Avaliação do risco de degradação da qualidade da água em bacias hidrográficas agrícolas em situação de cheia
Maria C. Gonçalves1, Tiago B. Ramos2, Maria A. Branco1, David Brito3, José Tavares1, Sara Rodrigues1, Ângela Prazeres1, José C. Martins1, Manuel L. Fernandes1 e Fernando P. Pires1
1Instituto Nacional de Investigação Agrária e Veterinária, UEIS Sistemas Agrários e Florestais e Sanidade Vegetal 2CEER–Centro de Engenharia dos Biossistemas, Instituto Superior de Agronomia 3Instituto Superior Técnico
Estudo realizado no âmbito dos projectos PTDC/AGR-AAM/098100/2008 EUTROPHOS e SOE1/P2/F146 AGUA FLASH
1 Encontro Anual da SPCS 2013, Oeiras
Introdução
As cheias são fenómenos naturais responsáveis pelo transporte de sedimentos e nutrientes para as linhas de água.
Originam picos de poluição que podem durar de poucas horas a alguns dias e podem conduzir à eutrofização dos rios e reservatórios e à contaminação da água potável.
2 Encontro Anual da SPCS 2013, Oeiras
No caso do sudoeste Europeu, devido às características do clima mediterrânico, dos solos e do uso da terra, as cheias têm um contributo muito importante para a remoção de sedimentos, pesticidas, fósforo e azoto do solo, originando uma consequente degradação do solo e da água.
3 Encontro Anual da SPCS 2013, Oeiras
O fósforo, sendo um factor limitante para a produção primária, é transferido dos solos agrícolas, ligado às partículas do solo, através do escorrimento superficial e da erosão do solo.
O azoto é, também, muito importante na produção autotrófica, nomeadamente na forma de nitratos, sendo fundamentalmente transportado nas águas de drenagem.
4 Encontro Anual da SPCS 2013, Oeiras
• Devido ao caracter esporádico das cheias, os picos de poluição podem escapar aos sistemas clássicos de monitorização, baseados em amostragens sazonais ou mesmo mensais.
• Programas de monitorização contínua são essenciais para compreender a dinâmica dos sedimentos e dos nutrientes na bacia hidrográfica.
• A monitorização não fornece contudo informação da fonte dos sedimentos ou dos nutrientes.
• A histerese verificada na relação concentração-caudal pode ser analisada para obter aquela informação.
5 Encontro Anual da SPCS 2013, Oeiras
Objectivos
• Estudar a evolução da qualidade da água durante as cheias ocorridas na bacia do Enxoé ao longo do ano hidrológico 2010-2011.
• Determinar a carga de sedimentos e de nutrientes para o reservatório do Enxoé.
• Determinar a origem desses sedimentos e nutrientes, baseado na interpretação das curvas de histerese na relação concentração-caudal.
6 Encontro Anual da SPCS 2013, Oeiras
Bacia hidrográfica do Enxoé a montante do reservatório (60 km2)
Água
Outros usos da terra
Povoação
Pastagens permanentes
Culturas anuais (17%)
Olival (18.3 %)
Montado (17.6 %)
Uso do solo:
Rio Enxoé com 9 km Altitude média 200 m
8 Encontro Anual da SPCS 2013, Oeiras
Others
Luvisols
Cambisols
Fluvisols
Soils:
Vertisols
Calcisols
Outros
Luvissolos (47%)
Cambissolos (28%)
Fluvissolos
Soilos:
Vertissolos (4%)
Calcissolos (13%)
Solos da bacia hidrográfica do Enxoé
9 Encontro Anual da SPCS 2013, Oeiras
Medições automáticas (sonda YSI):
• Nível de água
• Turbidez
Colheitas de água automáticas:
• Variação do nível de água de 10 cm
Colheitas de água manuais
• No rio Enxoé e na Ribeira de Vale de Vargo, quinzenalmente
15 Encontro Anual da SPCS 2013, Oeiras
Elementos monitorizados entre Outubro de 2010 e Junho de 2011:
• Nível de água
• Turbidez
• Concentração de sedimentos suspensos (SSC)
• Fósforo total (TP)
• Fósforo particulado (PP)
• Fósforo solúvel reactivo (SRP)
• Nitratos (NO3-)
16 Encontro Anual da SPCS 2013, Oeiras
Encontro Anual da SPCS 2013, Oeiras 17
• O caudal do rio foi calculado a partir do nível de água medido pela sonda e da geometria do leito do rio pela equação de Manning • As cargas de sedimentos e de nutrientes para o reservatório foram calculadas a partir do integral no tempo do produto das concentrações pelo caudal. • As cargas dos elementos particulados foram obtidas a partir dos valores de turbidez medidos automaticamente, devido à elevada correlação desta propriedade com os elementos particulados (R2 entre 0.792 e 0.897).
Histerese
• Sentido horário – O pico de
concentração chega antes do pico
da cheia
• Entradas rápidas do elemento no
rio - locais próximos
• Sentido anti-horário – O pico de
concentração chega depois do pico
da cheia
• Transferência para o rio mais lenta
e difusa - de locais mais afastados
• A histerese para um dado caudal é caracterizada por diferenças
na concentração de um elemento no ramo ascendente e
descendente do hidrograma.
• As relações entre a variação da concentração-caudal podem
resultar em trajetórias no sentido horário ou no sentido anti-
horário
20 Encontro Anual da SPCS 2013, Oeiras
Análise da histerese - Butturini et al. (2006)
Descreve o comportamento da histerese a partir de 2 parâmetros:
• (∆C) - as alterações relativas na concentração dos solutos;
• (∆R) - a área relativa e o padrão rotacional de cada curva da histerese.
A variabilidade dos 2 parâmetros pode ser descrita num plano unitário ∆C vs. ∆R, onde são identificadas 4 regiões de acordo com o aumento de concentração/diluição do elemento e o padrão rotacional (horário e anti-horário) da histerese.
Encontro Anual da SPCS 2013, Oeiras 21
Região A
Região B
Região D
Região C
22
0.0
0.2
0.4
0.6
0.8
1.0
0.0 0.2 0.4 0.6 0.8 1.0
Qnorm
Cnorm
Q C
Aumento da concentração no ramo ascendente
0.0
0.2
0.4
0.6
0.8
1.0
0.0 0.2 0.4 0.6 0.8 1.0
Tnorm
Qnorm
Cnorm
Q C Diluição no ramo descendente
0.0
0.2
0.4
0.6
0.8
1.0
0.0 0.2 0.4 0.6 0.8 1.0
Qnorm
Cnorm
Q C
Aumento da concentração no ramo descendente
0.0
0.2
0.4
0.6
0.8
1.0
0.0 0.2 0.4 0.6 0.8 1.0
Tnorm
Qnorm
Cnorm
Q C
Diluição no ramo ascendente
Horário Anti-Horário
Aumento da concentração
Diluição
ΔC (%)
ΔR (%)
0
5
10
15
20
25
30
35 0
5
10
15
20
25
30
29-9-10 3-11-10 8-12-10 12-1-11 16-2-11 23-3-11 27-4-11
Pre
cip
itaç
ão (
mm
)
Cau
dal
(m
3 s-1
)
Time (d)
Caudal Amostragens Precipitação
Out. 10
Fev. 11
Mar. 11
Abr. 11
Out. 10
24 Encontro Anual da SPCS 2013, Oeiras
Precipitação (mm) e caudal (m3 s-1) no rio Enxoé entre Outubro 2010 e Junho 2011. Podem observar-se as 5 cheias acompanhadas e as amostragens efectuadas.
0
250
500
750
1000
1250
1500
0
5
10
15
20
25
30
29-09-10 03-11-10 08-12-10 12-01-11 16-02-11 23-03-11 27-04-11
SS
C (
mg
L-1
)
Tu
rbid
ez (
NT
U)
Cau
da
l (m
3 s
-1)
Time (d)
Caudal SSC Turbidez
25 Encontro Anual da SPCS 2013, Oeiras
Caudal (m3 s-1), concentração de sólidos suspensos (SSC) (mg L-1) e turbidez (NTU) monitorizados entre Outubro 2010 e Junho 2011
0
1
2
3
4
5
6
7
8
0
5
10
15
20
25
30
29-09-10 03-11-10 08-12-10 12-01-11 16-02-11 23-03-11 27-04-11
TP, S
RP,
PP
(m
g L
-1)
Cau
da
l (m
3 s
-1)
NO
3- (m
g L
-1)
Tempo (d)
Caudal NO3- TP SRP PP
26 Encontro Anual da SPCS 2013, Oeiras
Caudal (m3 s-1), concentações de nitratos (NO3-), de fósforo total (TP),
particulado (PP) e solúvel reactivo (SRP) (mg L-1) observadas entre Outubro 2010 e Junho 2011.
f1.1
f2.1
f2.2
f3.1
f3.2
f3.3
f4.1
f4.2
f4.1
f1.1
f2.1
f2.2
f3.1
f3.2
f4.1f5.1
f1.1f2.1
f2.2
f2.3
f3.1
f3.2
f4.1
f5.1
-100
-80
-60
-40
-20
0
20
40
60
80
100
-100 -80 -60 -40 -20 0 20 40 60 80 100
ΔC (%)
ΔR (%)
anticlockwise
flushing
clockwise
dilution
Region A
Region B
Region D
Region C
-100.0
-80.0
-60.0
-40.0
-20.0
0.0
20.0
40.0
60.0
80.0
100.0
-100.0 -80.0 -60.0 -40.0 -20.0 0.0 20.0 40.0 60.0 80.0 100.0
SSC TP PP SRP NO3
SSC/TP/PP
NO3-
SRP
27 Encontro Anual da SPCS 2013, Oeiras
f5.1
Encontro Anual da SPCS 2013, Oeiras 28
Perdas Margens e leito do rio
Campos agrícolas a montante
(kg/ha.ano) Cheias (%) (%) (%)
SSC 414 55.3 46.4 53.6
TP 0.87 76.2 52.1 47.9
NO3- 33.7 15.2 - 84.8
• Os 5 eventos de cheias monitorizados entre Outubro de 2010 e Junho de 2011 revelaram grande variabilidade sazonal ao nível da dinâmica dos sedimentos e dos nutrientes na bacia hidrográfica do Enxoé.
• Os valores máximos para todos os elementos foram sempre observados durante as cheias, nomeadamente no Outono e Primavera.
30 Encontro Anual da SPCS 2013, Oeiras
O padrão da histerese alterou-se ao longo do ano:
• SSC, TP e PP - trajectória horária nas cheias do Outono até meio do Inverno e anti-horária no fim do Inverno e Primavera
• SRP apresentou trajectórias mistas dependendo da cheia e de práticas de fertilização locais. Não foi possível detectar um padrão.
• NO3- trajectória anti-horária, com excepção na
cheia de Fevereiro
31 Encontro Anual da SPCS 2013, Oeiras
O comportamento dos elementos particulados foi diferente dos elementos solúveis
• Os particulados chegaram muito rapidamente ao
rio, tendo sido arrastados essencialmente de locais próximos do rio, como o leito e as margens, dependendo da capacidade de transporte das linhas de água e da disponibilidade das partículas
• Os solúveis chegaram mais lentamente ao rio, por difusão lenta, a partir de locais a montante, dependendo das propriedades hidráulicas e das práticas agrícolas
32 Encontro Anual da SPCS 2013, Oeiras
• Os valores médios de erosão do solo foram relativamente baixos (414 kg/ha.ano), em que 55.3% corresponderam a sedimentos transportados durante as cheias.
• As perdas de fósforo foram altas (0.87 kg/ha.ano), com 76.2% ocorrendo também durante os mesmos períodos de cheias.
• As perdas de nitratos foram também relativamente diminutas (33.7 kg/ha.ano), ocorrendo ao longo do ano e não preferencialmente durante as cheias.
Encontro Anual da SPCS 2013, Oeiras 33
A implementação de práticas de conservação, tais como a adopção de técnicas de mobilização mínima, a preservação da vegetação ripária e a protecção das margens do pastoreio, com a consequente prevenção da sua degradação, poderão reduzir os depósitos de sedimentos no leito do rio e substancialmente as perdas de sedimentos e de nutrientes para o reservatório do Enxoé.
34 Encontro Anual da SPCS 2013, Oeiras
Recomendações