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UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES
INSTITUTO A VEZ DO MESTRE
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
Sala de Recursos e o sujeito surdo: a estimulação dos
processos de comunicação/ linguagem
Por: Mônica Moura Neves
Orientadora: Professora Maria Esther de Araújo
Co-orientadora: Professora Giselle Böger Brand
Nova Iguaçu
2013
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UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES
INSTITUTO A VEZ DO MESTRE
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
Sala de Recursos e o sujeito surdo: a estimulação dos
processos de comunicação/ linguagem
Monografia apresentada ao Instituto
A Vez do Mestre como requisito
parcial para a obtenção do título de
especialista em Educação Especial e
Inclusiva.
Por: Mônica Moura Neves
Orientadora: Professora Maria Esther de Araújo
Co-orientadora: Professora Giselle Böger Brand
Nova Iguaçu
2013
AGRADECIMENTOS
Agradeço a Deus em primeiro lugar, pois está sempre ao meu lado, iluminando meus caminhos e me ajudando a vencer os obstáculos.
Aos meus pais a minha gratidão, por me incentivarem a prosseguir meus estudos.
À orientadora Maria Esther e à co-orientadora Giselle que, com seu apoio, colaboraram para o desenvolvimento deste trabalho.
EPÍGRAFE
“Um dia, quando olhares para trás,
verás que os dias mais belos foram
aqueles em que lutaste.”
Sigmund Freud
RESUMO
A linguagem está diretamente ligada à elaboração e à simbolização do pensamento humano. É por seu intermédio que o homem pode se comunicar com seus semelhantes em busca da aquisição de conhecimento e de novas experiências de vida. Dentre os diversos tipos de deficiência (sensorial, mental ou física) que podem interferir no desenvolvimento da linguagem temos a surdez, tema central da presente pesquisa bibliográfica. Sabemos que, colocando-nos em contato com o mundo que nos cerca, o sentido da audição se encontra claramente envolvido em todo o desenvolvimento fonético do indivíduo o que, posteriormente, influenciará na aprendizagem dos mecanismos de leitura, escrita e demais áreas curriculares. Deste modo, no que diz respeito à educação formal, temos a possibilidade de trabalharmos junto a esse aluno surdo na perspectiva de uma educação inclusiva, cujo objetivo primordial é assegurar a inclusão escolar dos alunos com deficiência. Dentre as propostas pedagógicas para tal fim, temos o Atendimento Educacional Especializado (Sala de Recursos), que visa à permanência do aluno na escola regular, promovendo o acesso ao currículo por meio, principalmente, de acessibilidade física e aos sistemas de comunicação. Portanto, a partir desse novo olhar pedagógico, certamente a escolarização e o crescimento do aluno surdo acontecerá de modo autônomo e prazeroso, levando-o à descoberta de si mesmo e de suas potencialidades.
METODOLOGIA
Tendo em vista o desenvolvimento do presente estudo, que resultou na
elaboração de uma monografia, cuja delimitação de tema foi previamente
definida, a saber, Sala de Recursos e o sujeito surdo: a estimulação dos
processos de comunicação / linguagem, tornou-se necessário pesquisar de que
modo o profissional responsável pela sala de recursos para alunos surdos
incluídos pode contribuir para que, de fato, essa inclusão aconteça, com
igualdade de oportunidades para todos, especialmente no que tange aos
processos de interação social pela linguagem, seja de que tipo for. Portanto, a
pesquisa bibliográfica visou ao aprofundamento dos conhecimentos referentes
ao tema escolhido, sendo fundamentada em livros científicos, de coleção
particular, na área da Fonoaudiologia e em materiais consultivos, com enfoque
na Educação Especial e na perspectiva da inclusão escolar junto ao aluno com
surdez.
Deste modo, para os capítulos que discorrem sobre a função da
linguagem e sobre a surdez propriamente dita e suas conseqüências
educacionais e escolares do sujeito surdo, foram escolhidos autores
renomados em tais áreas, tais como Ieda C .Pacheco Russo, Regina Celi
Machado Cupello, Regina Jakubovicz e Teresa M. Momensohn Santos. No que
diz respeito aos capítulos referentes à educação especial e inclusiva, foram
utilizadas, por exemplo, coleções elaboradas pelo Ministério da Educação de
nosso país.
Vislumbramos a partir desta pesquisa bibliográfica, dar informações
úteis a respeito da contribuição do Atendimento Educacional Especializado no
trabalho junto ao sujeito surdo para que o mesmo possa, de fato, chegar ao
conhecimento de si mesmo, superando limites e desenvolvendo suas
potencialidades singulares.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 7
CAPÍTULO I – ATENDIMENTO EDUCACIONAL ESPECIALIZADO 10
1.1 – Marcos históricos e normativos 10
1.2 – Objetivo da Política Nacional de Educação Especial / Inclusiva 12
1.3 – AEE: Regulamentação vigente 13
CAPÍTULO II - O DESENVOLVIMENTO DA LINGUAGEM E SUAS
IMPLICAÇÕES NA FORMAÇÃO DO SUJEITO 16
2.1 - O que é linguagem? 16
2.2 - Aspectos necessários para a aquisição e evolução da linguagem 18
CAPÍTULO III - PERDAS AUDITIVAS 21
3.1 - Um pouco sobre a surdez 21
3.2 – Principais consequências geradas pela surdez 24
CAPÍTULO IV - ATENDIMENTO EDUCACIONAL ESPECIALIZADO PARA
PESSOAS COM SURDEZ 26
4.1 – Atividades pedagógicas envolvendo linguagens 27
CONCLUSÃO 31
BIBLIOGRAFIA BÁSICA 32
INTRODUÇÃO
O tema escolhido para o desenvolvimento desta monografia é:
Atendimento Educacional Especializado (Sala de Recursos), sendo o mesmo
delimitado na forma como a Sala de Recursos pode auxiliar o sujeito surdo no
processo de inclusão escolar, através da estimulação dos processos de
comunicação/ linguagem. O ponto central, portanto, da presente pesquisa
bibliográfica é justamente ressaltar como as práticas pedagógicas
desenvolvidas nesse tipo serviço podem levar o sujeito surdo, ao ter suas
potencialidades respeitadas, à superação dos desafios existentes a nível do
uso da linguagem, que também acaba por interferir na aquisição do
conhecimento formal, e assim, tornar-se construtor de sua própria história de
vida, com autonomia e independência nas relações coletivas.
Consideramos o tema escolhido de real importância pois, como é sabido
por todos nós, a linguagem está diretamente ligada à elaboração e à
simbolização do pensamento humano, podendo ser verbal (através da fala) ou
não-verbal (como o uso de gestos e expressões faciais ou corporais, por
exemplo). É por seu intermédio que o homem pode se comunicar com seus
semelhantes em busca de aquisição de conhecimento e de novas experiências
de vida. Portanto, para que tudo isso ocorra, torna-se necessária a utilização
de órgãos periféricos, bem como a integralidade do sistema nervoso central.
Deste modo, qualquer alteração existente provocará déficits no que diz respeito
ao pleno desenvolvimento das funções da linguagem.
Dentre as alterações que podem interferir no desenvolvimento da
linguagem temos a surdez. Logo, as perdas auditivas, que podem ser
classificadas de diversos modos (segundo o tipo e o grau), influenciam no
reconhecimento de fala, de acordo com os achados audiométricos e,
consequentemente, na aquisição da linguagem, além de gerar problemas de
ordem psicossocial e educacional. Neste viés, a perspectiva da educação
inclusiva tem como objetivo primordial assegurar a inclusão escolar dos alunos
com deficiência e, dentre as propostas pedagógicas para tal fim, temos o
Atendimento Educacional Especializado (Sala de Recursos), que visa à
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permanência do aluno na escola regular, promovendo o acesso ao currículo
por meio, principalmente, de acessibilidade física e aos sistemas de
comunicação. A estimulação da linguagem, sob todas as formas de expressão,
isto é, oral, escrita, corporal, pictórica etc, auxiliará o aluno na apropriação dos
conteúdos formais, desenvolvendo e aprimorando os mecanismos de
aprendizagem – leitura, escrita, cálculo, conhecimentos naturais, geográficos,
históricos e culturais. Enfrentando os problemas e superando limites, o aluno
surdo incluído poderá se tornar agente da construção de sua própria história e
transformador do meio em que está inserido.
Assim, de acordo com o que foi explicitado anteriormente, considera-se
como objetivo geral desta monografia descrever as consequências
ocasionadas pela surdez, principalmente no que é referente à aquisição e à
utilização da linguagem, e como o atendimento pedagógico em Sala de
Recursos pode contribuir para a superação dos problemas de aprendizagem
decorrentes, levando assim, o sujeito ao conhecimento de si mesmo,
promovendo a sua real inclusão na sociedade em que vivemos. Além disso,
temos como objetivos específicos: definir linguagem e suas implicações no
desenvolvimento humano; explicar o que é surdez, apresentando sua etiologia
e suas principais conseqüências para a aquisição da linguagem e para os
aspectos educacionais no surdo, em especial, as dificuldades encontradas por
ele mesmo, pela família e pela escola durante a comunicação interpessoal;
conceituar o Atendimento Educacional Especializado (Sala de Recursos),
explicitando as funções pedagógicas no processo de inclusão do aluno surdo;
citar a contribuição da Sala de Recursos no trabalho com o surdo,
proporcionando-lhe, ao ter suas potencialidades e tempo próprio de
aprendizagem respeitados, a transformação de sua vida pelo acesso integral
ao conhecimento formal.
Deste modo, o capítulo I abordará o Atendimento Educacional
Especializado através da apresentação dos marcos políticos e normativos
referentes ao assunto em questão, além de apontar o objetivo global da Política
Nacional de Educação Especial / Inclusiva no território brasileiro, bem como
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delinear a regulamentação vigente para o acompanhamento pedagógico em
Sala de Recursos.
Dando continuidade ao tema central, o capítulo II tratará sobre o
desenvolvimento da linguagem e suas implicações na formação do sujeito,
ressaltando os aspectos necessários para a aquisição e evolução desse
processo.
No capítulo III, por sua vez, serão apresentadas informações importantes
sobre a etiologia das perdas auditivas e suas respectivas implicações nos
mecanismos de fala, linguagem, aprendizagem e sociabilidade.
Por fim, o capítulo IV irá sugerir atividades envolvendo os diversos tipos de
linguagem, em Sala de Recursos, a fim de que as conseqüências geradas pela
surdez sejam minimizadas e/ou eliminadas de acordo com as possibilidades
existentes.
Portanto, de um modo geral, desejamos deixar claro ao leitor de que modo
o Atendimento Educacional Especializado (Sala de Recursos) pode auxiliar o
aluno surdo incluído em turma regular a utilizar os processos de
comunicação/linguagem, favorecendo, portanto, a aquisição da leitura, da
escrita e do cálculo matemático, vislumbrando o pleno desenvolvimento de
aprendizagem.
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CAPÍTULO I
ATENDIMENTO EDUCACIONAL ESPECIALIZADO
Neste primeiro capítulo, vejamos um pouco sobre a trajetória da
Educação Especial no Brasil através da apresentação de marcos políticos e
normativos referentes e do objetivo global da Política Nacional de Educação
Especial / Inclusiva no território brasileiro, ressaltando por fim, a
regulamentação do Atendimento Educacional Especializado, como proposta de
uma educação igualitária. Assim sendo, iniciemos com a apresentação de
aspectos teóricos acerca da trajetória da Educação Especial ao longo dos
anos, a qual levou à perspectiva da educação inclusiva em nossas escolas,
respaldada por mecanismos legais que asseguram o acesso à escolarização
em igualdade de oportunidades para todos.
1.1 – Marcos históricos e normativos
Neste primeiro capítulo, vejamos o que o documento Marcos Político-Legais
da Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva (2010),
desenvolvido pela Secretaria de Educação de Brasília - Brasil, propõe como
eixos temáticos relativos à estruturação do atendimento educacional
especializado, a partir da visão histórica da educação especial em nosso país.
No Brasil, se traçarmos uma linha histórica do percurso de propostas
educacionais e sociais para o atendimento às pessoas com deficiência,
podemos destacar alguns momentos importantes no processo de construção
de uma oferta sólida e igualitária de oportunidades para todos, de acordo o
pensamento cultural vigente. Assim, podemos mencionar que o atendimento
organizacional às pessoas com deficiência teve início na época do Império,
com a criação de duas instituições: o Imperial Instituto dos Meninos Cegos, em
1854, atual Instituto Benjamin Constant – IBC, e o Instituto dos Surdos Mudos,
em 1857, hoje denominado Instituto Nacional da Educação dos Surdos – INES,
ambos no Rio de Janeiro. Em 1926, foi fundado o Instituto Pestalozzi,
especializado no atendimento às pessoas com deficiência intelectual e em
1954, deu-se início à primeira Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais-
10
APAE. A Constituição Federal de 1988 traz como um de seus objetivos
primordiais, expresso no art. 3º, inciso IV, “promover o bem de todos, sem
preconceitos de origem, raça, sexo, cor e idade e quaisquer outras formas de
discriminação”. A atual Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei nº
9.394/96, em seu artigo 59, preconiza que os sistemas de ensino devem
assegurar aos alunos currículo, métodos, recursos e organização específicos
para atendê-los de acordo com as necessidades individuais. Em 1994, a
Declaração de Salamanca proclamou que as escolas regulares com orientação
inclusiva se constituem como meios eficazes no combate às atitudes
discriminatórias. A Convenção de Guatemala (1999), promulgada no Brasil
através do Decreto nº3.956/2001, afirma que as pessoas com deficiência têm
os mesmos direitos humanos e liberdades fundamentais que as demais
pessoas, promovendo neste viés, a eliminação das barreiras que impedem a
acesso à escolarização. A Convenção sobre os Direitos das Pessoas com
Deficiência, aprovada pela ONU em 2006 e da qual nosso país é signatário,
estabelece que os Estados-Parte devem assegurar um sistema de educação
inclusiva em todos os níveis de ensino, em igualdade de condições com as
demais pessoas na comunidade em que vivem.
Até o momento, destacamos alguns marcos históricos e normativos que
delineiam o percurso social da oferta de suportes para as pessoas que
apresentam algum tipo de deficiência, seja intelectual, sensorial, física ou
comportamental de forma sucinta, porém elucidativa. Obviamente, muitas
outras leis, decretos, portarias e documentos já foram estabelecidos no Brasil,
mas o objetivo aqui, era justamente, destacar pontos importantíssimos nessa
trajetória, os quais nos auxiliarão a compreender o que é e qual a função real
do atendimento educacional especializado (salas de recursos), objeto de
interesse no presente estudo. Dando continuidade portanto, vejamos agora o
objetivo global das políticas públicas para a implementação legal da proposta
inclusiva através do contexto da educação especial.
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1.2 – Objetivo da Política Nacional de Educação Especial / Inclusiva
A Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação
Inclusiva tem como objetivo o acesso, a participação e a aprendizagem dos
alunos com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas
habilidades / superdotação. Consideram-se alunos com deficiência aqueles que
têm impedimentos de longo prazo, de natureza física, mental, intelectual ou
sensorial, que em interação com diversas barreiras podem ter restringida sua
participação plena e efetiva na escola e na sociedade. De acordo com Braun
(in Damasceno, org., 2010), são garantidos os seguintes direitos:
transversalidade da educação especial, desde a educação infantil até a
educação superior; atendimento educacional especializado; formação de
professores para o atendimento educacional especializado, bem como para os
demais profissionais da educação; participação da família e da comunidade,
como por exemplo, durante a estruturação do projeto político-pedagógico;
acessibilidade urbanística, arquitetônica e nos mobiliários, equipamentos,
transportes e comunicação, dentre outros.
A autora também salienta que a educação especial é uma modalidade
de ensino que perpassa todos os níveis de escolarização. O atendimento
educacional especializado tem como função identificar, elaborar e organizar
recursos pedagógicos e de acessibilidade para ajudar o aluno incluído a ter
acesso ao mesmo currículo dos demais alunos considerados regulares, de
modo adaptado as suas necessidades individuais, levando à promoção da
autonomia e da independência singulares. Isto significa dizer que esse tipo de
atendimento tem início logo na educação infantil: o lúdico, a riqueza de
estímulos cognitivos, perceptivos, sensoriais, emocionais e psicomotores
favorecem o processo de socialização e a valorização da própria criança como
um sujeito em potencial. Do nascimento aos três anos, tal atendimento se
expressa por meio da oferta de estimulação precoce, apoiando o
desenvolvimento dos alunos incluídos em interface com os serviços de saúde
(médico e terapêutico) e de assistência social. Na modalidade de educação de
jovens e adultos, favorece o ingresso no mundo do trabalho pelo aumento da
escolarização e o preparo para a profissionalização. Na educação indígena, os
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projetos pedagógicos devem ser elaborados baseando-se nas diferenças
sociais e culturais desses grupos. No ensino superior, as atividades propostas
devem envolver o ensino, a pesquisa e a extensão. Vale lembrar que, para o
ingresso de alunos com surdez, oferta-se a educação bilíngüe, ou seja, a
Língua Portuguesa como segunda modalidade escrita e a LIBRAS, como
língua materna. Junto aos alunos cegos, o Sistema Braille, com sistemas de
mobilidade espacial, é de fundamental importância para a recepção dos
estímulos educacionais de acordo com as especificidades existentes.Por fim,
com alunos que apresentam deficiências físicas ou transtornos globais do
desenvolvimento, adaptações arquitetônicas, recursos de multimídia e o uso
de tecnologias assistivas de comunicação e de informação se fazem
necessárias para o alcance dos resultados esperados.
O atendimento educacional especializado (salas de recursos) deve ser
oferecido em horário inverso ao da escolaridade regular, por profissionais
qualificados. Contudo, só haverá benefícios e ganhos reais se a escola contar
com o suporte de políticas públicas eficazes, que tornarão possível o diálogo e
a interface com os demais setores da sociedade civil – serviços de saúde,
acessibilidade arquitetônica e ações de assistência social, trabalho e justiça, a
fim de que, de fato, a inclusão aconteça. Passemos à apresentação legal do
atendimento educacional especializado na perspectiva da educação inclusiva.
1.3 – AEE: Regulamentação vigente
O decreto nº 6.571, de 17 de setembro de 2008, sancionado pelo então
presidente Luiz Inácio Lula da Silva, dispôs sobre o apoio técnico e financeiro
aos sistemas públicos de ensino dos Estados, do Distrito Federal e dos
Municípios, a fim de ampliar a oferta do atendimento educacional especializado
junto aos alunos com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e
altas habilidades ou superdotação, devidamente matriculados na rede pública
de ensino regular, por meio de: implantação de salas de recursos
multifuncionais (ambientes dotados de equipamentos, mobiliários e materiais
didáticos e pedagógicos); formação continuada dos professores, gestores e
demais profissionais que atuam junto ao aluno incluído; adequação
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arquitetônica dos espaços escolares; distribuição de recursos educacionais que
incluem livros didáticos e paradidáticos em Braille e em Libras, sintetizadores
de voz e softwares. O AEE é, portanto, o conjunto de atividades e recursos de
acessibilidade e pedagógicos prestado de modo complementar ou
suplementar, integrando a proposta pedagógica da escola, envolvendo ainda, a
participação familiar.
O decreto nº 7.611, de 17 de novembro de 2011, sancionado pela
presidente Dilma Rousseff, determina em seu artigo 1º , o dever do Estado em
garantir um sistema educacional inclusivo em todos os níveis, sem
discriminação e com base na igualdade de oportunidades, além da oferta de
educação especial preferencialmente na rede regular de ensino. O artigo 2º
provê que a educação especial deve garantir, por sua vez, os serviços de apoio
especializado voltado a eliminar as barreiras que possam obstruir a
escolarização dos alunos com deficiência, transtornos globais do
desenvolvimento e altas habilidades. Para fins desse Decreto, tais serviços se
constituem como o atendimento educacional especializado, compreendido
como o conjunto de atividades, recursos de acessibilidade e pedagógicos,
como já foi mencionado anteriormente (BRASIL, 2010).
A Resolução nº4/2009, no art. 5º, aponta que o AEE é realizado
prioritariamente na sala de recursos multifuncionais da própria escola ou em
outra escola de ensino regular, não sendo substitutivo às classes comuns,
podendo também ser realizado em centros de Atendimento Educacional
Especializado da rede pública ou de instituições comunitárias, confessionais ou
filantrópicas sem fins lucrativos. Trata-se portanto, de um espaço para se lidar
com as especificidades de cada aluno no tocante ao processo de
aprendizagem ( BRAUN; in Damasceno, org., 2010).
Atuar com alunos sob inclusão no espaço da escola regular exige outras
formas de lidar com o processo escolar, que precisam ser compartilhadas por
todos os ambientes que oferecem o atendimento educacional especializado,
independente de sua caracterização. O universo da escola regular e especial
está passando por muitas mudanças, tendo assim, que rever ações, finalidades
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e resultados. Neste sentido, a organização de um espaço como o do
Atendimento Educacional Especializado pode favorecer um olhar diferenciado
que propicia, ao mesmo tempo, a igualdade de direitos para todos. É
importante lembrar que as salas de recursos não são os únicos responsáveis
pela organização das estratégias de ensino para o aluno com especificidades,
visto que a escola é uma entidade social, onde todos se tornam responsáveis
por todas as medidas educacionais.
No próximo capítulo, trataremos sobre o desenvolvimento da linguagem
e suas interferências no processo de formação global do sujeito.
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CAPÍTULO II
O DESENVOLVIMENTO DA LINGUAGEM E SUAS
IMPLICAÇÕES NA FORMAÇÃO DO SUJEITO
Neste momento, vejamos um pouco sobre a função da linguagem, tão
importante para as relações do sujeito com o mundo que o cerca, seja pela
comunicação com seus pares, seja pela estruturação da aprendizagem formal.
2.1 - O que é linguagem?
Poucas palavras como a palavra linguagem apresentam uma
significação tão extensa mas, em resumo, podemos dizer que corresponde a
fenômenos comunicativos. Com o envio ou recebimento de mensagens por
meio de um código, o homem cria a atividade chamada linguagem. E, dentre os
diversos códigos utilizados temos a língua, cujo uso origina a fala,
condicionada pelas regras estabelecidas através da língua universal de um
determinado grupo social (NICOLA e INFANTE, 1992).
De acordo com Pérez e Momplet, o estudo a respeito da aquisição da
linguagem tem crescido cada vez mais nos últimos anos. Contudo, ao longo da
história, várias teorias foram propostas para explicar tal mecanismo tão
complexo. Chomsky propôs a teoria inatista, segundo a qual a linguagem
preestabelecida no cérebro humano emergiria a partir da maturação biológica
do organismo. Para combater tal teoria, Skinner desenvolveu uma posição
altamente ambientalista, a fim de provar que a linguagem se desenvolve em
virtude da relação com o meio ambiente. Jean Piaget veio então, para
enriquecer o cenário da linguagem infantil: o construtivismo de Piaget dizia que
as estruturas da linguagem eram construídas pela criança com suas
experiências individuais. Finalmente, não poderíamos nos esquecer de
Vygotsky, defensor da linguagem como fenômeno social e cultural, cuja postura
interacional da criança com o meio originou polêmica entre suas idéias e as de
Piaget. Diante desse quadro, podemos verificar que as investigações que
anteriormente se pautavam sob a discussão de teor inatista ou ambientalista
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foram, com o passar dos anos, ganhando novos contornos e explicações
empíricos (in PEÑA-CASANOVA – org., 1997).
Falar sobre os mecanismos cerebrais necessários para o surgimento da
linguagem, seja ela falada, lida ou escrita, constitui-se como tarefa bastante
complexa, que não cabe no presente trabalho monográfico. Entretanto,
podemos mencionar, de um modo geral, o que Narbona e Fernández (in
CHEVRIE-MULLER e NARBONA – orgs., 2005) nos apontam como fonte de
pesquisa. De acordo com os mesmos, os mecanismos especializados
relacionados às funções da linguagem têm sua sede numa extensa parte do
córtex perissilviano primário, secundário e terciário, com (seja qual for a
preferência manual) localização no hemisfério esquerdo para 87% da
população, no hemisfério direito para 8% e um repartição bilateral para 5%.
Além disso, deve se mencionar que a Área de Wernicke e a Área de Broca
correspondem às passagens onde ocorrem, respectivamente, a decodificação
dos sinais acústicos-verbais e a programação motora para a produção da fala.
Admite-se ainda que, em pelo menos 87% dos seres humanos, o hemisfério
esquerdo desempenhe função preponderante no que diz respeito aos aspectos
formais da linguagem, tais como a fonologia, a sintaxe e o pensamento
hipotético-dedutivo; quanto ao hemisfério direito, podemos dizer que o mesmo
atua em aspectos como a atenção, a orientação espacial, a prosódia e as
tarefas indutivas.
Segundo Russo e Santos (1994), a linguagem é uma faculdade humana
através da qual o homem consegue estabelecer contato com seus
semelhantes. Assim sendo, a comunicação, além de satisfazer uma
necessidade básica, isto é, o saber, influencia diretamente as relações sociais.
Portanto, entendida como processo interior, a linguagem pode ser de dois
tipos: verbal, quando expressada por meio da fala (exteriorização do
pensamento abstrato através do uso de símbolos verbais ou palavras contidos
no código – signos, sinais e símbolos – de uma determinada língua); não-
verbal, quando envolve o uso de gestos representativos, expressão corporal,
expressão facial ou a utilização da paralinguagem (manifestada através de
qualidades e características vocais específicas).
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Na realidade, o indivíduo começa a aprendizado do uso da linguagem e
da representação das idéias a partir da formação de um conceito mental
interno, possibilitado pelas suas próprias experiências. Desta forma, para que
ocorra a linguagem, há a necessidade do uso de órgãos periféricos e do
sistema nervoso central. Para Lennenberg (in JAKUBOVICZ, 2002), a
linguagem acontece não só devido ao amadurecimento de potenciais
orgânicos, mas também que ela ocorra durante um tempo limitado. Isto
significa dizer que se essa aquisição da linguagem não acontecer durante um
período considerado “ótimo” (período crítico ou privilegiado), poderão existir
conseqüências a nível de comunicação e em outros mecanismos do
desenvolvimento humano. É em virtude desse período “ótimo” que é possível
observar que, em casos de lesões traumáticas ou vasculares em crianças entre
4 e 10 anos (portanto, que já tinham adquirido a linguagem), a recuperação dos
sintomas afásicos é bastante ativa, o que nos faz pensar na atuação da
plasticidade cerebral que não está presente no adulto com lesão. Em suma, o
período privilegiado para a aquisição da linguagem se daria por volta dos 5 e 6
anos e se encerraria em torno dos 10 anos, quando o cérebro perde sua
plasticidade funcional.
Neste viés, passemos agora ao resumo dos mecanismos inerentes ao
bom desenvolvimento das funções da linguagem.
2.2 - Aspectos necessários para a aquisição e evolução da linguagem
Nos primeiros anos de vida, uma criança é capaz de dominar um
sistema linguístico idêntico àquele empregado pelos adultos que se encontram
ao seu redor. Contudo, para que o desenvolvimento da linguagem falada se
processe de fato, são necessárias três sequências de desenvolvimento:
primeiramente, temos o desenvolvimento da capacidade de receber, identificar
e manipular as características do mundo que nos cerca, o que constitui a fase
de recepção dos estímulos sensoriais (em especial, os visuais, os auditivos e
os cinestésicos) sob o comando do sistema nervoso central; após a maturação
do sistema receptivo, há a prontidão para que o processo expressivo se
estabeleça, correspondendo à interpretação dos sons linguísticos que a criança
18
ouve em seu ambiente, através do uso de processos muito complexos tais
como a memória, a organização no tempo e no espaço, a análise e a síntese, a
figura-fundo, além de experiências emocionais; por fim, ocorre a emissão, que
é o desenvolvimento da capacidade de produzir sons, cuja etapa envolve uma
atividade motora, a habilidade fonoarticulatória, comandada pelo sistema
nervoso central. Deste modo, percebemos que, inicialmente, o ser humano
possui apenas uma audição reflexa, que será inibida a partir das experiências
auditivas adquiridas no relacionamento interpessoal (RUSSO e SANTOS,
1994).
Na mesma linha de pensamento, Jakubovicz (2002) nos diz que, a fim
de que a linguagem se estabeleça sem intercorrências, é importante que haja:
integridade do sistema nervoso e suas funções (organização simbólica,
julgamento de relações, cognição, atenção, concentração, percepção,
raciocínio indutivo e dedutivo, controle dos impulsos, memória e retenção dos
estímulos para um futuro reconhecimento); habilidades mentais adequadas
(associações figurativas, simbólicas, semânticas e comportamentais);
funcionamento adequado do sistema sensorial (habilidades cognitivas, isto é,
consciência, identificação, localização, discriminação, atenção, memória,
sequenciação e análise-síntese); estabilidade emocional (a quem falar, de que
falar e o porquê de falar); estimulação do ambiente (a transmissão da língua é
feita principalmente pelo modelo oferecido pela mãe ao seu filho); maduração
(o cérebro necessita de alguns requisitos como a integração –
desaparecimentos de reflexos arcaicos e aquisição de novos circuitos
funcionais , a maduração – troca de enzimas e hormônios, trocas eletrolíticas e
mielinização , e a organização do eu com o mundo.
Assim sendo, Cupello (1993) nos diz que os primeiros sons emitidos
pela criança se dão logo após o nascimento, quando o oxigênio entra pela
primeira vez nos pulmões (tratam-se dos gritos reflexos do nascimento). De
zero a duas semanas, temos um choro indiferenciado, um comportamento inato
que, a partir de duas a três semanas, ganha características de diferenciação,
como o “choro de fome”, o “choro de dor” etc. Aproximadamente, em torno de
um mês, surgem os sons de “gargarejo”; de dois a quatro meses, os sons
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vocálicos; aos três meses, o verdadeiro balbucio (um prazer na repetição de
sons, que não possuem muita relação com a língua e que, portanto, é
observado também em bebês surdos até seis meses); ao quinto mês, as
sequências de vogais e consoantes.
Após esse período que chamamos de pré-linguagem, é possível
observar, com um processo de estimulação auditiva e afetiva, o processo de
linguagem propriamente dito. Logo, a primeira palavra com intenção aparece
por volta dos 10 aos 12 meses. Dos 14 aos 15 meses, a criança aumenta ainda
mais sua capacidade simbólica para a compreensão da linguagem (entretanto,
o que verificamos aqui, é ainda um predomínio da linguagem compreensiva
sobre a expressiva o que, posteriormente, será invertido). A maioria das
crianças de três anos sabem se expressar com desenvoltura. Até os cinco
anos, ocorre, gradativamente, um aumento de vocabulário. Entre os cinco e
sete anos, a linguagem ainda não tem um cunho sociocêntrico, ou seja, a
criança fala para si mais do que para os outros e, até os sete, a influência da
linguagem sobre o pensamento ainda não é definitiva.
Vale mencionar por fim, que a linguagem também passa por estágios
que acompanham toda a vida do indivíduo. A partir dos sete anos, a criança
começa a ler e a escrever e, assim, é capaz de aumentar seu vocabulário e
seus conhecimentos: é nesta fase que o diálogo passa, de fato, a existir. Dos
21 anos em diante, podemos dizer que o processo linguístico entrou em
equilíbrio e que a competência individual está estabelecida.
A seguir, falaremos sobre surdez, apresentando sua etiologia e suas
principais conseqüências para a aquisição da linguagem e para os aspectos
sociais e educacionais do surdo.
20
CAPÍTULO III
PERDAS AUDITIVAS
Um dos aspectos importantes para o desenvolvimento da linguagem é o
uso da audição. Assim sendo, qualquer alteração na acuidade auditiva
interferirá no uso pragmático das funções de comunicação. A seguir, vejamos
características do mecanismo da audição normal e a definição de surdez e
suas implicações gerais.
3.1 - Um pouco sobre a surdez
Segundo Canning (2002), o nascimento de uma criança é um evento
muito importante na vida familiar. Os pais passam nove meses imaginando e
idealizando seu filho e como será a dinâmica da família após sua chegada.
Entretanto, se o recém-nascido apresenta algum tipo de deficiência, seus pais
viverão, a princípio, momentos de dúvidas e incertezas quanto ao futuro do
mesmo, momentos esses que serão superados com a convivência e a
descoberta de que, apesar de haver uma deficiência, tal criança é um sujeito
em potencial (in PUESCHEL , org., 2002).
Dentre os diversos tipos de deficiência (sensorial, mental ou física)
temos a surdez. Colocando-nos em contato com o mundo que nos cerca, o
sentido da audição se encontra claramente envolvido em todo o
desenvolvimento fonético do indivíduo, tanto na aprendizagem quanto na
modulação e posterior controle, com a audição de nossa própria voz. Assim
sendo, de acordo com Russo e Santos (1994), a estreita relação entre a
audição e o desenvolvimento da linguagem no ser humano faz com que seja
necessário um diagnóstico precoce de uma perda auditiva, a fim de que,
através do acompanhamento específico (realização de avaliações auditivas e
posterior assistência terapêutica – dentre elas, a intervenção fonoaudiológica),
seja possível minimizar e/ou anular os efeitos funestos provocados pela
ausência de estimulação auditiva sobre a função da linguagem, proporcionando
melhores condições para o desenvolvimento global do sujeito.
21
O sentido da audição encontra-se claramente envolvido em todo o
desenvolvimento fonético do indivíduo, tanto na aprendizagem quanto na
modulação e posterior controle, com a audição da nossa própria voz (CONTI e
FERNÁNDEZ, 1997). Por sua vez, Dangelo e Fantini (1995), recordam que o
órgão vestíbulo-coclear é um órgão que percebe não apenas estímulos
sonoros, mas também estímulos provocados por alterações da posição da
cabeça no espaço. Deste modo, é o órgão da audição e do equilíbrio e
compreende três partes: orelha externa, orelha média e orelha interna.
De um modo geral, podemos dizer que, durante toda a vida, o homem
recebe um corrente contínua de informações sonoras que são captadas pelas
orelhas, classificadas e arquivadas na memória de seu cérebro. Quando as
ondas sonoras atingem a membrana timpânica, a compressão e o relaxamento
alternados do ar que fica adjacente a essa membrana fazem com que ela se
mova para trás e para frente. O centro dessa membrana está fixado ao cabo do
martelo, o qual está articulado à bigorna e esta, por sua vez, ao estribo . A
vibração da cadeia ossicular é transmitida pela platina do estribo sobre a janela
oval, que está em contato direto com a perilinfa da orelha interna. O órgão de
Corti é estimulado pela movimentação da membrana tectória sobre os cílios de
suas células sensoriais: cada vez que estes saem de sua posição normal,
ocorre uma modificação na carga elétrica endocelular, provocando o disparo do
impulso nervoso para as fibras nervosas que, posteriormente, formarão o nervo
vestíbulo-coclear. Após passarem pelo nervo coclear (e daí para o nervo
vestíbulo-coclear), os impulsos são transmitidos através de pelo menos cinco
níveis encefálicos, a saber: os núcleos cocleares dorsal e ventral, o corpo
trapezóide e o núcleo olivar superior; o colículo inferior; o corpo geniculado
medial; o córtex auditivo. Finalmente, os sinais são transmitidos para o centro
integrador comum, na Área de Wernicke do córtex cerebral, onde o significado
global das sensações visuais, auditivas e de outras modalidades, em suas
diferentes combinações, é determinado (GUYTON, 1998).
O mais baixo murmúrio que podemos ouvir possui apenas cerca de um
milionésimo de energia sonora da voz falada normal, o que demonstra a
extrema sensitividade do ouvido para a detecção do som. Segundo Russo e
22
Behlau (1993) podem ,então, ser identificados os seguintes elementos da
percepção auditiva: detecção, sensação sonora, discriminação, localização,
reconhecimento, compreensão, atenção e memória. Portanto, deve haver
integridade tanto a nível periférico quanto central para que a identificação dos
sons do ambiente, a percepção da fala e o desenvolvimento da linguagem
ocorram sem alguma interferência que prejudique esses processos.
Passaremos agora a falar sobre o que vem ser a surdez, apresentando
sua etiologia e suas principais conseqüências para a aquisição da linguagem e
para os aspectos sociais e educacionais do sujeito surdo.
As perdas auditivas podem ser classificadas, dependendo do aspecto a
ser considerado, em perdas quanto ao local, ao grau, ao momento em que
ocorrem e à origem do problema (Russo e Santos, 1994). Deste modo temos:
quanto ao local – perdas auditivas condutivas, que ocorrem quando as ondas
sonoras não alcançam a orelha interna de modo adequado, seja por problemas
na orelha externa ou na média, determinando uma redução na acuidade
auditiva (LOPES FILHO, 1997); perdas auditivas mistas – dependendo do
predomínio do fator de condução ou da gravidade da lesão sensorial esse tipo
de perda apresenta características diferentes, isto é, o reconhecimento de fala
pode não estar comprometido caso o componente seja condutivo, contudo se
houver predomínio de lesão neurossensorial, os índices podem estar
rebaixados (Russo e Santos,1993); perdas auditivas centrais – ainda para as
autoras citadas anteriormente, tratam-se de distúrbios auditivos decorrentes de
lesões na via auditiva central, onde os limiares tonais estão dentro da
normalidade, porém, há dificuldade para reconhecer a fala, bem como
informações complexas; perdas auditivas funcionais – Lopes Filho (1997)
afirmou que neste tipo de deficiência auditiva (também denominada pseudo-
hipoacusia, quando simulada) o paciente não apresenta lesões orgânicas no
aparelho auditivo, periférico ou central, mas a dificuldade em entender a
mensagem pode ser de fundo emocional ou psíquico; quanto ao grau – esta
classificação apóia-se na obtenção da média de perda auditiva para as
freqüências de 500, 1.000 e 2.000 Hz e a comparação do valor resultante com
a tabela apresentada por Davis e Silvermann, em 1970: normal – 0dB a 25 dB;
23
leves – 26 dB a 40 dB; moderado – 41 dB a 70 dB; severo – 71 dB a 90 dB;
profundo – 91 dB em diante (RUSSO e SANTOS, 1994); quanto ao momento
em que ocorrem – ainda de acordo com as autoras anteriormente citadas, as
deficiências auditivas podem também ser classificadas baseando-se no
momento em que ocorrem, ou seja, se ocorreram antes, durante ou depois do
nascimento; como causas mais comuns temos infecções nos ouvidos
constantes, sem tratamento adequado, doenças infecto-contagiosas como a
meningite, sarampo e caxumba, por traumatismos crânioencefálicos, dentre
outras; quanto à origem do problema – de acordo com o fator
hereditariedade, as perdas auditivas podem ser classificadas em perdas de
origem hereditária e de origem não-hereditária.
A partir do que foi exposto acima, passemos agora à explanação das
conseqüências em virtude de uma perda auditiva existente.
3.2 – Principais consequências geradas pela surdez
O ser humano depende da informação acústica desde a vida
intrauterina, tanto para sua sobrevivência física quanto psíquica e, portanto,
caso haja uma perda de audição, todo o seu desenvolvimento, a dinâmica
familiar, a interação social, a aprendizagem e a vida adulta estarão
prejudicados. Para Ramos (1999), podemos distinguir a relação entre as
perdas auditivas e seus efeitos na comunicação humana: 16 – 25 dB – as
vogais são ouvidas claramente, mas algumas consoantes podem não ser
ouvidas, além de acarretar uma discreta dificuldade na aquisição da linguagem
em crianças em que esta não esteja estabelecida; 26 – 40 dB – é considerada
como uma perda leve e a criança geralmente tem dificuldade para ouvir a fala
cochichada ou distante; 41 – 70 dB – crianças com deficiência moderada
normalmente não escutam a maioria das palavras de uma conversa falada em
intensidade normal, necessitando de aparelho de amplificação sonora e
fonoterapia.
De acordo com Russo e Santos (1994), dentre as principais
conseqüências decorrentes de uma perda auditiva (observando as
características da perda existente e se, principalmente, a detecção da perda
24
não ocorrer o mais precocemente possível) temos: problema perceptual – o
mecanismo de alerta e defesa pode estar prejudicado por não ser capaz de
identificar objetos ou eventos pelos sons que produzem; problema de fala – a
criança tem dificuldade em associar os movimentos de seus mecanismos
fonoarticulatórios aos sons resultantes; problema na comunicação – o surdo
poderá não aprender a língua oral, gerando assim, um prejuízo na
conversação; problema cognitivo - a criança com deficiência auditiva aprende
sobre o mundo apenas através de situações concretas; problema social –
dificuldade em perceber os aspectos da paralinguagem, ou seja, fatores
suprassegmentais da fala, como a mudança no tom de voz; problema
emocional – por problemas na comunicação, podem surgir sentimentos de
frustração, agressividade, além de uma imagem de si mesmo destrutiva;
problema educacional – muitas das vezes, as escolas não estão preparadas
para receber o aluno surdo; problema intelectual- embora não possua déficit
cognitivo, a não ser que haja outros comprometimentos associados, a criança
apresenta dificuldades na competência da linguagem e no conhecimento geral;
problema familiar – as reações instintivas dos pais cujo filho tem dificuldades
em desenvolver a linguagem verbal é deixar de estimulá-lo pela conversação,
havendo assim, um comprometimento no desenvolvimento global e na
integração social e emocional da criança; problema social e econômico – a
necessidade do uso de aparelho de amplificação sonora, sua manutenção e o
trabalho especializado necessário geram problemas econômicos sérios.
No próximo capítulo, trataremos sobre como é realizado o
acompanhamento educacional especializado junto aos alunos surdos, de modo
a lhes proporcionar, ao ter suas potencialidades e tempo próprio de
aprendizagem respeitados, a transformação de suas vidas quanto à
aprendizagem formal.
25
CAPÍTULO IV
ATENDIMENTO EDUCACIONAL ESPECIALIZADO PARA
PESSOAS COM SURDEZ
De acordo com Alvez, Ferreira et al (2010), historicamente, as
concepções desenvolvidas sobre a educação de pessoas com surdez se
basearam em três diferentes abordagens: a oralista (utilização da língua da
comunidade ouvinte na modalidade oral, tendo como única possibilidade
linguística o uso da voz e da leitura labial), a comunicação total (considera a
pessoa surda de forma natural, prescrevendo o uso de todo recurso disponível
para a comunicação) e o bilinguismo (visa à capacitação para o uso de duas
línguas no contexto escolar e na vida social, isto é, a língua de sinais e a língua
da comunidade ouvinte). Damázio (2005) nos lembra que, aproximadamente
há dois séculos, existe um embate político e epistemológico entre oralistas e
gestualistas que tem ocupado lugar de destaque nas discussões e ações
referentes à educação do sujeito surdo. E, enquanto não se chega a um
consenso, quem sofre é o próprio sujeito, que fica marginalizado das relações
sociais, com seu potencial individual posto de modo descontextualizado. Muito
se tem conquistado, por outro lado, com as novas políticas públicas de
inclusão, porém há ainda muitos desafios a serem superados a fim de que a
inclusão do aluno surdo aconteça de fato, com igualdade de oportunidades. E,
para que isso aconteça, é preciso que a educação da pessoa surda não
continue centrada na questão da língua a ser utilizada apenas, mas que se
também reflita sobre a qualidade e a eficácia das práticas pedagógicas usadas
junto à mesma, considerando-a como um sujeito que possui habilidades,
potencialidades, desejos e intenções. Assim, deve ser estimulada para fazer
uso de várias linguagens, obviamente sendo respeitada em sua singularidade.
Ainda para Damázio (2005), a pessoa com surdez na concepção pós-
moderna não pode ser vista como estrangeira em sua terra, porém como
usuária de um sistema lingüístico com características específicas. Neste
sentido, a perspectiva inclusiva quebra paradigmas, procurando dar à pessoa
26
com surdez possibilidades sociais e educacionais. Mais do que uma língua, o
sujeito surdo precisa de ambientes educacionais estimuladores, que desafiem
a organização do pensamento lógico e exercitem habilidades cognitivas,
perceptivas e psicomotoras.
O Decreto 5.626, de 5 de dezembro de 2005, determina o direito de uma
educação que garanta a formação da pessoa com surdez, em que a Língua
Brasileira de Sinais e a Língua Portuguesa, preferencialmente na modalidade
escrita, sejam acessadas de modo simultâneo no ambiente escolar. Portanto,
não é a ruptura com o mundo ouvinte que respeitará a diferença da pessoa
com surdez, mas sim espaços para o desenvolvimento de seu potencial
singular. Neste contexto é que o Atendimento Educacional Especializado
disponibilizará serviços e recursos para tal fim, visando à autonomia e à
independência global.
Para Soares (2003), “o letramento traz conseqüências políticas,
econômica e culturais para os indivíduos e grupos que se apropriam da escrita,
fazendo com que esta se torne parte de suas vidas como meio de expressão e
comunicação.”
Concluindo nossas reflexões, vejamos sugestões pedagógicas para a
estimulação das funções da linguagem por meio do atendimento educacional
especializado.
4.1 – Atividades pedagógicas envolvendo linguagens
O Atendimento Educacional Especializado junto às pessoas com surdez,
partindo do reconhecimento das capacidades de cada uma delas, vislumbrará
o pleno desenvolvimento e a aprendizagem formal. Para isso, deve considerar
os dispositivos legais, que determinam o direito de uma educação bilíngue, em
que LIBRAS e Língua Portuguesa escrita se constituam como línguas de
instrução em todo o processo educativo. O conteúdo curricular não deve,
portanto, ser linear, hierarquizado, pois o conhecimento deve ser visto como
uma teia de relações, como uma ação conectada entre o pensar e o fazer
pedagógico. O aluno precisa aprender fazendo, questionando, levantando
27
idéias e buscando respostas para suas dúvidas. Damázio (2005) sugere a
Pedagogia Contextual Relacional. O sentido dessa pedagogia encontra-se em
formar o ser humano com base em contextos significativos, descartando o que
não tem valor para a vida. Para efetivar a rotina escolar em sala de recursos,
aplica-se nesse viés, a metodologia vivencial, ou seja, um caminho percorrido
pelo professor para possibilitar as condições de aprendizagem do aluno surdo,
numa proposta bilíngue, que se trata justamente do que foi exposto
anteriormente – pensar, questionar, levantar hipóteses, entrar em conflito,
confrontar-se com estruturas anteriores, descobrir algo novo, vivenciar o ato
conquistado e aplicá-lo no dia a dia.
Logo, percebemos que a organização didática do atendimento em sala
de recursos envolve três momentos, a saber: atendimento educacional
especializado em LIBRAS (a organização didática deve ser rica em imagens
visuais; pode se recorrer a outros recursos, como o teatro, por exemplo);
atendimento educacional especializado para o ensino da Língua Portuguesa
escrita (a língua portuguesa escrita pode ser um eficaz dispositivo para a
inserção no mundo trabalho; tal trabalho deve ainda, ser desenvolvido por uma
professora, preferencialmente formada em Letras, começando pelos processos
iniciais de alfabetizar e letrar, depois com os processos intermediários, como
ler, interpretar e escrever, até a um nível mais avançado da apropriação da
língua oficial escrita) e atendimento educacional para o ensino de LIBRAS ( é
importante a presença de um profissional com surdez, como os instrutores de
LIBRAS; o atendimento deve ser planejado com base no conhecimento que o
aluno tem a respeito da língua de sinais; os alunos, nesse espaço, vivenciam
momentos de trocas através do uso de materiais concretos). Enfim, a educação
no atendimento educacional especializado para a pessoa com surdez significa,
basicamente, em prepará-la para a individualidade e a coletividade, de fato
numa proposta inclusiva.
Podemos concluir que o planejamento do AEE em LIBRAS é atribuição
do professor deste perfil de atendimento , de acordo com as seguintes etapas:
acolhimento dos alunos, numa relação de respeito e confiança mútua;
identificação das habilidades e das necessidades educacionais; parceria com
28
os professores da sala de aula comum para adaptações curriculares e troca de
experiências; produção de recursos didáticos acessíveis; avaliação da
aprendizagem por meio da LIBRAS. Para atuar no ensino da LIBRAS é preciso
que o professor de AEE tenha fluência nesta língua, a fim de desenvolver
conceitos e elaborar recursos e materiais adaptados. Neste sentido, a sala de
recursos multifuncional precisa ter, para bem atender tal público-alvo, um
amplo e diversificado acervo textual em Língua Portuguesa. Vale lembrar por
fim, que a avaliação das aquisições do Português pelos alunos deve sempre
colocar em evidência as dificuldades e os avanços para servir de base para um
novo planejamento das ações.
Na fase inicial de aprendizado da Língua Portuguesa temos: expressão
corporal, dramatização, aula-passeio, sessão de filmes etc. Para a leitura
podemos mencionar: leitura de símbolos, leitura visual de imagens, leitura de
texto escrito, interpretação e compreensão ou pelo desenho ou pela escrita,
dentre outras. Para a escrita, podemos salientar a escrita de diferentes gêneros
textuais - num momento anterior, para a descoberta da escrita, é possível se
trabalhar de modo lúdico, através de brincadeiras, livros ou informática
acessível (ALVEZ, FERREIRA et al, 2010).
Por fim, neste processo de estimulação da linguagem junto ao aluno
surdo, podemos mencionar atividades e práticas em Psicomotricidade e em
Arteeducação que também podem contribuir, através do uso do corpo próprio
e do exercício da criatividade respectivamente, para que o mesmo possa
superar limites, fazendo-se compreender e compreender o outro.
Para Moura e Vieira, o espaço destinado para se trabalhar com o surdo,
seja ele escolar ou clínico, não serve apenas para a execução de determinadas
técnicas, mas sim, para trabalhar a construção de uma identidade, que é única
(in PAVONE e RAFAELI, orgs., 2005). Vejamos, neste momento, o que
Urrutigaray (2006) nos informa a respeito do emprego dos materiais plásticos:
material seco – corresponde às modalidades de lápis, pastéis, canetas
hidrográficas, gizes de cera etc, que são elementos de fácil manuseio e
controle, o que reforça a sensação de bem-estar e equilíbrio, obtendo-se
29
aspectos indicativos de estados emocionais internos; tintas - por se tratar de
material fluido, é ótimo para manifestar emoções pela experimentação de
afetos; material tridimensional – esculpir significa cortar e gravar, ato que é
capaz de captar a essência de estados interiores que são transpostos para o
material, o qual pode ser a argila, a massa de modelar ou sucatas; colagem –
propicia uma certa simulação de conteúdos psíquicos, pois o sujeito acredita
que as imagens por ele escolhidas não têm uma relação direta consigo mesmo.
Assim sendo, ao pintar, modelar ou desenhar, o sujeito possui múltiplas
possibilidades criativas, o que aguça todos os sentidos e estimula a formação
de novos esquemas mentais para a aprendizagem formal.
Por fim, Nicola (2004) sugere como sugestões de atividades
psicomotoras aquelas que estimulam as seguintes habilidades motrizes:
relações espaciais, coordenação visomotora, constância de percepção, figura-
fundo, atenção, percepção tátil, percepção olfativa, percepção gustativa,
percepção auditiva, orientação temporal, associação de idéias, compreensão e
raciocínio, memória, posição no espaço pois, através das mesmas, é possível
auxiliar o sujeito (e também aquele que é surdo) a se apropriar do próprio
corpo, desfazendo-se ao mesmo tempo das dificuldades existentes, oirundas
da perda auditiva que se faz presente.
Portanto, de acordo com o que foi exposto anteriormente, podemos
verificar como o atendimento em sala de recursos é fundamental para que o
aluno surdo seja considerado em sua totalidade, o que o levará a ser agente de
sua história e sujeito transformador da sociedade em que vive.
30
CONCLUSÃO
A linguagem, faculdade específica do ser humano, permeada por várias
formas de manifestação, dentre elas a fala, a leitura e a escrita, necessita de
um ambiente interno íntegro e de um ambiente externo rico em estímulos.
Dentre os inúmeros fatores que podem interferir no processo de
desenvolvimento da linguagem/ comunicação, temos a surdez, cujas
conseqüências variam de acordo com o tipo, o grau e o momento em que foi
ocasionada.
Atualmente, muito se tem discutido acerca da proposta inclusiva para
aqueles alunos que apresentam alguma forma de deficiência, seja ela de
origem intelectual, física, sensorial ou de comportamento. Uma das propostas
pedagógicas eficazes para auxiliar o aluno incluído no acesso às informações
curriculares é justamente o Atendimento Educacional Especializado, também
conhecido sob o termo Sala de Recursos.
É possível identificar os efeitos gerados pela existência de uma perda
auditiva, tanto no que diz respeito à estruturação do eu individual, quanto ao
processo de relacionamento junto à família, à escola e aos demais grupos
sociais de convívio. Neste sentido, o apoio pedagógico em Sala de Recursos
contribuirá sobremaneira para que o sujeito surdo seja tratado em sua
totalidade valorizando-se, através de estratégias e adaptações, seus desejos e
anseios pessoais. Somente assim, o mesmo poderá alcançar autonomia em
sua trajetória de construção do conhecimento humano, superando as
dificuldades a nível do uso pragmático da leitura e da escrita e aprimorando
sua teia de relações interpessoais, tanto na comunidade surda como no grupo
de pessoas ouvintes a ele relacionado.
31
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