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Na semana passada, na aula teórica, discutimos as aplicações da citopatologia na
medicina clínica. E eu disse-vos que existem três grandes áreas onde a citologia é
importante: citologia exfoliativa, que se dividia em ginecológica e não ginecológica, e a
citologia aspirativa. E nós, na semana passada, discutimos a citologia exfoliativa,
principalmente a citologia ginecológica, e hoje vamos estudar um pouco mais em
detalhe a citologia aspirativa, chamada, então, citologia aspirativa por agulha fina.
Nós podemos definir a citologia aspirativa, num sentido estrito, como um diagnóstico
morfológico baseado num exame do material celular que foi puncionado, aspirado,
estendido, fixado e corado. Isto é uma forma muito redutora de definir citologia
aspirativa, se nós nos fixarmos apenas na técnica. Assim, as fronteiras da citologia
aspirativa ampliam-se quando a interpretação morfológica é combinada com a história
clínica, exame físico e com exames complementares, principalmente a imagiologia. E o
diagnóstico final deve ser, sempre, o chamado team work, deve ser um diagnóstico que
tenha em consideração todos aqueles aspectos. Portanto, a citologia realizada desta
maneira chama-se Citologia Clínica.
E um exemplo do que é a citologia clínica é este que vos vou demonstrar.
Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Biopatologia
BIÓPSIA ASPIRATIVA E “CORE BIOPSY”
23 de Abril de 2007 Prof. Fernando Schmitt
Fig 2 Fig 1
Fig 3 Fig 4 Fig 5
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Vocês vêem este doente (Fig.1), com múltiplos nódulos cutâneos e subcutâneos, uns
maiores, outros mais pequenos, no tórax e abdómen. Foi-nos pedido que fizéssemos
uma punção aspirativa de um destes nódulos. Nós puncionámos um nódulo, o nódulo
foi puncionado, aspirado, estendido, fixado e corado. Agora imaginem-se perante este
quadro morfológico e sem esta história clínica ou sem terem visto o doente. Estas
células que vocês vêem aqui (Fig.2) são células do tipo epitelial, linfóide ou
mesenquimatoso? Estas células são compridas, com núcleos alongados, a maior parte
destas células não estão em grupo, estão soltas e isoladas e ainda vemos aqui um
fragmento de colagéneo, elemento do estroma. Então, com estas dicas, já me sabem
dizer: são epiteliais ou mesenquimatosas? Mesenquimatosas. Apesar de ser um
esfregaço muito celular, não dá para ver aqui atipias, não há pleomorfismo, mitoses, ou
seja, não vemos aqui características de malignidade. E, portanto, se nós não tivéssemos
visto aquele doente, o máximo que poderíamos dizer dessa citologia é que se trata de
uma neoplasia mesenquimatosa com características de benignidade. Ora, quais são as
neoplasias mesenquimatosas com características de benignidade que vocês conhecem?
Lipoma, está certo. Leiomioma e fibroma. Muito bem! Já não está mal!
Prof. Sobrinho Simões:
Srs. Doutores, condroma, rabdomioma, neurofibroma...1
Isto é diferente... Vamos pegar nestas três que disseram: lipoma, leiomioma e fibroma.
Isto podia ser um lipoma? Não, porque não tem células adiposas. Podia ser um
leiomioma? Não, porque o leiomioma tem células musculares lisas. Aqui não se vê o
citoplasma das células, porque muitas vezes os citoplasmas das células, num esfregaço,
“caem”, não são identificáveis (isto é não é um corte histológico, é um esfregaço), mas
poderia eventualmente ser um leiomioma, mas não tem muita cara... Podia ser um
fibroma? Podia muito bem ser um fibroma: tem fragmentos de tecido conjuntivo,
colagéneo, células alongadas com núcleo alongado... Agora, se juntarem este aspecto
citológico de neoplasia benigna mesenquimatosa com a observação deste doente,
sabendo apenas que a citologia veio de um dos nódulos do doente, não acende nem uma
luzinha na cabeça de vocês? O que parece que o doente tem? Eu vou dar mais uma dica:
além destes múltiplos nódulos, se eu vos disser que, nas costas, o doente tinha uma
1 “Srs. Doutores, se vocês, nesta altura, não vão lá, estamos lixados!”
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mancha que chamamos “mancha de café com leite”, com áreas escuras e áreas claras...
Então aí já pensamos na possibilidade de ser uma Neurofibromatose. E o que significa o
nome neurofibromatose? Se eu dissesse que o doente tem uma lipomatose, o que é que
vocês pensavam que ele tinha? Que tinha múltiplos lipomas. Se é uma
neurofibromatose, é porque tem múltiplos neurofibromas. Então, se vocês olharem para
o doente e associarem as características morfológicas desta citologia, vocês facilmente
fazem o diagnóstico de neurofibroma. Um destes nódulos (Fig.3) foi, depois, retirado, é
um nódulo bem delimitado (lembrem-se que é uma neoplasia benigna), fuso celular
(Fig.4), e aqui (Fig.5) cora por imunohistoquímica para a proteína S100 que, em geral,
cora os tecidos de origem neural. Este exemplo é só para vos mostrar que, associando os
aspectos clínicos com os achados morfológicos, vocês conseguem, com a citologia
aspirativa, fazer o diagnóstico de uma maneira muito mais fácil e rápida.
Um ponto muito importante da citologia aspirativa é a técnica. Muitos erros e enganos
que acontecem na citologia aspirativa acontecem muito mais na hora de colher o
material do que na própria interpretação da lâmina. Portanto, nesta técnica, a colheita do
material é muito importante. E o sucesso da citologia aspirativa depende de alguns
passos prévios essenciais, como, por exemplo: conhecer a história clínica do doente,
localizar de uma forma muito precisa o nódulo a ser aspirado, por palpação ou por
imagem, verificar se a indicação da punção aspirativa está justificada. Por exemplo, na
tireóide, para nódulos inferiores a 1 cm de diâmetro, em geral, a punção aspirativa não
está indicada, só para nódulos de 1 cm ou mais, por causa da precisão da punção.
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Hoje em dia, praticamente toda a citologia aspirativa guia a agulha através de métodos
imagem, sendo o método de imagem mais comummente utilizado a ecografia. Mesmo
nos nódulos palpáveis, preferimos guiar a punção através da ecografia, para se saber
exactamente onde é que a agulha recolheu o material.
O material usado para fazer a citologia aspirativa consiste numa seringa, em geral de 10
ml, num aparelho que nós usamos para colocar a seringa e para criar pressão negativa e
em agulhas. E agora sim, por que é que nós dizemos que é citologia aspirativa por
agulha fina? Porque o diâmetro da agulha não pode ultrapassar os 0,6 mm, ou seja, este
é o diâmetro máximo de uma agulha considerada uma agulha fina. Sabem qual é o
diâmetro da agulha usada para colheita de sangue? É 0.8 mm.
Se eu vos disse que a citologia aspirativa é clínica, ela é também um método que exige
que se acompanhe uma série de passos: história e exame físico bem feito; uma palpação
bem feita do nódulo, se ele for palpável, ou uma localização precisa, se for por
ecografia; aspiração do material com agulha; depois da aspiração do material, temos que
o colocar em cima de uma lâmina, seja, fazer um esfregaço; depois do esfregaço, o
material é fixado e corado e, finalmente, interpretado no microscópio. O sucesso deste
método é maior quando um único indivíduo faz todos estes passos. Muitas vezes, não é
um único indivíduo que faz, alguns aspiram e outros interpretam no microscópio.
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Quando é o mesmo que aspira o doente e interpreta no microscópio, as taxas de sucesso
do método são bastante maiores.
A história e exame clínico são muito importantes. Por exemplo, uma senhora com
carcinoma da mama não podia ser operada, porque tinha um problema pulmonar que
não permitia fazer anestesia. Ela fazia tratamento hormonal com tamoxifeno, pois era
pós-menopáusica. Era acompanhada regularmente por punções aspirativas do nódulo da
mama. Numa das consultas em que iria fazer uma nova punção da mama, ao ser
examinada, foi-lhe detectado um nódulo subcutâneo, que, em princípio, seria uma
metástase do carcinoma da mama ou um lipoma, embora não tivesse sido observado nas
consultas prévias. Por isso, decidiu confirmar se aquilo era uma metástase do carcinoma
da mama, fazendo uma citologia aspirativa de agulha fina deste nódulo. Que tipo de
células observam aqui: epiteliais, linfóides ou mesenquimatosas? São linfóides. Na
realidade, ela tinha um linfoma, uma segunda neoplasia.
A palpação, quando o nódulo é palpável, é muito importante. Para fixar o nódulo,
principalmente quando é móvel, usam-se dois dedos e a agulha vai entrar exactamente
no meio. Quando o nódulo é muito pequeno (em geral são nódulos subcutâneos muito
pequenos), temos que usar um único dedo para pressionar e fixar e a agulha entra de
forma oblíqua, por baixo do dedo.
A aspiração é muito importante, porque é nesta fase que se cometem os maiores erros
técnicos da citologia por agulha fina. Portanto, estão a ver aqui um nódulo e a agulha é
colocada dentro do nódulo. Quando a agulha estiver dentro do nódulo, puxam o êmbolo
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da seringa, o que cria pressão negativa dentro da seringa e faz com que as células sejam
aspiradas. E vocês vão movimentar a agulha em diferentes direcções. É muito
importante que, antes de retirarem a agulha do nódulo, vocês soltem o êmbolo. Ao
soltá-lo, como há pressão negativa (não há ar aqui dentro), ele volta à posição original.
A punção aspirativa não é apunhalar o doente2! Numa punção bem feita não deve vir
sangue, não deve vir nenhum material para dentro da seringa. O material que queremos
tem que ficar na agulha. A não ser que seja um cisto cheio de líquido. Neste caso,
quando vocês colocam a agulha, o líquido enche a seringa. O líquido é, então,
centrifugado e nós fazemos citologia do líquido. Este passo é muito importante, porque
se vocês retirarem a agulha de dentro do nódulo com o êmbolo puxado, entra ar na
agulha e empurra as células para dentro da seringa. Como esta seringa é de plástico, as
células aderem ao plástico, sendo impossível retirá-las para as examinar. Por isso, é
muito importante que, antes de se retirar a agulha, se solte o êmbolo para que ele volte à
posição original. Só depois se retira a agulha de dentro do nódulo.
Depois, vem outra etapa do exame, o esfregaço3. Como se faz o esfregaço de sangue
periférico, em hematologia? (o professor explicou com gestos). Num esfregaço 2 “...enquanto não vier sangue para dentro da seringa, o médico que não fica satisfeito! Tem que encher de sangue, principalmente os cirurgiões gostam de encher de sangue! Aí eles dão aquela agulhinha cheia de sangue, tem o material cheio de sangue. Depois vocês dizem “Não tem material” “Mas, como? Eu entreguei a seringa cheia de sangue!!Como vocês dizem que não tem material???” Não tem material do tumor, tem é sangue.” 3 “Muita gente acha que fazer o esfregaço é colocar o material em cima de uma lâmina e depois esfregar, como quem esfrega a roupa!”
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hematológico, o material é o próprio sangue, e o que o que hematologista quer é contar
o número de células ou identificar alguma célula estranha, usando uma camada muito
fininha do esfregaço e, por isso, utiliza aquela técnica. Aqui, este tipo de esfregaço é
totalmente contra-indicado, porque no nosso material vamos ter células do tumor/lesão
e sangue, misturados. Em geral, as células da lesão são mais pesadas que as células do
sangue. Então, se vocês fizerem como num esfregaço hematológico, removem da
lâmina as células tumorais e deixam ficar as do sangue. Vamos então ver como se faz...
Lembram-se que retiraram a agulha com o êmbolo na posição original. A seguir, antes
de fazer o esfregaço, é preciso destacar a agulha da seringa, puxar o êmbolo para encher
a seringa de ar, colocar novamente a agulha na seringa e, finalmente, “empurrar” o
material para cima da lâmina. Por vezes, o material não sai todo. Por isso, usamos uns
truques: por exemplo, batemos com a agulha em cima da lâmina, com movimentos
secos, ou, com uma agulha de insulina, mais fina, fazemos aspiração da própria agulha e
depois colocamos o material na lâmina. E é assim que se faz o esfregaço: há uma lâmina
receptora e uma lâmina que faz o esfregaço. Vocês colocam o bordo superior desta
lâmina que faz o esfregaço junto ao material e fazem o movimento. Só que aqui há uma
grande diferença relativamente ao esfregaço hematológico: antes do material chegar ao
fim, vocês levantam a outra lâmina, de modo a não arrastar o material até ao fim da
lâmina receptora. Quando o material é líquido, podemos concentrá-lo recorrendo a uma
técnica: primeiro, com a outra lâmina, levamos todo o material “lá para cima”, voltamos
até ao meio e, a partir do meio, fazemos aquele mesmo tipo de esfregaço, nunca
trazendo esta lâmina até ao fim da outra. E assim fica feito o esfregaço.
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O esfregaço de boa qualidade (1) tem o aspecto de um cometa e nunca vai até ao fim.
Um exemplo de esfregaço de má qualidade é este que foi estendido por toda a lâmina e
veio até ao fim (2); outro exemplo é este que está muito espesso, tem muito sangue(3).
Se o esfregaço ficar mal feito, vamos ter que recolher novamente o material do doente.
Depois, temos a fixação e a coloração. Na fixação e coloração, vocês podem ou deixar o
material secar ao ar e depois este material é fixado só no momento da coloração
(colorações hematológicas, como o May-Grünwald-Giemsa-MGG, o Leishman...) ou
fixar em álcool 95 (colorações tipo Papanicolau, HE, imunocitoquímica) para fixar o
material imediatamente (vocês fazem o esfregaço e colocam num recipiente com álcool
ou usam spray; isto tem que ser muito rápido, porque se passar muito tempo entre o
esfregaço e a fixação, o material fica danificado, sendo, neste caso, preferível não fixar
e fazer coloração hematológica). Quando é que se faz um e quando é que se faz outro?
Depende do serviço que vocês tiverem e de quão o patologista que vai interpretar estas
laminas está treinado para um tipo de coloração ou outro.
E chegámos ao último passo, a interpretação citológica. É evidente que vocês, além de
colherem um bom material, esfregarem e fixarem, têm que saber o que significam
aquelas células.
Quando se pede para fazer uma citologia aspirativa (citologia clínica), o que é que o
clínico quer saber daquele nódulo? Quer saber primeiro se é benigno ou maligno, depois
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se é ou não curável, pode haver uma abordagem cirúrgica ou tem que ser feito outro tipo
de tratamento? E são estes tipos de resposta que temos que dar nos diferentes pólipos.
Aquilo que vêm agora é uma criança de um
ano de idade, com múltiplos nódulos
subcutâneos.
É benigno ou maligno? Múltiplos nódulos
subcutâneos numa criança de um ano, não
parece muito bom! Se é curável e se se deve
operar este nódulo, depende do diagnóstico.
Nesta criança, estes nódulos são uma metastase de um neuroblastoma (um tumor
maligno).
Prof. Sobrinho Simões: Blastoma é sempre maligno.
Agora vou mostrar-vos algumas aplicações da citologia aspirativa em alguns órgãos
onde é usada com mais frequência:
MAMA
Na mama, a citologia aspirativa é um método simples, rápido, barato, efectivo, e é
considerado o padrão de avaliação, tanto em lesões palpáveis, como em lesões não
palpáveis (sendo que em lesões não palpáveis deve ser guiado, ou por ecografia, ou pela
mamografia, uma técnica chamada de estereotaxia. (Lembrem-se que no seminário de
mama já falámos nas biopsias guiadas por estereotaxia.)
Neste órgão, a citologia aspirativa contribui para a decisão da conduta, tanto a nível
clínico como cirúrgico, sendo o material obtido frequentemente após o diagnóstico
primário. A mulher tem um nódulo, vocês puncionam e fazem o diagnóstico de
carcinoma, de um cisto ou de um fibroadenoma. Como muitas vezes o planeamento
terapêutico é feito antes da cirurgia, evidentemente que para nós deve ser o mais preciso
possível.
A citologia aspirativa por agulha fina e a biopsia por agulha grossa, mudaram um pouco
a filosofia dos nódulos de mama. Há 15-20 anos atrás, a mulher tinha um nódulo de
mama e não se sabia o que era. Ia para o bloco operatório, tirava o nódulo e fazia um
exame extemporâneo, para ver se era benigno ou maligno. Se fosse maligno, era
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imediatamente sujeita a mastectomia, se fosse benigno a cirurgia parava por ali. Isto era
muito agressivo pois a mulher nunca sabia se ia acordar com ou sem mama. Para além
disso, não podia discutir o tipo de cirurgia. Hoje em dia, como ela vai para o bloco com
o diagnóstico, já pode discutir se vai fazer uma cirurgia conservadora, uma mastectomia
com reconstrução…
A citologia aspirativa por agulha fina torna-se um método de “high tech” quando se
associa aos métodos de imagem, uma vez que juntos permitem o diagnóstico de um
carcinoma de dimensões muito pequenas, fazendo um diagnóstico muito precoce. E por
isso, na abordagem dos nódulos da mama, usa-se o tripé diagnóstico, tendo em conta a
clínica, a imagem e a citologia. Quando os três são benignos, o diagnóstico é de
benignidade (não é necessário retirar o nódulo ou fibroadenoma, a não ser por uma
questão estética). Pelo contrário, se os 3 forem malignos, a conduta é a cirurgia. Se
houver discordância, tem que se fazer uma biopsia.
Com a mamografia de rastreio, começaram a aparecer muitas lesões mamárias não
palpáveis, que são classificadas pelos radiologistas (classificação de I-V). Se acharem
que é benigno a mulher volta na próxima ronda da mamografia, se acharem que é
maligno faz a citologia, e se for suspeito tem que ser estudado. Existem várias formas
de estudar esta lesão: desde por citologia aspirativa por agulha fina, até cirurgia aberta
para remoção do nódulo (era o que se fazia antigamente). Hoje em dia há uma série de
outros métodos intermédios: citologia por agulha grossa, o chamado mamoton, que
parece um aspirador que aspira o nódulo (muito agressivo e caro).
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Um dos aspectos
mais frequentes da
mamografia, que
levanta a
possibilidade de
malignidade, são
as
microcalcificações
(sempre que forem retiradas deve documentar-se: fazer um biopsia, um RX dessa
biopsia para ver se as microcalcificações lá estão, e depois, se possível, observar no
corte histológico a presença da microcalcificação; porque se a agulha estiver no lugar
errado faz-se um diagnóstico de um falso-negativo).
Nos últimos anos tem havido uma grande pressão para substituir a citologia por agulha
fina pela biopsia por agulha grossa (CNB).
Na biopsia por agulha grossa extrai-se um cilindro de tecido. Os defensores desta
técnica defendem que esta é melhor que a citologia aspirativa por agulha fina porque se
obtém mais material, podem estudar-se os factores prognósticos e preditivos, e não é
necessário treino para fazer a citologia (colheita, interpretação…). No entanto isto é um
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“loby” tremendo a favor da citologia aspirativa por agulha grossa, uma vez que, sendo
este um método mais caro, que necessita da compra de um aparelho, há um grande
interesse da indústria na sua utilização.
Entretanto, há muitos estudos a demonstrar que não há grandes diferenças entre as duas
técnicas, na mama. A sensibilidade e especificidade são semelhantes, há falsos-positivos
e falsos-negativos nos dois.
Há uma situação em que a biopsia por agulha grossa é claramente superior à citologia
aspirativa por agulha fina: as microcalcificações. Em todas as outras situações é melhor
a citologia aspirativa por agulha fina.
Tal como o nosso grupo comprovou, não é verdade que só se pode estudar factores
preditivos, por exemplo receptores de estrogéneos e material de citologia aspirativa, por
biopsia por agulha grossa.
Evidentemente que, na biopsia por agulha grossa o aparelho faz quase tudo. Já o
sucesso da citologia aspirativa por agulha fina está relacionado com a habilidade e a
experiência de quem faz a aspiração.
Nas lesões não palpáveis da mama, tanto o exame citológico do material de punção
aspirativa como histológico de biopsia por agulha grossa não são muitas vezes o
diagnóstico definitivo. O relatório final deve ser, de preferência, enquadrado em
categorias diagnósticas, tal como acontece no exame radiológico: é maligno, benigno,
não tem material, ou é suspeito, sendo necessário retirar a lesão.
Em relação aos cistos da mama, se for único, pode fazer-se diagnóstico e tratar ao
mesmo tempo (esvaziando o cisto com a punção aspirativa).
Tecido mamário com alterações fibro-císticas.
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E aqui vêm uma imagem do seminário com as células da metaplasia apócrina que
comummente reverte para os cistos da mama.
TIREÓIDE
Bócio Colóide (difuso)
Bócio multinodular
Carcinoma papilar da tireóide
Metaplasia apócrina
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Tireoidite de Hashimoto
A tireóide pode ter patologia nodular ou
difusa, onde eu posso ver um aumento de
toda a glândula. A lesão pode ser
clinicamente palpável ou apenas
observável pela ecografia.
Com a citologia por agulha fina faz-se
diagnóstico da grande maioria das
patologias da tireóide (ex: bócios
colóides, tireoidite de Hashimoto…) e também de tumores (carcinomas papilares da
tireóide, que classicamente têm esta inclusão dentro do núcleo – ver imagem
correspondente; carcinomas medulares da tireóide, através da comprovação de que
produzem calcitonina – ver imagem correspondente).
Carcinoma folicular
No entanto, há uma situação em que a citologia aspirativa por agulha fina da tireóide
não consegue definir o diagnóstico: são os chamados tumores foliculares. Isto é uma
citologia em que aparecem muitas células, formando folículos, com pouco colóide, não
sendo possível definir, se é um adenoma folicular da tireóide ou um carcinoma. Porque
na histologia, como é que se diferencia o adenoma do carcinoma? Através de dois
� Celularidade abundante � Arranjos microfoliculares � Escasso colóide
Carcinoma medular da tireóide
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critérios: a invasão da cápsula e a invasão vascular (que não se vêm na citologia). Nesta
situação recomenda-se a cirurgia, remove-se o lóbulo e só depois se estuda a cápsula
para ver se há áreas de invasão.
Vantagens da citologia aspirativa da tireóide:
- Diagnóstico muito rápido;
- Custo muito baixo;
- Reduz muito as cirurgias desnecessárias
(Depois veio a cintilografia: via-se se captava ou não iodo. Quando o nódulo não
captava e era frio, em geral era maligno; quando era quente, era benigno. Esta técnica dá
muitos falsos-negativos e falsos-positivos. Se imaginarem um cisto da tireóide, ele deve
ser frio ou quente? Frio. É um cisto, como tal é o último a captar o iodo. Estes cistos
eram antigamente interpretados como malignos e eram retirados. Deste modo, a
citologia reduziu muito estas cirurgias desnecessárias.)
- O risco é muito baixo, mesmo em doentes com contra-indicações cirúrgicas;
- Os cistos podem ser diagnosticados e tratados;
- Pode permitir a confirmação diagnostica de um caso inoperável;
- Permite o acompanhamento de doenças funcionais como a tireoidite de Hashimoto.
GÂNGLIOS LINFÁTICOS
Faz-se citologia aspirativa por agulha fina para, por exemplo pesquisar um gânglio
aumentado num doente previamente saudável, fazer o estadiamento dos tumores
malignos, seguimento de tumores tratados, audiação do material para uma coloração ou
uma investigação especial. Praticamente não existe contra-indicação para fazer uma
citologia aspirativa por agulha fina.
Nos gânglios, a citologia aspirativa por agulha fina tem um papel muito importante nas
doenças infecciosas. Por exemplo, permite que se faça o diagnóstico da linfadenite
granulomatosa, ou seja uma inflamação crónica dos gânglios com granulomas. Pode ter
muitas causas: tuberculose, toxoplasmose, pode ser um fungo, uma micose sistémica
que pode comprometer os gânglios. Este granuloma com muitos PMN aqui no fundo, é
o granuloma de uma doença que é relativamente frequente em gânglios cervicais ou
axilares – a doença da arranhadela do gato – causada por uma bactéria, a Bartonella.
A citologia aspirativa dos gânglios linfáticos também pode fazer o diagnóstico de uma
metastase. Vocês podem chegar ao diagnóstico do sítio primário desta metastase se, por
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exemplo, pensarem na localização do gânglio e do aspecto morfológico. Mas por
exemplo, se virem uma metastase cervical de um carcinoma numa doente relativamente
jovem, vão pensar na possibilidade de ser um tumor da tireóide. As metastases que têm
células com nucléolos muito grandes e um pigmento acastanhado no citoplasma são
provavelmente de um melanoma. Se por exemplo tiverem uma metastase de um
adenocarcinoma, na região supraclavicular esquerda, vão pensar em quê? Carcinoma
gástrico.
Em relação aos tumores primários dos gânglios, a citologia aspirativa por agulha fina
muitas vezes não faz o diagnóstico definitivo do tumor. A citologia aspirativa pode
dizer: isto é um linfoma (já devem ter ideia que a classificação dos linfomas exige
muitas vezes olhar para a arquitectura do gânglio e exige que se façam técnicas
adicionais, e por isso a citologia aspirativa até pode dizer que é um linfoma, ou até que é
um linfoma de Hodgkin, mas muito frequentemente exige a retirada para estudo
histológico).
Mas há outras situações em que a citologia aspirativa pode ser muito importante,
situações que são, por vezes, de emergência médica, como acontece no linfoma
linfoblástico, um linfoma que muitas vezes acomete o mediastino de crianças. E ao
acometer o mediastino ele cresce muito rapidamente e pode comprimir a veia cava,
dando um quadro clínico chamado sdr. da veia cava superior. Esta um situação de
emergência médica (a criança pode morrer em insuficiência respiratória). Nessa
situação, a citologia aspirativa por agulha fina é muito importante pois faz o diagnóstico
deste linfoma, e este linfoma linfoblástico pode ser tratado imediatamente com drogas,
para reduzir a massa tumoral (embora não seja o tratamento definitivo da doença), de
forma a que o doente pare com a síndrome da veia cava, sendo depois abordado
novamente para um diagnóstico definitivo.
Dei-vos alguns exemplos (mama, tireóide e gânglios), mas praticamente qualquer sítio
onde uma agulha pode chegar pode ser aspirado de forma a fazer o diagnóstico:
Exemplos:
Lipoma
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Este senhor tem um nódulo no pescoço: o que é que parecem estas células? Adipócitos,
portanto isto é um lipoma (não tem sinais de malignidade).
Às vezes também se faz biopsias aspirativas a órgãos profundos, exigindo
evidentemente maior cuidado do que com os órgãos superficiais, uma vez que aumenta
o risco de complicações. Este era um doente que tinha sido operado à 5 anos por um
adenocarcinoma do cólon. Este doente voltou à consulta com queixas respiratórias,
febre, foi feito um RX e ele tinha um nódulo no pulmão. Pensou-se numa metástase.
Estranhamente este era um nódulo único, e este doente não tinha qualquer outra
manifestação de recidiva da doença, não tinha metástases no fígado, não tinha mais
nenhum sinal. Mas tinha febre, e por isso, antes de fazer quimioterapia o clínico fez uma
citologia aspirativa por agulha fina daquele nódulo. Qual foi a surpresa, que este era um
granuloma por uma infecção fúngica do pulmão. Se o doente tivesse feito
quimioterapia iria diminuir a imunidade com consequente disseminação fúngica, que
poderia ser fatal. Este é então um caso em que a citologia aspirativa foi muito
importante para fazer o diagnóstico definitivo da doença.
GLOSSÁRIO
Ora aqui está mais uma aulinha desgravada! Espero que vos seja muito útil! Boa sorte
a todos para esta última etapa! **Ana Luísa Aires**Ana Lúcia Cordeiro**
- Biópsia do tipo "core-needle"
- Citologia aspirativa por agulha fina
- Esfregaço citológico
- Imunocitoquímica
- Neurofibromatose
- Fibroma
- Leiomioma
- Lipoma
- Neurofibroma
- Pólipo
- Metastase
- Neuroblastoma
- Mama
- Mamografia
- Exame extemporâneo
- Fibroadenoma
- Metaplasia apócrina
- Tireóide
- Bócio colóide (difuso)
- Bócio multinodular
- Carcinoma papilar
- Carcinoma medular (tireóide)
- Tireoidite de Hashimoto
- Carcinoma folicular
- Invasão
- Linfadenites
- Melanoma
- Adenocarcinoma