dona ritinha e o sonho de voltar a morar no campo

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Boletim Informativo do Programa Uma Terra e Duas Águas Ano 7 • nº1257 Julho/2013 Esperança Dona Ritinha e o sonho de voltar a morar no campo Dona Ritinha nasceu em Patos-PB e quando tinha apenas 10 anos de idade, sua família foi morar em Esperança, no Agreste da Borborema. Seus pais vieram morar no sítio Benefício, nas terras de seus avôs maternos. Lá construíram uma casa com muito esforço e trabalho. E foi com seus pais que Ritinha aprendeu a fazer e a admirar a agricultura. Quando completou 17 anos, dona Ritinha engravidou e sua vida deu uma reviravolta. Precisava trabalhar para sustentar seu filho. Resolveu se mudar para o Rio de Janeiro e buscar a sorte. Passou 23 anos por lá, mas, seu grande sonho sempre foi voltar para a Paraíba, para o sítio onde tinha sido criada. No Rio de Janeiro, trabalhou em casa de família, foi camelô, vendedora de sanduiche natural na praia, trabalhou numa ONG de direitos humanos. Foi também governanta na casa de um embaixador aposentado. Nesse tempo que morou no Rio de Janeiro juntou dinheiro e conseguiu comprar uma casa que tem até hoje no município de Esperança. Dona Ritinha sente-se muito agradecida pelas experiências que teve nessa época de sua vida, mas deixa claro que todo esforço que fez foi pensando na criação e educação do filho e em regressar para morar na Paraíba. Atualmente, dona Ritinha é casada com Leomarcos dos Santos ou seu Baia, como é mais conhecido. E o casal vive hoje no mesmo local onde ela cresceu, como um dia desejou. Para Ritinha a vida do campo é mais natural. Ela mesma planta o que come e colhe o que precisa, e a tranquilidade é outro ponto que valoriza muito. Conta que hoje em dia, quando vai para a rua, não consegue dormir direito, apesar de ter vivido tanto tempo numa grande cidade como o Rio de Janeiro. As minhas raízes estão aqui, afirma dona Ritinha quando fala se sua terra. Eu tenho uma casa no centro de Esperança, mas eu gosto mesmo é da roça. Minha mãe e meu pai foram morar na cidade e quando meu pai faleceu, voltei para o sítio. Há 8 anos assumiu novamente o sítio de um hectare e meio e conta que quando chegou havia apenas 3 pés de frutas: um de acerola, um de seriguela e outro de pinha. A terra era fraca e tinha até um lugar que era barro puro. Quando cheguei, meu irmão disse: Rita, essa terra não dá nada! Mas eu insisti

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Page 1: Dona Ritinha e o sonho de voltar a morar no campo

Boletim Informativo do Programa Uma Terra e Duas Águas

Ano 7 • nº1257

Julho/2013

Esperança

Dona Ritinha e o sonho de voltar a morar no campo

Dona Ritinha nasceu em Patos-PB e quando tinha apenas 10 anos de idade, sua família foi morar em Esperança, no Agreste da Borborema. Seus pais vieram morar no sítio Benefício, nas terras de seus avôs maternos. Lá construíram uma casa com muito esforço e trabalho. E foi com seus pais que Ritinha aprendeu a fazer e a admirar a agricultura.

Quando completou 17 anos, dona Ritinha engravidou e sua vida deu uma reviravolta. Precisava trabalhar para sustentar seu filho. Resolveu se mudar para o Rio de Janeiro e buscar a sorte. Passou 23 anos por lá, mas, seu grande sonho sempre foi voltar para a Paraíba, para o sítio onde tinha sido criada.

No Rio de Janeiro, trabalhou em casa de família, foi camelô, vendedora de sanduiche natural na praia, trabalhou numa ONG de direitos humanos. Foi também governanta na casa de um embaixador aposentado. Nesse tempo que morou no Rio de Janeiro juntou dinheiro e conseguiu comprar uma casa que tem até hoje no município de Esperança. Dona Ritinha sente-se muito agradecida pelas experiências que teve nessa época de sua vida, mas deixa claro que todo esforço que fez foi pensando na criação e educação do filho e em regressar para morar na Paraíba.

Atualmente, dona Ritinha é casada com Leomarcos dos Santos ou seu Baia, como é mais conhecido. E o casal vive hoje no mesmo local onde ela cresceu, como um dia desejou. Para Ritinha a vida do campo é mais natural. Ela mesma planta o que come e colhe o que precisa, e a tranquilidade é outro ponto que valoriza muito. Conta que hoje em dia, quando vai para a rua, não consegue dormir direito, apesar de ter vivido tanto tempo numa grande cidade como o Rio de Janeiro. As minhas raízes estão aqui, afirma dona Ritinha quando fala se sua terra. Eu tenho uma casa no centro de Esperança, mas eu gosto mesmo é da roça. Minha mãe e meu pai foram morar na cidade e quando meu pai faleceu, voltei para o sítio.

Há 8 anos assumiu novamente o sítio de um hectare e meio e conta que quando chegou havia apenas 3 pés de frutas: um de acerola, um de seriguela e outro de pinha. A terra era fraca e tinha até um lugar que era barro puro. Quando cheguei, meu irmão disse: Rita, essa terra não dá nada! Mas eu insisti

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Boletim Informativo do Programa Uma Terra e Duas Águas Articulação Semiárido Brasileiro – Paraíba

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Realização Patrocínio

PLANTEI PRIMEIRO um pé de côco e um pé de laranja e aos poucos fui continuando com minha plantação adubando o solo. Hoje depois dos cuidados com a terra, já existem 52 tipos de fruteiras. Dona Ritinha conta que aprendeu com seu pai a limpar o roçado e queimar o mato, mas quando assumiu o sítio, passou a fazer diferente: passou a juntar a palha do feijão, as cascas de frutas e os restos de verduras e utiliza para adubar o solo aproveitando tudo. Eu deixo o mato crescer porque é alimento da terra, explica. Eu quero dar mais vida ao meu sítio e não limpo mais o roçado. É dessa forma que a gente não queima o mato, mas faz o adubo a partir dele.

Com esses cuidados, dona Ritinha e seu Baia perceberam que essas práticas tem colaborado na produção e no manejo fertilidade da terra. Não adianta tirar tudo da terra e não devolver, porque a terra é como o ser humano e precisa de vida, continua dona Ritinha. Apesar do ano passado ter sido bastante estiado, lucraram 3 sacos de milho e 4 sacos de feijão. Ritinha é muito organizada e todos os anos separa e guarda as sementes para o próximo inverno. Guardando sempre as sementes de feijão azulão, feijão macassar e milho para o plantio do amo seguinte.

Quando assumiu as terras dos pais, dona Ritinha já encontrou uma cisterna de água de beber. Ela construiu dois tanques para armazenar a água utilizada nos trabalhos domésticos. E no final de 2012, foi contemplada com a cisterna de enxurrada que armazena 52 mil litros de água para a produção na propriedade. A cisterna encheu no inverno desse ano, e permitirá a continuidade e o aumento da produção mesmo em períodos de seca, como ela mesma explica.

Toda a água acumulada serve para o plantio que possuem no arredor de casa. Plantam feijão, milho, pés de cuité, e muitas hortaliças como alface, pimentão, cebola e outras. Também ajudou a situar as frutas e aguar as muitas flores que cultiva, como os pés de orquídeas tão estimados pela

agricultora. Além disso, criam galinhas que são selecionadas pela família e vem sendo uma fonte de renda com a venda dos ovos. O terreno é pequeno, mas mesmo assim a família se preocupa com a preservação do ambiente, tanto que seu Baia tem um sonho de fazer uma mata de sábia.

As mudanças na vida e na propriedade de dona Ritinha e seu Baia foram enormes. O casal trabalha com tanto gosto que a experiência deles já recebeu muitas visitas de vários grupos de agricultores e agricultoras. Dona Ritinha viveu muitas experiências e conheceu uma realidade diferente, mas nunca abandonou seu objetivo de voltar para suas raízes. E aos poucos a família foi transformando a paisagem do sítio com as práticas agroecológicas e construindo a certeza de que a vida na zona rural pode ser produtiva e feliz.