QUÉZIA ELLER MIRANDA CATRINCK
A SAÚDE BUCAL NA ESTRATÉGIA SAÚDE DA FAMÍLIA: AVANÇOS E DESAFIOS
TEÓFILO OTONI – MG
2011
QUÉZIA ELLER MIRANDA CATRINCK
A SAÚDE BUCAL NA ESTRATÉGIA SAÚDE DA FAMÍLIA: AVANÇOS E DESAFIOS
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Especialização em Atenção Básica em Saúde da Família, Universidade Federal de Minas Gerais, como requisito parcial para obtenção de título de Especialista. Orientadora: Profa. Dra. Maria Rizoneide Negreiros de Araújo
TEÓFILO OTONI - MG
2011
QUÉZIA ELLER MIRANDA CATRINCK
A SAÚDE BUCAL NA ESTRATÉGIA SAÚDE DA FAMÍLIA: AVANÇOS E DESAFIOS
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Especialização em Atenção Básica em Saúde da Família, Universidade Federal de Minas Gerais, como requisito parcial para obtenção de título de Especialista. Orientadora: Profa. Dra. Maria Rizoneide Negreiros de Araújo
Banca Examinadora:
Profa. Dra. Maria Rizoneide Negreiros de Araújo – UFMG
Profa. Dra. Mara Vasconcelos
Aprovado em Belo Horizonte: 02/07/2011
TEÓFILO OTONI - MG
2011
Ao Deus Eterno
“Tu és digno, Senhor e Deus nosso, de receber a glória, a honra e o poder, porque todas as coisas tu criaste, sim, por causa da tua vontade vieram a existir e foram criadas”.
Ap. 4:11.
Agradeço à Profa. Dra. Maria Rizoneide Negreiros de Araújo, querida orientadora, pelo carinho, incentivos
constantes e competência profissional.
Ao meu amado esposo, Arthur Henrique da Cruz Catrinck,
pelo companheirismo e ajuda especialmente em informática.
À minha amada mãe, Nelma Eller Miranda pelo exemplo de
vida, de amor e de fé.
Ao meu cunhado Nelson Salviano e irmã Márcia pela
tradução do resumo e também pelo apoio e incentivo sempre.
Aos irmãos queridos Marcelo, Caia e Oyama pelo amor e
incentivo sempre demonstrados a mim. E sua significativa
contribuição para este trabalho.
A todos os familiares...
RESUMO
A Estratégia de Saúde da Família (ESF) foi implantada nos municípios brasileiros em 1994 com a responsabilidade de contribuir na reorganização da Atenção Básica. Em 2000 a equipe de saúde bucal foi incorporada à atenção básica junto às equipes de saúde de família. O processo de inserção das equipes e o trabalho das mesmas ainda estão, de forma incipiente, incorporando os princípios e diretrizes da ESF. Dessa forma, a mudança de modelo proposta fica comprometida. Este trabalho teve como objetivo analisar a inserção da saúde bucal na estratégia saúde da família e para tanto foi realizada uma pesquisa bibliográfica livre, porém, direcionada na literatura nacional, para identificar as publicações que abordavam a inserção da saúde bucal na ESF. Como resultados foram identificados dificuldades das equipes de saúde bucal para enfrentar e resolver os problemas da saúde bucal da população, por vários fatores envolvendo a gestão, o modelo vigente, os profissionais e também os usuários. Entre esses, foram mencionadas na literatura as questões relacionadas à formação do cirurgião dentista muito voltada para os aspectos curativos e a dificuldade dos gestores municipais entenderem o processo de trabalho das equipes no que diz respeito às ações de promoção e prevenção. Os trabalhos analisados apresentam um cenário promissor na questão da mudança do modelo de atenção à Saúde Bucal. Conclui-se que a ESF vem contribuindo para a ampliação da inserção da Saúde Bucal na Atenção Básica, contudo, o estabelecimento da mudança de modelo proposto pela ESF requer a efetiva mudança no processo de trabalho das equipes e na formação dos profissionais de saúde, dentro de uma visão de promoção e prevenção de saúde. Descritores: Saúde bucal. Saúde bucal no programa saúde da família. Saúde bucal
na atenção básica.
ABSTRACT The Family Health Strategy (FHS) was implemented in the Brazilian districts on 1994 with the responsibility to contribute to the Primary Care reorganization. In 2000, the oral health team was incorporated to the primary care within the family health teams. The insertion process of the teams and their work still remains, while incipient form, incorporating the principles and guidelines of the FHS. In this way, the change of the proposal model becomes compromised. The aim of this paper was to analyze the insertion of oral health in the family health strategy and, for that reason a free bibliographical research was performed, which was directed to the national literature in order to identify the publishing works that addressed the insertion of oral health in the FHS. As result, it was identified some difficulties of the oral health teams to face and solve the population’s oral health problems for a variety of factors which involve the management, the actual model, the professionals and also the customers. Among them, it was mentioned in the literature the questions related to the dentist surgeon training focused on the cure aspects and the difficulties of the district managers to understand the working process of the teams concerned promotion and prevention actions. The analyzed papers present a promising scenario for the changing matters in the oral health care model. The conclusion is that the FHS has contributed to the expansion of the insertion to oral health within the primary care. However, the establishing change of the model proposed by FHS requires an effective change within the working process of the teams and in the health professional training, in the view of promotion and health prevention.
Key words: Oral health. Oral health in family health program. Oral health in primary
care.
Lista de siglas CPOD - Dentes cariados, perdidos e obturados
FSESP – Fundação Especial de Saúde Pública
ESF – Estratégia Saúde da Família
PSF – Programa Saúde da Família
UBS – Unidade Básica de Saúde
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO 10
2 JUSTIFICATIVA 12
3 OBJETIVO 17
4 METODOLOGIA 18
5 REVISÃO DE LITERATURA 19
6 RESULTADOS E DISCUSSÃO 26
7 CONSIDERAÇÕES FINAIS 28
REFERENCIAS 31
10
1 INTRODUÇÃO
Desde que me formei em Odontologia, em 1996, iniciei minha vida profissional no
Serviço Público de Saúde. Ao longo desse período pude constatar a grande
complexidade que envolve a saúde, em particular a bucal. Fatores individuais e
coletivos, permeados por toda uma estrutura sócio-econômica, definem o estado de
saúde das pessoas. Portanto, para se atingir índices aceitáveis em saúde, é preciso
investir em diversos setores da sociedade.
Nesse sentido, o Serviço Público de Saúde é um importante setor que desenvolve
ações específicas visando à promoção, prevenção e recuperação da saúde. Para
que suas ações sejam eficazes é preciso tecnologia apropriada e correta alocação
de recursos, com um aumento de investimentos em toda a sua estrutura, gerando
eficiência quanto ao seu objetivo e mudança na imagem que esse setor tem perante
toda a sociedade, que ainda hoje é visto como um setor que oferece um serviço de
baixa qualidade, levando descrédito aos usuários que tem nesse a sua única
oportunidade de acesso.
A Estratégia de Saúde da Família foi implantada com a responsabilidade de
reorganizar a Atenção Primária à saúde, objetivando, principalmente, a promoção de
saúde, melhorando assim a qualidade de vida da população. A partir de
levantamentos epidemiológicos realizados no país foi possível conhecer as
necessidades em saúde bucal. A partir daí, foram incluídas as equipes de saúde
bucal no Programa de saúde da Família.
O Trabalho das equipes de saúde bucal, dentro dos princípios e diretrizes dessa
estratégia, requer competência e habilidades próprias.
Sendo assim, a qualificação profissional é uma etapa fundamental na construção
desse novo modelo de assistência em saúde. Temos no Curso de Especialização
em Atenção Básica em Saúde da Família uma excelente iniciativa.
11
Em 2007, quando da publicação do edital para o Curso de Especialização em
Atenção Básica em Saúde da Família (CEABSF), participei do processo seletivo e
fui aprovada. Iniciei o curso no primeiro semestre de 2008 vinculado ao pólo de
Teófilo Otoni.
Foi um momento de muita reflexão acompanhar o curso, trabalhando e fazendo as
atividades, sempre que possível, no meu próprio trabalho. O formato do curso, por
meio de tutoria, levou-me a ter uma maior responsabilidade com o meu processo de
aprendizagem.
Durante o desenvolvimento do curso fui percebendo que o processo de implantação
das equipes de saúde bucal e o trabalho das mesmas ainda estão, de forma
incipiente, incorporando os princípios e diretrizes de Estratégia Saúde da Família.
Com isso, a concepção da mudança do modelo proposto fica comprometida,
trazendo, muitas vezes, insatisfação entre gestores, profissionais da saúde e
usuários.
Um serviço de saúde deve atender às necessidades demandadas pela população e
também desenvolver ações promotoras de saúde baseadas no conhecimento e
tecnologia científicas atuais. Por isso é fundamental que haja número de
profissionais compatível tanto com a demanda curativa quanto preventiva.
Quando realizei a disciplina planejamento e avaliação das ações de saúde e fiz o
diagnóstico da minha área de abrangência foram identificados vários problemas
relevantes e prioritários para ser trabalhados. Mas quando cursei as disciplinas
Saúde Bucal aspectos básicos e atenção ao idoso, reafirmei que as minhas
atividades não estavam sendo realizadas como preconizadas pelo Ministério da
Saúde (MS), pelo fato do meu trabalho ser dentro do consultório, atendendo
usuários agendados para tratamento curativo.
Com base nesta realidade, optei por realizar este trabalho com a finalidade de
levantar na literatura nacional como vêm sendo realizadas as ações de saúde bucal
junto às equipes de saúde da família (CAMPOS; FARIA e SANTOS, 2008).
12
2 JUSTIFICATIVA
É de fundamental importância entender o processo histórico do desenvolvimento das
ações de saúde bucal. A Odontologia sempre teve um caráter predominantemente
individualista, privado, curativo, remunerado pela doença, pouco valorizada no
âmbito social. Na atualidade, temos uma odontologia que muito evoluiu em termos
técnico-científicos, sendo hoje considerada como de primeiro mundo. Porém, à
mesma só tem acesso as pessoas mais ricas da sociedade.
As inúmeras transformações ocorridas nas últimas décadas com destaque para as
transições epidemiológica, demográfica e político-institucional, trouxeram a
necessidade da construção de modelos capazes de responder às novas realidades
sanitárias como o declínio das doenças agudas em jovens e o incremento das
crônicas em idosos; o deslocamento do objeto das práticas de indivíduos para
famílias; o desenvolvimento de novas abordagens voltadas para hábitos e estilos de
vida; às novas concepções de práticas educativas e a busca de novos cenários de
práticas de saúde (GOULART, 1999).
A Odontologia, em suas especialidades Saúde Coletiva e Saúde Pública, ainda não
conseguiu um meio de atingir os grandes problemas da saúde bucal, apesar desses
problemas serem passíveis de controle ou totalmente evitáveis por meio de métodos
simples e acessíveis. Têm-se ainda uma visão que para se ter saúde bucal é preciso
ter sorte ou ser rico. Esse é um paradigma a ser vencido. Quem tem melhores
condições socioeconômicas, certamente terá melhores condições de saúde, devido
a um conjunto de fatores determinantes.
Outra característica marcante do modelo de atenção à saúde bucal é que o acesso
se dá por livre demanda, ou seja, pela demanda espontânea. Dessa forma, a
organização do serviço não se faz na lógica da programação e ainda prioriza as
ações curativas (ZANETTI et al., 1996). Caracteriza-se, portanto, como uma
concepção de prática da odontologia orientada pelo mercado e para o mercado, e
não pelas reais necessidades de saúde da população.
13
Segundo Oliveira et al., (1999), esse modelo de assistência odontológica, que possui
traços idênticos em sua prática pública e privada, pouco tem contribuído para a
melhoria das condições de saúde bucal da população.
A Odontologia em Saúde Pública ainda vem gerando uma atenção deficiente,
mutiladora, excludente, quando a maior parcela da população só tem acesso a um
atendimento odontológico básico e em caráter de urgência.
Pelos estudos epidemiológicos realizados no país em 2003, foi possível conhecer a
realidade de saúde bucal e a partir daí formular propostas que pudessem reorientar
as práticas em saúde bucal. A Política Nacional de Saúde Bucal propõe garantir as
ações de promoção, prevenção e recuperação da saúde bucal dos brasileiros,
entendendo que esta é fundamental para a saúde geral e qualidade de vida da
população. Suas metas incluem a reorganização da prática e a qualificação das
ações e serviços oferecidos, no marco do fortalecimento da atenção básica,
reunindo uma série de ações em saúde bucal, com ampliação do acesso ao
tratamento odontológico gratuito aos brasileiros, por meio do SUS (BRASIL, 2004).
A Promoção da Saúde representa uma estratégia promissora para enfrentar os
múltiplos problemas de saúde que afetam as populações humanas. Propõe a
articulação de saberes técnicos e populares e a mobilização de recursos
institucionais e comunitários, públicos e privados, para o enfrentamento de
problemas, estando atualmente associada a um conjunto de ações e valores como
intersetorialidade, a solidariedade, a equidade, a cidadania, o desenvolvimento
social, a participação comunitária. Ademais, sua operacionalização implica na
responsabilização múltipla pelos problemas e por suas soluções, através da
combinação de ações do Estado (políticas públicas saudáveis), da comunidade
(reforço da ação comunitária), de indivíduos (desenvolvimento de habilidades
pessoais), do sistema de saúde (reorientação do sistema de saúde) e de parcerias
intersetoriais (BUSS, 2000).
14
A Estratégia Saúde da família, nesse contexto, vem com uma visão coletiva,
promotora de saúde, sentido oposto ao implantado anteriormente.
A regulamentação da inserção da saúde bucal junto às equipes de saúde da família
ocorreu em 2000 com a publicação da portaria nº 1.444 de 28 de dezembro de 2000,
estabelecendo incentivo financeiro aos municípios pelo número de equipes
implantadas e também oferecendo suporte inicial para a reorganização da atenção à
saúde bucal no contexto da saúde da família (BRASIL, 2000).
Reconhece-se que a portaria representa um avanço do ponto de vista da
universalização das ações de odontologia à população. No entanto, pela história das
práticas do profissional cirurgião dentista que sempre se deu de forma individual e
mais direcionada as práticas clínicas dirigidas para uma clientela restrita, voltada
principalmente para o atendimento da demanda espontânea e urgências, ainda não
se atingiu o preconizado na portaria ministerial pelas equipes de saúde bucal já
implantadas.
As práticas recomendadas para que os profissionais das equipes de saúde bucal
incorporem no cotidiano do trabalho para contribuir na mudança do modelo
assistencial, como o reconhecimento do território, o levantamento epidemiológico, a
classificação de risco, não vem sendo realizadas. Reproduz-se ainda o modelo
curativo com as atividades restauradoras. Em muitos locais não houve uma real
inserção da saúde bucal nas equipes de saúde da família. O que ocorre é o
atendimento clínico da população adscrita, sem a vinculação da equipe de saúde
bucal ao território e aos outros profissionais.
Tradicionalmente, o modelo de atenção odontológica hegemônico no setor público
do país, tem se caracterizado pela falta de racionalidade e programação de suas
ações. Essas práticas decorrem de uma concepção centrada na assistência
odontológica ao indivíduo doente, realizada com exclusividade por um sujeito
individual – o cirurgião-dentista – no restrito ambiente clínico cirúrgico (NARVAI,
1994).
15
Algumas concepções de programação científica da saúde bucal começaram a ser
formuladas a partir da década de 50, devido à necessidade de ajuste as novas
demandas do mercado e da sociedade de consumo, em nível privado, e no público,
em função da necessidade de aumento da produtividade, expansão da cobertura e
uma visão funcional da odontologia em saúde pública, ligada aos processos
preventivos com flúor sistêmico e tópico (CORDON, 1998).
Neste período, segundo Zanetti, et al. (1996), algumas concepções de programação
em odontologia foram formuladas, sendo as mais importantes:
• o sistema incremental, direcionadas a escolares de 6 a 14 anos e que se
manteve hegemônico por mais de 30 anos;
• o modelo de atenção simplificado baseado na concepção de aumento da
produtividade e redução dos custos;
• o modelo da odontologia integral, que deu maior ênfase à prevenção e a
aplicação do conceito de risco.
Dentre os diversos modelos gerenciais, o que se estabeleceu como hegemônico foi
o Sistema Incremental em escolares, geralmente vinculado aos programas de Saúde
Escolar. Este sistema visava o completo atendimento dental de uma população
dada, eliminando suas necessidades acumuladas e posteriormente mantendo-a sob
controle. Desenvolvido inicialmente nos EUA, alcançou expressiva difusão no Brasil,
a partir de trabalhos da Fundação SESP (PINTO, 1993).
O Sistema Incremental resume-se em um programa intensivo e curativo, amparado
em uma metodologia preventivo-educativa pobre que tentava resolver em curto
espaço de tempo problemas acumulados em um seguimento populacional pequeno
(escolares). Seus resultados foram satisfatórios quanto aos tratamentos
completados em escolares, porém não houve redução do índice de cárie da
população brasileira, como pretendia seus idealizadores. Os elementos cariados
eram substituídos pelos restaurados, não alterando o valor final no índice CPOD
(dentes cariados, perdidos e obturados).
16
O modelo incremental teve sua importância na odontologia porque foi um marco da
programação do serviço público odontológico, quebrou a hegemonia da livre
demanda dos consultórios. Deve-se considerar, ainda, a época em que este modelo
foi idealizado, quando os conhecimentos a respeito de cariologia, microbiologia e
planejamento em saúde estavam em um patamar inferior ao hoje experimentado.
Entre os anos 50 e fins dos anos 80, a assistência odontológica pública no Brasil era
caracterizada pela predominância de assistência a escolares (na maioria das vezes
com Sistema Incremental). Para o restante da população, a assistência se dava de
forma pulverizada nas diversas instituições, entre elas as conveniadas com o
Sistema Previdenciário (INAMPS), as Secretarias Estaduais de Saúde e entidades
filantrópicas (NARVAI, 1994; ZANETTI et al., 1996).
Os problemas identificados nos usuários a partir do levantamento epidemiológico
realizado em muitos municípios brasileiros verificando a existência de um acúmulo
de doenças, os gestores municipais detectaram a necessidade de ampliar a
produtividade dos serviços com conseqüente aumento dos custos, pois já no início
dos anos 70, o Sistema Incremental se mostrou como um modelo superado tanto do
ponto de vista de sua eficácia, quanto de sua abrangência e cobertura (OLIVEIRA,
1999).
Com base nessa realidade, o atendimento odontológico foi ampliado a essa
demanda reprimida e o cirurgião dentista continuou seguindo um modelo curativista,
levando-o a atuar em problemas emergentes com conseqüências mutiladoras, pela
ausência de medidas preventivas feitas em momentos oportunos.
O caminhar da atenção à saúde bucal foi marcada por vários tipos de modelo e
atualmente vive-se a sua integração à equipe de saúde da família. No entanto
percebe-se que ainda não conseguiu fazer a transformação do modelo proposto.
Pretende-se neste estudo, a partir de uma revisão bibliográfica da literatura
compreender como vem se dando a inserção da saúde bucal na estratégia saúde da
família.
17
3 OBJETIVO Analisar na literatura nacional a produção cientifica sobre a inserção da saúde bucal
na estratégia saúde da família
18
4 METODOLOGIA A medicina baseada em evidências vem sendo muito utilizada em pesquisas
principalmente naquelas voltadas para a prática clínica. Com o intuito de levantar o
caminhar da atenção a saúde bucal na atenção primária à saúde busquei na
literatura nacional por meio de uma pesquisa bibliográfica livre, mas direcionada
para identificar as publicações que abordassem a inserção da saúde bucal na
estratégia saúde da família.
A revisão da literatura, segundo Leopardi, et al., (2002), deve ser feita em todo
trabalho científico para identificar o que já existe sobre o tema a ser estudado e
assim relacioná-la com o problema formulado para o estudo e ainda, evitar
duplicação de esforços e a reafirmação de idéias já amplamente discutidas ou
esclarecidas.
Trata-se, portanto de uma análise de literatura publicada em artigos em periódicos
sobre um tema que se deseja pesquisar.
4. 1 Método O caminho adotado para a realização deste trabalho foi de uma revisão narrativa,
que segundo Rother (2007), é condizente para descrever um determinado assunto,
sob o ponto de vista das pesquisas já realizadas e com diferentes concepções. A
revisão narrativa possibilita o uso de publicações com diferentes metodologias, sem,
contudo perder a cientificidade do trabalho a ser realizado. A busca dos artigos
ocorreu apenas nos periódicos nacionais e foram utilizados os seguintes descritores:
• Saúde bucal;
• Saúde bucal no programa saúde da família;
• Saúde bucal na atenção básica.
19
5 REVISÃO DE LITERATURA
Estudos demonstram que a saúde bucal afeta as pessoas física e psicologicamente,
influenciando a maneira como elas crescem, se divertem, falam, mastigam,
saboreiam os alimentos, nutrem-se e se socializam. Interferindo em seu bem estar
social, na sua aceitação no mercado de trabalho e ainda reflete a sua estreita
relação com a saúde em geral e com a sua qualidade de vida (SHEIHAM, 2005).
Watt (2005) mencionava que as doenças bucais levam a desconforto, dor,
sofrimento, noites sem dormir, dificuldade na função mastigatória e nutrição e horas
fora da escola e do trabalho, produzindo negativo impacto no indivíduo e na
sociedade.
No Brasil, a esfera privada sempre foi o locus de excelência para a oferta das
práticas profissionais em Odontologia, tendo sido a esfera pública formada e
operada como secundária na definição das relações, modos e mecanismos de
regulação do exercício profissional (ZANETTI, 2000).
No entanto, o emprego de tecnologias, como a fluoretação da água, a escovação, o
uso tópico de flúor e o aumento da oferta de serviços de saúde bucal, o Setor
Público tem sido preponderante para a conquista e manutenção de melhores índices
em saúde bucal para a população em geral.
Nickel; Lima; Silva (2008) mencionam que somente a partir da criação do Sistema
Único de Saúde (SUS) a assistência odontológica passou a ser universal, até então
era voltada apenas para os trabalhadores que contribuíam para o Instituto de
Assistência Médica da Previdência Social (INAMPS). A atenção odontológica no
Brasil passou por diferentes Sistemas. Na década de 50 tivemos o sistema
Incremental, que foi financiado pelo governo americano e desenvolvido pelas
Unidades montadas pela Fundação Especial de Saúde Pública (FSESP). Esse
Sistema tornou-se um programa para assistência de escolares na faixa etária de 6 a
20
14 anos de idade, eleita por ser a faixa de idade que possui a maior incidência de
cárie. Contam à época com a fluoretação da água como recurso preventivo e, na
inexistência desse recurso, utilizava a aplicação do flúor tópico. Esse sistema trouxe
a discussão da importância da prevenção, mas na prática tornou-se mais curativo,
pois enfatizava as ações restauradoras. Em síntese esse sistema era excludente,
pois atendia somente escolares na faixa de idade de 6 a 14 anos. Os autores
destacaram que apesar de todas as deficiências esse sistema foi um marco
importante da implantação da odontologia no serviço público. Outra experiência que
a Odontologia teve foi o Programa Inversão da Atenção que se orientava
prioritariamente para controlar a cárie e depois para a restauração. Foi também
excludente, pois se voltava para escolares, crianças de creches, ou seja, atuava em
ambiente fechados. Outro sistema que a odontologia perpassou foi de Atenção
Precoce voltado para a primeira infância, resgatou a criança de idade inferior a 6
anos, que encontrava-se fora da Escola. Denominava-se Clínica do Bebê. Obteve
bons resultados como a redução da cárie nos anos subsequentes porque fazia à
parte, medidas preventivas de acompanhamento de 2/2 meses. A criança quando
chegava à idade escolar já vinha com a prevenção realizada.
Esses mesmos autores apontam que, em 2001 o Ministério da Saúde, após a
implantação das equipes de saúde da família e entendendo ser importante o
atendimento integral das famílias nos territórios de abrangência dessas equipes,
regulamenta a inserção das equipes de saúde bucal às equipes de saúde da família
para contribuir na melhoria da qualidade de vida dos cidadãos adscritos às equipes
de saúde. A incorporação da saúde bucal na atenção básica trouxe no seu esboço
as ações voltadas para a promoção, prevenção, controle e tratamento das doenças
bucais, priorizando a eliminação da dor e da infecção. Para tanto, Nickel; Lima; Silva
(2008) ressaltam a importância da utilização dos recursos da epidemiologia para a
identificação dos problemas de saúde bucal da população. A saúde bucal na saúde
da família preconiza os princípios da universalidade e da integralidade e assim
pressupõe reduzir o fluxo de usuários para a atenção secundária. Os autores foram
enfáticos em destacarem que esse modelo ainda não atingiu todas as equipes de
saúde da família, tendo, portanto uma cobertura ainda pequena da população
brasileira.
21
Pimentel, et al., (2010), fizeram um estudo sobre a atenção à saúde bucal na
estratégia saúde da família num distrito sanitário da cidade de Recife. Encontraram
que as primeiras equipes implantadas fizeram os diagnósticos dos territórios para a
definição do perfil epidemiológico das famílias e posterior elaboração da
programação. As equipes mais recentes não tiveram a vivência de fazerem o
diagnóstico e as programações. Essas últimas equipes alegaram falta de tempo para
realizarem essas atividades, levando os autores a inferirem que não existe um
planejamento das atividades dos profissionais das equipes de saúde bucal. Outros
pontos foram destacados como: o não reconhecimento por parte de alguns gerentes
das Unidades Básicas de Saúde (UBS) de como deve ser o trabalho de saúde bucal
dentro de uma nova concepção de organização do trabalho; o compartilhamento do
trabalho com outros profissionais; a realização de ações fora dos muros da UBS; o
aproveitamento de oportunidades para realização de palestras, entre outros. A visão
perpetuada por esses gerentes é do trabalho do cirurgião dentista dentro do
consultório odontológico. Os autores destacam na pesquisa que encontraram como
pontos negativos apontados pelos participantes do estudo, a falta de capacitação
dos profissionais da saúde bucal para atuarem dentro do novo modelo, a demanda
excessiva para atendimento de demanda espontânea, a precarização das relações
de trabalho com baixos salários, contratações instáveis e a falta de articulação entre
a equipe de saúde da família e de saúde bucal.
Narvai, (2006: p.145), discutindo a importância do enfrentamento, em profundidade,
dos problemas da saúde bucal a serem trabalhadas pelos cirurgiões dentistas
destacam que ser necessárias competências desses profissionais e para tanto se
entende que
[...] o sistema de ensino superior não está cumprindo o seu papel na formação de profissionais comprometidos com o SUS e com o controle social. A formação dos trabalhadores da saúde não se orienta pela compreensão crítica das necessidades sociais em saúde bucal e é conduzida sem debate com os organismos de gestão e de participação social do SUS [...]
22
As discussões sobre o processo de formação do cirurgião dentista reforçam que os
conteúdos técnicos são fortemente direcionados para os ambulatórios instalados das
Faculdades de Odontologia e deixam de inserir os acadêmicos em cenários que
contemplem a realidade social da população (PIMENTEL, et al.,2010). Não resta
dúvida que movimentos indutores de mudança estão sendo construídos pela própria
legislação do Ministério da Educação - Diretrizes Curriculares Nacionais para o
ensino de graduação em odontologia – enfatizando a importância da articulação
entre o ensino e os princípios do Sistema Único de Saúde (SUS).
No estudo realizado por Rodrigues, et al., (2009), encontraram que apesar dos
entrevistados afirmarem que o atendimento Odontológico é organizado, se
contradizem porque informaram também o desconhecimento do quadro de
necessidades da comunidade pela ausência do diagnóstico epidemiológico da saúde
bucal. Pelas informações levantadas e analisadas os autores confirmaram que o
atendimento se processava de acordo com a queixa do usuário, predominando,
portanto, o atendimento individual. Nesse estudo, os autores destacaram a
insatisfação dos cirurgiões dentistas entrevistados com o nível salarial deficitário
levando-os a atuarem no setor público e no privado para suprirem as suas
necessidades financeiras. Foi um ponto positivo encontrado pelos pesquisadores, a
resposta da maioria dos entrevistados que no contexto da formação tinham
conteúdos das diretrizes do SUS e sobre o processo de trabalho preconizado na
estratégia saúde da família nas disciplinas da graduação, e ainda que os mesmos
tinham uma visão da saúde bucal como uma ação a ser desenvolvida coletivamente
e que a política de saúde bucal aponta para um avanço no modelo de atenção em
odontologia.
No tocante ao ensino da odontologia, Matos e Tomita (2004), comentam que o
processo de formação do profissional está voltado para conteúdos técnicos e os
cenários de aprendizagem são ainda os próprios ambulatórios das Faculdades sem
oportunizar o estudante o viver e o conviver com os problemas sociais dos usuários.
Destacam a importância de modificar o processo de formação do cirurgião dentista
por meio da relação entre teoria e prática para retirar a formação do acadêmico da
23
contramão das necessidades de saúde bucal da população. As autoras comentam
que:
[...] as políticas públicas de saúde, ao inserir as ações de saúde bucal no PSF, propõem uma reorganização na atenção básica de saúde bucal, o que requer uma reflexão sobre o enfoque dado pelas instituições de ensino superior à formação do cirurgião dentista (MATOS; TOMITA, 2004, p. 1541).
A responsabilidade pela preparação do profissional, cirurgião dentista, para atender
as demandas das políticas públicas têm ficado mais na responsabilidade das
instituições de serviços, o que acarreta um desgaste grande do profissional e para a
população usuária do serviço.
Barbosa; Brito e Costa (2007), afirmam que o planejamento das ações de saúde é
fundamental para a reorganização das práticas e esse deve ser feito com a
participação de toda a equipe de saúde da família e com a comunidade, tendo em
vista a necessidade de se otimizar o tempo em virtude da grande demanda
reprimida existente na comunidade. O planejamento vai ajudar a ordenar de forma
sistemática as ações a serem realizadas pela equipe de saúde bucal para assim
reduzir as desigualdades de acesso aos serviços de odontologia. Os autores citados
destacam que para dar sustentabilidade ao trabalho das equipes de saúde bucal
junto ao PSF fazem-se necessárias:
Práticas diferenciadas das executadas no modelo assistencial ora vigente, como agendamento das consultas, visitas domiciliares, trabalhos com grupos específicos, propiciando o envolvimento de todos os segmentos da comunidade para assim se conseguir um efetivo controle social (BARBOSA; BRITO; COSTA, 2007, p. 55).
No trabalho realizado por Barbosa; Brito e Costa (2007) comentam que é uma utopia
pensar que uma equipe de saúde bucal seja capaz de resolver todos os problemas
bucais simplesmente pelo desenvolvimento da prática clínica dentro do consultório. É
preciso que a equipe de saúde bucal compreenda a importância do desenvolvimento
de outras ações fora do consultório, agregando as ações de promoção, prevenção e
24
de educação em saúde junto aos grupos sociais que integram o território da Unidade
Básica de Saúde.
Antunes; Narvai (2010) analisam duas ferramentas que nas últimas décadas foram
expandidas em todo o país, fluoretação da água de abastecimento e o atendimento
odontológico, se referenciando no princípio constitucional de universalização de
ações e serviços de saúde. A criação do SUS na constituição de 1988 é decisiva para
a oferta de serviços odontológicos no país. Os princípios constitucionais do SUS, tais
como: universalidade, integralidade e equidade reconhecem a saúde bucal como
parte indissociável da saúde geral. Nos levantamentos epidemiológicos de âmbito
nacional constata-se uma redução da prevalência de cárie, indicando a efetividade da
fluoretação da água, embora haja marcantes desigualdades regionais na experiência
de cárie associado à forma como a fluoretação das águas vem sendo implantadas. É
preciso direcionar ações para que o princípio da equidade seja atingido, levando o
benefício para áreas onde é mais necessário, diminuindo assim tais desigualdades.
Essa é uma medida desejável, já que o flúor é amplamente reconhecido como
importante determinante no risco à cárie e tem fácil acesso à população através da
água fluoretada.
O aumento da oferta dos serviços odontológicos públicos vem ao encontro de uma
população historicamente excluída, com inúmeras necessidades em saúde bucal,
diminuindo a hegemonia da clínica privada dos serviços de saúde bucal no Brasil,
aumentando significativamente a oferta de trabalho para os profissionais da área.
Essa expansão dos serviços odontológicos implica em correta alocação de recursos,
já que não é possível uma cobertura imediata e completa. Impõe-se a priorização de
grupos: Crianças, gestantes, por exemplo. E também ações de promoção de saúde:
educação em saúde, ações preventivas.
A incorporação da equipe de saúde bucal na ESF em 2000 e o estabelecimento dos
CEO em 2004 representam novos impulsos para a ampliação da oferta de
atendimento odontológico (BRASIL, 2004).
25
Apesar de ainda não haver estudos que correlacionem índices em saúde bucal e
serviço público odontológico, as estratégias de ampliação da atenção odontológica
estão sendo favoráveis na diminuição das desigualdades em saúde (ANTUNES;
NARVAI, 2010).
Em um estudo de avaliação da Atenção à saúde bucal no Programa Saúde da
Família do Recife, tomando como referência aspectos políticos, técnicos e
administrativos, o autor identifica aspectos condicionantes, que contribuem para os
resultados alcançados. Dentre os elementos facilitadores podemos citar, entre outros:
- A adesão dos profissionais (médicos, enfermeiros e dentistas) efetivos ao programa
Saúde da Família. - A promoção de cursos introdutórios e de especialização em
Saúde da Família para todos os profissionais do PSF. Por outro lado podemos citar
outros fatores que comprometem a qualidade dos serviços prestados, tais como: - A
manutenção de uma proporção aproximada de uma ESB para duas ESF. - Formação
inadequada dos cirurgiões-dentistas para atuar no PSF. - Iniquidade de cobertura das
Equipes de Saúde da Família. - Falta de critérios e de um planejamento que
orientasse a implantação do PSF no município. – A falta de cargos oficiais para as
coordenações de saúde bucal. – A pouca qualificação de alguns coordenadores para
atuar nas atividades de gerenciamento (SILVA, 2008).
26
6 DISCUSSÃO DOS RESULTADOS
A complexidade do setor saúde, com grandes áreas de incerteza na
relação entre os problemas de saúde e as intervenções para resolvê-las
apesar da incorporação de novas tecnologias e da grande expectativa da
população, abre espaço permanente para a avaliação na prática de saúde.
Há discussões sobre as dificuldades da equipe de saúde bucal para
enfrentar de fato e resolver os problemas da saúde bucal da população
adscrita, por fatores relacionados à gestão, ao modelo vigente, aos
profissionais envolvidos e também aos usuários. Mencionam também as
questões relacionadas à formação do profissional cirurgião dentista que
ainda se faz em cenários não aderidos ao SUS, muitas vezes dentro dos
ambulatórios da própria Faculdade.
Os trabalhos analisados apresentam um cenário promissor na questão da
mudança do modelo de atenção a saúde bucal e ao mesmo tempo
sinalizam para os problemas ainda existentes no cenário da atenção à
saúde bucal.
A busca da qualidade de vida para a população brasileira só é possível
com ações que extrapolem a capacidade setorial do profissional, desde que
asseguradas as melhores evidências na oferta de ações e serviços de
saúde.
As discussões sobre as dificuldades dos gestores municipais entenderem o
processo de trabalho das equipes de saúde bucal junto às equipes de
saúde da família permeiam vários estudos, pelo fato de ainda ser cobrado
dos cirurgiões- dentistas uma cota de produção de procedimentos curativos
dentro de um ambiente fechado, não lhes possibilitando um trabalho com
as famílias dentro do território.
Reconhece-se que de fato houve um avanço na organização dos serviços
de saúde bucal com a implementação dos Centros de Especialidades
27
Odontológicas e os Laboratórios Regionais de Prótese Dentária, mas
sobretudo na compreensão da importância do atendimento dos princípios
do SUS, mas ainda é ínfima a incorporação desses princípios na prática.
28
7 CONSIDERAÇÕES FINAIS O cuidado com a saúde da população por meio dos princípios da Estratégia de
Saúde da Família requer o rompimento com o modelo hegemônico e curativista,
incorporando o conceito ampliado de saúde, sendo fundamental, nesse contexto, o
trabalho em equipe multiprofissional.
Neste sentido a implantação das equipes de saúde da família e de saúde bucal, por
si só, não garantem a modificação do modelo assistencial. Este depende da
mudança na forma de produzir o cuidado, assim como dos diversos modos de agir
dos profissionais, entre si, e com os usuários e ainda do investimento tecnológico
disponibilizado para a realização do trabalho. A disponibilização do equipamento
odontológico não garante um atendimento qualificado e aderente às necessidades
da população no que diz respeito à saúde bucal. Ainda existem muitos gestores que não têm uma visão mais ampla do conceito de
saúde, e também grande parte dos profissionais da odontologia não estão
comprometidos com a mudança do modelo assistencial. A população também
deseja um profissional voltado apenas ao atendimento clínico.
O serviço de saúde bucal na esfera pública realmente tem avançado nos últimos
tempos, tanto por parte do governo, por meio de leis e incentivos, quanto pelos
profissionais da saúde, que pelo entendimento da necessidade de mudança na
abordagem à saúde, tem se disposto a enfrentar as mudanças necessárias em
busca de melhores indicadores em saúde bucal, porém ainda é tênue essa
disposição para a mudança.
Entende-se que a Estratégia Saúde da Família vem contribuindo para a ampliação
da inserção da saúde bucal na atenção primária à saúde. Há ainda muitas
demandas para que de fato a saúde bucal seja mais eficiente e transparente nos
indicadores sociais. Para tanto são necessários:
29
• Maiores investimentos financeiros porque os procedimentos odontológicos
não se fazem somente com o equipo odontológico.
• Ampliação do número de equipes de saúde bucal em ambas as modalidades
para beneficiar um percentual maior de usuários do serviço público.
Os estudos analisados demonstraram que muitas das práticas exercidas pela equipe
de saúde bucal não se efetivam por falta de insumos e de priorização por parte da
gestão municipal. Assim a política nacional de saúde bucal fica mais no papel que
na prática.
A falta de conhecimento das necessidades locais, refletida nos diagnósticos
precários por deficiências no levantamento epidemiológico, no monitoramento e na
avaliação das atividades têm dificultado a obtenção de uma adequada assistência
odontológica à população.
É notória também a falta de capacitação e entendimento de muitos gestores com
relação à proposta da Estratégia de Saúde da Família. Preocupam-se apenas com o
atendimento do doente. Não visualizam um serviço que promova saúde e bem estar
e evite doenças em longo prazo. Na nossa realidade vemos os profissionais de
saúde bucal inseridos nas equipes de saúde da família realizando apenas o
atendimento clínico básico, agendados de acordo com uma livre demanda, sem
nenhum critério de prioridades para população adulta.
Ainda existem grandes barreiras para a consolidação do modelo de atenção
proposto, para que ele tenha condição de efetivamente substituir o modelo
tradicional. Foram identificadas dificuldades de estrutura e processos mais
elementares ao funcionamento da Estratégia Saúde da Família, além de alguns
resultados importantes não alcançados, o que nos leva a crer que, o modelo de
atenção tradicional (o modelo de mercado) continua sendo reproduzido, apenas
revestido de novas nuances.
Para os cirurgiões-dentistas, a mudança do modelo de atenção à saúde demanda
competências e aptidões para efetivar um planejamento do processo de trabalho em
30
equipe, sem, contudo, perder a especificidade do trabalho dos mesmos, de forma
autônoma e efetiva. Há ainda uma falta de priorização por parte da gestão municipal
nessa alocação da equipe de saúde bucal na APS.
Pode-se ainda salientar que, para a consolidação desse novo modelo proposto é
preciso um trabalho de orientação junto à população, que só entende assistência à
saúde da forma tradicional e, muitas vezes é resistente a novas práticas. O trabalho
do dentista é amplamente associado à cadeira odontológica. Qualquer atividade que
extrapole o consultório pode não ser entendida ou mesmo desejada por essa
população que ainda têm enormes demandas clínicas e entendem que a única
forma do dentista ajudá-la é tratando de seus dentes já acometidos pela doença.
É preciso rever, historicamente, os princípios que nortearam a assistência
odontológica à população, corrigir rotas baseadas em evidências científicas
buscando uma sociedade mais saudável, profissionais mais qualificados dentro de
uma visão social mais humanitária, com cidadãos mais valorizados e mais
satisfeitos.
O caminhar da odontologia, em seu contexto, e seus frutos, são os melhores
mecanismos para se entender o seu fazer no presente e os rumos que deve seguir
para contribuir com a saúde oral da população brasileira. Por outro lado, é
importante que as instituições formadoras de recursos humanos para a saúde,
aproximem-se precocemente do SUS seus alunados de forma que eles vivenciem os
processos de trabalho e se incorporem aos mesmos.
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REFERÊNCIAS
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