Candombá – Rev ista Virtua l, v . 2, n. 1, j an – j un 2006 ISSN 1809-0362
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Mandaçaia: uma abelha-chave para a conservação da caatinga
Boletim Informativo
Faculdades Jorge Amado. Boletim Informativo do Curso de Licenciatura em Ciências Biológicas, Salvador, ano 2, n. 1, jun. 2006.
Edinaldo Luz das Neves* Marina Siqueira de Castro**
*Professor do curso de Licenciatura em Ciências Biológicas,
Instituto Superior de Educação das Faculdades Jorge Amado.
Doutorando em Botânica, Universidade Estadual de Feira de
Santana – UEFS. E-mail: [email protected]
*Professora da Universidade Estadual de Feira de Santana –
UEFS. Coordenadora do Laboratório de Abelhas – LABE da
Empresa Baiana de Desenvolvimento Agrícola - EBDA. Doutora
em Ecologia, Universidade de São Paulo – USP. E-mail:
A Caatinga é uma fitofisionomia
carac terística da região Nordeste, estendendo-se
do Piauí até o norte do Estado de Minas Gerais . A
origem do nome caatinga é tupi e significa mata
branca, fazendo uma referência ao fato de
apresentar, na estação seca, árvores com caules
esbranquiçados que, na ausência de folhas , dão o
tom claro àquela vegetação. (MMA, 2002).
A Caatinga é o único bioma
exclusivamente brasileiro, podendo-se afirmar
que grande parte do patrimônio biológico que
ocorre nessa região não se encontra em outro
lugar do planeta.
Para o bioma caatinga, são conhecidas
duas espécies de abelha popularmente chamadas
de mandaçaia: (1) a Melipona quadrifasciata
anthidioides Lepeletier, 1836, que não é
encontrada nas localidades próximas às margens
do Rio São Franc isco, e (2) a Melipona mandacaia
(Smith 1863), que es tá dis tribuída do norte do
es tado de Minas Gerais , atravessando o estado da
Bahia até a divisa com Pernambuco, somente nas
áreas de caatinga de domínio das bacias do Rio
São Francisco e Vaza Barris e suas áreas de
influência. Essas abelhas são muito importantes
para a polinização de muitas plantas da caatinga
(p.ex., jurema - Mimosa tenuiflora) e produzem
um mel muito saboroso e de grande valor
comercial.
A mandaçaia já foi muito abundante, mas
atualmente é rara em algumas localidades do
semi-árido baiano. Acreditamos que isso
acontece principalmente devido à carência de
árvores que formam ocos adequados para
nidificação da mandaçaia como, por exemplo,
quixabeira (Syderoxylon obtusifolium) (Figuras 1
e 2), juazeiro (Zizyphus joazeiro), pau ferro
(Caesalpinia férrea), baraúna (Schinopsis
brasiliensis ) e umburana (Commiphora
leptophloeos ).
Figura 1. Contagem e caracterização de ninhos de Melipona mandacaia em quixabeira.
Essas árvores são cortadas para serem
usadas na cons trução de cercas e como lenha em
olarias .
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Figura 2. Caule de quixabeira contendo ninhos de
Melipona mandacaia.
Outra causa da diminuição da população
de mandaçaia na caatinga é a destruição dos
ninhos pelos meleiros para a retirada de mel
(Figuras 3 e 4).
Figura 3. Baraúna sendo derrubada por meleiro
para a coleta de mel.
Figura 4. Ação dos meleiros para coletar mel:
umburana derrubada para a coleta de mel.
A localidade de nome “Saco dos Bois ”
(Figura 5), que se encontra inserida na Área de
Proteção Ambiental Lagoa de Itaparica (Figura 6),
detém a maior abundância de ninhos de Melipona
mandacaia já encontrada para o semi-árido.
Figura 5. Localidade Saco dos Bois, APA Lagoa de Itaparica.
Em trabalho desenvolvido pela
especialista em Entomologia Carla Melo Oliveira
(UEFS), foi possível registrar até 15 ninhos de
mandaçaia em um único pé de quixabeira.
(OLIVEIRA, 2002). O fato de essa localidade estar
inserida em uma Área de P roteção Ambiental
(APA) facilita os trabalhos de conservação da
mandaçaia e a realização de pesquisas que visem
conhecer melhor a biologia e a ecologia dessa
abelha, assim como o desenvolvimento de
técnicas de manejo adequadas para a sua c riação
racional.
Figura 6. Placa indicando o início da Área de Proteção Ambiental APA Lagoa de Itaparica.
Já nos mares de areia do Médio Rio São
Francisco, na localidade de Ibiraba, em uma área
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de 10 ha, foi registrado apenas um ninho de
mandaçaia em tronco de copaíba (Copaifera
coriaceae) (Figuras 7 e 8). Segundo informações
dos moradores locais , a madeira da copaíba é
muito utilizada para a construção de cercas e
como combustível doméstico e em olarias .
(NEVES; VIANA, 2002).
Figura 7. Localidade de Ibiraba (10º 47’37”S e 42º 49’25”W), mares de areia do Médio Rio São Francisco, Barra, Bahia.
Figura 8. Ninho de Melipona mandacaia em tronco de copaíba, nos mares de areia do Médio Rio São Francisco.
O Laboratório de A belhas (LABE) da EBDA
desenvolve projetos que visam incentivar a
c riação de abelhas mandaçaia como alternativa
tecnológica para os agricultores de economia
familiar no âmbito do desenvolvimento
sus tentável. Com esses projetos , pretende-se
fornecer uma alternativa de complementação da
renda dos agricultores e favorecer o aumento da
população de mandaçaia e de árvores nativas que
produzem ocos para a nidificação dessas abelhas
no semi-árido (Figuras 9 e 10).
Figura 9. Visão interna do ninho de Melipona mandacaia.
Figura 10. Medição de uma árvore de umburana contendo ninho de Melipona mandacaia.
Referências
MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE. Avaliação e ações
prioritárias para a conservação da biodiversidade da
caatinga. Brasília, 2002. 36 p.
OLIVEIRA, Carla Melo. Hábitos de nidificação de abelhas
sem ferrão do gênero Melipona Illiger, 1806
(Hymenoptera; Apidae; Meliponinae) em áreas de
Caatinga do Baixo-Médio São Francisco. 2002, 33 f.
Monografia (Especialização) – Departamento de Ciências
Biológicas, Universidade Estadual de Feira de Santana, 2002.
NEVES, E. L.; VIANA, B. F. As abelhas eussociais (Hymenoptera,
Apidae) visitantes florais em um ecossistema de dunas
continentais no Médio Rio São Francisco, Bahia, Brasil. Revista
Brasileira de Entomologia, v. 46, n. 4, p. 571-578, 2002.