999/ 99B268: embora a sentença

proferida em ação constitutiva não tem, em si mesma, efeito executivo, não

obstante, sempre que a sentença proferida sobre o objeto da ação contenha

implícita, pela natureza desse objeto, uma ordem de praticar este ato, ou de

se realizar a mudança a que a ação visava, ela constituirá, então, título

executivo. Por isso, continuou, uma vez julgada procedente a ação de

preferência, e o Réu se negar a cumprir, não se torna necessário uma nova

ação para o levar ao cumprimento, bastando para a execução a sentença

declaratória obtida na dita ação de preferência.

b. Por seu turno, o Ac. RL 26 novembro 1992/ 068172 decidiu que para que

a sentença possa servir de base à ação executiva, não é necessário que

condene no cumprimento de uma obrigação, bastando que esta obrigação

fique declarada ou constituída por essa sentença. E assim, apesar de o

inventário não ser uma ação de condenação, o certo é que a sentença

homologatória de partilhas fixa definitivamente, após o seu trânsito em

julgado, o direito dos interessados, nomeadamente quanto aos bens que lhes

foram adjudicados, pelo que se o cabeça de casal se recusar a entregar tais

bens aos interessados, a sentença homologatória de partilhar servirá de título

executivo para obter tal entrega.

c. Finalmente, o Ac. RE 20 março 1987 concluiu que o enquadramento da

pretensão do exequente nos limites do título executivo deve ser conhecido

oficiosamente pelo tribunal, independentemente de o executado deduzir ou

não oposição e que, em conformidade, quando a sentença condenatória

compreenda uma ordem de cumprimento de obrigação pecuniária e não haja

condenação em juros, o pedido do exequente pode abranger o crédito do

capital e o dos respetivos juros de mora, à taxa legal, a contar da data da

notificação da sentença ao executado ou do trânsito.

2. Posições negatórias: em sentido exatamente oposto e de modo também

inequívoco, foram produzidos durante os anos 90 do século passado vários arestos

compondo uma linha jurisprudencial:

a. Já em 1985, Ac. STJ 28 fevereiro 1985/ 07104 enunciava a essencialidade da

doutrina contrária, em sede de juros de mora. A saber: sendo os juros

moratórios uma facultativa reparação indemnizatória causada pela mora,

necessário se torna que sejam expressamente exigidos pelo credor na devida

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oportunidade. Apenas assim se possibilitando a inerente oposição do

devedor, de modo a serem apreciados, atendidos e fixados na sentença em

que se procede a liquidação do crédito exequendo.

b. Posteriormente, concluiu-se no Ac. RC 30 novembro 1999/ 2225/99 a

consequência executiva deste raciocínio: os juros de mora se não constarem

da sentença, não estão contidos no título e, não constando do título executivo

a obrigação do pagamento de juros, a execução com base nessa sentença não

os pode abranger.

c. Mas, mesmo recentemente, o Ac. RE 28 fevereiro 2008/ 3011/07-2 decidiu

identicamente: não podem os mesmos juros ser exigidos na ação executiva.

Já diversamente, quanto ao adicional de juros da sanção pecuniária compulsória legal

poder-se-ia executar com base em sentença que não os houvesse imposto. Em

termos próximos, no passado, Lebre de Freitas negava que se pudesse executar a

obrigação de restituição por efeito da nulidade declarada em ação, bem como a

obrigação de juros moratórios: é a sentença que define o conteúdo do direito nos

limites do pedido (artigo 609.º CPC) e constitui caso julgado nos limites da decisão

(artigo 621.º CPC). Diferentemente, já a sanção pecuniária compulsória legal prevista

no artigo 829.º-A, n.º4 CC não carecia de condenação expressa.

3. Posição pessoal: é inegável que há decisões de simples apreciações e constitutivas

que são pressupostos legais da constituição de uma obrigação do réu. Os exemplos

são, entre outros, os já atrás casuisticamente expostos: as sentenças de divisão de

coisa comum, incluindo a sentença homologatória de partilha, de demarcação, de

mudança de servidão, de preferência, de execução específica, de declaração de

nulidade do despedimento, entre outras. Por outro lado, também a condenação em

pagamento de quantia pecuniária é prejudicial à condenação em juros de mora legal.

Todavia, não é correto falar em condenação implícita pois que, na verdade, nenhuma

vontade processual pode ser assacada ao tribunal nesse sentido, presumida ou tácita.

O tribunal limita-se a conhecer do que lhe é pedido, não podendo, tampouco,

condenar ou sequer declarar a obrigação prejudicada. A questão, se bem colocada, é

outra: se a sentença no caso, ou qualquer outro título executivo em geral, apenas é

executória da obrigação dela constituída ou reconhecida ou se também das

obrigações derivadas por força da lei. Na primeira hipótese ter-se-ia de obter um

título por cada obrigação; na segunda, apenas título para a obrigação prejudicial. Um

entendimento possível é o de que não se pode impor ao credor a obtenção de título

senão quanto a obrigações que dependam da vontade do devedor para se

constituírem. Pelo contrário, não seria conforme ao artigo 20.º, n.º1 CRP que o

credor estivesse dependente do devedor para poder executar uma obrigação que já

decorre da lei. E o caráter ex lege significa, ademais, que o devedor não seria

surpreendido por uma fonte de vinculação cujo desconhecimento não pode impedir

a execução (artigo 6.º CC). Deste modo, e respeitando a exigência do artigo 10.º, n.º5

CPC, as obrigações legais para serem executadas ou são reconhecidas

autonomamente em título ou deveriam ser consequência de outros já, por sua vez,

tituladas. Aplicando esta regra à execução de sentença, a admissão de uma força

executória indireta para as obrigações prejudicadas parece inevitável, conforme a

doutrina tem pugnado. Os valores da tutela do credor perante o devedor de

obrigação constituída ex lege corresponderiam assim ao princípio da economia

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processual para esse credor carente de tutela executiva. Aplicando esta regra à

execução da sentença, a admissão de uma força executória indireta para as obrigações

prejudicadas parece inevitável, conforme a doutrina tem pugnado. Os valores da

tutela do credor perante o devedor de obrigação constituída ex lege corresponderiam

assim ao princípio da economia processual para esse credor carente de tutela

executiva. Claro que isto significa que o princípio do dispositivo – i.e., o credor que

decide do seu pedido – tanto pode ser exercido no momento da declaração ou no

momento da execução da dívida. Todavia, há que notar que a admissão de execução

de obrigações sem prévia pronúncia judicial implica, inevitavelmente, uma restrição

ao princípio do contraditório: o credor vai executar uma obrigação que não alegou

na ação declarativa, relativamente à qual o réu não se pode defender, e sobre a qual

o juiz não produziu condenação. Na prática, o direito de defesa fica deferido para o

momento da oposição à execução. Mas isso significa que uma eventual impugnação

ou exceção – máxime, contraditório – terão de ser admitidas em sede de artigo 729.º,

alínea g) CPC apesar de não estarem suportadas em factos objetivamente

supervenientes. Mais: o réu será executado e sujeito a penhora por uma dívida cuja

extensão desconhecia, e, em princípio, sem citação prévia (artigo 550.º, n.º2, alínea a)

CPC). Cabe, por isso, perguntar se essa restrição é necessária e razoável já que a

natureza processual do título executivo impõe valores próprios que não podem ser

desconsiderados. Em suma: prevalece o interesse do credor ou prevalece o interesse

do devedor? Por um lado, parece ser uma restrição razoável: dado se tratar de direitos

constituídos ope lege, e pese embora o valor não expresso da força executória da

sentença, não será uma decisão surpresa contrária à garantia de processo equitativo

aflorado no artigo 20.º, n.º4 CRP, como já dissemos. Pode é perguntar-se se será uma

restrição necessária: não nos parece que seja, tendo conta a circunstância de que o

autor teve a oportunidade processual de deduzir o pedido de condenação na

obrigação secundária a título de pedido subsidiário prejudicial, i.e., supondo a prévia

procedência do pedido prejudicial, e não o fez. O argumento de se estar perante um

pedido sem autonomia económica, logo de dedução meramente eventual, pressupõe

que o réu não poderia evitar esse prejuízo, o que não pode colher, como se viu:

mesmo quando não tenha autonomia económica, a exequibilidade da obrigação é um

prejuízo para o qual ele apresenta interesse direto em contradizer. Concluir o

contrário é colocar o momento do exercício do direito de defesa do devedor na

disponibilidade do credor: ele tanto pode deduzir expressamente o pedido

condenatório, provocando a defesa do devedor, como pode não o fazer, fazendo

aquele esperar pela possibilidade de oposição à execução. Esta consequência não é

razoável.

4. (Conclusão): o artigo 703.º, n.º2 CPC: apesar disso, desde 2003, que se pode

ler no novo artigo 703.º, n.º2 CPC que se consideram abrangidos pelo título

executivo os juros de mora, à taxa legal, da obrigação dele constante.

Complementarmente, o artigo 716.º, n.º2 CPC veio acrescentar que a liquidação pelo

agente de execução de juros moratórios vincendos, quando não decorram do título

e documentos complementares, será feita em função das taxas legais de juros de mora

aplicáveis. O legislador tornou, assim, partido nesta discussão. Todavia, o preceito,

por tratar apenas do âmbito objetivo do título executivo, não dispensa o credor de

ter de expressamente deduzir o respetivo pedido acessório de juros. Por outro lado,

na execução para prestação de facto admite-se no artigo 868.º, n.º1, 2.ª parte CPC

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que o credor possa requerer o pagamento da quantia devida a título de sanção

pecuniária compulsória, em que o devedor tenha sido já condenado ou cuja fixação

o credor pretenda obter no processo executivo. Destas formas, quanto a estas

obrigações ocorrer uma transferência da dedução de factos modificativos, ou

extintivos respetivos para a oposição à execução. Naturalmente que esta tomada de

posição do legislador quanto aos juros de mora legais e quanto à sanção pecuniária

compulsória, permite ainda colocar a pergunta de se ela é aplicável a todas as

eventualidades ditas de condenação implícita ou se é excecional. Temos para nós que

se trata de solução excecional: quisesse o legislador consagrar a tese generalista e tê-

lo-ia feito. Pelo contrário, a consagração limitada confirma, ademais, que para o

legislador as obrigações prejudicadas não estão abrangidas pelo título judicial tendo

o autor o ónus de as pedir cumulativamente.

Simples declaração judicial do direito: escrevemos que as sentenças de simples

apreciação não impõem um comando de atuação e, como tal, não têm força executiva, à

semelhança de outros ordenamentos. A questão já não é, pois, deduzir da sentença,

implicitamente, uma outra obrigação retirada do efeito declaratório ou constitutivo

(enquanto tenha neste um seu pressuposto), mas, sim, de a própria declaração ou recognição

da obrigação ser ou não suficiente para a sua ulterior execução. Portanto, é à própria sentença

que se recusa força executiva. Ora, dizer-se funcionalmente incoerente que o

reconhecimento de dívida constante de documento privado possa ter força executiva – artigo

703.º, n.º1, alínea b) CPC – e que, ao contrário, um reconhecimento judicial dessa mesma

dívida, por não ser condenatória, não possa ter força executiva, apesar da declaração

documentada e definitiva do direito, como nota Anselmo de Castro. Lopes Cardoso parece

admitir, justamente, que a mera declaração judicial da obrigação possa ser executada. No

entanto, a lei exige que se trate de sentenças condenatórias, i.e., a imposição de uma ordem

judicial de atuação, não bastando uma mera sentença. Tal é um claro e inultrapassável

obstáculo a interpretação diversa. O tratamento diferenciado entre a declaração judicial e a

declaração extrajudicial do crédito corresponde a um aspeto central na dogmática do sistema

de ações vigente, à luz do artigo 10.º CPC: pedido condenatório é sinónimo de pedido de

simples declaração com força executiva já que no plano material a ordem de condenação não

alteraria, só por si, a data e os termos substantivos do cumprimento. Ou seja: a diferença de

conteúdo da sentença – simples apreciação ou condenação – justifica-se por diferenças no

plano processual do objeto da ação. O pedido de simples recognição do crédito tem no título

de aquisição do direito, máxime, no contrato e na incerteza grave e objetiva a sua causa de

pedir e visa, como efeito prático, repor os limites entre esferas jurídicas. O pedido de

condenação apenas tem naquele título a causa de pedir e visa, como efeito prático, a

possibilidade de cumprimento forçado da obrigação. A escolha de um ou de outro pedido

fica na disponibilidade do autor. Por outras palavras, a aparente incoerência do sistema em

conceder valor executivo à recognição extrajudicial e a negar à judicial decorre de o legislador,

em homenagem ao princípio dispositivo, exigir ao credor uma expressa vontade executiva.

É esse o sistema executivo vigente em Portugal. Diversamente seria se o nosso sistema

tornasse o exercício do direito à execução independente da condenação. Há, porém, exceções

previstas especialmente na própria lei. Elas valem nos estritos limites, enquanto casos

previamente conhecidos e utilizados pelas partes. Assim, as certidões extraídas dos

inventários valem como título executivo, desde que contenham os elementos previsto no

artigo 52.º, n.º1 CPC, entretanto revogado, mas integralmente transladado para o artigo 20.º,

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Lei n.º 23/2013, 5 março. Mas, em bom rigor, e ao contrário do que se poderia defender, o

título executivo não é a certidão de sentença, mas a própria sentença homologatória da

partilha da qual a certidão enuncia o conteúdo (artigo 20.º, n.º1, alínea c) Lei n.º23/2013, 5

março – neste caso, decisão do notário de declaração de partilha. Justamente já foi decidido

que a própria sentença homologatória da partilha vale como título executivo para pedir a

entrega dos bens. Ora, na sentença ou decisão de partilha temos duas decisões ou efeitos

absolutamente diferentes: a simples apreciação da existência das situações jurídicas, créditos

in casu, que integram a herança; o efeito constitutivo de partilha dessas situações jurídicas ou

seja de titulação subjetiva. E assim, embora não haja condenação alguma, há, por força do

artigo 20.º da Lei n.º 23/2013, um valor executivo dado ao crédito judicialmente ou

notarialmente reconhecido.

Execução provisória:

1. Regra ou exceção? A força executiva de uma sentença não se confunde com o seu

valor de caso julgado, pois pode haver execução antes do transito em julgado. A regra,

enunciada no n.º1 do artigo 704.º CPC é a de que a sentença só constitui título

executivo depois do trânsito em julgado e mesmo que as custas da causa não se

achem pagas. Relembre-se que a decisão transita em julgado logo que não seja

suscetível de recurso ordinário ou de reclamação, nos termos dos artigos 615.º e 616.º

CPC. Deste modo, tipicamente, quando não seja admissível recurso ordinário há que

deixar transcorrer o prazo de 10 dias de pedido de reclamação, retificação, aclaração

ou reforma (artigos 149.º, n.º1, 614.º, n.º1, 615.º, n.º4 e 616.º, n.º1 e 2 CPC); quando

o seja, o prazo de 30 ou 15 dias de interposição de recurso (artigo 638.º, n.º1 CPC).

Todavia, no processo comum essa regra cede em toda a linha perante exceções,

trazidas pelo regime recursal posterior a 2003. Na verdade, o artigo 704.º, n.º1, in

fine CPC admite que possam ser executadas sentenças pendentes de recurso, desde

que a interposição deste tenha efeito meramente devolutivo, i.e., não suspensivo dos

efeitos da sentença – n.º1 do artigo 704.º CPC. Ou seja: o valor de exequibilidade

pode ser alcançado mesmo antes de valor de caso julgado. Ora, até à Reforma, a regra,

constante do n.º1 do artigo 692.º CPC, era a de que o recurso de apelação interposto

em processo ordinário – que era o recurso pertinente para a impugnação da sentença

condenatória nos termos do artigo 691.º CPC – tinha efeito suspensivo; diversamente,

no processo declarativo sumário (anterior artigo 792.º CPC) a interposição da

apelação tinha efeito meramente devolutivo, salvo no caso em que fosse decretada a

restituição de prédio. Com a reforma de 2003, foi alterado o atual artigo 704.º, n.º5

CPC, bem como os artigos 647.º, 649.º CPC, relativos às matérias do efeito da

interposição do recurso de apelação e respetivos regime. Em simultâneo o artigo

792.º CPC foi suprimido. O sentido dessa mudança foi consagrar como regra, no

novo artigo 647.º CPC, o que antes era exclusivo do artigo 792.º CPC: a interposição

de apelação tem efeito meramente devolutivo. Consequentemente, podem ser de

imediato executadas as sentenças condenatórias, após o seu conhecimento pelas

partes. Em opção vem fazer com que o risco da injustiça da decisão de primeiro

instância seja suportado pelo devedor, e não pelo credor que obteve ganho, o que

aumenta a pressão sobre a qualidade das decisões de primeira instância. E mesmo

que seja interposto sucessivo recurso de revista, passando pelo crivo da dupla

conforme (artigos 671.º, n.º3 e 672.º CPC) esse terá, novamente, efeito meramente

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devolutivo (artigo 676.º, n.º1 CPC). Por isso, será anda exequível a sentença pendente

de recurso de revista.

2. Sentenças não passíveis de execução provisória: escapam à exequibilidade

imediata os casos previstos no artigo 647.º, n.º2 e 3 CPC. Nomeadamente, e entre

outras, as ações sobre o estado das pessoas, ações referidas no n.º3 do artigo 629.º

(alíneas a) e b)) CPC – quando se aprecie e a validade ou a subsistência de contratos

de arrendamento para habitação) e as ações que respeitem à posse ou à propriedade

da casa de habitação do réu. Em suma, causas que relevarão em sede de execução

para entrega de coisa certa. Nestas eventualidades, em que não pode haver execução

provisória, determina o artigo 649.º, n.º2 CPC que o apelado (i.e., o credor), que não

esteja já garantido por hipoteca judicial, pode requerer que o apelante preste caução,

nos termos do artigo 623.º CC e artigo 650.º CPC, no prazo de 10 dias contados da

notificação do despacho que admitiu o recurso com efeito suspensivo.

3. Procedimento de execução provisória:

a. Inibição de execução: nos casos não abrangidos pelo n.º3 do artigo 647.º

CPC, obtida sentença, o devedor apelante, ao interpor o recurso, pode

requerer a suspensão da exequibilidade da sentença, com fundamento em que

a execução lhe causa prejuízo considerável e desde que se ofereça para prestar

caução. Temos aqui uma providência inibitória da execução provisória de

sentença, semelhante á existente noutros ordenamentos jurídicos. A

declaração do efeito suspensivo é requerida no próprio requerimento de

interposição do recurso, conforme o n.º4 do artigo 647.º CPC. O apelado

pode responder-lhe nas suas contra-alegações (artigo 648.º, n.º2 CPC). O

perigo de prejuízo deve ser justificado nos mesmos termos que valem para

as providências cautelares – artigo 368.º, n.º1 CPC) – ou para a dispensa de

citação prévia – artigo 727.º, n.º1 CPC; ou seja, mediante a alegação e prova

de factos dos quais decorra ser verosímel a ocorrência de prejuízo

considerável em resultado da satisfação por via executiva do aparente crédito

do autor. O que se deve demonstrar é, pois, o perigo de dano e não a pretensa

inexistência da dívida do réu, já que esta está a ser discutida no recurso. Mas

tal não é suficiente para a procedência do requerimento: se resultar da prova

que o receio do prejuízo considerável é fundado, deve ainda o Tribunal, nos

termos gerais do artigo 368.º, n.º2 CPC, fazer um balanceamento entre os

interesses das partes, ou seja, entre o prejuízo que a execução causará ao

devedor e o prejuízo que a não execução causará ao credor. Será deferido o

requerimento do devedor apelante se o saldo lhe for negativo, mas desde que

efetive a prestação de caução em prazo fixado pelo tribunal (artigo 647.º, n.º4,

in fine CPC) e sem limite temporal. Se houver dificuldade na caução – artigo

623.º CC –, calcula-se o seu valor mediante avaliação por um único perito

nomeado pelo juiz, conforme o artigo 650.º, n.º1 CPC. A caução deve ser

prestada no prazo de 10 dias após o despacho de admissão do recurso (artigo

641.º CPC), sob pena de o juiz mandar extrair translado, com a sentença e

outras peças que o juiz considere indispensáveis para se processar o incidente,

seguindo a apelação os seus termos. Aplicar-se ainda o artigo 648.º CPC: a

suspensão da exequibilidade da sentença será levantada se a instância de

recurso estiver parada durante mais de 30 dias, por negligência do apelante

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(devedor) em promover s seus termos. Por outro lado, os n.º3 e 4 do artigo

650.º CPC, vieram inovar. Assim, a caução que tiver sido prestada por fiança,

garantia bancária ou seguro caução, mantém-se até ao trânsito em julgado da

decisão final proferida no último recurso interposto. E só pode ser libertada

em caso de absolvição do pedido ou, tendo a parte sido condenada, se prova

que cumpriu a obrigação exequenda no prazo de 30 dias a contar do trânsito.

Se não tiver sido feita essa prova no prazo, será notificada a entidade que

prestou caução para entregar o montante da mesma à parte beneficiária,

aplicando-se, em caso de incumprimento e com as necessárias adaptações, o

disposto no artigo 777.º, em especial o seu n.º3 CPC. Serve, então, de título

executivo para entrega do montante a notificação efetuada pelo tribunal.

b. Execução, revogação ou modificação da sentença: não tendo sido

deduzido ou obtido provimento o requerimento de atribuição de efeito

suspensivo à apelação ou tendo este sido indeferido, basta ao credor a

extração de certidão de sentença ou do translado (artigo 649.º, n.º1 CPC) para

poder deduzir a sua pretensão no requerimento executivo. Mas, proposta a

execução, o executado pode ainda, ao abrigo do artigo 704.º, n.º5 CPC, obter

suspensão do processo, mas agora da própria instância de execução, mediante

prestação de caução. Tal pedido terá de ser deduzido o mais tardar até ao

primeiro ato de transmissão dos bens penhorados, por o objeto da suspensão

serem os atos materiais propriamente ditos (artigo 734.º, n.º2 CPC). Por

acaso, aplica-se, devidamente adaptado o n.º3 do artigo 733.º CPC – i.e., a

execução suspensa prosseguirá se a oposição estiver parada durante mais de

30 dias, por negligência do opoente em promover os seus termos – e referido

o artigo 650.º, n.º3 e 4 CPC. Mas, ainda que não obtenha essa suspensão, o

novo artigo 704.º, n.º4 CPC admite uma suspensão da parte final da execução

em respeito ao direito à habitação do executado: enquanto a sentença estiver

pendente de recurso, se o bem penhorado for a casa de habitação efetiva do

executado, o juiz pode, a requerimento daquele, determinar que a venda

aguarde a decisão definitiva, quando aquela seja suscetível de causar prejuízo

grave e dificilmente reparável. Quid iuris, se a sentença vier a ser revogada ou

modificada pelo recurso? Importa distinguir consoante a decisão de recurso

seja anterior ou posterior à transmissão dos bens penhorados, fazendo uso,

em qualquer dos casos, do n.º2 do artigo 704.º CPC. Se a revogação ocorrer

antes da transmissão dos bens penhorados, naturalmente que a instância

executiva ou se extingue ou vê restringido o seu âmbito. A penhora será

levantada e não poderá haver venda dos bens, total ou parcialmente. Se a

revogação ocorrer depois da transmissão dos bens penhorados, o problema

é diverso, uma vez que estes já estão na esfera jurídica e, eventualmente, na

posse do terceiro adquirente. A execução até já pode ter terminado com o

pagamento, sendo certo que este não foi distribuído pelos credores sem que

estes prestassem previamente caução – artigo 704.º, n.º3 CPC. Neste caso, a

revogação importa a ineficácia da venda nos termos do artigo 839.º, n.º1,

alínea a) CPC e a possibilidade de devolução dos bens – artigo 839.º, n.º3

CPC. Em alternativa, pode o executado que obteve total ou parcialmente

provimento no recurso ficar com a caução prestada pelos credores.

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4. Âmbito: este regime de exequibilidade imediata da sentença pendente de recurso

com efeito meramente devolutivo, vale, por maioria ou por identidade de razão,

consoante os casos, para todas as situações em que a sentença exequenda não está

estabilizada na sua eficácia. Em primeiro lugar, e por maioria de razão, como bem

ensinava Anselmo de Castro e foi continuado por Teixeira de Sousa, o regime vale

para a execução de sentença que nem sequer admita recurso e esteja aguardado o

esgotamento do prazo de 10 dias para reclamar ou requerer notificação, aclaração (só

no Código Velho) ou reforma (artigos 615.º, n.º1 e 3 e 616.º, n.º1 e 2 CPC).

Identicamente, é ainda uma execução provisória a execução de sentença contra a qual

tenha sido apresentado recurso extraordinário de revisão de sentença, nos termos do

artigo 696.º e seguintes CPC. Justamente, o artigo 702.º CPC determina que se estiver

pendente ou for promovida a execução da sentença, não pode o exequente ou

qualquer credor ser pago em dinheiro ou em quaisquer bens sem prestar caução. E

portanto, tanto num caso, como no outro, pode o credor executar de imediato a

sentença, seguindo o regime de prestação de caução, modificabilidade da execução e

ineficácia da venda constante dos artigos 704.º e 839.º, n.º1, alínea a) e 3 CPC. Em

segundo lugar, o artigo 47.º, n.º3 LAV/2011 admite que uma sentença arbitral possa

ser executada ainda que haja sido impugnada mediante pedido de anulação

apresentado de acordo com o artigo 46.º LAV/2011. Essa impugnação tem efeito

meramente devolutivo, mas o impugnante – in casu o devedor – requerer que ela

tenha efeito suspensivo da execução, oferecendo-se para prestar caução. Apenas com

a prestação da caução no prazo fixado pelo tribunal é que se suspenderá a execução.

Aplica-se neste caso o disposto no n.º3 do artigo 733.º CPC e com as necessárias

adaptações o disposto nos artigos 648.º e 650.º CPC, já nossos conhecidos. Este

regime equivale não ao do artigo 647.º, n.º4 CPC mas, sim ao do artigo 704.º, n.º3

CPC: o que suspende é a execução e não o efeito condenatório da sentença arbitral.

Por isso, antes da instauração da execução nada haverá a suspender. Se não for obtida

a suspensão da execução, podem ter lugar atos executivos baseados em título que

poderá a vir ser revogado, se for procedente a anulação da sentença arbitral.

Pensamos que se devem, por isso, aplicar as normas de proteção ao devedor que

estão vertidas nos n.º2 e 3 artigo 46.º LAV/2011. Em terceiro lugar, deve também

incluir-se no âmbito do artigo 704.º CPC a execução de providências cautelares.

Recorde-se que, sendo certo que todas as providências cautelares são ações

constitutivas, algumas delas constituem e impõem deveres de prestar aos requeridos.

Naturalmente que tais direitos a uma prestação são dotados de exequibilidade. Ora,

a similitude com a sentença pendente de recurso reside em que as providências

cautelares são também uma regulação provisória. Contudo, são uma regulação

intrinsecamente provisória e não apenas por razões formais, justificadas na celeridade

processual. Ora, se uma sentença pode ser revogada total ou parcialmente pelo

recurso e, com ela, levantada a execução, também a providência cautelar pode

caducar e ser ulteriormente levantada nos termos do artigo 373.º CPC. Isto sem

prejuízo da eventual responsabilidade civil do requerente nos termos do artigo 374.º

CPC. Por fim, são ainda provisórias para efeitos do artigo 704.º CPC as execuções

de sentenças e transações judiciais estrangeiras que conheçam recurso pendente no

estado de origem.

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Obtenção aparentemente desnecessária de ação declarativa: ao credor que

disponha de título executivo diverso de sentença condenatória não está vedado a sua

obtenção dessa sentença. Já Lopes Cardoso escrevia que o emprego de processo de

declaração, por parte de quem esteja munido de título com manifesta força executiva é

permitido, não importando nulidade. Notava Anselmo de Castro que isso pode suceder,

essencialmente, com duas finalidades: a primeira é a resolução de dúvidas sobre a existência

e exequibilidade do título ou sobre a dívida, a segunda, a obtenção de maior segurança formal.

No primeiro caso, existindo as dúvidas sobre a existência e exequibilidade do título ou sobre

o incumprimento do seu crédito , o credor coloca ação condenatória para evitar correr o

risco de um indeferimento liminar da ação executiva ou da procedência da respetiva oposição

à execução. No segundo caso, mesmo que lhe seja em absoluto desnecessária e tenha em

vista unicamente a vantagem da substituição do título ijicial pelo mais completo e seguroo

da sentença condenatória pode pedir a condenação do devedor. No atual procedimento

executivo alcançará algumas eventuais vantagens como a dispensa de citação prévia e a

redução dos fundamentos de oposição à execução (artigos 550.º, n.º2, alínea a) e 729.º CC).

No entanto, há mais razões, lícitas, que justicam o uso do meio declarativo. Assim, Lopes

Cardoso e Remédio Marques apontam a obtenção de sentença judicial contra o cônjuge que

não figure como devedor no título, ao abrigo do artigo 34.º, n.º3, 2.ª parte CPC. E, por seu

lado, Diogo Pereira faz notar outros ganhos que podem levar o credor a procurar a

condenação judicial: subida do valor da taxa de juro de mora aplicável de civil para comercial

(por invocação da relação subjetiva), possibilidade de registar hipoteca judicial (artigo 710.º

CC) uo aumento do prazo de prescrição da obrigação (artigos 309.º e 311.º CC),

nomeadamente. O autor que apesar de estar munido de um título com manifesta força

executiva recorre ao processo de declaração terá, pois, direito a uma sentença de mérito,

devendo apenas ser condenado em custas, conforme impôs o n.º2, alínea c) do artigo 535.º

CPC. Porventura, assim não será, no caso daquela terceira finalidade, já que, na verdade, não

tem título contra o cônjuge e dele carece.

§7.º - Documentos privados

Requisitos comuns:

1. Documento autêntico e documento particular autenticado: constituem títulos

executivos, extrajudiciais privados, por força da alínea b) do n.º1 do artigo 703.º CPC,

os documentos autênticos ou autenticados por notário ou por outras entidades ou

profissionais com competência para tal, que importem constituição ou

reconhecimento de qualquer obrigação.

a. No plano formal cabem, assim, tanto:

i. As escrituras e testamentos públicos; como

ii. Os testamentos cerrados, no seu original ou na sua certidão ou fotocópia autêntica

(artigos 383.º e 384.º e, ainda, 386.º e 387.º CC).

b. No plano material, tanto pode ser:

i. Um título constitutivo (v.g. artigo 1143.º ou 875.º CC); como,

ii. Um título recognitivo da obrigação:

1. Confissão ou ato ou facto que constitui a dívida, nos termos dos artigos

352.º, 358.º, n.º2 e 364.º CC; ou

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2. Reconhecimento de dívida, nos termos do artigo 458.º CC.

A obrigação tanto pode ser de pagamento de quantia certa, de entrega de coisa certa

ou de prestação de facto.

2. Documento particular. A supressão da categoria na Reforma de 2013: a alínea

c) do artigo 46.º CPC (atual 703.º) alargava, desde 1997, o leque dos títulos executivos

extrajudiciais privados, aos documentos particulares simples, i.e., aos quais não tenha

ocorrido nenhum ato de certificação por uma entidade administrativa. Os requisitos

eram os seguintes:

a. Assinatura pelo devedor, dispensando-se a assinatura pelo credor;

b. Importarem constituição ou reconhecimento de:

i. Obrigações pecuniárias, cujo montante seja determinado ou determinável por

simples cálculo aritmético de acordo com as cláusulas dele constantes;

ii. Obrigação de entrega de coisa, móvel ou imóvel, ou de prestação de facto.

Desde a reforma de 1995-1996 que o artigo 708.º CPC deixou de exigir

reconhecimento da assinatura do devedor. Apenas ainda assim sucedia quanto aos

escritos particulares (qualquer documento – na atual versão do artigo) com assinatura de

terceiro a rogo (assinatura alógrafa): só gozam de força executiva se a assinatura

estiver reconhecida por notário ou por outras entidades ou profissionais com

competência para tal. Relembre-se que a lei não exige que o título, quando

recognitivo, siga a forma do contrato solene, bastando documento escrito, conforme

o artigo 458.º, n.º2 CC. Com a Reforma de 2014 a categoria de documentos

particulares é suprimida, no correlativo artigo 703.º, n.º1, alínea c) CPC. As razões

respetivas assentam no aumento da geração de títulos privados ocorrida desde a

reforma de 1995-1997. No plano da tutela melhor será, a montante, o credor

precaver-se promovendo a autenticação, por termo, do documento particular, ao

abrigo do artigo 150.º CNot. Para tanto, as partes confirmarão o conteúdo do

documento particular perante o notário, o qual o deve reduzir a termo, e cumprindo-

se os requisitos dos artigos 151.º e 152.º CNot. Se tal não for possível, resta ao credor,

a jusante, obter injunção ou sentença de condenação. Por outro lado, restringe-se

agora o preceito aos títulos de crédito, ainda que meros quirógrafos, desde que, neste

caso, os factos constitutivos da relação subjacente constem do próprio documento

ou sejam alegados no requerimento executivo. Do alcance deste enunciado

trataremos mais de seguida.

Requisitos específicos na execução de obrigações futuras (artigo 707.º CPC)

1. Categorias de obrigações futuras. Requisitos específicos formais: a obrigação

titulada deve ser existente em face do título, vencida ou a vencer-se. Por isso, não

constitui titulo executivo o documento privado em que se prevê que uma das partes

constituirá um crédito perante a outra ou terceiro. É isso que decorre a contrario do

artigo 707.º CC. Porém, excecionalmente, o mesmo artigo admite força executiva

para documentos autênticos ou autenticados relativamente a:

a. Prestações futuras neles convencionadas (obrigações futuras stricto

sensu);

b. Ou apenas cuja constituição neles se preveja (obrigações eventuais)

desde que se prove quanto às primeiras que alguma prestação (pecuniária, de facto

ou de entrega de coisa certa) foi realizada para conclusão do negócio ou, quanto às

segundas, que alguma obrigação foi constituída na sequência da previsão das partes

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– a chamada prova complementar do título. A prova complementar do título deve

ser feita por documento passado em conformidade com as cláusulas constantes do

documento exequendo – extratos de conta-corrente ou outros documentos

contratuais – ou, sendo aqueles omissos, por documento revestido de força

executória própria. Note-se que o título executivo não é o documento complementar,

ainda que revestido de força executiva própria, mas, sim, o documento exarado ou

autenticado. Já quanto ao título exequendo tem sido discutido se pode também ser

um mero documento particular. Até 2003 a lei previa apenas escrituras públicas, mas

na doutrina de Lebre de Freitas pugnava pela admissibilidade de documento

autenticado e mesmo de documento particular o que, aliás, tinha correspondência

em alguma jurisprudência, como o Ac. STJ 15 maio 2001/01ª1113. Já Teixeira de

Sousa aceitava documento autêntico ou autenticado. Todavia, tal posição era difícil

de aceitar na altura diante da expressa restrição literal a escrituras públicas. Justamente,

alguma jurisprudência (Ac. STJ 21 fevereiro 2002/02B214) enunciava que «o artigo

50.º [anterior] CPC [atual artigo 707.º] não é aplicável, por interpretação extensiva, dos

documentos particulares». Depois da reforma de 2003, o legislador veio alargar o âmbito

formal do preceito a qualquer documento autenticado, mas os limites desse

alargamento tornam patente que não está, na sua vontade, admitir os documentos

particulares simples.

2. Objeto:

a. obrigações futuras stricto sensu: a obrigação futura stricto sensu decorre de

um contrato que as partes estavam obrigadas, pelo título executivo, a

constituir. O âmbito objetivo do preceito não é de perceção imediata pois

implica interpretar os regimes contratuais substantivos e a vontade das partes,

em ordem a distinguir estas das obrigações ainda não vencidas. Efetivamente,

constitui, antes de mais, um problema de Direito material saber se o

exequente tem em seu poder um título que só por si não constitui a obrigação

exequenda, sendo esta, por isso, futura, ou um título que já constitui ou

reconheceu uma obrigação, sendo a obrigação, por isso, atual, mas não

vencida. Essa diferença material tem expressão processual: sendo uma

obrigação futura está-se em sede do artigo 707.º CPC e será necessário

demonstrar o facto da constituição da obrigação após a emissão do título

executivo, como nele se prescreve; sendo uma obrigação não vencida, mas

constituída ou reconhecida pelo título dado à execução, regerá, pelo menos

no plano literal, o regime de demonstração do vencimento do artigo 715.º

CPC. Mais: se a prova da obrigação futura pode ser feita apenas

documentalmente, nos termos restritos da 2.ª parte do artigo 707.º CPC, já a

prova do vencimento pode ser feita por qualquer meio de prova, máxime,

testemunhal, nos termos daquele artigo 715.º CPC.

i. Para Alberto dos Reis a solução em apreço procuraria dar

exequibilidade a contratos preparatórios ou contratos promessa mas

por referência a obrigações que não derivam dele, mas do ulterior

contrato prometido. Ou seja, as obrigações futuras em sentido estrito

seriam obrigações exequendas decorrentes de um contrato que as

partes estão obrigadas a constituir. Seguindo esta tese, no âmbito do

artigo 707.º CPC, haveria, conexos entre si, dois contratos – o

preparatório, com o valor executivo, e o prometido. Opostamente, já

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um contrato de execução continuada de obrigações recíprocas cairia

no âmbito do artigo 715.º CPC. Com o devido respeito, pensamos

que a questão não se reconduziria, em sede de Código anterior à

reforma de 1997, estritamente aos contratos preparatórios. Os

contratos preparatórios supõem dois momentos contratuais

correspondentes a duas eficácias jurídicas distintas:

1. Uma eficácia preparatória ou prejudicial; e

2. Uma eficácia final ou prejudicada.

E, formalmente, exprimem-se em dois tipos contratuais:

3. Um tipo intrinsecamente preparatório;

4. Um tipo intrinsecamente final.

Ora, esta dualidade contratual surge no contrato de abertura de

crédito enquanto contrato promessa de mútuo, mas não surge no

contrato de fornecimento. No contrato de abertura de crédito no

primeiro momento da abertura do crédito há uma eficácia

preparatória: produz-se um acordo de concessão de crédito que visa

a disponibilidade futura do dinheiro, eventualmente, em conta-

corrente, ficando perfeito com o acordo das partes, sem necessidade

de qualquer entrega monetária. Este acordo é intrinsecamente

preparatório um contrato promessa de empréstimo, segundo Alberto

dos Reis. Num segundo momento, há uma eficácia final: levantada a

quantia concreta, maxime, da conta corrente, constitui-se o mútuo,

dada a natureza real quoad constituionem. O mútuo é intrinsecamente

final. Ora se é certo que o mútuo em si mesmo poderá ser título

executivo da obrigação de restituição da quantia mutuada, desde que

celebrado na devida forma escrita legalmente exigida, todavia no

mútuo prometido em concessão de crédito ele não apresenta

autonomia formal: o documento titular das vinculações é o da

abertura de crédito. Daí que se compreenda a necessidade de

colmatar essa falta de documento que, titulando o mútuo, possa ser

levado à execução. Justamente, o artigo 707.º CPC, permite-o desde

que o exequente prove que entregou efetivamente o montante a

recuperar. Todavia, quanto ao contrato de fornecimento é

absolutamente artificial contruí-lo dogmaticamente como uma

sequência de promessas de vinculações futuras, com sucessivos

momentos contratuais preparatórios/finais. Em suma: na economia

da vontade das partes, na empreitada o que há é uma única intenção

negocial genericamente derivada de um único e mesmo acordo inicial

mas com execução continuada de prestações sinalagmáticas repetidas.

Não se vislumbra aqui um momento que seja intrinsecamente

preparatório, configurando um contrato tipicamente preparatório; se

uma prestação sinalagmática condiciona a contraprestação, essa

condição não é, a se, uma vontade contratual autónoma e preparatória.

Mas se é assim, o artigo 707.º CPC surgia como relativamente amplo

e pouco exigente na casuística que nele coubesse. O que importava

era a demonstração de que em cumprimento do contrato foi

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efetivamente emprestada alguma quantia, realizado algum

fornecimento ou feita alguma prestação, em execução da convenção

de prestação futura; sinteticamente, alguma prestação foi realizada em

cumprimento do negócio, lia-se no Código de 1961. Então, se o contrato

de abertura de crédito é um contrato preparatório e o contrato de

fornecimento é um contrato de execução continuada, deveria existir

uma outra ratio que justificasse a sua expressa colocação no originário

artigo 51.º, §único CPC 1939. Mais, apesar de a lei atualmente ter

perdido essa referência, eles eram e ainda são pacificamente

admitidos na doutrina e na jurisprudência. Essa ratio pode ser mais

aclarada se acrescentarmos que alguma doutrina e jurisprudência

sujeitam ainda no artigo 707.º CPC, para além daquelas figuras

contratuais, o contrato de empreitada e o contrato de aquisição por

editor das obras futuras de um escritor. Procurando descortinar essa

ratio comum Lebre de Freitas escreve que se trata, afinal, de contrato

promessa de contrato real: em todos eles apenas com a entrega de

um bem se constitui a obrigação de restituição, objeto da execução.

Nesta linha de pensamento, a expressão prestação futura deverá ser feita

coincidir com prestação constitutiva dum contrato real (prestação

quoad constitutionem).

ii. Por isso, para Lebre de Freitas caberiam aqui, além dos referidos

contratos de abertura de crédito, de fornecimento e de empreitada,

ainda os contratos de comodato, depósito e locação. Já não o

contrato de empreitada, por a demonstração da realização da obra

necessária ser uma condição de exigibilidade do preço respetivo,

cabendo no artigo 715.º CPC. Contraponto ao artigo 715.º CPC a

convenção de prestação futura para a conclusão de negócio é uma

promessa (unilateral ou bilateral) de contrato real e a maior exigência

formal do artigo 707.º CPC no confronto com o artigo 715.º CPC

justifica-se por o primeiro cuidar da existência da obrigação,

enquanto que no segundo está só em causa a demonstração da sua

exigibilidade.

iii. Já Teixeira de Sousa inclui não somente a promessa de contrato real

quoad constitutionem mas também a promessa de constituição futura de

uma obrigação, necessariamente não quoad constitutionem.

iv. Concordamos com Lebre de Freitas: nos contratos historicamente

abrangidos pelo artigo 707.º CPC – a abertura de crédito e o

fornecimento – a obrigação exequenda constitui-se com a entrega de

um bem, como a quantia ou a obra respetivamente. Naturalmente, é

essa entrega que deve ser objeto da prova complementar do título: a

entrega do dinheiro mutuado, a entrega do bem fornecido, a entrega

da obra, etc. Mas, até à atual versão do artigo 707.º CPC, remontando

à reforma de 1995-1996, não só esse era o traço comum aos contratos

abrangidos, como era mesmo o único traço distintivo. Efetivamente

já vimos que cabiam no preceito quer os contratos preparatórios,

quer os contratos de execução continuada, i.e., tanto situações em

que a prestação de entrega da coisa é constitutiva de nova obrigação,

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como situações em que dita o vencimento de obrigação pré-existente.

Assim sendo, a única forma de distinguir o artigo 707.º CPC

daqueloutro do artigo 715.º CPC, em que também trata de obrigações

exequendas em contratos de execução continuada – que não seja

apontar apenas que a criação da solução há mais de 70 anos foi

casuística – era, justamente, notar que aquele se referia a obrigação

exequenda que se constitui ou se vence – consoante seja contrato

preparatório ou não – com a realização da convencionada prestação

futura de entrega de um bem.

Mas os dados legais do problema voltaram a mudar a 1 janeiro 1997 com a

reforma de então. Onde antes se exigia a demonstração de que alguma

prestação foi efetivamente realizada no desenvolvimento da relação

contratual, passou a exigir-se a demonstração de que alguma prestação foi

realizada para conclusão do negócio.

v. Para Lebre de Freitas, com esta alteração o legislador quis restringir

o âmbito do artigo 707.º CPC apenas aos contratos preparatórios,

deixando os contratos de execução continuada para o artigo 715.º

CPC. Se assim for, então, atualmente cabem, como pugna Lebre de

Freitas, os contratos preparatórios ou promessa de contratos de reais.

Mas estes são os contratos promessa de mútuo (abertura de crédito),

de comodato, depósito e locação e de aquisição por editor de obra

futura. Nesses casos, o objeto da prova complementar será a

constituição da obrigação exequenda, conforme o artigo 707.º CPC.

Já o contrato de empreitada e o contrato de fornecimento são, em

nossa opinião, contratos de execução continuada, cujas obrigações

pecuniárias se constituem na data do contrato, mas que se vencem

com a realização da prévia entrega das coisas. Esta entrega deve ser

demonstrada nos termos do artigo 715.º CPC.

Assim sendo, a obrigação futura é a obrigação exequenda decorrente de um

contrato que o credor está obrigado, pelo título executivo, a constituir

mediante entrega de uma coisa ao devedor.

b. Obrigações eventuais: contrariamente à obrigação futura stricto sensu, a

obrigação diz-se eventual se a obrigação exequenda vier a decorrer de um

contrato que as partes não estavam obrigadas, pelo título executivo, a

constituir. Essa obrigação foi objeto de previsão das partes, como está na

letra do artigo 707.º CPC, ou seja, de negociação pré-contratual, e a ela foi,

eventualmente, associada à mesma garantia real constituída para uma

contemporânea obrigação atual ou apenas futura, nos termos da 1.ª parte

daquele artigo.

Limites objetivos:

1. Obrigações prejudicadas de fonte legal: tal como sucede com a sentença

condenatória sempre se discutiu até à reforma de 2003 se quando os juros de mora

legais não estivessem estipulados no título executivo poderia, apesar disso, ser

exigidos na execução. A jurisprudência estava dividida entre aceitar o que resultava

da lei material ou recusar por se pedir o que o título não dava. A lei, como se vê pela

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leitura do n.º2 do artigo 703.º CPC seguiu o primeiro caminho. No caso de título

negocial, era demasiado rígido defender que o direito aos juros não teria, de facto,

tutela executiva que não passasse pela obtenção de sentença condenatória. Afinal, há

que tomar em conta que os juros de mora não são frequentemente clausulados pela

simples razão de que a lei já os garante. Na verdade, vale aqui, de modo irrestrito, a

regra geral atrás enunciada: não se poder impor ao credor a obtenção de título senão

quanto a obrigações que dependam da vontade do devedor para se constituírem, não

sendo conforme ao artigo 20.º, n.º1 CRP que o credor estivesse dependente do

devedor para poder executar uma obrigação que já decorre da lei. Ao contrário do

que talvez suceda em sede de execução de sentença com condenação implícita, trata-

se de uma solução legislativa proporcional e necessária visto ser desrazoável impor

ao credor que se garantisse uma expressa cláusula repetindo um conteúdo meramente

supletivo. E, por isso, em qualquer execução fundada em títulos privados podem

também ser realizadas coativamente as obrigações legais prejudicadas pelas

obrigações tituladas. Em concreto, no caso específico da letra e livrança o portador

pode, ao abrigo dos artigos 48.º e 77.º, n.º1 LULL, executar o crédito titulado a

pagamento, com juros se assim for estipulado, os juros de mora desde a data do

vencimento e as despesas do protesto – as dos avisos e as outras despesas. A pessoa

que pagou uma letra ou livrança (artigo 77.º, n.º1 LULL) pode reclamar dos seus

garantes, conforme o artigo 49.º LULL, a soma integral que pagou, os juros da dita

soma, desde a data em que a pagou e as despesas que tiver feito. Tratando-se de

execução de cheque o portador pode executar, nos termos do artigo 45.º LUC a

importância do cheque não paga, os juros de mora desde a data da apresentação a

pagamento e as despesas do protesto ou da declaração equivalente, as dos avisos

feitos e as outras despesas. Por seu turno, dita o artigo 46.º LUC, que a pessoa que

tenha pago o cheque pode reclamar daqueles que são responsáveis para com ele a

importância integral que pagou, juros da mesma importância desde o dia em que a

pagou e as despesas por ele feitas.

2. Não referência à causa de pedir: como se disse atrás, a propósito da autonomia

do título executivo, se a causa ou fundamento da obrigação exequenda não constar

do título deverá ser alegada no requerimento, sob pena de ineptidão do requerimento

executivo. E tratando-se de título executivo negocial decorrerá do artigo 726.º, n.º2,

alínea c) CPC o ónus de prova mínima do facto constitutivo. Importa, porém,

considerar as obrigações abstratas:

a. Teixeira de Sousa: dispensa-se a alegação da causa: basta apresentar o

próprio título executivo – v.g., o cheque – mesmo que nele não esteja

enunciada a causa, sem que se tenha de demonstrar o porquê e

independentemente de objeções, invalidades ou exceções.

b. Já Lebre de Freitas: a propósito do artigo 458.º, n.º1 CC, em que o devedor,

por simples declaração unilateral, promete uma prestação ou reconhece a

dívida, escreve que na respetiva execução se o credor quiser prevenir a

invocação de prescrição da dívida pelo executado na oposição à execução

deverá alegar a causa, mas não proceder à sua prova, pois é uma dispensa de

ónus de prova que o artigo 458.º, n.º1 CC permite.

c. Parece que ambos os autores têm razão em áreas diferentes:

i. No reconhecimento de dívida do artigo 458.º, n.º1 CC, título recognitivo

particular por excelência, efetivamente decorre do preceito que, fica

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o credor dispensado de provar a relação fundamental, cuja existência

se presume até prova em contrário.

ii. No entanto, há uma causa material e processualmente relevante: como

escreveram Pires de Lima e Antunes Varela, não se está, em rigor,

perante um negócio abstrato, mas perante uma inversão do ónus da

prova, pois cabe ao devedor alegar e provar a falta de causa os meios

de defesa que relativos à relação fundamental: a inexistência, a

nulidade ou a anulabilidade do negócio donde procede a dívida ou a

que a prestação se reporta, bem como a própria exceção de contrato

não cumprido, o direito de resolução.

Os mestres civilistas notavam uma importantíssima consequência do caráter não

abstrato da promessa de cumprimento ou reconhecimento de dívida: o devedor

continuará a poder invocar aqueles meios de defesa que respeitam à relação

fundamental mesmo domínio das relações imediatas, entre o devedor e credor

cessionário do título respetivo. Mas terá a causa essa estrita relevância negativa,

enquanto objeto de fundamentos de oposição, ou deve, antes de mais, ser sempre

alegada pelo exequente no requerimento executivo, tendo uma relevância positiva?

Parece-nos que a imposição feita pelo artigo 724.º, n.º1, alínea e) CPC de indicação

da causa de pedir – mas não a sua prova – quando não conste do título vale mesmo

para o reconhecimento de dívida. Neste sentido, Castro Mendes defendia

precisamente que o credor que disponha de uma confissão de dívida não pode

remeter apenas para esse título, no requerimento executivo, mas deve neste indicar a

causa concreta. Já na execução de títulos de crédito, dissemos atrás que a causa de

pedir é ainda a aquisição na esfera do requerente de um direito a uma prestação

mediante o saque ou emissão do título, mas sem que ele tenha de indicar a que relação

subjacente corresponde esse direito (respetivamente, artigos 1.º LULL e 458.º CC).

Por isso, a apresentação do título de crédito, devidamente datado e preenchido,

preenche só por si a exigência de causa de pedir, pois certifica por si mesma o facto

do saque ou da emissão. Tanto na execução do reconhecimento de dívida, como na

execução de título de crédito, é certo que se podem invocar vícios e exceções relativos

à relação de causa ou de valuta mas tal vale como facto impeditivo, modificativo ou

extintivo. A sua relevância nada tem a ver com a uma ausência de causa de pedir na

execução de obrigações abstratas incorporadas em títulos.

3. Prova do título: o título executivo apresentado pode ser o documento original,

constitutivo ou recognitivo da obrigação, mas também pode ser uma sua certidão ou

fotocópia autêntica para os documentos autênticos ou autenticados, nos termos do

artigo 383.º, 384.º e 387.º, n.º1 CC, ou uma pública forma e fotocópia atestada para

os documentos particulares, conforme os artigos 386.º e 387.º, n.º2 CC. Mas já

tratando-se de títulos de crédito a sua literalidade parece impedir a execução

suportada em cópia.

a. No passado o Ac. RC 7 maio 1985 concluiu que as fotocópias dos títulos

cambiários não são títulos executivos, ainda que obedecendo aos requisitos

da lei notarial. Carecia-se de juntar o original, perante o que seria uma mera

irregularidade nas decisões mais conformes ao princípio da prevalência da

funcionalidade material do processo.

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i. Em sentido contrário, o Ac. RL 19 dezembro 1985 declarou que a certidão

de letra existente num processo passada pela respetiva secretaria

judicial tem o mesmo valor que a própria letra e o Ac. RC 24 maio

1987 que as fotocópias de documentos (livranças) se não impugnadas

fazem prova plena da sua exatidão.

b. Por seu turno, Remédio Marques distinguia:

i. Se fossem títulos de crédito ao portador: é preciso que se junte o

original;

ii. Se fossem títulos de crédito à ordem: a titularidade do direito, embora

se encontre ligada ao documento que a corporiza, pertence a alguém,

nele identificado, pelo que o exequente poderá juntar fotocópia do

título certificada por notário (ou pelo funcionário do tribunal onde

corra outra execução com base no mesmo título).

Esta era a solução mais adequada, efetivamente, em face do então regime

vigente.

c. Seguindo Lebre de Freitas, o nosso entendimento era o de que, seja qual

for o título de crédito, basta a junção da respetiva cópia pois ela mesma já é

admitida para acompanhar eletronicamente o título executivo no regime do

CITIUS, conforme o admite em termos gerais o artigo 144.º, n.º2 CPC. No

n.º4 do artigo 144.º CPC lia-se, juntamente, que os documentos assim

apresentados – quaisquer que eles sejam – têm a força probatória dos

originais, nos termos definidos para as certidões, ou seja, em termos idênticos

aos previstos no artigo 383.º, n.º1 CC. Desse modo, pode sempre o juiz ou o

executado pedirem os originais como o permitem o artigo 146.º, n.º5 CPC e

o artigo 385.º CC. Ora, fora do uso da via informática, valeria a mesma

solução. No entanto, no novo artigo 724.º, n.º5 CPC determina-se que

quando a execução se funde em título de crédito e o requerimento executivo

tiver sido entregue por via eletróncia, o exequente deve sempre enviar o

original para o tribunal, dentro dos 10 dias subsequentes à distribuição; na

fatal de envio, o juiz, oficiosamente ou a requerimento do executado,

determina a notificação do exequente para, em 10 dias, proceder a esse envio,

sob pena de extinção da execução. Portanto, parecerá que para o legislador

as fotocópias dos títulos cambiários não são títulos executivos, ainda que

obedecendo aos requisitos da lei notarial: deve juntar-se o original. E trata-se

de uma tomada de posição que não pode deixar de se generalizar para

qualquer modo de apresentação de título cambiário.

Prescrição da obrigação cartular:

1. Regime da prescrição: questão de grande importância prática é a da exequibilidade

de um título de crédito cuja obrigação cartular haja prescrito. Para tanto há que partir

do regime substantivo para depois se clarificarem as respostas no campo processual.

Assim, no caso de letras e livranças (ex vi artigo 77.º LULL), o artigo 70.º LULL

determina que as ações:

a. Contra o aceitante relativas prescrevem em três anos a contar do seu

vencimento, nos termos dos artigos 33.º e seguintes LULL;

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b. Do portador contra os endossantes e contra o sacador prescrevem num

ano, a contar da data do protesto feito em tempo útil, ou da data do

vencimento, se se trata de letra contendo a cláusula sem despesas;

c. Dos endossantes uns contra os outros e contra o sacador prescrevem

em seis meses a contar do dia em que o endossante pagou a letra ou

em que ele próprio foi acionado.

Quanto cheque importa ter em linha de conta vários prazos e condições:

a. O portador tem oito dias para apresentação do cheque a pagamento,

contados da data nele aposta (e não da data do preenchimento) – artigo

29.º, n.º1 LUC. Esgotado esse prazo, embora alguns defendam a prescrição

do título (RL 27 março 2001), melhor será entender que a apresentação de

um cheque à cobrança fora do prazo em que a lei permite fazer o protesto

ou declaração equivalente não é causa adequada, quer no plano naturalístico,

quer em geral e em abstrato, para que o mesmo cheque não seja pago. Na

verdade, o artigo 32.º, n.º2 LUC estabelece que o sacado, i.e., a entidade

bancária, pode pagá-lo mesmo depois de findo o prazo. Todavia, o sacador

pode revogar unilateralmente o cheque (artigo 32.º, n.º1 LUC), obstando,

licitamente, ao pagamento.

b. Ainda que apresentado dentro desse prazo (artigo 40.º LUC), se o

cheque não for pago constitui condição de ação contra os endossantes,

sacador e outros co-obrigados, a verificação de recusa de pagamento

por um ato formal (protesto) ou por uma declaração do sacado, datada

e escrita sobre o cheque, com a indicação do dia em que este foi

apresentado ou por uma declaração datada duma câmara de

compensação, constatando que o cheque foi apresentado em tempo

útil e não foi pago (artigo 40.º LUC). A ausência de verificação de recusa

de pagamento ou a sua ocorrência não atempada determina que o cheque que

não possa valer como título de crédito. Portanto, se a falta de apresentação a

pagamento no prazo do artigo 29.º, n.º1 LUC não dita a prescrição do cheque,

pelo que deve ser pago, todavia, já dita essa prescrição se não houver

pagamento pois não é suficiente apenas a verificação de recusa de pagamento.

c. Essa ação cambiária do portador contra os endossantes, contra o

sacador ou contra os demais co-obrigados prescreve decorridos que

sejam seis meses, contados do termo do prazo de apresentação (artigo

52.º, n.º1 LUC). Portanto, esgotado o segundo prazo ocorre a prescrição do

cheque como título executivo cambiário.

Prescrito o título de crédito pode ele ainda ser executado enquanto documento

particular – quirógrafo?

2. Tese do mero quirógrafo: uma linha jurisprudencial maioritária propugna que o

credor possa executar já não a obrigação cartular mas a obrigação subjacente fazendo

uso do mesmo documento, agora como simples reconhecimento particular de dívida,

nos termos do artigo 458.º CC. Naturalmente que se exigem certos pressupostos.

a. Um pressuposto formal: uma letra prescrita pode valer como título

executivo desde que satisfaça os requisitos dos outros escritos particulares,

i.e., do artigo 46.º, n.º1, alínea c), em sede de Código velho, máxime, estar

assinado pelo devedor;

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b. Dois pressupostos materiais objetivos:

i. Enunciação da concreta e determinada relação causal ou subjacente – a

obrigação de pagamento – i.e., que contenha ou represente um ato

jurídico por virtude do qual alguém se tenha constituído em

obrigação de pagar determinada quantia a outrem, no título de crédito

ou, ao menos, por alegação no requerimento executivo.

ii. Natureza não formal da relação subjacente, uma vez que sendo a causa do negócio

jurídico um seu elemento essencial se o título prescrito não seguir a forma devida

não poderá constituir título executivo.

Em suma: haveria que ter em conta e, conjugar entre si, os próprios requisitos de

exequibilidade de um reconhecimento de dívida e ainda se o negócio é formal ou não.

Com bem sintetiza o Ac. STJ 27 novembro 2007:

«Extinta, por prescrição, a obrigação cambiária incorporada no cheque, este pode

continuar a valer como título executivo, enquanto documento particular assinado pelo

devedor, no quadro das relações credor originário/devedor originário e para execução

da respetiva obrigação subjacente ou fundamental, desse que, nesse caso, o exequente

haja alegado, no requerimento executivo, esta obrigação (a relação causal) e que esta

não constitua um negócio jurídico formal».

Na doutrina, depois de Alberto dos Reis, Anselmo de Castro veio defender que a

exequibilidade subsiste, ainda depois da extinção da relação cartular quanto à relação

subjacente. Mais recentemente, Lebre de Freitas seguiu no mesmo sentido,

escrevendo que o preenchimento à ordem ou a entrega ao portador tem implícita a

constituição ou o reconhecimento duma dívida, a satisfazer através da cobrança dum

crédito (cedido), contra a instituição bancária. Prosseguindo, se o próprio título de

crédito mencionar a causa da obrigação, o exequente poderia apresentar a letra

prescrita como título executivo. Aqui a letra prescrita assinada pelo devedor vale

como quirógrafo de uma obrigação e funciona como documento particular,

independentemente de a causa ser solene ou não. Apenas, se a letra não fizesse

referência à causa da relação jurídica, é que haveria que aferir se a obrigação resulta

de um negócio jurídico formal, tendo em linha de consideração que a causa do

negócio é um elemento essencial deste (artigos 221.º, n.º1 e 223.º, n.º1 CC). No

mesmo sentido vão, no essencial, Remédio Marques e Amâncio Ferreira.

Por seu turno, Abrantes Geraldes defende que atento o regime prescrito pelo artigo

458.º CC e a conexão existente entre ónus de alegação e o ónus da prova não há

fundamento para impor ao credor, tanto numa ação declarativa, como numa ação

executiva, o ónus de invocar a causa pois só faz sentido impor esse ónus sobre quem

recai simultaneamente o ónus da prova. Ora visto que aquele artigo faz presumir a

existência de causa para o credor, dispensado está este daqueles dois ónus. Suficiente

e necessário é, porém, que do texto do documento cartular resulte a assunção de uma

obrigação de pagamento da quantia nele inscrita de que seja beneficiária a pessoa nele

indicada.

3. Posição: negação do valor executivo: com o devido respeito, não se vislumbra

como se possa aderir a este doutro e dominante entendimento. Parece-nos abusivo

afirmar uma vontade negocial de reconhecimento da dívida subjacente. A assinatura

da letra, livrança ou cheque é somente constitutiva da respetiva obrigação, sendo uma

ordem de pagamento ao sacado, no caso do cheque. Atribuir-se uma vontade de

reconhecer uma dívida equivale a ultrapassar os limites e inerentes seguranças do

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título de crédito e dos seus limites temporais. Nada no título permite a afirmação

expressa de uma vontade negocial de reconhecimento da obrigação subjacente.

Trata-se de uma ficção doutrinal e jurisprudencial afirmar o contrário. Seguimos,

assim, Lopes Cardoso para quem o credor perde o título e, como não contém a causa

da obrigação, nem sequer como reconhecimento de dívida subjacente pode

sobreviver. Na verdade, a letra prescrita (e, mutatis mutandis, os demais títulos

cartulares) não pode continuar a titular por si só, a obrigação originária, sob pena de

ficar totalmente inútil a lei que estabelece a prescrição. O título prescrito não é sequer

documento suficiente para provar por si só a obrigação subjacente: com ele o autor

apenas provará a sua emissão, cumprindo-lhe provar ainda, além da existência da

obrigação que a fez nascer, entre outros elementos. Repare-se que a sujeição do

credor ao ónus probatório comum – ónus que é invertido na doutrina dominante –

é razoável, atenta a circunstância dele ter deixado correr os prazos de caducidade.

Ora, esse ónus não poder ser cumprido em ação executiva; apenas em ação

declarativa autónoma. Por outras palavras: não pode o credor alegar os factos

constitutivos da obrigação subjacente e juntar prova ao mesmo. O requerimento

executivo tem como função apresentar um título à execução; não, constituir o título

da execução. Esta posição tem um eco na jurisprudência, embora restrito: Ac. RL 27

março 2001.

4. Aplicação prática: a alteração introduzida pelo artigo 703.º, n.º1, alínea c) CPC:

a reforma de 2013 pretendeu eliminar a polémica sobre este tema. Suprimindo a

exequibilidade genérica dos documentos particulares, ressalvou, porém, como títulos

executivos, no artigo 703.º, n.º1, alínea c) CPC, os títulos de crédito, ainda que meros

quirógrafos, desde que, neste caso, os factos constitutivos da relação subjacente

constem do próprio documento ou sejam alegados no requerimento executivo. A

aplicação concreta deste entendimento, ao qual não podemos aderir pelas razões

explicadas, implica algum cuidado: deve ser feita à luz do património jurisprudencial

já referido. Assim, o exequente de título de crédito prescrito tem o ónus de alegação

no requerimento executivo da relação de valuta. Essa causa deverá ser demonstrada

o suficiente para evitar um indeferimento liminar por falta de aparência mínima da

existência do facto constitutivo do direito (artigo 726.º, n.º2, alínea c) CPC). Além

disso, deve estar-se no domínio das relações imediatas, já que o putativo

reconhecimento foi-o entre o sacador e o beneficiário, e o negócio de valuta não

pode ser solene. Se assim não também pode ter lugar indeferimento liminar nos

termos do artigo 726.º, n.º2, alínea a) CPC. Por outro lado, o exequente não pode

basear a execução no título prescrito e mais tarde convolar para execução de

reconhecimento de dívida. Isso porquanto a invocação da relação subjacente, em

substituição da invocação da relação formal configura a invocação de uma causa de

pedir diferente da inicial. Ora uma alteração superveniente da causa de pedir no

estrito procedimento executivo apenas pode ser feita com o acordo do executado,

por força do artigo 264.º CPC. Na falta desse acordo, a convolação não pode ter

lugar, sequer na oposição à execução pois o autor nesta é o executado, o que impede

o uso do artigo 265.º, n.º1 CPC atinente ao uso da réplica. Já Lopes Cardoso era, no

essencial, desta opinião. Quanto ao executado, ele tem o ónus da invocação da

prescrição do título cambiário, por algum das causas previstas na LULL na oposição

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à execução, ao abrigo do artigo 731.º CPC. Trata-se de uma exceção perentória que

não pode ser conhecida oficiosamente (artigo 303.º CC).

§8.º - Documentos avulsos

Título judiciais impróprios:

1. Introdução: a injunção: na alínea d) do n.º1 do artigo 703.º CPC contém-se uma

remissão: são títulos executivos os documentos a que, por disposição especial, seja

atribuída força executiva. Trata-se, portanto, de um apelo a normas avulsas, situadas

no próprio CPC ou em legislação, em geral. Importa apresenta-los, dada a sua

heterogeneidade, fazendo uso das já conhecidas categorias de títulos judiciais

impróprios, particulares e administrativos. Os títulos judiciais impróprios

correspondem essencialmente a títulos produzidos ao termo de um procedimento de

injunção ou monitório, mas também a casos pontuais em que o título processual não

contém uma condenação com valor de caso julgado, mas tem, ainda assim, força

executiva. A técnica da injunção é uma solução disseminada na Europa e na América

Latina. Pode dizer que que um título judicial impróprio enuncia um comando de

atuação, também conhecido por injunção, de cumprimento de uma obrigação pelo

devedor, sem valor de caso julgado material no quadro de um procedimento –

procedimento de injunção ou monitório – com as seguintes características:

a. Do lado do autor a obtenção do título consubstancia o exercício do direito

de ação, coberto pelo artigo 20.º CRP;

b. Do lado do réu garante o efetivo conhecimento do procedimento de

formação do título, através da citação, e o direito de defesa, imediata ou

diferida;

c. Organicamente o título incorpora um ato de autoridade judiciária ou de uma

entidade administrativa com possibilidade de recurso para um juiz;

d. Materialmente o comando de atuação ao réu é uma cominação por este ter

confessado expressa ou tacitamente (por falta de contestação) a dívida.

Trata-se de tutela sumária, por excelência, ou seja, com restrições às garantias

constitucionais, seja de defesa, seja de equidade no plano da verdade material –

menos exigência de prova –, seja de, mesmo de estabilidade da decisão. Podem

distinguir-se, usando uma sub-divisão concetual, corrente em Itália entre:

a. Injunção pura: o credor deve alegar os factos constitutivos da sua pretensão

mas não tem de os demonstrar; e

b. Injunção documental: o autor tem o ónus de alegar e provar os factos.

Além disso, a injunção tanto pode ser a estrutura de um específico procedimento,

como pode ser uma solução para a revelia do réu, no quadro de um procedimento

não sumário – revelia com efeito cominatório pleno, i.e, sobre a própria procedência

do pedido e não apenas quanto aos factos. Adicionalmente, ao configurar-se como

um meio de resolver a questão da omissão de contestação a uma pretensão a técnica

da injunção pode ainda aparecer, sem autonomia formal, em qualquer tipo de ação,

máxime, como modo de produção de certeza jurídica sobre a qualidade/existência

de um crédito dentro de uma execução de que são exemplo os artigos 741.º, n.º2, in

fine, 773.º, n.º3 e 792.º, n.º3 CPC.

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2. Processo de injunção (Decreto-Lei n.º 269/98, 1 setembro): entre nós o uso da

injunção para a produção de títulos executivos tem a sua expressão no Decreto-Lei

n.º 269/98, 1 setembro, alterado sucessivas vezes. Além dele há ainda o incidente do

despejo imediato previsto no artigo 14.º, n.º4 e 5 NRAU e o requerimento de despejo

não contestado em sede de processo especial de despejo, do artigo 15.º-E, n.º1, alínea

a) NRAU e que estudaremos mais adiante. No Decreto-Lei n.º 269/98, a injunção é

definida no seu artigo 7.º como a providência que tem por fim dar força executiva a

requerimento destinado a exigir o cumprimento das seguintes obrigações:

a. Obrigações pecuniárias emergentes de contratos de valor não superior

a 15 000 euros (artigo 1.º do diploma preambular ao Decreto-Lei n.º

269/98);

b. Obrigações pecuniárias emergentes de transações comerciais

abrangidas pelo Decreto-Lei n.º 32/2003, 17 fevereiro,

independentemente do valor da dívida (artigo 7.º desse Decreto-Lei).

O artigo 3.º, alínea a) Decreto-Lei n.º 32/2003, 17 fevereiro, define como

transação comercial qualquer transação entre empresas ou entre empresas e

entidades públicas, qualquer que seja a respetiva natureza, forma ou

designação, que dê origem ao fornecimento de mercadorias ou ainda à

prestação de serviços contra uma remuneração. Deste modo, trouxe-se em

2003 para o âmbito da injunção as transações entre comerciantes, sejam

empresas ou empresários em nome coletivo. A lei não distingue entre

obrigações pecuniárias cujo montante foi fixado por acordo das partes,

daquelas em que tal não acontece.

Procedimentalmente, o credor deve começar por entregar o requerimento de

injunção,

a. Por via eletrónica no Balcão Nacional de Injunções (artigo 5.º e

seguintes Portaria n.º 220-A/2008, 4 março);

b. Ou em suporte de papel, por correio, telecópia ou entrega direta

(artigos 5.º, n.º2 Portaria n.º 220-A/2008), na secretaria ou do tribunal do

lugar do cumprimento ou do domicílio do devedor (artigo 8.º do anexo

ao Decreto-Lei n.º269/98, e artigo 5.º n.º3 da já referida Portaria).

segundo o modo constante do artigo 9.º do anexo ao Decreto-Lei n.º269/98 e com

o conteúdo e forma do artigo 10.º deste diploma. O credor tem o ónus de alegar os

factos constitutivos do seu direito (artigo 10.º, n.º1, alínea d)), mas não de fazer prova,

máxime, documental, dos mesmos. Por isso, está-se perante uma injunção pura.

Depois, a secretaria recusa (artigo 11.º) ou recebe. Neste caso, deve proceder à

notificação do requerido em 5 dias, para no prazo de 15 dias, pagar a quantia e taxa

de justiça ou deduzir oposição (artigo 12.º, n.º1, e 13.º). A notificação realiza-se por

carta registada com aviso de receção, mas, se frustrada, passa-se à via postal simples

(artigo 12.º, n.º1 e 4 Decreto-Lei n.º 269/98). O mesmo sucede em caso de

convenção de domicílio (artigo 12.º-A, n.º1 Decreto-Lei n.º 269/98) bastante

frequente. O conteúdo dos elementos a notificar ao requerido estão estabelecidos no

artigo 13.º, mas ele não é informado da cominação de preclusão dos fundamentos de

oposição à execução, em sede de artigo 729.º CPC. À notificação é aplicável, com as

devidas adaptações, o disposto nos artigos 223.º, 224.º, 228.º, n.º2 e 5 e 246.º CPC.

Se o requerido proceder ao pagamento da dívida e das custas (artigo 7.º, n.º4 RC),

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extingue-se o processo. Se nada fizer, tem lugar a oposição da fórmula executória,

sobre o suporte de papel (artigo 14.º, n.º1 Decreto-Lei n.º 269/98) ou por via

eletrónica (artigo 12.º Portaria n.º 220-A/2008). O credor passa, assim, a dispor de

um título judicial impróprio. Aposta a fórmula executória procede-se à devolução de

todo o expediente ao requerente em suporte de papel (artigo 14.º, n.º4 dito Decreto-

Lei) ou à sua disponibilização por via eletrónica (artigo 13.º Portaria n.º 220-A/2008).

O credor poderá instaurar, de imediato, uma execução para pagamento de quantia

acerta não carecendo de outros documentos que serviram de suporto ao processo de

injunção para que tenha força executiva. Essa execução vai correr com dispensa de

citação prévia seja em sede de artigo 812.º-C, alínea b) anterior CPC, seja em sede de

artigo 550.º, n.º2, alínea b) CPC (processo sumário), o que corresponde à solução,

revogada pelo artigo 15.º Decreto-Lei nº38/2003, 8 março, de a execução do

requerimento de injunção seguir a forma sumária da execução para pagamento de

quantia certa. A lei no artigo 14.º Portaria n.º 220-A/2008, 4 março, autoriza a que o

exequente em vez de apresentar o original do requerimento de injunção, o substitua,

para todos os efeitos, por disponibilização ao tribunal da referência única prevista no

n.º do artigo 13.º dessa Portaria, juntamente com o número do procedimento em que

foi aposta a fórmula executória. O tribunal ou o agente de execução podem sempre

consultar o título executivo na área de acesso público do endereço eletrónico oficial

destinado a esse fim. O controlo de um juiz está sempre garantido na injunção. Ele

tanto pode conhecer de reclamação da recusa de recebimento (artigo 11.º, n.º2 anexo

ao Decreto-Lei n.º269/98), como de recusa de aposição de fórmula executória (artigo

14.º, n.º4 do mesmo anexo), como, em geral, de qualquer questão sujeita a decisão

judicial (artigo 16.º, n.º2 do mesmo anexo). A competência judicial injuntória é, assim,

uma competência de garantias. Se o requerido deduzir oposição ao requerimento de

injunção e, bem assim, quando ocorra frustração da notificação, após apresentação

dos autos à distribuição (artigo 16.º) vai seguir-se, com as necessárias adaptações, a

ação declarativa condenatória na forma sumaríssima abreviada regulada nos artigos

1.º a 5.º do Anexo ao Decreto-Lei n.º269/98, sem prejuízo das regras gerais

subsidiárias, ex vi artigo 549.º, n.º1 CPC. Trata-se de uma ação em que o requerimento

executivo vai valer como petição inicial e a oposição do requerido como contestação.

A principal especialidade é a ter a característica títpica da injunção de a falta de

contestação implicar que o tribunal confira força executiva à petição, a não ser que

ocorram, de forma evidente, exceções dilatórias ou que o pedido seja manifestamente

improcedente (n.º2). A execução desta petição seguirá, também, sem citação prévia

do executado, por força do artigo 550.º, n.º2, alínea b) CPC, mutatis mutandis. Se a

ação for até à sentença final, esta será sumariamente justificada e ditada para ata

(artigo 4.º, n.º7 do anexo). Repare-se na diferença desta ação perante a estrutura

subjetiva e a distribuição probatória na oposição à execução. Na injunção, o credor

alega sempre os factos constitutivos, mas, num primeiro momento, tão só para

suportar a sua pretensão injuntória, mas sem que o Balcão Nacional de Injunções

possa controlar o fundamento (artigo 11.º, n.º1 Anexo). Portanto, basta-lhe cumprir

um ónus processual de fundamentação formal, estando dispensado de um juízo de

procedência ou de, pelo menos, de não manifesta improcedência por parte de um

juiz. Há aqui, claramente, uma jactância dirigida ao devedor, pois é sobre ele – e não

ao requerente, como seria numa ação judicial sujeita ao ónus da prova (artigo 342.º,

nº1 CC – que recai o ónus de decidir o destino (processual) da (alegada) dívida: ou

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paga, ou deixa formar título executivo contra si, ou dá impulso processual à

convolação para procedimento jurisdicional – impugnado ou excecionado,

dilatoriamente ou perentoriamente. Todavia, havendo convolação, o requerido

tomará a posição passiva na ação sumaríssima, abreviada, ao contrário do que sucede

na oposição à execução. Naquela se formará, sendo o caso, título executivo; nesta

nega-se o título ou a dívida ou os pressupostos processuais.

Outros títulos judiciais impróprios: a lei conhece vários casos em que o título embora

formado num procedimento civil não é uma sentença de condenação com valor de caso

julgado, mas tem, ainda assim, força executiva. Na verdade, contém-se nele um

reconhecimento judicial de uma dívida, ainda que dotado de eficácia restrita. Isso pode

suceder

1. A título principal: tome-se o exemplo do processo de prestação de contas pelo réu

(artigos 941.º e seguintes CPC). Se for apurado saldo favorável ao autor pode este

requerer que o réu seja notificado para, em 10 dias, pagar a importância do saldo

(artigo 944.º, n.º5 CPC). Se esta não for paga, procede-se à penhora dos bens e de

seguida inicia-se uma execução para pagamento de quantia certa.

a. Para Lebre de Freitas, o título executivo serão as contas apresentadas na

forma de conta corrente (artigo 944.º, n.º1 PC/2013).

b. Repare-se que temos aqui uma confissão de dívida, pois o saldo da conta-

corrente é especificado pelo próprio réu. Todavia, não é produzido uma

decisão de reconhecimento de dívida com valor de caso julgado material ou,

tampouco, uma condenação.

2. A título incidental: considere-se o novo incidente de comunicabilidade da dívida,

dos artigos 741.º e 742.º CPC. Nele a decisão final do juiz qualificará – sendo o caso

– a dívida como comum (artigos 741.º, n.º5 e 742.º, n.º2 CPC), e ipso facto, extenderá

subjetivamente o título executivo diverso de sentença ao cônjuge do devedor

executado. Não há, obviamente, uma condenação e pode ser duvidoso um valor de

caso julgado material para aquela decisão.

Títulos particulares: títulos particulares avulsos são, entre outros:

1. A ata de reunião de condomínio, nas condições do artigo 6.º, n.º1 Decreto-Lei n.º

268/94, 25 outubro, nomeadamente indicando o devedor e quantia em dívida;

2. O extrato de conta emitido por sociedade sediada em Portugal, dedicada à

concessão de crédito por emissão e utilização de cartões de crédito, quanto

ao saldo destes (artigo 1.º Decreto-Lei n.º45/79, 9 março);

3. O contrato de arrendamento acompanhado das comunicações ao inquilino

previstas no artigo 15.º, n.º1 NRAU, até às alterações trazidas pela Lei n.º31/2012,

14 agosto.

Títulos administrativos: finalmente, o Estado, incluindo as autarquias e pessoas coletivas

públicas, beneficia de um vasto leque de títulos avulsos de dívidas contraídas pela prática de

atos administrativos em face dos particulares. Disso são exemplo:

1. A certidão de dívida à segurança social (artigo 9.º Decreto-Lei n.º511/76, 3 julho);

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2. A certidão de dívida ao Serviço Nacional de Saúde (Decreto-Lei n.º 194/92, 8

setembro);

3. O certificado de conta de emolumentos e outros encargos por ato registal ou

notarial (artigo 133.º Decreto-Regulamentar 55/80, 8 outubro);

4. A certidão de liquidação de conta de custas, juntamento com a sentença

transitada em julgado (artigo 35.º, n.º2 RC);

5. Os certificados emitidos pelas entidades reguladoras de valor mobiliário

escriturais (artigo 84.º CVM);

6. A decisão de entidade mediadora de conflito de consumo (artigo 8.º Decreto-

Lei n.º 146/99, 4 maio), eventualmente;

7. A decisão de autoridade administrativa que impõe coima, ao abrigo do artigo

89.º, n.º1 Regime Geral das Contra-Ordenações (Decreto-Lei n.º 433/82, 27

outubro);

8. A nota discriminativa de honorários e despesas do agente de execução, ex vi

artigos 721.º, n.º5 CPC e artigo 5.º Decreto-Lei n.º 4/2013, 11 janeiro.

B – Obrigação exigível e determinada

§9.º - Generalidades. Exigibilidade

Natureza e sentido dos requisitos da obrigação exigível, certa e líquida:

1. Introdução. A exigibilidade: já atrás escrevemos que o título deve demonstrar uma

obrigação, que se seja certa, líquida e exigível. É o que decorre do artigo 713.º CPC

e dos artigos 725.º, n.º1, alínea c) e 728.º, alínea e) CPC. À semelhança do título

executivo, não se trata de pressupostos processuais, pois não respeitam à relação

processual: pelo contrário, a obrigação constitui o cerno, rectius, o objeto mediato, da

relação material. Aqui já estamos na configuração que o próprio direito a uma

prestação deve apresentar para poder ser objeto de uma execução: tem de existir ao

tempo da citação uma obrigação que o executado deva cumprir e que seja qualitativa

e quantitativamente determinada. Essa pré-existência material determina se o tribunal

pode ou não satisfazer o pedido do credor de realização coativa da prestação, ou seja,

a procedência do pedido executivo. Trata-se, pois, de condição de ação. Portanto, se

o título executivo tem a natureza jurídica de condição formal de realização coativa da

prestação, a certeza, a liquidez e a exigibilidade da obrigação têm a natureza jurídica

de condição material da realização coativa da prestação. Como se relacionam entre si

os três requisitos de exigibilidade, certeza e liquidez?

a. Para Teixeira de Sousa: a exigibilidade seria uma condição relativa à

justificação da execução, e a certeza e liquidez seriam condições respeitantes

à possibilidade da execução; sem a primeira não se justifica a execução e sem

as segundas esta não é possível.

b. Sem dúvida que, num certo sentido, é a exigibilidade que justifica a

execução. Como e porquê? Com que função processual e material exatas?

Antecipando as próximas conclusões, diremos que:

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i. A exigibilidade corresponde a factos complementares de uma causa de pedir

complexa, pelo que nem sempre tem autonomia;

ii. A certeza e a liquidez consubstanciam uma qualidade de determinação do pedido.

Começando pela exigibilidade, dir-se-ia que ela seria sinónimo de

incumprimento. Efetivamente, o artigo 817.º CC enuncia que não sendo a

obrigação voluntariamente cumprida, tem o credor o direito de exigir

judicialmente o seu cumprimento e de executar o património do devedor,

nos termos declarados no Código e nas leis de processo. O que justifica que

a execução seria o incumprimento, afinal: a execução do património do

devedor, enquanto realização judicial da função de garantia geral das

obrigações nos termos do artigo 601.º CC, tem como condição aparente o

incumprimento da obrigação. Sem incumprimento não haveria necessidade

de execução. Não é assim, todavia: o facto negativo do incumprimento não

chega a incorporar a causa de pedir, seja declarativa, seja executiva. O

autor/exequente não tem de alegar e provar que a obrigação não foi pontual

e integralmente cumprida. Relembre-se que, diversamente, e como já

demonstramos atrás, a causa de pedir, tanto condenatória, como executiva,

são os factos constitutivos ou aquisitivos do direito a uma prestação. São

estes que têm de ser demonstrados, pela prova ou pelo título executivo,

respetivamente. Caberá ao reu alegar o cumprimento ou facto equivalente

como exceção perentória extintiva. Efetivamente, a exigibilidade é a

qualidade substantiva da obrigação que deve ser cumprida de modo imediato

e incondicional após a interpelação do devedor. Tal qualidade não é

processual, mas substantiva: a verificação do facto do qual depende o

cumprimento, com o decurso do prazo, condição, contraprestação ou data.

Na verdade, se as cláusulas contratuais atinentes ao conteúdo da obrigação

respeitem ao mérito da causa, outrossim sucede com as cláusulas contratuais

atinentes ao tempo do cumprimento da obrigação. Portanto, e em termos

simples, obrigação exigível é a obrigação que está em tempo de cumprimento

– obrigação atual. No plano da necessária expressão processual, a

exigibilidade deve ser entendida no quadro da causa de pedir comum à ação

executiva e à ação declarativa: o facto de aquisição pelo exequente de um

direito a uma prestação. É esse facto, simples complexo, que deve ser

demonstrado na ação declarativa ou que o título executivo faz presumir na

ação executiva. Ora, tanto numa como noutra ação, a exigibilidade pode ser:

iii. Simples: dispensando o credor de prova, competindo ao executado

demonstrar uma condição resolutiva ou a exceção de não

cumprimento;

iv. Complexa: como facto constitutivo complementar, i.e., cuja variação

não releva nem a ineptidão, nem para as exceções de caso julgado ou

litispendência – v.g., a verificação da condição suspensiva, da

contraprestação.

Integrando a causa de pedir, a demonstração da exigibilidade é, em qualquer

caso, condição de procedência do pedido na ação declarativa e na ação

executiva, não se confundindo com uma (desnecessária) demonstração do

incumprimento. Na ação declarativa a falta de atualidade da obrigação

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redunda em improcedência do pedido, por ausência de um elemento da causa

de pedir. Na ação executiva surge pela exigência da obrigação ser exigível,

elemento integrativo da causa de pedir, presumida pelo título. Não o sendo,

é extinta a execução, por falta de condição material do seu objeto material

(i.e., da relação material de dívida ou de prestação) sem nenhum tipo de juízo

de improcedência, pois este é alheio à funcionalidade executiva. Não se trata

de um pressuposto processual, por conseguinte.

2. A liquidez e certeza: finalmente, a liquidez e a certeza são, no essencial, também

exigidas na ação declarativa. Um ato do Estado que afete a esfera jurídica dos sujeitos

deve estar determinado, qualitativa e quantitativamente, no seu objeto sempre que tal

for possível à parte ativa. Isso é assim para produção de um título judicial com valor

de caso julgado, como para a imposição unilateral de atos materiais. Em suma: por

regra, o processo não admite a dedução de pretensões genéricas. No plano da norma

expressa apenas no artigo 556.º CPC restritivamente se admitem pedidos genéricos,

i.e., líquidos no sentido do artigo 713.º CPC ou quantitativamente indeterminados.

Mas a fortiori não se poderão admitir pedidos qualitativamente indeterminados, afinal,

a mesma ratio que leva a que se admitam pedidos alternativos – entre pagar ou

entregar uma coisa – apenas nos casos do artigo 553.º, .º1 CPC. Um pedido,

declarativo ou executivo, assim deduzido carece do pressuposto processual atípico

da determinação do pedido, porque o credor está em situação de o poder concretizar.

Portanto, não estão em causa factos constitutivos do direito alegado. Sendo a certeza

e a liquidez aspetos do mesmo pressuposto da determinação é com esta designação

comum e em conjunto que os devemos passar a tratar.

Exigibilidade, em especial:

1. Critério legal e regime: a obrigação é exigível quando, à data da propositura da

execução, se encontre vencida ou se vença mediante interpelação, ainda que judicial,

não estando dependente de contraprestação, nem o credor em mora. Deste modo,

não é admissível uma execução in futurum, ou seja, antes do vencimento de obrigação

com prazo, o que na ação declarativa apenas se aceita nos casos restritivos do artigo

557.º CPC. No caso terá o credor de se apoiar, quando muito, no artigo 850.º, n.º1

CPC. A exigibilidade da obrigação exequenda pode resultar de modo imediato, do

próprio título executivo quando a obrigação esteja sujeita a prazo dele constante já

vencido. Diversamente sucederá se for obrigação sujeita a condição suspensiva,

contraprestação do próprio credor ou facto atinente aos termos do cumprimento.

Nesta segunda hipótese incumbirá ao credor, ao instaurar a execução, fazer a

demonstração da ocorrência, nos termos do regime previsto no artigo 715.º CPC.

Mas se uma parte da obrigação for inexigível e a outra já for exigível, pode esta

executar-se imediatamente, nos termos remissivos do artigo 715.º, n.º6 CPC: requere-

se a execução imediata da parte exigível, enquanto o acertamento da outra parte pode

ser feita na pendência da mesma execução, conforme o artigo 716.º, n.º8 CPC, e,

sendo o caso, o seu n.º8. Finalmente, a lei admite, como vamos ver, a execução de

obrigações que só se vão vencer com a própria citação. Portanto, a exigibilidade da

obrigação não coincide com o vencimento da obrigação: pode haver obrigação ainda

não vencida mas exigível – a obrigação pura – e obrigação vencida, mas ainda não

exigível – a obrigação vencida mas em que o credor esteja em mora. Vamos ver, de

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seguida, como a lei distingue procedimentalmente a execução de obrigações com

prazo, puras e condicionais ou dependentes de contraprestação.

2. Obrigações com prazo: a obrigação com prazo a favor de devedor – o que se

presume ex vi artigo 779.º CC – apenas é exigível com o termo do prazo, nos termos

do artigo 805.º, n.º2, alínea a) CC – ressalvada eventual a perda do benefício do prazo

nos termos do artigo 780.º CC. Este prazo pode ter sido:

a. Estipulado negocialmente, fixado após a constituição da obrigação,

pelo credor (artigo 777.º, n.º3 CC);

b. Em processo especial de fixação judicial de prazo dos artigos 1456.º e

1457.º CC (artigo 777.º, n.º2 CC), previamente à execução.

No caso de o credor se ter apresentado no domicílio do devedor a pedir o pagamento,

há mora desse credor, ex vi, artigos 772.º, n.º1 e 813.º, in fine CC, valendo nessa

circunstância o artigo 610.º, n.º2, alínea b) CPC: apesar de a obrigação está já vencida,

apenas com a citação para a execução é que o devedor – logo, o direito aos juros

moratórios – fica em mora e se torna a obrigação exigível.

3. Obrigações condicionais ou dependentes de contraprestação: a prestação da

obrigação pode estar dependente de condição suspensiva ou de uma contraprestação

simultânea por parte do credor ou de terceiro. Nessas eventualidades incumbe ao

exequente proceder, segundo o regime do artigo 715.º CPC, à demonstração do facto

externo da exigibilidade da obrigação – verificação da condição ou de que efetuou

ou ofereceu a sua prestação. O exequente fará, por isso, a exposição dos factos no

requerimento executivo e juntará a respetiva prova, documental, testemunhal ou

outra (artigo 724.º, n.º1, alínea h), 2.ª parte CPC). No Código garante-se no artigo

550.º, n.º3, alínea a) CPC, que haverá sempre despacho liminar judicial, mesmo

quando a forma a seguir deva ser a sumária, no qual se fará a apreciação da pretensão

e da prova. Cabe ao juiz apreciar os factos expostos, conhecer sumariamente da prova

e decidir da ocorrência do facto alegado pelo exequente – a condição ou o

oferecimento da prestação. Por regra, estas diligências têm lugar antes da citação do

devedor, sem a sua audição. Todavia, o juiz pode concluir pela necessidade de ouvi-

lo antes da decisão. Nesse caso, o devedor será citado para contestar a verificação da

condição ou prestação, cumulativamente com a oposição à execução. Mas recebe a

advertência de que, na falta de contestação, se considera verificada a condição ou

efetuada ou oferecida a prestação, nos termos do requerimento executivo, sem

prejuízo dos casos de revelia inoperante do artigo 568.º CPC. A decisão da verificação

da condição suspensiva, contraprestação do próprio credor ou facto atinente aos

termos cumprimento, vale apenas na instância processual onde foi proferida. Ela

permite admitir ou excluir a pretensão executiva, com base em prova sumária, não se

vislumbrando qualquer outra causa, declarativa ou executiva, principal ou incidental.

Assim, não só o executado pode impugnar a exigibilidade na oposição à execução,

como pode uma nova execução da mesma dívida ser intentada.

4. Obrigações puras: no caso das obrigações puras, a Reforma de 2013 suprimiu o

anterior n.º3 do artigo 804.º CPC, que dispunha que se considerava vencida com a

citação do executado a obrigação cuja inexigibilidade deriva apenas da falta de

interpelação. Esta solução já resultava do artigo 805.º, n.º1 CC (c.f., ainda o artigo

610.º, n.º2, alínea b) atual CPC). Neste caso, como até à data da citação do executado

inexiste mora, contar-se-á o direito aos juros moratórios somente a partir daquele

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momento O exequente terá, por isso, vantagem de fazer a demonstração de

interpelação prévia à execução se quiser alegar que a mora já se iniciou e, desse modo,

o direito aos respetivos juros. Essa vantagem não é a única, porém. Efetivamente, se

o executado pagar voluntariamente no prazo de oposição à execução, as custas serão

pagas pelo exequente, por força dos artigos 610.º, n.º3 e 535.º, n.º1, alínea b) CPC se

ainda não fizera a prévia interpelação judicial. É que o credor poderia ter obtido o

mesmo resultado mediante essa interpelação. Assim, foi ele quem deu causa à ação

executiva. Ademais, em sede de Código velho tal demonstração permitiria ao credor

cumprir um dos pressupostos de dispensa de citação prévia do artigo 812.º-C, alínea

c), incisivo i) desse Código. Esta demonstração da prévia interpelação segue o

procedimento do artigo 715.º CPC, dado o alcance genérico deste. Se o próprio

devedor tiver impedido a interpelação previa, a interpelação considera-se feita na data

em que normalmente ocorreria, e, por isso, a obrigação vencida ex vi artigo 805.º,

n.º2, alínea c) CC.

§10.º - Determinação

Generalidades: o pedido deve estar determinado no seu objeto. Sendo o pedido um

momento de exercício do direito a prestação, o mesmo é dizer que o objeto da obrigação

deve estar determinado. A determinação do objeto da obrigação deve ser feita quando, em

face do título, não estiverem acertadas as suas qualidades ou a sua quantidade. A

determinação é exigida seja qual for o objeto da prestação. A lei refere-se à determinação

qualitativa, como a certeza da obrigação exequenda; refere-se à determinação quantitativa,

como a liquidez da obrigação. Abordemos estes requisitos por esta ordem.

Certeza:

1. Âmbito: as obrigações genéricas de escolha (artigo 539.º e seguintes CC) e as

obrigações alternativas (artigo 543.º CC) são as categorias típicas de obrigações em

que se verifica a indeterminação qualitativa. Nesses casos, é necessário um ato

acessório de especificação da qualidade da prestação seja no mesmo tipo de prestação,

seja entre prestações de tipos diferentes, respetivamente. Processualmente, vale aqui

o regime do artigo 714.º CPC, sob pena de a obrigação permanecer indeterminada.

Já nas obrigações genéricas de quantidade a indeterminação não respeita à qualidade

mas quanto ao exemplar ou espécimen concreto. Portanto, aqui apenas falta

concentrar a obrigação num objeto concreto, de modo a permitir a inerente

transmissão do direito de propriedade – artigo 408.º, n.º2 CC. Deverá ter lugar uma

operação de individualização, pesagem ou medição. Na execução esta concentração

do exemplar concreto, passará por separação e medição feitas pelo agente de

execução – artigo 861.º, n.º2 CPC. Por fim, tratando-se de obrigações com faculdade

alternativa pelo devedor – v.g. artigo 558.º CC – o credor deve promover a execução

do direito à obrigação primária, cabendo ao executado no prazo da oposição exercer

a faculdade alternativa. Não o fazendo, sujeita-se à execução da obrigação principal,

que poderá, naturalmente, cumprir. Se for obrigação com faculdade alternativa pelo

credor, caberá a este escolher no próprio requerimento, ao abrigo do artigo 724.º,

n.º1, alínea h), 2.ª parte CPC.

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2. Escolha da prestação pelo credor: a determinação qualitativa depende sempre de

uma escolha, que caberá ao devedor, ao credor ou a terceiro. Por outro lado, essa

escolha pode estar sujeita ou não a um prazo específico. Se a escolha do objeto da

prestação depender do credor, deve a mesma ser feita no requerimento executivo,

como se estabelece no artigo 724.º, n.º1, alínea h), 2.ª parte CPC, acompanhada da

indicação dos factos que a fundamentam.

3. Escolha da prestação pelo devedor ou por terceiro: segundo o n.º1 do artigo

714.º CPC, se a escolha depender do devedor – regime supletivo nos termos do artigo

539.º e 543.º, n.º2 CC – e, acrescente-se, não houver prazo convencionado de escolha

ou, existindo, ainda não esteja transcorrido, é este citado para a execução pelo agente

para se opor à execução e notificado para, no mesmo prazo da oposição, se outro

não tiver sido fixado pelas partes, declarar por qual das prestações opta. Na falta de

escolha pelo devedor, bem como no prazo de haver vários devedores e não ser

possível formar maioria quanto à escolha, devolve-se sucessivamente ao credor o

direito de escolha, devolve-se sucessivamente ao credor o direito de escolha, nos

termos do nº3, in fine, do artigo 714.º CPC, em consonância com o artigo 548.º CC.

Já se a escolha couber ao devedor mas o prazo convencionado para a escolha estiver

plenamente esgotado à data do requerimento executivo a devolução do direito de

escolha ao credor deu-se mesmo antes da ação executiva. É essa a boa lição de Lebre

de Freitas. Cabendo a escolha a terceiro, este é notificado para a efetuar, nos termos

do n.º1 do artigo 714.º CPC. Portanto, pode escolher no prazo da oposição, i.e., tem

20 dias a contar dessa notificação, se outro não tiver sido fixado pelas partes, sob

pena de devolução desse direito ao credor.

Liquidez:

1. Aspetos gerais: o acertamento da obrigação cujo objeto não esteja quantificado em

face do título é um dos pressupostos da execução, já que ele irá dar a medida do

ataque ao património do executado – c.f. o princípio da proporcionalidade

estabelecido no n.º3 do artigo 735.º CPC. Como tal, deve ter lugar preliminarmente

à execução propriamente dita, uma operação de quantificação da obrigação – a

liquidação – feita por força do artigo 10.º, n.º1 CPC, dentro dos limites que lhe são

fixados pelo título executivo não podendo constituir um modo de extensão do seu

âmbito. Por conseguinte, o exequente não pode, na execução, formular pedido

ilíquido sem proceder à respetiva liquidação. Apenas excecionalmente podem ser

deduzidos pedidos ilíquidos, ou genéricos no sentido do artigo 556.º CPC, na ação

executiva. Afiguram-se-nos três casos, e que podem ter lugar qualquer que seja o

título executivo:

a. Pedem-se juros vincendos: a liquidação é feita a fina, ex vi artigo 716.º, n.º2

CPC, pelo agente de execução, em face do título e dos documentos

complementares, ou em face das taxas legais de juros de mora aplicáveis, nos

casos do artigo 703.º, n.º2 CPC.

b. A sanção pecuniária compulsória: será liquidada mensalmente e no

momento da cessação da sua aplicação, pelo agente de execução, notificando

o executado da liquidação – artigo 716.º, n.º3 CPC.

c. Execução para entrega de uma universalidade de facto: discutia-se no

Direito anterior a 2003 se,

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i. Alberto dos Reis: na execução para entrega de uma universalidade

de facto ou de Direito o exequente deveria liquidar no requerimento

o número de elementos da universalidade; ou

ii. Castro Mendes e Lebre de Freitas: se podia não o fazer, por tal

não lhe ser possível.

Esta última obteve consagração no n.º7 do artigo 716.º CPC, onde se lê que,

se a liquidez da obrigação resultar de esta ter por objeto uma universalidade

e o autor não a puder concretizar, a liquidação será feita depois da apreensão

dos bens. A disposição desse n.º7 é geral e ao mesmo tempo residual,

permitindo um pedido genérico quando, independentemente do título

executivo, a liquidação não tenha sido possível pelos meios anteriores,

incidentais ou não.

2. Cálculo de juros de mora: os juros de mora contabilizam-se, rectius, vencem-se,

conforme o artigo 806.º, n.º1 CC, a partir do dia da constituição em mora do devedor,

ou seja, quando, por causa que lhe seja imputável, a prestação, ainda possível, não foi

efetuada no tempo devido (artigo 804.º, n.º2 CC). Concretizando, a mora ocorre,

segundo o artigo 805.º CC:

a. Sendo obrigação pura, depois de o devedor ter sido judicial ou

extrajudicialmente interpelado para cumprir;

b. No termo do prazo certo da obrigação sujeita a prazo;

c. De imediato:

i. Se a obrigação provier de facto ilícito; ou

ii. Se é o próprio devedor a impedir a interpelação, considerando-se interpelado, neste

caso, na data em que normalmente o teria sido.

As datas do início da mora serão, respetivamente, a da interpelação, o dia seguinte ao

termo do prazo, a do facto ilícito e, como se viu, a data normal da interpelação.

Todavia, se o crédito for ilíquido, determina o n.º2 do artigo 805.º CC que não há

mora enquanto se não tornar líquido, salvo se a falta de liquidez for imputável ao

devedor ou se tratar de responsabilidade por facto ilícito o pelo risco, caso em que o

devedor constitui-se em mora desde a citação, a menos que já haja então mora por

falta de liquidez imputável ao devedor. A taxa de juro aplicável é a legal (artigo 806.º,

n.º2 CC):

d. Juros Civis: de 4% (Portaria n.º 291/2003, 8 abril – c.f. artigo 559.º, n.º1 CC);

e. Juros Comerciais: de 8,25% para o segundo semestre de 2011, segundo o

Aviso n.º14190/2011, conjugado com a Portaria n.º597/2005, 19 julho,

relativamente a créditos de que sejam titulares empresas comerciais (artigo

230.º CCom), singulares ou coletivas, conforme o artigo 102.º, §3.º CCom

(taxa supletiva comercial) que remete para Portaria avulsa; justamente com a

nova Portaria n.º 277/2013, 26 agosto esta será a taxa de juro aplicada pelo

Banco Central Europeu à sua mais recente operação principal de

refinanciamento efetuada antes do 1.º dia de janeiro ou de julho, consoante

se esteja, respetivamente, no 1.º ou no 2.º semestre do ano civil, acrescida de

7 pontos percentuais

salvo se antes da mora for devido um juro mais elevado ou as partes houverem

estipulado um juro moratório diferente do legal, desde que feita por escrito (artigo

559.º, n.º2 CC). Este não pode ser usurário, como decorre dos artigos 559.º-A e

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1146.º CC, nem calculado de modo anatocista (artigo 560.º CC). Além disso, existem,

naturalmente, regimes legais especiais.

3. Procedimento:

a. Liquidação por simples cálculo aritmético: toda a liquidação é um cálculo

aritmético, mas necessariamente um cálculo aritmético juridicamente

relevante, tanto nos factos em que assenta, como nos efeitos que dela

decorrem. Ora se estes são sempre de modo a permitir a prossecução da

execução da realização da prestação, já a diferente natureza jurídica dos factos

em que assenta determina o seu regime processual.

i. No Direito anterior à Reforma da ação declarativa de 2003: a liquidação da

obrigação exequenda estava regulada nos artigos 805.º a 810.º CPC.

Sem esquecer as alterações que tiveram lugar, em sede do incidente

de liquidação, nos artigos [correspondentes aos atuais] 358.º e 361.º

CPC, a verdade é que atualmente apenas o artigo 716.º CPC regula a

matéria.

ii. Na Reforma de 2013: novos acertos foram introduzidos: a chave para

a compreensão de tão apertado artigo, bem como para a sua

articulação com os artigos 358.º a 361.º CPC reside no uso da

distinção entre liquidação por simples cálculo aritmético e liquidação

que não depende de simples cálculo aritmético.

A liquidação para feita por simples cálculo aritmético assenta em factos que

ou estão abrangidos pela segurança do título executivo ou são factos que

podem ser oficiosamente conhecidos pelo tribunal e agente de execução.

Estes são, nos termos gerais, os factos notórios, de conhecimento resultante

do exercício das suas funções ou cujo próprio regime permita esse

conhecimento (artigos 5.º, n.º2, alínea c) e 412.º CPC, entre outros). O autor

não tem de alegar aqueles factos para efeitos de prova – artigo 412.º CPC.

Por outro lado, o título executivo cujo valor pode ser liquidado por simples

cálculo pode ser de qualquer tipo, incluindo sentença condenatória. A

liquidação por simples cálculo aritmético deve ser feita pelo exequente no

requerimento executivo – artigo 724.º, n.º1, alínea b) CPC. Esta liquidação é

constituída por uma especificação no requerimento executivo dos valores

que o exequente considera compreendidos na prestação devida e pela

conclusão do requerimento executivo com um pedido líquido (artigo 716.º,

n.º1 CPC). O valor liquidado no requerimento pode ser impugnado em sede

de oposição à própria execução.

b. Incidente de liquidação – generalidades; limites: a liquidação que não

depende de simples cálculo aritmético, embora implique também, por

definição, um cálculo aritmético, assenta em factos (i.e. em matéria de facto)

que por não estarem abrangidos pela segurança do título executivo, não

serem notórios ou não serem de conhecimento oficioso, são passíveis de

controversão. Como tal carecem de um acertamento judicial, a ter lugar em

procedimento declarativo próprio – o incidente de liquidação –, no qual o

credor tem o ónus de indicar o valor que lhe parece adequado aos factos e o

devedor tem o ónus de contestar quer os factos, quer o valor concluído. Mas,

como nota e vem, o Ac. STJ 18 janeiro 2000/ 99ª1037:

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«A liquidação [incidental] visa não o apuramento do que se tenha como

novos ou outros prejuízos mas a determinação do valor dos já considerados».

i. Antes de 15 setembro 2003: o incidente de liquidação tinha um só regime

e desenrolava-se sempre numa fase preliminar do processo de

execução, fosse qual fosse o título executivo, ainda que judicial.

ii. Depois de 15 setembro 2003: deixou de ser assim, passando a ser

relevante o título executivo:

1. A liquidação de título diverso de sentença: tem lugar em incidente

da própria execução, cujo regime é o constante do

[correspondente atual] n.º4 do artigo 716.º CPC;

2. A liquidação de sentença: está sujeita ao ónus de liquidação em

incidente na ação declarativa respetiva conforme o artigo

704.º, n.º6 CPC e cujo regime é o constante dos artigos 358.º

a 361.º CPC.

iii. Com a reforma de 2013: a lei veio flexibilizar aquela segunda regra, pois

passou a admitir que decisões judiciais ou equiparadas, para as quais

não vigore o ónus de proceder à liquidação no âmbito do processo

de declaração, possam ser objeto de liquidação pelo incidente do n.º4

do artigo 714.º CPC. Tal será o caso da condenação em pedido de

indemnização cível, por tribunal criminal.

c. Incidente de liquidação de sentença: como se sabe, o artigo 556.º, n.º1

CPC permite a dedução de pedidos genéricos, tendo, no caso das respetivas

alíneas a) e b), o autor o ónus de deduzir o incidente de liquidação do pedido

antes de começar a discussão da causa, sendo possível – artigo 358.º, n.º1

CPC. Se não for deduzido o incidente e se o tribunal não tiver elementos para

fixar o objeto ou a quantidade, ver-se-á na contingência de condenar no que

se liquidar em execução de sentença (artigo 609.º, n.º2 CPC). No caso de a

iliquidez ter por objeto as consequências do facto ilícito ou do uso da

faculdade admitida pelo artigo 569.º CC (alínea b) do n.º1 do artigo 556.º

CPC) trata-se de situação em que, estando provada a verificação do dano,

apenas não existem elementos de facto para operar a sua quantificação, quer

por estes factos ainda não serem conhecidos ou estarem em evolução no

momento em que é instaurada ou no da decisão, quer por na ação declarativa

não se ter logrado fazer a prova do quantitativo desses mesmos danos. Esta

última possibilidade é importante: a condenação ilíquida não depende,

sempre, de ter sido formulado um pedido genérico. É que mesmo quando se

formula o pedido de indemnização em quantia certa, desde que se provem

danos mas o seu montante não foi averiguado por falta de elementos para

fixar o objeto ou a quantidade, há lugar à condenação no que se liquidar em

execução de sentença (Ac. RC 4 maio 1999/ 310/99). Como se liquida, então,

uma sentença genérica? O incidente de liquidação deve ser deduzido pelo

autor em requerimento nos termos do artigo 359.º CPC, depois de ser

proferida a sentença, renovando-se, para tal, a instância declarativa entretanto

extinta, por força do artigo 358.º, n.º2 CPC. O pedido incidental não pode

ultrapassar os limites do julgado na sentença a liquidar e, bem assim das

preclusões já ocorridas na instância declarativa. Mas, isso não obsta a que o

pedido de condenação a liquidar em execução de sentença, pressuponha a

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alegação de matéria de facto que substancialize o dever de indemnizar.

Naturalmente que quando ao objeto da prova o limite é o da preclusão: é

vedado ao exequente produzir nela prova sobre factos cuja veracidade não

conseguiu provar – tendo o ónus – na ação declarativa ou matéria que não

alegou nesta última. Se o réu não contestar, valem as disposições gerais dos

incidentes da instância do artigo 293.º, n.º3 CPC: a falta de oposição no prazo

legal determina a produção do efeito cominatório que vigore na causa em que

o incidente se insere. Assim, tratando-se de ação declarativa comum cai-se

no regime geral da revelia – a regra é o efeito não ser cominatório pleno, nos

termos do artigo 557.º, n.º1 CPC. Se o réu contestar ou ocorrer revelia

inoperante, seguem-se os termos subsequentes do processo comum

declarativo a terminar em sentença de liquidação – artigo 360.º, n.º3 CPC.

Tratando-se de liquidação de indemnização em dinheiro o seu valor rege-se

pela regra substantiva do artigo 566.º, n.º2 CC: corresponderá à diferença

entre a situação patrimonial do lesado, na data mais recente que puder ser

atendida pelo tribunal, e a que teria a essa data se não existissem danos. Ora,

a data mais recente a ser atendida pelo tribunal, para aquele efeito, é a do

encerramento da discussão da causa, por força do disposto no artigo 611.º,

n.º1 CPC. Todavia, no caso de a indemnização ser liquidada, mais tarde, em

execução de sentença, aquele momento é o do encerramento da discussão no

próprio incidente de liquidação na ação executiva ou a do termo do facto

danoso, caso este lhe seja anterior. Liquidada a sentença, o réu devedor ficará

em mora desde a data da liquidação, salvo se a falta de liquidez for imputável

ao devedor (1.ª parte do n.º3 do artigo 805.º CC). Todavia, manda a 2.ª parte

desse mesmo n.º3 do artigo 805.º CC que, tratando-se, porém, de

responsabilidade por facto ilícito ou pelo risco, o devedor constituiu-se em

mora lodo desde a citação para a ação declarativa, mesmo antes da liquidação,

a menos que já haja mora por falta de liquidez ser imputável ao devedor. Ora,

o Ac. STJ 4/2002, 9 maio 2002 veio interpretar restritivamente este preceito

material ditando que sempre que a indemnização pecuniária por facto ilícito

ou pelo risco tiver sido objeto de cálculo atualizado, nos termos do n.º2 do

artigo 566.º CC, i.e., objeto de liquidação, vence juros de mora, por efeito do

disposto nos artigos 805.º, n.º3 e 806.º, n.º1 CC, a partir da decisão

atualizadora, i.e., a decisão incidental, e não a partir da citação.

d. Incidente de liquidação de título diverso da sentença: o incidente de

liquidação de obrigação fundada em título extrajudicial (mas também de

decisões judiciais ou equiparadas, para as quais não vigore o ónus de proceder

à liquidação no âmbito do processo de declaração, no Código novo) é

deduzido no requerimento executivo, nos mesmos termos que a liquidação

por simples cálculo aritmético: especificação pelo exequente dos valores que

considera compreendidos na prestação devida e conclusão do requerimento

executivo com um pedido líquido (artigo 716.º, n.º2 CPC). O executado é, de

seguida, citado pelo agente de execução para contestar a liquidação do

exequente, em oposição à execução, no prazo de 20 dias a contar da citação

– artigo 716.º, n.º4 e 728.º, n.º1 CPC. Isto quer dizer que ele tem o ónus de

cumular a contestação da liquidação com a oposição à própria execução, não

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podendo deixar esta para um momento posterior. Se o executado não

contestar a liquidação do exequente, vale um efeito cominatório pleno: a

obrigação considera-se fixada segundo os termos da liquidação feita pelo

exequente no requerimento executivo, salvo os casos de revelia inoperante

do artigo 568.º CPC. A verificação dessa fixação será competência do juiz,

em sede de despacho liminar, por força da garantia de que haverá sempre

despacho liminar judicial mesmo quando a forma a seguir devesse ser a

sumária (artigo 550.º, n.º3, alínea a) CPC). Se o executado contestar a

liquidação do exequente, ou sendo aquela revelia inoperante, o referido artigo

716.º, n.º4 CPC, manda aplicar os n.º3 e 4 do artigo 360.º CPC, do incidente

da liquidação. Por conseguirem o procedimento corre junto do juiz de

execução e são observados os termos subsequentes do processo comum

declarativo e, se a prova produzida pelos litigantes for insuficiente para apurar

da quantia devida, incumbe ao juiz completá-la mediante indagação oficiosa,

ordenando, designadamente, a produção de prova pericial. Haverá, assim,

saneamento, discussão e julgamento, e, por fim, sentença, na qual o tribunal

fixa o valor que considera ter sido demonstrado.

e. Efeitos da decisão: excetuando-se sentença condenatória genérica esta

integra no âmbito objetivo do caso julgado a ulterior concretização operada

pela decisão do incidente de liquidação de sentença. Por isso, a decisão do

incidente terá valor de julgado material, apesar da maior simplificação do

procedimento respetivo. Precludido ou exercido o momento da defesa, a

decisão não poderá ser impugnada, salvo nos termos restritos do artigo 729.º

CPC. Executando-se título diverso de sentença também aqui a decisão do

incidente completa ou concretiza o objeto do título, agora não judicial. Mas,

ao contrário do que sucede no incidente de liquidação de sentença, esta

decisão não é final: ela vale suportada no e para o título. Negado o título ou

apresentado outro necessariamente que caducará o respetivo valor ou não

será oponível o que se decidiu, respetivamente. Portanto, a decisão incidental

não pode deixar de valer como um caso julgado material à eficácia daquele

título. Por isso, escreve Lebre de Freitas, que este caso julgado obstará a que

em nova execução do mesmo título se volte a discutir a liquidação da mesma

obrigação, mas, diversamente, já poderá ser esse valor novamente discutido

se a execução for fundada noutro título. Naturalmente que em ação

declarativa autónoma, ao não estar vinculada ao título executivo diverso de

sentença, v.g., ao contrato, poderá discutir-se não só a obrigação, mas o seu

valor.

Consequências da iliquidez da obrigação: a dedução de pedido ilíquido, fora dos

casos excecionais, é de conhecimento oficioso e é sanável, em regra. O tribunal que a conheça

deve proferir um despacho de aperfeiçoamento do requerimento executivo, liminar (artigo

726.º, n.º4 CPC) ou superveniente, no caso do artigo 734.º CPC. Na falta de correção, o

requerimento deve ser indeferido, no primeiro caso. Além disso, pode constituir fundamento

de oposição à execução, ao abrigo do artigo 729.º, alínea e) CPC. No novo Código, tal

fundamento pode implicar a suspensão da execução, ao abrigo do artigo 733.º, n.º1 , alínea

c) CPC. Diversamente sucede com a falta de liquidação incidental de sentença: a sentença só

constitui título executivo após a liquidação no processo declarativo, dita o n.º6 do artigo 704.º

CPC. Desta forma, o legislador convolou um problema relativo à obrigação exequenda num

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problema relativo ao título executivo, evitando a propositura desnecessária de execuções. É

que a inexequibilidade da sentença constitui uma causa de recusa de recebimento pelo agente

de execução, segundo o artigo 811.º, n.º1, alínea b) CPC. Isto quer dizer que uma sentença

de condenação genérica não constitui título executivo.

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IV – Pressupostos processuais

A – Pressupostos relativos ao Tribunal

§11.º - Competência internacional

Introdução: pode afirmar-se que uma execução coloca um problema de competência

internacional quando os sujeitos e objeto processual chamam a aplicação de normas jurídicas

que não apenas portuguesas. Assim, tal sucede quando as partes são, uma ou ambas, de

nacionalidade não portuguesa. O mesmo acontece quando os factos que integram a causa de

pedir, v.g., o contrato, tiver um lugar total ou parcialmente fora do nosso território. Por fim,

e independentemente da presença ou não de um elemento internacional no plano dos sujeitos

e da causa de pedir, o próprio pedido pode ter uma conexão a outra ordem jurídica. Isso

sucede se a realização coativa houver de ser feita no estrangeiro – v.g., a penhora ou a

apreensão de um bem – ou se a própria prestação tiver de ser cumprida no estrangeiro – o

pagamento, a entrega ou o facto a prestar. Ora, como a regra é a de que cada tribunal apenas

aplica o Direito Processual interno, ainda que haja conexões a mais de uma ordem jurídica,

deve, então, apelar-se às normas determinadoras de qual a jurisdição internacionalmente

competente, aplicadora das normas respetivas.

Normas internas de competência internacional:

1. Competência exclusiva: na ausência de vinculações normativas internacionais

devem aplicar-se as nossas normas de competência internacional. Aqui a regra a

considerar-se é a do artigo 69.º CPC em que os tribunais portugueses têm

competência internacional quando se verifique alguma das circunstâncias

mencionadas no artigo 62.º CPC. No entanto, antes do artigo 62.º CPC, há que

garantir o cumprimento das competências internacionais exclusivas presentes no

artigo 63.º CPC tal como para as ações declarativas. Daí o novo artigo 59.º CPC

determinar que os tribunais portugueses são internacionalmente competentes

quando se verifique algum dos elementos de conexão referidos nos artigos 62.º e 63.º

CPC. Nos trabalhos preparatórios da Reforma de 1995/1996 já havia sido proposta

uma competência exclusiva para a execução de decisões que deva ter lugar em

território português. A ideia não obteve consagração, consideradas as críticas da

doutrina e, em particular, de Lebre de Freitas. Este autor propunha uma competência

exclusiva para os casos em que sejam penhorados bens situados em território

português, o que se consagrou na reforma de 2003. Passou, então, a determinar-se

uma competência exclusiva para as execuções sobre bens existentes em território

português. Deste modo, aproximámo-nos dos instrumentos internacionais sobre a

matéria. A sua aplicação não era isenta de dificuldades: sendo fácil localizar um

imóvel no nosso território, já o mesmo não sucedia com os bens móveis e, ainda

menos, com os direitos. Escrevia, por isso, Lebre de Freitas que a mobilidade do bem

móvel leva a que a competência exclusiva do tribunal português seja fruto da situação,

algo eventual, existente no momento da propositura da ação executiva, mantendo-se

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ao longo da instância. Já quanto aos direitos a uma prestação notava Paula Costa e

Silva que enquanto realidades jurídicas destituídas de substrato real não têm lugar em

que se situem pelo que poderá, quando muito, falar-se em local do respetivo

cumprimento, pelo que não seira de impor uma competência exclusiva.

Posteriormente, em 2008 e só nas comarca-piloto, veio simplificar a norma, pois a

competência exclusiva será apenas quanto às execuções sobre bens imóveis situados

em território português. Justamente, o novo artigo 63.º CPC vem assumir

integralmente no plano literal esta solução na sua alínea d). Seja como for, pensamos

que, em qualquer das suas versões, o preceito está parcialmente afastado pelos

Regulamentos Europeus e Convenção de Lugano na execução da sentença. É que

estes dão competência exclusivas aos tribunais do Estado-Membro do lugar da

execução, ou seja, da situação dos bens. Ainda assim, da competência exclusiva do

artigo 63.º, alínea d) CPC, decorre o não reconhecimento pelos nossos tribunais de

competência a tribunal estrangeiro onde corra a execução sobre bens nacionais –

penhora ou entrega de coisa certa. Por isso, não poderá ser cumprida carta rogatória

enviada por essa instância estrangeira para a realização daqueles atos executivos.

2. Competência do artigo 62.º CPC: não se verificando a alínea em questão do artigo

63.º CPC, restará verificar as circunstâncias do artigo 62.º CPC, ressalvada, como já

se viu, a aplicação de tratados, convenções e regulamentos comunitários (artigo 59.º,

1.ª parte CPC). Se assim for, então a jurisdição nacional será a competente. Mas o

ponto não é pacífico: houve doutrina que propugnou que o artigo 62.º CPC apenas

se aplicaria às causas declarativas, escudada em razões de viabilidade da própria

execução e das restrições que a soberania de cada Estado pode acarretar.

a. Assim, Anselmo de Castro entendia não ser legítimo transpor sem mais para

o campo do processo executivo as normas do artigo 62.º CPC.

i. É que sendo o título uma sentença, bem pode suceder que o executado

não tenha bens alguns em Portugal, que o facto a executar se não

situe em território português ou que a coisa a entregar se não

encontre em Portugal. Em tais casos, a execução seria inviável,

porque eventuais cartas rogatórias aos tribunais estrangeiros excedem

o âmbito normal que deverão ter, com o que implicarão

necessariamente a prévia revisão e confirmação da sentença a

executar nesse país para cumprimento ulterior da carta rogatória.

ii. Sendo o título executivo diverso de sentença, o autor mostrava que os

critérios do artigo 62.º CPC originam a mesma consequência de a

execução correr em país diferente daquele onde se encontram os bens

a executar, já porque os nossos tribunais serão competentes quando

os bens se não encontrem em Portugal, já porque não o serão para

execuções contra devedores cujos bens se encontrem em Portugal.

iii. Apenas nas execuções para entrega de coisa certa ou por dívida com garantia, o

artigo 89.º, n.º2 CPC garantiria a coincidência entre jurisdição para execução e

jurisdição da situação dos bens.

Por isso, concluía o autor, as regras estabelecidas no artigo 62.º CPC, se

revelam inapropriadas ao processo executivo, devendo-se restringir a

competência internacional dos tribunais portugueses para as execuções

baseadas em sentença aos casos em que os bens a executar se encontrem em

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Portugal, e aplicar, como princípio geral para as execuções baseadas em

sentença aos casos em que os bens a executar se encontrem em Portugal, e

aplicar, como princípio geral para as execuções baseadas noutro título, a

norma estabelecida no n.º3 do artigo 89.º CPC sempre e só quando a

execução deva correr sobre bens sitos em Portugal.

i. Esta tese foi, por exemplo, acolhida no Ac. RP 30 janeiro 1995/

9451021 que expressamente enunciou que a competência

internacional dos tribunais portugueses, para as execuções baseadas

em sentença, restringe-se aos casos em que os bens a executar se

encontrem em Portugal e para as execuções baseadas noutro título, é

de aplicar, como princípio geral, as normas estabelecidas no artigo

89.º, n.º2 CPC.

b. Posteriormente, Teixeira de Sousa veio expressar melhor o que estava

subjacente a este ponto de vista: cada Estado tem o monopólio das medidas

coativas efetuadas no seu território – é a regra da territorialidade da execução.

Por isso, o fator de conexão relevante para a aferição da competência

executiva internacional dos tribunais portugueses não pode deixar de ser a

circunstância de as medidas necessárias à realização coativa da prestação

poderem correr em território português- Essa circunstância estaria à partida

garantida pelo critério de ser internacionalmente competente português que

já o seja pelo critério da competência territorial: assim, com a execução de

sentença ou decisão arbitral proferidas em Portugal (artigos 85.º, n.º1 e 2 CPC)

ou de dívida com garantia real sobre bem situado no nosso território (artigo

89.º, n.º2 CPC). Mas, como já mostrara Anselmo de Castro, nem sempre a

dupla funcionalidade das normas de competência territorial garantem, só por

si, que se afastem execuções para as quais as medidas de coação não devam

ter lugar em território português. É o que sucede com a execução de sentença:

os bens a penhorar bem podem estar no estrangeiro. Segundo Teixeira de

Sousa, haveria então que usar uma conexão suplementar para verificar se, em

concreto, a execução seria viável. Essa conexão suplementar é a do artigo

89.º, n.º3 CPC: o domicílio do executado em território português ou, pelo

menos, a existência de bens penhoráveis em Portugal. Não se esqueça que,

como bem nota Teixeira de Sousa, em regra, qualquer executado domiciliado

em território português possui bens penhoráveis em território nacional. Este

último seria, afinal, o que verdadeiramente releva como fator atributivo da

competência internacional. Contudo, aquela prova dos nove da conexão

relevante já não seria necessária quanto às conexões estabelecidas para a

execução do título diverso de sentença pelos n.º1 e 2 do artigo 89.º CPC, pois

no seu caso todos os elementos de conexão que são relevantes para a aferição

da competência territorial apresentam uma ligação com o território português.

c. Por nossa parte,

i. abraçámos, em obra anterior, a linha de Anselmo de Castro e Teixeira

de Sousa, escrevendo que ninguém – os tribunais, o credor e até o

devedor – ganha com a propositura de uma execução cujas medidas

de realização coativa da prestação não podem correr em território

português. Defendemos, então, que esse critério de apuramento da

competência internacional haveria de estar presente na execução de

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qualquer título, como defendeu Anselmo de Castro, e que deveria a

solução do n.º3 do artigo 89.º CPC, garantir por si só a viabilidade da

execução. Concluímos, então, que os tribunais não têm competência

internacional para execuções sobre bens que não se situam em

território português.

ii. Atualmente, no plano teórico, a nossa posição é a já seguida por

Lebre de Freitas e de Amâncio Ferreira: o artigo 62.º CPC aplica-se

também à ação executiva, sem prejuízo de, de iure condendo, serem

consagrados, critérios mais próximos dos Regulamentos europeus e

Convenção de Lugano. É que a posição de Anselmo de Castro e

Teixeira de Sousa, postulam uma interpretação restritiva do âmbito

do artigo 62.º CPC que não parece ter correspondência na letra

respetiva:

1. Por um lado, o artigo 89.º, n.º3, in fine CPC, é objetivamente

uma norma residual, lateral perante o sistema e, sobretudo,

feita a pensar na competência interna;

2. Por outro lado, o uso do critério da dupla funcionalidade das

normas de competência interna, eventualmente com

aqueleoutro do artigo 89.º, n.º3 CPC, embora tecnicamente

sofisticado, dificilmente se poderá dizer que foi querido pelo

legislador.

Seja como for, e justamente no plano normativo, assiste-se a uma

generalização do critério da situação dos bens, graças à expansão

aplicativa dos Regulamentos Europeus, correlativa de uma retração

das nossas normas. Assim, já se viu que tanto o critério de

competência exclusiva em razão da localização dos bens – apenas

para a execução de sentença – como em razão de o objeto ser bem

imóvel – na execução da sua entrega – dos Regulamentos europeus,

tornam residual o nosso artigo 63.º, alínea d) CPC. Nas demais

execuções, fora do círculo de competências exclusivas, regem os

critérios do artigo 62.º CPC, com variações legislativas recentes.

Efetivamente, no novo artigo 62.º CPC ficam consagrados os

princípios da coincidência (alínea a)), causalidade (alínea b)) e

necessidade (alínea c)).

3. Competência convencional: as partes podem convencionar pactos de jurisdição

executiva. No quadro do Regulamento 1215/2012, pode-no fazer ao abrigo do artigo

25.º, salvo quanto à competência exclusiva relativa à entrega de um imóvel e à

execução de sentença (artigo 24.º, n.º1 e 5 R). No quadro do nosso Código de

Processo Civil, vale-lhes o artigo 94.º, sem prejuízo, também aqui, do respeito pelo

artigo 63.º, alínea d) (artigo 94.º, n.º3, alínea d) CPC). Todavia, em concreto, pode

ser rara a ocorrência de interesse sério de ambas as partes ou de uma delas, que não

envolva inconveniente grave para a outra.

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§12.º - Competência interna

Competência em razão da matéria e da hierarquia:

1. Competência em razão da matéria. Regime da Lei n.º62/2013, 26 agosto:

escrevemos atrás que o exercício da função jurisdicional, em geral, e a executiva, em

especial, está cometido aos tribunais e, dentro das ordens jurisdicionais ou ordens de

tribunais (artigo 209.º, n.º 1 CRP) a execução civil corre nos tribunais judiciais ou

comuns.

a. Para a LOFTJ/99: estes têm, em razão da matéria, competência primária

para a execução dos titular relativos a direitos privados a uma prestação e

competência secundária residual para realizar a execução de todo e qualquer

titulo executivo, não reservada a tribunal de outra ordem jurisdicional (artigo

18.º, n.º1 LOFTJ). Nomeadamente, cabe aos tribunais judiciais a execução

das sentenças arbitrais, salvo se houver um pacto de arbitragem executória.

Dentro dos tribunais comuns vamos encontrar com competência executiva

tribunais com competência genérica (artigo 77.º LOFTJ) e tribunais de

competência especializada, os quais têm competência executiva nos termos

dos artigos 77.º, n.º1, alínea c) e 103.º LOFTJ:

i. Os primeiros são os tribunais de comarca, stricto sensu, e têm competência

executiva (artigo 77.º, n.º1, alínea c) LOFTJ);

ii. Os segundos podem ser, nomeadamente, tribunais de família, de menores, de

trabalho, de comércio e marítimos (artigos 78.º e seguintes LOFTJ), mas também

juízos de competência especializada cível, quando na comarca existam, por

exemplo, juízos de competência especializada criminal (artigos 93.º e 94.º

LOFTJ). Quanto a eles a LOFTJ/99 estatui que sem prejuízo da

competência dos juízos de execução, os tribunais de competência

especializada e de competência específica são competentes para

executar as respetivas decisões.

b. Já no quadro da LOS (Lei n.º62/2013, 26 agosto) prevê-se genericamente

no seu artigo 81.º, que o tribunal de comarca seja estruturado em

i. Instâncias centrais: nestas, podem ser criadas:

1. Secções de competência especializada, arroladas no artigo 81.º, n.º3:

a. Familia e menores;

b. Trabalho;

c. Comércio; e

d. Criminais.

Todos podem executar as suas decisões, respetivamente,

segundo os artigos 122.º, n.º1, alínea f), 126.º, n.º1, alínea m)

(incluindo outros títulos executivos laborais) e 128.º, n.º3.

Além disso, podem existir tribunais judiciais de primeira

instãncia com competência para mais do que uma comarca

ou sobre áreas especialmente referidas na lei:

e. Os tribunais de competência territorial alargada,

segundo o artigo 83.º, n.º1: neles se incluem, por

exemplo, os tribunais de propriedade intelectual, da

concorrência, regulação e supervisão, e os tribunais

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marítimos. Eles têm competência para executar as

respetivas decisões, ao abrigo dos artigos 111.º, n.º2,

112.º, n.º1, 113.º, n.º2, respetivamente.

ii. Instâncias locais.

2. Competência em razão da hierarquia: no plano da hierarquia, apenas os tribunais

de primeira instância têm competência executiva. Portanto, as decisões de primeira

instância são executadas pelos tribunais organicamente de primeira instância. Mas

lembre-se que em matéria declarativa podiam-se encontrara, a título excecional é

certo, previsões de competência declarativa ainda junto das Relações ou mesmo do

STJ. Ora também essas decisões – de primeira instância no plano funcional – são

executadas nos tribunais organicamente de primeira instância. A este propósito o

artigo 86.º CPC determina, por isso, que se a ação tiver sido proposta na Relação ou

no Supremo, é competente para a execução o tribunal de 1.ª instância, do domicílio

do executado. As Relações e o Supremo são, assim, puros tribunais de recurso e de

resolução de conflitos de jurisdição e de competência. Têm, porém, ainda uma

competência de conceção de força executiva às decisões dos tribunais eclesiásticos e

de reconhecimento de sentenças estrangeiras (artigo 56.º, n.º1, alíneas g) e f)

LOFTJ/99), respetivamente.

Competência em razão da forma e do valor: já atrás notamos que podem existir em

dada comarca juízos de execução. São tribunais cuja competência é determinada pelo tipo de

processo: execuções, seja qual for o valor e matéria, em regra.

1. Por isso, e bem, a LOFTJ/99 prevê-os no artigo 96.º, n.º1, alínea g), como tribunais

de competência específica, enquanto a LOFTJ/2008, já menos bem, prevê-los no

artigo 74.º, n.º2, alínea h), como juízos de competência especializada. Quanto à

respetiva competência, a LOFTJ/2008 prevê, nos artigos 126.º, em termos

semelhantes ao anterior artigo 102.º-A LOFTJ/99, que compete aos juízos de

execução:

a. Competência primária: para os processos de execução de natureza cível,

com as competências previstas no CPC, com exclusão:

i. Dos processos atribuídos aos juízos de família e menores, aos juízos

do trabalho, aos juízos de comércio, aos juízos de propriedade

intelectual e aos juízos marítimos e;

ii. Das execuções de sentenças proferidas por juízo criminal que, nos

termos da lei processual penal, não devam correr perante um juízo

cível (artigo 74.º, n.º2 LOFTJ/2008).

b. Competência secundária ou residual: para os processos de execução por

dívida de custas civis aplicadas em processo cível, com as competências

previstas no CPC não atribuídas àqueles juízos de competência especializada.

Em todo o caso, e independentemente da qualificação,

a. Nas comarcas onde existam juízos de execução toda e qualquer

execução deve ser nele colocada, seja sentença, seja título extrajudicial, desde

que caiba na respetiva esfera, primária ou secundária, de competência.

b. Nas comarcas que não tenham juízos de execução deve distinguir-se,

consoante:

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i. O título executivo: ou seja, tratando-se de sentença judicial, estas devem

ser executadas pelo mesmo tribunal que as proferiu:

1. Tribunais de competência genérica (artigo 77.º, n.º1 LOFTJ/99) –

máxime, comarca;

2. Tribunais de competência específica (artigos 97.º, 99.º e 101.º

LOFTJ/99):

a. Vara cível,

b. Juízo cível;

c. Juízo de pequena instância cível;

3. Tribunais de competência especializada (artigo 103.º LOFTJ/99):

v.g.:

a. Tribunal do trabalho;

b. Juízos de competência especializada cível.

ii. O valor: é o critério para a determinação da competência para os

títulos executivos diversos da sentença judicial (sentença arbitral,

injunção, títulos particulares e administrativos) é determinada pelo

valor, nas comarcas em que o possa ser:

1. Se superior à alçada da relação: é das varas cíveis (artigo 97.º, n.º1,

alínea b) LOFTJ/99);

2. Se igual ou inferior: é dos juízes cíveis (artigo 99.º LOFTJ/99).

Não havendo tribunais em razão da forma de processo/valor serão

executadas pelo tribunal de comarca ou por juízos de competência

especializada cível, enquanto tribunais de competência residual

perante a competência criminal.

2. No quadro da nova Lei de Organização do Sistema Judiciário (LOSJ):

já atrás escrevemos que se prevê genericamente no seu artigo 81.º que o tribunal de

comarca seja estruturado em:

a. Instâncias centrais: onde podem ser criadas:

i. Secções de competência especializada: nomeadamente:

1. De execução (artigo 81.º, n.º2, alínea g) LOSJ): portanto, cabe

distinguir:

a. Nas comarcas com secção de execução: a

competência, regulada no artigo 129.º LOSJ, é,

essencialmente, idêntica à da LOFTJ/99: cabe-lhes

uma competência primária de execução de qualquer

título executivo: processos de execução de natureza

cível, com as competências previstas no CPC, com

exclusão dos processos atribuídos às secções centrais

especializadas arroladas no artigo 81.º, n.º3 LOSJ, e

aos tribunais de competência territorial alargada, do

artigo 83.º, n.º1 LOSJ. Enquanto secção da instância

central, têm ainda competência secundária ou residual,

mas agora muito mais limitada: para os processos de

execução por dívidas de custas cíveis, multas ou

indemnizações, aplicadas em processo cível, com a

competência territorial alargada, as secções da

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instância central e as secções de competência genérica

da instância local (artigo 137.º LOSJ).

b. Nas comarcas sem secção de execução: a

competência executiva será, das instâncias centrais no

âmbito das ações executivas de natureza cível de valor

superior a 50 000€ (artigo 117.º, n.º1, alínea b) LOSJ)

e, residualmente, no que não esteja atribuído àquelas,

às instâncias locais, conforme o artigo 130.º, n.º1,

alínea a) LOSJ, em secções de competência genérica.

Estas secções de competência genérica podem ser

desdobradas em secções cíveis (artigo 130.º, n.º2

LOSJ).

b. Instâncias locais.

Competência em razão do território:

1. Introdução. Sentenças nacionais e condenações acessórias: a competência em

razão do território é regulada pelos artigos 85.º e seguintes CPC. Os seus critérios

têm em linha de conta o tipo de título e algumas das suas circunstâncias.

a. A competência para a execução de sentença ou de decisão judicial que

impunha uma obrigação está regulada nos artigos 85.º a 88.º e 90.º CPC.

α. Antes da reforma de 2003: a execução de sentença regia-se, em regra,

pelo princípio da coincidência plena, da competência declarativa com a

competência executiva, que se retirava do artigo 90.º, n.º1 do respetivo

CPC: o tribunal que dava a sentença era o tribunal que executava a

sentença. Alguns encontravam aqui, por isso, uma norma de

competência global, tanto em razão do valor como do território, como

da matéria.

β. Depois da Reforma de 2003: com a criação de tribunais de execução,

esse critério passou a ser de estrita coincidência territorial, como regra.

Explicando: se, antes de 2003, o tribunal que proferiu a sentença

condenatória seria o tribunal que faria a execução, desde então o tribunal

que fará a execução é da mesma comarca do tribunal que proferiu a

sentença condenatória, mas se é ainda este último ou se é um juízo de

execução depende já da organização judiciária. Por outro lado, o mesmo

artigo definia ainda regras de relação da instância executiva com a

instância declarativa: se aquela é autónoma a sentença é executada por

apenso ou mediante translado; se é uma fase de um mesmo processo, é

executada nos próprios autos.

γ. Com a Reforma de 2013: alterando ainda o artigo e renumerando-o como

artigo 85.º CPC, o resultado final é o seguinte:

i. Nas comarcas com juízo de execução a sentença é executada noutro tribunal

da mesma comarca:

i. No artigo 90.º, n.º3, 2.ª parte CPC (designadas como comarca com

competência executiva específica) pelo seu translado (certidão, passada pela

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secretaria do tribunal de sentença, que reproduz a parte decisória

desta), mas o juiz de execução pode entender por conveniente

apensar-lhe todo o processo;

ii. No artigo 85.º, n.º2 (designadas como quando nos termos da lei de

organização judiciária, seja competente para a execução secção especializada de

execução – artigo 81.º, n.º2, alínea g) LOSJ) por cópia, a qual deve ser

remetida àquela secção, com caráter de urgência, acompanhada do

requerimento que deu início à execução (ainda no processo

declarativo, entenda-se) e dos documentos que a acompanham – e,

não, dos autos do processo declarativo.

ii. Nas comarcas sem juízo de execução a sentença é executada no mesmo

tribunal que a proferiu:

1. Νο artigo 90.º, n.º3, 1.ª parte CPC antigo, por apenso ao processo

declarativo;

2. No artigo 85.º, n.º1 CPC (atual) nos próprios autos do processo

declarativo, onde deve ser apresentado o requerimento executivo,

mas tramitada de forma autónoma; ressalva-se estar pendente

recurso, caso que se executa o respetivo translado.

Porventura, poderia ser, de iure condendo, vantajoso que o credor pudesse

optar entre os critérios atuais e o lugar da situação dos bens que entendesse

mais convenientes para penhorar.

iii. Se a decisão tiver sido proferida por árbitros em arbitragem que tenha tido lugar em

território português, é competente para a execução o tribunal da comarca do

lugar da arbitragem (n.º3 do artigo 85.º CPC).

iv. Como os tribunais superiores – Relação ou Supremo Tribunal de Justiça –

não têm competência executiva das suas próprias sentenças e despachos

condenatórios para a execução destes é competente o tribunal do

domicílio do executado, salvo o caso especial do artigo 84.º CPC; em

qualquer caso, baixa o translado ou o processo declarativo ao tribunal

competente para a execução (artigo 86.º CPC). Discute-se se esta regra

também se aplica à execução para entrega de coisa certa. Alguma

jurisprudência entende que o artigo 86.º CPC não tem aplicação, mas,

manifestamente, a lei é única no seu âmbito.

v. Para a execução das decisões de condenação em custas, multa ou indemnização

referidas no artigo 542.º CPC e preceitos análogos, deve distinguir-se:

1. Quanto às decisões proferidas em primeira instância:

a. No artigo 92.º CPC: vale a regra da mera coincidência

territorial;

a. é competente o tribunal do lugar em que haja corrido

o processo em que tenha tido lugar a notificação da

respetiva conta ou liquidação, observando-se o n.º3

do artigo 90.º CPC;

b. caso o respetivo processo declarativo dê origem a

execução por iniciativa de qualquer das partes, deve a

execução por custas, multas ou indemnizações ser

instaurada por apenso à execução principal;

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c. caso a execução por custas haja sido instaurada

primeiro, a mesma deve ser apensada à execução

principal desde que ainda não tenham sido liquidados

bens no valor suficiente para a satisfação da pretensão

em causa;

b. No artigo 87.º CPC: é competente o tribunal do lugar em que

haja corrido o processo, correndo por apenso a este.

2. Quanto às decisões proferidas em tribunais superiores: segundo o artigo 88.º

CPC, é o tribunal de 1.ª instância competente, da área em que o

processo haja corrido.

b. A execução de qualquer outro título rege-se, pelo artigo 89.º CPC:

2. Restantes títulos: para os demais títulos vale o disposto no artigo 89.º CPC,

contendo regras especiais e regras gerais, essencialmente de conexão real ou de

conexão pessoal entre a execução e o lugar da competência. Também aqui cabe a

execução do requerimento de injunção com fórmula aposta. Não se trata de decisão

da autoria de um tribunal, além de que pode nem sequer passar pela competência de

um concreto tribunal, mas, antes, de uma entidade administrativa nacional ou Balcão

(artigos 5.º e seguintes Portaria n.º220-A/2008, 4 março).

a. A primeira regra é a regra da conexão real: conforme o n.º2, se a execução

for para entrega de coisa certa ou por dívida com garantia real, são,

respetivamente, competentes o tribunal do lugar onde a coisa se encontre ou

o da situação dos bens onerados. Não se tratando de um desses casos

especiais há que buscar solução nas regras gerais, constantes dos n.º1 e 3

daquele artigo.

i. A regra primária – regra da conexão pessoal – é a de que é competente para a

execução o tribunal do domicílio do executado, eventualmente eletivo. Todavia,

o exequente pode optar pelo tribunal do lugar em que a obrigação

deva ser cumprida quando:

1. O executado seja pessoa coletiva; ou

2. Situando-se o domicílio do exequente na área metropolitana de Lisboa

ou do Porto, o executado tenha domicílio na mesma área metropolitana.

ii. A regra residual, volta a ser a de conexão real: se o executado não tiver

domicílio em Portugal, mas aqui tenha bens, a execução deve

proposta no tribunal da situação dos bens.

3. Relações plurilocalizadas: na execução relativa a relação plurilocalizada depois de,

num primeiro momento, se fazer uso das normas de competência internacional que

determinem a jurisdição portuguesa como competente há que fixar qual o tribunal

internamente competente. Não é clara a solução pois falta uma previsão legal

expressa, a quase todo o regime, à exceção do artigo 90.º CPC. Na verdade, a ausência

de opção legal sobre o problema é aparente: ela não surge expressamente apenas

porque o legislador deu como adquirido que nas relações plurilocalizadas para quais

se tenha competência internacional o foro internamento competente resulta da

aplicação dos artigos 85.º e seguintes CPC. Nem sempre é assim, porém, havendo

que ter também em linha de conta os artigos 90.º e 89.º, n.º4 CPC.

a. Em primeiro lugar, tratando-se de sentenças não é relevante por que regra

se obteve a competência internacional, mas sim

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i. Se a sentença é estrangeira: a executar entre nós, incluindo ao abrigo do

Regulamento 1215/2012 ou da Convenção de Lugano, vale

diretamente a regra do artigo 90.º CPC, independentemente da

hierarquia do tribunal que a proferiu. A propósito dela, recorde-se

que na redação do artigo 90.º, anterior a 2003, determinava-se que a

execução fundada em sentença estrangeira corre por apenso ao

processo de revisão ou no respetivo translado, que, para esse feito, a

requerimento do exequente, baixarão ao tribunal de 1.ª instância que

for competente. Perguntava, então, a doutrina se o tribunal de

primeira instância que for competente era o que resultava do artigo

89.º, n.º1 CPC ou do artigo 86.º CPC (nos artigos do atual CPC,

correspondendo aos anteriores da reforma), conforme o título

executivo fosse visto como sendo a sentença estrangeira ou como a

sentença da Relação que confirmou a decisão estrangeira. Na

primeira visão, o tribunal competente seria o do lugar do

cumprimento ou da situação da coisa a penhorar ou entregar; na

segunda visão, seria competente o tribunal do domicílio do executado.

Com a reforma de 2003 vingou a segunda opção, como se vê no teor

literal do artigo 90.º CPC (atual): a execução de sentença estrangeira

é feita no tribunal do domicílio do executado, pois determina-se nos

termos do artigo 86.º CPC. Com isso, não pode querer dizer-se,

todavia, que o título executivo não seja a própria sentença exequenda

(mesmo nos casos de prévio reconhecimento) entendimento

absolutamente negado pela executoriedade direta das decisões

abrangidas pelo Regulamento 1215/2012. Se o devedor não tiver

domicílio em Portugal, regressamos à regra subsidiária do artigo 89.º,

n.º4 CPC: será competente o tribunal da situação dos bens a executar:

na ausência de bens em Portugal, parece-nos que terá de se recorrer

às regras residuais do artigo 80.º, n.º3 CPC.

ii. Se a sentença é nacional: relativa a uma relação plurilocalizada, valem os

artigos 85.º e 86.º CPC diretamente. É irrelevante se já ou não há bens,

e se existe ou não garantia real.

b. Se o titulo executivo for diverso de sentença, importa distinguir:

i. Quando a competência internacional for obtida pelas normas do Regulamento

1215/2012, máxime, pelo domicílio, a irrelevância normativa do

artigo 62.º CPC não significa ulterior irrelevância do artigo 89.º, n.º1

a 3 CPC; estes determinarão a comarca internamente competente.

Falhando estes, i.e., não existindo cá bens, restará o artigo 80.º CPC:

1. Se Portugal obteve jurisdição pelo domicílio (n.º1);

2. Nos demais casos de atribuição de jurisdição (n.º2).

ii. Quando a competência internacional for obtida pela norma de competência

exclusiva do artigo 63.º, alínea d) CPC, decorre também de modo direito

da literalidade residual do n.º4 do artigo 89.º CPC, que o tribunal

internamente competente será:

1. O tribunal que decorrer dos n.º1 a 3 do artigo 89.º CPC, i.e., do

critério da coincidência;

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2. Se não ocorrer nenhuma das situações previstas nesses preceitos, será o

tribunal da situação dos bens a executar.

iii. Quanto a competência internacional foi assegurada pelos critérios do artigo 62.º

CPC, então:

1. No critério da coincidência do artigo 62.º, alínea a) CPC, os tribunais

territorialmente competentes são os ditados pelos n.º1 a 3 do

artigo 89.º CPC;

2. Nos critérios de causalidade ou de necessidade dos artigos 62.º, alíneas

b) e c) CPC, temos um aparente vazio: não há nem normas

especiais, nem conexões territoriais diretas, pelo que entre as

regras do artigo 80.º CPC e o critério mais adequado à

execução do artigo 106.º, n.º4 CPC deve optar-se por este,

por analogia, sendo competente o foro da situação dos bens

a executar; apenas se cá não existirem bens é que valerá o

artigo 80.º, n.º2 e 3 CPC.

Extensão de competência na cumulação de execuções: como se sabe, a

incompetência relativa para uma das execuções não impede a cumulação de execuções, ao

contrário do que sucede com a violação das regras de competência absoluta – artigo 709.º,

n.º1, alínea a) CPC. Porém, ela cria a necessidade de determinar, de entre os tribunais

competentes para a execução, qual será o tribunal em que serão instauradas as execuções. Tal

configura uma extensão da competência relativa quanto ao tribunal que não a teria, caso a

execução lhe tivesse sido apresentada isoladamente. Essas normas de extensão de

competência acham-se nos n.º2 e 4 do artigo 709.º CPC e, indiretamente, no artigo 710.º

CPC. O regime é, assim, o seguinte, no quadro da reforma de 2013:

1. Se todas as execuções se fundam em títulos de formação judicial diversos de

sentença: a ação executiva será promovida no tribunal do lugar onde correu o

processo de valor mais elevado;

2. Quando se cumulem execuções de título de formação judicial e de título

extrajudicial: a execução corre no tribunal do lugar onde correr procedimento em

que o título se formou;

3. Se as execuções se basearem todas em títulos extrajudiciais: é aplicável à

determinação da competência territorial o disposto nos n.º2 e 3 do artigo 82.º CPC,

com as devidas adaptações.

4. Se forem execuções baseadas em pedidos procedentes de uma mesma

sentença: é competente o respetivo tribunal.

A lei nada diz atualmente sobre qual o tribunal competente para a execução cumulada de:

1. Uma pluralidade de sentenças; ou

2. De uma sentença com outro título.

No anterior artigo 53.º, n.º2 e 3 CPC, sabia-se que era, respetivamente:

1. O tribunal do lugar onde correu o processo de valor mais elevado;

2. O tribunal do lugar onde correu a causa.

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O que se admite, sim, é a execução cumulada dos pedidos julgados procedentes em uma

mesma sentença, no artigo 710.º CPC, necessariamente no mesmo tribunal. Ora visto que o

artigo 709.º CPC admite a cumulação de títulos diversos entre si (o que não é a mesma coisa

que títulos diversos de sentença, como aliás se confirma pela leitura da alínea d) do seu n.º1)

estamos perante uma lacuna legal. Por nós, mas com dúvidas: ainda aplicaríamos a solução

dos n.º2 e 3 do artigo 709.º CPC: a ação executiva será promovida no tribunal do lugar onde

correu o processo de valor mais elevado ou no tribunal do lugar em que a causa foi julgada,

consoante as situações – só cumulação de sentenças ou cumulação mista, respetivamente.

Competência convencional: vale também na ação executiva o artigo 95.º CPC,

estruturado em duas linhas:

1. Regras de competência executiva em razão da matéria, da hierarquia, do valor

e da forma de processo não podem ser afastadas por vontade das partes:

2. As partes podem afastar, por convenção expressa, a aplicação das regras de

competência em razão do território, salvo nos casos de conhecimento oficioso

a que se refere o artigo 104.º, n.º1 CPC, ou seja, o artigo 85.º, n.º1 CPC e o artigo

89.º, n.º1, 1.ª parte e 2 CPC.

Não parece ter suficiente apoio legal a posição de Anselmo de Castro que pugnava pela

natureza imperativa das normas de competência territorial executiva por se governarem por

um princípio da coincidência da ação executiva com o lugar da situação dos bens, que é

inadmissível que seja posto na dependência da vontade das partes.

§13.º - Regime de incompetência

Incompetência internacional:

1. Quando resulte da violação do Regulamento 1215/2012: o regime de

incompetência por violação do Regulamento 1215/2012 e da Convenção de Lugano

prevalece sobre o nosso regime de incompetência internacional previstos, nos artigos

96.º CPC. Se for desrespeitado o artigo 24.º, n.º4 e 5 R e 22.º, n.º4 e 5 CLg, para a

execução de sentença e entrega de imóveis, gera-se uma causa de incompetência de

conhecimento oficioso, conforme o artigo 27.º R e 25.º CLg. O tribunal deverá

declarar-se incompetente, por conseguinte. Para quem entenda que o Regulamento

1215/2012 vale também para a execução fundada em outro título se a ação for

colocada em Tribunal sem competência em face do artigo 4.º ou dos artigos 7.º e

seguintes R, a incompetência não é de conhecimento oficioso. Efetivamente,

resultará do artigo 26.º, n.º1, 1.ª parte R e 24.º, 1.ª parte CLg, que se o réu comparecer

mas não arguir a falta de competência o tribunal de um Estado-Membro perante o

qual o requerido compareceu adquire competência ad hoc, mesmo que haja

desrespeito por um pacto de jurisdição. Ou seja, segundo TJUE 20 maio 2010, o

tribunal deve declarar-se competente quando o demandado comparece no processo

e não deduz uma exceção de incompetência, constituindo essa comparência no

processo uma extensão tácita da competência. Contudo, esta regra não é aplicável se

a comparência tiver como único objetivo arguir a incompetência ou se existir outro

tribunal com competência exclusiva, por força do artigo 24.º R e 22.º CLg, limita o

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artigo 26.º, n.º1, 2.ª parte R e 24.º, 2.ª parte CLg. Se o réu nada fizer, não pode relevar

o vício. Tanto no caso do Regulamento 1215/2012, como na Convenção de Bruxelas,

como ainda para a Convenção de Lugano a aferição da incompetência faz-se nos

termos desses instrumentos internacionais. Por isso, na oposição que os executados

fizerem à execução, não será de aceitar a invocação de preceitos normativos da Lei

Portuguesa para justificar a falta de competência do tribunal estrangeiro que proferiu

a sentença exequenda. Todavia, o procedimento – i.e., momento e modo – tanto do

conhecimento oficioso ou como da invocação pelo devedor são os fixados pelo

nosso Código para a incompetência internacional. Por outras palavras, a violação do

Regulamento 1215/”012 e da Convenção de Lugano, é procedimentalmente

incompetência absoluta, seguindo os artigos 96.º e seguintes CPC naquilo que não

for afastado ou incompatível com aqueles instrumentos. Como tal, declarada a

incompetência deve o devedor ser absolvido da instância ou indeferido o despacho

liminar, e a execução extinta.

2. Quando resulte da violação de nossas normas: quando a incompetência

internacional resulte da violação das nossas normas há, então, uma incompetência

absoluta, conforme o artigo 96.º CPC. É de conhecimento oficioso, máxime no

despacho liminar (artigo 726.º, n.º2, alínea b) CPC) ou no despacho sucessivo do

artigo 734.º CPC, e conduz ao indeferimento liminar do pedido ou a absolver da

instância o executado (artigos 97.º, n.º1, 99.º e 278.º, n.º1, alínea a) CPC). Do lado do

agente de execução deve levá-lo a suscitar despacho do juiz, conforme o artigo 855.º,

n.º2, alínea b) CPC. No Código velho a violação de pacto privativo de jurisdição

sujeitava-se à incompetência absoluta mas com a Reforma de 2013 saiu do

correspondente artigo 102.º CPC, e passou para o regime da incompetência absoluta,

com as especialidades dos artigos 97.º, n.º1 e 578.º (não é de conhecimento oficioso)

e 99.º, n.º3 CPC. O executado pode embargar com fundamento nessa incompetência,

ao abrigo do artigo 729.º, alíneas c) e seguintes CPC.

Incompetência interna: igualmente gera incompetência absoluta a violação das normas

em razão da matéria e da hierarquia, conforme o mesmo artigo 96.º CPC. Vale, por

conseguinte, o mesmo regime de conhecimento e efeitos. A violação das regras de

competência fundadas no valor da causa, na forma do processo aplicável, na divisão judicial

do território ou decorrentes de um pacto de competência executiva gera incompetência

relativa. Alguma incompetência em razão do território, contudo, é de conhecimento oficioso,

conforme o n.º1 do artigo 104.º CPC: o n.º1 do artigo 85.º CPC, a 1.ª parte do n.º1 e 2 do

artigo 89.º CPC.

B – Pressupostos relativos às partes

§14.º - Personalidade e capacidade judiciária

Requisitos: os pressupostos processuais da personalidade judiciária e da capacidade

judiciária seguem o regime geral dos artigos 11.º e seguintes e 15.º CPC, respetivamente, sem

especialidade. Por isso, valem as normas relativas à representação de incapazes, incertos,

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ausentes e pessoas coletivas, incluindo o Estado, e demais situações abrangidas pelos artigos

20.º a 26.º CPC.

1. No caso da personalidade judiciária de uma sociedade comercial podem

colocar-se algumas questões práticas:

a. Se a pessoa coletiva cessou para efeitos de IVA, mas ainda não foi

extinta, nada muda no plano processual: permanece com aptidão para ser

parte (artigo 11.º CPC).

b. Se o juiz se aperceber que estava já registado o encerramento da

liquidação da pessoa coletiva antes de propositura então houve

processo sem parte, gerando falta de personalidade inicial, e levando

à extinção da lide por impossibilidade, nos termos do artigo 277.º,

alínea e) CPC. Mas se apenas depois do início da causa é que sobrevem o

registo do encerramento da liquidação (com inerente extinção da pessoa

coletiva), então valerá o artigo 162.º CSC: a ação executiva continua e a

sociedade extinta considera-se substituída pela generalidade dos sócios,

representados pelos liquidatários, nos termos dos artigos 163.º, n.º2, 4 e 5 e

164.º, n.º2 e 2 CSC, não tendo lugar suspensão da instância sendo necessária

habilitação.

c. No caso de insolvência com incidente de qualificação com caráter

limitado, por insuficiência da massa insolvência nos termos do artigo

39.º CIRE, quando o processo de insolvência seja declarado findo (artigos

7.º, alínea b) e 39.º CIRE), ao cessar funções o administrador de insolvência

(Salva a competência residual referida no mesmo n.º7, alínea c)) represtinam-

se os administradores da pessoa coletiva como legais representantes. As

execuções que entretanto estivessem suspensas, por força do artigo 88.º, n.º1

CIRE, podem assim, prosseguir contra a sociedade comercial e as citações e

notificações passarão a ser feitas naqueles.

Regime da falta de personalidade, da incapacidade e representação irregular:

1. Em sede de Código Velho: os pressupostos processais da personalidade e da

capacidade eram controlados oficiosamente, num primeiro momento, pelo agente de

execução, exercendo competências que cabiam à secretaria até à reforma de 2009.

Efetivamente, mandava o artigo 812.º-D, alínea f) CPC (de então), que o agente de

execução remetesse o requerimento executivo para despacho liminar se suspeitar que

se verifica uma das situações previstas nas alínea b) do n.º1 do artigo 812.º-E CPC

(de então), ou seja, exceções dilatória, não supríveis, de conhecimento oficioso. Tal

será o caso da falta de personalidade. Estranhamento, o agente de execução estava

desprovido dessa competência se o vício for suprível, como acontece, a título

excecional, com a falta de personalidade no (equivalente ao atual) artigo 14.º CPC e,

em termos gerais com a falta de capacidade ou com a representação irregular. O

melhor entendimento seria o de que o agente de execução ao estar sujeito ao (atual)

artigo 6.º, n.º2 CPC, i.e., ao dever funcional de promoção da sanação das

irregularidades e vícios processuais, se não tem competência de correção dos mesmos,

deveria, porém, remeter o processo para o juiz.

2. No novo Código: a questão está bem resolvida, justamente naquele sentido: se na

forma ordinária o problema não se coloca porquanto há sempre despacho judicial

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(artigo 726.º CPC), na forma sumária cabe ao agente de execução suscitar a

intervenção do juiz quando se lhe afigure provável a ocorrência de alguma das

situações previstas no n.º2 do artigo 726.º CPC (artigo 855.º, n.º2, alínea b) CPC), i.e.

de indeferimento liminar e de aperfeiçoamento para suprir as irregularidades do

requerimento executivo, bem como para sanar de pressupostos. Havendo, então,

lugar a despacho liminar o juiz deve indeferir liminarmente o requerimento, se a falta

de personalidade não for suprível, ao abrigo do artigo 726.º, n.º4 CPC. Em todos os

demais casos, deve começar por proferir despacho de convite à sanação da falta de

personalidade (artigo 14.º CPC), da falta de capacidade ou da irregular representação

(artigo 27.º e 28.º CPC) ou, ainda, da falta de autorização ou deliberação (artigo 29.º

CPC), nos termos do artigo 726.º, n.º4 CPC. Em todos os demais casos, deve

começar por proferir despacho de convite à sanação da falta de personalidade (artigo

14.º CPC), da falta de capacidade ou da irregular representação (artigo 27.º e 28.º

CPC) ou, ainda, da falta de autorização ou deliberação (artigo 29.º CPC), nos termos

do artigo 726.º, n.º4 CPC. Se o vício não for sanado deverá, então, o juiz despachar

pelo indeferimento liminar. Mas, importa não esquecer que o artigo 734.º CPC

admite que o juiz possa depois do momento inicial, e desde que ainda não se tenha

pronunciado em termos concretos sobre um dado vício, conhecer oficiosamente das

questões da falta de personalidade, de capacidade ou de representação regular. Nessa

eventualidade instará o exequente a promover a sanação do vício, sendo o caso,

podendo concluir por uma decisão de absolvição do executado da instância, se não

for sanado ou for insanável. Naturalmente que a falta destes pressupostos configura

exceções dilatórias que podem servir de fundamento à oposição à execução pelo

executado, ao abrigo dos artigos 729.º, alínea c) CPC e, remetendo para este, dos

artigos 857.º, 730.º e 731.º, respetivamente, CPC.

§15.º - Legitimidade processual singular; interesse processual

Generalidades: o artigo 817.º CC ao definir o direito à execução coativa da prestação fixa

ipso facto quem tem legitimidade processual ativa e passiva na execução: o credor, i.e., aquele

que tem o direito de exigir judicialmente o cumprimento e o devedor por causa do seu

património. Por outro lado, o mesmo Código Civil, no seu artigo 818.º CC determina que o

direito de execução pode incidir sobre bens de terceiros, quando estejam vinculados à

garantia do crédito ou quando sejam objeto de ato praticado em prejuízo do credor, que este

haja procedentemente impugnado. Isto significa que, no plano da legitimidade passiva pode

ser parte ativa quem não é devedor. Estes princípios de repartição da legitimidade sem

expressão processual em critérios de aferição da legitimidade singular constantes dos artigos

53.º e 55.º CPC. Por fim, deve ainda ter-se em linha de conta o artigo 606.º CC.

Credor e devedor:

1. Qualidade de credor e de devedor originários: o artigo 53.º, n.º1 CPC enuncia

que a execução tem de ser promovida pela pessoa que no título executivo figure

como credor e deve ser instaurada contra a pessoa que no título tenha a posição de

devedor. Apela-se, assim, à literalidade do título executivo, sentença, contrato, título

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de crédito ou qualquer outro. Essa mesma literalidade autoriza, todavia, alguma

situações excecionais de indeterminação do credor em face do título. Aquilo que na

expressão de Teixeira de Sousa se pode designar por legitimidade aberta.

a. Assim sucede se o título for ao portador (artigo 53.º, n.º2 CPC): será a

execução promovida pelo portador do título;

b. Também no contrato a favor de terceiro (artigo 443.º, n.º1 CC) e no

contrato para pessoa a nomear (artigo 352.º, n.º1 CC): o credor não

consta do título mas será determinado posteriormente, nos termos

contratados. Esta determinação deve ser alegada e demonstrada no

requerimento executivo.

c. E ainda, o credor do pagamento da sua parte em indemnização dos

titulares de interesses difusos violados não individualmente

identificados (artigo 22.º, n.º2 LAP): tê-lo-á de o fazer no requerimento

executivo de execução da respetiva sentença condenatória.

O devedor tanto pode ser singular, como plural, em conjunção ou em solidariedade,

como pode ser um devedor subsidiário, maxime, fiador. No caso da fiança, o devedor

garante, com o seu património, o pagamento de dívida alheia, ficando pessoalmente

obrigado perante o credor (artigo 627.º, n.º1 CC). A obrigação do fiador é acessória

da que recai sobre o principal devedor (artigo 627.º CC). Por isso, ela mantêm-se

enquanto não se extinguir a obrigação do devedor principal, ainda que esta já não

possa ser objeto de execução singular. Por outro lado, o fiador está, em regra, numa

posição de subsidiariedade perante o afiançado, pois é-lhe lícito recusar o

cumprimento enquanto o credor não tiver excutido todos os bens do devedor sem

obter a satisfação do seu crédito (artigo 638.º, n.º1 CC). No entanto, tanto na fiança

mercantil (artigo 101.º CCom), quanto em resultado de exclusão contratual ou ficta

do benefício da excussão prévia (artigo 640.º e 641.º, n.º2 CC), o fiador pode

posicionar-se como devedor principal e solidário (artigos 638.º e 640.º CC) da

integralidade da dívida (artigo 634.º CC). A fiança deve revestir sempre a forma

legalmente exigida para a obrigação afiançada, por força do artigo 628.º, n.º1 CC.

Todavia, se esta for constituída por uma forma mais solene do que a que a lei exige,

tem sido defendido que à respetiva fiança basta que satisfaça apenas seguir a forma

legal mínima da obrigação principal. O título executivo é o contrato de fiança (artigo

703.º, n.º1, alínea b) CPC). Já no caso do avalista, dita o artigo 32.º LULL, que o

dador de aval é responsável da mesma maneira que a pessoa por ele afiançada. A sua

obrigação constitui-se formalmente pelo ato de assinatura do dador do aval,

acompanhada da expressão bom para aval ou fórmula equivalente. Ela tem sido

caracterizada como sendo materialmente autónoma, mantendo-se ainda que seja nula

a obrigação garantida por qualquer razão que não seja um vício de forma, mas não

sendo subsidiária da do avaliado. Trata-se de uma responsabilidade solidária, não

gozando o avalista de benefício de excussão prévia, conforme o artigo 47.º, I e II

LULL. O título executivo é, naturalmente, o título de crédito (artigo 703.º, n.º1, alínea

e) CPC).

d. A garantia bancária autónoma: consiste numa garantia obrigacional, em

que o garante é um banco e a obrigação garantia tem por credor o beneficiário

e por devedor um terceiro. Ora, o sujeito que garante o cumprimento fê-lo,

sem acessoriedade da obrigação principal, e sem poder opor ao credor

exceções e meios de defesa próprios daquela, ao contrário do fiador (artigo

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637.º, n.º1 CC). A garantia autónoma pode ser simples ou à primeira

solicitação, consoante o credor para exigir o cumprimento da obrigação do

garante que tenha de provar o incumprimento da obrigação do devedor ou a

verificação dos pressupostos do nascimento do seu crédito face ao garante,

ou não tenha de fazer essa prova, bastando a interpelação para cumprimento

ao garante. O título executivo, pelo qual se buscará o devedor, será o contrato

de constituição dessa garantia.

2. Sucessores universais e singulares: a seguir, o artigo 54.º, n.1º CPC declara que

tendo havido sucessão no direito ou na obrigação, deve a execução correr entre os

sucessores das pessoas que no título figuram como credor ou devedor da obrigação

exequenda e no próprio requerimento para a execução deduzirá o exequente os

factos constitutivos da sucessão. Esta sucessão na obrigação tanto pode ser sucessão

mortis causa, como a transmissão da obrigação para outrem por ato inter vivos, nos

termos dos artigos 577.º (cessão de créditos) e 595.º (assunção de dívida) CC ou da

LULL, nomeadamente. Querendo o executado poderá na oposição à execução,

invocar a ilegitimidade singular por falta desta sucessão (artigo 729.º, alínea c) CPC).

Naturalmente que o facto sucessório há de aqui ser posterior à formação do título

executivo, mas anterior à produção do requerimento executivo. Diversamente, se o

facto sucessório ocorre na pendência da ação executiva o exequente deverá promover

o incidente de habilitação, de herdeiro, se a causa for a morte do devedor (artigo

351.º CPC), ou de adquirente ou cessionário, se a causa foi uma transmissão entre

vivos (artigo 356.º CPC). Esta transmissão pode ter lugar mesmo depois de já estarem

penhorados bens.

3. Terceiros abrangidos por sentença condenatória: a execução fundada em

sentença condenatória pode ser promovida, não só contra o devedor ou respetivos

sucessores, mas ainda contra as pessoas em relação às quais a sentença tenha força

de caso julgado, como se lê no artigo 55.º CPC. Estamos, portanto, perante uma

regra de legitimação passiva por extensão subjetiva imperativo do caso julgado. No

plano material, esses terceiros não o são no plano da dívida: tanto podem ser credores,

como devedores por terem adquirido o crédito ou coisa litigiosa, mas sem a

correlativa aquisição da qualidade de parte processual. Está apenas e somente aqui

abrangida a situação em que a sentença produz efeitos contra o adquirente, não

habilitado, de direito ou coisa litigioso (artigo 263.º, n.º3 CPC). Já naqueloutro caso

em que a sentença vincula o terceiro chamado à causa para parte principal ao abrigo

do artigo 316.º CPC, mesmo se não haja intervindo (artigo 320.º CPC), aquele não é

terceiro, pois sendo citado passou a parte principal pelo que estará abrangido pelo

artigo 53.º, n.º1 CPC. Quanto aos intervenientes como partes acessórias, ao estarem

sujeitos ao caso julgado da parte principal ex vi artigos 323.º, n.º4 e 332.º CPC, a

respetiva legitimidade também cabe no artigo 53.º, n.º1 CPC. Bem Lebre de Freitas:

ao excluir a sua legitimidade passiva para efeitos do artigo 72.º CPC por sendo um

mero auxiliar da parte principal, a apreciação da sua posição jurídica terá lugar em

ação autónoma. Efetivamente, assim é embora sujeitos ao caso julgado eles não

foram condenados. Este regime será aplicável às situações de caso julgado secundum

eventum litis ou eventual?

a. Do lado passivo: nos termos dos artigos 522.º e 635.º, n.º1 CC tanto o co-

devedor solidário, como o fiador não presentes na causa em que foi

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condenado o co-devedor ou o devedor principal não são prejudicais, i.e.,

sujeitos a exequibilidade do comando condenatório. O mesmo se diga para

o devedor principal não presente na causa em que se condenou o fiador, ex

vi artigo 635.º, n.º2 CPC. Não podem, pois, ser executados, dada a exclusão

legal de prejuízo em face deles. Pelo contrário, apenas dela beneficiam

querendo, nos termos desses mesmos preceitos.

b. Do lado ativo: de acordo com os artigos 531.º e 538.º, n.º1 CPC, os co-

devedores solidários e os co-credores de obrigação indivisível, podem

beneficiar sa sentença. Terão, por isso, legitimidade ativa? Pelo artigo 55.º

CPC a resposta parece ser negativa, dado esse artigo se referir expressamente

e apenas ao lado passivo do direito à prestação.

i. Neste sentido, Lebre de Freitas exclui a sua aplicação por analogia,

em razão da sua excecionalidade, e considerando que a condenação

não acarreta o reconhecimento do direito dos outros contitulares,

mas tão-só a indiscutibilidade do dever de prestar do réu;

ii. Contra, Teixeira de Sousa, entende que a norma não é excecional –

pelo contrário é expressão de um princípio geral – e que a extensão

do caso julgado aos credores solidários não demandantes ou aos

credores demandantes de uma prestação indivisível implica o

reconhecimento de legitimidade executiva a esses mesmo credores.

iii. Somos de opinião que o princípio da extensão do caso julgado

secundum eventum litis é-o, inevitavelmente, também quanto à força

executória. Quando o artigo 531.º CC autoriza a que ele pode ser

oposto por estes ao devedor ou o artigo 538.º, n.º2 CC que o caso

julgado favorável a um dos credores aproveita aos outros, o que é

oponível é a indiscutibilidade do dever de prestar do réu também

perante os demais credores. É esse o essencial dessa oponibilidade

ou aproveitamento. Mas, por outro lado, o princípio do contraditório

dita que aquela extensão seja restrita: na medida do que for comum

ao terceiro credor. O devedor permanece com o direito, não

precludido, de invocar fundamentos de oposição pessoais ao credor

terceiro que não fora parte do processo. Em suma: os credores

solidários ou de prestação indivisível não demandantes têm

legitimidade executiva por força de um princípio que, enunciado no

Código Civil, implica a interpretação extensiva do artigo 55.º CPC.

Ao mesmo tempo, o devedor terá, em sede de artigo 729.º, alínea g)

CPC, possibilidade de invocar exceções perentórias que apenas ele

teria legitimidade para invocar perante o credor, caso este houvesse

sido parte.

4. Representação do Estado na execução por custas e multas: embora

substantivamente já fora da execução civil deve referir-se, todavia, que o artigo 57.º

CPC determina, o que designa como legitimidade, ao Ministério Público para

promover a execução por custas e multas judiciais impostas em qualquer processo.

Trata-se, afinal, de uma previsão de representação orgânica do Estado, credor

daquelas dívidas. O legitimado é o credor, i.e., o Estado, em face dos títulos

executivos apresentados.

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Execução sub-rogatória: em várias situações, pode o terceiro executar a dívida em sub-

rogação ao credor. Assim, o artigo 606.º CC determina, com exceções, que sempre que o

devedor o não faça, tem o credor a faculdade de exercer, contra terceiro, os direitos de

conteúdo patrimonial que competem àquele. Mas, essa sub-rogação só é permitida quando

seja essencial à satisfação ou garantia do direito do credor. Anselmo de Castro nota que é

possível admiti-la na ação executiva quando o devedor-credor se mostre negligente no seu

exercício, embora com dúvidas. Ou seja: aquele preceito civil dá legitimidade processual ativa

secundária – pois não dá coincidência entre titularidade do crédito e o autor da ação – para

o credor propor ou entrar em execuções em nome do seu devedor. E, na verdade, apenas se

o seu crédito estiver vencido é que poderá o credor instaurar a sua própria execução e

penhorar o crédito que o seu devedor tem sobre terceiro, ao abrigo do artigo 773.º, n.º1 CPC.

Por seu lado, no procedimento executivo de penhora de créditos prevê-se no artigo 777.º,

n.º3 CPC que o exequente se substitua ao executado na execução do crédito deste sobre

terceiro.

Terceiros à dívida:

1. Bens de terceiro vinculados à garantia do crédito: o crédito do exequente pode

estar garantido por hipoteca ou outra garantia real sobre bens de terceiro à divida, o

qual não irá ser o devedor principal, originário, mas o garante do cumprimento da

obrigação. Tal é admitido pelos artigos 686.º, n.º1 e 818.º, 1.ª parte CC, em articulação

com o artigo 735.º, n.º2 CPC. A respetiva execução por dívida provida de garantia

real sobre bens de terceiro conhece as regras do artigo 54.º, n.º2 e 3 CPC. Elas

enunciam critérios de legitimidade passiva. O terceiro garante tanto pode ser quem

prestou a garantia inicialmente, como quem tenha, posteriormente, adquirido a coisa

onerada. Sendo o título executivo sentença deverá o terceiro garante ter também sido

nela ponderado, já que por força do artigo 635.º, n.º1, 1.ª parte CC, aplicável à

consignação de rendimentos ex vi artigo 657.º, n.º2 CC, penhor ex vi artigo 667.º, n.º2

CC e hipoteca ex vi artigo 717.º, n.º2 CC, o caso julgado entre o credor e o devedor

não é oponível àquele, salvo se os bens lhe tiverem sido transmitidos pelo devedor

já onerados. Importa distinguir várias vias possíveis de atuação do credor

condicionadas pela natureza disponível das garantias reais e pelo artigo 697.º, a

contrario CC. Se o exequente não pretender fazer valer a garantia colocará a ação

contra o devedor, legitimado pelos artigos 53.º, 54.º, n.º1 ou 55.º CPC. Alguma

doutrina afirma que o credor não poderia prescindir da garantia, mas, com o devido

respeito, tal não é conforme à disponibilidade substantiva de uma garantia real. Assim,

e por exemplo, quando uma hipoteca incide sobre vários imóveis, pode o credor

executar qualquer deles ou parte de um deles, pela totalidade da dívida. Naturalmente

que essa disponibilidade tem de ter expressão processual e justamente o verbo

pretender significa que o credor não exerce o direito real de garantia no ato processual

devido. Isso pode ocorrer tacitamente ao não indicar o bem onerado à penhora e o

agente de execução também não e o credor nada exprimir em contrário. Mas também

pode ocorrer expressamente mediante declaração expressa de não exercício feita em

declaração para os autos ou, mesmo, antes da execução. Tanto a mera não invocação

da garantia real, como esta declaração, não extintiva da garantia, não se podem

confundir com a renúncia ou extinção unilateral e voluntária da garantia. Esta só

pode ter lugar segundo os modos previstos na lei civil para renúncia a direito real.

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Por isso, uma válida renúncia ou e feita extrajudicialmente, máxime, antes da

execução, segundo a forma válida, ou no ato processual do próprio requerimento

executivo apenas quando a forma legal o consinta: os casos da hipoteca voluntária

sobre coisa móvel (artigo 688.º, n.º1, alínea f) CC) e de penhor (artigo 677.º CC).

Havendo renúncia naturalmente que apenas o devedor conserva a legitimidade

passiva, conforme o artigo 53.º CPC, sem prejuízo dos artigos 54.º, n.º1 e 44.º CPC.

Em qualquer outro caso, o exequente faz valer a garantia, seja indicado o bem, sem

declarações de restrições quanto à garantia, seja aceitando que o agente o

individualize também de modo irrestrito. Mas, como o devedor não tem direito a que

a penhora se inicie sobre os bens alheios, como decorre do artigo 697.º, a contrario

CC, cabe ao credor escolher se quer acionar somente o terceiro, ou o terceiro e o

devedor em coligação, inicial ou superveniente. A legitimidade opcional, diríamos,

do terceiro justifica-se por o artigo 735.º, n.º2 CPC determinar que nos casos

especialmente previstos na lei, podem ser penhorados bens de terceiro, desde que a

execução tenha sido movida contra ele. Concretizando, o exequente poderá acionar

apenas o terceiro sem sequer demandar o devedor, ao abrigo do artigo 54.º, n.º2, 1.ª

parte CPC. Isto permitirá que a dívida se extinga sem que o devedor chegue sequer

a ir ao processo. Deve, em todo o caso, entender-se que o devedor que queira pagar

voluntariamente deverá, naturalmente, poder fazê-lo, nos termos do artigo 846.º, n.º1

CPC. Não podem subsistir dúvidas que qualquer pessoa pode ser o próprio devedor,

além de um terceiro, naturalmente. Repare-se que, deste modo, o artigo 54.º, n.º2

CPC surge como uma norma de legitimação passiva do terceiro e não como uma

previsão de litisconsórcio necessário desse terceiro com o devedor. Se se reconhecer

a insuficiência dos bens onerados com a garantia real, o que só pode acontecer após

a distribuição do produto da venda, pode o exequente requerer, no mesmo processo,

o prosseguimento da ação executiva contra o devedor, que será demandado para

completa satisfação do crédito exequendo (artigo 54.º, n.º3 CPC). Trata-se de uma

intervenção principal compondo um litisconsórcio – não uma coligação –

superveniente pois, pese embora a diferente posição dos executados perante a dívida

– um é um devedor (deve cumprir) e o outro é garante real (deve responder pelo

incumprimento) – a obrigação exequenda é uma e mesma, não podendo permanecer

extinta em face de um e não extinta em face do outro. Naturalmente que o exequente

poderá, querendo, acionar em litisconsórcio voluntário o terceiro garante e o devedor

desde o início, conforme o artigo 54.º, n.º2, 2.ª parte CPC. O que o exequente não

pode é de início demandar apenas o devedor, executando ao mesmo tempo a garantia.

Qual a consequência neste caso? Não pode ser a ilegitimidade do próprio devedor,

mas, sim a ilegalidade subjetiva da penhora, impugnável em embargos de terceiro e

em ação de reivindicação. O artigo 54.º, n.º2 CPC dá legitimidade ao terceiro, mas

não a retira ao devedor.

2. Bens do devedor onerados por direitos de gozo de terceiro: quadro diverso é o

da execução por dívida provida de garantia real sobre bens do devedor. Nessa

eventualidade importa separar se os bens estão onerados com direito de terceiro ou

se não têm esse encargo.

a. Se sobre o bem com garantia real não incidir direito de terceiro, nada

há a dizer no plano da legitimidade singular, pois apenas tem legitimidade o

devedor. O que sucede é que o devedor executado tem direito a que penhora

se inicie pelos bens sobre que incida a garantia e só pode recair noutros

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quando se reconheça a insuficiência deles para conseguir o fim da execução,

conforme o artigo 697.º CC – cujo âmbito extravasa o da hipoteca graças aos

artigos 665.º, 678.º, 753.º, 758.º, 2.ª parte e 759.º, n.º3 CC – e o artigo 752.º,

n.º1 CPC.

b. Se sobre o bem com garantia real incidir direito de terceiro deve

considerar-se o n.º4 do artigo 54.º CPC. Este declara que pertencendo os

bens onerados ao devedor, mas estando eles na posse de terceiro, poderá este

ser desde logo demandado juntamente com o devedor. Portanto, trata-se de

mais um critério de legitimidade passiva plural. O âmbito do preceito não é

claro. Antes de mais em face do n.º2 do mesmo artigo. Quanto a este a

diferença é a seguintes:

i. No n.º2: o direito a penhorar – bens, na expressão legal – é da

titularidade de terceiros;

ii. No n.º4: o direito a penhorar é da titularidade do devedor mas está

onerado por direito menor de terceiro e que lhe confere posse.

Deste modo, um usufrutuário tanto pode ser citado pelo artigo 54.º, n.º2 CPC,

quando o bem objeto da garantia – logo, da hipoteca – seja o usufruto, como

pode ser citado pelo artigo 54.º, n.º4 CPC, quando o objeto da garantia seja

um direito maior (máxime, de propriedade) e haja o usufruto a onerá-lo.

Depois, qual pode, então, ser esse direito menor na titularidade do terceiro

que confira posse? A lei não distingue, pelo que abrange todos os direitos que

consistam a posse, logo, será um direito nos termos de um direito real de

perigo. Para Teixeira de Sousa os possuidores, i.e., os que obteriam

vencimento em embargos de terceiros, obteriam agora ganho na oposição à

penhora, se fosse caso disso naturalmente. Os possuidores com direitos não

oponíveis não obteriam vencimento. Sem dúvida que assim é, quanto ao

sentido da procedência, mas a justificação da existência do preceito

permanece por explicar. A chave é o conceito de direito incompatível para

efeitos do artigo 351.º, n.º1 CPC (embargos de terceiro), máxime quanto ao

usufruto e à locação. Trata-se de matéria que abordaremos detalhadamente

adiante, em sede de embargos de terceiro, mas da qual já se pode antecipar

algumas conclusões. Se o terceiro possuidor tiver uma posse incompatível –

i.e., substantivamente oponível – com a eminente ou já consumada penhora,

para efeitos do artigo 351.º, n.º1 CPC, mas que deva caducar com a venda

executiva, ex vi artigo 824.º, n.º2 CC, por ser posterior à garantia do exequente,

aquela caducidade tem como condição processual o terceiro ter sido citado

para a execução, nesta sede de artigo 54.º, n.º4 CPC. Ou seja, se o credor

quiser realizar a sua garantia real na íntegra (i.e., abrangendo a propriedade

de raiz e incorporando ainda o usufruto ou qualquer outro direito real

onerador posterior à garantia) deverá executar ab initio o terceiro, ao abrigo

da legitimação dada pelo artigo 54.º, n.º4 CPC. Ao contrário, se o terceiro

não for citado, ao abrigo desse n.º4, a penhora e a venda executiva para serem

subjetivamente válidas apenas poderão abranger a propriedade de raiz. Se

ainda assim for penhorada a propriedade plena o direito não caduca e

usufrutuário pode embargar de terceiro, procedentemente, sublinha Lebre de

Freitas. Em suma: o artigo 54.º, n.º4 CPC assegura a legalidade da extensão

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objetiva da penhora. Deste modo, trata-se, pois, de um litisconsórcio

voluntário conveniente, rectius, de uma coligação. Porquê? Porque o

fundamento material para a presença do devedor e para a presença do

terceiro não é o mesmo. Seja como for, ao contrário do que sucede em sede

de artigo 71.º, n.º2 CPC (onde o terceiro conserva legitimidade sempre que a

garantia seja executada, ainda que na ausência do devedor) o terceiro

possuidor não pode ser executado sozinho: deve ser demandado juntamente

com o devedor. Isso sucede porquanto a sua legitimidade supõe a necessária

penhora de um bem do devedor, onerado pelo direito ou posse do terceiro.

Por isso, estando-se na forma ordinária de execução – i.e., a citação antecede

a penhora – e o bem não cegar, sequer, a ser penhorado, o possuidor perderá

legitimidade para estar na causa. Uma vez citado como executado, o terceiro

possuído terá ao seu dispor a oposição à penhora – por exemplo, invocando

que o bem do devedor está na posse do terceiro como instrumento de

trabalho deste (artigos 737.º, n.º2, 784.º, n.º1, alínea a) CPC) pelo que a

penhora deve ser levantada – e a oposição à execução, de modo restrito. Além

do mais, ficará como depositário se for a sua casa de habitação efetiva (artigo

756.º, n.º1, alínea a) CPC).

3. Terceiro adquirente por ato impugnado: já sabemos que o artigo 818.º CC prevê

ainda que o direito de execução pode incidir sobre bens de terceiro quando sejam

objeto de ato praticado em prejuízo do credor, que este haja procedentemente

impugnado. Juntamente o artigo 616.º, n.º1 CC autoriza a que o credor possa

executar esses bens no património do terceiro. Trata-se de terceiro contra quem

tenha sido obtida com sucesso sentença de impugnação pauliana, i.e., houve um ato

praticado em prejuízo do credor. O título executivo é a sentença de impugnação

pauliana.

a. Lebre de Freitas entende que o adquirente surge aqui como devedor,

enquanto condenado; mas

b. Amâncio Ferreira pugna pela aplicação do artigo 54.º, n.º2 CPC.

c. E, na verdade, se o devedor conserva a sua legitimidade em face do título,

i.e., no plano da titularidade da obrigação exequenda, já o adquirente tem

legitimidade por causa dos bens, i.e., no plano da garantia da obrigação

exequenda, como sucede no artigo 54.º, n.º2 CPC.

4. Apreciação conclusiva: numa primeira consideração global pode afirmar-se que os

critérios de atribuição de legitimidade executiva traduzem uma adaptação do artigo

30.º CPC à circunstância de a execução ter por base um título executivo, conforme

enuncia o artigo 10.º, n.º5 CPC. Daí a primeira regra, do artigo 53.º CPC: têm

legitimidade para serem partes ativa e passiva os sujeitos da relação tal como é

configurada pelo autor no título executivo, por se presumir serem os titulares do

interesse direto em executar em contradizer a pretensão de execução. No entanto, a

suficiência formal do título como constitutivo do poder de realização coativa da

prestação não pode ser complexa, pois para lá do momento da formação do título

podem existir modificações ou importa considerar, ainda, os próprios termos dos

títulos negociais. Assim, neste caso, a existência de títulos ao portador determina que,

como se viu no artigo 53.º, n.º2 CPC, que o credor possa ser determinado apenas no

próprio requerimento executivo. Naqueloutro, objeto do artigo 54.º, n.º1 CPC, deve

a lei permitir que os sucessores ou transmissários possam ser parte na causa por ainda

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terem um nexo com a legitimidade primária dada no título aos transmitentes. Repare-

se que na ação declarativa estes problemas não se colocam nos mesmos termos, mas

ainda assim também se colocam. É que no momento declarativo do impulso

processual o autor afirma-se como o putativo credor, ainda a demonstrar

probatoriamente e a ser declarado pelo tribunal na sentença final. De certo modo, é

irrelevante, no plano das normas processuais, saber se adquiriu a posição credor

originaria ou superveniente. No entanto ele tem de ter legitimidade ativa e para tal

tem de alegar, em sede de causa de pedir, que adquiriu a posição jurídica.

Diversamente, já a dependência funcional da ação executiva perante o título

executivo obriga o legislador a abrir uma exceção à suficiência do título para dar os

elementos subjetivos e objetivos do litígio à execução. Deste modo, o autor é sempre

determinado, mesmo que seja apenas determinável, em face do título. O mesmo

sucede em relação à sentença com efeito sobre terceiros (artigo 55.º CPC).

Novamente, temos um título em que a sua suficiência formal pode ter limites em face

do que, no plano material, deriva dela. Portanto, os critérios de legitimidade dos

artigos 53.º, n.º2, 54.º, n.º1 e 55.º CPC têm uma ratio comum: o crédito é

subjetivamente diverso ou mais extenso do que aparenta no título. Mas o critério

nuclear é aquele que enunciamos de início: tem legitimidade executiva quem é o

titular, pelo título ou a partir dele, da relação material como o autor a

configura. Já diversamente sucede com o artigo 54.º, n.º2 e 4 CPC, pois dá-se

legitimidade passiva a quem não é sujeito da relação controvertida, mas tem um

interesse direto em contradizer. Porquê? Porque há um desdobramento subjetivo

entre a titularidade da obrigação e a responsabilidade patrimonial pela mesma, no

plano da propriedade ou no plano da posse. Por isso, o terceiro tem de ser

demandado porque é titular de um direito cuja titularidade, no caso do artigo 54.º,

nº.2 CPC, ou o exercício, no caso do artigo 54.º, n.º4 CPC, serão alterados pela

realização coativa da prestação.

Regime da ilegitimidade singular: a ilegitimidade singular é de conhecimento oficioso

e não é sanável. Já sabemos que, no atual Código, na forma sumária cabe ao agente de

execução suscitar a intervenção do juiz quando se lhe afigure provável a ocorrência de alguma

das situações previstas no n,ç2 e no n.º4 do artigo 726.º (artigo 855.º, n.º2, alínea b) CPC). O

tribunal que conheça da ilegitimidade deve proferir um despacho de indeferimento liminar

do requerimento executivo (artigo 726.º, n.º2, alínea b) CPC) ou, se conhecida mais tarde, ao

abrigo do artigo 734.º CPC, deve absolver o executado da instância e extinguir a execução.

A falta de legitimidade constitui uma exceção dilatória que pode ser fundamento à oposição

à execução pelo executado, ao abrigo dos artigos 729.º, alínea c) e seguintes CPC.

Interesse processual: pela expressão interesse processual têm sido abrangidas realidades

de natureza heterogénea. Assim, tanto se inclui a necessidade de perigo de dano ao direito

subjetivo, como a exigibilidade da obrigação como, ainda, o uso de um meio processual

quando já se está munido de um suficiente meio de tutela. Demonstrada já noutra sede a

natureza substantiva, não processual, tanto da necessidade de perigo de dano ao direito

subjetivo enquanto elemento da causa de pedir, e da exigibilidade da obrigação como

elemento da causa de pedir complexa da ação declarativa condenatória e da ação executiva,

o interesse processual fica circunscrito às situações de abuso do direito de ação como, e bem,

defende Diogo Pereira. Estas são ações sem causa processual, i.e., o autor abre uma concreta

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via judiciária já dispondo de prévia medida de tutela ou podendo abrir uma via judiciária mais

célere. São, nomeadamente, os casos das alíneas c), d) e e) do n.º2 do artigo 535.º CPC: todos

eles supõem um concurso de meios processuais em face dos quais o titular do direito de ação

pretende fazer uso do que tem maior custo para o Estado ou um uso desnecessário do

processo, mais genericamente. Ora, o abuso de ação conduz à responsabilidade do autor por

custas, nos termos do artigo 535.º, n.º1 CPC, não impedindo o conhecimento do pedido

Assim configurado o interesse processual, parece haver muito pouco espaço concreto para

o abuso de direito de ação executiva, tal como se enquadra no artigo 535.º, n.º1 CPC. É que

não há meios executivos concorrentes entre si: ao credor não é apresentada mais do que uma

via de execução. A única situação parece ser a execução de obrigações puras sem prévia

interpretação do devedor. O credor vai obter pela citação judicial um efeito processual que

poderia ter produzido privadamente. Já vimos que ela pode conduzir à responsabilidade por

custas caso o devedor que no prazo de oposição à execução, nos termos dos artigos 610.º,

n.º3, e 535.º, n.º2, alínea b) CPC.

1. Pelo contrário, para Teixeira de Sousa, o direito de execução não dispensa o

interesse processual do exequente mas surge mais como pressuposto de atos

processuais do que como pressuposto processual.

2. Mas, novamente, o termo interesse processual surge aqui para abranger

consequências normativas de princípios e institutos heterogéneos como o da

proporcionalidade. Usado com esta amplitude, como é corrente suceder, perde

qualquer capacidade de delimitar e explicar a realidade normativa.

§16.º - Legitimidade processual plural

Generalidades: a ação executiva recebe as figuras comuns do litisconsórcio, em sentido

amplo, e dentro dele, do litisconsórcio e da coligação. Na verdade, os direitos a uma prestação

podem estar em contitularidade, seja do lado ativo, seja do lado passivo. Além disso, são

frequentemente direitos que integram relações jurídicas complexas, aparecendo,

nomeadamente sujeitos que dão garantias, sejam pessoais – máxime, um fiador ou um

avalista – sejam reais – v.g., o não devedor titular de um direito dado em garantia. Por outro,

podem ainda ser considerados os titulares de interesses concorrentes ou mesmo

incompatíveis, como sejam, respetivamente, os interesses de outros credores do executado

ou os interesses do cônjuge ou de terceiros. Finalmente, a já referida dependência funcional

da execução perante o título executivo coloca, novamente, agora em sede de legitimidade

plural, a exigência de que seja o título a dar, direta ou indiretamente, legitimidade a todos os

envolvidos. Por isso, importa apurar, em concreto qual o real alcance do litisconsórcio e da

coligação, tanto iniciais como supervenientes, na ação executiva e quais os requisitos

específicos. À semelhança da ação declarativa importa isolar os casos em que a pluralidade

de sujeitos no litígio impõe uma pluralidade de sujeitos processuais, sob pena de não

conhecimento do pedido executivo, e as situações em que isso não sucede. Por outras

palavras, o caráter residual do litisconsórcio voluntário ante o necessário impõe que se

comece por abordar este.

Litisconsórcio necessário:

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1. Litisconsórcio necessário convencional e natural: à partida, atento o artigo 33.º,

n.º1 CPC, pode afirmar-se que o litisconsórcio é necessário na ação executiva quando

a realização coativa de um direito a uma prestação apenas por todos os credores ou

contra todos os devedores pode ter lugar, seja por lei, vontade das partes ou

indivisibilidade material da própria prestação. No passado, Alberto dos Reis afirmou

que não havia litisconsórcio necessário na ação executiva, o que a realidade desmente.

Há, porventura, uma menor frequência da figura no processo executivo porque ela

está mais presente nas ações declarativas constitutivas; não há seguramente uma

ausência.

a. O litisconsórcio necessário convencional: existe quando as partes

convertem uma obrigação parciária ou uma obrigação solidária numa

obrigação que chamaremos unitária. Trata-se de um verdadeiro regime

material para as obrigações plurais que apenas vigora no exercício judicial do

direito.

b. O litisconsórcio necessário natural: exige uma indivisibilidade da própria

prestação: apenas pode ser materialmente realizada em face de todos os

credores ou por todos os devedores o que, atentos os limites subjetivos das

medidas judicias, implica que todos tenham de estar na ação.

i. Tal é dificilmente configurável na execução para pagamento de quantia certa,

pois o objeto da prestação é naturalmente divisível;

ii. No entanto, na execução para entrega de coisa certa, embora raramente, há

litisconsórcio natural passivo quando aquela indivisibilidade material

surgir como a própria indivisibilidade material dos atos de apreensão,

independentemente da questão da contitularidade do direito de

fundo. Assim, se os atos materiais de apreensão exigirem num

primeiro momento, uma entrega plural, existe necessidade

litisconsorcial. Isso sucede se a apreensão envolver o domicílio ou a

sede social de mais de uma pessoa singular ou coletiva. Mas já não há

litisconsórcio necessário natural se a coisa cuja entrega era devida por

vários se encontra apenas em casa de um dos obrigados, na sua posse,

mesmo que todos invocassem direitos próprios.

iii. Finalmente, na execução para prestação de facto, podem configurar-se

obras ou factos plurais, como, por exemplo, a realização de um

concerto.

2. Litisconsórcio necessário legal: há várias normas substantivas, obrigacionais,

familiares, reais e sucessórias, que impõem a presença de credores e devedores na

ação executiva, sob pena de ilegitimidade. No plano obrigacional exemplos de

litisconsórcio necessário legal são os que estão nos artigos 496.º, n.º2 e 500.º, n.º1

CC. No primeiro, litisconsórcio entre os vários titulares sucessivos do crédito de

indemnização; no segundo, litisconsórcio entre comitente e comissário na execução

de indemnização. Mas há ainda o artigo 535.º, n.º1 CC: em sede de execução de

obrigações indivisíveis com pluralidade de devedores, só de todos os obrigados pode

o credor exigir o cumprimento da prestação, salvo se tiver sido estipulada a

solidariedade ou esta resultar da lei. Por outro lado, também na execução

subrogatória se o credor exerce a faculdade de executar contra terceiro, os direitos

de conteúdo patrimonial que compete ao seu devedor será necessária a citação do

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devedor sub-rogado, em litisconsórcio passivo, como impõe o artigo 608.º CC. Neste

caso, a legitimidade afere-se não apenas pelo direito exequendo, mas também pela

penhora, de modo a que os atos executivos tenham como sujeitos processuais os

sujeitos dos respetivos efeitos substantivos (artigo 819.º e 824.º CC, nomeadamente).

Nos litígios reais, os artigos 1404.º e 1405.º, n.º1 CC, impõem claramente um

litisconsórcio passivo: os contitulares de direitos exercem, em conjunto, todos os

direitos que pertencem ao proprietário singular. Tal vale seja na execução para

entrega de coisa certa, seja na execução para pagamento de quantia certa com garantia

real sobre bem em contitularidade. Por outro lado, o artigo 2091.º, n.º1 CC dita que,

em regra, os direitos relativos à herança só podem ser exercidos conjuntamente por

todos os herdeiros ou contra todos os herdeiros. Portanto, determina-se

litisconsórcio necessário, ativo e passivo, e seja qual a espécie de execução:

pagamento de quantia certa, entrega de coisa ou prestação de facto. Por seu turno,

em matéria conjugal, o artigo 34.º CPC estatui litisconsórcios necessários ativos no

seu n.º1 e necessários passivos no seu n.º3, 1.ª e 3.ª partes. Os n.º1 e 3, 3.ª parte do

artigo 34.º CPC apenas se aplicam à execução para entrega de coisa certa. Elas

regulam a disponibilidade comum sobre bens, próprios ou comuns, tendo por objeto

os casos dos artigos 1682.º CC, para os bens móveis, e 1682.º-A CC, para os bens

imóveis. Ora, como na execução para entrega de coisa certa podem ser apreendidos

bens que caibam nessas categorias impõe-se a participação do casal. Por seu turno,

na execução de prestação de facto não se põe um problema de perda de direitos ou

de bens, dado o objeto processual não ser dispositivo, nem onerador de bens da

respetiva prestação. Já na execução de prestação pecuniária o risco de perda ou

oneração de bens indisponíveis, por meio da penhora e ulterior venda executiva é

considerado pelo processo mas de outra forma. Efetivamente, aqui ou ambos os

cônjuges são citados enquanto devedores, ou quando somente um é executado valerá

o regime dos artigos 740.º e 786.º, n.º, alínea a), 2.ª parte CPC, protetor de bens

comuns, eventualmente indisponíveis, ou o regime do artigo 786.º, n.º1, alínea a), 1.ª

parte CPC, especificamente destinado às indisponibilidades sobre bens próprios. Já

a 1.ª parte e 2.ª parte do n.º3 do artigo 34.º CPC não se aplicam fora da execução para

pagamento de quantia certa. Elas apontam, respetivamente, para o regime de

execução de dívidas comuns e para o regime das dívidas comunicáveis. Mas, como

mostraremos adiante, se a 1.ª parte impõe um litisconsórcio conjugal passivo, a

segunda já admite um litisconsórcio voluntário conveniente. Permitamo-nos, porém,

deixar a demonstração destas asserções para a sede da penhorabilidade subsidiária,

pois apenas nesse contexto se poderá fazer luz sobre a questão.

3. Regime da preterição de litisconsórcio necessário: a preterição de litisconsórcio

necessário é causa de ilegitimidade, nos termos do artigo 33.º, n.º CPC. É de

conhecimento oficioso e sanável, constituindo uma exceção dilatória que pode ser

de fundamento à oposição à execução pelo executado, ao abrigo dos artigos 729.º,

alínea c) CPC e seguintes. O tribunal que a conheça deve proferir um despacho

liminar ou superveniente de aperfeiçoamento (artigo 726.º, n.º4 e 734.º CPC). A

sanação dá-se pela intervenção principal provocada do interessado faltoso, ao abrigo

do artigo 316.º, n.º1 CPC. A não sanação conduz ao indeferimento liminar ou ao

indeferimento sucessivo, consoante os casos (artigo 726.º, n.º5 CPC). No entanto,

no regime do artigo 261.º CPC, o exequente pode sanar o vicio ainda em 30 dias

sobre o trânsito em julgado formal do despacho de indeferimento ou sentença de

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procedência de oposição à execução fundada em preterição do litisconsórcio

necessário. Deste modo, o exequente conseguirá reabrir a instância, mantendo todos

os benefícios temporais da sua prévia propositura.

Litisconsórcio voluntário: não havendo litisconsórcio necessário, importa distinguir,

consoante o regime da obrigação exequenda seja de

1. Créditos plurais: a natureza solidária (artigo 512.º CPC) ou parciária (artigo 512.º, a

contrario, e 533.º CC) de uma obrigação plural não obriga a que todos, credores e/ou

devedores, estejam como partes na execução. Todos têm legitimidade, em face do

artigo 53.º CPC, mas o que decorre do regime comum do artigo 32.º CPC é que:

a. Sendo a obrigação parciária: cabe ao exequente optar entre exigir a

prestação acompanhado e/ou contra todos os devedores ou não. Se o credor

sozinho ou apendas deduzir a pretensão contra um dos obrigados apenas

pode executar a respetiva quota-parte na prestação, sob pena de excesso do

pedido sobre o título e indeferimento parcial do requerimento (artigo 726.º,

n.º3 CPC). Deste modo, a demanda plural na execução de obrigações

parciárias configura-se como um litisconsórcio conveniente.

b. Tratando-se de obrigações solidárias: o cumprimento total e íntegro pode

ser exigido por um dos credores, em representação dos demais, ou realizado

por um dos devedores em representação dos restantes. É o que se preceitua

no artigo 512.º, n.º1 CC. Correlativamente, vale o artigo 32.º, n.º2 CPC,

bastando que um dos credores e/ou devedores intervenha para assegurar a

legitimidade. Este enunciado significa que basta a intervenção de um deles

para se executar a totalidade da prestação, em representação processual.

Regime idêntico rege a execução de obrigações indivisíveis com pluralidade

de credores. Qualquer dos credores tem o direito de exigi-las por inteiro e o

devedor, uma vez judicialmente citado para a execução, deve exonerar-se

relativamente a todos ou alguns dos credores (artigo 538.º, n.º1 CC). Tanto

no caso das obrigações solidárias, como no de obrigações indivisíveis, cabe

ao exequente em conjunto, e a via da substituição processual se atua ou

demandar sozinho.

c. Finalmente, se houver um devedor principal e um devedor subsidiário,

máxime, um fiador – ambos legitimados ex vi artigo 53.º, n.º1 CPC – o credor

pode optar entre demandar um deles ou ambos, já que a eventual alegação

do benefício da excussão prévia não respeita à legitimidade. É o que veremos

em sede do artigo 745.º CPC.

2. Situações reais e sucessórias em contitularidade: tanto a composse, como a

compropriedade podem ser defendidas singularmente, em representação processual,

em sede de legitimidade ativa, por cada um dos compossuidores ou comproprietários,

em execução para entrega de coisa certa, ao abrigo dos artigos 1268.º, n.º1 e 1405.º,

n.º2 CC. Tal é assim, mesmo que na ação declarativa tenha corrido litisconsórcio

necessário entre os contitulares. O mesmo sucede com o herdeiro que pede

separadamente a totalidade dos bens da herança em poder de terceiro, representando

os demais (artigo 2078.º, n.º1 CC).

Litisconsórcio superveniente:

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1. Problema. hodiernamente, é consensual que se admite intervenção de terceiros para

ocuparem a posição de exequente ou de executado nos casos tipificados na lei:

a. Do devedor na execução movida contra o terceiro com garantia real

(artigo 54.º,n.º3 CPC);

b. Do devedor principal ou do fiador, na execução movida,

respetivamente, contra o fiador ou contra o devedor principal (artigo

745.º, n.º2 CPC);

c. Do exequente na execução de bens com garantia real (anteriormente no

artigo 832.º, n.º4 antigo CPC suprimido no artigo 750.º CPC atual).

Por outro lado, a lei permite ainda a intervenção de outros terceiros:

d. Com direito ou posse incompatível com a penhora (artigo 342.º CPC);

e. Com um crédito suportado por garantia real e do cônjuge do

executado (artigo 786.º, n.º1, alíneas a) e b) CPC).

Fora deste núcleo duro, a doutrina divide-se entre o campo dos autores que admitem,

com ou mais ou menos restrições, a aplicabilidade dos artigos 311.º e seguintes CPC

à ação executiva e a doutrina que, inversamente, admite a intervenção de terceiros

apenas em casos pontuais, determinados fora dos parâmetros gerais

a. Doutrina: trata-se, afinal, de avaliar a funcionalidade do procedimento

executivo no plano subjetivo em face do princípio dispositivo e do favor

creditoris.

i. Na doutrina mais antiga, Anselmo de Castro escrevia que o artigo

54.º, n.º3 CPC, ao admitir a intervenção superveniente do devedor,

após a demanda inicial do terceiro titular de bem vinculado em

garantia real, se deve ter como afloração de um princípio geral a

aplicar nos demais casos de pluralidade de responsáveis, máxime à

demanda inicial de apenas um dos co-devedores solidários. Por outro

lado, o regime das (demais) intervenções de terceiros na causa

previsto para a fase declaratória em nada colidindo ele com os fins da

ação executiva, antes assegurando a sua realização, nenhuma razão

haveria para o não admitir. Já a figura da assistência raro terá na

execução interesse mas que não se vê razão para não ser admitida.

ii. Atualmente, Teixeira de Sousa depois de restringir a intervenção

acessória aos apensos declarativos, constrói uma posição aberta de

admissibilidade de intervenção principal na execução. Admite, assim,

a intervenção principal provocada para sanar a preterição de

litisconsórcio necessário (artigo 261.º, n.º1 CPC) e para fazer intervir

um litisconsorte voluntário, máxime, o executado provocar a

intervenção de um seu co-devedor solidário, no prazo da oposição à

execução. Já o fiador, constante do título executivo juntamente com

o devedor, não poderia requerer a intervenção principal deste por

falta de interesse processual: deve é invocar o benefício da excussão

prévia como o permite o artigo 747.º CPC. Inversamente, também o

devedor principal não poderia provocar a intervenção do fiador,

enquanto não se esgotarem os seus bens. Simetricamente, Teixeira de

Sousa, admite a intervenção principal espontânea, tanto em

composição de litisconsórcio necessário, como por parte de

litisconsorte voluntário. Quanto a este nada parece obstar à

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intervenção de um terceiro para vir ocupar a posição de co-exequente

ou de co-executado, a ter lugar a todo o tempo (artigo 322.º, n.º1

CPC).

iii. Algo contrariamente, Lebre de Freitas tem uma posição restritiva

quanto às intervenções de terceiros na instância executiva,

postulando que as disposições reguladoras dos vários tipos de

incidentes de intervenção de terceiros, à exceção da assistência, foram

pensados em função da ação declarativa. Além das situações previstas

na lei a intervenção de terceiros apenas pode ter lugar quando o

credor o queira, tanto do lado ativo, como do lado passivo, salvo para

a coligação.

b. Jurisprudência:

i. Na jurisprudência passada recusaram-se os incidentes do chamamento à

autoria (antigo artigo 325.º CPC) e do chamamento à demanda antigo

artigo 330.º CPC), correspondentes, respetivamente, à atual

intervenção acessória provocada (artigo 320.º CPC atual) e à

intervenção principal provocada de co-devedores ou de devedor

principal (artigo 316.º, n.º2, alínea b) CPC).

ii. Na jurisprudência recente tem sido recusada a intervenção principal

provocada (artigos 316.º e seguintes CPC).

1. O fundamento está expresso no Ac. RL 21 abril 2009/

11180/1008-1: a executada através do incidente de

intervenção principal provocada nos termos dos artigos 316.º

e seguintes CPC não pode colocar os chamados na posição

de executados pois é ao exequente que cabe decidir contra

quem, das pessoas que no título têm a posição de devedor,

pretende instaurar a execução (artigo 47.º LULL, ex vi artigo

77.º CPC da altura), argumente que diríamos valer para

qualquer litisconsórcio voluntário.

2. Mas não se trata de entendimento consolidado: o Ac. RP 23

abril 2001 /0150402 veio afirmar que se é sabido que os

incidentes de terceiros foram estruturados em função da ação

declarativa, só nela se podendo realizar, mas a intervenção

principal é já defensável na ação executiva, quanto a pessoas

com legitimidade para esta ação, admitindo que terceiro,

entretanto condenado em impugnação pauliana e cujos bens

foram penhorados, pudesse deduzir a sua intervenção

principal espontânea (artigos 311.º e seguintes CPC). E na

mesma linha, já se defendeu que o próprio exequente pudesse

provocar a intervenção (artigo 316.º CPC) desse terceiro.

Por outro lado, quanto às intervenções acessórias foi negada, mas

com exceções, a intervenção acessória (artigo 321.º CPC), tanto por

intervenção acessória provocada, como por assistência (artigo 326.º

CPC), tendo em conta a finalidade deste tipo de processo – visa obter

a realização coativa da prestação não cumprida, pois que o dever de

prestar já se encontra corporizado no título executivo.

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3. Todavia, em sede de assistência, o Ac. STJ 3 janeiro 2996

/099257 veio dizer que nada impede que ela possa ocorrer no

processo executivo, mas, todavia, essa intervenção como

assistente só se justifica se a lei não facultar a esse terceiro

algum outro meio para defender o seu direito, eventualmente

sujeito a poder vir a ser prejudicado pela decisão a tomar no

processo.

4. E também o Ac. RP 23 outubro 1995/ 9550768 já admitira o

mesmo.

c. Posição pessoal: o princípio da estabilidade da instância determina que

apenas podem ter lugar modificações subjetivas quando a lei as preveja

(artigo 259.º CPC).

i. Vimos que as normas executivas admitem intervenções de terceiros nos casos

típicos atrás referidos.

ii. Já as intervenções de terceiros dos artigos 311.º e seguintes CPC apresentam um

regime unitário tipicamente declarativo, na relação dos seus atos com o

procedimento da ação pendente e, bem assim, na sua função – extensão do

âmbito subjetivo inicial tanto do contraditório como da sentença final.

As previsões respetivas postulam, na sua articulação com o

procedimento pendente, uma discussão declarativa que, em absoluto,

está ausente do procedimento executivo, nomeadamente:

1. Articulados (artigos 312.º e 313.º CPC);

2. Despacho saneador (artigo 314.º, n.º1 CPC);

3. Audiência de discussão e julgamento (artigo 323.º, n.º2 Código

velho).

iii. Portanto, os incidentes gerais de intervenção de terceiro são, no sua

concreta expressão, incidentes declarativos.

Por seu lado, a execução não serve para convencer outrem do direito de

alguma das partes, como, por exemplo, para chamar o terceiro contra o qual

o requerente pretenda exercer o direito de regresso em ulterior ação de

indemnização (artigo 323.º, n.º4 CPC). O âmbito subjetivo da execução é o

pré-definido pelo título executivo e os sujeitos assim demandados hão-de

sempre apresentar legitimidade por força dos artigos 53.º e seguintes CPC e

não como resultado do próprio procedimento de intervenção. Na doutrina

de Teixeira de Sousa, nota isso mesmo: a intervenção principal, como

exequente ou como executado, está restringida, em regra, a sujeitos que

constam do título executivo. Em suma: os regimes de intervenções de

terceiros serão outros, eventualmente com a mesma designação doutrinal,

mas não estes. E, portanto, por aqui não se acham exceções para efeitos do

artigo 259.º CPC. A regra vigente na execução é, assim, a da inadmissibilidade

de intervenções atípicas de terceiros, seja a que título for. Poderemos invocar

princípios que imponham a admissibilidade de intervenção de terceiros

excecional? Um princípio pode ser o da tutela da materialidade subjacente:

seria um desperdício processual que o credor tivesse de abrir uma outra ação

só para demandar outro devedor. A ser assim concordaríamos com Lebre de

Freitas: as intervenções de terceiros apenas pode ter lugar quando o credor o

queira. Os lugares próximos do artigo 54.º, n.º2 CPC e do artigo 711.º, n.º1

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CPC confirmariam um princípio de disponibilidade do credor na

conformação subjetiva da instância, tanto inicial quanto superveniente. Do

lado do executado, apenas o direito constitucional de defesa pode justificar

que ele possa chamar outro devedor ao procedimento executivo. Neste

sentido, o Ac. RP 28 abril 2008/0852357 decidiu que em processo executivo

só excecionalmente se pode autorizar a intervenção de terceiros, quando

indispensável e necessária à defesa do executado. Mas essa intervenção não

será somente para o apenso de oposição à execução, mas na própria execução,

sujeitando-se aos atos executórios, naturalmente. Em qualquer caso, o

terceiro que seja admitido à execução terá o prazo próprio para dedução de

oposição à execução em 20 dias a contar da citação para intervenção. Trata-

se de uma oposição superveniente, não pela matéria mas pelos sujeitos (artigo

728.º, n.º2 CPC).

§17.º - Patrocínio judiciário

Âmbito: do artigo 58.º CPC, alterado no n.º1 e com um novo n.º3, desde a reforma de 2013,

conjugado com o artigo 40.º CPC, resulta o que se expõe de seguida, sendo decisivo o valor

da causa:

1. Assim, nas execuções de valor superior à alçada da Relação, há patrocínio

obrigatório, apenas por advogado;

2. Nas execuções de valor superior à alçada do tribunal de 1.ª instância e igual

ou inferior à alçada da Relação, há patrocínio judiciário obrigatório:

a. Por advogado, advogado estagiário;

b. Por advogado apenas para os apensos e reclamação de créditos de

valor superior à alçada do tribunal de 1.ª instância.

3. Nas execuções de valor igual ou inferior à alçada do tribunal de 1.ª instância,

o patrocínio não é obrigatório, salvo para as reclamação de crédito superior à alçada

da 1.ª instância, mas podem as partes, voluntariamente, pleitar representadas por

advogado estagiário ou solicitador.

Regimes da falta ou irregularidade de patrocínio judiciário:

1. A falta de patrocínio segue o artigo 41.º CPC. Por isso,

a. Se o exequente não constituir advogado: o tribunal, oficiosamente (artigo

726.º, n.º4 e 734.º CPC) ou a requerimento da parte contrária, fá-la-á notificar

para o constituir dentro de prazo certo, sob pena de o executado ser

absolvido da instância.

b. Se foi o executado quem não constituiu advogado: o regime é o mesmo

salvo que os atos do executado ficam sem efeito, se não houver suprimento.

2. Por seu turno, a irregularidade do patrocínio segue o artigo 48.º CPC:

a. A falta de procuração e a sua insuficiência ou irregularidade podem, em

qualquer altura, ser arguidas pela parte contrária e suscitadas oficiosamente

pelo tribunal, seja em momento liminar, seja em momento superveniente. O

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juiz fixará no respetivo despacho o prazo dentro do qual deve ser suprida a

falta ou corrigido o vício e ratificado o processado. Findo este prazo sem que

esteja regularizada a situação, fica sem efeito tudo o que tiver sido praticado

pelo mandatário, devendo este ser condenado nas custas respetivas e, se tiver

agido culposamente, na indemnização dos prejuízos a que tenha dado causa.

Sempre que o vício resulte de excesso de mandato, o tribunal participa a

ocorrência ao Conselho Distrital da Ordem dos Advogados. Portanto, se o

réu será absolvido da instância ou os seus atos anulados, caso, respetivamente,

consoante o que ficar sem efeito forem respetivamente, o requerimento

executivo ou os atos do réu.

C – Pressupostos relativos ao objeto

§18.º - Pressupostos gerais

Positivos:

1. Intelegibilidade e congruência lógica e substancia. Âmbito da ineptidão: o

artigo 186.º CPC dita-nos as características da inteligibilidade e da congruência do

objeto processual. A inteligibilidade é a qualidade lógica de expressão de um sentido

pelos enunciados produzidos nos atos processuais da parte. Assim:

a. Tanto a causa de pedir como o pedido têm, não somente de ser

formulados (artigo 186.º, n.º2, alínea a), 1.ª parte CPC), como o devem

ser de modo inteligível: se faltar ou for ininteligível a causa de pedir ou

pedido, a petição inicial é inepta (artigo 186.º, n.º2, alínea a) CPC).

b. O pedido não pode ser contraditório, em termos lógicos, com a causa

de pedir (artigo 186.º, n.º2, alínea b) CPC) e tanto o pedido como a

causa de pedir devem ser materialmente compatíveis com outro

pedido ou causa de pedir cumulados, ao abrigo dos artigos 709.º, 56.º e

186.º, n.º2, alínea c) CPC,

Para Anselmo de Castro a ineptidão do requerimento executivo não teria lugar na

ação executiva. Ela está representada no título executivo, é inútil, por irrelevante,

tudo quando sobre aquela o autor exponha na petição. Ou seja, a leitura do título

garantiria sempre a presença de causa de pedir e a sua inteligibilidade e, bem assim, a

ausência de contradição com o pedido. Os vícios a existirem seriam da própria

inexequibilidade do título.

Quanto a nós, parece-nos que importa distinguir se a causa de pedir, i.e., o facto da

aquisição do direito a uma prestação, consta ou não do titulo executivo. Por regra, a

causa de pedir constará do título, dada a função certificadora e a suficiência desta: a

causa de pedir não será autónoma em face do título e não carecerá sequer de

enunciado (artigo 724.º, n.º1, alínea e) CPC, a contrario). Se faltar o título o vício é esse,

justamente – falta de título – e não o da ineptidão; se o título não for inteligível o

vício será ainda o mesmo. Opostamente, os factos que fundamentam o pedido

podem não constar do título executivo, i.e., a causa de pedir ser autónoma em face

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do título. Tem então, o exequente o ónus da respetiva alegação no requerimento

executivo como determina o artigo 724.º, n.º1, alínea e) CPC. É o que sucede,

nomeadamente, na demonstração da causa debendi do reconhecimento de dívida.

Todavia, o credor não tem de fazer prova da causa – a presunção de existência da

dívida decorrente do título executivo dispensa essa prova. No entanto, e dito isto,

quando seja título executivo negocial decorre do artigo 726.º, n.º2, alínea c) CPC que

a causa de pedir tem de ser minimamente aparente de modo a permitir um juízo de

verossimilhança positiva por parte do juiz. Se assim não for o juiz pode indeferir

liminarmente o requerimento executivo por manifesta inexistência de factos

constitutivos da obrigação exequenda que sejam de conhecimento oficioso. Já o

pedido não decorre do título, pois não se confunde com o direito neste enunciado.

Isto é: ainda que, v.g., se estipule no contrato o direito à restituição do capital

mutuado essa declaração negocial não é a pretensão dirigida ao tribunal. Precisamente,

o ónus do artigo 724.º, n.º1, alínea f) CPC impõe ao exequente ónus de formular o

pedido, sempre. E, por conseguinte, pode muito bem ocorrer ineptidão do

requerimento executivo por omissão de dedução do pedido executivo. Por outro lado,

também não pode ser requerida uma execução que seja contraditória com a respetiva

causa de pedir, o que alguns designam por divergência entre o pedido e o próprio

título ou inexistência concreta de título. E, enfim, não podem ser cumulados pedidos

insubstantivamente compatíveis entre si, em violação do artigo 555.º, n.º1, 1.ª parte

CPC. Uma e outra situação redundam em ineptidão.

2. Falta de aptidão do requerimento executivo: do que escrevemos conclui-se que

o requerimento executivo é inepto quando dele esteja ausente a indicação da causa

de pedir autónoma ou quando, embora enunciada, não seja intelegível ou seja

incomatível com o pedido ou com outra causa de pedir (artigo 186.º, n.º2, alíneas a)

e b) CPC). O requerimento é ainda inepto por falta absoluta de pedido, conforme o

artigo 186.º, n.º2, alínea a) CPC. O mesmo se diga quando não se afigure como

inteligível ou quando seja contraditório com outro pedido (artigo 186.º, n.º2, alíneas

a) e c) CPC. A ineptidão causa nulidade de todo o processo, cominada pelo artigo

186.º, n.º2 no seu corpo CPC. Apenas não produz esse efeito no caso do n.º3 do

mesmo artigo: ainda que o executado argua a ineptidão com fundamento na falta do

pedido, o juiz não poderá julgar procedente a arguição quando se verificar que o

opoente interpretou convenientemente o requerimento executivo. Trata-se de uma

exceção dilatória que conduz à absolvição da instância executiva (artigos 278.º, n.º1,

alínea b) e 577.º, alínea b) CPC), de conhecimento oficioso pelo juiz (artigo 578.º

CPC), e fundamento de oposição à execução do artigo 729.º, alínea c) CPC. Ademais,

o agente de execução que receba o processo deve analisá-lo e remetê-lo

eletronicamente ao juiz para despacho liminar ex vi artigo 726.º CPC ou por força do

artigo 855.º, n.º2, alínea b) CPC, na forma sumária.

Negativos:

1. Litispendência: há litispendência entre execuções quando o credor executa o

mesmo direito a uma prestação em mais do que um processo, ao mesmo tempo.

a. No plano objetivo: a repetição de execução sucede, ainda que se faça uso de

títulos diversos – máxime, de sentença condenatória e de título negocial – ou

de bens diferentes. Ou seja, a litispendência não exige a identidade de objeto

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dos atos executivos. Por isso, apenas sem sentido impróprio e não rigoroso

se pode chamar de litispendência à pluralidade de penhoras sobre o mesmo

bem, mas por dívidas diferentes, que está tratada no artigo 794.º CPC. Na

execução em separado de devedores ou credores solidários trata-se sempre

da mesma dívida, havendo litispendência se o âmbito objetivo da dívida

executada coincidir.

b. No plano subjetivo: não é relevante, para aferir a litispendência, se o direito

à execução forçada da dívida é exercido na posição processual de credor

exequente ou de credor reclamante: a dívida é sempre a mesma. E, assim,

existe litispendência quando depois de intervir como reclamante em execução

de terceiro, instaura a sua própria e autónoma ação executiva – já não o

inverso, pois aí o artigo 794.º CPC obriga à fusão das execuções – ou ainda

reclama o mesmo crédito com garantia real em mais do que uma execução.

Há também litispendência se numa causa se executar o devedor principal e

noutra o devedor subsidiário. A identidade dos sujeitos do ponto de vista da

sua qualidade jurídica (artigo 581.º, n.º2 CPC) deve ser entendida em sentido

amplo de modo a abranger não apenas os transmissários, mas os obrigados

acessoriamente. Por outras palavras, não há litispendência se numa execução

se pede um terço do valor e na outra os demais dois terços, pois o primeiro

pedido não configura uma desistência do pedido na parte não executado, com

a inevitável extinção do direito que se pretendia fazer valer (artigos 285.º e

288.º CPC).

A litispendência é de conhecimento oficioso e dita a absolvição da segunda instância

executiva, nos termos dos artigos 278.º, n.º1, alínea e), 577.º, alínea i) e 578.º, 1.ª parte

CPC, mesmo que já haja bens penhorados nessa causa. Há, afinal, uma causa

desnecessária. O que se pode discutir é se essas penhoras da causa repetida podem

ser aproveitadas para a primeira causa, de maneira a aproveitar-se a eficácia dos atos

processuais quando valha a pena.

a. Lebre de Freitas defende a permanência das penhoras da causa repetida e

sua manutenção no âmbito da primeira ação por meio da aplicação analógica

da remessa prevista no artigo 832.º, n.º4 CPC anterior, obstando à absolvição

da segunda instância (artigo 278.º, n.º2 CPC).

b. Importa distinguir, parece-nos:

i. Como se acabou de observar a segunda instância será, em qualquer caso

extinta, sendo despiciendo aplicar o artigo 832.º, n.º4 CPC antigo, ainda que por

analogia. Ademais, esse regime não subsiste no novo Código. O que

se deve é apurar da eventual coincidência quanto aos bens

penhorados;

ii. Assim:

1. Se os bens penhorados nas duas ações forem os mesmos, a segunda

penhora extingue-se com a respetiva causa e a primeira

penhora, naturalmente, subsiste;

2. Se os bens forem diferentes entre si, uma eventual não extinção das

segundas penhoras terá de ser avaliada e decidida pelo agente

de execução, atentando aos princípios cardinais da

proporcionalidade, adequação e legalidade material e adjetiva

da fase da penhora, considerada no conjunto das duas ações.

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É certo que a manterem-se penhoras isso quer dizer que atos

de uma causa serão enxertados em outra, mas mais por um

princípio de aproveitamento dos atos processuais – logo da

prevalência da materialidade subjacente à execução –, e

menos pela relevância do anterior artigo 832.º, n.º4 CPC,

impossível, aliás, no novo regime.

2. Caso julgado: a exceção de caso julgado entre execuções pressupõe que, como

decidiu o Ac. RP 3 maio 1994/9321180, haja identidade quanto ao pedido e à causa

de pedir desde que a primeira execução, por o exequente ter desistido do pedido, for

julgada extinta por sentença transitada em julgado. Esta exceção ditará a absolvição

da segunda instância, nos termos do artigo 278.º, n.º1 CPC, sendo levantada as

eventuais penhoras. Como concluiu o mesmo aresto o caso julgado obsta a que seja

requerida outra execução com os mesmos sujeitos, o mesmo pedido e a mesma causa

de pedir. Todavia, tal supõe que uma execução possa terminar com sentença do juiz

o que, não é a regra: está reservada aos embargos de executado. Por regra, termina

com comunicação da ocorrência de um facto extintivo por parte do agente de

execução, nos termos do disposto no artigo 849.º CPC. E supõe ainda que aquela

sentença da oposição à execução tenha valor de caso julgado material. Se assim pode

ser, é algo que abordaremos em detalhe mais adiante, ou seja, em que medida a

extinção de uma execução pode relevar numa posterior execução de uma mesma

dívida.

3. Pendência de processo de insolvência: tivemos já ensejo de referir a prevalência

da insolvência sobre quaisquer outras diligências executivas, sejam em ações

executivas, sejam em providências cautelares. No caso, é importante o artigo 88.º,

n.º1, 1.ª parte CIRE, estatuindo que a declaração de insolvência determina a

suspensão de quaisquer diligências executivas ou providências requeridas pelos

credores da insolvência que atinjam os bens integrantes da massa insolvente (artigo

88.º, n.º1, 1.ª parte CIRE) e obsta a instauração ou ao prosseguimento de qualquer

ação executiva intentada pelos credores da insolvência; porem, se houver outros

executados, a execução prossegue contra estes (artigo 88.º, n.º1, 2.ª parte CIRE).

Tem-se discutido se a suspensão é para todas as execuções, seja qual a for a sua

modalidade, ou se abrange apenas as execuções de dívidas. A ser assim, continuam a

correr os seus termos as execuções para prestação de facto e para entrega de coisa

certa. Assim, já se decidiu que quanto à ação executiva para prestação de facto,

avaliado por perito o respetivo custo e efetuada a penhora da quantia necessária para

o respetivo pagamento e das custas devidas, que foi depositada à ordem do juiz, não

deve ser ordenada a sustação da execução devendo antes a execução prosseguir os

seus termos normais. Deve discordar-se, com o devido respeito, parcialmente. A

ratio do artigo 88.º CIRE é a preservação de bens do insolvente para os interesses de

insolvência. Não podem prosseguir as execuções que tenham por objeto bens em

poder do devedor, a que título for – propriedade própria, comodato – e seja para que

finalidade for – entrega, pagamento – e com que expressão processual for – execução

autónoma, execução acessória. Deve reservar a apreciação dos direitos de terceiro

sobre bens do devedor e, obviamente, a sua liquidação para a sede do processo de

insolvência. Deste modo, a inexistência de declaração de insolvência constitui um

pressuposto processual negativo, ex vi artigo 88.º, n.º2, 1.ª parte CIRE. Em bom rigor,

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parece mesmo ser uma situação de litispendência entre execução e processo de

insolvência, pois neste liquida-se a massa de bens para pagar todas as dívidas,

incluindo uma dívida exequenda. De todo o modo, seja qual for a qualificação que

se lhe dê, ela será de conhecimento oficioso e leva à absolvição da instância, nos

termos dos artigos 278.º, n.º1, alínea e) e 577.º, alínea i) e 578.º, 1.ª parte CPC.

§19.º - Pluralidade de objetos processuais

Cumulação de pedidos:

1. Funcionalidade: na ação executiva, o credor pode cumular execução contra o

mesmo devedor ou vários devedores litisconsortes, conforme o artigo 709.º, n.º1

CPC. Com isto quer dizer-se que o exequente pode deduzir num mesmo processo

uma pluralidade de pedidos executivos contra o devedor ou grupo litisconsortial

pretendendo que todos sejam contemporaneamente procedentes. Trata-se, pois, de

um regime especial de cumulação simples de execuções. A ausência de referência

legal à cumulação alternativa e à cumulação subsidiária, respetivamente, dos artigos

553.º e 554.º CPC, não permitirá concluir pela aplicabilidade dos respetivos regimes.

São soluções previstas somente no processo de declaração, como mostra a sua

localização sistemática e, sobretudo, a sua funcionalidade. Efetivamente, a

alternatividade é admitida no plano do objeto pelas obrigações alternativas, nos

termos do artigo 714.º CPC, sendo certo que uma mera alternativa processual, i.e.,

com ausência de alternatividade material, em que coubesse a escolha ao tribunal entre

duas execuções já seria ilegal. De igual modo, a procedência a que se refere o artigo

554.º CPC é declarativa e não do tipo executivo. Nesta teria de se admitir que só se

a execução não terminasse por pagamento se poderia executar outra dívida,

condicionamento ao pedido que imporia um ato adicional de manutenção da mesma

instância sem qualquer sensível economia processual. Deste modo, deve ser

liminarmente indeferido requerimento executivo em que o exequente pretenda

deduzir uma cumulação alternativa processual. Por outro lado, a admissão pelo

legislador no artigo 711.º CPC de que o designa por cumulação sucessiva torna

desnecessário que qualquer regime de cumulação subsidiária, ao permitir, enquanto

uma execução não for julgada extinta, que nesse mesmo processo, se promova

execução de outro título.

2. Pressupostos: tradicionalmente a cumulação simples na ação executiva pede

pressupostos de admissibilidade comuns à ação declarativa e especiais da execução.

Esses pressupostos estão enunciados no artigo 709.º, n.º1 CPC e nos artigos 186.º,

n.º2, alínea c) e 555.º, n.º1 CPC regendo qualquer que seja o tipo de título cumulado.

Mas, com a reforma de 2013, o legislador pretendeu restringir esses pressupostos à

cumulação de execuções fundadas títulos diferentes, em sede de artigo 709.º CPC,

por contraposição à cumulação de execuções fundadas apenas em sentença tratada

no artigo 710.º CPC. Vamos, então, ver como será este sistema dual.

a. Execução de títulos diferentes: na cumulação de execuções fundadas em

títulos diferentes – judiciais, quase judiciais ou extrajudiciais – constituem

pressupostos comuns à cumulação na ação declarativa:

i. A compatibilidade processual:

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1. Quanto à competência absoluta: é exigida no artigo 709.º,

n.º1, alínea a) CPC ao estabelecer como facto impeditivo a

incompetência absoluta do tribunal para algumas das

execuções. O tribunal concretamente competente quanto aos

critérios de competência relativa, máxime, em razão do

território, será determinado pela aplicação dos n.º2 a 4 do

mesmo artigo;

2. Quanto à forma do processo: exige-se, na alínea a) do n.º1 do

artigo 709.º CPC pois não pode a alguma das execuções

corresponder processo especial diferente do processo que

deva ser empregado quanto às outras, sem prejuízo do

disposto nos n.º2 e 3 do artigo 37.º CPC. Portanto,

ressalvam-se quer a admissibilidade de cumulação de

execuções comuns com execuções especiais ou várias

especiais em que a forma de processo que derive unicamente

do valor, quer o poder de adequação formal do juiz.

ii. A compatibilidade substantiva quanto aos seus efeitos: decorre das regras

gerais dos artigos 186.º, n.º2, alínea c) e 555.º, n.º1 CPC. Mas, uma

vez que não é admitida a cumulação de execuções com fins diversos

dir-se-ia, que nunca poderia um pedido executivo esvaziar o efeito

útil de outro pedido executivo, com ele cumulado. Além disso, um

pedido de execução para pagamento de quantia certa é sempre

compatível com outro da mesma finalidade: a (eventual) insuficiência

do património para pagar mais do que uma dívida não é em si mesma

uma incompatibilidade substantiva. No entanto, bem podem suceder

situações de incompatibilidade substantiva entre execuções,

nomeadamente, quando:

1. Se executem dois créditos de entrega de uma mesma coisa ou de coisas

diversas mas interdependentes;

2. Se execute um crédito de entrega incompatível com uma prestação de facto;

3. Se executem duas prestações de facto incompatíveis entre si.

É irrelevante se o título executivo é um só ou se se trata da execução

de vários títulos. Mas a reforma de 2013 veio acrescentar uma nova

alínea ao artigo 790.º, n.º1 CPC: a alínea d). Nela se encerra um

pressuposto relativo à cumulação da execução de decisão judicial:

4. Não pode ser cumulada a execução da decisão judicial que

corra nos próprios autos.

Compreende-se a restrição: se a sentença é executada nos próprios

autos da ação declarativa tal levantaria dificuldades perante a

execução dos demais títulos que têm a sua autonomia procedimental.

Ora, a regra é a do artigo 85.º, n.º1, combinado com o respetivo n.º2:

a sentença é executada nos próprios autos quando não haja juízo de

execução (secção especializada de execução).

iii. A identidade funcional entre as execuções: requerida na alínea b) do n.º1 do

artigo 709.º CPC pede que as execuções não possam ter fins

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diferentes, o mesmo é dizer, deve existir uma identidade abstrata

entre os objetos das prestações realizadas coativamente.

b. Execução de sentença: novidade importante da reforma de 2013 é o que

se passa a dispor no artigo 710.º CPC se o título executivo for uma sentença,

é permitido cumular a execução de todos os pedidos julgados procedentes.

Pretende-se, claramente, e cumprindo o princípio da economia processual,

permitir a execução cumulada de pedidos que, apesar de provirem da mesma

sentença, não a admitiriam em sede de artigo 709.º CPC. O exemplo

paradigmático era o da sentença de despejo: a execução da condenação do

locado não poderia ser cumulada com a execução da condenação no

pagamento de rendas em mora, de despesas ou indemnizações. Ora, este

novo regime na simplicidade do seu dispositivo – é permitido cumular – afasta

os pressupostos do artigo 710.º CPC. Portanto, admite-se a cumulação de

execuções com fins diversos e ainda que incompatíveis processualmente.

Esta última afirmação tem de ser moderada. O legislador como ratio presume

a compatibilidade processual entre as decisões contidas numa mesma

sentença. Mas, se isto não acontecer em concreto, o juiz terá de usar do

princípio da adequação formal (artigo 547.º CPC) como aliás já se garantia

por meio da remissão para o disposto nos n.º2 e 3 do artigo 37.º CPC. Mas

esse mesmo princípio tanto pode, pensamos, permitir ao juiz compor um

procedimento ad hoc, como recusar a cumulação quando tal viole o limite do

processo equitativo, agora expressamente afirmado no fim do artigo 547.º

CPC. Seja como for, o n.º4 do artigo 505.º CPC contém regras que procuram

harmonizar o procedimento de execução de pretensões executivas com

diferentes finalidades, em sede de execução de decisão judicial condenatória.

Ele dispõe o seguinte:

«Se o credor, conjuntamente com o pagamento de quantia certa ou com a

entrega de uma coisa, pretender a prestação de um facto, a citação prevista

no n.º2 do artigo 868 é realizada em conjunto com a notificação do executado

para deduzir oposição ao pagamento ou à entrega».

Em qualquer circunstância, não pode ser desconsiderada, mesmo nesta sede

de artigo 710.º CPC, a necessidade de compatibilidade substantiva entre os

efeitos das execuções. Trata-se de um pressuposto genérico de qualquer

objeto processual, como decorre dos já referidos artigos 186.º, n.º2, alínea c)

e 555.º, n.º1 CPC,

c. Cumulação supervenientes: o artigo 711.º CPC autoriza a cumulação

superveniente em execução pendente não extinta. O requisito específico será,

um, todavia: título diverso do inicial. É que a lei aponta para a cumulação de

outro título. Deve ser uma dívida que conste de um título ainda não dado à

execução. Portanto, não pode o credor executar dívida que já esteja

originariamente constituída ou reconhecida pelo título inicial. Por isso, o

artigo não se pode aplicar à cumulação de pedidos julgados procedentes

numa mesma sentença (artigo 710.º CPC). Naturalmente que não podem

existir nenhuma das circunstâncias que impedem a cumulação, mas dispensa-

se a exigência de conexão funcional quando a execução iniciada com vista à

entrega de coisa certa ou de prestação de facto haja sido convertida em

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execução para pagamento de quantia certa. Reserva-se, assim, espaço legal

para os artigos 867.º e 869.º CPC, nomeadamente.

3. Efeitos sobre a sequência processual: a figura da cumulação de execuções foi, na

reforma de 2003, objeto de uma supressão no n.º3 do artigo 53.º CPC antigo, na

referência que nele se fazia ao processo sumário em sede de cumulação da execução

de título judicial com título extrajudicial. Tendo em conta que a Reforma da ação

executiva de 2003 pôs termo ao processo sumário, dir-se-ia que aquela supressão

fizera todo o sentido. Paradoxalmente, pensamos que não. Recorde-se que o sentido

da norma era o de equilibrar os interesses e valores associados ao processo ordinário

e ao processo sumário:

a. Se, quanto à competência, prevalecia o tribunal do título judicial,

b. Quanto à forma, prevalecia a forma ordinária da execução do título

extrajudicial sobre a forma sumária da execução de sentença.

Por outras palavras, prevalecia a forma que garantia a citação prévia sobre a forma

que não garantia a citação prévia (cf. artigo 53.º CPC pretérito). A partir daqui já se

percebe que o problema se manteve após a reforma de 2003 e que só podia ser

resolvido como antes da pretensa unificação de formas processuais, com as devidas

adaptações, naturalmente. Assim, na cumulação da execução de título judicial com

título exrtrajudicial, não se aplicava o regime previsto no artigo 812.º-C anterior CPC.

Deveria prevalecer como até agora, o regime com mais garantias para o executado: o

regime regra da citação. Ora, em 2013, assiste-se ao regresso da dualidade de formas

de processo. Por isso, e justamente, o artigo 710.º, n.º5 CPC vem estabelecer que

quando ocorra cumulação de execuções que devam seguir forma de processo comum

distinta, a execução segue a forma ordinária. Regressa-se, pois, à solução de uma

década atrás e que sempre defenderamos.

Coligação: há coligação quando à pluralidade de partes corresponde uma pluralidade de

pedidos executivos subjetivamente diferenciados. Ou seja: quando ocorre cumulação de

pedidos com cumulação de partes, correspondendo a cada parte um pedido. Tal decorre da

presença de uma pluralidade de situações jurídicas autónomas, i.e., sem existência de

contitularidade, mas conexas entre si. Em suma: o que se poderia apelidar de mera apensação

de causas. Por isto, a coligação exige ao mesmo tempo os requisitos da cumulação (objetiva)

simples de pedidos que vimos a propósito do artigo 709.º CPC e os requisitos próprios de

conexão entre causa diversa. No regime da ação executiva esses requisitos estão vertidos no

artigo 56.º CPC. Logo o artigo 56.º, n.º1 CPC começa por remeter, justamente, para o artigo

709.º CPC: pode haver coligação quando não se verifiquem as circunstâncias impeditivas

previstas no n.º1 do artigo 710.º CPC. Portanto, impõem-se a compatibilidade processual, e,

residualmente, a compatibilidade substantiva. Mas logo de seguida o dito artigo acrescenta,

nos n.º1 e 2, um pressuposto específico de conexão entre os vários objetos processuais que

justifique a junção numa mesma causa de litígios diferentes. A saber:

1. A coligação ativa é sempre admissível (alíneas a ) e, 1.ªs partes) sejam credores

comuns, sejam privilegiados com garantias reais;

2. A coligação passiva:

a. Em geral é admissível:

i. Se os credores estiverem obrigados no mesmo título (alínea b), 2.ª parte);

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ii. Ainda que o não estejam, os devedores sejam titulares de quinhões no mesmo

património autónomo ou de direitos relativos ao mesmo bem indiviso, sobre os

quais se faça incidir a penhora (alínea c));

b. Em especial (e adicionalmente) para o pagamento de quantia certa, só

é admitida se a obrigação for líquida ou se, não o sendo, seja liquidável

por simples cálculo aritmético.

A exigência de unicidade de título é particularmente importante. É um requisito que,

paradoxalmente, pode não estar presente no litisconsórcio. Assim:

Já foi decidido que sendo executado A e B como mutuários de contrato de abertura de crédito e C

como avalista de livrança dada em garantia daqueles subscritores-mutuários, existirá litisconsórcio

voluntário passivo à luz do artigo 32.º, n.º1 CPC pelo que todos poderiam ser demandados apesar

da pluralidade de títulos.

Regime da pluralidade ilegal de execuções:

1. A falta de compatibilidade processual quanto à competência absoluta (artigo 709.º,

n.º1, alínea a) CPC) gera incompetência absoluta para o pedido respetivo e

indeferimento parcial do requerimento executivo.

2. A falta de compatibilidade quanto à forma de processo também leva ao

indeferimento liminar parcial, por erro na forma de processo quanto ao pedido.

3. A incompatibilidade substantiva é, como já sabemos, motivo de ineptidão da

petição inicial, nos termos dos artigos 186.º, n.º2, alínea c) CPC, não sanável. Todavia,

será de defender, por mais adequado ao princípio da prevalência funcional do litígio

sobre o processo, que se essa incompatibilidade substantiva for em sede de

cumulação sucessiva (artigo 711.º CPC), então apenas se deverá indeferir o novo

pedido executivo.

4. A falta de identidade funcional por força do artigo 709.º, n.º1, alínea b) CPC, assim

como a ausência de algum dos requisitos do artigo 56.º, n.º1 CPC (conexão adicional)

deve levar o tribunal a notificar o exequente para, ao abrigo do artigo 38.º CPC,

escolher a execução que pretende manter, sob pena de indeferimento de todas.

O conhecimento dos vícios e as eventuais diligências de sanação devem ter lugar no

momento liminar em despacho, conforme o artigo 726.º, n.º4 CPC, ou no momento

superveniente, nos termos do artigo 734.º CPC. Constituem exceções dilatórias que podem

ser de fundamento à oposição à execução pelo executado, ao abrigo do artigo 729.º, alínea

c), e seguintes CPC.

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PROCEDIMENTO DE EXECUÇÃO DE PAGAMENTO

DE QUANTIA CERTA

I – Fase Introdutória

A – Formas procedimentais

§26.º - Processo comum e processos especiais

Processo comum:

1. Pretensa unificação de formas na Reforma de 2003: o processo executivo comum

conhecia, até à Reforma,

a. A forma ordinária: garantia ao executado o exercício do direito de defesa

antes dos atos de apreensão de bens e logo após a citação e estava reservada

para a execução de título extrajudicial e de decisão judicial que carecesse de

liquidação incidental.

b. A forma sumária: a apreensão de bens tinha lugar no início do processo,

seguida de citação do executdo para eventual dedução de embargos de

executado e de oposição à penhora; além disso, o prazo para dedução

daqueles embargos era de 10 dias, e não de 20 dias como na forma ordinária.

A forma sumária estava reservada para a execução comum de decisão judicial

que não carecesse de ser liquidada em execução.

Com a reforma de 2003 estabeleceu-se que o processo comum de execução segue a

forma única. Em conformidade, foram retiradas as referências ao processo sumário

e ordinário, pois as relações de subsidiariedade entre as disposições reguladoras

passam a fazer-se entre o processo comum e os processos especiais. Era discutível o

real alcance desta vontade legislativa. Efetivamente, o que permite identificar uma

forma de processo é o modo como os interesses das partes são feitos valer e são

salvaguardados através do conteúdo, momento, prazo, admissibilidade e efeitos dos

atos processuais. Tendo isto em mente, pode dizer-se que continuaram no Código

velho a encontrar-se dois modelos diferentes quanto ao exercício do direito de defesa

na ação executiva: antes e depois da penhora, sujeitos a variantes internas. Na verdade,

a tramitação inicial do procedimento de execução para quantia certa continuou a

depender e a distinguir-se consoante houvesse ou não citação prévia do executado.

Ora, tal aspeto procedimental constitui precisamente o cerne da oposição entre a

forma ordinária e a forma sumária. A par disto, permaneceram dois efeitos distintos

quanto à oposição à execução – um não suspensivo e um suspensivo – e dois prazos

diferentes para a oposição à penhora. Unificação existiu, sim, quanto ao prazo para

a dedução da oposição à execução, que é sempre de 20 dias, seja a citação efetuada

antes ou depois da penhora, e o aumento significativo da extensão dos títulos

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executivos passíveis de execução sem citação prévia do executado – antes a sentença

e título judiciais impróprios, depois também os títulos extrajudiciais dentro da alçada

da Relação. Em conclusão: a Reforma de 2003 mais do que levar a cabo uma

unificação de formas de processo, procedeu a uma generalização de soluções do

processo sumário.

2. Retorno à divisão entre forma ordinária e forma sumária na Reforma de 2013:

com a reforma de 2013 assiste-se a uma clarificação externa das formas processuais

executivas. Regressam as formas ordinárias e sumária: o processo comum para

pagamento de quantia certa é ordinária é ordinário e sumário (artigo 550.º CPC). Ao

mesmo tempo, essa clarificação traz associada uma redistribuição das competências

de agente de execução, juiz e secretaria. Em especial, retorna o despacho liminar

judicial no rito ordinário; adicionalmente, o juiz passa a estar sempre presente nas

diligências preliminares de exigibilização, acertamento e liquidação da obrigação

exequenda. Em termos grosseiros, pode dizer-se que no novo Código a forma

ordinária é a forma do juiz e que a forma sumária é a forma do agente de execução.

Naquela há despacho liminar, nesta apenas provocadamente (pelo agente de

execução) há despacho liminar. Tal como antes de 2003, a diferenciação de formas é

apenas relativa à fase liminar do processo. Do momento da penhora em diante, há

apenas uma sequência processual, no essencial. A forma ordinária corresponde à

atual execução com citação prévia e constitui a forma-regra, regulada nos artigos

724.º e seguintes CPC. A forma sumária corresponde à atual execução com dispensa

de citação prévia, tendo lugar nos casos arrolados no artigo 550.º, n.º2 CPC e está

regulada nem especial nos artigos 855.º e seguintes CPC. Mas em certas situações

garante-se sempre a forma ordinária (alíneas do n.º3 do mesmo artigo 550.º CPC).

Impõem-se, porém, maiores reflexões sobre as sequências procedimentais que

concretamente daqui derivam.

3. Sequências procedimentais: Quadro global em sede de Código novo: em

termos sintéticos, o processo executivo comum para pagamento de quantia certa

continua a apresentar a estrutura que era a sua no Código de Processo Civil de 1939.

Essa estrutura assenta no tríptico nuclear

requerimento executivo – penhora – venda – pagamento

Dito por extenso: o procedimento executivo para pagamento de quantia certa implica

um impulso processual do credor, por ser um modo de tutela de direitos privados e

disponíveis e a satisfação do credor por um pagamento ou meios de semelhante

funcionalidade. No limite estes dois atos ou complexos de atos processuais bastariam

para a realização judicial da prestação se o pagamento fosse sempre voluntário, mas

dada a pretensão ser de realização coativa terá de ter lugar um momento de venda de

bens ou similar para, mediatamente, permitir o ulterior pagamento forçado.

Finalmente, a penhora justifica-se com a necessidade de assegurar a viabilidade

material e jurídica da venda executiva. Ela não teria justificação se os bens pudessem

em simultâneo ser indicados e vendidos o que não é possível pela natureza das coisas.

A dita estrutura de 1939 completa-se, depois, fazendo assentar sobre aquele tríptico

quer os atos de controlo oficioso, quer os atos de oposição contraditória, quer as

intervenções necessárias de terceiros. O resultado final é o seguinte:

a. Fase introdutória: compreendendo:

i. Petição executiva;

ii. Recebimento;

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iii. Apreciação judicial liminar (por vezes, eventual);

iv. Citação; e

v. Oposição (eventual);

b. Penhora: compreendendo,

i. Atos preparatórios;

ii. Atos de penhora;

iii. Notificação; e

iv. Oposição do executado ou de terceiro;

c. Intervenção de credores reclamantes e do cônjuge não executado;

d. Venda;

e. Pagamento.

Dir-se-ia que esta tramitação dificilmente pode ser simplificada pois todos os seus

atos são necessários à economia da execução. Mas pode, todavia. Esta sequência

conhece como variação interna mais importante a de a fase introdutória poder ser

contínua ou poder ser parcialmente diferida para o termo da penhora, que se irá

intercalar nela.

a. A marcha ordinária tem lugar nos casos em que há citação prévia: todos os

casos dos artigos 550.º, n.º3 CPC e todos os que não caibam no n.º2 do

mesmo artigo.

b. A marcha sumária tem lugar nos casos em que há:

i. Dispensa legal de citação prévia (i.e., todos os casos do artigo 550.º, n.º2

CPC); e

ii. Dispensa judicial de citação prévia (artigo 727.º CPC).

Portanto, na forma ordinária a fase introdutória apresenta contraditório prévio, na

forma sumária a fase introdutória apresenta antecipação da penhora e contraditório

diferido. Por outro lado, iremos ver que na execução de sentença o momento e os

termos de apresentação do requerimento executivo são especiais: nos próprios autos

(artigo 85.º, n.º1 CPC). Mas, em especial no Código novo, o quadro de sequências

procedimentais é mais complexo, do que o que resultaria da mera oposição entre

forma ordinária e forma sumária. É que além das formas de processo que decorrem

do artigo 550.º CPC acresce tanto a execução da sentença, como de título extrajudicial

de obrigação vencida de valor não superior ao dobro da alçada de 1.ª instância

conhecem especialidades procedimentais. Elas acham-se em sede de artigo 626.º e

855.º, n.º5 CPC, respetivamente. Antecipando o que iremos repetir nessas sedes,

pode dizer-se que:

a. A execução de sentença para:

i. Pagamento de quantia certa: ocorre na forma sumária nos termos

dos:

1. Artigo 550.º, n.º2, alínea a) CPC se não dever ser executada no

próprio processo; e

2. Artigo 626.º, n.º2 CPC se dever ser executada no próprio

processo, salvo os casos que caiam no artigo 550.º, n.º3 CPC.

ii. Entrega de coisa certa: corre em forma única ex vi artigos 550.º,

n.º4 e 626.º, n.º1 CPC, i.e., com admissão pela secretaria e despacho

liminar, mas com dispensa de citação prévia à entrega (artigo 626.º,

n.º3 CPC).

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iii. Prestação de facto: corre em forma única ex vi artigos 550.º, n.º4 e

626.º, n.º1 CPC, i.e., com admissão pela secretaria, despacho liminar

e citação prévia (artigo 626.º, n.º3 CPC);

iv. Entrega cumulada de quantia certa/entrega de uma coisa e

prestação de facto: corre na forma sumária adaptada nos termos do

artigo 626.º, n.º3 CPC.

b. A execução de decisão arbitral para pagamento de quantia certa: corre

na forma sumária, nos termos do artigos 55.º, n.º2, alínea a) CPC, salvo os

casos que caiam no artigo 550.º, n.º3 CPC.

c. A execução de requerimento de injunção: corre na forma sumária, nos

termos do artigo 550.º, n.º2, alínea b) CPC, salvo os casos que caiam no artigo

550.º, n.º3 CPC.

d. A execução de título extrajudicial de obrigação vencida garantida por

hipoteca ou penhor: corre na forma sumária, nos termos do artigo 550.º,

n.º2, alínea c) CPC salvo os caso que caiam no artigo 550.º, n.º3 CPC.

e. A execução de título extrajudicial de obrigação vencida de valor não

superior ao dobro da alçada de 1.ª instância:

i. Corre na forma sumária, nos termos dos artigos 550.º, n.º2, alínea d)

CPC, salvos os casos que caiam no artigo 550.º, n.º3 CPC.

ii. Sem prejuízo dos casos que caiam no artigo 550.º, n.º3 CPC, corre

numa forma sumária limitada, prevista no artigo 855.º, n.º5 CPC, em

que depois de admissão pelo agente de execução (artigo 855.º CPC),

há despacho liminar (artigo 726.º CPC) e citação prévia, no caso de

ser necessária a penhora de:

1. bens imóveis;

2. estabelecimento comercial;

3. direito real menor que sobre eles incida; ou

4. quinhão em património que os inclua.

f. A execução de titulo extrajudicial de obrigação vencida de valor

superior ao dobro da alçada de 1.ª instância: corre na forma ordinária,

nos termos dos artigos 550.º, n.º1 CPC.

g. A execução de título extrajudicial para entrega de coisa certa: corre na

forma única, ex vi artigo 550.º, n.º1 CPC.

h. A execução de título extrajudicial para prestação de facto: corre na

forma única, ex vi artigo 550.º, n.º1 CPC.

Em qualquer dos casos de execução para pagamento de quantia certa com citação

prévia, i.e., do n.º1 a contrario do artigo 550.º CPC, do n.º3 do artigo 550.º CPC e do

n.º5 do artigo 855.º CPC, pode haver lugar a despacho liminar, sem citação prévia,

por requerimento ao juiz nas condições do artigo 727.º CPC. Consumados estes

passos processuais, passa-se às fases seguintes de intervenção de credores

reclamantes e do cônjuge não executado, venda e pagamento.

4. Disposições aplicáveis: a execução para pagamento de quantia certa na forma

ordinária, segue os artigos 724.º e seguintes CPC. A forma sumária traduz-se em

várias especialidades previstas nos artigos 855.º e seguintes CPC, mas aplicam-se-lhe

se subsidiariamente as disposições do processo ordinário, ex vi artigo 551.º, n.º4 CPC.

Em qualquer caso, aplicam-se ainda as disposições gerais do processo de execução

dos artigos 712.º a 723.º CPC e as disposições reguladoras do processo de declaração

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que se mostrem compatíveis com a natureza da ação executiva, segundo o artigo

551.º, n.º1 CPC. Esta última ressalva não pode ser menosprezada e dá real significado

à função de princípios que apontámos atrás a vários enunciados. Estes conduzirão a

que algumas soluções declarativas não se possam aplicar à execução.

Processos especiais:

1. Generalidades: ao lado do processo executivo comum, vários processos e

procedimentos executivos podem ser qualificados como especiais, porquanto apenas

se aplicam em razão do crédito exequendo. Esta especialidade material justifica

especialidades no plano da marcha e dos atos do processo. Seguindo de próximo a

arrumação de Lebre de Freitas, elas podem ser classificados em:

a. Processos executivos especiais stricto sensu: existindo até ao início dos

anos 2000, eram:

i. A execução sumária simplificada do Decreto-Lei n.º 274/97, 8

outubro (já revogado), que trazia a vantagem de, moldada sobre a

estrutura do processo sumário, suprimir, a título eventual, a fase de

reclamação de créditos, desde que o exequente nomeasse à penhora

apenas bens móveis;

ii. A execução por alimentos (artigos 956.º a 960.º CPC atual);

iii. Correndo ainda nos tribunais comuns, mas já não tendo por objeto a

execução de uma obrigação de Direito Privado, a execução por custas

judiciais, atualmente regulado nos termos dos artigos 35.º e 36.º

Regulamento Custas Processuais.

b. Processos mistos: compostos de fase declarativa e de fase executiva eram:

i. A venda e adjudicação do penhor;

ii. A posse ou entrega judicial;

iii. A execução de mandato de despejo de prédio urbano;

iv. Certas providências cautelares, quando impliquem atos

materiais:

Destes, restaram os dois últimos a que se pode acrescentar o Procedimento

especial de despejo, regulado nos artigos 15.º e seguintes NRAU/2012.

c. Atos executivos avulsos: em processos declarativos, podemos encontra-los

em vários preceitos normativos:

i. Artigo 929.º, n.º2 CPC;

ii. Artigo 939.º, n.º2 e 4 CPC;

iii. Artigo 1046.º CPC.

Às execuções especiais aplicam-se subsidiariamente as normas do processo comum,

conforme o n.º2 do artigo 466.º CPC («as normas de processo ordinário»), segundo o artigo

551.º, n.º4 CPC.

Em havido uma tendência para a sua redução, o que redunda em desconsideração da

necessidade de tutela jurisdicional diferenciada.

2. Remissão: a execução por alimentos e a execução por custa, a execução para entrega

de coisa imóveis serão tratadas adiante.

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B – Forma ordinária (citação prévia à penhora)

I – Impulso processual

§27.º - Ato de impulso (Requerimento Executivo)

Conteúdo: o requerimento executivo é o ato pelo qual o credor dá o impulso processual de

arranque da ação executiva, numa clara expressão do princípio do dispositivo que é

característico do processo civil. Antes da Reforma de 2003, o conteúdo do requerimento

executivo era decalcado do modelo da petição inicial. Em 2003, criaram-se disposições

complementares e, em 2008, fixou-se o conteúdo do requerimento executivo de modo

completo e sem remissões para outros lugares normativos. Com a Reforma de 2013, o artigo

724.º CPC vem concentrar e simplificar os preceitos anteriores, reforçar as garantias do

executado no n.º5 e introduzir uma remissão para o regime da petição inicial (artigo 552.º,

n.º5 e 6 CPC), quanto ao apoio judiciário. É ocioso procurar arrumar internamente o

conteúdo do requerimento executivo à imagem e semelhança da petição inicial (artigo 553.º

CPC). Não só a narração dos factos e das razões de Direito tem uma menor importância

como, sobretudo, a sua estrutura é modular, através do formulário eletrónico ou modelo em

papel legalmente impostos pelos artigos 2.º e 3.º Portaria n.º282/2013, 29 agosto, e respetivo

anexo I. Por isto, a análise do artigo 724.º CPC deve passar por uma arrumação do seu

conteúdo por três funções:

1. Configuração objetiva da instância: inclui, sempre, os seguintes elementos

comuns a qualquer execução:

a. Identificação do tribunal (corpo do n.º1);

b. Identificação das partes (alínea a)), indicando os seus nomes,

domicílios ou sedes, número de identificação fiscal e, sempre que

possível, profissões, locais de trabalho, filiação e números de

identificação civil;

c. Indicação do domicílio profissional do mandatário judicial (alínea b)).

2. Configuração subjetiva da instância: apresenta:

a. Elementos comuns:

i. Indicação do fim da execução (alínea d));

ii. Formulação do pedido (alínea f));

iii. Indicação do valor da causa (alínea g)).

b. Elementos eventuais: são:

i. Quanto à pretensão executiva:

1. Exposição sucinta dos factos que fundam o pedido, quando os mesmos

não constem do título executivo (alínea e));

2. Alegação dos factos que fundamentam a comunicabilidade da dívida

constante de título assinado apenas por um dos cônjuges (artigo 724.º,

n.º1 CPC);

3. Liquidação por simples cálculo aritmético ou incidente de liquidação

(alínea h));

4. Escolha da prestação, quando cabia ao credor (alínea h));

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5. Alegação da verificação da condição suspensiva, da realização ou do

oferecimento da prestação de que depende a exigibilidade do crédito

exequendo, indicados ou juntando os meios de prova (alínea h), 2.ª parte,

no artigo 724.º, n.º1 CPC).

ii. Quanto à relação processual:

1. Designação do agente de execução, nos termos do artigo 720.º, n.º1 CPC,

ou requerimento de realização das diligências executivas por oficial de

justiça (alínea c), 2.ª parte do artigo 724.º, n.º1 CPC);

2. Pedido de dispensa de citação prévia (artigo 727.º CPC);

3. Pedido de citação prévia (para o anterior regime – revogado no atual).

3. Preparação da penhora e pagamento: é sempre eventual e faz-se, ante de mais,

pela indicação de bens à penhora descriminados e identificados sempre que possível

e na medida do que for possível. No nº.5 do 810.º (e ainda na alínea i) do n.º1) CPC

anterior enunciava-se quais seriam esses elementos identificativos, enquanto no novo

regime temos de considerar o artigo 724.º, n.1º, alíneas i) e k), 2 e 3 CPC atual. Uns

e outros serão analisados mais adiante, quando for tratada a matéria da indicação de

bens pelo executado. Por fim, com natureza eventual e preparando o pagamento,

poderá ainda o exequente indicar um número de identificação bancária, ou outro

número equivalente, para efeito de pagamento dos valores que lhe sejam devidos,

nos termos da alínea k) do n.º1 do artigo 724.º CPC.

Por outro lado, há nele elementos comuns a qualquer execução e elementos eventuais:

1. Os elementos comuns são também elementos obrigatórios, pois a sua falta implica

a recusa de recebimento do requerimento, pela secretaria ou agora pelo agente de

execução (artigo 725.º, n.º1, alínea b) e d) CPC).

2. Os demais elementos eventuais determinam essa recusa: a falta de exposição

sucinta dos factos que fundam o pedido, quando os mesmos não constem do título

executivo, a falta de liquidação por simples cálculo aritmético ou para incidente de

liquidação, a falta de escolha da prestação pelo credor ou de alegação da condição

suspensiva e a falta de indicação do número de identificação bancária (artigo 725.º,

n.º1, alínea d) CPC). Os demais elementos eventuais são opcionais – a indicação de

bens à penhora, a designação do agente de execução, o pedido de dispensa de citação

prévia (ou da sua realização, no Código Velho) e a alegação da comunicabilidade da

dívida.

Formalidades: decorre do n.º9 do artigo 810.º e dos artigos 712.º, n.º2 e 725.º, n.º1 CPC e

das remissões que neles se acha que a pretensão executiva deve ser deduzida em modelo e

nos termos fixados em Portaria. Essa Portaria é a n.º282/2013, 29 agosto. Nela prevê-se o

uso de um de dois modelos de requerimento executivo:

1. O formulário para a apresentação por transmissão eletrónica de dados; e

2. O modelo para a apresentação em suporte de papel.

Em ambas as opções o modelo de requerimento executivo tem a estrutura de uma grelha

modular distribuída por capa ou campo, cabeçalho e anexos. Cada categoria de informação

ou de pedido consta de um anexo próprio, sucessivamente subdividido em quadros e campos.

Esta solução, embora implique alguma rigidez formal, tem o mérito de impor maior secura

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de expressão aos mandatários judiciais, mas pode colocar constrangimentos ao exercício do

direito de ação. O requerimento executivo deve ser redigido em língua portuguesa (artigos

133.º, n.º1 e 474.º, alínea h) CPC – este a título subsidiário) e assinado pela parte ou pelo

mandatário judicial (artigo 558.º, alínea e) CPC a título subsidiário). No momento da

apresentação do requerimento por via eletrónica o mandatário aporá uma assinatura digital

através de certificado de assinatura eletrónica que garanta de forma permanente a sua

qualidade profissional (Portaria n.º28072013, 26 agosto). Por outro lado, o n.º4 do artigo

724.º CPC impõe que acompanhem o requerimento executivo alguns documentos ou

elementos informativos, sendo certo que, quando o requerimento é enviado por via

eletrónica, esse acompanhamento consistirá em anexos eletrónicos. Esses documentos são:

1. Cópia ou original do título executivo quando o requerimento é entregue por via

eletrónica ou em papel, respetivamente (artigo 724.º, n.º4 CPC);

2. Documentos ou elementos relativos a bens indicados à penhora que o

requerente disponha (artigo 724.º, n.º2 e 4, alínea b CPC), entre eles, o documento

comprovativo de pagamento da taxa de justiça inicial ou da concessão do benefício

de apoio judiciário, nos termos do artigo 145.º CPC (n.º4 do artigo 724.º CPC).

Por outro lado, o novo artigo 724.º, n.º5 CPC, determina que quando a execução se funde

em título de crédito e o requerimento executivo tiver sido entregue por via eletrónica, o

exequente deve sempre o original para o tribunal, dentro dos 10 dias subsequentes à

distribuição; na falta de envio, o juiz, oficiosamente ou a requerimento do executado,

determina a notificação do exequente para, em 10 dias, proceder a esse envio, sob pena de

extinção da execução.

Apresentação:

1. Por transmissão eletróncia de dados: em matéria de suporte do requerimento

executivo, o artigo 2.º e 3.º Portaria n.º282/2013, 29 agosto, dita que o requerimento

executivo pode ser apresentado por transmissão eletrónica de dados ou em suporte

de papel, no tribunal competente. No Código Velho valia a regra geral da

apresentação preferencial a juízo por transmissão eletrónica de dados, nos termos da

Portaria n.º114/2008. Era certo que, o artigo 810.º, n.º10 e 11 CPC anterior e o artigo

3.º Portaria n.º331-B/2009, 30 março, determinavam que a parte com mandatário

que usasse suporte de papel, apesar de obrigada à entrega do requerimento executivo

por via eletrónica, teria de pagar de imediato de uma multa, no valor de metade de

uma Unidade de Conta, salvo alegação e prova de justo impedimento. Mas, se

conjugássemos a previsão da cominação de multa com a dedução que o requerimento

apresentado em suporte de papel pelo mandatário afinal não podia ser recusado pelo

agente de execução já que ele obedecia a modelo aprovado. A alegação de justo

impedimento servia assim não para evitar a recusa do requerimento executivo, mas

para evitar a condenação em multa. Daqui resultava que em qualquer ação, com ou

sem mandatário constituído, o requerimento executivo podia ser entregue em

formato digital através da transmissão eletrónica de dados, mas também podia ser

entregue em formato de papel. O uso de papel tenderia a encarecer a ação, seja por

via da multa, seja, em qualquer caso, pela via das custas. Com a reforma de 2013, a

regra passou a constar no artigo 144.º, n.º1 CPC com uma diferença: a apresentação

a juízo por transmissão eletrónica de dados passou a ser a via normal e não a via

preferêncial. Por outro lado, lê-se no artigo 712.º, n.º1 CPC que a tramitação dos

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processos executivos é em regra, efetuada eletronicamente, nos termos, aliás, gerais

do artigo 132.º CPC. Tal também está implícito no artigo 2.º, n.º1 Portaria

n.º282/2013, 29 agosto, quando à apresentação do requerimento executivo. Ademais,

não esqueça ainda o teor do artigo 144.º, n.º7 CPC

«sempre que se trate de causa que não importe a constituição de mandatário, e a parte

não esteja patrocinada, os atos processuais (…) também podem ser apresentados a

juízo por uma das (…) formas»

não eletrónicas arroladas no mesmo número. Justamente, o artigo 3.º, n.º1 Portaria

n.º282/2013, 29 agosto, vem admitir a apresentação do requerimento executivo em

suporte de papel quando a parte não esteja representada por mandatário judicial, ou,

estando, haja justo impedimento para a prática do ato. O exequente ao usar da via

eletrónica pode fazê-lo em qualquer dia e independentemente da hora da abertura e

encerramento dos tribunais, ao abrigo do artigo 137.º, n.º4 CPC. O exequente está

dispensado de remeter os originais dos documentos que acompanham o

requerimento executivo (artigo 144.º, n.º3 CPC). Estes documentos eletrónicos

ficarão com o valor probatório dos originais, nos termos definidos para as certidões,

conforme o n.º4 do artigo 144.º CPC (cf. artigo 383.º CC). Por isso, nos termos do

artigo 385.º CC a contraparte e, bem assim, o tribunal podem invalidar ou modificar

a respetiva força probatória pelo confronto com o original ou com a certidão,

podendo exigir que o confronte seja feito na sua presença. E, efetivamente, o n.º5 do

artigo 144.º CPC enuncia um dever de exibição das peças processuais em suporte de

papel e dos originais dos documentos juntos pelas partes por meio de transmissão

eletrónica de dados, sempre que o juiz o determine, nos termos da lei de processo.

De igual modo, o exequente está dispensado de produzir duplicados do requerimento

executivo e de fazer cópias dos documentos se fizer uso do CITIUS (artigo 148.º,

n.º6 CPC). Quando seja necessário duplicado ou cópia de qualquer peça processual

ou documento, a secretaria extrai exemplares dos mesmos, designadamente para

efeitos de citação ou notificação das partes, exceto nos casos em que estas se possam

efetuar por meios eletrónicos (artigo 148.º, n.º7 CPC).

2. Em suporte de papel: de suporte alternativo até 2013, após a reforma de 2013, o

artigo 144.º, n.º7 CPC restringe o uso da apresentação em suporte de papel à causa

que não importe a constituição de mandatário, e aparte não esteja patrocinada.

Excecionalmente, admite o artigo 144º, n.º8 CPC o recurso a esta via pela parte

patrocinada por mandatário se houver justo impedimento para a prática dos atos

processuais, in casu, de apresentação do requerimento executivo. É por isto que, como

se notou já, também o artigo 3.º, n.º1 Portaria n.º282/2013, 29 agosto, permite a

apresentação do requerimento executivo em suporte de papel quando a parte não

esteja representada por mandatário judicial, ou, estando, haja justo impedimento para

a prática do ato. O requerimento executivo em suporte de papel pode ser entregue

diretamente na secretaria do tribunal ou por remessa postal ou através de telecópia,

conforme o n.º2 do artigo 144.º CPC. Nas duas primeiras vias o requerimento fica

sujeito aos horários das secretarias, mas no caso do uso da telecópia o exequente

pode enviar o requerimento executivo em qualquer dia e independentemente da hora

da abertura e do encerramento dos tribunais (artigo 137.º, n.º4 CPC). O uso da via

em suporte de papel chama a si a regimes dos n.º1 a 5 do artigo 148.º e artigo 146.º,

n.º6 CPC. Assim, o requerimento executivo deverá ser apresentado em duplicado e

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quando seja oposto a mais de uma pessoa, oferecer-se-ão tantos duplicados quantos

forem os interessados que vivam em economia separada, salvo se forem

representados pelo mesmo mandatário (artigo 152.º, n.º1 CPC). No entanto, esta

exigência está, no novo Código, restringida às causas sem mandatário constituído,

conforme o disposto no artigo 148.º, n.º1 CPC. Por outro lado, os documentos

apresentados devem ser igualmente acompanhados de tantas cópias, em papel

comum, quantos os duplicados do requerimento executivo (artigo 148.º, nº2, 1.ª parte

CPC). Quando razões especiais o justifiquem, o juiz pode dispensar a apresentação

das cópias ou marcar um prazo suplementar para a sua apresentação (artigo 148.º,

n.º4 CPC). Manda o artigo 148.º, n.º3 CPC que se o exequente não fizer entrega de

qualquer dos duplicados e cópias, é notificado oficiosamente pela secretaria para os

apresentar no prazo de dois dias, pagando de multa a quantia fixada na alínea a) do

n.º5 do artigo 139.º CPC. Não o fazendo, é extraída certidão dos elementos em falta,

pagando a parte, além do respetivo custo, a multa mais elevada prevista no n.º5 do

artigo 139.º CPC. As cópias serão entregues ao executado com a citação (artigo 148.º,

n.º2 CPC). Em qualquer caso, constitui dever das partes representadas por

mandatário facultarem ao tribunal, sempre que o juiz o solicite, um ficheiro

informático contendo as peças processuais escritas apresentadas pela parte em

suporte de papel (artigo 148.º, n.º5 CRP; ainda a Portaria n.º280/2013, 26 agosto).

No entanto, a própria secretaria fica com a obrigação de digitalizar o requerimento

executivo e os documentos apresentados em suporte de papel. No Código Novo esse

dever é residual:

«Quando seja necessário duplicado ou cópia de qualquer peça processual ou documento

apresentado por transmissão eletrónica de dados, a secretaria extrai exemplares dos

mesmos, designadamente para efeitos de citação ou notificação das partes, exceto nos

casos em suporte de papel são digitalizados pela secretaria judicial, que estas se possam

efetuar por meios eletrónicos, nos termos definidos na lei e na portaria prevista no n.º1

do artigo 132.º»,

lê-se no artigo 144.º, n.º6 CPC. Esta passará a ser a nova Portaria n.º 280/2013, 26

agosto.

3. Justo impedimento: dada a preferência legal pelo uso da via eletrónica, cabe

perguntar se uma falha no seu funcionamento constitui, precisamente, um justo

impedimento aplicável na entrega do requerimento executivo por via digital. E isto

tanto quanto à data de entrega, quanto ao não uso da via informática e sujeição à

multa, em sede do Código Velho. Uma primeira resposta, simples, poderia ser em

sentido negativo, com o fundamento de que o envio pode ser feito em qualquer

computador, desde que o utilizador esteja registado no CITIUS. Importa, porém, ser

razoável nesta questão e aplicar a este novo problema as regras e a jurisprudência

anteriores. Uma falha informática pode ser considerada uma situação de justo

impedimento nos termos do artigo 140.º, n.º1 CRP/2013, verificados os seguintes

requisitos:

a. Ser um problema técnico não imputável à parte, seus representantes

ou mandatários, ou seja, que decorra de razões justificadas ou desculpáveis

que não envolvam culpa ou negligência séria daqueles;

b. Obste à prática atempada do ato, mesmo que não em termos absolutos,

num quadro de adequada atuação diligente do sujeito. Quanto a este deve-se

seguir a jurisprudência já existente em matéria de telecópia. Saliente-se a do

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Ac. RLx 17 outubro 1996, que decidiu que os acidentes e deficiências que

ocorram na transmissão ou receção da telecópia podem e devem ser alegados

e comprovados através do respetivo incidente processual, podendo caber na

figura de justo impedimento quando independentes da vontade das pessoas

que utilizem aqueles meios ou quando fruto de erro totalmente desculpável.

A esta luz, constitui justo impedimento uma aparência de envio que iluda o

mandatário judicial e que este só posteriormente venha a apurar: nesse caso,

o sujeito não sabia, nem tinha de saber, da falta de envio. Ainda será justo

impedimento um congestionamento no tráfego eletrónico dos canais do

sistema judiciário que leve o mandatário a optar pela entrega em mão do

requerimento executivo: não deve o particular ser castigado pelo mau

funcionamento dos serviços do Estado. Ao contrário, já não constitui justo

impedimento uma falta de envio por razões técnicas quando pudesse, num

quadro de diligência adequada, ter sido suprida pelo uso de outro

computador. Naturalmente que, nos termos do n.º2 do artigo 140.º

CRP/2013, o exequente terá o ónus de alegar o justo impedimento de envio

do requerimento executivo pelo sistema CITIUS em requerimento

autónomo, com a imediata prova, no próprio momento de entrega do

suporte de papel na secretaria. A prova poderá ser um relatório do fornecedor

de acesso (ISP) ou dos serviços responsáveis pelo CITIUS, consoante a falha

seja de uns ou de outros. O mesmo n.º2 impõe a audição de parte contrária.

É bom de ver que este preceito deve ser interpretado restritivamente para os

procedimentos inaudita parte, i.e., no caso, a execução em que haja dispensa

de citação prévia, máxime, na forma sumária. Já vimos que, havendo justo

impedimento, o artigo 144.º, n.º8 CPC autoriza a apresentação do

requerimento em suporte de papel, se tal for a vontade do mandatário. O

regime do justo impedimento também vale, por interpretação, para o ato

processual de terceiro, como, por exemplo, o exercício do direito de remição

(artigo 842.º CPC).

4. Data da apresentação do requerimento executivo: o requerimento executivo é

processual e materialmente eficaz na data da sua apresentação. Ora, até à Reforma

de 2013 regiam as regras gerais do artigo 150.º, n.º1 e 2, correspondentes às regras

do artigo 144.º, n.º1 e 7 CPC atual. Por isso, o requerimento apresentado por via

eletrónica considerava-se apresentado na data da expedição eletrónica, por força do

artigo 150.º, n.º1, in fine Código antigo, artigo 144.º, n.º1, in fine CPC atual. Se

apresentado em suporte de papel o requerimento executivo considerava-se

apresentado nas datas resultantes do regime definido pelas alíneas do n.º2 do artigo

150.º CPC anterior, atual artigo 144.º, n.º7 CPC: a data da entrega direta na secretaria

judicial, data da efetivação do registo postal ou data da expedição da telecópia. O

Código de Processo Civil reformado traz um conjunto de alterações de duvidosa

constitucionalidade, ante o artigo 20.º, n.º1 CRP. Efetivamente, o novo artigo 724º,

n.º6 CPC vem enunciar que o requerimento executivo só se considera apresentado:

a. Na data do pagamento da quantia inicialmente devida ao agente de execução,

a título de honorários e despesas, a realizar nos termos definidos por portaria

do membro do Governo responsável pela área da justiça ou da comprovação

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Página 127 页

da concessão do benefício de apoio judiciário, na modalidade de atribuição

de agente de execução;

b. Quando aplicável, na data do pagamento da retribuição prevista no n.º8 do

artigo 749.º, nos casos em que este ocorra após a primeira data.

São aplicáveis os n.º5 e 6 do artigo 552.º CPC, adaptados: sendo requerida citação

urgente e faltando à data de apresentação do requerimento executivo, menos de cinco

dias para o termo do prazo de caducidade ou ocorrendo outra razão de urgência,

deve o exequente apresentar documento comprovativo do pedido de apoio judiciário

se este estiver pendente.

Custas, despesas e apoio judiciário: o credor interessado em obter pela via judicial o

seu crédito terá de ter em conta que tem um preço, correspondente ao pagamento,

frequentemente antecipado, da produção dos atos de execução. Esse preço engloba as custas

judiciais e as despesas com o solicitador de execução. O credor terá, assim, de ponderar e

gerir a relação custo-benefício da execução, fazendo nomeadamente uma prognose do custo

da atuação do agente de execução versus a probabilidade de sucesso em tempo útil da

execução. Manifestamente, bem pode o credor concluir que a cobrança de uma dívida sai

mais cara que a sua estrita liquidação. Quanto às custas importa dizer que o valor de taxa de

justiça inicial vai depender do valor da ação e, ainda, de o agente de execução ser ou não

oficial de justiça, nos termos do artigo 7.º, n.º4, Tabela II RCP. Em qualquer caso, se o

exequente entregar o requerimento executivo através dos meios eletrónicos disponíveis, a

taxa de justiça é reduzida a 90% do seu valor, graças ao disposto no artigo 6.º, n.º3 RCP, á

referido. A taxa deve ser paga antes do envio do articulado, devendo ser junto o documento

comprovativo do seu prévio pagamento ou da concessão do benefício do apoio judiciário,

salvo se neste último caso aquele documento já se encontrar junto aos autos (artigo 145.º,

n.º1 CPC). Quando o ato processual seja praticado por transmissão eletrónica de dados, o

prévio pagamento da taxa de justiça ou a concessão do benefício do apoio judiciário são

comprovados nos termos definidos nos artigos 5.º, n.º1, alínea b) e 8.º, n.º1 Portaria

n.º114/2008, 6 fevereiro (e a nova Portaria n.º280/2013, 26 agosto, que veio revogar aquela),

sem prejuízo dos casos de impossibilidade técnica previstos no artigo 10.º, n.º2 (artigo 8.º

dessa Portaria). A falta de junção do documento comprovativo do pagamento de taxa de

justiça implica a recusa de recebimento do requerimento executivo (artigos 725.º, n.º1, alínea

e) CPC, conjugado com o artigo 724.º, n.º4, alínea c) CPC). A junção de documento

comprovativo de valor inferior ao devido nos termos do Regulamento das Custas

Processuais, equivale à falta de junção, devendo o mesmo ser devolvido ao apresentante

(artigo 145.º, n.º2 CPC). O exequente pode socorrer-se da Lei n.º 24/2004, 29 julho, para

obter apoio judiciário tanto para o pagamento da taxa de justiça, como para o pagamento de

honorários ao agente de execução, conforme as várias modalidades previstas no artigo 16.º,

n.º1, alíneas a), c) e d) do mesmo diploma. Segundo o artigo 18.º, n.º2 da mesma lei o apoio

judiciário deve ser requerido antes da apresentação do requerimento executivo, salvo se a

situação de insuficiência económica for superveniente ou se, em virtude do decurso do

processo, ocorrer um encargo excecional. Nestes casos interrompe-se o prazo para

pagamento da taxa de justiça e demais encargos com o processo até à decisão definitiva do

pedido de apoio judiciário, aplicando-se o disposto nos n.º4 e 5 do artigo 24.º Lei.

Especialidades da apresentação de requerimento de execução de sentença:

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1. Introdução pela Reforma de 2008: o artigo 675.º-A: a reforma de 2008/2007

trouxe a novidade do artigo 675.º-A (regulamentado no artigo 48.º, n.º1 e 2 Portaria

n.º331-B/2009, 30 março) pela qual se veio permitir ao credor, ainda na pendência

de ação de condenação onde se irá produzir sentença contra o devedor, antecipar a

apresentação do requerimento executivo não apenas para antes do seu trânsito em

julgado, como já decorreria, em certas circunstâncias do artigo 47.º, n.º1, mas mesmo

antes da prolação. Assim, o autor pode na própria petição inicial ou em qualquer

momento do processo declarativo, pelos meios eletrónico definidos na Portaria n.º

114/2008, 6 fevereiro, e, desde 1 setembro 2013, na nova Portaria n.º280/2013, 26

agosto:

a. Requerer condicionalmente a execução judicial da sentença que venha

a condenar o réu ao pagamento de uma quantia certa, i.e., em relação

à respetiva obrigação;

b. Indicar o agente de execução; e

c. Indicar bem à penhora, nos termos dos n.º5 a 7 do artigo 810.º,

d. Condicionar, querendo, a execução da sentença a um prazo dilatório

de 20 dias após o trânsito em julgado da sentença, possibilitando ao

réu cumprir a obrigação.

Dificilmente este regime teria utilidade, dado que o funcionamento de uma boa

presunção natural permitirá concluir que o réu uma vez avisado irá dispor dos seus

bens. A impugnação pauliana não sai daqui mais forte do que antes e tampouco o

arresto. Em todo o caso, este regime não deixava de causar várias perplexidades e

dúvidas. Antes de mais, não estava claro como deve o exequente proceder se quiser

cumular um pedido de juros, mas parece que ele terá de ser indicado como juros

vincendos, nos termos comuns do artigo 805.º, n.º2. Por outro lado, parece que o

réu não era ouvido sobre o pedido, dado este ser condicional. Ainda o prazo dilatório

de 20 dias era, na mente legislativa, mais vantajoso do que a solução comum de

trânsito imediato e sucessiva dedução de um requerimento executivo, porquanto o

autor já teria pronto o arranque da execução. Naturalmente que se pressupunha que

a sentença transite em julgado, mas se ela apenas for exequível provisoriamente, ao

abrigo do artigo 47.º, n.º1, parece que se poderia à mesma avançar. Finalmente, não

podia deixar de entender-se que esta apresentação antecipada seria revogável nos

termos gerais dos atos processuais, ou seja, mediante desistência da instância

respetiva, que não da pretensão executiva, carecendo de aceitação do opoente, sendo

o caso (artigo 918.º, n.º2). Logo após o trânsito em julgado da sentença ou, nos casos

em que o autor o declare, 20 dias após o trânsito em julgado da sentença, a secretaria

da causa declarativa verificava oficiosamente se a sentença condenou o réu no

pagamento de uma quantia certa e se o autor pagou a taxa de justiça correspondente

ao valor da quantia pecuniária líquida a que o réu foi condenado. Verificados esses

requisitos a execução iniciar-se-ia, por apenso – salvo se houvesse juízo de execução

caso em que o traslado é enviado a este – e de forma eletrónica, mediante envio pela

secretaria ao agente de execução designado dos requerimentos do autor e da cópia

eletrónica ao agente de execução designado dos requerimentos do autor e da cópia

eletrónica da sentença (artigo 48.º Portaria n.º331-B/2008, 30 março). Depois deste

envio, se o réu cumprisse a sentença nos prazo de 20 dias após o trânsito em julgado,

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o autor comunicava esse facto ao tribunal no prazo de cinco dias, exclusivamente

por meios eletrónicos e, de duas uma:

a. Se a instância executiva não começara, não teria início;

b. Se a instância executiva já começara extinguia-se imediatamente, sem

necessidade de qualquer ato da secretaria ou do juiz, e o réu pagaria as custas.

Quando se iniciasse a execução seria disponibilizada por meios eletrónicos ao agente

de execução nomeado para os efeitos do n.º10 do artigo 810.º cópia da sentença e a

informação e a documentação enviada pelo autor nos termos do n.º1 do artigo 675.º-

A.

2. Alterações na Reforma de 2013. O artigo 626.º: na reforma de 2013, a dedução do

requerimento de execução de sentença passa a ser feita nos próprios autos da ação

declarativa embora tramitada de forma autónoma, i.e., constituindo uma fase

autónoma nos autos declarativos. A sua regulamentação consta do artigo 4.º, n.º1

Portaria n.º282/2013, 29 agosto. Nela destacamos quatro regras:

a. O requerimento é dirigido ao tribunal que proferiu a decisão em 1.ª

instância;

b. O exequente deve indicar a decisão judicial que pretende executar,

estando dispensado de juntar cópia ou certidão da mesma;

c. Quando se pretenda executar pedidos com finalidade diversa (artigo

710.º CPC), é designado apenas um agente de execução;

d. O requerimento de execução considera-se apresentado apenas na data de

pagamento das quantias previstas no artigo 724.º, nº.6 CPC.

Caso haja juízo de execução aquele, depois de deduzido, deve ser remetido a esse

tribunal, com caráter de urgência, com a cópia da sentença e os documentos que o

acompanham. Esta remessa constitui já um ato do processo executivo, visto que,

como se lê no artigo 85.º, n.º2 CPC, o requerimento já deu inicio à execução. Assiste-

se, deste modo, a uma economia procedimental, mas que não dispensa que o credor,

querendo, apresente o requerimento. Portanto, a execução de sentença não é

automática. Sendo esta reforma meramente procedimental, ao contrário do regime

do artigo 674.º-A, o requerimento apenas pode ser deduzido após a produção da

condenação, nos termos gerais dos artigos 703.º, n.º1, alínea a) e 704.º CPC. A partir

daí, abre-se um quadro de vias procedimentais, para a execução de sentença

condenatória constantes do artigo 626.º CPC. Já atrás o adiantámos e que aqui

repetimos abrangendo, por comodidade de exposição, as várias finalidades da

execução. As vias procedimentais de execução de sentença condenatória são:

a. O pagamento de quantia certa corre na forma sumária, nos termos dos artigos

550.º, n.º2, alínea a) (se não dever ser executada no próprio processo) e 6256.º,

n.º2 (se dever ser executada no próprio processo), salvo os casos que caiam

no artigo 550.º, n.º3, todos CPC;

b. A entrega de coisa certa, corre em forma única ex vi artigo 550.º, n.º5 e 626.º,

n.º1, i.e., com admissão pela secretaria e despacho liminar, mas com dispensa

de citação prévia à entrega (artigo 626.º, n.º3 CPC);

c. A prestação de facto corre em forma única ex vi artigo 550.º, n.º4 e 626.º, n.º1

CPC, i.e., com admissão pela secretaria, despacho liminar e citação previa

(artigo 626.º, n.º3 CPC);

d. A entrega cumulada de quantia certa/entrega de uma coisa e prestação de um

facto, corre na forma sumária adaptada nos termos do artigo 626.º, n.º3 CPC.

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II – Distribuição, admissão, despacho liminar e citação

§28.º - Distribuição e admissão

Distribuição. Controle administrativo liminar (admissão): a distribuição é a

atribuição aleatória de um tribunal para o caso apresentado pela parte ativa. Ora, enuncia o

artigo 207.º, n.º1 CPC que nenhum ato processual é admitido à distribuição sem que

contenha todos os requisitos externos exigidos por lei. Se a via usada foi a eletrónica, essa

triagem é feita eletronicamente, conforme o respetivo n.º2. Trata-se, pois, de uma triagem

meramente técnica, prévia à distribuição. A execução corresponde à 6.ª espécie de ação nos

termos do artigo 212.º CPC. Feita a distribuição eletrónica, o requerimento executivo carece

de ser objeto de ato liminar de recebimento ou recusa para apurar se ele apresenta os

requisitos formais legalmente exigidos para puder ser presente ao juiz ou serem iniciadas as

diligências de penhora, consoante a forma de processo. Ora, até à reforma de 2008, competia

à secretaria judicial o ato de admissão, a partir daí passou a ser o agente de execução. Se o

exequente designou agente de execução e utilizou via do CITIUS então valia o artigo a regra

de que ao requerimento executivo era, de forma automática e oficiosa, atribuído um número

único de processo, feita a sua distribuição e enviado eletronicamente ao agente de execução

designado. Uma vez que o agente de execução era depois notificado por via eletrónica, tendo

5 dias para emitir por via eletrónica a declaração de não aceitação, parecia que essa

distribuição é condicional e que em caso de não aceitação terá de ser feita nova distribuição.

Nos demais casos importaria distinguir:

1. Se o exequente designou o agente de execução por via não eletrónica: a

secretaria digitalizaria o requerimento executivo e os documentos apresentados em

suporte de papel, enviaria, eletronicamente para o agente de execução designado os

requerimentos do autor e a cópia eletrónica da sentença e teria lugar a distribuição

eletrónica;

2. Se o exequente não designou o agente de execução: o processo iria

primeiramente à secretaria para efeitos de fazer a designação do agente de execução,

mas somente depois de decidir pelo recebimento ou pela recusa.

Mas havia que considerar ainda o já referido regime especial de distribuição do requerimento

antecipado. Com a Reforma de 2013, a secretaria judicial recuperou a competência de receber

ou recusar a admissão ao requerimento executivo, na forma ordinária da execução para

pagamento de quantia certa ou na forma única nas demais execuções. É o que decorre dos

artigos 725.º e 626.º, n.º1 CPC, respetivamente. O agente de execução manteve essa

competência na forma sumária, nos termos do artigo 855.º CPC. Ora, se foi feita

apresentação eletrónica do requerimento executivo esse ato de controle administrativo

liminar terá lugar no prazo de 10 dias a contar da distribuição, conforme decorre do artigo

725.º, n.º1 e do artigo 855.º, n.º2, alínea a) CPC. Já se foi usado o suporte físico o artigo 3.º,

n.º2 e 4 Portaria n.º282/2013, 20 agosto, admite que feita a análise do mesmo nos termos

dos artigos 724.º e 725.º CPC pode ser efetuada a distribuição.

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Controle liminar administrativo:

1. Introdução: no plano do objeto o controle liminar administrativo, pode fazer-se em

três níveis:

a. Ao nível dos requisitos externos da pretensão executiva;

b. Ao nível dos pressupostos processuais da execução;

c. Ao nível da existência e condições da própria pretensão executiva.

No plano do ato processual por que o agente/secretaria deverá concluir a sua

apreciação do requerimento, ele poderá ter, consoante os casos, recebimento do

requerimento executivo, recebimento do requerimento executivo para despacho

liminar e recusa de recebimento do requerimento executivo. Ora, no Código Velho,

tal era a vasta competência do agente de execução. Diversamente, no Código novo,

essa tríplice competência ainda se mantém com o agente de execução na forma

sumária, enquanto que na forma ordinária a secretaria tem competência restringida

apenas ao primeiro nível.

2. Controle dos requisitos externos: recebimento e recusa de recebimento:

quanto ao primeiro nível de controlo dos requisitos externos da pretensão executiva,

o seu conteúdo está muito próximo daquele que é levado a cabo pela secretaria no

início da ação declarativa, nos termos do artigo 558.º CPC. Assim, o agente de

execução (na forma sumário – artigo 855.º, n.º2, alínea a) CPC) ou a secretaria (forma

ordinária) dever verificar se há:

a. Uso do modelo de requerimento executivo (artigo 725.º, n.º1, alínea a)

CPC);

b. Identificação do tribunal e das partes (artigo 725.º, n.º1, alínea c) CPC);

c. Indicação do domicílio profissional do mandatário judicial, caso este

seja obrigatório (artigo 725.º, n.º1, alínea c) CPC);

d. Indicação do fim da execução (artigo 725.º, n.º1, alínea b) CPC);

e. Indicação da forma de processo (artigo 725.º, n.º1, alínea c) CPC);

f. Indicação do valor da causa (artigo 725.º, n.º1, alínea c) CPC);

g. Junção do documento comprovativo do pagamento da taxa de justiça

(artigo 725.º, n.º1, alínea e) CPC);

h. Indicar o número de identificação bancária ou equivalente (artigo 725.º,

n.º1, alínea c) CPC);

i. Junção do documento comprovativo da concessão de apoio judiciário

(artigo 725.º, n.º1, alínea e) CPC);

j. Assinatura (embora omitido na lei deve aplicar-se o artigo 558.º, alínea g)

CPC, graças ao artigo 551.º, n.º1 CPC);

k. Redação em língua portuguesa (embora omitido na lei, deve aplicar-se o

artigo 558.º, alínea g) CPC, graças ao abrigo do artigo 551.º, n.º1 CPC).

A falta de um destes requisitos implica a recusa de admissão do requerimento

executivo, por força do disposto no corpo do artigo 725.º, n.º1 CPC. Desse ato de

recusa cabe reclamação para o juiz, cuja decisão será, por seu turno, irrecorrível

(artigo 725.º, n.º2 CPC). Em alternativa, o exequente pode apresentar outro

requerimento executivo ou o documento em falta nos 10 dias subsequentes à recusa

de recebimento ou notificação da decisão judicial que a confirme, mantendo o

benefício da renovação, i.e., da salvaguarda da primeira data como momento da

propositura da execução (artigo 725.º, n.º3 CPC). Findos daqueles 10 dias sem que

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tenha sido apresentado outro requerimento ou o documento ou elemento em falta,

extingue-se a execução, sendo disso notificado o exequente, conforme o artigo 724.º,

n.º5 CPC.

3. Controle dos pressupostos processuais (Código velho e forma sumária):

recebimento para despacho liminar: o segundo nível de controlo diz respeito aos

pressupostos processuais nas execuções dispensadas de despacho liminar. Trata-se

de um nível que, agora, só existe na forma sumária e que cabe ao agente de execução,

pois apenas se justifica quando não caiba ao juiz despacho liminar. A afirmação de

um controlo de pressupostos processuais por parte do agente de execução pode ser

causadora de perplexidade. No artigo 855.º, n.º2, alínea b) CPC, ao remeter-se para

o artigo 726.º, n.º2 e 4 CPC, o agente de execução a verifica tanto os pressupostos

sanáveis, como os insupríveis. Se lhe afigurar-se possível a ocorrência de alguma

dessas situações deverá suscitar a intervenção do juiz.

4. Controle da pretensão executiva (Código velho e forma sumária): recusa de

recebimento e recebimento para despacho: sobre estes dois níveis de controlo

do agente de execução era colocado um terceiro nível de controlo: a verificação da

própria existência e condições da pretensão executiva. Novamente, após a reforma

de 2013 está vedada à secretaria esta competência, mas permanece com o agente de

execução na forma sumária do artigo 855.º, n.º2, alíneas a) e b) CPC. No Código

velho tratava-se (e agora, em idêntica solução a vigorar nos artigos 725. 726.º e 855.º

CPC) de aferir da existência de:

a. Causa de pedir complementar;

b. Pedido;

c. Título executivo e sua suficiência, incluindo a interpelação ou

notificação do devedor (quando seja manifesta a inexistência ou

insuficiência ou quando duvide da existência ou suficiência);

d. Acertamento da obrigação exequenda, por falta de liquidação por

simples cálculo aritmético ou de escolha da prestação, quando caiba

ao credor;

e. Factos impeditivos, modificativos ou extintivos da obrigação

exequenda, que sejam de conhecimento oficioso, incluindo a nulidade

de convenção de arbitragem que fundou a sentença arbitral.

A inexistência de algum destes elementos tem consequências diversas. Assim, a falta

de causa de pedir complementar, de pedido, de apresentação de título executivo ou

de sua cópia, de acertamento da obrigação exequenda (por falta de liquidação por

simples cálculo aritmético ou de escolha da prestação) ou, ainda, se for manifesta a

insuficiência da cópia ou do título apresentado, devem levar o agente de execução a

recusar-se a receber o requerimento, por força do disposto no corpo do n.º1 do artigo

811.º CPC anterior; mas vejam-se os correlativos artigos 725.º, n.º1 e 855.º, n.º2,

alínea a) CPC atual. Do ato de recusa cabia reclamação para o juiz, cuja decisão ser

recorrível quando se funde na insuficiência do título executivo ou na falta de causa

de pedir. Novamente, em alternativa, o exequente poderia apresentar outro

requerimento executivo ou o documento em falta nos 10 dias subsequentes à recusa

de recebimento ou notificação da decisão judicial que a confirme, mantendo o

benefício da salvaguarda da primeira data como momento da propositura da

execução. Já a falta ou insuficiência duvidosas de título executivo e a verificação de

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factos impeditivos, modificativos ou extintivos da obrigação exequenda, que sejam

de conhecimento oficioso incluindo a nulidade de convenção de arbitragem que

fundou a sentença arbitral, por violação da LAV, não obstam ao recebimento mas

deve ser feita remessa para o juiz. Idêntica solução vigora nos artigos 726.º e 855.º,

n.º2, alínea b) CPC atual.

Efeitos do recebimento: acabou de se ver que quando não haja motivo para recusa, ou,

tendo havido, em cumprimento de despacho judicial que haja deferido reclamação de recusa,

o agente de execução ou a secretaria (forma ordinária, no novo Código) recebem o

requerimento executivo. Este ato tem como efeito processual principal a da constituição da

relação jurídica processual ou instância executiva na data do recebimento do requerimento

executivo, nos termos do artigo 259.º, n.º1 CPC, conjugado com o artigo 144.º CPC.

Tratando-se de execução de títulos de crédito, a pendência da causa executiva determina a

não caducidade do direito de propor a ação, nos termos dos artigos 70.º e 77.º LULLL e do

artigo 52.º LUC.

§29.º - Despacho liminar

Regime anterior à reforma de 2013:

1. Excecionalidade: no Direito anterior à reforma de 2003, o controlo dos

pressupostos processuais e, em geral, da regularidade da instância tinha lugar

liminarmente e era feito pelo juiz em despacho. Mesmo na execução sob forma

sumária, em que havia dispensa de citação prévia, a penhora era ordenada sem

prejuízo, porém, da apreciação pelo juiz. Posteriormente, com as reformas de 2003 e

2008, o despacho liminar perdeu valor na sequência processual executiva. Em

primeiro lugar, algum do objeto que, tradicionalmente, lhe competia passou para a

competência do agente de execução. Em segundo lugar, passou a haver execuções

que correm com despacho liminar e execuções que correm sem despacho liminar. Só

que, até 30 de maio 2009, a regra era a da conclusão do processo ao juiz para

despacho liminar quando não se verificasse um dos casos de despensa de despacho

liminar, embora, por sua vez, excecionados. Desde 31 março 2009, passou a vigorar

a regra oposta: as exceções que correm com despacho liminar seriam as

expressamente previstas e sempre por decisão do agente de execução. Todas as

demais corriam sem despacho liminar. Esta interpretação era coerente com a

circunstância de o de o regime quando se referia a despacho liminar era para dizer

quando ele tem lugar e nunca para dizer quando não tem lugar, o que significam que

a regra, implícita, era a da sua ausência. Por outro lado, era a que melhor se adequava

à regra geral da oficiosidade das diligências de citação. Mesmo a evolução do regime

ia nesse sentido. É que antes apenas se admitia despacho liminar de citação no

processo executivo nos casos expressamente previstos, ou seja, como regra e em

casos excecionais. A partir de 2008 os casos previstos são justamente os casos de

despacho de citação. Nenhuma delas tem um âmbito geral pelo que se pode concluir

que, a contrario, a citação é feita oficiosamente. Deste modo, após a reforma de 2008,

o ataque ao património do devedor é feito, tendencialmente, sem controlo judicial

direto e necessário. É constitucional um procedimento feito com uma fase liminar,

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com um controlo administrativo, dispensando o juiz. Trata-se apenas de verificar a

regularidade e legalidade da instância, tarefa que não é, em si mesma jurisdicional.

Daí o regime fazer sentido. Como escrevemos atrás, os juízos de valoração não são

identitários da função jurisdicional, estando presentes em vários procedimentos

administrativos. Naturalmente que essa apreciação administrativa em nada vincula o

juiz que tenha, posteriormente, de apreciar alguma questão na execução. O problema

da ausência sistemática do despacho liminar situa-se, parece-nos, no plano da eficácia

procedimental. É que, como nota António José Fialho, existe o perigo real de

instauração e prosseguimento de ações executivas sem condições básicas para

alcançar o seu objetivo dada também a fácil produção de títulos executivos

extrajudiciais ao abrigo do CPC/2012.

2. Pressupostos: concretizando, os pressupostos que determinam que uma execução

fosse sujeita, depois do controle liminar administrativo, a um despacho liminar do

juiz da execução, arrumavam-se em dois grupos quanto ao seu âmbito:

a. Pressupostos comuns a qualquer execução: eram:

i. A dúvida quanto à suficiência do título que não justifique a recusa;

ii. A suspeita da ocorrência de exceção dilatória insanável e de conhecimento oficioso.

b. Pressupostos especiais: eram:

i. Na execução de documento exarado ou autenticado, por notário ou por outras

entidades ou profissionais com competência para tal, ou documento particular com

reconhecimento presencial da assinatura do devedor, a dúvida quanto à

interpelação ou notificação do devedor;

ii. Na execução baseada em título negocial, a suspeita da ocorrência de factos

impeditivos, modificativos ou extintivos da obrigação exequenda, de conhecimento

oficioso;

iii. Na execução de sentença arbitral, a dúvida sobre se o litígio poderia ser cometido

à decisão por árbitros, por estar submetido, por lei especial, exclusivamente a

tribunal judicial ou a arbitragem necessária, ou por o direito litigioso não ser

disponível pelo seu titular.

Já quanto a dependerem ou não de uma avaliação do agente de execução podiam, em

conformidade, arrumar-se em

c. Pressupostos subjetivos: ambos os pressupostos comuns pois carecem de

uma avaliação do agente de execução.

d. Pressupostos objetivos: eram pressupostos especiais objetivos:

i. A execução ser movida contra o devedor subsidiário;

ii. A exigibilidade da obrigação carecer de ser provada por meio não documental;

iii. A execução fundar-se em ata da reunião da assembleia de condóminos;

iv. A execução fundar-se em título executivo.

Regime posterior à reforma de 2013: na nova forma ordinária à admissão do

requerimento pela secretaria segue-se sempre o despacho liminar do juiz, previsto e regulado

no artigo 726.º CPC.

Conteúdo:

1. Indeferimento liminar: o despacho liminar pode ser indeferimento liminar nas

situações previstas n.º3 do artigo 726.º CPC São os seguintes:

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a. Falta ou insuficiência do título, desde que manifestas (alínea a));

b. Exceções dilatórias não supríveis de conhecimento oficioso:

i. Incompetência absoluta e ilegitimidade singular;

ii. Caso julgado;

iii. Nulidade de todo o processo de conhecimento oficioso não sanável, seja do

processo executivo – máxime, por ineptidão do requerimento inicial

–, seja do processo declarativo que produziu a sentença exequenda

desde que não tenha havido preclusão de alegabilidade com o trânsito

julgado (v.g., a falta de citação para a ação declarativa não sanada

nesta – artigos 196.º e 191.º, n.º2 CPC – e que pode ser fundamento

de oposição à execução – artigos 729.º, alínea d) CPC e 372.º, n.º3

CC);

iv. Outros fundamentos de oposição à execução (artigo 729.º, alínea b) CPC) em

certas condições;

v. Factos impeditivos, modificativos ou extintivos da obrigação exequenda, de

conhecimento oficioso e que sejam manifestos, fundando-se a execução em título

negocial (alínea c));

vi. Tratando-se de execução baseada em decisão arbitral, o litígio não pudesse ser

cometido à decisão por árbitros, quer por estar submetido, por lei especial,

exclusivamente, a tribunal judicial ou a arbitragem necessária, quer

por o direito controvertido não ter caráter patrimonial e não poder

ser objeto de transação – apenas na alínea d) do n.º2 do artigo 726.º

CPC.

É admitido o indeferimento parcial, designadamente objetivo, quanto à parte

do pedido que exceder os limites constantes do título executivo, autoriza o

n.º3 do mesmo artigo. Neste acrescenta-se ainda o indeferimento parcial

subjetivo quanto aos sujeitos que careçam de legitimidade para figurar como

exequentes ou executados. Todavia, como bem ensina Teixeira de Sousa, o

n.º3 do artigo 278.º CPC também conhece aplicação na ação executiva,

máxime, se a oposição à execução poder ser procedente a despeito de falta

de incompetência territorial ou de falta de patrocínio por parte do executado.

Este despacho de indeferimento é passível de recurso para a Relação,

independentemente do valor da causa e da sucumbência, nos termos da regra

geral do artigo 629.º, n.º3, alínea c) CPC, aplicável ex vi artigo 551.º, n.º1 CPC.

Trata-se de recurso de apelação de decisão que põe termo à causa, para efeitos

do artigo 644.º, n.º1, alínea a), 1.ª parte CPC.

2. Aperfeiçoamento: ocorrendo um vício que não determine o indeferimento liminar,

deverá o juiz proferir despacho de aperfeiçoamento para suprimento de

irregularidades do requerimento executivo e de sanação da falta de pressupostos

processuais (v.g., sanação da incapacidade judiciária, da representação irregular, da

falta de patrocínio obrigatório, ou junção de documento complementar do título

executivo nos termos dos artigos 707.º CPC ou 54.º, n.º1 CPC). Naturalmente que,

não sendo o vício suprido ou a falta corrigida dentro do prazo marcado, é indeferido

o requerimento executivo. Residualmente, é possível um despacho com outro

conteúdo não extintivo da execução (v.g., remessa do processo para o tribunal

territorialmente competente, nos termos do artigo 105.º, n.º3 CPC).

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3. Citação do executado. Despacho de citação do cônjuge do executado: não

havendo irregularidades do requerimento executivo ou falta de pressupostos

processuais que cumpra ao juiz conhecer oficiosamente, ou tendo sido o vício

suprido ou a falta corrigida, o juiz profere despacho de citação do executado para no

prazo de 20 dias pagar ou opor-se à execução – artigo 726.º, n.º6 CPC. A secretaria

remete, então, ao agente de execução, por via eletrónica, o requerimento executivo e

os documentos que o acompanhem, notificando aquele de que deve proceder à

citação (artigo 726.º, n.º8 CPC). No regime posterior à reforma de 2013 se o

exequente tiver alegado no requerimento executivo a comunicabilidade da dívida

constante de título diverso de sentença, o juiz profere despacho de citação do cônjuge

do executado para os efeitos previstos no n.º2 do artigo 741.º CPC.

Despacho sucessivo: a verificação judicial da regularidade da instância não se esgota no

momento inicial da execução, pois que ela continua a ser possível ao longo da execução,

conforme se dispõe no artigo 734.º CPC, não ficando precludida com um eventual despacho

liminar. Trata-se de um curto despacho de saneamento da causa e que se justifica por o

despacho liminar ou não ter ocorrido ou, se ocorreu, não ter produzido caso julgado formal.

Ele tanto pode ocorrer a propósito de um ato executivo que o juiz tenha de praticar, como

de um momento declarativo: máxime, conhecimento de uma reclamação de ato do agente

de execução ou da petição de oposição ou à penhora, da petição de embargos de terceiro ou

da reclamação de créditos. Este controlo judicial pode ter lugar, com o alargamento que

conhecer com a Reforma de 2003, até ao primeiro ato de transmissão de bens penhorados,

o que, grosso modo, é precisamente o fim da fase da venda em qualquer das modalidades,

incluindo consignação de rendimentos (artigo 827.º, n.º1 CPC). Segundo as remissões

operadas pelo artigo 734.º, n.º1 CPC, e o novel artigo 48.º, n.º3 LAV/2011, o juiz deverá,

neste ensejo, conhecer oficiosamente:

1. Das questões que poderiam ter justificado o despacho liminar de

indeferimento, incluindo da validade de sentença arbitral por o litígio não pude ser

cometido a arbitragem nos termos do Direito português (por, entre outras razões,

estar submetido, por lei especial, exclusivamente a tribunal judicial ou a arbitragem

necessária, ou por o direito litigioso não ser disponível pelo seu titular) ou por

ofender os princípios da ordem pública internacional do Estado português (artigo

726.º, n.º1 CPC e o artigo 46.º, n.º3, alínea b) LAV/2011);

2. Das questões que poderiam ter justificado um despacho liminar de

aperfeiçoamento (artigo 726.º, n.º4 CPC).

Mas devem ser questões novas, i.e., de que o juiz ainda não haja conhecido: se já as decidiu

não pode novamente conhecê-las em sede de artigo 734.º CPC, por força da preclusão

decisória do artigo 613.º CPC e da eficácia de caso julgado formal, do artigo 620.º, n.º1 CPC.

Por outro lado, esse conhecimento não se compadece com a produção de provas, devendo

o juiz ater-se apenas aos elementos que já existiam nos autos. Se concluir pela ocorrências

dos vícios, as questões elencadas em a) conduzem à rejeição da execução (neste sentido o

n.º3 do artigo 48.º LAV/2011) e as questões elencadas em b) a despacho de aperfeiçoamento,

num primeiro momento. Rejeitada a execução ou não sendo o vício suprido ou a falta

corrigida, a execução extingue-se.

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§30.º - Citação

Introdução: até à reforma de 2008 resultava que a citação do executado podia ser feita

depois da penhora ou antes dela, num quadro, algo confuso, de remissões e ressalvas,

estruturado sobre um princípio, afirmado pela doutrina, da coincidência entre o despacho

liminar e a citação prévia. Este princípio da coincidência desdobrava-se em duas regras de

sentido inverso e com algumas exceções:

1. A regra negativa: quando houvesse dispensa de despacho liminar, havia dispensa de

citação prévia correndo sem despacho liminar. Esta regra conhecia dois desvios para

alguns casos:

a. Uma garantia de despacho liminar apesar de não haver citação prévia;

b. Uma garantia legal de citação prévia apesar de não haver despacho

liminar.

2. A regra positiva: quando houvesse despacho liminar, havia citação prévia à penhora

o que sucedia, em regra, em todas as situações que não coubessem na anteror. Esta

regra conhecia um desvio: nas execuções com despacho liminar, na execução

proposta contra devedor subsidiário, só ou acompanhado pelo devedor principal, e

ainda, em geral, o exequente podia requerer que a penhora fosse efetuada sem a

citação prévia do executado, tendo para o efeito de alegar factos que justifiquem o

receio de perda da garantia patrimonial do seu crédito e oferecer de imediato os meios

de prova.

No quadro da reforma de 2008-2009, a regra da coincidência manteve-se, mas com um

alcance muito menor, dada a excecionalidade do despacho liminar do juiz. Além disso, as

garantias de despacho liminar foram suprimidas; contudo, mantiveram-se as garantias de

citação prévia e a possibilidade de o exequente requerer a dispensa de citação prévia. Para a

economia da sequência processual da fase introdutória o que passou a ser decisivo e

estruturante era haver ou não haver citação prévia e, não, a existência ou não existência de

despacho liminar. Visto que só depois de citado é que o executado pode deduzir oposição à

execução, pode falar-se em fase introdutória em contraditório prévio e fase instrutória com

contraditório diferido. Na economia do Código de Processo Civil de 2013 retorna-se ao

princípio da coincidência. Assim:

1. Na forma ordinária: sucessora da fase introdutória com contraditório prévio,

depois do despacho liminar, tem lugar a citação, salvo o caso de dispensa judicial de

citação, ao abrigo do artigo 727.º CPC.

2. Na forma sumária: correspondente à anterior fase introdutória com contraditório

diferido, não há despacho liminar, nem citação prévia à penhora. ~

Novamente, as situações de forma sumária são excecionais: as contantes do artigo 550.º, n.º2

(ainda o artigo 626.º, n.º2 CPC) e do artigo 727.º CPC. Vamos, então, ver de seguida o regime

da citação prévia à penhora ou na forma ordinária.

Regime anterior à reforma de 2013:

1. Regra da citação prévia: no Código velho, fora dos casos previstos (e, mesmo assim,

com a exceção prevista), corriam as demais execuções com citação prévia. Contudo,

havia citação prévia promovida oficiosamente pelo agente de execução e citação

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prévia dependente de despacho liminar. A citação prévia promovida pelo agente de

execução constituía a regra e, normalmente, coincidia com a própria ausência de

despacho liminar – que era a regra. Mas nos casos em que tinha de haver despacho

liminar, havia que distinguir:

a. Nas situações em que, apesar de haver despacho liminar, continuava

a existir situação prévia oficiosa do agente de execução:

i. Execução movida apenas contra o devedor subsidiário e o exequente não tenha

pedido a dispensa da citação prévia;

ii. Incidente de liquidação;

iii. Execuções fundadas em título extrajudicial de empréstimo contraído para

aquisição de habitação própria hipotecada em garantia;

iv. Constar no registo informático de execuções a menção da frustração, total ou

parcial, de anterior ação executiva movida contra o executado.

b. Nas demais situações, o despacho liminar do juiz poderia ser de

citação prévia.

Deste modo, o despacho liminar tanto podia significar:

a. Liminar, em sentido técnico, porque anterior à constituição da instância

em face do executado é o juiz que mandará citar;

b. Liminar, em sentido impróprio, ou inicial porque posterior à constituição

da instância em face do executado, pois era o agente quem cita e o juiz quem

indeferiria, total ou parcialmente, mas já não liminarmente.

2. Desvio: dispensa judicial de citação: finalmente, nos processos remetidos para

despacho liminar, em que haveria, nos termos gerais, citação prévia, o exequente

poderia, requerer que a penhora fosse efetuada sem a citação prévia do executado,

tendo para o efeito de alegar factos que justifiquem o receio de perda de garantia

patrimonial do seu crédito e oferecer de imediato os meios de prova. Tratava-se de

uma solução que fora pela primeira vez introduzida na reforma de 2003 com a

natureza de providência cautelar não autónoma ou enxertada. A respetiva era

semelhante à do arresto – salvaguarda da garantia patrimonial do crédito –, embora

diferente no momento – mais próximo do momento da execução do crédito – e na

causa do perigo – mais específica, porque se referia ao concreto ato processual da

citação, causador de mora processual e de conhecimento prévio da execução

aumentando o risco de descaminho de bens. Esta dispensa de citação prévia não

podia, em nenhuma circunstância, ser decretada oficiosamente, dado o princípio do

dispositivo: o juiz só podia conceder a tutela do direito mediante pedido do respetivo

titular. Por isso, o exequente deveria deduzir requerimento de dispensa de citação

prévia à penhora contendo:

a. A alegação da existência do crédito (o fumus boni iuris);

b. A alegação dos factos que estão na base do justo receio de lesão da

garantia do crédito (o periculum in mora; este podia também ser

superveniente, por ter ocorrido especial dificuldade em efetuar a citação

prévia, designadamente ausência em parte incerta);

c. O pedido de dispensa de citação prévia.

O requerimento deveria ser acompanhado da respetiva prova. Quanto ao crédito, ele

não carecia de ser demonstrado, porque tal já resultava do título executivo. Quanto

ao receio de perda da garantia, ele deveria ser provado por mera justificação dos

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factos alegados. Nesta hipótese, a prova seria valorada pelo juiz com o respetivo

poder concluir pela verosimilhança do receito, tal como se exige nos restantes

procedimentos cautelares. Mas, anteriormente, ainda, admitia-se que se o

fundamento do receio fosse a frustração de anterior ação executiva movida contra o

executado, bastava juntar a respetiva certidão do registo informático de execuções.

Nessa eventualidade, a lei impunha uma presunção de periculum in mora, em que

dispensa tem sempre lugar. Já noutra versão, nada se dizia: o fundamento podia ser

invocado, a certidão trazida mas poderia não ser o suficiente.

Regime posterior à reforma de 2013: já sabemos que na forma ordinária de 2013,

quando o processo deva prosseguir, o juiz profere despacho de citação do executado para,

no prazo de 20 dias, pagar ou opor-se à execução. Mas atente-se ao n.º4 do artigo 728.º CPC,

a citação do executado é substituída por notificação quando, citado o executado para a

execução de determinado título, se cumule depois, no mesmo processo, a execução de outro

título, nos termos do artigo 711.º CPC. Tal como sucedeu inicialmente no regime anterior,

continua a prever-se, agora no artigo 727.º CPC, que o exequente possa pedir ao juiz a

dispensa de citação prévia por fundado receio de perda da garantia patrimonial. Tanto os

fundamentos, quanto os termos procedimentais desta diligência são os mesmos que

vigoraram até à reforma de 2013. Há, ainda assim, três novidades:

3. Recuperação, na 2.ª parte do artigo 727.º CPC que se dispunha: o receio é justificado

sempre que, no registo informático de execuções, conste a menção da frustração,

total ou parcial, de anterior ação executiva movida contra o executado.

4. O incidente é tramitado como urgente (artigo 727.º, n.º2 CPC);

5. Quando a citação prévia do executado tenha sido dispensada, é aplicável, com as

necessárias adaptações, o regime estabelecido nos artigos 856.ºe 858.º CPC, ou seja,

os termos do processo sumário quando ao momento em que o executado poderá

deduzir oposição à execução e à penhora e o regime sanções ao exequente por uso

abusivo deste instrumento de dispensa da citação.

Ato de citação:

1. Procedimento: na execução com citação prévia à penhora ou forma ordinária a

citação é feita nos termos gerais, como se estatui no artigo 10.º Portaria n.º 2822013,

29 agosto. Deste modo, será feita pelo agente de execução (artigo 719.º, n.º1 CPC),

por via postal (artigo 228.º CPC). Se esta citação se frustrar, a citação é efetuada

mediante contacto pessoal do agente de execução com o executado (artigo 231.º, n.º2

CPC). Importa, também, não esquecer o regime especial de citação das pessoas

coletivas, abrigado no artigo 246.º CPC. Os preceitos gerais dos n.º2 e 3 do artigo

226.º CPC, impõe que se em 30 dias não se concluir a citação o agente de execução

informe o exequente e que, sucessivamente, pela mesma razão, decorridos mais 30

dias sobre o termo do prazo anterior se informe o juiz de execução. Pode haver lugar

a citação edital nos termos dos artigos 11.º e 12.º Portaria, n.º282/2013, 29 agosto.

Na realidade, a Portaria n.º1148/2010, 4 novembro, veio aditar, já presente no n.º2

do artigo 10.º Portaria n.º282/2013, determinando que frustrada a citação pessoal

por carta registada com aviso de receção ou frustrada a citação por contacto pessoal

o agente de execução procede à citação edital eletrónica do mesmo, nos termos dos

artigos seguintes da Portaria.

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2. Conteúdo: no ato da penhora, o executado recebe o duplicado do requerimento

executivo e cópias do título executivo e documentos que o acompanhem (artigo 227.º,

n.º1 CPC) com a informação de que está a ser citado para pagar ou opor-se à

execução no prazo de 20 dias a contar dessa citação. Mas há mais informações que

são obrigatoriamente transmitias em todas as citações e, bem assim, informações que

são transmitidas em algumas citações. Mas há mais informações que são

obrigatoriamente transmitidas em todas as citações e, bem assim, informações que

são transmitidas em algumas citações. A sua omissão pode ser causa de nulidade da

citação, nos termos gerais do artigo 198.º, n.º1 CPC. Informações comuns são:

a. Dados identificativos do processo (artigo 227.º, n.º, 2.ª parte CPC);

b. Necessidade de patrocínio judiciário, quando seja obrigatório (artigo

227.º, n.º2 CPC);

c. Informação do montante provável dos honorários e despesas do agente

de execução (artigo 44.º, n.º5 Portaria n.º282/2013, 29 agosto).

O executado será ainda adicionalmente informado:

d. Nas execuções contra o devedor subsidiário, do ónus de invocar o

benefício da excussão prévia no prazo da oposição à execução (artigo

745.º, n.º1 CPC);

e. Nas execuções com incidente de liquidação, do ónus de contestar o

valor oferecido pelo exequente na liquidação em oposição à execução,

com a cominação que incorre em caso de revelia (artigo 716.º, n.º4 CPC).

3. Efeitos processuais. A instância executiva: a citação tem vários efeitos,

processuais e materiais. Neles podemos distinguir efeitos principais e secundários:

a. Efeito processual:

i. Principal: é o da constituição da relação jurídica processual entre o

executado e o tribunal e de modo estável, como decorre do artigo

259.º, n.º2 CPC;

ii. Secundário: é o da litispendência: o credor está impedido de colocar

uma nova execução contra o autor com o mesmo objeto processual,

mesmo que o título utilizado seja diferente. Recorde-se que a

litispendência deve ser alegada na oposição à execução proposta em

segundo lugar e que considera-se proposta em segundo lugar a ação

para a qual o réu foi citado posteriormente; se em ambas as ações a

citação tiver sido feita no mesmo dia, a ordem das ações é

determinada pela ordem de entrada dos requerimentos executivos

respetivos (artigo 582.º, n.º1 e 2 CPC).

Mas detenhamo-nos, um pouco, na instância processual assim constituída. Ela rege-

se por princípio da estabilidade expressamente consagrado no artigo 260.º CPC e

repescado no artigo 564.º, alínea b) CPC: a instância deve manter-se a mesma quanto

às pessoas, ao pedido e à causa de pedir, salvas as possibilidades de modificação

consignadas na lei.

b. As modificações subjetivas da instância decorrem tanto da intervenção

de terceiros na ação executiva (artigos 261.º e 262.º, alínea b) CPC), como da

substituição das partes por outras (artigo 262.º, alínea a) CPC), inter vivos ou

mortis causa, valendo aqui o incidente da habilitação (artigo 351.º CPC). Se este

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tem uma aplicação idêntica à da ação declarativa, já as intervenções de

terceiros são mais restritas que naquela, como já tivemos ensejo de analisar.

c. As modificações objetivas da execução são também particularmente

restritas. Assim, a ação executiva proprio sensu não conhece nem reconvenção,

nem articulados supervenientes, que são atos próprios de uma discussão

declarativa. Por outro lado, se pode haver lugar a uma cumulação de

execuções, nos termos do artigo 711.º CPC e também dos artigos 788.º e

seguintes CPC, muito claramente só podem ocorrer alteração da causa de

pedir e do pedido executivos por acordo do executado, ao abrigo do artigo

264.º CPC. Essa alteração da causa de pedir e do pedido apenas poderá ter

lugar até ao primeiro ato de transmissão de bens penhorados, por ser o último

momento em que manifestamente o interesse das partes prevalece sobre o

interesse de terceiros com expectativas de aquisição. Além disso, havendo

reclamação de créditos é duvidoso que a alteração da causa e de pedir e do

pedido possa ter lugar sem o acordo dos credores reclamantes. O nosso

entendimento é o de que assim pode suceder pois o credores reclamantes se

estão sujeitos à extinção da execução pelo exequente ou como consequência

indireta do pagamento do executado, por maioria de razão estão sujeitos à

sua eventual exclusão da execução por ilegitimidade superveniente

decorrentes da alteração do objeto processual. Excluída fica a aplicação do

regime da modificação unilateral, pelo exequente, do objeto processual do

artigo 265.º CPC. No plano funcional, este refere-se a um objeto tipicamente

declarativo, expresso em articulados contendo alegações e prova; e, por isso,

no plano literal aponta para atos processuais sem correspondência na

sequência procedimental executiva.

4. Efeitos materiais: a citação do devedor é pressuposto de vários e importantes

efeitos materiais.

a. Antes de mais o de colocar o réu devedor em mora no caso de obrigação

pura, conforme o artigo 805.º, n.º1 CC e o artigo 610.º, n.º2, alínea b) CPC.

Portanto, é com a citação que se vence a obrigação.

b. Em segundo lugar, a citação provoca interrupção da prescrição se o réu

for devedor e correr em seu benefício um prazo de prescrição, por força

do artigo 323.º, n.º1 CC. Se a citação ou notificação se não fizer dentro de

cinco dias depois de ter sido requerida, ou seja, desde a propositura da ação,

por causa não imputável ao requerente, tem-se a prescrição por interrompida

logo que decorram os cinco dias, ao abrigo do artigo 323.º, n.º2 CC;

c. Em terceiro lugar, tendo o exequente adquirido o crédito por cessão de

créditos, nos termos do artigo 577.º CC, relevada processualmente pelo

regime do artigo 54.º, n.º1 CPC, a citação para a ação executiva vale como

notificação da cessão de crédito ao devedor, condição de eficácia da

cessão em face deste, conforme o artigo 583.º CC;

d. Por fim, ocorre o efeito material de cessação da boa fé do possuidor

(artigo 564.º, alínea a) CPC), o que releva, em especial, na execução para

entrega de coisa certa.

5. Falta e nulidade de citação. Erro na forma de processo: a falta de citação do

executado, nos termos do artigo 188.º CPC, ou a sua nulidade, nos termos do artigo

191.º CPC, têm lugar quando não hajam sido, na sua realização, observadas as

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formalidades prescritas na lei, seja esta levada a cabo por agente de execução ou

mesmo por funcionário judicial. A falta de citação pode ser arguida pelo executado a

todo o tempo, por força do artigo 198.º, n.º2 CPC e do artigo 851.º, n.º1 CPC, caso

tenha corrido à revelia. Se o executado intervier na causa sem arguir logo, no ato, a

falta de citação, esta sana-se, conforme o artigo 188.º CPC. Por seu lado, a nulidade

de citação pode ser arguida no prazo da oposição; sendo, porém, nulidade de citação

edital, ou não tendo sido indicado prazo para a defesa, a nulidade pode ser arguida

aquando da primeira intervenção do citado no processo (artigo 191.º, n.º2 e 3 CPC).

A falta de arguição da nulidade dita a sua sanação salvo no caso do artigo 191.º, n.º2,

2.ª parte CPC, por ser de conhecimento oficioso ex vi artigo 196.º CPC. Por força das

regras gerais, a falta de citação do executado será de conhecimento oficioso pelo

tribunal (artigo 196.º CPC) e, bem assim, a dita nulidade de citação edital prevista no

artigo 191.º, n.º2, 2.ª parte CPC. Já as restantes nulidades de citação carecerão mesmo

daquela arguição a que alude o n.º1 do artigo 851.º CPC. Depois, sustados todos os

termos da execução, o juízo conhece logo da reclamação. O juiz não pode concluir

que a citação ocorrer, apenas com base em presunção judicial, mas deve ter presente

prova documental do efetivo ato de citação. Ao contrário da falta de citação, a

arguição de nulidade de citação só é atendida se a falta cometida puder prejudicar a

defesa do citado. Se a arguição de nulidade for julgada procedente, anula-se tudo o

que no processo se tenha praticado. O requerimento executivo permanece eficaz,

porém, graças aos artigos 187.º corpo, in fine, e 195.º, n.º2, 1.ª parte CPC. Mas o

requerimento de arguição de nulidade ou falta de citação pode ser deduzido mesmo

depois de finda a execução, em que o executado haja sido revel, configurando-se

como um ato processual póstumo e que determina a reabertura da instância. Sendo

o caso, a venda executiva será também anulada como dita o artigo 839.º, n.º1, alínea

b) CPC. Todavia, se a partir da venda tiver decorrido já o tempo necessário para a

usucapião, o executado ficará apenas com o direito de exigir do exequente, no caso

de dolo ou de má fé deste, a indemnização do prejuízo sofrido, se esse direito não

tiver prescrito entretanto. Mesmo no Código velho poderia ocorrer erro na forma de

processo, nomeadamente quando o agente de execução seguisse a via da dispensa de

citação prévia mas não era um caso dos artigos 812.º-C ou 812.º-F, n.º3, ou,

inversamente, quando promovesse a citação prévia, desrespeitando algum destes

artigos. O mesmo sucede, naturalmente, no Código novo, quanto ao uso indevido

das formas ordinária ou sumária, mas agora envolvendo também a secretaria (v.g.,

artigo 726.º, n.º1 CPC). Parece, nesses casos, ser de aplicar o artigo 193.º CPC,

podendo a parte prejudicada invocar o vício até ao termo do prazo para a dedução

de oposição à execução (artigo 198.º, n.º1 CPC). O tribunal pode, porém, conhecer

oficiosamente do erro na forma de processo ao abrigo do artigo 196.º CPC.

III – Oposição à execução

§31.º - Caracteres

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Funcionalidade: uma vez citado o executado está em posição de poder pagar

voluntariamente as custas e a dívida, nos termos e com os efeitos dos artigos 846.º e 849.º

CPC. Em alternativa, no prazo de 20 dias a contar da citação, pode o executado deduzir, nos

termos do n.º1 do artigo 728.º CPC, oposição à execução. A oposição à execução é o meio

processual pelo qual o executado exerce o seu direito de defesa ou de contradição perante o

pedido do exequente. A defesa, em processo civil, tanto pode assentar na impugnação, i.e.,

de negação dos factos da parte ativa, materiais ou processuais (pressupostos processuais

positivos), como na apresentação de factos que impedem o conhecimento da procedência

do pedido (pressupostos processuais negativos de litispendência e caso julgado) ou que

impedem, modificam ou extinguem o efeito jurídico que é pedido pela parte ativa (exceções

perentórias). Contudo, são diferentes os termos em que essas impugnação ou apresentação

de factos são feitas numa ação executiva e numa ação declarativa. A diferença está no efeito

jurídico pretendido, o que se traduz, no plano formal, num diferente instrumento processual:

1. Na ação declarativa: o direito de defesa corporiza-se num ato, quase sempre

articulado: a contestação. A contestação, em sentido próprio, é a declaração de um

pedido de absolvição do réu, da instância ou do pedido, fundado seja na impugnação,

seja na dedução de factos. Esta defesa por contestação integra o próprio

procedimento de produção da sentença final. No final, a sentença ditará ou a

improcedência do pedido da parte ativa (o autor), mas não da procedência do pedido

do réu: o caso julgado versará apenas e só sobre o pedido do autor (porém, o artigo

91.º, n.º2, 2.ª parte CPC).

2. Na ação executiva: o direito de defesa corporiza-se numa petição inicial do

executado de extinção da execução tendo por fundamento novamente a impugnação

de factos ou a afirmação de factos, seja a instância, seja sobre a dívida. Assim, se

percebe como, na execução de título diverso de sentença além dos fundamentos de

oposição especificados no artigo 729.º CPC, na parte em que sejam aplicáveis,

possam ser alegados quaisquer outros que seria lícito deduzir como defesa no

processo de declaração (artigo 731.º CPC). Estruturalmente, este defesa do executado

não integra o procedimento de execução, sendo autónoma no seu objeto e

procedimento, correndo como ação declarativa, incidental – fisicamente, por apenso

– à execução. Uma contra-ação, no dizer de Anselmo de Castro, e de alguns arestos.

Aqui, no final, a sentença ditará a procedência ou improcedência do pedido do autor-

executado (parte passiva da execução).

Em conclusão: a oposição à execução apresenta-se como uma ação declarativa

funcionalmente acessória da ação executiva porquanto justificada pela oposição de uma

defesa à dedução de uma pretensão executiva: sem execução não há oposição.

Consequência da acessoriedade: a acessoriedade do meio processual de oposição

perante a execução vai traduzir-se em vários aspetos do seu regime relacionados entre si:

1. No plano formal-termporal, vislumbra-se uma tendencial, ainda que em concreto

não conseguida, coincidência da sua duração com a duração da execução à custa de

uma simplificação processual. Assim, no Código Velho era um ação próxima na sua

estrutura do processo comum sumário por apresentar apenas dois articulados (o que

continua a suceder no Código novo, por força do artigo 732.º, n.º2 CPC) e, em geral,

uma simplificação dos atos e um encurtamento dos prazos. Pelas mesmas razões, o

princípio da economia processual não se concretiza numa admissibilidade de

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reconvenção por parte do réu-exequente contra o autor-executado e tampouco pode

o executado pretender alargar o âmbito da oposição a terceiros.

2. No plano objetivo do processo, o autor apenas pode invocar causas de pedir

específicas admitidas pela lei, nos artigos 729.ºa 731.º CPC, e agora no artigo 857.º

CPC, quanto à injunção. Em contrapartida, a essencial função de defesa autoriza a

que na execução de título diverso de sentença além dos fundamentos de oposição

especificados no artigo 729.º CPC, na parte em que sejam aplicáveis, possam ser

alegados quaisquer outros que seria lícito deduzir como defesa no processo de

declaração (artigo 731.º CPC). Em termos erais, trata-se de causas idóneas para um

pedido de extinção da execução tão só e somente, estando vedado ao executado

pretender efeito diverso, como um efeito relativo à penhora ou condenatório. A este

propósito, a acessoriedade funcional justifica que o executado somente possa

cumular com o pedido de extinção da execução, um pedido de substituição da

penhora por uma caução idónea que garanta os fins da execução, nos termos do n.º7

do artigo 751.º CPC.

3. No plano dos efeitos da sentença, a procedência do pedido de oposição implica a

extinção da execução. Esses efeitos são nuns casos estritamente processuais – os

respeitantes aos pressupostos da instância –, noutro são materiais – os atinentes ao

direito à prestação, incluindo a sua demonstração pelo título.

§32.º - Objeto mediato

Pedido: na oposição à execução o autor-executado deduz um pedido de extinção da

execução, total ou parcial.

4. Neste sentido, Ac. RE 5 junho 2008/ 925/08-2 declarou que a oposição à

execução visa a extinção da execução.

5. No dizer do Ac. RL 18 janeiro 2001/ 0040876 não é uma sentença de condenação,

antes conduzindo se os embargos forem julgados procedentes, à extinção da ação

executiva. Esta efeito extintivo da execução sendo o efeito pretendido pelo autor da

oposição tem, porém, como fundamentos decisórios o reconhecimento da atual

inexistência do direito exequendo, ou da falta de um pressuposto, específico ou geral,

da ação executiva, no dizer da mesma decisão. Por esta necessidade de

reconhecimento defendem vários Acórdãos que se trata de uma ação de simples

apreciação negativa da obrigação exequenda, de um pressuposto processual ou de

uma condição da execução.

6. Identicamente, Lebre de Freitas defende que se trata sempre de uma ação de

acertamento negativo:

a. Da situação substantiva, i.e., da obrigação exequenda, na oposição de mérito

– v.g., extinção da obrigação por pagamento –, desse modo, obstando ao

prosseguimento da ação executiva mediante a eliminação, por via indireta, da

eficácia do título executivo, ilidindo a presunção nele estabelecida;

b. Da falta de um pressuposto processual na oposição com fundamento

processual – v.g., falta de competência – incluindo a falta de título executivo,

obstando ao prosseguimento da causa, por inadmissibilidade.

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Visando o pedido dos embargos, a produção de um efeito extintivo, todavia essa extinção

pode ser, como se verá já de seguida, uma extinção por procedência de fundamento

processual ou por procedência de fundamento substantivo, como é apontado pela doutrina

e decorre dos artigos 729.º a 731.º CPC. Então, correlativamente, a extinção da execução

pode equivaler, respetivamente, à absolvição da instância executiva (incluindo por falta de

título) ou à absolvição do pedido, consoante o fundamento seja processual ou seja material.

Deste modo, o pedido da oposição à execução não é como o pedido da petição de uma ação

declarativa autónoma. Neste o autor pede a condenação do réu no pedido. Ora, neste apenso

o autor-executado não pede a condenação do réu-exequente no pedido; ao contrário, ele

deduz o mesmo pedido que deduziria numa contestação: a sua própria absolvição na

instância ou no pedido executivo. Estas conclusões confirmam-se, depois, na distribuição do

ónus da prova subjetivo, e terão consequências na qualidade do caso julgado final. Na

verdade, estando nós perante uma contestação posicionada como uma petição inicial, faltará

saber se o executado obterá o caso julgado material próprio do pedido do autor ou se apenas

uma apreciação incidental, como decorreria da regra do artigo 91.º, n.º2, 2.ª parte CPC.

Causa de pedir:

1. Aspetos gerais: a causa de pedir na oposição à ação é heterogénea mas é sempre um

facto jurídico legalmente previsto: é a lei que determina o tipo de facto admissível e

cuja demonstração conduz necessariamente à extinção da execução. Os factos

admissíveis dependem do título executivo em que se funda a execução. Como

escrevia Anselmo de Castro, o âmbito da oposição à execução compreende só e

todos os fundamentos que a natureza do título não exclua. Desta ratio resulta que

vamos encontrar, em razão do título executivo, tanto um sistema restritivo, como

um sistema não restritivo de fundamentos. Todavia, nada impede o embargante de

cumular fundamentos na mesma oposição a execução. Um sistema não restritivo de

fundamentos rege a execução de título diverso de sentença. Podem ser invocados

como causa de pedir os factos do n.º1 do artigo 729.º CPC, na parte em que sejam

aplicáveis (alíneas a), c), e) e g) da 1.ª parte) e quaisquer outros que possam ser

invocados como defesa no processo de declaração (artigo 731.º CPC). Já um sistema

restritivo de fundamentos taxativos rege a execução de títulos públicos judiciais e

judiciais impróprios. Assim, quanto a:

a. Sentença (incluindo sentença estrangeira), apenas os do artigo 720.º, alíneas

a) a g) CPC (corpo do artigo 729.º CPC);

b. Sentença homologatória apenas os do artigo 729.º, alíneas a) a h) CPC

(corpo do artigo 729.º CPC);

c. Sentença arbitral apenas os do artigo 729.º, alíneas a) a g) CPC e também,

pelo artigo 730.º CPC, aqueles em que pode basear-se a anulação judicial da

mesma decisão, sem prejuízo do disposto nos n.º1 e 2 do artigo 48.º

LAV/2011;

d. Requerimento de injunção ao qual tenha sido aposta fórmula

executória, fundamentos do artigo 729.º CPC, mas em certas circunstâncias

os do artigo 731.º CPC, além de certos fundamentos de conhecimento

oficioso (artigo 857.º CPC).

A ratio desta restrição de fundamentos é a tendencial imutabilidade do caso julgado

ou o princípio da preclusão no caso da injunção, que conduzem a não poder a

oposição servir para se discutir novamente o que se tenha decidido no âmbito da

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ação judicial ou procedimento anterior. Por esta razão, há preclusão da alegabilidade

dos factos que, podendo sê-lo, não foram invocados na contestação e que, apesar de

supervenientes, não foram alegados nem conhecidos. A despeito da aparente

diferenciação entre fundamentos em razão do título executivo pode, concetualmente,

dar-se-lhes um tratamento comum, apontando naturalmente as especificidades

determinadas por aquele mesmo título. Assim, há causas de pedir respeitantes à

relação processual e causas de pedir respeitantes à relação de dívida, incluindo a sua

demonstração por título executivo. Por outro lado, a função de defesa de um dado

fundamento será, consoante os casos, e nos termos gerais dos artigos 198.º e 571.º

CPC, e dos artigos 10.º, n.º5 e 713.º CPC, em especial, a de exceção perentória,

exceção dilatória, alegação de falta de condições de execução, arguição de nulidade e

a simples impugnação de facto ou de Direito.

2. Fundamentos comuns:

a. Exceções dilatórias: relativamente à relação processual o oponente pode

deduzir exceções dilatórias, ao abrigo do artigo 729.º, alínea c) CPC e, por

remissão, dos artigos 730.º, 731.º e 857.º, n.º1 CPC. A saber, entre outras:

i. A incompetência, quer absoluta, quer relativa, do tribunal;

ii. A nulidade de todo o processo;

iii. A falta de personalidade ou de capacidade judiciária de alguma das partes;

iv. A falta de autorização ou deliberação que o autor devesse obter;

v. A ilegitimidade de alguma das partes;

vi. A coligação indevida, quando entre os pedidos não exista a conexão exigida no

artigo 56.º, n.º1 CPC;

vii. A falta de constituição de advogado quando imposto pelo artigo 58.º CPC ou a

falta, insuficiência ou irregularidade de mandato judicial por parte do mandatário

que propôs a ação;

viii. A litispendência entre execuções (artigos 564.º, n.º1, alínea c), 577.º, alínea

i), 580.º, 581.º, n.º1 e 2 CPC).

Alguns destes vícios são sanáveis, pelo que, ex vi artigo 6.º, n.º2 CPC

(principio da oficialidade) deve o juiz da oposição promover oficiosamente a

sua correção por si próprio ou convidando o exequente ao suprimento

consoante o regime do vício.

b. Inexistência, inexequibilidade ou invalidade formal do título:

relativamente ao título executivo pode ser arguida a sua inexistência, i.e., a

não apresentação de título ou inexistência de aparência mínima de título,

como a sua inexequibilidade, ou seja a não verificação dos pressupostos dos

artigos 703.º a 708.º CPC ou de normas avulsas, ou ainda a sua nulidade

formal. A alegação de inexistência ou de inexequibilidade do título executivo,

ao abrigo do artigo 729.º, alínea a) CPC e, por remissão, dos artigos 730.º,

731.º e 857.º CPC, configura materialmente uma defesa por impugnação, já

que o executado nega o facto da existência do documento ou o seu valor

jurídico.

i. Em relação à sentença, em especial, esta não existe se o tribunal não

tinha poder jurisdicional ou está despida da parte decisória, exigida

pelo artigo 607.º, n.º3 CPC. Por outro lado, será inexigível a sentença

que:

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1. Não contenha uma ordem de prestação ou condenação;

2. Não esteja assinada pelo juiz;

3. Esteja pendente de recurso com efeito suspensivo (artigos 704.º. n.º1 e

647.º, n.º2 a 4 CPC);

4. Tenha sido revogada em recurso, ordinário ou extraordinário;

5. Sendo estrangeira não tenha sido revista e confirmada pela Relação

(artigos 978.º, n.º1 e 979.º CPC) ou não obedeça ao Regulamento

n.º1215/2012 ou à Convenção de Lugano.

Podem, ainda, arguir-se, indiretamente, vícios formais e materiais (i.e.,

quanto à questão de mérito) da sentença exequenda, originários, pois

dizem respeito à instância declarativa ou injuntória:

1. Exceções dilatórias – caso julgado anterior à sentença que se

executa (artigo 729.º, alínea f) CPC);

2. Nulidades originárias – a falta ou nulidade da citação para a ação

declarativa quando o réu não tenha intervindo no processo

(alínea d) do artigo 729.º CPC); a falsidade do processo ou

sentença declarativos (alínea b), 1.ª parte do artigo 729.º CPC)

que influa nos termos da execução;

3. Nulidade ou anulabilidade de confissão ou transação, na sentença

homologatória (alínea h) do artigo 729.º CPC);

4. Anulabilidade de sentença arbitral (artigo 730.º CPC);

5. Os fundamentos excecionais do artigo 857.º, n.º2 e 3 CPC, em sede

de execução de injunção.

Trata-se de vícios que não puderam ser alegados na ação declarativa

ou na injunção. Por isso, a lei admite que seja excecionado o princípio

da preclusão ou mesmo da imutabilidade do caso julgado. São,

necessariamente, fundamentos taxativos pelo que não se pode

invocar outros vícios da sentença ou injunção. Mas outros desses

vícios são objetivamente supervenientes, respeitando a formalidades

posteriores, e, por isso, também não poderiam ser alegados na ação

declarativa: a falsidade ou infidelidade do translado (alínea b), 2.ª

parte do artigo 729.º CPC) que influa nos termos da execução.

ii. Por seu turno, em relação aos títulos de crédito, há uma consistente

jurisprudência atinente a várias causas de inexequibilidade. Assim,

relativamente às letras e livranças tem sido afirmado:

1. Nas relações imediatas (entre subscritor, benificiário e quem

assina no verso), i.e., não tendo entrado em circulação, não

valem os princípios cambiários da literalidade e abstração (i.e.,

a letra é independente da causa debendi subjacente) e, por isso:

a. O executado pode opor:

a- Exceções fundadas sobre relações pessoais

como eventuais vícios ou inconsistência da

relação causal;

b- Demonstração de que nada deve ao

exequente, incluindo por extinção por

compensação;

c- Exceção do não cumprimento do contrato;

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d- Alteração das circunstâncias quanto ao

contrato subjacente.

b. O avalista pode invocar contra o beneficiário de

livrança em branco o preenchimento abusivo do

título de crédito ou a nulidade do aceite;

c. O avalizado pode invocar a prova da intenção de

prestar aval;

d. Pode ser invocado que a livrança foi subscrita e

avalizada como caução e garantia do bom pagamento

duma fiança prestada pelo exequente aos opoentes e

que a fiança foi extinta e por isso o exequente nunca

chegou a desembolsar fosse o que fosse.

2. Nas relações mediatas (i.e. fora da relação subjacente) ou perante

o portador decorre do artigo 17.º LULL, que o executado –

máxime, o avalista –, não pode opor as exceções fundadas

sobre as relações pessoais dela com terceiros, com o

subscritor avalizado, ou com os anteriores portadores, que

não o próprio pagamento da dívida, a menos que o portador,

ao adquirir a letra, tenha procedido conscientemente em

detrimento do devedor;

3. Nas letras de favor, ou seja em que o favorecente, normalmente,

figura na letra como aceitante, mas na realidade nada deve ao

sacador, servindo apenas de garantia:

a. O favorecente pode opor ao favorecido a convenção

de favor, porque nada deve e apenas quis com o favor

ajudar à obtenção do crédito ou facilitar a circulação

do título no interesse do favorecido;

b. Até lá a letra pode ser executada, mesmo por terceiro

endossado, aqui por se estar no domínio das relações

mediatas, desde que não se prove que estivesse a par

da inexistência de relação causal, uma vez que não há

da sua parte má fé ou consciência de prejudicar o

devedor – executado.

4. O pagamento parcial de uma letra de câmbio não lhe retira a validade

como título executivo, mesmo no caso de na letra não ter sido

feita menção do pagamento parcial;

5. No caso de desconto de letras que não foram pagas nos seus vencimentos,

tendo ocorrido a sua devolução pura e simples pelo banco

(sem que dos títulos conste qualquer reendosso) ao sacador

endossante, com a concomitante restituição, por parte deste

ao banco, das importâncias recebidas, se o sacador pretende

dar à execução esses títulos, de duas uma:

a. Risca os endossos a favor de entidade bancária

readquirindo assim a sua plena legitimidade como

portador dos títulos, nos termos do artigo 16.º LULL;

ou

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b. Terá que alegar no requerimento executivo os factos

justificativos da detenção das letras, i.e., de como

sucedeu ao banco endossado na qualidade de legítima

portadora dos títulos.

6. No caso da cláusula sem despesas não é condição da execução dos

direitos do portador de livrança contra o avalista, tanto o

protesto prévio por falta de pagamento, como a apresentação

a pagamento;

7. Na pluralidade de avales, vale a presunção do artigo 516.º CC,

de que os co-devedores solidários comparticipem em partes

iguais na dívida, ilidível na oposição à execução;

8. Constando do teor da letra o lugar onde a mesma deve ser paga, não

pode o título ser dado à execução sem que, para esse efeito,

o mesmo tenha sido aí apresentado;

9. A assinatura no lugar do aceitante em letra sacada contra uma sociedade

presume-se do respetivo gerente em representação dela; não

ilidida essa presunção a assinatura será considerada da sacada,

mesmo que se não faça referência expressa à representação;

10. Prescrita a obrigação cambiária de aval, apenas permanece a

obrigação do subscritor da livrança.

iii. Relativamente aos cheques, tem sido afirmado o seguinte:

1. Tratando-se de chegue de garantia competirá ao executado alegar

e provar que a relação fundamental que se pretendeu garantir

não tem causa ou fundamento ou se extinguiu ou se

modificou;

2. Cabe ao embargante, subscritor do cheque exequendo, emitido com data

em branco e posteriormente completado pelo tomador ou a seu mando, o

ónus da prova da existência de acordo de preenchimento e da sua

inobservância;

3. No cheque de conta coletiva, cada titular será único exclusivo

sacador nos cheques que emitiu, obrigando-se

cambiariamente com a aposição da sua assinatura, enquanto

os restantes titulares não passaram a ter a qualidade de

sacadores, nem se obrigaram cambiariamente.

c. Incerteza, inexigibilidade ou iliquidez da obrigação: correlativamente

ao artigo 713.º CPC, a incerteza, inexigibilidade ou iliquidez da obrigação

exequenda são fundamento de oposição, nos termos do artigo 729.º, alínea e)

CPC, por remissão, dos artigos 730.º, 731.º e 857.º CPC, caso não tenham

sido supridas na fase introdutória da execução. A alegação da inexigibilidade

da obrigação configura materialmente uma defesa por exceção perentória

impeditiva relativa à exigibilidade do crédito – v.g., se alega uma condição

suspensiva ou a exceção de não cumprimento do contrato. Por seu turno, a

alegação de incerteza ou de iliquidez é uma defesa por impugnação quanto

ao quid ou ao quantum do crédito.

d. Factos impeditivos, modificativos ou extintivos e impugnação do

crédito exequendo: além da inexigibilidade, incerteza ou iliquidez, podem

ainda o executado apresentar factos impeditivos, modificativos ou extintivos

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da obrigação exequenda, muitos dos quais parciais. Trata-se, claramente, de

exceções perentórias, conforme o artigo 576.º, n.º3 CPC. A sua sede

específica é o artigo 729.º, alínea g) CPC para onde remetem os artigos 730.º,

731.º e 857.º CPC. Alguma jurisprudência defende que esses factos devem

ter existência atual no momento em que são invocados, não podendo estarem

dependente de um evento futuro e incerto, máxime, sentença transitada em

julgado.

i. Os factos impeditivos consubstanciam a inexistência originária da obrigação seja

por:

1. Falta ou nulidade formal do seu título material, eventualmente

coincidente com o título executivo;

2. Nulidade não formal;

3. Falta de causa do aceite da letra ou livrança.

ii. Por seu turno, os factos modificativos podem ser, entre outros:

1. A modificação do contrato por alteração da circunstância, tanto na

oposição à execução de sentença, como em sede de artigo

731.º CPC, pois poderia ser deduzido na contestação;

2. Os factos que consubstanciam a inexigibilidade da obrigação, v.g.,

condição suspensiva, a exceção de não cumprimento, já

referidos;

3. A substituição do objeto da prestação ou do direito real;

4. A alteração das garantias.

iii. Finalmente, os factos extintivos consubstanciam o que na

jurisprudência se toma como inexistência da obrigação, incluída na

alínea e) do artigo 729.º CPC, por maioria de razão. Os factos

extintivos podem ser:

1. Comuns: é, por exemplo, a anulabilidade por incapacidade do

devedor, em sede do artigo 731.º CPC.

2. Específicos: são, nomeadamente:

a. Quanto às pretensões creditícias:

a- O cumprimento ou qualquer outra causa de

extinção da obrigação, como a

compensação da obrigação exequenda

(artigo 847.º CC) – tanto anterior à

execução, como por meio da petição à

oposição –, a dação em cumprimento

(artigo 837.º CC), a consignação em

depósito (artigo 841.º CC), a novação

(artigo 857.º CC), a remissão (artigo 863.º

CC) e a confusão (artigo 868.º CC);

b- A impossibilidade objetiva de cumprimento

da prestação (artigo 790.º, n.º1 CC);

c- A prescrição da dívida, por norma pelo

decurso do prazo ordinário, ex vi artigo

311.º CC, e sem prejuízo dos prazos mais

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curtos de prescrição de obrigações

cambiárias;

d- A extinção da causa do aceite ou de um

reconhecimento de dívida;

e- A falta de protesto.

b. Quanto às pretensões reais:

a- Causas de extinção do direito real

exequendo, além da anulabilidade (v.g.

artigo 1476.º CC);

b- A usucapião.

iv. Todavia, o executado pode outrossim impugnar a realidade dos factos

constitutivos do crédito que o autor apresenta no título executivo.

3. Fundamentos específicos:

a. Execução de sentença: tratando-se de sentença, ainda que administrativa,

há várias restrições à oposição de factos impeditivos, modificativos e

extintivos, constantes do artigo 729.º, alínea g) CPC. A relevância deste

objeto configura uma revisão de uma decisão transitada em julgado ou com

aptidão para transitar em julgado.

i. Como primeira restrição apenas se admite facto modificativo ou

extintivo que seja posterior ao encerramento da discussão no

processo de declaração. Manifestamente, no estrito plano literal,

apenas se estão a admitir factos objetivamente supervenientes: desde

que sejam posteriores ao encerramento da discussão no processo de

declaração onde a sentença foi proferida. Factos que em si mesmos

sejam posteriores a esse ato processual. Por isso, não podem ser

factos que, quanto à existência e conteúdo da obrigação exequenda

há tivessem sido definidos na sentença condenatória que serve de

título executivo ou pudessem ter sido alegados e, como tal, foram

precludidos pelo caso julgado – ou seja, factos velhos. Recorde-se

que essa alegação declarativa está sujeita ao princípio da concentração

temporal da defesa ao momento da contestação (artigo 573.º, n.º1

CPC) ou, sendo os factos supervenientes a esse momento, ao

momento do encerramento da discussão (artigo 588.º, n.º1 CPC). Há

no entanto, uma exceção a este regime de superveniência: o devedor

executado por credores solidários que não foram parte na ação

declarativa de condenação em prestação indivisível, legitimados ao

abrigo do artigo 55.º CPC, conserva o direito processual de invocar

exceções perentórias pessoais contra aqueles já que não o pudera

fazer no processo declarativo (artigos 531.º, 2.ª parte e 538.º, n.º2, 2.ª

parte CC). Em rigor, não chegara ainda a ocorrer preclusão perante

quem era terceiro. E se o executado não alegou esses factos, seja

porque deles não tinha conhecimento, sem culpa, ou não dispunha

do documento necessário para os provar? Ou seja, se forem factos

anteriores mas subjetivamente superveniente?

1. No plano literal, a questão parece estar resolvida, pelas razões

que já apontamos. Justamente, o Ac. STJ 25 novembro 2008/

08A1997 enunciou que factos anteriores, mesmo quando o

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executado deles não tinha conhecimento ou não dispunha do

documento necessário para os provar, não podem servir de

fundamento de oposição à execução.

2. No plano funcional, pode invocar-se ser incompreensível que na

ação declarativa se admita a superveniência subjetiva até ao

encerramento da discussão (artigo 588.º, n.º3, alínea c) CPC)

e não se admita o mesmo nesta nova instância.

3. Teixeira de Sousa: admite-os importando as situações que

permitiriam recurso de revisão de sentença (artigo 696.º,

alínea c) CPC) e laborando com a própria admissão de

oposição à execução superveniente no artigo 728.º, n.º2 CPC.

Afinal, se a superveniência subjetiva de um facto que pode

ser provado documental é relevante como fundamento de

recurso de revisão, não faz sentido que não o seja como

fundamento de embargos de executado, dado que a

procedência daquele recurso implica a inexequibilidade do

título executivo, fundamento possível de oposição à execução,

conforme o artigo 729.º, alínea a) CPC.

4. Temos para nós que foi opção do legislador não valorar o

conhecimento superveniente salvo em sede de recurso

extraordinário de revisão. Porventura, pretendeu-se que a

oposição operasse como uma revisão mais restrita. Se o

executado tiver um documento de que não tivesse

conhecimento, ou de que não tivesse podido fazer uso, no

processo em que foi proferida a decisão a rever e que, por si

só, seja suficiente para modificar a decisão em sentido mais

favorável à parte vencida tem de abrir uma revisão de

sentença e com a decisão favorável promover a extinção da

execução e/ou da venda que entretanto haja ocorrido (artigo

839.º, n.º1, alínea a) CPC).

Os factos objetivamente supervenientes incluem ainda os factos de

formação complexa como a compensação ou a usucapião, mas

dependentes de declaração de vontade para a produção de efeitos

jurídicos. Neste caso, somente são supervenientes os factos que

tenham concluído o seu iter formativo depois do encerramento da

discussão na 1.ª instância, pois só então pode a vontade negocial ser

exercida (v.g., por adquirir por usucapião). Por isso, não são

supervenientes usucapião ou compensação cujos pressupostos

objetivos já estivessem completos até ao encerramento da discussão

em 1.ª instância mas cujo pressuposto subjetivo da declaração de

vontade não tivesse tido lugar nos respetivos articulados, fosse como

exceção perentória extintiva ou, para quem o admita, compensação

reconvencionada. Justamente o artigo 860.º, n.º3 CPC exclui o direito

a benfeitorias que não haja sido oportunamente alegado. Neste

sentido o Ac. STJ 2 dezembro 2008/ 08A3355. Nessa eventualidade,

a declaração de vontade tanto pode ser emitida anteriormente à

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oposição à execução, como através da própria petição de oposição à

execução.

ii. Como segunda restrição, o facto que deve ser objetivamente

superveniente deve ter a qualidade de facto extintivo ou modificativo

da obrigação. A exclusão de factos impeditivos parece decorrer da

sua natureza necessariamente não superveniente. Por exemplo, a

nulidade é originária, existindo ab initio na relação controvertida. A

sua arguição deveria ter lugar na contestação, nomeadamente.

1. Todavia, Lebre de Freitas e Teixeira de Sousa têm chamado

a atenção para que pode ocorrer um facto impeditivo já

depois do encerramento da audiência de discussão e

julgamento em 1.ª instância.

iii. Por fim como terceira restrição, a alínea g) do artigo 729.º CPC dita

que as exceções perentória supervenientes apenas poderão ser

provadas por documento, ressalvada a prescrição do direito ou da

obrigação, a qual pode ser demonstrada por qualquer meio.

b. Execução de sentença homologatória: a execução de sentença

homologatória de confissão, transação ou, ainda, de partilha finda por acordo

ou deliberação entre interessados (artigo 48.º, n.º1 e 6 Lei n.º23/2013, 5

março), permite a oposição pelos fundamentos da sentença comum, ou seja,

do artigo 729.º, alíneas a) a g) CPC. A lei prevê ainda o fundamento específico

adicional da alínea h): qualquer causa de nulidade ou anulabilidade do negócio

processual da transação ou confissão. Efetivamente, o negócio processual

subjacente a uma sentença homologatória pode ser objeto de impugnação

autónoma tanto por ação de declaração de nulidade ou de anulação (artigo

291.º, n.º2 CPC), como por meio de recurso extraordinário de revisão de

sentença homologatória (artigo 696.º, alínea d) CPC). Por seu turno, a

sentença homologatória de partilha judicial pode ser emendada e anulada ao

abrigo dos artigos 70.º e seguintes Lei n.º23/2013, 25 março. Portanto, a

oposição à execução surge como um modo de impugnação – i.e., de

revogação – alternativo de uma sentença homologatória, a par dos modos

que lhe são privativos. Mas valerão estes taxativos fundamentos quando o

exequente dispondo de transação ou confissão celebrada extrajudicialmente,

i.e., sem ser por ter no processo (artigo 290.º, n.º1, in fine CPC), mas que veio

a ser homologada por sentença, leva à execução o documento autêntico ou

particular daquela, em vez de sentença?

i. Lebre de Freitas ensina que uma vez homologada, a exigibilidade é

como que absorvida pela sentença homologatória, de tal modo que

deixam na oposição à execução, de ser invocáveis fundamentos

admissíveis na ação declarativa que extravasem a enunciação do

artigo 729.º CPC, podendo o executado invocar na oposição à

execução que o negócio processual ainda não fora homologado para

ser admitido o fundamento extravazante.

ii. Pelo contrário, de modo moderado, para Teixeira de Sousa, as

possibilidades de oposição são mais amplas – artigo 731.º CPC dado

que não se verifica qualquer preclusão dos fundamentos desta

oposição.

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Não pode ser esquecido que ainda que extrajudiciais quanto às impugnações,

exceções, dilatórias ou perentórias, e nulidades, que o réu teve a oportunidade

processual de puder alegar antes da data de celebração do negócio processual.

Diversamente, todas as posteriores exceções e nulidades podem ser arguidas

ainda em sede de oposição à execução. Portanto, trata-se, afinal, do mesmo

regime de preclusão parcial decorrente da transação ou confissão judiciais: o

negócio dita o fim do processo (condicionado à sua homologação, todavia) e

a preclusão dos fundamentos de defesa deduzidos ou deduzíveis até esse

momento.

c. Execução de sentença arbitral: à execução de sentença arbitral podem ser

opostos os fundamentos do artigo 729.º, alíneas a) a g) CPC e os

fundamentos em que pode basear-se a anulação judicial da mesma decisão

(artigo 730.º CPC). Estes são os do artigo 46.º, n.º3 LAV/2011 (conforme o

artigo 48.º, n.º1 da mesma lei). Também aqui a oposição é um modo de

impugnação de uma sentença arbitral alternativo à anulação, mas em sede da

sua execução. Com a nova LAV acrescentou-se à letra do artigo 730.º CPC

aa ressalva do disposto nos n.º1 e 2 do artigo 48.º da Lei da Arbitragem

Voluntária, os quais tratam em pormenor dos termos em que esses

fundamentos podem ser apresentados.

d. Execução de requerimento de injunção. Remissão: tem-se discutido se

os fundamentos da oposição à sentença valem, também, para a oposição à

execução de injunção. Dado a matéria ser regulada pelo artigo 857.º CPC, em

sede de forma sumária, permitamo-nos trata-la nesse lugar.

e. Executado não devedor: terceiro garante e terceiro possuidor: importa

não esquecer que em certos casos o executado pode não ser o devedor: por

exemplo, em sede de artigo 54.º, n.º2 e 4 CPC.

i. Na situação do artigo 54.º, n.º2 CPC (terceiro garante)

necessariamente que o terceiro à dívida pode invocar causas de defesa

específicas, pelo menos. Assim, fará sentido que o executado garante

invoque causas próprias da sua posição jurídica, como a extinção da

garantia real que onera o seu bem. Por outro lado, poderá sempre

invocar fundamentos gerais não pessoais ao devedor, como a sua

ilegitimidade por não ter garantido o crédito, a incompetência do

tribunal (artigo 729.º, alínea c) CPC) ou a falsidade do traslado (artigo

290.º, alínea b) CPC), por hipótese. Todavia, o terceiro garante

hipotecário ou pignoratício, graças aos artigos 698.º, n.º1 e 678.º CC,

pode ainda opor ao exequente os meios de defesa que o devedor tiver

contra o crédito, ainda que o devedor a eles tenha renunciado. Trata-

se de uma substituição processual que tem lugar mesmo que o

terceiro garante esteja a ser demandado ao mesmo tempo com o

devedor, em litisconsórcio. Finalmente, por força do n.º2 daquele

artigo 698.º CC o terceiro garante pode opor uma exceção material

semelhante à que a lei civil concede ao fiador no artigo 642.º CC: tem

a faculdade de se opor ao pagamento forçado enquanto o devedor

puder impugnar o negócio donde provém a sua obrigação, ou o

credor puder ser satisfeito por compensação com um crédito do

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devedor, ou este tiver a possibilidade de se valer da compensação

com uma dívida do credor.

ii. Já no caso do artigo 54.º, n.º4 CPC o terceiro possuidor tanto pode

invocar a extinção ou inexistência do seu direito ou posse, como

fundamentos gerais não pessoais do devedor. Discutível é se este

executado, que é um terceiro possuidor, pode invocar que a sua posse

é incompatível com o âmbito da penhora, já que a penhora

necessariamente abrangeu o seu direito. Se ele não tivesse sido citado,

podê-lo-ia, em sede de embargos de terceiro, conforme o artigo 342.º,

n.º1 CPC.

1. Lebre de Freitas segue a via afirmativa: o terceiro possuidor

pode alegar na oposição à execução que a sua posse é

compatível com a penhora e a venda, como é a posse do

arrendatário.

2. É uma solução com a qual se concorda, não somente por

respeito pelos direitos de defesa da parte passiva, mas

sobretudo por, em bom rigor, o que se está a discutir é se o

citado tem legitimidade em face do artigo 54.º, n.º4 CPC. É

que a posse que nele se considera é a posse compatível com

o âmbito da penhora.

Por outro lado, e ao contrário do que sucede com o terceiro garante

do artigo 54.º, n.º2 CPC, parece que o terceiro possuidor não poderá

invocar a extinção do crédito, ou, pelo menos, meios de defesa que o

devedor pudesse ter contra o crédito. É que, na ausência de norma

de teor idêntico à do artigo 698.º, n.º1 CC, ele não pode atuar em

substituição processual do devedor. A exceção é, porém, a prescrição

da dívida, já que, para efeitos do artigo 305.º CC, trata-se de um

terceiro com interesse legítimo na sua declaração.

f. Fundamentos não previstos no artigo 729.º CPC: oposição por simples

requerimento: já sabemos que o artigo 729.º CPC consagra um sistema

restritivo de fundamentos taxativos na oposição à execução de títulos

públicos judiciais e judiciais impróprios. Todavia, desde sempre a doutrina

notou que esta taxatividade não esgota o leque possível de vícios que o

executado terá em interesse e ónus de alegar. A questão era particularmente

candente com a inexistência até à reforma de 1995-1996 de uma alínea como

a atual alínea c) do artigo 729.º CPC. Atualmente, embora, raríssimos após a

inclusão daquela alínea c), há ainda vícios que não cabem no artigo 729.º CPC

e que o juiz poderá, aliás, conhecer oficiosamente, embora de modo eventual,

em sede de despacho liminar ou de despacho sucessivo do artigo 734.º CPC.

São, nomeadamente, os caso de, como defende Lebre de Freitas, de erro na

forma de processo (artigo 191.º CPC), falta de indicação do valor da causa

no requerimento executivo (artigo 305.º, n.º3 CPC), falta de qualquer outro

requisito legal do requerimento executivo (irregularidade para efeitos dos

artigos 590.º, n.º3, 726.º, n.º4 e 734.º CPC). O meio próprio será o simples

requerimento, ao abrigo do artigo 723.º, n.º1, alínea d) CPC. Na verdade, ele

garante ao mesmo tempo o exercício do contraditório sem que o seu objeto

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apresente complexidade que exija um procedimento de tipo sumário, como

o da oposição à execução.

§33.º - Procedimento

Generalidades:

1. Pressupostos processuais. Regras de procedimento: tratando-se de uma nova

relação processual exige-se que o executado assegure a presença dos pressupostos

processuais positivos e comuns a qualquer causa. Assim, o tribunal da execução é o

competente para o apenso da oposição à execução, por força da regra do artigo 91.º,

n.º1 CPC de que o tribunal competente para a ação é também competente para

conhecer das questões que o réu suscite como meio de defesa. Por outro lado, a

remissão do artigo 732.º, n.º2 CPC para o processo comum declarativo, e que melhor

se verá adiante, determina que o julgamento da causa se faça perante juiz singular,

nos termos do artigo 559.º CPC. Por isso, está excluída a intervenção do tribunal

coletivo, mesmo quando o valor da causa é superior à alçada da Relação. Quanto às

partes, elas devem apresentar personalidade, capacidade e legitimidade, sendo o

executado (artigo 728.º, n.º1 CPC) e o exequente (artigo 732.º, n.º2 CPC),

respetivamente, o autor e o réu desta causa. Mas também o cônjuge de legitimidade

ativa, nos termos do artigo 787.º, n.º1 CPC, apesar de não ser executado. A oposição

à execução conhece normas próprias de procedimento, constantes dos artigos 728.º,

732.º e 733.º CPC. No mais, por se tratar de um incidente, observar-se-á o que vai

disposto nos artigos 293.º e 294.º ex vi artigo 292.º CPC.

2. Litisconsórcio inicial e superveniente: no caso de haver pluralidade de sujeitos

processuais, i.e., de executados e/ou de exequentes, tem-se discutido qual a sua

expressão no apenso declarativo. Vale aqui a boa doutrina de Teixeira de Sousa:

assim,

a. Na pluralidade de executados: ainda que em litisconsórcio necessário,

qualquer deles tem legitimidade singular para opor-se à execução, tal como

sucederia com a legitimidade para interpor recurso (artigo 634.º, n.º1 CPC).

Portanto, ao litisconsórcio necessário passivo não corresponde um

litisconsórcio necessário ativo em sede de oposição à execução.

b. Na pluralidade de exequentes: há litisconsórcio necessário passivo se o

fundamento de oposição lhes for comum, independentemente de aquela ser

voluntária ou necessária: incompetência do tribunal, incerteza, inexigibilidade

ou iliquidez da obrigação, falsidade do processo ou do traslado, etc. O

litisconsórcio passivo é sempre voluntário, por conseguinte.

Pode haver intervenção de terceiros na oposição à execução? A resposta é negativa:

intervenção de terceiro supõe uma extensão decisória da oposição, que ultrapassa a

respetiva função acessória de estrita extinção da execução. A jurisprudência vai

essencialmente nessa linha.

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Impulso inicial:

1. Petição inicial: a oposição à execução é substancialmente uma contestação ao

pedido executório, mas formalmente é uma petição inicial (Ac. RP 19 dezembro

2006/ 06B4137) já que constitui uma nova relação processual ao contrário do que

sucederia formalmente com uma contestação. Estando o direito exequendo já

certificado pelo título, nenhuma cominação relativamente à sua existência pode

decorrer da omissão processual do executado: ele não tem o ónus de oposição (como

se fora ónus de contestação) ou o ónus de impugnação especificada como nota Lebre

de Freitas. Tampouco valem regras probatórias como, por exemplo, o ónus objetivo

de prova (artigo 515.º CPC) pois nada se deve associar no plano probatório à falta

de oposição à execução. A petição inicial de oposição deve ser apresentada, num

prazo de 20 dias a contar da citação do executado, nos termos do artigo 728.º, n.º1

CPC. Todavia, por força da aplicação analógica do artigo 569.º n.º1, 2.ª parte CPC, o

prazo para a dedução da oposição à execução, na sequência da revogação do

despacho que indeferiu liminarmente o requerimento executivo, conta-se da

notificação ao executado do despacho que ordenou o prosseguimento da execução e

não da prévia citação. Além disso, se está pendente pedido de apoio judiciário na

modalidade de nomeação de patrono (artigo 16.º, n.º1, alínea b) LAD) o prazo para

dedução de oposição à execução interrompe-se com a apresentação de documento

comprovativo de ter sido requerido o apoio judiciário naquela modalidade, cessando

tal interrupção na data da notificação ao patrono nomeado ou de que o executado

teve conhecimento do indeferimento de tal pedido de apoio judiciário (artigo 24.º,

n.º4 LAD).

a. No plano formal: a petição inicial apresenta a estrutura e conteúdo de uma

comum petição inicial, nos termos do artigo 552.º CPC. Como tal, é

inadmissível a dedução de embargos de executado por simples requerimento

em que se remeta para a petição do co-embargante, sob pena de ineptidão.

Por outro lado, com a petição inicial deve o opoente arrolar as testemunhas

e, ou, requerer outras provas, por força do artigo 293.º, n.º1 CPC. Finalmente,

o executado pode com a petição de oposição requerer a substituição da

penhora por caução idónea, ao abrigo do artigo 751.º, n.º7 CPC. Não se trata

aqui de provocar a suspensão da execução, conforme o artigo 733.º, n.º1,

alínea a) CPC a contrario, mas de proteger o interesse patrimonial do executado,

obtendo-se o levantamento das penhoras já realizadas. Quanto ao valor da

causa de oposição, por se tratar de um incidente da instância, aplicam-se os

artigos 304.º, n.º1 e 307.º CPC. Em consequência, o valor da oposição é o da

execução a que respeita, salvo se tiver realmente valor diverso deste (artigo

304.º, n.º1 CPC); se, porém, o opoente não indicar o valor, entende-se que

aceita o valor dado à execução (artigo 307.º, n.º1 CPC).

b. No plano material do conteúdo funcional: a oposição à execução é, ainda

e sempre, o ato, por excelência, de reação a uma causa para o qual se é citado,

i.e., um ato de resposta a uma pretensão processual. Por isso, apesar de

alguma jurisprudência afirmar que o requerimento inicial de embargos se

apresenta como uma petição, pelo contrário, deve entender-se que esta

petição, por se configurar como um articulado de contestação do pedido

executório, segue o regime e princípios daquela. Todavia, ao mesmo tempo,

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é formalmente um articulado de impulso de uma ação declarativa eventual, o

que implica algum tipo de articulação entre aquele regime e princípios e o

regime da petição inicial. Daqui decorrem várias consequências:

i. A petição de oposição constitui o momento oportuno para deduzir toda a defesa,

regendo-se pelo princípio da concentração da defesa, nos termos do

artigo 573.º CPC. Por isso, não pode o exequente deduzir facto

posterior em outros embargos, nos termos do artigo 728.º, n.º2 CPC,

que não seja superveniente.

ii. Quanto ao regime de custas e seu comprovativo, a petição de oposição para efeitos

tributários deve ser equiparada à contestação e, por aí, regida, nomeadamente pelo

artigo 570.º CPC. Deste modo, não comprovado o pagamento da taxa

de justiça inicial em tempo, não deve a secretaria recusar-se a receber

a petição inicial, ao abrigo do artigo 558.º, alínea f) CPC, mas, sim,

no prazo de 10 dias a contar da apresentação da contestação, deverá

notificar o opoente para, em 10 dias, efetuar o pagamento omitido

com acréscimo de multa de igual montante, mas não inferior a 1 UC

nem superior a 5 UC. Apresentada a contestação do exequente ou

esgotado o prazo respetivo, sem que não tenha sido junto o

documento comprovativo do pagamento da taxa de justiça devida e

da multa por parte do opoente, ou não tiver sido efetuada a

comprovação desse pagamento, o juiz profere despacho nos termos

da alínea b) do n.º2 do artigo 590.º CPC, convidando o opoente a

proceder, no prazo de 10 dias, ao pagamento da taxa de justiça e da

multa em falta, acrescida de multa de igual valor ao da taxa de justiça

inicial, com o limite mínimo de 5 UC e máximo de 15 UC. No entanto,

não pode deixar de se aplicar o n.º6 do artigo 570.º CPC se, no termo

destes 10 dias, o executado persistir na omissão, o tribunal determina

o desentranhamento da petição de oposição à execução.

iii. Sendo equiparada a uma contestação, o prazo de 20 dias para dedução da

oposição apresenta natureza processual. Por isso, trata-se de um prazo

contínuo, conforme o n.º1 do artigo 138.º CPC e não um prazo de

caducidade como sucede com o prazo para embargos de terceiro.

Todavia, no Direito pretérito, discutia-se se o artigo 569.º, n.º2 CPC era

aplicável à oposição à execução. Por um lado, dir-se-ia – seria também o

nosso entendimento – que a natureza de contestação latu sensu imporia, nos

termos dessa norma, que quando terminasse em dias diferentes o prazo dos

20 dias por parte dos vários executados, a oposição de todos ou de cada um

deles pode ser oferecida até ao termo do prazo que começou a correr em

último lugar. Em sentido contrário – dominante, tanto na doutrina, quanto

na jurisprudência que a tratavam como verdadeira petição de autor – poder-

se-ia argumentar que a inexistência na omissão de oposição à execução do

efeito cominatório da revelia, própria da contestação (artigo 567.º, n.º1 CPC)

retirava necessidade de aplicação do preceito, além de que atrasaria o início

da fase da penhora posterior à citação. Acresce que numa ação declarativa as

várias contestações são tratadas em conjunto ao longo do processo, já nesta

ação acessória as várias petições de oposição não parece que tenham de ser

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decididas por sentença comum. A questão terá ficado resolvida com o n.º3

do artigo 729.º CPC que expressamente dita não ser aplicável à oposição

aquele n.º2 anterior à reforma de 1996-1997. E, portanto, o prazo para cada

oposição deve ser computado igualmente.

2. Recebimento e despacho liminar: a petição inicial da oposição à execução deve

ser entregue na secretaria de execução ou na secretaria do tribunal competente para

a execução. Há lugar a despacho liminar, que poderá ser de indeferimento, quando:

a. Tiver sido deduzida fora do prazo (artigo 732.º, n.º1, alínea a) CPC);

b. O fundamento não se ajustar ao disposto nos artigos 729.ºa 731.º e 857.º

(alínea b) do n.º1 do artigo 732.º CPC);

c. O pedido for manifestamente improcedente (alínea c) do n.º1 do artigo

732.º CPC);

d. Ocorram, de forma evidente, exceções dilatórias insupríveis e de que

o juiz deva conhecer oficiosamente (artigo 590.º, n.º1 CPC).

A dedução de pedido reconvencional na petição inicial é fundamento de despacho

liminar de indeferimento parcial, mas apenas e somente quanto a esse mesmo pedido.

Naturalmente que o despacho de aperfeiçoamento cabe, com o mesmo alcance do

artigo 590.º, n.º2 CPC, i.e., tanto para suprir exceções dilatórias, como para

aperfeiçoamento da petição inicial, por força do artigo 6.º, n.º2 CPC.

3. Efeitos da pendência: no regime anterior à reforma de 2013, se o despacho liminar

fosse de recebimento e tivesse havido citação prévia, salvo exceções, nãos e suspendia

a marcha do processo de execução. No Código posterior à reforma de 2013,

generaliza-se a qualquer forma de processo – i.e., independentemente do momento

da citação – a regra, agora decorrente do n.º1 do artigo 733.º CPC, de que o

recebimento dos embargos não suspende a marcha do procedimento executivo. As

exceções a esse efeito não suspensivo são:

a. O executado tiver consumado a prestação de caução (artigos 704.º, n.º5

731.º, n.º1, alínea a) CPC);

b. Tiver sido impugnado a genuinidade da assinatura de documento

particular, com apresentação de documento que constitua princípio de

prova (artigo 733.º, n.º1, alínea b) CPC): deverá aquilitar-se se, face à prova

produzida pelo embargante nos autos, a não genuinidade da assinatura

imputada ao executado é, séria e minimamente, consistente, mas

dispensando-se um juízo definitivo que apenas cabe em sede de decisão final

da oposição, bastando um juízo de probabilidade ou indiciário quanto a essa

não genuinidade;

c. Tiver sido impugnada, no âmbito da oposição deduzida, a

exigibilidade ou a liquidação da obrigação exequenda (artigo 729.º,

alínea e) CPC) e o juiz considerar, ouvido o embargado, que se justifica

a suspensão sem prestação de caução (artigo 733.º, n.º1, alínea c) CPC).

Em todo o caso, não devemos perder de vista que a própria oposição à execução

pode também ser suspensa nos termos do artigo 269.º CPC. Assim, poderá ser

suspensa, nomeadamente, ao abrigo do artigo 272.º, n.º1 CPC, por pendência de

causa prejudicial.

4. Prestação de caução: a prestação de caução pode ter por objeto qualquer das

formas admitidas pelo artigo 623.º, n.º1 e 2 CC. Uma vez que é ditada por razões

processuais, esta caução não pode considerar-se como garantia especial das

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obrigações do executado. A prestação de caução tem natureza incidental, nos termos

dos artigos 906.º e seguintes CPC, sendo processada por apenso à causa pendente,

embora com aplicação das regras próprias de processo autónomo (nomeadamente,

os artigos 913.º para a prestação espontânea de caução), com as especialidades

previstas no artigo 915.º CPC (o incidente é urgente, determina o n.º2 deste último)

e decorrentes da remissão do n.º6 do artigo 733.º para os n.º3 e 4 do artigo 650.º

CPC. Apenas o executado-embargante, na petição inicial ou após o despacho de

recebimento, a pode requerer para efeito de suspensão da execução e não está sujeita

a qualquer prazo, podendo ter lugar a todo o tempo: trata-se de simples faculdade do

executado e a execução só deverá ser suspensa depois e se prestada a caução. O

exequente será ouvido nesse procedimento, podendo impugnar o valor ou a

idoneidade da mesma (artigo 913.º, n.º2 CPC). Sendo impugnada, cabe ao tribunal

decidir da idoneidade da caução quando não houver acordo dos interessados,

conforme o artigo 623.º, n.º3 CC. A lei não define o critério para a avaliação da

idoneidade da caução. A jurisprudência aponta um critério funcional de avaliação

dessa idoneidade: é suficiente a caução que seja juridicamente admissível, em face da

lei (máximo, do artigo 623.º CC) e no plano fático seja objetivamente adequada –

pecuniária e temporalmente – a permitir, por si ou em complemento da penhora, a

satisfação da obrigação caucionada. A medida da adequação objetiva varia em função

do momento processual em que a caução vai ser prestada. Não havendo ainda

penhora a caução deve cobrir o pagamento da dívida, mais os juros se estes tiverem

sido pedidos, incluindo o tempo de mora acrescido pela suspensão tendo o opoente

o ónus de alegar e provar a dita suficiência. Havendo penhora ou garantia real, a

caução cobrirá apenas o eventual diferencial estimado entre o valor garantido pela

penhora e o estimado, após a mora processual, se necessário ou substituindo a

penhora, nos termos do artigo 818.º, n.º2, in fine CPC, não se duplicando as garantias

na parte já coberta. Mas também por isso mesmo se não houver diferencial, pode ser

dispensada a prestação de caução por já haver penhora real suficiente mesmo para a

mora processual. A caução pode ser prestada por terceiro.

5. Notificação pessoal: o exequente será, segundo o n.º2 do artigo 732.º CPC,

notificado para contestar em 20 dias. Esta notificação deve ser feita notificado

pessoalmente nos termos do artigo 225.º, n.º2 CPC ex vi artigo 250.º CPC, como bem

defende Lebre de Freitas et alia em respeito pelas garantias de defesa do exequente.

6. Oposição superveniente: o n.º2 do artigo 728.º CPC aceita que possa haver

oposição à execução deduzida depois deste momento, quando ela se baseie em factos

que ocorreram ou foram conhecidos depois daquele prazo inicial, i.e., os factos que

sejam objetiva ou subjetivamente supervenientes. Esses novos fundamentos terão

sempre de ser, naturalmente, os permitidos pelos artigos 729.º a 731.º e 857.º CPC.

Neste caso, corre um novo prazo de 20 dias sobre a ocorrência ou o conhecimento

do facto para o executado se poder opor novamente ou pela primeira vez, se ainda

não o fizera.

Contestação e sequência sumária: na contestação, o exequente pode:

1. Impugnar as exceções perentórias (incluindo a que causa a inexigibilidade da

obrigação), as exceções dilatórias negativas (v.g., litispendência) e as nulidades

formais do título executivo;

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2. Alegar os factos contrários aos que consubstanciam exceções dilatórias

positivas (v.g., competência internacional), inexistência de inexequibilidade do

título executivo ou a incerteza ou iliquidez do crédito.

Diversamente, não é admissível reconvenção, pelas razões da acessoriedade preliminarmente

já por nós explicadas. Por isso, a compensação será sempre invocável como exceção

perentória extintiva pelo executado, seja extrajudicial, i.e., já operada antes da execução, seja

judicial, operando na petição de oposição e mesmo que o seu valor seja superior ao do crédito

exequendo. Esta conclusão parece ser de manter mesmo no novo artigo 729.º, alínea h) CPC.

A respetiva sentença não serve de título executivo contra o exequente e a condenação do

exequente a pagar a diferença entre os créditos terá de ser obtida em ação declarativa

autónoma. O exequente, confrontado com o teor da petição de oposição não pode

unilateralmente alterar a causa de pedir da ação executiva. Relembre-se que essa alteração

objetiva apenas pode ter lugar em réplica, se o processo a admitir o que não é o caso. A

contestação do exequente não pode ser equiparada àquela. Não há, em regra, mais articulados,

como impõe o n.º2 do artigo 732.º CPC, sem prejuízo de às exceções deduzidas na

contestação poder o executado opoente responder na audiência prévia ou, não havendo lugar

a ela, no início da audiência final (n.º3 e 4). Todavia, alguma jurisprudência tem admitido

articulado ou requerimento do opoente de tomada de posição sobre documento oferecido

pelo exequente na contestação, ao abrigo dos artigos 415.º, n.º2 e 427.º CPC. A solução

deverá ser semelhante do processo sumaríssimo: oferecido novo documento, o opoente deve

ser notificado para responder oralmente no início da audiência que venha a ter lugar. Por

força do artigo 732.º, n.º3 CPC, à falta de contestação é aplicável o disposto no n.º1 do artigo

567.º CPC e no artigo 568.º CPC, i.e., consideram-se confessados os factos articulados pelo

opoente, sem prejuízo dos casos de revelia inoperante. Todavia, não se têm confessados os

factos que estiverem em oposição com os expressamente alegados pelo exequente no

requerimento executivo.

Saneamento, instrução, discussão e julgamento:

1. Procedimento: após a contestação, seguem-se os termos do processo comum

declarativo, como enuncia o artigo 732.º, n.º2 CPC.

2. Regime probatório: em matéria de ónus subjetivo da prova a regra aplicável na

oposição à execução é a geral: àquele que invocar um direito cabe fazer a prova dos

factos constitutivos do direito alegado, conforme o artigo 342.º, n.º1 CC, cabendo

contra quem o direito é arrogado um direito, fazer a prova dos factos impeditivos,

modificativos ou extintivos do direito invocado (artigo 342.º, n.º1 CC) ou impugnar

os factos constitutivos do direito do autor. Esta regra é material, aferindo-se pela

posição da parte na execução, e não pela estrita posição formal na oposição à

execução. Em consequência, é ao executado embargante, funcionalmente em posição

de demandado na execução, que cumpre alegar e provar os factos impeditivos ou

extintivos do direito que o exequente se arroga. Inversamente, caberá ao exequente

embargado, fazer prova dos factos impugnados ou dos factos constitutivos da sua

pretensão. A circunstância de ser o exequente a ter de fazer prova da causa de pedir

da pretensão executiva – os factos de aquisição do direito à prestação – mostra que

a respetiva demonstração decorrente do título executivo não substitui a prova proprio

sensu desses factos constitutivos, antes apresentando a força probatória de mera

aparência. Portanto, o resultado final de distribuição do ónus da prova é idêntico ao

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de ação de simples apreciação negativa, enunciado no artigo 343.º, n.º1 CC. Se essa

é a qualificação exata da ação de embargos de executado, ver-se-á de seguida. Na

oposição à execução, os meios de prova admissíveis seguem o regime comum. Esta

regra geral vale também para a prova da compensação extrajudicial ou dos seus

requisitos, se operada na própria oposição, não tendo o executado, como bem ensina

Lebre de Freitas, nomeadamente, se apresentar como prova um título exequível. Mas

desse mesmo regime comum de prova resulta a sujeição às inerentes restrições

probatórias. Em especial, por força dos artigos 395.º e 351.º CC, as partes do negócio

titulado documentalmente não podem usar de prova testemunhal ou por presunção

judicial, nos casos previstos nos artigos 392.º e 394.º CC. Todavia, já referimos que

na oposição à execução de sentença fundada em facto extintivo ou modificativo da

obrigação (artigo 729.º, alínea g) CPC), apenas é admissível prova destes por

documento, restrição probatória que não vale para as exceções fundadas em títulos

diversos de sentença. A ratio desta restrição está na autonomia que é dada à sentença

enquanto documento com força executiva: a certificação do direito feita em

documento judicial apenas pode também ser impugnada pela prova documental de

facto contrário ao facto nela enunciado. No entanto, como nota e bem Lebre de

Freitas, nada impede que esses mesmos factos venham a ser provados por o

exequente os vir a confessar no processo, como decorre do artigo 364.º, n.º2 CC. Da

restrição probatória, ressalva-se apenas e só prescrição do direito ou da obrigação, na

2.ª parte da mesma alínea g): ela pode ser provada por qualquer meio, nos termos

gerais e mesmo que seja sentença penal. A razão reside em o documento não ser o

meio de prova normal para o facto que levou à prescrição. Esta limitação ao direito

à prova tem sido criticada pela doutrina:

a. Lebre de Freitas: considera que ela introduz um desfasamento entre o

Direito substantivo e o Direito processual executivo, já que no plano das

regras de prova dos factos extintivos da obrigação, o Código Civil apenas

admite a exceção do seu artigo 395.º CC. Tal conduz a resultados de injustiça

material quando o executado dispõe de outras provas mas não de prova

documental. A moderação da solução legal passaria por estender a exceção

da 2.ª parte da alínea h) à usucapião bem como, nos casos semelhantes, em

que não é normal ou possível, ou se apresenta desnecessária, a prova

documental – v.g., a verificação de condição resolutiva.

b. Teixeira de Sousa: escreve que não se pode atender ao sentido literal, em

face da interpretação sistemática. Esta dita que a exigência de prova

documental só pode referir-se àqueles casos em que esse meio de prova

corresponda a uma imposição legal (como a estabelecida nos artigos 394.º e

395.º CC) ou em que, pelo menos, ela seja usual no comércio jurídico, como

a prescrição ou o cumprimento da obrigação de facere (artigo 868.º, n.º2, in fine

CPC). Fora desse âmbito, trata-se de uma restrição não razoável ao direito de

acesso à justiça do artigo 20.º, n.º1 CRP, como, por exemplo, as benfeitorias

não puderem ser provadas por perícia. Em suma: a adequação do meio de

prova não pode deixar de ser em função do facto a provar, como se garante

constitucionalmente.

c. Por nossa parte: pensamos que a ratio deste preceito probatório restritivo é

coerente com o sistema de impugnação de sentença transitada em julgado em

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matéria de facto: neste apenas se admite prova documental a suportar o

pedido de revisão de sentença (artigo 696.º, alínea c) CPC). Na verdade, a

questão é sistémica, ultrapassado o ponto estrito da oposição à execução. O

desfasamento, e concomitante, injustiça material, apontado por Lebre de

Freitas é, na verdade, um desfasamento que o legislador quer para todo o

sistema de revisão de sentença – pois funcionalmente, o artigo 729.º CPC

redunda em revisão de sentença, nas suas alíneas d), f), g) e h). Pessoalmente,

e sem prejuízo do alargamento proporcionado pelo artigo 868.º, n.º2, in fine

CPC, pensamos que, dentro do espírito da ratio, pode estender-se a prova

admissível tanto à confissão, como a meios de prova ainda mais seguros que

o meio documental, como sejam a inspeção judicial ou peritagem. Como

última salvação, resta ao executado que pague o que não deve, propor ação

de restituição do indevido, como, aliás, propõe Lebre de Freitas. O exercício

do direito de ação não conhece, nessa eventualidade, limitações probatórias.

Sentença: a sentença de oposição à execução deve ser proferida no prazo máximo de três

meses, contados da data da petição de oposição à execução, como impõe o artigo 723.º, n.º1,

alínea b) CPC. Sendo vários os opoentes, o prazo de 3 meses para oposição é contado

singularmente e não a partir da última citação de executado (artigos 728.º, n.º3 e 569.º, n.º2

CPC), como já vimos. A sentença de oposição à execução é impugnável nos termos gerais.

Efetivamente, dela pode caber recurso de apelação tanto em sede de artigo 853.º, n.º1, alínea

c) CPC, como, enquanto decisão que põe termo à causa incidental, em sede de artigo 853.º,

n.º1 CPC, remetente para o artigo 644.º, n.º1, alínea a) CPC. Já o recurso de revista é admitido

tanto pelo artigo 854.º CPC (ao remeter para o artigo 853.º, n.º1, alínea c) CPC), como pelo

artigo 870.º, in fine CPC. Havendo absolvição da instância numa oposição à execução, pode

o executado servir-se da faculdade prevista no n.º2 do artigo 729.º CPC? Ou seja, pode

intentar nova oposição no prazo de 30 dias, a contar do trânsito em julgado da sentença de

absolvição da instância? Em sentido contrário, lavraria o caráter acessório desta ação: ela

deveria ser sempre proposta no prazo do artigo 728.º, n.º1 CPC. Com o devido respeito,

temos de discordar desta doutrina: é certo que se trata de um prazo processual, como se viu

atrás. Mas trata-se de um entendimento contrário ao princípio constitucional favor actoris: as

normas processuais devem ser interpretadas e aplicadas potenciando a tutela e não

reduzindo-a. Ora, deve o juiz in casu lançar mão do princípio da adequação formal, plasmado

no artigo 547.º CPC, por a tramitação processual prevista na lei não se adequar às

especificidades da causa e aceitar a nova petição de oposição à execução, ouvido o exequente.

§34.º - Efeitos da sentença final

Sentença de forma: a sentença final da oposição à execução pode ter vários sentidos

possíveis, nos termos gerais, mas adaptado. Ela pode terminar na absolvição do exequente

da instância incidental quando o tribunal anule todo o processo de oposição à execução ou

se verifique uma exceção dilatória relativamente à própria instância de oposição à execução.

Nesta eventualidade, a instância executiva mantém-se. A sentença fará caso julgado formal,

nos termos do artigo 620.º, n.º1 CPC, pois recai unicamente sobre a relação processual. Tem,

assim, força obrigatória apenas dentro do processo.

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Sentença de mérito:

1. Generalidades: sentidos decisórios: se não decidir pela absolvição da instância

incidental, o juiz conhecerá do pedido de extinção total ou parcial da ação executiva

deduzido pelo executado. Havendo procedência o executado será absolvido da

instância executiva ou do absolvido do pedido executivo inicial – portanto, o

exequente não é condenado no pedido. A execução extingue-se, em consequência,

total ou parcialmente. Havendo improcedência, o exequente será absolvido do

pedido de embargos: a instância acessória extingue-se com o trânsito em julgado da

decisão e a instância executivo prosseguirá, total ou parcialmente.

2. Sentença favorável: efeitos processuais: a procedência da oposição à execução

dita vários efeitos processuais primários e secundários, estes relativos à penhora,

venda, custas e responsabilidade do exequente.

a. O efeito processual primário: está enunciado no artigo 732.º, n.º4 CPC:

sendo procedente, total ou parcialmente, o pedido de oposição à execução,

extingue-se a execução, no todo ou em parte. Esta procedência dever ser

definitiva, i.e., após o trânsito em julgado da decisão de embargos. Portanto,

se for interposto recurso de apelação da sentença, não se pode entender que

a causa se extingue provisoriamente. Trata-se, segundo Paula Costa e Silva,

de um resultado absurdo, que teria sido evitado, quer com a supressão do

n.º4 do artigo 732.º CPC, que, aliás, não faria falta, quer com a introdução do

vocábulo definitiva. Paradoxalmente, Lebre de Freitas/Ribeiro Mendes

escrevem que o n.º4 não corresponde a uma inovação, pois que a oposição,

quando procedesse, extingue a instância executiva, total ou parcialmente,

como sucede no lugar paralelo do artigo 734.º, n.º2 CPC. No entanto, se o

n.º4 não correspondesse a uma inovação, caberia, então, perguntar qual seria

a sua utilidade. Vislumbra-se sempre alguma: o preceito impõe

autonomamente o efeito extintivo da execução, quando antes era necessário

que o mesmo fosse verificado por sentença de extinção da execução.

b. Os efeitos processuais secundários são vários:

i. Conforme se dispõe no artigo 839.º, n.º1, alínea a), 2.ª parte CPC, a venda de

bens fica sem efeito salvo se quando, sendo parcial a procedência, a subsistência

da venda seja compatível com a decisão tomada.

ii. O exequente terá de pagar as custas tanto da execução, quanto do próprio

incidente de oposição à execução;

iii. As penhoras pendentes serão levantadas, embora por efeito da extinção da

execução;

iv. A procedência da oposição à execução pode ditar a sujeição a um pacote de sanções

ao exequente que promoveu a execução sem citação prévia do modo, pelo menos,

negligente. Constante do artigo 858.º CPC, relativo à forma sumária de

execução, onde, justamente, se penhora sem citação prévia.

3. Natureza da eficácia do caso julgado:

a. A questão na doutrina: impõe-se fixar o valor do julgado da decisão que

conhece do pedido do executado, independentemente de ser favorável ou

desfavorável ao autor. Terá efeitos extra-processuais ou apenas

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intraprocessuais? Poder-se-á, porventura, ensaiar uma divisão entre

fundamentos do pedido de oposição.

i. Na verdade, há fundamentos que, por respeitarem àquela concreta relação

processual executiva, nunca poderão suportar – novamente, ao abrigo do artigo

620.º, n.º1 CPC – efeitos senão quanto e para essa mesma execução: ocorrerá,

assim, caso julgado formal quando os fundamentos sejam relativos à

regularidade da instância executiva, nos termos exatos do artigo 278.º,

n.º1 CPC. A saber:

1. Exceções dilatórias (artigos 729.º, alíneas c), d e f) CPC e 857.º,

n.º3, alínea b) CPC);

2. Nulidades originárias ou supervenientes (artigo 729.º, alíneas b) e d)

CPC);

3. Nulidade ou anulabilidade de confissão ou transação, na sentença

homologatória (artigo 729.º, alínea h) CPC); e

4. Anulabilidade da sentença arbitral (artigo 730.º CPC).

Em suma: a sentença de oposição à execução que conheça do pedido

fundado em vícios processuais tem força obrigatória apenas dentro

do processo. Sendo considerada procedente a arguição do vício

formal, o juiz decretará a extinção da execução e o executado será

absolvido da instância executiva, como defendia Castro Mendes.

ii. Já todos os demais fundamentos são materiais: dizem respeito à causa de

pedir, ou seja, ao facto de aquisição pelo exequente de um direito a

uma prestação. Nomeadamente, respeitam à demonstração formal da

causa de pedir – a existência ou inexequibilidade do título da alínea a)

do artigo 729.º CPC – ou à existência e caracteres do direito:

1. Factos impeditivos, modificativos e extintivos da obrigação (artigo

729.º, alínea g) CPC);

2. Certeza, liquidez e exigibilidade do direito (artigo 729.º, alínea e)

CPC).

Ora, é amplamente discutido se a decisão que conheça de questões

atinentes à relação de dívida chega a alcançar valor de caso julgado

material. Podemos distinguir uma:

1. Posição positiva (Castro Mendes): a sentença de procedência

por inexequibilidade do título executivo, por incerteza ou

iliquidez da obrigação exequenda determina a absolvição da

instância executiva. Os demais fundamentos – inexigibilidade

do direito, factos modificativos, impeditivos ou extintivos –

e ainda o caso julgado anterior à sentença executada se

desconforme levariam a absolvição do pedido executivo, com

valor de caso julgado material. Deste modo, aquela decisão

pode ser invocada em qualquer ação futura, executiva ou

declarativa. Nomeadamente, evitar-se-ia uma dupla e

sucessiva execução do devedor.

2. Posição negativa (Ac. RP 4 julho 1996): decidiu que a sentença

que julgou os embargos de executado improcedentes não

pode atribuir-se força de caso julgado quanto à inexistência

real de um crédito do embargante para efeitos de

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compensação. Tal sentença implicaria tão só que, mesmo que

tal crédito exista, que não pode servir de fundamento à

procedência dos embargos. Na verdade, o caso julgado

material dos embargos diz apenas respeito à sua procedência,

nos termos constantes da respetiva decisão (Ac. RP 12 janeiro

1998) e não aos fundamentos, máxime, a existência do crédito.

3. Posição intermédia (Lebre de Freitas):

a. Até à reforma de 2003: defendia que a sentença que

conhecesse de questões materiais faria caso julgado

material, atenta a circunstância de a forma de

processo seguida – ordinária ou sumária – ter uma

forma quase tão solene como a do processo comum,

em que o contraditório estava plenamente

salvaguardado.

i. Por ela, transitaria em julgado material a

sentença de procedência enquanto definição

da situação de Direito substantivo reinante

entre as partes – a extinção da obrigação pelo

pagamento.

ii. Sendo de improcedência, os seus efeitos

cingir-se-iam em função da causa de pedir

invocada (negação dum fundamento da

pretensão executiva ou exceção perentória

contra ela), não impedindo nova ação de

apreciação baseada em outra causa de pedir,

mas impedindo nova ação com a mesma

causa de pedir.

b. Atualmente: perante as restrições probatórias

decorrentes da sujeição à forma sumária (artigos 732.º,

n.º2, 2.ª parte CPC), entende que apenas em concreto

se pode verificar se o direito à prova foi efetivamente

limitado, valendo mutatis mutandis o disposto no

artigo 332.º, alínea a) CPC, por analogia. A saber: o

caso julgado produzir-se; é, porém, admissível à parte

provar, em ação que autonomamente venha a ser

proposta, que as limitações de prova do artigo 789.º

CPC, a impediram de fazer uso de testemunhas que

poderiam ter influído na decisão final, sendo reaberta

a discussão da matéria de facto, mas a revogação da

primeira decisão apenas ocorrerá se as novas

testemunhas se revelarem efetivamente

determinantes duma convicção judicial de conteúdo

diverso do primeiro. Por isso, o efeito preclusivo das

exceções não deduzidas não se dissolve no caso

julgado: a exceção que o executado não invocou

como fundamento numa oposição pode ser invocada

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em outra, de outra execução. Novamente, esta última

não terá eficácia de caso julgado material mas pode

conduzir à restituição ao executado da quantia

conseguida na execução, pelo mecanismo da

restituição do indevido, no que é acompanhado por

Anselmo de Castro. Valeriam as regras do

enriquecimento sem causa devendo ser restituída

apenas a medida do enriquecimento do exequente,

conforme o artigo 479.º, n.º2 CC.

b. Posição pessoal; o novo nº.5 do artigo 732.º CPC: até certo ponto

concordamos com Castro Mendes; ou seja, em razão do fundamento,

podemos isolar alguns com aptidão para a respetiva sentença alcançar valor

de caso julgado material. Relembre-se que o artigo 619.º, n.º1 CPC dá essa

qualidade à decisão sobre a relação material controvertida. Mas falta saber

quando surge um tal objeto decisório nos embargos de executado e qual a

eficácia do respetivo caso julgado. Assim, já atrás escrevemos que o título

executivo é uma condição da ação – sem ela o credor não obtém o efeito

pretendido – mas de natureza formal. Negado o título, por falta, insuficiência

ou invalidade formal, o que se proferiu foi um juízo de não verificação do

título, i.e., nega-se a demonstração da dívida, mas não sobre a dívida em si

mesma. Por isso, a decisão respetiva conhecerá a qualidade de caso julgado

formal, enquanto pronúncia sobre se aquela execução conhece das condições

que permitem a sua admissibilidade. O executado é, assim, absolvido da

instância. Mas, também por isso, nova execução pode ser instaurada com

melhor título para o crédito. Por seu turno, a indeterminação da obrigação,

por incerteza ou por iliquidez, apenas pode obstar a uma concreta execução,

mas se alterada não obstará a outra. Já a exigibilidade integra a causa de pedir,

necessariamente complexa, enquanto facto acessório. Qualquer sentença

sobre a mesma terá potencial abstrato para alcançar valor de caso julgado

material, mas rebus sic standibus também: uma obrigação ainda não vencida na

data de uma dada execução, pode vencer-se em data posterior, máxime, por

verificação da condição suspensiva. Neste caso, o executado será absolvido

ou não do pedido. Finalmente, a decisão sobre a existência e validade da

obrigação exequenda também poderá por esse seu objeto alcançar valor de

julgado material como qualquer decisão sobre a aquisição, modificação e

extinção do direito à pretensão. Aqui se incluem ainda os vícios formais que

contaminam também o título executivo que seja o mesmo tempo o título

material do crédito. Falta, então, saber se a sentença de oposição à execução

que conheça destes fundamentos relativos à relação material controvertida

julga desta ou julga da existência da execução. É certo que pela procedência

obtém-se a extinção da execução. Portanto, pareceria tratar-se de uma ação

apenas sobre a relação processual. No entanto, pode, por outro prisma,

entender-se que esse efeito de extinção da execução é uma consequência

necessária mas secundária: ela tem lugar prejudicada pelo conhecimento da

questão ou fundamento da oposição à execução, tal como a verificação da

caus de revogação de uma sentença em sede de artigo 696.º CPC determina

a revogação ou anulação desta ou numa ação declarativa o julgamento dita a

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extinção da instância (artigo 277.º, alínea a) CPC). Na verdade, quando o

fundamento diga respeito à existência ou à exigibilidade da dívida a oposição

à execução surge como uma verdadeira ação de revogação de um título,

rectius, do respetivo efeito de certificação da aquisição de um direito a uma

prestação, nos requisitos prescritos. Neste sentido, o Ac. RE 8 julho 2004. A

revogação do título, como a revogação de sentença, tem lugar como

consequência da apreciação da situação de Direito substantivo reinante entre

as partes, para usar a expressão de Lebre de Freitas. Por outras palavras, o

conhecimento judicial de realidade efetiva da extinção ou modificação da

obrigação conhecida na sentença de oposição à execução afasta a presunção

de existência da dívida assente no título executivo. Portanto, em bom rigor,

o efeito alcançado de revogação do título executivo, é uma consequência no

plano formal do efeito principal de declaração de inexistência da dívida (plano

material). Portanto, o facto da inexistência não é apenas um fundamento

decisório da sentença – o que lhe retiraria valor de caso julgado, como

decorreria da regra geral da irrelevância dos fundamentos de defesa,

enunciada no artigo 91.º, n.º2 CPC –, mas é o próprio objeto da decisão

transitada em caso julgado. Como tal ganha força de caso julgado material,

nos termos do artigo 619.º, n.º1 CPC. E tratando-se de execução de sentença

a oposição à execução de título judicial surge próxima da revisão da sentença,

do artigo 771.º CPC, e, obviamente, da ação de anulação de sentença arbitral

ou de negócio processual. Por ela se vai atualizar ou substituir o conteúdo da

sentença objeto de caso julgado – se ainda há obrigação ou se já não há

obrigação – tal como na decisão recursória a revogação da sentença recorrida

é o efeito instrumental que permite atualizar ou substituir o conteúdo da

decisão recorrida. Na jurisprudência, o Ac. RL 9 dezembro 1999, veio

considerar que a pretensão formulada em embargos de executado,

implicitamente contida, no pressuposto, i.e., de ser absolvido do pedido, é a

de declaração judicial de que o embargante não deve a quantia exequenda.

Portanto, tanto a sentença que decide a oposição, como uma (eventual)

sentença revisória comungam do valor de coisa julgada material da sentença

inicial. Por outras palavras, não pode deixar de se lhe dar um valor de caso

julgado material à sentença respetiva enquanto revogação do que fora julgado.

A simplificação, máxime, em matéria probatória, do procedimento de

oposição não altera esta resposta. Naturalmente que, com Manuel Tomé

Gomes, bem se poderia perguntar se a redução apenas à forma sumária é

consentânea com o princípio constitucional do processo equitativo, quando

implique confinar a prova de uma causa que correria autonomamente

processo declarativo ordinário aos termos do processo declarativo sumário.

Pensamos que sim. A existência de contraditório, prova e apreciação judicial

são suficientes para assegurar esse efeito sobre a questão apreciada pois o

nível de garantias ordinárias impostas pelo artigo 20.º, n.º4 CRP não coincide

com a concreta formulação num processo de uma forma processual concreta

de tipo ordinário. A ser assim, não haveria caso julgado nos processos

sumários e sumaríssimos. De todo o modo, esta objeção viu-se diminuída

com a sujeição ao processo comum declarativo, embora com dois articulados.

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Essa alteração confirma, aliás, o mesmo pensamento. Por fim, e voltando a

uma visão global da oposição à execução, ela apresenta-se, no plano dos

efeitos, como uma ação de simples apreciação negativa de um pressuposto

processual na oposição com fundamento processual, e como ação de

revogação do título executivo por simples apreciação negativa da dívida ou

dos seus termos. Daí a nova solução enunciada no artigo 732.º, n.º5 CPC: a

decisão de mérito proferida nos embargos à execução constitui, nos termos

gerais, caso julgado quanto á existência, validade e exigibilidade da obrigação

exequenda.

4. Levantamento da caução: transitada a sentença final de embargos, e

independentemente do seu sentido, deve ser julgados extinta a caução associada ao

efeito suspensivo da pendência. Todavia, se a sentença foi de improcedência da

oposição à execução, então terá o exequente o direito ao montante do depósito

caucionado e só depois, caso este seja insuficiente, ao produto dos bens penhorados.

Relações com outros objetos processuais:

1. Generalidades: como nota Teixeira de Sousa, enquanto meio que obsta à execução

de uma obrigação, a oposição à execução pode concorrer com outros meios com

função próxima, máxime, sobre a eficácia da sentença. A saber concorrem com a

oposição à execução:

a. O recurso extraordinário de revisão da sentença exequenda (artigo 696.º

CPC);

b. A ação de anulação da sentença arbitral (artigo 46º. LAV/2011);

c. A ação de anulação de sentença homologatória (artigo 291.º CPC);

d. As ações em que se discuta e decidida a existência e/ou extensão do

crédito exequendo: a ação de simples apreciação negativa da obrigação

exequenda (artigo 10.º, n.º3, alínea a) CPC);

e. A ação de alteração de obrigação alimentar ou duradoura (artigo 619.º,

n.º2 CPC);

f. A ação de reivindicação do executado contra o exequente (artigos 1311.º

e 1315.º CC).

Este concurso é inegável se atribuirmos valor de caso julgado à apreciação produzida

sobre o direito exequendo.

2. Concurso com outras ações declarativas: podem ocorrer litispendências, nos

termos dos artigos 576.º, n.º2, 577.º, alínea i), 580.º e 581.º CPC, entre a oposição à

execução e uma outra ação em que se discute e decide a existência e/ou extensão do

crédito exequendo. De outro modo, não se evitaria a contradição ou repetição de

julgados entre as duas causas, nos termos do artigo 580.º, n.º2 CPC. Desse objeto

litispendente estão excluídos os objetos acessórios. Neste sentido, o Ac. STJ 29

setembro 2009, na senda de Lebre de Freitas, decidiu que o caso julgado marterial

circunscreve-se à obrigação exequenda, dele estando excluídas outras obrigações que,

por serem conexas, poderiam, na ação declarativa comum, dar lugar a uma cumulação

de pedidos ou a um pedido reconvencional, que não se compadecem com a função

instrumental da ação de oposição. Havendo sentença de oposição com valor de caso

julgado, o credor vencido em oposição à execução não poderá abrir nova execução.

Tampouco poderá o devedor vencido, consoante as situações concretas, colocar uma

ação autónoma de simples apreciação negativa da dívida ou pedir a restituição do

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indevido se já tiver pago uma obrigação extinta. A exceção de caso julgado impede-

o, nos termos dos artigos 576.º, n.º2, 577.º, alínea i), 2.ª parte, 580.º e 581.º CPC.

3. Prejudicablidade e autoridade de caso julgado com a revisão de sentença: no

caso de revisão de sentença ensina Lebre de Freitas que mesmo que o fundamento

de oposição à execução possa, eventualmente, ser também fundamento de recurso

de revisão de sentença para efeitos do artigo 696.º CPC – máxime, falsidade de

processo judicial ou traslado, facto subjetivamente superveniente provado

documentalmente, nulidade ou anulabilidade de confissão ou transação, falta de

citação para a ação declarativa (artigo 729.º alíneas b), d), g) e h) CPC) – a pendência

daquele recurso não suspende a execução (artigo 669.º, n.º3 CPC) pelo que o

executado tem o ónus de deduzir a oposição à execução. Porquê? Porque a identidade

de fundamentos não redunda em exceções de litispendência ou de caso julgado entre

o acórdão que julgará procedente a revisão de sentença e a instância de oposição à

execução, por o pedido ser diverso: ali a revogação de uma sentença já transitada em

julgado, aqui a extinção da execução por falta de exequibilidade, por facto material

ou por falta de pressuposto processual. No entanto, como se defendeu, a procedência

destes fundamentos do artigo 729.º, alíneas b), d), g) e h) CPC, é em si mesma uma

revogação de sentença, pelo que não pode deixar de haver uma relação de

prejudicabilidade entre os dois meios. Mas os fundamentos e momentos processuais

respetivos são independentes de um meio em face do outro. Por esta circunstância,

estando pendente aquele recurso extraordinário, pode qualquer dos juiz competentes,

usando o artigo 92.º, n.º1 CPC, suspender a instância, não parecendo existir uma

propriedade temporal entre elas, pelo que pode ser tanto uma, como a outra – a de

recurso ou a de oposição à execução – e não a que tivesse sido aberta em segundo

lugar. Todavia, se ao tempo da oposição à execução já há uma decisão de recurso, ela

terá autoridade de caso julgado sobre a decisão de oposição à execução, dada a

relação de prejudicabilidade: o conteúdo daquela será tido em conta nesta, o que

determinará o sentido do mérito da oposição à execução.

4. Prejudicabilidade e autoridade de caso julgado com a anulação de sentença

homologatória ou arbitral: impõe-se, por fim, esclarecer alguma das relações entre

a oposição e as ações de anulação de sentença, arbitral ou homologatória. Recorde-

se que, na falta de norma nesse sentido, devem entender-se que a pendencia daquela

ação de anulação não suspende os efeitos da sentença a anular, pelo que esta pode

ser, entretanto, executada. Justamente, já foi decidido que transitada em julgado

sentença homologatória e requerida a sua execução, esta não será suspensa pelo facto

de se haver intentado ação a pedir a nulidade da mesma transação. Todavia, não

parece que possam estar pendentes em simultâneo oposição à execução e algum

desses meios privativos, em mais. Pensamos que, como regra, podemos aplicar

novamente a doutrina que enunciámos para as relações entre o recurso de revisão e

a oposição à execução: como a identidade de fundamentos não redunda em exceções

de litispendência ou de caso julgado – o pedido é diverso: ali a anulação de uma

sentença já transitada em julgado, aqui a extinção da execução – há sim, relações de

prejudicabilidade entre os dois objetos processuais. Estas ditam que estando

pendente ação de anulação, poderá qualquer dos juízes suspender a respetiva

instância, ao abrigo do artigo 92.º, n.º1 CPC, ou quando já haja uma decisão de

anulação, ela tenha autoridade de caso julgado sobre a decisão de oposição à execução,

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o que determina o mérito da oposição à execução. Deste modo, poderão ser

repetidos fundamentos entre uma ação de anulação e a oposição à execução. No

caso de sentença arbitral, importa ter ainda em linha de conta as restrições previstas

na Lei da Arbitragem. Ou seja: o artigo 730.º, 2.ª parte CPC remete tanto para o

âmbito positivo, como para o âmbito negativo da anulação arbitral. Assim, no artigo

27.º n.º3 LAV determina-se que interposto recurso da sentença arbitral os

fundamentos de anulação só podem ser conhecidos nesse recurso e já não em ação

autónoma. Por isso, deve ser entendido que se o executado tem pendente recurso da

sentença não pode invocar na oposição à execução fundamentos de anulabilidade.

Por outro lado, o n.º3 do mesmo artigo, exclui a anulação por fundamento em

incompetência ou a irregularidade de constituição de tribunal arbitral quando a parte

tenha dele conhecimento oportuno. Naturalmente que esta exclusão vale para a

oposição à execução, também. Já no artigo 46.º, n.º4 LAV/2011, a exclusão refere-

se a qualquer fundamento: se uma parte, sabendo que não foi respeitada uma das

disposições da LAV que as partes podem derrogar ou uma qualquer condição

enunciada na convenção de arbitragem, prosseguir apesar disso a arbitragem sem

deduzir oposição de imediato ou, se houver prazo para este efeito, nesse prazo,

considera-se que renunciou ao direito de impugnar, com tal fundamento, a sentença

arbitral.

Limites subjetivos da eficácia decisória:

1. Pluralidade de exequentes: já atrás vimos que existindo pluralidade de exequentes,

há litisconsórcio necessário passivo se o fundamento de oposição lhes for comum,

pelo que a sentença os vinculará a todos nessa eventualidade. Fora desse caso a

sentença apenas terá efeitos para os que foram concretamente demandados. Os

demais são terceiros à causa declarativa, pelo que, embora sendo partes executivas,

não são abrangidos pela eficácia direta do caso julgado da sentença de mérito.

Quando muito poderão dela beneficiar secundum eventum litis (artigos 531.º e 538.º, n.º2

CC).

2. Pluralidade de executados: havendo pluralidade de executados, ainda que em

litisconsórcio necessário, qualquer deles tem legitimidade ativa para opor-se à

execução, tal como sucederia com a legitimidade para interpor recurso (artigo 634.º,

n.º1 CPC). Também por este lado, o caso julgado, formal ou material, apenas

vinculará os concretos executados e exequente(s) que foram partes na oposição à

execução. E quanto aos demais executados que não participaram dos embargos? O

ponto é controvertido:

a. Teixeira de Sousa: defende que se há litisconsórcio voluntário na ação

executiva a decisão pode aproveitar, i.e., por ser decisão favorável, aos demais

nos termos das alíneas b) e c) n.º2 do artigo 634.º CPC por analogia – se o

fundamento for comum (v.g., inexequibilidade do título), se o executado não

opoente for titular de interesse essencialmente dependente do interesse do

executado opoente (v.g., ser o terceiro garante do artigo 54.º, n.º2 CPC) ou

se o executado não opoente for um devedor solidário, salvo se for um

fundamento pessoal. Havendo um litisconsórcio necessário na execução,

novamente o artigo 634.º, n.º1 CPC dita que a decisão favorável aproveita

aos demais, apesar de não serem opoentes.

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b. Lebre de Freitas: critica esta proposta de solução, já que nem ocorre caso

omisso nem a analogia se verifica. Não há caso omisso, porquanto se o

litisconsórcio necessário for legal a extensão do caso julgado ao ausente

decorre da natureza do litisconsórcio, o mesmo sucedendo no caso de

litisconsórcio necessário natural não revestiria utilidade o prosseguimento da

execução apenas contra o executado que não se opôs à execução. Por outro

lado, se for litisconsórcio necessário convencional, é defensável que a não

dedução de oposição impede o executado de se prevalecer da situação

integradora do litisconsórcio, nem mesmo por um mecanismo de adesão

como o defendido por Teixeira de Sousa, dependendo do credor a execução

da obrigação apenas contra o executado que não se opôs à execução. Não há

caso omisso ainda nos casos de interesse dependente e de solidariedade

passiva, porque a lei civil já estatui o aproveitamento da decisão favorável

(nos termos do caso julgado secundum litis), sendo certo que, não se formando

caso julgado na ação executiva, esse aproveitamento dá-se, na oposição à

execução, em outras situações não previstas nas alíneas b) e c) n.º2 do artigo

634.º CPC. Não se verificaria, tampouco, analogia, nomeadamente no

interesse comum porque o aproveitamento dos efeitos favoráveis do recurso

dá-se, em afastamento das normas gerais, em virtude da figura da adesão ao

recurso, à qual não se vê equivalente na oposição à execução.

c. Pese embora a proximidade de natureza entre a oposição à execução e as vias

de recurso, a transposição in solidum do regime do artigo 634.º CPC

pede algum cuidado. Na verdade, apenas se deve fazer uso desse regime se

houver uma lacuna normativa e se apenas ele possa apresentar a melhor

solução.

i. Havendo litisconsórcio necessário discordamos de Lebre de Freitas: não se

pode distinguir entre os vários tipos de litisconsórcio. O artigo 33.º,

n.º1, in fine CPC não o faz e, tampouco, o artigo 634.º, n.º2, parte

inicial CPC. Pelo contrário, a letra deste último preceito postula um

elemento do próprio sistema: de que no litisconsórcio necessário o

recurso aproveita sempre ao não recorrente. O artigo 634.º, n.º2 CPC

não adianta, por isso, nada nesse ponto. A possibilidade de adesão é

ainda possível pelas regras gerais do artigo 311.º CPC, i.e., por

intervenção principal espontânea, a qual não conhece nessa sede

declarativa as restrições que vigoram no procedimento executivo.

Novamente, é desnecessário invocar o mecanismo do n.º5 do artigo

634.º CPC.

ii. Quanto ao litisconsórcio voluntário, se for unitário (artigo 1405.º n.º2 CC),

os opoentes representam os ausentes pelo que estes receberão a

eficácia da decisão final. Não sendo unitário, coloca-se, sim, a dúvida

da

1. Aplicação do regime comum – posição de Lebre de Freitas –;

ou

2. Aplicação do regime especial do artigo 634.º, n.º2 CPC –

posição de Teixeira de Sousa.

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O nosso entendimento é o de que a oposição à execução ao ser uma

ação e, em especial, quando tem fundamento material, está mais

próxima do recurso de revisão de sentença do que do recurso

ordinário. A ratio do artigo 634.º, n.º2 CPC é a de manter unidos os

sujeitos unidas pela circunstância de serem partes numa causa que

ainda está pendente. Ao contrário, essa preocupação desaparece

quando já terminou a causa, como sucede no recurso de revisão:

valem, por isso, quanto a este as regras substantivas comuns do caso

julgado secundum eventum litis (artigos 522.º e 635.º, n.º1 e 2 CC), nada

se prevendo de remissivo para o artigo 634.º CPC. E, naturalmente,

também será essa solução em sede de oposição à execução.

C – Forma sumária (dispensa de citação prévia à penhora)

§35.º - Pressupostos

Antes da reforma de 2013: já atrás se referiu que antes da reforma de 2013, a regra era a

de que a execução tinha lugar com a citação prévia. Ao mesmo tempo, por regra não havia

despacho liminar. Portanto, a execução sem aviso prévio ao executado tinha apenas lugar

quando a lei o previsse, seja diretamente, seja dependendo de despacho judicial. Por isto, era

central o artigo contendo os casos que já antes a 2008 mereciam o mesmo tratamento

procedimental. Mas o papel deste artigo não era definir quando não havia despacho liminar

mas, sim, definir quando não havia citação prévia – despacho liminar não havia, salvo nos

casos previstos expressamente num outro artigo. Nessa sequência processual,

manifestamente sumária, o agente de execução, após o controlo liminar necessário, deveria

prosseguir imediatamente para os atos preparatórios de penhora, se for uma execução:

1. Cujo título executivo, independentemente do valor da dívida, apresentasse

uma segurança jurídica judicial, por ser título executivo produzido em

processo judicial – assim, a decisão judicial ou arbitral e o requerimento de injunção

no qual tenha sido aposta fórmula executória;

2. Cujo título executivo apresentasse uma segurança jurídica administrativa, por

ter havido uma intervenção notarial ou de entidade equivalente – assim, o

documento exarado pelo notário ou entidade, por eles autenticado ou em que a

assinatura do devedor haja sido presencialmente reconhecida –, cumulada com

uma previa:

a. Interpelação extrajudicial se necessária ao vencimento de obrigação

de valor não superior à alçada da relação;

b. Interpelação judicial ou equiparada de cumprimento, ainda que a

obrigação já estivesse vencida, de obrigação de valor superior à alçada

da relação.

3. Cuja obrigação exequenda, estando vencida, independentemente do título,

seja de montante e expressão patrimonial da execução não socialmente

gravosa (o seu valor não ultrapassasse a alçada da relação e não foram indicados à

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penhora, pelo exequente, bem imóvel, estabelecimento comercial, direito real menor

que sobre eles incidisse ou quinhão em património que os incluísse).

Ora, o regime vinha a confirmar noutro artigo que imediatamente equivale a dispensa de

citação prévia, excecionando quando a citação prévia pelo agente de execução tivesse sido

requerida pelo exequente. Portanto, a lei permitia ao próprio exequente apresentar

requerimento de citação do executado, quando, de outro modo haveria lugar a dispensa de

citação prévia.

Depois da reforma de 2013:

1. Forma sumária legal: taxatividade do artigo 550.º, n.º2 CPC; a garantia de

citação prévia em razão da concreta penhora (artigo 855.º, n,º5 CPC). Forma

sumária judicial: dispensa de citação prévia (artigo 727.º CPC): depois da

reforma de 2013 permanece a regra de que a execução corre com citação prévia:

corresponde à forma ordinária, cujo procedimento estivemos a estudar

anteriormente. E novamente, a execução sem citação prévia à penhora, agora

autonomizada como forma sumária, apresenta-se com um âmbito taxativamente

determinado pela lei ou em consequência de procedência de requerimento de

dispensa de citação prévia. A forma sumária legalmente tabelada está no artigo 550.º,

n.º2 CPC. O seu âmbito é em parte coincidente com o do regime anterior,

confirmando as rationes legislativas anteriores, e noutra consubstancia uma alteração

a anteriores opções do legislador. Senão vejamos: segundo aquele n.º2 emprega-se o

processo sumário nas execuções baseadas em três categorias de títulos executivos:

a. Em decisão arbitral ou judicial nos casos em que esta não deva ser

executada no próprio processo;

b. Em requerimento de injunção ao qual tenha sido aposta fórmula

executória;

c. Em título extrajudicial de obrigação pecuniária vencida, garantia por

hipoteca ou penhora;

d. Em título extrajudicial de obrigação pecuniária vencida cujo valor não

exceda o dobro da alçada do tribunal de 1.ª instância, i.e., 10000€.

A previsão da alínea c) traduz um excesso de favor creditoris: seja qual for o montante

da obrigação exequenda, qualquer entidade bancária passa a poder executar sem aviso

o cliente com empréstimo hipotecário. Há aqui uma violação das garantias

constitucionais de defesa prévia pois não é uma restrição razoável. Mais: atribui-se a

certos credores uma celeridade processual na obtenção da penhora que viola o

princípio da pars conditio creditorum Por seu turno, a previsão da alínea d) comporta

uma significativa exceção à imposição de forma sumária. Efetivamente, dado o valor

não passar os 10000€, então, segundo o n.º5 do artigo 855.º CPC, a penhroa de bens

imóveis, de estabelecimento comercial, de direito real menor que sobre eles incida,

ou de quinhão em património que os inclua só pode realizar-se depois da citação do

executado, em consequência da aplicação do disposto no artigo 726.º CPC. Por

outras palavras, essa penhora, pela sua gravidade patrimonial, exige sempre e

excecionalmente despacho liminar e citação prévia, devendo o processo ser concluso

ao juiz para despacho nos termos do artigo 855.º, n.º2, alínea b) CPC. Por fim, manda

o artigo 727.º, n.º4 CPC seguir os preceitos da forma sumária – artigos 856.º a 858.º

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CPC – quando o exequente obtenha dispensa de citação prévia, por fundado receio

de perda da garantia patrimonial. Portanto, são casos em que de outro modo,

seguiriam o rito ordinário, fosse pelo artigo 550.º, n.º1, fosse pelo n.º3 do mesmo.

Podemos designá-la como forma sumária judicial, já atrás tratada. Em qualquer caso,

importa realçar que se está em sede de execução para pagamento de quantia certa.

Tanto a execução para entrega de coisa certa, como para prestação de facto, sujeitam-

se seja qual for o título executivo à regra da forma única enunciada no n.º4 do artigo

550.º CPC.

2. Garantia de forma ordinária (artigo 550.º, n.º3 CPC): porém, o n.º3 do citado

artigo 550.º CPC, retira da forma sumária um conjunto de situações para as quais se

garante sempre a forma ordinária. São situações em que tem lugar alguma forma de

incidente preliminar justificando, assim, um despacho liminar e também uma citação

prévia do executado. A saber:

a. Nos casos previstos nos artigos 714.º e 715.º CPC (diligências preliminares

de escolha e exigibilidade da obrigação);

b. Quando a obrigação exequenda careça de ser liquidada na fase

executiva e a liquidação não dependa de simples cálculo aritmético;

c. Quando, havendo título executivo diverso de sentença apenas contra

um dos cônjuges, o exequente alegue a comunicabilidade da dívida no

requerimento executivo;

d. Nas execuções movidas apenas contra o devedor subsidiário que não

haja renunciado ao benefício da excussão prévia.

3. Execução da sentença. Articulação com o artigo 626.º CPC: a forma da execução

de sentença para pagamento de quantia certa merece uma atenção particular. A regra,

já vimos, é ela correr na forma sumária, sendo o requerimento executivo deduzido

logo no processo declarativo e a sentença executada nos próprios autos e no mesmo

tribunal que a proferiu, ou por cópia em juízo de execução para onde é remetida com

urgência (artigo 85.º, n.º1 e 2 CPC), consoante o que decorre da LOSJ. Tal é a forma

imposta pelo artigo 626.º, n.º2 CPC, ao qual já tivemos oportunidade de aludir, e pelo

artigo 550.º, n.º2, alínea a) CPC, em relação de correspondência de âmbito objetivo

com aquele artigo 85.º CPC. A aparente repetição da imposição da forma sumária

entre o artigo 626.º, n.º2 e o artigo 550.º, n.º2, alínea a) CPC, visa garantir que a

sentença é sempre executada na forma sumaria, mesmo para os casos em que esta

não deva ser executada no próprio processo. O que se quer dizer? São as sentenças

que não sejam proferidas por tribunais portugueses (sentenças estrangeiras) ou que

sendo proferidas por tribunais portugueses não podem ser executados nos próprios

autos declarativos (artigo 85.º, n.º1 CPC) por falta ou indisponibilidade destes: por

exemplo, uma sentença civil proferida em processos penal, uma transação numa

providência cautelar.

§36.º - Especialidades

Tramitação inicial:

1. Antes da reforma de 2013: a execução com dispensa de citação prévia à penhora é

a forma do agente de execução. Assim, a admissão e controle liminar são de sua

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competência: não apenas os requisitos externos do requerimento executivo, mas

também os pressupostos processuais e as condições de execução. Em caos de duvida,

pode provocar o despacho liminar do juiz de execução. Ora, já vimos atrás como isso

se regulava em sede do regime pretérito. Sendo admitido o requerimento, o agente

de execução iniciava imediatamente as consultas e as diligências prévias à penhora e

procede à penhora.

2. Depois da reforma de 2013: no novo Código, determina o artigo 855.º CPC que o

requerimento executivo e os documentos que o acompanhem são imediatamente

enviados por via eletrónica, sem precedência de despacho judicial, ao agente de

execução designado, com indicação do número único do processo. Cabe, depois, ao

agente de execução:

a. Recusar o requerimento, nos termos em que a secretaria o pode fazer

em sede de artigo 725.º CPC;

b. Suscitar a intervenção do juiz, ao abrigo do artigo 723.º, n.º1, alínea d),

quando:

i. Se lhe afigure provável a ocorrência de alguma das situações previstas no artigo

726.º, n.º2 e 4 CPC, i.e., causas de indeferimento e de aperfeiçoamento liminares;

ii. Duvide da verificação dos pressupostos de aplicação da forma sumária.

Se, pelas causas de recusa, são verificados os requisitos externos e formais do

requerimento executivo, pelas competências de provocação de despacho liminar

judicial o agente de execução tem uma competência indireta quanto aos pressupostos

processuais e às condições da pretensão executiva. Se o requerimento for recebido e

o processo houver de prosseguir, o agente dá início imediato às consultas e diligências

prévias à penhora, conforme o artigo 855.º, n.º3 CPC. Depois importa distinguir:

a. Se forem consumados atos de penhora a citação do executado é feita

no ato ou até cinco dias a contar da efetivação da primeira penhora;

b. Se decorrerem três meses sem consumação de atos de penhora,

observa-se o artigo 750.º, n.º1 CPC, i.e., indaga-se da existência de bens

junto de exequente e de executado que deverá, por isso, ser citado. Nesta

última hipótese, pode extinguir-se:

iii. Sem citação do executado, no caso do exequente não indicar bens e se frustre a

citação pessoal daquele, não cabendo citação edital (artigo n855.º, n.º4 e 750.º,

n.º2 e 3 CPC);

iv. Com citação do executado, no caso de exequente e executado não indicarem bens

penhoráveis em 10 dias, termos gerais do artigo 750.º, n.º1 CPC.

Sendo apurados bens penhoráveis, prossegue a execução para penhora.

Citação: no Código Velho, o executado seria citado no ato da penhora, sempre que ele

esteja presente, ou, não estando, no prazo de 5 dias contados da realização da última penhora

e segundo os termos gerais – artigo 864.º, n.º2, conjugado com o artigo 808.º, n.º1 CPC. Essa

citação, necessária, acompanharia a citação, eventual, do cônjuge do executado e de credores

em condições de reclamar créditos, no mesmo prazo. No Código novo o artigo 856.º, n.º2

CPC contém o mesmo dispositivo normativo mas com uma significativa diferença: os cinco

dias são contados da efetivação da penhora. Isto significa que a defesa do executado pode

ter lugar consumado o primeiro ato da penhora. Por outro lado, ela antecederá, em princípio,

a citação do cônjuge do executado e dos reclamantes, visto esta passar a ter lugar concluída

a fase da penhora e apurada, pelo agente de execução, a situação registral dos bens, conforme

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o artigo 786.º, n.º1 CPC. Além dos elementos comuns e gerais já atrás apontamos, máxime,

os decorrentes do artigo 277.º, n.º1 CPC, o executado será ainda adicionalmente informado:

1. Do prazo de 20 dias para a dedução de oposição à execução e à penhora, conforme

os artigos 856.º, n.º1 CPC;

2. Do ónus da dedução de oposição à penhora em cumulação com a oposição à

execução (artigo 856.º, n.º3 CPC);

3. Se citado antecipadamente por falta de bens, ao abrigo do artigo 750.º, n.º1, 1.ª parte

CPC da cominação prevista no artigo 750.º, n.º1, 2.ª parte CPC;

Além disso, é, em simultâneo, notificado do ato da penhora (artigo 856.º, n.º3 CPC) pelo que

será também destinatário de algumas advertências, além de receber cópia do auto de penhora:

1. Da obrigação de indicação dos direitos, ónus e encargos não registáveis que recaiam

sobre o bem penhorado, e respetivos titulares e beneficiários, no prezo da oposição

e sob pena de condenação como litigante de má fé – artigo 753.º, n.º3, 1.ª parte CPC;

2. Do ónus de requerer a substituição dos bens penhorados ou da substituição da

penhora por caução (artigo 753.º, n.º3, 2.ª parte CPC, com remissão para o artigo

751.º, n.º4, alínea b) e 5 CPC).

Oposição à execução e à penhora: o executado, uma vez citado, dispõe de 20 dias para

deduzir embargos de executado e oposição à execução, cumuladamente. Era o que do artigo

856.º, n.º1 e 3 CPC. Por outro lado, no anterior regime, determinava-se que não havendo

lugar à citação prévia, o recebimento da oposição suspende o processo de execução, sem

prejuízo do reforço ou da substituição da penhora. Tal regime muda no novo Código: o

regime de suspensão aplicável à forma sumária é o da forma ordinária, i.e., do artigo 733.º

CPC, não havendo nenhuma especialidade. Deste modo, por regra, a oposição à execução

não tem efeito suspensivo, salvos os casos enunciados nas alíneas do seu n.º1 – máxime, se

for prestada caução pelo executado – e sem prejuízo da tutela do direito à habitação do n.º5.

E mesmo que apenas seja deduzida oposição à penhora, também aí apenas a prestação de

caução suspende a marcha do processo (artigo 785.º, n.º3 CPC). Seja como for, o credor não

pode ser pago sem prestar caução, enquanto estiver pendente a oposição à execução, como

garante o artigo 733.º, n.º4 CPC. Há, porém, uma novidade no artigo 856.º, n.º5 CPC: o

executado que se oponha à execução – e portanto mesmo que não se oponha à penhora –

pode na mesma requerer a substituição da penhora por caução que igualmente garanta os

fins de execução.

Oposição à execução de requerimento de injunção, em especial:

1. A questão até à reforma de 2013: a execução de requerimento de injunção ao qual

tenha sido atribuída força executiva, pela aposição da fórmula executória mercê uma

atenção especial. Ela é feita sem citação prévia, sejam na forma sumária, nos termos

do artigo 550.º, n.º2, alínea b) CPC. Ora, é controvertida a matéria dos fundamentos

da respetiva oposição à execução: serão os da sentença, dado ser um título judicial

impróprio, porquanto produzido em procedimento com audição prévia e preclusão

e passível de controlo jurisdicional, ou serão os fundamentos que assistem aos demais

títulos, visto não se estar perante uma sentença? Sobre esta questão tem havido,

essencialmente, dois entendimentos:

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a. Procedia a uma equiparação à sentença, dada a natureza processual

do meio, pelo que, em consequência, vigoraria também na injunção

um princípio de preclusão da alegação de factos não supervenientes.

Tipicamente, decidiu-se que só podem ser suscitadas questões que não

pudessem ter sido suscitadas em sede de oposição ao requerimento de

injunção, ou que sejam de conhecimento oficioso.

b. O segundo negava a aplicabilidade das restrições próprias da execução

de sentença .

A lei tomou posição na reforma de 2008: o disposto para os fundamentos de

oposição à sentença aplicava-se, com as necessárias adaptações, à oposição à

execução fundada em requerimento de injunção ao qual tenha sido aposta fórmula

executória, desde que o procedimento de formação desse título admita oposição pelo

requerido. Esta solução era todavia, considerada inconstitucional por Lebre de

Freitas por violar o direito de defesa: a norma só salvaria a ação executiva se

conforme com a diminuição de garantias (artigo 20.º, n.º1 CRP), pugnando o Ac. RC

13 dezembro 2011 pela aplicação do artigo 733.º CPC, de fundamentos irrestritos.

Ecoando esta linha, o Tribunal Constitucional pronunciou-se por três vezes neste

sentido, julgando inconstitucional a norma contida no artigo em questão (814.º, n.º2

Código pretérito), quando interpretada no sentido de limitar a oposição à execução

fundada em injunção à qual foi aposta fórmula executória. A ratio decisória respetiva

é esta: a norma em apreço, na medida em que limita injustificadamente os

fundamentos de oposição à execução baseada em requerimento de injunção a que foi

aposta fórmula executória, padece do vício de inconstitucionalidade por violar o

princípio da proibição da indefesa, enquanto aceção do direito de acesso ao direito e

aos Tribunais consagrado no artigo 20.º, n.º1 CRP. Colocando um ponto final na

discussão, o TC declarou com força obrigatória geral (Ac. TC n.º388/2013) a

inconstitucionalidade da norma constante quando interpretada no sentido de limitar

os fundamentos de oposição à execução instaurada com base em requerimentos de

injunção à qual foi aposta a fórmula executória, por violação do princípio da

proibição da indefesa, consagrado no artigo 20.º, n.º1 CRP.

2. Posição pessoal. A reforma de 2013: o que pensar?

a. No plano teórico: não podemos, com o devido respeito, concordar com os

doutos acórdãos: a presença de uma preclusão associada a um ónus de

exercício do direito de defesa em tempo adequado implica uma equiparação

à sentença, para efeitos de embargos à execução. Trata-se de uma solução,

aliás, normal nos sistemas processuais europeus: um título executivo pode ser

produzido pela maquinaria judiciária sem valor de caso julgado, em exercício

do direito à tutela jurisdicional efetiva do credor e com respeito pelas

garantias do devedor. Nenhuma proibição de indefesa é aí violada. Mais: o

cumprimento do direito de defesa é independente da eficácia final da medida

de tutela, i.e., da presença ou ausência da qualidade de caso julgado, mas já

exige a presença das regras da preclusão. A não ser assim, dar mais um

momento de defesa ao devedor é claramente violar, desproporcionalmente,

o direito de ação do credor. Portanto, a (eventual) inexistência de processo

jurisdicional – a ausência de um juiz – não acarreta por inerência uma

ausência preclusão dos fundamentos de defesa ocorreria. Há mais vida para

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além do caso julgado. Todavia, no plano legislativo concreto, as garantias

processuais apresentam-se formalmente aligeiradas no procedimento

injuncional português:

i. O requerido é notificado por carta simples, em caso de frustração da citação por

carta registada com aviso de receção (artigo 12.º, n.º1 e 4 Decreto-Lei n.º

269/98, 1 setembro) e em caso de convenção de domicílio (artigo 12.º-A,

n.º1 Decreto-Lei n.º269/98, 1 setembro);

ii. O requerido não é informado da cominação de preclusão dos fundamentos de

oposição à execução, em sede de artigo 814.º, n.º2 CPC pretérito;

iii. O procedimento não corre perante um juiz, mas perante uma entidade

administrativa;

iv. Não há um controle liminar sobre se dívida alegada pelo requerente tem suporte

fático, pois o requerente de injunção não tem de apresentar suporte documental à

sua pretensão.

Estes desvios tornam o exercício concreto da defesa injuntória bastante

enfraquecido. Por isto, o processo de injunção passará a ser conforme à

Constituição se o direito de defesa do devedor ficar formal e materialmente

salvaguardado:

i. A primeira condição é que se passe a exigir um efetivo conhecimento da citação,

por meio de registo postal.

ii. A segunda é a que o requerido seja informado da cominação de preclusão dos

fundamentos de oposição à execução, em sede de artigo 729.º CPC atual;

iii. O valor da injunção deveria ser rebaixado para 5000€ correspondente ao valor

até ao qual não se exige patrocínio judiciário (artigo 40.º, n.º1, alínea a) CPC).

Além do mais, o regime português da injunção deveria, ainda, estar

sintonizado com o regime da injunção europeia, do Regulamento n.º

1896/2006, do Parlamento Europeu e do Conselho, 12 dezembro de 2006.

Por isso, ainda que se possa manter o atual regime de citação com domicílio

convencionado, andou bem a reforma de 2013 no que dispõe no artigo 857.º

CPC. Por um lado, enuncia como regra, que se a execução se fundar em

requerimento de injunção ao qual tenha sido aposta fórmula executória,

apenas podem ser alegados os fundamentos de embargos previstos no artigo

729.º CPC, i.e., relativos à sentença, com as devidas adaptações. Mas admite

duas importantes exceções:

i. Tendo havido justo impedimento à dedução de oposição ao requerimento de

injunção: e desde que tempestivamente declarado perante a secretaria

de injunção, nos termos previstos no artigo 140.º CPC, podem ainda

ser alegados os fundamentos previstos no artigo 731.º CPC, nesse cas,

o juiz receberá os embargos, se julgar verificado o impedimento e

tempestiva a sua declaração;

ii. Independentemente de justo impedimento: o executado é ainda admitido a

deduzir oposição à execução com fundamento em questão material

de conhecimento oficioso que determina a improcedência, total ou

parcial, do requerimento de injunção ou na ocorrência de forma

evidente no procedimento de injunção de exceções dilatórias de

conhecimento oficioso.

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Enfim, parece-nos que a nova e definitiva declaração de

inconstitucionalidade por parte do Tribunal Constitucional além de partir de

postulados aos quais, com o devido respeito, não se adere conduz ao sistema

de injunção português e dos títulos executivo extrajudiciais a um beco. Se o

novo artigo 857.º CPC conhecerá uma breve vida, semelhante á do extinto

artigo 814.º, n.º2 CPC pretérito, apenas o futuro o dirá.

Responsabilidade do exequente: na execução sem citação prévia, o exequente está

sujeito a responsabilidade civil, multa e responsabilidade criminal, nos termos do artigo 858.º

CPC. A finalidade destas sanções é a tutela do devedor que foi executado com base na

aparência de dívida decorrente do título, sem possibilidade de contraditório prévio.

Pressupostos comuns são, justamente:

1. A procedência da oposição à execução;

2. A forma sumária dos artigos 855.º e seguintes CPC.

A penhora dos bens não é pressuposto, podendo apenas ser tida em conta para efeitos de

computo do dano. Isto é: o exequente pode ser responsabilizado mesmo sem penhora prévia

de bens. Contra a irrelevância do fundamento da oposição à execução, dir-se-ia que se pode

fazer sentido o exequente responder por colocar uma execução sabendo da extinção prévia

da dívida, será desproporcionado que responda pela menor qualidade da sua atuação na pura

instância processual, v.g., por ilegitimidade. Assim, não tem de ser, porém: ter-se-á de

demonstrar os demais pressupostos, não bastando a procedência da oposição do executado.

É que o que se pretendeu foi associar ao benefício do credor de dispensa de citação um

especial dever de cuidado processual. Ora, desse modo, a intensidade do dever de cuidado

variará muito em função do fundamento, podendo mesmo ser inexistente, máxime, quanto

a questões de forma como, máxime, falsidade do processo ou do traslado ou infidelidade

deste (alínea c) do artigo 729.º CPC), quando não lhe sejam imputável. Em suma: o caráter

amplo deste pressuposto nãos e traduz necessariamente numa automática e ampla

responsabilidade. Por seu lado, no Código reformado, a dispensa de citação abrange tanto a

legal como a requerida. A lei nada distinguiu, quando poderia ter feito se assim fosse

pretendido: a responsabilidade está reservada à dispensa legal de citação, por força da forma

sumária; todavia, não pode deixar de se aplicar – por maioria de razão – ao caso do artigo

727.º CPC, em que é o próprio exequente que estimula a falta de aviso prévio ao devedor.

Como pressupostos especiais da responsabilidade civil do exequente devem ser considerados:

o ato, a culpa, o nexo causal e o dano na esfera jurídica do executado:

1. O ato danoso: será, em rigor, uma sequência de atos processuais. Esta sequência

inicia-se sempre pelo requerimento executivo, conditio sine qua non, mas não suficiente

para a produção do dano. Haverá ainda que ocorrer um ato concretamente causador

de dano: o ato de penhora será o ato mais potencialmente danoso, mas também o

poder ser a simples constituição do putativo devedor como executado, pela citação,

dados os fastos que este terá de fazer para se defender. Na verdade, já vimos que

pode haver lugar a responsabilidade do exequente mesmo sem penhora de bens: o

que o artigo 858.º CPC comina é a execução sem penhora de bens; não a penhora

injustificada. Penhora ou citação são, em qualquer caso, os factos finais de um

processo iniciado pelo e por causa do credor;

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2. Os danos emergem em nexo causal daquela sequência de atos, porquanto está no

poder decisório do exequente evitá-los não colocando, precisamente, a execução;

3. A culpa consiste em o exequente não ter atuado com a prudência normal, como se

lê no próprio artigo 858.º CPC. Nisto há uma clara influência do artigo 374.º, n.º1

CPC, em que se procede à responsabilização do requerente cautelar quando não

tenha agido com a prudência normal. A exigência de culpa do exequente marca este

regime como sendo de responsabilidade civil subjetiva, necessariamente

extracontratual, não bastando, justamente se disse, a simples procedência da oposição

à execução. A culpa consiste em o executar pretensão exequenda que ele sabe ou não

pode ignorar ser ilegal, seja no plano do mérito, seja no plano estritamente processual.

A espécie de título executivo é um dos fatores a ponderar no juízo de culpa e na

aferição da prudência normal.

a. Assim, se o título executivo for uma decisão judicial ou arbitral, ou for

um requerimento de injunção – artigos 550.º n.º2, alíneas a) e b) CPC –, a

segurança que deles advém dá ao exequente uma justificação para o seu

comportamento que não poderá ter na execução de um contrato, que é mais

facilmente dada a atuações dolosas, como a falsificação ou ao interpretação

abusiva. Mas em reverso, se nesses casos, a culpa da desnecessidade da

execução será mais rara, todavia, será mais intensa e grave quando ocorra.

b. Quid iuris se a sentença foi, porém, obtida com litigância de má fé do

autor sabendo ele já da improcedência do pedido, mas não tendo o réu

alegado, aquela litigância? Parece precludir-se, com a extinção da instância

declarativa, a invocação desses factos, salvo se eles sejam continuados para a

nova e autónoma instância executiva.

O valor da indemnização é o valor do dano, seguindo as regras do artigo 564.º CC como

sucede em sede de artigo 374.º, n.º1 CC: prejuízo causado, lucros cessantes e danos futuros,

desde que sejam previsíveis. Não se aplica pois o artigo 543.º, n.º1 CPC. Esses danos podem

ser morais. Não se vê razão para não se aplicarem as regras gerais do artigo 570.º CC, de

culpa concorrente do executado para a produção do dano. A ação de responsabilidade será

colocada de modo autónomo? Como bem se relata no Ac. RP 2 fevereiro 2007, a lei não

determina expressamente que o direito do executado à reparação dos danos deva ser exercido

na própria oposição à execução ou em ação autónoma. Não se vislumbra impedimento

processual ao exercício desse direito na própria oposição. Como também não estará o

executado impedido de demandar em ação autónoma. O ponto é duvidoso, efetivamente: a

ligação material e prejudicial com a execução e com a oposição à execução, em especial,

aconselharia a que corresse por apenso, eventualmente, nos autos de oposição à execução.

Ademais, poupar-se-ia na passagem de certidões e traslados do processo executivo. Todavia,

levaria a que se prolongasse um procedimento executivo que se deve extinguir por falta de

causa. Tampouco faria sentido correr como apenso à oposição à execução pois obrigaria a

reabrir a respetiva instância. Por isso, parece ser mais curial que o lesado faça valer os seus

direitos em ação condenatória autónoma, à semelhança do que sucede em sede de artigo

374.º, n.º1 CPC. Independentemente da responsabilidade civil fica ainda o exequente

obrigado a pagar multa, verificados os pressupostos da causalidade e da culpa. Enquanto

responsabilidade civil se dirige à contraparte, a condenação em multa justifica-se com o abuso

do direito de ação executiva, por falta de causa. Nisto há alguma aproximação à sanção do

pagamento de custas em sede de artigo 535.º CPC. O valor da multa é o correspondente a

10% do valor da execução ou da parte dela que tenha sido objeto de oposição. A multa pode,

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porém, ser superior àquela percentagem, quando a obrigação exequenda seja de baixo valor,

já que ela tem de ser de pelo menos 10UC: ao contrário, pode ser inferior àquela percentagem

quando a obrigação exequenda seja de valor elevado, dado que ela não pode ser superior ao

dobro do máximo da taxa de justiça. Nada disto impede a responsabilidade criminal do

exequente, nos termos gerais, segundo a parte inicial do artigo 858.º CPC

II – Penhora

A – Objeto e sujeitos

§37.º - Delimitação primária

Funcionalidade. Objeto:

1. Noção e função: o termo penhora tanto designa

a. Um dado ato processual: a penhora é o ato processual pelo qual o Estado

retira ao executado os poderes de aproveitamento e de disposição de um

direito patrimonial na sua titularidade. A norma legitimadora para a realização

desse ato é, a do artigo 817.º CC de que tem o credor o direito de executar,

penhorando e vendendo, acrescentemos, o património do devedor, nos

termos declarados neste Código e nas leis de processo. Esse ato de penhora

não cumpre uma função sancionatória, mas uma função instrumental, qual

seja a de acautelar o exercício do direito de execução sobre o património do

devedor. Por aqui, a penhora desempenha, processual e instrumentalmente,

uma função de garantia (lato sensu) do cumprimento de obrigações. Esta

funcionalidade do ato de penhora explica o seu objeto e limites: o objeto há-

de ser o mesmo da venda executiva e os sujeitos cuja esfera é afetada hão-de

ser os mesmos afetados pela venda executiva. Em conformidade, o artigo

735.º, n.º1 CPC enuncia que estão sujeitos à execução todos os bens do

devedor suscetíveis de penhora que, nos termos da lei substantiva,

respondem pela dívida exequenda.

b. Uma fase ou conjunto-sequência de atos processuais: a penhora é o

conjunto-sequência de atos processuais de preparação, realização e

impugnação do ato de penhora. As operações materiais, identitárias da ação

de execução civil, enquanto factos jurídicos públicos no mundo privado,

começam a ter aqui a sua expressão. Essa linha de atos sucede ao impulso

processual executivo e, em regra, à citação do executado e antecede o

pagamento, incluindo-se neste a venda.

2. Objeto potencial e objeto concreto: o termo bem deve ser entendido com algum

cuidado, pois, justamente a penhora não tem como objeto imediato os bens, i.e.,

coisas ou prestações. Pelo contrário, se a penhora é instrumental em relação à venda

executiva e se por esta se transmitem direitos, então a penhora há-de incidir

imediatamente sobre direitos e só mediatamente sobre coisas e prestações, através da

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sua apreensão, i.e., da sua colocação à ordem do tribunal e esses direitos apenas

podem ser direitos passíveis de ser transmitidos a terceiro. Deste modo, o ato de

penhora tem por objeto toda e qualquer situação jurídica ativa disponível de natureza

patrimonial, integrante da esfera jurídica do executado, cuja titularidade possa ser

transmitida forçadamente nos termos da lei substantiva. Todavia, o objeto mediato

dos direitos determina o procedimento de penhora e, por isso, dos artigos 755.º CPC

em diante temos a penhora de coisa corpórea imóvel, de coisa corpórea móvel e de

direitos. O objeto de penhorabilidade, i.e., dos bens sujeitos à execução, assim

delimitado é o objeto tomado em abstrato, sem consideração do caso concreto. É,

se quisermos, o objeto máximo ou potencial de uma penhora. Sucede que tal não é

suficiente para determinar que bens podem numa dada ação ser penhorados. Na

verdade, dentro do objeto potencial de penhora, deve ser operada uma delimitação

concreta dos bens a penhorar em razão de:

a. Limites de lei substantiva: tanto quanto:

i. À responsabilidade (incluindo a limitação de responsabilidade e a

responsabilidade subsidiária); como quanto

ii. À transmissibilidade.

b. Exclusões objetivas especiais;

c. Proporcionalidade;

d. Adequação.

Em termos simples, numa execução são penhoráveis os bens do devedor que

respondendo substantivamente pela dívida, não esteja abrangidos por cláusulas

especiais de exclusão, e que, num plano global, componham uma penhora

proporcional na extensão e adequada na qualidade.

Âmbito subjetivo; bens em poder de terceiro: no plano subjetivo, a regra, coincidente

com aquela outra da legitimidade singular, tanto no artigo 817.º CC, como no artigo 53.º

CPC, é a de que apenas os bens do devedor estão sujeitos à execução. O n.º32 do artigo 735.º

CPC admite, porém, que nos casos especialmente previstos na lei, podem ser penhorados

bens de terceiro à divida. A condição, necessariamente, é que a execução tenha sido movida

contra o terceiro. O terceiro à dívida não pode ser terceiro ao processo. Por isso, há-de ter

legitimidade nos termos já atrás referidos. A saber:

5. Pelo artigo 54.º, n.º2 CPC um sujeito que tenha dado em garantia real de uma dívida

alheia a um bem seu;

6. Pelos artigos 818.º e 616.º, n.º1 CC: terceiro contra quem tenha sido obtida com

sucesso sentença de impugnação pauliana, i.e., ter havido um ato praticado em

prejuízo do credor.

Trata-se já de uma extensão subjetiva do âmbito primário da penhora a quem, ao contrário

do que sucede no n.º1, não é devedor, sendo terceiro à dívida. Deste modo, o devedor

subsidiário não está abrangido: fiador e sócio de sociedade de responsabilidade ilimitada,

entre outros, estão sujeitos à penhora nos termos do n.º1 do dito artigo 735.º CPC. Contudo,

ao mesmo tempo o terceiro é um executado ainda e sempre, pois a ação há-de ser movida

contra ele como manda o preceito. Por outro lado, determina o artigo 757.º, n.º1 CPC que

os bens do executado são apreendidos ainda que, por qualquer título, se encontrem em poder

de terceiro, sem prejuízo, porém, dos direitos que a este seja lícito opor ao exequente. Mas o

agente de execução deve indagar se esse título é o penhor ou o direito de retenção. Se assim

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suceder, fará constar do auto de penhora o domicílio do credor, para posterior citação para

a reclamação de créditos, nos termos do artigo 786.º, n.º1, alínea b) e 4 CPC). Esta

averiguação justifica-se por, em sede de reclamação de créditos, se ter restringido a citação

dos credores com garantia real, que não careça de ser registada, às garantias conhecidas

(artigo 786.º, n.º1, alínea b) CPC). A indagação dará a conhecer essa oneração não registada,

sendo certo que os respetivos titulares deixam de ser citados por edital e passam a sê-lo no

domicílio que tenha sido indicado no ato da penhora ou que seja indicado pelo executado.

Repare-se que aqui o objeto da penhora não é o direito de terceiro, mas todavia ela irá

restringir ou mesmo suprimir direitos de terceiro que não sejam licitamente oponíveis ao

exequente. Poder-se-ão penhorar bens de terceiro fora destes limites, consentido ele? Já foi

decidido que se há a possibilidade de a prestação ser feita por terceiro, bem como a execução

poder cessar por pagamento de terceiro, então, é lícito a nomeação pelo executado de bens

de terceiro, desde que o titular dos bens nomeados não se oponha à penhora (Ac. RP 25

junho 1996/ 9620491). Parece-nos que assim pode ser: os bens serão vendidos como sendo

do terceiro mas, justamente, para pagar a dívida do executado.

§38.º - Limites substantivos

Responsabilidade:

1. Regra: responsabilidade universal e imediata; exceções: a lei substantiva dita o

alcance máximo do objeto da penhora. Viu-se que o artigo 735.º, n.º1 CPC aponta

para os bens do devedor suscetíveis de penhora que, nos termos da lei substantiva,

respondem pela dívida exequenda, enquanto o artigo 817.º CC fala em património do

devedor. A este propósito importa considerar o que na lei substantiva se determina

quanto à relação entre os bens do devedor e a dívida: respondem todos ou

respondem alguns dos bens? Tanto para as pessoas singulares, como para as pessoas

coletivas a regra é a da responsabilidade universal e imediata, do artigo 601.º CC: pelo

cumprimento da obrigação respondem todos os bens do devedor suscetíveis de

penhora, sem prejuízo dos regimes especialmente estabelecidos em consequência da

separação de patrimónios. Importa ter em conta que este princípio conhece vários

desvios e exceções:

a. Podem existir limitações legais e convencionais de responsabilidade

que afastam a universalidade e a imediação da responsabilidade;

b. O próprio artigo 601.º, in fine CC ressalva os regimes especialmente

estabelecidos em consequência da separação de patrimónios. Ora, essa

segregação patrimonial pode ser:

i. Plena: opera-se uma restrição à universalidade da responsabilidade –

o património só responde por certa categoria de dívidas;

ii. Condicional ou imperfeita: opera-se uma restrição à imediação da

responsabilidade – o património responde primariamente por certas

dívidas e condicionalmente por todas as restantes.

Se o executado entender que foram penhorados bens em desrespeito a essas

limitações poderá, invocando a violação do concreto preceito, deduzir oposição à

penhora, ao abrigo das alíneas a) e b) do n.º1 do artigo 784.º CPC.

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2. Limitação legal e convencional de responsabilidade:

a. Quanto às limitações legais, considerem-se as seguintes:

i. Os sócios das sociedades por quotas e das sociedades anónimas têm a sua

participação social (artigos 197.º, n.º3 – sem prejuízo do artigo 198.º,

n.º1 – e 271.º CSC respetivamente);

ii. Havendo cessão de bens pelo devedor aos seus credores para que estes os liquidem

e repartam entre si o produto da venda (artigo 831.º CC), os credores

cessionários e os credores posteriores à cessão de bens pelo devedor

não podem penhorar esses bens (artigo 833.º, 2.ª parte CC), ao

contrário dos demais credores terceiros ao negócio da cessão e

anteriores à mesma;

iii. Os bens que o mandatário haja adquirido em execução do mandato e devam ser

transferidos para o mandante nos termos do n.º1 do artigo 1181.º CC não

respondem pelas obrigações daquele, desde que o mandato conste de documento

anterior à data da penhora desses bens e não tenha sido feito o registo da aquisição,

quando esta esteja sujeita a registo (artigo 1184.º CC);

iv. Os credores pessoais do fiduciário nãos e podem pagar pelos bens sujeitos ao

fideicomisso, mas somente seus frutos (artigo 2292.º CC), além dos demais bens

do devedor;

v. Pelos atos relativos à profissão, arte ou oficio do menor e pelos atos praticados no

exercício dessa profissão, arte ou oficio só respondem os bens de que o menor tiver

a livre disposição (artigo 127.º, n.º2 CC).

b. Por seu turno, os artigos 602.º e 603.º CC contêm, com diferentes soluções,

regimes de limitação negocial de responsabilidade:

i. O artigo 602.º CC dita que as partes podem, por convenção entre elas,

limitar a responsabilidade do devedor

1. A alguns dos seus bens (limitação positiva); ou

2. Que determinados bens sejam excluídos da execução

(limitação negativa), no caso de a obrigação não ser

voluntariamente cumprida.

Nada impede que essa limitação esteja sujeita a condições – incluindo

um gradus executionis – ou só opere para certas dívidas que o devedor

tenha perante o credor. Por outro lado, esta limitação tanto pode ser

contemporânea, como posterior à constituição da dívida. E, portanto,

por vontade das partes pode a responsabilidade tanto ser limitada,

como deixar de ser imediata. Quid iuris se os bens reservados para a

responsabilidade se desvalorizarem, deteriorarem ou perecerem? Sem

prejuízo de maior estudo, o que parece ser de entender é que, no

essencial, esse risco corre por conta do credor, sem prejuízo das

regras da resolução ou modificação do contrato de facto imputável

ao devedor, i.e., pelo qual ele estraga, deixa estragar ou aliena o bem

da responsabilidade. Nessa eventualidade, a atuação de má fé do

devedor há-de fundamentar uma resolução do acordo por parte do

credor. Todavia, a admissibilidade desta convenção conhece

restrições:

1. Não poderá ter lugar quando se trate de matéria subtraída à

disponibilidade das partes (v.g. artigo 2008.º, n.º1 CC): se o

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direito é indisponível, também o é a respetiva garantia

patrimonial.

2. Pode perguntar-se se as partes podem acordar que certos

bens do devedor responderão pela dívida, mesmo que eles

não cubram toda a dívida. A ser assim tal contrariaria o artigo

809.º CC, consubstanciando, de facto, uma renúncia

antecipada aos direitos ao cumprimento e à indemnização por

mora. A melhor solução parece ser ainda a de Pires de

Lima/Antunes Varela: esta disposição não autoriza que por

vontade das partes, a dívida seja inteiramente subtraída à execução

patrimonial, transformando-se uma obrigação civil numa obrigação

natural. Os autores propunham que na convenção se

deveriam sempre indicar bens, em quantidade que não seja

manifestamente inferior à necessária para a garantia dos

créditos. De outro modo, a cláusula seria fraudulenta.

Portanto, aparentemente, seria aceitável uma diminuição da

responsabilidade, desde que em concreto não esvazie de

eficácia o direito à execução, opinião que é partilhada por

Lebre de Freitas.

ii. O artigo 603.º CC regula um caso especial de limitação de

responsabilidade: numa doação ou em testamento os bens podem ser

deixados ou doados com a cláusula de exclusão da responsabilidade

por dívidas do beneficiário, respondendo somente pelas obrigações

posteriores à liberalidade, e também pelas anteriores se for registada

a penhora antes do registo daquela cláusula. Mas se a liberalidade tiver

por objeto bens não sujeitos a registo, a cláusula só é oponível aos

credores cujo direito seja anterior à liberalidade.

3. Separação plena de património: havendo plena autonomia patrimonial certos

bens só respondem por certas dívidas e mais nenhumas. É o que sucede no regime

da penhora em execução de dívidas de herança contra herdeiros, constante do artigo

744.º CPC: na execução contra o herdeiro só podem penhorar-se os bens recebidos

do autor da herança. Mas se os herdeiros depositaram em dinheiro aquilo que para

eles representa o valor do remanescente da herança que receberam, depois de pago

o passivo, esse depósito pode ser penhorado. Em qualquer caso, é ao âmbito da

herança que há que se atender para determinar a responsabilidade do herdeiro, quer

a aceitação da herança tenha sido feita a benefício de inventário, quer o tenha sido

pura e simplesmente. Outro exemplo de separação de patrimónios com autonomia é

dos bens afetos ao EIRL. Esses bens unicamente respondem pelas dívidas da sua

exploração, e não por outras, por força do artigo 10.º, n.º1 Decreto-Lei n.º 248/86,

25 agosto, sem prejuízo da ressalva operada pelo n.º2 do mesmo artigo.

4. Separação condicional de património; a responsabilidade subsidiária: não

havendo autonomia patrimonial temos um fenómeno de responsabilidade subsidiária:

para uma dada dívida há bens que respondem imediatamente pela dívida e outros

que só respondem condicionalmente – os primeiros não satisfazem o interesse do

exequente. Todavia, esta relação de subsidiariedade é mais ampla que o fenómeno da

separação de patrimónios, cabendo distinguir entre:

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a. Responsabilidade subsidiária real ou objetiva: a subsidiariedade tem

lugar no interior do património do executado, em resultado da existência de

separação de patrimónios. Há uma parte constituída por bens que está

delimitada, autonomizada dos restante património, na medida em que não

responde de imediato por qualquer dívida, mas por apenas pelo pagamento

de determinadas dívidas. Nesta subsidiariedade a condição de penhora dos

bens do executado que respondem em segunda linha é uma prognose

fundamentada de falta ou insuficiência dos bens do executado que poderiam

ser primariamente executados. Esta falta ou insuficiência pode ser feita valer

aquando da indicação de bens à penhora. É isso que, aliás, expressamente se

enuncia no artigo 745.º, n.º5 CPC. O regime processual da penhora numa

situação de responsabilidade subsidiariedade objetiva consta do artigo 745.º,

n.º5 CPC, justamente, completado pelos artigos 740.º a 742.º e 786.º, n.º1,

alínea a) e do artigo 752.º, n.º1 CPC.

b. Responsabilidade pessoal ou subjetiva: é entre as dívidas de dois sujeitos

– um devedor principal e um devedor solidário – e, consequentemente, entre

os respetivos patrimónios. Aqui a condição de penhora dos bens do devedor

subsidiário é, em regra, a verificação da falta ou do esgotamento – excussão

ou insuficiência concreta – dos bens do património do devedor principal.

Esse esgotamento só ocorre com um pagamento insuficiente resultante da

venda. O regime processual da penhora numa situação de responsabilidade

subsidiariedade subjetiva ou equiparada consta do artigo 745.º, n.º5 CPC.

5. Responsabilidade subsidiária objetiva;

a. Benefício de excussão real: as normas de Direito substantivo preveem

várias situações de bens que beneficiam de um regime de responsabilidade

subsidiária objetiva, no interior do património do devedor:

i. Bens comuns, sendo dívida própria, ou bens próprios, sendo dívida da

responsabilidade de ambos os cônjuges (artigos 1695.º e 1696.º CC);

ii. Bens onerados com garantia real a favor do credor (beneficium excussionis realis

– artigos 697.º CC e 752.º CPC).

iii. Na execução de dívidas:

1. Da associação sem personalidade jurídica, o património dos associados

que a contrario, após a penhora do fundo comum (artigo 198.º, n.º2

CC), e, na falta ou insuficiência daquele, o património dos restantes

associados, proporcionalmente à sua entrada no fundo comum;

2. Do titular do EIRL, alheias à exploração do estabelecimento, os bens

do EIRL, quando sejam, de modo comprovado, insuficientes os demais

bens do comerciante (artigo 10.º, n.º1 e 22.º Decreto-Lei n.º248/86 );

iv. Na execução de dívidas do sócio de:

1. Sociedade em nome coletivo (artigo 183.º, n.º2 CSC) ou de sócio

comanditado de sociedade em comandita simples (artigo 474.º CSC), os

bens restantes, após a penhora do direito aos lucros e à quota de

liquidação;

2. Sociedade civil, o direito aos lucros e à quota de liquidação, após a

penhora dos bens restantes (artigo 999.º, n.º2 CSC).

Os três primeiros casos merecem especial atenção, dada a sua importância e

complexidade. Todavia, a responsabilidade subsidiária objetiva conjugal será

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tratada em ponto especial de seguida. Ora, quanto ao artigo 697.º CC pode

dizer-se que nele se estatui que o devedor que for dono da coisa hipotecada

tem o direito de se opor não só a que outros bens sejam penhorados na

execução enquanto se não reconhecer a insuficiência da garantia, mas ainda

que, relativamente aos bens onerados, a execução se estenda além do

necessário à satisfação do direito do credor. Além do princípio de

proporcionalidade que aqui está também presente e ao qual voltaremos,

enuncia-se uma regra de responsabilidade subsidiária objetiva: os bens não

onerados só devem ser penhorados na falta ou insuficiência dos bens

onerados. Trata-se do referido beneficium excussionis realis. Diversamente, caso

o devedor não seja dono da coisa hipotecada ou, por outro modo, dada em

garantia real, mas sim um terceiro, já não há responsabilidade subsidiária. Tal

resulta a contrario do artigo 697.º CC. Por outras palavras, o devedor não tem

direito a que a penhora se inicie sob os bens alheios. Por essa razão, já vimos

que o artigo 54.º, n.º2 CPC admite que o credor possa executar logo o terceiro

e sozinho, sem que daí advenha ilegitimidade singular do terceiro ou então

ambos – devedor e terceiro – em litisconsórcio voluntário. Ora, este

benefício também vale para o penhor de coisas e privilégios creditórios ex vi

artigos 678.º e 753.º CC, mas quando entramos no artigo 752.º, n.º1 CPC

parecem levantar-se dificuldades de articulação. Neste lê-se que a penhora

inicia-se pelos bens sobre que incida a garantia real e só pode recair sobre

outro quando se reconheça a insuficiência deles (nos termos do artigo 745.º,

n.º5 CPC) para conseguir o fim da execução. Portanto, como ensinava

Anselmo de Castro estão aqui compreendidas todas as garantias reais,

incluindo os privilégios creditórios e os casos similares de separação de

patrimónios. Ou seja: além do que já se admite no Código Civil cabem ainda

todas as restantes garantias reais, incluindo penhor de direitos (artigos 679.º

e seguintes CC) e direito de retenção (artigos 754.º e seguintes CC); em suma,

as causas legítimas de preferência, conforme o artigo 604.º, n.º2 CC. A ser

assim, o artigo 752.º, n.º1 CPC contém uma norma de Direito material. O

arresto deve aqui ser também considerado equiparado a uma garantia real,

provisória embora. Lembre-se que o arresto tem os mesmos efeitos que a

penhora, por força do artigo 606.º CC e do artigo 391.º, n.º2 CPC, e em

particular dar no pagamento preferência ao credor, conforme o artigo 822.º

CC, perante qualquer outro credor que não tenha garantia real. Se o credor

tem um arresto a seu favor deve, pelo artigo 752.º, n.º1 CPC, a penhora

começar pelos bens penhorados. Independentemente de qualquer outra

consideração, como seja a de que o arresto caducar se não for promovida a

execução dos ditos bens em dois meses (artigo 395.º CPC), não faria sentido

que agredido licitamente o devedor no seu património, por meio de arresto,

essa agressão não se consolidasse de imediato. Repare-se que pelo arresto

esses bens ficaram, precisamente, reservados para uma ulterior penhora. Se

assim não pode ser para uma garantia real, também não pode ser para o

arresto, a despeito da sua provisoriedade, pois há sempre uma oneração. O

agente de execução está vinculado a esta norma, pelo que não pode deixar de

promover primariamente a penhora dos bens sobre os quais incida a garantia

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do exequente, salvo se o exequente tiver renunciado ou expressamente não

pretender exercer a garantia. Só na sua falta ou insuficiência irá penhorar

outros bens do devedor, embora no caso do artigo 54.º, n.º3 CPC somente

depois de ele estar na ação como executado. Se o executado entender que

esta subsidiariedade não foi respeitada, poderá, invocando a violação do

artigo 752.º, n.º1 CPC e do artigo 697.º CC, deduzir oposição à penhora, ao

abrigo da alínea b) do artigo 784.º, n.º1 CPC. Caso os bens onerados sejam

insuficientes, o agente de execução pode autonomamente fazer a penhora de

outros bens, ao abrigo do artigo 751º, n.º4, alínea b) CPC. Nesse caso, uma

vez que o beneficium excussionis realis visa a proteção do executado, o agente de

execução terá sempre de fundamentar a sua opção quando notificar as partes

da penhora, demonstrando a verificação do pressuposto legal da

subsidiariedade, ou seja, a insuficiência de outros bens – artigo 697.º CC. Este

pressuposto é reforçado na lei processual, pois aquela insuficiência tem de

ser manifesta segundo aquela alínea b).

b. Associações sem personalidade e EIRL: finalmente, temos os casos da

execução de dívidas da associação sem personalidade jurídica e do titular do

EIRL. Assim, e como se disse, na execução de dívidas de associação sem

personalidade jurídica, respondem, sucessivamente, o fundo comum, o

património dos associados que contriu a dívida e, na sua falta ou insuficiência,

o património dos restantes associados, proporcionalmente à sua entrada no

fundo comum (artigo 198.º, n.º1 e 2 CC). E, por seu lado, na execução de

dívidas do titular do EIRL alheias à exploração do estabelecimento,

respondem em primeiro lugar os bens do comerciante e, na sua insuficiência,

os bens afetos ao EIRL (artigos 10.º, n.º1 e 22.º Decreto-Lei n.º 248/86).

Esta subsidiariedade será objetiva ou será subjetiva? Trata-se, antes de mais,

de situações de pessoas judiciárias, em face do artigo 12.º, alínea a), ou em

que é discutível que o sejam, no caso do EIRL? Tal decorre, justamente, de

não terem personalidade jurídica, sendo patrimónios autónomos da

titularidade de uma pessoa jurídica. No caso das associações é duvidoso se

há um fundo comum que esteja afetado às dívidas voluntariamente assumidas

em nome da associação (artigo 198.º, n.º1, 1.ª parte CC), mas, ao mesmo

tempo, a titularidade substantiva dessas dívidas, não é da associação, pese

embora apresentar personalidade judiciária, ao abrigo do artigo 12.º, alínea b)

CPC e artigo 198.º, n.º3 CC. O mesmo se diga quanto aos bens do EIRL:

eles constituem um património autónomo destinado apenas às dívidas do

EIRL (artigo 10.º Decreto-Lei n.º248/86). Mas o devedor é o titular do EIRL

– daí o EIRL não ter personalidade judiciária – que vê, desse modo, a sua

responsabilidade limitada. Em ambos os casos, a condição de subsidiariedade

é a falta ou insuficiência, própria da subsidiariedade objetiva. Assim sendo,

sujeitam-se, ambos, ao regime da responsabilidade subsidiária objetiva,

podendo a penhora de bens de segunda linha ser logo primariamente

promovida (artigo 745.º, n.º5 CPC).

6. Responsabilidade subsidiária subjetiva:

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a. Fundamento substantivo: as situações de responsabilidade subsidiária

subjetiva previstas nas normas de Direito material são, nomeadamente, os

casos:

i. Da fiança,

ii. Do sócio de sociedade civil;

iii. Do sócio de sociedade em nome coletivo; e

iv. Do sócio comanditado de sociedade em comandita.

Já o avalista é devedor subsidiário mas solidário. Quanto ao fiador, como já

atrás enunciamos, na execução da obrigação afiançada é-lhe lícito recusar o

cumprimento enquanto o credor não tiver excutido todos os bens do

devedor sem obter a satisfação do seu crédito (artigo 638.º, n.º1 CC). Apenas

assim não será na fiança mercantil (artigo 101.º CCom) ou quando o fiador

tenha renunciado ao benefício da excussão prévia (artigos 640.º e 641.º, n.º2

CC). Por outro lado, se, para segurança da mesma dívida, houver garantia real

constituída por terceiro, contemporânea da fiança ou anterior a ela, tem o

fiador o direito de exigir a execução prévia das coisas sobre que recai a

garantia real, mesmo que os bens do devedor principal se hajam esgotado

(artigo 639.º, n.º1 CC). Esta proteção do fiador existe haja ou não benefício

de excussão prévia. Diversamente, se essa garantia real incidir sobre bens do

devedor principal, será irrelevante (enquanto tal) para o fiador: este reclamará

a excussão prévia dos bens do devedor principal, onerados ou não. Já será da

estrita legitimidade do devedor principal – não do devedor subsidiário –

invocar, em sede de oposição à penhora, a faculdade que lhe é concedida pelo

artigo 697.º CC, i.e., o benefício da excussão real. Finalmente, se a garantia

real foi constituída em bens do fiador este tem direito a que, na execução dos

seus bens, se comece pelos onerados, graças ao já conhecido artigo 697.º CC.

Quanto ao sócio de sociedade civil na execução de dívidas da sociedade o

artigo 997.º, n.º1 CC determina que os sócios têm responsabilidade pessoal e

solidária. Todavia, o n.º2 do mesmo artigo acrescenta que o sócio pode exigir

a prévia excussão do património social. Solução semelhante está prevista no

artigo 175.º, n.º1 CSC, relativamente ao sócio de sociedade em nome coletivo

na execução de dívidas da sociedade: responde subsidiariamente em relação

à sociedade, em solidariedade com os demais sócios. Identicamente opera

esse artigo 175.º, nº.1 CSC em sede de sociedades em comandita, ex vi artigo

465.º, n.º1, 2.ª parte CSC: cada um dos sócios comanditados responde

subsidiariamente pelas dívidas da sociedade.

b. Procedimento: a expressão procedimental da alegabilidade do benefício da

excussão prévia constava do artigo 828.º, n.º1 a 6 CPC. O regime respetivo

sofreu, tanto em 2003, quanto em 2008-2009, alterações de fundo, no sentido

de articular o momento e o modo de invocação do benefício da excussão

prévia com a nova tramitação inicial da execução. Em 2013, com a

clarificação da forma processual, retornou-se à simplicidade normativa,

anterior a 2003, no artigo 745.º CPC atual.

i. Antes da reforma de 2013: em sede de Código anterior a 2013,

sobressarem duas preocupações:

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1. Garantir a tutela da posição do devedor subsidiário: mesmo em caso

de dispensa da citação prévia;

2. Facilitar a invocação do benefício da excussão prévia: quer pela

antecipação da sua alegação, sem ter de se esperar pela

excussão dos bens do devedor principal, quer pela

consagração de um permanente direito de indicação de novos

bens do devedor principal por parte do devedor subsidiário.

Várias hipóteses se abriam no regime procedimental, consoante

contra quem fosse movida a execução, consoante houvesse ou não

citação prévia do devedor subsidiário e consoante o momento da

citação. Acrescia ainda a necessidade de adequar o regime da

invocação do benefício da excussão prévia.

ii. Depois da reforma de 2013: na reforma de 2013, o devedor subsidiário

que seja singularmente demandado tem a seu favor a garantia de

forma ordinária, por força do artigo 550.º, n.º3, alínea d) CPC, desde

que não haja renunciado à dispensa de citação prévia por fundado

receio de perda da garantia patrimonial, nos termos do artigo 727.º

CPC. A contrario, em todas as demais situações – execução de

devedor subsidiário que seja singularmente demandado, mas com

renúncia ao benefício da excussão prévia e execução conjunta de

devedor subsidiário e devedor principal – a execução seguirá, nos

termos gerais, a forma ordinária ou sumária conforme o que decorra

da aplicação dos nº1 a 3 do artigo 550.º CPC. Ora, o novo artigo 745.º

CPC (correspondente ao anterior artigo 828.º CPC anterior) vem

estabelecer um regime mais simples através do qual possa o devedor

subsidiário fazer valer os seus direitos específicos. Esse regime vale

seja qual for a forma do processo. Assim,

1. Se for execução movida contra o devedor subsidiário, singularmente ou

com o devedor principal: não podem penhorar-se os seus bens,

enquanto não estiverem excutidos todos os bens do devedor

principal. Para tanto, ele tem o ónus de invocar o benefício

da excussão prévia em requerimento, entregue no prazo da

oposição à execução (n.º1 do artigo 745.º, e o artigo 728.º,

n.º1 CPC), como objeção preventiva à penhora. Sendo

deferido o requerimento, suspende-se a execução quanto ao

devedor subsidiário, e de duas uma:

a. Se era execução do devedor subsidiário

singularmente: pode o exequente requerer a execução

contra o devedor principal, para o que será citado,

para pagamento integral, conforme o n.º2;

b. Se era execução contra o devedor subsidiário e o

devedor principal: prossegue a execução apenas

contra este. Mas, aqui, se a forma for sumária a lei não

é clara quanto aos termos da alegação pelo devedor

subsidiário do benefício da excussão prévia,

necessariamente, já depois da penhora. Parece-nos

que será no prazo das oposições (artigo 856.º, n.º1

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CPC) mas visto que a penhora já se consumou, não

mais será uma objeção preventiva à penhora, mas um

fundamento de oposição à penhora, previsto no

artigo 784.º, n.º1, alínea b) CPC. Aliás, era esta a

solução do já referido artigo 828.º (no seu n.º4) CPC

anterior.

2. Se for execução movida apenas do devedor principal: executam-se os

seus bens, mas se eles se revelarem insuficientes, pode o

exequente requerer, no mesmo processo, execução contra o

devedor subsidiário, que será citado para pagamento do

remanescente. Naturalmente que manda o princípio da

economia processual que esta solução valha para quando o

devedor principal haja sido citado supervenientemente.

Nessa eventualidade, o devedor subsidiário (que já invocara

com sucesso o benefício da excussão prévia) em vez de citado,

será notificado.

Como se previa anteriormente, continua a garantir-se no n.º4 do

artigo 745.º CPC que quando se houver de executar os bens do

devedor subsidiário, pode este indicar bens do devedor principal

adquiridos ou conhecidos supervenientemente. Nessa eventualidade,

susta-se a execução sobre os seus bens e prossegue-se a penhora dos

bens indicados. Novamente, parece estar pressuposto que o devedor

subsidiário já fizera oportuna invocação do benefício da excussão.

Disponibilidade e transmissibilidade:

1. Indisponibilidade: a penhora apenas pode recair sobre uma situação jurídica ativa

disponível de natureza patrimonial e cuja titularidade possa ser transmitida

forçadamente nos termos da lei substantiva. À cabeça não são penhoráveis as coisas

fora do comércio, por não poderem ser objeto de direitos privados, nos termos do

artigo 202.º, n.º2 CC:

a. Os bens do domínio público do Estado e das restantes pessoas

coletivas públicas, conforme a alínea b) do artigo 736.º CPC,

impenhorabilidade que se justifica por se presumir iuris et de iure de que tais

bens estão, pela sua própria natureza, afetos exclusivamente a fins de

utilidade pública;

b. Os bens que, pela sua natureza, não são suscetíveis de apropriação

individual.

Depois, cabe à lei substantiva fixar quais são os direitos que, embora dentro do

comércio, são indisponíveis i.e., renunciáveis pelo seu titular, ou que, embora

disponíveis, são intransmissíveis inter vivos objetiva ou subjetivamente. Uns e outros

são impenhoráveis. A penhora de direitos indisponíveis, intransmissíveis ou sem a

autorização exigida legal ou contratualmente é ilegal podendo constituir fundamento

de oposição à penhora ao abrigo da alínea a) do n.º1 do artigo 784.º CPC. Assim, são

indisponíveis o direito a alimentos, conforme o artigo 2008.º, n.º1 CC, declarando-

se expressamente a respetiva impenhorabilidade no artigo 2008.º, n.º2 CC. O mesmo

sucede, em regra, com o direito à sucessão de pessoa viva (artigo 2028.º CC). Por

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isso, não podem também ser transmitidos forçosamente e, para tal, penhorados.

Também os créditos provenientes do direito à indemnização por acidente de trabalho

são inalienáveis, impenhoráveis e irrenunciáveis (artigo 302.º CT).

2. Instransmissibilidade objetiva: há direitos disponíveis mas que são

intransmissíveis em razão do seu objeto. A este respeito a alínea a) do artigo 736.º

CPC define genericamente como absolutamente impenhoráveis as coisas ou direito

inalienáveis. Em concreto, são direitos legalmente intransmissíveis:

a. O direito de uso e habitação o qual, constituído intuito personae, não pode

ser trespassado ou locado, nem onerado por qualquer modo (artigo 1488.º

CC);

b. A servidão predial, pois apenas pode ser penhorada com um dos prédios a

que pertencem, ativa ou passivamente (artigo 1545.º CC);

c. O direito ao arrendamento pela regra do artigo 1038.º, alínea f) CC: o

locatário está obrigado a não proporcionar a outrem o gozo total ou parcial

da coisa por meio de cessão onerosa ou gratuita da sua posição jurídica,

sublocação ou comodato, exceto se a lei o permitir ou o locador o autorizar.

Ao contrário, o arrendamento para fim não habitacional pode ser abrangido pela

penhora de estabelecimento comercial, incluído na relação de elementos do

estabelecimento (artigo 782.º, n.º1 CPC), porque pode ser transmitido sem

consentimento do senhorio (artigo 1112.º, n.º1, alínea a) CPC). Naturalmente que

casuisticamente poderão apurar-se mais inalienabilidades legais. Mais genericamente

são sempre inalienáveis os bens cuja alienação seja nula, nos termos do artigo 280.º

CC, por objeto contrário à lei, ordem pública ou ofensivo dos bons costumes. Por

outro lado, pode haver direitos contratualmente intransmissíveis.

3. Instransmissibilidade subjetiva: mas pode ainda a transmissão do direito

disponível e alienável estar subjetivamente limitada ou restringida na esfera jurídica

do respetivo titular. Nas situações de limitação subjetiva da transmissibilidade esta

está pelo direito substantivo na dependência de autorização de terceiro ao direito,

decorrente de acordo entre as partes ou de disposição legal.

a. No caso do curador, exige-se a sua presença na causa, nos termos do artigo

10.º, n.º1 CPC.

b. Por seu turno, o cônjuge deve ser citado nos estritos limites do estabelecido

na lei de processo: seja porque ou ambos os cônjuges são executados, seja

porque sendo executado um deles, o outro será citado após a penhora nos

termos do artigo 786.º, n.º1, alínea a), 1.ª parte CPC (se aqueles forem bens

próprios do executado) ou 2.ª parte conjugada com o artigo 740.º CPC (se

aqueles bens forem comuns), para obtenção do estatuto processual do artigo

787.º CPC.

Mas, todavia, em qualquer dos casos, curador ou cônjuge, não estarão na causa para

dar o seu consentimento à penhora. As razões são diversas:

a. Quanto ao curador: a penhora, sendo um ato de execução forçada com

eficácia oneradora (artigos 819.º, 820.º e 822.º CC) e preparatório de um ato

dispositivo – a venda –, não tem no executado a respetiva autoria pelo que

ao curador não se apresenta um ato deste para autorizar.

b. Quanto ao cônjuge: o artigo 787.º, n.º1 CPC é claro nos poderes

processuais que lhe confere: são, no essencial, os do executado. Como este,

e por isso, não tem, nem pode, autorizar seja a penhora, seja a venda. Lebre

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de Freitas explica esta solução dizendo que as exigências dos artigos 2681.º e

1681.º-A são extrínsecas ao direito pois decorrem do casamento, que atua do

exterior sobre certas situações jurídicas próprias de cada um dos cônjuges,

mas a não organização desse interesse em direito subjetivo leva a sacrificá-lo

ao interesse, mais forte do credor.

Já nos demais casos, parece ser necessária a autorização do terceiro o que levanta a

questão de se, então, em caso de não autorização qual o interesse que deve prevalecer.

Lebre de Freitas entende que se trata de limitações intrínsecas ao direito, distinguindo

depois. Há limitações intrínsecas inseridas em esquema de cumprimento contratual

sujeitas à regra geral do artigo 424.º, n.º1 CC e sujeitas a uma regra de coincidência

entre intransmissibilidade e impenhorabilidade. Há limitações intrínsecas não

inseridas em esquema de cumprimento contratual, sendo que as alienações de

participações sociais nas sociedades por quotas (artigo 228.º, n.º2 CSC), em

comandita (aritgo 469.º, n.º1 e 475.º CSC) exigem consentimento negocial, como se

viu (artigos 228.º, n.º2, 329.º, n.º2, alínea a), 469.º, n.º1 e 475.º CSC) todavia não o

exigem para a penhora, como decorre dos artigos 239.º, n.º2, 328.º, n.º5 e 475.º CSC.

E por seu turno, tanto nas sociedades comerciais em nome coletivo, como nas

sociedades em nome coletivo, como nas sociedades em comandita simples se

consagram regras de impenhorabilidade da parte social, em favor da penhora do

direito aos lucros e à quota de liquidação (artigos 999.º, n.º1 CC e 183.º, n.º1 e 474.º

CSC). Na restrição subjetiva da transmissibilidade é feita a atribuição da faculdade de

disposição a terceiro ao direito. Aqui o terceiro será parte na causa, como credo

reclamante (artigo 666.º CC para o credor pignoratício) ou ocupará a posição de mero

representante legal suprindo a incapacidade judiciária do executado, nos termos do

artigo 16.º, n.º1 CPC.

§39.º - Impenhorabilidades objetivas

Impenhorabilidades absolutas. A impenhorabilidade da Constituição da

República. O direito à habitação: mesmo de entre os bens do devedor não excluídos

da responsabilidade e transmissíveis há bens que nunca podem ser penhorados ou apenas o

podem em certas condições. Tal resulta de normas que fixam, respetivamente,

impenhorabilidades absolutas e relativas. Essas normas são imperativas, não estando os seus

efeitos na disponibilidade do devedor.

1. O Código arrola as impenhorabilidades absolutas no artigo 736.º, alínea a) CPC,

além dos direitos intransmissíveis já referidos. Mas há normas avulsas que preveem

impenhorabilidades de bens que, de outro modo, não o poderiam ser. Os bens

absolutamente penhoráveis podem ser arrumados em três grupos:

a. Os bens cuja apreensão constituiria uma ofensa dos bons costumes:

i. Os objetos especialmente destinados ao exercício de culto público;

ii. Os túmulos;

iii. Os instrumentos indispensáveis aos deficientes e os objetos destinados

(indispensáveis na alínea f) do artigo 736.º CPC) ao tratamento de doentes;

iv. Quaisquer outros cuja apreensão viole aquela cláusula geral.

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b. Os bens cuja apreensão careça de justificação económica, pelo seu

diminuto valor venal;

c. Os bens isentos de penhora por disposição especial: por exemplo, os

manuscritos inéditos, esboços, desenhos, telas ou esculturas, tenham ou não

e assinatura, quando incompletos, salvo o oferecimento ou consentimento

do autor (artigo 50.º, n.º1 CDADC).

Mas importa não perder de vista que estes limites remetem, na realidade, para os

princípios constitucionais, dogmaticamente mais ricos e atuais, da dignidade da

pessoa (artigo 1.º CRP) e da proporcionalidade das restrições aos direitos

fundamentais do executado (artigo 18.º, n.º2 CRP): são absolutamente

impenhoráveis os bens cuja apreensão e/ou alienação ofendam a dignidade do

executado ou com desproporcionalidade perante o ganho económico para o

exequente. E quanto ao direito constitucional à habitação do artigo 65.º, n.º1 CRP

em especial? A casa morada de família não é bem impenhorável, não gozando o

cônjuge do executado do direito de exigir a restrição da penhora de forma a que esta

não contenda com a faculdade de usar a casa de morada de família. NA verdade, o

direito à habitação tem a sua sede própria vis à vis do Estado, e não, de modo

imediato, no plano das relações entre particulares, como enuncia o Ac. RE 9 outubro

2003/03B2762, concretizando doutrina do Ac. TC 829/1996, 29 junho. O que a lei

prevê são formas de consideração e proteção indireta desse direito, máxime, quanto

à suspensão da venda (artigos 704.º, n.º4, 733.º, n.º4 e 856.º, n.º4 CPC), quanto ao

depositário (artigos 756.º, n.º1, alínea a) e, após 2012, quanto ao gradus executionis,

751.º, n.º3, alíneas a) e b) CPC).

Impenhorabilidades relativas: depois, no universo de bens penhoráveis por não

caberem nas normas de exclusão absoluta, há bens que estão afetos a certas dívidas e mais

nenhumas ou que só respondem numa dada circunstância processual. Não há aqui, portanto,

confusão com os bens subsidiariamente penhoráveis, pois estes estão afetos a certas dívidas

mas também podem responder por outras, embora em segundo lugar. Assim, nos termos do

artigo 737.º, n.º1 CPC, os bens do domínio privado do Estado e das restantes pessoas

coletivas públicas, de entidades concessionárias de obras ou serviços públicos ou de pessoas

coletivas de utilidade pública, podem beneficiar de isenção de penhora desde que se verifique

um pressuposto funcional: se encontrem especialmente afetados à realização de fins de utilidade pública.

Nessa eventualidade, só respondem por dívida com garantia real e quando sejam os bens

onerados por essa mesma garantia. Compete ao agente de execução apurar se o bem está

afeto a uma atividade económica do Estado mas de serviço privado ou se a entidade não tem

a natureza pública exigida na lei ou se a penhora e venda afetarão a continuidade do serviço

público. Se não for esse o caso concreto, o bem será penhorável e valerão as regras gerais de

penhora. Todavia, nada impede ao executado de, em oposição à penhora, vir fazer a prova

da verificação in concreto dos pressupostos destas impenhorabilidades objetivas. Por seu turno,

os instrumentos de trabalho e os objetos indispensáveis ao exercício da atividade ou

formação profissional do executado por regra não podem ser penhorados, qualquer que seja

a profissão. Apenas podem ser penhorados se o executado os indicar para penhora ou forem

penhorados como elementos corpóreos de um estabelecimento comercial. Mas esses bens

respondem ainda pelo pagamento do preço da sua aquisição ou do custo da sua operação. Já

não pela execução de pensão de alimentos do executado. A estas restrições feitas pelo artigo

737.º CPC dever-se-ia ainda acrescentar a que enganadoramente está tratada como

impenhorabilidade absoluta na alínea f) do artigo 736.º CPC e como impenhorabilidade

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relativa no artigo 737.º, n.º3 CPC. Nesse preceito enuncia-se a regra da impenhorabilidade

dos bens imprescindíveis a qualquer economia doméstica – i.e. aferida objetivamente

segundo um padrão elementar, mas não marginal, conforme ao mínimo de dignidade social

– que se encontrem na residência permanente do executado, Mas note-se que no artigo 737.º,

n.º3 CPC os bens devem estar na habitação efetiva do executado, o que torna a garantia mais

rigorosa. No passado entendeu-se que não são indispensáveis os eletrodomésticos – televisão,

frigorífico, máquina de lavar – e certos móveis com uma alegada comodidade acima do básico

– sofás, candeeiros. Atualmente, com a evolução do patamar do mínimo social – que não é

meramente sociológico, mas também axiológico porque aferível pelo princípio da dignidade

da pessoa humana – entende-se serem impenhoráveis, por exemplo, um frigorífico, uma

cama para descansar ou um fogão para cozinhar. Ora, não se trata de um regime de

impenhorabilidade absoluta visto que no mesmo lugar legal se determina que esses bens

podem ser penhorados na execução do crédito do preço da respetiva aquisição ou do custo

da sua reparação. Justamente por isso, a Reforma de 2013 trasladou o preceito para um novo

n.º3 do artigo 737.º CPC.

Impenhorabilidades parciais:

1. Penhora de créditos de rendimentos pessoais:

a. Objeto e limites; as alterações da Reforma de 2013: decorria do regime

anterior à Reforma de 2013 que os rendimentos periódicos da causa pessoal

– vencimentos, salários, incluindo subsídios de férias e de Natal, prestações

sociais, pensões de alimentos, prestações pagas regularmente a título de

seguro ou indemnizações por acidente – não podem ser penhorados na

totalidade. Trata-se de créditos sujeitos ao regime do artigo 779.º CPC e dos

artigos 773.º e seguintes CPC. O preceito admitia ainda que pudessem ser

outros rendimentos ou prestações de natureza semelhante, no que mostrava

de modo claro que deveriam ser rendimentos que sustentem de modo estável

uma pessoa singular. Ora, justamente é esse o sentido do artigo 738.º, n.º1

CPC após 2013: se, por um lado, elimina a referência a prestações de natureza

semelhante precisamente, substituiu-a por prestações de qualquer natureza

que assegurem a subsistência do executado ou seja que assegurem a

manutenção ordinária da vida financeira básica do executado. Por isso, deve

entender-se que os rendimentos de autor e, em geral, de profissão liberal,

caberão no preceito se for demonstrado que constituem in casu rendimento

de subsistência, ainda que sejam recebidos anualmente ou, mesmo, de modo

irregular. Quanto ao âmbito da impenhorabilidade parcial, no Direito

anterior à Reforma de 2003, os rendimentos periódicos de causa pessoal

podiam ser penhorados entre um sexto e um terço do valor líquido, de acordo

com o que o juiz despachasse segundo o seu prudente arbítrio, tendo em

conta a natureza da dívida exequenda e as condições económicas do

executado (artigo 738.º, n.º1 e 2 CPC). No caso de vencimentos ou salários,

havia uma válvula de escape no n.º3 do artigo 738.º CPC: o juiz tinha o poder

discricionário de excecionalmente isentar de penhora os rendimentos, tendo

em conta a natureza da dívida exequenda e as necessidades do executado e

seu agregado familiar. Recordemos aqui que estas normas levantam dúvidas

quanto à necessidade de se respeitar o limite do montante do salário mínimo

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nacional, de pensões de reforma e de rendimento mínimo garantido, em face

do princípio da dignidade humana, decorrente do princípio do Estado de

Direito, resultante dos artigos 1.º, 59.º, n.º2, alínea a) e 63.º CRP. A este

propósito o Tribunal Constitucional, no Ac. n.º318/99, 26 maio 1999, veio

declarar a inconstitucionalidade daqueles n.º1 e 2, por violação daquele

princípio, quando interpretados no sentido de se permitir a penhora até um

terço de prestações sociais que não excedessem o salário mínimo. Mas o Ac.

TC n.º 96/04, 11 fevereiro 2004 foi mais longe e declarou inconstitucional

idêntica penhora que não deixasse um rendimento disponível de pelo menos

igual ao salário mínimo nacional. A Reforma de 2003 teve, então, tudo isto

em linha de conta ao reformular o artigo 738.º CPC, embora o tenha feito

em termos desnecessariamente complexos e redundantes. Assim, continuam

a ser impenhoráveis dois terços destes rendimentos periódicos, como antes

se estabelecia, devendo atender-se ao valor líquido no plano fiscal, i.e., depois

de impostos. Também aqui o artigo 738.º, n.º1 e 2 CPC vem dizer isso

mesmo: são impenhoráveis dois terços da parte líquida, considerados os

descontos legalmente obrigatórios. Portanto, não se deve atender a um valor

líquido no plano pessoal, i.e., depois de deduzidas as despesas pessoais.

Qualquer invocação de gastos pessoais deve ser feita a posteriori, nos estritos

limites do artigo 738.º, n.º6 CPC, não se restringindo o objeto inicial.

Penhorado um terço do vencimento do executado, numa execução, nada

impede que o mesmo terço venha a ser penhorado noutra execução, valendo

aí o regime da reclamação do crédito no processo da primeira penhora (artigo

794.º CPC). O que não pode suceder é haver penhora de qualquer outra parte

desse vencimento, seja nessa ou noutra execução. Ou seja: não pode

penhorar vários terços em diferentes execuções: o vencimento e o executado

são rigorosamente únicos ainda que mude a execução. Contudo, a parte

impenhorável, i.e., aquela que permanecerá como o rendimento disponível

do executado, tem um:

i. Limite mínimo: consiste numa garantia de reserva de um montante

equivalente a um salário mínimo, nos termos do artigo 738.º, n.º3

CPC. A penhora efetuada não pode ir mais longe do que esse valor.

Nos casos extremos, mas frequentes, em que o executado aufere

apenas rendimentos iguais ou inferiores ao salário mínimo, ou uma

pensão de sobrevivência, ou ainda o rendimento de reinserção social,

não podem estes ser penhorados de todo. Esta garantia de limite

mínimo estava dependente, no regime anterior, de dois pressupostos

negativos:

1. Que o executado não tenha outro rendimento: importa notar que

como decidiu o Ac. RP 23 fevereiro

2012/1218/08.3TJVNEP1, na falta de prova de que existem

outros rendimentos ou bens, parte-se do princípio de que o

executado só tem esse salário ou essa pensão. Efetivamente a

exigência constitucional de respeito pela dignidade da pessoa

humana, subjacente ao artigo 738.º, n.º1 CPC, significa que

se deve assegurar, na medida dos poderes de conhecimento

do juiz ou do agente de execução, que o executado mantém

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um rendimento disponível total igual, pelo menos, ao valor

do salário mínimo. Não significa que um vencimento, ainda

que de valor igual ao salário mínimo ou rendimento de valor

igual, nunca possa ser penhorado. Dá-se, assim, expressão

legal ao melhor entendimento anterior à Reforma, segundo o

qual se deveria proceder a uma avaliação in concreto do peso

do salário mínimo no rendimento disponível do executado; e

2. Que o crédito exequendo não seja de alimentos: se a obrigação

exequenda fosse de alimentos – artigos 956.º e seguintes CPC

– também não havia esse limite mínimo, podendo penhorar-

se mais de um terço do rendimento, qualquer que seja o

montante remanescente. Repare-se que, deste modo, não se

sufragou o entendimento que defendia a inaplicabilidade pura

e simples da regra da impenhorabilidade de dois terços à

execução por alimentos. Não: o rendimento do executado

mesmo nessa execução é impenhorável em dois terços, mas,

diferentemente, é sempre penhorável em um terço, mesmo

que o rendimento restante fique abaixo daquilo que seria o

limite mínimo. Todavia, alguma jurisprudência e doutrina

defendem, e bem, que mesmo assim o princípio da dignidade

do executado imporá sempre um limite: o valor do

rendimento social de inserção, já que este corresponderá ao

mínimo de existência.

ii. Limite máximo: importa dizer que ele vem previsto no mesmo n.º2 do

artigo 738.º CPC: fixa-se como limite máximo à impenhorabilidade

três salários mínimos nacionais à data de cada apreensão. O que é um

limite máximo à impenhorabilidade? Significa que será penhorável,

por completo, a parte do rendimento acima desse múltiplo de três.

No novo artigo 738.º CPC mantém-se a mesma letra e doutrina dos limites

mínimo e máximo, no seu n.º2, salvo quanto a uma importante alteração: o

limite mínimo continua, efetivamente, a não se aplicar ao executado que não tenha outro

rendimento, mas já a circunstância de o crédito exequendo ser por alimentos tem uma

relevância legal diferente: vale uma regra de inaplicabilidade pura e simples da regra da

impenhorabilidade de dois terços à execução por alimentos, consagrada agora no n.º4 do

artigo 738.º CPC. Deste modo, na execução por alimentos o rendimento do

executado em vez de ser penhorável em, pelo menos, um terço, mesmo que

o rendimento restante fique abaixo daquilo que seria o limite mínimo, é

penhorável na sua totalidade. Com uma ressalva, porém: a quantia

equivalente à totalidade da pensão social do regime não contributivo é

sempre guardada para a sobrevivência do executado.

b. Aplicabilidade às indemnizações de seguro: em sede da Lei dos

Acidentes de Trabalho (Lei n.º100/97, 13 setembro), preceituava-se no artigo

35.º que os créditos provenientes do direito às prestações estabelecidas por

esta lei são inalienáveis, impenhoráveis e irrenunciáveis e gozam dos

privilégios creditórios consignados na lei geral como garantia das retribuições

do trabalho, com preferência a estas na classificação legal. Em termos simples,

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as prestações indemnizatórias por acidentes de trabalho e doenças

profissionais não poderiam ser penhoradas. Posteriormente, a LAT de 2009,

embora revogando aquela primeira (artigo 186.º, alínea a) respetivo) veio

manter no artigo 78.º a mesma solução de inalienabilidade,

impenhorabilidade e irrenunciabilidade dos mesmos créditos, suportada em

idêntica consagração no artigo 302.º CT. Ora, o artigo 12.º Decreto-Lei

n.º329-A/95, 12 dezembro determinava que não são invocáveis em processo

civil as disposições constantes de legislação especial que estabeleçam a

impenhorabilidade absoluta de quaisquer rendimentos, independentemente

do seu montante, em colisão com o disposto no artigo [738.º CPC]. Donde

a conclusão jurisprudencial de que o que não pode ser penhorado em

processo civil são apenas 2/3 das pensões pagas por acidente de trabalho, de

acordo com o constante da alínea b) do n.º1 do artigo 738.º CPC, sendo o

restante 1/3 penhorável. Na verdade, seguindo a doutrina do Ac. RG 14 abril

2004 // 479/04-1 seria inaceitável uma impenhorabilidade absoluta dos

direitos àquelas prestações pois contenderia pelo menos com o princípio

ínsito no artigo 62.º CRP (garantia da propriedade privada), de que o direito

do credor à satisfação do seu crédito é ainda manifestação. Embora em caso

de colisão ou conflito entre o direito do credor a ver realizado o seu crédito

e o direito fundamental ao percebimento das pensões emergentes de acidente

de trabalho, opte a lei laboral por sacrificar o direito do credor, tal deve ter

lugar na medida do necessário apenas. Essa deveria conter uma limitação à

impenhorabilidade de tais créditos ao quantum tido por razoavelmente

necessário para a subsistência condigna do titular dos créditos. A

interpretação passaria, in casu, por sujeitá-los ao artigo 738.º, n.º1 CPC, mas

cujos limites à impenhorabilidade são afastáveis em certos casos, como, por

exemplo, na execução de crédito de alimentos. Justamente, já o Ac. RP 12

janeiro 1998/9751079 reconhecia que na ação executiva para prestação de

alimentos a menor, são objeto de penhora as indemnizações reconhecidas ao

executado em consequência de acidente de trabalho. A questão levanta

dúvidas, ainda assim. Repare-se, antes de mais, que estes créditos

indemnizatórios, pagos por entidades seguradoras, por acidente de trabalho,

não se confundem com os créditos do executado pagos pela entidade

patronal a título de indemnizações por despedimento. Não é a estes que se

referem o artigo 78.º LAT e 302.º CT. Ora, mais do que eventual natureza

alimentícia dos mesmos, o que se pode ponderar é se, atentas a anterioridade

temporal do Decreto-Lei n.º329-A/95, 12 dezembro, perante a Lei

n.º98/2009, 4 setembro, como a não alteração do conteúdo normativo que

foi vertido do artigo 35.º para os artigos 302.º CT e 78.º LAT, o legislador

não terá dado, também no plano da ponderação dos valores constitucionais,

um sinal de prevalência do interesse do credor laboral sobre o credor não

laboral ao estabelecer impenhorabilidades sem nenhuma restrição:

literalmente, elas valem seja qual for a natureza da execução – fiscal, civil ou

outra. Tratar-se-ia, aliás, de um sinal que o sistema executivo recebe noutros

lugares, como no artigo 788.º, n.º6 CPC. No entanto, o mesmo legislador

mantém vigente o Decreto-Lei n.º329-A/95, pelo que melhor preserva a

unidade do sistema afirmar que o artigo 12.º do mesmo diploma pretendeu

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(malgré tout) restringir normas especiais, onde quer que ele se encontrassem

(ainda que em diplomas de Direito substantivo) porque reguladoras de certo

um ato processual (a penhora). Por outro lado, tal foi suportado numa

eficácia normativa dirigida não apenas aos diplomas da época mas aos que

sucederam a estes e que não tenham afastado aquela eficácia restritiva. Em

suma: mantém-se desde 2012 o status quo de eficácia normativa instituído

em 1 de janeiro de 1998 quanto aos limites à penhora de indemnização por

acidente de trabalho. Deste modo, os créditos de seguros são objeto de

sujeição aos limites objetivos de penhorabilidade constantes do artigo 738.º,

n.º1 a 3 CPC, quando tenham os caracteres que nesse artigo se estabelecem.

Nomeadamente, como decorre do artigo 738.º, n.º1 CPC, deverão ser

prestações pagas regularmente a título de seguro, indemnização por acidente

de modo a poderem beneficiar de uma impenhorabilidade de 2/3 do seu

montante. E, por outro lado, apenas podem ser seguros que sustentem uma

pessoa singular e não uma pessoa coletiva. Por essa razão, um crédito

indemnizatório irregular ou único não está, em princípio, protegido pela

impenhorabilidade parcial, porque se presume que não sustenta o executado.

Neste sentido, o Ac. RL 9 novembro 2011/ 442-B/1995.L1-1 julgou que a

letra do artigo [738.º, n.º1 CPC] ao empregar explicitamente a locuções

prestações periódicas, aponta decisivamente no sentido de que as

indemnizações por acidente (de viação ou de trabalho) apenas são

impenhoráveis se forem pagas sob a forma de renda vitalícia ou temporária,

isto é, com caráter periódico, mas já não o são se forem pagas por uma só

vez, ainda que fracionadamente, sem caráter de periodicidade. Portanto, a lei

associa a natureza de sustento à regularidade do rendimento. No entanto, e

sobretudo, no novo artigo 738.º, n.º1, in fine CPC, parece ser importante a

função de sustento do rendimento e menos a sua regularidade o que poderá

alterar o resultado interpretativo. Naturalmente, que dada a natureza que a

regularidade reveste de facto impeditivo da penhora da totalidade do valor, o

ónus da prova de que tal indemnização tinha caráter periódico cabe ao

executado por ser ele o requerente o incidente de redução da penhora e por

isso, a dúvida ou incerteza sobre o caráter periódico da referida indemnização

resolve-se, nos termos do artigo 414.º CPC, contra a parte a quem

aproveitaria a demonstração desse facto (ainda o Ac. RL 9 novembro 2011/

442-B/1994.L1-1. No caso da execução de crédito de alimentos, no conflito

entre o interesse do menor na obtenção de alimentos, por parte do pai, e

entre o interesse deste na manutenção de um mínimo de dignidade, deve

prevalecer o do pai, considerando-se impenhorável a pensão por acidente de

trabalho, inferior ao salário mínimo nacional, único rendimento deste (Ac.

RP 4 outubro 2001/ 0131220). Deste modo, pretendeu-se ainda assim impor

um limite mínimo, ainda assim superior ao que resulta agora do n.º4 do artigo

758.º CPC.

c. Isenções e reduções de penhora. As alterações da Reforma de 2013:

aligeirando os critérios legais pré-existentes, a reforma de 2003 mantivera e

aprofundara o n.º4 do artigo 738.º CPC o poder discricionário do juiz de, a

requerimento do executado, reduzir o objeto da penhora por período que

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considere razoável ou mesmo de isentar os rendimentos de penhora por

período não superior a um ano. Os fatores que determinavam a decisão do

juiz eram a natureza e o montante da dívida exequenda e as necessidades do

executado e do seu agregado familiar. Posteriormente, em 2008, o

mecanismo atribuiu importantes competências ao agente de execução; assim,

a requerimento do executado ao agente de execução, este pode – após

audição do exequente – propor ao juiz o decretamento da redução, por

período que considere razoável, da parte penhorável dos rendimentos,

ponderados o montante e a natureza do crédito exequendo, bem como as

necessidades do executado – aferidas pelo padrão de consumo normal de um

homem comum em idênticas circunstâncias – e do seu agregado familiar. O

agente de execução deveria juntar um projeto de decisão fundamentada que

o juiz podia sustentar. Trata-se de um mecanismo excecional, destinadoà

salvaguarda da sobrevivência digna do executado e do seu agregado familiar,

e que, por isso, deverá tentar-se alcançar um equilíbrio justo entre o direito

do credor à satisfação do seu crédito e o direito do devedor à garantia de um

mínimo de subsistência própria e do seu agregado familiar (Ac. RP 17

dezembro 2998/ 0826372). E, como antes de 2008, o momento decisório

conserva a sua natureza discricionária, tanto do lado do agente, para propor,

quanto do juiz para decretar a redução. Um e outro, em ordem a evitar

decisões supresa deverão proferir despachos fundamentados e sob pena da

equidade se transformar em arbitrariedade com sujeição ao princípio do

contraditório (Ac. RP 19 março 2012 /3007/10.6TJVNF-A.P1). Por outro

lado, esta providência não suspendia a execução, pois apenas reduz a fração

penhorável dos rendimentos ou os isenta de penhora. Com a dita reforma de

2008-2009, passaram a prever-se outros mecanismos mais objetivos de

redução e isenção da penhora. Efetivamente, é ao agente de execução que o

executado pode requerer isenção de penhora pelo prazo de seis meses desde

que demonstre que o agregado familiar tem um rendimento relevante para

efeitos de proteção jurídica igual ou inferior a três quartos do valor do

Indexante de Apoios Sociais. Por outro lado, pelo n.º5, alterado, passou a ser

ao agente de execução que o executado deve requerer uma decisão de

redução para metade da parte penhorável dos rendimentos daquele, pelo

prazo de seis meses. Para tanto, o executado devia demonstrar que o seu

agregado familiar tem um rendimento relevante para efeitos de proteção

jurídica superior a três quartos e igual ou inferior a duas vezes e meia do valor

do Indexante de Apoios Sociais. Uma e outra são decisões vinculadas já que

decorre claramente da letra da lei – isenta de penhora, reduz para metade –

que o decretamento da redução ou isenção supõem uma prévia demonstração

(liquidação no plano quantitativo) de pressupostos legais. Ambas postulam

que o agente ouça sempre e previamente o exequente, como expressamente

estava na letra do artigo. Finalmente, na reforma de 2013, foi-se recuperar na

íntegra a letra do artigo anterior a 2008. Assim, apenas se enuncia no artigo

736.º, n.º6 CPC que ponderados o montante e a natureza do crédito

exequendo, bem como as necessidades do executado e do seu agregado

familiar, pode o juiz, excecionalmente e a requerimento do executado, reduzir,

por período que considere razoável, a parte penhorável dos rendimento e

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mesmo, por período não superior a um ano, isentá-los de penhora.

Permanece, assim, atual o que escrevemos sobre os critérios decisórios e

interesses aqui em jogo e a natureza discricionária do despacho judicial.

d. Aumento da penhora. As alterações da Reforma de 2013: no sentido

oposto, o regime anterior, permitia aumentar o objeto da penhora, com base

na ponderação da natureza e montante da dívida exequenda, das necessidades

do executado e seu agregado familiar e do estilo de vida do executado e

família, alvo quando fosse penhora de pensão ou regalia social. Para tanto, o

exequente devia pedir a redução do limite mínimo de um montante

equivalente a um salário mínimo. No caso da penhora de dinheiro ou de saldo

bancário de conta à ordem, podia requerer o afastamento da

impenhorabilidade do valor global correspondente a um salário mínimo

nacional. No Direito anterior a 2008, o requerimento deveria ser dirigido ao

juiz; posteriormente passou a ser dirigido ao agente de execução que, se lhe

desse provimento, proporia ao juiz o afastamento do limite ou a redução do

limite mínimo imposto, juntando um projeto de decisão fundamentada que

o juiz pode sustentar. No artigo 738.º CPC atual, deixou, pura e simplesmente,

de se prever o aumento da extensão da penhora. Mas voltando ao regime

anterior a 2013, a regra presente, além de levar a um apuramento do que é o

mínimo adequado a cada executado, permitia que, quando o exequente não

conhecesse ou não pudesse demonstrar a existência de outras fontes de

rendimento, o juiz procedesse à redução da impenhorabilidade com base nas

presunções naturais que se inferem de sinais exteriores de rendimento

disponível superior ao salário mínimo. As decisões, em causa, de alargamento

da penhora ao abrigo deste regime eram sempre proferidas no uso legal de

um poder discricionário tanto do agente, para propor, quanto do juiz para as

decretar.

e. Penhora de quantias pecuniárias ou de saldo bancário de conta à

ordem: este regime de impenhorabilidade parcial vale ainda para créditos

subrogados no crédito de rendimento pessoal. Efetivamente, o artigo 739.º

CPC determina que são impenhoráveis a quantia em dinheiro ou o depósito

bancário resultantes da satisfação de crédito impenhorável, nos mesmos

termos em que o era o crédito originariamente existente. Assim, um salário

que seja recebido por transferência para conta do executado continua a estar

salvaguardado pelos n.º1, 1.ª parte 3 do artigo 738.º CPC, os quais irão

restringir o saldo efetivamente penhorável. Como escreve Januário da

Costa Gomes,

«deste modo, o exequente não pode invocar a fungibilidade do dinheiro e a

abstração das operações bancárias».

A lei abrange qualquer depósito bancário, à ordem ou a prazo, mas

seguramente que não se aplica a produtos de poupança pura, i.e., de reserva

de liquidez para o futuro. Tome-se o caso dos Planos Poupança Reforma

(PPRs): normalmente, eles são municiados com uma transferência periódica

de pequenos montantes. Ora, com essa transferência, a quantia perde a

qualidade primária de sustento (pressuposto do artigo 739.º CPC) e passa a

ter a qualidade secundária de poupança. E, em consequência, se o executado

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pode colocar de lado parte do seu rendimento para entesouramento, também

pode sujeitar-se a que essa mesma quantia vá pagar o que já devia ter pago.

Caberá ao executado demonstrar a origem do dinheiro ou do depósito

bancário para efeitos da invocação do artigo 739.º CPC, e, através dele, do

artigo 738.º, n.º1 CPC. Todavia, assim não será se for por si mesmo notório

que se trata de uma conta-ordenado ou de conta em que está domiciliado o

pagamento por transferência do rendimento. Nesse caso, o agente de

execução oficiosamente terá em conta o artigo 738.º, n.º1 CPC. Qual o meio

para o executado invocar a origem do crédito? Parece ser em sede de

oposição à penhora, com base na alínea a) do n.º1 do artigo 738.º CPC, e não

o simples requerimento que, por similitude, se buscaria no n.º6 do artigo

738.º CPC. É que estes últimos pressupõem uma penhora legalmente

efetuada, o que não é o caso, sendo ainda certo que o requerimento é de uso

residual em face do meio geral de invocação de ilegalidades objetivas da

penhora. Nesse caso, pode, inversamente, o exequente demonstrar que o

valor em causa não se destina ao sustento do executado, mas a outra

finalidade, como a de poupança: as economias são penhoráveis, escrevia Castro

Mendes.

2. Penhora de créditos sub-rogado em crédito de rendimentos pessoais: suponha-

se, agora, que o executado ou o agente de execução oficiosamente não relevaram uma

origem sub-rogada do dinheiro ou do depósito bancário que permita a tutela do

artigo 739.º CPC. Nessa eventualidade, pode ser penhorada a totalidade da quantia

pecuniária ou do saldo, mas com salvaguarda de um valor global correspondente a

um salário mínimo desde que se trate de conta à ordem. É isso que estabelecia o

artigo 738.º CPC na sua versão anterior. No atual artigo 738.º, n.º5 CPC há duas

pequenas mudanças:

a. O preceito passa a tutelar qualquer saldo bancário, à ordem ou a prazo.

Por isto, se em antes a penhora de conta a prazo poderia ser integral (mas

com o limite máximo dado pelo artigo 735.º, n.º3 CPC), com ressalva das

contas sujeita a um regime especial, agora com o Código novo deve ter-se em

consideração a dita ressalva de um valor global correspondente ao salário

mínimo nacional.

b. Tendo em conta a não sujeição da execução por alimentos à

impenhorabilidade parcial do artigo 738.º, n.º1 CPC, determina-se que

nessa eventualidade o que se salvaguarda não é um valor global

correspondente a um salário mínimo, mas o equivalente à totalidade

da pensão social do regime não contributivo.

Apesar de procedimentalmente reguladas no artigo 739.º CPC o objeto são ainda

rendimentos pessoais, embora funcionalmente subrogados em depósito bancário.

Por isso, a penhora respetiva pode ser alterada nos termos já conhecidos dos n.º6 do

artigo 738.º CPC. Já no artigo 738.º, n.º5 CPC o objeto são saldos bancário saldos

bancários proprio sensu. Todavia, em qualquer dos casos, trata-se sempre de contas

tituladas por pessoas singulares, pensando na respetiva dignidade. São, por isso, de

refutar extensões a pessoas coletivas de impenhorabilidades desse valor.

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§40.º - Dívidas conjugais

Enquadramento material:

1. Razão de ordem: o regime processual da penhora por obrigações pecuniárias

contraídas pelos cônjuges só é compreensível no quadro das normas do Direito Civil

que fixam a responsabilidade pessoal por aquelas obrigações e a responsabilidade

objetiva por essas obrigações. Esta última depende do regime de bens do casamento.

Vamos, por isso, passa-las em revista.

2. Responsabilidade subjetiva comum: no plano subjetivo, a responsabilidade pode

ser

a. De ambos os cônjuges: são da responsabilidade de ambos os cônjuges as

dívidas que se subsumam às previsões dos artigos 1691.º, 1692.º, alínea b), 2.ª

parte, 1693.º, n.º2 e 1694.º, n.º1 CC. Dentro destas dívidas, deve ainda

distinguir-se:

i. As dívidas comuns: têm por fonte um facto praticado por ambos os

cônjuges, ainda que antes do casamento – v.g. artigo 1691.º, n.º1,

alínea a) CC).

ii. As dívidas comunicáveis: têm por fonte um facto praticado por um dos

cônjuges, mas que implica uma comunicação da responsabilidade,

voluntária ou legal. A comunicação voluntária resulta do

consentimento dado para o ato pelo cônjuge que não contraiu a

dívida, como consta, nomeadamente, da 2.ª parte da alínea a) do n.º1

do artigo 1691.º CC. A comunicação legal resulta da subsunção da

situação a alguma das previsões das alíneas b) a e) do n.º1 e do n.º2

do artigo 1691.º CC ou dos artigos 1692.º, alínea b), 2.ª parte, 1693.º,

n.º2 e 1694.º, n.º1 CC.

O regime das dívidas da responsabilidade de ambos os cônjuges (artigo

1695.º CC) resume-se a isto: a dívida do casal que seja da titularidade ou do

interesse de ambos deve ser suportada pelos bens de ambos. Trata-se, assim,

de um mecanismo de partilha pelo casal das consequências patrimoniais

negativas de um ato funcionalmente positivo para o casal. Isso não é tão

evidente nos casos de dívidas comuns pois essa partilha já decorreria das

regras gerais das obrigações, pois, afinal, ambos assinaram a letra ou o

contrato, por exemplo. Aí, pelo contrário, o que há é uma vantagem objetiva,

nos regimes de comunhão de bens, a favor dos cônjuges: os bens próprios

ficam subtraídos à penhora de modo imediato, reservando-se a título

subsidiário. Mas já nos casos de dívidas comunicáveis, as regras gerais

imporiam que fosse devedor somente o contraente e que, por consequência,

apenas os seus bens pudessem ser penhorados ou, quando muito, a sua

meação nos bens comuns. Ora o que sucede é que, ao impor a comunicação

da dívida, todos os bens dos membros do casal – seus ou comuns – podem

ser penhorados e apenas a subsidiariedade é que, no regime de comunhão de

bens, poderá proteger, e de modo limitado, uma parte do património. Esta

solução é boa para o credor pois aumenta o objeto da garantia, mas também

é boa para o cônjuge devedor que atuou no interesse do casal, pois deixam

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de ser os seus bens próprios a sujeitarem-se apenas e de imediato à execução.

Não se trata, contudo, de criar uma nova parte no negócio ou título cambiário,

de cuja celebração de participou. O cônjuge do devedor é terceiro ao negócio.

Por isso, e por exemplo, o cônjuge do comprador de um eletrodoméstico

não pode exigir ao vendedor a entrega da coisa porquanto ele não é o

comprador. O cônjuge do devedor é também terceiro à obrigação pecuniária

exequenda, não sendo um co-devedor, solidário ou parciário. Ele não poderia,

por isso, invocar a compensação de um crédito seu sobre o credor exequente

como fundamento da oposição à execução do crédito do devedor marido ou

mulher. Tal seria absolutamente contrários aos princípios da boa fé objetiva

que impedem que um credor possa ser prejudicado por quem não contratou

com ele. No entanto, o comprador já pode interpelar o cônjuge para pagar o

preço, judicial ou extrajudicialmente. Não por que ele esteja em mora – quem

está é o cônjuge devedor – mas porque ele responde na mora. Ou seja: como

o fiador, o cônjuge que vê a dívida do consorte comunicada é um devedor de

garantia, cobrindo as consequências legais e contratuais da mora ou culpa do

devedor seu consorte e cuja obrigação tem o conteúdo da obrigação principal.

E por isso a partilha das consequências negativas far-se-á ao nível do

património afeto à satisfação das obrigações.

b. Unicamente daquele que se obrigou.

3. Responsabilidade subjetiva própria: a responsabilidade subjetiva própria do

cônjuge que deu causa à dívida é, primariamente, residual perante a responsabilidade

subjetiva comum: é a das dívidas contraídas voluntariamente, antes ou depois da

celebração do casamente, por cada um dos cônjuges sem o consentimento do outro,

fora dos casos indicados nas alíneas b) e c) do n.º1 do artigo 1691.º CC, lê-se no

artigo 1692.º, alínea a) CC. Secundariamente são ainda próprias dívidas constituídas:

a. Ex lege como sanção (artigo 1692.º, alíneas a) e b), 1.ª parte CC);

b. Por outrem, mas transmitidas por ato de liberalidade (artigo 1693.º CC);

c. Contraídas voluntariamente e, ainda que pudessem caber nas alíneas b) e c)

do n.º1 do artigo 1691.º CC, tenham garantias sobre bens comuns (artigo

1692.º, alínea c) conjugado com o artigo 1694.º, n.º2 CC).

Este regime de dívidas tanto se pode dizer que prejudica o cônjuge contraente – só

os seus bens respondem – como o credor pelo universo restrito de bens disponíveis

para a penhora.

4. Responsabilidade objetiva; separação de patrimónios: no plano subjetivo, todo

o casamento está sujeito ao regime que acabamos de mostrar. No plano objetivo,

contudo, deve recordar-se que já o artigo 601.º, in fine CC ressalvara da

responsabilidade universal e imediata os regimes especialmente estabelecidos em

consequência da separação de patrimónios. Ora, há separação de patrimónios nos

regimes de comunhão de bens, seja de adquiridos – regime supletivo, segundo o

artigo 1698.º CC, regulado nos artigos 1721.º e seguintes CC – seja geral (artigos

1732.º CC). Nesses regimes distinguem-se na esfera patrimonial de cada cônjuge os

bens próprios – situações jurídicas patrimoniais ativas em titularidade exclusiva,

incluindo as quotas de participação na contitularidade de tipo romano, i.e., nos

termos dos artigos 1405.º CC (artigo 1727.º CC) – e os bens comuns – situações

jurídicas patrimoniais ativas em contitularidade de tipo germânico ou em mão

comum. Nestes casos, pelas dívidas da responsabilidade de ambos os cônjuges devem

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ser penhorados os bens designados no artigo 1695.º CC: bens comuns e,

subsidiariamente, na falta ou insuficiência deles, os bens próprios. Pelas dívidas de

responsabilidade exclusiva de um dos cônjuges devem ser penhorados os seus bens

próprios e, na falta ou insuficiência, a meação nos bens comuns, nos termos do artigo

1695.º CC. Por seu turno, aos regimes de separação de bens (artigo 1735.º e seguintes

CC), não se lhes aplica o n.º1 do artigo 1695.º CC. Não há bens em comunhão;

quando muito, há bens em compropriedade, o que é diferente e não lhes muda a

natureza própria. Apenas se encontram bens próprios no património de cada cônjuge,

o que quer dizer que não há relações de subsidiariedade na responsabilidade por

dívidas dos cônjuges. Nestes casos, pelas dívidas da responsabilidade de ambos os

cônjuges podem, em abstrato, responder de imediato todos os bens dos cônjuges,

que respondem como devedores parciários, pois a sua responsabilidade não é

solidária (artigo 1695.º, n.º2 CC); o credor apenas pode pedir a cada cônjuge a

respetiva quota-parte na prestação. Pelas dívidas de responsabilidade singular do

cônjuge respondem os bens próprios do devedor, não existindo a meação nos bens

comuns a que se refere o artigo 1696.º CC. Por último, os regimes inominados de

bens fixados em convenção antenupcial (artigo 1698.º CC) regem-se pelas normas

que a sua concreta estrutura interna implicar. Em concreto, se os esposados tiverem

convencionado a comunicabilidade de certos bens (dentro dos limites dos n.º1, alínea

d) e 2 do artigo 1699.º CC), valerá quanto a eles, e no seu exato âmbito, o regime da

separação de patrimónios e de responsabilidade subsidiária de que trata o artigo

1695.º CC. Já quanto aos demais bens, ou no caso de as partes não terem

convencionado comunhão alguma, vale o regime da separação de bens, i.e., da não

subsidiariedade da responsabilidade e da parciariedade das dívidas.

5. Limites temporais: os regimes de bens duram enquanto durar o casamento,

afirmação que deve ser entendida com algum cuidado em face de outra: a

responsabilidade subjetiva e objetiva pela dívida afere-se na data da sua constituição

e não na data da execução. Isto por força do artigo 1690.º, n.º2 CC para a

determinação da responsabilidade dos cônjuges, as dívidas por eles contraídas têm a

data do facto que lhes deu origem. Efetivamente, por um lado, as dívidas contraídas

após o termo da sociedade conjugal passam a ser da exclusiva responsabilidade do

devedor, nos termos gerais do artigo 601º. CC. Ao mesmo tempo, qualquer novo

bem adquirido será sempre do ex-cônjuge adquirente, o que sucederá com os bens

comuns apenas com a respetiva partilha. Mas, por outro lado, as dívidas contraídas

antes do termo do casamento, mas executadas depois da separação ou divórcio,

mantêm a qualidade própria ou comum. Além disso, só depois de feita a partilha é

que os bens perdem a natureza, própria ou comum, que tinham em função da

existência do casamento, pelo que os bens comuns não partilhados podem ainda ser

penhorados nos termos do artigo 740.º CPC e não nos termos do artigo 781.º CPC.

Neste sentido, em obediência ao dito artigo 1690.º, n.º2 CC, o Ac. RP 5 março 2009

/ 2864/06.5YRPRT explicitou que

«enquanto não partilhado, esse património comum mantém essa afetação primacial à

satisfação das dívidas que eram comuns do casal»,

pelo que

«só na falta ou insuficiência destes, são chamados a satisfazer a dívida os bens próprios

(solidariamente) de qualquer dos (ex.) cônjuge».

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Todavia, à comunhão desses bens posterior à dissolução do casamento parece passar

a reger-se pelas regras da compropriedade do artigo 1404.º CC. Naturalmente, que já

os novos bens adquiridos após a extinção do casamento, v.g., o vencimento, são bens

de titularidade do respetivo adquirente.

6. Expressão processual: importa ver como este enquadramento material se traduz

processualmente, tanto em termos de legitimidade como em termos de objeto e

procedimento de penhora. É o que faremos de seguida, de modo autónomo. Para

isso vamos ver segundo o plano da responsabilidade subjetiva, ou seja, a execução de

dívida da responsabilidade do casal e a execução de dívida da responsabilidade de

cônjuge contraente. Esta abordagem sendo corrente é, no entanto, geradora de

alguns equívocos sobre a relação entre o Direito da Família e o Direito Processual

Civil. Na verdade, como para qualquer outra qualificação jurídica, dizer-se que uma

dívida é da responsabilidade do casal ou da responsabilidade de um cônjuge é dizer-

se que a mesma está aceite no processo como tal. Importa por isso perguntar se a

natureza da dívida é de conhecimento oficioso ou se, independentemente disso, se

algum das partes tem o ónus de fazer a qualificação da dívida e de apresentar os

factos respetivos. Quanto aos factos de que depende essa qualificação valem,

naturalmente, as regras gerais do artigo 5.º, n.º1 CPC aplicadas ao processo executivo:

a parte que queira que a execução siga o procedimento decorrente de uma dada

qualificação tem de ser ela a trazer para a instância os factos em que ela assenta. Essa

parte tanto pode ser o credor, como o devedor, pois um regime de dívidas tanto é

favorável a um como a outro: viu-se isso atrás, tanto a respeito das dívidas próprias

como a respeito das dívidas comuns. Não cabe ao credor presumir sem mais se o

devedor é casado ou não, ou o seu regime de bens ou a natureza da dívida. Trata-se

de situações e estados jurídicos que assentam em factos que, como quaisquer outros,

carecem de ser alegados2. O que o processo, tanto declarativo, quanto executivo, têm

de assegurar são os atos e momentos processuais em que a parte possa alegar os

factos e fazer a respetiva qualificação. Esses momentos são, pelo menos, o

requerimento executivo para o exequente e a oposição à penhora para o executado e

na ação declarativa a petição inicial e a contestação. Contudo, nos termos gerais do

princípio da auto-responsabilidade das partes, conjugado com a natureza perentória

dos prazos processuais, associada à imperatividade dos atos processuais, se o credor

ou o devedor não alegaram a sua razão no meio e no momento previstos na lei de

processo, preclude-se, i.e., caduca, o respetivo poder processual. No entanto, nos

termos gerais do artigo 5.º, n.º2 CPC, quer o tribunal, quer o agente de execução

podem conhecer oficiosamente dos factos de que depende a qualificação se eles

resultarem do exercício das suas funções, desde que eles constem de elementos

2 É, por exemplo, manifestamente descabido pelos princípios gerais do Direito probatório exigir que o credor tenha de atuar processualmente, sem prévia demonstração, tanto no plano da legitimidade, como no da penhorabilidade, sem prévia demonstração, tanto no plano da legitimidade, como no da penhorabilidade, como se a obrigação exequenda fosse contraída para ocorrer aos encargos normais da vida familiar ou pelo cônjuge administrador ou em proveito comum do casal e nos limites dos seus poderes de administração (artigo 1691.º, n.º1, alíneas b) e c) CC). Pelo contrário, como se enuncia no Ac. STJ 11 novembro 2008 /08B3303, o apuramento do proveito comum – ou de outro facto comunicador da dívida acrescentamos – apresenta-se como uma questão musta ou complexa, envolvendo uma questão de facto e outra de Direito, consistindo a primeira em averiguar o destino dado ao dinheiro representado pela dívida, enquanto a segunda é de valoração sobre se, perante o destino apurado, a dívida foi contraída no interesse comum do casal, preenchendo o conceito legal. Deste modo, a expressão legal proveito comum traduz-se num conceito de natureza jurídica a preencher através dos factos materiais indicadores daquele destino, conclui e bem o mesmo aresto.

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existentes no processo. A razão dessa oficiosidade reside na natureza imperativa das

normas da responsabilidade por dívidas dos cônjuges, o que significa que será ilegal

qualquer penhora feita fora dos pressupostos previstos nessas normas. Esta

imperatividade implica que tanto o juiz como o agente de execução devem procurar

assegurar-se de que a instância corre em conformidade com elas. Não devem por

isso, nem juiz, nem agente de execução, considerar que são normas cuja violação

caiba à parte prejudicada alegar – um problema seu, se quisermos. Uma vez

adquiridos esses factos para o processo, a qualificação jurídica será a que o tribunal

ou o agente entender que se aplica. Um e outro não estão sujeitos às alegações das

partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de Direito, graças

ao artigo 5.º, n.º3 CPC. De tudo isto resulta que deve sempre ser executada como

comum ou como própria a obrigação exequenda quando resulte de título – única

fonte de factos incontrovertidos enquanto não for procedente uma oposição do

executado – e não de outros elementos, sua natureza. Assim, deve ser executada

como comum a dívida que tenha por título executivo um contrato ou título de crédito

assinados pelo casal ou uma sentença condenatória de ambos (aqui seja porque

ambos contraíram a dívida, seja porque a dívida de um se comunicou ao outro). É

que nessa eventualidade tanto os factos como a qualificação jurídica, resultante da

aplicação da alínea a) do n.º1 do artigo 1691.º CC, são de conhecimento oficioso. Por

seu lado, deve ser sempre executada como própria a obrigação exequenda

proveniente de crime, indemnização, restituição, custa judicial ou multa devidas por

factos imputáveis a cada um dos cônjuges, nos termos dos artigos 1692.º, alínea b)

CPC, quando decorra do título que o facto é imputável ao cônjuge. Em todos os

demais casos a comunicabilidade da dívida, i.e., a existência dos pressupostos

previstos nas alíneas a) a d) do n.º1 e no n.º2 do artigo 1691.º CC deverá ser alegada

e demonstrada. Nomeadamente, deverá ser alegado e demonstrado: constituir um

encargo normal da vida familiar, o proveito comum (que aliás não se presume,

conforme o n.º3 do mesmo artigo), estar nos limites dos seus [do cônjuge] poderes

de administração, contração da dívida no exercício do comércio (aqui beneficiando

da presunção do artigo 15.º CCom). Ainda deverá ser demonstrada quer a oneração,

quer a natureza comum do bem para efeitos do artigo 1694.º, n.º1 CC e o ingresso

da liberalidade no património comum para efeitos do artigo 1693.º, n.º2 CC. E se,

resultando dos autos que o executado está casado, mas não for feita a alegação e a

demonstração de que a dívida, embora contraída individualmente é comum? Aqui

devemos voltar ao regime material: a dívida será tida por própria, conforme o artigo

1692.º, alínea a) CC. Em conformidade, quando for o executado a indicar, bens à

penhora, deve começar pelos bens próprios e, só na falta destes, é que lhe será lícita

a nomeação da sua meação nos bens comuns do casal.

Execução de dívida comum:

1. Bens penhoráveis: como se faz a execução de dívida comum, i.e., fundada em

sentença que haja condenado o casal ou em título extrajudicial subscrito pelos dois?

Trata-se de uma dívida da responsabilidade dos cônjuges por força do artigo 1691.º,

alínea a) CC e como tal deve ser tomada sempre já que, mesmo que as partes não a

qualifiquem, é de caráter comum, ainda que oficiosamente, como acabámos de

concluir. Factos e qualificação da natureza comum são conhecidos tanto pelo agente

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de execução, quanto pelo tribunal. Mas no plano da responsabilidade objetiva há que

distinguir o regime de bens, entre de separação ou de comunhão. Se os cônjuges

estiverem em regime de separação de bens, não há bens comuns a responder, pelo

que respondem os bens próprios de qualquer dos cônjuges (n.º1 do artigo 1695.º CC).

Estes respondem de modo não solidário (artigo 1695.º. n.º2, in fine CC), i.e., os bens

de cada cônjuge pagam metade da dívida. Se os cônjuges estiverem em regime de

separação de bens, não há bens comuns a responder, pelo que respondem os bens

próprios de qualquer dos cônjuges (n.º1 do artigo 1695.º CPC). Estes respondem de

modo não solidário (artigo 1695.º, n.º2, in fine CC), i.e., os bens de cada cônjuge

pagam metade da dívida. Se os cônjuges estiverem em regime de comunhão de bens

determina o artigo 1695.º CC que respondem primeiro os bens comuns e,

subsidiariamente, na falta ou insuficiência deles, os bens próprios de qualquer dos

cônjuges. Estes respondem solidariamente, ou seja, pela dívida toda. Por conseguinte,

há que ter em conta a existência dos bens comuns como património afeto às dividas

comuns e de bens que respondem apenas subsidiariamente – os bens próprios. Note-

se, contudo, o seguinte: a penhora baseada em título comum contra o casal em regime

de comunhão há-de ser feita sempre na presunção de que o bem penhorado é um

bem comum. Implicitamente neste sentido, afirma o Ac. STJ 12 janeiro 2006

/05B3427 que a existência de património comum é conclusão de direito a extrair do

regime de bens do casal. Portanto, o credor não tem de demonstrar que o bem é

comum: não é razoável que ele demonstre que um concreto recheio de casa foi

comprado antes ou depois do casamento. Cabe, sim, ao devedor demonstrar que um

concreto bem não é comum. Contudo, pode resultar do processo se um dado bem é

comum ou é próprio, como sucede com um bem sujeito a registo, por causa da data

respetiva. No entanto, por força do regime do artigo 745.º, n.º5 CPC pode o

exequente promover logo a penhora dos bens que respondem subsidiariamente pela

dívida, desde que demonstre a insuficiência manifesta dos que por ela deviam

responder propriamente. Trata-se de uma norma que na prática tem pouca utilidade

porquanto até impugnação contrária procedente todos os bens penhorados são

comuns.

2. Legitimidade:

a. Problema; doutrina do litisconsórcio voluntário: a dúvida que se deverá

colocar é se o credor que executa uma dívida comum em face do título pode

optar por propor a ação executiva apenas contra um ou deve coloca-la

sempre contra os dois consortes por força do artigo 34.º, n.º3 CPC e do

próprio n.º1 do artigo 1695.º CC. Na ação declarativa, observando o artigo

34.º, n.º3 CPC, notar-se-á adiante que, enquanto a 2.ª parte, referente às

dividas comunicáveis, consagra um litisconsórcio voluntário conveniente,

parece certo que, em face da expressão devem, na 1.ª e 3.ª partes do n.º3, se

preveem litisconsórcios necessários. Para o que agora interesse, a 1.ª parte

refere-se às dívidas comuns do artigo 1691.º, n.º1, alínea a) CC, o que quer

dizer que na ação declarativa o credor não pode optar por demandar nesses

casos apenas um dos cônjuges devedores. Neste caso, se ação declarativa não

for proposta contra o casal, há uma ilegitimidade ex vi artigo 33.º, n.º1 CPC.

Essa preocupação está ausente, como se verá mais adiante, quando a dívida

for comunicável – 2.ª parte do n.º3 do artigo 34.º CPC –, tendo o autor e o

réu o ónus de definir o âmbito subjetivo da ação declarativa, pois prevê-se

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apenas um litisconsórcio voluntário. A preocupação de formação uniforme

de condenações judiciais contra o casal, pela sua natureza, exclusiva da ação

declarativa. Poderá, de algum modo, ser extensível à ação executiva?

i. Para alguma doutrina a resposta é negativa: a dívida comum poder

ser executada singularmente tratar-se-á de um litisconsórcio

voluntário, como têm defendido Lopes Cardoso, Anselmo de

Castro, Lebre de Freitas e Remédio Marques.

1. Lebre de Freitas, em especial, como nós mesmo no passado,

defende o caráter funcionalmente declarativo do artigo 34.º,

n.º1, 1.ª parte CPC não se verifica na ação executiva a razão

de ser do preceito, dirigido à salvaguarda de ambos os

cônjuges quando está em causa a definição (mas não a

execução) dum regime de responsabilidade patrimonial

comum. Deste modo, na posição de Lebre de Freitas, uma

sentença condenatória do casal pode ser executada apenas

contra um dos cônjuges, bem como o contrato ou a letra, por

exemplo. Por isso, quando a dívida for comum, o credor que

disponha de título executivo contra ambos tem

disponibilidade para decidir contra quem pode deduzir a

execução, podendo executar isoladamente o cônjuge que lhe

pareça ter os bens próprios mais adequados à satisfação do

crédito.

2. Anselmo de Castro escrevia, nesse sentido, que quando ao

credor conviesse mais não demandar logo ambos ele fá-lo-ia

apenas em face de um deles.

Em todos os caso de penhora de bens comuns, os penhorados são

os bens próprios. Naturalmente, que o executado poderia deduzir

oposição à penhora, invocando a subsidiariedade desses mesmos

bens em execução de dívida comum por haver bens comuns ou

invocando que esses bens são, afinal, comuns. Haveria ilegalidade

objetiva da penhora, nos termos da alínea a) do n.º1 do artigo 784.º

CPC. Nesse caso, esse credor poderia requerer a intervenção

principal do cônjuge do executado para permitir a legalidade da

penhora.

b. Crítica: a posição da doutrina da exequibilidade singular de dívidas comuns

conduz a resultados dificilmente aceitáveis. É que a consequência seria uma

tal execução correr pelo regime do artigo 740.º CPC, conjugado com o artigo

786.º, n.º1, alínea a) CPC, para o regime de comunhão de bens. Justamente,

na doutrina paradigmática de Lebre de Freitas, caberiam no artigo 740.º CPC

os casos de execução singular de dívida da responsabilidade de ambos os

cônjuges, tanto comum, como comunicável, e de execução de dívida da

responsabilidade de um deles. E na jurisprudência, o recente aresto RP 9

julho 2009/ 111-C/1992.P1 veio enunciar que cabem no âmbito da previsão

do artigo 741.º, n.º1 CPC, não só os casos de responsabilidade exclusiva do

executado, mas também aqueles em que a responsabilidade é comum,

segundo a lei substantiva, mas a execução foi movida contra um só dos

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responsáveis – quer haja título executivo contra ambos (caso em que o credor

podia ter movido a execução contra os dois), quer haja título executivo

apenas contra o executado (caso em que o credor, querendo executar ambos

os cônjuges, teria de propor previamente ação declarativa contra marido e

mulher: artigo 34.º, n.º3 CPC). A execução de dívidas comuns seria

perfeitamente possível para Lebre de Freitas pois o artigo 740.º CPC valeria

também para quando a responsabilidade é comum, segundo a lei substantiva,

mas a execução foi movida contra um só dos responsáveis – quer haja título

executivo contra ambos, quer haja título executivo apenas contra o executado.

Lebre de Freitas afirma, então, que o que sucederia é que a ordem a observar

na penhora teria de respeitar os regimes substantivos, in casu, sendo a dívida

comum e havendo título contra ambos os cônjuges, a penhora deve começar

pelos bens comuns e só na sua falta ou insuficiência pode incidir sobre bens

próprios. Esta penhora de bens comuns, defendida pelo Mestre

jusprocessualista, há-de querer dizer que o cônjuge seria citado para separar

a meação nos termos, justamente, deste artigo 740.º CPC. A solução causa

estranheza porquanto não se compreenderia como sendo penhorados bens

comuns para uma dívida comum o cônjuge não pudesse estar na melhor

posição processual possível: a de executado. Materialmente, seria o mesmo

que estabelecer um regime atípico de responsabilidade por dívidas comuns

em que apesar de constar do processo esta natureza se começaria pela

penhora dos bens comuns que compõem a meação e, só depois, a penhora

dos bens próprios. Deste modo, o artigo 1695.º CC quanto à penhora de

bens comuns deveria ser lido restritivamente: pelas dívidas da

responsabilidade de ambos os cônjuges responde a sua meação nos bens

comuns, na execução singular. Mais: a possibilidade de o credor poder

demandar só uns cônjuges devedores também deveria ser aplicada no regime

de separação de bens o que daria o seguinte: pelas dívidas da responsabilidade

de ambos os cônjuges respondem os bens próprios de qualquer dos cônjuges,

de ambos ou de só um deles, na execução singular. Ora, tal resultado não

pode ser tomado, pois as normas processuais devem ser interpretadas no

sentido mais conforme ao Direito material. É certo que logo de seguida Lebre

de Freitas concede que só se não houver bens comuns é que se explica a

propositura da execução contra um só dos obrigados no título. Esta

afirmação significa que, afinal, nem sequer se chega a aplicar o artigo 740.º

CPC, mas quando muito, supomos, a citação nos termos do artigo 786.º, n.º1,

alínea a), 2.ª parte CPC. Portanto, esta posição doutrinal coloca a nu as

fraquezas de se defender um litisconsórcio voluntário na execução de dívida

comum: o credor poderia, se demandasse apenas um cônjuge, penhorar

apenas metade dos bens comuns, o que não está na lei civil, e colocaria o

cônjuge numa posição subalterna. Por aqui decorre que o artigo 740.º CPC

não se aplica na execução de dívida comum, pois o cônjuge deve ser sempre

citado como devedor comum, em litisconsórcio necessário.

c. Posição pessoal (litisconsórcio necessário): deve partir-se da

interpretação dos dados do Direito substantivo, já que o regime processual

não pode senão dar expressão a este. O que está em questão é saber quais as

consequências de uma dívida ser, nos termos da lei, da responsabilidade de

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ambos os cônjuges, por ter sido contraída por ambos. O problema é,

portanto, anterior à responsabilidade objetiva, i.e, ao regime de bens, pois

existe quer este seja de separação, quer seja de comunhão. Expressamente a

lei material não impõe em lado algum um litisconsórcio. Se é patente que

ambos são devedores, como já seriam ainda que não fossem casados, e que

o eventual ganho situar-se-á no plano da responsabilidade objetiva como já

notámos atrás, contudo, o mero facto de existirem dois devedores não impõe

a sua presença na ação executiva. Por outro lado, não é manifesto que uma

dívida apenas por ser conjugal possa ser indivisível no seu cumprimento –

afinal, trata-se de uma obrigação pecuniária, importa relembrar. No entanto,

retira-se da crítica à tese do litisconsórcio voluntário que a responsabilidade

comum para poder ser realizada nos seus exatos termos apenas o pode ser

contra o casal. Menos que isso é gerar uma responsabilidade comum parcial

que a lei não admite: a responsabilidade comum é indivisível. Por outras

palavras, a demanda executiva de um só dos devedores não produz o efeito

útil normal de uma execução de dívida comum. Esta nossa conclusão retoma

a conclusão, feita por Alberto dos Reis no domínio do Código de Processo

Civil de 1939 de que o então artigo correspondente ao artigo 34.º, n.º3, 1.ª

parte CPC, se referia a toda e qualquer ação, incluindo a ação executiva. Tal

é, ainda hoje, válido: no plano literal, a lei não distingue o tipo de ação e no

plano material seria incoerente que o legislador quisesse uma definição

comum da dívida sem correspondência no momento grave da execução.

Desse modo, se decorrer do título, judicial ou extrajudicial, que a dívida foi

contraída por ambos, deverá a execução ser colocada contra o casal.

Aderimos por isto, à linha doutrinal de, nomeadamente, Teixeira de Sousa

e Castro Mendes, que defende que a dívida comum apenas pode ser

executada coletivamente sob pena de violação do regime substantivo. Há,

assim, um litisconsórcio necessário passivo tanto na declaração, como na

execução emergentes de facto praticado por ambos os cônjuges. Note-se que

conclusão vale tanto para uma execução em regime de comunhão de bens,

como em regime de separação de bens. A diferença, natural, é que na

comunhão se penhorão primeiramente bens comuns enquanto na separação

se penhorão sempre bens próprios, de qualquer dos cônjuges. Naturalmente

que podem perfeitamente ser penhorados apenas bens de um deles que se

respeite a subsidiariedade presente no artigo 1695.º, n.º1 CC ou nos limites

da meação na dívida impostos pelo n.º2 deste mesmo artigo. Em qualquer

caso, como ambos os cônjuges devem ser executados não há lugar nem à

aplicação do artigo 740.º CPC, nem do artigo 786.º, n.º1, alínea a) CPC. A

preterição deste litisconsórcio redunda em ilegitimidade que poderá ser

sanada por intervenção principal provocada pelo exequente no prazo dado

em despacho liminar ou superveniente para sua sanação. Na falta desta e após

o devido despacho de indeferimento liminar ou de extinção superveniente da

instância o credor poderá ainda aproveitar a ação, mediante renovação nos

termos do artigo 261.º, n.º2 CPC.

Execução de dívida própria:

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1. Regime de comunhão de bens (artigo 740.º CPC): os já referidos artigos 740.º e

786.º, n.º1, alínea a) CPC aplicam-se, antes de mais, à execução de dívida da

responsabilidade de um dos cônjuges no regime de comunhão de bens, ou seja, no

campo do artigo 1696.º CC. Tratar-se-á de dívida apresentada pelo credor e não

impugnada procedentemente pelo executado como sendo da responsabilidade de um

dos cônjuges. Ou seja: uma execução com base em título judicial ou extrajudicial que

formalmente apenas obrigue um deles, sem que o credor ou o devedor hajam alegado

e feito a demonstração de que a dívida, embora contraída individualmente, é comum.

Ora, substantivamente, nesta eventualidade, a dívida será tida por própria, conforme

o caráter residual do artigo 1692.º, alínea a) CPC. Por conseguinte, a execução deverá

ser promovida apenas e somente contra o cônjuge que é devedor em face do título,

nos termos gerais, em especial do artigo 53.º CPC. Em respeito do Direito civil, deve

ser, em primeiro lugar, promovida a penhora dos bens do próprio executado. Esta

qualidade vai presumir-se para qualquer bem penhorado, salvo se for manifesto que

os bens encontrados são bens comuns ou do cônjuge terceiro. Naturalmente, que o

próprio executado pode alegar esses caracteres na oposição à penhora ou o cônjuge

em embargos de terceiro. Se algum dos bens próprios do executado for imóvel ou

estabelecimento comercial, deve ser citado o seu cônjuge, ao abrigo do artigo 786.º,

n.º1, alínea a), 2.ª parte CPC. Mas também podem desde logo ser penhorados certos

bens comuns, e sem citação do cônjuge que seria imposta pelo artigo 740.º CPC,

conjugado com o artigo 788.º, n.º1, alínea a), 1.ª parte CPC, graças ao n.º2 do artigo

1692.º CC:

a. Os bens por ele levados para o casal ou posteriormente adquiridos a

título gratuito, bem como os respetivos rendimentos;

b. O produto do trabalho e os direitos de autor, ambos do cônjuge

executado;

c. Os bens subrogados no lugar dos referidos na alínea a).

A imperatividade desta afetação dos bens próprios às dívidas próprias implica que o

gradus executionis do n.º1 do artigo 751.º CPC, em geral, ou que a busca dos bens

cujo valor pecuniário seja de mais fácil realização ou adequado ao montante do

crédito do exequente, e dentro do universo dos bens próprios, desde que essa

qualidade seja conhecida.

a. Em consequência, a penhora de bens comuns apenas com o fundamento

de que são os mais adequados, com desrespeito dos bens próprios

conhecidos, é ilegal, podendo alegar esse vício que o executado, quer o seu

cônjuge, quer o exequente.

i. Em qualquer caso, o executado terá ao seu dispor o incidente de

oposição à penhora para alegar que os bens penhorados eram

comuns, nos termos do artigo 784.º, n.º1, alínea b) CPC, mas, tal

como no passado se dispunha, deve indicar no requerimento de

dedução do incidente os bens integrados no património autónomo

que responde pela dívida exequenda, que tenha em seu poder e

estejam sujeitos à penhora, segundo o n.º2 do artigo 784.º CPC.

ii. O exequente, por seu turno, pode reclamar do ato de penhora praticado

pelo agente de execução, nos termos do artigo 723.º, n.º1, alínea c)

CPC.

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iii. Quanto ao cônjuge do executado, importa distinguir. Sabemos que ele pode

utilizar os embargos de terceiro para defender os direitos sobre os

bens comuns (artigo 343.º CPC); mas tem ele a posição de terceiro?

Tem-na, sempre que a penhora dos bens comuns não tenha sido

acompanhada da sua citação, imposta pelo n.º1 do artigo 740.º e n.º2

do artigo 735.º CPC, sem prejuízo do n.º6 do artigo 786.º CPC. Neste

caso, a procedência dos embargos de terceiro dita o levantamento da

penhora, mas o exequente poderá requerer novamente a penhora dos

mesmos bens, agora citando o cônjuge, como a lei dispõe. Aliás, essa

mesma citação já poderia ter tido lugar anteriormente,

independentemente do decêndio de embargos de terceiro. Mas já não

tem a posição de terceiro requerida pelo artigo 343.º CPC, sendo os

embargos de indeferir, quando a penhora dos bens comuns tiver sido

acompanhada da sua citação, para promover a separação de bens.

Essa promoção é que é o seu poder processual específico, embora

em sede de Código velho o artigo 787.º CPC lhe confira ainda o

direito de deduzir o incidente de oposição à penhora, nos termos do

artigo 784.º, n.º1, alínea b) CPC.

b. Na falta de conhecimento de bens próprios do executado ou na

insuficiência destes, responde a meação sobre os bens comuns, como já

sabemos. No plano processual, houve evolução: o essencial do regime

encontra-se agora retornado à versão histórica por meio do reduzido artigo

740.º CPC. Se, antes da reforma de 2003, o exequente nomeava os bens

comuns e, ao mesmo tempo, devia requerer a citação do cônjuge do

executado, desde então é o agente de execução que, quando penhorar os bens

comuns que haja escolhido, deverá citar o cônjuge do executado, nos termos

do n.º1 do artigo 740.º CPC, para possibilitar a este requerer a separação de

bens ou juntar certidão comprovativa da pendência de ação em que a

separação já tenha sido requerida. Efetivamente, a citação do cônjuge passou

a ser promovida oficiosamente pelo agente de execução, nos termos do artigo

786.º, n.º1, alínea a) CPC, independentemente de o executado ter sido citado

previamente à penhora ou só depois desta. Cabe àquele agente a realização

das citações que devam ter lugar por causa da penhora e aquando da penhora:

cônjuge, credores titulares de direitos reais de garantia e demais entidades

referidas nos n.º1 e 2 do artigo 786.º CPC. A omissão da citação do cônjuge

do executado tem o mesmo efeito que a falta de citação do réu, podendo

importar a anulação das vendas, adjudicações, remições ou pagamentos já

efetuados, conforme o n.º6 do artigo 786.º CPC. A mesma sede legal confere

a esse cônjuge, em qualquer caso, o direito a indemnização segundo a medida

do enriquecimento sem causa do exequente ou de outro credor pago em vez

dele, e, nos termos gerais, segundo a medida do dano provocado pela pessoa

– máxime, agente de execução – a quem seja imputável a falta de citação. A

nulidade pode ser suprida por repetição do ato de citação do cônjuge, ao

abrigo do artigo 202.º CPC. Citado nos termos do artigo 740.º, n.º1 CPC e

786.º, n.º1, alínea a), 2.ª parte CPC, o cônjuge pode no de 20 dias (n.º1 artigo

740.º CPC):

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i. Requerer a separação de bens;

ii. Juntar a certidão comprovativa da pendência da ação em que a separação já tenha

sido requerida.

Atribui-se-lhe, ainda, os poderes enunciados no artigo 787.º CPC, ainda que

não requeresse a separação de bens, a saber:

i. Opor-se à execução ou opor-se à penhora, em 10 dias, a contar da citação, ou até

ao termo do prazo concedido ao executado, se terminar depois daquele;

ii. Exercer, na verificação e graduação de créditos e no pagamento, todos os direitos

que a lei processual confere ao executado.

Se o cônjuge requerer a separação de bens ou juntar certidão de ação

pendente em que a separação já tenha sido requerida, nos termos do n.º2 do

artigo 740.º CPC, fica suspensa a execução, mas não a penhora, uma vez

apensado o requerimento ou junta aquela certidão. O meio próprio para

efetuar essa separação é:

i. Como consequência de prévia separação, divórcio, declaração de nulidade ou

anulação do casamento o processo de inventário, regulado pela Lei n.º

23/2013, 5 março com as especificidades do artigo 70.º da mesma lei;

ii. A título principal e exclusivo, o processo para a separação de bens em casos

especiais regulado no artigo 81.º Lei n.º23/2013.

Aqui, embora qualquer dos cônjuges tenha legitimidade para impulsionar o

inventário, todavia, o credor exequente possui também legitimidade para

promover esse andamento, conforme o artigo 81.º, n.º1, alínea a) Lei

n.º23/2013. O cônjuge do executado ou falido tem o direito de escolher os

bens com que há-de ser formada a sua meação (artigo 81.º, n.º1, alínea c) Lei

n.º23/2013), mas, nesse caso, são notificados da escolha os credores. Não

podem ser aprovadas dívidas que não estejam devidamente documentadas,

segundo o artigo 81.º, n.º1, alínea b) Lei n.º23/2013. Os credores notificados

podem, então, reclamar contra a escolha, fundamentado a sua queixa,

máxime, invocando que poderão sofrer lesão por ter havido escolha simulada

ou ter sido feita a má avaliação dos bens. Se julgar atendível a reclamação, o

juiz ordenará a avaliação dos bens que lhe pareçam mal avaliados. Se a

avaliação modificar o valor dos bens escolhidos pelo cônjuge do executado,

este pode declarar que desiste da escolha; nesse caso, ou não tendo ele usado

do direito de escolha, as meações são adjudicadas por meio de sorteio. A não

existência de conflito entre os cônjuges, e a estratégia deliberada para colocar

os melhores bens no património do outro cônjuge e não executado, com vista

à subtração ao pagamento, consubstancia um comportamento malicioso

tendente a fazer do processo um uso manifestamente reprovável, com o fim

de atingir um objetivo ilegal, ou seja, manifesta má fé processual. Feita a

partilha, de duas uma, segundo o n.º2 do artigo 740.º CPC:

i. Ou os bens foram adjudicados ao executado, prosseguindo a execução na direção

da venda;

ii. Ou os bens penhorados foram adjudicados ao cônjuge do executado, podendo o

exequente indicar outros bens que lhe tenham cabido.

Nesta segunda hipótese, com a adjudicação do bem, onerado por penhora,

ao cônjuge não executado, por força do efeito subrogatório associado à perda

da coisa do património do executado do artigo 823.º CC, a penhora transfere-

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se, também para os bens do cônjuge do executado que hão-de constituir o

quinhão executado como valor de tornas. Ou seja: sobre eles passa a incidir

a garantia do pagamento do crédito, apesar de serem bens de terceiro à dívida.

Enquanto não forem transmitidos para o património do executado o cônjuge

devedor das tornas fica colocado na posição de fiel depositário, com todos

os deveres daí inerentes, inclusive, com a obrigação de prestar contas (artigo

760.º, n.º1 CPC). Por isso, sobre ele incide o dever de conservar as tornas em

seu poder ou de as depositar à ordem do tribunal. Paralelamente, e para maior

garantia para o exequente, o n.º2 do artigo 740.º CPC determina que a

penhora anterior permanece até nova apreensão de outros bens que hajam

cabido ao executado imediatamente ou futuramente a título de tornas,

acrescentamos. Esta solução suscita-nos profundas reservas: não

encontramos fundamento para estarem penhorados bens que, na verdade,

não vão responder pela dívida, visto serem do cônjuge não devedor. Não é

aceitável que os bens continuem submetidos aos efeitos da penhora –

apreendidos e sem possibilidade de alienação eficaz a terceiros. Acresce ainda

que o seu titular fica sujeito, sem prazo, aos resultados das diligências de

busca e indicação à penhora de novos bens.

d. Diferentemente, se o cônjuge citado não requerer a separação dos bem

sou não juntar a certidão de ação pendente, prossegue a execução nos

bens penhorados (artigo 740.º, n.º2, in fine CPC). Neste caso, ao cônjuge do

executado não se lhe atribuem mais poderes, regressando-se à doutrina

anterior a 2003, onde este já não poderia vir a opor-se à penhora por

embargos de terceiro, requerer a sua intervenção na ação como assistente do

executado ou, por algum modo, deduzir pedido de sustação na execução ou

retenção de metade do produto da venda. Visto que bens comuns

responderam por dívidas da exclusiva responsabilidade de um só dos

cônjuges será a respetiva importância levada a crédito do património comum

no momento da eventual partilha futura, por força do n.º2 do artigo 1967.º

CC.

2. Regime de separação de bens: vigorando um regime de separação de bens, vale o

que se disse anteriormente, com adaptações e exclusões. A diferença da execução

comum é que em vez de se penhorarem de modo não solidário os bens próprios de

cada cônjuge (artigo 1695.º, n.º2 CPC), apreender-se-ão apenas os bens do cônjuge

executado (artigo 1696.º, n.º1, 1.ª parte CC). Se forem penhorados imóveis ou

estabelecimento comercial do executado e que este não possa alienar livremente será

citado o seu cônjuge por força do artigo 786.º, n.º1, alínea a), 2.ª parte CPC. A falta

de bens comuns determina a inaplicabilidade do artigo 741.º CPC, pois o seu fito é a

tutela de bens comuns, já o dissemos.

Execução de dívida comunicável:

1. Comunicação na ação declarativa: como pode ser demonstrado que a dívida

contraída singularmente preenche algum pressuposto de comunicabilidade, de entre

os arrolados nos artigos 1691.º, n.º1, alíneas b) a e) e 2 CC? Na ação declarativa cabe

ao credor – já Alberto dos Reis o dizia – que tenha apenas um cônjuge como autor

do facto de onde provém a dívida optar entre obter condenação contra um ou contra

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os dois. No primeiro caso, o credor vai obter uma sentença que não pode ser

executada sobre os bens de terceiro ao título – i.e., nem sobre os bens comuns, nem

sobre os bens próprios do cônjuge que não é réu. No entanto, o réu terá o ónus de

alegar e demonstrar os pressupostos da comunicabilidade da dívida recorrendo à

intervenção principal provocada do seu cônjuge (artigo 316.º, n.º1 CPC), sob pena

de preclusão. No segundo caso é o credor que tem o ónus de demonstrar que a dívida

é comunicável para obter sentença que permita a execução dos bens próprios – e dos

bens comuns, no caso de regime de comunhão de bens – do cônjuge terceiro. Por

seu lado, o réu deve, consoante os casos, impugnar os respetivos factos constitutivos

da comunicabilidade ou ilidir presunções. Se o credor não invocar a comunicabilidade

na ação declarativa já não pode depois invoca-la na execução, ponto consensual na

doutrina. Essa sentença pode ser obtida mesmo que o credor já tenha título executivo

já que tem necessidade substantiva de obter título mais adequado ao seu direito.

Portanto, em conclusão, a 2.ª parte do n.º3 do artigo 34.º CPC estabelece um regime

de litisconsórcio voluntário conveniente na ação declarativa, como tem sido

defendido por alguma doutrina e jurisprudência. No entanto, alguma jurisprudência

qualifica esta necessidade de demandar os dois para obter sentença passível de

permitir a penhora de bens do cônjuge do executado como sendo um litisconsórcio

necessário, para assegurar o efeito útil da ação. Com o devido respeito, parece haver

aí um enviesado entendimento do conceito de necessidade litisconsorcial: esta resulta

de uma indivisibalidade subjetiva da pretensão do autor e in casu existiria se em

nenhuma circunstância ele pudesse obter uma condenação no cumprimento senão

através da demanda plural. Ora não é o caso: ele pode obter contra o cônjuge

contraente da dívida uma condenação com âmbito executivo mais restrito e, por isso,

uma sentença com efeito útil. Se essa linha de raciocínio jurisprudencial fosse

concetualmente adequada então nada impediria que também se visse como

constituindo litisconsórcio necessário a impossibilidade legal de executar uma dívida

conjunta apenas em face de um dos devedores parciários. A leitura do artigo 33.º,

n.º1 CPC permite-nos rapidamente concluir que assim não se pode entender. Dir-se-

á que assim se está a postergar o disposto no n.º1 do artigo 1695.º CC. Não é o caso,

de todo: não se viola o que não foi alegado e demonstrado no processo, sem prejuízo

de eventual conhecimento oficioso. Uma dívida comunicável é uma dívida que sendo

da autoria de um cônjuge o respetivo pressuposto de comunicação foi provado ou

pelo credor ou pelo devedor. Só depois dessa comunicação é que a dívida para efeitos

substantivos é uma dívida da responsabilidade de ambos os cônjuges. Antes disso é

uma dívida que será da responsabilidade exclusiva do cônjuge, salvos os casos de

comunicação automática, e que segue o regime do artigo 740.º CPC. Por isso, a

demanda de um cônjuge que não conste do título não pode deixar de redundar em

ilegitimidade singular por desrespeito ao artigo 53.º CPC, nomeadamente.

Eventualmente, pode e deve perguntar-se como se irá, depois, executar uma dívida

que for comunicada no processo. A resposta é aí sim semelhante, no resultado, à de

Teixeira de Sousa: como o título demonstra uma dívida contraída por ambos está-se

perante uma dívida da responsabilidade de ambos pelo que a penhora deve ser feita

segundo o regime do artigo 1695.º CC – no regime de comunhão ou de separação de

bens, consoante o caso – pois este não é divisível. Mais ainda: será de conhecimento

oficioso por constar de uma sentença em que os cônjuges foram condenados. Por

isso, após a comunicação, há um litisconsórcio necessário passivo processualmente

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superveniente; logo, por isso, não há lugar a aplicação do artigo 740.º e do seu

correlativo artigo 786.º, n.1º, alínea a) CPC.

a. Já Alberto dos Reis notava que se na execução de sentença condenatória

comunicadora da dívida apenas contra o marido a penhora de bens comuns

é fundamento de embargos de terceiro por parte da mulher. Este

entendimento vale, ainda, para o título judicial improprio ou de formação

judicial, máxime, o requerimento de injunção com fórmula executória e a

petição inicial não contestada no âmbito do procedimento declarativo

simplificado constante dos artigos 1.º a 6.º do anexo Decreto-Lei n.º269/98,

1 setembro, pois a existência do título pressupõe que não houve contestação

do devedor, que bem poderia ter alegado a comunicabilidade da dívida.

b. Contra esta posição está Abranges Geraldes por entender que houve

ausência de discussão, como acontece com um título extrajudicial.

c. Com o devido respeito, discordamos. Seria o mesmo que dizer que, em

geral, na injunção não há discussão sobre a pretensão do requerente; a

injunção, vista como um preliminar eventual do processo executivo ou do

procedimento declarativo simplificado, comporta discussão, só que quando

ocorre – i.e., quando o requerido contesta – implica o envio para o processo

declarativo proprio sensu (artigo 17.º, n.º1 Decreto-Lei n.º269/98, 1 setembro).

Se a discussão se centrar sobre a comunicabilidade da dívida, i.e., se é alegada

a comunicabilidade da dívida, vai-se também para o processo declarativo

simplificado. Fora da injunção também é assim: o procedimento declarativo

simplificado comporta discussão através da contestação; não se pode dizer

que ao respetivo réu que não contestou, nem alegou a comunicabilidade da

dívida, não foi dada a possibilidade de contestação e, em geral, de defesa

contra a pretensão do autor.

2. Comunicação na ação executiva:

a. A questão antes da reforma de 2003; posição pessoal: a pergunta que se

impõe agora é se fora dos casos de execução de sentença se também pode o

credor provocar a comunicação da dívida, agora na ação executiva. Na

verdade, o artigo 34.º, n.º3, 2.ª parte CPC é inaplicável diretamente à ação

executiva pois ele permite uma legitimidade plural conveniente para abrir um

processo que possa terminar em sentença. Não é manifestamente o caso.

Mais: a letra da norma – decisão suscetível de ser executada – mostra que o

legislador não a pretende aplicar à ação executiva, mas ao momento anterior

de formação do título executivo judicial. No entanto, sempre se discutiu se

estando pendente execução se poderia comunicar a dívida. Porquê? Porque

subjacente ao preceito está uma regra: a tutela processual deverá dar meios

ao credor de comunicar uma dívida. Contudo, ao mesmo tempo a ação

executiva tem por limite objetivo e formal o título executivo: ora a questão

da natureza comunicada da dívida é-lhe exterior. Como conciliar a

subsidiariedade, que resulta do regime material do artigo 1695.º, n.º1 CC, com

a regra da legitimidade formal aferida pelo título executivo do artigo 53.º, n.º1

CPC? Dois grupos de posições de perfilam:

i. Afirma que a dívida deve ser executada apenas contra o cônjuge devedor, por ser

o único que consta do título. Esta posição é, no plano numérico, a

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dominante, sendo defendida por Gama Prazeres, Anselmo de

Castro, Lopes Cardoso, Remédio Marques, Lebre de Freitas e

Amâncio Ferreira. No caso de regime de comunhão de bens, o

credor deveria, sucessivamente, nomear à penhora apenas os bens

próprio do executado e a meação nos bens comuns, nos termos do

artigo 740.º CPC. Já no regime de separação apenas poderia indicar

bens próprios do executado. Num plano formal, não ocorreria

alguma preterição de litisconsórcio necessário, pois respeitar-se-ia a

regra de legitimação formal dada pelo título (artigo 53.º CPC). Por

outro lado, o cônjuge executado não poderia a requerer a intervenção

principal do cônjuge terceiro, pois, segundo Lebre de Freitas na ação

executiva seria vedado ao executado requerer a intervenção principal

do outro devedor, ainda que cônjuge, além de que, neste caso, com

ela se visaria, afinal, obter a condenação do chamado, o que não se

compadece nem com o fim nem com os limites da execução. Restaria,

por isso, ao cônjuge executado acionar o mecanismo da

compensação, previsto no artigo 1697.º CC.

Nós próprios defendemos, nos anos 90, uma variante a esta posição que

passava pela nomeação da meação nos bens comuns apurados através da

aplicação por analogia do mecanismo do artigo 740.º CPC, e depois, na falta

ou insuficiência destes, de nomeação dos seus bens próprios, tudo conjugado

com a impossibilidade de chamar à demanda o cônjuge do executado, quando

este não conste do título (artigo 316.º CPC) e sem que ocorresse alguma

preterição de litisconsórcio necessário. Em 2004, abandonámos essa nossa

solução por nos parecer artificial, seja em face do Direito material, seja em

face do Direito processual. No entanto, toda a posição dominante, em apreço,

assenta num vício de falta de suporte e violação do Direito material. Um

regime material de dívidas é convertido em regime de dívida próprias com

fundamento em alegados limites do processo convertido.

ii. Ora, justamente, um segundo grupo de posições teve historicamente

em comum apontar à anterior essa desconformidade com o Direito material e

buscar solução mesmo dentro do processo. A partir daqui conheceram-se

variantes:

1. Alberto dos Reis e, mais tarde, Castro Mendes, admitiam

que a execução fosse dirigida apenas contra o consorte que

conste do título como devedor. Na verdade, o seu cônjuge

não teria legitimidade em face do título disponível. Por isso,

o credor só podia nomear à penhora os bens próprios do

executado e a meação nos bens comuns ou os respetivos bens,

nos termos do artigo 740.º CPC. No entanto, o devedor

executado poderia obter a comunicação na própria execução

por incidente de chamamento à demanda do consorte, ao

abrigo do artigo 316.º, n.º1 CPC, no prazo da oposição à

execução. Deste modo, se o credor apenas em ação

declarativa poderia promover a comunicação da dívida, i.e.,

uma condenação comum anterior à execução, já o devedor o

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poderia fazer tanto em sede declarativa, como em sede

executiva.

2. Mais recentemente, Teixeira de Sousa veio pugnar pela

dispensa pura e simplesmente da comunicação formal do

título e por uma execução comum contra ambos os cônjuges,

em litisconsórcio necessário, apesar de o título se referir

apenas a um dos consortes. O Mestre processualista partia do

pressuposto de que o artigo 1695.º, n.º1 CC impõe que a uma

responsabilidade comum corresponda uma execução comum,

pelo que a execução singular de dívida da responsabilidade de

ambos os cônjuges seria ilegal; esta regra de coincidência

entre a responsabilidade por dívidas e a legitimidade

encontraria expressão no n.º3 do artigo 34.º CPC. Contudo,

este imperativo não teria qualquer resposta legal nos casos em

que o título não legitima ambos os cônjuges para a execução;

nomeadamente, o artigo 740.º CPC não seria a solução

adequada. Só que o exequente, atendendo precisamente aos

artigos 1695.º, n.º1 CC e 34.º, n.º3 CPC não poderia

demandar apenas um dos cônjuges, apesar de ser este o único

legitimado pelo título, pelo que deveria propor a ação

executiva contra o casal, sob pena de o tribunal concluir por

preterição do litisconsórcio necessário legal, suprível pela

intervenção principal do cônjuge terceiro ao título. Para tal

deveria pedir a intervenção principal do cônjuge do

executado, no requerimento executivo ou o mais tardar até à

decisão de ilegitimidade (artigo 261.º CPC).

3. A posição de Teixeira de Sousa tem firmes alicerces no Direito

material mas parece-nos que quanto à adequada expressão processual a

razão estava com Alberto dos Reis e Castro Mendes. Os

preceitos processuais civis devem ser lidos favor actionem no

seu sentido amplo de, em favor, também, das posições

jurídicas subjetivas materiais da parte passiva. Ora, se é

verdade, como começamos por demonstrar, que os regimes

de dívidas não são destinados apenas ao credor ou apenas ao

devedor, seguramente que não pode, em nenhuma

interpretação, ser contra o devedor por negação a este de um

meio de invocar um regime que lhe possa ser útil à tutela dos

seus direitos. E, portanto, sempre haveria de ser admissível a

intervenção principal provocada na oposição à penhora,

ainda que apenas para os fins da execução. Uma vez

convencido o exequente da comunicação da dívida deveria a

execução correr contra ambos os cônjuges. Deste modo,

novamente o regime de dívidas comuns seria executado tal

como o Código Civil exige:

a. Os bens comuns; e depois

b. Os bens:

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a- De cada; na comunhão de bens;

b- Próprios de cada; na separação de bens.

Não provocada ou não tendo sucesso a comunicação, a

dívida seria própria, porque assim o é residualmente qualquer

dívida para a qual não seja demonstrada uma causa de

comunicação. O seu regime de penhora seria aquele a que já

aludimos.

b. A questão depois da reforma de 2003: após a reforma de 2003 a opção do

legislador foi a de permitir nos n.º2, 3, 4 e 6 do artigo 825.º CPC

(correspondente ao atual artigo 740.º CPC) um incidente restrito de

comunicação da dívida não contraída por ambos os cônjuges, provocado

pelo exequente ou pelo executado. Deste modo, o legislador avançou no

sentido de Alberto dos Reis mas sem admitir um incidente de intervenção

principal provocada. Aparentemente, puseram-se de lado, as reticências à

formação de título executivo contra o cônjuge terceiro em plena ação

executiva, quando só houvesse título contra um dos cônjuges. Não é, no

entanto, seguro que o novo regime seja totalmente eficaz e isento de

problemas. Pode preliminarmente afirmar-se que o artigo em questão, com

o seu regime de tutela dos bens comuns já analisado, se aplica só e apenas à

execução de dívida contraída por um dos cônjuges no regime de comunhão

de bens e que seja da sua responsabilidade exclusiva. E isto porque se o

incidente da comunicabilidade não surtir o efeito de comunicação a dívida

será executada como própria e se, diversamente, se for comunicada a dívida

abandona-se por completo a linha procedimental deste artigo. Mas vamos,

então, ver como se processava este incidente restrito de comunicação da

dívida. Importa distinguir qual o título que o exequente está a executar:

i. Se uma sentença: não deve ser admitida a alegação da comunicabilidade,

dado que qualquer das partes já o poderia ter feito na ação declarativa.

1. Quanto ao executado, vimos atrás que se entendia que ele tinha

o ónus de invocar a comunicabilidade na ação declarativa, sob

pena de o trânsito em julgado da decisão fazer precludir o seu

exercício. Desde 2003, isso resulta expressamente.

2. Quanto ao exequente, aderiu-se à melhor interpretação doutrinal

da 2.ª parte do n.º3 do artigo 34.º CPC: a ação declarativa

emergente de facto praticado por um dos cônjuges tanto se

pode mover também, em litisconsórcio voluntário

conveniente, contra o cônjuge terceiro, quando pretenda

obter-se decisão suscetível de ser executada sobre bens

próprios do outro. Deste modo, ou o credor invoca a

comunicabilidade na ação declarativa ou, caso não o faça, o

que não é contrário à lei, já não pode depois invoca-la na

execução. Este entendimento vale, ainda, para o título judicial

impróprio ou de formação judicial, máxime, o requerimento

de injunção com fórmula executória e a petição inicial não

contestada no âmbito do procedimento declarativo

simplificado constante dos artigos 1.º a 6.º do anexo ao

Decreto-Lei n.º269/98, pois a existência do título pressupõe

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que não houve contestação do devedor, que bem poderia ter

alegado a comunicabilidade da dívida.

Em conclusão, preexistindo um processo judicial ou administrativo,

há o ónus quer do autor, quer do réu, de invocar a comunicabilidade

nesse processo, sob pena de não o poderem fazer na ação executiva.

ii. Se outro título: se o título for extrajudicial e dele conste apenas um dos

cônjuges, passa a ser admitida a alegação da comunicabilidade pelo

exequente e pelo executado na ação executiva. Aparentemente, o

cônjuge citado não pode alegar a comunicabilidade da dívida, já que

o que se prevê é que ele apenas possa, além de promover a separação

de bens, declarar se aceita a comunicabilidade da dívida alegada por

este ou pelo exequente e manifestamente nada se diz quanto a ele.

Trata-se de um procedimento de base declarativa, que permite que,

apenas para efeitos daquele concreto processo, e sem valor de caso

julgado, se possa concluir pela existência de um direito do exequente

à execução dos bens comuns do casal. Tal como na injunção, o que

o mecanismo pretende é tão-só provocar a oposição à alegação do

requerente e associar ex lege um efeito de reconhecimento da

pretensão do requerente. A tramitação que pode ser considerada

modelo está fixada para a alegação feita pelo exequente, nos seguintes

termos:

1. Alegação fundamentada de que a dívida, a despeito da

singularidade passiva formal da obrigação, é comunicável,

feita no modelo de requerimento executivo, a par da

indicação de bens comuns;

2. Citação do cônjuge para requerer a separação de bens ou junção de

certidão de ação pendente e declarar se aceita ou não a comunicabilidade

nos termos fundados pelo exequente.

No caso do executado, o regime dá a entender que se o cônjuge não

executado já requerer a separação de bens, o executado já não pode

desencadear o mecanismo. O prazo de que o executado dispõe, o

regime de notificação e os efeitos da resposta do cônjuge do

executado são os mesmos que valem para o exequente. A partir daqui

há que distinguir, consoante:

1. Ocorra reconhecimento da comunicabilidade da dívida: o

reconhecimento pode decorrer da falta de oposição,

consistindo então numa confissão ficta decorrente da revelia,

ou pode resultar de uma confissão expressa por aceitação da

dívida. Produz-se, assim, o efeito da norma substantiva

alegada na fundamentação do exequente para a

comunicabilidade da dívida. Repare-se que não se trata de um

verdadeiro incidente declarativo, seja quanto ao contraditório,

seja quanto à prova, seja quanto à qualidade de quem o dirige,

seja, ainda, quanto ao valor da conclusão que dele resulta.

Efetivamente, no caso do mecanismo da comunicabilidade

da dívida:

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a. A lei não exige nenhuma prova ao exequente ou ao

executado que aleguem a comunicabilidade; mais até:

a sua junção ao processo pode ser sequer relevada;

b. Não há intervenção de um juiz, mas do agente de

execução;

c. Não há contraditório – não é ouvida sequer a

contraparte, ou seja, o executado ou o exequente;

d. Não há uma decisão final onde seja exercida a função

jurisdicional no acertamento definitivo de uma

situação jurídica.

Mas há, porém, um acertamento limitado, condição essencial

de prosseguimento da execução contra o cônjuge terceiro.

Esse acertamento apenas releva para aquele processo, não

tendo valor de caso material. Todavia, se tiver havido

confissão expressa da responsabilidade pela dívida, deve

considerar-se uma eficácia externa probatória da mesma:

aquela declaração tem a natureza de uma confissão de dívida

feita à parte contrária (artigo 352.º CC), provocada (artigo

356.º, n.º2 CC), escrita ou equiparada. Esta vale como

confissão judicial na correspondente ação de execução e

extrajudicial em qualquer outra causa (artigo 353.º, n.º3 CC),

com o valor probatório fixado no artigo 358.º, n.º2 CC. No

entanto, ele alcança alguma exequibilidadeprocessual.

Estamos, pois, perante um procedimento sumário com

cominatório pleno ou de tipo injuntório. A execução

prossegue então também contra o cônjuge não executado, lê-

se no artigo, expressão, no mínimo, enganadora porque, na

verdade, ele passa à condição de parte executada. A execução

passa a contar com dois executados, em regime de

litisconsórcio necessário superveniente. Uma vez que a dívida

passa a ser tida como da responsabilidade de ambos os

cônjuges, passará a valer o regime de responsabilidade

subsidiária do artigo 1695.º, n.º1 CC. Conjugando estes

preceitos, resulta que:

e. Se mantém a penhora sobre os bens comuns;

f. O executado inicial pode requerer a substituição da

penhora dos seus bens próprios – que haviam sido

penhorados no pressuposto de que a dívida era

incomunicável – por bens comuns suficientes;

g. O exequente pode requerer a penhora de bens

próprios do cônjuge executado, verificada a falta ou

insuficiência dos bens comuns.

Houve, assim, um ato processual de que resultou a

exequibilidade da obrigação contra quem não constava do

título original. Qual é o título executivo do cônjuge do

executado originário? Poder-se-ia pensar que seria o título

que o exequente apresentou à execução e que, portanto, a

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comunicabilidade consistiria numa extensão subjetiva do

âmbito desse título. Não nos parece que seja assim. A

comunicabilidade da dívida não é em si mesma uma alteração,

pela via processual, do conteúdo do negócio jurídico que se

formaliza, por exemplo, na letra ou no contrato; um

suprimento da falta de uma declaração negocial, se quisermos.

Não: a comunicabilidade dá expressão ao que já decorre da

lei, i.e., ao que resulta da verificação de uma causa legal de

extensão da responsabilidade pela dívida. Deste modo, parece

dever entender-se que se forma um título executivo ex novo,

autónomo, embora geneticamente ligado ao título executivo

extrajudicial inicial. Esse executado, que a dívida foi

considerada comum, como se lê no artigo, ou seja, que se

verificou, nos termos processualmente admitidos, uma

extensão da responsabilidade pela dívida. Será esse

documento um título judicial, ou seja, conterá ele uma

apreciação feita por um juiz, ou será um simples documento

executivo que contém uma apreciação do agente de execução?

Parece que aquela verificação há-de ser feita pelo agente de

execução, já que não se acha norma que dê este poder

específico ao juiz. A correção desta conclusão pode ser

aferida pela existência de idêntica solução quanto à apreciação

da existência de um crédito do executado sobre o terceiro

devedor no artigo 775.º CPC. Este título caía na alínea d) do

n.º1 do artigo 703.º CPC e deveria ser considerado um título

judicial impróprio ou, como a lei o designava, um título de

formação judicial – artigo 709.º, n.º2 e 3 CPC.

2. Não ocorra reconhecimento da comunicabilidade da dívida: caso o

cônjuge recusasse a comunicabilidade da dívida, esta

mantinha a qualidade supletiva de dívida própria. O problema

substantivo saía, então, da esfera da execução. O cônjuge

podia, então, requerer a separação de bens ou juntar certidão

de ação pendente, nos termos da norma mais geral. Se não o

fizer, a execução prossegue sobre os bens comuns

penhorados. A execução continuaria a contar com um só

executado e o seu cônjuge prosseguiria com os poderes

previstos no artigo 789.º CPC.

c. Âmbito e efeitos da comunicabilidade; a comunicabilidade na

separação de bens: entrando, mais em particular, na análise do regime da

comunicabilidade da dívida do Código Velho, já acima dissemos que é seguro

que ele fosse totalmente eficaz e isento de novos problemas. Tratavam-se de

problemas, de certo modo, comuns ao procedimento sumário com

cominatório pleno, a saber:

i. Pode o exequente ou o executado optar por outro meio alternativo,

quando ele exista?

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ii. Que pode fazer a parte que deduziu o pedido de comunicabilidade

da dívida na hipótese de não haver o reconhecimento dessa

comunicabilidade?

iii. Podem aceitar-se todas as declarações de reconhecimento?

iv. A parte que não requereu a comunicabilidade fica sujeita ao resultado

de reconhecimento ou de não reconhecimento da comunicabilidade?

O primeiro problema deveria ser resolvido preliminarmente, pois dele

dependia a resolução dos restantes. Importa saber, na verdade, se o exequente

ou o executado podem, em alternativa, usar outro meio processual para obter

a declaração da comunicabilidade da dívida. A resposta deveria ser negativa:

o meio previsto no regime era o adequado para obter aquele resultado, quer

porque tal foi o desiderato legislativo, quer porque, efetivamente, ele tutela

de modo suficiente os interesses em presença. Assim, o exequente não

poderia decidir não alegar a comunicabilidade e ir requerer junto do juiz de

execução a intervenção principal do cônjuge do executado, tal como antes da

Reforma defendia alguma doutrina. Este entendimento é, salvo melhor

opinião, o único que está de acordo com o enquadramento geral das soluções

semelhantes dos artigos 773.º, n.º3 CPC e 792.º, n.º3 CPC: são

procedimentos incidentais exclusivos e que não podem ser substituídos por

uma ação declarativa incidental. Resolvido este problema, já estamos em

condições de procurar responder às restantes questões, distinguindo algumas

das hipóteses possíveis em sede do procedimento de comunicação da dívida.

i. Numa primeira hipótese, que diríamos ideal, porquanto foi a pretendida

pelo legislador, o cônjuge aceita a comunicabilidade da dívida contraída em

proveito comum. Neste caso, alcança-se alguma estabilidade como

resultado do funcionamento de mecanismos diversos daqueles que

são próprios do caso julgado. Assim, o cônjuge fica vinculado aos

efeitos jurídicos decorrentes da procedência dos fundamentos

alegados pelo exequente ou pelo executado e que o artigo retira do

seu comportamento ativo ou omissivo, nos termos que já atrás

referimos. Por seu turno, o exequente ou o executado, que obteve a

procedência do seu pedido, não pode voltar a colocar o mesmo

problema no mesmo preceito, pois viu satisfeita a sua pretensão. No

entanto, já quanto à respetiva contraparte que discorde da

comunicabilidade da dívida – o executado, quando a

comunicabilidade for requerida pelo exequente, e o exequente,

quando a comunicabilidade for requerida pelo executado –, dir-se-á

que o respeito pelo direito de defesa não permite outra consequência

que não seja a de que aquela parte não se encontra em estado de

sujeição, podendo colocar o problema, nomeadamente, perante o juiz

de execução. Parece-nos que não pode deixar de caber reclamação,

nos termos gerais do artigo correspondente ao atual 723.º, n.º1, alínea

c) CPC, da apreciação sobre a comunicabilidade da dívida feita pelo

agente de execução. Só que essa reclamação é da decisão do agente

de execução, i.e. serve para pedir uma substituição da decisão do

agente, no quadro em que ele agiu, com base nos mesmos elementos.

Deste modo, a contraparte – v.g., o executado – pode alegar junto do

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juiz que não se verificaram os pressupostos da comunicação da dívida

– máxime, o reconhecimento – ou que a pretensão do requerente não

tem fundamento. Contudo, a reclamação não é um procedimento

alternativo, nem um incidente declarativo alternativo. Deste modo,

tal como sucede nos demais procedimentos sumários com

cominatório pleno, a discussão sobre a comunicabilidade terá de ser

realizada fora da execução: nomeadamente, para o executado, em

sede da compensação que é devida pelo pagamento de dívidas

comuns através de bens próprios, nos termos do artigo 1697.º, n.º2

CC.

ii. Numa segunda hipótese, o cônjuge do executado não aceita a comunicabilidade da

dívida contraída em proveito comum. As soluções a aplicar, são, em nosso

ver, as mesmas. Assim, imagine-se que a dívida é contraída em

proveito comum, mas esse cônjuge não aceita a comunicabilidade. A

nosso ver, esta situação será até a mais frequente, apesar do otimismo

do legislador: apenas em casos de inaptidão técnica do mandatário

judicial do cônjuge, de ausência daquele, ou de forte comoção

emocional do cônjuge, é que este aceitará que todo o património

comum, e também os seus bens próprios, passem a estar sujeitos à

execução. Tal pode acontecer, mas não será o normal. Se daí resulta

que a dívida não pode ser tratada como comum, contudo, daí

também não resulta que ela seja própria do cônjuge executado. Não

o é, porque esse não foi o objeto da pretensão do exequente ou do

executado, e também porque a não aceitação da comunicabilidade

pelo cônjuge do executado não resolve de modo definitivo e estável

a questão da natureza da dívida, i.e, não faz caso julgado. No entanto,

a dívida será executada segundo o que decorre do título, ou seja,

como dívida própria. Nesta eventualidade,

1. Se a comunicabilidade foi alegada pelo exequente, ele apenas pode

reclamar do ato do agente de execução, nos termos e limites

já referidos, ou seja, da correção da apreciação realizada pelo

agente de execução. Diversamente, o executado tem o ónus

de alegar um fundamento para a comunicabilidade da dívida.

2. Se a comunicabilidade foi alegada pelo cônjuge executado, este pode

reclamar do ato do agente de execução. Em qualquer caso, o

cônjuge executado pode beneficiar, já fora da execução, do

regime de compensação que é devida pelo pagamento de

dívidas comuns com bens próprios, nos termos do artigo

1697.º, n.º1 CC, podendo nele alegar a natureza comunicável

da dívida, pois, como já vimos, não se faz caso julgado sobre

a questão.

Por fim, importa notar que nada se prevê para quando os cônjuges

estejam casados em regime de separação de bens. De facto, se o

credor começar por penhorar bens próprios do executado não tem

aplicação este regime. A solução de admitir a intervenção principal

provocada, obviamente, causaria um desequilíbrio no sistema, em

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face da opção legal pelo incidente restrito previsto no artigo. A

solução há-de ser a sua aplicação analógica. Em que termos?

1. O exequente poderá no requerimento executivo alegar

fundamentadamente que a dívida, constante de título diverso de sentença,

é comum, caso em que o cônjuge do executado será citado para

no prazo da oposição declarar se aceita a comunicabilidade

da dívida, baseada no fundamento alegado, com a cominação

de, se nada disser, a dívida ser considerada comum, para os

efeitos da execução e sem prejuízo da oposição que contra ela

deduza, aplicando-se o regime, se não houver oposição do

exequente.

2. Por seu turno, o executado poderá invocar a comunicabilidade no

prazo da oposição à execução sendo o cônjuge notificado para no

prazo de que dispõe para oposição declarar se aceita a

comunicabilidade da dívida, baseada no fundamento alegado,

com a cominação de, se nada disser, a dívida ser considerada

comum, para os efeitos da execução e sem prejuízo da

oposição que contra ela deduza.

d. A questão nos artigos 740.º a 742.º CPC – autonomização do incidente

de comunicação da dívida: na Reforma de 2013 assiste-se ao

recentramento e clarificação de todo o sistema de alegação da

comunicabilidade da dívida na execução. Assim, por um lado, o artigo 825.º,

renumerado em artigo 740.º CPC, é reduzido de sete para dois números e

volta a função que tinha até à reforma de 2003: tão somente regular a

intervenção do cônjuge quando penhorados bens comuns. Já o fomos

analisando atrás, a propósito da execução de dívidas próprias. Por outro lado,

a questão da comunicação da dívida passa a merecer um tratamento

autónomo nos novos artigos 741.º e 742.º CPC.

i. Por seu turno, o artigo 741.º CPC estabelece várias regras que densificam

o até agora escassamente regulado incidente de comunicabilidade da

dívida.

1. Uma primeira nota é a seguinte: a questão da

comunicabilidade da dívida passa – e bem – a ser

independente da citação do cônjuge por penhora de bens

comuns. Naturalmente, que se pressupõe que se mova

execução apenas contra um dos cônjuges, tanto no n.º1 do

artigo 741.º, como no n.º1 do artigo 742.º CPC mas bem se

pode estar apenas a penhorar bens próprios do executado, ou

bens comuns ou até podem ainda nem sequer ter sido

penhorados bens alguns.

2. Uma segunda nota: a legitimidade ativa para requerer a

comunicação da dívida continua a caber ao exequente ou ao

executado, tal como no revogado regime, bastando alegar

fundamentadamente que a dívida, constante de título diverso

de sentença, é comum (n.º1 de ambos os artigos). Portanto,

não há mudança quanto ao âmbito objetivo deste incidente.

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3. Um terceiro lugar: no aso de alegação pelo executado é

necessário, ainda, no artigo 742.º, n.º1 CPC, que

a. Tenham sido executados bens próprios seus; e

b. Que indique logo quais os bens comuns que podem

ser penhorados.

Nenhum destes requisitos era exigido anteriormente.

Finalmente, as linhas de procedimento variam consoante a parte requerente

seja o exequente ou seja o executado, conforme os artigos 741.º e 742.º CPC.

i. Tratando-se de pedido apresentado pelo exequente, rege o artigo 741.º CPC: o

requerimento poderá ser deduzido, com os factos que fundamentam

a comunicabilidade da dívida:

1. No requerimento executivo (artigo 724.º, n.º1, alínea e) CPC);

2. Em requerimento autónomo deduzido até ao início das diligências para

venda ou adjudicação, nos termos dos artigos 293.º a 205.º CPC

e autuado por apenso.

O cônjuge do executado é depois citado para, no prazo de 20 dias,

declarar se aceita a comunicabilidade da dívida, baseada no

fundamento alegado. Perante esta citação pode, como no pretérito

regime:

1. Reconhecer expressamente a natureza comum da dívida;

2. Nada dizer, o que dita que a dívida será considerada comum;

3. Recusar a comunicabilidade da dívida, por oposição.

Mas, constitui novidade a possibilidade de o cônjuge poder deduzir

oposição à comunicabilidade da dívida, por impugnação. Por outras

palavras: se antes a mera recusa do cônjuge impedia desde logo a

comunicação, agora a recusa de reconhecimento da comunicabilidade

determina a abertura de uma fase contraditória.

ii. Se o pedido de comunicação da dívida foi deduzido pelo exequente no requerimento

executivo: a oposição do cônjuge à comunicabilidade da dívida pode

ser deduzida

1. De modo cumulado: efetivamente, o cônjuge que pretenda opor-

se à execução deverá cumular no ato a oposição à

comunicabilidade. Neste caso, se o recebimento da oposição

não suspender a execução, nos termos do artigo 733.º, n.º1

CPC, apenas podem ser penhorados bens comuns do casal –

i.e., além dos bens próprios do executado; nunca os bens

próprios do cônjuge – mas a sua venda aguarda a decisão da

proferir sobre a questão da comunicabilidade; Mas o cônjuge

pode não pretender opor-se à execução: deverá deduzir a

oposição à comunicabilidade em articulado próprio; ou

2. De modo autónomo: se o pedido de comunicabilidade da dívida

foi deduzido pelo exequente em requerimento autónomo a

oposição do cônjuge à comunicabilidade da dívida pode ser

deduzida na oposição a esse mesmo requerimento. Deduzida

a oposição fica suspensa a venda, quer dos bens próprios do

cônjuge executado que já se mostrem penhorados, quer dos

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bens comuns do casal, a qual aguarda a decisão a proferir,

mantendo-se entretanto a penhora já realizada.

iii. Por seu turno, o executado também pode deduzir pedido de comunicação da dívida

na oposição à penhora, ao abrigo do artigo 742.º CPC. O cônjuge é então

citado nos termos e para os efeitos do n.º2 do artigo 741.º CPC, ou

seja, no prazo de 20 dias, para declarar se aceita a comunicabilidade

da dívida, baseada no fundamento alegado. Mas também o exequente

deve ser notificado do requerimento. Se este se opuser ou se o

cônjuge impugnar a comunicabilidade a questão é resolvida pelo juiz

no âmbito do incidente de oposição à penhora. Fica suspensa a venda

dos bens próprios do executado.

Em qualquer caso, o julgamento do incidente da comunicabilidade é da

competência do juiz de execução, numa sequência declarativa que será a da

própria oposição à execução ou de incidente autónomo, consoante a linha

procedimental. Os efeitos processuais de a dívida ser qualificada como

comum ou como própria constam dos n.º5 e 6 do artigo 741.º CPC, para

onde ainda remete o n.º2 do artigo 742.º CPC. Esses efeitos são idênticos e

apresentam igual natureza tenha a qualificação resultado fictamente da falta

de oposição ou tenha sido declarada pelo juiz. Assim,

i. Se a dívida for considerada comum: valerá a solução do n.º 5 do artigo

741.º CPC: a execução prossegue também contra o cônjuge (que

passa a ter o estatuto de executado) cujos bens próprios podem ser

nela subsidiariamente penhorados; se, antes da penhora dos bens

comuns, tiverem sido penhorados bens próprios do executado inicial,

pode este requerer a respetiva substituição;

ii. Se a dívida não for considerada comum: retorna-se à solução do n.º1 do

artigo 740.º CPC: se já tiverem sido penhorados bens comuns do

casal, o cônjuge do executado deve, no prazo de 20 dias após o

trânsito em julgado da decisão, requerer a separação de bens ou juntar

certidão comprovativa da pendência da ação em que a separação já

tenha sido requerida, sob pena de a execução prosseguir sobre os

bens comuns. Neste caso, naturalmente, que se aplicam com as

necessárias adaptações, o disposto no n.º2 do artigo 740.º CPC.

A decisão final parece valer apenas dentro do processo quanto à qualificação

da dívida, mas não é seguro que assim seja.

§41.º - Proporcionalidade e adequação

Proporcionalidade:

1. Enunciado: os limites substantivos, incluindo os regimes de responsabilidade, e as

impenhorabilidades objetivas, determinam o objeto abstrato ou legal de penhora.

Importa ainda fixar a extensão ou medida concretas desse objeto. Já antes da reforma

de 2003 se entendia que a penhora estava limitada na sua extensão pelo valor da

obrigação exequenda – e não dos créditos reclamados – somando ao valor das custas

do processo. Assim, quando o executado nomeava bens à penhora, estes deveriam

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ser suficientes para pagamento de crédito e das custas; quando o exequente fazia a

nomeação nos casos do anterior regime, deveria nomear bens suficientes para

pagamento do seu crédito e das custas; nos demais casos, essa mesma parte nomeava

os bens necessários para suprir a falta ou insuficiência. Os bens suficientes e

necessários funcionavam como uma medida para a extensão da penhora no

património do executado, se além deles existissem mais bens – não mais do que esses,

para o exequente; não menos, para o executado. A ideia que se reconduz à regra da

proporcionalidade da penhora, passou com a reforma de 2003 a estar enunciada no

que agora corresponde ao n.º3 do artigo 735.º CPC. Aí se pode ler que a penhora

limita-se aos bens necessários ao pagamento da dívida exequenda e das despesas

previsíveis da execução. Este princípio, também designado por princípio da

suficiência, tem raiz constitucional no princípio da propriedade privada (artigo 62.º

CRP) que torna excecional qualquer oneração ou perda forçada das situações

jurídicas ativas privadas. Na jurisprudência, tem-se defendido que a natureza gravosa

da penhora limita-se àquilo que seja necessário para a satisfação do crédito exequente

e das custas. Ao mesmo tempo salvaguarda-se o interesse público do uso adequado

dos tribunais, sem atos ou diligências desnecessários.

2. Concretização; proibição de apreensão prévia de bens a penhorar: o preceito

do artigo 735.º, n.º3 CPC lida, assim, com uma dupla estimativa:

a. A do valor dos bens: importa operar uma prognose não só do valor do

produto arrecadável, mas ainda do valor o quantum desse valor que chegará,

no final, às mãos do exequente. Neste sentido, ensina Lebre de Freitas que

devem ser levadas em conta na extensão inicial da penhora as garantias reais

de terceiro: acionadas em sede de reclamação de créditos, elas reduzirão a

parte do produto da venda a receber pelo exequente. É, tendo em conta estas

limitações, que se deve aferir se os bens a penhorar são ou não são os

necessários. E será essa mesma necessidade que ditará um reforço da penhora,

nas eventualidades do artigo 751.º, n.º4 CPC.

b. A do valor das despesas de justiça: o uso da expressão despesas previsíveis

da execução no artigo 735.º, n.º3 CPC, não é inocente: pretende-se com ela

abranger, além das custas judiciais stricto sensu, os encargos com

remunerações e outros pagamentos a fazer agente de execução, nos termos

dos artigos 43 e seguintes Portaria n.º282/2013, 29 agosto. Uma vez que no

início da execução tais valores apenas podem ser estimados, a 2.ª parte do

mesmo preceito estabelece que, sem prejuízo do que se vier a apurar a final

(artigo 847.º, n.º1 a 3 CPC), as despesas se presumem no valor de:

i. 20% do valor de execução, se este couber na alçada do tribunal

da comarca – ou seja, até 1000€ de despesas estimadas, sem que o

valor da execução seja superior a 5000€;

ii. 10 % do valor de execução, se este for superior à alçada do

tribunal da comarca, sem exceder em quatro vezes o valor da

alçada do tribunal da Relação – portanto, até 12000€ de despesas

estimadas, numa execução cujo valor não pode exceder os 120000€;

iii. 5% do valor de execução, se este for superior a quatro vezes o

valor da alçada do tribunal da Relação – portanto, para execuções

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de valor superior a 120000€, como, por exemplo 10000€ em 200000€

de execução.

Estas regras de proporcionalidade funcionam de modo objetivo, em função

do valor das dívidas, principal e acessórias; não em função da configuração

subjetiva da causa. Assim, se numa execução forem vários os executados, a

regra da suficiência da penhora não funciona de forma individualizada ou

pessoal, relativamente apenas aos seus bens. É que o que releva é que a

totalidade dos bens penhorados sejam suficientes para o pagamento do

crédito exequendo e custas, independentemente de quem indicou os bens e

de quem são esses bens. Deste modo, a indicação e penhora dos bens de

alguns dos devedores aproveita aos demais.

Por fim, e tal como o anterior conceito de suficiência, a medida dos bens necessários

para os vários pagamentos, é apreciada logo no momento da apreensão e não após a

venda dos mesmos. Por isto, é ilegal, porquanto violadora daqueles limites, uma

penhora cautelar ou preventiva, ou uma apreensão prévia – no essencial, com o

mesmo cariz ofensivo da propriedade – feitas apenas com o intuito de criar uma

reserva de património para a execução, de modo a prevenir uma eventual frustração

da venda dos bens penhorados.

a. No entanto, vários Acórdãos têm autorizado a que o exequente

requeira que se proceda primeiro à apreensão da coisa móvel sujeita a

registo, para se certificar que existe e qual o seu valor comercial,

havendo dúvidas fundadas, e só depois, solicitar o registo da penhora.

No plano normativo haveria suporte no n.º1 do artigo 749.º CPC que

autoriza que a realização da penhora possa ser precedida de todas as

diligências úteis à identificação ou localização de bens penhoráveis. Esta

apreensão prévia seria uma dessas diligências.

b. Com o devido respeito, discordamos. Dir-se-ia que quem pode, ao abrigo

da lei, beneficiar de uma penhora pode beneficiar de um quid qualitativamente

menor. O argumento não pode proceder: o direito à execução apenas pode

se exprimir pelos meios coativos típicos, dada a gravidade que eles

representam para o executado: esta apreensão não sendo nem penhora, nem

arresto, nem nenhuma providência cautelar não tem admissibilidade legal.

Tivesse o legislador querido tipificar uma tal medida no artigo 749.º CPC e

tê-lo-ia feito. E não é, justamente, de somenos o efeito concreto desta

apreensão prévia: o executado fica com o bem retido, sujeitando-se a dano, e

nada garante que a retenção se converta em penhora. É certo que o princípio

da cooperação processual poderá justificar que o executado tenha a obrigação

de mostrar o bem, por força do n.º1 e 4 do artigo 7.º CPC, Mas a remoção

dos obstáculos – autorizada ao agente de execução, por aplicação analógica

do n.º4 do mesmo artigo – ao conhecimento da existência e estado do bem

pode apenas passar por injunções verbais ou escritas ao executado. Em

conclusão, citando o Ac. RP 9 setembro 2008 /0824024 a lei

«não permite que se proceda à apreensão prévia do veículo com o fim de

averiguar da sua existência, do seu estado e do seu valor comercial».

O agente de execução deve, sim, previamente à comunicação à conservatória

colher informações sobre a existência do veículo e o seu estado e valor

comercial, ao abrigo do artigo 749.º CPC.

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3. Violação: o n.º3 do artigo 735.º CPC constitui, não tanto uma orientação quanto ao

objeto da indicação dos bens para a penhora pelo exequente ou pelo executado, mas

uma limitação da penhora do agente de execução. Efetivamente, se houver excesso

de indicação de bens pelo exequente ou mesmo pelo executado, tal apenas aumentará

o leque de escolha do agente de execução. Mas já se houver insuficiência ou falta

absoluta de indicação de bens pelo executado, tal pode fazê-lo incorrer numa sanção

pecuniária compulsória (artigo 752.º, n.º1, 2.ª parte CPC –, se tiver agido com má fé.

Diversamente, o que o nº3 do artigo 737.º CPC vem fazer é impor ao agente de

execução o dever legal de promover a penhora apenas dos bens na medida do

necessário e suficiente para atingir os limites estabelecidos naquela norma. Por isso,

a violação do artigo 735.º, n.º3 CPC é fundamento de oposição à penhora pelo

executado (artigo 784.º, n.º1, alínea a) CPC) ou de reclamação para o juiz pelo

exequente (artigo 723.º, n.º1, alínea c) CPC), respetivamente.

Adequação; relação com o princípio da proporcionalidade:

1. Regime da reforma de 2008:

a. Não vinculação às indicações do exequente; o gradus executionis: é

dentro deste teto que o agente de execução deverá procurar penhorar os bens

que apresentam maior probabilidade de realizarem uma quantia pecuniária

em menor tempo cumprindo um princípio de adequação do objeto da

penhora à realização do direito à execução. Quanto a ele o legislador pode

determinar a sujeição às indicações de penhora deduzidas pelo credor ou

pode tornar estas meramente indicativas. Sobretudo nesta última hipótese,

pode a lei optar entre impor critérios abstratos de preferência de realização

da penhora de certos bens sobre outros – gradus executionis – ou deixar ao

agente de execução um poder discricionário, ainda que delimitado, de

concretização da adequação. Em sede de Código anterior à reforma de 2013,

este princípio de adequação e, bem assim, o princípio da proporcionalidade

ditavam uma regra de não vinculação do agente de execução às indicações do

exequente. Efetivamente, suprimida em 2003, com a reforma de 2008

retornou-se à solução, de impor um gradus executionis que valia, justamente,

independentemente da ordem pela qual o exequente indicou bens à penhora,

do resultado das diligências prévias à penhora e dos bens nomeados à

penhora pelo executado. Deste modo, a ordem da eventual indicação de bens

pelo exequente ou pelo executado era isso mesmo: uma mera informação. O

agente de execução deveria, então, penhorar os bens encontrados pela ordem

seguintes:

i. Depósitos bancários;

ii. Rendas, abonos, vencimentos, salários ou outros créditos se permitirem,

presumivelmente, a satisfação integral do credor no prazo de seis meses;

iii. Títulos e valores mobiliários;

iv. Bens móveis sujeitos a registo se, presumivelmente, o seu valor for uma vez e meia

superior ao custo da sua venda judicial;

v. Quaisquer bens cujo valor pecuniário seja de fácil realização ou se mostre

adequado ao montante do crédito do exequente.

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Por outro lado, também previa um gradus executionis especial mediante

critérios de preferência na escolha da conta ou contas cujos saldos são

penhorados. O critério entre as categorias de bens era o da subsidiariedade:

apenas se passa para a penhora dos bens situados imediatamente abaixo na

escala, na falta ou insuficiência dos bens anteriores. Do ponto de vista da

expressão económica, a penhora deveria, assim, orientar-se para os bens que

apresentam maior probabilidade de realizarem uma quantia pecuniária em

menor tempo, probabilidade essa que ia baixando com a descida na escala.

Não fazia sentido procurar aplicar ao exequente a vinculação do gradus

executionis. Esta regulava a ordem da realização da penhora – o agente de

execução deve efetuar a penhora, lia-se no preceito – ou seja, do ato efetivo

de restrição à esfera patrimonial do executado, ato esse da competência do

agente de execução. Todavia, o princípio da proporcionalidade determinava

alguns aspetos do gradus executionis:

vi. O legislador presumia – nem sempre bem – que a penhora de valores

mobiliários seria menos gravosa que a penhora de móveis e que a

penhora destes é-o também quanto a outros bens – máxime, imóveis;

vii. Os bens imóveis e estabelecimentos comerciais ficavam resguardados

para o fim da graduação fosse enquanto bens que in casu cujo valor

pecuniário seja de fácil realização ou fosse enquanto bens cujo valor

se mostre adequado ao montante do crédito do exequente, não

havendo melhores bens.

1. Mais, a sua penhora dependia de quando a penhora de outros

bens não permita a satisfação integral do credor no prazo de

seis meses, máxime, porque não houvesse mais bens

conhecidos. Mas nesse caso, a penhora de bens imóveis ou

de estabelecimento comercial seria feita ainda que não se

adeque, por excesso, o montante do crédito exequendo.

Tratava-se de uma manifestação do favor creditoris: entre ter de se sacrificar o

interesse do exequente na satisfação em tempo razoável do seu direito ou o

interesse do executado em ver a oneração do seu património ser apenas a

correspondente à da sua responsabilidade, sacrifica-se este último. Ou seja,

entre o valor jurídica da adequação e o valor jurídico da proporcionalidade

da penhora, prevalecia aquele primeiro sobre este último. O agente de

execução teria, porém, de fundamentar a indispensabilidade desta solução.

Esta opção axiológica foi, porém, moderada com as alterações impostas pela

Lei n.º60/2012, 9 novembro. Em vez de se ser pressuposto bastante a

penhora de outros bens presumivelmente não permitir a satisfação integral

do credor no prazo de seis meses, a penhora de bens imóveis ou do

estabelecimento comercial passou a depender de a penhora de outros bens

presumivelmente não permitir a satisfação integral do credor:

i. No prazo de doze meses, no caso de a dívida não exceder metade do

valor da alçada do tribunal de primeira instância – i.e., ser até 2500€

- e o imóvel seja a habitação própria permanente do executado;

ii. No prazo de dezoito meses, no caso de a dívida exceder metade do

valor da alçada do tribunal da primeira instância – i.e. ser superior a

2500€ - e o imóvel seja a habitação própria permanente do executado;

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Página 234页

iii. No prazo de seis meses, nos restantes casos.

Em qualquer caso, o gradus executionis não funcionava de modo abstrato, puro,

mesmo para o agente de execução. Logo se atribuía ao agente de execução a

última palavra: ele deveria seguir o gradus preferencialmente. Isto é: o critério

gradativo abstrato de adequação fixado pelo legislador, podia ser substituído

por um critério gradativo concreto fixado pelo agente de execução. Tratava-

se, claramente, de um poder discricionário mas, necessariamente, um poder

limitado com caráter excecional. O seu uso carecia de fundamentação

expressa, sob pena de sindicabilidade em sede de impugnação. Nessa

fundamentação o agente deveria demonstrar a conveniência do não

cumprimento do gradus, ponderando o critério da adequação entre o bem e a

eficácia da respetiva execução, agora já não presumida abstratamente pelo

legislador, mas concretamente avaliado pelo agente. E, muito em particular,

deve demonstrar que uma eventual inaplicação (quantitativa ou qualitativa)

do princípio da proporcionalidade é a única via possível.

b. Exceções ao gradus executionis; violação: no Código pretérito o gradus

executionis era afastado pelo funcionamento de certos preceitos do regime da

penhora. Assim, a execução de garantia real, tanto sobre bens de terceiro

(artigo 54.º, n.º1 CPC) como sobre bens do executado (artigo 752.º, n.º1

CPC), deveria ser respeitada pelo agente de execução. Por outro lado, ditava

o correspondente n.º2 do artigo 752.º CPC atual, que quando a penhora de

quinhão em património autónomo ou de Direito sobre bem indiviso

permitisse a utilização do mecanismo do artigo 743.º, n.º2 CPC e tal for

conveniente para os fins da execução, a penhora começaria por esse bem.

Finalmente, o exequente poderia pretender que se penhorassem certos bens

para alcançar vantagens processuais que o Código lhe concede:

i. Evitar a citação prévia; ou

ii. Evitar a reclamação de créditos garantidos com privilégios gerais.

O agente de execução também se encontrava vinculado nestes dois casos.

i. Evitar a citação prévia: o exequente deverá não fazer indicação à

penhora do estabelecimento comercial, direito real menor que sobre

ele incida ou quinhão em património que os inclua e deverá

expressamente enunciar a sua pretensão relativa ao ganho de dispensa

de citação. O agente de execução deverá, então, promover a respetiva

penhora ou penhorar outros bens diferentes mais adequados, desde

que não sejam bens imóveis ou estabelecimento comercial, direito

real menor que sobre eles incida ou quinhão em património que os

inclua. Aqui há uma vinculação relativamente às categorias de bens

que não podem ser penhorados. No entanto, se os bens indicados

não forem encontrados e se os não poder substituir por outros que

não caibam naquela categoria, o agente de execução devia informar o

exequente, nos termos do artigo 754.º, n.º1 CPC (na versão

correspondente). Ao mesmo tempo deveria promover a citação do

executado. É que, se assim não fosse, seriam penhorados bens em

citação prévia do executado, em circunstâncias não previstas pelo

legislador.

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ii. Evitar a reclamação de créditos garantidos com privilégios gerais: suponha-se

que o exequente, em vez de indicar um imóvel de baixo valor, opta

pela indicação de um frota de veículos comerciais do executado para

beneficiar do artigo 788.º, n.º4 CPC (na versão correspondente). Ora,

essa intenção para ser salvaguardada também deve ser expressa, não

se podendo deduzir por presunção natural da mera indicação de certo

tipo de bens e não indicação de outros.

O desrespeito a qualquer destas vinculações é violação grave do princípio do

dispositivo e gera a nulidade da penhora, pois ela não poderia ter lugar de

todo em face do ato processual excludente do exequente. Naturalmente que,

salvo na execução de garantia real, apenas a proporcionalidade poderá

restringir o alcance da vontade do exequente e, mesmo assim, sempre depois

de o mesmo ser informado. Já a violação do gradus executionis constituía

fundamento de oposição à penhora pelo executado (artigo 784.º, n.º1, alínea

a) CPC) ou de reclamação para o juiz pelo exequente (artigo 723.º, n.º1, alínea

a) CPC), respetivamente.

2. Regime da reforma de 2013: vinculação às nomeação de bens pelo exequente;

supressão do gradus executionis. A garantia de citação na execução de dívida

vencida não superior a 10 000 euros, por título extrajudicial (artigo 855.º, n.º5

CPC): o artigo precedente, sai fortemente reformado em vários aspetos em 2013,

renumerado em artigo 751.º, n.º1 a 3 CPC.

a. A primeira mudança é a da regra da vinculação do agente de execução às

indicações do exequente, assim enunciadas na 1.ª metade do n.º2 deste artigo:

o agente de execução deve respeitar as indicações do exequente sobre os bens

que pretende ver prioritariamente penhorados. Não se quer, pois, dizer que

o agente apenas penhorará unicamente esses bens: pode, se necessário,

penhorar outros bens, mas depois dos indicados pelo credor. Em suma: a

indicação de bens passa a ser um verdadeiro ato de nomeação de bens à

penhora, responsabilizador do exequente. Parece ser nula e, por isso, objeto

de reclamação para o juiz (artigo 723.º, n.º1, alínea a) CPC), a penhora feita

em desrespeito da nomeação de bens do exequente. Seja como for, a 2.ª parte

do mesmo n.º2 do artigo 751.º CPC ressalva o que já decorre dos princípios

e regras gerais: o agente de execução não deve cumprir a nomeação de bens

do exequente que viole norma legal (processual ou substantiva) imperativa

(v.g., que ordene a penhora de todos os bens móveis do domicílio do

executado ou da totalidade do salário – artigos 737.º, n.º3, 1.ª parte e 738.º,

n.º1 a 3 CPC), ofenda o princípio da proporcionalidade da penhora (artigo

735.º, n.º3 CPC) ou infrinja manifestamente o princípio da adequação

afirmado no n.º1 do artigo 751.º CPC. Uma das regras imperativas é a de que,

salvo renuncia do credor, a execução de garantia real sobre bens de terceiro

ou do devedor (artigo 54.º, n.º2 e 752.º, n.º1 CPC), deve ter prioridade sobre

a penhora de bens não dados em garantia. E parece também que a

consideração geral dos fins da execução poderá determinar, ao abrigo do

artigo 752.º, n.º2 CPC, a prioridade da penhora de quinhão em património

autónomo ou de Direito sobre bem indiviso, desde que permita a utilização

do mecanismo do artigo 743.º, n.º2 CPC.

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Página 236页

b. Efetivamente, e como segunda mudança da reforma de 2013, passa a

enumerar-se no dito n.º1, o referido princípio cardinal da adequação,

recuperando-se a letra do anterior regime: a penhora começa pelos bens cujo

valor pecuniário seja de mais fácil realização e se mostrem adequados ao

montante do crédito do exequente. Trata-se de uma cláusula geral a ser

concretizada, ao abrigo de um poder discricionário, pelo agente de execução.

Já não mais se impõe um gradus executionis, salvo na penhora de saldos

bancários no artigo 780.º, n.º7 CPC. No mais mantém-se, no n.º3 do artigo

751.º CPC, a regra de que a penhora de imóveis e de estabelecimento

comercial apenas se admite quando a penhora de outros bens

presumivelmente não permita a satisfação integral do credor nos prazos,

fixados nas várias alíneas, de doze, dezoito e seis meses. Mas não pode deixar

de ser uma manifestação preventiva do princípio da proporcionalidade o n.º5

do artigo 855.º CPC que garante que na execução na forma sumária, ao abrigo

do artigo 550.º, n.º2, alínea d) CPC, a penhora de bens imóveis, de

estabelecimento comercial, de direito real menor que sobre eles incida ou de

quinhão em património que os inclua só possa realizar-se depois da citação

do executado, em consequência da aplicação do disposto no artigo 726.º CPC.

Recorde-se que aquela alínea d) aponta para dívidas que não passam de

10000€ pelo que é de gravidade patrimonial pagá-las à custa de bens

tendencialmente mais valiosos.

B – Atos preparatórios

§42.º - Indicação de bens

Introdução: o ato de penhora é o resultado de uma cadeia de atos prévios que o preparam:

as diligências prévias à penhora. Esses atos prévios são:

1. A indicação de bens;

2. A consulta de registo informático de execuções;

3. A localização e identificação dos bens penhoráveis.

Apenas a consulta do registo informático está presente em qualquer execução. Todos os

demais são atos eventuais.

Legitimidade:

1. Exequente: a indicação de bens é um ato voluntário de uma parte executiva de

individualização dos concretos bens a penhorar, no que parece ser um misto de

princípio da cooperação, com princípio dispositivo. Desde a reforma de 2003 que foi

suprimida o benefício do executado proceder voluntariamente à individualização do

património a sujeitar à execução antes de eventual devolução ao exequente. É certo

que tal já sucedia no processo sumário, mas então generalizou-se a regra, haja citação

ou não prévia. E, por isso, mesmo quando haja despacho de citação, o executado é

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chamado á ação para pagar ou opor-se à execução, segundo o artigo 726.º, n.º6 CPC

e já não para pagar ou nomear à penhora, como se dispunha antes de 2003. Na

verdade, a individualização de bens penhoráveis passou a poder ser feita pelo

exequente em dois momentos:

a. Inicial: no requerimento executivo o exequente pode indicar bens para a

penhora, incluindo a indicação dos ónus e encargos respetivos. No regime

anterior enunciava-se que esses elementos identificativos seriam, sempre que

possível ou tanto quanto possível:

i. Quanto a imóveis, por denominação ou número de polícia – ou situação

e confrontações na falta daquelas –, artigo matricial e número da

descrição, caso estejam registados, ou a sua natureza, freguesia e

concelho, caso o não estejam;

ii. Quanto a móveis, por especificação e lugar da localização;

iii. Quanto a móveis sujeitos a registo, por especificação e lugar da localização

e matrícula;

iv. Quanto a créditos:

1. Por título, identidade do devedor, montante, natureza e origem da dívida,

data do vencimento e garantias;

2. Tratando-se de crédito de salário ou vencimento, identificação do

empregador do executado, as contas e os bens deste, bem como os ónus e

encargos que sobre eles incidam;

3. Tratando-se de estabelecimento comercial o nome e o endereço;

4. Os dados conhecidos e possíveis das contas bancárias, sendo certo que a

divulgação do número de conta por parte bancária não implica violação

de sigilo bancário.

v. Quanto aos direitos a bens indivisos, o administrador e os

comproprietários, bem como a quota parte que neles pertence ao

executado.

Já no novo regime, no n.º2 do artigo 724.º CPC, enuncia-se em termos

genéricos que incumbe ao exequente, quando indique bens a penhorar,

fornecer os elementos e documentos de que disponha e que contribuam para

a sua exata identificação, especificação e localização, bem como para o acesso

aos respetivos registos. Mas, a verdade, é que ainda permanecem três

preceitos concretizadores, que são desenvolvimento do que se estabelecia no

regime anterior:

i. Na alínea i) do n.º1 ainda se especifica a indicação sempre que possível

do empregador do executado, as contas bancárias de que este seja

titular e os bens que lhe pertençam, bem como os ónus e encargos

que sobre eles incidam;

ii. No n.º3, 1.ª parte, determina-se que quanto aos créditos deve declarar-

se, tanto quanto possível, a identidade do devedor, o montante, a

natureza e a origem da dívida, o título de que constam, as garantias

existentes e a data do vencimento;

iii. No n.º3, 2.ª parte, lê-se que quanto ao direito a bens indivisos, deve

indicar-se o administrador e os comproprietários, bem como a quota-

parte que neles pertence ao executado.

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No mais, será conveniente que, a título de orientação, o exequente faça uso

adicional dos elementos e jurisprudência do anterior regime. Naturalmente,

que o exequente tem o dever de atuar de boa fé processual na indicação de

bens para a penhora. A indicação de bens pelo exequente é eventual, não

constituindo ónus processual ou, muito menos, um dever processual. Esta

consideração permanece correta mesmo em face do novo n.º2 do artigo 752.º

CPC: se o agente de execução está, dentro de limites, vinculado à indicação

do exequente sobre os bens que pretende ver prioritariamente penhorados,

todavia o exequente não tem um dever processual de o fazer. Na realidade, a

falta de indicação de bens não o faz cair em nenhuma cominação no plano

da realização da penhora, pois as penhoras não deixam de ser feitas por esse

facto. Tem é certo a vantagem prática de permitir ao agente de execução o

aligeiramento das diligências prévias e de direcionar o objeto da penhora.

Daqui resulta que a falta de indicação de bens pelo exequente não é motivo

de recusa de recebimento do requerimento executivo pelo agente de

execução ou pela secretaria (artigo 725.º, n.º1, a contrario, e 855.º, n.º2, alínea

a) CPC, para, respetivamente, as formas ordinária e sumária).

b. Sucessivo: o exequente pode indicar bens à penhora em momento sucessivo

nos termos do artigo 750.º, n.º1 CPC, quando não tenham sido inicialmente

encontrados bens penhoráveis que permitam o arranque dos atos executivos,

e, bem assim, no exercício de faculdades de reforço e substituição de penhora,

ao abrigo do artigo 751.º, n.º4 CPC: se o agente de execução o pode fazer

avulsamente, também o exequente o pode a requerimento.

2. Executado: no paradigma do processo executivo trazido pela reforma de 2003, é

restrita e residual a faculdade do executado de nomear bens à penhora: só na

frustração de penhora é que será aquele citado ou notificado para pagar ou indicar

bens para penhora. Os termos exatos do regime têm algumas diferenças, mas são

próximos:

a. No Código Velho: o executado é citado (ou notificado se houver citação

prévia) se o exequente não indicar bens, após notificado para tal na sequência

de não terem sido encontrados bens penhoráveis. Dão-se-lhe, então, 10 dias

para pagar ou indicar bens, ainda que se oponha.

b. No Código Novo: no artigo 750.º, n.º1 CPC o procedimento pretende-se

mais concentrado: se não forem encontrados bens penhoráveis no prazo de

três meses a contar da notificação feita pela secretaria ao agente de execução

para o início das diligências de penhora (artigo 748.º, n.º1 CPC) o agente de

execução notifica em simultâneo o exequente para especificar quais os bens

que pretende ver penhorados na execução e o executado para indicar bens à

penhora. Se a execução houver se seguir com dispensa de citação prévia – i.e.,

na forma sumária e no caso do artigo 727.º CPC – a notificação é substituída

por citação do executado. Neste caso, se o exequente não indicar bens

penhoráveis, tendo-se frustrado a citação pessoal do executado, não há lugar

à citação edital deste e extingue-se logo a execução nos termos do n.º2 do

artigo 750.º CPC.

Portanto, a intervenção do executado em matéria de individualização do objeto da

penhora é reduzida ao mínimo e à ideia de último recurso para a prossecução da

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execução. Constituirá, por isso, nulidade processual inominada a indicação de bens

pelo executado fora deste caso, mesmo se com o acordo do exequente? Porventura

não: valerá o bom entendimento pretérito de que o exequente pode pedir a

colaboração do executado (artigo 417.º, n.º1 CPC) no sentido de identificar bens

penhoráveis, não no requerimento executivo mas, por exemplo, em posterior e

superveniente reforço ou substituição de bens (artigo 751.º, n.º4 CPC). Quanto ao

ulterior desenvolvimento da execução, importa distinguir em função do

comportamento processual do executado:

a. Se o executado efetuar o pagamento voluntário da dívida exequenda e

das custas do processo (artigos 846.º e 847.º CPC): a execução extinguir-

se-á (artigo 849.º, n.º1, alíneas a) e b) CPC. Tal acarreta a extinção de eventual

oposição à execução que haja, no prazo geral de 20 dias (artigo 728.º, n.º1

CPC), sido entretanto deduzida, atenta a acessoriedade desse apenso

declarativo.

b. Se o executado indicar bens para a penhora: e apesar da omissão do artigo

750.º, n.º1 CPC, deverão aqueles ser suficientes para a satisfação da obrigação,

entendida como o créditos e as custas (artigo 734.º, n.º3 CPC). Em caso de

pluralidade de devedores executados, pode cada um indicar à penhora os seus

bens, mas não os bens de outro devedor executado, ainda que em

solidariedade passiva; são questões distintas a repartição da responsabilidade

nas relações internas e a afetação do património de cada um dos executados

à execução. Nesta indicação de bens, o executado está vinculado a especial

boa fé processual, impendendo o dever jurídico de colaboração na descoberta

da verdade material: a respetiva indicação deve ser feita de modo a não

prejudicar os interesses do exequente. Mas a indicação de bens, ao ser o

cumprimento de um dever de boa fé processual, nada determina quanto ao

reconhecimento da própria dívida exequenda por parte do executado. Por

isso, ela é compatível com a dedução de oposição à execução.

c. Já a falta absoluta de indicação de bens ou a falsa declaração de que

resultou o não apuramento de bens suficientes para a satisfação da

obrigação exequenda: fazem incorrer o executado numa sanção pecuniária

compulsória, caso se verifique, após a renovação da execução extinta (artigo

850.º, n.º5 CPC) que por ele foram ocultados bens, por omissão ou por

falsidade de declaração. Essa sanção está prevista no artigo 750.º, n.º1, 2.ª

parte CPC. O respetivo montante é de 5% da dívida ao mês, com o limite

mínimo global de 10 UC desde a data da omissão até à descoberta dos bens

– embora no artigo 750.º, n.º1 CPC esta referência esteja ausente. Trata-se da

cominação imposta a uma atuação processual de má fé por violação grave do

dever de cooperação, pelo qual se deve pautar a atuação do executado em

sede de penhora – artigo 7.º, n.º1 CPC. Mas não há má fé se o executado, por

si diretamente ou pelo seu mandatário, apresentar ao Tribunal razão plausível,

ainda que com a negligência leve, para não ter prestado as solicitadas

informações. Tal não será fácil, porém, já que, o executado tem ao seu alcance

os meios necessários para identificar os bens, o que pode não suceder com o

exequente. O executado, aquando da citação, deverá ser advertido das

consequências de declaração falsa ou de falta de declaração, como estava

imposto no regime anterior. Apesar de estar novamente ausente do artigo

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750.º, n.º1 CPC não pode deixar de existir no novo Código. Em todo o caso,

o executado permanece sujeito ao regime geral de responsabilidade por

litigância de má fé, do artigo 542.º, n.º2, alíneas c) e d) CPC, por força do

artigo 551.º, n.1º CPC. Por isso, em todos os demais casos de violação do

dever de cooperação por ação ou omissão relativo à penhora – por exemplo,

manobras dilatórias de ocultação de bens já indicados à penhora – pode

responder naqueles termos.

d. Se o executado não pagar, nem indicar bens à penhora, extingue-se a

execução, como se determina no essencial o n.º2 do artigo 750.º CPC.

Efeitos:

1. No Código Velho: previa-se que o agente de execução ficasse dispensado de encetar

diligências prévias à penhora, i.e., identificação e localização de bens penhoráveis,

sempre que no requerimento executivo sejam bens referidos expressamente de valor

previsivelmente igual ou superior ao crédito exequendo acrescido das custas

previsíveis da execução. Neste caso o agente de execução estaria vinculado a

penhorar aqueles bens, sob pena de inutilidade do preceito. E estava-o ainda que

fossem bens onerados. Na prática o legislador colocava bens sobre os ombros do

exequente o risco da frustração da penhora. Diversamente, se os bens de valor

inferior ao do crédito exequendo e custas previsíveis, ou se a indicação de bens

proviesse do executado, não somente haveria lugar a diligência prévia (no primeiro

caso) como a indicação de bens não vincularia a escolha do agente de execução dos

bens a penhorar. Nomeadamente, o agente de execução poderia entender que a

indicação feita pelo exequente – ou executado – não continha um universo de bens

suficiente para a execução e/ou advogado, v.g., porque onerado. A indicação era

meramente indicativa, por conseguinte, como expressamente enunciava o regime.

No entanto, quando houvesse diligências prévias, seguidas de identificação de bens,

o exequente podia declarar que não pretendia a penhora de determinados bens

imóveis ou móveis não sujeitos a registo identificados ou mesmo desistir da execução.

Tal solução permitia ao exequente ter, afinal, um poder processual de veto sobre o

destino da penhora. Por outro lado, a garantia de processo equitativo, enquanto

processo da não surpresa, impunha que sempre que o agente de execução, por

alguma razão, entenda não dar sequência àquilo que o exequente promoveu o deva

fundamentar por escrito e fundamentadamente. Isso não retirava o caráter

discricionário mas garantia a publicidade e fundamentação do ato, permitindo

eventual dedução de reclamação do ato por razões externas à discricionariedade.

2. No Código Novo: foi suprimida esta solução. Todavia, como o n.º2 do artigo 751.º

CPC impõe que o agente de execução deve respeitar a nomeação de bens do

exequente, de certa forma, no plano de facto, o agente de execução pode ver

aligeiradas as suas tarefas de promoção de identificação e localização de bens

penhoráveis. Aliás, tal decorre implicitamente do disposto no artigo 748.º, n.º3 CPC:

se houver registo de prévia execução frustrada, o agente de execução deve iniciar

imediatamente as diligências de identificação de bens penhoráveis, desde que o

exequente não haja indicado bens penhoráveis no requerimento executivo.

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Em qualquer dos Códigos, a indicação de bens feita pelo exequente pode, em certos casos,

relevar para outros efeitos processuais que não apenas os da penhora. São casos já referidos

em que o exequente pretende pela indicação produzir um certo efeito processual ou material:

1. Execução de garantia real, tanto sobre bens de terceiro (artigo 54.º, n.º2 CPC)

como sobre bens do executado (artigo 752.º, n.º1 CPC);

2. Utilização do mecanismo do n.º2 do artigo 743.º CPC, na penhora de quinhão

em património autónomo ou de direito sobre bem indiviso que permita aquela (artigo

752.º, n.º2 CPC);

3. Evitar a reclamação de créditos garantidos com privilégios gerais (artigo 788.º,

n.º4 CPC=).

No Código velho o objeto da penhora poderia ainda determinar a forma de processo mas já

não no Código novo visto o artigo 550.º, n.º2 CPC deixar de utilizar o critério dos bens

penhorados para levar à dispensa de citação prévia.

§43.º - Consulta do registo informático de execuções

Início:

4. Antes da Reforma de 2013: determinava o regime que os vários atos preparatórios

da penhora da competência do agente de execução teriam sempre início no prazo

máximo de cinco dias contados de um ato que depende da sequência processual

transcorrida. Assim,

a. Tratando-se de execução sem citação prévia e sem despacho liminar,

o prazo contava-se da data da apresentação do requerimento executivo.

b. Tratando-se de execução com citação prévia e sem despacho – a

tramitação regra – importava distinguir:

i. Se o executado deduziu oposição à execução, o prazo contar-se-ia do termo

do prazo para essa oposição;

ii. Se o executado deduziu oposição à execução, o prazo contar-se-ia da

notificação da secretaria ao agente de execução:

1. Depois de proferido despacho inicial que fixe o efeito não suspensivo à

oposição à execução;

2. Depois de proferida sentença final que julgue total ou parcialmente

improcedente a oposição à execução, se esta teve efeito suspensivo.

c. Ainda nos casos de despacho liminar mas sem citação prévia, o prazo

contava-se da posterior notificação da secretaria ao agente de execução.

5. Depois da Reforma de 2013: forma ordinária e forma sumária; a garantia do

artigo 855.º, n.º5 CPC: no Código de Processo Civil de 2013 temos de ter em conta

o artigo 748.º, n.º1 e 855.º, n.º3 CPC, atinentes, respetivamente, às formas ordinária

e sumária. Trata-se de uma simplificação, agora duplicada, do regime anterior,

decorrente da clarificação das formas de processo e da melhoria da marcha

introdutória da execução. Assim:

a. Na forma ordinária: a secretaria notifica o agente de execução de que deve

iniciar as diligências para penhora, depois de:

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i. Proferido despacho que dispense a citação prévia do executado (artigo 727.º

CPC);

ii. Decorrido o prazo de oposição à execução sem que esta tenha sido deduzida

(artigo 728.º, n.º1 CPC);

iii. Apresentação de oposição que não suspenda a execução (artigo 733.º, n.º1

CPC);

iv. Ter sido julgada improcedente a oposição que tenha suspendido a execução.

b. Na forma sumária: o agente de execução inicia as consultas e diligências

prévias à penhora, imediatamente a seguir à admissão do requerimento

executivo e o processo houver de prosseguir. Mas relembre-se que o n.º5 do

artigo 855.º CPC garante que nas execuções sumárias instauradas ao abrigo

do disposto na alínea d) do n.º2 do artigo 550.º CPC – i.e., quando esteja em

execução título extrajudicial de obrigação pecuniária vencida cujo valor não

exceda o dobro da alçada do tribunal de 1.ª instância – a penhora de bens

imóveis, de estabelecimento comercial, de direito real menor que sobre eles

incida ou de quinhão em património que os inclua só pode realizar-se depois

da citação do executado, mediante conclusão do processo ao juiz para

despacho nos termos do artigo 726.º CPC. Trata-se como já dissemos, de

uma manifestação preventiva do princípio da proporcionalidade da penhora.

Consulta do registo informático de execuções: o primeiro ato preparatório a levar a

cabo pelo agente de execução consiste em proceder à consulta do registo informático de

execuções (artigo 717.º CPC). Este dever funcional é-lhe imposto pelo n.º2 do artigo 748.º

CPC. Relembre-se que, justamente, a parte final da alínea b) do n.º4 do artigo 718.º CPC

confere-lhe legitimidade para a consulta. .Essa consulta é feita de modo direto, por via

eletrónica, conforme o artigo 56.º, n.º2 Portaria n.º282/2013, 29 agosto. Em face do que

achar no registo informático de execuções, deverá o agente de execução atuar diversamente.

1. Numa primeira hipótese: se concluir que houve execução movida contra o

executado que terminou – nos últimos três anos (artigo 748.º, n.º3) – sem pagamento

integral, têm lugar imediatamente, segundo o artigo 748.º, n.º3 CPC, as diligências,

tendentes a identificar-se e/ou localizar bens penhoráveis, nos termos do artigo 749.º

CPC. Mas se o exequente indicou bens penhoráveis no requerimento executivo, o

agente de execução irá procurar logo fazer a sua penhora, como decorre do atual

artigo 749.º, n.º3 CPC. Portanto, fica dispensado de diligências prévias. Não sendo

encontrados bens, ou seja, caso as diligências se frustrem, é o seu resultado

comunicado ao exequente, extinguindo-se a execução se este não indicar, em 10 dias,

quais os concretos bens que pretende ver penhorados (artigo 748.º n.º3, 2.ª parte

CPC). Ficará, então, a constar do registo informático de execuções essa execução

frustrada, nos termos do artigo 717.º, n.º2, alínea b) CPC.

2. Numa segunda hipótese: até à Reforma de 2013, caso ainda não tivesse terminado

execução anterior movida contra o executado para pagamento de quantia certa, teria

lugar a remessa do requerimento executivo para aquela ação, se esta estivesse em

momento anterior à sentença de graduação e o exequente dispusesse garantia real

sobre um bem já penhorado nessa ação.

3. Em todas as demais hipóteses (artigo 748.º, n.º4 CPC): estatui-se que o agente

de execução deverá prosseguir com as diligências prévias à penhora, na:

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a. Pendência de execução mas não houve ainda penhora nela;

b. Execução prévia extinta com integral pagamento;

c. Inexistência de registo de execução contra o executado.

Para tal, deverá anteriormente fixar a inscrição no registo informático de execuções

dos dados a que se refere o n.º1 do artigo 717.º CPC = artigo 2.º, n.º1 Decreto-Lei

n.º201/2013, 10 setembro – inscrição suprimida no artigo 748.º, n.º2 CPC, mas que

não se vê como não deixar de ocorrer.

§44.º - Identificação e localização dos bens

Momento; dispensa: posteriormente à consulta prévia, caso a ação haja de prosseguir,

procede o agente de execução às tarefas de identificação e localização dos bens penhoráveis,

e, eventualmente, de identificação do próprio executado como impõe o n.º1 do artigo 749.º

CPC. Neste n.º1 do artigo 749.º CPC, estas tarefas podem não ter lugar uma vez que, esta

norma, manda observar a nomeação de bens pelo exequente (i.e., o disposto no artigo 751.º,

n.º2 CPC), o que parece ser isto de concluir atento quer o disposto no n.º2 do artigo 751.º

CPC quer no artigo 748.º, n.º3 CPC. Nestas eventualidades, o agente promoverá, na medida

do possível, os atos de penhora, pois já saberá quais são os seus bens. Mas fora desta evental

dispensa de diligências prévias, deverá, então, o agente de execução indagar sobre a

identificação e localização de bens junto das pessoas e entidades que tiver como mais

adequadas. A nova lei fixa um prazo de 20 dias no referido artigo n.º1, do artigo 749.º CPC

para a conclusão dessas diligências. Sem prejuízo da competência para pedir informações ao

exequente ou mesmo ao executado, o agente de execução pode consultar junto de terceiros

entidades elementos sujeitos a sigilo fiscal, elementos sujeitos a sigilo bancário e outros

elementos, mediante:

1. Consulta direta e sem autorização judicial às bases de dados da administração

tributária, da segurança social, das conservatórias do registo predial, comercial e

automóvel e de outros registos ou arquivos semelhantes, em acesso eletrónico

(artigos 749.º, n.º3 e 4 CPC e 2.º, n.º8 da Portaria n.º331-A, 20 março).

2. Fornecimento obrigatório dos elementos pelos serviços competentes pelo

meio mais célere e no prazo de 10 dias.

O acesso, em especial, aos elementos sujeitos a sigilo fiscal ou sob outro regime de

confidencialidade, está regulado no artigo 748.º, n.º7 CPC. O preceito garante que a consulta

dependerá de despacho judicial e remete para o artigo 418.º, n.º2 CPC. Nada obsta a que,

aquando da apreciação deste requerimento, o juiz possa, se tiver elementos, conhecer da

legalidade da penhora dos bens em questão e indeferir o requerimento com fundamento na

sua ilegalidade. Parece que esta autorização judicial fica dispensada para efeitos de penhora

de depósitos bancários: o n.º6 do artigo 749.º CPC determina que o Banco de Portugal

disponibiliza por via eletrónica ao agente de execução informação acerca das instituições

legalmente autorizadas a receber depósitos em que o executado detém contas ou depósitos

bancários. Qualquer que seja o objeto e tipo de elemento a obter pelo agente de execução,

recorde-se que valem aqui as regras gerais do processo civil: o dever de cooperação das partes

e terceiros, neste caso para a descoberta de bens (artigo 417.º, n.º1 CPC), quando interpolado

pelo agente de execução. Naturalmente, que as respetivas comunicações da 1.ª parte do n.º2

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do artigo 417.º CPC também se aplicam, mas são da competência do juiz de execução: o

agente de execução não impõe multas. Por outro lado, se houver documentos, informações,

pareceres, plantas, fotografias, etc. em poder de terceiro, relevantes para a descoberta de bens

a penhorar, o agente de execução pode requerer ao juiz que o terceiro seja notificado para o

entregar ao agente de execução, conforme os artigos 436.º e 432.º CPC. Somente nos casos

em que o exequente seja uma sociedade comercial que tenha dado entrada num tribunal,

secretaria judicial ou balcão, no ano anterior, a 200 ou mais providências cautelares, ações,

procedimentos ou execuções, é devida uma remuneração pelos serviços prestados na

identificação do executado e na identificação e localização dos seus bens, às instituições

públicas e privadas que prestem colaboração à execução nos termos do artigo 749.º CPC. O

conceito regime dessa remuneração consta da Portaria n.º202/2011, 20 de maio, alterada pela

Portaria n.º279/2012, 26 agosto.

Informação ao exequente. Indicação sucessiva de bens. Frustração:

posteriormente às diligências de identificação e localização dos bens, o agente de execução

deve cumprir um dever de informação perante o exequente. Assim, no n.º1 do artigo 748.º

CPC, fixa-se um prazo de três meses a contar da notificação feita pela secretaria ao agente

de execução para o início das diligências de penhora para serem encontrados bens

penhoráveis. Se não forem encontrados esses bens penhoráveis no prazo o agente de

execução notifica em simultâneo o exequente para especificar quais os bens que pretende ver

penhorados na execução; simultaneamente e o executado para indicar bens à penhora.

Novamente, o dever de informação do artigo 754.º, n.º1 CPC impõe que o agente de

execução informe o exequente dos motivos da frustração da penhora. NA falta absoluta de

indicação de bens penhoráveis no prazo de 10 dias, extingue-se sem mais a execução. Se

forem encontrados bens, então, nos termos gerais, faz-se a penhora e notifica-se o exequente

dela.

C – Ato de penhora

§45.º - Penhora de bens imóveis

Objeto:

1. Direitos reais de gozo em titularidade e posse exclusivas. Frutos e partes

integrantes: o Código de Processo Civil dedica os artigos 755.º a 763.º CPC à

penhora de imóveis, os artigos 764.º a 772.º CPC à penhora de móveis, e, enfim, toda

uma subsecção à regulação da penhora de direitos, artigos 773.º a 783.º CPC. Trata-

se de uma tripartição fundada na diferenciação entre os atos da penhora, i.e,, no

regime de apreensão dos bens sobre que incidem os direitos penhorados.

a. A penhora de imóveis e de móveis é uma penhora de direitos reais de gozo

em titularidade e posse exclusivas que incidam sobre aqueles bens. Tanto

pode ser a penhora da propriedade, como a penhora do usufruto, superfície

ou outro direito real menor de gozo.

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b. Já se o objeto da penhora foram direitos reais de gozo em

contitularidade os catos de penhora seguem o regime da penhora de direitos

indivisos, do artigo 781.º CPC.

c. Por seu turno, sendo objeto de penhora de direitos com sobreposição

de posses, i.e, onerador por direitos de gozo menores, então a penhora faz-

se como penhora de imóveis, com notificação ao titular do direito menor e

sem desapossamento, nos termos do artigo 781.º, n.º5 CPC.

Como princípio, a penhora de imóveis abrange, em regra, o prédio com todas as suas

(ex vi artigo 758.º CPC):

a. Partes integrantes; e

b. Frutos:

i. Naturais; ou

ii. Civis.

A penhora do imóvel não abrange as coisas acessórias, salvo os documentos de

titularidade do bem, como a caderneta predial. O princípio de que o acessório não

abrange a coisa principal assim o dita (artigo 210.º, n.º2 CC). Quanto a estas coisas

ter-se-á de fazer uma penhora autónoma de coisa móvel não sujeita a registo, nos

termos do artigo 764.º, n.º1 CPC. Os frutos penhoráveis em conjunto com o imóvel

são os que se produziram, no caso dos naturais, ou se venceram, no caso dos civis,

depois do momento da penhora. No caso das rendas em dinheiro serão depositadas

em instituição de crédito, à ordem do agente de execução (ou, nos caso em que as

diligências de execução não realizadas por oficial de justiça da secretaria), à media

que se vençam ou se cobrem (artigo 756.º, n.º3 CPC). Todavia, a parte integrante ou

o fruto, natural ou civil, podem ser excluídos da penhora do imóvel, se houver

vontade expressa nesse sentido ou se sobre eles incidir privilégio, i.e., garantia real,

como privilégio creditório, consignação de rendimentos ou penhor, desde a parte

integrante ou fruto tenha sido separado. Nesse caso, os frutos naturais podem ser

penhorados em separado, como coisas móveis, quer já estejam separados, quer ainda

estejam pendentes, i.e., ainda imobilizados na árvore, desde que não falte mais de um

mês para a época normal da colheita.

2. Fracionamento do imóvel: se for penhorável um imóvel que seja divisível e o valor

do imóvel exceder largamente o valor dos créditos exequendo e reclamação, o

executado pode requerer autorização para proceder ao seu fracionamento (artigo

759.º CPC). A competência decisória que era do agente de execução, passou com a

Reforma de 2013, para o juiz, no referido artigo 759.º CPC. A execução prossegue,

não sendo suspensa. Sendo deferida e realizada a divisão, a penhora mantém-se sobre

a totalidade dos imóveis resultantes da divisão. Todavia, o executado pode requerer

ao agente de execução o levantamento da penhora sobre algum desses imóveis,

alegando e demonstrando que os restantes imóveis são manifestamente suficientes

para satisfazer os créditos exequendo e reclamado. Os demais interessados devem

ser ouvidos, antes do agente de execução decidir este pedido.

Ato de penhora:

1. Registo: o procedimento de efetivação da penhora de coisas imóveis foi fortemente

modificado pelo Decreto-Lei n.º 32/2003, 8 março.

a. O mecanismo de antes da reforma de 2003 desenvolvia-se em três tempos:

1. Termo no processo;

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2. Registo;

3. Entrega efetiva ao depositário.

Enquanto não fosse registada, a penhora não era oponível a terceiros, o que

poderia facilitar que o executado alienasse os imóveis antes do registo da

penhora. O registo tinha efeito consolidativo da penhora, a qual apresentava

uma existência e eficácia autónomas. Por outro lado, enquanto não fosse

efetivamente entregue ao depositário, o bem podia degradar-se. Isto significa

que, na prática, a penhora só começava a ter efeitos jurídicos e materiais

algum tempo depois de ser feita por termo.

b. Para obviar a esta dilação entre a efetivação e a oponibilidade a terceiros, a

Reforma de 2003 introduziu no n.º1 do artigo 755.º CPC, e, articulado com

ele, no artigo 48.º, n.º1 CRPr, um sistema de dois em um: a penhora de

imóveis passa a efetivar-se por comunicação eletrónica do agente de

execução ao serviço do registo competente, a qual vale como pedido de

registo, ou com a apresentação naquele serviço de declaração por ele

subscrita. O registo predial é, assim, constitutivo da penhora, pois a inscrição

registal é elemento integrante da previsão da norma da qual a efetivação da

penhora é a estatuição: essa norma é o artigo 755.º, n.º1 CPC. .Sem registo

não se pode entender que haja penhora, sendo por isso nula, a entrega de

bem a um depositário.

O título que fundamenta o registo da penhora é o requerimento executivo. O registo

da penhora tem natureza urgente e importa a imediata feitura dos registos

anteriormente requeridos sobre o bem penhorado (artigo 755.º, n.º5 CPC). Inscrita

a penhora e observado o disposto no n.º5, é enviada ou disponibilizada por via

eletrónica, ao agente de execução, certidão dos registos em vigor sobre os prédios

penhorados. Seguidamente, o agente de execução lavrará o auto de penhora e

procede à afixação, na porta ou noutro local visível do imóvel penhorado, de um

edital, constante de modelo aprovado nos Anexos III e IV da Portaria n.º282/2013,

29 agosto.

2. Registo recusado ou provisório:

a. O conservador recusará apenas o registo se se verificar algum dos casos

previstos no artigo 69.º CRPr. Pode ainda determinar a sua feitura provisória

por dúvidas ao abrigo do artigo 70.º CRPr por haver motivo que, não sendo

fundamento de recusa, obste ao registo do ato tal como é pedido. Essas

dúvidas podem respeitar ao objeto da penhora ou respeitar aos sujeitos da

penhora. Nesses casos, importará retificar a descrição do bem ou esclarecer

a titularidade respetivamente.

b. Na segunda eventualidade, o disposto no n.º1 do artigo 119.º CRPr

determina que havendo registo provisório de arresto, penhora ou

apreensão em falência ou insolvência de bens inscritos a favor de pessoa

diversa do requerido ou executado, o juiz deve ordenar a citação do titular

inscrito para declarar: no prazo de dez dias, se o prédio ou o direito lhe

pertencer. Essa citação está sujeita ás disposições gerais do processo civil

sobre citações, salva a especialidade do n.º2 daquele artigo 119.º CRPr.

1. Se o citado declarar que os bens lhe não pertencem ou não fizer nenhuma

declaração, o tribunal ou o agente de execução comunica o facto ao

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serviço de registo para conversão oficiosa do registo em registo

definitivo.

2. Se o citado declarar que os bens lhe pertencem, permanece, naturalmente, a

situação de dúvida quanto à titularidade sobre o bem. O juiz remeterá

os interessados para os meios processuais comuns, e aquele facto é

igualmente comunicado, bem como a data da notificação da

declaração para ser anotada no registo. Esses meios processuais

comuns são a ação de simples apreciação positiva e a ação de

reivindicação, a usar tanto por terceiro, como pelas partes executivas.

Neste caso, permanece como provisório o registo. O exequente

poderá, por isso, desistir da penhora ou, em alternativa, promover a

sua substituição ou reforço ao abrigo do artigo 751.º, n.º4, alínea c)

CPC.

Se não for intentada a ação declarativa o registo provisório caducará de igual

modo e, com ele a penhora, dada a natureza constitutiva do registo. Restará

ao exequente promover a penhora de novos bens do executado. Se for

intentada a ação declarativa, o registo da ação declarativa na vigência do

registo provisório é averbado neste e prorroga o respetivo prazo até caducar

ou ser cancelado o registo da ação. O registo provisório da penhora não tem

efeito suspensivo sobre a execução, salvo se o juiz da execução, ponderados

ou motivos da provisoriedade, decidir que a execução não prossiga, se

perante ele a questão for suscitada. Em qualquer caso, os bens não podem

ser transmitidos: não se faz a adjudicação dos bens penhorados, a

consignação judicial dos seus rendimentos ou a respetiva venda sem que o

registo se haja convertido em definitivo. Se caducar ou for cancelado o registo

do direito de ação, então caducará o registo provisório da penhora. No caso

de procedência da ação, pode o interessado pedir a conversão do registo no

prazo de 8 dias a contar do trânsito em julgado.

Depositário:

1. Determinação: o agente de execução deverá designar um depositário judicial dos

bens imóveis. Em regra, o depositário judicial será, pelo n.º1 do artigo 756.º CPC, o

próprio agente de execução, ou, na s execuções cujas diligências estejam distribuídas

a oficial justiça, a pessoa designada por este. Contudo,

a. Poderá ser o próprio executado, quando o exequente o consinta (artigo

756.º, n.º1, 2.ª parte CPC) ou quando o imóvel seja a sua casa de habitação

efetiva (alínea a) do mesmo n.º1). Ainda poderá ser o arrendatário ou titular

de direito de retenção sobre o imóvel desde que o incumprimento contratual

tenha sido verificado judicialmente (alíneas b) e c) do mesmo n.º1,

respetivamente).

b. Já o executado (não um terceiro) que seja promitente-comprador e que

esteja na posse do imóvel não pode ficar depositário, enquanto tal, mas sim

se o imóvel for a casa de habitação efetiva, após tradição, ou tiver a seu favor

sentença que reconheça um seu eventual direito de retenção por falta de

restituição do sinal, nos termos do artigo 755.º, alínea f) CC.

c. O depositário pode ser ainda um terceiro designado pelo agente de

execução, com o consentimento do exequente. Não se vê, a este propósito,

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que o exequente ao indicar bens à penhora ou mesmo depois disto não possa

propor ao agente de execução certa pessoa para depositário, sendo aquele a

decidir.

2. Estatuto: o depositário judicial está sujeito aos deveres comuns do depositário,

apesar de não estarmos perante um contrato. Nestes termos, ele deve, ex vi artigos

1187.º e 1190.º CC:

a. Guardar a coisa depositada;

b. Avisar imediatamente o executado e o exequente, quando saiba que

algum perigo ameaça a coisa ou que terceiro se arroga com direitos

em relação a ela, desde que o facto seja desconhecido do depositante;

c. Restituir a coisa com os seus frutos ao executado, finda a penhora, ou

adquirente, sendo a coisa vendida, ainda que estes não tenham sido

penhorados (artigo 758.º, n.º1, in fine CPC);

d. Não usar a coisa depositada nem a dar em depósito a outrem, sem

prejuízo de poder ter colaboradores atuando sob sua responsabilidade

(artigo 760.º, n.º3 CPC).

Além dos deveres comuns, o n.º1 do artigo 760.º CPC impõe ao depositário de

imóveis os deveres especiais de:

e. Administrar os bens com a diligência e zelo de um bom pai de família;

f. Prestar contas, espontaneamente ou exigidas pelo exequente conforme

os artigos 948.º e seguintes CPC, ex vi artigo 952.º CPC.

Mas se a administração de bens se rege por um critério de diligência, questão diversa,

é a de qual o conteúdo concreto dessa administração. No essencial, trata-se, antes de

mais, de substituir o executado nos poderes, materiais e jurídicos, que lhe terão sido

subtraídas pela penhora e exercê-los em conformidade com a finalidade de

conservação, típica da penhora. Deste modo, os atos de administração são,

naturalmente, e antes de mais, atos de administração corrente, como pagamentos de

contas, rendas, impostos, ou taxas. Quanto aos atos de administração extraordinária,

resulta do n.º2 do artigo 760.º CPC que deve ser obtido acordo entre o exequente e

o executado. Na sua falta, o juiz decidirá, ouvido o depositário e feitas as diligências

necessárias. Por outro lado, a sujeição ao dever de diligência como bom pai de família

determina também a sujeição a responsabilidade civil extracontratual nos termos dos

artigos 487.º, n.º2 CC. Além disso, o depositário de bens penhorados, que não seja o

dono dos bens, que os destrua, danifica ou inutilize responderá pelo crime de abuso

de confiança agravado (artigo 300.º, n.º2, alínea b) CP). Sendo o depositário o dono

dos bens, responderá por descaminho ou destruição de objetos colocados sob o

poder público, que faz incorrer o infrator numa pena de prisão até cinco anos (artigo

397.º CP). Qualquer que ele seja, o depositário pode sempre pedir escusa do cargo,

ocorrendo motivo atendível, segundo o n.º3 do artigo 761.º CPC. Motivo atendível

pode, por analogia, ser algum dos artigos 417.º, n.º3 e 497.º CPC. Finalmente, admite-

se a ocorrer a remoção do depositário. Efetivamente, dita o n.º1 do artigo 761.º CPC

que o depositário que, não sendo solicitador de execução, deixe de cumprir os

deveres do seu cargo, será removido. O regime da remoção mantém-se no restante

artigo 761.º CPC. Assim, a remoção tanto pode ser requerida por qualquer

interessado, como, oficiosamente, por iniciativa do agente de execução. Abre-se,

depois, um incidente de remoção no qual o depositário é notificado para responder,

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observando-se o disposto nos artigo s 292.º a 294.º CPC. Naturalmente que as

funções de depositário cessarão quando se extinga a penhora, i.e., pelo seu

levantamento, pela venda ou pela extinção da execução.

3. Entrega efetiva: o depositário deve tomar posse efetiva do imóvel. Sendo casa

habitada ou uma sua dependência fechada, a diligência deve efetuar-se entre as 7 e as

21 horas, devendo entregar-se cópia do auto de penhora a quem tem a

disponibilidade do local. Este pode assistir à diligência e fazer-se acompanhar por

pessoa da sua confiança que, sem delonga, se apresente no local. O executado ou o

terceiro detentor estão legalmente obrigados a entregar o imóvel. Quando seja oposta

alguma resistência ao apossamento do imóvel (ou haja receio justificado de oposição

de resistência, segundo o artigo 757.º, n.º1 CPC) o agente de execução pode solicitar

diretamente e sem despacho judicial o auxílio das autoridades policiais, por

competência dada pelo artigo 757.º, n.º1 CPC. Estas autoridades são as que forem

localmente competentes nos termos administrativos aplicáveis, mesmo que atuem

fora da área da jurisdição do tribunal. Todavia, no novo Código exige-se despacho

judicial quando se trate de domicílio (artigo 757.º, n.º4 CPC), o que não se exigia no

Código pretérito. Quando seja necessário o arrombamento de porta e a substituição

da fechadura para efetivar a posse do imóvel o agente de execução conhece dois

regimes distintos:

a. No Código velho: o agente de execução deduziria requerimento

fundamentado ao juiz de turno de um dos tribunais de comarca da

circunscrição judicial do domicílio do executado (correspondente ao artigo

759.º, n.º3 CPC atual e artigo 16.º, n.º1 Decreto-Lei n.º226/2008, 20

novembro); por isso, o juiz competente poderia não ser o juiz da execução

sempre que o imóvel se situe fora da respetiva comarca; por outro lado, a

decisão deveria ser proferida no prazo máximo de um dia útil;

b. No Código novo: passa, como regra, a poder também solicitar diretamente

o auxílio das autoridade policiais, a menos que se trate de domicílio (artigo

757.º, n.º4 CPC), sendo certo que pelo artigo 4.º, alínea e) Lei n.º41/2013, 26

junho, o juiz de execução será o competente.

Em face também da alteração do n.º5 do artigo 757.º CPC (no correspondente ao

atual) – onde se substitui o objeto da salvaguarda forário casa habitada tout cour por

domicílio – deve entender-se que domicílio é o lugar de intimidade pessoal da pessoa

física. Na verdade, há que apelar a todo o património de jurisprudência constitucional

sobre o tema da garantia da inviolabilidade do domicílio. Aparentemente, também

aqui cabe o domicílio de pessoa coletiva. De ato de entrada forçada terá o agente de

lavrar auto de ocorrência. Manda o n.º6 do artigo 756.º CPC que às autoridades

policiais seja paga uma remuneração pelos serviços prestados, que constituirá encargo

para os efeitos do Regulamento das Custas Processuais.

§46.º - Penhora de bens móveis

Ato de penhora: importa distinguir a penhora de móveis não sujeitos a registo da penhora

de móveis sujeitos a registo, sendo certo que a própria lei usa a distinção nos artigos 746.º,

n.º1 CPC e 768.º, n.º1 CPC.

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1. Móveis não sujeitos a registo: segundo o n.º1 do artigo 764.º CPC, tratando-se de

coisa móvel não sujeita a registo, a penhora faz-se por apensação efetiva do bem –

como no Direito anterior –, seguida de sua remoção para depósitos. Estes tanto

podem ser depósitos privados como depósitos públicos, i.e., de qualquer local de

armazenagem de bens que tenha sido afeto, por despacho do diretor-geral da Direção

Geral da Administração da Justiça, à remoção e depósito de bens penhorados no

âmbito de um processo executivo (artigo 27.º, n.º1 Portaria n.º 282/2013, 29 agosto),

como ainda depósitos equiparados (alínea o), do n.º1 do artigo 123 do Estatuto das

Câmara dos Solicitadores – artigo 27.º, n.º2 Portaria n.º282/2013, 29 agosto). O

regime destes depósitos públicos ou equiparados pode ser compulsado nos artigos

27.º e seguintes Portaria n.º282/2013, 29 agosto. Apenas nos depósitos públicos ou

equiparados virá a possível a venda em depósito público, nos termos do artigo 836.º

CPC e dos artigos 31.º a 35.º Portaria n.º282/2013, 29 agosto. No entanto, o novo

n.º2 do artigo 764.º CPC vem determinar que não há lugar à remoção em qualquer

das seguintes situações:

a. A natureza de bens é incompatível com o depósito;

b. A remoção implica uma desvalorização substancial dos bens ou a sua

inutilização;

c. O custo da remoção é superior ao valor dos bens.

Nestes casos, deve proceder-se a uma descrição pormenorizada dos bens, à obtenção

de fotografia dos mesmos e, sempre que possível, à imposição de algum sinal

distintivo nos próprios bens, ficando o executado como depositário. Idêntica solução

deverá valer quando o bem não é removido por falta de depósitos.

2. Móveis sujeitos a registo: a Reforma de 2003 veio autonomizar, dentro da penhora

de coisas móveis, um regime específico para aquelas cujas vicissitudes reais estejam

sujeitas a registo: é essa a finalidade dos artigos 768.º e seguintes CPC. O artigo 768.º,

n.º1 CPC ,manda aplicar, com as devidas adaptações, o disposto no artigo 755.º CPC,

à penhora de coisas móveis sujeitas a registo. Portanto, a penhora efetiva-se por

comunicação eletrónica à conservatória do registo automóvel, ou similar para os

navios e aeronaves, que for competente. Inscrita a penhora com natureza de urgente

é enviado ou disponibilizado por via eletrónica, ao agente de execução, certidão dos

registos em vigor sobre o veículo penhorado. Após isso, o agente de execução lavra

o auto de penhora e procede à afixação, no veículo de um edital, constante de modelo

aprovado por Portaria do Ministério da Justiça. Esse modelo consta da Portaria

n.º282/”013, 29 agosto. A penhora da coisa não se confunde com a apreensão da

coisa.

a. Em sede de Código Velho: feita a penhora, passava-se à apreensão. Sendo

automóvel, aquela fazia-se por imobilização, designadamente através da

imposição de selos ou de imobilizadores e da apreensão do documento de

identificação do veículo. O veículo seria apenas removido para depósito

quando o agente de execução entendesse necessário para a salvaguarda do

bem. Como já escrevemos atrás, é ilegal e inadmimssível que se proceda,

antes da penhora, à apreensão da coisa móvel sujeita a registo, para se

certificar que existe e qual o seu valor comercial, havendo dúvidas fundadas,

e só depois, solicitar o registo da penhora.

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b. Em sede de Código Novo: a imobilização pode, como se lê no artigo 768.º,

n.º2 CPC, ser anterior à penhora, mas não é obrigatório que o seja. Tal como

até 2003, a imobilização não é um ato preparatório de uma penhora

meramente eventual do bem, i.e., para se certificar se este existe e qual o seu

valor comercial, mas ato preparatório de uma necessária penhora. Na verdade,

se assim suceder, a comunicação eletrónica da penhora deve ser realizada até

ao termo do primeiro dia útil seguinte (artigo 768.º, n.º2 CPC). Deste modo,

aquela apreensão é nula se a penhora não tiver lugar neste limite temporal.

Após a penhora e a imobilização deve proceder-se à apreensão do

documento de identificação do veículo, se necessário por autoridade

administrativa ou policial, segundo o regime estabelecido em legislação

especial e à remoção do veículo, salvo se o agente de execução entender que

a remoção é desnecessária para a salvaguarda do bem ou é manifestamente

onerosa em relação ao crédito exequendo, nos termos prescritos em

legislação especial. Sendo navio despachado para viagem após a penhora

notifica-se a capitania competente para apreender os respetivos documentos

e impedir a saída do mesmo (artigo 768.º, n.º4 CPC). Tratando-se da penhora

de aeronave, notifica-se a autoridade de controlo de operações do local onde

está estacionada, à qual caberá apreender os respetivos documentos (artigo

768.º, n.º5 CPC.

3. Partes integrantes e frutos: a penhora de coisas móveis rege-se, ainda, pelo artigo

758.º CPC, nos mesmos termos da penhora de imóveis, mutatis mutandis. Por isso, o

ato processual de penhora de coisas móveis abrange também eventuais partes

integrantese frutos, naturais ou civis, desde que não sejam expressamente excluídos

e nenhum privilégio exista sobre eles. Novamente, as rendas em dinheiro serão

depositadas conforme se dispõe no n.º3 do artigo 756.º CPC. A penhora do móvel

não abrange as coisas acessórias, salvo os documentos de titularidade do bem, como

expressamente impõe o artigo 768.º, n.º2 CPC. Essas coisas poderão ser penhoradas

autonomamente, nos termos do artigo 764.º, n.º1 CPC.

Depositário:

1. Determinação e estatuto: sempre que haja dos bens móveis penhorados, o fiel

depositário é o agente de execução que realizou a diligência, segundo a parte final do

n.º1 do artigo 764.º CPC. Mas, uma vez que os armazéns particulares podem, em

certos casos, ser depósitos equiparados a públicos, e como tal comportam um

depósito específico – o titular do depósito (artigo 3.º, n.º4 e 7 Portaria n.º941/2003,

5 setembro) –, deve entender-se que, nestas hipóteses, é ainda o agente de execução

que responde perante o tribunal e as partes pela má guarda que aquele possa fazer.

Já se o depósito for estritamente privado e disponibilizado pelo exequente o

depositário será o agente de execução de execução ou o exequente, mediante

designação expressa do agente, não parecendo que possa ser necessário

consentimento do próprio como decorreria da 2.ª parte do n.º1 do artigo 756.º CPC.

Diversamente, quando a coisa não é removida, mantendo-se na detenção do

executado, será este o depositário?

a. No Código Velho: diríamos que a resposta não seria clara: por um lado, não

era razoável impor-se ao agente que ficasse como depositário, dado o

afastamento físico em relação ao bem e a sua permanência próxima do

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executado, pelo que este seria o depositário; por outro lado, as regras gerai

ditariam que o agente fosse depositário ainda que o executado detivesse a

coisa – afinal aquele afastamento é idêntico ao que teria na penhora de imóvel,

quase como se o automóvel estivesse, também quanto a isto, imobilizado.

Esta seria a melhor solução, em nosso modo de ver.

b. No Código Novo: já vimos que a questão está resolvida: determina-se no

artigo 766.º, n,º2, in fine CPC que quando não haja lugar à remoção fica o

executado como depositário.

Na pluralidade de penhora de móveis (artigo 794.º CPC) o depositário é, como já

dissemos, quem já está nessa função em sede de primeira execução de penhora. Além

das regras do depositário, tratadas em sede de imóveis e aqui válidas quando

aplicáveis ex vi artigo 772.º CPC, regem ainda nesta sede as normas especiais dos

artigos 769.º a 771.º CPC. Assim, o depositário de coisa móvel tem, adicionalmente,

o dever especial de apresentação, quando lhe for ordenado, dos bens que tenha

recebido. Pode, porém, invocar justa causa para não apresentação de bens. Se os não

apresentar dentro de cinco dias e não justificar a falta, é logo ordenado arresto em

bens do depositário suficientes para garantir o valor do depósito e das custas e

despesas acrescidas. Ao mesmo tempo, o depositário será executado, no próprio

processo, para o pagamento daquele valor e acréscimos. O arresto é levantado logo

que o pagamento esteja feito, ou os bens apresentados, acrescidos do depósito da

quantia de custas e despesas, que será imediatamente calculada. A não apresentação

dos bens pode gerar, ao mesmo tempo, responsabilidade criminal, conforme se prevê

no artigo 771.º, n.º2, in fine CPC e a que já aludimos. No caso de navio penhorado o

depositário pode requerer autorização ao juiz para fazê-lo navegar, sendo notificados

aqueles executado e o exequente para darem o seu acordo ou resposta em cinco dias,

se ainda não tiverem dado o seu assentimento. Se for concedida a autorização, avisar-

se-á, por ofício, a capitania do porto. Independentemente de acordo entre o

exequente e o executado, pode aquele, ou qualquer dos credores com garantia sobre

o navio penhorado, requerer que este continue a navegar até ser vendido, contanto

que preste caução e faça o seguro usual contra riscos. A caução deve assegurar os

outros créditos que tenham garantia sobre o navio penhorado e as custas do processo,

sendo ouvidos sobre a idoneidade da caução e a suficiência do seguro o capitão do

navio e os titulares dos créditos que cumpra acautelar. Se o requerimento for deferido,

é o navio entregue ao requerente, que fica na posição de depositário, e dá-se

conhecimento do facto á capitania do porto.

2. Entrega efetiva: se o executado, ou quem o represente, se recusar a abrir quaisquer

portas ou móveis, ou se a casa estiver deserta e as portas e móveis se encontrarem

fechados, observar-se-á o disposto no artigo 757.º CPC. O agente de execução que,

no ato da penhora, suspeite da sonegação, instará pela apresentação das coisas

ocultadas e advertirá a pessoa da responsabilidade em que incorre com o facto da

ocultação. Efetivamente, o executado ou a pessoa que ocultar alguma coisa com o

fim de a subtrair à penhora fica sujeito às sanções correspondentes à litigância de má

fé, sem prejuízo da responsabilidade criminal em que possa incorrer, já antes referida.

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§67.º - Penhora de direitos

Regime comum:

1. Objeto e regime: a partir dos artigos 773.º e seguintes CPC prevê-se no Código a

penhora de direitos. Por penhora de direitos pretende o legislador referir-se à

penhora de qualquer posição jurídica ativa que não seja tratada em sede de penhora

de imóveis ou em sede de penhora de móveis. É, assim, uma categoria legislativa

residual. Em concreto, a penhora de direitos é a penhora de:

a. Posições jurídicas reais não exclusivas sobre a coisa, seja por estarem

em contitularidade, seja por, apesar da sua titularidade singular, postularem

um direito real menor de gozo que onera essa titularidade;

b. Posições jurídicas creditícias: o direito de crédito a penhorar, em especial,

pode ser:

i. Pecuniário ou de prestação de facto fungível;

ii. Singular ou crédito plural, conjunto ou solidário (sendo penhorável a quota parte

ou a totalidade do crédito, respetivamente – artigo 512.º, n.º1 CC);

iii. Vencido ou não vencido;

iv. Presente ou futuro;

v. Sobre devedor nacional ou estrangeiro (máxime, empresa sediada no estrangeiro,

desde que tenha sucursal, filial ou delegação em Portugal, respeitado o artigo 12.º,

n.º2 CPC);

vi. Incluindo os respetivos frutos civis, i.e., os juros e dividendos sociais, conforme o

artigo 758.º, n.º1 CPC, aplicável por força do artigo 783.º CPC.

Já um crédito indivisível é materialmente impenhorável.

c. Universalidade de direitos, máxime de herança e de estabelecimento

comercial.

A penhora de direitos, em geral, implica, a intromissão judicial numa relação jurídica,

creditícia, no caso dos créditos, ou real, no caso de direitos reais em comunhão ou

sobrepostos. A penhora de créditos, em especial, tem de lidar com três interesses

diferentes:

a. O interesse do exequente na penhora e venda do direito;

b. O interesse do terceiro devedor, no cumprimento do contrato; e

c. O interesse do executado, enquanto credor, igualmente

consubstanciado nos termos desse mesmo contrato.

Portanto, a penhora de créditos tem a especialidade de lidar com os problemas da

existência da obrigação, das suas garantias e do cumprimento da prestação. Ora,

quanto à existência e às garantias da obrigação, na medida em que estão fora do título

executivo, e, portanto, da certeza que dele decorre, entramos no campo da ação

declarativa: como fazer valer a favor do exequente um direito que não está acertado

pelo título executivo? Vamos ver que a solução da lei passa por prever nos artigos

773.º n.º2 e 4, 775.º e 776.º CPC, respetivamente, um procedimento sumário de

cominatório pleno, através do qual se permite que apenas para efeitos daquele

concreto processo se possa concluir pela existência do pretenso direito de crédito

sobre o terceiro ou, ao contrário, pela sua inexistência. Este mecanismo assenta

somente na declaração que o terceiro devedor nele vier a proferir, de confirmação ou

de negação entre o executado e o seu devedor ou, em geral, de um documento com

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força executiva nos termos do artigo 703.º CPC, não pode ser considerada para esse

efeito. A regulamentação da penhora de direitos contém uma parte relativa à penhora

de créditos em geral nos artigos 773.º e 775.º 777.º CPC, pouco alterada com as

sucessivas reformas. É este o regime que serve de referência a sucessivos regimes

especiais, destinados tendencialmente:

a. À penhora de certos créditos (artigos 774.º, 779.º e 780.º CPC);

b. À penhora de direitos não creditícios (artigo 781.º CPC); ou

c. À penhora de estabelecimento comercial (artigo 782.º CPC).

Todavia, estas normas não esgotam o regime aplicável, devendo ser considerado,

sempre que seja necessário e não haja incompatibilidade, o disposto para a penhora

de coisas imóveis e de coisas móveis, como decorre do artigo 783.º CPC.

2. Ato de penhora:

a. Notificação pessoal: a (pretensa) existência de créditos do executado sobre

um terceiro devedor chega ao processo seja por meio de indicação das partes

(i.e., exequente e executado), seja por conhecimento oficioso do agente de

execução. O agente de execução, no âmbito dos atos preparatórios de

penhora previstos no artigo 749.º, nº.1 CPC, pode requerer ao terceiro

devedor as informações que considere úteis à individualização d o crédito –

sujeitos, montante, garantias, vencimento do crédito. Porém, a penhora

propriamente dita efetiva-se através da notificação do debitor debitoris, de que

o crédito fica à ordem do agente de execução, segundo o n.º1 do artigo 773.º

CPC. Tal notificação deve ser feita com as formalidades da citação pessoal e

sujeitas ao regime desta. Dá-se, assim, letra de lei à doutrina que, antes de

2003, entendia haver violação do direito constitucional de defesa se a

notificação fosse feita de modo simples, sem indicação daqueles dados.

Deste modo, procedimentalmente, seguem-se, por isso, os artigos 228.º e

seguintes e 246.º, com a ressalva do 229.º CPC. Quanto ao conteúdo da

citação, o terceiro devedor, além de ser notificado de que o crédito fica à

ordem do agente de execução, é ainda, obrigatoriamente, sob pena de

nulidade, informado, nos termos do artigo 227.º CPC, do prazo para declarar

se reconhece o crédito e da cominação em que incorre se nada disser. Esta

remissão para o artigo 227.º CPC significa ainda que deve ser fornecido ao

terceiro devedor um duplicado do requerimento executivo em que o crédito

foi indicado. Na falta de indicação no requerimento executivo, tem o agente

de execução de entregar um documento com a descrição do crédito. Não

pode ser de outro modo: se não existir uma expressão escrita sobre o

pretenso crédito, não é visível qual a pretensão que o terceiro poderá

contradizer. Consumada a notificação, o terceiro devedor não poderá, com

eficácia, concluir atos de extinção do crédito, como decorre artigo 820.º CC.

Já as declarações a que se referem os n.º2 e 3 do artigo 773.º CPC são atos

(eventuais) do notificado e já não integram a efetivação da penhora, sendo-

lhe posteriores.

b. Especialidades na penhora de crédito plural e de crédito com garantia

real: tratando-se de crédito plural, parciário ou solidário, importa ter alguma

cautela. Assim,

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i. Na pluralidade ativa: em que o executado é um co-credor, o artigo 743.º

CPC, por analogia, articulado com o artigo 735.º, n.º1 CPC, impõe

que apenas se possa penhorar a respetiva posição e nunca a dos

demais credores. Mas os seus co-credores deverão ser notificados ex

vi artigo 781.º, n.º1 CPC.

ii. Na pluralidade passiva: devem ser notificados todos os devedores e não

somente um deles. É que a confusão de um não se estende a outro,

tal como o caso julgado perante um não se estende aos ausente (artigo

522.ºCC).

iii. Se o crédito penhorado beneficiar de garantia real: além da notificação ao

devedor, impõem-se ainda atos acessórios de conservação da garantia.

Estes atos não integram a penhora.

1. Sendo penhor: o agente de execução procede à apreensão do

objeto deste, aplicando-se as disposições relativas à penhora

de coisas móveis, ou faz-se a transferência do direito para a

execução, consoante seja penhor de móveis ou penhor de

direito; a apreensão é feita esteja a coisa empenhada em poder

do executado credor pignoratício, esteja em poder de terceiro

devedor, conforme o artigo 747.º, n.º1 CPC. O Agente de

execução será o respetivo depositário, nos termos gerais.

2. Sendo hipoteca: faz-se no registo o averbamento especial da

penhora, conforme a 2.ª parte do n.º7 do artigo 773.º CPC,

conjugada com os artigos 2.º, n.º1, alínea o) e 101.º, n.º1,

alínea a) CRPr.

As mesmas soluções normativas valem se o crédito estiver garantido

por consignação de rendimentos.

3. Confissão do crédito, simples ou qualificada: feita a notificação pelo agente de

execução, o terceiro pode ter comportamentos processuais diferentes, sendo certo

que está vinculado a um dever de boa fé processual: se falta conscientemente à

verdade, o devedor incorre na responsabilidade do litigante de má fé (artigo 773.º,

n.º5 CPC). Assim, o terceiro pode, no ato da notificação ou no prazo de 10 dias,

previsto no artigo 773.º, n.º3 CPC, por termo ou simples requerimento:

a. Reconhecer que o crédito existe, mas declarar que a sua exigibilidade

depende de contraprestação do executado (artigo 776.º, n.º1 CPC):o

devedor pode reconhecer que o crédito existe:

i. De modo expresso: faz-se através da declaração de existência do crédito.

Essa declaração deve ser acompanhada da indicação das garantias,

data de vencimento e quaisquer outras circunstâncias que possam

interessar à penhora (n.º2 do artigo 773.º CPC). Mas esse

reconhecimento expresso, pode ser:

1. Simples: sem reservas;

2. Qualificado: o devedor declara que a exigibilidade do crédito

depende de uma contraprestação do executado,

nomeadamente porque se trata de contrato sinalagmático, ou

declara que existe ainda certa cláusula ou certa garantia.

Todavia, uma e outra reserva devem conformar-se com os

limites temporais decorrentes do artigo 820.º CC.

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O executado será, então, notificado para confirmar a declaração e realizar a

prestação em 15 dias, por determinação do agente de execução.

i. De modo tácito: o reconhecimento tácito da obrigação nos previstos

termos em que foi indicada à penhora (artigo 773.º, n.º4 CPC), é um

efeito cominatório pleno da omissão de pronúncia sobre o crédito.

Tem-se, fictamente, a dívida por confessada, embora apenas para

efeitos daquele concreto processo executivo. Portanto, não há aqui

nenhum valor de caso julgado, mas um valor de preclusão, ou seja,

de caducidade do direito de defesa quanto a uma questão concreta no

processo em questão: o terceiro devedor fica impedido de contestar

a existência do crédito, quer o faça, nomeadamente, em sede de

oposição à execução dessa dívida (artigo 777.º, n.º3 CPC), quer em

qualquer outro meio processual, como a oposição à penhora. Liberto

do ferrolho do caso julgado, pode, assim, o debitor debitoris sempre

invocar em outra ação a existência do crédito ou alegar contra ele

qualquer exceção, como ensina Teixeira de Sousa. É o que admite

o n.º4 do artigo 777.º CPC: tendo sido instaurada, pelo exequente ou

pelo adquirente, execução própria contra o terceiro devedor, pode

este, na competente oposição à execução, impugnar ou excecionar,

nos termos gerais do artigo 731.º CPC, o crédito.

c. Reconhecer que o crédito existe nas condições em que foi indicado à

penhora;

d. Contestar a existência do crédito.

Ainda, assim:

a. Se o executado confirmar e caso não cumpra a contraprestação: a lei

cria um sistema para afastar o obstáculo da inexigibilidade do crédito sobre

o terceiro:

i. Ser instaurada ação executiva contra o executado, pelo exequente ou pelo terceiro

devedor, a qual pode correr na mesma execução, sem necessidade de

citação prévia do executado, tendo como título executivo a

declaração de reconhecimento da dívida (artigo 776.º, n.º4 CPC);

ii. O exequente realizar a prestação pelo executado, ficando neste caso sub-

rogado nos direitos do devedor, nos termos do artigo 592.º, n.º1 CC.

b. Se o executado impugnar a declaração e não cessar a divergência com

a declaração do terceiro, vale, então, com as devidas adaptações, o regime

do artigo 775.º CPC, ex vi artigo 776.º, n.º3 CPC.

c. Conservação do crédito: medio tempore, antes do cumprimento pelo debitur

debitoris, dia o n.º6 do artigo 773.º CPC que o executado e, em substituição

processual, o exequente e os credores reclamantes, podem singularmente

requerer ao juiz a prática, ou a autorização para a prática, dos atos que se

afigurem indispensáveis à conservação do direito de crédito penhorado.

Portanto, trata-se das medidas constantes dos artigos 605.º e seguintes CC:

i. Declaração de nulidade dos atos praticados pelo devedor (artigo 605.º CC);

ii. Subrogação do credor ao devedor (artigos 606.º e 607.º CC);

iii. Impugnação pauliana (artigo 610.º CC); e

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iv. Arresto (artigo 619.º CC).

d. Cumprimento da obrigação vencida pelo terceiro devedor: se o terceiro

devedor reconhecer, sem reservas, que o crédito existe deverá, logo que

aquele se vença, proceder ao cumprimento. O mesmo sucederá quando,

estando o crédito dependente de contraprestação do executado, esta tenha

sido realizada. Vencido o crédito, se o objeto da obrigação for um pagamento

ou a restituição ou entrega de uma quantia pecuniária, manda a alínea a) do

n.º1 do artigo 777.º CPC que seja depositada a importância em instituição de

crédito, à ordem do agente de execução ou, nos casos em que as diligências

de execução sejam realizadas por oficial de justiça da secretaria do tribunal.

O terceiro deverá subsequentemente apresentar o documento do depósito.

Se o objeto da obrigação for a entrega de uma coisa, deverá esta ser entregue

ao agente de execução, ou à secretaria que funciona como seu depositário.

Na eventualidade de o vencimento ocorrer depois da venda ou adjudicação,

será a prestação naturalmente entregue ao adquirente (n.º2 do artigo 777.º

CPC).

e. Incumprimento da obrigação vencida pelo terceiro devedor: em caso de

incumprimento pelo terceiro devedor pode ser proposta ação executiva pelo

exequente ou pelo adquirente do crédito, nos termos do artigo 777.º, n.º3

CPC, consoante o crédito ainda esteja penhorado ou já tenha sido vendido.

Condição material é a de que o crédito sobre o debitor debitores esteja vencido,

como decorre do n.º1 do artigo 777.º CPC. Não se vê porque o executado

não possa também propor ação de condenação ou executar título executivo

de que já disponha. No entanto, decorre do n.º6 do artigo 773.º CPC, por

um argumento de maioria de razão, que carecerá de autorização prévia do

juiz, para poder colocar essa ação.

i. Se a execução for proposta pelo exequente: o titulo executivo é o documento

demonstrativo da ocorrência da confissão de dívida, expressa ou

tácita, conforme o artigo 777.º, n.º1 CPC. A saber, nos termos do

n.º3 do artigo 777.º CPC, e respetivamente: a declaração de

reconhecimento do devedor ou a notificação efetuada acompanhada

do termo no processo de falta de declaração, se o reconhecimento

resultou da não contestação (artigo 773.º, n.º4 CPC). Portanto,

configura-se a relevância extraprocessual da confissão, expressa ou

ficta, da dívida. Materialmente, está-se perante uma sub-rogação do

credor ao devedor. O executado deverá ser citado para constituir

litisconsórcio ativo com o exequente, em razão de o caso julgado

abranger também este.

ii. Se a execução for proposta pelo adquirente do crédito penhorado, o título

executivo é o título de aquisição do crédito emitido pelo agente de

execução nos termos do artigo 827.º, n.º1 CPC (artigo 777.º, n.º3, in

fine CPC). Materialmente, não há aqui uma sub-rogação ao executado:

o adquirente é o novo credor ex vi transmissão do crédito pela venda

e não um contemporâneo terceiro ao crédito. O executado já é

absolutamente exterior à divida e, logo, ao futuro caso julgado.

iii. Se a execução for colocada pelo executado: o título executivo não pode ser,

o reconhecimento do crédito por parte do devedor, pois ele não

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beneficia do artigo 777.º, n.º3 CPC. Se ele quiser fazer valer o seu

crédito sobre o terceiro terá de ser um qualquer outro título nos

termos gerais do artigo 703.º CPC, v.g., como uma sentença

condenatória.

Esta execução do crédito do executado não se confunde com a própria

execução pendente da sua própria dívida, sendo diversas tanto a dívida, como

as partes. No plano processual é tradicionalmente vista como formalmente

autónoma (mas o artigo 777.º, n.º3 CPC vem expressamente admitir –

opcionalmente, diríamos – que ela corra nos próprios autos da execução.

Quando seja colocada em separado, e visto que o título é diverso de sentença,

parece que o tribunal competente será determinado segundo as regras

residuais do artigo 89.º CPC, máxime, a do domicílio do executado. Na

execução sobre o terceiro, cujo crédito haja sido reconhecido tacitamente nos

termos do n.º4 do artigo 773.º CPC, se se verificar, na oposição à execução

(artigo 728.º CPC), que o crédito não existia, fica ele obrigado a indemnizar

os danos causados, nos termos gerais da responsabilidade civil

extracontratual, como se prevê no n.º4 do artigo 777.º CPC. Este direito à

indemnização pode ser alegado pelo exequente na contestação àquela

oposição (artigo 732.º, n.º2 CPC), vindo a ser liquidado nessa execução. Esta

possibilidade configura um caso único de reconvenção na oposição à

execução, porque esta não admite, em regra, tal atitude processual. Por fim,

importa notar que em 2003 e reformado em 2013, introduziu-se um novo

n.º5 ao artigo 779.º CPC, em que se manda aplicar o disposto nos n.º3 e 4 do

artigo 779.º CPC.

f. Negação da obrigação pelo terceiro devedor: o devedor pode negar a

existência do crédito, nos mesmos termos em que o faria se fosse o réu numa

ação declarativa ou autor em oposição à execução. Portanto, tanto pode

impugnar a existência do crédito, como opor-lhe exceções perentórias (artigo

571.º CPC). A ineficácia relativa, imposta pelo artigo 820.º CC, dita que

apenas podem ser opostos com eficácia processual factos extintivos

anteriores à penhora. Idêntica regra vale quanto a factos modificativos ou

impeditivos mas veremos mais adiante que se poderão admitir desvios a essa

solução. Sendo o crédito negado, a lei, entre determinar o levantamento

imediato da penhora ou o início de um incidente declarativo para apurar a

existência do crédito, segue uma via intermédia. Assim, segundo o n.º1 do

artigo 775.º CPC, deve proceder-se à notificação do exequente e do

executado para se pronunciarem, no prazo de 10 dias, devendo o exequente

declarar se mantém a penhora ou desiste dela. Tudo decorre por escrito,

enquanto antes da reforma de 2003, tinha lugar uma audição perante o

tribunal; por outro lado, o terceiro devedor não tem direito a participar neste

contraditório sumário, por se entender que a sua intervenção já se esgotou

na sua declaração negatória. A declaração que, neste ensejo, o exequente

prestar determina o destino próximo da penhora:

i. Se mantiver a penhora, o crédito será levado à venda ou à adjudicação

como litigioso (n.º1 artigo 775.º CPC);

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ii. Se desistir da penhora, esta é levantada e o exequente poderá, se

necessário, fazer nova indicação de bens, nos termos do artigo 751.º,

n.º4, alínea b) e e) CPC.

O devedor que haja contestado a dívida não está obrigado a depositar na data

do vencimento a respetiva importância em instituição de crédito (artigo 777.º,

n.º1 CPC a contrario). Quais a viabilidade e as consequências da venda de um

crédito litigioso? Se a venda ou adjudicação vier a ter lugar – e nada impede

que o adquirente desse crédito possa ser o próprio exequente – o adquirente

que for confrontado com uma situação de incumprimento poderá lançar mão

dos meios gerais, declarativos – máxime, da ação de condenação – e

executivos – execução para pagamento de quantia, entrega de coisa ou

prestação de facto, consoante o objeto da prestação devida pelo terceiro. Para

estes últimos, exige-se título executivo, naturalmente. Será o título de

aquisição do crédito? Parece que sim em face do artigo 777.º, n.º3 CPC que

lhe dá essa qualidade, e em face do artigo 828.º CPC. Mas como o crédito foi

impugnado não terá, por isso, o título de transmissão do crédito perdido a

sua força executiva. Pensamos que não: na verdade, estamos em sede de

artigo 777.º, n.º3 CPC, onde não se distingue se o crédito é ou não litigioso:

basta o incumprimento, haja ou não impugnação do crédito. Portanto, o

crédito vencido tanto pode ser executado pelo exequente antes da

transmissão executiva tendo por título a confissão da dívida (artigo 777.ºº,

n.º3, 1.ª parte CPC) e ainda que já esteja litigioso, nos termos do artigo 775.º,

n.º2 CPC, como pode ser executado pelo adquirente depois da transmissão

executiva tendo por título executivo a aquisição do crédito (artigo 777.º, n.º3,

in fine CPC), ainda que litigioso. Será na contestação à ação declarativa ou na

oposição à execução que o terceiro devedor poderá negar novamente o

putativo crédito.

Pluralidade de penhoras sobre o mesmo crédito: se for ordenada a penhora de um

crédito por dois tribunais diferentes junto de que credor deverá o terceiro devedor realizar a

prestação? Para o Ac. RP 10 julho 1997, a questão de saber-se qual dos exequentes

beneficiaria do crédito tem de ser definida pelo tribunal onde corre o processo executivo. Ao

devedor não seria lícito socorrer-se da consignação em depósito para se libertar da obrigação

de depositar o crédito, alegando que, sem culpa sua, não puder efetuar a prestação (artigo

841.º, n.º1, alínea a) CPC). Ora, com o devido respeito, discordamos: trata-se de uma

pluralidade de penhoras sobre o mesmo direito pelo que deverá a segunda penhora ser

oficiosamente sustada pelo agente de execução, nos termos do artigo 794º., n.º1 CPC. O

cumprimento deverá, então, ser feito perante o credor da primeira execução, que, aliás, por

beneficiar da penhora mais antiga, terá preferência na graduação no produto do crédito por

força do artigo 822.º CC.

Créditos incorporados:

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1. Títulos de crédito: constituem objeto desta penhora direitos de crédito

incorporados em títulos de crédito stricto sensu e direitos reais, no caso dos títulos de

crédito representativos. Todavia, o regime funciona também quando os direitos

incorporados são reais, como é o caso de um conhecimento de carga. O mecanismo

específico de penhora de direitos incorporados em títulos de crédito consta do artigo

774.º, n.º1 e 3 CPC. A penhora destes direitos assenta em dois momentos:

a. Apreensão do título, com eventual averbamento do ónus da penhora

(n.º1 do artigo 774.º CPC): traduzindo-se na transferência efetiva do

exercício dos poderes de facto para o agente da execução, funda-se na

incorporação do direito no título. Como escreve Vaz Serra,

«sem a posse deles não pode ser exercido o direito».

A esta expressão aplicam-se, por força do artigo 783.º CPC, as normas que

regulam a entrega efetiva de coisa móvel não sujeita a registo, constantes dos

artigos 764.º a 767.º CPC. Falamos, nomeadamente, da presunção de

titularidade do executado sobre os bens encontrados (artigo 764.º, n.º3 CPC),

da entrada forçada no domicílio do executado ou de terceiros (artigo 764.º,

n.º4 CPC), da cooperação do exequente (artigo 765.º CPC) e dos obstáculos

à penhora (artigo 767.º, n.º1 CPC), incluindo a remissão para o artigo 757.º

CPC. A penhora tem-se por realizada no momento da apreensão. Tal resulta,

quer do teor literal do n.º1 do artigo 774.º CPC quer da consideração de que

o momento do depósito tem já uma função de conservação do bem, como

sucede com a penhora sobre coisas corpóreas, imóveis ou móveis, que é

seguida da entrega a um depositário.

b. Depósito em instituição de crédito, à ordem do agente de execução

(artigo 774.º, n.º2 CPC): o depositário é a instituição de crédito, e não o

agente de execução ou pessoa designada pelo oficial de justiça, como sucede

na penhora sobre coisas corpóreas (artigo 756.º, n.º1 e 772.º CPC). Esta

instituição de créditos será designada pelo agente de execução (artigo 719.º,

n.º1 CPC). À atividade da instituição financeira depositária podem aplicar-se,

por força do artigo 783.º CPC, algumas normas que tratam do estatuto do

depositário, desde que compatíveis com a natureza específica de uma

instituição financeira. Nomeadamente, parece-nos que pode qualquer

interessado, nos termos do artigo 761.º, n.º1 CPC, requerer a substituição da

instituição de crédito depositária em caso de má administração, ou seja, esta

norma haverá sempre de se poder opor ao depósito firmado entre o agente

da execução e a instituição financeira. A penhora de títulos de crédito não

carece de registo. Se os direitos tiverem natureza obrigacional, como sucede

nos casos muito mais importantes dos títulos de crédito stricto sensu, deve ter-

se em conta a posição jurídica passiva de terceiro devedor do executado. É o

que se faz através da remissão, inalterada, do n.º2 para o regime comum da

penhora de créditos. Deste modo, sempre que existir um devedor do

executado, deverá ele ser notificado de que o crédito que o documento titula

foi penhorado, nos termos e para os efeitos dos artigos 773.º e 775.º CPC.

No mais, quanto ao cumprimento pelo terceiro, regerão os artigos 776.º e

777.º CPC.

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2. Valores mobiliários: passemos, agora, a tratar da penhora de direitos incorporados

em valores mobiliários. Cabem, aqui, por exemplo, as ações de uma sociedade

anónima e os títulos da dívida pública, como os certificados de aforro. Esta matéria

foi modificada pela Reforma de 2003. Assim, o n.º1 do artigo 774.º CPC passou a

abranger expressamente também a penhora de valores mobiliários titulados. Em

contrapartida, foi eliminado o n.º que tratava, precisamente, da penhora dos títulos

ou valores mobiliários sujeitos a um regime de imobilização ou depósito em

instituição financeira. Quanto os valores mobiliários não sujeitos a imobilização ou

depósito não há dificuldade especial. Efetivamente, tal como antes da Reforma de

2003, a respetiva penhora de valores mobiliários será feita nos termos que se

explicaram para a penhora de títulos de crédito stricto sensu:

a. Apreensão;

b. Notificação à contraparte;

c. Posterior depósito em instituição de crédito.

Esta penhora pode eventualmente carecer de ser averbada, nos termos do artigo

774.º, n.º1, parte final CPC. Tratando-se de valores mobiliários escriturais integrados

em sistema centralizado, a penhora, em conformidade com os artigos 82.º CVM, será

feita mediante comunicação, preferentemente eletrónica, à entidade registadora, de

que o valor fica à ordem do agente de execução. A entidade registadora lavra, depois,

oficiosamente o registo (artigo 66.º, n.º1 CVM).Por seu turno, os valores mobiliários

sujeitos a imobilização ou depósito perderam a norma específica do n.º revogado em

2003 do artigo 774.º CPC. Nesse numero estatuía-se que a penhora se realizava

mediante comunicação à entidade depositária de que os títulos ficam à ordem do

tribunal. O que sucedeu foi que o artigo 780.º, n.º14 CPC passou a ditar que o regime

da penhora de depósitos bancários (salva a alínea b) do n.º7 – ressalva suprimida na

Reforma de 2013) é aplicável à penhora de valores mobiliários, escriturais ou titulados,

seja os integrados em sistema centralizado, os registados ou depositados em

intermediário financeiro, ou registados junto do respetivo emitente. Este tratamento

comum pode levantar algumas dificuldades:

a. Em sede de Código Velho, a remissão parecia ditar que a penhora carecesse

de prévio despacho judicial. Só que tratando-se de valores mobiliários

registados e que, por isso, não estão ao abrigo do segredo e cuidados

bancários, parecia-nos excessivo, em face da nova economia da ação

executiva. Mas, com a reforma desse n.º1 (agora no artigo 780.º CPC) deixou

de haver, seguramente, despacho judicial prévio. Naturalmente que será o

agente de execução que promoverá as diligências de venda e as subsequentes,

nos termos gerais da sua função no processo (artigo 719.º, n.º1 CPC).

b. Mantém-se do regime anterior que a penhora se faz por comunicação,

eletrónica, à entidade registadora ou depositárias de que o valor fica à ordem

do agente de execução (artigo 780.º, n.º1 CPC).

c. As demais normas do artigo 780.º CPC são aplicáveis quanto à identidade do

depósito do valor mobiliário, às preferências entre depósitos, às

comunicações entre o agente de execução e a instituição responsável, às

afetações de saldo, à responsabilidade, e à remuneração da instituição

bancária. Também, o regime do artigo 780.º, n.º12 CPC – entrega imediata

de quantia penhorada que não garanta crédito reclamado – se aplica à

execução sobre valores mobiliários registados ou depositados. No caso de

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valor imobiliário registo, há que aplicar, ainda, as normas relativas à penhora

de móveis sujeitos a registo, fazendo uso do disposto no artigo 768.º, n.º1

CPC, que remete para o artigo 755.º CPC ex vi artigo 783.º CPC. Assim,

aquela comunicação servirá para a inscrição da penhora e será suficiente para

a prodição erga omnes dos efeitos desta (artigo 755.º, n.º1 CPC), devendo a

entidade responsável pelo sistema centralizado ou o emitente, consoante o

caso, depois de inscrita a penhora e de observado o disposto no n.º2 do artigo

7780.º CPC, enviar ao agente de execução – mas não ao juiz, insistimos –

documentos de certificação de registo e uma certidão dos ónus (n.º2 do artigo

755.º CPC.

Rendimentos periódicos:

1. Objeto: a penhora de rendimentos periódicos regulada no artigo 779.º CPC sofreu

alterações até à Reforma de 2013, atinentes ao pagamento do exequente por entrega

direta dos valores penhorados. Em 2003, o artigo, que se referia literalmente apenas

aos abonos ou vencimentos de funcionários públicos, viu alargado o campo subjetivo

e objetivo da previsão para qualquer executado que seja credor de quaisquer

rendimentos periódicos. Quanto ao executado, deixou de se exigir a qualidade de

funcionário público. Assim, a penhora do salário de um empregado de escritório, que

antes caía na penhora comum de créditos (artigo 773.º CPC), passou a ser abrangida

pelo artigo 779.º, n.º1 CPC. Os rendimentos periódicos podem ser, além dos

rendimentos enumerados (rendas, abonos, vencimentos, salários) outros créditos

periódicos. Deste modo, cabem aqui, antes de mais, enquanto rendimentos de causa

pessoal:

a. Rendimentos do trabalho, lato sensu, seja por conta de outrem, seja a

título de prestação de serviços, como vencimentos, salários, avenças,

ou prestações de natureza semelhante, incluindo direitos de autor;

b. Prestações sociais, como abonos, subsídios e pensões de reforma;

c. Prestações pagas regularmente a título de seguro ou indemnização.

Já os valores auferidos de modo excecional não cabem aqui e deverão ser penhorados

como créditos, nos termos do artigo 773.º CPC. Estes rendimentos periódicos de

causa estritamente pessoal necessitarão de ser objetivamente penhoráveis, o que não

sucede, por exemplo, com o direito a alimentos (artigos 735.º, n.º1, 2.ª parte CPC e

2008.º, n.º2 CC). Quando sejam objetivamente penhoráveis, são-no apenas

parcialmente, nos termos do artigo 738.º CPC. Mas o legislador da Reforma passou

a admitir expressamente no artigo 779.º, n.º1 CPC, algo que anteriormente não se

previa: os rendimentos de causa real, i.e., os frutos civis (artigo 212.º, n.º2 CC)

vencidos regularmente pela titularidade de um direito real ou pessoal de gozo sobre

uma coisa. A saber:

a. Rendas e alugueres, a que lei se cinge literalmente quando se refere, adiante,

ao locatário;

b. Prestações semelhantes recebidas na execução de contratos de aluguer

de longa duração (ALD) e leasing;

c. Prestações pecuniárias convencionadas e que sejam pagas por titular

de direito real de gozo menor, como o usufrutuário (artigos 1440.º e 1445.º

CC) e o superficiário (artigo 1530.º CC).

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Já os frutos civis que tenham a natureza de interesse – máxime, juros remuneratórios

– excluem-se deste artigo, cabendo na penhora de depósitos bancários (artigo 780.º

CPC). Finalmente, a formulação de 2003 do artigo 779.º, n.º1 CPC permite ainda

apenhora de rendas ou prestações afins percebidas por pessoas coletivas.

2. Procedimento: feita a indicação pelo exequente dos rendimentos, pessoais e reais

(artigo 724.º, n.º3 CPC) e, quando possível, do empregador do executado (artigo

724.º, n.º1, alínea i) e 3 CPC) ou do locatário (artigo 724.º, n.º3 CPC), ou descobertos

esses bens pelo agente de execução, na ausência daquela, promoverá este a respetiva

penhora, nos termos do artigo 709.º, n.º1 CPC. Todavia, se o agente de execução

deve (em sede de Código novo) respeitar as indicações do exequente sobre os bens

que pretende ver prioritariamente penhorados, o artigo 751º., n.º2 CPC impõe-lhe o

respeito por norma legal imperativa, máxime, os já referidos limites do artigo 738.º

CPC, pelo princípio da proporcionalidade (artigo 735.º, n.º3 CPC) e pelo princípio

da adequação (artigo 751.º, n.º1 CPC). Confirmada a legalidade da penhora, deve o

agente de execução (artigo 719.º, n.º1 CPC) promover a notificação do locatário,

empregador ou entidade que os deva pagar (artigo 779.º, n.º1 CPC). Nessa

notificação, o agente de execução ordena ao notificado que passe a descontar o valor

do crédito penhorado e o deposite em instituição de crédito – 2.ª parte do mesmo

n.º1 do artigo 779.º CPC. Este desconto será feito à medida que se vença ou seja

cobrado o rendimento, de modo que cada novo vencimento importa novo depósito,

nos termos do artigo 756.º, n.º3 CPC. A citação dos credores e do cônjuge terá lugar

apenas depois de concluída a fase da penhora e de apurada, pelo agente de execução,

a situação registal. Isto sem prejuízo de poder haver, eventualmente, dispensa de

citação de credores por consignação de rendimentos ao exequente, nos termos do

n.º4, alínea a), do artigo 788.º CPC e do n.º3 do artigo 803.º CPC. A citação do

cônjuge parece impor-se, essencialmente, na penhora de rendimentos que sejam bens

comuns: máxime, o produto do trabalho é um bem comum (artigo 1724.º, alínea a)

CC). Os efeitos da penhora de rendimentos produzem-se com a notificação ao

terceiro devedor, pois, nos termos gerais do artigo 773.º, n.º1 CPC, o respetivo

crédito fica desde logo à ordem do agente de execução. Os efeitos da penhora, como

a ineficácia dos atos extintivos (artigo 820.º CC) dão-se pela notificação, portanto. O

cumprimento pelo terceiro devedor far-se-á mediante depósito, segundo o n.º2 do

artigo 779.º CPC, à ordem do agente de execução, ou, nos casos em que as diligências

de execução são realizadas por oficial de justiça, da secretaria. Feito o seu depósito,

as quantias ficam indisponíveis até:

a. Ao termo do prazo para oposição do executado – à penhora, entenda-se

– e que é de 10 ou 20 dias, consoante tenha havido citação prévia do

executado, ou não (artigos 785.º, n.º1 e 856.º, n.º1 CPC); essa oposição é

ainda a do cônjuge citado (artigo 787.º, n.º1 CPC); ou,

b. Ao trânsito em julgado da respetiva decisão.

Findo esse prazo, ou julgada improcedente a oposição, o dinheiro fica disponível

para ser adjudicado ao exequente até ao valor da obrigação exequenda, abatidas as

despesas da execução referidas no artigo 735.º, n.º3 CPC.

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Saldos bancários:

1. Regime: a penhora de depósitos bancários foi uma das matérias mais alteradas pela

Reforma de 2003, com o objetivo de aumentar a eficácia da penhora. Além da

questão dos limites à nomeação de conta bancária e da eventual compatibilidade com

o sigilo bancário, era frequente o exequente não conseguir identificar adequadamente

contas bancárias e, verificada essa frustração, requerer ao tribunal que solicitasse ao

Banco de Portugal informação sobre quais as instituições em que o executado seria

detentor de contas bancárias. O sistema mudou, então, passando a ser centralizado

no agente de execução e numa penhora sem aviso prévio. O seu regime passou a

estar distribuído pelos 14 números do artigo 780.º CPC. Em 2013 e novamente

alterado o regime, no sentido da agilização. Foram seus pontos principais: a supressão

(discutível) da necessidade de despacho judicial prévio e a alteração do sistema de

preparação e consumação da penhora dos saldos, por meio de comunicação do

agente de execução. Por outro lado, faz-se uso impróprio do termo bloqueio e

respetiva forma verbal, como sinónimo de apreensão preparatória da penhora (artigo

780.º, n.º6 CPC) e de penhora (assim no n.º5 do artigo 780.º CPC). Finalmente, o

regime de operacionalização desta penhora (disponibilização de informação pelo

Banco de Portugal e ao concretos) passou a estar regulado nos artigos 17.º e 18.º

Portaria n.º282/2013, 29 agosto.

2. Objeto; limites temporais e subjetivos: o objeto desta penhora não é a conta do

executado, i.e., a universalidade de posições ativas que compõem a sua posição

contratual perante o banco. O objeto é o direito de crédito do executado sobre uma

instituição de crédito decorrente de um saldo positivo num depósito bancário. Caso

se queira penhorar outros elementos da relação do executado com o seu banco que

não se traduzam num depósito terá de se fazer a respetiva e autónoma penhora

enquanto penhora de títulos ou penhora de créditos. A identificação da conta poderá

ter sido feita na indicação de bens para penhora, nos termos da alínea i) do n.º1 do

artigo 724.º CPC. Caso não tenha sido feita adequadamente essa identificação, o n.º2

do artigo 780.º CPC permite que possa ser penhorada a parte do executado nos saldos

de todos os depósitos existentes nas instituições notificadas/comunicadas com

respeito pelo limite decorrente do princípio da proporcionalidade da penhora (artigo

735.º, n.º3 CPC) e das impenhorabilidades parciais (artigo 738.º, n.º4 e 5 CPC). Mas,

o n.º7 do artigo 780.º CPC impõe um gradus executionis pelo qual se visa conciliar os

princípios da proporcionalidade da penhora com o da adequação aos interesses do

credor exequente. A respetiva ordem é a seguinte:

a. Contas singulares do executado:

i. A prazo;

ii. À ordem;

b. Contas coletivas:

i. Em que o executado esteja com menor número de contitulares;

1. A prazo;

2. À ordem;

ii. Em que o executado seja o primeiro titular;

1. A prazo;

2. À ordem.

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A graduação é vinculativa o que significa que, por um lado, é ilegal a penhora que a

viole e que, por outro lado, que a conta que está a seguir na graduação apenas pode

ser penhorada nos termos do artigo 751.º, n.º4, alínea b) CPC, i.e., quando seja ou se

torne manifesta a insuficiência dos bens penhorados. Parece, assim, configurar-se

uma penhorabilidade subsidiária objetiva fundada, como se lê no artigo 745.º, n.º5,

in fine CPC, em que se demonstre a insuficiência manifesta dos que por ela deviam

responder prioritariamente. A sua violação merece censura em sede de artigo 784.º,

n.º1, alínea b) CPC. Uma vez que o saldo bancário não é estático, importa fixar se as

entradas ou saídas ordenadas antes da penhora devem ser consideradas no objeto de

penhora. A resposta é afirmativa e consta do n.º10 do artigo 780.º CPC. Assim,

devem ser contabilizados:

a. A favor do saldo: os lançamentos dos créditos de valores entregues antes da

penhora, mas ainda não creditados;

b. Em desfavor do saldo: as apresentações a pagamento de cheques, com data

anterior à penhora, e os pagamentos ou levantamentos já creditados a

terceiros antes da penhora.

Mas a pergunta inversa também deve ser feita: se as entradas ou saídas ordenadas

após a penhora devem ser consideradas. Ora, segundo o artigo 780.º, n.º11CPC, a

entidade bancária fornecerá ao agente de execução onde constem todas as operações

que afetem os depósitos penhorados após a realização da penhora, sendo responsável

pelas informações que prestar. Este teor literal poderia indiciar que a penhora poderia

abranger novos valores creditados depois da data da cativação. Não nos parece que

assim possa suceder: como resulta a contrario do n.º10, alínea a) do artigo 780.º CPC,

os movimentos a favor da conta mas posteriores à penhora não relevam para o saldo

que ficou indicado no auto da penhora. Isto significa que a penhora do saldo está

temporalmente limitada a uma data (é uma penhora do saldo presente) e que só pode

ser alargada mediante reforço da penhora ao abrigo do artigo 751.º, n.º4, alínea b)

CPC. Finalmente, os limites subjetivos à penhora de depósitos bancários fazem

sentir-se nos casos de contas coletivas, i.e., que pertencem em contitularidade ao

executado e outro ou outros sujeitos. Essas contas são correntemente designadas

como contas conjuntas, solidárias e mistas, atendendo à distribuição dos poderes de

gestão e movimentação entre os contitulares. A lei neste caso é muito clara, no n.º2

do artigo 780.º CPC, em coerência com o artigo 743.º CPC: sendo vários os titulares

do depósito, a penhora incide sobre a quota-parte do executado na conta comum,

presumindo-se que as quotas são iguais. Deste modo, se o executado estiver casado,

importa distinguir:

a. Se a conta for coletiva: penhora-se a quota parte do saldo, i.e., metade;

b. Se a conta for singular (do executado): penhora-se a conta na totalidade

objetivamente admissível; contudo, nesta segunda hipótese, se for penhora

de um vencimento recebido em conta, estamos perante penhora de um bem

comum (artigo 1724.º, alínea a) CC), pelo que se deve citar o cônjuge nos

termos e para os efeitos do artigo 740.º, n.º1 CPC.

3. Procedimento:

a. Atos iniciais: consulta ao Banco de Portugal; comunicação à entidade

bancária; penhora condicional de conta: a penhora de saldo bancário

segue um procedimento algo complexo, em que a penhora definitiva resulta

da realização de vários atos, incluindo um ato de penhora provisória. Nele

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devemos distinguir entre atos iniciais e a penhora definitiva propriamente dita.

Os atos preparatórios integram:

i. Consulta ao Banco de Portugal;

ii. Constituição do agente de execução ao banco de penhora provisória da conta

(cativação ou bloqueio, segundo a terminologia legal);

iii. Resposta da instituição de crédito.

O procedimento de penhora de depósito bancário inicia-se por obtenção de

informação acerca das instituições legalmente autorizadas a receber depósitos

em que o executado detém contas ou depósitos bancários junto do Banco de

Portugal, disponibilizada por via eletrónica ao agente de execução (artigo

749.º, n.º6 CPC). Obtida esta informação, o agente de execução envia uma

comunicação eletrónica diretamente às instituições de crédito (artigo 780.º,

n.º1 e 2 CPC). Esta comunicação conterá os seguintes elementos, de acordo

com os n.º2 e 3 do artigo 780.º CPC:

i. Identificação do executado (nome, domicílio, BI/NPC e/ou NIF);

ii. Menção expressa de que o saldo existente, ou a quota-parte do executado nesse

saldo:

1. Fica cativo/bloqueado desde a data do envio da comunicação, até ao

limite da penhora expressa em euros, calculada de acordo

com o limite do n.º3 do artigo 735.º CPC, salvaguardado o

disposto no n.º4 e 5 do artigo 738.º CPC;

2. Só é movimentável pelo agente de execução.

Como melhor se verá adiante, quando confirmado este ato é já o primeiro

ato de penhora, embora sujeito a condição resolutiva da sua eficácia. Quando

não confirmada toda a sua eficácia se esvai retroativamente. Admitimos que

esta interpretação sobre a natureza do bloqueio não seja pacífica. Dado que

apenas se for confirmada é que tem eficácia sobre o executado, a lei designa-

a como bloqueio ou cativação e a instrução dada à entidade bancária, como

comunicação – não como notificação. É duvidoso se a

notificação/comunicação deve ser feita perante a pessoa coletiva anco ou se

perante a agência onde esteja situada conta a penhorar. Januário da Costa

Gomes respondeu já dizendo que deve ser feita na sede da pessoa jurídica e

não nos estabelecimentos bancários, mas sugere uma aplicação do artigo 13.º,

n.º1 CPC que dá personalidade judiciária às agências quando a ação proceda

de facto por ela praticado.

b. Atos finais:

i. Resposta negativa da instituição de crédito; levantamento da penhora condicional:

uma vez recebida a notificação, as entidades notificadas tinham 10

dias para comunicar ao agente de execução se a conta ou contas

existem e qual o montante do saldo, e bem assim quais os seus

caracteres e condicionalismo, máxime a existência de garantias reais.

No novo artigo 780.º, n.º8 CPC aquele prazo foi reduzido para dois

dias após a comunicação do agente de execução. As informações a

transmitir serão, no essencial, as mesmas:

1. O montante bloqueado; ou

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2. O montante dos saldos existentes, sempre que, pela aplicação do disposto

nos n.º4 e 5 do artigo 738.º CPC, a instituição não possa

efetuar o bloqueio a que se refere o n.º2; ou,

3. A inexistência de conta ou saldo.

Nestas duas últimas hipóteses, não foi confirmada a possibilidade de

penhora, pelo que a penhora condicional do agente fica sem efeito

por ilegal (no caso do excesso de penhora) ou for falta de objeto.

Quais serão as consequências para a instituição de crédito por

declarar que nada consta em nome do executado, omitir elementos

relevantes, ou pura e simplesmente não responder?

4. Em sede de Código velho, uma solução seria pugnar pela

aplicabilidade do regime geral da penhora de créditos dos

(atuais) artigos 773.º e seguintes CPC aos casos de declaração

de inexistência de conta ou de ausência de resposta. Em

consequência, nos termos do n.º4 do artigo 773.º CPC: se

faltar conscientemente à verdade, o devedor incorre na

responsabilidade do litigante de má fé.

5. Justamente, o artigo 780.º, n.º1 CPC vem consagrar essa

solução na sua parte final: determina-se a aplicação do

disposto no n.º1 do artigo 417.º CPC. Isto quer dizer que se

impõe às entidades bancárias o cumprimento de dever de

cooperação para a descoberta da verdade, facultando o que

for requisitado e praticado os atos que foram determinados.

A violação desse importante dever processual redunda em

litigância de má fé nos termos do artigo 542.º, n.º2, alínea c)

CPC, com eventual condenação em multa e indemnização à

parte prejudicada.

Mas deve ir-se mais longe, além desta cominação?

6. Em sede anterior á reforma de 2013, a remissão para o regime da

penhora de créditos permitia discutir se perante a declaração

de inexistência de conta sucederia o efeito do artigo 775.º,

n.º1 CPC – equipara-se a negação à contestação do crédito

que leva à notificação do exequente e o executado para se

pronunciarem, no prazo de 10 dias, devendo o exequente

declarar se mantém a penhora ou desiste dela, sob pena de

ficar um crédito litigioso (artigo 775.º, n.º2 CPC) – ou em

caso de silêncio do banco o efeito de reconhecimento ficto

do crédito do artigo 773.º, n.º3 CPC.

a. Na doutrina, Januário da Costa Gomes negava

essas consequências: a técnica do artigo que

estabelecia a remissão para o artigo 773.º CPC,

aplicando este regime, era claramente diferente. As

razões seriam por, em virtude do sigilo e da

mobilidade do saldo, ser necessária uma indicação

precisa de um crédito à penhora. Pareceria, assim, não

valer o regime geral dos artigos 773.º e seguintes CPC.

Todavia, a verdade é que o problema do sigilo ficava

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resolvido com o despacho judicial, nada impedindo

que o banco confirmasse ou não se havia a conta X.

b. Por isso, o AC. RP 26 fevereiro 1996, decidiu que

ordenada a penhora desses saldos e notificada a

respetiva instituição de crédito, não é lícito a esta

eximir-se do cumprimento das declarações previstas

no Código.

c. No entanto, segundo o Ac. STJ 15 junho 1999,

indicado à penhora um saldo bancário, a cominação

para a falta de declaração do devedor, ou seja, do

banco, se pode respeitar ao saldo que efetivamente

exista no momento da notificação, devendo a

instituição bancária informar se o valor do depósito

for inferior ao valor certo mandado penhorar.

7. A dúvida parece estar resolvida no artigo 780.º, n.º1 CPC: este

já remete para o regime geral da penhora de créditos, mas,

como se disse, somente para o regime do artigo 417.º, nº1

CPC. Portanto, consagrou-se a solução mais restrita,

propugnada, nomeadamente, por Januário da Costa Gomes.

ii. Resposta positiva da instituição de crédito; momento da penhora; comunicação de

confirmação ao terceiro: no caso de a entidade bancária comunicar o

montante bloqueado, tem-se a penhora efetuada na data do envio da

comunicação de bloqueio que o agente lhe fizera, como decorre do

artigo 780.º, n.º1 e 2 CPC. Ou seja: não há mais ulterior ato de

penhora ou data a considerar. A ser assim, o bloqueio prévio

permitirá – ponto duvidoso, concedemos – que a penhora do saldo,

ao restringir a data da primeira comunicação, prevaleça sobre uma

penhora consumada que ocorra entre o momento do bloqueio e a

confirmação deste em penhora. Doravante, o valor penhorado só é

movimentável pelo agente de execução, até ao limite estabelecido no

artigo 735.º, n.º3 CPC, como estatui o artigo 780.º, n.º4 CPC. Isto,

sem prejuízo do disposto no acerto desse saldo em consequência de

créditos e débitos pendentes, nos termos do artigo 780.º, n.º10 CPC.

Ou seja: dá-se aqui o efeito essencial à penhora de indisponibilidade

dos atos e disposição ou oneração do crédito penhorado, nos termos

do artigo 820.º CC. Ao mesmo tempo, para efeitos de reclamação de

créditos, dá-se o segundo efeito, estatuído pelo artigo 822.º, n.º1 CC.

É este o conteúdo útil da cativação ou bloqueio que se abate sobre o

saldo existente, ou a quota-parte do executado nesse saldo. Por isso,

a primeira comunicação foi uma verdadeira notificação de ato de

penhora, dado ser o ato processual pelo qual o devedor do executado

vê, ainda que provisoriamente, restringidas as suas posições jurídicas.

Era essa aliás a correta expressão consagrada no anterior regime. Mas

uma vez que há uma dilação temporal entre o momento da

notificação, i.e., da ordem de penhora e o momento do conhecimento

das contas efetivamente existentes, os efeitos da penhora do saldo

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haviam começado por produzir-se sob condição resolutiva, pois o

objeto não está determinado no momento da notificação, e bem se

pode dar o caso de o executado não ter nenhuma conta aberta.

Efetivamente, importa que o agente confirme ainda se a penhora está

consolidada e em que medida. Dessa confirmação depende a eficácia

ou a revogação do ato provisório de penhora. Por isto, o n.º9 do

artigo 780.º CPC determina que recebida aquela comunicação, o

agente de execução, no prazo de cinco dias, respeitados os limites

previstos nos n.º4 e 5 do artigo 738.º CPC, comunica por via

eletrónica às instituições de crédito a penhora dos montantes dos

saldos existentes que se mostrem necessários para notificação da

quantia exequenda e o desbloqueio dos montantes não penhorados.

No entanto, os efeitos da penhora reportar-se-ão sempre à data

daquela notificação: lembre-se, novamente, a este propósito que, nos

termos do n.º11 do artigo 780.º CPC a instituição é responsável pelos

saldos bancários nela existentes à data da notificação/comunicação.

Da penhora do saldo bancário lavra o agente de execução auto. Trata-

se de ato processual obrigatório para certificar a realização, a data e o

objeto da penhora – máxime, a identificação das contas e montante

penhorado. Antes da reforma de 2013 a realização do ato decorria do,

então, artigo 836.º, mas este foi renumerado como artigo 753.º, n.º1

CPC.

iii. Comunicação interna ao cliente; notificação do executado: a 2.ª parte do

mesmo n.º9 do artigo 780.º CPC vem determinar que após esta

notificação a penhora efetuada deve ser comunicada de imediato ao

executado pela instituição de crédito. Sendo certo que de toda a

penhora deve o executado ser notificado a fim de poder conhecer do

ato e, querendo, exercer o direito de defesa (artigo 753.º, n.º2 CPC)

deve perguntar-se se a comunicação do banco ao cliente é a

notificação da penhora ao executado:

1. Se a resposta for afirmativa: isso significa que, ou a notificação

não se sujeita às garantias processuais a que estão sujeitas as

notificações, em geral, o que é ilegal por violar essas mesmas

garantias, sem razão excecional razoável, ou que valem essas

garantias e então teremos os bancos a substituir os

mandatários do Estado, i.e., os funcionários judiciais e os

agentes de execução.

2. Mas não: a comunicação imposta pelo artigo 780.º, n.º9 CPC

tem a natureza de uma comunicação interna, entre banco e

cliente, cabendo ao agente de execução proceder à verdadeira

notificação nos termos gerais. A utilidade do preceito é

obrigar o terceiro devedor a fazer uma comunicação que não

resultaria do regime geral do artigo 773.º CPC.

Deste modo, em sede de Código novo, cumpre ao agente de

execução proceder ainda à notificação do executado nos 5 dias

posteriores à realização da penhora do saldo bancário (artigo 753.º,

n.º4 CPC). Através dela, deve o executado ser advertido da

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possibilidade de deduzir oposição à penhora, com os fundamentos

previstos no artigo 784.º CPC, e do prazo que, para tal, dispõe,

entregando-lhe cópia do auto de penhora. Dada esta resposta é mais

fácil responder a uma outra dúvida que se tem colocado em matéria

de notificação do ato de penhora de depósito bancário: havendo

contitulares na conta bancária devem estes ser notificados? Remédio

Marques entende que não, o que, salvo o devido respeito, não tem

nenhuma justificação legal, antes pelo contrário. Apenas o

entendimento de que toda a notícia da penhora de depósito bancário

se resume à comunicação ao executado por parte do banco, pode

suportar uma tal ideia. O artigo 781.º, n.º1 CPC obriga a essa

notificação, opinião que é também a de Amâncio Ferreira.

4. Obrigações subsequentes e remuneração da instituição de crédito: enquanto

os depósitos bancários estiverem penhorados o banco, e como já se viu atrás,

segundo o artigo 780.º, n.º11 CPC fornece ao agente de execução extrato onde

constem todas as operações que afetem os depósitos penhorados após a realização

da penhora. Trata-se de um dever processual de execução continuada pois abrange

todos os extratos supervenientes à penhora e não somente o primeiro. Tal permitirá

não apenas operar o n.º10 do mesmo artigo (i.e., a consideração de créditos e de

débitos anteriores à penhora), como, em geral, ainda sustentar um eventual reforço

da penhora, caso venha a ser necessário, com base em operações de crédito

posteriores à penhora. Por outro lado, até à reforma de 1008, o regime determinava

que as instituições de crédito deveriam ser remuneradas pelos serviços prestados na

averiguação da existência das contas e na efetivação da penhora dos saldos existentes.

Com a reforma de 2008, o regime passou a ser mais restrito: lia-se que apenas nos

casos em que o exequente seja uma sociedade comercial que tenha dado entrada num

tribunal, secretaria judicial ou balcão, no ano anterior, a 200 ou mais providências

cautelares, ações, procedimentos ou execuções, é devida às instituições de crédito

uma remuneração pelos serviços prestados. O normativo mantém-se no artigo 780.º,

n.º12, 2.ª parte CPC. Quanto ao valor da remuneração,

a. O artigo 17.º, n.º9 RCP estatuía que cada instituição receberia um quinto de

1UC (1/5), em caso de penhora de saldos em nome do executado ou um

décimo de 1UC (1/10), quando não haja saldos ou valores em nome do

executado. Segundo o n.º10 do mesmo artigo 17.º, estas remunerações são

reduzidas a um décimo (1/10) quando, por facto imputável a instituição

bancária, não sejam utilizados meios eletrónicos.

b. No novo Código, no artigo 780.º, n.º12, 2.ª parte CPC mantém-se a regra

de que apenas há lugar a remuneração às instituições de crédito colaborante

nos casos em que o exequente seja uma sociedade comercial que tenha dado

entrada num tribunal, secretaria judicial ou balcão, no ano anterior, a 200 ou

mais providências cautelares, ações, procedimentos ou execuções. Mas no

mais passou-se apenas a remeter-se a regulação do quantitativo, formas de

pagamento e cobrança destas remunerações para uma portaria, devendo,

nessa fixação, atender-se à complexidade da colaboração requerida e à

circunstância de a penhora se ter ou não consumado. Portanto, tal matéria

deixa constar do Regulamento das Custas Processuais. Na realidade, trata-se

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ainda da Portaria n.º202/2011, 20 maio, nos seus artigos 5.º e seguintes, mas

agora alterados pela Portaria n.º279/2013, 26 agosto. Nomeadamente, o

artigo 5.º, n.º2 passa a determinar que a remuneração corresponde a um

quinto de UC (1/5) quando não haja conta bancária ou saldos do executado,

sendo de um décimo de UC (1/10) quando não haja conta bancária ou saldos

em nome do executado ou quando, após bloqueio dos saldos, estes estejam

desbloqueados. Nos termos do artigo 1.º, in fine Portaria n.º202/2011, 20

maio e no reformulado artigo 1.º, n.º2 da mesma Portaria, como alterado pela

Portaria n.º279/2013, 26 agosto, aquela remuneração constitui encargo para

efeitos de Regulamento de Custas. Ou seja, são gastos que devem ser pagos

pela parte requerente ou interessada e que não integram nem os honorários

do agente de execução, nem as custas da execução, nem podem ser

reclamadas a título de custas da parte.

5. Entrega ao exequente: as quantias penhoradas que não garantem qualquer crédito

reclamado poderão, fundo o prazo de oposição ou tendo sido esta julgada

improcedente, ser entregues diretamente ao exequente, nos termos do artigo 780.º,

n.º3 CPC. Repete-se, pois, o que consta do artigo 777.º, n.º3 CPC. Deste modo,

extingue-se necessariamente a respetiva penhora. Ao contrário, havendo reclamação

de créditos essa entrega será feita em função da graduação de créditos.

Quotas sociais, lucros e quotas de liquidação: o artigo 781.º CPC regula ainda, no

seu n.º6, a penhora de quota em sociedade. Dita o artigo 239.º, n.º1 CSC que a penhora de

uma quota abrange os direitos patrimoniais a ela inerentes, com ressalva do direito a lucros

já atribuídos por deliberação dos sócios à data da penhora e sem prejuízo da penhora deste

crédito. Todavia, o direito de voto continua a ser exercido pelo titular da quota penhorada.

Esta solução vale, mutatis mutandis, para a penhora de participações sociais, em geral que não

sejam reconduzíveis a valores mobiliários, i.e., não abrangidos pelos artigos 774.º e 780.º,

n.º14 CPC. A penhora é feita através notificação à própria sociedade e de registo, como já

constava da alínea f) do artigo 3.º CRCom, antes da reforma de 2003. Estatui-se naquele n.º6

que a notificação deve ser feita além da comunicação à conservatória de registo competente,

pelo agente de execução, nos termos do n.º1 do artigo 755.º CPC. Tal como na penhora de

quota-parte em bens indivisos não sujeitos a registo, o registo é ato constitutivo da penhora

conjuntamente com a notificação aos consortes. Já a penhora de direito aos lucros e à quota

de liquidação, deve ser vista como uma penhora de quinhão sobre um bem indiviso, em sede

de artigo 781.º CPC. Na verdade, o direito ao lucro assenta num direito a quinhoar sobre

lucros, i.e., integra um feixe comungado de direitos aos lucros – tantos quantos os sócios.

Isto significa que há-de ser feita mediante notificação aos restantes sócios não executados,

nos termos do n.º1 do mesmo artigo. Vale no resto o que adiante se disser sobre este tipo de

penhora.

§48.º - Penhora de direitos reais em comunhão ou em sobreposição de

direitos sobre patrimónios autónomos e de expectativas de aquisição

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Direitos em comunhão e sobre patrimónios autónomos:

1. Objeto: se a execução for movida contra titular de posição jurídica em

contitularidade que não seja um crédito regem os artigos 743.º e 781.º CPC,

respetivamente, o objeto e o procedimento. Cabem aqui a penhora de direito real em

comunhão (bens indivisos) como a compropriedade, compropriedade das partes

comuns na propriedade horizontal, co-usufruto, e a penhora de quinhão sobre

universalidade de direito afetas a certas dívidas (patrimónios autónomos), como

herança e os bens comuns do casal. Em qualquer dos casos apenas pode ser

penhorada a quota-parte do executado, que é em si mesma uma realidade ou quid de

natureza jurídica, nos termos do artigo 743.º, n.º1 CPC. Não se penhora a coisa em

si, sua fração especificada ou bens que a compõem. Nesse sentido, o Ac. STJ 27

outubro 1998 declarou que o direito à meação da herança não está materializado

sobre o bem X ou o bem Y, ainda que se saiba que tais bens integram o património

indiviso. De contrário, estar-se-ia a penhorar um bem de um terceiro (artigo 735.º,

n.º2 CPC), o qual poderia embargar de terceiro. Repare-se, assim, em como a

diversidade de objetos de penhora determina uma diversidade de procedimento de

efetivação: a penhora de imóveis tem por objeto direitos reais de gozo em titularidade

singular e por objeto da apreensão o imóvel em si mesmo; mas se esse imóvel passar

a ter dois proprietários já o objeto da penhora é a quota-parte do consorte executado,

objeto da apreensão improprio sensu. Por isso, como o executado não tem direito a

uma quota-parte de determinado bem da herança, não tem também direito aos

concretos frutos produzidos por aquele bem, pelo que a penhora do direito à herança

não os pode abranger como decorreria do artigo 758.º, n.º1 CPC.

2. Procedimento: o artigo 781.º CPC estabelece as especialidades do procedimento da

penhora que tenha por objeto uma parte, quota ou quinhão em bens indivisos não

sujeitos a registo e em patrimónios autónomos. A penhora efetiva-se unicamente –

expressão do legislador no n.º1 do artigo – por notificação do agente de execução

aos contitulares e ao administrador dos bens, caso exista. Estes bens, como a quota-

parte do executado, poderão ter sido identificados pelo exequente no requerimento

executivo, nos termos do artigo 724.º, n.º2 CPC. A penhora tem-se, então, por

realizada desde a data da primeira notificação, segundo o artigo 781.º, n.º1, in fine

CPC, procurando-se assegurar a produção dos efeitos da penhora tão cedo quanto

possível. Os notificados podem fazer as declarações que acharem por bem quanto

ao direito do executado – 1.ª parte do n.º2 do artigo 781.º CPC. Nomeadamente,

poderão contestar a existência do direito do executado e, em geral, a existência e

características da situação de indivisão, em termos semelhantes aos do terceiro

devedor na penhora de créditos, para cujo artigo 775.º CPC remete o n.º3 do artigo

781.º CPC. Tal implica o funcionamento do regime das garantias na citação e da

cominação pela não oposição, previsto no artigo 773.º, n.º1 a 4 CPC. Por seu turno,

a penhora de parte, quota ou quinhão em bem indiviso, móvel ou imóvel, sujeito a

registo faz-se segundo o sistema do artigo 755.º CPC, aplicável aos móveis sujeitos a

registo (artigo 768.º, n.º1 CPC) e ao nosso caso da penhora de direitos, por força do

artigo 783.º CPC. Realizada a penhora por meio do registo serão dela notificados

tanto o administrador e contitulares ou a comunicação de registo, como impõe o

artigo 753.º, n.º2 CPC. Essa notificação já não integra os atos constitutivos da

penhora, ao contrário da notificação prevista no n.º1 do artigo 781.º CPC: todavia,

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não pode deixar de ser feita, não para que esses terceiros possam confirmar a

titularidade do bem – como sucederia se fosse um mero bem móvel não sujeito a

registo – mas por razões diferentes. A saber: a notificação do administrador impõe-

se para este conhecer ou e se pronunciar sobre quem fica como depositário; a

notificação dos contitulares permite, mesmo em sede de bens sujeitos a registo, o

exercício da faculdade de autorizar que a venda tenha por objeto todo o património

ou a totalidade do bem, ao abrigo do n.º2 do artigo 781.º CPC.

3. Venda conjunta: novidade absoluta de 2003 foi a criação de mecanismos que

facilitam a venda da totalidade do património ou do bem em comunhão, e que

constam dos artigos 781.º, n.º3 e 2, 2.ª parte, 743.º, n.º2 e 752.º, n.º2 CPC. Estes

mecanismos valem para qualquer bem em comunhão como resulta da indistinção

literal (bem indiviso), seja no artigo 743.º, n.º2, seja no artigo 752.º, n.º2 CPC, pese

embora a aparente restrição ao locus normativo da penhora sobre indivisos não

sujeitos a registo. O legislador pretendeu que sempre que possível não fosse levada à

venda executiva apenas a quota, mas também a totalidade do bem. Mas pode

perguntar-se se, inversamente, após a penhora de quota ou quinhão poderá ser posto

termo à indivisão, máxime, por ação de divisão de coisa comum ou por partilha?

a. Nesse caso, a penhora da quota ou quinhão convertia-se em penhora

dos bens concretos que coubessem ao executado.

b. Ao lado da doutrina que admite essa conversão, contra estiveram, em

diferente medida, Anselmo de Castro, Vaz Serra e Lebre de Freitas.

i. Lebre de Freitas, em particular, distingue se o executado interveio

ou não (independentemente da posição processual):

1. Se sim, o ato seria ineficaz ex vi artigo 819.º CC;

2. Se não interveio o ato seria eficaz. Neste caso, justificar-se-ia

que o exequente e reclamantes fossem citados para a partilha

ao abrigo do artigo 1406.º, n.º1, alínea c) CC e, em qualquer

caso, o recurso à ação de nulidade por simulação e à

impugnação pauliana.

c. A nossa posição é a seguinte: sendo a divisão da coisa comum ou partilha

pedida pelo executado decorrerá do artigo 819.º CC a ineficácia da divisão ou

partilha: a extinção da quota ou quinhão ainda que por novos bens, é um ato

extintivo da posição real inicial, logo está-lhe vedado. Sendo pedida pelos

demais contitulares dir-se-ia ser oponível, já que literalmente o artigo 820.º,

2.ª parte CC (ineficácia de extinção do crédito pelo executado ou pelo terceiro

devedor) apenas se aplica aos créditos. Mas essa é uma resposta formal, pois

toleraria a fraude entre executados e contitulares. Por isso, o preceito também

se lhes aplica, sendo ineficazes os atos dispositivos dos terceiros contitulares.

Direitos reais de gozo sobrepostos: falamos agora da penhora de direitos reais de gozo

em sobreposição e que sejam de titularidade singular. Importa distinguir se o objeto da

execução é o direito maior ou se é o direito menor:

1. Penhora de direito onerado: se o objeto da penhora for o direito onerado, o seu

titular (executado) tem gozo partilhado da coisa e uma pose não exclusiva e não

efetiva. Nestes casos, a coisa não pode ser apreendida segundo o regime da penhora

de imóveis ou móveis, pois tal implicaria retirar o gozo da coisa ao terceiro titular do

direito real onerador. A solução reside no n.º5 do artigo 781.º CPC: nele se manda

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aplicar à penhora do direito real de habitação periódica e dos outros direitos reais

cujo objeto não deva ser apreendido máxime, nua propriedade, propriedade do

fundeiro) o disposto nos números anteriores, relativos à penhora de parte, quota ou

quinhão em bens indivisos e em patrimónios autónomos. Esta remissão tem várias

implicações:

a. A remissão significa, antes de mais, que nos termos do n.º1 do artigo

718.º CPC, devem ser notificados os terceiros titulares dos outros

direitos sobrepostos e que gozam da coisa – os demais beneficiários do

time sharing, o usufrutuário e o superficiário –, com a advertência de que o

direito penhorado fica à ordem do agente de execução desde a data da

primeira notificação.

b. Ela significa ainda que os notificados podem fazer as declarações que

acharem por bem quanto ao direito do executado – 1.ª parte do n.º1 do

artigo 781.º CPC – e, em especial, contestar a sua existência, em termos

iguais aos do terceiro devedor na penhora de créditos para cujo artigo

775.º CPC remete o n.º3 do artigo 781.º CPC. Há lugar a registo, nos termos

do artigo 755.º CPC (artigo 783.º CPC), constitutivo da penhora

conjuntamente com a notificação aos consortes.

c. Por fim, a remissão significa ainda algo importante: poder ser aplicado

a estes direitos reais singulares sem posse exclusiva o mecanismo de

venda da totalidade dos direitos sobrepostos, previsto no artigo 781.º,

n.º4 e 2, 2.ª parte CPC, bem como o regime dos artigos 743.º, n.º2 e 752.º,

n.º2 CPC.

2. Penhora do direito onerador: já se o objeto da penhora for o direito onerador, i.e.,

o direito real pelo qual a coisa está a ser efetivamente gozada – o usufruto, a superfície

ou qualquer outro direito real menor – segue-se o regime da penhora de imóveis ou

de móveis, sendo o caso. A coisa corpórea pode, por conseguinte, ser apreendida já

que o gozo do terceiro não se traduza em posse efetiva. Contudo, esses casos,

também devem ser notificados os terceiros titulares de direitos reais, como o

proprietário de raiz ou o fundeiro.

Direitos e expectativas de aquisição:

1. Objeto: o artigo 778.º CPC introduzido pela Reforma do Processo Civil de

1995/1996 visou adequar o regime dos atos de penhora à nova realidade económico-

social da diminuição da importância do direito de propriedade e à substituição deste

por direitos de gozo de bens de terceiro, com possibilidade de futura aquisição. O

objeto desta penhora são, prima facie, situações jurídicas ativas que, afetando em

termos reais um bem, permitem que o sujeito executado possa, no futuro, adquiri-lo

para si: os direitos e expectativas de aquisição. É que, contemporaneamente, a

titularidade desse bem ainda permanece na esfera de terceiro e, sendo anterior à

penhora, não caducou, graças ao artigo 824.º, n.º2 CC a contrario. Estas situações

jurídicas reais têm por fonte, entre outros:

a. Contratos reais quoad effectum sujeitos a condição (artigo 274.º, n.º1

CC) ou a reserva, como a compra com reserva de propriedade (artigo 409.º

CC);

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b. Contratos preparatórios de aquisição, como a promessa com eficácia real

(artigo 413.º, n.º1 CC);

c. Contratos que dão a opção de aquisição, como o pacto de preferência

com eficácia real (artigo 421.º CC);

d. Contratos que, concomitantemente com faculdades de gozo, dão a

opção de aquisição do bem, como o leasing e o aluguer de longa duração;

e. A verificação dos pressupostos de facto – o corpus – quanto à aquisição

por achamento (artigo 1323.º, n.º1 e 2 CC), por acessão (artigo 1341.º, n.º2

CC) ou por prolongamento de edifício em parcela de terreno alheia

(artigo 1343.º, n.º1 CC);

f. O fideicomisso (artigo 2286.º CC).

Nuns casos, encontraremos verdadeiros direitos reais de aquisição; noutros casos,

simplesmente expectativas. Todavia, o objeto desta penhora é mais amplo, pois além

do direito ou expectativas de aquisição, i.e., o conteúdo real, o que penhorado é a

posição contratual do executado, logo, também o conteúdo obrigacional. Só este

entendimento permite compreender que, mantendo-se a penhora da expectativa ou

do direito de aquisição, o que é levado à venda executiva, e é adquirido pelo terceiro,

seja a posição contratual do executado, deixando este de ser parte no contrato.

Excluem-se do âmbito deste artigo os direitos ou expectativas de aquisição de

natureza obrigacional, os quais são penhoráveis nos termos gerais da penhora e

créditos (artigos 773.º e seguintes CPC). E tampouco cabem aqui os direitos e

expectativas de aquisição pelo executado que não sejam sobre bens determinados,

conforme a letra do n.º1 do artigo 778.º CPC. Finalmente, não constitui expectativa

de aquisição o direito não constante de título formal – máxime, o direito de

propriedade – e cujo reconhecimento o executado esteja a pedir em ação que para o

efeito intentou, v.g., com fundamento em usucapião. Isto porque para o executado

já se trata, efetivamente, de um direito atual, embora judicialmente litigioso.

2. Reservas a favor do exequente: é ponto controverso saber se pode ser objeto de

penhora o bem do próprio exequente mas dado em reserva de propriedade ao

executado. Do facto do exequente haver indicado à penhora o veículo automóvel

sobre cujo direito tinha reserva, não resulta que a ela tenha renunciado tácita e

eficazmente. Como bem declara o Ac. RL 12 fevereiro 2008 não faz sentido admitir

a renúncia do exequente à reserva de propriedade, uma vez que não está na

disponibilidade deste a unilateral e arbitrária alteração dos termos contratuais que

firmou aquando da celebração do contrato de compra e venda. E também não há

razão para suspender o procedimento de penhora, ao abrigo do artigo 119.º, n.º1

CRPr, uma vez que não existem quaisquer dúvidas quanto à titularidade do bem

penhorado – não pertence, certamente, ao executado. Portanto, o agente de execução

não deveria, pura e simplesmente, fazer a penhora até que se mostre comprovado o

cancelamento desse registo. Todavia, algumas decisões têm admitido a penhora de

bens registado em nome do exequente, embora provisória por natureza (artigo 92.º,

n.º2, alínea a) CRPr). No entanto, como se fixou no Ac. STJ (uniformização de

jurisprudência) 9 outubro 2008, após essa penhora a execução não pode prosseguir

para as fases de concurso de credores e da venda, sem que este (o exequente)

promova e comprove a inscrição, no registo automóvel, da extinção da referida

reserva. Em suma: a execução, quanto a esse bem, terá de ser suspensa; eliminada a

reserva, e só depois prossegue também quanto ao mesmo. É um acórdão paradoxal

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pois apesar de, e bem, pugnar pela inexistência de renúncia pela mera indicação à

penhora e, em consequência, reconhecer a ilegalidade de uma tal penhora opta, não

pelo seu levantamento, mas pela sua permanência. No entanto, trata-se de uma

limitação querida pelo próprio exequente.

3. Procedimento; natureza jurídica da apreensão: a penhora de direitos ou

expectativas de aquisição coloca um problema: é que a expectativa incide sobre uma

coisa que, por sua vez, é propriedade de um terceiro, contraparte no contrato. Como

fazer a penhora sem se prejudicar o direito de propriedade do terceiro? Neste sentido,

manda o final do n.º1 do artigo 778.º CPC que a efetivação desta penhora se faça nos

termos da penhora de créditos. Isto significa que a penhora é feita somente por

notificação à contraparte reservatária no contrato, realizada pelo agente de execução,

de que a posição contratual do executado, que lhe permitirá adquirir o direito de

propriedade ou outro, fica à sua ordem (artigo 773.º CPC). Significa também que

poderá haver alguma controvérsia sobre a existência das obrigações do alienante e

sobre as suas características (artigos 775.º e 776.º CPC). Se a coisa a adquirir estiver

já na posse ou detenção do devedor que espera vir a adquiri-la, deverá proceder-se

também à sua apreensão nos termos do regime da penhora de imóveis ou de móveis,

consoante os casos (artigo 778.º, n.º2 CPC). Portanto, terá de ser designado um

depositário, conforme o artigo 756.º CPC ex vi artigo 772.º CPC. Mas tem-se

discutido a natureza desta apreensão ou apossamento pelo tribunal ou agente de

execução:

a. Remédio Marques nega que haja aqui uma penhora, pois o bem apreendido

é de terceiro; por isso, entende que se trata de uma apreensão de

acautelamento do efeito útil da eventual e futura aquisição do bem, após a

conversão da penhora, nos termos do n.º3 do artigo 778.º CPC: acautelar a

perda, o perecimento ou o extravio da coisa.

b. Temos outra opinião: se o objeto de qualquer penhora é uma situação

jurídica ativa do executado, máxime, um direito subjetivo, já o objeto dos

concretos atos de apreensão são os bens respetivos. É o bem que fica sujeito

à atuação do depositário, à ordem do agente de execução, para efeitos de

conservação e administração ou, sendo móveis, para evitar o seu descaminho,

mas é o respetivo direito que irá ser alienado a final, após a penhora. Isto não

muda nada na penhora de expectativas ou direitos de aquisição, sendo certo

que a posição do terceiro alienante, ainda que comporte posse, não é tocada,

pois o que se penhora é a situação jurídica do executado, e não a propriedade

daquele. Sucede que o legislador evitou, como regra geral, a solução da

apreensão do bem, porque ela iria afetar a atuação de um terceiro (no caso, o

proprietário reservante) num quadro em que a aquisição do direito pelo

executado é uma eventualidade, mas não uma certeza. Daí que a penhora ser

feita por notificação, nos termos do artigo 773.º, n.º1 CPC ex vi artigo 778.º,

n.º1 CPC. É, afinal, uma solução em tudo idêntica ao regime da penhora de

direitos reais não suscetíveis de apreensão (artigo 781.º, n.º5 CPC), em que a

penhora se faz por notificação, sem apreensão, porque a coisa está a ser usada

por um terceiro. A diferença está em que, no caso da penhora de expectativa

ou direito real de aquisição, a coisa pode mudar, com o tempo, de mãos.

Todavia, se a coisa já está na posse do executado, há que evitar o perigo de

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desgoverno e descaminho: por isso o n.º3 do artigo 778.º CPC remete para o

regime da apreensão própria da penhora de imóveis e de móveis, e impõe a

constituição de um depositário. Mas esta apreensão não é o ato constitutivo

de penhora, mas um ato de execução da penhora.

Uma vez realizada, deverá a penhora ser registada, caso se esteja perante um direito

real de aquisição sobre coisa imóvel ou coisa móvel sujeita a registo, nos termos dos

artigo 755.º e 768.º, ex vi artigo 783.º CPC. A lei continua a ser omissa quanto a esta

matéria, mas não pode deixar de ser assim. Efetivamente, no direito real de aquisição,

importa considerar a existência de uma relação entre o executado e o sujeito alienante,

por um lado, e a sua oponibilidade erga omnes, traduzida na necessidade de os outros

sujeitos da ordem jurídica respeitarem este direito, por outro. A primeira é acautelada

através da notificação à contraparte, nos termos da penhora de créditos, como manda

o n.º1 do artigo 778.º CPC; a segunda leva à necessidade de registo.

4. Vicissitudes posteriores à penhora:

a. Conversão da expectativa em direitos; convolação do objeto da

penhora: tendo em conta as vicissitudes que a expectativa ou direito de

aquisição venham a conhecer, deve distinguir-se se, após a efetivação da

penhora, ocorreu uma verificação das condições legais ou contratuais para a

aquisição ou, pelo contrário, alguma causa de extinção da posição jurídica,

máxime, resolução por incumprimento. Na hipótese de verificação das

condições legais ou contratuais para a aquisição, a aquisição do bem pode ser

um efeito legal ou convencional automático mas também pode ser

consequência de um ato voluntário do executado ou do adquirente seja pela

vida extrajudicial, seja por via judicial. A coisa pode, então, em função do

momento de ocorrência do facto jurídico, ser adquirida pelo executado antes

da venda executiva ou pelo adquirente executivo já depois da venda.

i. Se a aquisição da propriedade for antes da venda executiva: o

executado precisará de autorização do agente de execução para o

exercício do poder de aquisição; embora não se trate de ato

dispositivo, i.e., de extinção de uma posição patrimonial para efeitos

dos artigos 819.º ou 820.º CC, todavia, a expectativa penhorada ficou

à ordem do agente de execução, nos termos do artigo 773.º, n.º1, in

fine CPC. No caso, esta apreensão implica que o exercício dos poderes

incluídos na posição penhorada seja autorizada previamente. Mas

tem-se defendido que o próprio exequente pode sub-rogar-se ao

executado, em litisconsórcio com o executado, e promover a

aquisição, nos termos e momento contratualmente fixados, ao abrigo

do artigo 776.º, n.º6 CPC, enquanto ato indispensável à conservação

do direito de crédito penhorado. Feita a aquisição definitiva da coisa

antes da venda, estatui o n.º3 do artigo 778.º CPC, a conversão

automática da penhora: o objeto da penhora deixa de ser a posição

contratual e passa a incidir sobre o direito real adquirido, evitando-se

qualquer vazio por desaparecimento do objeto inicial da penhora.

Será esse o direito a ser levado à venda executiva. O agente de

execução deverá, então, efetivar a penhora correspondente de

imóveis (artigos 755.º e seguintes CPC) ou de móveis, eventualmente

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sujeitos a registo (artigos 764.º e seguintes e 768.º CPC,

respetivamente).

ii. Na hipótese de não verificação das condições legais ou

contratuais de aquisição antes da venda: a penhora mantém-se

como estava. Naturalmente que será levada à venda a posição

contratual e o inerente direito ou expectativa de aquisição. Ora, se

após a venda da expectativa, houver lugar a aquisição do bem, o

adquirente executivo fa-lo-á já no exercício da posição contratual

adquirida e não em sub-rogação do executado.

b. Extinção da penhora: finalmente, se tiver lugar a ocorrência de alguma

causa de extinção da posição jurídica, máxime, resolução por incumprimento

(mas, artigo 820.º CC) a penhora extingue-se pelo desaparecimento do seu

objeto. Podem, então, ser nomeados outros bens por insuficiência

superveniente dos bens penhorados (artigo 751.º, n.º4, alínea b) CPC).

D- Auto, notificação e vicissitudes

§50.º - Auto e notificação

Auto de penhora: concluídos os autos de penhora nos termos da lei – registo, apreensão

ou notificação – lavra o agente de execução um auto, como impõe o artigo 753.º, n.º1 CPC.

Trata-se do documento que certifica a realização do ato de penhora ou seja, o objeto, a data

e eventuais incidentes. E, por isso, será pelo auto que se poderá determinar o momento a

partir do qual se produzem os efeitos da penhora. Mas esses efeitos não são do auto de

penhora, mas do ato da penhora e têm a data do ato e não do auto. No entanto, em princípio,

as datas de um e outro coincidirão. O auto de penhora não tem, portanto, um valor

constitutivo, mas um valor enunciativo dos efeitos da penhora.

Notificação:

1. Executado: ao executado será dada judicialmente notícia da realização do ato de

penhora, por citação ou notificação. No Direito anterior à Reforma de 2003

estabelecia-se que do despacho que ordene a penhora, bem como a realização desta,

são notificados ao executado. Esta norma, em sede de penhora de coisas imóveis,

estendia-se às demais, graças a normas remissivas. A norma foi então suprimida sem

ter sido substituída por outra. Achavam-se, porém, referências soltas á notificação

do ato de penhora: uma referência expressa para efeitos do início do prazo para

oposição à penhora e outras referências implícitas na matéria relativa à citação e

notificação do executado. Passados 10 anos, na reforma de 2013, a matéria volta a

merecer tratamento autónomo no artigo 753.º, n.º2 e 4 CPC. Quanto ao momento,

resultava do regime que o executado seria notificado no próprio ato de penhora, se

estivesse presente, ou, não estando, em 5 dias a contar da última penhora. Na

execução com dispensa de citação prévia, era ao mesmo tempo, citado da causa. Com

a reforma de 2013, há uma importante modificação: se o executado não estiver

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presente no ato de penhora, deve ser notificado em 5 dias a contar do respetivo ato

(artigo 753.º, n.º4 CPC). A mudança é sensível: antes tinha o executado de esperar

pela ocorrência da última penhora para se poder defender do ataque aos seus bens.

Por outro lado, também na execução com citação prévia, permanece a solução da

simultânea citação para a execução e notificação do ato de penhora, agora em sede

de artigo 856.º, n.º1 CPC. Por via da notificação, o executado, nos termos do artigo

753.º, n.º2 e 3 CPC:

a. Fica advertido:

i. Da possibilidade de deduzir oposição, com os fundamentos previstos no artigo

784.º CPC; e

ii. Do prazo de que, para tal dispõe;

iii. Da obrigação de, no prazo da oposição, e sob pena de ser condenado como litigante

de má fé, indicar os direitos, ónus e encargos não registáveis que recaiam sobre o

bem penhorado, bem como os respetivos titulares ou beneficiários.

b. É informado do direito de substituição ou de prestação de caução

substitutiva, nas condições e nos termos do disposto na alínea a) do

n.º4 e 5 do artigo 751.º CPC;

c. Recebe cópia do auto de penhora.

A obrigação de indicação de direitos, ónus e encargos, a par da indagação que o

agente de execução deve fazer nos termos do artigo 747.º, n.º2 CPC, serve para dar

a conhecer as onerações não registadas, para que os respetivos titulares possam ser

citados para a reclamação de créditos.

2. Exequente: também o exequente deverá ser notificado do ato de penhora. O ato

interessa ao executado e ao exequente, por razões diversas. No caso do exequente,

apesar de ter direito a consultar o registo informático de execuções, a sua notificação

é condição indispensável para tomar conhecimento em tempo útil dos bens que

foram penhorados e para, em caso de discordância, poder reclamar do ato para o juiz.

Por isso, o exequente deverá ser sempre notificado em 5 dias a contar da penhora,

porque não há razão específica para o prazo ser diferente daquele que vale para o

executado.

3. Falta de notificação: a falta de notificação da penhora ao executado equivale à falta

de citação como decorre do n.º6 do artigo 786.º CPC e da jurisprudência. Invalidam-

se todos os atos posteriores à falta do ato, mas não pode deixar de se aplicar a ressalva

importante feita na 2.ª parte do mesmo número e à qual voltaremos adiante.

§51.º - Vicissitudes

Frustração (total e parcial) e renovação: o n.º1 do artigo 750.º CPC fixa prazo de três

meses, a contar da notificação feita pela secretaria ao agente de execução para o início das

diligências de penhora (artigo 748.º, n.º1 CPC), para serem encontrados bens penhoráveis.

Se não forem encontrados bens penhoráveis no prazo, o agente de execução notifica em

simultâneo:

1. O exequente para especificar quais os bens que pretende ver penhorados na

execução;

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2. O executado para indicar bens à penhora, com a cominação de que a omissão ou

falsa declaração importa a sua sujeição a sanção pecuniária compulsória, no montante

de 5% da dívida ao mês, com o limite mínimo global de 10UC, se ocorrer ulterior

renovação da instância executiva e aí se apurar a existência de bens penhoráveis.

Se nem o exequente nem o executado indicarem bens penhoráveis no prazo de 10 dias,

extingue-se sem mais a execução. Por outro lado, o artigo 797.º CPC manda aplicar esta

mesma solução decorridos três meses sobre o pagamento parcial da dívida sem que tenham

sido identificados outros bens penhoráveis. No entanto, ao abrigo do artigo 850.º, n.º5 CPC,

o exequente poderá requerer a renovação da instância quando indique, posteriormente, bens

penhoráveis aplicando-se, com as necessárias adaptações, o disposto no n.º4 do mesmo

artigo. Ora, esta possibilidade de renovação da lide, demonstra que não é exato ver nesta

frustração da penhora uma situação de inutilidade superveniente da lide, porquanto o direito

do autor à execução não se extinguiu e continua no mesmo ponto em que se estava

inicialmente: carente de tutela processual. Permanecerá sempre a expectativa de que o

executado possa vir a ter bens – e daí a possibilidade de renovação – e não a certeza de que

nunca os terá. Por isto, as custas, em caso de extinção por frustração, serão a cargo do

executado pois deu causa à execução, causa essa que subsiste, como o demonstra o título

executivo (artigo 527.º, n.º1 CPC). Portanto, não é correto invocar o artigo 536.º, n.º3, 2.ª

parte CPC (responsabilidade do requerido na inutilidade, por falta de bens) para que o

executado pague as custas.

Substituição e reforço:

1. A requerimento do executado: a penhora pode ser reforçada ou substituída pelo

agente de execução nos casos previstos no n.º4 do artigo 751.º CPC, a pedido ou

oficiosamente. Assim, o executado pode requerer-lhe, no prazo de oposição à

penhora – artigos 785.º, n.º1 e 856.º, n.º1 CPC , nas formas ordinária e sumária,

respetivamente –, a substituição dos bens penhorados por outros bens verificados

dois pressupostos:

a. Que os novos bens assegurem os fins da execução;

b. Que o exequente a isso não se oponha fundadamente.

Trata-se da generalização de uma solução que já existir na pretérita forma sumária da

execução para pagamento de quantia certa anterior à reforma de 2003; portanto,

apenas em face de uma penhora anterior à citação. Caberá ao agente de execução

aquilatar a verificação dos pressupostos da substituição, salvo se o executado deduzir

também oposição à penhora. Aí determina o n.º5 do artigo 751.º CPC que o agente

de execução remeta o requerimento e a oposição ao juiz, para decisão. Sendo deferido

o requerimento, a penhora anterior, sem prejuízo do disposto no Código anterior, só

será levantada depois da conclusão da nova penhora – artigo 751.º, n.º6 CPC. Em

alternativa, o executado que se haja oposto à execução pode optar por conseguir pura

e simplesmente o termo da penhora, se requerer e prestar caução idónea, segundo o

n.º7 do artigo 745.º CPC.

2. Oficiosamente ou a requerimento do exequente: por seu turno, oficiosamente

ou mesmo a requerimento do exequente, pode ter lugar a penhora de novos bens,

com manutenção ou com substituição dos bens já penhorados, conforme se entender

melhor. A saber:

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a. Insuficiência manifesta, inicial ou superveniente, dos bens

penhorados;

b. Recebimento de embargos de terceiro, nos termos do artigo 347.º

CPCM

c. Suspensão da execução por efeito da oposição à execução, nos termos

do artigo 733.º, n.º1 CPC;

d. Bens penhorados não serem livres e desembaraçados e o executado

tenha outros que o sejam;

e. Desistência da penhora por verificação da existência de penhora

anterior (artigo 794.º, n.º3 CPC);

f. Invocação do benefício da execução prévia pelo devedor subsidiário

que não haja sido citado antes da penhora (artigo 745.º, n.º2 CPC).

O agente deverá sempre informar previamente o exequente, por força do artigo 754.º,

n.º1, alínea a) CPC, quando não seja a requerer o reforço ou a substituição. Mas não

nos parece que haja um mecanismo de devolução ao exequente do direito de

individualizar bens penhoráveis. Em caso de substituição de bens por outros, a

penhora anterior, e sem prejuízo do disposto no n.º4 do artigo 745.º CPC, só será

levantada depois da conclusão da nova penhora.

Redução: já sabemos que a penhora deve limitar-se aos bens necessários ao pagamento da

dívida exequenda e das despesas previsíveis da execução, nos termos do artigo 735.º, n.º3

CPC. Por isso, se suceder um excesso da penhora superveniente o executado tem direito a

requerer a redução da penhora, em requerimento avulso. Também tivemos ensejo de analisar

o regime especial de redução de penhora de rendimentos pessoais, artigo 738.º CPC.

Sub-rogação objetiva superveniente (artigo 823.º CC): o artigo 823.º CC dita que se

a coisa penhorada se perder, for expropriada ou sofrer diminuição de valor, e, em qualquer

dos casos, houver lugar a indemnização de terceiro, o exequente conserva sobre os créditos

respetivos, ou sobre as quantias pagas a título de indemnização, o direito que tinha sobre a

coisa. Castro

1. Castro Mendes via aqui uma extensão da penhora.

2. Melhor será considerar como um caso de sub-rogação superveniente da penhora

dado o objeto inicial do ato processual se perder. Esta opera, como ensinava

Anselmo de Castro, ipso iure sem conversão em penhora de créditos e sem notificação

do terceiro devedor? Discordamos. Há que fazer uso do regime comum da penhora

de créditos, dos artigos 773.º e seguintes CPC, de modo a confirmar tanto o sujeito

como o objeto desses créditos.

Suspensão e extinção:

1. Suspensão: uma penhora já consumada pode ser suspensa, ou seja, levantada

provisoriamente, possibilitando-se a restituição provisória da posse. Isso sucede

apenas como efeito dos embargos de terceiros em que o tribunal determine

restituição provisória da posse sobre a coisa penhorada (artigo 347.º CPC). Por isso,

é ato inútil o executado requerer a suspensão da entrega do bem fora dos embargos

de terceiro. No entanto, trata-se de um levantamento parcial, já que se mantêm tanto

o efeito da ineficácia jurídica dos atos dispositivos ou oneradores, ex vi artigo 819.º

CC, como o da preferência do exequente, ao abrigo do artigo 822.º, n.º1 CC. Mas já

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não há levantamento provisório se apenas a marcha da instância executiva se

suspender. É o que sucede quando a oposição à execução tenha efeito suspensivo

(artigo 733.º, n.º1 CPC), quando o executado preste caução em oposição à penhora

na execução sem dispensa de citação prévia (artigo 785.º, n.º3 CPC) e ainda por

determinação judicial no despacho de recebimento de embargos de terceiro (artigo

347.º CPC). Nesse caso, a penhora mantém-se e, sendo o caso, a eventual reclamação

e atos de venda já consumados, mas aquele bem não é objeto de atos processuais

futuros.

2. Extinção: a penhora pode extinguir-se como efeito de:

a. Omissão processual prolongada: está regulada no artigo 763.º CPC.

Embora em sede de penhora de coisas imóveis é uma norma geral da penhora,

por força dos artigos 772.º e 783.º CPC. No respetivo n.º1 determina-se que

o executado pode requerer ao agente de execução o levantamento da penhora

se, por ato ou omissão que não seja da sua responsabilidade, não forem

efetuadas quaisquer diligências para a realização do pagamento efetivo do

crédito nos seis meses anteriores ao requerimento. A penhora é apenas

levantada findo o prazo de reclamação da decisão do agente de execução ou

transitada em julgado a decisão judicial que a determinou, respetivamente.

Levantada a penhora são imputadas ao exequente as custas a que deu causa,

não sendo necessário que o executado pedisse a condenação do exequente

no pagamento respetivo. No entanto, esta solução parece ter sido absorvida

pelo n.º1 do artigo 3.º Decreto-Lei n.º4/2013, 11 janeiro, quando a omissão

processual seja de imputar ao exequente. Este estatui que os processos

executivos cíveis para pagamento de quantia certa que se encontrem a

aguardar impulso processual do exequente há mais de seis meses extinguem-

se.

b. Desistência: a lei prevê que o exequente pode desistir da penhora no caso

do artigo 751.º, n.º4, alínea e) (pluralidade de penhoras) e 775.º, n.º1, in fine

CPC (negação do crédito pelo terceiro devedor). Mais genericamente, o

princípio do dispositivo dita que o exequente possa desistir da penhora a todo

o tempo, parecendo ser livre por equiparação com a desistência do pedido

(artigo 786.º, n.º2, in fine CPC. Se estiver pendente impugnação da penhora,

não parece, dada a sua acessoriedade funcional, corresponder a um valor

autónomo que justifique a necessidade de consentimento do executado ou

mesmo do terceiro.

c. Impugnação procedente de penhora: a procedência da oposição à

penhora (artigo 785.º, n.º6 CPC), do proteste do ato da penhora (artigo 764.º,

n.º3 CPC), dos embargos de terceiro (artigo 342.º CPC) e da ação de

reivindicação (artigo 1311.º CC) determina o levantamento da penhora, i.e.,

a extinção da penhora, mas não a extinção da execução.

d. Venda executiva do bem: é imposta pelo artigo 824.º, n.º2 CC, o qual vale

para a adjudicação e remissão de bens ex vi artigo 826.º CC.

e. Extinção da execução: por causa comum ou específica, extingue-se sempre

a penhora, salvo se houver uma consignação de rendimentos, por força do

artigo 805.º, n.º1 CPC.

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f. Situações avulsas: como as do artigo 740.º, n.º2 CPC (atribuição do bem

penhorado ao cônjuge do executado por efeito de partilha).

3. Substituição processual por credor reclamante: acabámos de ver que o n.º1 do

artigo 763.º CPC se determina que o executado pode requerer ao agente de execução

o levantamento da penhora se, por ato ou omissão que não seja da sua

responsabilidade, não forem efetuadas quaisquer diligências para a realização do

pagamento efetivo do crédito nos seus meses anteriores ao requerimento. Ora, com

o fito de tutelar também a posição do credor reclamante de obrigação vencida, os

n.º5 e 6 do artigo 763.º CPC permitem que este possa substituir-se ao exequente na

prática do ato que tenha sido negligenciado pelo exequente.

a. Os pressupostos positivos dessa substituição processual são:

i. Decurso de três meses pelo executado;

ii. O seu crédito estar vencido;

iii. Ter sido reclamado para ser pago pelo produto da venda dos bens penhorados.

b. Os pressupostos negativos são:

i. Não ter sido requerido o levantamento da penhora pelo executado, nos termos do

n.º1 do mesmo artigo. No entanto, como este apenas pode ser requerido

após seis meses, e como nessa eventualidade opera, como se referiu,

o n.º1 do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º4/2013, 11 janeiro, o

pressuposto parece ter perdido cabimento.

Deferido o requerimento pelo agente de execução, dá-se uma substituição processual,

pois os atos serão imputados ao exequente. Vale, com as necessárias adaptações, o

n.º3 do artigo 850.º CPC: o requerimento faz prosseguir a execução, mas somente

quanto aos bens sobre que incida a garantia real pelo requerente, que assumirá a

posição de exequente. A substituição termina quando o exequente retomar a prática

eficaz dos atos executivos subsequentes.

E – Efeitos e natureza jurídica

§52.º - Funções da penhora. Indisponibilidade material absoluta

Generalidades; sub-funções: a penhora comporta múltiplos efeitos materiais e

processuais na esfera do executado, dos credores, do tribunal e de terceiros, como o cônjuge

do executado, por exemplo. No seu cerno, estes efeitos são explicados pela razão de ser da

penhora: acautelar o exercício do direito de execução sobre o património do devedor. No

nosso sistema processual, tal implica:

1. Assegurar a viabilidade da venda executiva dos direitos sujeitos à penhora

cumprindo uma sub-função conservatória: a função conservatória reporta-se ao

plano material e ao plano jurídico. Teixeira de Sousa fala, por isso, em conservação

material e conservação jurídica. É uma função que também se encontra no regime da

insolvência, com idêntica dupla expressão (artigos 36.º, alínea g) – conservação

material – e 81.º, n.º1 e 6 CIRE – conservação jurídica).

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a. No plano material: pretende-se que o bem, objeto do direito penhorado,

não seja desencaminhado ou diminuído no seu valor. Para isso, é feita a sua

apreensão improprio sensu, i.e., a transferência para o agente de execução dos

poderes de exercício material do direito, máxime, o uso, a fruição e

administração, consubstanciando o que Anselmo de Castro designava por

indisponibilidade material dos bens. Trata-se de uma indisponibilidade

tendencialmente absoluta, pois não admite exceções. Esta apreensão tanto

pode consistir na constituição de uma posse precária a favor do tribunal ou

agente de execução, quando se trate de bens corpóreos, como em colocar

sob a autoridade judicial o exercício do direito, quando se trate de bens

incorpóreos.

b. No plano jurídico: pretende-se que a faculdade de disposição do direito

penhorado que incide sobre o bem apreendido, e que o executado mantêm

na sua esfera jurídica, não possa ser exercida de modo a privar a venda do

seu objeto. Para tanto, opta a lei por cominar com ineficácia o exercício dessa

faculdade de disposição no artigo 819.º e 820.º CC, para os efeitos de crédito.

Trata-se aqui de uma indisponibilidade jurídica relativa: como bem

contrapunha Anselmo de Castro, têm-se os atos como válidos e eficazes em

todas as direções, menos em relação à execução, para a qual são havidos

como se não existissem.

2. Beneficiar o credor que promoveu a execução perante outros credores,

cumprindo uma subfunção de garantia: a função de garantia traduz-se em o

exequente adquirir pela penhora o direito de ser pago com preferência a qualquer

outro credor que não tenha garantia real anterior (artigo 822.º CC). É uma vantagem

limitada, é certo, mas pelo menos permitir graduar por critério temporal os créditos

exequendos não privilegiados.

Vamos, de seguida, ver cada um destes três efeitos.

Indisponibilidade material absoluta: inibição ou condicionamento dos

poderes de exercício material do direito:

1. Penhora de coisas corpóreas: vimos atrás que na penhora de direitos em

titularidade singular e posse exclusiva, i.e., de imóveis e os móveis, os bens são

apreendidos pelo agente de execução que os entrega a um depositário, quando este

seja outrem (artigo 757.º, 764.º, n.º1 e 768.º, n.º2 e 3 CPC). A apreensão tanto pode

resultar de tradição voluntária do executado ao depositário, como de uma ocupação

forçada por parte do agente de execução, caso aquele não colabore (artigo 757.º CPC).

Os poderes de uso, fruição e administração – necessariamente determinados pela

funcionalidade da execução – passam para a responsabilidade do agente de execução

a partir do momento da apreensão, e não antes. Quais são as consequências desta

apreensão no plano da posse?

a. Para Teixeira de Sousa: a penhora impõe ao executado um desdobramento

da posse sobre os seus bens: ele permanece possuidor em nome próprio nos

termos do seu direito de que ainda fica como titular, mas vê constituir-se

sobre eles uma posse que é exercida pelo depositário e que tem o conteúdo

que resulta dos poderes que são os concedidos a este último (artigos 760.º e

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772.º CPC). Mesmo quando o executado permanece depositário dos bens

penhorados (artigo 756.º, n.º1 CPC e 772.º CPC, a sua posse é exercida nessa

qualidade e não como titular de um direito real sobre eles.

b. Já para Lebre de Freitas: cessa a posse do executado e inicia-se uma nova

posse pelo tribunal: o depositário passa, em nome deste, a ter a posse do bem

penhorado.

c. No essencial, seguimos a posição de Teixeira de Sousa a qual apresenta

vários aspetos significativos no plano da dogmática dos direitos reais:

i. A posse do depositário é a posse que tem no Estado o seu titular; posse

necessariamente precária ou temporária. O depositário, máxime, o agente

de execução, ao apreender está a exercer poderes do Estado. Ou seja,

o Estado é possuidor em nome próprio e o depositário é detentor,

enquanto possuidor em nome do Estado (artigo 1253.º, alínea c) CC).

É isto o seu ius imperii.

ii. O executado não perde a sua posse civil. Justamente já Anselmo de Castro

defendera a permanência da posse, acompanhando a permanência da

titularidade do direito no executado, o que é incompatível como a

circunstância de ficar sem os poderes de gozo sobre a coisa. Mas

enquanto a posse do executado passa a mera posse civil, a posse do

Estado é a posse efetiva.

Por outras palavras, penhorada uma coisa corpórea não há nem uma transmissão de

posse a favor do Estado – como se entende quando se define a penhora como

desapossamento do exequente –, nem uma extinção da posse do executado

acompanhada de constituição de uma outra para o tribunal: sobre o bem passam a

incidir duas posses: a civil do executado e a efetiva do Estado. A permanência da

posse do lado do executado tem consequências práticas: não só o executado pode

usar de meios de defesa da posse, mesmo na pendência da penhora, como o tempo

que discorra entretanto conta para efeitos de usucapião. Por seu lado, a constituição

de posse efetiva a favor do Estado é acompanhada da transmissão da

responsabilidade pelo risco de perda ou deterioração do bem.

2. Penhora de direitos: na penhora de direitos não, por regra, há uma apreensão de

coisas corpóreas. Viu-se que é levada a cabo, por notificação ou por registo, ficando

o direito à ordem do tribunal (artigo 773.º, n.º1, in fine CPC). Ou seja: o devedor fica

a saber que só se desonera mediante o pagamento à penhora que o tribunal designar.

Fala-se aqui em apreensão simbólica, mas tal é inapropriado, pois não há um

condicionamento de credor (executado) ou de devedor (debitor debitoris) no plano

material. O que se altera são o recetor e o lugar do cumprimento da prestação: só

perante o Estado e nos termos do artigo 777.º CPC (ainda artigo 778.º, n.º1 CPC); já

não como estava contratado. Por outro lado, a essa transferência da legitimidade

passiva do cumprimento para o Estado, corresponde uma perda pelo executado

credor das faculdades de exigibilidade judicial ou extrajudicial autónoma da obrigação

perante o terceiro devedor. Efetivamente, já vimos que tanto os atos de conservação,

como quaisquer ações do executado contra o debitor debitoris carecerão, nos termos

do n.º6 do artigo 773.º CPC, de autorização prévia do juiz. Porém, a intensidade da

penhora de direitos pode ser maior em casos específicos:

a. Na penhora de estabelecimento comercial se este continuar a ser

explorado pelo executado fica sujeito à supervisão de um fiscal, nos

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termos do artigo 782.º, n.º2 CPC, ou mesmo à administração de um

terceiro. Desse modo os atos de administração não onerosos ou não

dispositivos, sujeitam-se aos interesses da penhora, seja o estabelecimento

administrado pelo executado ou por terceiro. Esses atos tanto podem ser

jurídicos, como a celebração de negócios jurídicos, como podem ser materiais.

Estamos, pois, em zona mista de indisponibilidade material e

indisponibilidade jurídica. O seu momento constitutivo é o da própria

penhora, máxime, a data do auto de arrolamento dos bens integrantes do

estabelecimento comercial (artigo 782.º, n.º1 CPC).

b. Em casos pontuais pode mesmo ter lugar apreensão de coisa corpórea

na penhora de direitos. Assim, o objeto da prestação, pecuniária ou de

entrega de coisa, entretanto vencida deve ser depositado em instituição de

crédito ou entregue ao agente de execução, consoante seja quantia pecuniária

ou outra coisa (artigo 777.º, n.º1 CPC). E também se observámos que na

penhora de expectativas também deve ser apreendida a coisa se já tiver

havido tradição para o executado (artigo 778.º, n.º2 CPC) e se, necessário,

adquirida ou exercida a preferência. Trata-se, pois, da mesma constituição de

posse precária, atrás referida.

Em conclusão: na penhora de direitos a transferência para o agente de execução dos

poderes de exercício material do direito, ocorre sobretudo no plano jurídico, tendo

por objeto:

a. Os termos do cumprimento;

b. A faculdade de exigibilidade da prestação;

c. A administração da exploração do estabelecimento.

Mais raramente se debate sobre o plano possessório por meio de apreensão do objeto

mediato da prestação.

§53.º - Indisponibilidade jurídica relativa: ineficácia relativa dos atos de

disposição ou de oneração

Introdução: a transferência dos poderes de exercício material do direito não impede que o

executado transmita a titularidade desse direito a terceiro, o extinga ou sobre ele constitua

oneração por direito menor. Potencialmente, esses atos tenderão a prejudicar a venda

executiva.

1. Escreve Teixeira de Sousa: a lei poderia ter optado, para cumprir a necessária

conservação jurídica do bem, por usar a solução que vigora na ação declarativa:

admitir a transmissão, por qualquer das partes, da coisa ou direito litigioso,

circunstância que opera uma transferência da legitimidade do transmitente ou

cedente – que passa a atuar como substituto processual do adquirente ou cessionário

(artigo 263.º, n.º1 CPC) – e permite a habilitação deste último na ação pendente

(artigos 263.º, n.º1 e 356.º CPC). Bem elucida Anselmo de Castro: transposto para

a execução um tal esquema significaria que o executado poderia, nomeadamente,

vender os bens penhorados e depois a execução seria oposta ao terceiro adquirente.

E, claramente a penhora ganharia, nesse quadro de solução – disposição cum omere –

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a natureza dum direito real. Naturalmente que em caso de intenção fraudulenta o

credor teria, em alternativa, e pese embora aquela oponibilidade, a ação de

impugnação pauliana, ao abrigo do artigo 610.º CC.

2. A solução teria inconvenientes, pensamos, de articulação, máxime, entre a

conveniência de conservar a coisa materialmente, e o interesse do terceiro. Além de

que tornaria mais complexa a legitimidade executiva passiva, alargando o campo do

atual artigo 54.º, n.º2 CPC. Por isso, a lei consagrou uma diferente via: a ineficácia

relativa dos atos de disposição e oneração do direito penhorado. Esta regra está

concretizada em dois preceitos:

a. Artigo 819.º CC: sem prejuízo das regras do registo, são inoponíveis em

relação à execução os atos de disposição, oneração ou arrendamento dos

bens penhorados;

b. Artigo 820.º CC: sendo penhorado algum crédito do devedor, a extinção

dele por causa dependente da vontade do executado ou do seu devedor,

verificada depois da penhora, é igualmente inoponível à execução.

Se o artigo 820.º CC vale para a penhora de créditos e direitos de estrutura relativa,

em geral, o artigo 819.º CC tem por âmbito a penhora de direitos reais,

independentemente da sua arrumação prática do Código – i.e., deve ser tratada como

penhora de imóveis, móveis, de direitos sobre bens indivisos, de direito real de

habitação periódica e ou de outros direitos reais cujo objeto não deva ser apreendido.

Também se lhe pode ainda juntar a penhora de outros direitos absolutos, como a

penhora do direito patrimonial de autor e a penhora dos direitos da propriedade

industrial.

Natureza jurídica: ineficácia: qual é a natureza jurídica desta inoponibilidade? Sem

prejuízo de maiores desenvolvimentos adiante, pode dizer-se, por ora, de que se trata de uma

ineficácia, como ensinavam Alberto dos Reis e Anselmo de Castro, e que acha lugar

paralelo no artigo 81.º, n.º6 CIRE. Não estamos perante uma invalidade: os atos são válidos,

o executado não ficou privado dos poderes de disposição, mas não produzem efeitos

enquanto estiverem os bens penhorados. Por isso, se a penhora for levantada os efeitos terão

lugar retroativamente à data do ato. O devedor executado pode, assim, livremente alienar os

bens penhorados, embora a execução prossiga como se esses bens pertencessem ao

executado. Todavia, desde a reforma de 2003 que a letra dos dois artigos alude a uma

inoponibilidade dos efeitos, retomando terminologia presente em Castro Mendes e Teixeira

de Sousa. Obviamente que esta é, ainda e sempre, aquela mesma ineficácia, ou seja, uma

exclusão legal de efeitos de um ato válido. É como se não tivesse havido qualquer disposição ou

oneração do bem ou direito penhorado ou não se tivesse verificado a extinção do crédito penhorado, escreve

Teixeira de Sousa.

Objeto:

1. Generalidades. Direitos reais e outros direitos absolutos: esta ineficácia é

objetivamente restrita: abate-se sobre os atos de disposição, oneração ou

arrendamento dos bens penhorados; não sobre outros. Em concreto, os atos

ineficazes podem ser, quanto à penhora de direitos reais e outros direitos absolutos:

a. Atos voluntários:

i. Negociais:

1. A venda;

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2. A constituição da propriedade horizontal;

3. A convenção antenupcial fixadora de regime de comunhão geral de bens

ou de sujeição de algum bem à comunhão (artigo 1698.º CC);

4. A cedência de estabelecimento comercial;

5. A cessão de bens aos credores (artigo 834.º, n.º1 CC);

ii. Não negociais: a posse de terceiro, ainda que de boa fé.

b. Atos processuais:

i. Transação judicial: desistência ou confissão do pedido que tenha por

objeto os bens e direitos penhorados

ii. Sentença judicial:

1. Partilha da herança;

2. Divisão de coisa comum;

3. Ações de nulidade e de anulação do contrato; e

4. Em geral, quaisquer sentenças judiciais que, em substituição da vontade

dos proprietários de bens penhorados em execução, determinem disposição

ou oneração desses bens.

Desde 2003 que se inclui expressamente no objeto da ineficácia o arrendamento

celebrado depois da penhora, pondo um ponto final na incerteza entre os que

defendiam a ineficácia e os que sustentavam a perfeição do ato. Justamente, a contrario

do disposto no artigo 819.º CC, os atos de administração ordinária ou conservação

são plenamente eficazes quando se contenham nas competências de depositário

judicial ou autorizados.

2. Créditos e outros direitos relativos: quanto à penhora de direitos de crédito e

outros direitos relativos são ineficazes os factos extintivos do crédito por causa

dependente da vontade do executado ou do seu devedor, verificada depois da

penhora (artigo 820.º CC), como:

a. Extinção da obrigação:

i. Negocial: declaração de compensação, de remissão de dívida, renúncia,

novação ou extinção do arrendamento comercial penhorado;

ii. Processual: transação, desistência ou confissão do pedido, ações com

efeito sobre o crédito;

b. Exclusão do património do executado: como por cessão do crédito ou

sub-rogação real.

Ao contrário, sendo a causa de extinção anterior à penhora, não é aplicável a

disciplina do artigo 820.º CC, não havendo qualquer obstáculo a oponibilidade ao

exequente da extinção do direito penhorado (Ac. STJ 24 abril 2991). Já quanto aos

factos modificativos ou impeditivos, dir-se-ia, numa leitura literal, que poderão ser

opostos, ainda que posteriores à penhora. Naturalmente que se impõe uma

interpretação conforma à ratio do preceito. Assim, é certo que os factos modificativos

não extinguem o crédito; todavia, não são de admitir factos que tornem o crédito

previsivelmente não exigível em tempo da própria execução, tolhendo o interesse do

exequente. Já, por seu lado, os factos impeditivos se, em regra, serão anteriores à

penhora, porquanto originários, bem pode ocorrer um facto impeditivo após a

penhora. Ora, embora sejam modos de extinção do crédito, improprio sensu, porém

não estão dependentes da vontade seja do executado, seja do seu devedor, podendo

ser oponíveis. Já as omissões do executado no exercício do seu direito ou das

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faculdades que o integram não são ineficazes desde que não tenham efeito extintivo

ou modificativo. Não é ineficaz, por exemplo, a não aquisição da coisa locada

financeiramente e tampouco a não realização da contraprestação que provoque a

exigibilidade da obrigação perante o terceiro. Já a omissão, pelo executado, de ato de

cuja prática que dependesse a não verificação de condição resolutiva parece não

produzir o dito efeito extintivo. Todavia, o exequente pode sub-rogar-se ao

executado, em litisconsórcio com o executado, como se viu em sede geral de artigo

776.º, n.º2 CPC e mesmo na penhora de expectativas. Tampouco são ineficazes os

atos do executado relativos ao crédito e que sejam, por sua vez, fonte de meros

direitos de crédito. NA verdade, eles não têm por objeto o direito penhorado, não

transmitindo bem onerado.

Proporcionalidade:

1. Sentido: o princípio da proporcionalidade da penhora, já não quanto ao seu objeto,

mas quanto aos seus efeitos, impõe uma interpretação restritiva da regra da

indisponibilidade dos atos dispositivos ou oneradores do direito penhorado. No

dizer do Ac. RP 8 abril 1997, o exequente não perde, de todo, os poderes de

disposição, mas, na pendência da penhora e por seu efeito, esses poderes ficam

limitados, na medida em que haja colisão com o interesse do exequente, ou seja,

quanto aos efeitos incompatíveis com a realização do interesse do exequente (aqui,

nas palavras de Teixeira de Sousa), e dos credores reclamantes, acrescentamos. Por

isso, segundo Teixeira de Sousa, a indisponibilidade não se estende a outros efeitos

que não contendem com a satisfação deste interesse. E, portanto, não apenas o ato

dispositivo é válido, como se viu atrás, como chega a ser parcialmente eficaz. A

concretização deste enunciado vai determinar o caráter relativo da ineficácia, tanto

no planto objetivo como no plano subjetivo.

2. Relatividade subjetiva passiva: a ineficácia é relativa enquanto subjetivamente

envolvendo apenas as esferas jurídicas afetadas pelo efeito útil da execução. Assim,

no plano da destinação dos efeitos do ato dispositivo ou onerador ao dizer-se que

são inoponíveis quer dizer-se que são ineficazes posicionalmente: perante a execução

(artigos 819.º e 820.º CC). Ou seja, perante quem exerce o direito à execução –

exequente e dos credores reclamantes com créditos vencidos e graduados (artigo

850.º, n.º2 CPC) – e perante o terceiro adquirente do bem penhorado em realização

desse direito. Como bem sintetizada Anselmo de Castro, têm-se os atos como válidos

e eficazes em todas as direções, menos em relação à execução, para a qual são havidos

como se não existissem. Portanto, os atos produzirão efeitos perante os demais

terceiros. Estes irão sujeitar-se às obrigações que em face deles sejam possíveis.

3. Relatividade subjetiva ativa: por seu turno, no plano da imputação do ato, são

inoponíveis os atos de disposição, oneração e arrendamento voluntários do

executado. E são-no mesmo que quem surja a invocar direitos fundados nesses atos

sejam os terceiros sucessores e transmissários inter vivos do direito. Ao contrário,

são, por regra, oponíveis à execução os direitos de terceiro desde que constituídos

sem o concurso da vontade do executado, embora depois da penhora:

a. Garantias reais, a graduar depois da penhora (artigo 822.º, n.º1 CC);

b. Preferências reais legais;

c. Direitos menores de gozo, ainda que constituídos por usucapião;

amortizações de quota, perda ou oneração por efeito de sentença constitutiva,

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ainda que registada ou proposta após a penhora, mas desde que não

abrangida pelos limites impostos pelo artigo 820.º CC ao debitor debitoris.

Todavia, excecionalmente não são oponíveis os atos de extinção de créditos por

causa dependente da vontade do terceiro devedor verificada depois da penhora, nos

termos do artigo 820.º CC. Literalmente, terceiro deixa de poder dispor do crédito,

como se fosse um executado reflexo. Mas o preceito coloca dúvidas quanto ao seu

alcance, atendendo à extrema restrição que é importa ao terceiro. Assim, discute-se

se pode esse terceiro exercer os poderes potestativos de extinção unilateral do

contrato, máxime, de resolução ou de denúncia.

a. No sentido negativo, por exemplo, o Ac. STJ 13 outubro 1993, concluiu

que havendo uma ação de despejo, cujo fundamento é a falta de pagamento

de rendas, anterior à penhora do direito ao arrendamento e trespasse, a

senhoria não mantém a faculdade de rescindir o contrato, em virtude de o

despejo exigir prévio dictum judicial, tendo o exequente legitimidade para

intervir como parte principal nesse despejo. E também o Ac. STJ 3 junho

1992 decidiu que o despejo de estabelecimento, do local arrendado, ocorrido

em data posterior à penhora do direito ao trespasse e arrendamento, é

ineficaz em relação ao exequente.

b. Todavia, pensamos que a resposta não pode deixar de ser positiva em

aplicação interpretativa do próprio princípio da proporcionalidade que

orienta o sentido e limites dos artigos 819.º e 820.º CC. É essa a boa

doutrina de Teixeira de Sousa: o terceiro ou mesmo o executado podem,

em certos contratos, exercer um direito à extinção que prevalece sobre o

direito do exequente, não havendo lugar à ineficácia.

Procurar concretizar aquele princípio da proporcionalidade, parece-nos que se deve

interpretar o artigo 820.º CC no sentido de que o que há-de ser dependente da

vontade do executado ou do seu devedor é a causa e não o efeito extintivo.

Efetivamente, é inegável que na cessação do contrato por exercício do direito à

resolução ou rescisão contratuais é esse exercício a causa imediata da cessação. Ora,

se esse exercício é voluntário, os respetivos fundamentos nem sempre o são: o que

interessa é apurar se a qualidade de fundamento constitutivo do direito à resolução

ou rescisão contratuais é ela mesma dependente ou independente da vontade do

debitor debitoris. Neste sentido, os fundamentos de resolução do arrendamento urbano,

patentes nos n.º1 a 3 do artigo 1083.º CC, não são dependentes da vontade do

senhorio: a eficácia extintiva é-lhes conferida por lei. O mesmo se diga da falta de

pagamento da remuneração ou da justa causa para despedimento, em sede de

contrato de trabalho. Por isso, eles devem valer independentemente da forma exigida

para a mesma operar. Se apenas se aceitasse uma extinção operada judicialmente, em

face das mudanças do Direito substantivo, tal poderia redundar numa extrema

restrição ao direito do terceiro de se proteger de abusos graves por parte do

executado. Por isso, é oponível à execução tanto a resolução por sentença de despejo,

nos termos do artigo 1084.º, n.º2 CC, como por comunicação à contraparte, nos

termos do artigo 1084.º, n.º1 CC. A competente ação de resolução deverá ser

promovida com a intervenção dos interessados, i.e., credores e adquirentes

executivos, para que deles possam proteger os seus direitos. Se assim não for, a

sentença não é oponível, v.g,, ao arrematante, dada ineficácia erga omnes do caso

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julgado. Ocorrida esta resolução, extingue-se a penhora, pelo que será ineficaz, por

falta de objeto, a ulterior venda executiva dessa posição, entretanto extinta pelo

terceiro. Já, pelo contrário, dependem da vontade do senhorio e/ou executado:

a. A revogação por mútuo acordo (artigo 1082.º CC);

b. A oposição à renovação do contrato, tanto de senhorio, como de

inquilino (artigos 1097.º e 1098.º CC);

c. A denúncia mediante comunicação ao arrendatário com antecedência

não inferior a cinco anos sobre a data em que pretenda a cessação

(artigo 1101.º, alínea c) CC).

Estes e outros fundamentos do mesmo jaez em qualquer tipo contratual, não são

oponíveis à execução nos termos do artigo 820.º CC. Esta solução é, assim, próxima

da do artigo 108.º, n.º4 CIRE, que determina que apenas em dois casos o locador

não pode requerer a resolução do contrato após a declaração de insolvência: falta de

pagamento das rendas ou alugueres respeitantes ao período anterior à data da

declaração de insolvência e deterioração da situação financeira do locatário. Pelo

contrário, já a falta de pagamento de rendas respeitantes ao período posterior à data

da declaração de insolvência, autoriza o senhorio do insolvente, a exigi-las e a resolver

o contrato em ação de despejo autónoma, a processar por apenso ao respetivo

processo insolvencial, direcionada contra a massa insolvente, a devedora e os seus

credores, ao abrigo do artigo 89.º, n.º2 CIRE.

4. Relatividade objetiva: no caso do artigo 819.º CC, a proporcionalidade no plano

objetivo dita que é inoponível apenas o efeito dispositivo ou onerador e não todos

os efeitos dos atos jurídicos em questão: esses não são tocados pela ineficácia. Por

outras palavras, o que é inoponível é o efeito do ato e não o ato; e dentro dos efeitos,

apenas os efeitos dispositivos ou oneradores. Se o ato jurídico permanece, a

contraparte fica sujeita à eficácia do ato, vinculando-se ou dele beneficiando,

consoante o caso concreto. Naturalmente, que a economia interna de um ato negocial

neste estado de incompletude de eficácia está orientada pelos limites da boa fé, da

exceção do não cumprimento, e do que as partes hajam combinado em concreto –

máxime, da venda de coisa futura (artigo 880.º CC). Mas a proporcionalidade dita

ainda que aquela inoponibilidade de disposição e oneração abate-se somente sobre

os atos posteriores à penhora – do executado e também da contraparte no caso do

artigo 820.º CC – que forem incompatíveis com as pretensões dos credores

exequentes e reclamantes. Por outras palavras, no plano objetivo, a ineficácia é a que

for estritamente necessária à salvaguarda do efeito útil da venda, e, portanto, da

execução. Por isso, se o ato de transmissão do próprio direito penhorado – máxime,

propriedade – é sempre eficaz – pois, de outro modo, perder-se-ia, sempre e sem

qualquer circunstância o objeto da penhora – já os atos de oneração deverão ser

avaliados casuisticamente nos seus efeitos típicos. Assim, a constituição pelo

executado de direito real de aquisição é incompatível com a execução quando

determine o valor de venda do bem. É o que sucede com um contrato-promessa com

eficácia real pois ele vai impor ao agente de execução a venda direta, nos termos do

artigo 831.º CPC, e conforme o que haja sido clausulado. Ao contrário, uma

preferência real convencional, ainda que posterior à penhora, não tolhe a posição dos

credores da execução. Se é verdade que ela determinará a atos processuais adicionais

(máxime, notificação nos termos do artigo 819.º, n.º1 CPC) todavia a sua

consideração vai alargar ou criar um universo de compradores com preferência. Será,

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por isso, oponível à execução. Diversamente, são sempre ineficazes a constituição,

depois da penhora, de direito de gozo menor ou de arrendamento. E certo que a sua

posterioridade à penhora determina, por força do artigo 824.º, n.º2 CC, a caducidade

respetiva pelo que, se diria não haver incompatibilidade com a execução. No entanto,

a posse dada por esses direitos implica uma tradição da coisa que é contrária ao

interesse em manter a coisa em bom estado e sem extravios. Já quanto à constituição

de direito real de garantia, privilégio creditório geral, penhora ou arresto, o artigo

822.º CC permitirá que o exequente beneficiário da penhora venha a ser graduado

antes dos terceiros credores, pelo que são sempre eficazes, ainda que posteriores à

penhora. Exclui-se, porém, o direito de retenção e o penhor de coisas. Sendo direitos

reais também quoad constitutionem a posse em favor do Estado impede a sua

constituição em nossa opinião.

Âmbito temporal: atos posteriores à penhora, incluindo o seu registo: a ineficácia

abate-se sobre os atos posteriores à penhora, incluindo o registo dela quando necessário. É

isso que está nos artigos 819.º e 820.º CC. E, portanto, esse efeito não se abate sobre os atos

anteriores à penhora. Por isso, uma causa de resolução do contrato verificada antes da

penhora, não está sujeita ao artigo 820.º CC, não havendo qualquer obstáculo à oponibilidade

ao exequente da extinção do direito penhorado. Mas há uma exceção, pelo menos, no caso

do artigo 821.º CC: a cessão ou liberação de rendas e alugueres não vencidos, respeitantes a

período de tempo não decorridos à data da penhora não é oponível à execução. A justificação

reside em evitar a fraude implícita nesses atos. Por vezes, a penhora tem de ser registada –

assim, na penhora de imóveis, de certos móveis e de certos valores mobiliários – artigos 755.º

e 769.º, n.º1 CPC, por exemplo). Na verdade, nessas eventualidades o ato de penhora é o

registo. A mediação do registo levanta o problema da eficácia contra terceiros da penhora ou

do direito de terceiro. Antes da reforma de 2003 escrevia-se que a penhora não registada não

era oponível a terceiros; só que na época o ato de penhora era anterior ao registo. Atualmente,

o registo da penhora é constitutivo da mesma. Uma penhora não registada é uma penhora

nula. Quanto aos direitos de terceiro tem-se discutido se os atos de disposição ou oneração

que sejam anteriores à penhora mas não hajam sido registados podem ser opostos à execução

ou não. O artigo 819.º CC ressalva justamente as regras do registo. O artigo 5.º, n.º1 CRPr

determina que os factos sujeitos a registo só produzem efeitos contra terceiros depois da data

do respetivo registo. E, portanto, dir-se-ia que, por exemplo, uma venda ou um usufruto ou

uma hipoteca consumados em favor de V antes da penhora do respetivo imóvel mas não

registados ou somente registados depois da mesma, não seriam oponíveis ao credores

exequente A (o terceiro).

1. Esse era o entendimento de Ferreira de Almeida para quem terceiro reduz-se

àquelas pessoas que hajam obtido do alienante sobre a coisa direitos incompatíveis

com os do adquirente, direta ou indiretamente. Era uma solução que valia ainda para

o arresto e a hipoteca judicial registados posteriores a direito não registado a favor

de terceiro;

2. Justificava Vaz Serra que se se tratasse de hipoteca voluntária não seria duvidoso

que o credor hipotecário e o comprador tinham adquirido do mesmo autor, ou

transmitente; ora, o credor com hipoteca judicial não tem que ser menos protegido e

que, de igual modo, se um prédio for comprado a certo vendedor e for penhorado

em execução exercida contra este, o comprador e o penhorante são terceiros entre si,

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havendo embora sem a sua intenção um direito contra o executado que pode

considerar-se emanado deste. Esta posição teve bastante eco na doutrina posterior,

material e processual e na jurisprudência, antes e depois do Assento STJ 12/97 (20

maio 1997).

3. Porém, alguma doutrina defendia um conceito restrito de terceiro elaborado por

Manuel de Andrade: terceiros para efeitos de registo predial são as pessoas que do

mesmo autor ou transmitente adquiram direitos incompatíveis (total ou parcialmente)

sobre o mesmo prédio. Exigia-se, pois, uma identidade subjetiva entre os títulos de

transmissão. Dado o caráter forçado da penhora e da venda executiva não haveria

essa identidade, o que também estaria ausente de uma hipoteca judicial. Por isto, o

terceiro a quem o direito não registado não seria oponível seria o adquirente de um

mesmo autor ou transmitente, máxime, uma dupla alienação/oneração voluntária. Já

não o exequente: este beneficiava de uma oneração não voluntaria, pelo que um ato

não registado ser-lhe-ia oponível. Aplicando esta solução julgaram-se procedentes

embargos de terceiro fundados em posse relativa a direito de propriedade constituído

antes do registo provisório da penhora, apesar de não estar registado. O Assento

STJ 3/99 (18 maio 1999) veio abraçar esta posição, no que tem sido seguido pelos

tribunais, incluindo em sede de oponibilidade de arresto registado antes de alienação

anterior. No entanto, recentemente o Ac. STJ 8 janeiro 2009 retomou, como no

mesmo se assume, a tese do Assento STJ 17/97 e concluiu que o exequente através

da penhora, adquiriu um direito de garantia oponível ao terceiro proprietário que não

registou o direito de propriedade em seu nome. O penhorante e o titular do direito

de propriedade não podem deixar de considerar-se terceiros para efeito de registo.

É certo, porém, que a própria lei, desde o Decreto-Lei n.º233/99, 1 dezembro, adota o

conceito restrito de terceiro no n.º4 do artigo 5.º CRPr: terceiros, para efeitos de registo, são

aqueles que tenham adquirido de um autor comum direitos incompatíveis entre si. Tal

merece críticas profundas que escapam ao escopo da presente obra. Concorde-se ou não,

estamos perante uma severa restrição ao regime do artigo 819.º CC. Na doutrina, Remédio

Marques ainda procura demonstrar que a venda executiva advém do mesmo transmitente –

i.e., o executado –, mas com o devido respeito tal abordagem esbarra na clara vontade

legislativa. Esse direito não caduca com a venda executiva porquanto foi constituído antes

da penhora e pode ser imposto à execução mediante embargos de terceiro.

Provisoriedade: o regime da ineficácia dos atos dispositivos e oneradores é temporário:

mantém-se com a pendência da penhora, termina com o seu levantamento ou a sua extinção

com a venda, adjudicação ou remição (artigos 824.º e 826.º CC). Se a penhora for levantada

os efeitos dispositivos e oneradores terão lugar retroativamente à data do ato. Se a penhora

se extinguir por venda, adjudicação ou remição o ato de oneração ou de alienação caducará

por impossibilidade superveniente.

§54.º - Preferência

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Relação jurídica de prevalência: como decorre do artigo 602.º CC, não existindo causas

legítimas de preferência, os credores têm o direito de ser pagos proporcionalmente pelo

preço dos bens do devedor, quando ele não chegue para integral satisfação dos débitos.

Assim, impõe o princípio da par condictio creditorum. Mas podem existir causas legítimas, i.e.,

reais, de preferência: além de outras admitidas na lei (artigo 604.º CC):

1. A consignação de rendimentos;

2. O penhor;

3. A hipoteca;

4. O privilégio;

5. O direito de retenção.

Ora, o artigo 822.º, n.º1 CC determina que salvo nos casos especialmente previstos na lei, o

exequente adquire pela penhora o direito de ser pago com preferência a qualquer outro

credor que não tenha garantia real anterior. Da articulação da penhora com as eventuais

causas de preferência resulta, então, do artigo 822.º, n.º1 CC a seguintes ordenação temporal

de acordo com a prioridade dos seus registos, ou, não estando as penhoras ou as garantias

sujeitas a registo, em harmonia com a prioridade da data de constituição: potior in iure qui prius

in tempore:

1. A penhora não prevalece sobre garantia real com data anterior;

2. A penhora prevalece sobre:

a. Hipoteca judicial ou arresto com data/registo posterior (artigo 6.º, n.º1

CRPr e artigo 289.º Decreto-Lei n.º54/75, para o registo automóvel);

b. Penhora com data posterior.

Havendo penhoras ou garantias reais, máxime, hipoteca, registadas no mesmo dia prevalece

a que tiver número de ordem mais baixo (artigo 6.º, n.º1, 2.ª parte CRPr).

Conversão retroativa do arresto em penhora:

1. Procedimento: o artigo 822.º CC determina, no seu n.º2, que tendo os bem sido

executado sido previamente arrestados, a anterioridade da penhora reporta-se à data

do arresto. Recorde-se que o artigo 762.º CPC dita que quando os bens penhorados

já estejam arrestados, converte-se o arresto em penhora. Não obsta a essa conversão

o facto de terem sido deduzidos embargos de terceiros ao arresto, já que só pela

procedência daqueles é que o arresto se extingue. Importa notar que se trata de

arresto levado a cabo pelo credor exequente antes ou mesmo na pendência da ação

executiva, nos termos do artigo 364.º, n.º1, in fine e 391.º CPC. Sendo arresto feito

por terceiro, terá este de intervir como credor reclamante, como se verá mais adiante.

Tratando-se de penhora de bens imóveis, se o arresto já estava registado, a penhora

faz-se por averbamento mediante comunicação eletrónica do agente de execução ao

registo (artigo 755.º CPC). Se o arresto não estava registado, a penhora é inscrita na

data pretérita, nos termos gerais daquele artigo 755.º CPC e do artigo 91.º, n.º1 CRPr,

com base no despacho que procedeu à conversão.

2. Efeitos: o arresto é uma providência antecipatória da penhora, pelo que esgota a sua

utilidade com a sua conversão em penhora. A conversão do arresto em penhora é,

afinal, uma consumação do arresto pela penhora. Todavia, se o arresto estiver

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pendente de impugnação, à data da conversão, a penhora ficará temporalmente

dependente das vicissitudes do arresto, e aquela consumação será condicional e

provisória. Assim, se a oposição for procedente, enquanto contraditório diferido ao

arresto (artigos 372.º, n.º1, alínea b) e 393.º CPC), tem-se entendido que o

consequente levantamento do arresto determina idêntico levantamento da penhora

feita por conversão do arresto. Esta afirmação deve ser lida com cuidado: o que se

extingue é a penhora com data do arresto, mas deve ser reduzida a noa data – a data

da própria penhora. Ou seja: o que se perdeu foi um título judicial para antecipar a

penhora, mas não o ato de penhora. Portanto, se o arresto caducar, a penhora

recuperará a sua autonomia. Assim, não será, todavia, se a oposição ao arresto for

por meio de embargos de terceiro. Por essa razão, deve ser liminarmente indeferida,

por litispendência, a petição de novos embargos de terceiro contra penhora resultante

de conversão de arresto, quando o arresto já era do conhecimento do embargante e

este já se lhe opôs por embargos. Ou seja: o próprio terceiro não carece de segundos

embargos – agora contra a penhora – porquanto os embargos ao arresto consomem

a necessidade de tutela, agora contra, no estrito plano formal, a nova penhora por

conversão. O que o exequente pode é requerer a substituição ou reforço da penhora

do bem arrestado, dado terem sido embargos de terceiro que, por consumação,

acabam por ser embargos à penhora (artigo 751.º, n.º4, alínea d) CPC).

§55.º - Natureza jurídica

Doutrina: qual é a natureza da posição de preferência dada pela penhora? O ponto não é

pacífico, sendo tratado em comum com a natureza jurídica do arresto. É que este produz os

mesmos efeitos que a penhora, por força do artigo 622.º, n.º1 CC, como sabemos.

1. Natureza real: no Direito anterior a 1967, a favor da natureza de garantia real de

ambos, mas sem tecerem considerações de fundamentação que não fossem

decorrentes da letra da lei, achavam-se, por exemplo, Alberto dos Reis, José Tavares,

Pinto Coelho e Palma Carlos.

a. Alberto dos Reis: entendia que o que a penhora produz é um direito real de

garantia a favor do exequente e dos credores concorrentes. Estes beneficiam

de um direito de sequela, que os autoriza a fazer valer a garantia perante

aqueles a quem os bens forem transmitidos.

b. Palma Carlos: escrevia que a penhora confere um direito real de garantia

que acompanha os bens nas subsequentes transmissões, direito que possui as

características de um direito real, nomeadamente: a sequela e a preferência.

c. Já Dias Marques: depois de definir a penhora como a afetação jurídica dos

direitos sobre que incide – e de que são eles, e não respetivos bens, o objeto

da penhora – em forma real, à satisfação do direito do exequente, concluía

que a penhora integra um caso típico de direitos sobre direitos. Este saudoso

Mestre fundamentava a natureza real da penhora em termos bastante

complexos: a penhora não é configurável como uma proibição puramente

pessoal de dispor juridicamente dos direitos apreendidos mas antes como

uma compreensão real da própria faculdade de disposição do respetivo titular;

deste modo, a ulterior constituição, sobre o objeto da penhora, de novos

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direitos reais é válida, mas a sua eficácia fica dependente, em virtude da

sequela e da prevalência, da prévia realização dos fins que com esta se

pretendiam atingir. Estas considerações demonstrativas do caráter real dos

efeitos emergentes da penhora são de pleno aplicáveis ao arresto, dada a

semelhança de natureza estrutural e funcional existente entre ambas as figuras.

d. Já no Direito do Código Civil de 1967, Menezes Cordeiro: defende que a

penhora, o arresto e o arrolamento são direitos reais que, com fins cautelares

ou instrumentais, estão previstos na lei do processo, e que traduzem afetações

jurídicas de coisas, com função de garantia.

e. Por seu turno, Lebre de Freitas: defende a natureza real da preferência que

o exequente adquire com a penhora: é um direito real de garantia dotado de

eficácia extraprocessual (artigo 788.º, n.º5 CPC), embora limitado nos

mesmos termos que a hipoteca judicial, sem prejuízo de poder cessar, tal

como os outros efeitos da penhora, por causas exclusivamente processuais,

como as que levam à extinção da execução.

f. Na jurisprudência:

i. O Ac. STJ 23 junho 1992: declarou que a penhora em execução comum

confere uma garantia real.

ii. O Ac. RP 20 outubro 1998: também considerou que o crédito que

beneficie de penhora anterior ao despacho que ordena o

prosseguimento da ação em processo de recuperação de empresa

deve ser classificado como crédito que goza de garantia real sobre

bens da mesma empresa.

iii. Ac. RE 22 junho 2007: afirmou que da penhora resulta um direito real

de garantia.

Mais decisões foram, neste sentido, afirmando a natureza real da preferência

do artigo 822.º CC.

2. Natureza não real:

a. Teixeira de Sousa: nega que a penhora seja uma garantia real. O Autor não

encontra nem sequela nem inerência pois esses caracteres reais justificam que

a garantia acompanhe a transmissão do bem e possa ser invocada contra

quem for o seu proprietário ou possuidor no momento da execução não

colocando qualquer obstáculo à dinâmica da vida jurídica e, em concreto, à

transmissão do bem onerado. Pelo contrário, a penhora resolve o mesmo

problema – a afetação do bem onerado à realização dos fins da execução –

de modo totalmente oposto. Em vez de acompanhar o bem transmitido e de

sujeitar o seu adquirente à execução, a penhora ignora a transmissão do bem

e rejeita qualquer substituição do executado. Deste modo, e concluindo, se a

penhora é fonte de uma preferência sobre o produto da venda dos bens

penhorados, todavia, ela não é um direito real de garantia, porque, embora

seja inerente a uma coisa e afete a execução desta à satisfação do crédito do

exequente, a sua função é conservatória sendo esta função que justifica a

regra da inoponibilidade dos atos de disposição ou oneração posteriores a ela.

A penhora não é um direito real (por isso não se fala, quanto a ela, de titulares

ativos e passivos), mas uma situação em que são colocados certos bens ou

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direitos. E quanto ao arresto, o mesmo pode ser dito por apresentar

manifestas semelhanças.

b. Na jurisprudência: o Ac. STJ 17 maio 2005 concluiu que o arresto (e a

penhora) não são verdadeiros direitos reais – de gozo, de garantia ou de

aquisição, pois, falta-lhes para tanto o elemento realidade que une

diretamente o titular à coisa, de jeito que, em princípio, e em certos termos,

segue-a, e persegue-a, ou, tem sobre ela, crédito preferencial, mesmo em

esfera alheia. Segundo o mesmo Acórdão, o que o arresto e a penhora

constituem, a beneficio do credor/exequente, é uma situação que se traduz

na ineficácia dos atos de disposição ou oneração que ele, dono, venha a

praticar sobre os bens penhorados (artigo 819.º CC), sendo uma relação não

real, mas preferencial creditória, por forma que o exequente adquire pela

penhora (ou pelo arresto) o direito de ser pago com preferência a qualquer

outro credor que não tenha garantia real anterior; e tendo os bens sido

previamente arrestados, a anterioridade da penhora reporta-se à data do

arresto (artigo 822.º, n.º1 e 2 CC).

Posição pessoal:

1. Natureza de garantia real até 1967. Natureza não real da indisponibilidade

jurídica e da indisponibilidade material: no Código de Processo Civil anterior a

1967, a penhora era, manifestamente, um direito real de garantia, como apontavam

Alberto dos Reis, Palma Carlos e Dias Marques. Ao preceituar que os bens

penhorados garantiam o cumprimento da obrigação ainda que sejam transmitidos,

uma vez que o registo da transmissão seja posterior ao registo da penhora, claramente

apresentava no regime a típica sequela real e, sobretudo, não impedia as transmissões

e onerações. Portanto, vigorava, então, um sistema que – esse sim – apresentava-se

como tomando emprestadas as palavras de Teixeira de Sousa, sendo uma garantia

que acompanhava a transmissão do bem e podia ser invocada contra quem fosse o

seu proprietário ou possuidor no momento da execução. Com o Código Civil de

1967, aquele preceito foi revogado e as pedras basilares passaram a ser os artigos

819.º, 820.º e 822.º CC. Perante esse novo e completamente diverso regime, tornou-

se plenamente artificial a alegação ainda em 1968 de Palma Carlos (porventura ainda

imbuída do sistema que terminava) de que a sequela na penhora resultava evidente

do artigo 819.º CC. Pelo contrário: muito pelo contrário. É neste quadro de

referencias legais que se deve colocar uma questão prévia: quando falamos de

natureza real da penhora estamos a falar da ineficácia relativa dos atos de disposição

e oneração (artigo 819.º e 820.º CPC), estamos a falar da preferência em relação a

credor sem melhor causa de preferência (artigo 822.º CPC) ou estamos a falar de

ambas as vertentes? Ora, a penhora parece assumir-se como um ato processual

produtor de um complexo de efeitos e não tanto como uma figura unitária e, por

isso, temos distinguir entre o efeito conservatório e o efeito de garantia,

correspondentes à indisponibilidade jurídica e à preferência derivadas da penhora,

respetivamente. O efeito conservatório não é de natureza real, pelas razões apontadas

por Teixeira de Sousa e que nos parecem inteiramente procedentes. Mas também a

visão intelectualmente laboriosa de Dias Marques, embora no contexto anterior a

1967, não é atualmente procedente, pois uma compreensão real da faculdade de

disposição do direito real é, ela mesma, uma negação da sequela, pois dispensa-a,

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precisamente. Se esse efeito fosse real, então o bem poderia ser vendido pelo devedor

e não pode, na verdade. Pelo contrário, o efeito dos artigos 819.º e 820.º CC deve ser

aproximado a idêntica indisponibilidade que tem lugar em sede de declaração de

insolvência, em particular do artigo 81.º CIRE. Esta consiste no seguinte: a

declaração de insolvência priva imediatamente o insolvente, por si ou pelos seus

administradores, dos poderes de administração e de disposição dos bens integrantes

da massa insolvente, os quais passam a competir ao administrador da insolvência

(n.º1) de modo que são ineficazes os atos realizados pelo insolvente em contravenção

do disposto nos números anteriores, respondendo a massa insolvente pela restituição

do que lhe tiver sido prestado apenas segundo as regras do enriquecimento sem causa

(n.º6). Finalmente, pelo n.º2 ao devedor fica interdita a cessão de rendimentos ou a

alienação de bens futuros suscetíveis de penhora. Mas, como já se viu, o executado,

ao contrário do insolvente, não se vê privado desses poderes de modo absoluto.

Funcionalmente, estamos perante regimes instrumentais acauteladores do efeito útil

de uma execução de direitos de crédito – execução singular no primeiro caso;

execução universal no segundo. Ambos são restrições pessoais às faculdades de

disposição lato sensu que o devedor tem no conteúdo dos seus direitos reais de gozo

e dos seus direitos de crédito. Mas na execução singular são restrições ou ineficácias

não absolutas nem totais porque apenas são ineficazes os atos idóneos a prejudicar o

efeito útil da execução: certos atos de oneração continuam a ser eficazes em face da

execução e para terceiros à execução o ato é significativamente eficaz. São, pois,

restrições que acham a sua justificação e limites nos estritos limites da

instrumentalidade conservatória que prosseguem. Esta qualificação estende-se e,

ganha, por isso coerência, à indisponibilidade material. Efetivamente, a perda da

posse efetiva é ainda uma restrição pessoal às faculdades de uso e fruição da coisa.

2. Natureza não real da prevalência: também o efeito de garantia consubstancia o

conteúdo de um direito legal não real de garantia que pode onerar o direito que haja

sido objeto da penhora, seja um direito real de gozo – máxime, a propriedade – seja

um direito de crédito. Por ele o exequente adquire pela penhora o direito de ser pago

com preferência a qualquer outro credor que não tenha garantia real anterior. Ou seja,

por ele constituem-se relações de prevalência não reais entre direitos de garantia. Mas

porque é que não é de natureza real? Porque, mais uma vez, dada a funcionalidade

específica da penhora, a preferência que ela confere necessita apenas para o seu

exercício da conservação da situação jurídica do bem penhorado, e não de seguir a

coisa eventualmente vendida. Ao contrário do que afirmava Palma Carlos, a penhora

não acompanha os bens nas sunbsequentes transmissões, ou seja, não é dotada de

sequela. Isso era verdade no pretérito artigo 763.º, n.º1 CPC; atualmente, a penhora

já impede essas transmissões. Nisso é absolutamente diversa da hipoteca judicial. O

que sucede, afinal, é que a penhora não é dotada de sequela: no plano dos direitos

reais, a sequela é a natureza real nas vicissitudes transmissiva ou oneratória do direito.

Ora, novamente, como se viu em sede de artigo 819.º CC, o bem está congelado,

imune a vicissitudes até à venda executiva ou adjudicação. Novamente, a sequela da

penhora é desnecessária perante isto; a sua realidade é desnecessária. Contra esta

consideração poder-se-ia argumentar que a preferência conferida pela penhora

apresenta natureza real nas suas relações com os titulares de outras garantias, porque

a verdade é que a posição do exequente pode ser oposta, em sede de graduação de

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créditos (artigo 788.º, n.º5 CPC) a qualquer outro credor com garantia real posterior

á penhora – máxime, uma hipoteca judicial (artigo 710.º CPC) – sendo de estranhar

que possam existir relações de prevalência entre garantias reais e garantias não reais.

Justamente, a preferência decorrente da penhora é uma causa legítima de preferência,

das admitidas na lei, conforme se lê no artigo 604.º, n.º2 CC; a lei aqui é o artigo 822.º,

n.º1 CC. É esta a eficácia extraprocessual para efeitos dos artigos 788.º, n.º5 e 795.º

CPC. Todavia, não se trata de uma eficácia real: como se sabe, as relações de

prevalência entre direitos não têm de ser reais. Por exemplo, o privilégio creditório

geral é tido como não sendo de natureza real e, contudo, é levado à graduação de

créditos na ação executiva. Aliás, interessantemente, o privilégio creditório geral

comporta-se, de certa forma, de modo próximo da penhora, não vale contra terceiros

titulares de direitos que, recaindo sobre as coisas abrangidas pelo privilégio, sejam

oponíveis ao exequente (artigo 749.º CPC). Ora, a verdade é que o bem pode ser

vendido, adjudicado ou remido mesmo que o exequente com penhora posterior não

surja a reclamá-la: a falta de reclamação, ao abrigo daqueles artigos, não se traduz

numa futura oneração, dotada de sequela. Deste modo, tanto nos privilégios gerais,

como na penhora, temos direitos legais de garantia de natureza não real.

F – Impugnação

§56 – Generalidades; oposição à penhora

Generalidades: há, porventura com arcaico casuísmo, uma plêiade de meios de reação

contra o ato de penhora. O seu pedido é sempre o de revogação do ato de penhora, pelo que

o que os distingue é a causa de pedir e a legitimidade ativa. A causa de pedir pode reconduzir-

se à ilegalidade do objeto da penhora, à ilegalidade do sujeito aos efeitos da penhora e à

nulidade do ato de penhora. As ilegalidades objetivas do ato de penhora, ou seja, em razão

do objeto respetivo, podem ser arguidas em:

1. Oposição à penhora pelo executado;

2. Reclamação do ato do agente de execução – residualmente, apenas se o legislador

não prever meio específico.

As nulidades do ato de penhora, ou seja, em razão dos sujeitos dos efeitos da penhora, podem

ser arguidas em protesto do ato de penhora (artigo 764.º, n.º3 CPC), embargos de terceiro,

ação de reivindicação e reclamação do ato do agente de execução – aqui novamente apenas

se o legislador não prever meio específico. Os terceiros não podem defender no processo

executivo a sua propriedade mediante outro meio como, nomeadamente, simples

requerimento, salvo o caso daquele artigo 764.º, n.º3 CPC. Não é possível reagir contra a

penhora já efetuada em processo executivo por meio de providência cautelar, seja porque

esta é subsidiária perante os demais meios (artigo 362.º, n.º3 CPC, enquanto princípio), seja

porque mesmo que exista lesão do direito, esta se consuma com a efetivação da penhora.

Oposição à penhora:

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1. Função e objeto:

a. Função: a oposição à penhora consiste num incidente declarativo da

execução. Por isso, é ação funcionalmente acessória da ação executiva cuja

função é a oposição pelo executado de uma defesa a um ato de penhora de

um bem seu. Sem ação executiva não há oposição à penhora.

b. Pedido. Cumulação de pedido de comunicação da dívida (artigo 742.º,

n.º1 CPC): o pedido na oposição à penhora é a revogação da penhora de um

bem do executado. Deste modo, é uma ação constitutiva extintiva. Estão de

fora do seu objeto e, portanto, do caso julgado os fundamentos da decisão

do pedido, como a existência ou inexistência do direito penhorado ou, por

exemplo, a existência de uma fiança. No novo artigo 742.º, n.º1 CPC passa a

permitir-se, em termos já atrás estudados, que, movida execução apenas

contra um dos cônjuges e penhorados bens próprios do executado, pode este,

na oposição à execução, alegar fundamentadamente que a dívida, constante

de título diverso de sentença é comum. Trata-se de um fundamento que se

relaciona com o da alínea b) do n.º1 do artigo 784.º CPC (imediata penhora

de bens que só subsidiariamente respondam pela dívida exequenda) mas que

não lhe é coincidente, pois a penhora foi, então, legal. No entanto, o fim

daquela alegação é obter a admissão da comunicação pelo cônjuge terceiro

ou mediante decisão judicial. Ora, nesse caso, o executado originário pode

pedir o levantamento da penhora dos seus bens próprios, por troca com bens

comuns, ao abrigo do artigo 741.º, n.º5, 2.ª parte CPC. Sendo, pois, um

fundamento cumulado, é também possível a sua dedução autónoma, i.e, no

prazo da oposição à penhora, sem que esta tenha sido apresentada. Corre,

então, a sua própria tramitação.

c. Causa de pedir: tal como sucede com a oposição à execução, também esta

oposição tem fundamentos, i.e., causas de pedir, restritas Elas aparecem-nos

arroladas no artigo 784.º, n.º1 CPC. Estas causas têm em comum tratar-se,

sempre, de ilegalidades objetivas do ato da penhora, ou seja, em razão do

objeto respetivo, e dizem sempre respeito a bens do executado.

i. O primeiro fundamento (alínea a)) é o da inadmissibilidade da penhora dos bens

concretamente apreendidos ou da extensão com que foi realizada: está, por

conseguinte, a alegar-se que a penhora foi consumada em violação

das nomas que fixam:

1. Impenhorabilidades objetivas, absolutas, relativas ou parciais;

2. Princípio da proporcionalidade, em geral, ou concretizado pelos limites

do n.º3 do artigo 751.º, n.º3 CPC.

ii. O segundo fundamento (alínea b)) é a imediata penhora de bens que só

subsidiariamente respondam pela dívida exequenda. Trata-se, portanto, tanto

de penhora de bens em responsabilidade subsidiária objetiva, como

de bens em responsabilidade subsidiária subjetiva, máxime, de fiador.

Naturalmente que não existe esta subsidiariedade nas dívidas

solidárias. Todavia, no caso de violação das regras de penhorabilidade

subsidiária subjetiva, apenas pode ser admitida a oposição quando o

opoente – o fiador – não teve oportunidade processual de invocação

do benefício da excussão prévia no prazo de oposição à execução.

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Tal é o caso do artigo 745.º, n.º3 CPC quando na forma sumária o

fiador não foi citado antes da penhora. Pelo contrário, se o fiador não

cumpriu o ónus de alegar o benefício da excussão no prazo da

oposição à execução, como impõe, nomeadamente, o artigo 745.º,

n.º1, in fine e n.º2 CPC, precludiu-se essa competência processual.

Não pode invoca-la agora. Mas suponha-se que o fiador alegou o

benefício da excussão prévia e obteve indeferimento do juiz: também

não pode novamente pedir-lhe a sua reapreciação, agora por oposição

à penhora. É que vale aqui uma regra mais ampla: o primeiro

despacho fez caso julgado formal. Recorde-se que antes da reforma

de 2003, a oposição à penhora conhecia um pressuposto negativo, e

que era, justamente, a questão da impenhorabilidade não ter sido

expressamente apreciada e decidida no despacho ordinatório da

penhora. Na verdade, a questão coloca-se para todos os casos de

apreciação prévia pelo tribunal da penhorabilidade de um bem

concreto e cuja impenhorabilidade venha a ser alegada em incidente

de oposição à penhora. Ora, tal como antes, não pode o executado

voltar a colocar a questão ao mesmo tribunal com base no n.º1 do

artigo 784.º CPC, pois, sobre ela já se fez caso julgado formal nos

termos do artigo 620.º CPC, tendo o juiz esgotado o seu poder

jurisdicional sobre a matéria (artigo 613.º, n.º1 e 3 CPC). Se o fizer

ocorre uma exceção dilatória insuprível, nos termos do artigo 577.º,

alínea i), 2.ª parte CPC, de conhecimento oficioso (artigo 578.º CPC)

e que leva a despacho de indeferimento liminar, nos termos do artigo

590.º CPC.

iii. O terceiro fundamento (alínea c)) é a incidência da penhora sobre bens que, não

respondendo, nos termos do direito substantivo, pela dívida exequenda, não

deviam ter sido atingidos pela diligência. Relembre-se, aqui, os casos de

limitação convencional e legal de responsabilidade e os casos de bens

não transmissíveis ou mesmo fora do comércio.

2. Procedimento:

a. Pressupostos: este incidente corre no tribunal de execução, sendo da

competência exclusiva do juiz de execução proceder ao seu julgamento,

segundo o artigo 723.º, n.º1, alínea b) CPC. Por isto, o agente de execução

não tem competência para conhecer da oposição. Na oposição à penhora a

legitimidade ativa cabe ao executado, como se enuncia no corpo do n.º1 do

artigo 784.º CPC, e não a outrem. Um terceiro, ainda que co-devedor, não

pode, pois, deduzir oposição à penhora invocando ilegalidade objetiva – v.g.

violação dos artigos 738.º, n.º1 ou 739.º CPC. A legitimidade passiva pertence

ao exequente pois ele é que terá prejuízo pelo levantamento da penhora

(artigo 30.º, n.º2, 2.ª parte CPC). Já os credores reclamantes, pelo contrário,

veem mantida a sua garantia. Quanto ao patrocínio judiciário recordem-se as

regras do artigo 58.º, n.º1 CPC que o impõe nos apensos declarativos, se o

valor da causa for superior à alçada de primeira instância.

b. Momentos e prazo: O momento e prazo de dedução do incidente de

oposição à penhora estão dependentes da forma do processo. Realizando-se

a penhora antes da citação do executado, i.e., na forma sumária do artigo

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550.º, n.º2 CPC, manda o artigo 856.º, n.º1 CPC que a oposição será

apresentada no prazo de 20 dias a contar da citação da execução e do ato de

penhora. Aqui o executado tem o ónus de cumular a oposição à penhora com

a oposição à execução que eventualmente venha a deduzir em igual prazo,

nos termos do artigo 856.º, n.º3 CPC. Ocorrendo a penhora depois da citação

para a execução, i.e., na forma ordinária do artigo 550.º, n.º1 e 2 CPC, a

contrario, a oposição será apresentada em 10 dias a contar da notificação do

ato de penhora, por força do artigo 785.º, n.º1 CPC.

c. Oposição autónoma: caso não haja a cumulação de oposições – seja porque

o executado foi citado antes da penhora (forma ordinária), seja porque foi

depois da penhora (forma sumária), mas não se quis opor à execução – o

incidente segue as disposições gerais dos incidentes da instância dos artigos

293.º a 295.º, e n.º1 e 3 do artigo 732.º CPC. Assim dispõem os artigos 785.º,

n.º2 e 856.º, n.º3 CPC, consoante as formas de processo. Por isso, na petição

de oposição (artigo 552.º CPC), deve o executado oferecer o rol de

testemunhas e requerer os outros meios de prova. Conhece-se, depois,

despacho liminar, ex vi artigo 732.º, n.º1 CPC, podendo ser de indeferimento

liminar manifesta improcedência ou o fundamento não ser uma das alíneas

do artigo 784.º, n.º1 CPC. Proferido despacho liminar, deve ser notificado o

exequente para contestar no prazo de 10 dias, com idêntico ónus instrutório

(artigo 293.º, n.º2 CPC). Por outro lado, visto que o artigo 293.º, n.º2 CPC,

não pode reger a revelia, dado a causa principal não ser declarativa, rege o

artigo 732.º, n.º3 CPC, ex vi artigos 785.º, n.º2 e 856.º, n.º4 CPC: é aplicável

o disposto os artigos 567.º, n.º1 e 568.º CPC. Porém, ressalvam-se como não

confessados os factos relativos à penhorabilidade do bem que estiverem em

oposição com os expressamente alegados pelo exequente no requerimento

executivo sobre a mesma questão. A prova rege-se pelas especialidades do

artigo 294.º CPC. Se necessário haverá audiência para a prova constituenda.

No Novo Código bem agora inovar-se no artigo 295.º CPC, que finda a

produção da prova, pode cada um dos advogados fazer uma breve alegação

oral, sendo imediatamente proferida decisão por escrito, aplicando-se, com

as necessárias adaptações, o disposto no artigo 607.º CPC.

d. Oposição cumulada: se o executado for citado depois da penhora (forma

sumária), pode opor-se, contemporaneamente e no mesmo prazo, tanto à

execução, como à penhora. É o que decorre do artigo 856.º, n.º1 e 3 CPC.

Isto significa que o procedimento da oposição à penhora é também o

procedimento da oposição à execução. Por isso, deduzida a petição inicial

dupla de embargos e de impugnação da penhora, há depois lugar a despacho

liminar, notificação do exequente para contestar, contestação (eventual), nos

termos do artigo 732.º, n.º1 e 2 CPC. Após esta fase introdutória, seguem-se,

sem mais articulados os termos do processo declarativo comum, em sede de

artigo 732.º, n.º2 CPC. A produção de prova está sujeita às especialidades

próprias da oposição à execução, determinadas pela forma do procedimento

declarativo.

e. Efeito sobre a marcha do processo: o regime dos efeitos do recebimento

do requerimento de oposição à penhora sobre a marcha do processo estão

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regulados nos n.º3 a 6 do artigo 785.º CPC (também aplicável à forma

sumária por força do artigo 856.º, n.º4 CPC), quando seja oposição autónoma,

i.e., não cumulada com a oposição à execução. Assim, determina o n.º3 do

artigo 785.º CPC que a suspensão da execução – não da penhora – só tem

lugar se o executado prestar caução e esclarece-se que a suspensão

circunscreve-se aos bens a que oposição respeita, podendo a execução

prosseguir sobre outros bens que sejam penhorados. Mas, se não for prestada

caução, no artigo 785.º, n.º4 CPC, passa a determinar-se que a se a oposição

disser respeito ao imóvel que constitua habitação efetiva do executado,

aplica-se o disposto no n.º5 do artigo 733.º CPC. Assim, o executado pode

requerer ao juiz que a venda fique a aguardar a decisão proferida em 1.ª

instância sobre a oposição à penhora, alegando e demonstrando que tal venda

é suscetível de causa prejuízo grave e dificilmente reparável. Além disso,

quando a execução prossiga seja porque esse requerimento foi improcedente

ou nem sequer deduzido, máxime, por não se tratar de habitação, ou então

porque já foi proferida decisão em 1. ª instância desfavorável ao executado –

e fica ainda pendente a oposição à penhora – nem o exequente, nem qualquer

outro credor pode ser pago na pendência da oposição (incluindo seu recurso),

sem prestar caução, ex vi artigo 785.º, n.º5 CPC. Quando seja oposição não

autónoma, i.e., seja cumulada com a oposição à execução (processo sumário),

o processo só se suspende nos termos do regime próprio dos embargos à

execução. Recorde-se que esta tem efeito suspensivo nas situações do artigo

733.º, n.º1 CPC (efeito suspensivo eventual, máxime, por prestação de

caução). Mas também aqui valem os respetivos n.º4 e 5, respetivamente, de

tutela de habitação efetiva do executado e de imposição a exequente e

qualquer outro credor da obrigação de caução para poder obter pagamento,

na pendência das oposições à execução e à penhora. Todavia, ao abrigo do

artigo 856.º, n.º6 CPC, o executado pode requerer a substituição dos bens

penhorados por caução idónea o que, se não suspende a marcha da

integralidade do procedimento executivo, retira à execução de modo total ou

parcial os bens penhorados inicialmente.

f. Direito probatório e sentença final, em especial: alguns aspetos comuns

do regime da prova devem ser destacados. Assim, incumbe ao executado

opoente o ónus de alegação e demonstração dos factos que integram a causa

de pedir. A justificação desta distribuição do ónus da prova reside em aqueles

factos serem exceção – diríamos, impeditiva – ao ato de penhora e como tal

o ónus da prova cabe a quem aproveita nos termos do artigo 342.º, n.º2 CC.

Por outro lado, o exequente pode requerer prova pericial (artigos 474.º e

seguintes CPC). Na sentença de oposição à penhora o juiz declara quais os

factos que julga provados e não provados, observando, com as devidas

adaptações, o disposto no artigo 607.º CPC. Ela deve ser proferida no prazo

mínimo de três meses contados da data da petição de oposição à execução,

conforme o artigo 723.º, n.º1, alínea b) CPC. Sendo vários opoentes à

penhora aquele prazo de 3 meses será contado singularmente, dado cada

oposição iniciar uma ação separada, mesmo quando seja oposição cumulada

com embargos. A penhora será levantada se a oposição à penhora for

procedente – n.º6 do artigo 785.º CPC. Tal levantamento será levado a cabo

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pelo agente de execução, o qual procederá ainda ao cancelamento de

eventuais registos. A sentença respetiva tem valor de caso julgado formal,

pelo que só por ela não é nula a penhora noutra execução de o mesmo bem

tido, nomeadamente, por impenhorável.

§57.º - Protesto do ato de penhora

Aspetos gerais:

1. Antecedentes: protesto no ato de penhora: antes da reforma de 2003, no ato da

penhora o executado ou alguém por ele – não o terceiro em nome próprio –, podia

obviar a uma ilegalidade subjetiva manifesta da penhora que pudesse ser resolvida de

imediato, mediante a apresentação de documento que demonstrasse, de modo

inequívoco, que o bem pertencia a terceiro ou ao executado e a terceiro. Cabe, então,

ao funcionário judicial averiguar a que título se acham os bens em poder do

executado e exigir a apresentação dos documentos que houvesse, em prova das

alegações produzidas. Depois o funcionário podia concluir a penhora

definitivamente, se não ficasse convencido ou provisoriamente, se ficasse com

dúvidas. Na primeira hipótese, restariam ao protestante os embargos de terceiro e

ação de reivindicação. Na segunda remetia a questão ao tribunal para este decidir se

a penhora deveria ser mantida, ouvidos o exequente e o executado e obtidas as

informações necessárias. Opostamente, o funcionário podia não realizar a penhora

se fosse procedente o protesto. Notificava então o exequente o qual poderia,

eventualmente, indicar outros bens ou reclamar para o juiz do ato do funcionário

judicial. O meio, previsto nas disposições comuns sobre a penhora era de alcance

geral, valendo para a penhora de qualquer bem. Entendia-se mesmo que também as

ilegalidades objetivas da penhora, máxime, as impenhorabilidades absolutas, quando

fossem manifestas e de fácil demonstração, poderiam ser invocadas pelo protesto no

ato da penhora A prática mostrou, contudo, um uso perverso do protesto no ato da

penhora: o funcionário judicial tendia a não efetuar a penhora perante a alegação do

executado, ou de quem estivesse à sua frente, por fraca que fosse a demonstração

documental. Com isso perdiam o exequente e o sistema judicial, mas o executado

ganhava tempo para dispersar os bens. Além disso, do ponto de vista teórico, era

dificilmente aceitável que um funcionário administrativo pudesse afastar um

despacho judicial.

2. Enunciado: com a reforma da ação executiva foi, enfim, suprimido o protesto no

ato da penhora e passou-se a estabelecer, em sede de penhora de móveis não sujeitos

a registo que se presumem pertencer ao executado os bens encontrados em seu poder,

abrindo-se um curto procedimento declarativo para esta presunção, feita a penhora,

ser ilidida perante o juiz, mediante prova documental inequívoca do direito de

terceiro, sem prejuízo dos embargos de terceiro. No novo Código, o artigo 764.º,

n.º3 CPC, o enunciado permanece essencialmente o mesmo, apenas com uma

clarificação em sede de legitimidade ativa: presume-se pertencerem ao executado os

bens encontrados em seu poder, mas, feita a penhora, a presunção pode ser ilidida

perante o juiz, quer pelo executado ou por alguém em seu nome, quer por terceiro,

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mediante prova documental inequívoca do direito de terceiro sobre eles, sem prejuízo

da faculdade de dedução de embargos de terceiro. O âmbito abrange não somente

uma presunção de propriedade mas também de qualquer direito real menor que esteja

a ser objeto da penhora. A disposição do artigo 764.º, n.º3 CPC foi inspirada,

segundo Lebre de Freitas e Ribeiro Mendes, numa semelhante presunção

estabelecida no Código de Processo Civil Italiano, relativamente aos bens

encontrados na casa, estabelecimento ou escritório do executado. Contudo, o que se

prevê nesse artigo, em sede de oposição de terceiro à penhora, é que o terceiro não

pode provar por testemunhas o seu direito sobre bens móveis penhorados em casa

ou no estabelecimento do devedor, salvo se a existência do direito decorrer, com

verosimilhança, da profissão ou do comércio exercidos pelo terceiro ou pelo devedor.

3. Objeto e natureza: a pretensão neste meio processual é a do levantamento da

penhora e a restituição dos bens, por afastamento da presunção de que o que está

em poder do executado lhe pertence. À primeira vista, poder-se-ia dizer que a

presunção agora proclamada nada tem de novo pois respeita o que já decorre do

artigo 1268.º, n.º1 CC. Não parece ser assim, já que a presunção de titularidade do

direito de fundo do artigo 1268.º, n.º1 CC decorre da posse, e não é totalmente

líquido que em seu poder signifique em sua posse. Pelo contrário: para o legislador, os

bens móveis estão em poder do executado quando se achem num espaço identificado

no processo coo sendo objeto de algum direito de gozo, real ou pessoal, do executado

– o seu domicílio, a sede social, o estabelecimento comercial ou o seu local de

trabalho. Não interessa por que a coisa está naquele local. A correção desta asserção

é demonstrada pela consideração de que, se fosse relevante para a realização da

penhora saber a que título a coisa móvel está em poder do executado, então bastar-

lhe-ia alegar no ato que o bem não é seu, mas detido nos termos do artigo 1253.º CC,

com a consequente não efetivação da penhora. Tal sucedia, dentro de certas

exigências, no anterior protesto no ato da penhora; tal não sucede neste novo regime,

no qual o direito de terceiro só pode ser invocado após a penhora e perante o juiz.

Deste modo, a presunção de titularidade do artigo 764.º, n.º3 CPC, apresenta um

âmbito mais vasto que a presunção do artigo 1268.º, n.º1 CC.

a. Indo mais longe, Paula Costa e Silva, aponta que, em rigor, nem se trata de

uma presunção (artigo 349.º CC), mas de uma verdadeira ficção jurídica.

Enquanto na presunção a inferência de um facto desconhecido – a

titularidade do direito sobre a coisa – é feita a partir de um facto conhecido

– a coisa estar sob o poder do executado –, aqui a lei impõe a fita presunção

mesmo quando a titularidade é conhecida – e até inequívoca – do agente de

execução.

b. Parece-nos que o enunciado normativo parece ter uma natureza mista,

consoante o ponto de vista.

i. Pelo ponto de vista do terceiro: esta presunção é ilidível, mas de modo

deferido: ele pode afastar a presunção mas não no próprio ato de

penhora. Por outro lado, nesse afastamento impõe-se-lhe uma

restrição probatória – em oposição sumária à penhora não se pode

usar de prova testemunhal para demonstrar o direito de terceiro.

ii. Pelo ponto de vista do agente de execução: é uma ficção já que oficiosamente

ele deveria aferir da qualidade de ser ou não do executado com base

na regra comum do artigo 1268.º, n.º1 CC, que seria um critério

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normativo para permitir ou não a penhora. Ora, não apenas o critério

que se lhe impõe para os estritos efeitos do processo é mais amplo,

como se viu, como ainda, ele não pode ex officio recusar-se à penhora.

O direito de terceiro é o mesmo direito incompatível com a realização ou âmbito da

diligência da penhora que suportaria embargos de terceiro em sede de artigo 342.º

CPC. Em suma: direitos materialmente oponíveis ao exequente, constituídos antes

do ato de penhora (artigo 819.º CC). Em concreto, podem, por isso, usar do meio

do artigo 764.º, n.º3 CPC o terceiro titular de direito de propriedade ou de direito

real menor de gozo sobre a coisa penhorada. Pelo contrário, o protesto do ato de

penhora deve ser indeferido se o requerente invocar garantia real, ainda que

acompanhada de detenção ou direito pessoal de gozo. Mas, tal como nos

fundamentos dos embargos de terceiro, o terceiro deve alegar que a penhora ofende

o seu direito. Por isso, se o terceiro alegar propriedade reservatária ou locação

financeira a seu favor deve demonstrar em concreto que o ato de penhora ofende o

seu direito. Assim será se o bem ainda estiver na sua posse: não será se o bem já foi

entregue ao executado, como se prevê no artigo 778.º, n.º2 CPC.

4. Âmbito: preliminarmente, pode afirmar-se que, da colocação em sede de penhora de

móveis não sujeita a registo, se retira que o n.º3 do artigo 764.º CPC não tem o

âmbito de aplicação geral do anterior protesto no ato da penhora, valendo apenas

para a penhora de coisas móveis não sujeitas a registo. Percebe-se que assim seja:

enquanto a titularidade sobre bens móveis assenta na simples situação de poder do

executado sobre a coisa, já a definição da titularidade sobre coisas móveis sujeitas a

registo não pode deixar de assentar no efeito presuntivo do registo. Isto significa que,

por exemplo, não pode ser penhorado um automóvel que seja encontrado na

garagem do executado quando o agente de execução dele nada conheça. Em relação

a esse bem, a presunção do artigo 764.º, n.º3 CPC, é substituída pela presunção

registal. Se, ainda assim, o agente de execução imobilizar o automóvel nem o

executado ou o terceiro podem usar do meio de oposição do artigo 764.º, nº.3 CPC,

pois a função desse protesto é afastar o funcionamento de uma presunção – que aqui

não é sequer aplicável –, e não alegar a falta de pressupostos da penhora. Deste modo,

resta ao terceiro deduzir os adequados embargos de terceiro, enquanto o executado

deverá reclamar da penhora realizada pelo agente de execução. Mas esta colocação

sistemática permitir dar resposta à pergunta seguinte: a presunção deve funcionar

mesmo quando seja manifesto que os bens são de terceiro? A questão põe-se, antes

de mais, em relação a bens que, atenta a profissão exercida pelo executado ou pelo

terceiro, é manifesto que não serão do executado. E os bens móveis do cônjuge e,

mais em geral, dos familiares – v.g., filhos – e de todos aqueles que vivam em

economia comum com o executado?

a. No Direito anterior, Teixeira de Sousa: defendia que o funcionário judicial

devia seguir a regra de que pertence ao executado tudo o que se encontra em

poder desta parte, salvo se for evidente que o bem pertence a terceiro.

b. Por seu turno, Lebre de Freitas: defende que o agente de execução não deve

realizar a penhora quando seja confrontado, no próprio ato, com a evidência

do direito de terceiro. Melhor ainda: antes da penhora, a ilisão da presunção

do artigo 764.º, n.º3, 1.ª parte CPC caberia ao agente de execução –

oficiosamente, pelo menos, depois da penhora seria feita perante o juiz, nos

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termos do preceito. Por outras palavras, se for clara a titularidade de terceiro

não há lugar a presunção.

c. Por nosso lado: não achamos base para fazer uma distinção onde o

legislador não quis distinguir. A ser como Lebre de Freitas propugna, estaria,

a final, ainda a vigorar contra legem o revogado regime. Dir-se-ia, porém, que

as regras sobre a posse determinam que, nalguns daqueles casos, se está

apenas perante mera detenção, por ser público que há um quadro objetivo

de que resulta uma atuação profissional e, portanto, uma posse em nome

alheio, nos termos do artigo 1253.º, alínea c) CC. Contudo, o artigo 764.º,

n.º3 CPC ignora a situação material do bem – no limite a própria presunção

do artigo 1268.º, n.º1 CC – a qual apenas pode ser considerada em sede de

ilisão da presunção. Parece, todavia, que importa retornar à colocação

sistemática do preceito. Dela decorre que ele se aplica à penhora de móveis

num domicílio, mas já não à penhora de móveis integrados num

estabelecimento comercial. Os móveis domiciliares devem ser penhorados

sem restrições, cabendo ao terceiro, máxime, cônjuge ou familiares, impugnar

a penhora, ilidindo a presunção, embargando de terceiros ou reivindicando.

Já os móveis do estabelecimento comercial ou similar serão objeto de

listagem nos termos do n.º2 do artigo 782.º CPC e não da apreensão típica

da penhora de móveis (artigo 764.º, n.º1 CPC). Ora, para efeitos do n.º1 do

artigo 782.º CPC, não bastará apenas que os bens estejam no estabelecimento,

pois a pergunta não é se eles são do executado mas se eles integram o

estabelecimento comercial. E, justamente, não integram o estabelecimento os

bens que fazendo uso das regras gerais da posse, máxime, do artigo 1268.º,

nº1 CC – e já não segundo a presunção especial do artigo 764.º, n.º3 CPC –,

se presuma serem de terceiro.

Legitimidade:

1. Quem tem legitimidade ativa neste procedimento de ilisão da presunção

previsto no n.º4 do artigo 764.º CPC? Na extinta figura do protesto no ato da

penhora, a lei atribuía legitimidade ao executado ou a alguém em seu nome, mas havia

alguma doutrina que defendia que o próprio terceiro poderia protestar no ato da

penhora. No passado, admitimos, no essencial, que esta legitimidade ainda se

mantinha no novo procedimento: o elemento literal, ao contrário do que se passava

antes, não delimitava a legitimidade ativa, o que constituiria, mais do que uma posição

de neutralidade, uma intenção de abandono da restrição do anterior regime. Por

outro lado, pelo elemento teleológico concluía-se que uma penhora de bens de

terceiro à causa prejudicava, naturalmente e antes de mais, o titular terceiro com

direito incompatível – à semelhança do que acontece no regime italiano – mas que o

executado também teria legitimidade para o uso do meio, pela transposição das

rationes que lhe permitiam no Direito anterior protestar no ato da penhora: a defesa

do interesse do terceiro ausente no ato da penhora, que pode ser, por exemplo, o seu

cônjuge ou um familiar seu. No novo Código, o artigo 764.º, n.º3 CPC esclarece que

o requerimento pode ser deduzido pelo executado ou por alguém em seu nome, quer

por terceiro. Retorna-se, portanto, à doutrina anterior de 2003.

2. Já a legitimidade passiva reside no exequente, pois é ele o titular do interesse em

manter a penhora (artigo 30.º CPC).

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Prova:

1. Reflexões prévias: enquanto a presunção do artigo 1268.º, n.º1 CC pode ser afastada,

nos termos gerais, por qualquer meio de prova, a presunção do artigo 764.º, n.º3 CPC

é ilidível apenas com prova documental inequívoca. Daqui resulta que, enquanto em

qualquer outra ação ou procedimento em que se discuta a propriedade sobre um bem

possuído por outrem, se podem usar testemunhas para demonstrar aquele direito, já

naquele procedimento o mesmo terceiro se vê restringido nos meios de prova, sendo-

lhe vedado o uso da prova testemunhal (artigo 392.º CC), o que também significa o

não funcionamento de presunções judiciais, ex vi artigo 351.º CC. Em que consiste

esta restrição? Defendemos em obra anterior que a lei, ao exigir prova documental

inequívoca, não se está a referir nem ao documento em si, nem ao tipo de convicção

a formar no espírito do julgador. Na verdade, sempre que um juiz dá como provado

um facto, afirma-o sem reservas; ou seja, o resultado probatório proprio sensu – i.e., o

resultado que não decorra de um juízo de mera probabilidade firmado sobre uma

mera justificação – é sempre inequívoco. Em suma: o facto ou é dado como provado,

ou não. Assim sendo, o caráter inequívoco só poderia derivar de o documento

apresentado não ser impugnado ou contestado pela contraparte. Sucede que, no

plano do Direito compactado, a expressão prova documental inequívoca tem muitas

semelhanças com a utilizada no regime brasileiro. Ora, no Brasil defende-se que

prova inequívoca será aquela que apresenta um grau de convencimento tal que, a seu

respeito, não possa ser oposta qualquer dúvida razoável ou cuja autenticidade ou

veracidade seja provável, segundo Carreira Alvim. Este dado de Direito compactado

é esclarecedor: a prova em questão é própria de processos de cognição sumária, em

que a prova documental é aligeirada. Mutatis mutandis, a prova inequívoca do artigo

764.º, n.º3 CPC é uma prova sumária, no plano quantitativo, e que por isso não

permite que a decisão final tenha força no caso julgado material. Afinal, estamos

perante um procedimento de cognição sumária.

2. Conclusões: daqui resulta um quadro mais complexo do que antes suponhamos.

Em rigor, apenas se não houvesse audição do exequente é que esta exigência de prova

qualificada faria mais sentido: não sendo ouvida a contraparte o juiz teria de cumprir

um especial dever de cuidado na avaliação da prova. Não é o caso: a ilisão da

presunção do artigo 764.º, n.º3 CPC corre com contraditório prévio. A ser assim, dá-

se um paradoxo: ou o adjetivo inequívoca é redundante pois exige ao tribunal uma

convicção probatória que, como dissemos, é a própria da prova stricto sensu; ou, pelo

contrário, o adjetivo dispensa o juiz de pedir mais prova à parte, i.e., pede-lhe que

atinja a mesma convicção mas com menos prova, e por isso, exige uma qualidade

probatória ao próprio documento tanto no plano formal, como no plano do

conteúdo. Mas o documento não tem de ser formalmente autêntico, podendo ser

simples documento particular. Repare-se, justamente, que a lei não enuncia apenas

prova documental, mas pede uma melhor qualidade. Destas pistas interpretativas

resulta o seguinte:

a. Se o documento enunciar data de aquisição do direito antes da

penhora e não for impugnado, apesar do requerido contestar com

outros fundamentos, ou se até for omitida em absoluto a contestação,

caberá ao tribunal avaliar a qualidade probatória do documento, sem que haja

algum tipo de, respetivamente, admissão por acordo do facto ou confissão

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por revelia, ex vi artigos 574.º, n.º2 e 567.º, n.º1 CPC. A exigência de

inequivocidade da prova significa que o juiz terá o facto por provado apenas

se não der lugar a dúvida razoável, por menor que seja, sobre a genuinidade

do documento ou sobre o teor do seu conteúdo;

b. Se o documento apresentado for impugnado ou contestado pela

contraparte não há prova inequívoca, pois a qualidade probatória perdeu-se

de imediato. Isso pode suceder mesmo que o terceiro apresente documento

autêntico com data anterior à penhora ou documento particular autenticado

ou reconhecido ou apresentado em serviço público em data anterior à

penhora, desde que não haja motivo sério para duvidar da sua genuinidade

ou da validade do ato documentado (Lebre de Freitas). Consoante o valor

probatório do documento apresentado, essa impugnação nuns casos será por

contraprova (artigos 346.º e 374.º CC, por exemplo) e noutros por prova do

facto contrário (artigos 347.º e 372.º, n.º1 CC, por exemplo). Ora, se o

documento autêntico for impugnado pela contraparte, deixa de ser suficiente

de, apenas por si, poder conduzir à procedência da pretensão do terceiro.

Não só ele é inequívoco, mas também não parece que seja de admitir que o

requerente apresente documento que faça prova da sua veracidade (artigo

374.º, n.º2 CC). A natureza sumária do procedimento não parece admiti-lo.

Só isto é suficiente para a pretensão do requerente não poder proceder.

Procedimento: este procedimento inicia-se pela dedução pelo legitimado em simples

requerimento do pedido de levantamento da penhora, acompanhado de documento

suficiente para a prova da titularidade do direito, desde que a sua data seja anterior à da

penhora. Não se estabelece qualquer prazo para a sua dedução, pelo que vale o prazo geral

de 10 dias do artigo 149.º, n.º1, 1.ª parte CPC, a contar do ato de penhora ou, aplicando por

analogia o artigo 344.º, n.º12 CPC, do conhecimento do mesmo, mas nunca depois da venda

ou adjudicação. Há lugar a contraditório por força do artigo 3.º, n.º3 CPC, pelo que o

exequente deverá ser notificado para, querendo, se opor em 10 dias, nos termos do artigo

149.º, n.º1, 2.ª parte CPC. Se o juiz entender pode pedir esclarecimento oral às partes. O

procedimento termina por decisão do juiz de:

1. Procedência, i.e., em que reconhece a existência do direito de terceiro;

2. Improcedência, por impugnação procedente.

A decisão proferida não prejudica a dedução de embargos de terceiro, estatui-se no final do

n.º3 do artigo 764.º CPC. Isso significa que pode, pois, o terceiro que perder nesta sede

colocar o problema naquela outra. Portanto, perante a mesma ofensa judicial ao seu direito,

o terceiro pode optar por qualquer dos meios. Inversamente, o não uso do procedimento

pelo terceiro – porque não pôde ou não quis – não pode ser entendido como uma renúncia

ao direito de usar dos embargos de terceiro, ressalva que se acha no n.º3, in fine, do artigo

764.º CPC. Portanto, esta oposição não é idóneo para fazer caso julgado material. Vincula o

juiz dentro da execução – pois ele não pode contradizer.se em segunda oposição ou atuação

semelhante –, mas não em sede do apenso declarativo de embargos de terceiro.

§58.º - Embargos de terceiro

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Aspetos gerais: os embargos de terceiro podem ser definidos, a título perfunctório, como

a ação pela qual quem não é parte na execução pede a extinção do ato de penhora, apreensão

ou entrega judiciais de bem seu. Trata-se de um meio de defesa perante uma penhora ou

apreensão subjetivamente ilegais e que não se cinge aos estritos limites de uma ação executiva.

Na verdade, a sua necessidade pode colocar-se na execução de uma qualquer medida

processual de ingerência material na esfera jurídica de um terceiro: arresto, arrolamento. No

caso da ação executiva, em especial, os embargos de terceiro situam-se num ponto de tensão

entre execução do direito à prestação e o exercício dos direitos dos sujeitos que não são os

executados. Por um lado, nunca podem ser penhorados bens de terceiro à execução (artigo

735.º. n.º1 e 2 a contrario CPC). Mesmo quando, a título excecional em face dos critérios de

legitimidade do artigo 53.º CPC, um terceiro à dívida pode ser executado (artigo 735.º, n.º2 ,

54.º, n.º2 CPC e 818.º CC), a execução deve ser movida contra ele. Por outro lado, já sabemos

que, ao abrigo do artigo 747.º, n.º1 CPC, os bens do executado são apreendidos ainda que,

por qualquer título, se encontrem em poder de terceiro, sem prejuízo, porém, dos direitos

que a este seja lícito opor ao exequente. Portanto, parece resultar desde logo que embora a

penhora recaia sobre direitos do executado ela pode restringir ou mesmo suprimir direitos

de terceiro que não sejam licitamente oponíveis ao exequente. Cabe, assim, perguntar o que

são bens do executado e direitos que é lícito opor ao exequente pelo terceiro? Apenas respondendo

a estas perguntas, mais adiante, e poderemos apurar se todo o terceiro pode embargar ou se

apenas quem apresente uma posição jurídica com uma certa qualidade. Por outro lado, há

que considerar ainda que os embargos tanto podem ser ações preventivas de uma lesão a um

direito ou posse, como podem ser ações repressivas dessa mesma lesão, como decorre do

artigo 450.º CPC. E deve, ainda, compreender-se a dupla estrutura procedimental dos

embargos: cautelar, numa primeira fase, declarativa, numa segunda. Por último, impõe-se a

análise dos efeitos materiais da sentença de embargos, quer no plano da posse, quer no plano

do direito de fundo. Nomeadamente, deve apurar-se ainda se eles estão abrangidos por um

valor de caso julgado e como se relacionam com os efeitos da decisão de mérito em ação de

reivindicação ou em ação possessória.

Causa de pedir:

1. Dogmática:

a. Conteúdo: na letra do artigo 342.º, n.º1 CPC enuncia-se que a penhora ou

qualquer ato judicialmente ordenado de apreensão ou entrega de bens,

ofender a posse ou qualquer direito incompatível com a realização ou o

âmbito da diligência, de que seja titular quem não é parte na causa, pode o

lesado fazê-lo valer, deduzindo embargos de terceiro. Retira-se daqui que o

autor deve, sob pena de improcedência, alegar e provar os factos seguintes:

i. Penhora ou qualquer ato judicialmente ordenado de apreensão ou entrega de bens;

ii. Ofensa;

iii. Aquisição de direito ou posse;

iv. Incompatibilidade desse direito ou posse com a realização ou âmbito da diligência.

Repare-se que nenhum embargo de terceiro procederá se não se provar o ato

judicial de apreensão ou penhora e, muito menos, que esse ato ofendeu o

direito. Por outro lado, este não pode ser um qualquer direito mas um direito

incompatível.

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b. Apreensão executiva ou cautelar: penhora, apreensão ou entrega de

bens: os embargos de terceiro são um meio de defesa contra certos atos do

Estado: os atos executivos de penhora e, em geral, de apreensão executiva de

bens. Em concreto,

i. Na execução para pagamento de quantia certa, já sabemos que pela penhora

o executado perde a posse efetiva sobre a coisa, nos casos de imóveis

e de móveis, e que na penhora de direitos também há restrições às

faculdades de administração, no caso do estabelecimento, por um

depositário e inclusive apreensão do objeto da prestação.

ii. Na execução para entrega de coisa certa a apreensão e entrega

consubstanciam uma perda absoluta da posse efetiva.

Mas cabem, ainda, os atos de execução das providências cautelares de arresto,

de arrolamento de bens, de restituição provisória da posse e de qualquer

providência cautelar atípica com efeitos semelhantes.

iii. Efetivamente, tanto o arresto quanto o arrolamento implicam o

desapossamento de bens do requerido, ao abrigo da remissão que nos

respetivos regimes se faz para o regime da penhora (artigos 622.º, n.º

CC, 391.º, n.º2 e 406.º, n.º5 CPC). O arresto é mesmo definido como

uma apreensão judicial de bens no artigo 391.º, n.º2 CPC. Por seu

turno, a restituição provisória da posse é, por excelência, uma

apreensão e entrega de um bem (artigo 377.º CPC).

iv. Finalmente, podem ser decretadas providências cautelares inominadas de

apreensão de bens. O próprio Código admite no artigo 379.º CPC que

ao possuidor que seja esbulhado ou perturbado no exercício do seu

direito, sem que ocorram as circunstâncias previstas no artigo 377.º

CPC, seja facultado, o procedimento cautelar comum, mas há

eventualidade.

1. Algumas são providências de apreensão seguida de depósito (de coisas

corpóreas para sua conservação até se resolver o litígio real

que sobre os mesmos exista ou por serem o eventual objeto

de entrega em cumprimento de crédito, de títulos de crédito

de modo a obstar à sua alienação, de quantias até se apurar o

seu destino),

2. Outras são seguidas de entrega (de estabelecimento comercial a

sociedade que alega ser a sua proprietária, havendo risco de

lesão grave, de automóvel à vendedora cessionária, com

reserva de propriedade).

Terceiros podem ver a sua posse ou direitos sobre coisas ofendidas

se aqueles atos se lhes dirigirem. Os embargos são, então, adequados

à tutela do terceiro cujos bens foram arrolados, arrestados, restituídos

ou cautelarmente apreendidos.

v. Diversamente, tratando-se de uma providência cautelar de condenação em

inibição, i.e., que intime o requerido a abster-se da prática de um ato,

ou de condenação em prestação não podem terceiros defender-se das

consequências da respetiva execução. Na verdade, nestas

providências o ato que, eventualmente, prejudica terceiro é um ato

privado, não judicial. Também não constituem atos suscetíveis de

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ofender o direito ou posse de terceiro a diligência de venda judicial

ordenada em ação especial de divisão de coisa comum (artigo 928.º,

n.º2, 2.ª parte CPC) e a hipoteca judicial (artigo 710.º, n.º1 CC),

quando sobre bens de terceiro.

1. Quanto à hipoteca judicial ela não é uma diligência ordenada

judicialmente, mas antes se constitui por ato de registo

promovido pelo credor, nem ofende a posse ou direito.

Naturalmente, o interessado que não tenha sucesso obtido a

revogação da sentença em via de recurso, terá de promover

ação de cancelamento do registo.

2. Já para a venda judicial

1. Foi defendido que como não vincula quaisquer

terceiros não intervenientes no processo, não

constitui verdadeiramente diligência ofensiva da

posse, suscetível de ser atacada por embargos de

terceiro (Ac. RP 28 novembro 1995).

2. Na verdade, os efeitos restritivos dos direitos de

terceiros decorrem da venda e não de uma prévia

apreensão, inexistente neste processo especial. A

reivindicação será a ação correta.

c. Ofensa ou ameaça de ofensa:

i. Objeto; caráter não exclusivamente possessório: o artigo 342.º CPC exige uma

ofensa. Por seu turno, o artigo 350.º, n.º1 CPC autoriza a que posse

ser uma prévia ameaça de diligência judicial ofensiva. Mas em que

consiste esta ofensa? A ofensa decorrerá, necessariamente, de uma

incompatibilidade entre o exercício do direito do terceiro e os efeitos

da penhora. Ou seja: não ser possível ao mesmo tempo o sujeito

terceiro manter a plena afetação do bem jurídico nos termos do seu

direito e manter-se o ato de apreensão executiva ou cautelar. Em

termos simples: ocorrer uma ilegalidade subjetiva da penhora. Há,

assim, que concretizar esta incompatibilidade. Os efeitos da penhora

que são incompatíveis são, prima facie,

1. A indisponibilidade material, traduzida, nomeadamente, na

perda da posse efetiva sobre uma coisa. Recorde-se que até à

Reforma de 1995-1996 os embargos constituíam um estrito

meio de defesa da posse, com exclusão da defesa do próprio

direito real, de propriedade ou outro. Uma quase ação de

restituição de posse por ofensa judicial. Como tal, só se

justificam na penhora de imóveis e de móveis ou mais

latamente, na defesa de direitos que concedam posse. Já

quanto a penhora que não implique uma preensão, máxime,

a penhora de direitos, não há uma perda de posse efetiva, pelo

que a incompatibilidade terá de ser buscada noutros efeitos.

2. Efetivamente, a ilegalidade subjetiva da penhora também se pode

colocar na penhora de direitos. Assim, na penhora de saldos

bancários pode suceder que um sujeito não executado careça

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de defender o seu direito por a penhora incidir sobre a

totalidade de uma conta em que o executado é apenas um dos

contitulares ou, pior ainda, se por engano foi penhorada a

conta de terceiro. Ou basta pensar, ainda, nos casos em que

o terceiro devedor, embora identificado, não foi notificado

(artigo 773.º, n.º1 CPC) ou em que, pura e simplesmente, esse

terceiro não consta dos autos como devedor do executado.

Nessas eventualidades se é certo que o cumprimento da

prestação por um devedor exonera os demais, contudo, a

penhora é ilegal por falta de notificação, i.e., da possibilidade

de negação do crédito, por parte do co-devedor terceiro. Em

termos simples: a penhora não lhe é oponível. Todavia, a

prestação tem de ser cumprida em face do executado, por

depósito da quantia ou da coisa devidas, nos termos do artigo

777.º, n.º1 CPC. Em ambos os casos, o sujeito terceiro deixa

de poder dispor do objeto do seu direito de crédito nos

termos dados pelo seu t´tulo de aquisição. Tal é, portanto,

uma ofenda de um direito por diligência judicial. Ora, o artigo

20.º, n.º1 CRP e 2.º, n.º2 CPC garantem ao terceiro que ele

terá à mão um meio adequado para se opor à apreensão do

objeto do seu direito. Assim, o devedor solidário não

notificado há-de, então, ter meio para se opor à apreensão do

objeto da prestação. Esse meio, à falta de outro na lei,

consiste nos embargos de terceiro, desde a Reforma de 1995-

1996.

Em conclusão: a incompatibilidade ou ofensa integrante da causa

petendi dos embargos de terceiro refere-se a toda e qualquer inibição

total ou parcial, material ou jurídica, do titular de exercer o seu direito

sobre o bem jurídico respetivo. Não se situa, pois, apenas no plano

dos atos materiais. Portanto, atualizando a nossa definição, pode

dizer-se que os embargos de terceiro são uma ação de defesa contra

a execução de um qualquer ato processual (judicial ou não), de

restrição total ou parcial nos poderes de exercício do direito de

terceiro sobre um bem. Deste modo, após 1 janeiro 1997, os

embargos de terceiro abrangem a defesa da posse, mas também

qualquer dieito incompatível com a realização ou o âmbito da

diligência stricto sensu. Por isso, deixaram de ser uma estrita ação

possessória; pelo contrário: no caso da penhora, a ofensa ao exercício

do terceiro pode decorrer dos efeitos restritivos da indisponibilidade

material, como da indisponibilidade jurídica (artigos 819.º e 820.º CC).

ii. Delimitação: o embargante carece de alegar e provar a ofensa: provar

que a penhora na sua realização ou âmbito, abrangeu também o seu

direito. A penhora é ofensiva por força do seu âmbito quando a sua

extensão formal, máxime, levado a registo, é subjetivamente mais

vasta que o âmbito subjetivo legalmente admitido. Aqui a ofensa

presume-se, não carecendo de se demonstrar ofensa concreta, dada a

dificuldade em provar aqueles efeitos de facto. Diversamente, não há

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ofensa da propriedade do senhorio na penhora do direito ao

arrendamento porquanto o direito do senhorio não cabe no seu

âmbito. A penhora é ainda ofensiva se, pese embora o âmbito formal

ser o adequado, a penhora for em concreto realizada contra terceiro.

Aqui o facto concreto da ofensa – o desapossamento – tem que ser

sempre provado, pois formalmente a penhora exclui o direito de

terceiro.

d. Aquisição de titularidade do direito: dupla funcionalidade na

legitimidade processual e na procedência: o embargante deve apresentar

posse ou qualquer direito incompatível de que seja titular. Portanto, o terceiro

deve alegar e demonstrar a titularidade – i.e., o facto de aquisição da

titularidade – da posse ou de direito ofendidos, o que determina, ao mesmo

tempo, legitimidade e causa de pedir. Esta dupla funcionalidade da

titularidade do direito não é estranha na economia do exercício do direito de

ação. Assim, e por exemplo, numa ação de cumprimento de um crédito ser-

se credor na petição inicial preenche a legitimidade ativa, ex vi, artigo 30.º

CPC, se corresponder ao autor da ação. Mas apenas se o autor alegar e provar

que é efetivamente credor é que ele pode aspirar a obter sentença procedente.

Se assim não suceder perderá a ação apesar de se ter conservado ab initio

legitimidade processual ativa. Ora, identicamente, nos embargos de terceiro

ser-se titular do direito ou posse preenche a legitimidade ativa implícita no

dito preceito do artigo 342.º, n.º1 CPC e confirmada na regra geral do artigo

30.º, n.º1 CPC: apenas o titular tem interesse direto em demandar, pois é ele

que, em caso de procedência, colherá benefício da sentença. Por outras

palavras, uma petição deduzida por quem é terceiro à titularidade do direito

deverá se liminarmente indeferida (artigo 345.º, 1.ª parte CPC) por

ilegitimidade já que não há coincidência entre os sujeitos com interesse direto

e os sujeitos da relação jurídica processual. Por outro lado, não se atribui

nenhuma legitimidade indireta no preceito que possa mitigar essa

consequência. Por isso, e dada a excecionalidade da legitimidade indireta

(artigo 30.º, n.º3, 1.ª parte CPC), apenas o titular do direito ofendido tem

legitimidade de embargar de terceiro. Todavia, o autor do pedido de

embargos além de ter inicialmente coincidir com o titular do direito ou posse

incompatível, tal como é por ele configurado na petição inicial, tem o ónus

de ulteriormente cumprir, no plano do mérito, uma condição necessária, mas

não suficiente para a procedência do pedido: provar que é efetivamente titular

do direito ofendido. Se assim não suceder, o embargante perderá a ação

apesar de ter ab initio legitimidade processual ativa. E deste modo se consta

como o mesmo facto – a titularidade do direito – suporta de modo autónomo

a legitimidade e a causa de pedir.

e. Direito incompatível: não basta a inibição, ainda que parcial, ao exercício

do direito pelo terceiro. Já sabemos que essa restrição é um efeito concreto

da penhora, que resulta da incompatibilidade, como se disse, entre a

realização do direito e o âmbito ou realização da apreensão executiva ou

cautelar. Mas a restrição há-de ter um adicional desvalor que a permita

qualificar como ofensa. De outro modo, não se poderia penhorar bens na

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posse de terceiro. Ora, na previsão daquele artigo 342.º, n.º1 CPC enuncia-se

esse desvalor quando se aponta para a qualidade do direito restringido: posse

ou qualquer direito incompatível. O que é um direito (ou posse) incompatível?

i. Critério geral – doutrina: alguma doutrina tem definido direito

incompatível por relação com a venda executiva:

1. Teixeira de Sousa: escreve justamente que os direitos

incompatíveis são aqueles que impedem que os bens

penhorados possam ser incluídos naqueles que, por

pertencerem ao património do executado, devem responder

pela dívida exequenda; como critério concreto são

incompatíveis com a realização ou o âmbito da penhora os

direitos de terceiros sobre os bens penhorados que não se

devam extinguir com a sua venda executiva. Ora, como, por

força do artigo 824.º, n.º2 CC, se extinguem com a venda

executiva além de outros, os direitos reais de gozo que não

tenham registo anterior ao de qualquer arresto, penhora ou

garantia, exceto aqueles que, constituídos em data anterior,

produzam efeitos em relação a terceiros independentemente

de registo então não pode embargar de terceiro o titular de

um direito real de gozo cuja constituição ou registo seja

posterior ao da penhora, do arresto convertido em penhora

ou da garantia real exercida na ação executiva.

Simetricamente, prossegue Teixeira de Sousa, já poderiam

defender os seus direitos em embargos de terceiro o titular de

um direito real de gozo constituído ou registado antes do

arresto, penhora ou garantia real.

2. Lebre de Freitas: entende que o direito incompatível será

todo o direito de terceiro, ainda que derivado do executado,

cuja existência, tido em conta o âmbito com que é feita,

impediria a realização desta função, isto é, a transmissão

forçada do objeto apreendido. Por outras palavras, para

Lebre de Freitas, o direito incompatível com a penhora é

aquele que, por nos termos do artigo 840.º, n.º1 CPC, é

direito incompatível com a transmissão e, como tal, pode

fundar um protesto pela reivindicação da coisa.

Portanto, em qualquer das duas posições doutrinais, a

incompatibilidade deverá ser aferida não pela penhora mas pela

venda executiva. Os direitos incompatíveis serão sempre direitos que

não caducam com a venda e que, por isso, poderão depois ser

opostos ao adquirente.

ii. Critério geral – posição pessoal: impõe-se alguma cautela, em nossa

opinião, nesta questão. É certo que a penhora ao ser instrumental da

venda terá por objeto admissível aquilo que, por sua vez, possa ser

objeto da venda executiva. Esta não pode incidir sobre o que possa

ser um direito incompatível com a transmissão, como decorre

cristalinamente do regime do protesto pela reivindicação do artigo

840.º, n.º1 CPC. Quem pode protestar pela reivindicação poderá, sem

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dúvida, embargar de terceiro. Deste modo, uma penhora

subjetivamente ilegal é uma penhora que ofende direito incompatível

com a transmissão de quem não é parte na causa. Neste sentido,

direito incompatível com a penhora é equivalente a direito

incompatível com a venda. Em suma: se é nula a alienação executiva

de coisa alheia, nula seria a respetiva e prévia penhora. No entanto,

supomos que esta interpretação está incompleta, pois apenas abarca

alguns dos dados do problema. Assim, perfunctoriamente, importa

notar que o que ofende o direito de terceiro não é a venda executiva,

mas a penhora ou, fora da execução para pagamento de quantia, um

ato de apreensão executiva ou cautelar. É esse o ato (pretensamente)

ilegal e ofensivo, como está na letra do artigo 342.º, n.º1 CPC. Por

conseguinte, é esse o ato processual cujo desvalor terá de ser apurado

in casu. Portanto, a lei postula um critério que apele aos efeitos da

penhora (ato atual) e não aos efeitos da venda (ato futuro). Não o

poderia, aliás, ser de outro modo: a alienação executiva, em qualquer

das suas formas – venda, adjudicação ou remição – é, ao momento

da penhora, meramente eventual. A seguir-se a doutrina dominante

alcançar-se-iam resultados não pretendidos. Aliás, um tal critério que

ignore os efeitos do ato atual de apreensão não seria, sequer, aplicável

na ofensa por apreensão não preparatória de venda: nos casos de uma

apreensão em sede de execução para entrega de coisa certa, seja por

arresto, seja por restituição provisória da posse, seja por medida

cautelar inominada, os efeitos translativos e extintivo, do artigo 824.º,

n.º1 e 2 CC estão ausentes necessariamente. Outro critério terá

sempre de ser procurado, o qual, afinal, teria de ser coerente com o

critério dos embargos de terceiro à penhora. Portanto, os efeitos

extintivos da venda executiva decorrentes do regime do artigo 824.º,

n.º2 CC, não relevam para a decisão dos embargos de terceiro. Ora,

na verdade, o objetivo indireto dos embargos de terceiro é reduzir o

objeto da penhora à sua justa medida subjetiva, sem que o direito à

execução do credor atropele os direitos legítimos de terceiro. Mas que

direitos são legítimos e que critério delimita a justa medida? A lei dá

resposta por meios vários indícios literais:

1. Já sabemos que o artigo 747.º, n.º1 CPC autoriza a penhora de

bens do executado ainda que, por qualquer título, se

encontrem em poder de terceiro. Portanto, em regra, os bens

em poder de terceiro são apreendidos; presume-se que a

penhora se trata de inibição lícita ao direito de terceiro. Mas

aquele artigo 747.º, n.º1 CPC faz uma ressalva significativa ao

exercício perante terceiro do direito à execução: sem prejuízo,

porém, dos direitos a que a este seja lícito opor ao exequente.

2. Correlativamente, o artigo 342.º, n.º1 CPC supõe, por

conseguinte, uma penhora que consubstancie uma inibição

ao direito de terceiro: quando se refere posse ou qualquer

direito incompatível a incompatibilidade há-de ser uma

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qualidade do próprio direito ofendido: a oponibilidade

substantiva que causa um desvalor à penhora.

Em conclusão: pode preliminarmente afirmar-se que o terceiro

apresenta um direito incompatível se for um direito oponível à

execução ou procedimento de apreensão por razões de direito

substantivo. Os direitos materialmente oponíveis são:

1. Direitos objetivamente oponíveis: os direitos reais, incluindo a

posse nos termos desses direitos, pois apenas eles são

oponíveis erga omnes, mesmo perante um tribunal;

2. Direitos subjetivamente oponíveis: os direitos de crédito e qualquer

outro direito sobre bens que não integrem a esfera do

executado.

O direito materialmente oponível ao ato judicial é um direito excluído

do seu objeto, qualquer que seja a forma processual que assuma:

penhora, apreensão, despejo, restituição provisória da posse,

arrolamento ou apreensão inominada. Essa oponibilidade pode,

porém, estar temporalmente limitada pela data de produção dos

efeitos da penhora, nos termos dos artigos 819.º e 820.º CC. Quanto

ao artigo 819.º CC basta ilustrar que a posse para ser oponível tem

anterior à penhora contra a qual foram deduzidos os embargos.

Identicamente se decidiu para o arrendamento e para a propriedade.

Ou seja: o direito oponível por razões de Direito substantivo não

pode estar abrangido pela ineficácia cominada pelo artigo 819.º CC.

Também no caso do arresto, dados os seus efeitos antecipadores da

penhora, o direito não pode ser posterior ao arresto, sob pena de não

ter eficácia jurídica (artigos 622.º e 819.º CC). Finalmente, esta

incomparabilidade material do direito de terceiro não é uma

qualidade que releve em sede de legitimidade, mas de procedência do

pedido. Ou seja, o titular de direito compatível pode embargar de

terceiro, mas não obterá a procedência no pedido, salvo se houver

revelia e o respetivo motivo de compatibilidade não for de

conhecimento oficioso. Mais: seria pouco avisado por parte do

legislador atribuir-lhe uma funcionalidade de legitimidade (ou, noutra

abordagem doutrinal, até de interesse processual) quando, como se

verá, não é a mais das vezes pacífica a natureza compatível ou

incompatível de um dado direito ou posse. Em suma: a

incompatibilidade é questão de mérito.

2. Casuística:

a. Direitos reais de gozo:

i. Prima facie, a propriedade e a compropriedade de terceiro não podem integrar

o objeto da penhora, por força do artigo 735.º CPC. Se ainda assim

suceder, então, mesmo que o bem continua a ser de terceiro. O efeito

translativo do artigo 824.º, n.º1 CC, não se pode dar para direitos que

não são os do executado, tal como a venda extrajudicial não faz

extinguir o direito legítimo do proprietário ou titular de direito real.

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Recorde-se a letra da lei: a venda em execução transfere para o

adquirente os direitos do executado sobre a coisa vendida. A

circunstância de o n.º2 do artigo 344.º CPC determinar que os

embargos não podem ser propostos depois de os respetivos bens

terem sido judicialmente vendidos ou adjudicados apenas quer dizer

que há que colocar ação de reivindicação, mas não que o direito tenha

caducado. Naturalmente, que se o título aquisitivo for posterior à

penhora nem sequer há direito de propriedade na esfera jurídica do

terceiro, por força do artigo 819.º CC.

ii. Relativamente a direitos reais de gozo menores, vigora o mesmo princípio:

só é legal a penhora de direito que esteja na titularidade do executado.

No plano da venda executiva tal é correlativo do artigo 824.º, n.º1

CC,, não se pode dar para direitos que não são os do executado. Mas,

por outro lado, o n.º2 do artigo 824.º CC impõe que se atente à data

de constituição do direito real menor e à data da primeira garantia

feita valer na execução. Não para efeitos de admissibilidade ou não

do pedido, como já se viu, mas da procedência do pedido. Vamos ver

como isso opera, usando o usufruto:

1. Se o usufruto for posterior à própria penhora e haja sido constituído

voluntariamente pelo executado: é ineficaz ex vi artigo 819.º CC e,

por isso, inoponível à penhora; ele não por nenhum modo

restringir o âmbito da penhora e, por isso, esta pode ser

realizada restringido ou suprimido o seu exercício; o pedido

será improcedente e a futura alienação executiva será válida;

2. Se for um usufruto anterior à primeira garantia (de exequente ou de

reclamante): não poderá integrar o objeto da penhora e, por

algum modo a realização desta o afetar; e apenas se pode

penhorar a propriedade de raiz; a ocorrer desse usufruto será

porque é registada/constituída penhora com âmbito

excessivo (sobre a propriedade plena) ou porque a realização

concreta da penhora veio impedir o exercício do usufruto

(v.g., mudando fechaduras); o pedido será procedente; a

futura alienação executiva será nula;

3. Se o usufruto for posterior à primeira garantia – v.g. hipoteca – seja esta

do credor reclamante (caso em que o objeto da penhora – feita pelo

exequente, note-se – é menor que o objeto da garantia), seja esta do credor

exequente (caso em que o objeto da penhora abrange a propriedade plena):

apesar de estar sujeito à caducidade do artigo 824.º, n.º2 CC

trata-se de um direito legítimo e oponível à penhora: esta

deve ter em as onerações existentes à sua data; em que termos?

Importa notar, antes de mais, que este direito não pode ser objeto de

nenhuma restrição ou exclusão de exercício por meio da penhora,

sem que o seu titular seja também citado como executado nos termos

do artigo 54.º, n.º4 CPC. Porquê? Porque à data da penhora é um

direito real, oponível erga omnes. A sua caducidade é um facto extintivo

eventual e futuro. Deste modo, não pode haver direitos de terceiro à

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execução que caduquem com a venda sem citação do seu titular,

sendo oponíveis. Importará, assim, distinguir, consoante tem lugar

ou não a sua citação. Se o credor quiser realizar a sua garantia real na

íntegra (i.e., abrangendo a propriedade de raiz e incorporando ainda

o usufruto ou qualquer outro direito real onerador posterior à

garantia), deverá executar ab initio o terceiro, ao abrigo da legitimação

dada pelo artigo 54.º, n.º4 CPC (penhora de bens onerados na posse

de terceiro). Uma vez citado como executado, o terceiro à dívida

ficará duplamente tutelado: pode deduzir oposição à execução,

conforme já estudado, e além disso ficará como depositário se for a

sua casa de habitação efetiva (artigo 756.º,n.º1, alínea a) CPC). Se o

terceiro não for citado o credor apenas pode validamente promover

a penhora e a venda da propriedade de raiz; a oneração não caducará

com a alienação executiva, pois não integra o objeto respetivo. Se

assim suceder serão improcedentes embargos de terceiro, pois a

execução deixará o direito de terceiro incólume. Mas ainda assim a

penhora pode ser ilegal e o usufrutuário ter fundamento substantivo

para embargar de terceiro. Veja-se:

1. Se a penhora abrangeu a propriedade plena o seu âmbito ofende o direito

de terceiro: o pedido será sempre procedente e implica a

redução do âmbito da penhora, salvo se o exequente requerer

a citação superveniente do usufrutuário como executado para

efeitos do artigo 54.º, n.º4 CPC.

2. Se a penhora apenas abrangeu a propriedade de raiz, pode haver ofensa

na sua realização, v.g., impedimento do uso da coisa: o pedido será

procedente também, o concreto ato ofensivo deve ser

suprimido.

Neste sentido vai Lebre de Freitas quando analisa o artigo 824.º,

n.º2 CC e o reclamante apresenta uma garantia mais vasta (abrange a

propriedade plena) que a penhora do exequente (abrange a

propriedade de raiz, com exclusão do usufruto). Escreve o ilustre

mestre que se o credor reclamante não requerer a extensão do objeto

da penhora para o âmbito da sua própria garantia com base no artigo

54.º, n.º2 CPC aceita o credor que o seu crédito seja pago na execução

só pelo produto do direito penhorado substituindo o direito de gozo

do terceiro e conservando o credor a sua garantia, pelo remanescente,

quanto a esse direito. Ao contrário, se o usufrutuário fosse citado ao

abrigo do artigo 54.º, n.º2 CPC passaria a executado e o seu direito

caducaria. Mas isto também vale na doutrina de Lebre de Freitas,

quando a primeira garantia é do exequente e, por isso, a penhora

abrange a propriedade plena: se é certo que o direito do exequente

não pode ser limitado por um direito posterior e que deu certamente

lugar a uma execução movida, nos termos do artigo 54.º, n.º4 CPC,

contra o dever e o terceiro, todavia se o titular não for citado nesses

termos do artigo 54.º, n.º4 CPC, o direito não caduca e o usufrutuário

pode embargar de terceiro, procedentemente, sublinha o autor. Em

todos estes casos, o terceiro tinha um direito válido e eficaz, em face

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do regime do artigo 824.º, n.º2 CC, e por isso oponível à execução.

Confirma-se, pois, em sede de direitos reais de gozo que a

incompatibilidade corresponde à própria oponibilidade do direito à

execução: direito incompatível é direito oponível ao concreto modo

de exercício do direito à execução, e, por isso, excluído em absoluto

do objeto da execução (o direito, maior ou menor, anterior à primeira

garantia) ou, em certos casos, por força do artigo 824.º, n.º2 CC,

excluído em termos relativos do objeto da execução – se o seu titular

não for citado. Esse direito ou nunca é suscetível de caducar com a

venda (se for anterior à primeira garantia) ou pode mesmo caducar

com a venda, mas se e somente se o terceiro for citado. Portanto, se

todo o direito que não caduque com a venda pode fundar embargos

de terceiro procedentes, nem todo o direito ofendido pela penhora

pode vir a não caducar com a venda: também direitos que caducam

com venda são objeto de embargos de terceiro desde que ofendidos

pela penhora. O direito do exequente fica sempre salvaguardado, seja

promovendo a citação do terceiro para estender o objeto da penhora,

seja reduzindo o objeto da penhora, seja pondo termo à ofensa de

facto.

b. Direitos pessoais de gozo: exclusão, salvo na penhora de bens de

terceiro. O regime especial da locação: por regra estão excluídos os

direitos pessoais de gozo, como o comodato e o depósito e a parceria

pecuária. Eles não são oponíveis fora das relações entre titular do direito de

fundo e utilizador da coisa, seja extrajudicialmente, seja judicialmente. O

direito de crédito do exequente prevalece sobre o direito de crédito do

comodatário ou do depositário. Esta é uma legítima relação de prevalência.

Por isso, a sua ofensa em consequência de a coisa lhes ser retirada, é lícita.

Todavia, lê-se no artigo 1133.º, n.º2 CC, que se o comodatário for privado

dos seus direitos ou perturbado no exercício deles, pode usar, mesmo contra

o comodante, dos meios facultados ao possuidor nos artigos 1276.º e

seguintes CC; idênticas soluções se preveem nos artigos 1037.º, n.º2

(locatário), 1125.º, n.º2 (parceiro pensador) e 1188.º, n.º2 CC (depositário).

Daqui decorre que poderão opor, sim, o seu direito quando ele incida sobre

bens que não são do executado, i.e., penhoram-se bens de terceiro, sobre os

quais incidem, por sua vez, aqueles créditos pessoais de gozo. Claramente,

nesta situação, não há uma legítima relação de prevalência do crédito

exequendo sobre o crédito de terceiro, v.g., do comodatário. Idêntica solução

vale para o direito de gozo da coisa fundado em contrato-promessa com

tradição do objeto prometido adquirir (artigo 442.º, n.º2, 2.ª parte e 405.º,

n.º1 CC): tem mera natureza creditícia. Como, seguimos Castro Mendes,

enuncia o Ac. STJ 24 janeiro 1989 o contrato promessa é res inter alias para

o credor exequente. Por isso, não é oponível à execução e, por isso, não é

incompatível, salvo se o executado for diverso do dono da coisa prometida.

Já a locação apresenta um regime diferente, dada a sua oponibilidade assentar

na regra emptio non tollit locatio (artigo 1057.º CC). Alguma doutrina defende

que, por isso, a locação não caduca com a venda executiva, ou, pelo menos,

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os arrendamentos vinculísticos, em razão de proteção do direito ao

arrendamento. Por isso, seriam compatíveis com a penhora. Com o devido

respeito, discordamos: a oponibilidade fundada no artigo 1057.º CC permite

que, como melhor se explicará adiante, em sede de efeitos extintivos da venda

executiva, que a locação deva ser tratada nos mesmos e exatos termos dos

direitos reais de gozo menores, atrás analisados. Não menos e não mais.

Portanto, tanto o aluguer como o arrendamento não materialmente

oponíveis nos mesmos termos que um direito real de gozo menor, mutatis

mutandis, tanto em sede de penhora, como em sede de venda executiva. Por

consequência:

i. Uma locação anterior à primeira garantia não pode integrar o objeto da penhora,

nem por algum modo a realização desta o afetar; se for objeto da penhora,

esta é ilegal e os embargos de terceiros serão procedentes e uma

eventual venda seria nula;

ii. Uma locação posterior à própria penhora é ineficaz ex vi artigo 819.º CC; por

isso, é inoponível à penhora, os embargos de terceiro são

manifestamente improcedente e a futura alienação executiva será

válida.

iii. Uma locação posterior à primeira garantia, sendo esta do exequente, então a

penhora para ser legal ou apenas recai sobre a propriedade de raiz ou extende-se

ao arrendamento se o arrendatário for citado nos termos desse mesmo artigo 54.º,

n.º4 CPC; se assim não for os embargos de terceiro serão procedentes.

Portanto, nos casos i. e ii. o direito de crédito do exequente não prevalece

sobre o direito do locatário, salvo por extensão, no caso iii.

c. Direitos reais de garantia: exclusão, salvo se o objeto da penhora da

garantia for de terceiro: são oponíveis à execução os direitos reais de

garantia, dada a sua natureza de causa legítima de preferência, nos termos do

artigo 604.º, n.º2 CC. Concretizando, a execução não os pode restringir ou

suprimir sem prévia citação do seu titular: tal como sucede com os direitos

reais menores de gozo, a caducidade das garantias reais supõe uma prévia

citação. Todavia, essa citação é em sede de reclamação de créditos (artigo

786.º, n.º1, alínea b) CPC) e não por meio de embargos de terceiro. Mas

mesmo essa oponibilidade, exigente de uma prévia citação, é limitada. É que

se o credor terceiro não for citado para a reclamação, não pode embargar de

terceiro. Pode, sim, arguir a falta de citação, ao abrigo do n.º6 do mesmo

artigo. Arguida essa falta de citação, a venda pode ou não vir a ser anulada,

como se decorre de uma rápida leitura desse mesmo n.º6 do artigo 786.º CPC,

em que se impõe a extinção da garantia caso o exequente não haja sido o

exclusivo beneficiário. Este entendimento é válido para todas as garantias

reais, incluindo o direito de retenção. Neste particular, também o titular do

direito de retenção do promitente-comprador que obteve tradição da coisa

prometida – garantia do crédito resultante do não cumprimento imputável à

outra parte, nos termos do artigo 442.º CC (cf. artigo 755.º, alínea f) CC) – se

terá de fazer valer em concurso com os demais credores com garantia real

relativamente ao bem penhorado. Ou seja, também esse direito é oponível à

execução somente através da reclamação de créditos, não sendo os embargos

de terceiro o meio processual adequado à tutela do respetivo crédito. De

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outro modo, o crédito garantido pelo direito de retenção seria sempre

oponível aos demais não somente na graduação de crédito mas no próprio

exercício do direito à execução ao impedir a penhora causada por créditos

concorrentes o que não tem fundamento substantivo. A circunstância de a

retenção permitir o controle material sobre a coisa não coloca o retentor –

máxime, o promitente-comprador – numa posição materialmente diferente

da do credor pignoratício. Discute-se, ainda assim, se for penhorado bem de

terceiro se poderá embargar de terceiro o credor desse terceiro, com garantia

real sobre esse mesmo bem:

i. Note-se que não sendo ele credor do executado, não será citado para a reclamação

de créditos. Por isso, e bem, tanto Alberto dos Reis, Castro Mendes, Teixeira de

Sousa, quanto Lebre de Freitas respondem afirmativamente. Sem dúvida que

o seu direito é materialmente oponível e nem sequer será ineficaz

após a penhora ou extinto pela venda.

ii. Todavia, haverá que apurar sempre o requisito da ofensa sob pena de

improcedência do pedido. Repare-se:

1. É certo que os efeitos de caducidade advenientes da venda executiva não

tocam os direitos de terceiro à execução: transmite-se o direito do

executado e caducam garantias de credor privilegiado com

uma garantia sobre bens do executado; não se transmite o

direito de terceiro, nem tampouco caducam as garantias do

credor privilegiado desse terceiro.

2. Mas falta saber se os efeitos da penhora restringem de facto o exercício

das garantias reais de terceiro.

1. A ofensa parece que ocorre se a garantia é

acompanhada de posse sobre o bem objeto da

garantia: nessa eventualidade, a constituição da posse

a favor do Estado é incompatível com a posse do

credor garantido na sua realização;

2. Diversamente, parece suceder se a garantia não

implicar posse, mas registo: aqui a ofensa, a existir,

não decorrerá sequer da ineficácia relativa dos atos de

disposição e oneração (artigos 819.º e 820.º CC), pois

que, como se disse essa ineficácia não abrange os

direitos de terceiro, nem tolhe o titular de exercer o

seu direito sobre a coisa por meio de atos materiais.

3. Todavia, o registo da penhora sobre bem dado em

garantia a terceiro pode, potencialmente, restringir

essa garantia, ao conduzir à venda, sendo certo que

ao terceiro não é dado reclamar o seu direito. Por isso,

o meio adequado a tutelar a sua posição é o embargo

de terceiro.

d. Direitos reais de aquisição: em sede de direitos reais de aquisição, os

termos do problema são essencialmente idênticos, ao observado no campo

dos direitos reais de garantia. Estamos, nomeadamente, a falar da promessa

de aquisição com eficácia real (artigo 413.º CC) e das preferências reais a favor

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de terceiro. A sua existência, ainda que o bem já esteja na posse desse terceiro,

não tolhe a legalidade da penhora, graças ao artigo 747.º, n.º1 CPC. Trata-se

de direitos que, dada a sua realidade, também são materialmente oponíveis à

execução que não os pode restringir ou suprimir sem citação do seu titular.

Ora, essa citação é, justamente, para o respetivo exercício: da preferência real

(artigo 819.º CPC), do direito à execução específica (artigo 831.º CPC). Na

perspetiva da eventual venda executiva, esses direitos apenas caducam se o

seu titular for assim citado, pois só assim aquela lhes pode ser validamente

oposta. Por isso, a falta dessa citação importa direito a ação de preferência

(artigo 819.º, n.º1 CPC conjugado com o artigo 1410.º CC) ou ação de

execução específica, ainda que depois da transmissão do bem a terceiro.

Trata-se, pois, de uma oponibilidade ou incompatibilidade plena mas que é

feita por uma ação autónoma e não por meio de embargos. Isto porque a

incompatibilidade funcional entre a penhora e o direito real de aquisição

passa pela necessidade de exercício da preferência. Não se trata aqui da

ofensa paralisante do seu exercício, essa, sim, própria do âmbito dos

embargos. Já se o bem penhorado for propriedade de terceiro, e não do

executado, tampouco será procedente uma ação de preferência porquanto o

bem não foi validamente vendido – era de terceiro – e, por isso, ele não pode

preferir numa venda nula.

i. Nessa eventualidade, Lebre de Freitas defende que o promitente-

comprador, pode embargar de terceiro, ao ser titular de um direito

incompatível na exata medida em que é incompatível o direito do

promitente-vendedor.

ii. Concordamos plenamente pois trata-se de direitos materialmente

oponíveis – nem sequer ineficazes após aquela penhora ou extinto

pela venda – mas, porém, também quanto a eles haverá que apurar

sempre o requisito da ofensa sob pena de improcedência do pedido.

Quanto a isso remetemos para o que dissemos em sede de ofensa das

garantias reais de terceiro sobre bens penhorados a terceiro.

e. Expectativas reais de aquisição: quid iuris se a titularidade do direito real

de gozo estiver sujeita a uma condição? Os casos paradigmáticos são a venda

com reserva de propriedade ou a cessão do gozo em regime de locação

financeira. Como se sabe nestas situações o objeto da penhora possível

consiste na expectativa real de aquisição incorporada na posição jurídica do

comprador-reservatário ou do locatário financeiro – i.e., o executado –, ao

abrigo do artigo 777.º CPC. A expectativa seria, pois, oposta à execução nos

termos e limites desse regime de penhora. Naturalmente, que uma

expectativa oponível à execução deve ser anterior à penhora, por força do

artigo 819.º CC. Se for posterior os embargos serão improcedentes. Dito isto,

importará distinguir (artigo 778.º, n.º2 CPC):

i. Quem é o terceiro; e

ii. Se houve tradição da coisa.

O terceiro embargante pode ser o proprietário ou vendedor-

reservatário/locador e o executado o comprador-reservatário/locatário,

respetivamente. O direito de propriedade daquele é, como sabemos,

incompatível, i.e., oponível, dada a natureza real. Por outro lado, sendo

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terceiro e titular desse direito ele apresenta legitimidade. Mas serão

procedentes eventuais embargos da sua parte?

i. Tanto Teixeira de Sousa como Lebre de Freitas, como alguma

jurisprudência, entendem que o proprietário pode embargar de

terceiro.

ii. Por nossa parte, pensamos que sim, pois é um direito de natureza

real, mas – questão diversa – parece-nos que apenas mediante

alegação e demonstração de ofensa é que os embargos serão

procedentes, o que pode nem sequer suceder. Na verdade, se tiver

lugar uma verdadeira e rigorosa penhora de expectativas de aquisição,

nos termos do artigo 778.º CPC, o proprietário, vendedor-

reservatário ou locador, não verá o seu direito ofendido. E não

havendo esta ofensa, vale plenamente o sentido jurisprudencial de

que a entidade locadora não pode, com fundamento no seu direito

de propriedade, embargar de terceiro. Ao contrário, ofensa existirá

sempre – i.e., haja o bem já sido entregue ao executado ou não – que

o âmbito subjetivo da penhora for maior que o âmbito legalmente

admissível, i.e., se for registada penhora sobre a própria propriedade

do terceiro. Mas, se houver tradição do bem para o executado, pode

adicionalmente, ocorrer ofensa do direito do terceiro se, apesar da

penhora ser registada ou se referir à expectativa, todavia na realização

da penhora se constituir posse efetiva sobre o bem, sendo imóvel

(artigo 757.º, n.º1 CPC), eventualmente mediante apreensão, sendo

coisa móvel (artigo 764.º, n.º1 e 768.º, n.º2 e 3 CPC).

Simetricamente, o terceiro embargante pode apresentar-se com comprador-

reservatário ou locatário, sendo o executado o próprio vendedor-reservatário

ou locador.

i. Para Teixeira de Sousa o comprador pode sempre embargar para,

opondo a expectativa de aquisição, salvaguardar a sua subsistência da

sua posição (evitando a sua caducidade) após a venda.

ii. Lebre de Freitas vai no mesmo sentido, mas pelo prisma

possessório.

iii. Pensamos que manifestamente aquele terceiro terá um direito

incompatível dada a natureza real da expectativa de aquisição. Mas é

necessário ainda que a penhora haja produzido ofensa à expectativa

para poder obter ganho nos embargos de terceiro. Ora, novamente,

a ofensa poderá decorrer da realização da penhora, caso o terceiro

ainda tenha a coisa consigo, ou/e também do âmbito da mesma,

mesmo que já tivesse entregue o bem ao executado. Em qualquer

circunstância a expectativa não caducará com a venda, pois,

justamente, está fora do âmbito válido de penhora. Nem a expectativa

integra os direitos do executado, objeto de transmissão, nem um

direito de terceiro, garantia ou de aquisição, caduca se a penhora não

for válida. Mas pode haver lugar a embargos de terceiro, como se vê.

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Diferentemente, as meras expectativas e os direitos futuros não podem

fundar embargos de terceiro. É que não se trata nem de direitos subjetivos,

nem correspondem a interesses legalmente protegidos.

f. Direitos de crédito e direitos sobre universalidades: antes da reforma dos

embargos de terceiro em 1995-1996, alguma jurisprudência negava que o

terceiro credor pudesse embargar, por não se tratar de posições jurídicas que

conferiam posse. Perdido o caráter estritamente possessório dos embargos

de terceiro, pode atualmente afirmar-se que uma penhora pode ofender o

direito de crédito, nomeadamente, quando:

i. O terceiro co-credor não for notificado da penhora do crédito;

ii. A coisa depositada objeto de prestação não seja a devida mas de terceiro;

iii. Seja estabelecimento comercial, saldo bancário ou quota em sociedade;

iv. O crédito penhorado tiver por credor um terceiro e não o executado, porque, por

exemplo, antes da penhora, este o cedera àquele.

Já o promitente-comprador sem eficácia real e sem coisa entregue tem um

mero crédito – logo, não materialmente oponível – que tem o executado

como devedor e, portanto, concorrendo com o credor exequente. É um

direito que se extinguirá com a venda executiva, como efeito secundário da

extinção do direito do executado (artigo 824.º, n.º1 CC). Carecerá de uma

tutela processual que, não sendo a da reclamação, será a execução específica

ou a indemnizatória, consoante as circunstâncias (artigo 442.º e 830.º CC).

Diferente é o caso de a penhora incidir sobre um crédito à entrega de coisa

ou de quantia pecuniária (artigo 777.º, n.º1, alínea b) CPC), e se apreenda este

objeto da prestação antes do vencimento, i.e., da transmissão da propriedade

do debitori debitoris para o executado. Naturalmente, que aí o terceiro vê o seu

direito ofendido, mas trata-se, não de um crédito, mas, eventualmente, da

propriedade sobre a coisa ou dinheiro.

g. Posse incompatível: a posse é a posição ativa cujo conteúdo é o exercício

de poderes de facto próprio e identificadores de um direito real de gozo. O

artigo 342.º CPC admite que o fundamento da incompatibilidade seja,

precisamente, a titularidade possessória. Sendo esta a causa de pedir, quem

deduz embargos de terceiro tem de alegar e provar a posse, com os

pressupostos materialmente exigidos. Além disso, apenas obterá provimento

se a posse for anterior à penhora ou diligência contra a qual foram deduzidos

os embargos – de outro modo não será oponível, porquanto sem efeitos

perante a execução. É absolutamente irrelevante para efeitos de

oponibilidade da posse à penhora ou ato judicial de apreensão se essa posse

é causal ou se é formal, i.e., se o possuidor é o efetivo titular ou é, apenas, um

aparente (por via da posse, justamente) titular do direito de fundo. E se o

embargante se pode basear em posse efetiva, todavia também basta uma

posse jurídica, não efetiva, como na sucessão na posse (artigo 1255.º CC) e

no constituto possessório (artigos 1263.º e 1264.º, alínea d) CC), seja essa

posse efetiva exercida diretamente ou por intermédio de outrem. Mas

também é irrelevante se o embargante é o possuidor originário ou se é

possuidor derivado por sucessão na posse (artigo 1253.º CC) ou por título

diverso (artigo 1256.º CC). Finalmente, a posse incompatível é-o mesmo

quando é exercida por intermédio de outrem, em nome do embargante, como

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o autoriza do artigo 1252.º CC. Em suma: a posse é sempre posse. A

diferença pode, sim, é exprimir-se no plano da procedência da causa, que não

se confunde com o plano da legitimatio ad causam. Tratando-se de posse formal

a alegação e prova da titularidade do direito de fundo a favor do executado

embargado terá o valor de facto que ilide a presunção legal do artigo 1268.º,

n.º1 CC, obstando à procedência do pedido de levantamento da penhora.

Sendo-lhe oposto que já deixou de gozar a coisa penhorada em favor do

executado terá, para obter provimento, de, por exemplo, alegar e provar a

posse precária do executado, ou que este possui em nome alheio. Havendo

sucessão na posse, nos termos do artigo 1253.º CC, o sucessor embargante

pode, eventualmente, invocar uma data de constituição da posse mais antiga

do que a correspondente ao estrito facto sucessório. Por seu turno, na

transmissão na posse se é certo que o possuidor derivado pode juntar a sua

posse à do antecessor, ao fazê-lo sujeita-se aos caracteres de menor âmbito –

máxime, má fé, não título –, se a posse do antecessor for de natureza diversa

da sua. A posse incompatível, exigida no artigo 342.º, n.º1 CPC, é a posse

correspondente a um direito materialmente oponível à apreensão – em

princípio, um direito real de gozo e, residualmente, direitos reais de garantia

e de aquisição quando o executado não seja o credor garantido ou a

contraparte no contrato – e, por isso, excluído em absoluto do objeto da

execução. Inclui-se aqui a posse sobre títulos de crédito. Não há posse

incompatível nos termos de um direito compatível. Em face da letra do artigo

342.º CPC, o terceiro terá, assim, ao seu dispor causas de pedir alternativas:

tanto pode alegar e demonstrar o seu direito incompatível, como pode alegar

e demonstrar a posse respetiva. Portanto, os embargos de terceiro são meio

de defesa tanto da posse, como de qualquer direito incompatível com a

realização ou o âmbito da diligência judicial. Invocando direito incompatível,

o terceiro deverá alegar e demonstrar os factos de aquisição da titularidade

do direito, i.e., o facto jurídico de que deriva o direito real (artigo 581.º, n.º4

CPC). Invocando posse incompatível, o terceiro deverá alegar e demonstrar

os factos de aquisição da posse. No plano probatório, essa posse

incompatível fará, instrumentalmente, presumir a titularidade do direito

correspondente aos poderes de facto, nos termos do artigo 1268.º, n.º1 CC,

o que, inversamente, pode ser usado como facto probatório quando a causa

de pedir seja o direito de fundo. Sendo-lhe oposto que já deixou de gozar a

coisa penhorada em favor do executado terá, para obter provimento, de, por

exemplo, alegar e provar a pose precária do executado, ou que este possui em

nome alheio. Havendo sucessão na posse, nos termos do artigo 1253.º CC, o

sucessor embargante pode, eventualmente, invocar uma data de constituição

da posse mais antiga do que a correspondente ao estrito facto sucessório. Por

seu turno, na transmissão na posse se é certo que o possuidor derivado pode

juntar a sua posse à do antecessor, ao fazê-lo sujeita-se aos caracteres de

menor Âmbito – máxime, má fé, não título –, se a posse do antecessor for

de natureza diversa da sua. A posse incompatível, exigida pelo artigo 342.º,

n.º1 CPC, é a posse correspondente a um direito materialmente oponível à

apreensão – em princípio, um direito real de gozo e, residualmente, direitos

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reais de garantia e de aquisição quando o executado não seja o credor

garantido ou a contraparte no contrato – e, por isso, excluído em absoluto

do objeto da execução. Inclui-se aqui a posse sobre títulos de crédito. Não

há posse incompatível nos termos de um direito compatível. Em face da letra

do artigo 342.º CPC, o terceiro terá, assim, ao seu dispor causas de pedir

alternativas:

i. Tanto pode alegar e demonstrar o seu direito incompatível: invocando-o, o

terceiro deverá alegar e demonstrar os factos de aquisição da

titularidade do direito, i.e., o facto jurídico de que deriva o direito real

(artigo 581.º, n.º4 CPC);

ii. Como pode alegar e demonstrar a posse respetiva: o terceiro deverá alegar e

demonstrar os factos de aquisição da posse.

No plano probatório, essa posse incompatível fará, instrumentalmente,

presumir a titularidade do direito correspondente aos poderes de facto, nos

termos do artigo 1268.º, n.º1 CC, o que, inversamente, pode ser usado como

facto probatório quando a causa de pedir seja o direito de fundo. O

fundamento de fundo é melhor se o terceiro tiver registo a seu favor de outro

modo pode perder-se numa probatio diabólica. O fundamento possessório é,

justamente, aconselhável quando, não havendo registo do direito, se possa

provar mais facilmente a posse. Tal é particularmente evidente na prova da

propriedade sobre bens móveis. Ademas, a posse beneficia de um conjunto

de presunções quanto à sua existência:

i. Em caso de dúvida, presume-se a posse naquele que exerce o poder de facto (artigo

1252.º, n.º2 CC), sem prejuízo do disposto no n.º2 do artigo 1257.º

CC;

ii. Se o possuidor atual possuiu em tempo remoto, presume-se que possuiu igualmente

no tempo intermédio (artigo 1254.º, n.º1 CC);

iii. A posse atual não faz presumir a posse anterior, salvo quando seja titulada;

neste caso, presume-se que há posse desde a data do título (artigo

1254.º, n.º2 CC).

Apenas em concreto, o terceiro poderá apurar qual o melhor fundamento,

mas é perfeitamente admissível que invoque ambas as causas de pedir, uma a

título principal e outra a título subsidiário, para a improcedência do pedido

fundado na primeira.

h. Mera detenção: a detenção está, manifestamente, excluída como causa de

pedir dos embargos de terceiro. Há simples detenção quando havendo

corpus falta o animus possedendi. A razão da sua exclusão do âmbito do artigo

342.º CPC, reside em a detenção não fazer presumir o direito de fundo, i.e.,

não beneficiar do artigo 1268.º, n.º 1 CC. Aplicando o artigo 1253.º CC, pode

dizer-se que estão assim arredados da tutela do artigo 342.º CPC, os seguintes:

i. Sem intenção de agir como titulares do direito;

ii. Exercendo atos de mera tolerância;

iii. Possuidores em nome alheio.

A posse em nome alheio exige alguma atenção. Trata-se de representação na

posse em que os poderes integradores do corpus são exercidos por outrem

(artigo 1252.º, n.º1 CC) cuja atuação é imputada ao representado. O

representado é o possuidor em nome próprio, enquanto o representante é o

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possuidor em nome alheio. Este representante, apesar de ter corpus, não é

possuidor, já que o uso que faz da coisa se enquadra numa situação precária,

cuja função é permitir a não titulares do direito o uso de coisa alheia, mas não

a aquisição do respetivo direito. Estas situações resultam de um acordo entre

o titular e o utilizador, o qual se consubstancia em atos ou negócios jurídicos

que constituem para o utilizador um justo título ou causa de detenção de

coisa alheia, enquanto representantes. Sem prejuízo dos contratos

constituídos ao abrigo da autonomia privada (artigo 405.º CC), estão

tipificadas na lei situações como fontes de posse em nome alheio, em

resultado de um acordo entre o titular e o utilizador:

i. Representação pura ou integrada: a representação, em geral (artigo 258.º

CC), o contrato de trabalho (artigo 1152.º CC), o mandato (artigo

1157.º CC);

ii. Direitos pessoais de gozo: a locação – aluguer e arrendamento – (artigos

1022.º e 1023.º CC), a parceria pecuária (artigo 1121.º CC), o

comodato (artigo 1129.º CC), o depósito (artigo 1185.º CC), o gozo

por tradição da coisa objeto de contrato-promessa (artigo 442.º, n.º2,

2.ª parte CC e 405.º, n.º1 CC) e por compra com reserva de

propriedade (artigo 1406.º, n.º2 CC);

iii. Direitos reais de gozo não exclusivo: a compropriedade (artigo 1406.º, n.º2

CC), o usufruto (artigo 1439.º CC), o uso e habitação (artigo 1484.º

C), a superfície (artigo 1524.º CC), as servidões prediais (artigo 1543.º

CC);

iv. Direitos reais de garantia: o penhor de coisas.

Ora, há três dúvidas que se levantam em sede de embargos de terceiro:

i. Se o possuidor em nome alheio poderá ser equiparado ao possuidor e atuar

processualmente em nome próprio;

ii. Se o possuidor em nome alheio poderá, ao invés, atuar como representante

processual do possuidor;

iii. Se certas posições jurídicas especialmente tuteladas são passíveis de ser qualificadas

como possessórias ou e não como mera detenção.

Importa distinguir e esclarecer alguns pontos na relação entre detentor e

possuidor, para respondermos a estas questões. Quando falamos em posse

em nome alheio, estamos a aponta para uma relação de sobreposição de

direitos em que o representado na posse é o titular de um direito real de gozo

(máxime, a propriedade) e o representante na posse (i.e., o detentor) é o

titular de um direito de gozo, real ou não. Ora, atentando à segunda pergunta

(ii.), devemos dizer que de facto legal de o detentor representar o proprietário

na posse não decorre que o possa representar na dedução de embargos de

terceiro de defesa do direito de propriedade, ao contrário do que alguma boa

doutrina tem pretendido. Ou seja: das normas materiais não decorre uma

legitimidade secundária, para efeitos do artigo 30.º, n.º3, 1.ª parte CPC,

conjugado com o n.º1 do artigo 342.º CPC. Tampouco decorre deste mesmo

artigo 342.º, n.º1 CPC, como já o dissemos. A disponibilidade do direito

maior reside no seu titular, não cabendo ao seu representante na posse dispor

desse mesmo direito por via judicia. Justamente tem sido esta também o

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sentido da jurisprudência. O que se afigura na lei são deveres de aviso do

detentor ao possuidor. O comodatário tem uma tal obrigação legal de avisar

imediatamente o comodante, sempre que tenha conhecimento que a ameaça

algum perigo ou que terceiro se arroga direitos em relação a ela, desde que o

facto seja ignorado do comodante (artigo 1135.º, alínea g) CC). O locador

também tem a obrigação de avisar imediatamente o locador sempre que tenha

conhecimento de vícios na coisa ou saiba que a ameaça algum perigo ou que

terceiros se arrogam direitos em relação a ela, desde que o facto seja ignorado

pelo locador (artigo 1038.º, alínea b) CC). Se não pode embargar em

representação do possuidor, pois é a este que se refere a detenção,

apresentará, então, o possuidor em nome alheio legitimidade direta para

embargar por si próprio, i.e., um direito incompatível ou uma posse em nome

próprio incompatíveis? A resposta é sim, se o respetivo direito que legitima

o corpus for um direito materialmente oponível, ou seja, um direito real. É o

que sucede, justamente, com os titulares de direitos reais de gozo não

exclusivos: a compropriedade (artigo 1406.º, n.º2 CC), o usufruto (artigo

1439.º CC), o uso e habitação (artigo 1484.º CC), a superfície (artigo 1524.º

CC), as servidões prediais (artigo 1543.º CC). Eles são possuidores em nome

alheio quanto à propriedade, mas possuidores em nome próprio quanto ao

direito real de gozo não exclusivo. Por conseguinte, esses sujeitos podem

embargar de terceiro tendo por causa de pedir tanto o direito real, como se

viu atrás, como a posse nos termos desse direito. Mas mesmo aqui não pode

ser um direito oponível por outro modo, como seja uma garantia real, caso

em que está reservada a reclamação de créditos. Mas se o respetivo direito

que legitima o corpus for um direito não materialmente oponível já não tem

legitimidade para embargar. No estado atual da doutrina civilista, pode

dizer.se que não são oponíveis à execução nem a parceria pecuária (artigo

1121.º CC), nem o comodato (artigo 1129.º CC), nem o depósito (artigo

1185.º CC). Ou seja, os direitos pessoais de gozo. Os respetivos titulares são

possuidores em nome alheio quanto à propriedade, tão só. Quanto a terem

posse pelo seu próprio direito, ainda que a tivessem – o que é controverso –

sê-lo-iam nos termos de um direito de oponibilidade restrita, de crédito, não

real. Diversamente, por via da regra da emptio non tollitis locatio (artigo 1057.º

CC) a posição do locador é oponível à execução nos mesmos termos de um

direito real, i.e., quando não seja abrangida pela ineficácia imposta pelo artigo

819.º CC. O locatário é possuidor em nome alheio quanto à propriedade e

possuidor em nome próprio quanto à locação. Veja-se o que já atrás

escrevemos sobre essa oponibilidade. Esta nossa última qualificação dos

direitos pessoais de gozo embate, aparentemente, no regime legal.

Efetivamente, como já dissemos, vários preceitos preveem que o titular de

um direito pessoal de gozo possa usar de meios de defesa da posse, mesmo

quanto ao titular do direito maior: artigos 1037.º, n.º2 (locatário), 1125.º, n.º2

(parceiro pensador), 1133.º, n.º2 e 1188.º, n.º2 CC (depositário). Ora, dada a

referência a embargos de terceiro no artigo 1285.º CC, poderão, por

conseguinte, embargar de terceiro, como alguns acórdãos já decidiram. Serão,

afinal, e mais genericamente, possuidores?

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i. Castro Mendes, entendia que apesar dessa referência, ao locatário,

ao parceiro, ao comodatário e ao depositário que usassem os

embargos de terceiro ser-lhe-ia oposta a exceptio dominii. O depositário,

por exemplo, teria uma posse desinteressada não se podendo opor

com sucesso à penhora em que o depositante seja executado. É que

mesmo que a coisa estivesse alugada ou comodatada com um prazo

a terminar depois do momento da penhora se, por um lado, a

admissibilidade da penhora imediata representaria a imposição de um

sacrifício ao credor em benefício de outro, quebrando a par conditio

creditorum, todavia, a penhora seria o exercício da propriedade em sub-

rogação, prevalecente sobre o mero direito obrigacional do terceiro.

Ora, deve notar-se que não só a penhora não é um modo de sub-

rogação dos direitos do executado sobre o bem, como se o fosse as

normas que preveem a oponibilidade daqueles direito ao próprio

titular do direito de fundo permitiriam não apenas o uso dos

embargos mas a sua prevalência em face do sub-rogado.

ii. Já Anselmo Castro atribuía àqueles possuidores em nome alheio o

recurso a embargos de terceiro. Posteriormente, também Rosário

Ramalho o fez com base na posição de Oliveira Ascensão, de que se

é verdade que arrendatário, parceiro, comodatário e depositário

possuem em nome alheio o direito legitimante do locador,

comodante e depositante (máxime propriedade), contudo são

possuidores em nome próprio nos termos do respetivo direito; ou

seja: são titulares também de uma posse digna de tutela.

iii. Por seu turno, Lebre de Freitas entende que se a lei civil faculta

expressamente meios de defesa da posse àqueles possuidores em

nome alheio dificilmente se sustentará que lei quisesse excluir os

embargos de terceiro. O direito de ação de embargos de terceiro

fundar-se-ia na especial relevância do seu interesse próprio em

continuar no gozo da coisa, conjugado com a presunção de que a

titularidade do direito real, correspondente à posse da pessoa em

nome de quem possuem, radica efetivamente nesta. No entanto,

conclui que se esta pessoa, em cujo nome possuem, for o executado

não são admissíveis embargos de terceiro pois que no conflito entre

direito real (constituído através da penhora) e o direito de crédito,

este terá de ceder perante o primeiro. Diversamente, poderão

embargar como tutela direta do interesse do terceiro (pessoa diversa

do executado).

iv. Articulando, agora em sede possessória, o que atrás dissemos

sobre a oponibilidade destes direitos de crédito ao credor

exequente, importa frisar duas linhas de raciocínio:

1. Os titulares dos direitos pessoais de gozo a terem posse pelo seu próprio

direito seria nos termos de um direito de oponibilidade restrita, de crédito,

não real. Justamente, o que sucede é que os preceitos que

preveem o uso dos meios de defessa da posse o fazem para

consagrar modos de o credor do gozo da coisa, como, por

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exemplo, o comodatário, poder fazer valer o seu direito à

prestação. Neste sentido, trata-se de ações de cumprimento e

não de ações reais. O uso dos meios possessórios é feito por

equiparação no plano dos atos de recuperação do gozo, mas

não por se tratar de posse. O credor goza a coisa, sem a

possuir. Detém-na, apenas. Tendo por fundamento de direito

de crédito naturalmente que este é oponível inter partes –

mesmo contra o comodante, depositário, parceiro

proprietário. Ao contrário, já não é oponível a terceiros que

apresentem melhor direito, máxime ao credor exequente ou

ao tribunal ou ao agente de execução. Este fará a penhora

ainda que o bem esteja em poder desses credores da prestação

de gozo da coisa, nãos e tratando que a este seja licito opor

ao exequente (artigo 747.º CPC). Portanto, a razão pela qual

o crédito do terceiro cede perante o crédito do exequente é

que ele não lhe é oponível por não ter natureza real. Mas a

ser assim, não se explicaria porque se dá prevalência de um

crédito – o exequendo – sobre outro crédito – o de terceiro

comodatário ou depositário –, quando isso posterga a

igualdade dos credores. A razão decorre da opção legislativa

de a execução não ser universal, mas singular e em que os

créditos concorrentes apenas são oponíveis em sede de

reclamação. A verdade é esta: o crédito primeiramente

executado prevalece sobre os restantes se estes não

beneficiarem de garantia real. Por isto, será improcedente o

embargo deduzido pelo comodatário e sujeitos semelhantes

pois nem o seu direito é incompatível, nem apresentam posse.

2. No entanto, deve admitir-se que, como já se viu, estes direitos possam ser

oponíveis ao credor exequente quando a penhora tenha caído sobre bens

que não são do executado. Nessa eventualidade, a respetiva

detenção merece uma específica tutela como consagram os já

referidos artigos 1037.º, n.º2 (locatário), 1125.º, n.º2 CC

(parceiro pensador), 1133.º, n.º2, e 1188.º, n.º2 CC

(depositário). Adaptando, agora para a posse, o que atrás

escrevemos, nessas situações não há uma legítima relação de

prevalência entre o crédito exequendo e o crédito do terceiro,

v.g., do comodatário, ao qual a detenção se refere.

Raciocínios semelhantes regem a matéria da detenção nos termos de outros

direitos pessoais de gozo atípicos como o do promitente comprador ou do

comprador reservatário que já receberam a coisa antes do contrato de compra

e venda final. Trata-se também de posse em nome alheio e já sabemos que o

respetivo direito não é oponível à execução e, por isso, não é incompatível.

No plano possessório, ambos são detentores em nome alheio: o terceiro

possui o objeto do contrato em nome de outrem, mais não sendo do que um

mero representante do verdadeiro possuidor – o proprietário –, em cuja

esfera jurídica produzem efeitos quaisquer atos materiais de posse. Ora, por

essa razão, esse mesmo promitente comprador ou reservatário não

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apresentam uma posse incompatível, mas uma simples detenção, pelo que

serão improcedentes os embargos respetivos. É que a razão de ser da defesa

da posse mediante embargos de terceiros reside na presunção de propriedade

ou de direito real de gozo de que o possuidor goza, mas não na mera detenção.

Mas novamente, exceciona-se que haverá oponibilidade ao exequente se o

que foi penhorado foi bem de terceiro. Todavia, levanta-se a questão da

detenção por direito de retenção – máxime, mas não apenas, do promitente

comprador – já atrás abordada e, em geral, por direito real de garantia ou de

aquisição que confira gozo da coisa. Em especial, quanto ao primeiro vimos

não ser oponível por embargos de terceiro, mas por reclamação de créditos.

Ora, coerentemente, deve entender-se que o promitente retentor não poe

embargar de terceiro fundado no seu poder sobre a coisa, pois este não é

senão mera detenção. Na verdade, essa detenção é instrumental de uma

garantia que a penhora não prejudica, atenta a existência de reclamação de

créditos. Sucede que o artigo 759.º, n.º3 CC ao remeter para o regime do

penhor, autoriza o uso de meios possessórios por causa do artigo 670.º, alínea

a) CC. Por isso, alguma jurisprudência autoriza os embargos de terceiro ao

promitente-comprador retentor, ou o retentor, em geral, fundados na posse.

Tal não é de acompanhar pelas razões expostas, salvo na penhora de bem de

terceiro que esteja, por sua vez, sujeito a direito de retenção de outrem. Mas

importa fazer uma ressalva: se o próprio direito do promitente-comprador

tiver eficácia real este será possuidor em nome alheio quanto à propriedade

e em nome próprio quanto ao seu direito real. Todavia, mesmo que haja aí

posse ela não é correspondente a um direito de gozo materialmente oponível

à apreensão, mas a um direito real de aquisição, que deve ser feito valer pela

venda direta, salvo na penhora de bem de terceiro e desde que haja ofensa.

Diversamente, em sede de compra com reserva de propriedade, Lebre de

Freitas defende que a posse do comprador é exercida em nome próprio,

dado que dos efeitos da compra e venda só o da transmissão de propriedade

fica sujeito a condição suspensiva do pagamento do preço. Por isso, poderia

embargar de terceiro. Sobre isso já dissemos que no plano do fundo está-se

perante uma naturalmente real da expectativa de aquisição, pelo que a posse

do reservatário é em nome próprio desse direito materialmente oponível –

não em nome próprio do direito de propriedade. Mas é mister que a penhora

haja produzido ofensa à posse nos termos da expectativa para poder ganhar

nos embargos de terceiro o que só sucederá se não for respeitado o regime

do artigo 778.º, n.º2 CPC. Naturalmente que todos os detentores que

estivemos a analisar podem passar a possuidores, ainda que não causais, por

inversão do título da posse. Por exemplo, o promitente-comprador que

recebeu a coisa pode demonstrar que, afinal, já não era mero possuidor em

nome alheio, mas verdadeiro possuidor. Aí têm de alegar e provar o exercício

dessa posse sobre o bem como seu titular, em nome próprio.

i. Cônjuge terceiro: pelo artigo 343.º CPC, o cônjuge que seja terceiro – i.e.

não seja parte na ação, como executado ou como cônjuge citado ao abrigo

dos artigos 786.º, n.º1 e 740.º, n.º1 CPC – tem legitimidade singular – e, por

isso, não carece de autorização do outro – para se defender por meio de

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embargos da diligência indevida delimitada pelo artigo 342.º CPC, em duas

situações:

i. O cônjuge embargará de terceiro para defender os direitos

relativamente aos seus bens próprios. Por outras palavras, a

penhora indevida dá-se quando se penhora bem próprio do cônjuge

não executado, em desconformidade com o artigo 735.º, n.º2 CPC.

ii. O cônjuge terceiro pode defender os seus direitos sobre os bens

comuns que hajam sido indevidamente atingidos. Neste caso, a

penhora indevida dá-se quando se penhora bem comum sem que o

cônjuge seja citado como impõem os artigos 740.º, n.º1 e 786.º, n.º1,

alínea a), 2.ª parte CPC. Relembre-se que tal se impõe mesmo quando

o cônjuge já estejam separados mas ainda perdure a comunhão de

bens, por ausência de partilha.

Mas pode ainda embargar de terceiro nos casos de penhora de bens próprios

do executado mas em que, por serem imóveis ou estabelecimento comercial,

se imporia a citação do seu cônjuge ex vi artigo 786.º, n.º1, alínea a), 1.ª parte

CPC? A resposta deve ser negativa: o bem não é de terceiro. Por isso,

tratando-se de bens levados para o casal pelo executado, já o cônjuge deste

não pode deduzir embargos de terceiro por não serem seus bens próprios.

Deve, sim, arguir a falta de citação nos termos do artigo 786.º, n.º6 CPC. A

lei dispensa a exigência de direito compatível. Aparentemente, todavia. Na

verdade, bem próprio ou comum é sinónimo – também no casamento – de

direito incompatível, máxime, direito real, na esfera jurídica exclusiva do

cônjuge ou na esfera da comunhão conjugal. Porventura, nem há direitos de

crédito entre marido e mulher. Como a posse do terceiro cônjuge sobre os

bens comuns penhorados se presume, torna-se mais fácil ao cônjuge

demonstrar uma posse nos termos de um direito incompatível. Por outro

lado, exige-se também a ofensa desse direito – indevidamente atingidos, lê-

se. Esta pode decorrer seja do âmbito seja da realização da penhora ou outra

diligência de apreensão executiva ou cautelar. Caberá ao embargado

impugnar os factos constitutivos da pretensão de levantamento da penhora

e alegar e demonstrar algum facto impeditivo da procedência dos embargos

do cônjuge. Em particular, na execução de dívidas próprias, caberá ao

embargado invocar os factos impeditivos do n.º2 do artigo 1696.º CC (bens

comuns que respondem ao mesmo tempo que os bens próprios do cônjuge

devedor):

i. Bens por ele levados para o casal ou posteriormente adquiridos a título gratuito;

ii. Rendimentos desses mesmos bens;

iii. Produto do trabalho do cônjuge devedor;

iv. Direitos de autor do cônjuge devedor;

v. Bens subrogados no lugar dos referidos na alínea i.

A procedência de embargos de cônjuge do executado com fundamento em

não se ter pedido a sua citação, não obsta a que possa ser requerida e

decretada, de novo, a penhora do mesmo bem, desde que se peça a citação

daquele.

Qualidade de terceiro: já sabemos que o artigo 342.º CPC exige mais ao titular do direito

ou posse: ele não deve estar no processo como parte, sendo por isso terceiro – quem não é

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parte na causa lê-se nele. Trata-se de um conceito processual de terceiro: não pode ser nem

executado, nem exequente, nem cônjuge citado por força do artigo 786.º, n.º1 CPC, nem

credor reclamante. Sendo um conceito processual de terceiro, também o devedor não

executado é terceiro. Diversamente, já não é terceiro o herdeiro habilitado como sucessor do

primitivo executado e desde que executado que não pode deduzir embargos de terceiro. Ao

contrário se o sujeito passa a parte na causa perda a qualidade inicial de terceiro. Nesta

eventualidade, a penhora deixa de ser subjetivamente inválida pelo que os embargos devem

extinguir-se não por ilegitimidade superveniente, mas por improcedência. Todavia, a penhora

pode ainda ser nula se, por ter sido feita antes do momento processualmente devido, tal

prejudicou o novo executado. Mas suponha-se que se penhoram bens do exequente ou de

credor reclamante. Visto não serem nem terceiro, nem executado não podem nem embargar,

nem opor-se à penhora respetivamente. Tem-se defendido que o meio é o de simples

requerimento, mas porventura de iure condendo seria mais adequada uma equiparação a terceiro.

É que o problema é antes de mais subjetivo e não tanto de não presença no processo:

penhoram-se bens que, pela sua titularidade, não podem integrar o objeto da execução.

Portanto, a qualidade de ser-se terceiro já nada tem que ver nem com a legitimidade

processual, i.e., o interesse direto, nem com a procedência do pedido: independentemente da

posição que ocupe fora ou dentro do processo o sujeito tem um direito ofendido e

incompatível com a execução, máxime, um direito de propriedade. A qualidade de terceiro

parece, por isto, dizer respeito à admissibilidade subjetiva do meio de defesa, i.e., ao interesse

processual. O legislador quis reservar um procedimento com esta estrutura e regime para um

terceiro. A parte não executada não o pode usar, mas antes o simples requerimento. Se o

fizer haverá absolvição da instância. Portanto, a qualidade de terceiro não releva para a

legitimação processual, nem para a causa de pedir, mas para o interesse processual.

Pedido:

1. Pedido final: nos embargos de terceiro o efeito pretendido junto do tribunal é, no

regime regra de penhora efetuada pelo agente de execução, a revogação do ato de

penhora, já que não há prévia e genérica decisão judicial. Mas no caso de arresto ou

de apreensão cautelar, o pedido é a revogação da decisão judicial que decretou,

respetivamente, a penhora, arresto ou apreensão. Os embargos de terceiro

representam aí uma forma particular de reclamação tendente à revisão, pelo mesmo

órgão jurisdicional, da questão sobre que incidiu a decisão de que derivou a diligência

posta em causa (Ac. STJ 8 janeiro 2009). Trata-se, pois, de um pedido constitutivo

extintivo de um ato processual. É isso o fazer valer o direito incompatível a que alude o

artigo 342.º, n.º1 CPC. Diversamente, Lebre de Freitas entende serem os embargos

de terceiro uma ação declarativa de mera apreciação, do direito ou posse do terceiro.

No plano do objeto imediato, o pedido de embargos pode cumprir uma função

preventiva ou cumprir uma função de remédio, como autoriza o artigo 350.º CPC.

Na função preventiva, designada como embargos de terceiro preventivos, o terceiro

que evitar a ofensa judicial ao seu direito ou à sua posse, mantendo-os íntegros. A

revogação do despacho ou do ato de penhora, arresto ou apreensão é pedida antes

da consumação plena da diligência – i.e., antes do desapossamento – mas depois de

ordenada, a diligência. Deste modo, já não se pode deduzir embargos preventivos se

a diligência já teve inicio, embora ainda não esteja concluída. Por isso, não basta o

conhecimento do trânsito ou a exequibilidade provisória da sentença condenatória,

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pois a mesma não constitui certeza, muito menos, ordem judicial de penhora. A

diligência há-de estar ordenada pelo tribunal ou, no caso do agente de execução, em

fase preparatória de uma inevitável penhora sobre o bem em questão. Na função de

remédio, designada como embargos de terceiro repressivos, a revogação é pedida

depois da consumação da penhora. A eles se refere o artigo 344.º, n.º2 CPC quando

fixa o prazo para dedução após a diligência ofensiva ter sido efetuada ou após o

embargante dela ter tomado conhecimento. Pode haver cumulação de pedidos

simples em que o terceiro pede o levantamento da penhora de mais do que um bem.

2. Pedido intermédio: todavia, o artigo 347.º CPC autoriza a que o autor deduza, em

cumulação eventual, um segundo pedido para ser apreciado no termo da fase

introdutória dos embargos: o pedido de restituição provisória da posse.

Necessariamente que o autor terá de ter como fundamento uma posse incompatível

não bastando alegar um direito incompatível. Se ele pretende ser reconduzido na

posse tem de a demonstrar: se a posse presume o direito de fundo, este não presume

a posse. Necessariamente que o autor terá de ter como fundamento uma posse

incompatível, não bastando alegar um direito incompatível. Se ele pretende ser

reconduzindo na posse tem de a demonstrar: se a posse presume o direito de fundo,

este não presume a posse. Trata-se de um pedido de tutela antecipada ou um pedido

de uma tutela cautelar? Note-se aqui uma aproximação ao artigo 377.º CPC em que

o possuidor pede que seja restituído provisoriamente à sua posse, alegando os factos

que constituem a posse, o esbulho e a violência. Aqui o esbulho decorre de um ato

processual e não de um ato privado. Acresce ainda que, tal como se dispõe no artigo

368.º, n.º1 CPC, a restituição provisória exige que haja uma probabilidade séria da

existência do direito invocado pelo embargante, segundo o artigo 345.º CPC.

Fazendo uso de conclusões que obtivemos em outra obra, parece-nos que estamos

perante uma forma de antecipação do efeito da sentença com fundamento em prova

sumária e não perante uma medida cautelar. A causa de pedir é rigorosamente a

mesma para o pedido principal – i.e., a ofensa a direito incompatível por ato de

apreensão – e o juiz tem um poder discricionário para decretar medida mais adequada

(diversamente, o disposto no artigo 376.º, n.º3 CPC).

Procedimento:

1. Pressupostos processuais: o tribunal competente para conhecer os embargos de

terceiro é o tribunal onde está a correr a execução, mesmo que seja um tribunal de

competência especializada ou de competência específica. Tal decorre, por extensão

de competência, nos termos do artigo 91.º, n.º1 CPC, dada a natureza de incidente

de intervenção de terceiro na instância dos embargos. Já vimos atrás que a

legitimidade ativa se afere nos termos do artigo 342.º CPC: tem legitimidade quem

se apresenta como titular de um direito ou posse ofendidos ou como cônjuge do

executado, conforme o artigo 343.º CPC. Pode ter lugar litisconsórcio voluntário

unitário; por exemplo, qualquer co-herdeiro ou condómino de herança tem

legitimidade para deduzir embargos de terceiro. Já quanto à legitimidade passiva o

artigo 348.º CPC dita que o procedimento, na sua fase contraditória, corre em face

das partes primitivas, i.e., exequente e executado, como melhor se verá adiante.

2. Fase introdutória:

a. Prazo e petição inicial: os embargos de terceiro estão regulados como um

incidente de intervenção de terceiro numa ação pendente. O n.º2 do artigo

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344.º CPC impõe ao terceiro que coloque a ação num prazo de 30 dias a

contar da data em que a diligência foi efetuada ou em que o embargante teve

conhecimento da ofensa. Sendo o arresto convertido em penhora, o prazo

reporta-se ao arresto. O conhecimento pelo embargante do ato lesivo da

posse ou direito é um facto pessoal – por meio de representante legal ou

estatutário, no caso de pessoa coletiva – e subjetivo, que se pode presumir

segundo as regras de experiência. Assim, presume-se que o terceiro tem logo,

na data do ato, conhecimento da penhora quando ela se traduza numa

apreensão efetiva e aquele participou ou presenciou o ato de penhora ou não

poderia ter deixado de saber naquele dia segundo as regras de normalidade.

Diversamente, não se deve presumir o conhecimento na data da penhora se

não houve apreensão ou se o terceiro não participou nem presenciou o ato,

tendo sido deixado o simples anúncio público da penhora, através de edital,

afixado na porta ou noutro local visível do imóvel penhorado, ainda que o

embargante nele habite. O conhecimento, nesse caso, será por meio da

notificação do ato de penhora ou outro. Em qualquer caso, é irrelevante que

no ato da penhora o embargante tenha sido notificado erradamente como

executado, porque não podia deixar de conhecer a sua qualidade de terceiro

em relação à execução. Os embargos, todavia, não podem ser propostos

depois de os respetivos bens terem sido judicialmente vendidos ou

adjudicados (artigo 344.º, n.º2, 2.ª parte CPC) já que visam revogar ou

prevenir a penhora ou apreensão judicial. E no caso de embargos preventivos

o prazo de 30 dias deve contar-se da data que o embargante teve

conhecimento da futura penhora, despacho de arresto ou de apreensão

cautelar. Trata-se de um prazo de natureza substantiva, de caducidade. Como

tal não cabe ao autor, nem a alegação, nem a prova da tempestividade, a qual

não é requisito da administração dos mesmos. Ao contrário, é o embargado

que, por força da regra geral do artigo 343.º, n.º2 CC está onerado com a

alegação e com a prova de o prazo já ter decorrido sua dedução. É certo que

este preceito civil exceciona com ressalva ter sido outra a solução

especialmente consignado na lei o que para a doutrina dominante seria o caso:

sobre o embargante impenderia o ónus de alegar e de provar, conforme o

artigo 344.º, n.º2, in fine CPC, o momento em que teve conhecimento da

ofensa para aferir a tempestividade do exercício, por si, do direito de oposição

a atos executivos e sem prejuízo da oficiosidade do respetivo conhecimento.

Todavia, tal entendimento não tem suporte legal suficiente já que em nenhum

ponto se exige alegação. O artigo 345.º CPC parece exigir ao juiz que

verifique oficiosamente se a petição de embargos foi apresentada em tempo.

No entanto, a caducidade do direito de ação é de conhecimento oficioso

apenas em matéria de direitos indisponíveis (artigo 333.º, n.º1, in fine CC),

pelo que deve concluir-se que, em regra, não pode ser conhecido

oficiosamente tal excesso de prazo na instauração dos embargos de terceiro.

Assim, o tribunal até poderá, justamente, conhecer oficiosamente da

tempestividade dos embargos quando estes sejam deduzidos depois de os

bens terem sido judicialmente vendidos ou adjudicados, já que a violação do

artigo 344.º, n.º2, 2.ª parte CPC em questão já é de interesse público e não

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apenas do credor exequente. O terceiro deduzirá a sua pretensão numa

petição inicial, conforme aos artigos 147.º, n.º2 e 552.º CPC, enviada, nos

termos gerais, para a secretaria do tribunal da execução. Juntamente com a

petição deve o autor oferecer logo as provas, i.e., as provas documentais, o

rol de testemunhas e os requerimentos de prova. O valor inicial indicado na

petição pode ser alterado por efeito de impugnação pelos embargados ou

decisão do juiz nos termos do disposto nos artigos 305.º e seguintes CPC).

Se não for impugnado nem alterado pelo juiz, até ser proferido o despacho

saneador, considera-se aceite e definitivamente fixado o que foi indicado

(artigo 306.º, n.º2 CPC). Na petição de embargos de terceiro, o autor deve

integrar a causa de pedir pela necessária indicação específica de facto

constitutivo do direito ou posse que se pretende tutelar e deve deduzir o

pedido ou pedidos. A propositura dos embargos relativos a bens imóveis,

ainda que fundados em mera posse incompatível, deve ser levada a registo,

nos termos do artigo 3.º, alínea a) CRPr, enquanto ação com finalidade

acessória quanto à existência do direito, por força do artigo 349.º CPC, e com

efeitos sobre a penhora registada.

b. Despacho liminar: recebida a petição, nos termos do artigo 558.º CPC, os

embargos são processados por apenso à causa em que haja sido ordenado o

ato ofensivo do direito do embargante. A instância subsequente pode sofrer

vicissitudes, nomeadamente, a suspensão (artigo 269.º e seguintes CPC) e a

extinção (artigo 277.º CPC). Após a distribuição, o processo é concluso ao

juiz para despacho liminar, como decorre da referência implícita no artigo

345.º, 1.ª parte CPC, conjugada com o artigo 226.º, n.º4, alínea a) CPC. A

petição de embargos é liminarmente indeferida apenas quando ocorram

vícios insanáveis, oficiosamente ou pelo autor, ou improcedência, manifestos.

A saber:

i. O pedido seja manifestamente improcedente – não alegação e prova dos

factos que integram a, v.g.:

1. Ofensa;

2. Ameaça de ofensa;

3. Titularidade/existência de um direito ou posse;

4. A qualidade jurídica da oponibilidade destes;

5. Inexistência da qualidade de terceiro;

ii. O pedido seja deduzido fora do prazo dos 30 dias ou já depois da venda ou

adjudicação;

iii. Ocorram, de forma evidente, exceções dilatórias insupríveis e de que o juiz deva

conhecer oficiosamente – v.g. a petição ser inepta ou tratar-se de dedução

de embargos de terceiro relativamente à apreensão de bens realizada

no processo especial de recuperação da empresa e de falência (artigo

342.º, n.º2 CPC).

Esse indeferimento tanto pode ser:

i. Total: aplica-se o disposto no artigo 560.º CPC, i.e., a faculdade de

aproveitamento da data da primeira ação, sendo admitido recurso até

à Relação, com subida nos próprios autos;

ii. Parcial.

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Sendo o caso, o despacho pode ser de aperfeiçoamento, com o mesmo

alcance do artigo 590.º, n.º2 CPC, i.e., tanto para suprir exceções dilatórias,

como para aperfeiçoamento da petição inicial, por força do artigo 6.º, n.º2

CPC. Não havendo indeferimento liminar, o juiz pode ordenar a realização

das diligências probatórias necessárias, momento seguinte no processo. Mas

pode mais tarde voltar a conhecer de questão que não haja concretamente

sido apreciada liminarmente. Quando se tratem de embargos preventivos a

diligência de penhora, arresto ou apreensão cautelar fica suspensa: não será

efetuada antes de proferida decisão na fase introdutória dos embargos (artigo

350.º, n.º2 CPC). Sendo um efeito ex lege, a verificação do pressuposto

específico – a natureza preventiva do pedido de embargo – deve ser feita no

processo: será o juiz a declarar o efeito suspensivo no despacho liminar. No

caso da penhora isso implica que o agente de execução seja, depois, oficiado

para não a consumar. De outro modo, não poderá saber da superveniência

da suspensão. A data do efeito suspensivo será a propositura dos embargos

ou será do despacho liminar? Parece ser aquela primeira, embora declarado

retroativamente.

c. Instrução e despacho de recebimento: a realização das diligências

probatórias necessárias realiza-se, se necessário, em audiência de julgamento

(artigo 345.º CPC). O objeto do ónus probatório do embargante, ex vi artigo

342.º, n.º1 CC, é composto pelos factos que integram a causa de pedir:

penhora ou qualquer ato judicialmente ordenado de apreensão ou entrega de

bens, ofensa, quando não se presuma, título de aquisição do direito ou posse.

A incompatibilidade desse direito ou posse com a realização ou âmbito da

diligência, parece ser presumida a partir dos demais elementos. Naturalmente

que se a prova for apenas documental e o juiz entender que não deve ordenar

nenhuma diligência oficiosamente (artigos 6.º e 490.º, n.º1 CPC) de imediato

proferirá despacho de recebimento ou de rejeição dos embargos. Encerradas

as diligências probatórias, o juiz profere um despacho de recebimento ou de

rejeição dos embargos de terceiro. No despacho, o juiz deverá atender às

alegações e à prova informatória oferecida pelo embargante e, nos termos

gerais, aos factos dispensados da alegação (artigo 412.º CPC). O despacho é

de rejeição se ocorrer falta de alegação e/ou demonstração dos factos

constitutivos do direito ou da posse, seja por ausência absoluta de prova, seja

por não produção de uma conclusão probatória de que há probabilidade séria

da existência do direito invocado pelo embargante (artigo 345.º CPC). Esta

última expressão é, porém, equívoca pois induz a pensar que se está a referir

apenas à prova da titularidade do direito e não também à sua

incompatibilidade ou ofensa. Mas todos os fundamentos que integram a

causa de pedir beneficiam desse grau de prova inferior em clara aproximação

à letra do n.º1 do artigo 368.º CPC. Se faltar essa demonstração sumária então

a pretensão do embargante não pode ser procedente. Mas obviamente que o

despacho ainda será de rejeição quando ocorreu exceção dilatória que não era

manifesta no momento liminar. Atualmente, e contrariamente ao

anteriormente concedido, os embargos de terceiro não podem ser rejeitados,

com fundamento de que a transmissão foi feita para o transmitente se subtrair

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à sua responsabilidade. Esse é atualmente, como se vai ver de seguida, um

fundamento possível de contestação oposta à petição de embargos. A decisão

de rejeição é passível de ser recorrida nos termos gerais dos artigos 627.º, n.º1

e 644.º, n.º1, alínea a), in fine CPC mas não faz caso julgado material, atenta

a qualidade sumária da prova. Por isso, enuncia o artigo 346.º CPC que a

rejeição não impede que o embargante proponha ação em que peça a

declaração da titularidade do direito que obste à realização ou ao âmbito da

diligência, ou em que reivindique a coisa apreendida. Naturalmente que a

rejeição tem valor de caso julgador formal naquela execução o que impede

repetição de embargos quanto aos mesmos bens e com os mesmos

fundamentos. Já se os fundamentos forem outros, não se gera exceção de

caso julgado (artigos 577.º, alínea i), 580.º, n.º1 e 581.º CPC). Importando

aqui algo do que já escrevemos noutra sede, a exigência de probabilidade séria

de existência do direito não é prova stricto sensu mas também não é uma

simples ou mera possibilidade. É mais do que isto: é uma aparência, mera

justificação, probabilidade ou verosimilhança forte – o chamado fumus boni

iuris. Na sua parte decisória o despacho de recebimento terá vários segmentos

dispositivos:

i. Recebimento dos embargos;

ii. Suspensão – originária nos embargos repressivos e confirmativa nos

embargos preventivos (artigo 350.º, n.º2 CPC) – dos termos do processo

executivo ou cautelar, mas somente quanto aos bens a que dizem respeito;

iii. Injunção ao depositário do bem, máxime, agente de execução, de restituição

provisória da posse, se o embargante a houver requerido;

iv. Notificação das partes primitivas para contestarem.

Tratando-se de embargos de terceiro repressivos a restituição provisória na

posse pode ser condicionada à prestação de caução pelo requerente (artigo

347.º CPC). O valor a caucionar é o valor do direito do requerente da

diligência ou o valor dos bens a que os embargos de terceiro respeitam se

este valor for inferior, seguindo-se o procedimento dos artigos 906.º e

seguintes CPC, ex vi artigo 915.º, n.º1 CPC. Tratando-se de embargos

preventivos a confirmação da prévia suspensão do também pode ser

condicionada à prestação de caução pelo requerente (artigo 350.º, n.º2 CPC),

se o juiz o determinar. Todavia, pode o próprio exequente embargado, após

a sua citação, requerê-lo alegando que os embargos de terceiro com função

preventiva, estão a suspender a efetivação da diligência de penhora e que não

há nos autos qualquer penhora ou diligência análoga que garanta o reembolso

da quantia exequenda e acréscimos. Este despacho de recebimento, não está

suportado por um juízo definitivo, e por isso tem natureza provisória,

interina, destinada a fazer prosseguir o processo e podendo ser revogado por

posterior despacho saneador ou em sentença final. Por conseguinte, não tem

valor de caso julgado material em face desta, sobre o que nela se decidiu sobre

a existência de um direito ofendido por parte do terceiro. Ultrapassada a fase

introdutória, é ainda possível atender aos elementos de facto e de Direito e

que fundamentaram aquela fase.

3. Fase contraditória:

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a. Contestação; exceptio dominii: recebidos os embargos são notificados

para contestar as partes primitivas (artigo 348.º, n.º1 CPC). As partes

primitivas são o exequente e o executado, e não aqueles que são citados feita

a penhora – cônjuge e credores reclamantes (artigo 786.º, n.º1 CPC).

Teixeira de Sousa defende, e bem, a existência aqui de um litisconsórcio

necessário natural entre exequente e executado: apenas se obtendo sentença

em face dos dois podem os embargos ter efeito útil. É que, como escrevia

Anselmo de Castro, para qualquer ação permanecendo no executado a

titularidade do direito e com ela a da posse, a única regra de legitimação para

as ações em que se contenda sobre os bens penhorados, compatível com os

interesses postos em jogo do executado e do exequente é da legitimação

conjunta e indivisa. A notificação é feita segundo as regras da citação pessoal

(artigos 225.º, n.º2, 226.º, 227.º e seguintes e 246.º CPC), visto ser o primeiro

chamamento para uma ação pendente. A falta de notificação do embargado

para contestar os embargos de terceiro determina a nulidade de todo o

processo posterior à falta – a fase contraditória. No atual Código, os

embargos correm numa única forma de processo, conforme os artigos 348.º,

n.º1 e 548.º CPC. Por outro lado, o artigo 751.º, n.º4, alínea d) CPC autoriza

o exequente, uma vez notificado de que relativamente aos bens penhorados

foi deduzido e recebido pedido de embargo de terceiro, a substituir esses

bens por outros ou a reforçar a penhora. A contestação será, assim, deduzida

em 30 dias (artigo 569.º, n.º1 CPC). Quando termine em dias diferentes o

prazo para a defesa por parte dos vários réus, a contestação de todos ou de

cada um deles pode ser oferecida até ao termo do prazo que começou a correr

em último lugar (n.º2 do artigo 569.º CPC). Na contestação, os réus podem:

i. Alegar a caducidade do direito de embargar de terceiro, por força da regra geral

do artigo 343.º, n.º2 CC, como se disse atrás, e enquanto facto extintivo

do direito potestativo de ação do embargante, logo, constituindo uma

exceção perentória e não uma exceção dilatória;

ii. Impugnar os factos constitutivos do pedido do terceiro, i.e., a titularidade e a

natureza incompatível do direito ou da posse;

iii. Excecionar perentoriamente, máxime, invocando:

1. A extinção do direito do terceiro, por exemplo, por termo do contrato ou

por usucapião;

2. A titularidade pelo executado do direito de fundo, em detrimento da

posse do terceiro, quando esta seja a causa de pedir;

3. Fundamentos de impugnação pauliana contra o embargante titular

inscrito do direito penhorado ou mesmo a procedência de prévia ação

pauliana, ou seja, de que o terceiro adquiriu o direito para

diminuir a garantia patrimonial do crédito do exequente;

iv. Deduzir a exceptio dominii: esta, deduz-se ao abrigo do artigo 348.º, n.º2

CPC. Trata-se de um pedido de simples apreciação positiva de que o

réu executado é o titular do direito de propriedade sobre os bens ou

do direito real de gozo que foi objeto da penhora. O seu pressuposto

específico é o de que o terceiro tenha embargado com fundamento

na posse. O pedido tanto pode ser deduzido pelo réu executado,

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como, em substituição processual, pelo réu exequente. O valor da

causa pode alterar-se em resultado da cumulação deste novo objeto

processual. Funcionalmente, está-se perante um pedido

reconvencional já que há um sentido de procedência autónomo,

acompanhado por um valor de caso julgado. Não se trata de uma

exceção perentória dado que bastaria alegar a propriedade – aí sim

como exceção – para se obstar à procedência. E é diferente da

situação de o embargado impugnar os factos da posse ou excecionar

a existência da posse/direito (v.g., o caso da nulidade por simulação).

O que se pretende agora é uma decisão com caso julgado e um efeito

final de simples apreciação, independentemente da procedência ou

improcedência do pedido do autor. Todavia, se a exceptio dominii for

considerada procedente (reconhece-se que o direito é do executado e

o terceiro não tem direito ou posse incompatíveis), os embargos

serão improcedentes. Portanto, neste caso, o seu efeito é o próprio

de uma reconvenção cujo efeito é incompatível com o pretendido

pelo autor, pois impede a procedência do pedido do autor como

sucede, por exemplo, com o pedido reconvencional de compensação

de dívida de valor pelo menos igual ao do pericionado pelo autor. Na

verdade, esta reconvenção especial opera no plano dos fundamentos

do pedido do embargante: por ela se impugna um desses

fundamentos – a titularidade do direito. Todavia, ela não se insere

nos casos do n.º2 do artigo 266.º CPC, pois a declaração da

titularidade do direito não é o mesmo efeito jurídico pretendido pelo

autor terceiro, nos termos da alínea d) – este é a revogação do ato da

penhora – e tampouco um pedido de benfeitoria ou compensação

das alíneas b) e c). Mas parece que já poderia caber na alínea a) –

pedido emergente do fundamento de defesa do embargado – quando

o réu executado tivesse excecionado à posse do terceiro a sua própria

propriedade. Seja como for, a expressa previsão do artigo 348.º, n.º2

CPC afasta qualquer dúvida que a aplicabilidade da alínea a) pudesse

suscitar.

Pode perguntar-se da admissibilidade em geral da reconvenção comum, nos

termos desse mesmo artigo 266.º CPC. Teixeira de Sousa admite a

reconvenção nos termos gerais. O caráter incidental lato sensu ou acessório do

procedimento, não admitiria, porventura, que a causa ainda se pudesse

prolongar mais na sua suspensão da execução do bem a que se refere (artigo

347.º CPC). Todavia, será de admitir que o réu reconvinte que seja o

exequente o possa fazer, por estar na disponibilidade do seu interesse decidir

entre o ganho da reconvenção e o ganho da mais rápida execução. No atual

regime, apenas cabe réplica conforme o artigo 584.º, n.º1 CPC ou por exceptio

dominii, dada a idêntica natureza desta. A tréplica não tem lugar, nem por

alteração do objeto processual, mas cabe resposta às exceções apresentadas

pelos embargados ao abrigo da garantia prevista no artigo 3.º, n.º4 CPC.

b. Saneamento, instrução e julgamento: a falta de contestação ou de

impugnação e, bem assim, a não réplica ou não resposta à exceptio dominii,

seguem os regimes comuns da revelia, dos artigos 574.º, n.º2 e 587.º CPC,

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respetivamente, por força da remissão operada pelo artigo 348.º CPC para a

forma declarativa. Segue-se, depois, o saneamento, com eventual despacho

pré-saneador, audiência preliminar, despacho saneador e fixação da base

instrutória. A instrução e a audiência de julgamento seguem as regras do

respetivo processo: por isso, o momento e as regras de requerimento e

produção de prova serão as respetivas. Assim, quanto aos embargos a prova

documental deve acompanhar a contestação (artigos 423.º, n.º1 e 549.º, n.º1

CPC), sem prejuízo do artigo 412.º CPC. Por outro lado, ex vi artigo 599.º

CPC, o tribunal é sempre singular. Pensamos, porém, que as testemunhas

terão de ser novamente ouvidas agora perante os réus. A sentença não

apresenta especialidades. A sentença pode, nos termos gerais, ser de:

i. Absolvição da instância;

ii. Extinção da instância, nomeadamente por inutilidade superveniente dos embargos,

por exemplo (artigo 277.º, alínea e) CPC);

iii. De mérito, absolvendo ou condenando no pedido.

Efeitos da sentença final de mérito: as regras gerais do instituto do caso julgado

determinariam que a eficácia de caso julgado fosse somente quanto à parte decisória.

Portanto, apenas quanto à revogação ou não revogação do ato ou despacho de penhora,

arresto ou apreensão cautelar. Já os fundamentos, i.e., a titularidade ou não titularidade do

direito ou da posse estariam excluídos do âmbito objetivo do caso julgado. Não é isso o que

ordena o artigo 349.º CPC, todavia: a sentença de mérito proferida nos embargos constitui,

nos termos gerais, caso julgado quanto à existência e titularidade do direito ou da posse

invocados pelo embargante. E, inversamente, a sentença de mérito proferida nos embargos

constitui, nos termos gerais, caso julgado quanto à existência e titularidade do direito

invocado pelos embargados em exceptio dominii. Ou seja: a sentença de embargos também

decida da titularidade da posição jurídica real, à maneria da ação de reivindicação. De fora do

âmbito do caso julgado, estão os demais fundamentos que não sejam atinentes à existência e

titularidade do direito ou da posse invocados pelo embargante: por exemplo, a qualificação

da dívida exequenda ou a qualidade, comum ou própria, do bem penhorado. Por isso, podem

ocorrer exceções de caso julgado entre embargos de terceiro relativos a idênticas pretensões

sobre os mesmos bens, envolvendo identidade de partes (artigos 580.º, n.º1 e 581.º, n.º1 e 2

CPC). Já uma decisão proferida em processo de embargos de terceiro não vincula o

exequente em outra execução em que o exequente é diferente daquele em que os embargos

foram reduzidos, mesmo que os bens em causa sejam os mesmos. E também não há exceção

de caso julgado, quando, existindo identidade de sujeitos e de pedidos, os embargos de

terceiro respeitam a diversas penhoras sobre bens diferentes. Por outro lado, a sentença que

decidiu embargos de terceiro pode valer com autoridade de caso julgado em face de ações

que conheçam da existência e titularidade do direito ou posse – v.g., ação de reivindicação,

ações possessórias.

§59.º - Ação de reivindicação e protesto pela reivindicação

Ação de reivindicação: 814-410

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1. Objeto e legitimidade: os artigos 1311.º e 1315.º CC legitimam o proprietário ou o

titular de qualquer direito real a requerer judicialmente de qualquer possuidor ou

detentor da coisa o reconhecimento do seu direito de propriedade e a consequente

restituição do que lhe pertence. Trata-se da ação de reivindicação. Ao contrário dos

embargos de terceiro que, porque são um incidente, apenas podem ter lugar enquanto

a execução não se extinguir, a rei vindicatio pode ser deduzida a todo o tempo,

autonomamente e mesmo depois do termo da ação executiva A sua causa de pedir é,

nos termos do artigo 581.º, n.º4 CPC, o facto jurídico concreto de que deriva o direito

real: contrato, usucapião, acessão, ou qualquer outro facto concreto pelo qual o autor

tenha adquirido a titularidade do direito. Nela são deduzidos dois pedidos em

cumulação simples: de simples apreciação do direito real e um pedido de condenação

na restituição do bem ao seu titular, afetado por ato de penhora ou por alienação

executiva. A restituição da coisa é feita à custa do esbulhador, se o houver, e no lugar

do esbulho (artigo 1312.º CC). Naturalmente que o direito real não há de ter

caducado por efeito da venda executiva, em face do artigo 824.º, n.º2 CC. Se houve

venda terá sido de coisa alheia e o adquirente terá recebido um direito que, pura e

simplesmente, não estava na esfera do executado (artigo 824.º, n.º1 CC). E não há de

ser um direito inoponível à execução por força do artigo 819.º CC. Por outro lado,

uma vez que nesta ação é deduzido um pedido de restituição da coisa pelo

reivindicante decorre que devemos excluir do âmbito do artigo 1315.º CC direitos

que não incluam posse ou detenção da coisa. Portanto, está excluída a maioria dos

direitos reais de garantia e de aquisição. Ao contrário, tanto os direitos reais de gozo,

como o penhor de coisas (artigo 669.º CC), o direito de retenção (artigos 754.º e 755.º

CC), ou, v.g., o direito a pescar em área concessionada ou o direito de mineração,

podem ser objeto de ação de reivindicação. A ação de reivindicação é deduzida em

litisconsórcio necessário natural (artigo 33.º, n.º2 CPC) passivo contra o exequente e

o executado. Todavia, o Ac. RP 14 fevereiro 2995 defendeu que deve ser contra

todos os interessados: exequente, executado e ainda credores com garantia real e

adquirente dos bens. Efetivamente, é necessário demandar todos aqueles cujas

esferas jurídicas serão afetadas pela decisão final, pois o efeito dispositivo da

procedência da reivindicação é oponível à execução, como um todo. O mesmo é

dizer, no plano subjetivo, oponível a todos os que ganham ou perdem com a ação

executiva.

2. Efeitos da procedência: a procedência do pedido está também dependente da data

do registo da ação de reivindicação. A penhora e aquisição executivas que lhe sejam

anteriores, garantem respetivamente ao credor que recebe o produto da venda e ao

adquirente, a improcedência da ação de reivindicação desde que alegados e

demonstrados os requisitos do artigo 291.º CC ou do artigo 17.º CRPr, consoante os

casos. Ao contrário, como nota Lebre de Freitas, já se o terceiro adquiriu antes da

penhora e não registou pode opor vitoriosamente o seu direito, em face da nova letra

do artigo 5.º, n.º4 CRPr. No plano da posição jurídica do terceiro, a sentença final

procedente determina, nos termos do que foi pedido, o reconhecimento do direito

de fundo e a condenação na entrega do bem penhorado ou já transmitido. Em

consequência o autor vitorioso da ação deverá intervir na execução pedindo a

restituição do seu bem junto do agente de execução ou junto do adquirente, se o bem

já foi transmitido. Neste último caso, o artigo 825.º, n.º1 CC, determina que o

adquirente, no caso de execução de coisa alheia, pode exigir que o preço lhe seja

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restituído por aqueles a quem foi atribuído – i.e., os credores – e que os danos sejam

reparados pelos credores e pelo executado que hajam procedido com culpa, nas

condições do artigo 894.º CC. Concretizando, este preceito, o adquirente terá direito

à integridade do preço, ainda que os bens se hajam perdido, deteriorado ou diminuído

de valor por qualquer outra causa. Em lugar de exigir dos credores a restituição do

preço, o adquirente pode, em alternativa, exercer contra o devedor, por sub-rogação,

os direitos desses credores. Para Anselmo de Castro, esta sub-rogação executiva

contra o executado só será passível – dada a singularidade da execução – de exercer-

se nesta execução com relação ao exequente, enquanto, com relação aos outros

credores terá de o ser em outra execução. Se o terceiro proprietário havia já deduzido

protesto pela reivindicação no ato da venda ou anteriormente – ou se não houve

protesto prévio, caso se haja verificado o condicionalismo do artigo 841.º CPC – vale

a 2.ª parte do n.º2 do artigo 840.º CPC e n.º2 do artigo 825.º CC. Assim, o adquirente

pode não restituir de imediato o bem, pois fica com um direito de retenção da coisa

comprada, enquanto lhe não for restituído o preço. Poderá, por isso, o proprietário

reavê-lo dos responsáveis, se houver de o satisfazer para obter a entrega da coisa

reivindicada. Mas se o adquirente conheceu o protesto, já não lhe é lícito pedir a

reparação dos danos, salvo se os credores ou o devedor se tiverem responsabilizado

pela indemnização.

3. Relações com os embargos de terceiro: se o terceiro proprietário já havia

deduzido petição de embargos de terceiro importa considerar o sentido final da

decisão final respetiva. Para tanto, importa distinguir mais hipóteses.

a. Se nem sequer chegou a ter lugar prolação da sentença, por os embargos terem sido rejeitados

no termo da fase introdutória, o artigo 346.º CPC enuncia que a decisão de rejeição

não obsta a que o terceiro proponha ação em que peça a declaração da

titularidade do direito que obsta à realização ou ao âmbito da diligência, ou

reivindique a coisa apreendida. Trata-se, pois, de uma decisão sumária, sem

força de caso julgado.

b. Se chegou a ser proferida sentença final de forma – v.g., extinção da lide por

inutilidade superveniente, resultante da extinção da penhora por o bem

respetivo ter sido adjudicado – pode o terceiro instaurar ação de reivindicação.

c. Se a sentença foi de mérito, levantam-se questões de exceção e autoridade de caso

julgado e de litispendência. Recorde-se que a sentença que decide os

embargos de terceiro tem valor de caso julgado material e poderá ser

invocada noutra ação, real ou possessória, pois decidiu da existência do

direito ou posse do embargante ou do direito do embargado, nos termos do

artigo 349.º CPC. Mas invocada como exceção ou com autoridade de caso

julgado? Recorde-se que a exceção de caso julgado postula a identidade de

objeto e sujeitos processuais, obstando a uma decisão final de mérito (artigo

580.º CPC); já na autoridade de caso julgado inexistente tal identidade, mas

uma relação de prejudicialidade (ou outra) entre os dois objetos processuais

o que determina o sentido da decisão final de mérito. Por outro lado, importa

notar que a questão da eventual exceção de caso julgado tanto se coloca entre

o terceiro e o executado/exequente, como entre o terceiro e o adquirente do

bem: é que este, sendo transmissário, é ainda a mesma parte do ponto de

vista da sua qualidade jurídica (artigo 581.º, n.º2 CPC). Há que distinguir,

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consoante o fundamento dos embargos, para aferir se há ou não identidade

de causa de pedir entre os dois meios processuais. E importa ainda considerar

a concreta relação de prioridade temporal entre os dois meios.

i. Se os embargos forem anteriores à ação de reivindicação e se basearem em direito

incompatível, então fazem caso julgado e litispendência para a

reivindicação posterior. Uma e outra ação conhecem da titularidade

do direito. Razão tem, por isso, Lebre de Freitas quando escreve

que a abertura dos embargos de terceiro à tutela do titular do direito

de fundo veio diminuir substancialmente os casos em que o terceiro

lançava mão da ação de reivindicação, cuja utilização se circunscreve

aos casos em que, por já não ser possível embargar, essa ação surge

como último recurso. Claro que se postula uma identidade de pedido

entre embargos de terceiro e reivindicação. Ora, existe tal identidade

(incluindo de parte, como se referiu) quando a ação de reivindicação

é instaurada antes da transmissão do bem penhorado: em ambos os

meios processuais se pede o levantamento da penhora. Ao contrário,

se a ação de reivindicação por instaurada depois da transmissão do

bem penhorado, o que se o terceiro pede contra o adquirente é

diverso: a anulação da transmissão. Por isso, parece que nesta

segunda eventualidade falha a identidade de pedido, pelo que a

sentença de embargos apenas condicionará a sentença de

reivindicação no plano da procedência, a título de autoridade de caso

julgado.

ii. Já na hipótese de os embargos, ainda anteriores a ação de reivindicação, se

basearem em posse incompatível, não há possibilidade de valerem como

exceção de caso julgado (ou litispendência) ou mesmo como

autoridade de caso julgado em face da ação de reivindicação. Na

verdade, a causa de pedir dos embargos fundados na posse é diferente

da causa de pedir da ação fundada na aquisição da titularidade do

direito de fundo.

iii. Ao contrário, se o terceiro instaura primeiramente ação de reivindicação

(necessariamente ainda na pendência da execução), a sentença que naquela

absolver o réu do pedido determina improcedência de posteriores

embargos de terceiro fundados em posse. Ou seja: embora não haja

identidade de objeto processual, determinante de exceção de caso

julgado (ou de litispendência), há todavia uma relação de

prejudicialidade entre a decisão reivindicatória e os fundamentos

possessórios da sentença dos embargos. A saber: se já foi declarado

que A não é dono da coisa penhorada então a posse que invocar nos

embargos de terceiro há-de ser formal e ceder perante o direito de

propriedade do embargado.

iv. Já se os posteriores embargos de terceiro se fundarem no direito de fundo, são-

lhes oponíveis tanto as exceções de litispendência, quanto de caso

julgado, visto ambos os meios se fundarem na mesma causa de pedir.

Daqui decorre que embargos de terceiro e ação de reivindicação não são

meios cumulativos, pois o primeiro meio acionado no tempo pode, por via

de exceções dilatórias ou de juízos de prejudicialidade, condicionar o segundo

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meio acionado. São, pois, como ensina Teixeira de Sousa, na esteira de

Castro Mendes, e Lebre de Freitas, meios alternativos, pelo que o terceiro

interessado pode utilizar qualquer deles. Em bom rigor, meios

tendencialmente alternativos, pois não há sempre uma fungibilidade entre si,

quanto aos efeitos processuais e substantivos.

Protesto pela reivindicação: se a ação for deduzida antes da venda executiva pode o

terceiro produzir o incidente cautelar do protesto pela reivindicação, destinado a assegurar o

efeito útil da ação de reivindicação e previsto no artigo 840.º CPC. Trata-se de uma

intervenção atípica fundada na pendência ou iminente propositura da ação de reivindicação

por quem não é parte na causa – propriedade, usufruto, por exemplo – invocando a

titularidade de direito próprio incompatível com a transmissão. O protesto é feito por termo

no processo, que será lavrado. Dir-se-ia que se o protesto tiver de ser apreciado implicará

algum tipo de juízo antecipatório da viabilidade da futura reivindicação. Por isso, teria de ser

rejeitado se esta se afigurasse como manifestamente improcedente. No entanto, tem-se dito

que não é no momento em que faz o protesto pela reivindicação que o reclamante tem que

alegar os fundamentos do seu direito à reivindicação como não é nessa altura que o juiz há-

de apreciar da existência ou não de tais requisitos. Tal parece ser a melhor leitura da letra da

lei: basta fazer o protesto e fazê-lo acompanhar de certidão de pendência de reivindicação,

atual ou dentro do prazo de 30 dias. Sendo admitido o protesto, o despacho do juiz

determinará que os bens que sejam móveis não serão entregues ao comprador ou

adjudicatário. No novo Código, no artigo 840.º, n.º1 CPC, foi suprimida a possibilidade,

anteriormente prevista, de entrega dos bens mediante garantias (por outras palavras, os bens

só seriam entregues se o interessado prestasse caução – a qual não compreendia os

rendimentos, juros e dividendos –, enquanto os papéis de crédito sujeitos a averbamento

eram averbados pela entidade competente com a declaração de que o interessado não poderia

dispor deles enquanto a sentença da ação de reivindicação não passar em julgado). Por outro

lado, o produto da venda de qualquer bem, imóvel ou móvel, não será levantado pelo credor

que deva ser pago sem se prestar caução. Portanto, como bem nota Lopes Cardoso, quanto

aos bens mobiliários pode haver duas cauções: uma prestada pelo credor, para receber o

preço; outra prestada pelo comprador ou adjudicatário para receber os bens. O terceiro tem

então um prazo de 30 dias para propor a ação de reivindicação, sob pena de o adquirente

poder requerer a extinção das garantias destinadas a assegurar a restituição dos bens e o

reembolso do preço ao credor que haja recebido o produto da venda. Naturalmente que a

ação de reivindicação em si mesma poderá ser sempre colocada depois desse prazo: se a ação

não for intentada tal não se reflete na ação de reivindicação mas nos efeitos do ato processual

do protesto já praticado no processo executivo. Trata-se, pois, de um prazo de natureza

processual. Idêntica cominação pode ter lugar se a ação de reivindicação estiver parada por

negligência sua, durante três meses. Como já escreveremos, se a ação for julgada procedente,

a 2.ª parte do n.º2 do artigo 842.º CPC determina que o adquirente fica com o direito de

retenção da coisa comprada, enquanto lhe não for restituído o preço. Pode, nessa

eventualidade, o proprietário reaver o preço dos responsáveis, se houver de o satisfazer para

obter a entrega da coisa reivindicada. Este regime vale, com as necessárias adaptações, ao

caso de ação ser proposta, sem protesto prévio e antes da entrega dos bens móveis ou do

levantamento do produto da venda. Portanto, deverão ser aplicadas as mesmas medidas

cautelares.

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§60.º - Arguição de nulidade, simples requerimento e reclamação

Reclamação dos atos do agente de execução: tal como demonstrámos em sede geral,

a reclamação do ato de penhora (artigo 723.º, n.º1, alínea c) CPC) servirá para alegar violação

de deveres profissionais, erro de decisão, e erro de procedimento (nulidade) quanto ao um

concreto ato de iter da penhora. Pode ocorrer uma nulidade procedimental de penhora

quando:

1. Seja realizado um ato que a lei não admita, nem a título discricionário; ou

2. Haja omissão de um ato ou de uma formalidade que a lei prescreva.

Assim, e como se escreveu atrás, os despachos do agente de execução, como a decisão sobre

a redução da penhora de vencimento regem-se tanto pela regra geral do artigo 195.º CPC,

como pelas regras especiais dos artigos 614.º e seguintes CPC. Por seu turno, os atos

executivos de penhora serão nulos quando a lei o estatua ou ipsum facto pela sua própria

verificação ou omissão, pois não há uma decisão cujo sentido final deva ser considerado. A

reclamação do ato do agente de execução está, por regra, excluída para invocar que uma

penhora é intrinsecamente nula por ser objetiva ou subjetivamente ilegal. Para estas hipóteses,

o sujeito tem a seu dispor os já conhecidos meios de oposição à penhora, embargos de

terceiro e outros com o mesmo fundamento. Assim, por exemplo, a impugnação pelo

executado da violação dos limites do artigo 738.º, n.º1 CPC, deve ser feita em oposição à

penhora, porque a alínea a) do n.º1 do artigo 784.º CPC a admite. Na verdade, a lei quer, para

proteger o exequente, que ele seja ouvido e que a causa seja conhecida em sede de processo

com mais garantias: a oposição à penhora. Mas, já o ato de recusa de substituição dos bens

penhorados por outros, requerida ao agente de execução ao abrigo do artigo 751.º, n.º4,

alínea a) CPC, só pode ser sindicável pela reclamação. Ou seja, não está completamente

vedado ao exequente poder invocar a ilegalidade da penhora – ato ou fase de atos – por

reclamação, em casos restritos. A título meramente exemplificativo, são ainda passíveis de

reclamação pelo exequente:

1. A penhora de bens não indicados pelo exequente, quando a indicação de bens

seja vinculativa: em termos genéricos e expressos do artigo 751.º, n.º2 CPC;

2. A penhora objetiva ou subjetivamente ilegal pelo exequente;

3. A negação da verificação dos pressupostos da comunicabilidade da dívida,

previstos no Código anterior;

4. O indeferimento de requerimento dirigido ao agente de execução – v.g. de

reforço da penhora, nos termos do artigo 751.º, n.º4 CPC;

5. Em geral, a violação dos deveres funcionais do agente de execução na

penhora quando sejam processualmente relevantes e não configurem

nulidades processuais, de modo a provocar a fiscalização por parte do juiz.

Têm legitimidade a parte ou terceiro, incluindo o debitor debitoris na penhora de créditos.

Simples requerimento: o uso do simples requerimento para impugnação da penhora é,

tradicionalmente, admitido a título residual. Em primeiro lugar, o requerimento pode ser

deduzido quando a lei o preveja expressamente. Assim, atende-se ao requerimento que está

previsto no n.º6 do artigo 738.º CPC, para a redução ou extensão dos rendimentos periódicos

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penhorados. Dele já demos notícia suficiente atrás. Considere-se ainda o simples

requerimento de levantamento da penhora de bens que o herdeiro executado não haja

recebido em herança, do artigo 744.º CPC. Este deve ser deduzido no prazo indicado para o

incidente de oposição à penhora – artigo 785.º, n.º1 CPC –, com indicação ao mesmo tempo

dos bens da herança que o herdeiro tenha em seu poder. O requerimento é deferido se,

ouvido o exequente, este não fizer oposição. Opondo-se o exequente ao levantamento da

penhora, o executado pode obter o seu levantamento se, tendo a herança sido aceite a

benefício de inventário, juntar a certidão deste ou se, tendo a herança sido aceite pura e

simplesmente, alegar e provar que os bens penhorados não provieram da herança e que não

recebeu da herança mais bens do que aqueles que indicou ou, se recebeu mais, que os outros

foram todos aplicados em solver encargos dela. Nos demais casos restam-lhes os embargos

de terceiro. Em segundo lugar, o requerimento é ainda o meio para as partes deduzirem uma

pretensão ou pedido ao agente de execução no âmbito das competência deste.

Nomeadamente, é por requerimento que o executado pede ao agente de execução a

substituição dos bens inicialmente penhorados (artigo 751.º, n.º4, alínea a) CPC). E é também

por simples requerimento que o executado traz à execução uma informação sobre a qualifade

de um bem como comum ou próprio ou sobre a titularidade ou a situação de um bem. Em

terceiro lugar, o simples requerimento continua a ser o meio residual de oposição à penhora

de bens, pelo próprio exequente (v.g. os bens serem do próprio exequente ou qualquer outra

ilegalidade, máxime, quando os bens foram indicados pelo executado, nos termos do artigo

750.º, n.º1, 2.ª parte CPC. Aqui não há nada a reclamar do agente de execução, para arguir

como nulo: o ato de penhora era válido em face dos elementos conhecidos pelo agente de

execução. Em todos os demais casos, a impugnação pelo exequente da atividade do agente

de execução deverá ser feita sempre por arguição de nulidade ou por reclamação do ato do

agente de execução, nos termos atrás delimitados.

§61.º - Apelação e reclamação

Apelação: em fase de penhora são raros os despachos do juiz. Apenas a penhora de saldo

bancário carece de despacho judicial prévio e também carece de despacho judicial a entrada

em domicílio ou sede social com uso de força pública (artigo 757.º, n.º2 CPC). Mas, no artigo

738.º, n.º6 CPC é o juiz quem decida da alteração ao âmbito da penhora de rendimentos.

Nos termos gerais, esses despachos são passíveis de recurso, seja por um error in procedendo –

nulidades do artigo 738.º CPC, nulidades gerais do artigo 195.º CPC – seja por error in iudicando

de onde resulte a violação das normas sobre o objeto e os limites da penhora. No quadro

monista atual o recurso próprio é o de apelação, nos termos dos artigos 644.º e 852.º e

seguintes CPC.

Reclamação: o executado ou o exequente podem reclamar daqueles mesmos despachos

quando estes não admitam recurso ordinário, nos termos do artigo 615.º, n.º4 CPC. Isso

sucederá quando pelo valor da causa e da sucumbência não for admissível apelação; caberá,

então, a reclamação.

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III – Intervenção do cônjuge e reclamação de créditos

A – Citação. Intervenção do cônjuge

§62.º - Citação e intervenção

Citação do cônjuge e credores reclamantes:

Sujeitos e momento: consumada a penhora, sabemos já que pode haver lugar a citação do

executado quando a forma seja sumária (artigo 856.º, n.º1 CPC), nos termos já atrás referidos,

no ato da penhora, sempre que ele esteja presente, ou, não estando, no prazo de 5 dias. No

regime anterior estes contavam-se da realização da última penhora, mas no artigo 856.º, n.º2

do atual CPC basta uma penhora. Ora – só depois dessa citação que é inicial à fase da penhora

–, determinam os n.º1, 2 e 5 do artigo 785.º CPC que, conforme a competência do artigo

719.º, n.º1 CPC concluída a fase da penhora e apurada, pelo agente de execução, a situação

registal dos bens (diz-se expressamente no n.º1 do artigo 786.º CPC) este procede

oficiosamente à citação de:

1. O cônjuge do executado, nas situações que melhor veremos adiante de penhora de

bens imóveis ou estabelecimento comercial que o executado não possa alienar

livremente; de penhora de bens comuns do casal, para os efeitos de promoção da

separação de bens e comunicação da dívida; exclusivamente para declarar se aceita a

comunicabilidade da dívida;

2. Os credores que sejam titulares de direito real de garantia, sobre os bens

penhorados, registado ou conhecido, para reclamarem o pagamento dos seus

créditos, incluindo (esclarece-se na alínea a) o n.º1 do artigo 786.º CPC) de penhor

cuja constituição conste do registo informático de execuções;

3. A Fazenda Pública representada pelo Ministério Público;

4. O Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social I.P, dotado de

personalidade jurídica autónoma da do Estado, pelo que não é representado pelo

Ministério Público.

Em especial, quanto aos direitos reais de garantia que não estejam registados – assim, a

hipoteca – eles são conhecidos no processo por alguma das vias especialmente criadas para

esse efeito. A saber:

1. O exequente pode indicar os credores que conheça no requerimento executivo;

2. O executado tem o dever de indicação de direitos, ónus e encargos não registáveis

que recaiam sobre o bem penhorado, e respetivos titulares ou beneficiários, no prazo

da oposição e sob pena de condenação como litigante de má fé (artigo 753.º, n.º3

CPC);

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3. Oficiosamente, o agente de execução pode no ato de apreensão de bem em poder

de terceiro indagar se o terceiro tem os bens em seu poder por via de penhor ou de

direito de retenção e, em caso afirmativo, procede imediatamente à sua citação (n.º2

do artigo 747.º CPC); se esta não poder ser feita regular e imediatamente é anotado

o respetivo domicílio para efeitos de posterior citação;

4. O juiz pode conhecer oficiosamente a existência de garantia real, máxime de direito

de retenção, impondo-se-lhe que ordene a sua citação ao agente de execução.

Portanto, o credor que seja conhecido do processo por alguma destas vias deve ser citado,

em todos os demais casos, é um credor desconhecido do processo, podendo reclamar

espontaneamente o seu crédito (artigo 788.º, n.º3 CPC) conforme se vai ver. No artigo 786.º

CPC, para a citação do cônjuge, deve distinguir-se em função do que está disposto nos seus

n.º8 e 9. Antes de mais, a citação do cônjuge do executado é realizada no prazo de cinco dias

a contar do apuramento da situação registal dos bens. Portanto, o prazo conta-se só depois

do cumprimento de um especial dever de cuidado ao agente de execução. Trata-se,

claramente, de um vago e dificilmente controlável termo inicial para um ato tão importante

como é o da citação do cônjuge. Por seu lado, a citação dos credores com garantia real, da

Fazenda Pública e Segurança Social faz-se em cinco dia (5 dias) a contar do termo do prazo

de que o executado dispõe para deduzir oposição à penhora.

1. Procedimento: quanto ao modo de ser realizada, a lei é omissa mas a solução só

pode ser a mesma praticada no regime anterior onde se determinava que a citação do

cônjuge e dos credores era feita nos termos gerais, i.e. dos artigos 227.º e seguintes.

Por isso, a citação será promovida pelo agente de execução por via postal (artigo

228.º, incluindo o artigo 246.º para as pessoas coletivas CPC) e se esta citação se

frustrar a citação é efetuada mediante contacto pessoal do agente de execução com

o executado, eventualmente, com hora certa (artigos 231.º e 232.º CPC). Os credores

a favor de quem exista o registo de algum direito real de garantia sobre os bens

penhorados são citados no domicílio que conste do registo, salvo se tiverem outro

domicílio conhecido. Por seu turno, os titulares de direito real de garantia sobre bens

não sujeito a registo são citados no domicílio que tenha sido indicado no ato da

penhora ou pelo executado. Mas, frustradas estas diligências, apenas os credores não

podem ser citados editalmente (artigo 786.º, n.º7 CPC) mas já o pode ser o cônjuge,

leia-se o preceito a contrario, de forma a obstar à limitação anterior que, proibindo a

citação edital a ambos, obviava à venda sem a efetiva citação do cônjuge pois se

cominaria esta com nulidade. Já os credores, podem sempre deduzir reclamação

espontânea, como dissemos. Finalmente, a Fazenda Pública e a Segurança Social são

citadas pelo agente de execução exclusivamente por meios eletrónicos.

2. Conteúdo: anteriormente previa-se que, juntamente com os elementos exigidos pelo

que corresponde hoje ao artigo 227.º CPC, seria entregue ao citando cópia do auto

de penhora. O atual regime não contém uma tal garantia, mas não se vê como das

regras gerais de citação e do devido processual legal não resulte a manutenção desse

regime. Deste modo, o cônjuge e o credor reclamante devem ser informados dos/da:

a. Dados identificativos do processo (artigo 227.º, n.º1, 2.ª parte CPC);

b. Necessidade de patrocínio judiciário, quando seja obrigatório (artigo

227.º, n.º1 CPC);

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c. No caso do cônjuge, do prazo para deduzir oposição à execução ou à

penhora, ao abrigo do artigo 787.º, n.º1 CPC (artigo 227.º, n.º2 CPC);

d. No caso do credor, do prazo para deduzir reclamação de créditos

(artigo 227.º, n.º2 CPC).

No plano documental, o citado recebe:

a. Duplicado do requerimento executivo e cópias do título executivo e

documentos que acompanhem (artigo 227.º, n.º1, 1.ª parte CPC);

b. Cópia do auto de penhora do bem pelo qual foram citados (artigo 753.º,

n.º2 CPC por analogia).

3. Nulidade e falta de citação:

a. Regime e consequências no procedimento: o desrespeito pelas normas

de procedimento e de conteúdo da citação pode ser causa de nulidade da

citação, nos termos gerais do artigo 191.º CPC. Por isso, a nulidade pode ser

invocada pelo cônjuge e credor ao prazo da oposição ou da reclamação de

créditos. Se não foi sequer indicado esse prazo a nulidade será arguida

aquando da primeira intervenção no processo, mas esse vício pode ser

conhecido pelo tribunal oficiosamente (artigo 196.º, 1.ª parte CPC), logo que

dele se aperceba em qualquer estado do processo. Se a irregularidade consistir

em se ter indicado para a oposição ou para a reclamação prazo superior ao

que a lei concede, deve a defesa ser admitida dentro do prazo indicado, a não

ser que o exequente tenha feito citar novamente o réu em termos regulares.

A arguição só é atendida se a falta cometida puder prejudicar a defesa do

citado. Já a pura e simples falta de citação do cônjuge do executado ou do

credor reclamante imposta pelo artigo 786.º, n.º2 e 3 CPC tem o mesmo

efeito que a falta de citação do réu, o que implica, antes de mais, que ela segue

o regime geral da nulidade primária da falta de citação. Em concreto: alegação

pelo cônjuge ou credor (artigo 197.º, n.º1 CPC) em qualquer estado do

processo (artigo 198.º, n.º2 CPC), sem prejuízo de conhecimento oficioso

pelo juiz da execução (artigo 196.º CPC). No requerimento serão alegados e

demonstrados os pressupostos do ato de citação omitido. No caso do

cônjuge, serão a qualidade de cônjuge e a qualidade dos bens, sendo certo

que a qualidade de bens comuns não é de conhecimento oficioso, ao

contrário da natureza imóvel ou de estabelecimento comercial do bem. No

caso do credor reclamante deve juntar um título exequível e um documento

constitutivo da garantia real conhecida ou registada. A falta de citação do

cônjuge do executado fica sanada se ele intervier na execução sem logo a

arguir, nos termos do artigo 189.º, n.º1 CPC. Identicamente a falta de citação

do credor reclamante fica sanada se ele optar por intervir espontaneamente

na causa sem arguir a falta de citação, conforme o artigo 788.º, n.º3 CPC.

Não sendo sanada a falta de citação e sendo decretada a nulidade, cabe

discutir em que momento se dará a produção de eficácia, qual o seu objeto e

qual a sua extensão:

i. Quanto ao momento:

1. Anselmo de Castro: é de opinião que o efeito de anulação

não pode dar-se antes de a qualidade que a pressupõe –

cônjuge ou credor reclamante – estar verificada, o que quanto

ao reclamante seria após o despacho liminar de admissão da

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reclamação ou mesmo depois de obter sentença de

verificação e graduação, por somente por ela se constituir a

situação legitimante da anulação. Mais acrescentaríamos nós:

no plano prático, caso se viesse a não reconhecer em

definitivo essa qualidade de credor legitimado para reclamar

ter-se-ia de repristinar a situação anterior à anulação.

2. Mas, com o devido respeito não podemos acompanhar

completamente: existindo despacho liminar de admissão

das reclamações, a procedência da arguição de nulidade basta-

se com a prova das qualidades de legitimação junto do juiz

que aprecia a arguição de nulidade. Uma vez decretada, a

decisão judicial será imediatamente eficaz, não ficando

condicionada. Se assim não fosse, o reclamante que arguira

nulidade seria admitido condicionalmente à reclamação no

estado em que estivesse, não podendo já determinar a

anulação dos termos passados, e, desse modo, potenciando

uma sentença final de não verificação do crédito. Anselmo de

Castro conclui que deve o credor que requer a anulação por

falta de citação, cumulativamente, deduzir a reclamação de

créditos de modo, mas tal não será o melhor parece-nos. A

legitimidade para a arguição de nulidade basta-se com a prova

referida atrás e não pode impor-se ao credor que vá reclamar

em condições apressadas. Pelo contrário, ele tem ainda

direito à citação, ato que deverá ser praticado, conforme o

artigo 202.º CPC.

ii. Quanto ao objeto e extensão da anulação: a remissão para o regime da falta

de citação do réu parece determinar ser nulo tudo o que se processe

depois da penhora dos bens em questão salvando-se apenas esta

(artigo 187.º, alínea a) CPC):

1. Atos executivos, incluindo vendas, adjudicações, remições ou pagamentos

já efetuados;

2. O apenso de verificação e graduação de créditos.

Todavia, esta anulação é manifestamente relativa ou restritiva.

Assim, em primeiro lugar, relativamente aos atos executivos, a anulação

refere-se aos atos de que credor exequente há-de ter sido beneficiário

exclusivo. Será beneficiário exclusivo o exequente que, no cas da venda, foi

o comprador beneficiário exclusivo se lhe couber em pagamento todo o

preço da coisa adquirida por terceiro. A contrario não se anulam as vendas,

adjudicações, remições ou pagamentos já efetuados, dos quais o exequente

não haja sido exclusivo beneficiário. Por outras palavras, anular-se-ão as

vendas, adjudicações, remissões ou pagamentos já efetuados se os bens

forem adquiridos pelo exequente e para ele houver revertido todo o seu

produto (Anselmo de Castro), mas, ao contrário, já não se anularão esses atos

se:

i. Os credores reclamantes beneficiarem de algum dos modos de pagamento (artigo

795.º, n.º1 CPC); ou

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ii. Terceiros exerceram o direito de remição sobre os bens (artigo 842.º CPC) ou o

direito de preferência (artigo 819.º, n.º1 CPC).

A regra visa a proteção do adquirente dos bens, estranho à execução, e,

indiretamente, a segurança da venda; em segundo lugar, a proteção dos

credores a quem tenham já sido liquidados os seus créditos. Em segundo

lugar, tanto para os atos executivos como para os atos do apenso de

reclamação e graduação parece ser de seguir o princípio do aproveitamento

dos atos processuais pugnado por Anselmo de Castro: devem anular-se

apenas os atos ou sequências de atos que prejudicam o credor reclamante ou

o cônjuge que não foi citado, evitando-se uma anulação indiscriminada.

Antes de mais são anulados somente os atos relativos aos bens por cuja

penhora cônjuge e reclamante seriam citados, naturalmente. Depois, quanto

aos atos executivos nada haverá que anular quanto àqueles que sejam

indiferentes à presença do credor – e do cônjuge, acrescentamos – na

execução. Assim, quanto ao apenso de reclamação de créditos em que tenha

havido graduação de créditos apenas se anularia a parte relativa aos bens da

garantia mas que viessem a beneficiar do pagamento; se não houve venda ou

adjudicação também nada se anula, sem prejuízo de o credor ser admitido

para, querendo, exercer os direitos que lhe confere o artigo 850.º, n.º2 CPC.

Verificada a falta de citação, com esses efeitos sobre o processado posterior,

pode o ato de citação ser repetido, conforme o artigo 202.º CPC, como já

escrevemos. Todavia, enquanto não forem citados para a causa tanto o

cônjuge, como o credor mantêm-se como terceiro, naturalmente. Por isso, o

cônjuge pode embargar de terceiro, ao abrigo do artigo 343.º CPC,

impugnando a penhora dos bens comuns. Já quanto aos imóveis e

estabelecimento comercial próprios do executado, a omissão da citação

imposta pela 1.ª parte da alínea a) do n.º1 do artigo 786.º CPC não gera

invalidade subjetiva da penhora pois os bens não são do terceiro.

b. Cominações: na eventualidade de não ser anulada a venda, adjudicação,

remissão ou pagamento já efetuados garante-se ao cônjuge ou ao credor cuja

citação foi omitida o direito a ser indemnizado segundo as regras do

enriquecimento sem causa (artigo 479.º CC), não apenas pelo exequente

(como antes se estabelecia), mas por qualquer credor imediatamente pago em

vez dele e atendendo à graduação que deveria ter ocorrido. Cumulativamente,

tem ainda o direito a ser indemnizado segundo as regras de responsabilidade

civil pela pessoa a quem seja imputável a falta de citação: o agente de

execução que omitiu a diligência (artigos 187.º, alínea a) e 186.º, n.º1 – corpo

– e 2.º CPC), o exequente ou o executado que, sabendo ou devendo saber,

não informaram no processo da existência de uma garantia real a favor de

terceiro (artigo 724.º, n.º1, alínea i) e 753.º, n.º3 CPC), ou o terceiro que

recebeu a citação e não a entregou ao destinatário da citação (artigos 187.º,

n.º1, alínea e) e 232.º, n.º2 CPC). Incumbirá, sempre ao credor lesado ou

empobrecido, a prova da falta de citação – o despacho que deferiu a arguição

de nulidade –, do empobrecimento ou dano e do nexo entre estes.

Adicionalmente, no caso do enriquecimento sem causa, deverá apontar-se a

medida do enriquecimento do exequente ou credor efetivamente pago,

enquanto no caso da responsabilidade civil está dispensado da prova da culpa

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pois esta tem como pressuposto o facto da falta de citação,

independentemente de culpa, e, portanto, de caráter meramente objetivo. Em

ambos os institutos, o valor que está em causa, seja como empobrecimento,

seja como dano, respetivamente, qual é?

i. É o da perda da garantia real na íntegra?

ii. É o valor da perda da garantia real mas na medida concreta do pagamento que

obteria com a graduação a que faltou?

iii. Ou é esta mas após a venda do património sobrante do executado?

Tomamos a segunda opção: tem de se fazer um juízo de prognose e apurar

o que o credor perdeu concretamente em face da putativa graduação de

créditos. Não é de descontar o eventual – eventualíssimo – património

restante do executado, pois esse seria sempre de considerar ainda que tivesse

podido reclamar. Estes direitos devem fazer-se valer em ações autónomas de

condenação tendo como documentos probatórios da causa de pedir o

documento constitutivo ou certificativo da garantia real, o despacho de

nulidade e ainda a sentença de reconhecimento e graduação do crédito em

questão. Já Anselmo Castro defende que poderia logo executar a obrigação

– a liquidar em incidente, acrescentamos – na própria execução servindo de

título executivo aqueles documentos. A ser assim, ter-se-ia de admitir a sua

prorrogação apenas para essa finalidade.

Intervenção do cônjuge:

1. Pressupostos: concretizando melhor o que atrás se apresentou, a citação do cônjuge

do executado deve ter lugar:

a. Nos termos do artigo 786.º, n.º1, alínea a) CPC, quando a penhora

tenha recaído sobre:

i. Bens imóveis ou estabelecimento comercial que o executado não possa alienar

livremente, para os efeitos constantes do artigo 787.º, n.º1 CPC; ou

ii. Bens comuns do casal, cumprindo-se o disposto no artigo 740.º, n.º1 CPC, e para

os efeitos constantes dos artigos 740.º (em parte – promoção da separação dos

bens), 741.º a 742.º (comunicação da dívida) e 787.º, n.º2 CPC;

b. Nos termos do artigo 786.º, n.º5 CPC, exclusivamente para, no incidente de

comunicabilidade, declarar se aceita a comunicabilidade da dívida alegada por

exequente ou por executado, respetivamente nos termos dos artigos 741.º e

742.º CPC, citação imposta pelos artigos 741.º, n.º2 e 742.º, n.º1, n fine CPC.

Em qualquer dos casos, trata-se de execução de dívidas próprias em face do título

executivo, i.e., quando a dívida é própria do outro consorte, executado. Se fossem

dívidas comuns já sabemos que a necessidade litisconsorcial imporia que ambos os

cônjuges estivessem a ser executados, pelo que a penhora de imóveis e de

estabelecimento comercial não apresentaria relevância autónoma.

a. No caso da 1.ª parte da alínea a) do n.º1 do artigo 786.º CPC o objeto da

penhora são bens próprios do executado com uma especial legitimidade

material nos atos dispositivos ou de oneração de certos bens do casal. No

Direito anterior à reforma de 2003, impunha-se esta citação, mas apenas em

caso de penhora de imóvel de que o executado não pudesse livremente dispor

nos termos do artigo 1682.º-A CC. Procedeu-se, então, a uma inclusão no

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regime de uma referência ao estabelecimento comercial, que, segundo o

artigo 1682.º-A CC, não pode ser alienado, onerado ou locado sem o

consentimento de ambos os cônjuges. Houve, pois, uma aproximação ao teor

lilteral deste preceito. Excluída, permanece a citação do cônjuge do executado,

quando sejam penhorados os bens móveis a que se refere o artigo 1682.º CC.

Tal não é de estranhar, se tivermos em conta que a função da alínea a) do

n.º1 do artigo 786.º CPC não é a de conseguir uma completa harmonização

com a letra dos preceitos do Código Civil, mas a de que a tutela civil do

cônjuge seja aceite sem não conflituar com as finalidades desta. Ora, a ratio

das limitações à alienação e oneração negocial de certos bens por cônjuge

(evitar abusos do poder dipositivo) não se justifica quando aquelas sejam

executivas. Acresce que o legislador processual mostra, em vários pontos,

que a penhora e a venda de bens imóveis ou de estabelecimento comercial

merece mais cuidados do que a penhora e venda de móveis: vejam-se os

artigos 829.º e 816.º, n.º1 CPC.

b. No caso da 2.ª parte da alínea a) do artigo 786.º CPC, o objeto da

penhora são bens comuns do casal ou como se lê agora quando se verifique

o caso previsto no n.º1 do artigo 740.º CPC. Relembre-se que, como já atrás

estudamos, nessa eventualidade, cita-se o cônjuge do executado citado para,

no prazo de que dispõe para a oposição 20 dias, requerer a separação de bens

ou juntar certidão comprovativa da pendência de ação em que a separação já

tenha sido requerida. Relembre-se que na execução de dívida própria em face

do título apenas subsidiariamente pode ser penhorada meação do executado

nos bens comuns do casal (artigo 1696.º, n.º1, 2.ª parte CC). O apuramento

da meação exige uma prévia partilha dos bens comuns, ainda indivisos.

Justamente dada a comunhão da titularidade com o cônjuge e a proibição de

penhora de bens de terceiro à execução (artigo 735.º CPC) o cônjuge é citado

nos termos do n.º1 do artigo 740.º CPC para entrar na execução e proceder,

querendo, à separação da sua meação, em ação autónoma.

No atual regime, o incidente de comunicabilidade da dívida do executado passa a

merecer tratamento autónomo tanto no plano sistemático, como dos pressupostos,

como procedimental. A ele se destinam os artigos 741.º e 742.º CPC. Como já vimos,

o exequente pode proceder à alegação da comunicabilidade no requerimento

executivo ou até ao início das diligências da comunicabilidade no requerimento

executivo ou até ao início das diligências para venda ou adjudicação, enquanto para

o executado será na oposição à penhora. Depois o cônjuge tem de ser citado, como

impõem os artigos 741.º, n.º2 e 742.º, n.º1, in fine CPC. Donde, ter-se previsto agora

a citação do cônjuge para essas finalidades no artigo 786.º, n.º5 CPC.

2. Estatuto processual do cônjuge: as alterações de 2013: o estatuto processual do

cônjuge que está na ação sem ser parte executada, i.e., que está nessa ação para tutelar,

na medida do compatível com a execução, os seus direitos sobre imóveis ou

estabelecimento comercial próprios do executado ou para requerer a separação de

bens ou para ser ouvido na comunicação da dívida, tem conhecido alguma flutuação.

Que poderes e que papel – parte principal, parte acessória – conhece? A reforma de

2003 trouxe duas mudanças significativas, afinadas na reforma de 2008-2009:

a. Teve lugar uma equiparação entre o estatuto do executado e o estatuto

do seu cônjuge.

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b. Ocorreu uma mudança de fundo do estatuto processual do cônjuge

citado. Já sabemos que os seus poderes processuais de base são requerer a

separação de bens ou juntar certidão comprovativa de pendência de ação com

esse efeito. O cônjuge citado nos termos do artigo 742.º CPC foi equiparado

ao cônjuge citado pela penhora de imóvel ou estabelecimento comercial.

Passou a enunciar-se de forma inequívoca que o cônjuge é citado, seja qual

for o fundamento. Tratou-se de uma opção de uniformização bastante

discutível: o cônjuge foi chamado à execução para tratar da questão da

separação de bens; não nos parece que o seu interesse em manter a indivisão

dos bens merecesse tal tutela. O seu caso era diferente da posição do cônjuge

que é citado nos restantes termos.

No Código reformado em 2013 há algum regresso à boa vida. Assim, pelo artigo

787.º, n.º1 CPC o cônjuge do executado citado pela penhora de estabelecimento

comercial ou imóvel (nos termos da 1.ª parte da alínea a) do n.º1 do artigo 786.º CPC)

continua a ter um prazo de 20 dias para se opor à penhora dos bens respetivos,

podendo cumular eventuais fundamentos de oposição à execução. Por outro lado,

pode exercer nas fases da execução posteriores à sua citação, todos os direitos que a

lei processual confere ao executado. Esses direitos são, entre outros, os previstos:

a. No apenso de verificação e graduação de créditos, no artigo 789.º, n.º2

CPC;

b. Na fase de pagamento, nos artigos 812.º, n.º1 e 7, 813.º, n.º1 e 3, 814.º,

n.º2, 821.º, n.º1, 822.º, n.º1, 825.º, n.º1, 832.º, alíneas a) e b), 833.º, n.º2,

834.º, n.º1, alínea a) e 835.º, n.º1 CPC.

A contrario, o cônjuge citado nos termos da 2.ª parte do n.º1 do artigo 786.º, n.º1 CPC,

não beneficia deste estatuto. Portanto, não pode opor-se à penhora e à execução,

nem pode exercer os mesmos poderes do executado nas fases subsequentes. O que

sucede é que, como se esclarece no n.º2 do artigo 787.º CPC, nos casos especialmente

regulados nos artigos 740.º a 742.º CPC, é o cônjuge do executado a exercer as

faculdades aí previstas. Ou seja: naturalmente que além do referido ónus de requerer

a separação de bens (se for o caso), participará de eventual incidente de comunicação

da dívida.

3. Qualidade de parte: o cônjuge citado permanece como parte acessória ou como

parte principal?

a. No Direito pretérito: entendeu-se que o cônjuge citado nos termos da

correspondente 1.ª parte da alínea a) do n.º1 do artigo 786.º CPC, ou seja,

por causa da penhora de bens indisponíveis singularmente, era parte acessória

ou mesmo parte principal. Já a posição do cônjuge citado nos termos do

correspondente artigo 742.º CPC não era tão clara, mas, por contraste com a

daquele, não seria mais do que parte acessória, ou, porventura, um simples

interveniente, como o terceiro devedor (como no artigo 773.º CPC).

b. Parte principal é a que pode dispor da instância e do objeto do

processo: usando esse critério, pode afirmar-se que após a reforma de 2013,

o cônjuge intervenienrte pelo artigo 740.º CPC ou pelo incidente de

comunicabilidade não é parte principal da execução: dele não dependem nem

o início, nem o termo do processo; tampouco a omissão dos seus atos

interfere na marcha do processo. Já o cônjuge do executado citado nos

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termos da 1.ª parte da alínea a) do artigo 786.º CPC está numa posição

diferente. É certo que não é titular da relação exequenda – máxime, não é

devedor – mas estando presente em razão dos bens, um pouco como os

terceiros garantes ou possuidores (artigos 54.º, n.º2 e 4 CPC), o direito que

lhe assiste de deduzir oposição à execução permite-lhe, sendo o caso, levar à

extinção da execução. Ela é, por isso, parte principal.

Quanto à sua relação com o próprio executado:

a. Lebre de Freitas vê o cônjuge como um substituto processual deste na

oposição à execução: pode deduzir outros fundamentos que não os já

invocados pelo executado, já, para as demais atuações processuais, na

ocorrência de oposição entre as posições expressas por ambos, o juiz

decidiria nos termos do artigo 723.º, n.º1, alínea d) CPC.

b. Pensamos que a atuação do cônjuge do executado ao ter expressão sobre o

mesmo crédito e sobre um bem que é só do executado ou também é do

executado – bem próprio ou bem comum, respetivamente –, indicia estarmos

perante um litisconsórcio unitário – a mesma unitariedade que a lei civil pede

ao exigir o consentimento para a oneração ou disposição, seja, no artigo

1682.º-A CC. Um representa o outro ao atuar processualmente. Mas o

cônjuge apresenta também um interesse específico dado pela lei civil que lhe

permitiu uma tutela autónoma, mesmo que em sentido contrário às posições

processuais do executado. Por isso, querendo os dois ou não atuar, com

efeitos processuais que se contradigam, terá de ser o juiz a suprir a falta de

acordo.

B – Reclamação de créditos

§63.º - Função e objeto

Função. Estatuto pessoal:

1. Função. As alterações de 2013: a citação de outros credores do executado é um

ponto sensível na economia da execução singular. O cumprimento voluntário de um

crédito, incluindo a condenação declarativa, não estará, por regra, restringido pela

existência de outra obrigação. Deste modo, o sistema processual executivo poderia

ser de execução individual ou singular somente, de credor contra o seu devedor.

Todavia, já assim não sucede no cumprimento forçado, por meio de apreensão e

venda de património do devedor. É que constituindo o património a garantia geral

de todas as obrigações (artigo 601.º CC) e sendo ele limitado, os efeitos das medidas

executivas, necessariamente favoráveis ao credor exequente, serão, inversamente,

desfavoráveis aos demais credores. Em termos simples, quanto mais bens forem

vendidos para pagar um credor, menos bens restarão para eventuais execuções de

outros credores. Ora os credores por estarem em pé de igualdade – por condicitio

creditorum – têm igual direito ao património. No entanto, não é fácil determinar um

ponto de equilíbrio entre o interesse do credor exequente e o interesse de todos os

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demais. Uma solução de exclusão de qualquer intervenção na execução singular,

esvaziaria o princípio da igualdade entre credores. Desse modo, prevaleceria sobre

os demais o credor exequente, máxime, o credor penhorante. A solução oposta seria

admitir a execução coletiva, i.e., por todos os credores, em plena identidade com o

princípio par condictio creditorum, e universal, i.e., de todo o património, houvesse ou

não incumprimento, o que não seria nem consentâneo com o regime das obrigações

sujeitas a prazo ou a condição, nem com a economia única de cada crédito. No nosso

ordenamento tal execução universal apenas é admitida em estado de insolvência do

devedor, ou seja, quando o devedor se encontrar impossibilitado de cumprir as suas

obrigações vencidas. Aí são chamados todos os credores a serem pagos

proporcionalmente pelo preço dos bens do devedor (artigo 604.º, n.º1 CC), mesmo

que os créditos não estejam a sofrer mora (artigos 20.º, n.º1 e 47.º, n.º1 CIRE). A

solução tradicional do sistema português é a da execução mista ou concursal,

intermédia entre a pura exclusão dos demais credores e a execução coletiva como a

da insolvência: a execução começa por ser singular – objetivamente apenas se dirige

aos bens necessários para a execução das dívidas de um credor – mas, realizada a

penhora, alarga-se a mais credores que preencham certos pressupostos.

a. Até à reformulação do Código efetuada em 1961, vigorou a execução

mista ampla do Código de 1939, pois podiam reclamar tanto credores com

garantia real sobre os bens penhorados, ainda que por dívida não vencida,

como credores comuns com créditos vencidos, ainda que sem título

exequível. Se os bens não chegassem o próprio reclamante podia estendê-la

a outros bens, por nomeação de bens, como, aliás, se permitida no Código

de 1876.

b. Desde então, está-se num sistema de execução mista restrita: permite-

se que os credores cujos créditos não estejam ainda vencidos – e, por maioria

de razão, aqueles cujos créditos se venceram – possam intervir quando haja

um nexo direto e necessário, e não apenas eventual, entre a execução e a

diminuição da garantia patrimonial numa futura execução. Qual é esse nexo?

O nexo é o da titularidade de uma garantia real que caduque com a venda ou

adjudicação. Justamente, o legislador previu expressamente que os bens

executados sejam vendidos livres de garantias reais, as quais caducam (artigo

824.º, n.º2 CC) por tal ser o mais conveniente tanto a exequente, quanto a

executado. Por isso, os respetivos titulares têm um interesse direito e atual

vir à execução. Aliás, de outro modo, esta transmissão executiva seria ilegal

se corresse com a ausência do titular da garantia a extinguir. E, assim, admite-

se atualmente que apenas possam intervir credores com garantias reais

(artigos 786.º, n.º1, alínea b) e 788.º, n.º1 CPC) quanto á execução dos bens

a que estas respeitam, exercendo as preferências previstas no artigo 604.º,

n.º2 CC. Ou seja: o contrário do exequente, o credor reclamante intervém

para uma execução limitada e real – um concurso de preferências – e não

para uma execução geral, i.e., sobre todo o património. Os credores

reclamantes, vêm, portanto, à execução para tutelar e fazer valer o seu direito

de garantia (Castro Mendes), ao contrário dos reclamantes no sistema do

Código de 1939 e, naturalmente, do credor exequente, que vinham para obter

o pagamento. No entanto, o exequente beneficia de uma prevalência no

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pagamento sobre qualquer outro credor que não tenha garantia real anterior,

nos termos do artigo 822.º CC. Executada a garantia sem satisfação integral

do crédito, restar-lhes-á abrir execução própria ou, mesmo, pedir a

insolvência do devedor (artigo 20.º, n.º1 CIRE).

Esta mesma ratio determina que não há lugar à reclamação de créditos se não houver

pagamento por meio de venda ou adjudicação (incluindo uma eventual remissão, nos

termos do artigo 842.º CPC), pois nessas eventualidades não sobrevém extinção da

garantia real ex vi artigos 824.º, n.º2 e 826.º CC. São os casos de pagamento:

a. Por entrega de dinheiro, na penhora de moeda corrente, depósito bancário

em dinheiro ou crédito de terceiro com prestação depositada (artigos 795.º,

n.º1 e 798.º CPC);

b. Por consignação de rendimentos requerida antes da citação de eventuais

credores reclamantes (artigo 803.º, n.º3 CPC);

c. Voluntário, mediante plano de pagamento a prestações desde que a

suspensão/extinção da instância seja anterior à citação dos eventuais credores

reclamantes (artigo 806.º, n.º2 CPC, respetivamente).

Portanto, nestas eventualidades, tanto será nula a citação dos credores, como será

inadmissível a respetiva intervenção espontânea. Já os credores comuns, com

créditos vencidos, mas não dotados de garantia real, podem eles mesmos serem

exequentes, tanto em ação executiva autónoma, como, mais dificilmente, em

coligação inicial ativa, nos termos do artigo 56.º, n.º1, alínea a) CPC. Deste modo, se

vão ter ao seu dispor todo o património do executado – na medida do seu crédito, é

certo – todavia correm o risco de virem a penhorar os mesmos bens de credores

exequentes anteriores. Neste caso, não terão outra via senão a da reclamação de

créditos, ex vi artigo 794.º CPC o que constitui um resultado paradoxal, sem dúvida,

que, de facto, aproxima a execução singular da execução coletiva.

2. Estatuto processual: o credor reclamante tem vários direitos e poderes processuais

tipificados. Afora aqueles enquanto parte do apenso de reclamação e graduação (v.g.,

impugnar os demais créditos, incluindo o exequendo, conforme, por exemplo, o

artigo 789.º, n.º1 e 3 CPC), e do direito essencial a ser pago pelos bens sobre que

tiver garantia e conforme a graduação do seu crédito (artigo 796.º, n.º2 CPC), o

reclamante beneficia de um leque de poderes processuais em sede de procedimento

executivo de venda. Assim, tem:

a. Poderes ativos de:

i. Requerer a sustação da segunda penhora (artigo 794.º, n.º1 CPC visto que o

preceito prevê que a sustação é oficiosamente promovida pelo agente

de execução);

ii. Requerer a adjudicação do bem (artigo 799.º CPC);

iii. Requerer a prossecução/renovação da execução suspensa/extinta por plano de

pagamento em prestações (artigo 809.º, n.º2, alínea b) CPC);

iv. Propor a venda de estabelecimento comercial de valor superior a 500 UC mediante

propostas em carta fechada (artigo 829.º CPC);

v. Requerer a extensão do objeto da penhora ao objeto da sua garantia ou penhora,

eventualmente acompanhada de extensão subjetiva – v.g., extensão às partes

integrantes excluídas da penhora; extensão ao direito real de gozo

menor, se a penhora só incidiu sobre a propriedade de raiz, com

citação do terceiro ao abrigo do artigo 54.º, nº.4 CPC:

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b. Poderes passivos de:

i. Garantia de notificação da liquidação da responsabilidade do executado (artigo

847.º, n.º3 CPC) e da extinção da execução (artigo 849.º, n.º2, in fine CPC);

ii. Audição sobre despacho de determinação da modalidade de venda (artigo 812.º,

n.º1 CPC) e sobre a anulação da venda (artigo 838.º, n.º2 CPC);

iii. Ser pago por entrega de dinheiro (artigo 798.º, n.º1 CPC);

iv. Apreciar e votar as propostas de venda em carta fechada (artigo 821.º, n.º1 CPC);

v. Acordar para que se aceitem propostas de valor inferior ao disposto no artigo

816.º, n.º2 CPC (artigo 821.º, n.º3 CPC) ou propostas de venda por negociação

particular (artigo 832.º, alíneas a) e b), in fine CPC), ou para que seja o agente

de execução a realizar a venda por negociação particular (artigo 833.º, n.º2 CPC);

vi. Propor a venda em leilão (artigo 834.º, n.º1, alínea a) CPC);

vii. Reclamar do despacho de determinação da modalidade de venda (artigo 812.º,

nº.7 CPC) e das irregularidades do ato de leilão (artigo 835.º, n.º1 CPC).

Por outro lado, o credor reclamante só está obrigado a depositar o excedente sobre

o montante do crédito que tenha reclamado sobre os bens adquiridos (artigo 815.º,

n.º2 CPC). Estes poderes e direitos são atribuídos aos reclamantes enquanto tal, i.e.,

enquanto hipotético credor legitimado pelo requerimento de reclamação,

independentemente de vir a ser efetivamente reconhecido e graduado o seu crédito.

Requerimento de reclamação admitido, entenda-se. Perante a diferença funcional

entre a posição de credor exequente e a posição de credor reclamante pode afirmar-

se que os credores reclamantes são partes principais? São partes acessórias, apesar de

opiniões em sentido oposto. É certo que pela reclamação de créditos o objeto

processual se torna múltiplo pois várias relações materiais podem ser tuteladas pela

execução, ainda que apenas uma suporte as demais. Daí alguns entenderem que com

a reclamação de créditos vêm posicionar-se ao lado do exequente outros

exequentes/credores que passarão como partes principais a impulsionar a execução

em pé de igualdade, criando-se um litisconsórcio ativo, de natureza especial. No

entanto, essa igualdade não existe em nossa opinião. Em boa verdade, os poderes

processuais do credor reclamante estão sempre objetivamente limitados pelos bens

da sua garantia, por exemplo, artigos 799.º, n.º2, 812.º, n.º1 e 6, 820.º, n.º1, 834.º, n.º1,

alínea a), 838.º, n.º2 e 847.º, n.º2 CPC. E se essa execução restrita não cobrir o seu

crédito não pode estendê-la a outros bens, máxime, indicar bens à penhora; o

reclamante deve, assim, instaurar uma própria e autónoma execução. Por outro lado,

parte principal é aquela que pode dispor da ação, abrindo-a, alterando-a e

extinguindo-a por sua vontade. Ora, o credor reclamante não pode extinguir, por

desistência, a execução. Já o exequente pode-o e o executado também, se pagar

voluntariamente àquele, sem consideração pelo reclamante, salvo após a transmissão

dos bens. De igual modo, o credor reclamante não pode estender o âmbito objetivo

da execução e se a execução se pode extinguir pelo interesse do credor exequente –

v.g., desistência da execução, pagamento voluntário, consignação de rendimentos –

outro tanto não sucede quanto aos reclamantes. Em suma: está a relação processual

sempre na disponibilidade exclusiva do exequente e do executado, como dizia

Anselmo de Castro. Todavia, este autor considerava que os reclamantes ex vi artigo

795.º, n.º2 CPC, i.e., com penhora sucessiva, seriam partes principais estritamente

quantos aos bens penhorados. Seriam exequentes que, em razão da litispendência,

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são forçados a exercer os seus direitos noutra execução e, por isso, nela

necessariamente hão-de dispor dos direitos que lhes caberia na sua própria execução.

Esta doutrina procede plenamente e permitirá resolver, como se verá adiante, o

problema dos limites e conteúdo da intervenção do exequente com penhora

sucessiva.

3. Estatuto extraordinário: substituição e promoção processual: não desmentindo

este estatuto processual, o credor reclamante pode, excecionalmente, verificados

certos pressupostos, substituir processualmente o credor exequente ou, ele mesmo,

passar à condição de credor exequente. Em ambos os casos exige-se sempre que se

trate de credor cujo crédito esteja vencido e que haja sido reclamado para ser pago

pelo produto da venda dos bens penhorados.

a. A promoção a credor exequente, que melhor analisaremos adiante, dá-se

nas condições do

i. Artigo 850.º n.º2 CPC: temos a promoção póstuma: no prazo de 10

dias contados da notificação da extinção requer o credor, que tenha

satisfeito aquelas condições (máxime, o vencimento da obrigação), a

reabertura da causa para efetiva verificação, graduação e pagamento

do crédito.

ii. Artigo 809.º, n.º4 CPC. Temos a promoção incidental: fica sem efeito

a suspensão/extinção da execução decorrente da pendência da

execução de plano de pagamentos, por requerimento do credor

reclamante nas mesmas condições que queira obter satisfação do seu

crédito.

Ocorrida essa vicissitude então, sim, o reclamante adquirirá o estatuto de

parte principal.

b. Já a substituição processual do exequente pelo reclamante está prevista

no artigo 763.º, n.º4 CPC. Qualquer credor reclamante naqueles pressupostos

pode substituir-se ao exequente na prática do ato que ele tenha negligenciado

desde que tenham passado três meses sobre o início da atuação negligente do

exequente e enquanto não for requerido o levantamento da penhora. Neste

caso, aplica-se, com as necessárias adaptações, o n.º3 do artigo 850.º CPC até

que o exequente retome a prática normal dos atos executivos subsequentes;

ou seja: a execução prossegue, como o reclamante podendo praticar os atos

processuais próprios na posição de exequente, mas apenas quanto aos bens

sobre que incida a garantia real invocada pelo reclamante requerente.

Portanto, diferentemente do que se passa na renovação da execução (artigo

850.º, n.º2 e 3 CPC), no artigo 763.º, n.º4 CPC o reclamante fica legalmente

legitimado para praticar um ato processual em representação do exequente.

Deste modo, evita que, por inação do exequente, sobrevenha deserção da

instância e, concomitante, extinção (artigos 277.º, n.º1, alínea c) e 281.º, n.º1

CPC): após seis meses da falta negligente de impulso processual (artigo 281.º,

n.º5 CPC). De contrário, com bem motiva o Ac. RL 20 abril 2006, o credor

reclamante ficaria impedido de diligênciar pela cobrança do seu crédito, pelo

menos com a celeridade devida, pois que por um lado, a sua própria execução

está sustada, não a podendo impulsionar, por outro, teria que aguardar a

extinção da instância da execução onde reclamou o seu crédito e em que a

penhora é anterior para a poder renovar, o que atentaria, além do mais, contra

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o princípio da economia processual e contra o direito de, em prazo razoável,

obter a realização coerciva do seu direito.

Pedido: o credor reclamante deduz dois pedidos em relação de prejudicialidade:

1. Que seja reconhecido o seu crédito; e

2. Graduado no pagamento do produto da venda em conformidade com a sua

garantia real.

Ou seja: como o credor exequente, o reclamante pede a realização coativa do seu direito, mas

já depois da penhora e de modo restrito à medida e à posição relativa da preferência dada

pela sua garantia real. É essa a boa doutrina de Teixeira de Sousa: o credor pede a

verificação e a graduação do seu crédito.

Causa de pedir: 855-430

1. Aquisição do direito à pretensão de pagamento ainda que não vencida

(elemento pessoal): tal como quanto ao credor exequente, a causa de pedir que

sustenta a reclamação de créditos integra, antes de mais e necessariamente, o facto

da aquisição do direito à pretensão de pagamento de quantia certa pelo executado ou

título material. Trata-se do elemento pessoal da causa de pedir. O executado tanto

pode ser o devedor ou terceiro vinculado à dívida, nos termos do artigo 54.º, n.º2

CPC. A obrigação reclamada deve ser certa, líquida – ou acertada ou liquidada pelos

meios de que dispõe o exequente (n.º7 do artigo 788.º CPC). Deste modo, valem

para o credor reclamante, mutatis mutandis, tanto os mecanismos de acertamento da

obrigação previstos no artigo 714.º CPC, quanto os mecanismos de liquidação

admitidos pelos artigos 358.º e seguintes e 716.º CPC. Porém, a obrigação não tem

de ser exigível, pois o mesmo n.º7 enuncia que credor é admitido à execução, ainda

que o crédito não esteja vencido. A possibilidade de um credor poder executar um

devedor, mesmo antes do vencimento, é uma exceção ao regime obrigacional comum

do cumprimento conforme o contratado (artigo 406.º, n.º1 CC). À sua maneira é

igual ao regime da insolvência: o direito à garantia da obrigação prevalece sobre o

direito do devedor ao prazo. Nesta eventualidade, a final, a sentença de graduação

determinará que, na contra final para pagamento se efetue o desconto

correspondente ao benefício da antecipação, nos termos do artigo 791.º, n.º3 CPC.

No plano formal, o crédito reclamado é titulado num documento pelo qual o credor

demonstra a aquisição de um direito a uma prestação por parte do executado. Em

conformidade, o n.º2 do artigo 788.º CPC enuncia que a reclamação tem por base

um título exequível contra o executado, ou seja, um documento que, se o credor

fosse exequente, poderia servir de título executivo, nos termos do artigo 703.º e

seguintes CPC. Esse título pode ser produzido mesmo supervenientemente ao

requerimento de reclamação de créditos, em condições previstas no artigo 792.º CPC

e que analisaremos mais adiante. O título executivo, no caso das reclamações por

dívidas fiscais, nos termos do n.º2 o artigo 786.º CPC, é a certidão de dívida a

apresentar pelo Ministério Público, sem a qual não pode haver reclamação. Por outro

lado, por que a reclamação de créditos é delimitada pelo título da reclamação é

vedado ao reclamante pedir mais do que o que se indica no título.

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2. Aquisição da titularidade de garantia real (elemento real): além da aquisição do

direito à pretensão de pagamento de quantia certa, o credor reclamante deverá ainda

alegar a titularidade de um direito real de garantia válido ou de um direito

funcionalmente análogo, sobre os bens penhorados. Este elemento bem se pode

nomear como o elemento real da causa de pedir, já que a intervenção do credor em

reclamação, mede-se pelos bens, em primeiro lugar, e só depois pelo seu crédito,

assumindo-se como uma execução real. É esse elemento que, conforme o artigo 604.º,

n.º2 CC, vai legitimar a que o credor seja pago na medida do seu crédito, tanto quanto

o produto da venda o permite, e não apenas proporcionalmente. Embora a lei pareça

cingir, a contrario da alínea b) do n.º1 do artigo 786.º CPC e do n.º1 do artigo 788.º

CPC, a exigência de garantia real aos credores não referidos no n.º2 do artigo 786.º

CPC, não é assim, todavia: também as entidades referidas nas leis fiscais e o Instituto

de Gestão Financeira da Segurança Social, I.P., a citar nos termos desse n.º2, devem

apresentar garantias reais. Simetricamente, se as mais das vezes essas entidades e

institutos apresentam privilégios creditórios, porém, também outros sujeitos, máxime,

os trabalhadores do executado, podem ter privilégios creditórios gerais a assegurar

os seus créditos. Em suma: podem reclamar créditos os credores, privados ou o

Estado, com as causas reais de preferência previstas no artigo 604.º, n.º2 CC:

A consignação de rendimentos, judicial ou voluntária (artigos 656.º e

seguintes CC);

Penhor (artigos 666.º e seguintes CPC), tanto de coisa (artigos 669.º e

seguintes CC), como de direitos (artigos 679.º e seguintes CC);

Hipoteca (artigos 686.º e seguintes CC), nas suas diversas

modalidades (voluntária, legal e judicial, ainda que posteriores à

penhora – artigos 712.º e seguintes, 704.º e seguintes e 710.º e seguintes

CC);

Privilégios creditórios (artigos 733.º e seguintes CC, ainda que sobre

rendimentos do bem penhorado nos termos dos artigos 739.º e 740.º

CC), mobiliários gerais (artigos 736.º e seguintes CC, entre outras

normas) e especiais (artigos 738º e seguintes CC, entre outros) e

imobiliários gerais e especiais (artigos 735.º, n.º3 e 743.º e seguintes

CC, etc.);

Direito de retenção (artigos 754.º e seguintes CC).

Desde 15 de setembro de 2003 que a lei restringe no n.º4 do artigo 788.º CPC, a

intervenção de credores com privilégios creditórios gerais, salvo quando se trate de

créditos de trabalhadores (n.º6 do mesmo artigo). Correlativamente, o artigo 749.º,

n.º2 CC, alterado em 2003, passou a contar com um n.º2 onde se lê que são as leis

de processo – leis substantivas, afinal? – que estabelecem os limites ao objeto e à

oponibilidade do privilégio geral ao exequente, bem como os casos em que ele não é

invocável ou se extingue na execução. Portanto, não se retirou existência legal a esses

privilégios, mas restringiu-se o seu âmbito de oponibilidade a terceiros. Os

pressupostos da limitação legal podem sintetizar-se nos seguintes termos, devendo

ser conjugado o valor da obrigação exequenda com o objeto da penhora:

Se o valor da obrigação exequenda for inferior a 190 UC (inferior a

19380€) o que é pouco mais de metade da alçada da Relação, haverá

restrição à reclamação fundada em privilégio creditório geral sobre:

i. Moeda corrente;

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ii. Depósito bancário em dinheiro;

iii. Direito de crédito para o qual o exequente haja requerido a consignação de

rendimentos ou a adjudicação, em dação em cumprimento, antes de convocados os

credores.

Se o valor da obrigação exequenda for igual ou superior a 190 UC,

haverá restrição à reclamação fundada em privilégio creditório geral

sobre:

i. Bem parcialmente penhorável, nos termos do artigo 738.º CPC;

ii. Renda ou outro rendimento periódico;

iii. Veículo automóvel;

iv. Bens móveis de valor inferior a 25 UC.

a. Direitos funcionalmente análogos (penhora e arresto): o credor

reclamante pode apresentar a penhora como elemento real da sua causa de

pedir, como decorre do regime do artigo 794.º CPC. Já vimos que se alguma

doutrina e jurisprudência qualifica a preferência prevista no artigo 736.º CPC

como um direito real de garantia (Ac. RE 11 fevereiro 1999) outra nega-a

Todavia, esta discussão teórica não tange a admissibilidade de reclamação

fundada em penhora: ela é pacífica, como se pode discorrer dos n.º3 e 5 do

artigo 788.º CPC. Mas tem-se discutido se, dada a similitude de efeitos com

a penhora (artigo 622.º CC e 391.º, n.º2 CPC), o credor que apenas beneficie

de um arresto pode intervir como reclamante. Trata-se de credor não

exequente, pois sendo o credor exequente tem a faculdade de proceder à

conversão do seu prévio arresto em penhora, ao abrigo do artigo 762.º CPC.

i. A jurisprudência dominante entende que o arresto ainda não

convertido em penhora não confere qualquer preferência no

pagamento, pois não é uma garantia real que possa ser invocada para

reclamar o crédito no âmbito de uma execução pendente onde os

bens arrestados foram penhorados;

ii. Na doutrina, Teixeira de Sousa, propugna que o arresto enquanto

não for convertido em penhora é apenas um meio de conservação da

garantia patrimonial e não atribui qualquer preferência no pagamento,

pelo que não é uma garantia real.

iii. Rui Pinto: trata-se, com o devido respeito, de um entendimento que

não é conforme à substância da questão e que, por isso, não pode

colher.

1. Na verdade, a ser assim, no plano prático o credor arrestante

teria de esperar pelo sucesso da sua própria execução, em

ordem a obter aí uma penhora cuja data remontaria à do

arresto (artigo 762.º CPC); só depois poderia reclamar o seu

crédito com base nessa penhora. Ora, o resultado bem

poderia ser, todavia, o de o credor encontrar essa execução já

fechada por os bens já terem sido transmitidos (conforme o

limite do artigo 788.º, n.º3 CPC), inutilizando o arresto.

2. Por outro lado, no plano dogmático, o entendimento dominante

desconsidera a natureza antecipatória do arresto perante a

penhora, traduzida no enunciado legal do artigo 622.º CC, de

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que ao arresto são extensivos, na parte aplicável, os demais

efeitos da penhora, além da ineficácia relativa dos atos de

disposição dos bens arrestados (artigos 621.º, 819.º e 820.º

CC). Citando o Ac. STJ 17 março 2995, o arresto é ato judicial

de coercibilidade, de natureza idêntica à da penhora,

assegurando a mesma funcionalidade, qual seja, dar ao

exequente o direito de ser pago com preferência a qualquer

outro credor que não tenha garantia real anterior, conforme,

justamente, o artigo 822.º CC, como sabemos. Esta

identidade funcional fora defendida por Anselmo de Castro

e Pires de Lima/Antunes Varela, no que tiveram

continuidade em Lebre de Freitas: o artigo 622.º, n.º2 CC, ao

atribuir ao arresto o mesmo efeito de preferência que o artigo

822.º, n.º1 CC concede à penhora, esta consequentemente

abrangido pela regra geral relativa a todas as garantias reais.

Em conclusão, o arresto antecipa, de modo provisório, o efeito real

ou equiparado da penhora, e, por aí, a sua exequibilidade em sede de

reclamação de créditos.

No entanto, a despeito desta eficácia antecipatória, a decisão de arresto não

tem sentido condenatório para efeitos do artigo 703.º, n.º1, alínea a) CPC.

Por ele não se impõe uma atuação ao requerido mas uma indisponibilidade

jurídica e material acompanhada de uma preferência na alienação executiva,

tendo por fundamento o conhecimento sumário de um crédito e de um

perigo de dano a esse direito. Falta, por isso, título exequível, pressuposto

pelo artigo 788.º, n.º2, 1.ª parte CPC. Por isto, melhor será que o arrestante

possa socorrer-se da faculdade prevista no n.º1 do artigo 792.º CPC,

requerendo que a graduação de créditos, relativamente aos bens abrangidos

pela sua garantia, aguarde a obtenção da sentença da ação principal.

Naturalmente que se o arresto caducar, máxime, pelo motivo previsto no

artigo 373.º, n.º1, alínea c) CPC, caducará também a reclamação do crédito

respetivo. Pelo contrário, obtida sentença condenatória o credor terá um

título exequível cujo efeito reclamatório recuará à data do próprio arresto.

Mas nada impede o arrestante do recurso ao n.º2 do artigo 782.º CPC.

3. Concurso de penhoras:

a. A sustação. As alterações de 2013: a possibilidade dos credores com

penhoras posteriores reclamarem os seus créditos na execução

temporalmente prioritária leva questões de concurso de execuções sobre o

mesmo bem. Após a Reforma de 2003 e até à Reforma de 2013, a pluralidade

de execuções sobre os mesmos bens passou a relevar a título preventivo e a

título sucessivo. Como vimos, no atual Código, este mecanismo preventivo

foi suprimido. Voltou, pois, o legislador a admitir apenas o mecanismo

sucessivo do artigo 794.º CPC quando à pluralidade de execuções pendentes

corresponde também uma pluralidade de penhoras pendentes sobre o

mesmo bem. Mas enquanto em 2012 o preceito se focava em demasia sobre

os atos que importavam ao agente de execução, a nova versão do artigo 794.º

CPC pouca luz lança sobre os mesmos. Tal como antes, o pressuposto da

sustação é pender mais de uma execução sobre os mesmos bens. Essa

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pendência tanto pode ser de execução civil, como de execução fiscal, caso

em que a ulterior reclamação se deve fazer no processo de execução fiscal,

ao abrigo dos artigos 239.º e seguintes CPPT, incluindo o respetivo artigo

240.º, n.º4. De acordo com o artigo 794.º CPC determina-se apenas que o

agente susta quanto a estes a execução em que a penhora tiver sido posterior.

Todavia, idêntico regime temporal de 10 dias parece-nos que decorre das

normas subsidiárias do artigo 720.º, n.º7 CPC. Por outro lado, continua a ser

perfeitamente lícito requerimento do exequente, executado ou credor citado

para reclamar o seu crédito, dirigido ao agente de execução para promoção

da sustação, a todo o tempo enquanto o bem não for transmitido. Exequente,

executado e o cônjuge relativamente aos bens em questão devem ser

notificados do despacho de sustação. A suspensão vigora até ao momento

em que a penhora mais antiga for levantada. Antes da reforma de 2003 o

regime estabelecia que se a suspensão fosse total, as custas da execução

sustada seriam graduadas a par do crédito eu lhe deu origem, desde que o

reclamante junte ao processo, até à liquidação final, certidão comprovativa

do seu montante e de que a execução não prosseguiu noutros bens. Ora, no

novo artigo 794.º, n.º4 CPC, pode ler-se que a sustação integral determina a

extinção da execução, sem prejuízo do disposto no n.º5 do artigo 850.º CPC.

Por outras palavras, apesar de se dar como finda a execução o exequente

poderá ainda requerer a renovação da execução extinta quando,

supervenientemente, indique bens penhoráveis.

b. Nulidade da falta de sustação: caso o agente de execução não venha a

sustar a execução em que houve a penhora ulterior, parece-nos que uma

venda dos bens, nessa execução, constitui um ato processual nulo, ex vi artigo

195.º CPC. Mais: no plano substantivo, será inoponível ou ineficaz em

relação à outra execução, por força do artigo 819.º CC, já que é um ato de

disposição que prejudica os credores da execução mais antiga. Esta deverá,

pelo contrário, prosseguir quanto aos bens em questão.

c. Ónus de reclamação na execução de penhora mais antiga: o exequente

que viu a execução sobre o bem sustada pode, ao mesmo tempo,

relativamente ao bem que tem penhorado:

i. Manter a penhora, embora suspensa:

1. Sem mais; ou

2. Requerer a penhora de mais bens em reforço, visto que aquele bem está

onerado por outra penhora (artigo 822.º CC) e/ou poderá ser

insuficiente, em face da prognose da potencial distribuição do produto da

venda, ao abrigo do artigo 751.º, n.º4, alíneas b) e c) CPC;

ii. Desistir da penhora:

1. Sem mais; ou

2. Requerendo a sua substituição ao abrigo do artigo 751.º, n.º4, alínea e)

CPC e artigo 794.º, n.º3 CPC.

Mantendo a penhora sobre o bem o segundo exequente conserva a faculdade

que já tinha antes da reforma de 2003 de se apresentar a reclamar o crédito

exequendo na execução em que a penhora seja mais antiga. Naturalmente

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que se exige que o devedor do crédito reclamado seja o mesmo num e noutro

processos; i.e., não pode o exequente reclamar o seu crédito se o executado

na causa em que a penhora foi registada em primeiro lugar não foi também

demandado na execução sustada. De outro modo, o credor reclamante

sucessivo estaria, na execução mais antiga, a executar bem de quem não é

parte na causa, violando-se o artigo 735.º, n.º2 CPC e o artigo 818.º CC. Por

outro lado, o princípio da estabilidade da instância (artigo 260.º CPC)

impedirá que o credor provoque a intervenção do executado em falta, já em

plena reclamação de créditos. A intervenção na execução onde corre a

penhora mais antiga pode ser provocada por citação (1.º parte do n.º2 do

artigo 794.º CPC) ou pode ser espontânea, nos termos do artigo 788.º, n.º3 e

5 CPC, se nela ainda não tiver ocorrido a transmissão dos bens penhorados.

Sendo provocada por citação, o credor tem os 15 dias dados pelo artigo 788.º,

n.º2 CPC para deduzir a sua reclamação. Sendo espontânea, ela pode ter lugar

em idêntico prazo de 15 dias ex vi artigo 794.º, n.º2 CPC, a contar da

notificação de sustação e mesmo que na execução com a penhora mais antiga

ainda se não tenha sequer iniciado a fase da reclamação de créditos. O n.º5

do artigo 788.º CPC garante, então, a sustação da segunda execução quanto

ao objeto da garantia bens, se já não estiver sustada por decisão do agente de

execução ex vi artigo 794.º CPC. Recorde-se que aquele prazo de 15 dias era

o que resultava do regime anterior a 2003 (prazo para dedução de reclamação

de créditos), mas que depois da reforma de 2003 perdeu expressa

consagração. Todavia, alguma jurisprudência já o admitia: como bem

argumentou o Ac. RP 1 junho 2006 resultava do artigo 788.º,n.º2 CPC, mutatis

mutandis, que o prazo para a intervenção espontânea deveria ser de 15 dias a

contar da notificação da sustação. Admitindo à primeira reclamação, vale

então o regime da instância sobre a qual foi feita a reclamação espontânea,

máxime, a reabertura da graduação de créditos, e que abordaremos adiante.

Neste sentido, o arrigo 794.º, n.º2 CPC determina que a reclamação suspende

os efeitos da graduação de créditos já fixada, e, se for atendida, provoca nova

sentença de graduação, na qual se inclui o crédito do reclamante. Quanto ao

procedimento executivo, propriamente dito, o credor interventor vai apenas

poder cometer os atos processuais ainda sobrantes do procedimento de

venda e não aqueles atos cujo momento ou prazo estejam já exauridos. E,

portanto, esse credor pode não ter efetiva comparticipação no procedimento

da venda, como notava Anselmo de Castro.

d. Inexistência de ónus em casos de execução parada: mas, quid iuris se a

instância da primeira execução não estiver, todavia, a correr termos, estando

suspensa, interrompida – máxime, remetida à conta por inércia do exequente

– ou extinta mas sem que o registo de penhora de bem sujeito a registo não

tenha sido levantado? Deve ser suspensa a segunda execução e o credor ir

reclamar à primeira instância ainda que venha a ficar com essa sua penhora

sustada também? Ou fica o credor desonerado de o fazer? A jurisprudência

mostra-se dividida.

i. Alguns arestos defendem que a aplicação do normativo do artigo

794.º, n.º1 CPC não tem como pressuposto que a execução onde o

bem foi primeiramente penhorado esteja a correr os seus termos, isto

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é, se mantenha em estado dinâmico. A reclamação nessa instância

seria imposta ainda que ela se encontre inerte, nomeadamente em

caso de sustação por inércia ou negligência do exequente em

promover os seus termos. Bastaria, por conseguinte, a mera

pendência da primeira execução tal como exige desde logo a própria

letra do artigo 794.º, n.º1 CPC. Esta interpretação não violaria o

disposto nos n.º1 e 4 do artigo 20.º CRP, por não ofender a garantia

de tutela em prazo razoável. Contrariamente, outras decisões pugnam

que para haver lugar à intervenção na primeira ação é preciso ainda

que as execuções onde foram efetuadas essas penhoras (a anterior e

a posterior) estejam numa situação dinâmica, isto é, estejam em

movimento, seguindo o seu curso processual normal (Ac. RP 24 abril

2997).

ii. Pensamos que se deve, antes de mais, operar uma restrição prévia.

É que se na primeira execução se encontrar paga a quantia exequenda

e se ordenou a remessa do processo à conta para se proceder ao

cálculo das custas e se processar o seu pagamento já não pode haver

intervenção nela por parte de credores reclamantes, beneficiários de

penhoras posteriores ou outros. Efetivamente, o pagamento da

quantia exequenda (voluntário ou por distribuição de produto de

venda) dita a extinção da execução, embora na condição do

pagamento das custas. Ademais, nos casos em que houve transmissão

da titularidade sobre os bens o artigo 788.º, n.º3 CPC sempre limitaria

a reclamação espontânea. Portanto, a intervenção espontânea em

questão será sempre antes da transmissão dos bens ou do pagamento

voluntário.

Ora, dentro desse espaço de intervenção espontânea não se pode seguir a

solução dominante: com o devido respeito viola-se a garantia constitucional

do artigo 20.º, n.º1 CRP. Efetivamente, o credor com segunda penhora que

tivesse o ónus de se apresentar numa execução já de si parada, tanto veria

sustada a sua ação executiva atual, como a já pendente. Seria uma

inconstitucional situação de bloqueio, como aponta Isabel Meneres

Campos. Deverá, por isso, entender-se que o exequente com segunda

penhora não tem ónus de intervir no processo da penhora mais antiga de o

mesmo estiver parado, pois este ónus supõe que a primeira execução esteja

numa situação dinâmica. Mas, então, pode o credor prosseguir com a

execução da penhora mais recente? Pensamos que não pode, em face do que

sucederia à primeira penhora. É que visto que o artigo 822.º, n.º1 CC não

pode ser postergado – i.e. a prevalência da penhora mais antiga sobre as

posteriores – e que o primeiro exequente não pode vir reclamar a sua penhora

no segundo processo, em face do teor do artigo 794.º CPC, então, de duas

uma: ou não se poderia vender o bem na segunda execução, sob pena de

nulidade, ou seria vendido com caducidade da primeira penhora ex vi artigo

824.º, n.º2, 1.ª parte CC, ignorando o direito do credor prioritário. Nenhuma

destas soluções é adequada e conforme ao sistema. A solução há-de ser outra:

atender ao estatuto processual do exequente que se apresenta como

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reclamante na execução prioritária, em consequência do artigo 794.º CPC. É

que ele será, e como já se disse atrás, na esteira de Anselmo de Castro, parte

principal. Por isso, pode nomeadamente, terá ainda direito a ser pago pelo

seu crédito, na extinção da primeira execução por pagamento voluntário do

primeiro exequente e a prosseguir com a execução em caso de desistência do

primeiro exequente, estejam ou não já graduados os créditos. Como concluía

Anselmo de Castro apenas assim a razão de economia processual impeditiva

do exercício dos seus direitos na própria execução não se frustraria, como

vimos ser o resultado da aplicação da posição jurisprudencial da intervenção

necessária ainda que a primeira causa esteja inerte.

§64.º - Procedimento

Intervenção:

1. Formas: provocada e espontânea: os credores em posição de reclamar o seu

crédito podem intervir provocada ou espontaneamente. A intervenção é provocada

por citação dos credores conhecidos no prazo de 5 dias contados da realização da

última penhora em sede do artigo 786.º, n.º1, a 3 CPC ou, depois de concluída a fase

da penhora e apurada, pelo agente de execução, a situação registal dos bens (artigo

786.º, n.1º e 2 CPC). Já atrás explicámos o regime desta citação. A intervenção é

espontânea quando feita independentemente de citação, por ato unilateral do credor

terceiro. A possibilidade deste credor intervir espontaneamente já existia no Direito

anterior à Reforma de 2003 quando a reclamação tivesse sido dispensada pelo juiz.

O legislador generalizou em 2003 no n.º3 do artigo 788.º CPC para salvaguardar os

direitos dos credores que não tenham sido citados aquando da penhora. Este direito

visa, pois, essencialmente, não deixar sem proteção os credores desconhecidos em

face do processo, por a sua existência não resultar do registo, de informação do

executado ou exequente, ou de apuramento pelo agente de execução. Porventura, o

caso mais importante é o da reclamação espontânea pelo credor que viu a sua própria

execução sustada por dupla penhora, por força do artigo 794.º CPC. Todavia, o

amplo teor literal da expressão utilizada no artigo 788.º, n.º3 CPC (credores que não

tenham sido citados) parece conduzir a que seja um direito atribuído também aos

credores conhecidos, mas cuja citação foi omitida (artigo 187.º CPC). Embora seja

pouco provável que ocorra, nada impede que o terceiro credor opte por, em vez de

arguir a competente nulidade da citação, nos termos do n.º6 do artigo 786.º CPC,

reclamar espontaneamente o crédito. Afinal, tal como a falta de citação do réu se

sanaria pela sua intervenção no processo sem imediata arguição da nulidade (artigo

189.º CPC –, também na reclamação espontânea sem arguição da falta de citação vai

implícita a sanação do vício. Já pelo contrário, decorre da letra do n.º3 do artigo 788.º

CPC, que tratando-se de credor com garantia real, efetivamente citado para a

execução, nos termos do artigo 786.º CPC, mas que não veio reclamar o seu crédito,

não pode vir fazê-lo fora de prazo. O n.º3 do artigo 788.º CPC fixa que a reclamação

espontânea deverá ser deduzida até à transmissão do bem penhorado sobre o qual o

credor tem garantia real; portanto, até à emissão do título de transmissão por venda

ou adjudicação ou até ao momento da entrega dos bens ou da assinatura do título

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que a documenta, fora da venda por propostas em carta fechada. Mas pode

perguntar-se o que pode fazer o credor que só está em condições de intervir tarde

demais, ou seja, após a venda do bem que garantia o seu direito.

a. Lebre de Freitas e Ribeiro Mendes nos casos de pluralirdade de penhoras

(artigos 788.º, n.º5 e 794.º CPC) admitem a reclamação do crédito exequendo

na primeira execução até à graduação de créditos, mesmo após a transmissão

dos bens nessa execução;

b. Com o devido respeito, discordamos: a garantia do credor – v.g., a segunda

penhora (artigo 822.º CC) – não pode deixar de sofrer a extinção com a

transmissão executiva ex vi artigo 824.º, n.º2 CC, por omissão de reclamação,

extinção essa que, aliás, justifica que o termo da intervenção espontânea seja,

precisamente, o momento da transmissão. Resta-lhe a eventual ação de

responsabilidade civil, por aplicação, por maioria de razão, do n.º6, in fine,

do artigo 786.º CPC em face da pessoa a quem seja imputável a falta de

informação da existência do direito de terceiro. Por exemplo, o caso do

executado que haja violado o dever de informação previsto no artigo 753.º,

n.º3 CPC, quando se demonstre que a sua omissão foi a causa adequada do

dano do terceiro credor. No entanto, recorde-se que nos casos de omissão

de citação, o credor poderá sempre, em alternativa, alegar a nulidade por falta

de citação o que permitirá reabrir a venda.

2. Consequências da reclamação espontânea: até à Reforma de 2013 pouco se dizia

quanto às consequências da intervenção feita estando já pendente uma reclamação.

Por nosso lado, sempre pensámos que seriam de utilizar algumas das soluções que

os preceitos revogados em 2003, desde que fossem decorrentes dos princípios do

regime vigente. Assim, a reclamação espontânea não vai obstar ao desenrolar e termo

das diligências executivas necessárias para a realização do pagamento. No entanto,

ela suspenderá, como antes, os efeitos da graduação de créditos já fixada e, se for

atendida, provocará nova sentença de graduação, na qual se inclua o crédito do

reclamante: tal surge agora expressamente no n.º2, 2.ª parte do artigo 794.º CPC. Não

pode deixar de ser assim sob pena de não ter eficácia a reclamação espontânea. Por

outro lado, tem-se defendido que o reclamante espontâneo nos termos do artigo

794.º CPC – ou em geral – não poderia impugnar a existência dos créditos verificados

na sentença de graduação, entretanto já proferida, dado ser um terceiro juridicamente

indiferente. A nova sentença apenas alteraria a anterior na estrita medida do

reconhecimento do novo crédito e da reordenação de todos os créditos. Com o

devido respeito, no plano material é manifesto que o reclamante superveniente não

está juridicamente imune à existência dos demais créditos que sejam graduados á sua

frente, pois diminuem a possibilidade de satisfação deste. E tanto assim é que, no

plano processual, se fosse um dos credores originários teria tido direito a impugnar

os créditos, ao abrigo do artigo 789.º, n.º1 CPC. Na verdade, com a intervenção

espontânea ocorre uma alteração das circunstâncias em que a sentença da primeira

graduação alcançou a qualidade de caso julgado. Ou seja: a própria lei admite uma

intervenção de terceiros posterior ao caso julgado – fenómeno que uma ação comum

não admite – e, por isso, não pode dar a esse credor reclamante um tratamento de

parte diminuída. Por conseguinte, a intervenção espontânea de um credor reclamante,

determina procedimentalmente uma reabertura do procedimento de reclamação e

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verificação do crédito reclamado, com impugnação e resposta, e uma revogação

parcial da primeira sentença, não somente quanto à graduação, mas ainda quanto à

existência dos créditos primeiramente reclamados.

Articulados:

1. Reclamação: o conjunto das reclamações de créditos corre como uma nova ação

declarativa acessória, incidental ou instrumental da execução tanto no plano

procedimental – um incidente fisicamente constituindo um único apenso (artigo

788.º, n.º8 CPC), não integrando o procedimento de execução – como no seu objeto,

autónomo mas conexo à funcionalidade executiva global da causa. Por isso, ela não

subsiste sem a execução a que corre por apenso. E tendo natureza incidental, segue

o regime de custas à data da instauração da execução. O requerimento de reclamação

deve ser deduzido e enviado, seguindo as regras comuns dos articulados, e da petição

inicial, em especial (máxime os artigos 132.º, 133.º, 140.º, 144.º, 145.º, 147.º, n.º2,

148.º, n.º1 e 552.º CPC) em 15 dias a contar da citação do reclamante, segundo o

artigo 788.º, n.º2 CPC. Durante este prazo, a execução está suspensa, nos termos do

artigo 796.º, n.º1, 1.ª parte CPC. A prova documental da garantia real e o título

exequível devem acompanhar o requerimento (artigo 423.º, n.º1 CPC). O tribunal

competente é o da execução, independentemente da competência material para o

crédito isoladamente. A legitimidade ativa é a do credor que apresente os elementos

pessoal e real na causa de pedir, não podendo ser um terceiro. Já sabemos que pode

haver lugar a acertamento ou a liquidação pelos meios de que dispõe o exequente,

i.e., os meios dos artigos 714.º a 716.º CPC. Tal pode implicar a presença do juiz no

Código novo. Cabe depois a admissão da reclamação, pela secretaria, sem despacho

judicial liminar salvo nos casos acabados de referir, nos termos gerais do artigo 226.º,

n.º1 CPC. Segue-se, depois, notificação ao executado exequente e credores

reclamantes como manda o artigo 789.º n.º1 CPC.

2. Impugnação: no prazo de 15 dias a contar desta notificação, pode ser deduzida

impugnação, segundo o artigo 789.º, n.º1 CPC, pelo exequente e pelo executado –

ou seu cônjuge (artigo 787.º CPC) – contra o credor reclamante e por qualquer credor

reclamante contra os demais credores reclamantes e mesmo contra o exequente. Os

credores concorrem entre si pelo património e o executado e seu cônjuge procuram

preservá-lo. Neste ato processual a parte impugna o crédito ou a garantia, ou ambos.

No caso da impugnação por credor reclamante ela é restringida aos bens objeto das

suas próprias garantias. Quanto ao crédito, reclamado ou exequendo, conforme os

casos, a impugnação tem por objeto a impugnação de factos constitutivos do créidto

ou a alegação de factos impeditivos, modificativos ou extintivos do mesmo (artigo

789.º CPC). Quanto à garantia real ou direito equiparado, o impugnante tanto pode

identicamente impugnar os factos constitutivos da garantia real – v.g., a causa de

retenção – ou direito equiparado, como pode excecionar factos impeditivos,

modificativos ou extintivos da mesma. Recuperando alguma boa jurisprudência

minoritária, desde a Reforma de 2003 que o n.º5 do artigo 789.º CPC veio, e bem,

fixar que essa restrição aos fundamentos – atualmente dos artigos 729.º e 730.º CPC

– só vale quando o crédito estiver reconhecido por sentença que tenha força de caso

julgado em relação ao impugnante. Tal é coerente com o princípio de que o caso

julgado não produz efeitos sobre terceiros. Passou-se, pois, para uma restrição

subjetiva. Esta solução deve valer para a vexata quaestio de se credores hipotecários

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reclamantes podem impugnar o direito de retenção reconhecido em sentença de ação

declarativa de que não participaram. Na verdade, eles não tiveram legitimidade para

a ação declarativa em causa, dado serem estranhos ao contrato-promessa. Todavia,

sendo terceiros à causa, alguma jurisprudência defendia que enquanto terceiros

juridicamente indiferentes, nas categorias de Manuel de Andrade, i.e., titulares de

direito não prejudicado na sua existência e conteúdo pela definição judicial da relação

litigada operada por essa sentença, estariam abrangidos pela eficácia reflexa do

respetivo caso julgado. Ora, também para eles vale a regra da impugnabilidade da

sentença consagrada no artigo 789.º, n.º5 CPC, pois trata-se de impugnantes quanto

aos quais a sentença não tenha força de caso julgado. Uma eventual eficácia reflexa

do caso julgado formado nessa sentença não pode ser estendida ao credor hipotecário

reclamante, por ele não ser um terceiro juridicamente indiferente: ele será

necessariamente atingido na sua eficácia, e, por conseguinte, no seu conteúdo, pela

redução dos efeitos respetivos que, nomeadamente, a prioridade que o n.º2 do artigo

758.º CPC confere ao direito de retenção necessariamente acarreta. Por fim, manda

o direito de defesa que o preceito do artigo 789.º, n.º4 CPC seja interpretado como

meramente clarificador dos fundamentos de oposição, mas sem que exclua os

fundamentos relativos à instância e as condições formais – título exequível – e

materiais – obrigação certa e líquida – da realização coativa da pretensão reclamada.

3. Resposta à exceção: a parte cujo crédito foi impugnado mediante defesa por

exceção pode produzir resposta à impugnação nos 10 dias seguintes à notificação das

impugnações apresentadas – artigo 790.º CPC. Portanto, a lei refere-se à

circunstância de o impugnante ter alegado facto impeditivo, modificativo ou

extintivo do crédito exequendo ou reclamado.

4. Formação incidental de título exequível:

a. Antes da reforma de 2003 previa-se que o credor que não estivesse munido

de título exequível poderia, no mesmo prazo da reclamação, requerer a

sustação da graduação de crédito, relativa e somente aos bens abrangidos pela

sua garantia, até obter sentença condenatória em ação declarativa. Tal ação

deveria ser proposta, além do executado, ainda contra o exequente e credores

interessados: os credores titulares de direitos com garantia real sobre bens

relativamente aos quais o reclamante invoque qualquer garantia em concurso

de credores incluindo o exequente, independentemente de virem a ser

graduados e pagos. Estando já pendente ao tempo do requerimento de

suspensão deveriam ser citados para ocuparem o lugar de parte principal.

Media tempore, o requerente podia exercer no mesmo processo os mesmos

direitos do credor com reclamação admitida, mas os créditos eram

verificados e os bens vendidos ou adjudicados a final.

b. A Reforma de 2003 veio manter este mecanismo, que permanece, mas

introduzindo no artigo 792.º CPC um processo sumário com cominatório

pleno para o credor obter título exequível na própria ação executiva. Só se

esta via se frustrar, é que terá de tomar a via da ação declarativa, tendo o

legislador procedido a alguns acertos para obviar a qualquer prejuízo para a

execução. Assim, deduzido o requerimento de sustação da graduação de

créditos, no prazo da reclamação, é notificado o executado pela secretaria

para, no prazo de 10 dias, se pronunciar sobre a existência do crédito

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invocado (artigo 792.º, n.º2 CPC). Tal como antes da Reforma de 2003, o

nº.6 do artigo 792.º CPC dispõe que o requerimento não obsta à venda ou

adjudicação dos bens, nem à verificação dos créditos reclamados, mas o

requerente é admitido a exercer no processo os mesmos direitos que

competem ao credor cuja reclamação tenha sido admitida. Depois, importará

distinguir:

i. Se o executado reconhecer que o crédito existe nos termos do requerimento, seja

expressamente, seja como efeito cominatório pleno decorrente da

falta de contestação, considera-se formado o título executivo e

reclamado o crédito nos termos do requerimento do credor, sem

prejuízo da sua impugnação pelo exequente e restantes credores

(artigo 792.º, n.º3 CPC). Aparentemente, será a secretaria – que

enviaria a notificação – que aferirá da ocorrência deste efeito.

ii. Se o executado contestar a existência do crédito, então o credor será disso

notificado e terá de obter, como antes da reforma, em ação de

condenação, sentença exequível, reclamando seguidamente o crédito

na execução (artigo 792.º, n.º4 CPC), e, entretanto, a graduação

permanecerá suspensa.

Todavia, o requerimento de sustação ficará ope legis sem efeito se, nos termos

do n.º7 do artigo 792.º CPC, dentro de 20 dias a contar da notificação de que

o executado negou a existência do crédito, não for apresentada certidão

comprovativa da pendência da ação. Também sobrevem essa ineficácia se o

exequente provar que:

i. Não se observou o disposto no n.º5, ou seja, a provocação da intervenção

principal (artigo 316.º CPC) de exequente e credores interessados na

ação que esteja já pendente à data do requerimento; ou que

ii. A ação foi julgada improcedente; ou que

iii. Esteve parada durante 30 dias, por negligência do autor, depois do requerimento;

ou

iv. Se dentro de 15 dias a contar do trânsito em julgado da decisão, dela não for

apresentada certidão fica também o requerimento de sustação sem

efeito.

Saneamento, julgamento e decisão:

1. Saneamento e julgamento: o processamento ulterior aos articulados está regulado

no artigo 791.º CPC, embora o juiz possa suspender os termos do apenso posteriores

aos articulados até à realização da venda, quando considere provável que o produto

desta não ultrapassará o valor das custas da própria execução (n.º5 do mesmo artigo).

Não sendo esse o caso importa, depois, distinguir:

a. Se a verificação dos créditos impugnados está dependente de prova:

seguir-se-ão os termos da remessa para o processo comum de declaração, dos

artigos 552.º e seguintes CPC. Por isso, o julgamento da causa cabe ao juiz

singular da execução, estando excluída a intervenção do tribunal coletivo,

máxime, em sede de novo artigo 599.º CPC. O ónus subjetivo da prova

distruibuir-se-á segundo as regras gerais: cabe ao credor reclamante provar

os factos constitutivos da sua garantia e do seu crédito e ao credor

impugnante provar os factos das impugnações ou das exceções. Haverá,

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sendo caso disso, saneamento e condensação (artigos 591.º e seguintes CPC)

incluindo audiência preliminar e despacho pré-saneador, como antes da

reforma de 2003 se impunha no regime. O despacho saneador declarará de

imediato reconhecidos os créditos que o puderem ser, embora a graduação

de todos fique guardada para a sentença final artigo 791.º, n.º1, 2.ª parte CPC).

Eventualmente, pode absolver de imediato da instância o executado. A

admissão de articulados supervenientes e a possibilidade de alteração do

pedido deve ser restrita às regras gerais dos artigos 588.º e seguintes, 264.º e

265.º CPC. A audiência de discussão da matéria de facto e do aspeto jurídico

da causa e de julgamento da causa rege-se, em especial, pelos artigos 599.º e

seguintes CPC, em especial.

b. Se a verificação dos créditos impugnados não está dependente de

prova ou nenhum dos créditos for impugnado: proferir-se-á logo

sentença (artigo 791.º, n.º2 CPC).

2. Sentença:

a. Conteúdo: o artigo 723.º, n.º1, alínea b) CPC determina que a sentença de

reconhecimento e graduação de créditos deve ser proferida no prazo máximo

de três meses (3 meses) contados da data da reclamação. Lido assim parece

que para cada requerimento de reclamação se contraria o prazo. O problema

é que esta sentença vai conhecer de todos os requerimentos apresentados

para um dado bem, promovidas as citações. Ou seja: na verdade, aquele prazo

apenas pode correr depois da última reclamação apresentada relativamente

ao mesmo bem. A sentença de reconhecimento e graduação é uma sentença

de simples apreciação positiva. Apresenta um duplo objeto, como se viu,

traduzido em duas decisões separadas, compondo formalmente uma única

sentença: a verificação de créditos e a sua graduação em concurso com o

crédito do exequente (artigo 791.º, n.º2, 2.ª parte CPC). A sentença pode não

fazer a graduação de algum ou de alguns dos créditos, por não ter conhecido

do pedido, por ocorrência de exceção dilatória, decretando absolvição da

instância. Já foi defendido que nesta eventualidade os efeitos civis derivados

da proposição da primeira causa e da citação de exequente e de executado

mantêm-se, quando possível, se nova reclamação for intentada dentro de 30

dias, a contar do trânsito em julgado da sentença de absolvição da instância,

contra os demais credores reclamantes e o mesmo exequente ao abrigo do

artigo 279.º, n.º2 CPC. Pelo contrário, cumpridos os pressupostos

processuais, a sentença conhecerá ou negará existência dos fundamentos do

pedido, i.e., a aquisição do direito à pretensão de pagamento de quantia certa

e liquida, demonstrada em título exequível (elemento pessoal da causa de

pedir), e a titularidade de garantia real (elemento real da causa de pedir).

Haver-se-ão como reconhecidos os créditos e as respetivas garantias reais que

não forem impugnadas, sem prejuízo das exceções ao efeito cominatório da

revelia, vigentes em processo declarativo, ou do conhecimento, mesmo que

oficioso, das questões que deviam ter implicado rejeição liminar da

reclamação (artigo 791.º, n.º4 CPC). Recorde-se a este propósito que o artigo

819.º CC dita que quaisquer garantias reais constituídas pelo executado

voluntariamente depois da penhora são ineficazes pelo que elas não poderão

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ser reconhecidas. Ao contrário, deverão ser reconhecidas e graduadas as

garantias constituídas após a penhora ex lege ou judicialmente. Havendo

impugnação do crédito, este será reconhecido se o reclamante juntar título

exequível válido e o impugnante não demonstrar facto impeditivo,

modificativo ou extintivo. Se o juiz fizer a graduação por negar a existência

da causa de pedir, decretará absolvição do pedido. Já se reconhecer os

fundamentos do pedido procederá à graduação da totalidade dos créditos

incluindo do exequente (artigo 791.º, n.º3 CPC), segundo as regras do artigo

822.º CC e dos preceitos que fixam relações de prevalência entre garantias

reais. A graduação é feita para cada bem, bastando que haja uma reclamação

admitida para a garantia respetiva ser ordenada em face da penhora. Se algum

dos créditos graduados não estiver vencido, a sentença de graduação

determinará que, na conta final para pagamento, se efetue o desconto

correspondente ao benefício da antecipação (artigo 791.º, n.º3 CPC). Enfim,

relembre-se que por força da eventual reclamação de créditos espontânea, o

n.º6 do artigo 791.º CPC, prevê que a graduação seja refeita se vier a ser

verificado algum crédito que, depois dela, seja reclamado. O alcance objetivo

desta alteração da sentença foi atrás referido.

b. Eficácia e recorribilidade:

i. Para Castro Mendes: a sentença de verificação e graduação faz caso

julgado material quando reconheça os créditos. Já a absolvição da

instância não tolheria futura ação de simples apreciação ou de

condenação.

ii. Diversamente, para Lebre de Freitas: a ação de verificação e

graduação dos créditos não oferece ao devedor garantias idênticas ou

equiparáveis às da ação executiva comum, nomeadamente na citação

edital do devedor acompanhada de cominatório pleno (artigo 791.º,

n.º2 CPC). E, em todo o caso, o objeto desta ação não é tanto a

pretensão de reconhecimento do direito de crédito como a do

reconhecimento do direito real que o garante, pois já o

reconhecimento do crédito cairia no campo dos pressupostos da

decisão. Por isso, o caso julgado cobriria o reconhecimento das

garantias reais, mas já os créditos reclamados seriam reconhecidos

apenas para fundar a existência daquele direito real. O caso julgado

formar-se-ia, sim, quanto à graduação, mas não quanto à verificação

dos créditos, conclui Lebre de Freitas.

iii. Pensamos que importa, antes de mais, notar que, como se disse, o

pedido na reclamação é duplo: conhecer da existência dos créditos e

fazer a sua graduação com o crédito do exequente, em razão das

garantias reais (artigo 791.º, n.º2 CPC). Portanto, o reconhecimento

da garantia real não integra o efeito jurídico pedido pelo reclamante.

Por outras palavras, não estamos perante uma graduação de garantias,

como parece entender Lebre de Freitas, mas perante uma graduação

de créditos – segundo as garantias, naturalmente. Não se forma caso

julgado material quanto às garantias, pois elas são fundamento da

decisão. Tampouco se forma caso julgado material quanto à

graduação em si mesma – i.e., as relações de prevalência – porque se

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é verdade que ela está suportada na decisão prejudicial sobre o crédito

– que até pode valer como julgado – porém, também está suportada

por garantias reais que não foram reconhecidas, salvo enquanto

fundamento decisório. Portanto, forma-se caso julgado material

quanto aos créditos, salvo no caso de citação edital. Tanto as decisões

interlocutórias, como a sentença final pode, eventualmente, ser

objeto de recurso de apelação e de revista, nos termos gerais (artigo

852.º CPC), mas com as especialidades dos artigos 853.º, n.º1 e 854.º

CPC. A apelação tem efeito meramente devolutivo, conforme o n.º1

do artigo 647.º CPC, sem prejuízo do que se dispõe nos n.º2, alínea

c) e 4 do mesmo artigo.

Naturalmente que se têm de verificar os respetivos pressupostos,

nomeadamente:

i. A recorribilidade: em face da regra do n.º1 do artigo 629.º CPC tem

sido levantada aqui a questão do valor da causa nas reclamações de

crédito. A solução dominante é a que até ao trânsito em julgado da

sentença de graduação de créditos, a alçada do tribunal é de aferir

pelo valor de cada um dos créditos de que se recorra, sem qualquer

interferência dos restantes. Depois de graduados os créditos e sempre

que não esteja em causa a existência de qualquer crédito, então o valor

da causa para efeito de recurso, será o da soma dos créditos

verificados e graduados.

ii. A legitimidade: conforme o artigo 631.º, nº1 CPC tem sido defendido

que o exequente não goza da legitimidade para interpor recurso da

sentença de verificação e graduação de créditos quanto à impugnação

do crédito de reclamante-penhorante graduado depois do seu. Nessa

eventualidade, e ao contrário de um crédito concorrente graduado

acima do seu, o exequente não apresenta um interesse direto e um

prejuízo real, medido pela utilidade decorrente da procedência do

recurso, mas apenas é passível de sofrer prejuízo indireto ou reflexo,

eventual ou incerto. Por outro lado, também não assiste legitimidade

para o mesmo recurso ao credor reclamante cujos créditos tenham

sido rejeitados liminarmente, ainda que haja interposto recurso, ainda

pendente, do respetivo despacho de rejeição. Não só já não é parte

na causa no momento da sentença, como não lhe foi reconhecida

inicialmente uma posição jurídica que, a final, ser prejudicada direta

e efetivamente.

Ainda no plano subjetivo, defendeu-se que o recurso de um dos credores

quanto à graduação do seu crédito não aproveita aos credores reclamantes.

Diríamos que assim será por estarmos perante uma coligação superveniente

voluntária de credores, não valendo o n.º1 do artigo 634.º CPC. No entanto,

e apesar de serem de difícil verificação concreta, permanecem em aberto as

situações do n.º2 do mesmo artigo. Por outro lado, no plano objetivo sendo

esta sentença composta por duas decisões separadas – verificação de créditos,

graduação de créditos – deve entender-se que no silêncio do recorrente,

ambas estão a ser objeto de recurso, ex vi artigos 635.º, n.º3 CPC.

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§65.º - Graduação

Regras aplicáveis:

1. Sentido; relações de prevalência: a graduação dos créditos reconhecidos é

determinada por dois fatores:

a. A relação de prevalência com a penhora segundo o artigo 822.º CC: já

concretizámos atrás, a partir do enunciado legal de que o exequente adquire

pela penhora o direito de ser pago com preferência a qualquer outro credor

que não tenha garantia real anterior.

b. As relações de prevalência entre as garantias reais ditadas por normas

de Direito substantivo: assim:

i. O titular do direito de retenção sobre coisa imóvel enquanto não

entregar a coisa retida, tem a faculdade de a executar, nos mesmos

termos em que o pode fazer o credor hipotecário, e de ser pago com

preferência aos demais credores do devedor, prevalecendo neste caso

sobre a hipoteca, ainda que esta tenha sido registada anteriormente

(artigo 759.º, n.º1 e 2 CC);

ii. O titular do direito de retenção sobre coisa móvel goza dos

direitos e está sujeito às obrigações do credor pignoratício, salvo pelo

que respeita à substituição ou reforço da garantia (artigo 758.º CC);

Quanto a este direito de retenção tem-se posto em causa a

constitucionalidade da sua prevalência sobre a hipoteca ainda que registada

anteriormente, conforme o artigo 759.º, n.º2 CC. Em concreto, essa

prevalência colidiria com o princípio da confiança e segurança do comércio

jurídico ínsito no artigo 2.º CRP, de que beneficiaria o credor hipotecário.

Contra, entendeu-se que o credor hipotecário já sabe da existência do risco

da constituição de um eventual direito de retenção, desde que seja posterior

à entrada em vigor da norma que prevê este; na verdade, não se trataria de

um ónus oculto. No caso específico do direito de retenção a favor do

promitente-comprador com tradição da coisa, nos termos do artigo 755.º,

n.º1, alínea f) CC, o Tribunal Constitucional pronunciou-se pela não

inconstitucionalidade da referida norma com o fundamento de a atribuição

da preferência ao direito de retenção sobre a hipoteca registada anteriormente,

ter a sua justificação na prevalência, para o legislador, do direito dos

consumidores à proteção dos seus específicos interesses económicos

associados, em inúmeros casos, à aquisição de habitação própria, pelo que é

ainda convocável o artigo 65.º CRP. Deste modo, a jurisprudência ordinária

dominante acaba, identicamente, por ser a da prevalência do direito de

retenção sobre a hipoteca, máxime, da retenção do promitente-fiel sobre uma

hipoteca bancária.

iii. A hipoteca confere ao credor o direito de ser pago pelo valor de

certas coisas imóveis ou equiparadas, com preferência sobre os

demais credores que não gozem de privilégio especial ou de

prioridade de registo (artigo 686.º CC). No caso desta, tem-se

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discutido qual o crédito que ela abrange nos contratos de mútuo.

Atualmente, é jurisprudência consolidada que esta garantia abrange:

1. Capital mutuado;

2. Juros até três anos (3 anos), conforme o artigo 693.º, n.º2 CC,

não sendo lícita a capitalização de juros;

3. E, eventualmente, despesas até ao montante contratualmente

clausulado.

Por outro lado, o princípio da especialidade que caracteriza a hipoteca

reporta-se ao seu objeto – elementos individualizadores da coisa

sobre que incide a garantia – e ao crédito – deve estar suficientemente

determinado e quantificado o montante máximo assegurado: o valor

que a hipoteca garante, bem como o seu fundamento, os juros e os

acessórios do crédito. Esse crédito pode ser futuro, para efeitos do

artigo 707.º CPC.

iv. O penhor confere ao credor o direito à satisfação do seu crédito,

bem como da totalidade dos juros devidos, se os houver, com

preferência sobre os demais credores, pelo valor de certa coisa móvel,

ou pelo valor de créditos ou outros direitos não suscetíveis de

hipoteca, pertencentes ao devedor ou a terceiro (artigo 666.º CC).

Quantos aos privilégios regem-se por uma teia de normas substantivas do

Código Civil e de vários diplomas.

IV – Pagamento

A – Venda

§66.º - Introdução. Procedimento

Introdução:

1. Formas de pagamento: uma vez penhorados, estão os bens em condições de

segurança para se passar ao pagamento forçado da quantia devida pelo executado,

acrescida do valor das custas e honorários. Trata-se, pois, de transferir para a esfera

do credor exequente uma quantia pecuniária, em regra. As diligências para a

realização do pagamento efetuam-se só depois de findo o prazo para a reclamação

de créditos, embora independentemente do prosseguimento do apenso da verificação

e graduação de créditos (artigo 796.º, n.º2 CC). A exceção é a consignação de

rendimentos, que pode ser requerida pelo exequente e deferida logo a seguir à

penhora. A lei impõe-lhes, no novo n.º1 do artigo 796.º CPC, um prazo de três meses

a contar da penhora, para estarem concluídas, sob pena de extinção da execução por

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pagamento parcial da dívida quando não se identifiquem mais bens (artigo 797.º

CPC). A quantia pela qual será satisfeito o credor pode ser obtida por mais do que

uma via executiva, como arrola o n.º1 do artigo 795.º CPC:

a. Entrega de dinheiro (artigo 798.º CPC);

b. Consignação de rendimentos de bens penhorados (artigo 803.º e

seguintes CPC);

c. Entrega do produto da venda dos bens penhorados (artigos 811.º e

seguintes CPC).

O executado pode também pagar voluntariamente, na totalidade ou em prestações

(artigos 795.º, n.º2 e 806.º e seguintes CPC) ou no quadro do acordo global (artigo

795.º, n.º2 e 810.º CPC). Admite-se ainda que em vez de uma quantia pecuniária se

transfira para o exequente o próprio direito penhorado mediante a respetiva

adjudicação, prevista no mesmo n.º1 do artigo 795.º CPC e regulada nos artigos 799.º

e seguintes CPC. O pagamento mediante entrega de produto de venda de bens

penhorados é o modo mais importante do ponto de vista prático. E alguns aspetos

dos restantes modos de pagamento (v.g. a consignação de rendimentos, para efeitos

do artigo 803.º, n.º1 CPC) podem estar dependentes da ocorrência da venda

executiva.

2. Distribuição funcional de competências: as diligências de pagamento são da

competência do agente de execução, conforme o artigo 719.º, n.º1 CPC. O juiz de

execução mantêm competências estritamente decisórias, não executivas:

a. Conhecer da reclamação da decisão da modalidade da venda e do valor

dos bens (artigo 812.º, n.º7 CPC), autorizar a antecipação da venda

(artigo 814.º, n.º1 CPC), decidir da invalidade da venda, nos termos do

artigo 838.º, n.º2 CPC;

b. NA venda mediante propostas em carta fechada, proceder à abertura

das propostas (artigo 820.º e 829.º, n.º2 CPC);

c. NA venda por negociação particular, determinar, na falta de acordo, a

pessoa incumbida de realizar a venda (artigo 833.º, n.º2, in fine CPC)

e a venda urgente (artigo 832º, alínea c), in fine CPC);

d. Na venda em estabelecimento de leilão, conhecer da reclamação por

irregularidade (artigo 835.º, n.º1 CPC).

3. Modalidades de venda; âmbito relativo: atualmente, no artigo 811.º, n.º1 CPC

encontra-se o quadro geral das modalidades de venda de bens penhorados:

a. Venda mediante propostas em carta fechada (artigo 816.º e seguintes

CPC);

b. Venda em mercados regulamentados (artigo 830.º CPC);

c. Venda direta (artigo 831.º CPC);

d. Venda por negociação particular (artigos 834.º e 835.º CPC);

e. Venda em estabelecimento de leilões (artigo 834.º e 835.º CPC);

f. Venda em depósito público ou equiparado (artigo 836.º CPC);

g. Venda em leilão eletrónico (artigo 837.º CPC).

O que as distingue é mais o seu âmbito e o seu procedimento e menos o respetivo

objeto. No regime anterior a 2003 era a regra de que a venda seria judicial feita

mediante propostas em carta fechada e levada a cabo em tribunal; a venda

extrajudicial, fosse em bolsa, direta, por negociação particular ou em estabelecimento

de leilão, tinha lugar em situações específicas previstas na lei. Em 2003 foi suprimida

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a distinção entre venda judicial e venda extrajudicial levado a cabo pelo agente de

execução, i.e., deu-se uma desjudicialização da venda executiva (entre outros, artigos

719.º, n.º1, 812.º, n.º1 e 833.º, n.º2 CPC). Na altura, criou-se uma venda em depósito

público mas, na verdade, houve uma valorização, em relação à alienação executiva de

bens móveis e de direitos, de soluções comercialmente mais expeditas, como a

negociação particular ou mesmo da venda em estabelecimento de leilão (artigo 834.º

CPC). Deste modo, deixou de haver uma modalidade de venda que constituísse a

regra e o sistema da venda passou, então, a assentar em três modalidades mais

importantes:

a. A venda mediante propostas em cara fechada, restrita aos bens imóveis

(artigo 816.º CPC), e a estabelecimento comercial de valor consideravelmente

elevado (artigo 829.º CPC);

b. A venda em depósito público, limitada aos bens móveis (artigo 836.º CPC);

e

c. A venda por negociação particular (artigo 832.º CPC).

Em 2008 acrescentou-se no artigo 837.º CPC a venda em leilão eletrónico, de imóveis

e de móveis, ainda relativamente opcional, dependente das condições enunciadas nas

alíneas do seu n.º1. Mas já com a reforma de 2013 pretende dar-se uma

preponderância a esta venda em leilão eletrónico no quadro das várias modalidades

de venda: ela tem lugar preferencialmente (artigo 837.º CPC), mesmo quanto a bens

imóveis, salvos nos casos de venda em mercado regulamentado e de venda direta.

Do exposto resulta que no Código reformado em 2013, a hierarquia e o âmbito de

funcionamento das diferentes modalidades da venda podem sintetizar-se quanto a

bens imóveis, nas seguintes relações de subsidiariedade:

a. Venda direta, em caso de existência de promessa de venda com eficácia real

que se pretenda executar especificamente ou de direito a entrega da coisa a

certa entidade;

b. Venda em leilão eletrónico;

c. Venda mediante propostas em carta fechada;

d. Subsidiariamente, a esta última:

i. Venda por negociação particular, se o exequente ou o executado

propuserem um comprador e um preço, aceite pela contraparte e

demais credores, ou se houver urgência na realização da venda ou se

se frustrar a venda por proposta em carta fechada; ou

ii. Venda em estabelecimento de leilão (i.e., não eletrónica), após proposta do

exequente, executado, ou credor reclamante, sem oposição dos

restantes.

Tratando-se de bens móveis (ainda que sujeitos a registo) ou de direitos, será assim,

subsidiariamente

a. Venda em mercados regulamentados;

b. Venda direta;

c. Venda em leilão eletrónico;

d. Venda em depósito público;

e. Subsidiariamente, a esta última:

iii. Venda por negociação particular, se se frustrar a venda em depósito

público, se o exequente ou o executado propuserem um comprador

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e um preço, aceite pela contraparte e demais credores, ou se houver

urgência na realização da venda; ou

iv. Venda em estabelecimento de leilão, após proposta do exequente,

executado, ou credor reclamante, sem oposição dos restantes, ou

atentas as características do bem.

Em 2003, a supressão de venda mediante propostas em carta fechada como regra

parece ter deixado a descoberto a venda que não incide nem sobre coisas móveis,

nem sobre coisas móveis sobre imóveis. O problema reside, pois, em que o sistema

ficou apenas dirigido para venda de coisas corpóreas.

a. Lebre de Freitas e Ribeiro Mendes: a solução passaria por estabelecer um

paralelismo com a penhora, na medida em que tal reflita a consideração da

natureza do bem: a venda mediante propostas em carta fechada aplicar-se-ia

aos direitos que podem ser penhorados em sede de imóveis – propriedade,

usufruto –, enquanto a venda por negociação particular ou em

estabelecimento de leilão ficaria para os demais direitos reais sem posse

exclusiva e para os direitos de crédito que são penhorados segundo a penhora

de direitos.

b. Estes autores chegaram a estes resultados, porém, colocam a venda de quota

sobre bem imóvel na venda mediante proposta em carta fechada, porventura

justamente impressionados com as maiores garantias – lembre-se que só esta

venda é feita perante o juiz (artigo 820.º CPC) – dessa venda. Esta

preocupação deve ser tida em conta em tese geral, pelo que é de aplicar aquela

modalidade de venda quando, em concreto, ela se mostre ser a mais adequada

em função do valor do bem. Deste modo, parece-nos que o disposto no

artigo 829.º CPC, para a venda de estabelecimento comercial de valor

consideravelmente elevado pode ser usado, analogicamente, para a venda, a

realizar mediante propostas em carta fechada, de direitos reais sem posse

exclusiva ou, mesmo, de direitos de crédito. Isso significa que a quota-parte

penhorada não será sempre vendida mediante propostas em carta fechada,

mas apenas quando tal tenha sido autorizado judicialmente, nos termos do

artigo 829.º, n.º1 CPC. No novo artigo 837.º CPC tudo fica mais simples

seguindo leilão eletrónico.

4. Regime: há um regime comum às várias modalidades de venda e que se apura

conjugando as disposições dos artigos 812.º a 815.º e 842.º a 845.º CPC, com as

normas do regime da venda mediante propostas em carta fechada de valor geral

(artigo 811.º, n.º2 CPC) que resultam dos artigos 818.º, 819.º, 823.º e 828.º CPC.

Contudo, à venda direta não se aplicam os artigos 819.º e 823.º CPC, por respeitarem

ao exercício de direito de preferência. Passemos a analisar algumas das disposições

gerais, mas deixando aqueles artigos 828.º, 829.º, 823.º e 828.º CPC para a sede da

venda mediante proposta.

Atos preparatórios:

1. Despacho determinativo do agente de execução: nos termos do artigo 812.º CPC,

a fase da venda inicia-se com um despacho determinativo da venda executiva,

ouvidos o exequente, o executado e os credores com garantia sobre os bens a vender.

Esse despacho é da competência do agente de execução, contendo várias decisões

sobre os aspetos essenciais da venda:

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a. Modalidades de venda: em relação à decisão quanto à modalidade de venda,

importa distinguir consoante ao momento dessa decisão:

i. Inicial: por regra, inicialmente, o agente limita-se a enunciar a

aplicação da lei quando seja esta a impor uma modalidade de venda,

não estando habilitado com um poder discricionário para decidir

diversamente. É o que sucede com a venda mediante proposta em

carta fechada (artigo 816.º, n.º1 CPC), a venda em mercados

regulamentados, i.e., em bolsas de capitais ou de mercadorias (artigo

820.º CPC), a venda direta (artigo 831.º CPC), a venda por negociação

particular de bem de valor inferior a 4 UC (artigo 832.º, alínea g) CPC),

a venda em depósito público ou equiparado (artigo 836.º, n.º1 CPC)

e a venda em leilão eletrónico (artigo 837.º CPC), embora menos.

Diversamente, neste despacho determinativo o agente de execução

pode conhecer, mediante requerimento, de casos legalmente

previstos em que, após ouvir previamente o exequente, o executado

e os credores com garantia real sobre os bens a vender (2.ª parte do

n.º1 do artigo 812.º CPC) faz uso de um poder discricionário de

escolha do tipo de venda. Isso sucede, nomeadamente, quando o

exequente, executado ou credor com garantia sobre o bem, antes do

despacho, requererem inicialmente uma específica modalidade de

venda: que o estabelecimento comercial de valor superior a 500UC

seja vendido por proposta em carta fechada (artigo 829.º, n.º1 CPC)

ou uma venda por negociação particular com fundamento nas alíneas

a) a c) do artigo 832.º CPC.

ii. Superveniente: o agente de execução tem ainda poderes para em função

das vicissitudes supervenientes alterar a modalidade inicial da venda:

1. A requerimento: o exequente, executado ou credor garantido

pelo bem, podem supervenientemente, pedir que

estabelecimento comercial de valor superior a 500UC seja

vendido por proposta em carta fechada (artigo 829.º, n.º1

CPC) ou que se passe para a venda por negociação particular

por ocorrerem supervenientemente, algumas das situações

previstas nas alíneas a) e b) do artigo 832.º CPC;

2. Oficiosamente: podo o agente de execução, após frustração da

venda em depósito público ou equiparado, considerar que é

aconselhável a venda particular (artigo 832.º, alínea e) CPC)

ou, ainda, que a venda em estabelecimento de leilão de coisa

móvel deve ser feita por negociação particular, atentas as

características do bem (artigo 836.º, n.º1, alínea b) CPC) ou

que após anulação da venda em leilão e não existindo outro

estabelecimento se deva proceder à venda em carta fechada

ou por negociação particular, sendo caso disso (artigo 835.º,

n.º3 CPC).

Nestas eventualidades, o agente de execução só pode decidir depois

de ouvir as partes ex vi artigo 812.º, n.º1, 2.ª parte CPC.

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b. Valor dos bens: o artigo 812.º, n.º3 CPC confere ao agente de execução

poderes discricionários para, oficiosamente ou deferindo requerimento de

algum dos interessados, realizar as diligências que entenda necessárias à

determinação do valor de mercado, como seja uma avaliação por perito.

Deste modo, poderá proceder mas corretamente à fixação do valor base dos

bens a vender. O valor de base dos bens apura-se do seguinte modo:

i. Sendo imóveis, até 2012 o valor igual ao seu valor patrimonial

tributário, nos termos de avaliação efetuada há menos de três anos (3

anos), ou igual ao seu valor de mercado, nos restantes casos; a partir

de 10 novembro 2012, o artigo 812.º, n.º3 CPC passou a preceituar

que o valor será o maior de dois valores – valor patrimonial tributário,

nos termos de avaliação efetuada há menos de seis anos (6 anos), e

valor de mercado.

ii. Sendo outros bens, o fixado pelo agente de execução de acordo com

o valor de mercado.

A decisão do agente de execução é notificada ao exequente é notificada ao

exequente, executado e credores reclamantes com garantia real sobre os bens

a vender, segundo o artigo 812.º, n.º7 CPC. O artigo 813.º CPC procura

assegurar que, tal como a penhora é proporcional à obrigação exequenda e

despesas judiciais, também a venda só pode ser feita na medida do

estritamente necessário à satisfação dos interesses dos credores e das

despesas da execução. Assim se compreende que o respetivo n.º1 estatua que

a venda seja suscitada, a requerimento do executado, logo que o produto dos

bens já vendidos seja suficiente para cobrir o crédito exequendo, os créditos

reclamados sobre esses bens e as despesas da execução. É também isso que

justifica que, nas situações de subsidiariedade objetiva, estando penhorados

bens que respondem de imediato e bens que respondem em segunda linha,

se deva começar pela venda daqueles – n.º2 do artigo 813.º CPC. E,

finalmente, o mesmo princípio suporta que, em caso de divisão de coisa

penhorada, o n.º3 do artigo 813.º CPC atribua ao executado o direito de

requerer que a venda se inicie por algum dos prédios resultantes da divisão,

desde que seja suficiente para o pagamento. Quem deve conhecer destes

requerimentos é o agente de execução.

c. Eventual formação de lotes.

2. Despacho do juiz (venda antecipada): o regime da venda antecipada de bens foi

transferido e renumerado para o artigo 814.º CPC. Tem por objeto bens que o

executado ou o exequente alegam em requerimento próprio que não podem ou não

devem conservar-se, por estarem sujeitos a deterioração ou depreciação, ou em

relação aos quais há manifesta vantagem em fazer a antecipação da venda, qualquer

que seja a sua modalidade. Este requerimento deve ser dirigido e despachado pelo

juiz de execução nos termos do n.º1 do artigo 814.º CPC, competência que no

Código velho cabia ao agente de execução, salvo em caso de grande urgência. Se

autorizado, a venda será efetuada pelo depositário ou pelo agente de execução, se o

depositário for o executado, nos termos do artigo 756.º, n.º1 CPC.

Determinação de comprador e do valor concreto de aquisição. Entrega do

preço:

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1. Proposta em carta fechada: o objeto da venda mediante propostas em carta

fechada são bens imóveis que não hajam de ser vendidos de outra forma, máxime,

por venda direta (artigo 816.º, n.º1 CPC). A competência para a realização desta

venda é do tribunal de execução; da situação dos bens só terá competência, caso o

juiz o determina oficiosamente ou a requerimento dos interessados (artigo 816.º, n.º3

CPC). O procedimento da venda mediante propostas em carta fechada reconduz-se

às fases de publicidade, notificação e mostra, entrega de propostas, aberturas e

apreciação das propostas, adjudicação, entrega e, finalmente, registo. A publicidade,

notificação e mostra têm como função dar a conhecer aos interessados que se aceitam

propostas para a compra de um certo bem ou lotes de bens, por um certo valor, e

para permitir a apreciação visual e física do bem ou bens. Estão reguladas nos artigos

816.º, n.º2 e 817.º CPC. O valor enunciado para a venda era, até 9 novembro 2012,

sempre igual a 70% do valor base (artigo 816.º, n.º2 CPC), tendo deixado de ser

possível fixar uma percentagem diferente, nomeadamente inferior. Todavia, em 2012,

veio alterar-se para 85% aquele valor base, solução recebida pelo n.º2 do artigo 816.º

CPC. A notícia de quais os bens a vender, do valor base, do dia, hora e local da venda

e dos demais elementos constantes do n.º3 e 4 do artigo 817.º CPC é feita por editais,

anúncios e inclusão na página informática da secretaria da execução, nos termos do

n.º1 a 3 do mesmo artigo. Podem ser usados outros meios de publicidade da venda

por iniciativa oficiosa ou sugestão dos interessados na venda (artigo 817.º, n.º1 CPC).

A expressão iniciativa oficiosa significa iniciativa do agente de execução, e não do juiz,

pois é aquele que promove as diligências da venda. Com a expressão sugestão dos

interessados quer dar entender-se que o agente de execução tem um poder

discricionário para escolher o meio, não sendo passível de reclamação para o juiz a

opção que tomar. Os bens são mostrados, nos termos do artigo 818.º CPC. Em

simultâneo, o agente de execução procede à notificação dos titulares de direito de

preferência legal ou convencional com eficácia real. Decorre do n.º1 do artigo 820.º

CPC que a entrega das propostas é feita na secretaria do tribunal onde estiver a correr

a venda. Deverão vir obrigatoriamente acompanhadas de uma caução, que tanto

pode ser um cheque visado, à ordem do agente de execução, como uma garantia

bancária, no montante correspondente a 5% do valor base dos bens (artigo 824.º,

n.º1 CPC). No dia, hora e local anunciados, procede-se à abertura das propostas na

presença do juiz, devendo assistir à abertura o agente de execução e podendo a ela

assistir o executado, o exequente, os reclamantes com garantia real sobre os bens a

vender e os proponentes (artigo 820.º, n.º1 CPC). Uma vez que o agente de execução

só pode assistir, parece que a abertura das propostas e toda a sessão de venda será

feita pelos funcionários do tribunal, sob a autoridade do juiz. A deliberação da

escolha da melhor proposta é tomada nos termos do artigo 821.º CPC. Assim,

imediatamente após a abertura ou depois de efetuada a licitação ou o sorteio a que

houver lugar, são as propostas apreciadas pelo executado, exequente e credores que

hajam comparecido. Se os interessados não estiverem de acordo, prevalece o voto

dos credores que, entre os presentes, tenham maioria de créditos sobre os bens a que

a proposta se refere. Se nenhum estiver presente, considera-se aceite a proposta de

maior preço. Em qualquer caso, não serão aceites as propostas de valor inferior ao

valor previsto no n.º2 do artigo 816.º CPC, salvo se o exequente, o executado e todos

os credores com garantia real sobre os bens a vender acordarem na sua aceitação.

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Contrariamente ao que acontecia no sistema anterior à reforma de 1995/1996, o

executado não pode opor-se à proposta aceite por voto dos credores que, entre os

presentes, tenham maioria de créditos sobre os bens a que a penhora se refere (artigo

821.º, n.º2 CPC). Feita a aceitação dessa proposta, são interpelados os titulares das

preferências reais para as exercerem, ex vi artigo 823.º CPC, após o que o proponente

ou preferente vencedores são notificados para, no prazo de 15 dias, depositar, numa

instituição de crédito, a totalidade ou a parte do preço em falta. As consequências do

incumprimento desta obrigação constam do artigo 825.º, n.º1 CPC, cabendo ao

agente de execução optar por uma delas:

a. Decretar a ineficácia da venda:

i. E aceitar a proposta de valor imediatamente inferior, perdendo o proponente o

valor da caução constituída nos termos do n.º1 do artigo 824.º CPC;

ii. Efetuar a venda dos bens através da modalidade mais adequada, não podendo

ser admitido o proponente ou preferente remisso a adquirir novamente os mesmos

bens, perdendo o valor da caução constituída nos termos do n.º1 do artigo 824.º

CPC.

b. Manter a venda: fazer a liquidação da obrigação em dívida e requerer ao juiz

da execução o arresto dos bens suficientes para garantir o valor em falta,

acrescido das custas e despesas, sem prejuízo de procedimento criminal e

sendo aquele, simultaneamente, executado no próprio processo para

pagamento daquele valor e acréscimos. Segundo o n.º3 do artigo 825.º CPC,

se a venda ficar sem efeito, pode o preferente que não exerceu o seu direito

em tempo, efetuar, no prazo de 5 dias, contados do termo do prazo do

proponente ou preferente faltoso, o depósito do preço oferecido por estes,

independentemente de nova notificação.

2. Venda de estabelecimento comercial por proposta em carta fechada: o artigo

829.º CPC admitia até 2008 a venda de estabelecimento comercial de valor

consideravelmente elevado mediante o referido regime de propostas em carta

fechada. Com a reforma de 2008 passou a quantificar-se que se deve tratar de

estabelecimento de valor superior a 50 UC. Para tal deve ser apresentada ao juiz de

execução uma proposta, i.e., um requerimento, do agente de execução, exequente,

executado ou credor com garantia real sobre ele (artigo 829.º, n.º1 CPC). O juiz pode

em despacho chamar a si a abertura das propostas, na presença do agente de execução,

ou deixar para este a realização da venda (artigo 829.º, n.2º CPC). Se o juiz entender

dever dirigir a abertura das propostas, o agente de execução ficará com as tarefas de

anunciar a venda e fixar o respetivo valor (artigo 816.º, n.º2 CPC, conjugado com os

artigos 812.º, n.º2, alínea b) e 817.º CPC), de mostrar os bens (artigo 818.º CPC) e de

notificar os preferentes (artigo 819.º CPC), enquanto o juiz dirigirá toda a sessão de

venda (artigos 810.ºa 823.º e 826.º CPC). Cauções, depósitos, adjudicação e entrega

são feitas perante e pelo agente de execução (artigos 824.º, 825.º e 827.º CPC).

Quando não se siga este regime especial, seja porque o estabelecimento não é de

valor consideravelmente elevado, seja porque o juiz indeferiu o pedido dos

requerentes (artigo 829.º, n.º1 CPC), segue-se o regime comum por negociação

particular (artigos 833.º CPC) ou em estabelecimento de leilão (artigo 834.º CPC).

3. Leilão por depósito público: a venda em depósito público é uma modalidade de

venda, introduzida pela Reforma e regulada no artigo 836.º CPC. O seu objeto são

bens móveis que não devam ser vendidos por outra forma. Tem a função de servir

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para alienar de modo expedito os bens móveis sobre os quais não haja qualquer

direito real de aquisição, nem se verifique urgência na realização na venda, nem o

exequente ou o executado hajam proposto comprador ou a venda por leilão, nem a

sua natureza imponha o recurso a outra modalidade de venda. Isto poderá suceder,

por exemplo, para muitos dos bens que integram o recheio de uma casa e que

apresentem baixo valor comercial. A venda em depósito público será feita

mensalmente, em conjunto com outras vendas de bens penhorados em outras

execuções, após ser publicitada nos termos do n.º2 do artigo 836.º CPC (ainda, artigo

5.º Portaria n.º941/2013, 5/9). Segundo esta Portaria, os bens são vendidos em

regime de leilão entre as propostas apresentadas oralmente, pelos interessados (artigo

6.º, n.º6) vencendo a proposta de valor mais elevado e devendo o preço ser pago de

imediato (artigo 6.º, n.º7 CPC). Do resultado da venda lavra-se ata, nos termos do

artigo 8.º do mesmo diploma.

4. Negociação particular: a venda por negociação particular pode ter lugar ´

a. Originariamente (artigo 832.º, alíneas a) , b) e c) CPC): a venda por

negociação particular é utilizada em três situações:

i. Quando o exequente ou o executado propuserem um comprador e um preço, aceite

expressamente pela contraparte e demais credores; casos em que o executado

participa será para obter melhor preço em seu benefício e dos credores (artigo 832.º,

alíneas a) e b) CPC;

ii. Se houver urgência na realização da venda, desde que a urgência seja reconhecida

pelo juiz da execução (artigo 832.º, alínea c) CPC);

iii. Quando o bem em causa tenha um valor inferior a 4UC (artigo 832.º, alínea g)

CPC).

b. Subsidiariamente (alíneas d) e e) do mesmo artigo): depois da tentativa

da utilização de uma outra modalidade da venda, a venda por negociação

particular também pode ser utilizada neste caso de frustração da venda

mediante propostas em carta fechada, por falta de proponente, não aceitação

das propostas ou falta de depósito do preço aceite, no caso de frustração da

venda em depósito público, por falta de proponente, não aceitação das

propostas ou devido à natureza dos bens a vender ou quanto se frustre a

venda em leilão eletrónico por falta de propostas.

A pessoa que fica incumbida, como mandatário, de efetuar a venda, deve ser

designada no despacho que determina a venda por negociação particular. Segundo o

preâmbulo do Decreto-Lei n.º 38/2003, 8 março, o agente de execução passou a ter

um papel fundamental, podendo ser encarregado, em certas circunstâncias, da venda

por negociação particular. De facto, segundo o n.º2 do artigo 833.º CPC, pode ser

encarregado o agente de execução, por acordo de todos os credores e sem oposição

do executado, ou, na falta de acordo ou havendo oposição, por determinação do juiz.

Mas neste último caso para a venda de imóveis é preferencialmente designado

mediador oficial. Parece manter-se o entendimento anterior à reforma de 2003 de

que o executado não pode ser considerado como principal negociador, mas apenas

auxiliar do agente de execução. Tal não ofende nas negociações com o terceiro os

princípios do artigo 227.º CC, i.e., a boa fé pré-contratual, desde que o terceiro tenha

sido informado de que faltam ao dono da coisa os globais poderes de negociação do

prédio, agora na esfera do agente de execução. Adicionalmente, estando pendente

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recurso da sentença exequenda ou oposição do executado à execução ou à penhora,

deve o agente de execução também fazer disso menção no ato de venda. Por outro

lado, a venda de imóvel em que tenha sido, ou esteja sendo, feita construção urbana,

ou de fração dele, pode efetuar-se no estado em que se encontre, com dispensa da

licença de utilização ou de construção, cuja falta de apresentação a entidade com

competência para a formalização do ato faz consignar no documento, constituindo

ónus de adquirente a respetiva ligação. O preço que vier a ser recebido deverá ser

depositado em instituição de crédito, à ordem do agente de execução ou, na sua falta,

da secretaria; só depois é que o agente de execução poderá lavrar o instrumento de

venda (artigo 833.º, n.º4 CPC) e a coisa entregue.

5. Estabelecimento de leilão; leilão eletrónico: a venda em estabelecimento de leilão

pode ter lugar inicialmente, quando se verificar algum dos casos das alíneas a) e b)

do artigo 834.º, n.º1 CPC, ou seja, quando haja proposta de venda em determinado

estabelecimento, feita pelo exequente, pelo executado, ou por credor reclamante, e

não haja oposição dos restantes, ou quando o agente de execução entender que as

características do bem justificam o recurso a essa modalidade de venda. Nesta

segunda hipótese, é o agente de execução que deve escolher o estabelecimento de

leilão (artigo 834.º, n.º2 CPC). A reforma de 2003 alargou o âmbito da venda em

estabelecimento de leilão, pois passou a poder vender-se em estabelecimento de leilão

qualquer bem ou direito penhorado, ainda que respeite a imóveis. No caso de imóveis,

no artigo 834.º, n.º3 CPC, manda aplicar o que o n.º6 do artigo 833.º CPC se dispõe

quanto a imóvel ou fração em que tenha sido feita ou se esteja a fazer construção

urbana. Como já se escreveu, na reforma de 2008 acrescentou-se o artigo 837.º CPC,

correspondente à submodalidade de venda em leilão eletrónico. Ela apenas não pode

ter lugar quando o bem haja de ser vendido por venda em mercado regulamentado

ou por venda direta (respetivamente, os artigos 830.º e 831.º CPC). A modalidade

surgiu como tendencialmente supletiva mas, como já se disse, em sede de novo artigo

837.º CPC deixam de existir essas condições: esta venda de bens imóveis e de bens

móveis penhorados é feita preferencialmente em leilão eletrónico, nos termos a

definir por Portaria do membro do Governo responsável pela área jurídica. Como se

vê, se por um lado esta passa a ser a modalidade-regra da venda executiva, todavia

deixa-se ainda espaço decisório ao agente de execução, através do advérbio

preferencialmente. Claramente, o agente apenas deixará de realizar esta venda quando

fundamentadamente declare que as demais modalidades de venda aplicáveis

permitem a satisfação do interesse do credor mais rapidamente ou por outra razão

atendível em face dos princípios que norteiam a penhora e a venda. À venda em leilão

eletrónico aplica-se o que estiver especialmente regulado na Portaria n.º 282/2013,

29 agosto, nos seus artigos 20.º a 25.º. Subsidiariamente, as regras relativas à venda

em estabelecimento de leilão. Essa venda deve ser publicitada, com as devidas

adaptações, nos termos do artigo 817.º, n.º2, 3 e 4 CPC e do artigo 19.º Portaria

n.º282/2013, 29 agosto.

6. Mercados regulamentados (bolsa de capitais ou de mercadorias): a venda

executiva dos valores mobiliários cotados em bolsa de capitais deve ser feita nesta.

Trata-se, naturalmente, das ações e dos demais títulos de crédito que são

transacionados na Euronext Lisboa. Isto vale igualmente para as mercadorias sujeitas

a cotação em bolsa de mercadorias. Esta modalidade de venda manteve inalterado o

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seu regime no artigo 830.º CPC mas passou a ser designada como venda em

mercados regulamentados, abrangendo quaisquer instrumentos financeiros.

7. Venda de bem indiviso ou património autónomo: a reforma da ação executiva

de 2003 pretendeu tornar comercialmente mais atraente a venda de bens em

comunhão de direitos reais ou em patrimónios autónomos. Passemos a explica-lo: o

mecanismo passa pela venda da totalidade do património autónomo ou do bem

indiviso, e pode funcionar para qualquer venda que seja com ele compatível. A sua

configuração varia consoante todos os quinhões ou direitos tenham sido penhorados

ou apenas alguns dos quinhões ou direitos o tenham sido.

a. Se todos os quinhões ou direitos tiverem sido penhorados, regem os

i. N.º2 do artigo 743.º CPC: estatui que se realiza uma única venda, que

será feita no âmbito do processo em que se tenha efetuado a primeira

penhora. Há aqui uma espécie de remessa das vendas para a execução

mais antiga. Tal remessa pode ser evitada, se tiver sido constituída

uma coligação passiva inicial entre os contitulares de quinhões no

mesmo património autónomo ou relativos ao mesmo bem indiviso,

sobre os quais se faça incidir a penhora, como passou a admitir em

2003 a nova alínea c) do n.º1 do artigo 56.º CPC.

ii. Nº2 do artigo 752.º CPC. Para assegurar o funcionamento posterior

daquele mecanismo, estatuo que a penhora, a promover pelo agente

de execução, se inicia por esse bem, se tal for conveniente para os

fins da execução. A conveniência implica uma opção do agente de

execução, que deverá escolher entre a venda concentrada e única,

começando logo pela penhora do quinhão, e a venda de outros bens,

começando pela penhora destes. Em todo o caso, uma vez efetuada

a penhora do quinhão, é imperativo o funcionamento daquele regime

do artigo 743.º, n.º2 CPC, pois não parece que ele possa ser afastado

por razões de inconveniência. Segundo o referido n.º2 do artigo 743.º

CPC, do produto da venda far-se-á a posterior divisão, ou seja, a

quantia apurada será distribuída pelas várias execuções na medida de

cada quota-parte ou direito. Depois, esse produto será distribuído

segundo a graduação de créditos realizada em cada execução.

Para a hipótese de terem sido penhorados alguns dos quinhões ou direitos de bem

indiviso não sujeito a registo, valem os novos n.º2, 2.ª parte e n.º4 do artigo 781.º

CPC. Assim, feita a notificação ao administrador ou aos contitulares, podem os

notificados declarar se pretendem que a venda tenha por objeto todo o património

ou a totalidade do em. Se assim for, procede-se à sua venda, salvo se o juiz, para tal

solicitado, o entender inconveniente para o fim da execução (n.º4 do artigo 781.º

CPC. Deste modo, libertam-se os contitulares da sujeição a uma aquisição por

terceiro desconhecido e facilita-se a venda. Deverá o executado dar o seu

consentimento, atenta a expressão deste n.º4? Pensamos que não, já que, como se

sabe, a venda é feita sem o concurso da vontade do executado, como não pode deixar

de ser. Esta necessidade de consentimento refere-se a um contitular que se pode

manter na comunhão após a venda executiva, o que não é o caso do executado. Ainda

assim, em abstrato, o executado pode requerer ao juiz que recuse essa venda

concentrada, se demonstrar que a mesma é inconveniente para a execução (e não

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para si, claro). Tal pode ser uma hipótese académica, mas já não o é no caso de serem

o exequente ou o credor reclamante a deduzir tal pedido. A mesma questão da

inconveniência pode ser suscitada ao juiz pelo próprio agente de execução, ao abrigo

do artigo 723.º, n.º1, alínea d) CPC. Não pode é ser o agente de execução a ajuizar

questões de inconveniência, pois isso é matéria reservada ao juiz. Este regime da

venda concentrada e única do património autónomo ou bem indiviso constante do

artigo 781.º CPC deve ser seguramente aplicado a todos os casos análogos de

penhora de apenas alguns dos direitos reais sobre a mesma coisa sem posse exclusiva,

i.e., de alguns direitos reais de habitação periódica e de outros direitos reais cujo

objeto não deva ser apreendido. É o que resulta da remissão que o n.º5 do artigo

781.º CPC faz para o disposto nos números anteriores do mesmo preceito. Também

parece que os mecanismos que estão previstos nos artigos 743.º, n.º2 CPC e 752.º,

n.º2 e 56.º, n.º1, alínea c) CPC, podem igualmente aplicar-se quando todos os direitos

sobrepostos sem posse exclusiva, v.g., quando todos os direitos reais de habitação

periódica tenham sido penhorados. A lei nada diz, mas as rationes são as mesmas. Já

a sua literalidade parece excluir a aplicação à venda de direitos sobre bens indivisos

sujeitos a registo.

8. Venda ao exequente: especialidades; dispensa de depósito aos credores: o

próprio exequente pode adquirir para si o bem posto à venda.

a. No plano formal: esta forma de satisfação do interesse do credor não se

confundiria com o pagamento por adjudicação previsto no artigo 799.º CPC

pois nesta o direito ao pagamento forçado é realizado, na totalidade ou em

parte, mediante a transferência da titularidade de bens penhoráveis, sem

entrega de um preço, carater essencial de uma venda. No entanto, não é

exatamente assim: também o exequente que adquira bens alguma das

modalidades de venda executiva é dispensado de depositar a parte do preço

que não seja necessária para pagar a credores graduados antes dele e não

exceda a importância que tem direito a receber. É isso que dispõe o n.º1 do

artigo 815.º CPC. Se nem sequer estiverem ainda graduados os créditos – ou,

por maioria de razão, nem sequer houver credores reclamantes – o exequente

não é obrigado a depositar mais que a parte excedente à quantia exequenda.

Mas, se por efeito da graduação de créditos, o adquirente não tenha direito à

quantia que deixou de depositar ou a parte dela, é notificado para fazer o

respetivo depósito em 10 dias, sob pena de ser executado nos termos do

artigo 825.º CPC, começando a execução pelos próprios bens adquiridos ou

pela caução. Esta dispensa de depósito da totalidade do preço justifica-se

plenamente: o exequente não se vai pagar a si próprio.

b. No plano substantivo: tem, por isso, aqui razão Anselmo de Castro quando

escreve que já objetivamente sempre o caráter de uma adjudicação.

Ora, em sede de venda mediante propostas em carta fechada foi, adicionalmente

defendido, que o exequente estaria também dispensado de juntar à sua proposta uma

caução em cheque visado, à ordem do agente de execução ou, na sua falta, da

secretaria, no montante correspondente a 5% do valor base dos bens ou em garantia

bancária no mesmo valor, como exigiria o artigo 824.º, n.º1 CPC. É que, sendo o

comprador o próprio exequente, a caução não cumpre a sua função de garantia da

obrigação de pagamento do preço, não acrescentando qualquer seriedade à proposta,

nem (no caso de cheque-caução) a sua função de princípio de pagamento. Só que, na

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verdade, a caução tutela também, consoante os casos, os direitos dos credores

reclamantes, e do executado ao remanescente da venda. Justamente, o legislador de

2013 vem negar uma tal dispensa de caução, no novo n.º6 do artigo 820.º CPC.

Efetivamente, no prévio regime determina-se que n.º5 determina-se que na venda

mediante proposta em carta fechada se o exequente, se estiver presente no ato de

abertura das propostas, pode manifestar vontade de adquirir os bens a vender,

abrindo-se logo licitação entre si e proponente do maior preço; se o proponente do

maior preço não estiver presente, o exequente pode cobrir a proposta daquele; ora,

lê-se no sucessivo n.º6 que neste caso aplica-se, com as necessárias adaptações, o

disposto no artigo 826.º, sem prejuízo do artigo 817.º CPC. Por outras palavras, o

exequente deverá juntar obrigatoriamente com a sua proposta a caução, sem prejuízo

de estar dispensado de depositar a parte do preço que não seja necessária para pagar

a credores graduados antes dele e não exceda a importância que tem direito a receber,

conforme já visto. No entanto, esta última ressalva impõe a seguinte interpretação:

dada a já referida extensão subjetiva da função da caução, esta deverá ser reduzida a

menos de 5%, correspondente ao valor a pagar aos reclamantes mais o que sobrar

como remanescente para o executado, quando a soma seja inferior àquela

percentagem.

Atos finais:

1. Adjudicação e entrega: pelo menos na venda mediante proposta em carta fechada

(artigo 811.º, n.º2 CPC), determina o artigo 827.º CPC que mostrando-se

integralmente pago o preço e satisfeitas as obrigações fiscais inerentes à transmissão,

o agente de execução adjudica os bens ao adquirente, preferente ou proponente, sem

necessidade de despacho judicial. Tal é feito mediante emissão de título de

transmissão a favor do adquirente – constitutivo dos efeitos materiais da venda – no

qual se identificam os bens, se certifica o pagamento do preço ou a dispensa do

depósito do mesmo e se declara o cumprimento ou a isenção das obrigações fiscais,

bem como a data em que os bens foram adjudicados. Os bens são, então, entregues

ao proponente ou preferente. O detentor dos bens – depositário, seja ele o agente de

execução, terceiro e o próprio executado, nos termos do artigo 756.º, n.º1 CPC – não

tem, em nenhuma circunstância, justa causa para não entregar os bens. Em especial,

não são aplicáveis a esta entrega em sede de execução para pagamento de quantia

certa, os fundamentos de deferimento de entrega previstos em sede de entrega de

coisa imóvel arrendada, no artigo 864.º, n.º1 CPC. No Código novo, o que o

executado pode fazer é recorrer ao artigo 733.º, n.º5 CPC: se o bem penhorado for

a cada de habitação efetiva do embargante, o juiz pode, a requerimento daquele,

determinar que a venda aguarde a decisão proferida em 1.ª instância sobre os

embargos de executado, quando tal venda seja suscetível de causar prejuízo grave e

dificilmente reparável. Idêntica solução existe à disposição do executado enquanto a

sentença estiver pendente de recurso, ao abrigo do artigo 704.º, n.º4 CPC. No entanto,

se o detentor dos bens não os entregar os bens ao adquirente, pode este instaurar

execução para entrega de coisa certa, nos termos prescritos no artigo 861.º CPC,

devidamente adaptados. O título executivo será o título de transmissão (artigo 828.º

CPC). Essa execução correrá autonomamente ou mesmo na própria execução como

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se lê no artigo 828.º CPC. Pode o adquirente, para este último efeito, requerer o

prosseguimento se a execução entretanto já estiver extinta?

a. Ac. RL 8 novembro 2001: no passado, antes da reforma de 2003, a letra do

preceito previa que o adquirente pudesse requerer o prosseguimento da

execução contra o detentor dos bens, tendo sido decidido que o

prosseguimento da execução nos termos do artigo 828.º CPC só é possível

quando a execução para pagamento de quantia certa se encontrar extinta.

b. Lebre de Freitas: admite a renovação da execução para essa finalidade.

c. Rui Pinto: a letra da lei deixa margem para algumas dúvidas, mas não há aqui,

em qualquer caso, uma continuação ou prosseguimento da mesma execução

ou, mesmo, uma convolação ou transformação mas, antes, uma junção

sucessiva de execuções de fins diferentes.

Aberta a execução para entrega de coisa certa que seja casa de habitação principal do

executado, pode este (ou mesmo um terceiro), ao abrigo do n.º6 do artigo 861.º CPC

fazer-se valer do disposto nos n.º3 a 6 do artigo 863.º CPC. Como tal pode ser

requerida a suspensão das diligências executórias, quando se mostre, por atestado

médico que indique fundamentadamente o prazo durante o qual se deve suspender

a execução, que a diligência põe em risco de vida a pessoa que se encontra no local,

por razões de doença aguda. Caso se suscitem sérias dificuldades no realojamento do

executado, o agente de execução comunicará antecipadamente o facto á câmara

municipal e às entidades assistenciais competentes.

2. Cancelamento dos registos: qualquer que seja a modalidade de venda (artigo 811.º,

n.º2 CPC) o agente de execução deve ainda comunicar a venda, de preferência por

via eletrónica (paralelo do artigo 755.º, n.º1 CPC), ex vi artigo 827.º, n.º2 CPC à

conservatória do registo predial competente, para inscrever a aquisição a favor do

terceiro e para cancelar as inscrições relativas aos direitos que caducaram com a venda,

nos termos do artigo 824.º, n.º2 CC.

Entrega do produto da venda: o produto da venda deve ser entregue aos credores,

segundo a graduação fixada em sentença, caso tenha havido direitos de crédito de terceiros

reclamados e reconhecidos. Uma das grandes novidades que a Reforma da ação executiva

em 2003 foi a restrição do acesso dos credores com privilégio creditório geral ao produto da

venda. A intenção foi salvaguardar, na medida do possível, aquele que inicia e suporta a

execução – o credor exequente. Atuou-se, para tanto, quer na fase de reclamação de créditos

(artigo 788.º, n.º4 CPC) – o que já vimos atrás – quer na fase do pagamento (artigo 796.º,

n.º3 CPC). Apenas os privilégios creditórios dos trabalhadores escapam a ambas as restrições

(artigos 788.º, n.º6 e 796.º, n.º4 CPC). Ora, o credor com privilégio creditório geral, que não

haja sido impedido de reclamar os seus créditos pelo quadro de restrições do artigo 788.º,

n.º4 CPC, sujeita-se a um limite quanto ao que pode receber em pagamento. Trata-se de

assegurar o que se poderia designar como pagamento mínimo garantido do exequente.

Efetivamente, decorre do artigo 796.º, n.º3 CPC, que aquele credor vê reduzida a sua parte

no produto da venda, na medida ao necessário para garantir o pagamento de 50% do crédito

do exequente até 250 UC. Esta redução em desfavor do credor privilegiado não pode,

contudo, ficar abaixo de um limite mínimo: 50% do remanescente do produto da venda,

deduzidas as custas e o valor dos créditos graduados antes do exequente. Efetivamente

decorre do artigo 796.º, n.º3 CPC que aquele credor vê reduzida a sua parte no produto da

venda, na medida ao necessário para garantir o pagamento de 50% do crédito do exequente

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até 250UC. Esta redução em desfavor do credor privilegiado não pode, contudo, ficar abaixo

de um limite mínimo: 50% do remanescente do produto da venda, deduzidas as custas e o

valor dos créditos graduados antes do exequente. Traduzindo-se em esquema: resulta,

segundo Lebre de Freitas e Ribeiro Mendes, que, após o pagamento das custas – nas quais

se incluem os honorários do solicitador de execução – se deve fazer, antes de tudo, a

compensação entre o credor reclamante com privilégio creditório geral e o exequente, e, de

seguida, fazer a distribuição do restante, segundo a graduação de créditos. Se houver outros

credores reclamantes, além daquele com privilégio geral, o credor exequente receberá sempre

uma parte do produto da venda, o credor que é titular de privilégios creditórios gerais

receberá tanto como antes, menos o que transfere para aquele, e todos os demais credores

receberão o que receberiam – nem mais, nem menos – se não houvesse aquela compensação

à qual são alheios.

§67.º - Direitos de terceiro sobre a venda

Preferências reais: os direitos de aquisição sobre a coisa penhorada podem ser opostos à

execução quando tenham natureza real; a simples penhora de bens já onerado não é causa

da sua extinção e mesmo, por regra, da sua ineficácia, salvo os que se constituam depois da

penhora. Deste modo, pergunta-se como pode o respetivo titular adquirir a coisa no processo

executivo. As disposições centrais sobre a questão constam dos artigos 800.º, n.º2 e 819.º

CPC, respetivamente, para a adjudicação e para a venda, e do artigo 831.º CPC. O n.º1 do

artigo 819.º CPC fixa que os titulares do direito de preferência na alienação dos bens, seja

preferência legal ou convencional com eficácia real, devem ser notificados do dia, hora e local

aprazados para a abertura das propostas, a fim de poderem exercer o seu direito no próprio

ato, se alguma proposta for aceite. Esta disposição vale para todas as demais modalidades de

venda, excetuada a venda direta, segundo o n.º2 do artigo 811.º CPC. O n.º2 do artigo 800.º

CPC contém uma previsão semelhante, impondo, no âmbito da adjudicação, a notificação

aos titulares de direito de preferência, legal ou convencional com eficácia real do dia, hora e

local de abertura das propostas. Na venda por negociação particular, em depósito público ou

por leilão, eventualmente em eletrónico (artigos 833.º, 834.º, 836.º e 837.º CPC) vale, mutatis

mutandis este artigo 819.º CPC, ex vi artigo 811.º, n.º2, 2.ª parte CPC: o preferente deve ser

notificado da data da sessão de leilão, de modo a poder estar presente, ou do valor acordado

com o negociante particular ou da data de termo do leilão eletrónico. Em qualquer das

modalidades de venda ou na adjudicação, a notificação dos preferentes, que não pode ser

edital, é feita com aplicação das regras relativas à citação, segundo o n.º3 do artigo 819.º CPC.

Isto quer dizer, entre outras coisas, que o notificado deverá ser avisado das consequências

do seu não comparecimento, para além do tribunal onde corre o processo (artigo 227.º CPC).

Quanto ao momento de exercício do direito de preferência, na venda mediante proposta em

carta fechada, aceite alguma proposta os preferentes devem declarar se preferem após

interpelação (artigos 823.º, n.º1 CPC). Na adjudicação, o preferente terá de exercer o seu

direito na sessão fixada para abertura das eventuais propostas (artigo 801.º, n.º1 CPC), o

mesmo se passando para a sessão de venda por leilão. Na venda por negociação particular

exercerá a preferência imediatamente a ser informado do valor acordado com o terceiro.

Contudo, caso alguma proposta tenha sido aceite, se o proponente não tiver depositado a

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totalidade ou a parte do preço em falta, no prazo de 15 dias, a lei ainda dá ao preferente um

prazo de 5 dias para depositar esse preço, mesmo que ainda não tenha sido notificado (n.º4

do artigo 825.º CPC). Isso significa que, se não aceitarmos uma solução de caducidade

seguida de renascimento do direito, o preferente manteve esse direito real durante aquele

prazo na sua esfera jurídica. Se o sujeito emitir a declaração de preferência, a mesma deve ser

acompanhada da prestação de uma caução, na forma de cheque visado, à ordem do agente

de execução, correspondente a 5% do valor da melhor proposta, ou de uma garantia bancária,

no mesmo valor (artigo 824.º, n.º1 CPC ex vi artigo 823.º, n.º3 CPC). Se a proposta do

preferente for aceite, ele é notificado para, em 15 dias, fazer o depósito da parte do preço em

falta (artigo 824.º, n.º2 CP). No caso de incumprimento daquela obrigação legal de depósito

do resto do preço, deve o agente de execução liquidar a respetiva responsabilidade, i.e., o

valor em falta, as custas judiciais e as despesas com o agente de execução. Ao mesmo tempo,

será requerido – pelo mesmo agente de execução, parece – perante o juiz de execução o

arresto dos bens suficientes para garantir aqueles montantes e proposta a respetiva execução

para pagamento de quantia certa. Portanto, o preferente sujeita-se ao mesmo regime do

proponente cuja proposta tenha sido aceite. E também aos regimes da ineficácia da venda

por falta de depósito (artigo 825.º CPC) e da adjudicação do bem e registo (artigo 827.º CPC).

O titular de preferência real por convenção (artigo 421.º CC), que haja sido regularmente

notificado mas não exerceu o seu direito no momento processualmente devido, i.e., em

resposta à interpelação (artigo 823.º, n.º1 CPC) verá o seu direito extinguir-se ex vi artigo

416.º, n.º2 CC. Desse modo, a preferência convencional pela sua origem contratual não se

renova em nenhuma outra alienação posterior do mesmo bem, como ensina Teixeira de

Sousa. Já se o titular de uma preferência real ex lege não o exercer no momento adequado

apenas provocará a caducidade do ónus processual, i.e., não pode mais preferir naquela ação.

É que na boa doutrina de Teixeira de Sousa, dada a natureza legal conservará, mesmo após

a transmissão do direito penhorado, o seu direito perante o adquirente do direito caso este

venha, eventualmente, a procurar futuramente vender ou dar em cumprimento o bem.

Diversamente, no caso de frustração ou falta de notificação, mas também se o seu direito for

desatendido, i.e., não reconhecido pelo juiz ou pelo agente de execução, consoante a

modalidade de venda, pode o terceiro preferente propor ação de preferência, como decorre

do n.º2 e 4 do artigo 819.º CPC, sem que haja nulidade processual da venda. Isto significa

que a aquisição feita por adjudicação ou por venda pode ser impugnada por ação de

preferência proposta no prazo de 6 meses sobre a data do conhecimento dos elementos

essenciais daquela alienação executiva (artigo 1410.º CC, incluindo a remissão artigo 421.º,

n.º2 CC). A procedência da ação de preferência implica, nos termos do artigo 839.º, n.º2 CPC

que o preferente se substituirá ao terceiro adquirente, pagando o preço – entretanto

depositado nos termos do n.º1 do artigo 1410.º, in fine CC – das despesas e da compra. O

terceiro, por sua vez, será restituído no valor que despendeu. Deste modo, não se toca nas

posições dos credores.

Direito de remição: os artigos 842.º CPC preveem a figura do direito de remição: certos

interessados pode, potestativamente, fazer-se substituir ao adjudicatário ou ao comprador,

na preferencial aquisição de bens penhorados, mediante o pagamento de preço por eles

oferecido. Esses interessados são:

1. Cônjuge que não esteja separado judicialmente de pessoas e bens;

2. Descendentes ou ascendentes do executado.

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Trata-se, assim, de um direito de preferência qualificado, com o qual se quis proteger o

património familiar, evitando que os bens saíssem para fora da família, pondo o património

do executado (membro dela) a coberto de outros maiores prejuízos, de qualquer das maneiras

sem pôr em causa a essência da satisfação do interesse do exequente. Desde a Reforma de

2003 que o termo do prazo para exercer o direito de remição (n.º1 do artigo 843.º CPC) foi

adaptado à supressão do despacho de adjudicação, bem como da categoria da venda

extrajudicial. Assim, na venda mediante propostas em carta fechada, a remição pode ser

exercida até à adjudicação de bens ou no prazo do artigo 825.º, n.º3 CPC. Nas restantes

modalidades de venda, a remição pode ser exercida até à entrega dos bens ou da assinatura

do título que a documenta. A remição faz-se por requerimento, com alegação e comprovação

da qualidade pessoal, mas, se o requerente da remição não puder fazer logo a prova do

casamento ou do parentesco, dar-se-lhe-á dado prazo razoável para a junção do respetivo

documento. O requerimento deve ser dirigido ao agente de execução, o qual, deverá informar

o terceiro remidor de todas as condições da venda. Assim, tratando-se de venda por

negociação particular, tem de ter conhecimento do acerto do preço da venda, como dos

encargos a suportar com o ato, para ser-lhe exigível que disponha dos meios adequados ao

resgate. Do requerimento de remição devem ser notificadas todas as partes com interesse

nos bens em questão, i.e., exequente, comprador e executado. A prova da extemporaneidade

de atuação, designadamente por o remidor já estar anteriormente ciente de todos os

elementos do negócio, constitui do ónus dessas contrapartes. Se o remidor exercer o seu

direito no ato de abertura e aceitação das propostas em carta fechada, deverá proceder à

prestação de caução e depósito do preço conforme o artigo 824.º CPC, com as adaptações

necessárias. As consequências da falta de depósito são previstas nos n.º1 a 3 do artigo 825.º

CPC. Se o remidor exercer o seu direito depois desse momento, mas, necessariamente antes

da adjudicação de bens, o preço deve ser integralmente depositado com o acréscimo de 5%

para indemnização do proponente se este já estiver feito o depósito referido no n.º2 do artigo

824.º CPC. A prevalência interna e externa do direito de remição rege-se, depois, por um

conjunto de regras. Assim, o direito de remição permanece, sucessivamente, a:

1. Cônjuge;

2. Descendentes, preferindo os de grau mais próximo aos de grau mais próximo aos

de grau mais remoto e, em igualdade de grau, preferindo o que oferecer, em licitação,

maior preço;

3. Ascendentes, preferindo os de grau mais próximo aos de grau mais remoto e, em

igualdade de grau, preferindo o que oferecer, em licitação, maior preço.

Havendo concurso entre o direito de remição e um direito de preferência, o direito de

remição prevalece sobre o direito de preferência (artigo 844.º, n.º1 CPC), mas se existirem

vários preferentes e se abrir licitação entre eles, a remição tem de ser feita pelo preço

correspondente ao lanço mais elevado. Esta prevalência impõe-se ainda ao direito real de

aquisição de promitente-comprador.

Promessa real:

1. Âmbito substantivo: como adequar o direito de terceiro à execução específica de

promessa de compra e venda com eficácia real (artigo 413.º CC) com o direito do

exequente a obter o pagamento com o produto da venda do bem? Este quadro, se

por um lado apresenta a vantagem de (pré) existir à fase da venda um comprador

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para o bem penhorado, tem a desvantagem de este o fazer nos termos de um contrato

celebrado com o executado e não nos tempos e termos processuais. Até 2003, a

modalidade de venda direta estava reservada para bens que houverem, por lei, de ser

entregues a determinada entidade.

a. Lebre de Freitas e Teixeira de Sousa: entendia importante que o

promitente-comprador de promessa com eficácia real deveria vir à execução

exercer o seu direito na venda direta, nos termos contratualmente estipulados.

b. Contrariamente, para Amâncio Ferreira, o meio adequado para fazer a

aquisição judicial com base no contrato-promessa seria a ação de execução

específica (artigo 830.º, n.º1 CC) e não a venda direta: o direito real de

aquisição do promitente comprador concretiza-se, não por meio de uma

forma especial de venda, mas do direito de execução especídica.

c. Idênticamente, Remédio Marques e Miguel Mesquita defenderam que o

promitente-comprador não teria ónus de adquirir por venda direta, podendo

embargar de terceiro para obter o levantamento da penhora.

A solução adotada pela Reforma de 2003 pretendeu, justamente, consagrar a

posição de Lebre de Freitas e Teixeira de Sousa, parece-nos. Efetivamente, o

legislador aditou no artigo 831.º CPC, como segundo objetivo possível da venda

direta, os bens prometidos, com eficácia real, a quem queira exercer o direito de

execução específica. Está-se assim em presença de uma forma incidental de exercício

do direito à execução específica, i.e., do crédito à prestação de celebração do contrato

prometido. Na verdade, trata-se de poder antecipar o exercício do direito que de

outro modo caducaria sempre com a venda executiva. É certo que o adquirente

promitente não vai adquirir mediante uma sentença judicial de suprimento de uma

contra-vontade negocial ausente, pois não se chega a celebrar contrato com o

promitente-vendedor, mas por uma compra feita na execução, com título, natureza

e regime diferentes. No entanto, trata-se de alguém que tem um crédito onerado em

termos reais (não de garantia, mas para aquisição) o bem penhorado e que deve, à

semelhança seja dos preferentes, seja dos credores, reclamantes, ser chamado a

intervir na execução. Desse modo, poderá adquirir sem prejudicar o exequente. Neste

sentido, o direito à execução específica tanto pode ser exercido por via declarativa

principal, como por via executiva incidental, aqui a favor de terceiro – o exequente.

2. Regime: o promitente-comprador que esteja em condições de instaurar a ação de

execução específica tem o ónus de comprar nos termos do artigo 831.º CPC ou pode

optar pelo regime previsto no artigo 830.º CC mesmo após a aquisição do bem

penhorado por terceiro? Com algumas diferenças, o entendimento maioritário é o de

que deve negar-se qualquer ónus de aquisição pelo promitente-comprador e

prevalece o interesse de terceiro promitente.

a. Assim, para Remédio Marques, o promitente-comprador faz valer

querendo os seus direitos na execução; se não quiser, o bem há-de ser posto,

porventura, à venda com advertência de que sobre ele incide um direito que

importa sempre a execução específica, oponível a quem quer que seja, porque

inscrito no registo em data anterior. No plano substantivo, valeria, pois, o

artigo 830.º, n.º1 CC: o bem poderia mais tarde transferir-se para o

património do promitente-comprador, através da sentença constitutiva

proferida na ação de execução específica, como conclui Anselmo de Castro.

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b. Por seu turno, Lebre de Freitas entende que o promitente-comprador não

é obrigado a adquirir senão nas condições contratuais pelo que tal pode

implicar a suspensão da execução quanto ao bem em questão se ainda não se

tiver vencido a obrigação de celebração do contrato. Somente depois de

vencida a obrigação se o promitente não exercer o direito à execução

específica pode vir a ser penhorada a posição contratual do executado e,

subsequentemente, desencadeado o processo conducente à resolução do

contrato-promessa.

c. Mas já Teixeira de Sousa parece pugnar por uma solução diferente: as

condições da venda são as contratadas, mas se decidir não adquirir em sede

de venda direta esta não pode deixar de se efetuar, pelo que já a entender que

o direito daquele promitente se extingue e não se renova em nenhuma

alienação posterior do bem por parte do eventual adquirente.

d. Pensamos que se pode uma resposta no sentido contrário de que não se

pode configurar o direito de execução específica como um direito absoluto:

tal como as normas relativas à venda em execução condicionam o exercício

das preferências reais em sede de artigo 823.º CPC e o exercício das garantias

reais em sede de reclamação de créditos, também as normas relativas à venda

direta condicionam o exercício da faculdade de aquisição real do promitente-

comprador. E isso apesar de tanto a preferência real, como a garantia real,

poderem conhecer prazos de exercício; na verdade, eles são consumidos com

face da desoneração geral importa pelo artigo 824.º, n.º2 CC. Nesta linha de

orientação tem-se, pois, em linha de conta também (mas não exclusivamente)

o interesse do exequente, pois, se a existência de uma preferência real não é

obstáculo à venda – alguém compra sempre –, já o mesmo não se pode dizer

sobre a existência de uma promessa real: quem compraria um bem onerado

com um tal direito real? Parece-nos por isso que o sentido do artigo 831.º

CPC é onerar o promitente-comprador, desde que esteja em condições legais

de adquirir – não renunciou expressamente à execução específica, não há

convenção em contrario (artigo 830.º. n.º1 e 2 CC) – a adquirir a coisa

prometida mesmo que, com isso, perca o beneficio de prazo. Naturalmente

que sendo um ónus – não uma obrigação – é lícito o seu não exercício: a

venda deve ser feita diretamente a quem possa e queira exercer o direito de

execução. Querendo comprar o promitente-comprador deve emitir a

declaração de execução específica, em 10 dias a contar da notificação (artigo

149.º CPC) nas condições que estavam contratadas. A declaração deve ser

acompanhada da prestação de uma caução, na forma de cheque visado, à

ordem do agente de execução, correspondente 5 % do valor do preço

prometido, ou de uma garantia bancária no mesmo valor (artigo 824.º, n.º1

CPC, aplicável por analogia dado o artigo 823.º, n.º3 CPC não o excluir). Se

após verificação pelo agente de execução a proposta for aceite, ele é

notificado para, em 15 dias, fazer o depósito da parte do preço em falta (artigo

824.º, n.º2 CPC). Mas se não quiser exercer a execução específica, pode o

agente de execução buscar outros compradores, máxime, em proposta

mediante carta fechada. Se a coisa vier a ser comprada caducará o direito real

de aquisição, por força do artigo 824.º, n.º2 CPC, consequência similar à que

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se abate sobre as garantias reais. Qualquer ação de execução específica contra

o adquirente será improcedente, dada a libertação do ónus que incida sobre

o bem. Mas, na ausência de consumação da venda ou adjudicação, mantem-

se o direito de execução específica, naturalmente. Será que, nos casos de

omissão de notificação do promitente-comprador, pode o terceiro

promitente propor uma ação de execução específica? A resposta parece ser

positiva: uma vez que o direito real de aquisição não caducou com a venda,

ele continua a onerar a coisa vendida na execução. Trata-se, então, de suprir,

por via judicial, uma declaração de vontade do promitente-vendedor

executado que nunca teve lugar e de pagar o preço, que será entregue ao

terceiro comprador, por aplicação analógica do artigo 839.º, n.º2 CPC. A falta

de referência à procedência de ação de execução específica no artigo 839.º

CPC mostra que originariamente o sistema da execução – máxime, o artigo

831.º CPC – não tinha em conta a promessa com eficácia real. No entanto, a

realidade foi mudando; e mudado deveria ter sido, por isso, o artigo 839.º,

n.º2 CPC.

3. Concurso com preferência real: quid iuris se outrem tiver uma preferência real

sobre o bem prometido? O artigo 811.º, n.º2 CPC exclui expressamente da venda

direta as regras de notificação do terceiro preferente, constantes do artigo 819.º CPC.

No passado, Teixeira de Sousa e Remédio Marques defenderam que a venda

direta não era afastada pela existência de uma preferência, legal ou convencional. Pelo

contrário, o preferente poderia exercer o seu direito se o promitente-comprador

quisesse exercer o seu direito. Tal doutrina é de acompanhar.

§68.º - Regime de eficácia. Natureza jurídica

Introdução. O caráter processual dos pretensos efeitos obrigacionais:

1. Introdução: a venda executiva tanto pode ser vista como uma sequência de atos

processuais, como um único evento gerador de eficácia. Nesta última aceção, a venda

executiva pode ser definida como a transmissão forçada do direito penhorado a título

oneroso. Alguma doutrina veria a venda executiva como fonte contratual dos efeitos,

em parte obrigacionais, arrolados no artigo 879.º CC: a transmissão da propriedade,

a obrigação de entregar a coisa e a de entregar o preço. E seguramente que a venda

executiva é, ainda e sempre, no plano económico, uma transmissão de propriedade

ou outro direito mediante um preço. No entanto, no plano jurídico, e como melhor

veremos, nãos e trata de um contrato, mas de uma venda administrativa: uma venda

imposta ao executado pelo Estado em exercício do direito do credor à realização

coativa da prestação. É essa natureza que permite explicar tanto um regime de efeitos

que, em muitos aspetos essenciais, não está presente na venda voluntária e um regime

de vícios que só em parte é o da venda negocial e que determinam a sua anulação ou

a sua ineficácia. Destarte se é adequado o entendimento de que subsidiriamente se

aplicam à venda executiva as regras do Código Civil em bom rigor elas valem naquilo

em que não contrariem a funcionalidade processual e executiva da mesma. Em suma:

o regime da venda executiva, mesmo quando moldado sobre o regime da venda civil,

não absorve desta a natureza jurídica. No plano positivo, estão em foco, nesse regime,

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o artigo 824.º CC e os artigos 838.º a 841.º CPC, embora outros ainda, mas

secundários, devam ser ainda chamados à colação. Um e outro desses regimes são

aplicáveis tanto à adjudicação, como à remição de bens graças aos artigos 826.º CC e

802.º CPC (na parte em que remete para o artigo 838.º a 841.º CPC). Vamos, então,

abordar os efeitos e os vícios da venda executiva.

2. Pretensos efeitos obrigacionais; natureza processual: o adquirente tem o dever

e depositar o preço, como se viu, máxime no artigo 824.º CPC. No entanto, não se

trata de um efeito da venda como suceder contratualmente, em sede de artigo 879.º,

alínea c) CC. Pelo contrário, a entrega do preço é um pressuposto processual da

venda executiva: um dos vários atos sequencias que concorre para que se posse

proceder à transmissão do direito. Veja-se: se o preço não for depositado na sua

totalidade, o agente de execução pode determinar que a venda fica sem efeito (alíneas

a) e b) do n.º1 do artigo 825.º CPC), salvo se optar pela execução forçada da dívida

do adquirente ao abrigo da alínea c), n.º1 artigo 825.º CPC. Também a aparente

obrigação de entregar a coisa apresenta natureza processual. Transmitido o direito, o

depositário – agente de execução, executado ou terceiro – ou qualquer detentor deve

entregar a coisa (artigo 828.º CPC). Trata-se de um dos deveres legais de colaboração

com a justiça, em geral, e do depositário em especial.

Efeitos materiais principais:

1. Efeito translativo: a venda em execução transfere para o adquirente os direitos do

executado sobre a coisa vendida, dita o nº1 do artigo 824.º CC. A transferência para

o adquirente dos direitos do executado assume-se como o efeito primário da venda,

adjudicação ou remissão. Faltando a titularidade do direito na esfera do executado,

nada haverá para transmitir: o comprador só pode adquirir o direito do executado

sobre o bem transmitido e nada adquire se aquela parte não for o titular do direito

alienado, como ensina Teixeira de Sousa, comentando o artigo 839.º, n.º1, alínea d)

CPC. Transmitida a titularidade do direito, transmite-se com ela o risco de perda ou

deterioração da coisa. A este propósito parece ser compatível com os fins da

execução a aplicabilidade do regime geral do artigo 796.º CC. Deste modo, o

perecimento ou deterioração da coisa por causa não imputável ao Estado corre por

conta do adquirente. Mas se a coisa tiver continuado em poder do Estado em

consequência de termo constituído a seu favor, o risco só se transfere com o

vencimento do termo ou a entrega da coisa, salvo mora do adquirente. Naturalmente

que a posse respetiva também se transmite, mas no momento da entrega material da

coisa (artigo 1263.º, alínea b) CC). Do lado da esfera jurídica de quem compra assiste-

se de uma aquisição derivada, como sugere a letra da lei – transfere. Ora, se é certo que

o direito pode ser adquirido por terceiro desonerado de garantias reais e de certos

direitos reais – o que seria próprio de uma aquisição originária – tal é eventual, todavia:

podem manter-se direitos anteriores à primeira garantia, como decorre do artigo

824.º, n.º2, 1.ª parte CC a contrario. Portanto, o estado em que o direito é recebido

não tem que ser o da pura desoneração. A esta aquisição derivada, corresponde a

extinção do direito do executado sobre o bem e, bem assim, da respetiva posse, esta

por cedência (artigo 1267.º, n.º1, alínea c) CC). Por outro lado, a titularidade do

direito transmitido forçadamente justifica que o executado possa vir a ficar com o

eventual remanescente sobrante depois de pagos os credores e os sujeitos

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identificados no n.º3 do artigo 824.º CC, porque o seu direito foi objeto da venda

executiva. É que cumprida a função da venda executiva de satisfação do interesse do

exequente, retoma-se a regra civil do direito do transmitente à entrega do valor da

coisa, i.e., do preço (artigo 879.º, alínea c) CC), autónoma do efeito sub-rogatório do

n.º3 do próprio de terceiros com direitos estranhos à dívida.

2. Efeito extintivo das garantias reais: os bens são transmitidos livres dos direitos de

garantia que os onerarem, enuncia o artigo 824.º, n.º2, 1.ª parte CC. Abrangem-se

todas as causas legítimas de preferência (artigo 604.º, n.º2 CC), tenham ou não registo,

máxime, a consignação de rendimentos, o penhor, a hipoteca, o privilégio e o direito

de retenção, além de outras legalmente previstas. Portanto, a norma não admite,

nomeadamente, ma sobrevida do direito de retenção do promitente-comprador.

Também a penhora e o arresto, causas legítimas de reclamação de créditos, estão aqui

incluídas. Já as garantias reais ineficazes por força do artigo 819.º CC (portanto, com

ressalva das segundas penhoras – artigos 822.º CC e 794.º CPC) estão excluídas da

previsão da norma, pois, pura e simplesmente, não oneram. Elas extinguem-se em

razão de a originária ineficácia do ato jurídico se tornar definitiva. Prima facie, a norma

está construída pelo prisma do bem (não pelo prisma dos direitos subjetivos nele

incidentes) enunciando uma perda de objeto das garantias e não a extinção dessas

mesmas garantias: todas as garantias, constituídas ou registadas antes da venda, quer

o sejam antes quer depois do registo da penhora perdem o seu objeto, pois este fica

livre daquelas. Ora, no plano lógico-normativo esta perda de objeto determina a

caducidade da garantia real. Visa-se, como lembrava Anselmo de Castro, evitar a

depreciação do valor dos bens que resultaria de uma alienação com a subsistência

dos encargos, em benefício tanto do exequente como do executado. No plano

subjetivo, esta extinção das garantias corresponde, ainda, a uma forçada resolução do

contrato respetivo, ensinava, ainda, Anselmo de Castro. Todavia, o direito de

garantia não se extinguirá com a venda se o credor garantido se apresentar,

oportunamente, à execução a reclamar o seu crédito, citado ou espontaneamente.

Efetivamente, se o credor, citado ou espontaneamente, reclamar o crédito beneficiará

do efeito subrogatório fixado no n.º3 do artigo 824.º CC: a garantia transfere-se para

o produto da venda dos respetivos bens, não caducando pois se o direito real se

transfere para outro objeto, não caduca (Castro Mendes). É esse efeito subrogatório

que irá legitimar o pagamento aos reclamantes. Sendo reclamado, citando este autor,

o direito real de garantia, acessório do crédito, só se extingue em rigor, ou com a

extinção deste crédito por pagamento mediante a entrega do produto da venda, ou

por impossibilidade de satisfação por seu intermédio, por esgotamento da função de

garantia do objeto, caso outras garantias sejam pagas primeiramente. Ao contrário,

será a falta de reclamação pelo credor com garantia real (e sem prejuízo do disposto

no artigo 789.º, n.º6 CPC), que conduzirá à caducidade dessa garantia. Essa

caducidade da garantia real de hipoteca mantém-se mesmo que o credor, que se não

aproveitou dessa garantia venha a instaurar mais tarde processo executivo onde

obtenha penhora posterior, que conduz à sustação da execução e o leve a apresentar-

se a reclamar no primeiro processo. Nessa eventualidade, ele poderá beneficiar da

penhora que alcançou e que justificou a sustação da sua execução, mas não pode

aproveitar-se daquela garantia já caducada. Por isto, e em suma: as garantias reais que

caducam ipso facto com o ato processual da venda executiva são as não reclamadas; as

restantes caducam com o ato processual do pagamento, por alguma daquelas razões.

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Em qualquer caso, o crédito garantido, em si mesmo, não se extingue pela simples

extinção da garantia, podendo ser tutelado em outra ação.

3. Efeito extintivo dos direitos reais de gozo menores e ónus reais posteriores à

garantia prioritária e anteriores à penhora: os bens são ainda transmitidos livres

dos demais direitos reais que não tenham registo anterior (ou constituição) ao de

qualquer arresto, penhora ou garantia (artigo 824.º, n.º2, 2.ª parte CC). Algumas notas

prévias se impõem, como linhas interpretativas do preceito. A primeira linha

interpretativa é a de que, no plano do âmbito objetivo, se trata de direitos reais que

não sejam o direito penhorado ou os direitos de garantia: portanto, direitos reais de

gozo menores mas também dos direitos reais de aquisição. Importa, verificar se assim

sucede, efetivamente. A segunda linha interpretação é a de que aqueles arresto,

penhora ou garantia terão sido executados na instância executiva, seja pelo credor

exequente, seja, ulteriormente, por credor reclamante. Se o credor com garantia

anterior não deduzir reclamação de créditos que seja procedente a venda é feita

onerada com o direito real de gozo menor e este não caduca. Por fim, e como terceira

linha interpretativa, aponta-se para uma relação temporal entre a data de

registo/constituição do direito e a data de registo/constituição da garantia com

prioridade temporal. E importa notar que conta para este efeito é a prioridade

temporal (antiguidade) dos direitos em confronto e não a sua prioridade na graduação

de créditos. Assim, embora um direito de retenção de data posterior seja graduado

antes de uma hipoteca mais antiga (artigo 759.º, n.º2 CC), porém, o que vai ditar a

caducidade de um usufruto é a hipoteca. Por isso, apurar-se se o direito real de gozo

menor se constituiu ou registou antes ou depois da garantia executada mais antiga.

Em concreto, se os direitos reais de gozo menores se constituírem ou registarem

antes de todas as garantias executadas, seja pelo exequente, seja pelos reclamantes,

não caducam e, por isso, os bens são transmitidos com essas onerações. O titular

desses direitos se o vir ofendido por uma penhora cujo objeto extravasa para o seu

direito pode embargar de terceiro. Diversamente, caducam os direitos reais de gozo

menores constituídos/registados depois de garantia executada, porquanto se os bens

são transmitidos livres dos direitos reais que não tenham registo ou constituição

temporalmente anterior aquela, então, extinguem-se por perda do objeto real.

Anselmo de Castro explicava que a ratio desta caducidade era evitar o prejuízo

indevido ao titular da garantia real, e não uma consideração do exequente, já que em

face deste o direito de gozo desde que anterior à penhora ser-lhe-ia sempre oponível

(artigo 819.º CC a contrario). Idêntico regime legal estão, em parte, sujeitos os ónus

reais, como ensinam Teixeira de Sousa e Remédio Marques. É o caso da reserva do

doador a certa quantia sobre os bens penhorados (artigo 959.º, n.º1 CC), do apanágio

do cônjuge sobrevivo (artigo 2018.º, n.º1 CC), das obrigações propter rem ou, ainda,

das obrigações sucessória com garantia imobiliária – v.g., o ónus de redução das

doações sujeitas a colação do artigo 2218.º, n.º2 CC. Mas importa distinguir o título

da sua constituição. É que se forem de fonte legal, então sobrevivem à transmissão

executiva. A coisa é comprada onerada por eles. Diversamente, os ónus reais

constituídos voluntariamente apenas subsistirão se se estiverem constituído ou sido

registados antes da garantia prioritária.

a. Distinção em função do titular da garantia prioritária: nos casos de

caducidade do direito real menor de gozo, deve ainda distinguir-se:

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i. Se a garantia prioritária que o antecedeu é a garantia executada pelo credor

exequente: em regra, salvo renúncia ou não exercício, a penhora

começa necessariamente pelo bem onerado, nos termos do artigo

752.º CPC e do artigo 697.º CC, se o bem dado em garantia for do

devedor. O objeto da penhora coincide com o objeto da garantia. O

terceiro titular do direito real menor de gozo (ou da locação) deve

sempre ser citado para tomar a posição de executado, nos termos do

artigo 54.º, n.º4 CPC quando a penhora promovida pelo exequente

for da propriedade plena. De outro modo a penhora será

subjetivamente ilegal. É esta a boa lição de Lebre de Freitas já atrás

analisada: a garantia prioritária é do exequente e, se é certo que deu

certamente lugar a uma execução movida, nos termos do artigo 56.º,

n.º4 CPC, contra o devedor e o terceiro, todavia se o titular não for

citado nos termos desse mesmo preceito o direito não caduca e o

usufrutuário pode embargar de terceiro, procedentemente, sublinha

Lebre de Freitas. Deste modo, para caducar não basta ao direito real

de gozo menor estar incorporado no objeto da penhora como

tivemos ensejo de escrever a propósito dos embargos de terceiro:

também não pode ser objeto de nenhuma restrição ou exclusão de

exercício, pelo agente de execução, sem que o seu titular seja também

citado como executado.

ii. Se a garantia prioritária que o antecedeu é a garantia executada pela credor

reclamante: diversamente, o exequente é um credor comum que irá

obter uma prevalência pela própria penhora (artigo 822.º CC) ou

apresenta-se com uma garantia temporalmente posterior àquele

reclamante. Ora, nesta eventualidade a sua penhora apresentará um

objeto mais restrito que o objeto da garantia prioritária, pois terá

sempre o direito do terceiro a limitá-la. Neste caso, o terceiro credor

com garantia real vai ser citado para deduzir reclamação de crédito

sobre um bem penhorado, i.e., a propriedade de raiz, cujo âmbito é

menor do que o âmbito da sua própria garantia. Ora, tendo sido

doutrinalmente defendido, que o reclamante poderá, por isso,

requerer a extensão do objeto da penhora ao objeto da sua garantia

e, ao mesmo tempo, a citação dos restantes interessados para

tomarem (em face dele) a posição de executados, designadamente

podendo impugnar o seu crédito (Castro Mendes). Os restantes

interessados são os titulares de direitos reais menor de gozo, nos

termos do artigo 56.º, n.º4 CPC. Se não deduzir este requerimento, o

credor renuncia ao exercício da totalidade do objeto da garantia.

Escreve, precisamente Lebre de Freitas, que se o credor reclamante

não requerer a extensão do objeto da penhora para o âmbito da sua

própria garantia aceita o credor que o seu crédito seja pago na

execução só pelo produto do direito penhorado subsistindo o direito

de gozo do terceiro e conservando o credor a sua garantia, máxime,

a hipoteca pelo remanescente, quanto a esse direito. No caso de

ausência de requerimento de extensão do objeto da penhora, apenas

poderá ser vendido o objeto da penhora, i.e., sem o direito menor, o

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qual não caduca, pois a transmissão não abrangeu a extensão do gozo

que lhe está afetada. Se, ainda assim, o bem vier a ser vendido como

se não estivesse onerado pelo direito menor, o seu titular poderá

embargar de terceiro. Nesta hipótese, será o credor reclamante pago

pelo valor da coisa íntegra, ao abrigo do artigo 696.º CC, ou pelo valor

da proporção, correspondente, à propriedade de raiz?

1. Castro Mendes: propunha que se calculasse em que

percentagem o valor obtido está com o valor do prédio e

atribuir o excesso ao exequente ou, nas palavras de Teixeira

de Sousa, ser pago na proporção do valor obtido através da

nua propriedade em relação ao montante que poderia ser

conseguido se fosse vendida aquela propriedade.

2. Identicamente, Lebre de Freitas: escreve que o credor que

não requereu a extensão do objeto da penhora aceita que o

crédito seja pago na execução só pelo produto do direito

penhorado (na parte proporcional ao total do prédio), mas

conservando a sua garantia, pelo remanescente quanto ao

direito do terceiro.

3. Efetivamente, o reclamante reclamará a totalidade do seu

crédito sobre um objeto menor, sendo pago pelo valor

respetivo, proporcional ao valor da totalidade da propriedade.

Conservará a sua garantia ao restante do direito, como aponta

este último autor.

Concluindo: o direito real de gozo menor posterior à garantia prioritária, mas

anterior à penhora, para caducar deve incorporar-se no objeto da penhora.

Assim impõe a oponibilidade decorrente da sua natureza real. Tal implica a

citação para tomar a posição de executado. Esta tem lugar nos termos do

artigo 54.º, n.º4 CPC, aparecendo o direito menor como uma oneração deste,

concretizada numa posse.

b. Extensão à locação: o direito de locação, e o arrendamento, em particular,

merecem considerações especiais em razão da regra da emptio non tollit locatio

enunciada no artigo 1057.º CC. A doutrina e a jurisprudência apresentam-se

fortemente divididas.

i. Uma posição (Menezes Cordeiro, Romano Martinez, Amâncio

Ferreira) vem pugnar pela manutenção do arrendamento aplicando-

se a regra do artigo 1057.º CC à locação quando registada ou

constituída antes da penhora, já que o n.º2 do artigo 824.º CC não

previu a caducidade do arrendamento porque o artigo 1057.º CC

estabeleceu a regra da sua transmissão, não havendo, assim, lacuna

legal que permita a sua aplicação analógica ao arrendamento (Ac. STJ

19 janeiro 2004). Seria, então, um direito pessoal de gozo, mas com

um regime próprio.

ii. Uma segunda posição, maioritária, defende a caducidade (Oliveira

Ascensão, Teixeira de Sousa e Remédio Marques) incluindo a

locação no artigo 824.º, n.º2, 2.ª parte CC, eventualmente por

analogia. Assim, o Ac. STJ 31 outubro 2006, declarou que à luz do

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artigo 824.º CC, o contrato de arrendamento é considerado como um

verdadeiro ónus em relação ao prédio, daí que vendido o prédio em

sede executiva, o contrato de arrendamento celebrado depois da

constituição de hipoteca e da penhora caduque automaticamente. Na

mesma linha foi ainda o Ac. RL 28 setembro 2006: a venda judicial,

em processo executivo, de fração hipotecada faz caducar o seu

arrendamento, não registado, quando posteriormente celebrado à

constituição e registo daquela hipoteca, nos termos preceituados no

artigo 824.º, n.º2 CC.

iii. É esta a boa linha decisória, aliás, na senda de Vaz Serra. Na

verdade, o arrendamento não pode deixar de caducar, seja qual for a

natureza jurídica que se lhe possa atribuir. É que se fosse um direito

real menor de gozo não poderia deixar de ser assim, quando

apresentasse data posterior à garantia temporalmente prioritária; se

fosse um direito pessoal de gozo, por maioria de razão, caducaria, por

extinção do objeto mediato da prestação. Efetivamente, como

escreveu Vaz Serra, não há razão para o submeter a regime diferente

do aplicável aos direitos reais. Na verdade, não se pode deixar de

considerar que a regra do artigo 1057.º CC não é absoluta e conhece

os mesmos limites, para tutela dos credores e adquirentes – terceiros

à relação locatária – que os próprios direitos reais sofreriam. In casu,

a caducidade, ex vi artigo 824.º, n.º2 CC. Em consequência, no plano

processual o preceito substantivo do artigo 1057.º CC não pode

senão implicar que se dê à locação um tratamento semelhante ao de

um direito real de gozo menor em sede de relação com a venda

executiva. Em termos simples: a locação não pode ter um regime

mais favorável, nem mais desfavorável que um direito real de gozo

menor. Por isto, se a locação do bem penhorado for anterior à

garantia prioritária, o artigo 1057.º CC dita a permanência da locação

mesmo após a venda executiva. Por isso, o adquirente passará a ser o

novo locador, recebendo o ónus sobre o prédio. Já se a locação for

posterior à garantia prioritária, caducará ex vi artigo 824.º, n.º2 CC.

c. Exclusão dos direitos reais de aquisição: quanto aos direitos reais de

aquisição importa retomar algo do que já foi dito atrás tanto sobre as

preferências reais, como sobre as promessas reais. Os direitos de aquisição

respetivos escapam, em princípio, à aplicação do artigo 824.º, n.º2 CC, seja

porque não se extinguem, seja porque já estão extintos no momento da venda.

Efetivamente, os direitos reais de aquisição de fonte negocial (artigos 413.º e

421.º CC) caducam imediatamente ao seu não exercício no momento

processualmente devido (artigos 823.º, n.º1 e 831.º CPC) que é também, ex vi

artigo 416.º, n.º2 CC, o momento substantivamente devido. Assim, o direito

de preferência convencional caduca com a ausência de declaração do seu

exercício após interpelação, nos termos do artigo 823.º, n.º1 CPC. No

entanto, a promessa real caduca no momento da venda executiva efetiva do

bem e não pelo seu não exercício. Já os direitos reais de aquisição de fonte

legal não caducam caso não sejam processualmente exercidos, mantendo-se

intocada a sua existência. O preferente legal exerce, se quiser, o seu direito,

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embora sujeito às preclusões processuais. Pode, assim, vir preferir em futura

e eventual venda ou dação do bem adquirido pelo terceiro, negocial ou

executiva.

Efeitos materiais acessórios:

1. Efeito extintivo indireto dos direitos reais e locação posteriores à penhora, e

dos direitos pessoais de gozo: o efeito extintivo previsto no artigo 824.º, n.º2, 2.ª

parte CPC não abrange os direitos reais posteriores à penhora: são ineficazes ex vi

artigo 819.º CC e, por isso, inoponíveis à penhora. Eles por nenhum modo vão

restringir o âmbito da penhora e por isso pode esta ser realizada restringindo ou

suprimindo o seu exercício, i.e., em incompatibilidade. O que sucede é que a venda

executiva tem consequências sobre os atos dispositivos, oneradores ou de

arrendamento celebrados depois da penhora, caídos sob a ineficácia relativa

cominada no artigo 819.º CC. A sua eficácia que estava, assim, sujeita a condição

suspensiva de extinção da penhora, torna-se definitiva por impossibilidade

superveniente. Isso passa-se tanto para os efeitos reais, máxime, translativos e de

oneração, como para os efeitos obrigacionais (v.g. a obrigação de entregar a coisa –

artigo 879.º, alínea b) CC – ou de assegurar o gozo ao credor – artigos 1129.ºe 1131.º,

alínea b) CC). Portanto, os direitos reais posteriores à penhora, máxime, os direitos

reais menores de gozo e direitos reais de aquisição de fonte voluntária que sejam

ineficazes, extinguir-se-ão com a venda executiva por a originária ineficácia do ato

jurídico se tornar definitiva. Idêntica solução vigora para os direitos pessoais de gozo:

vale, não o artigo 824.º, n.º2 CC, mas o regime da impossibilidade de cumprimento

pelo devedor. O terceiro não está adstrito ao cumprimento, como escreve Remédio

Marques. Vendida a coisa, esses direitos caducam em qualquer circunstância,

independentemente de serem anteriores ou posteriores à garantia prioritária. Mesmo

a locação que seja posterior à garantia prioritária e anterior à penhora não caducará:

a emptio non tollit locatio, mas é limitada pelo artigo 824.º, n.º2 CC, como se viu. No

plano da economia contratual, ressalvada a eventualidade de o facto ou o risco da

penhora ter sido, em cumprimentos dos deveres de boa fé, dado a conhecer à

contraparte, deve aplicar-se o regime da impossibilidade culposa do artigo 801.º CC.

Isto é, deve considerar-se que, com a transmissão do direito a terceiro, a prestação se

tornou impossível por causa imputável ao devedor e que este é responsável como se

faltasse culposamente ao cumprimento da obrigação. Por isso, em contrato bilateral,

o credor, independentemente do direito à indemnização, poderá resolver o contrato

e exigir a restituição da prestação por inteiro se a já tiver realizado.

2. Efeito subrogatório: os direitos de terceiro que caducaram nos termos do n.º2 do

artigo 824.º CC transferem-se para o produto da venda dos respetivos bens, por força

do n.º3 do mesmo artigo. Teixeira de Sousa e Lebre de Freitas qualificam este efeito

como uma sub-rogação objetiva em que os direitos que desoneram, por efeito da

venda executiva, o direito transmitido, passam a um património autónomo: o

produto da venda. Por conseguinte, eles não caducam, como, aliás, já tínhamos

antecipado relativamente às garantias reais. Quais direitos? Em nosso entendimento

serão os:

a. Direitos reais de garantia (artigo 824.º, n.º2, 1.ª parte CC): cumpre-se

uma função solutória de dívidas;

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b. Direitos reais de gozo menor (artigo 824.º, n.º2, 2.ª parte CC), ónus

reais e a locação por equiparação: os que caducam por serem posteriores

à garantia mais antiga, embora anteriores à penhora. Cumpre-se uma função

indemnizatória, como bem nota Teixeira de Sousa.

Excluídos estão os direitos pessoais de gozo: o artigo 824.º, n.º3 CC é ainda uma

consequência da natureza real dos direitos a que se refere o n.º2. Algum eventual

ressarcimento terá de ser pretendido em sede meramente obrigacional, nos termos

gerais da responsabilidade do devedor pela impossibilidade culposa. E excluídas

estão ainda as garantias não reclamadas. Elas caducaram no momento da sua não

invocação processual. Por que ordem?

a. Há um ponto prévio: os direitos reais que caducando beneficiam do efeito

subrogatório não concorrem entre si em igualdade. A transferência para o

produto da venda deve considerar a sua qualidade substantiva – de garantia

ou de gozo – e as regras de preclusão processual: só depois de cumprida a

respetiva sentença de graduação é que se deve apurar se ainda há produto da

venda para os demais direitos.

b. Por outro lado, a graduação deve ser feita levando em linha de conta os

âmbitos específicos dos objetos de cada direito e as respetivas datas de

constituição ou registo.

c. Finalmente, sobrando, ainda assim, um valor da venda, o executado terá

direito ao remanescente, enquanto produto da venda de um bem que era da

sua titularidade.

Em concreto, partindo das boas lições de Lebre de Freitas e de Anselmo de Castro,

pode propor-se a seguinte ordem de concurso entre os direitos caducados nos termos

do n.º2 do artigo 824.º CC sobre cada um dos bens vendidos:

a. Direitos reais de garantia reclamados, ordenados entre si pela sentença

de graduação de créditos, cobrindo-se, por conseguinte, o arresto, penhora

do exequente ou de terceiro ou hipoteca judicial posteriores à penhora;

b. Direitos reais menores de gozo e locação pela ordem decorrente das datas

de constituição (ou registo) – Lebre de Freitas;

c. O eventual remanescente sobrante – remanescente do remanescente –

deve ser entregue ao executado.

O direito do executado ao remanescente do produto da venda de bens seus está,

ainda assim condicionado. Além das questões fiscais, alguma doutrina invoca ainda

direitos de terceiro sobre esse remanescente, configurando-se uma espécie de sub-

rogação residual. Assim,

a. Lebre de Freitas defende que os titulares de direitos reais posteriores à

penhora e, bem assim, credores com garantias não reclamadas poderiam

ainda invocar em especial esta sub-rogação sobre esse remanescente, visto os

seus direitos já poderem ser exercidos tendo sido satisfeitos os credores

exequente e reclamantes. Ou seja: como a indisponibilidade jurídica é relativa,

uma vez atingido o fim da execução, ressurgiria um princípio geral de sub-

rogação (artigos 692.º, 823.º, 1478.º, 1481.º e 1539.º, n.º2 CC);

b. Em sentido próximo, Teixeira de Sousa, tem, no seu pensamento, a

consideração do produto da venda como património autónomo permite aos

credores com garantias não reclamadas executarem o remanescente deste

como credores comuns. Esses direitos far-se-iam valer em ação autónoma e

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não na execução e apenas enquanto o remanescente não fosse entregue ao

executado, salvo se se provasse a origem do dinheiro. Esta solução é de

acolher, por ser consentânea com as limitações que o regime processual e

material específico da venda impõe aos direitos de terceiro. Todavia, os

credores não reclamantes não executam desse modo as suas garantias, pois

elas caducaram, mas uma sub-rogação objetiva.

3. Efeito repristinatório: o Professor Castro Mendes apontava, ainda, como efeito

da venda um fenómeno que Teixeira de Sousa veio denominar como efeito

repristinatório. Veja-se o artigo 724.º, n.º1 CC: se o adquirente, máxime, por cessão

da coisa hipotecada tinha, anteriormente à aquisição, algum direito real – seja de gozo,

de garantia ou de aquisição – sobre ela, esse direito renasce no caso de venda em

processo de execução ou de expurgação da hipoteca e é atendido em harmonia com

as regras legais relativas a essa venda. Mas, do n.º2 do mesmo artigo 724.º CC decorre

que se renascem direitos, do mesmo modo são incluídas na venda, as servidões que,

à data do registo da hipoteca, oneravam algum prédio do terceiro adquirente em

benefício do prédio hipotecado. Em qualquer caso, esta repristinação só é atendida

em harmonia com as regras legais relativas a essa venda. Teixeira de Sousa explica

que só renascem os direitos que não hajam de se extinguir por força do regime do

artigo 824.º, n.º2 CC.

Momento da eficácia: a venda executiva é uma sequência de atos processuais e não um

único evento gerador de eficácia: o depósito do preço, a adjudicação do bem, a emissão do

título de adjudicação, a entrega do bem. Cada ato de cadeia processual é pressuposto de

eficácia do ato seguinte. Ora, importa perceber qual é, nessa cadeia de atos, o ato gerador

dos efeitos materiais que estivemos a analisar, máxime, dos efeitos translativos e extintivos.

1. Lebre de Freitas: entende que a venda produz os seus efeitos com o depósito do

preço da venda, efetuado segundo os termos dispostos no artigo 824.º, n.º2 CPC.

Este depósito corresponderia àquilo que no artigo 827.º, n.º1 CPC se designa a data

em que os bens foram adjudicados e seria um elemento constitutivo da venda

executiva. Todavia, nota Lebre de Freitas, que o agente de execução poderá

determinar a ineficácia desta venda, por falta desse depósito (artigo 825.º, n.º1, alíneas

a) e b) CPC) o que, para a valia da posição em apreço, só levanta dúvidas. Na verdade,

o que a lei quer dizer é que a aceitação da proposta fica sem efeito.

2. Por seu turno, Remédio Marques: o legislador parece ter querido autonomizar dois

momentos:

a. O da conclusão do contrato; e

b. O da aquisição da propriedade.

Por isso, o contrato estaria concluído com a aceitação da melhor proposta, mas a

propriedade só se transmitia verificada a condição de depósito do preço e satisfação

do bem ao comprador (artigo 827.º, n.º1 CPC) e emitido o título de transmissão.

3. Já para Romano Martinez: esta ineficácia significaria que na veda executiva, a

propriedade não se transfere com a aceitação da proposta; se se tivesse transferido o

não pagamento do preço não poderia implicar uma falta de produção de efeitos. Na

verdade, pondo de lado que a transferência se faça com a entrega do bem (solução

contrária aos princípios do sistema civil; artigo 408.º, n.º1 CC), entende o autor que

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ela se dá na data do título de adjudicação e, na sua falta, na data do título ou

instrumento de venda.

4. Também Anselmo de Castro e alguma jurisprudência defenderam que é com o

despacho de adjudicação que a venda produz os seus efeitos reais. Por conseguinte,

este despacho seria uma coisa e o depósito do preço seria outra.

5. Já atrás tivemos ensejo de escrever, e decorre da leitura do artigo 827.º, n.º1 CPC,

que o depósito do preço é (a par da satisfação das obrigações fiscais) um pressuposto

da venda executiva, enquanto ato processual transmissivo do direito penhorado,

produtor de efeitos materiais: um dos vários atos sequenciais que concorre para que

se possa proceder à transmissão do direito. Mas o momento de conclusão da venda,

i.e., de produção dos efeitos materiais, também não pode ser a data da emissão do

título de adjudicação do direito, como é maioritariamente defendido. A ser assim,

não se entenderia como o direito de remição pode ser exercido na venda mediante

propostas em carta fechada, mesmo depois do despacho de adjudicação, até à

emissão do título da transmissão dos bens para o proponente (artigo 843.º, n.º1,

alínea a) CPC). Por isto, parece-nos que os efeitos da venda executiva se dão com a

passagem do título de transmissão e não com o despacho de adjudicação, anterior a

este, tratando-se de coisa vendida em proposta em carta fechada. Na verdade, este

opera para os bens imóveis como a escritura pública opera nas transmissões

imobiliárias (artigo 827.º. CPC). Já nas demais modalidades de venda executiva,

decorre do artigo 843.º, n.º1., alínea b) CPC que o momento translativo é o da entrega

dos bens ou da assinatura do título que a comprova. Por isso, a venda judicial não se

chega a consumar se depois da prolação de despacho de adjudicação, mas antes do

título de transmissão, se junta aos autos documento comprovativo de quitação da

dívida.

Vícios materiais:

1. Introdução. Invalidades absolutas: o ato de venda judicial pode ser impugnado

por:

a. Invalidade material;

b. Invalidade processual; e

c. Ineficácia superveniente,

Consoante tenha lugar um vício de violação de normas materiais ou processuais ou

tenha lugar uma ausência de efeitos sem violação normativa. Para tal, devem, prima

facie, ser chamados à colação os artigos 838.º a 841.º CPC. Mas deve ir-se a outros

lugares normativos para completar o quadro legal relevante? Efetivamente, na Teoria

Geral do Direito Civil, as invalidades substantivas respeitam, nomeadamente, a :

a. Falta de personalidade ou de capacidade, ainda que acidental;

b. Erro e vício na formação da vontade;

c. Divergência entre a vontade real e a vontade declarada;

d. Impossibilidade física ou legal;

e. Venda de coisa alheia;

f. Contrariedade ou inadmissibilidade legal (v.g., violação da proibição do

artigo 579.º CC – sanção de nulidade no artigo 580.º CC);

g. Contrariedade à ordem pública ou aos bons costumes.

Ora, o regime processual civil, trata de apenas parte daquelas invalidades, pelo que,

fora do âmbito respetivo dir-se-ia que valem os fundamentos e os regimes gerais do

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Código Civil, por o comprador executivo merecer tanta proteção como se fora

negocial. Todavia, importa considerar que o regime processual civil de invalidades

tem uma capacidade expansiva maior do que decorre do seu teor literal e que os

regimes gerais civis não podem ser aplicados, sem consideração dos princípios

públicos do processo civil e da venda executiva. É que se é certo que as normas de

Direito privado podem ser aplicadas seja atento o caráter subsidiário para os atos

jurídicos de que o processo é composto, seja os efeitos patrimoniais privados da

venda executiva, porém, não estamos perante um contrato mas perante uma

transmissão executiva. Esta não pode ser sujeita à instabilidade (limitada, é certo) que

o regime civil da declaração negocial acarreta. Na realidade, o regime civil comporta

aspetos que supõem uma igualdade entre os interesses das partes, que nos parece

algo postergada por um favor creditoris, compensado pelo baixo valor de aquisição

executiva dos bens. Em suma: quem compra executivamente, compra com risco.

Deste modo, diríamos que há invalidades materiais absolutas que na ausência de

normas processuais especiais não podem deixar regidas pelo Código Civil: a falta de

personalidade ou de capacidade jurídicas – do terceiro, não da parte, pois para esta

valem as regras processuais –, a venda de coisa alheia, a impossibilidade física ou legal,

a contrariedade ou inadmissibilidade legal e a contrariedade à ordem pública ou aos

bons costumes. Elas correspondem a valores que são condições de existência do

próprio tráfego jurídico privado e que, por isso, não podem ser postergados. Ao

contrário, o erro e o vício na formação da vontade e a divergência entre a vontade

real e a vontade declarada merecem uma cuidada ponderação de interesses entre a

execução e o terceiro.

2. Erro na formação da vontade: no plano abstrato, o erro na formação da vontade

do adquirente do bem na ação executiva pode decorrer de coação moral, conforme

o artigo 255.º CC, erro sobre os motivos, regulado pelo artigo 252.º CC, e erro sobre

o objeto, tratado nos artigos 247.º e 251.º CC. Ora, podem configurar-se atos de

venda praticados por coação moral sobre o terceiro, sujeitos às regras gerais. A

relevância da vontade concreta do adquirente no ato impõe a sua consideração. Mas

já é mais duvidoso que se possam relevar no processo os motivos – económicos,

pessoais – da aquisição por terceiro. Para uma e outros valem aqueles regimes civis

gerais, embora nos pareça que somente a coação moral tenha real relevância. Já

relativamente ao erro sobre o objeto, os artigos 838.º e 840.º CPC preveem normas

especiais em matéria de existência, titularidade, conteúdo e objeto do direito

transmitido. Costuma ser enunciado na jurisprudência que a compra que na execução

vier a ter lugar não assegura ao comprador direito mais extenso ou mais consistente

do que o que realmente existe, correndo por conta do comprador o risco da incerteza

que se verificar. Todavia, o artigo 838.º, n.º1 CPC determina que a venda executiva

pode ser anulada se se reconhecer a existência de:

a. Ónus oculto ou limitação que, sendo eficaz em face da penhora (artigo

819.º CC), não fosse tomado em consideração, i.e. de que não foi dado

conhecimento ao credor – ainda que estivesse registado –, e que exceda os

limites normais inerentes aos direitos da mesma categoria, não se exigindo

vício adicional na vontade; nesse caso, apesar da aproximação literal à 1.ª

parte do artigo 905.º CC, não se exige como na 2.ª parte deste preceito, o

elemento subjetivo psicológico do erro ou dolo; incluem-se os ónus ou

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limitações temporários, máxime, que caducam com a venda (artigo 824.º, n.º1

e 2 CC – locação ou usufruto), pois não só a lei não distingue, como ainda a

sua presença tem associados riscos normais (mas que não podem ser

ocultados) de gastos e prejuízos que o terceiro adquirente deverá ter em conta,

decorrentes seja da recusa de entregar do imóvel (artigo 828.º CPC), seja de

embargos de terceiro deduzidos entre o momento do edital e o momento da

efetiva aquisição (artigo 344.º, n.º2 CPC), seja da ineficácia superveniente da

venda (artigo 839.º, n.º1, alínea a), 1.ª parte CPC) por procedência de

oposição à execução deduzida pelo arrendatário citado, nos termos do artigo

54.º, n.º4 CPC.

b. Falta de conformidade com o que foi anunciado, tanto quanto à identidade

como quanto à qualidade da coisa, incluindo o defeito.

É somente naquele n.º1 do artigo 838.º CPC que se devem procurar os requisitos e

efeitos do erro sobre o objeto, não no Código Civil. Efetivamente, tanto no caso de

ónus oculto, como de desconformidade objetiva, o erro sobre o objeto vendido não

apresenta, nomeadamente, o requisito geral subjetivo (artigo 247.º CC e, ainda, o

artigo 252.º CC) da cognoscibilidade para o declarante – agente de execução – da

essencialidade para o declaratário – adquirente – do elemento que incidiu o erro em

questão por parte do declaratário. Isto porque o interesse do adquirente prevalece

sobre o interesse do exequente ou do credor reclamante. Mas já não é claro em que

medida o regime do ónus oculto e o regime da desconformidade do objeto, recebem

e esgotam os âmbitos dos regimes civis da venda de coisa onerada (artigos 905.º e

seguintes CC) e da venda de coisa defeituosa (artigos 913.º e seguintes CC):

a. No caso de ónus oculto: não se exige como na 2.ª parte do artigo 905.º CC,

o elemento subjetivo psicológico do erro ou dolo. No mais, os interesses em

presença tornam duvidosamente aplicáveis algumas regras substantivas sobre

a venda de bens onerados dos artigos 906.º e seguintes CC: a redução do

preço (artigo 911.º CC) ou a obrigação de convalescença (artigo 835.º CPC)

estarão fora da economia não privada da venda executiva. Pelo contrário, o

artigo 838.º, n.º1, in fine CPC apenas admite a aplicação do artigo 906.º CC e

das regras indemnizatórias, sediadas nos artigos 908.º e 909.º CC.

b. Já no caso da falta de conformidade: com o que foi anunciado consumirá

o respetivo regime processual aqueloutro da venda de coisas defeituosas, dos

artigos 913.º e seguintes CC? O ponto é duvidoso mas parece-nos que o

artigo 838.º, n.º1 CPC também abrange essa situação: vale o regime da

anulação por falta de conformidade com o que foi anunciado.

3. Vício na formação da vontade: por seu turno, o vício na formação da vontade do

adquirente, comoo dolo (artigo 253.º e 254.º CC), parece ter uma autonomia menor

do que pareceria à primeira vista. É que se o adquirente foi informado dolosamente,

máxime, pelo agente de execução com intenção de potenciar a venda do bem, de

duas uma:

a. Ou a atuação dolosa consubstancia um vício processual em si mesmo:

rege o artigo 839.º, n.º1, alínea a) CPC;

b. Ou uma omissão de informação da existência de ónus ou limitações

reais ou ainda um erro de conformidade com o que foi anunciado: rege

o artigo 838.º, n.º1 CPC.

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No entanto, se residualmente, a vontade do declarante tiver sido determinada por

dolo e não cai naquelas situações, não deixará a venda de ser anulável nos termos do

artigo 254.º, n.º1 CC. Mais: pode haver simulação entre as partes e os terceiros,

máxime entre executado e terceiro. Recorde-se que no Direito pretérito se previa

como causa de ineficácia da venda o conluio na hasta pública. Retirada essa causa,

porventura porque foi suprimida também a venda em hasta pública, o problema

mantém-se, em nossa opinião. Obviamente que o conluio não passou a ser admitido

na ação executiva. Pelo contrário, constitui simulação com desvalor patente no artigo

240.º CC que não pode deixar de vigorar, aqui.

4. Divergências na vontade: a doutrina é, ainda, relativamente significativa em aceitar

a relevância da divergência entre a vontade real e a vontade declarada no

procedimento executivo de venda. Antes de mais, valem na execução os termos

gerais do artigo 246.º CC: o erro advir de, ao praticar os atos processuais de aquisição

do bem, o adquirente apresentar falta de consciência da declaração ou estar sob

coação física. Mas pode, por outro lado, ainda o erro decorrer, ainda, de erro na

declaração, conforme o artigo 247.º CC.

5. Procedimento: no plano literal, dir-se-ia que somente os casos de ónus oculto e de

erro sobre a coisa estão procedimentalmente regulados, no artigo 838.º CPC. Porém,

tem sido defendido que esse regime procedimental vale para a invocação de qualquer

fundamento de anulação, salva a venda de coisa alheia, que se rege pelos artigos 840.º

e 841.º CPC. Portanto, as invalidades substantivas – absolutas e relativas – podem

ser invocadas na própria execução. O comprador no prazo-regra de um ano a contar

do conhecimento do vício (artigo 287.º, n.º1 CC) pode pedir, no próprio processo

de execução:

a. A anulação da venda; e

b. Indemnização a que tenha direito, conforme as regras gerais dos

artigos 908.º e 909.º CC.

Todavia, ressalva-se sempre a possibilidade de sanação da anulabilidade conforme o

disposto no artigo 906.º CC, por desaparecimento do ónus ou limitação, por qualquer

modo. São depois ouvidos o exequente, o executado e os credores interessados,

examinadas as provas que se produzirem e a questão decidida pelo juiz de execução.

Se o pedido de anulação do negócio e de indemnização do comprador foi feito antes

de ser levantado o produto da venda, este não será entregue sem a prestação de

caução. Se os elementos probatórios apresentados forem insuficientes, i.e., o juiz

permencer com dúvidas sobre os factos, ou se a questão for complexa, o juiz remete

o comprador para ação de anulação autónoma. Esta deve ser intentada contra o

credor ou credores a quem tenha sido ou deva ser atribuído o preço da venda. Ora,

como entretanto o prazo de caducidade do artigo 287.º, n.º1 CC já começara a correr,

e visto que, por despacho judicial, o comprador ainda não alcança uma decisão de

mérito sobre o seu pedido, o termo do prazo de um ano deve ser contado nos termos

dos regimes dos artigos 332.º, n.º1 e 327.º, n.º3 CC para onde aquele remete. Assim,

o despacho de juiz de execução deve equivaler à absolvição da instância de modo a

que se o prazo de caducidade tiver entretanto terminado ou terminar nos dois meses

imediatos ao trânsito em julgado da decisão ou da verificação do facto que torna

ineficaz o compromisso não se considerar completada a caducidade antes de

findarem estes dois meses. A caução entretanto prestada pela parte com direito ao

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produto da venda, será levantada, se a ação não for proposta dentro de 30 dias ou

estiver parada, por negligência do autor, durante três meses.

6. Venda de coisa alheia: especialidades: o Código de Processo Civil prevê nos

artigos 840.º e 841.º CPC um regime especial quando a coisa vendida não pertencia

ao executado e foi reivindicada, procedentemente, pelo dono, i.e., vendeu-se coisa

alheia à esfera jurídica do executado. Este regime deve ser articulado com o regime

dos efeitos da ação de reivindicação do artigo 1311.º e seguintes CC. Uns e outros

foram já objeto do novo estudo, importando, apenas, relembrar que o terceiro, além

da ação de reivindicação, pode muito bem ter lançado mão, antes de efetuada a venda

do meio avulso de protesto pela reivindicação da coisa previsto no artigo 840.º CPC

de qual tivemos já ensejo de abordar atrás. Transitada em julgado a sentença favorável

de reivindicação, o terceiro proprietário requererá a anulação da venda, nos termos

da alínea d) do n.º1 do artigo 839.º CPC. Os efeitos processuais e materiais desta

intervenção foram já expostos por nós, como dissemos:

a. O terceiro vitorioso da ação deverá intervir na execução pedindo a

restituição do seu bem junto do agente de execução ou junto do

adquirente, se o bem já foi transmitido;

b. Restituído o bem, o artigo 825.º, n.º1 CC, determina que o adquirente,

no caso de execução de coisa alheia, pode exigir que o preço lhe seja

restituído por aqueles a quem foi atribuído – i.e., os credores – e que os

danos sejam reparados pelos credores e pelo executado que hajam

procedido com culpa, nas condições do artigo 894.º CC; mas se o

adquirente conhecia do protesto, já não lhe é lícito pedir a reparação

dos danos, salvo se os credores ou o devedor se tiverem

responsabilizado pela indemnização (artigo 825.º, n.º2 CC).

c. No caso da reivindicação de bens móveis se o terceiro proprietário

havia já deduzido protesto pela reivindicação no ato da venda ou

anteriormente – ou se não houve protesto prévio, caso se haja verificado o

condicionalismo do artigo 841.º CPC –, o adquirente pode não restituir

de imediato o bem, pois fica com um direito de retenção da coisa

comprada, enquanto lhe não for restituído o preço e poderá, por isso,

o proprietário reavê-lo dos responsáveis, se houver de o satisfazer para

obter a entrega da coisa reivindicada.

Poderá o próprio adquirente, por equiparação ao fundamento típico da existência de

ónus oculto, do artigo 838.º, n.º1, 1.ª parte CPC, requerer a anulação da venda com

o fundamento de a coisa vendida não pertencer ao executado? A resposta é afirmativa:

sem dependência da diligência processual do dono em sede de ação de reivindicação,

o adquirente de modo autónomo vale-se, procedimentalmente, do regime dos n.º2 a

4 do artigo 838.º CPC.

Vícios processuais:

1. Nulidades processuais: o ato processual da venda pode ser anulado nos termos do

artigo 201.º CC, conforme a alínea c) do n.º1 do artigo 839.º CPC. Basta para tanto

que seja processualmente inválido algum do atos-sequência que compõem a fase da

venda. Vícios que podem ocorrer, determinando a anulação da venda do bem,

entretanto consumada, serão, entre outros:

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a. Falta ou irregularidade da notificação do despacho que ordenou a

venda em ação executiva, ex vi artigo 812.º, n.º6 CPC, máxime, por falta de

identificação dos bens e valor base (artigo 812.º, n.º3 CPC) ou falta de

notificação de reclamantes e exequentes (artigo 812.º, n.º6 CPC);

b. Nulidade da publicidade da venda, máxime, por:

i. Omissão de publicação de anúncios;

ii. Com antecedência legalmente exigida;

iii. Omissão de afixação nos locais devidos, ou

iv. O jornal não se publicar na localidade da situação dos bens a vender, já que a

omissão de publicidade é suscetível de influenciar o preço obtido em hasta pública

e, consequentemente, prejudica as partes e credores reclamantes;

c. Omissão de notificação na abertura das propostas (artigo 819.º, n.º1

CPC);

d. Ausência do juiz na abertura das propostas (artigo 820.º, n.º1 CPC).

O regime procedimental será o dos artigos 196.º e seguintes CPC. Assim, estas

nulidades não são de conhecimento oficioso, apenas podendo ser pelo interessado

na observância da formalidade ou na repetição ou eliminação do ato (artigos 196.º,

2.ª parte e 197.º, n.º1 CPC). Mas não pode arguir a nulidade processual a parte que

lhe deu causa ou que, expressa ou tacitamente, renunciou à arguição, conforme

determina o n.º2 do artigo 197.º CPC. Por outro lado, o prazo de arguição e o

momento do conhecimento da reclamação pelo juiz, regem-se pelos artigos 199.º e

200.º, n.º3 CPC, respetivamente. Impõe-se, ainda, a audiência da parte contrária, em

regra, i.e.., dos sujeitos diretamente afetados pelo ato processual. Decretada a

nulidade pelo juiz, a venda anulada não pode ser renovada se já expirou o prazo

dentro do qual devia ser praticado, salvo o caso de a renovação aproveitar a quem

não tenha responsabilidade na nulidade cometida. A restituição dos bens terá de ser

pedida no prazo de 30 dias, a contar da decisão definitiva, devendo o comprador ser

embolsado previamente do preço e das despesas de compra: se a restituição não for

pedida no prazo indicado, o vencedor só tem direito a receber o preço (artigo 839.º,

n.º2 CPC). Anselmo de Castro defende, e cm razão, que além da restituição dos bens

ou do seu preço, há que reconhecer ao executado direito aos rendimentos da coisa

posteriores à entrega ou à venda. Parece-nos que será sempre quem teve título para

a sua perceção que os deverá devolver, máxime, o adquirente ou credor exequente

adjudicatório.

2. Ineficácia superveniente: ainda que o ato processual seja em si mesmo

intrinsecamente válido, a venda executiva pode ficar sem efeito supervenientemente,

em consequência da anulação de ato processual de outras fases da execução que lhe

sejam procedimental e logicamente anteriores (artigo 195.º, n.º2, 1.ª parte CPC). Isso

sucederá segundo o n.º1 do artigo 839.º CPC, se:

a. For anulada ou revogada, incluindo em recurso extraordinário, a

sentença que se executou, ou for procedente a oposição à execução ou

for procedente a oposição à penhora, salvo quando, sendo parcial a

revogação ou a procedência, a subsistência da venda for compatível

com a decisão tomada;

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b. Toda a execução for anulada por falta ou nulidade da citação do

executado, que tenha sido revel, conforme o regime do artigo 851.º

CPC, salvo o disposto no n.º4 do mesmo artigo.

Mas deve ser dito que a venda fica ainda sem efeito, apesar de válida em si mesma,

se

a. Toda a penhora de bens respetivos for anulada;

b. Perder o seu objeto;

c. Nos casos avulsamente tipificados (artigo 786.º, n.º6 CPC).

Decretada a ineficácia pelo juiz, a restituição dos bens tem de ser pedida no prazo de

30 dias, a contar da decisão definitiva. O comprador deve ser reembolsado

previamente do preço e das despesas de compra. Se a restituição não for pedida no

prazo indicado, o vencedor só tem direito a receber o preço (artigo 839.º, n.º2 CPC).

Em qualquer caso, terá ainda direito aos rendimentos da coisa posteriores à entrega

ou à venda, nos termos já referidos.

3. Substituição do comprador por terceiro preferente ou remidor: quando,

posteriormente à venda, for julgada procedente qualquer ação de preferência ou for

deferida a remição de bens, o preferente ou o remidor substituir-se-ão ao comprador,

pagando o preço e as despesas da compra. É esse o estabelecido no n.º2 do artigo

839.º CPC. Não há aqui, portanto, ineficácia da venda, mas alteração superveniente

do adquirente.

Natureza jurídica: não é pacífica a natureza jurídica da venda executiva.

1. No passado, Anselmo de Castro considerava que a regulamentação e regime da

venda executiva nada apresentam de substancialmente diverso em relação à venda

privada, quer quanto á forma de negociação, quer quanto á própria estrutura.

Também haveria identidade com a venda privada, quanto aos efeitos de aquisição

derivada: aquisição translativa do lado do adquirente, ato translativo direto e imediato

do lado do executado. As diferenças relativamente ao regime do contrato típico de

compra e venda do artigo 874.º CC seriam a não simultaneadade da vinculação entre

vendedor e adquirente e a rescindibilidade por falta de pagamento de preço. Todavia,

mesmo estas especialidades, podem ser também estipuladas numa venda privada.

Mas concluía qualificando a venda executiva como um contrato misto, público em

relação ao vendedor (o qual seria o Estado, por meio do tribunal, e não, nem o

executado, nem o exequente), privado em relação ao adquirente.

2. Por seu turno, Lebre de Freitas veio defender que há um contrato preliminar

constituído por proposta e por aceitação, só depois tendo lugar a própria venda. E

quanto a esta, Lebre de Freitas encontra significativas especificidades quando

contraposta com o regime do contrato de compra e venda – nomeadamente, a quase

irrelevância da vontade do executado, o peso da vontade do Estado e a aquisição

pelo comprador de mais do que o executado lhe poderia transmitir, ex vi artigo 824.º,

n.º2 CC e os regimes de anulação e pagamento do preço. Mas apesar disso, conclui

que a sujeição da venda executiva ao regime geral da compra e venda leva a

caracterizá-la como um contrato especial de compra e venda com características de

Direito Público.

3. Mais recentemente, Romano Martinez é de opinião de que se está perante uma

verdadeira compra e venda, na qual o vendedor material não é, nem o tribunal, nem

o exequente, mas sim o executado, apesar da venda poder ser realizada contra a sua

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vontade. O tribunal é apenas o vendedor formal, pois atua não como representante

do executado ou do exequente, mas no uso do seu poder de jurisdição executiva.

4. Também para Remédio Marques a venda executiva importa a transmissão da

propriedade, por isso se trata de um contrato que reveste natureza real.

5. O que pensar? Há que retornar aos conceitos estruturantes de Teoria Geral do

Direito Civil. Um contrato supõe um acordo de vontades entre vendedor e

comprador, o qual está, manifestamente, ausente da venda executiva.

Cumulativamente, um contrato supõe uma vontade de venda juridicamente

imputável ao transmitente e ao transmissário. Ora, é certo que do lado transmissário,

há uma vontade de adquirir, própria do princípio geral do Direito patrimonial privado

de que ninguém pode adquirir contra sua vontade. Todavia, do lado transmitente,

nenhuma vontade pode ser imputada ao executado, ainda que em substituição: é um

ato forçado, não sendo o tribunal representante do executado. Por conseguinte, a

autoria do ato processual da venda não é do executado e os eventuais vícios sobre a

coisa ou quanto a ónus também apenas podem ser assacados ao autor do ato

processual – o Estado e o agente de execução. Se alguma vontade do executado

pudéssemos ver como estando a ser suprida na execução seria a de cumprimento da

prestação exequenda, e não a de venda de património. Isto explica porque não se

acham questões de vícios de vontade do executado em sede de venda: estes não

existem porque não existe vontade daquele. Nisso há uma profunda diferença do que,

ao invés, sucede na execução específica do artigo 830.º, n.º1 CC. Nesta ação há um

ato processual – a sentença – que vem substituir (forçadamente) uma declaração

negocial em falta. O objeto da prestação em more e, por aí, da ação de execução

específica é, precisamente, um exercício de uma vontade de contratar, negociada. Já

na venda executiva, em geral, nenhuma declaração negocial falta, pois que dela se

dispensa. Não é a conclusão da venda o objeto da prestação exequenda. A única

exceção será a venda (executiva) direta prevista no artigo 831.º CPC. Esta é um

momento de natureza contratual quanto às vontades envolvidas, de vendedor e

comprador: aí trata-se, como se disse, de simular judicialmente uma vontade negocial

em falta, ainda assim, uma vontade. No fundo, está-se, embora a título incidental,

perante uma execução específica, concluída a favor de terceiro – o exequente. Por

seu turno, no plano dos efeitos da venda executiva, já vimos que os seus alegados

efeitos obrigacionais da venda apresentam, afinal, natureza processual. Quanto ao

efeito translativo do direito que é objeto da venda executiva – o titular perde o direito

e um sujeito adquire-o na sua esfera – não é indicador da natureza contratual do ato

em presença: também os atos de expropriação podem produzir idêntico resultado.

Muito pelo contrário dão-se outros efeitos que são absolutamente alheios a um

estrito negócio de transmissão onerosa de um direito patrimonial privado. Daqui

resulta que a venda executiva não é um contrato. É aquilo que Alberto dos Reis

designava por providência de expropriação enquanto priva o executado, contra a

sua vontade, do direito de propriedade sobre os bens, transmitindo-os ao adquirente.

Por outras palavras, a venda executiva é um ato de Direito Público de

transmissão onerosa de direitos privados penhorados em ordem ao

pagamento da obrigação exequenda. Ato, afinal, de exercício do direito à garantia

patrimonial, ao abrigo do artigo 817.º CC, o qual não se pode exercer privadamente.

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B – Pagamento executivo e voluntário; outros modos de

pagamento

§69.º - Pagamento forçado e voluntário

Pagamento voluntário (remição da execução):

1. Pagamento preliminar:

a. Legitimidade: o pagamento voluntário da obrigação exequenda pode ser

feito pelo executado ou qualquer outra pessoa. A doutrina designa-o por

remição da execução. O terceiro pode ser ou não interessado no

cumprimento da obrigação, conforme o n.º1 do artigo 767.º CC.

Aparentemente, nem o executado, nem os credores se podem opor a este

pagamento, como decorreria do n.º2 do mesmo artigo e do artigo 768.º CC.

Neste caso, o n.º6 do artigo 847.º CPC determina que o terceiro ficará sub-

rogado nos direitos do exequente apenas e só se mostrar que os adquiriu nos

termos da lei substantiva, máxime, nos termos dos artigos 589.º, 590.º e

seguintes e 592.º CC. Por maioria de razão, se o terceiro for mesmo um dos

executados e que seja devedor solidário, parece que pode ao abrigo deste

meio executar em direito de regresso contra cada um dos condevedores, na

parte que a estes compete, nos termos do artigo 524.º CC. Este é, no plano

económico, ainda uma forma de sub-rogação legal do artigo 592.º CC. No

passado era essa a boa doutrina de Lopes Cardoso. A lei não é clara quanto

à via processual pela qual o terceiro poderá executar os direitos do credor,

nos quais se faz subrogar. Mas não pode deixar de se entender que poderá

ser ainda a mesma e própria execução pendente, agora como credor

exequente, com direito à tutela executiva até extinção da obrigação. Condição

é que no momento do pagamento, requeira logo a abertura de incidente de

habilitação nos termos do artigo 356.º CPC; a instância suspender-se-á, então,

aguardando uma alteração subjetiva da lide após a qual prosseguirá

obrigatoriamente. Se o não fizer, a execução será declarada extinta pelo

agente de execução, tendo o terceiro que abrir a sua própria execução dos

direitos que antes cabiam ao exequente. Não ficando sub-rogado, o terceiro

não pode na causa pendente executar algum direito contra o executado que

o legitime. Pelo contrário, terá de intentar, se for o caso, a sua execução ou

mesmo uma ação de condenação prévia para justificar a sua pretensão.

b. Procedimento: o pagamento voluntário das dívidas do executado é feito nos

termos e com os efeitos dos artigos 846.º e seguintes CPC, podendo ter lugar

em qualquer estado do processo. O pagamento pode ser feito processual ou

extraprocessualmente, consoante integre o procedimento executivo ou seja

exterior ao mesmo. Formalmente, deve ser deduzido requerimento de

pagamento e liquidação da responsabilidade do executado. Por regra, o

pagamento será feito mediante entrega direta ao agente de execução ou

depósito preliminar em instituição de crédito à ordem daquele (artigo 846.º,

n.º2 CPC). Esta possibilidade, como notam Lebre de Fretas e Ribeiro Mendes,

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pressupõe que ao agente de execução caiba liquidar logo, ainda que

provisoriamente, os juros e a sanção pecuniária compulsória. É, então,

sustada a execução. Já se as diligências de execução forem realizadas por

oficial de justiça, deverão ser primeiramente pedidas na secretaria, ainda que

verbalmente, guias para depósito da parte líquida ou já liquidada do crédito

do exequente que não esteja solvida pelo produto da venda ou adjudicação

de bens. Neste caso, o pagamento preliminar será, pois, efetuado por

depósito, e sustada a execução, a menos que o pagamento seja

manifestamente insuficiente. Neste caso, o pagamento preliminar será, pois,

efetuado por depósito, e sustada a execução, a menos que o pagamento seja

manifestamente insuficiente. Mas o pagamento ou outro facto extintivo da

dívida, como perdão ou renúncia pelo exequente ou outro (artigos 837.º,

n.º841.º, 847.º, 857.º, 863.º e 868.º CC), podem ter ocorrido fora do processo.

Nessa eventualidade, determina o n.º5 do artigo 846.º CPC que o requerente

– executado ou terceiro – deve documentalmente comprová-lo nos autos

mediante requerimento à secretaria, acompanhado de documento

comprovativo da quitação (artigo 787.º CC) ou de qualquer outro título

extintivo. Esta prova não pode ser substituída pelo silêncio do exequente,

visto a lei não atribuir a este o valor de confissão. Também nesta

eventualidade se suspende a execução e se liquidará a responsabilidade do

executado. Suspensa a execução, está o exequente impedido de praticar na

mesma quaisquer atos que não tenham a ver senão a questão da própria razão

de ser da liquidação. Assim, deverá ser sustado o apenso de reclamação e

graduação de créditos. Eventuais atos serão, por isso, nulos. Excetua-se o

disposto no artigo 847.º, n.º2, 2.ª parte CPC: se houverem de ser pagos

créditos reclamados para pagamento pelo produto de bens, entretanto já

vendidos ou adjudicado, mas ainda não estiverem graduados, a execução

prossegue então apenas para concluir o apenso de verificação de graduação.

Só depois se poderá pagar a esses credores.

2. Liquidação final da responsabilidade do exequente e extinção da execução:

viu-se que em qualquer destas hipóteses de pagamento preliminar, suspende-se mas

não se extingue, a execução. É que se tratou de uma mera operação material, para

que ainda tenha sido declarado oficialmente se a mesma foi suficiente ou não para

cobrir as dívidas, principal e acessórias. Por isso, passa-se de seguida à liquidação de

toda a responsabilidade do executado já não pelo juiz, como antes se dispunha antes

da reforma de 2013 mas perante o agente de execução ou perante a secretaria de

execução, consoante a entidade que recebeu o pagamento preliminar. Se o

requerimento for feito antes da venda ou adjudicação de bens a liquidação da

responsabilidade do executado, inclui:

a. Créditos exequendos (artigos 846.º, n.º1 e 847.º, n.º1 CPC):

i. Obrigação principal;

ii. Obrigação de juros vencidos à data da liquidação;

iii. Sanções pecuniárias compulsórias.

b. Custas (artigos 846.º, n.º1 e 847.º CPC), saber:

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i. Principais: taxa de justiça, encargos do processo (artigo 16.º RCP),

honorários e despesas com o agente de execução, honorários do

mandatário;

ii. Acessórias: custas do levantamento a fazer pelo exequente (artigo 847.º,

n.º3 CPC), custas dos apensos pendentes e cuja inutilidade

superveniente advenha da extinção da execução e multas.

Se o requerimento for feito depois da venda ou adjudicação de bens a liquidação da

responsabilidade do executado, inclui adicionalmente:

a. Créditos reclamados para pagamento pelo produto dos bens; conforme

graduação e até onde o produto obtido, salvo se o requerente apresentar

título extintivo de algum deles (artigo 847.º, n.º2 CPC);

b. Custas:

iii. Principais, pela reclamação de créditos;

iv. Acessórias pelos levantamentos a fazer pelos titulares dos créditos reclamados

(artigo 847.º, n.º3 CPC).

Dita o n.º2 do artigo 847.º CPC que se ainda não estiver feita a graduação dos créditos

reclamados que tenham de ser liquidados, a execução prossegue somente para

verificação e graduação desses créditos e só depois se faz a liquidação. Do valor da

liquidação serão notificados o exequente, credores interessados, executado e

requerente se for pessoa diversa deste (artigo 847.º, n.º3 CPC). A liquidação poderá,

então, ser impugnada pelos notificados por meio de reclamação sujeita, por analogia,

segundo Teixeira de Sousa, ao regime do artigo 789.º, n.º2 a 5 CPC. Liquidadas a

responsabilidade por custas e honorários, incluindo a decisão de eventuais

reclamações, é o requerente notificado para proceder ao depósito final do saldo a

liquidar. Portanto, só então é que o exequente poderá receber a quantia exequenda e

os respetivos juros, sendo o caso, salvo se houve pagamento extraprocessual. O

mesmo se diga quanto aos reclamantes: somente depois de liquidada a

responsabilidade do executado em face deles nos termos do n.º2 e 4 do mesmo artigo

847.º CPC é que serão pagos. Se o requerente não depositar o saldo que for liquidado,

será condenado nas custas a que deu causa e a execução prosseguirá, não podendo

tornar a suspender-se sem prévio depósito da quantia já liquidada, depois de

deduzido o produto das vendas ou adjudicações feitas posteriormente e depois de

deduzidos os créditos cuja extinção se prove por documento. Somente depois de

feito esse depósito é que será ordenada nova liquidação do acrescido, nos termos já

expostos.

3. Pagamento a prestações; as mudanças de 2013: no atual Código, a matéria passou

a ser regulada nos artigos 806.º a 810.º CPC, com algumas alterações. Na base do

regime previsto está um acordo entre exequente e executado para este pagar a dívida

parcelarmente segundo um plano de pagamentos. Não se exclui que ambas as partes

envolvam um terceiro nesse plano de pagamentos que fique como responsável pelo

pagamento da dívida, nos termos do artigo 846.º, n.º1, 2.ª parte CPC. O que não

pode suceder é o acordo ser apenas efeito entre o terceiro e exequente ou executado,

já que apenas ambas podem suspender/determinar a extinção da instância. No

Código velho, exequente e executado, de comum acordo, requereriam ao agente de

execução a suspensão da instância executiva, devendo conter-se o plano de

pagamento acordado. Com a reforma de 2013 dá-se maior autonomia às partes: basta

comunicarem o acordo ao agente de execução (artigo 808.º, n.º1 CPC), também até

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à transmissão do bem penhorado ou a aceitação da proposta em carta fechada, sendo

o caso. Mas maior novidade é a de que essa comunicação determina a extinção da

instância (n.º2, in fine). Tal liberta de qualquer espartilho processual o prazo que possa

ser acordado para pagamento da dívida: as partes podem acordar o que melhor

entenderem. Por outro lado, em consequência deste efeito, foi alterado o regime das

garantias. Na falta de convenção em contrário, e sem prejuízo da faculdade de reforço

ou substituição de garantias, a penhora já feita na execução converte-se

automaticamente em hipoteca ou penhor, que se mantêm até integral pagamento.

Será o agente de execução quem comunicará à conservatória competente a conversão

da penhora em hipoteca, bem como a extinção desta após o cumprimento do acordo.

As partes podem convencionar que a coisa objeto de penhor fique na disponibilidade

material do executado. Se o bem sobre o qual se constitui a garantia vier a ser vendido

ou adjudicado, livre do ónus da hipoteca ou do penhor (artigo 824.º, n.º2 CC), o

exequente será pago do saldo do seu crédito pelo produto da venda ou adjudicação,

com a prioridade da penhora por cuja conversão se constituíram ou, se for o caso,

com a prioridade de garantia anterior à penhora de que o exequente fosse titular (n.º2

do artigo 807.º CPC). Em suma: o exequente poderá reclamar o seu crédito.

Claramente este regime implica que em caso de insolvência do executado, o

exequente seja classificado como beneficiando de um crédito garantido nos termos

do artigo 47.º, n.º4, alínea a) CIRE, com prioridade no pagamento o artigo 174.º

CIRE. Para serem levantada as garantias há que proceder ao cancelamento das

respetivas inscrições, mediante documento comprovativo do integral cumprimento

do plano de pagamento. Fica sem efeito a sustação da execução – ou renova-se a

instância em sede de artigo 809.º, n1.º CPC – se algum credor reclamante, cujo

crédito esteja vencido, a todo o tempo em que durar o plano de pagamento das

prestações da dívida exequenda requerer o prosseguimento da execução para

satisfação do seu crédito. Será, então, notificado o exequente para, no prazo de 10

dias, declarar se:

a. Desiste da garantia, máxime, da penhora, embora mantendo o plano

de pagamento; ou

b. Requerer o prosseguimento da execução para pagamento do

remanescente do seu crédito, ficando sem efeito o plano acordado,

mas mantendo-se a penhora.

No silêncio, entende-se que fictamente desiste da penhora (Código velho) ou da

garantia. Sempre que desista, expressa ou fictamente da penhora, o credor reclamante

assume a posição de credor exequente, valendo as normas dos n.º2 a 4 do artigo 850.º

CPC. Cumprido o plano de pagamento, extingue-se a dívida, podendo o executado

pedir quitação ao exequente. No Código em vigor até 2013 deveria ser requerida a

liquidação das responsabilidades finais, seja ao agente de execução, seja junto da

secretaria no caso de execução por oficial de justiça, nos termos dos artigos 846.º e

847.º CPC (no atual e correspondente articulado). Só depois poderia ser julgada

extinta a instância por pagamento voluntário. No Código reformado, visto que a

execução já estaria extinta, convirá ao anterior devedor requerer o cancelamento da

hipoteca ou a entrega da coisa empenhada. Ao contrário, se for incumprido o plano

de pagamentos, nos termos acordados, ainda que seja por uma prestação, vencem-se

de imediato as demais. Nesse caso, pode o exequente requerer a prossecução da

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marcha (artigo 884.º CPC) ou renovação da instância no artigo 808.º, n.º1 CPC do

procedimento executivo para satisfação do crédito remanescente. Na reabertura da

instância, dita o artigo 50.º, n.º8 Portaria n.º282/2013, 29 agosto, que o agente de

execução elaborará a nota discrimativa de honorários e despesas atualizada tendo em

consideração o valor efetivamente recuperado, afetando o excesso recebido a título

de pagamento de honorários e despesas ao pagamento das quantias que venham a

ser devidas, sem prejuízo de, no termo do processo, restituir ao exequente o saldo a

que este tenha direito. Na instância renovada não se repetem as citações e aproveita-

se tudo o que tiver sido processado relativamente aos bens em que prossegue a

execução, e os outros credores e o executado são notificados do requerimento (artigo

850.º, n.º4 CPC). No entanto, visto a hipoteca ou penhor manterem-se pelo menos

até integral pagamento da dívida (artigo 807.º, n.º1 CPC onde não se delimita

temporalmente a garantia), o credor exequente chega à instância renovada já com

uma garantia real. Na execução renovada a penhora inicia-se pelos bens sobre os

quais tenha sido constituída hipoteca ou penhor, nos termos já explicados,

reportando-se aquela à data da primitiva penhora, e só pode recair noutros quando

se reconheça a insuficiência deles para conseguir o fim da execução. Se os bens

tiverem sido entretanto transmitidos, a execução renovada seguirá diretamente

contra o terceiro adquirente (nos termos do artigo 54.º, n.º2 CPC), se o exequente

pretender fazer valer a garantia, em termos semelhantes.

4. O acordo global: a reforma de 2013 trouxe consigo a novidade do acordo global,

no artigo 810.º CPC. Trata-se de uma modalidade de contrato de transação (artigo

1248.º CC) entre executado, o exequente e os credores reclamantes contendo

concessões recíprocas, constituição, modificação ou extinção de direitos diversos do

crédito exequendo e, até mesmo, de direitos de terceiros. A lei prevê várias

modalidades, a título exemplificativo:

a. A simples moratória de pagamento, i.e., fixação de novo prazo de

vencimento e/ou de execução da dívida;

b. Perdão, total ou parcial, i.e., remissão da dívida;

c. Alteração de garantias, por:

i. Substituição, total ou parcial, de garantias;

ii. Constituição de novas garantias.

Há aqui uma clara influência do plano de insolvência dos artigos 192.º e seguintes

CIRE, cujo conteúdo, constante do artigo 196.º CIRE é, aliás, em semelhante em

boa medida. Seguramente que alguma da respetiva doutrina e jurisprudência será

aplicável também ao acordo global, com as devidas adaptações. Tanto no artigo 810.º

CPC, como no artigo 196.º CIRE caso estamos perante enunciados exemplificativos:

aquelas são algumas das medidas nomeadamente possíveis. A celebração do acordo

global não restringe os direitos, nem alarga as vinculações de coobrigados e de

garantes do executado. De igual modo, o exequente e os credores reclamantes

conservam sempre todos os seus direitos contra estes. O procedimento constitutivo

é idêntico ao do plano de pagamentos, por força da remissão do artigo 810.º, n.º2

CPC para o artigo 806.º CPC. Assim, tal como o plano de pagamentos, também o

acordo global pode ser comunicado ao agente de execução até à transmissão do bem

penhorado ou à aceitação da proposta em carta fechada, sendo o caso. A

comunicação determina a extinção da causa executiva, nos termos do artigo 806.º,

n.º2, in fine CPC. Na falta de convenção em contrário, a penhora já feita na execução

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converte-se automaticamente em hipoteca ou penhora, que se mantém até integral

pagamento, sem prejuízo do disposto no artigo 809.º, n.º1 CPC, i.e., da possibilidade

de os reclamantes cujo crédito esteja vencido requererem a reabertura da instância.

Note-se que o acordo global pode não ser assinado por todos os credores. Os que o

fizeram não têm direito a requerer a reabertura da instância; os que ficaram de fora

podem sempre fazê-lo. A dívida pode ter-se extinto mesmo antes da conclusão da

execução do acordo global, em função do que o devedor e os credores contrataram.

De igual modo, embora a lei determine que a hipoteca ou penhor, se mantêm até

integral pagamento, pode sempre convencionar-se diversamente. O incumprimento

dos termos do acordo, no prazo de 10 dias após interpelação escrita do exequente

ou de credor reclamante, implica, na falta de convenção expressa em contrário, a sua

caducidade. Mas esta não prejudica os efeitos entretanto produzidos. Nessa

eventualidade, o exequente ou o credor reclamante podem requerer a renovação da

execução para pagamento do remanescente do crédito exequendo e dos créditos

reclamados. Manda, então, aplicar-se os n.º2 e 3 do artigo 808.º CPC, atrás referidos.

Portanto, na execução renovada a penhora inicia-se pelos bens sobre os quais tenha

sido constituída hipoteca ou penhor, nos termos já explicados, reportando-se aquela

à data da primitiva penhora, e só pode recair noutros quando se reconheça a

insuficiência deles para conseguir o fim da execução. Se os bens tiverem sido

entretanto transmitidos, a execução renovada seguirá diretamente contra o

adquirente, se o exequente pretender fazer valer a garantia, em termos semelhantes.

5. Levantamento do remanescente: paga a quantia exequenda e custas, o

remanescente dos bens penhorados pode ser levantado pelo executado. Mas importa

não esquecer que o artigo 81.º, n.º1 CPPT impõe que esse remanescente seja utilizado

no prazo de 30 dias após a conclusão do processo para o pagamento de quaisquer

dívidas tributárias de que o executado seja devedor à Fazenda Nacional e que não

tenham sido reclamadas nem impugnadas. Findo esse prazo é que o remanescente

será restituído ao executado. Claro que se o executado apresentar certidão de não

dívida ao Fisco obterá a restituição do remanescente de imediato. Por outro lado, o

remanescente pode, por sua vez, ser objeto de penhora em outras execuções por

parte de credores, nos termos gerais. Finalmente, tratando-se de uma pluralidade de

devedores não é no processo executivo que se pode tratar da legitimidade do seu

levantamento, do eventual direito de regresso e quantitativo que a cada um dos

devedores cabe. Terá de ser em ação autónoma.

Pagamento forçado: O regime do artigo 847.º CPC vale também para o pagamento

coercivo dos credores, na sequência da venda executiva. Ou seja: cada credor só pode ser

pago depois de liquidado aquilo a que tem direito, nos termos do artigo 847.º, n.º1 a 3 CPC.

É relevante ainda o artigo 25.º RCP: até cinco dias após a notificação de que foi obtida a

totalidade do pagamento ou do produto da penhora, consoante os casos, as partes que

tenham direito a custas de parte remetem para o tribunal, para a parte vencida e para o agente

de execução, quando aplicável, a respetiva nota discriminativa e justificativa. O seu conteúdo

e regime constam do artigo 25.º, n.º1 e 26.º RCP. Por outro lado, decorridos três meses sobre

o pagamento parcial sem que tenham sido identificados outro bens penhoráveis, aplica-se o

disposto no artigo 752.º, segundo o artigo 797.º CPC. Portanto, o agente de execução notifica

o exequente para especificar quais os bens que pretende ver penhorados e, simultaneamente,

o executado para indicar bens à penhora, com a cominação de que a omissão ou falsa

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declaração importa a sua sujeição a sanção pecuniária compulsória, no montante de 5% da

dívida ao mês, com o limite mínimo global de 100000€, se ocorrer ulterior renovação da

instância executiva e aí se apurar a existência de bens penhoráveis. Se nem o exequente nem

o executado indicarem bens penhoráveis no prazo de dez dias (10 dias), extingue-se sem mais

a execução.

§70.º - Outros métodos de pagamento

Entrega de dinheiro:

1. Objeto: estabelece o artigo 798.º CPC, ligeiramente melhorado na Reforma de 2003,

que quando a penhora recaia sobre moeda corrente, depósito bancário em dinheiro

ou outro direito de crédito pecuniário cuja importância tenha sido depositada o

exequente ou qualquer credor que deva preteri-lo é pago do seu crédito pelo dinheiro

existente. Determina-se ainda que essa entrega de dinheiro pode ser feita por meio

de cheque ou transferência bancária. Por conseguinte, trata-se de fazer a transmissão

direta – a execução direta, segundo Alberto dos Reis – ao credor da propriedade

sobre bens pecuniários seja inicial, no caso da penhora de dinheiro, seja

superveniente quando resultante do cumprimento consumado de direitos de crédito

penhorados (artigo 777.º, n.º1 e 779.º CPC).

2. Procedimento: o pagamento ao exequente, se obtido a partir da penhora de

rendimentos periódicos, segue o mecanismo do n.º3 do 861.º CPC, alterado nos n.º3

e 4 do artigo 779.º CPC. É uma solução repetida ipsis verbis – algo desnecessariamente

– no n.º13 do artigo 780.º CPC para o pagamento. Já sabemos que fundo o prazo

para a dedução de oposição à penhora ou esta julgada improcedente, o dinheiro fica

disponível para ser adjudicado ao exequente. Mas deve ser improcedente, o dinheiro

fica disponível para ser adjudicado ao exequente. Mas deve ser cumprido um

pressuposto negativo: o rendimento periódico não garantir crédito reclamado –

máxime, não estar consignado em rendimentos a terceiro, tratando-se de

rendimentos de bens imóveis ou móveis sujeitos a registo, ou não estar já penhorado,

tratando-se de qualquer rendimento periódico, em geral. Em suma: que não tenha de

estar à espera da graduação de créditos. Pois se assim for, a entrega apenas pode ter

lugar depois desta. Havendo, então, essa possibilidade, o pagamento imediato ao

exequente far-se-á até ao valor da obrigação exequenda, abatidas as despesas da

execução referidas no artigo 735.º, n.º3 CPC. Importa distinguir, porém: as quantias

vencidas já depositadas serão logo entregues; as quantias vincendas terão de ser

entregues ao exequente por depósitos regulares, razão pela qual o agente de execução

notificará a entidade pagadora para as entregar diretamente àquele conforme

determina agora expressamente os n.º3, alínea b) e 4 do artigo 779.º CPC. Se o

exequente não conseguir ser totalmente pago e houver outros bens penhoráveis,

manter-se-á a penhora dos rendimentos periódicos produzidos pelo crédito

(eventualmente a alienar na execução) ou, independentemente disso, podem ser

sujeitos a consignação de rendimentos a favor do exequente, quando aqueles

rendimentos sejam de causa real (rendas e semelhantes). Ao contrário, caso não sejam

identificados outros bens penhoráveis, enuncia expressamente o n.º4, alínea b) do

artigo 779.º CPC que será extinta a execução depois de assegurado o pagamento das

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quantias que sejam devidas a título de honorários e despesas ao agente de execução.

Todavia, ressalva-se no n.º5 a faculdade de o exequente requerer a renovação da

instância para satisfação do remanescente do seu crédito, aplicando-se o disposto no

n.º4 do artigo 850.º CPC.

Adjudicação:

1. Objeto e sujeitos: a adjudicação de bens foi favorecida, na expressão do preâmbulo

do Decreto-Lei n.º38/2003, 8 março, pois, em certos casos, passou a ter uma

tramitação mais leve do que aquela que tinha antes da Reforma. Por ela o direito ao

pagamento forçado é realizado, na totalidade ou em parte, mediante a transferência

da titularidade de bens penhorados, sem entrega de um preço. No plano subjetivo,

ela pode ser requerida ao agente de execução (artigo 799.º, n.º4 CPC) tanto pelo

exequente, como pelo credor reclamante, mas com limites objetivos. Assim, o

exequente pode requerê-la para bens não compreendidos nos artigos 830.º e 831.º

CPC, ou seja, que careçam de venda em bolsa ou de venda direta. Por seu turno, o

credor reclamante pode adjudicar os bens sobre os quais tenha invocado garantia.

Todavia, se já houver sido proferida sentença de graduação de créditos, a pretensão

do reclamante requerente só é atendida quando o seu crédito haja sido reconhecido

e graduado (n.º2 do artigo 799.º CPC).

2. Procedimento: no requerimento deverá ser indicado o preço que se oferece pelos

bens, sendo que, naturalmente, ele não pode ser inferior a 85% do seu valor base

(artigos 799.º, n.º3 e 816.º, n.º2 CPC). Da proposta de preço será feita publicidade

nos termos do artigo 817.º CPC, segundo o n.º1 do artigo 800.º CPC, com a menção

do preço oferecido. O dia, hora e local para a abertura das propostas são notificados

ao executado, àqueles que podiam requerer a adjudicação e bem assim aos titulares

de direito de preferência, legal ou convencional com eficácia real, na alienação dos

bens. Depois, nos termos do artigo 800.º, n.º3 CPC, as propostas serão abertas:

a. Perante o juiz de execução, se se tratar de bem imóvel ou de

estabelecimento comercial, quando o juiz determine, nos termos do

artigo 829.º CPC;

b. Perante o agente de execução, nos demais casos, aplicando-se, com as

necessárias adaptações, as normas da venda mediante propostas em

carta fechada.

Se não aparecer nenhuma proposta dos notificados ou ninguém a preferir, será aceite

o preço oferecido pelo requerente (artigo 801.º, n.º1 CPC). Se aparecer proposta de

maior preço seguem-se os termos dos artigos 820.º e 821.º CPC do procedimento

previsto para a venda em carta fechada, ex vi artigo 801.º, n.º2 CPC. No caso de o

requerimento de adjudicação tiver sido feito depois de anunciada a venda por

proposta em carta fechada o procedimento será dispensado se àquela não se

apresentar qualquer proponente. Nessa eventualidade, logo se adjudicarão os bens

ao requerente, evitando-se repetir o procedimento de abertura de propostas (artigo

801.º, n.º2 CPC). Mas se se apresentarem proponentes não se sustará a venda por

proposta em carta fechada e a pretensão de adjudicação só será considerada e o

respetivo procedimento aberto de não houver pretendentes naquela venda que

ofereçam preço superior (2.ª parte n.º4 do artigo 799.º CPC). A adjudicação é

efetuada pelo agente de execução (artigo 799.º, n.º4 CPC). A adjudicação de direito

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de crédito pecuniário não litigioso é feita pelo valor da prestação devida, efetuado o

desconto correspondente ao período a decorrer até ao vencimento, à taxa legal de

juros de mora, salvo se, não sendo próxima a data do vencimento, o requerente

pretender que se proceda nos termos do disposto no n.º3 do artigo 799.º CPC e nos

artigos 800.º e 801.º CPC. Sendo próxima a data do vencimento, podem os credores

acordar, ou o juiz determinar, a suspensão da execução sobre o crédito penhorado

até ao vencimento. No caso especial de rendas, abonos, vencimentos, salários ou

outros rendimentos periódicos podem ser diretamente entregues ao adjudicatário,

nos termos já vistos do n.º4, alínea b) do artigo 799.º CPC. É aplicável à adjudicação

de bens, com as necessárias adaptações, o disposto nos artigos 815.º, 816.º e 824.º,

n.º2 CPC. Assim, aceite alguma proposta, é o requerente, ou preferente, notificado

para, no prazo de 15 dias, depositar numa instituição de crédito, à ordem do agente

de execução ou, na sua falta, de secretaria, a totalidade ou a parte do preço em falta,

com a cominação prevista no artigo seguinte. Mas, note-se que tratando-se de

exequente ele está dispensado de depositar a parte do preço que não seja necessária

para pagar a credores graduados antes dele e não exceda a importância que tem

direito a receber; igual dispensa é concedida ao credor com garantia sobre os bens

que adquirir. Ou seja: apenas terá de pagar se houver credores graduados antes dele,

no mais compensando o valor do crédito exequendo pelo valor-base do bem. A falta

de depósito sujeita-se ao já conhecido regime dos n.º1 a 3 do artigo 825.º CPC. Após

o pagamento do preço e do imposto devido pela transmissão, o agente de execução

promove a adjudicação e entrega do bem e a atualização do registo, nos termos

também já estudados nos artigos 827.º, n.º2 e 828.º CPC.

3. Modalidades e natureza jurídica: seguindo a boa doutrina de Teixeira de Sousa, a

adjudicação pode ser, consoante a função que desempenhe no crédito exequendo:

a. Solutória: o adjudicatário, exequente ou reclamante, adquire os bens e

extingue a totalidade da dívida, sem pagar o seu valor, pois não tem credores

graduados antes de si. Trata-se, aliás, da solução admitida no n.º6 do artigo

875.º CPC, desde a reforma de 2003, tendo por condição o requerente o

pretender e os restantes credores não se opuserem. Em consequência,

suspende-se a instância quando a execução não deva prosseguir sobre outros

bens.

b. Aquisitiva: há credores graduados antes do adjudicatário. Este terá, por isso,

de pagar a estes o valor da coisa para poder ficar com ela e extinguir a dívida.

É o que admite no artigo 815.º, n.º2 CPC, aplicável por força do artigo 802.º

CPC.

Qual é a natureza jurídica do pagamento por adjudicação?

c. Para Alberto dos Reis, estamos perante uma dação em cumprimento ou

pagamento;

d. Sendo essa também a qualificação feita por Anselmo de Castro apenas no

resultado objetivo já que, em rigor, não depende da vontade do executado.

e. Também para Teixeira de Sousa a adjudicação solutória aproxima-se de

uma dação em cumprimento.

f. Diferentemente, para Castro Mendes tratava-se de uma modalidade de

venda executiva – no que é atualmente acompanhado por Lebre de Freitas

– em que a satisfação do crédito é feita mediante compensação com dívida

assumida. No mesmo sentido segue alguma jurisprudência.

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g. No pensamento de Lebre de Freitas as especialidades da figura – ser

modalidade de venda executiva, o preço desta ser apurado sem dependência

do valor do crédito e o regime de dispensa de depósito do preço – impedem

que se possa falar em dação em cumprimento, mas mais de um negócio

jurídico autónomo gerador de compensação.

h. Por fim, Remédio Marques entende que se trata de uma figura mista, de

dação em cumprimento, dação em função do cumprimento e compensação.

i. Para melhor compreendermos a natureza jurídica da adjudicação importa

chamar à colação e contrapor a aquisição por adjudicação da aquisição por

venda executiva. Dir-se-ia, justamente, que uma e outra seriam diferentes:

sempre que fosse o credor exequente a comprar o bem, esta seria diferente

procedimentalmente e a satisfação do interesse do credor far-se-ia pela

entrega do preço. Já na adjudicação o interesse do credor seria satisfeito pela

entrega do bem. Todavia, se formos a ver o procedimento é, essencialmente,

o mesmo pois também o credor que adquira bens na venda está dispensado

de entregar o preço no que for excedente do seu crédito ou do valor dos

créditos graduados à sua frente (artigo 815.º, n.º1 e 2 CPC). Há aqui uma

compensação entre a dívida do preço e o crédito exequendo ou verificado,

no dizer de Lebre de Freitas. Ou seja, objetiva e funcionalmente estamos

perante o mesmo fenómeno; tanto pode haver uma adjudicação com

pagamento adicional, como uma aquisição por venda executiva, sem

pagamento adicional. Tem razão, por isso, Anselmo de Castro quando

escreve que se em vez da adjudicação, se trata de venda, sob qualquer das

suas formas em relação ao credor adquirente, há objetivamente sempre o

caráter de uma adjudicação. Por isto, no essencial, concordamos com

Anselmo de Castro e Teixeira de Sousa. A adjudicação solutória é

funcionalmente uma dação em cumprimento: o devedor fica exonerado da

dívida pela prestação de coisa diversa da devida (artigo 837.º CC). Por seu

lado, a venda do bem ao exequente sem pagamento excedente é também uma

adjudicação solutória. Todavia, como os demais executivos de translação dos

direitos penhorados, esta dação em cumprimento é processual e de natureza

pública. Não apresenta a natureza privada, sendo um ato processual de

vontade do credor. Por seu lado, a adjudicação aquisitiva é um ato misto de

dação em cumprimento, em face do devedor, e dação pro solvendo em face dos

credores anteriormente graduados. Estes não recebem a prestação devida

mas um valor dela. Mas ela não é exclusiva da adjudicação, pois também se

impõe quando o exequente adquire o bem por venda executiva (artigo 815.º,

n.º1 CPC): aqui também há adjudicação aquisitiva. Em suma: a satisfação do

direito do credor faz-se por execução específica quando recebe o produto da

venda – o que sucede na venda executiva a terceiro – mas faz-se por dação

em cumprimento na adjudicação solutória. Quando tenha de pagar a

diferença parece ser dação em cumprimento e dação pro solvendo, como se

referiu.

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Consignação de rendimentos:

1. Objeto: a consignação judicial de rendimentos de imóveis ou de móveis sujeitos a

registo visa colocar o exequente na posição de beneficiário das rendas provenientes

da locação daqueles bens, como decorre dos n.º1 e 2 do artigo 804.º CPC. Também

podem ser consignadas prestações pecuniárias pagas por titular de direito real de

gozo menor, como o usufrutuário (artigos 1440.º e 1445.º CC) e o superficiário

(artigo 1530.º CC). Finalmente, podem ser objeto de consignação os rendimentos de

títulos de crédito nominativos, devendo a consignação ser mencionada nos títulos e

averbada nos termos da legislação respetiva (artigo 805.º, n.º3 C?C).

2. Procedimento: a consignação judicial de rendimentos pode ser requerida pelo

exequente – não pelos credores reclamantes – ao agente de execução logo a seguir à

penhora (artigo 796.º, n.º1 CPC) e enquanto os bens penhorados não forem vendidos

ou adjudicados (artigo 803.º, n.º1 CPC). Sobre o pedido é ouvido antes da citação

dos credores e o executado não requereu a venda dos bens, então se o crédito do

exequente for inferior a 190UC os credores com privilégio creditório geral perdem o

direito de reclamação (artigo 799.º, n.º4, alínea c) CPC). A consignação efetua-se por

comunicação ao serviço de registo competente, aplicando-se, com as necessárias

adaptações, o disposto no n.º2 do artigo 755.º CPC. O registo da consignação é feito

por averbamento ao registo da penhora. A consignação de rendas é notificada aos

locatários ou titulares do direito real menor quando existam ao momento do

requerimento de consignação (artigo 804.º, n.º1 CPC). Se não houver ainda locação

ou havendo de celebrar-se um novo contrato, os bens são locados pelo agente de

execução, mediante propostas ou por meio de negociação particular, observando-se,

com as modificações necessárias, as formalidades prescritas para a venda de bens

penhorados.

3. Execução: pagas as custas da execução, levantam-se a penhoras que incidam nos

bens restantes e extingue-se a execução (artigo 805.º, n.º1 CPC). Todavia, mantém-

se a penhora do bem onerado. Deste modo, o bem de que provém o rendimento não

virá a ser vendido. As rendas serão, doravante, recebidas pelo consignatário até que

esteja embolsado da importância do seu crédito, conforme o disposto no artigo 804.º,

n.º3 CPC. Por força do n.º4 do artigo 804.º CPC o consignatário fica na posição de

locador. Terá de administrar o imóvel como proprietário diligente e pagar as

contribuições e encargos, conforme o artigo 663.º, n.º1 CC? O ponto é duvidoso,

mas parece que não, pois o bem não passa para o seu poder, como se pressupõe,

nesse preceito civil. Na verdade, este contrato reger-se-á pelas regras gerais do

arrendamento urbano que lhe sejam aplicáveis, tanto do Código Civil, como do

NRAU. Ora, há uma especialidade imposta por aquele artigo 804.º, n.º4 CPC: o

consignatário não pode resolver o contrato, nem tomar qualquer decisão relativa aos

bens, sem anuência do executado; na falta de acordo, o juiz decidirá. As futuras

transmissões voluntárias do bem cujos rendimentos estão consignados não

extinguem o ónus, em manifestação da sua natureza de garantia real, conforme o

artigo 656.º, n.º1 CC. Essa mesma natureza dita que se os bens vierem a ser vendidos

ou adjudicados (artigo 805.º n.º2 CPC), vale o artigo 824.º, n.º2 CC caducando o do

ónus da consignação. Então o consignatário será pago – em reclamação de créditos

– do saldo do seu crédito pelo produto da venda ou adjudicação, com a prioridade

da penhora (artigo 822.º CC) a cujo registo a consignação foi averbada (ainda o n.º2

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do artigo 805.º CPC). O pagamento por consignação de rendimentos pode durar por

mais de 15 anos, por não estar sujeito ao limite do artigo 659.º, n.º2 CC. Extinta a

consignação de rendimentos, nomeadamente pela extinção da obrigação exequenda

– por pagamento integral da dívida, nomeadamente – a locação caducará ex vi artigo

1051.º, alíneas b) e c) CC, pois ela está sujeita a condição resolutiva (a extinção da

obrigação exequenda) e o exequente perde a sua legitimidade para permanecer como

senhorio.

4. Natureza jurídica: no pagamento por consignação de rendimentos extingue-se a

execução (artigo 805.º, n.º1 CPC) e mesmo que os valores futuros efetivamente

recebidos não cubram a dívida, a instância executiva não se reabrirá.

a. Como já notava Castro Mendes, a consignação de rendimentos constitui

um meio de satisfação total do crédito, no sentido de final. Por isso, pode

também servir para o remanescente que esteja por pagar, nota Lebre de

Freitas.

b. Diriamos que, processualmente, há aqui uma desistência eventual do pedido

executivo que pode ser parcial ou total, consoante o alcance do eventual

insucesso na satisfação do credor. A desistência do pedido faz extinguir o

direito do credor, conforme o artigo 285.º, n.º1 CPC.

c. Por seu turno, Anselmo de Castro entendia que a consignação de

rendimentos tinha a natureza de contrato, porquanto não poderia ter lugar se

o executado requeresse que se procedesse à venda dos bens (artigo 803.º, n.º2,

in fine CPC). Seria, pois, uma consignação voluntária de rendimentos (artigo

658.º, n.º2, 1.ª parte CPC).

d. No entanto, temos dúvidas que a não oposição do executado equivalha a

uma vontade negocial. Esta deve ser positiva. O pagamento por consignação

de rendimentos parece mais constituir uma forma imprópria de consignação

judicial de rendimentos (artigo 658.º, n.º2, 2.ª parte CPC).

e. Por outro lado, Castro Mendes ensinava existir aqui uma dação em função

de pagamento forçada de um direito real de fruição e de garantia. Deste modo,

a dívida não se extingue de imediato mas apenas cumprindo o pagamento

integral das prestações.

f. Já para Anselmo de Castro e Lebre de Freitas, tratar-se-ia de dação pro

solvendo, pois o devedor assumiria uma nova obrigação. É essa também a

nossa posição.

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PROCEDIMENTO DE EXECUÇÃO PARA ENTREGA DE

COISA CERTA

I – Execução comum

§77.º - Objeto e regime. Fase inicial

Objeto. Regime aplicável: 1007-507

Fase introdutória:

Oposição à execução:

§78.º - Execução específica

Apreensão e entrega:

Citação do cônjuge:

Impugnação:

Vícios da entrega judicial:

Efeitos da procedência:

§79.º - Execução sucedânea

Pressupostos e momento:

Procedimento:

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PROCEDIMENTO DE EXECUÇÃO PARA PRESTAÇÃO

DE FACTO

§86.º - Objeto, princípios e estrutura executiva

Objeto:

Especificidades estruturais:

§87.º - Prestação de facto fungível

Objeto:

Execução específica:

Execução sucedânea:

§88.º - Prestação de facto infungível

Execução específica:

Execução sucedânea:

§89.º - Prestação de facto negativo

Objeto:

Procedimento:

1. Execução de facto repristinável:

2. Execução de facto não repristinável: