Caracterização Experimental da Ignição de Partículas
Isoladas de Biomassa e Lenhite
Afonso de Oliveira Garcia Mendes Ferreira
Dissertação para obter o Grau de Mestre em:
Engenharia Mecânica
Orientadores: Professor Doutor Mário Manuel Gonçalves Costa,
Mestre Miriam Estefânia Rodrigues Fernandes Rabaçal
Júri
Presidente: Professor Doutor Viriato Sérgio de Almeida Semião
Vogal: Doutora Ana Sofia Oliveira Henriques Moita
Orientador: Mestre Miriam Estefânia Rodrigues Fernandes Rabaçal
Maio 2016
ii
iii
Agradecimentos
Em primeiro lugar quero agradecer ao meu orientador, o Prof. Mário Costa, e à minha co-
orientadora Miriam Rabaçal, pela enorme disponibilidade, apoio e orientação ao longo da elaboração
da minha tese de mestrado.
Agradeço ao Manuel Pratas e a todos os colegas e amigos do laboratório, pelo bom ambiente,
apoio e ajuda prestados no desenvolvimento do trabalho.
Agradeço ainda a todos os meus amigos que de alguma forma me apoiaram durante a
realização deste trabalho.
Por último, mas não menos importante, quero agradecer à minha família e à Patrícia pela
compreensão e apoio incondicionais demonstrados não só durante a realização do trabalho como no
meu percurso de vida.
iv
Resumo
O objectivo principal da presente dissertação é caracterizar a ignição de quatro combustíveis
sólidos originários da Turquia, nomeadamente casca de amêndoa, resíduo de oliveira e duas lenhites.
As biomassas foram peneiradas em duas granulometrias, 80-90 µm e 224-250 µm, enquanto as
lenhites apenas foram peneiradas para 80-90 µm. Os testes de ignição foram feitos num queimador
de chama plana para seis condições: temperaturas médias na zona de ignição de 1460 K, 1560 K e
1660 K, e concentrações médias de O2 de 3,5%; 5,2% e 6,5% (volume seco). O comportamento da
ignição foi estudado em termos do modo e tempo de ignição através da análise de imagens obtidas
com uma câmara de alta velocidade. O código de pós processamento de imagens existente foi
melhorado com o objectivo de calcular tempos de atraso à ignição mais precisos especialmente para
combustíveis que apresentam chamas ténues. Os resultados experimentais revelaram que: (i) as
ignições de todos os combustíveis ocorreram maioritariamente na fase gasosa, excepto para a menor
granulometria das biomassas na condição de temperatura mais baixa; (ii) os tempos de atraso à
ignição de todos os combustíveis convergem à medida que a temperatura aumenta, indicando que o
efeito da composição e do tamanho da partícula tornam-se menos importantes com o aumento da
taxa de aquecimento; (iii) face à variação de oxigénio estudada, não houve mudanças apreciáveis no
modo e tempo de atraso à ignição; (iv) verificou-se que com o aumento da humidade da partícula os
tempos de atraso à ignição aumentam também; (v) as biomassas têm um tempo de atraso à ignição
mais afectado pela temperatura do gás que as lenhites, o que revela o papel importante das
propriedades termofísicas da partícula, nomeadamente a densidade e o calor específico.
Palavras-chave: biomassa; lenhite; partículas individuais; tempo de atraso à ignição; modo de
ignição.
v
Abstract
The main goal of this work was to access the ignition behaviour of four solid Turkish fuels, two
biomasses, almond shell and olive residue, and two lignites. The biomass samples were sieved into
two sizes, 80-90 µm and 224-250 µm, whereas the lignite samples were sieved into 80-90 µm. The
experimental tests were performed in an optical flat-flame McKenna burner for six different conditions:
three mean gas temperatures in the ignition zone (1460 K, 1560 K e 1660 K) and three mean dry
oxygen concentrations (3.5%, 5.2% and 6.5% vol.). The ignition mode and the ignition delay time were
evaluated through the analysis of images obtained by a high-speed camera. The available image post-
processing script was improved in order to get more accurate ignition delay times, especially for fuels
which present weaker flames. The experimental results revealed that: (i) the ignition of all fuels
occurred predominantly in the gas phase, except for the lowest size range of both biomasses in the
lowest temperature operating condition; (ii) the ignition delay times for all fuels decrease with the
increase in the gas temperature, indicating that the particle size and composition become less
important as the heating rate increases; (iii) within the studied oxygen concentration range, its
variation did not have a significant impact on the ignition mode and delay time; (iv) it was found that
fuels with a higher moisture content showed longer ignition delay times; (v) biomass ignition delay
times were more affected by the gas temperature than lignites, indicating that particle thermophysical
properties, in particular density and specific heat, play a key role.
Keywords: biomass; lignite; single particle; ignition delay time; ignition mode
vi
Conteúdo
1 Introdução ........................................................................................................................................ 1
1.1 Motivação e enquadramento ................................................................................................... 1
1.2 Propriedades de combustíveis sólidos .................................................................................... 3
1.3 Fundamentos da ignição de combustíveis sólidos .................................................................. 4
1.4 Estudos prévios ....................................................................................................................... 6
1.5 Objectivos .............................................................................................................................. 10
1.6 Organização da tese ............................................................................................................. 10
2 Materiais e Métodos ....................................................................................................................... 11
2.1 Caracterização dos combustíveis.......................................................................................... 11
2.2 Instalação experimental ......................................................................................................... 13
2.3 Métodos e incertezas experimentais ..................................................................................... 15
2.4 Recolha e pós processamento de imagens .......................................................................... 18
3 Apresentação e Discussão dos Resultados .................................................................................. 23
3.1 Caracterização dos combustíveis sólidos ............................................................................. 23
3.2 Condições dos testes de ignição ........................................................................................... 25
3.3 Resultados experimentais ..................................................................................................... 27
3.3.1 Processo de ignição .......................................................................................................... 27
3.3.2 Modos de ignição............................................................................................................... 29
3.3.3 Fragmentação da lenhite Soma ........................................................................................ 31
3.3.4 Tempo de atraso à ignição ................................................................................................ 33
4 Fecho ............................................................................................................................................. 38
4.1 Conclusões ............................................................................................................................ 38
4.2 Trabalhos futuros ................................................................................................................... 39
Referências ........................................................................................................................................... 40
vii
Índice de Figuras
Figura 1.1: Ciclo do carbono [8]. ............................................................................................................ 2
Figura 1.2: Diagrama de Seyler [12]. ..................................................................................................... 3
Figura 2.1: Fotografias dos combustíveis testados, a) casca de amêndoa, 224-250 µm, b) resíduo de
oliveira, 224-250 µm, c) lenhite Tunçbilek, 224-250 µm, d) casca de amêndoa, 224-250 µm, e) resíduo
de oliveira, 80-90 µm, f) lenhite Soma, 80-90 µm. ................................................................................ 12
Figura 2.2: Esquema da instalação experimental e fotografia do queimador. ..................................... 13
Figura 2.3: Imagem esquemática do queimador McKenna. ................................................................ 14
Figura 2.4: Chama de pré-mistura do queimador. ............................................................................... 14
Figura 2.5: Fotografia do sistema de alimentação. .............................................................................. 15
Figura 2.6: Lado esquerdo: controlador Alicat Scientific, fonte: www.alicat.com (acedido em
1/5/2016). Lado direito: rotâmetro usado para controlar o ar de transporte. ........................................ 15
Figura 2.7: Representação da sonda e do termopar utilizados para medir temperaturas. Valores em
mm (excepto quando indicado). ............................................................................................................ 16
Figura 2.8: Sonda utilizada para medir espécies gasosas (valores em mm). ...................................... 18
Figura 2.9: Câmara, objectiva e teleconversor. ................................................................................... 19
Figura 2.10: Ilustração esquemática da recolha de imagens (1 - luz LED, 2 - vidro difuso, 3 -
queimador McKenna, 4 - câmara, objectiva e teleconversor). .............................................................. 19
Figura 2.11: Fases de identificação da partícula: a) imagem original, b) imagem resultante da
detecção de arestas, c) centróide da partícula a vermelho. ................................................................. 20
Figura 2.12: Sinal da intensidade de luz normalizada para 3 casos diferentes. Para cada caso a linha
tracejada corresponde ao sinal original e a linha a cheio é o sinal filtrado. .......................................... 22
Figura 3.1: Diagrama de Van Krevelen. ............................................................................................... 24
Figura 3.2: Imagens do MEV dos combustíveis testados e os factores de formam calculados (FF). . 25
Figura 3.3: Temperaturas do gás medidas ao longo do eixo central do tubo para as condições T1 a
T3 (símbolos vazios). Símbolos cheios mostram os valores estimados de acordo com o procedimento
descrito no subcapítulo 2.3. As barras verticais representam um intervalo de confiança de 95%. ...... 26
Figura 3.4: Concentração de O2 medido ao longo do eixo central do tubo para as condições O1 a O3.
............................................................................................................................................................... 27
Figura 3.5: Sinal da intensidade de luz filtrada para 3 partículas. Os eventos são apresentados na
figura seguinte. ...................................................................................................................................... 28
Figura 3.6: Visualização dos eventos 1 a 5. Note-se que a partícula c) não passa pelos eventos 3 e 4
uma vez que se trata de uma ignição na superfície. ............................................................................. 29
Figura 3.7: Frequência relativa de ignição na fase gasosa para as condições de operação T1 a T3. 30
Figura 3.8: Frequência relativa de ignição na fase gasosa para as condições de operação O1 a O3.
............................................................................................................................................................... 30
Figura 3.9: Exemplo de fragmentação para duas partículas de lenhite Soma. ................................... 31
Figura 3.10: Frequência relativa da fragmentação primária para as condições T1 a T3 (a) e para as
condições O1 a O3 (b). ......................................................................................................................... 32
viii
Figura 3.11: Imagens típicas do MEV para vários carvões. Imagem a) lenhite Tunçbilek, b) lenhite
Soma. As imagens c) , d), e) e f) foram retiradas de [37], c) e f) são lenhites, d) carvão betuminoso e
e) sub-betuminoso. ................................................................................................................................ 33
Figura 3.12: Tempo de atraso à ignição para as condições T1 a T3. As barras verticais representam
um intervalo de confiança de 98%. ....................................................................................................... 34
Figura 3.13: Tempo de atraso à ignição para as condições de operação O1 a O3. As barras verticais
representam um intervalo de confiança de 98%. .................................................................................. 35
Figura 3.14: Tempo de atraso à ignição em função da temperatura média da zona de ignição. Os
resultados da casca de pinheiro (CP), palha de trigo (PT) e do carvão betuminoso (BC) foram
retirados de [51]. As barras verticais representam um intervalo de confiança de 98%. ....................... 36
Figura 3.15: Variação do tempo de atraso à ignição com a humidade (% mássica, base tal e qual). Os
combustíveis são os mesmos da figura 3.14, Os resultados da casca de pinheiro (CP), palha de trigo
(PT) e do carvão betuminoso (BC) foram retirados de [51]. ................................................................. 37
ix
Índice de Tabelas
Tabela 1.1: Sumário das características dos reatores de queda livre (RQL) e entrained flow reactors
(EFR). ...................................................................................................................................................... 6
Tabela 2.1: Combustíveis sólidos e respectivas granulometrias.......................................................... 11
Tabela 2.2: Especificações do sistema de aquisição de imagem. ....................................................... 19
Tabela 3.1: Características químicas dos combustíveis. ...................................................................... 23
Tabela 3.2: Condições dos testes de ignição. ...................................................................................... 25
x
Nomenclatura
Abreviaturas
RQL Reator de Queda Livre
EFR Entrained Flow Reactor
TGA Thernogravimetric Analysis
ICCD Intensified Charged-Couple Device
CMOS Complementary Metal-Oxide-Semiconductor
fps frames per second
PCI Poder Calorifico Inferior
USP United States Pharmacopeial Convention
H Horizontal
V Vertical
Caracteres gregos
λ coeficiente de excesso de ar
Símbolos
𝑡𝑖𝑔 tempo de atraso à ignição
𝑗 frame
𝑤 peso do filtro
�̇�𝑟𝑎𝑑𝑖𝑎çã𝑜 transferência de calor associada à radiação
�̇�𝑐𝑜𝑛𝑣𝑒𝑐çã𝑜 transferência de calor associada à convecção
�̇�𝑐𝑜𝑛𝑑𝑢çã𝑜 transferência de calor associada à condução
�̇�𝑐𝑎𝑡á𝑙𝑖𝑠𝑒 transferência de calor associada a efeitos catalíticos
xi
1
1 Introdução
1.1 Motivação e enquadramento
A energia é, sem dúvida, uma das grandes preocupações da nossa sociedade, não só pela
forma como dependemos do seu uso, como também pelo impacto ambiental, económico e social que
causa. Ao longo dos últimos anos tem havido uma crescente consciencialização nesta matéria e, por
isso, vários têm sido os esforços dos governos no estabelecimento de limites para as emissões de
poluentes e fomentar o uso de energia sustentável a partir de fontes limpas e renováveis.
Mesmo com uma elevada penetração de energias renováveis no mix energético, estas não
estão sincronizadas com o consumo de energia eléctrica e, por isso, a queima de combustíveis
fósseis para a produção de energia eléctrica continua a ser indispensável. Segundo a agência
internacional de energia [1], a procura mundial das várias classes de carvões vai continuar a
aumentar devido à disponibilidade e reduzido custo deste recurso, principalmente em alguns países
como a China, os Estados Unidos da América, a Índia e a Turquia, entre outros [2].
A queima de combustíveis fósseis resulta na libertação de espécies para a atmosfera, tais
como, óxidos de azoto (NOX) e óxidos de enxofre (SOX), que são responsáveis por vários danos no
nosso ecossistema. A emissão de CO2 é a principal contribuição para o aumento dos gases com
efeito de estufa (GEE). Neste contexto, é esperado que nas próximas décadas se adoptem
tecnologias em centrais termoelétricas que permitam uma elevada eficiência na produção de energia
a partir do carvão. Uma estratégia prudente é a captura e sequestro de CO2 nas centrais alimentadas
a carvão já existentes. Esta tecnologia tem sido amplamente divulgada como um método promissor
para o controlo das emissões de GEE [3,4].
Outra estratégia para reduzir as emissões de GEE e poluentes que se está a tornar mais
comum é a queima conjunta de carvão e biomassa (co-combustão) [5], a qual, do ponto de vista
económico, é uma solução mais interessante do que construir centrais termoeléctricas de raiz
específicas para biomassa, uma vez que as existentes necessitam apenas de modificações mínimas
[6].
O facto de a biomassa ser uma fonte de energia renovável vem de encontro às preocupações
de sustentabilidade no que diz respeito ao uso dos recursos disponíveis no nosso planeta. Segundo o
Parlamento Europeu [7], biomassa é “a fracção biodegradável de produtos, resíduos e detritos de
origem biológica provenientes da agricultura (incluindo substâncias de origem vegetal e animal), da
exploração florestal e de indústrias afins, incluindo da pesca e da aquicultura, bem como a fracção
biodegradável dos resíduos industriais e urbanos“. Do ponto de vista das emissões de CO2 a
biomassa acarreta outra vantagem em relação aos combustíveis fosseis, pois, apesar de haver
libertação deste composto químico durante a sua combustão, o mesmo é absorvido no decorrer do
ciclo de crescimento da biomassa, sendo, por isso, o balanço global de carbono neutro, como ilustra
a Figura 1.1.
2
Figura 1.1: Ciclo do carbono [8].
Importa salientar, todavia, que apesar do CO2 emitido durante a combustão da biomassa não
contribuir para um aumento do CO2 na atmosfera, toda a logística inerente ao processo de
transformação da biomassa num combustível pronto a ser utilizado (cultivo, recolha, operação de
infraestruturas necessárias...) implica um aumento de CO2 na atmosfera, devido ao modelo actual,
cuja base é principalmente o uso de combustíveis fósseis.
A biomassa apresenta algumas desvantagens em relação ao carvão [9]: baixo poder calorífico (10-17
MJ/kg), elevado teor de humidade, morfologia pouco uniforme, quantidade significativa de cálcio,
silício e potássio, e elevada emissão de nanopartículas.
Para tornar a co-combustão uma estratégia cada vez mais viável é necessário modificar as
caldeiras e fornalhas existentes de forma a assegurarem uma queima mais eficiente de carvão e
biomassa. Para isto é necessário um melhor entendimento do processo de combustão, onde a
ignição devido ao seu papel na estabilização da chama é preponderante. Neste âmbito, o presente
estudo visa melhorar a actual compreensão do comportamento da ignição de partículas de biomassa
e lenhite.
Este trabalho enquadra-se numa cooperação internacional com um parceiro da Turquia, a
Middle East Technical University, que forneceu os combustíveis estudados na presente dissertação.
Os combustíveis são duas biomassas, resíduo de oliveira e casca de amêndoa e duas lenhites
provenientes de duas minas diferentes, Soma e Tunçbilek. A Turquia é um país com especial
interesse na co-combustão uma vez que possui imensas reservas de lenhite, aproximadamente 60
milhões de toneladas em 2013, cerca de 38% do fornecimento de energia primária [10], e tem na
agricultura uma grande fonte de potenciais recursos energéticos uma vez que é um dos maiores
produtores mundiais de azeitona e uva [11].
3
1.2 Propriedades de combustíveis sólidos
A biomassa e o carvão têm em comum a sua origem, matéria viva. No entanto, a escala de
tempo associada à formação dos combustíveis é uma diferença preponderante entre ambos e faz
com que tenham propriedades consideravelmente diferentes. O tipo de combustível, as suas
propriedades físicas e composição química influenciam o processo de combustão [12].
A Figura 1.2 mostra o diagrama de Seyler, onde se pode comparar as características do
carvão, da lenhite e da biomassa. O carvão é um mineral cuja análise elementar revela que é
constituído principalmente por carbono, hidrogénio, oxigénio e, em menores quantidades, enxofre e
azoto [13]. Os carvões podem ser classificados de várias maneiras, a mais frequente é por classe:
lenhite, semi-betuminoso, betuminoso, semi-antracite e antracite. A classe é baseada no poder
calorifico superior que depende principalmente da percentagem de carbono fixo, como se pode ver na
Figura 1.2.
Figura 1.2: Diagrama de Seyler [12].
A lenhite corresponde á classe mais baixa de carvão, ou seja, é a mais recente na escala
geológica. Tipicamente possui uma quantidade de carbono fixo e um poder calorifico inferior ao
carvão, apresentando um conteúdo em humidade superior. Ainda assim, pode apresentar um teor de
matéria volátil atractivo. Adicionalmente, pode apresentar conteúdos significativos de cinzas. Estas
características tornam a lenhite menos atractiva do que o carvão no que respeita à combustão; no
entanto, a sua abundância e reduzido custo tornam-na economicamente atractiva [14]. A biomassa é constituída por três componentes principais: a celulose, a hemicelulose e a
lignina; a combinação dos três é chamada de lignocelulósica. Enquanto a celulose e a hemicelulose
são macromoléculas compostas por diferentes açúcares, a lignina é um polímero fenólico altamente
ramificado [8]. Existem várias classificações que permitem agrupar a biomassa, uma das mais
4
frequentes é segundo a origem, na qual as biomassas podem ser divididas em três classes principais:
(1) madeira e materiais lenhosos, (2) plantas herbáceas e outras culturas anuais (culturas
temporárias de sequeiro e regadio) e (3) subprodutos/resíduos agrícolas e agro-pecuários (por
exemplo, cascas, caroços e peles). A biomassa é, pois, um combustível com origens
substancialmente diferentes entre si. Este facto conjugado com diferentes espécies ou partes da
planta, processos e condições de crescimento (luz solar disponível, localização geográfica, condições
atmosféricas), processo de recolha e respetivas condições atmosféricas; entre outros factores, fazem
com que a composição da biomassa seja altamente variável [13,15]. Tipicamente a biomassa tem
menos carbono, mais oxigénio e um poder calorifico mais reduzido do que o carvão. As análises
imediatas também revelam que tendencialmente tem um maior teor de humidade [13].
O poder calorífico, a percentagem de humidade e carbono fixo são três propriedades que estão
interligadas entre si e que podem limitar o uso da biomassa com combustível [15]. O poder calorífico
pode ser relacionado directamente com a concentração de carbono enquanto a humidade tem um
efeito muito importante sobre a libertação de energia durante a combustão. A combustão é um
processo exotérmico, mas a evaporação da água é um processo fortemente endotérmico e, por isso,
acima de um determinado conteúdo de humidade a combustão não é sustentada. Outra característica
muito importante da biomassa face ao carvão é a quantidade de voláteis (ver Figura 1.2); várias
biomassas têm uma quantidade de voláteis na ordem de 70% a 80% da sua composição, sendo que
no carvão normalmente não excedem 45% [6]. Isto faz da biomassa um combustível de elevada
reatividade o que facilita a sua conversão termoquímica [16].
1.3 Fundamentos da ignição de combustíveis sólidos
A ignição faz parte do processo de combustão de partículas sólidas. De uma forma sucinta, o
processo de combustão de partículas combustíveis envolve as seguintes etapas [12]:
Secagem e aquecimento das partículas;
Volatilização e ignição;
Oxidação homogénea da matéria volátil e oxidação heterogénea do resíduo carbonoso.
Não há uma sequência bem definida para estas etapas. Por exemplo, o aquecimento da
partícula pode ocorrer simultaneamente com a volatilização e oxidação dos voláteis e, mesmo, do
resíduo carbonoso.
Definição de ignição
Coelho e Costa [12] definiram ignição como o processo não estacionário em que numa mistura
de reagentes, inicialmente não reactiva, se começam a formar radicais, que se multiplicam, com
libertação de calor e rápido aumento de temperatura, dando lugar a um fenómeno de combustão
auto-sustentada. Para que isto aconteça é necessário que a temperatura seja suficientemente
elevada para provocar as tais reacções, o tempo seja suficiente para a energia absorvida pelos
5
reagentes provocar a formação em cadeia de radicais e a consequente libertação de calor
conducente à ignição.
Mecanismos de ignição
A teoria de ignição refere que há três mecanismos de ignição de partículas, ignição homogénea
ou na fase gasosa, ignição heterogénea ou na fase sólida e uma combinação dos dois modos [17].
De uma forma sucinta, ignição homogénea acontece quando o instante da ignição (onset na literatura
inglesa) ocorre nos voláteis libertados pela partícula. Por outro lado, quando ocorre uma oxidação
direta na superfície da partícula a ignição designa-se de heterogénea.
Os mecanismos, também designados de modos de ignição, têm sido um assunto controverso
ao longo do último meio século. Howard e Essenhigh [18,19] propuseram um modelo para a ignição
de partículas isoladas de carvão betuminoso em ar quando expostas a elevadas taxas de
aquecimento (104 K/s). Quando aquecidas as partículas libertam voláteis que podem começar a
queimar antes do resíduo sólido, isto acontece se os voláteis libertados forem em quantidade
suficiente para gerar uma mistura dentro dos limites da flamabilidade1 e as temperaturas locais em
redor da partícula ultrapassarem a temperatura de auto-ignição. Porém, os mesmos autores,
avançaram que com taxas de aquecimento ainda mais elevadas, o atraso no tempo de libertação dos
voláteis torna-se importante, e, caso as partículas atinjam temperaturas elevadas rapidamente, é
possível que a ignição ocorra por ataque direto do oxigénio na superfície sólida (ignição
heterogénea). Para além disso, o trabalho de Howard e Essenhigh sugere que, dependendo das
condições da combustão, é provável que partículas com um tamanho inferior a 65 µm experienciem
ignição na fase gasosa e combustão heterogénea simultaneamente. Os mesmos autores [18]
introduziram o conceito de tamanho (ou diâmetro) crítico, no qual para as mesmas condições,
partículas com um tamanho inferior ao tamanho crítico apresentam simultaneamente uma chama de
voláteis e combustão localizadas na superfície da partícula, ou seja, casos em que a ignição se dá na
superfície. O diâmetro crítico da partícula depende das propriedades físicas e químicas do
combustível sólido, das condições de queima bem como da temperatura de ignição. Outros estudos
[17,20] sugerem que a ignição na fase gasosa ocorre normalmente quando partículas de grandes
dimensões são sujeitas a baixas taxas de aquecimento (menores que 100K/s), enquanto ignição
heterógena tipicamente acontece quando partículas de dimensões menores que 100 µm são
expostas a taxas de aquecimento elevadas. Annamalai e Durbetaki [21] desenvolveram uma teoria
para a transição entre ignição homogénea e heterogénea. Estes investigadores determinaram as
temperaturas de ignição utilizando hipóteses simplificativas e afirmaram que a ignição heterogénea é
mais provável de ocorrer para partículas menores que 400 µm, fracções molares de oxigénio acima
de 15% e carvões de baixa classe.
Du e Annamalai [22] previram o efeito da temperatura ambiente e do teor da matéria volátil no
carvão na temperatura e modo de ignição. O modelo dos autores mostrou que a ignição na fase
1 Só é possível haver propagação de chama para uma gama de razões de equivalência que está entre os designados limites de flamabilidade [12].
6
sólida era predominante para carvões com menos de 70% de matéria volátil e a uma temperatura
ambiente acima de 900 K. Wall et al. [23,24] usaram várias técnicas experimentais para reavaliar o
ponto de vista desenvolvido nos anos anteriores que apoiava a probabilidade de ignição heterogénea
para partículas < 100 μm. Estes autores mostraram que, além do conteúdo de matéria volátil,
concentração de oxigénio e tamanho da partícula, que até aqui tinham tido mais destaque, factores
como a quantidade de massa injectada, a taxa de aquecimento da partícula, as condições do gás
envolvente e o mecanismo de transferência de calor associado ao aquecimento da partícula
influenciam o mecanismo de ignição. Mais importante ainda, estes investigadores [23,24] afirmaram
que a técnica específica que se usa define o modo de ignição. Na próxima secção são analisados em
maior detalhe vários trabalhos anteriores.
1.4 Estudos prévios
Neste subcapítulo são revistos estudos científicos relevantes para o presente trabalho. Os
reactores utilizados nas publicações mais recentes são normalmente um de dois tipos, RQL (Reator
de Queda Livre) e EFR (Entrained Flow Reactor). Ensaios experimentais feitos em RQL são
considerados por [25] os que melhor se assemelham ao processo e às condições da combustão do
carvão usados actualmente em caldeiras industriais de queima de carvão pulverizado; o mesmo autor
refere, no entanto, que por norma o carvão pulverizado que entra nas caldeiras industriais é exposto
a taxas de aquecimento na ordem de 105-106 K/s. Taxas de aquecimento tão altas dificilmente se
conseguem obter com um RQL, sendo mais fácil atingir estas taxas de aquecimento em reactores
EFR. Isto porque normalmente as temperaturas dos produtos de combustão são mais elevadas do
que as paredes dos reactores de queda livre. A instalação experimental usada neste trabalho,
descrita no próximo capitulo, é do tipo EFR. A Tabela 1.1 apresenta uma análise comparativa entre
ambos os equipamentos.
Tabela 1.1: Sumário das características dos reatores de queda livre (RQL) e entrained flow reactors (EFR).
Características RQL EFR
Temperatura máxima [K] ~ 1400 ~ 1800
Taxa de aquecimento [K/s] ~ 104 ~ 105
Controlo da atmosfera Fácil Limitado
Acesso óptico Difícil Fácil
Referências [6,26–29] [30–34]
Critério de Ignição
Os primeiros trabalhos neste campo, da década de 60 [18,19], definiram a ignição com base na
percentagem de voláteis e carbono perdida durante os primeiros momentos da combustão. Ainda no
século passado, Wall et al. [23] utilizaram técnicas de diagnóstico ópticas para definir o modo de
7
ignição através da luz visível emitida e do tamanho da partícula. Recentemente o uso de câmaras de
alta velocidade (cinematografia) e a pirometria têm sido duas técnicas amplamente utilizadas para
caracterizar a ignição. A pirometria permite monitorizar a temperatura da partícula ao longo do tempo.
De uma forma acessível, pode-se dizer que o faz com base nas razões do comprimento de onda
provenientes da radiação emitida pela partícula [35].
Shaddix e Molina [33] estudaram o tempo de atraso à ignição de jactos dispersos de partículas
de carvão betuminoso, tendo, para isso, registado a emissão média de CH* ao longo do tempo com
uma câmara e um filtro. Na opinião dos autores a quimiluminescência do CH* é um bom indicador do
instante inicial da ignição. Porém os mesmos autores, em [34], adotam um critério diferente de
ignição. Começaram por categorizar as imagens que captavam de partículas de carvão em três tipo:
pré-ignição, volatilização e combustão do resíduo carbonoso. O tempo de atraso à ignição foi definido
como o tempo decorrido desde a injecção da partícula no reator até metade de todas as imagens
corresponderem à volatilização; por sua vez, a volatilização foi identificada quando a luminosidade da
imagem era maior que 60% da luminosidade máxima.
Bejarano e Levendis [36] estudaram o efeito da atmosfera na combustão de carvão, com
diferentes concentrações de O2 em N2 e CO2. Estes autores utilizaram um pirómetro de três cores e
definiram a ignição quando era detectado um rápido aumento da temperatura da partícula em função
do tempo. Levendis et al. [37] apresentam o comportamento da combustão de partículas de cana-de-
açúcar com base em três técnicas de diagnóstico diferentes: pirometria, cinematografia de alta
velocidade e imagens obtidas com um microscópio electrónico de varrimento. O mesmo grupo em
[27] serviu-se da cinematografia para visualizar o modo de ignição. Com a pirometria estabeleceu o
critério de ignição como o valor máximo da derivada da temperatura da partícula em função do
tempo.
Mason et al. [31] estudaram amostras de partículas de biomassa e caracterizaram o tempo de
ignição com o auxílio de uma câmara, com a qual registaram imagens a uma taxa de 120 frames por
segundo. O critério usado pelos autores para definir a ignição baseava-se na imagem no qual era
possível ver luz intensa utilizando o contraste da imagem no máximo.
Yuan et al. [32] estudaram jactos dispersos de partículas de carvão e definiram o tempo de
atraso à ignição como o tempo desde a injecção no reactor até observar 10% da intensidade
luminosa máxima. Para isto utilizaram uma câmara de alta velocidade com um sensor ICCD e
gravaram imagens a uma taxa de 6000 frames por segundo.
Quando os investigadores têm acesso à evolução da temperatura da partícula ao longo do
tempo, existe uma tendência para definirem o instante em que começa a ignição com base nessa
informação; caso contrário, o estudo do fenómeno da ignição é levado a cabo por técnicas ópticas
com recurso a câmaras de alta velocidade e respetivo pós processamento das imagens.
Parâmetros que influenciam a ignição de combustíveis sólidos
Em geral, há muitos parâmetros que podem afectar a ignição. Coelho e Costa [12] referem a
pressão e temperatura iniciais da mistura, a sua composição química, a energia da fonte de ignição, a
sua distribuição espacial e temporal, a velocidade, a turbulência e as propriedades térmicas e de
8
transporte da mistura. No caso mais específico da ignição de combustíveis sólidos é amplamente
aceite pela comunidade científica que o diâmetro da partícula, a taxa de aquecimento, a fracção
molar de oxigénio, o conteúdo de material volátil, o tipo de combustível sólido e o mecanismo de
transferência de calor para a partícula têm um efeito significativo no modo e tempo de atraso à
ignição [17,19,21].
Efeito da composição atmosfera
Recentemente, devido ao crescente interesse na combustão oxy-fuel, o efeito da atmosfera na
ignição do carvão tem sido alvo de estudo por muitos investigadores [26]. Kimura et al. [38], Kiga et
al. [39] e Liu et al. [40] observaram tempos de atraso à ignição maiores para partículas de carvão
quando o N2 era substituído por CO2, mantendo o O2 com uma concentração de 21%. Toftegaard et
al. [41] sugeriram que este aumento se devia à maior capacidade térmica volumétrica (produto da
densidade com a capacidade térmica) do CO2 em relação ao N2. Por exemplo, a uma temperatura de
1400 K, a capacidade térmica volumétrica do CO2 é 1,67 vezes maior que a do N2, o que aumenta a
perda de calor da partícula e atrasa a ignição para níveis de O2 semelhantes [28].
Shaddix e Molina [33] reportaram um comportamento muito semelhante em relação à ignição quando
em vez de ar era usada uma mistura com 30% O2 e 70% CO2.
Além das propriedades termofísicas e de transporte do gás, a reactividade local da mistura
combustível/oxidante também é um parâmetro que influencia a ignição, sendo, por isso, esperado
que com o aumento da fracção molar de O2 a reactividade local aumente e o tempo de atraso à
ignição diminua [33,34,41].
A atmosfera que rodeia a partícula também tem um papel importante no modo de ignição.
Khatami et al. [28] estudaram três tipos de carvão norte-americano (lenhite, sub-betuminoso e
betuminoso) e observaram que em O2/CO2, para o carvão betuminoso, a probabilidade de haver
ignição na superfície aumentava com o aumento de CO2. Para o carvão sub-betuminoso, à medida
que a concentração de O2 em N2 aumentava, a tendência para as partículas fragmentarem
aumentava também e foi registada ignição heterógena dos fragmentos. Em relação à lenhite, o
mecanismo de ignição estava relacionado com a fragmentação; quando este fenómeno ocorria
durante o aquecimento da partícula, a ignição heterogénea era mais frequente devido à menor
dimensão dos fragmentos. Noutro estudo, os mesmos investigadores, Khatami et al. [29], reportaram
que a ignição na superfície é favorecida quando se usa CO2 em vez de N2 e quando a fracção molar
de O2 aumenta em ambos os ambientes.
Zou et al. [26] estudaram recentemente o efeito do vapor de água na ignição. Com um reactor
de queda livre, os autores comparam as diferenças entre atmosferas de O2/N2 e O2/H2O na ignição de
um carvão pulverizado. Estes autores relataram que a presença de vapor de água em torno das
partículas aumenta a reacção endotérmica, C + H2O → CO + H2, e a reacção exotérmica, CO + H2O
→ CO2 + H2. Estas reacções formam grandes quantidades de H2 e CO, reduzindo o tempo de atraso
à ignição da mistura de voláteis face às atmosferas O2/N2; em ambos os casos uma maior
concentração de O2 favorece a ignição, pois diminui o tempo de atraso à ignição e aumenta a
intensidade de luz visível.
9
Efeito da temperatura da atmosfera
Liu et al. [42] estudaram jactos dispersos de partículas de carvão e verificaram que, o tempo de
atraso à ignição diminuía à medida que aumentavam a temperatura dos produtos de combustão do
queimador entre 1200 K e 1670 K. Yuan et al. [32] estudaram também jatos dispersos de partículas
de carvão, e verificaram que, para a mesma concentração de O2, os tempos de atraso à ignição
diminuíam significativamente. Esta diminuição está associada à mudança do modo de ignição de
heterogéneo (a 1200 K), para hetero-homogéneo a temperaturas mais altas (1500 K e 1800 K),
devido à intensa volatilização que antecede as reacções heterogéneas a temperaturas mais
elevadas.
Efeito do combustível sólido
Levendis et al. [37] relataram que as partículas de carvão betuminoso libertam matéria volátil e
a ignição dá-se na fase gasosa formando uma chama de difusão à volta da partícula. No caso do
carvão sub-betuminoso estudado pelos autores, a maioria das partículas fragmentava antes de
ocorrer a ignição, pelo que posteriormente a ignição era heterogénea; no entanto, uma fracção das
partículas apresentava uma chama de voláteis durante um período bastante curto, a outra fracção
apresentava ignição na fase sólida. A lenhite não mostrou nenhuma chama de voláteis, o que é
consistente com as conclusões do trabalho de [21,43,44], uma vez que estes trabalhos reportaram
que a ignição nas partículas mais pequenas de lenhite ocorria no modo heterogéneo. A fragmentação
também desempenha um papel relevante no processo de ignição; Levendis et al. [37] afirmaram que
para o caso da lenhite, a tendência para haver fragmentação estava relacionada com o facto de as
partículas apresentarem uma superfície muito áspera e rugosa, cheia de vales e picos, evidente nas
imagens obtidas através de um microscópio eletrónico de varrimento (MEV).
Levendis et al. [6] estudaram a combustão de quatro biomassas diferentes num RQL sem
escoamento (esta condição era alcançada desligando os caudais de gases 10 segundos antes da
injecção das partículas). As biomassas testadas foram bagaço de cana-de-açúcar, serradura de
pinheiro, serradura de pinheiro torrada e resíduo de oliveira. Ao contrário do comportamento do
carvão, que os autores já tinham documentado noutras publicações, desta vez verificaram que
comportamento das diferentes biomassas era uniforme. A ignição era homogénea e ocorria mais
cedo do que nos carvões anteriormente testados, sendo a forma da chama de voláteis esférica,
mesmo nos casos de partículas alongadas.
No trabalho mais recente do grupo, Levendis et al. [45] compilaram todos os resultados obtidos
e as principais conclusões quanto à influência do combustível sólido. Assim, todos os carvões
betuminosos e alguns sub-betuminosos experienciam ignição homogénea; em partículas de antracite,
semi-antracite e lenhite a ignição é principalmente heterogénea; o conteúdo de fuligem e
consequentemente a luminosidade das chamas de voláteis aumenta com o aumento da classe do
carvão, de lenhite para betuminoso; e as chamas envolventes de biomassas são tipicamente ténues e
esféricas.
10
1.5 Objectivos
O objectivo principal da presente dissertação é caracterizar o comportamento de ignição de
quatro combustíveis turcos (duas biomassas e duas lenhites). As biomassas foram peneiradas em
duas granulometrias, 80-90 μm e 224-250 μm. As lenhites foram peneiradas na granulometria 80-90
μm. Ambas as amostras foram injectadas no escoamento dos produtos de combustão de um reactor
McKenna, onde se variaram as condições de operação com o objectivo de obter diferentes
atmosferas na zona de ignição. O modo e o tempo de atraso à ignição foram avaliados através da
análise de imagens obtidas com uma câmara de alta velocidade. O código existente de pós
processamento de imagens foi melhorado com o objectivo de calcular tempos de atraso à ignição de
forma mais precisa, especialmente para combustíveis que apresentam chamas ténues. Em particular
pretendeu-se:
Avaliar o efeito da composição das biomassas e lenhites no processo de ignição;
Estudar a influência do tamanho das partículas no caso das biomassas uma vez que em
aplicações práticas estas são usadas com granulometrias superiores à das lenhites;
Estudar o efeito da concentração média de O2 no processo de ignição; para isso foram
variados o coeficiente de excesso de ar e a carga térmica de maneira a manter a mesma
temperatura na zona de ignição;
Estudar o efeito da temperatura no processo de ignição; para isso foi mantido o mesmo
coeficiente de excesso de ar e a carga térmica foi variada.
1.6 Organização da tese
Esta dissertação está dividida em 4 capítulos. No presente capítulo foi feito um enquadramento
do tema, um resumo dos estudos prévios e o objectivo do trabalho foi explicitado. O capítulo 2
descreve a instalação experimental e os métodos utilizados, assim como as incertezas associadas.
No capítulo 3 são apresentados e discutidos os resultados. O capítulo 4 apresenta as conclusões do
trabalho e sugere trabalhos futuros.
11
2 Materiais e Métodos
Os ensaios experimentais foram realizados no laboratório de Combustão do Departamento de
Engenharia Mecânica do Instituto Superior Técnico, tendo sido utilizada a instalação experimental
descrita no subcapítulo 2.2. Este capítulo também descreve os combustíveis, as várias técnicas de
medida usadas, e as respetivas incertezas associadas.
2.1 Caracterização dos combustíveis sólidos
Os combustíveis sólidos usados neste trabalho foram a casca de amêndoa, resíduo de oliveira,
lenhite de Soma e lenhite de Tunçbilek. Todos os combustíveis são originários da Turquia, sendo as
lenhites provenientes de duas minas diferentes, respectivamente, Soma e Tunçbilek. Todos os
combustíveis sólidos foram processados num moinho Retsch SM 100 com um crivo em aço
inoxidável com orifícios trapezoidais de 1 mm. Posteriormente, as biomassas foram peneiradas em 2
gamas de tamanhos, 80-90 µm e 224-250 µm e as lenhites apenas na gama de tamanhos mais baixa,
uma vez que numa central termoeléctrica convencional, cerca de 75% das partículas de carvão que
alimentam as caldeiras possuem diâmetros inferiores a 75 µm [12]. Para as biomassas normalmente
são utilizadas granulometrias maiores, devido ao seu teor em humidade e a sua natureza fibrosa que
tornam a sua preparação mais complicada [16]. A peneira foi feita utilizando um Gilson SS-15 Sieve
Shaker, os crivos para as granulometrias pretendidas e de acordo com a norma 786 (método I) da
USP. A Tabela 2.1 mostra os combustíveis e as respectivas granulometrias e a Figura 2.1 mostra os
combustíveis já peneirados.
Tabela 2.1: Combustíveis sólidos e respectivas granulometrias.
Combustível Granulometria [μm]
Casca de amêndoa (CA) 224-250
80-90
Resíduo de oliveira (RO) 224-250
80-90
Lenhite Soma (LS) 80-90
Lenhite Tunçbilek (LT) 80-90
Todos os combustíveis da Tabela 2.1 foram analisados no laboratório de caracterização de
resíduos CVR (Centro para a Valorização de Resíduos) de acordo com as normas em vigor. A análise
12
imediata foi efectuada de acordo com as normas CEN/TS 15414:2006, CEN/TS 15402:2006, e
CEN/TS 15403:2006; a análise elementar (C, H e N) foi efectuada de acordo com a norma CEN/TS
15104, o S foi medido segundo a norma CEN/TS 15408; e o poder calorifico de cada combustível
sólido foi determinado de acordo com a norma CEN/TS 14918:2015.
Figura 2.1: Fotografias dos combustíveis testados, a) casca de amêndoa, 224-250 µm, b) resíduo de oliveira,
224-250 µm, c) lenhite Tunçbilek, 80-90 µm, d) casca de amêndoa, 80-90 µm, e) resíduo de oliveira, 80-90 µm, f)
lenhite Soma, 80-90 µm.
Os combustíveis foram também analisados utilizando um microscópio electrónico de
varrimento, marca Joel, modelo JSM – 7001F. Com este microscópio foi possível obter imagens das
partículas e analisar quantitativamente a sua forma. Para isto foram calculados os respectivos
factores de forma de cada amostra da Tabela 2.1. O factor de forma é simplesmente a razão entre a
maior dimensão (comprimento) e a dimensão perpendicular (largura) correspondente. Para cada
amostra os factores de forma foram calculados para um mínimo de 40 partículas. Os resultados
obtidos com os métodos descritos nesta secção são apresentados na secção 3.1 do capítulo 3.
13
2.2 Instalação experimental
Os testes de ignição foram realizados numa instalação experimental que consiste num
queimador de chama plana (designado de McKenna), com um tubo de quartzo e um sistema de
alimentação de partículas. O equipamento de medida inclui uma câmara de alta velocidade, uma
sonda para recolher espécies e uma sonda com um termopar. Um esquema da instalação
experimental e uma fotografia do queimador podem ser vistos na Figura 2.2.
Queimador McKenna
Os ensaios foram realizados num queimador de chama plana laminar (McKenna). Este
queimador trabalha com chamas de pré-mistura de metano e ar, que se estabelecem em cima de
uma matriz porosa de bronze de 60 mm de diâmetro continuamente arrefecida a água (ver Figura
2.3). A mistura ar/combustível entra no reactor, atravessa a placa porosa metálica e estabelece uma
chama plana estável para várias razões de equivalência.
Figura 2.2: Esquema da instalação experimental e fotografia do queimador.
14
Figura 2.3: Imagem esquemática do queimador McKenna.
Um tubo de quartzo com espessura de 2 mm, altura de 500 mm e diâmetro interno de 74 mm
confina o escoamento laminar de produtos de combustão e ao mesmo tempo permite acesso óptico.
As partículas são injectadas através de um tubo no centro do queimador com um diâmetro interno de
1,5 mm. A temperatura dos produtos de combustão faz com que este dispositivo possa atingir taxas
de aquecimento bastante elevadas (~105 K/s). Taxas de aquecimento desta ordem de grandeza são
semelhantes às atingidas em caldeiras de centrais termoeléctricas, nas quais normalmente um jacto
de partículas é exposto a elevadas temperaturas num curto espaço de tempo. A Figura 2.4 mostra
fotografias da chama de pré-mistura.
Figura 2.4: Chama de pré-mistura do queimador.
Sistema de alimentação
Com o objectivo de se alimentarem as partículas ao reactor foi utilizado um sistema de
alimentação que funciona da seguinte maneira: as partículas são depositadas numa seringa,
colocada verticalmente, donde caem por gravidade com auxílio de vibração, directamente num tubo
onde passa constantemente um caudal de ar controlado com um rotâmetro, que as transporta até ao
15
queimador. A vibração ajuda também na desaglomeração de partículas e facilita a injecção de
partículas isoladas no queimador. Uma fotografia do sistema pode ser vista na Figura 2.5.
Figura 2.5: Fotografia do sistema de alimentação.
2.3 Métodos e incertezas experimentais
Medição de caudais gasosos
O fornecimento de ar primário e de ar de transporte é feito com recurso a um compressor de 10
bar, Atlas Copco GX7ff. O metano utilizado era proveniente de garrafas industriais. Para ajustar os
caudais de metano e ar primário foram utilizados controladores da marca Alicat Scientific
(semelhantes aos da Figura 2.6), com uma gama de funcionamento de 0 a 5 dm3/min e 0 a 50
dm3/min, respectivamente. Os erros máximos na medição do caudal são de ± 0.2 dm3/min para o
controlador de maior capacidade e ± 0.03 dm3/min para o controlador de menor capacidade. A
medição do ar de transporte foi conseguida com o rotâmetro da Figura 2.6, cuja gama de
funcionamento é de 0 a 0.34 dm3/min. A incerteza de leitura na escala é de 2%.
.
Figura 2.6: Lado esquerdo: controlador Alicat Scientific, fonte: www.alicat.com (acedido em 1/5/2016). Lado
direito: rotâmetro usado para controlar o ar de transporte.
16
Medição de temperaturas
Para medir as temperaturas do gás foi utilizada a sonda com o termopar mostrada na Figura
2.7. O termopar é do tipo R (composto por fios não revestidos de platina/platina: 13% ródio) com 76
µm de diâmetro. Os fios são unidos através de um processo de soldadura eléctrica por resistência.
Ambos os fios já unidos são depois montados numa estrutura feita com os mesmos metais. Para
protecção e robustez, estes fios são colocados no interior de um tubo de cerâmica de duplo furo. Este
tipo de termopar tem uma gama de funcionamento entre 223 e 2041 K. A sonda é montada num
mecanismo que permite mover o termopar ao longo do eixo central do queimador. O posicionamento
do termopar tem uma exactidão de ± 1 mm. A leitura das temperaturas foi feita através de uma placa
de aquisição de dados ligada a um computador, sendo o tempo de aquisição de 30 segundos ao fim
do qual o valor médio era calculado. Além disto, cada perfil de temperatura foi repetido 3 vezes com o
objectivo de calcular as barras de erro presentes na Figura 3.3.
Figura 2.7: Representação da sonda e do termopar utilizados para medir temperaturas. Valores em mm (excepto
quando indicado).
Segundo Heitor e Moreira [46], os principais fenómenos que podem influenciar a medição de
temperatura com um termopar são as perturbações introduzidas no escoamento, os efeitos
catalíticos, e os erros de transferência de calor associados à condução e à radiação. Devido à
natureza laminar do escoamento dos produtos de combustão no queimador McKenna, as
perturbações associadas ao escoamento podem ser desprezadas. Podemos estimar a temperatura
“verdadeira” do gás através de um balanço de energia à junção do termopar, que em regime
estacionário é dado pela seguinte equação:
0 = �̇�𝑐𝑜𝑛𝑣𝑒𝑐çã𝑜 + �̇�𝑟𝑎𝑑𝑖𝑎çã𝑜 + �̇�𝑐𝑜𝑛𝑑𝑢çã𝑜 + �̇�𝑐𝑎𝑡á𝑙𝑖𝑠𝑒 (2.1)
17
A contribuição catalítica e a transferência de calor por condução são dois termos difíceis de
quantificar e com um valor significativamente menor que os termos da convecção e da radiação.
Seguindo as recomendações de [28,47], estes não foram aqui tidos em conta. Para o termo da
convecção foi assumida uma correlação para o número de Nusselt em torno de um cilindro, retirada
de [47,48]. Para estimar o termo da radiação foi assumido que a atmosfera era transparente à
radiação, o que é razoável uma vez que os produtos de combustão são maioritariamente constituídos
por moléculas de N2 e O2. Mais detalhes acerca cálculo que permite estimar a temperatura
“verdadeira” do gás podem ser consultados em [49]. As incertezas nas temperaturas medidas neste
trabalho são inferiores a 6%.
Medição da concentração de espécies gasosas
Para verificar a composição da atmosfera na qual as partículas são introduzidas foram feitas
medições de espécies gasosas. Estas medições foram feitas com recurso a uma sonda de aço
inoxidável arrefecida a água, montada num braço mecânico (o mesmo referido na medição de
temperaturas). A sonda e respectivas dimensões são apresentadas na Figura 2.8. A amostra foi
recolhida de forma continua e enviada para vários analisadores. Após deixar a sonda, a amostra de
gases era condicionada num circuito onde a humidade é retirada e partículas que poderão existir são
recolhidas em filtros. A amostra limpa e seca era, então, enviada para os vários analisadores que
mediam a concentração das espécies em percentagem volumétrica seca. Nos analisadores era
possível retirar informação sobre as espécies químicas O2, CO2, CO, NOx e HC. O O2 é analisado
através de paramagnetismo, o CO2 e o CO são quantificados por sensores de infravermelho não
dispersivo, o NOx é detetado por quimiluminescência e o HC por ionização de chama. Foram
realizadas calibrações dos analisadores com misturas padrão antes e depois de cada conjunto de
medidas. Os sinais analógicos provenientes dos analisadores eram transmitidos para um
computador, através de placas de conversão A/D, onde os dados eram apresentados graficamente a
cada segundo e o valor médio correspondente a um tempo de amostragem de 30 segundos
calculado. Os principais aspectos que podem influenciar a exactidão das medidas são as
perturbações introduzidas no escoamento pela sonda, erros associados ao facto de amostra poder
ser recolhida em condições não isocinéticas, a eficiência do congelamento das reacções e os efeitos
catalíticos na superfície da sonda. No caso presente, destes aspectos o mais importante é a amostra
não ter sido recolhida em condições isocinéticas. No entanto, por se tratar de um escoamento laminar
e com um perfil radial constante de espécies gasosas considera-se que as incertezas associadas à
medição de espécies gasosas são desprezáveis.
18
Figura 2.8: Sonda utilizada para medir espécies gasosas (valores em mm).
2.4 Recolha e pós processamento de imagens
As técnicas de diagnóstico utilizadas em combustão são normalmente de dois tipos: através da
utilização de sondas ou com recurso a meio ópticos [46]. O avanço tecnológico ao longo dos últimos
anos veio trazer novas técnicas de recolha de dados com recurso a meios ópticos, entre elas a
captura de imagens a alta velocidade.
Em estudos de ignição, as técnicas de diagnóstico ópticas são fundamentais pois permitem
identificar o modo de ignição e estabelecer um critério preciso para o tempo de atraso à ignição. No
presente trabalho foi utilizado um sistema de aquisição de imagem composto por, uma câmara de alta
velocidade com um sensor CMOS, um conjunto de lentes teleconversor, que permitem multiplicar a
distancia focal da objectiva duas vezes, e uma objectiva.
A Tabela 2.2 fornece detalhes do sistema de aquisição de imagem e a Figura 2.9 mostra a
câmara com a lente e o teleconversor. Não é usado nenhum filtro e por isso o sinal capturado
corresponde à intensidade da luz visível, que inclui radiação corpo negro e quimiluminescência – este
sinal já provou ser um bom indicador para estudar a ignição [32,34].
A câmara foi montada de forma a ficar direccionada para o centro do tubo de quartzo que
confina os gases de exaustão, com o eixo das lentes perpendicular ao eixo do tubo. Antes de cada
recolha de imagens a janela capturada era previamente calibrada com papel milimétrico; este
procedimento permite não só conhecer a altura em milímetros das imagens cuja referência é a base
do queimador, mas também focar a lente. Uma lanterna LED e um vidro difuso foram usados para
tornar possível a visualização das partículas antes da ocorrência da ignição. A Figura 2.10 mostra o
sistema descrito neste parágrafo.
19
Tabela 2.2: Especificações do sistema de aquisição de imagem.
Câmara Optronis CamRecord CR600x2
Resolução máxima (H x V) [pixéis] 1280 x 1024
Frame rate @ Resolução máxima [fps] 500
Resolução utilizada (H x V) [pixéis] 250x452 - 200x500 / 250 x 600
Frame rate @ Resolução utilizada [fps] 3500 / 2000
Tempo de exposição [s] 1/15000
Escala de cinzento 8 bit
Lente AF Micro Nikkor f/2.8 60 mm
Abertura do diafragma 2.8-5.6
Teleconversor Kenko 2x MC7 DGX p/Nikon
Figura 2.9: Câmara, objectiva e teleconversor.
Figura 2.10: Ilustração esquemática da recolha de imagens (1 - luz LED, 2 - vidro difuso, 3 - queimador
McKenna, 4 - câmara, objectiva e teleconversor).
Para cada condição e amostra de combustível foram recolhidas em média 45 partículas e,
assim, foi possível calcular um valor médio do tempo de atraso à ignição, o desvio padrão associado
e a frequência de ignições na fase gasosa. Para as partículas na gama 80-90 μm foi capturado (para
cada partícula) um conjunto de imagens numa janela onde é possível acompanhar a partícula desde
que é injectada até à ocorrência do evento da ignição. No caso das partículas maiores e porque a
20
ignição ocorre numa zona mais acima das partículas mais pequenas, foram capturadas duas janelas.
Na janela inferior a posição da partícula foi acompanhada (procedimento descrito em baixo) até uma
determinada altura acima do queimador (𝛥𝑡1), na janela suprajacente a partícula foi acompanhada
desde essa posição até à ignição (𝛥𝑡2).
A determinação do modo de ignição foi feita por meio da observação visual das imagens
recolhidas. A ignição foi considerada na fase gasosa quando era visível uma chama de voláteis à
volta da partícula. Quando a emissão de luz visível é proveniente da superfície da partícula a ignição
foi considerada como na superfície. Como foi visto na secção dos estudos prévios, alguns autores
classificam a ignição como heterogénea ou homogénea; no presente trabalho, todavia, foi adoptada a
designação de superfície em vez de heterogénea uma vez que com base no método de diagnóstico
utilizado não é possível distinguir entre reacções heterogéneas ou homogéneas que ocorrem na
superfície da partícula.
O tempo de atraso à ignição foi calculado com um script implementado em Matlab. Um código
desenvolvido previamente foi adaptado neste trabalho de forma a (i) identificar automaticamente a
posição da partícula antes da ignição e a (ii) filtrar o sinal luminoso de modo a aumentar a razão
sinal/ruído.
A Figura 2.11 mostra as várias fases de identificação da partícula. A imagem a) mostra a
imagem recolhida sem qualquer tratamento. A imagem b) mostra as arestas da partícula. As arestas
foram identificadas através do método Canny, onde são identificadas mudanças súbitas na
intensidade da escala de cinzento. Este método é tido como o mais poderoso para identificar arestas
uma vez que usa dois valores limite, para detectar arestas fracas e fortes, e inclui as arestas fracas
apenas quando estão ligadas a arestas fortes. Este método é, consequentemente, mais robusto que
os outros na medida em que é menos provável que seja enganado pelo ruído; mais detalhes sobre a
função e o método podem ser encontrados em González et al. [50]. A imagem b) é resultado do
procedimento descrito anteriormente. A imagem c) apresenta o interior das arestas das partículas
preenchidas a branco e o respectivo centroide da partícula, calculado como a combinação dos
centros geométricos de cada pixel branco, a vermelho. Foi, assim, possível medir o tempo da
partícula desde que entra na primeira janela visualizada até à posição correspondente ao limite
inferior da janela suprajacente (𝛥𝑡1).
Figura 2.11: Fases de identificação da partícula: a) imagem original, b) imagem resultante da detecção de
arestas, c) centróide da partícula a vermelho.
21
Na segunda fase (ii), é aplicado o filtro ao sinal correspondente à luminosidade máxima de
cada frame normalizada pela luminosidade máxima obtida no set de frames correspondente. O
funcionamento do filtro é ilustrado pelas seguintes equações:
𝑆𝑖𝑛𝑎𝑙′(𝑗) = 𝑤 ∗ 𝑂𝑟𝑖𝑔𝑖𝑛𝑎𝑙(𝑗) + (1 − 𝑤) ∗ 𝑆𝑖𝑛𝑎𝑙′(𝑗 − 1) (2.2)
𝑆𝑖𝑛𝑎𝑙′′(𝑗) = 𝑂riginal(𝑗) − min(𝑆𝑖𝑛𝑎𝑙′) (2.3)
𝑆𝑖𝑛𝑎𝑙′′′(𝑗) = 𝑆𝑖𝑛𝑎𝑙′′(𝑗)/max(𝑆𝑖𝑛𝑎𝑙′′) (2.4)
𝑆𝑖𝑛𝑎𝑙′′′′(𝑗) = 𝑤 ∗ 𝑆𝑖𝑛𝑎𝑙′′′(𝑗) + (1 − 𝑤) ∗ 𝑆𝑖𝑛𝑎𝑙′′′′(𝑗 − 1) (2.5)
𝑆𝑖𝑛𝑎𝑙′′′′′(𝑗) = 𝑆𝑖𝑛𝑎𝑙′′′′(𝑗)/max (𝑆𝑖𝑛𝑎𝑙′′′′) (2.6)
onde 𝑂riginal se refere ao sinal original e o peso do filtro é identificado pela letra w. Foram testados
vários valores para este parametro sendo que 0,4 foi o que produziu resultados mais satisfatórios. O
filtro foi aplicado para todas as partículas com o mesmo parametro. A equação 2.2 corresponde a uma
atenuação do ruído de modo a identificar o ruído de fundo médio que pode ser definido como
min(𝑆𝑖𝑛𝑎𝑙′). A equação 2.3 é uma translação que elimina a luz de fundo do sinal original. A equação
2.4 altera a escala da curva de modo a que esta varie entre 0 e 1. A equação 2.5 atenua o ruído e,
por fim, a equação 2.6 volta a normalizar para repor a escala entre 0 e 1.
Com este filtro digital é possível eliminar a luz de fundo, aumentar a relação sinal/ruído e
conservar as características físicas do processo mais importantes (intensidade máxima de luz e a
variação da intensidade luminosa com o tempo).
Na Figura 2.12 é possível observar as diferenças entre as curvas antes (linhas A, B e C a traço
interrompido) e depois da aplicação do filtro (linhas A, B e C a traço cheio). Note-se que se as curvas
a cheio forem deslocadas na vertical, no sentido ascendente, estas iriam sobrepor-se às curvas a
traço interrompido até à ocorrência do plateau superior. A diferença no tempo de atraso à ignição
entre o método já existente e o método desenvolvido aqui é identificado por Δt (ver Figura 2.12). Para
casos em que o gradiente é intenso, curva A, os métodos produzem resultados praticamente iguais.
Para casos onde o gradiente é menos intenso, curvas B e C, as diferenças entre as metodologias
acentuam-se. Com o sinal filtrado foi possível passar de um critério de ignição correspondente a 15%
da intensidade de luz máxima para apenas 5% reduzindo substancialmente o erro no caso particular
das biomassas de maior granulometria, quase esféricas, em que um gradiente menos intenso na
ocorrência da ignição é mais comum. Note-se que para o caso B, Δt corresponde a 2 ms. Para as
partículas de maiores dimensões o tempo de atraso (𝑡𝑖𝑔) à ignição é dado por:
𝑡𝑖𝑔 = 𝛥𝑡1 + 𝛥𝑡2 (2.7)
em que 𝛥𝑡1 é o tempo em que a partícula é acompanhada na janela inferior até à posição y, e 𝛥𝑡2 é o
tempo desde y até à intersecção do critério de 5% com a linha filtrada. Para as partículas de menores
dimensões 𝛥𝑡1 corresponde a zero visto que ignição ocorre na janela junto ao queimador.
22
Figura 2.12: Sinal da intensidade de luz normalizada para 3 casos diferentes. Para cada caso a linha tracejada
corresponde ao sinal original e a linha a cheio é o sinal filtrado.
23
3 Apresentação e Discussão dos Resultados
Neste capítulo são apresentados e discutidos os resultados. Na secção 3.1 são expostos todos
os resultados relativos à caracterização dos combustíveis, na secção 3.2 são explicitadas as
condições dos testes de ignição, e na secção 3.3 é analisado o processo de ignição, e são discutidos
todos os resultados provenientes dos testes de ignição.
3.1 Caracterização dos combustíveis sólidos
Nesta secção são apresentadas as principais características dos combustíveis e que ajudam a
explicar os resultados obtidos. A Tabela 3.1 mostra as análises imediatas, elementares e o poder
calorífico. Note-se que o carvão betuminoso utilizado em [51] é várias vezes referido ao longo do
capítulo com o objectivo de servir como comparação. Em relação à análise imediata pode-se verificar
que as biomassas são muito semelhantes. Já a lenhite Tunçbilek apresenta um carbono fixo e um
teor de voláteis próximos aos do carvão betuminoso. A lenhite Soma tem, por um lado, um teor de
matéria volátil similar ao do carvão betuminoso, mas, por outro lado, um valor de carbono fixo mais
baixo que se aproxima dos valores das biomassas. É ainda de notar que ambas as lenhites
apresentam elevados valores de cinzas, com a lenhite Soma a apresentar valores consideráveis de
humidade e de cinzas. Quanto ao poder calorífico inferior, a lenhite Tunçbilek é o combustível que
apresenta o valor mais próximo do carvão betuminoso, enquanto a lenhite Soma tem um valor mais
baixo que as biomassas.
Tabela 3.1: Características químicas dos combustíveis.
Parâmetro Casca de
Amêndoa
Resíduo
de Oliveira
Lenhite
Soma
Lenhite
Tunçbilek
Carvão
Betuminoso
Análise imediata (% mássica)1
Matéria volátil 73,0 70,7 31,4 33,3 37,6
Carbono fixo 17,6 17,1 26,0 43,9 58,8
Humidade 8,5 10,1 18,8 6,4 1,6
Cinzas 0,9 2,1 23,8 16,4 2,0
Análise elementar (% mássica)2
Carbono 47,4 48,3 45,3 57,3 76,9
Hidrogénio 6,3 6,2 3,1 5,3 5,1
Azoto 0,2 0,7 0,6 2,1 1,6
Enxofre <0,02 0,1 1,3 1,3 0,7
Oxigénio 46,1 44,7 49,7 34,0 12,1
PCI [MJ/kg] 16,2 18,6 13,4 24,1 32,7
1 base tal e qual; 2 base seca sem cinzas
24
A Figura 3.1 representa o diagrama de Van Krevelen construído a partir da análise elementar
para os combustíveis estudados e o carvão betuminoso usado em [51]. Tanto o carvão como as
biomassas se encontram nas suas zonas típicas. A lenhite Tunçbilek apresenta razões H/C e O/C
intermédias entre as biomassas e o carvão, zona típica das lenhites, mas é interessante notar que a
lenhite Soma se encontra numa zona atípica do diagrama derivado a ter uma razão de O/C
semelhante à das biomassas, mas uma razão H/C ao nível do carvão betuminoso.
Figura 3.1: Diagrama de Van Krevelen.
A Figura 3.2 apresenta as imagens do MEV e os factores de forma (FF) calculados para cada
amostra de combustível testada. Todos os combustíveis, à excepção da casca de amêndoa na gama
224-250 µm, apresentam um factor de forma inferior a 2 e, como tal, as partículas podem ser
consideradas quase esféricas. A casca de amêndoa na gama 224-250 µm apresenta um valor
ligeiramente superior cuja diferença não é significativa. De todos os combustíveis, as lenhites não só
apresentam as formas mais esféricas, como também (com base no valor do desvio padrão) são mais
homogéneas.
0,00
0,40
0,80
1,20
1,60
2,00
0,0 0,2 0,4 0,6 0,8
H/C
O/C
Casca de amêndoa
Resíduo de oliveira
Lenhite Tunçbilek
Lenhite Soma
Carvão Betuminoso
25
Figura 3.2: Imagens do MEV dos combustíveis testados e os factores de formam calculados (FF).
3.2 Condições dos testes de ignição
A Tabela 3.2 apresenta as condições dos testes de ignição. As condições de operação foram
estabelecidas da seguinte maneira: para as condições T1 a T3 a carga térmica foi aumentada através
do aumento do caudal de metano, no entanto o coeficiente de excesso de ar foi mantido constante
com o objectivo de manter a mesma concentração de O2 na zona de ignição; nas condições de
operação O1 a O3, tanto a carga térmica como o coeficiente de excesso de ar foram alterados de
maneira a obter a mesma temperatura, mas percentagens de O2 diferentes. O ar de transporte foi
mantido constante para todos os testes.
Tabela 3.2: Condições dos testes de ignição.
Parâmetro T1 T2 T3 O1 O2 O3
Carga térmica [kW] 0,7 1 2,2 1,1 1,2 2,2
Coeficiente de excesso de ar λ [-]
1,44 1,18 1,29 1,40
Ar de transporte [dm3/min] 0,14
O2 [%volume seco] 6,88 3,52 5,16 6,49
Temperatura do gás [K] 1460 1560 1660 1680
26
A Figura 3.3 apresenta os perfis de temperatura, medidos e estimados de acordo com o
procedimento descrito no subcapítulo 2.3, ao longo do eixo central do queimador para as condições
T1, T2 e T3. Os valores estimados da temperatura do gás apresentam-se mais baixos que os
medidos junto à chama porque perto desta o termopar recebe calor por radiação; no entanto à
medida que o termopar se afasta da chama, devido à perda de calor por radiação do termopar para a
envolvência, a temperatura estimada vai sendo cada vez maior face à temperatura medida. A chama
estabelece-se a uma altura de 3-4 mm acima do queimador e apresenta uma espessura de
aproximadamente 1 mm. É normal que com o aproximar da base do queimador as temperaturas
sejam menores do que na zona de ignição dado que o ar de transporte está a ser injectado à
temperatura ambiente. As temperaturas do gás são aproximadamente constantes na zona de ignição
para ambos os casos e os valores médios aumentam à medida que a carga térmica aumenta. Na
condição T1, um decréscimo da temperatura é registado para uma altura acima do queimador perto
de 30 mm. Este decréscimo é esperado e ocorre mais cedo devido às perdas de calor que têm um
efeito mais pronunciado nesta condição.
A Figura 3.4 apresenta a concentração de O2 para as condições O1 a O3. Para as três
condições, a concentração de O2 mantém-se aproximadamente uniforme na zona de ignição. Para a
condição O3 a chama estava mais levantada do que nos outros dois casos e, por isso, o jacto de ar
de transporte dissipa-se um pouco mais tarde. O facto de a sucção não ser isocinética faz evidenciar
ainda mais este efeito e, como consequência, os primeiros valores de O2 medidos são mais elevados.
Figura 3.3: Temperaturas do gás medidas ao longo do eixo central do tubo para as condições T1 a T3
(símbolos vazios). Símbolos cheios mostram os valores estimados de acordo com o procedimento descrito no
subcapítulo 2.3. As barras verticais representam um intervalo de confiança de 95%.
1100
1300
1500
1700
0 10 20 30 40
Te
mp
era
tura
[K
]
Altura acima do queimador [mm]
T1
T2
T3
Zona de Ignição
Cham
a p
lana
27
3.3 Resultados experimentais
3.3.1 Processo de ignição
A Figura 3.5 e a Figura 3.6 mostram o sinal da intensidade de luz filtrada ao longo do tempo
para três partículas distintas e os eventos que ocorrem em cada um dos marcos, respectivamente. As
3 partículas exemplificam a variedade dos casos estudados no que toca ao processo de ignição e
combustão. A linha a) é uma partícula de lenhite Tunçbilek (80-90 µm) que apresenta uma ignição na
fase gasosa testada na condição T2. A linha b) é também uma ignição na fase gasosa de uma
partícula de casca de amêndoa (224-250 µm) na condição O1. A linha c) é uma ignição na superfície
de uma partícula de casca de amêndoa (224-250 µm) na condição T2.
O evento 1 (ver Figura 3.6) mostra a partícula antes da ignição na fase de aquecimento, o
evento 2 corresponde ao instante da ignição, e o evento 3 apresenta a intensidade de luz visível
máxima durante a combustão dos voláteis. O evento 4 mostra a fase final da combustão dos voláteis
e o início visível da reacção de oxidação do resíduo carbonoso. Finalmente, o evento 5 apresenta a
combustão estabelecida do resíduo carbonoso.
Para linha a) é possível observar uma subida acentuada do sinal da intensidade de luz com a
luminosidade máxima tanto para a combustão dos voláteis como para oxidação do resíduo
carbonoso. Isto prende-se com o facto da chama de voláteis ser muito brilhante (imagem a.3), devido
à formação e emissão de fuligem, o que pode ser atribuído à presença de hidrocarbonetos pesados
na matéria volátil deste combustível (lenhite Tunçbilek). Um comportamento muito semelhante foi
observado por [37] e [52] para partículas de carvão betuminoso. Quando comparado com os outros
dois casos, todo o processo é mais rápido, o que é típico das partículas de menores dimensões.
As ignições e consequentes chamas de voláteis das biomassas, como se pode ver pelo caso
típico da casca de amêndoa (imagem b.3), apresentam intensidades mais baixas, devido à presença
de celulose e hemicelulose na biomassa que se decompõem em pequenas moléculas na forma de
hidrocarbonetos leves e CO [53], que queimam com uma intensidade menor que os hidrocarbonetos
Figura 3.4: Concentração de O2 medido ao longo do eixo central do tubo para as condições O1 a O3.
0
2
4
6
8
10
12
0 10 20 30 40
O2
vo
lum
e s
eco
%
Altura acima do queimador [mm]
O1 O2 O3
Zona de Ignição
Cham
a p
lana
28
pesados. Esta menor intensidade faz com que o sinal da intensidade luminosa, linha b), apresente um
declive menor que o da linha a).
O caso da linha c) diz respeito a uma partícula cuja ignição ocorre na superfície pois não
apresenta uma chama de voláteis descolada, não passando, por isso, pelos eventos 3 e 4. Neste
caso a chama de voláteis e a oxidação do resíduo carbonoso ocorrem simultaneamente na superfície
da partícula, com a luminosidade proveniente da oxidação do resíduo carbonoso a dominar o sinal. A
seguir à ignição (imagem c.2) a chama propaga-se pela superfície da partícula.
Figura 3.5: Sinal da intensidade de luz filtrada para 3 partículas. Os eventos são apresentados na figura
seguinte.
29
Figura 3.6: Visualização dos eventos 1 a 5. Note-se que a partícula c) não passa pelos eventos 3 e 4 uma vez
que se trata de uma ignição na superfície.
3.3.2 Modos de ignição
O modo de ignição foi avaliado por observação directa das imagens recolhidas, sendo a
ignição classificada como na fase gasosa quando era claro distinguir uma nuvem de voláteis
circundante e maior que a partícula, ou, em contrapartida, como na superfície quando a emissão de
luz visível vinha da superfície da partícula.
A Figura 3.7 e a Figura 3.8 mostram os modos de ignição para os combustíveis sólidos
estudados, excepto para a lenhite Soma uma vez que este combustível apresentou o fenómeno de
fragmentação que impossibilita a análise do modo de ignição.
A Figura 3.7 mostra que a lenhite Tunçbilek e o resíduo de oliveira na gama 224-250 μm
apresentaram ignições na fase gasosa independentemente da condição de operação. A casca de
amêndoa na gama 224-250 μm apresenta um ligeiro aumento da frequência de ignição na fase
gasosa com o aumento da temperatura. Esta subida é mais acentuada no caso das partículas de
resíduo de oliveira e de casca de amêndoa com 80-90 μm de diâmetro. A predominância de ignições
na fase gasosa está em conformidade com [51], onde é sugerido que partículas pouco alongadas,
com um factor de forma menor que 2,5, como é o caso (ver Figura 3.2), apresentem este
comportamento. No entanto, as menores partículas (gama 80-90 μm) de casca de amêndoa e resíduo
de oliveira mostram para a condição de temperatura mais baixa (T1) uma quantidade significativa
(> 50%) de ignições na superfície.
30
A transição entre modos de ignição com a variação do diâmetro da partícula foi estudada por
Howard e Essenhigh [18], que definiram um diâmetro crítico (dc) da seguinte forma. Para um
determinado conjunto de condições, nas partículas com um diâmetro inferior ao diâmetro crítico, a
chama não descola da superfície, e os voláteis juntamente com o resíduo carbonoso queimam na
superfície da partícula (ignição na superfície). A Figura 3.7 sugere que para a condição T1 o diâmetro
crítico da casca de amêndoa e do resíduo de oliveira será perto de 90 μm.
A Figura 3.8 mostra que a variação da pressão parcial de O2 tem pouco impacto no modo de
ignição e que todos os combustíveis apresentaram maioritariamente ignições na fase gasosa. Estes
resultados são consistentes com [51], onde se concluiu que para as mesmas variações de O2 não
houve uma mudança apreciável na frequência relativa de ignição na fase gasosa.
Figura 3.8: Frequência relativa de ignição na fase gasosa para as condições de operação O1 a O3.
0
50
100
O1 O2 O3
Fre
qu
ên
cia
re
lativa
de
ig
niç
ão
na
fa
se
g
aso
sa
[%
]
Condição de operação
RO 80-90 μm
CA 80-90 μm
LT 80-90 μm
CA 224-250 μm
RO 224-250 μm
Figura 3.7: Frequência relativa de ignição na fase gasosa para as condições de operação T1 a T3.
0
50
100
T1 T2 T3
Fre
qu
ên
cia
re
lativa
de
ig
niç
ão
na
fa
se
g
aso
sa
[%
]
Condição de operação
RO 80-90 μm
CA 80-90 μm
LT 80-90 μm
CA 224-250 μm
RO 224-250 μm
31
3.3.3 Fragmentação da lenhite Soma
A Figura 3.9 mostra dois exemplos típicos de fragmentação. Na coluna do lado esquerdo
consegue-se ver a partícula na fase de aquecimento (t = 10 ms) e nas imagens seguintes (t = 15, t =
17 e t = 19 ms) pode-se observar a fragmentação e ignição dos fragmentos. Em t = 21 ms ocorre a
combustão do resíduo carbonoso daquele que é o maior fragmento. Na coluna do lado direito é
possível observar a partícula na fase de aquecimento (t = 9 ms), e nas imagens seguintes (t = 14, t =
15, t = 16 e t = 17 ms) é possível ver uma nuvem de voláteis e combustão na superfície dos
fragmentos.
Figura 3.9: Exemplo de fragmentação para duas partículas de lenhite Soma.
A Figura 3.10 apresenta a frequência relativa de fragmentação primária em função das
condições T1 a T3 (a) e O1 a O3 (b). É possível observar que para as temperaturas mais altas
(condições T3, e O1 a O3) a maior parte das partículas de lenhite Soma fragmentou e apresentou um
número de fragmentos tipicamente inferior a 5. Para a lenhite Tunçbilek e para as biomassas não se
registaram casos de fragmentação. Importa referir que a fragmentação não afecta o cálculo do tempo
de atraso à ignição, pois se considerar apenas partículas que não fragmentam em todas as condições
a diferença máxima entre os resultados é de 3%.
32
Figura 3.10: Frequência relativa da fragmentação primária para as condições T1 a T3 (a) e para as condições
O1 a O3 (b).
A maior parte dos investigadores classifica a fragmentação de acordo com dois mecanismos
principais, fragmentação primária e fragmentação secundária. Zhang et al. [54] indica que
fragmentação primária pode ocorrer durante a secagem e volatilização devido ao aumento de
pressão no interior das partículas de carvão, enquanto a fragmentação secundária ocorre durante a
combustão do resíduo carbonoso.
Levendis et al. [37] estudaram a ignição de várias classes de carvões, desde lenhite a carvão
betuminoso (na gama de diâmetros 75-90 μm), e observou que as partículas de lenhite e carvão sub-
betuminoso com as superfícies mais ásperas fragmentavam, mas o carvão betuminoso, que
apresentava uma superfície mais lisa, não fragmentava. Os mesmos autores concluem que, apesar
do elevado teor de humidade das partículas de lenhite, este facto não parece estar por trás da
fragmentação uma vez que as partículas secas também experienciaram fragmentação.
A Figura 3.11 mostra imagens típicas do MEV para várias lenhites e carvões obtidas neste
estudo e retiradas do estudo de Levendis et al. [37]. Comparando as superfícies da lenhite Tunçbilek
(a) e do carvão betuminoso (d) é possível ver as semelhanças entre as superfícies pouco rugosas,
quase lisas e de arestas bem definidas. Comparando as superfícies da lenhite Soma (b) com as
lenhites (c) e (f) e com o carvão sub-betuminoso (e), é possível identificar superfícies ásperas com
pequenos montes e vales que se assemelham a escamas. Esta análise está de acordo com o estudo
de Levendis et al. [37].
0
50
100
T1 T2 T3
Fre
qu
ên
cia
re
lativa
de
fr
ag
me
nta
çã
o p
rim
ári
a [%
]
Condição de operação
LS 80-90 μm
LT 80-90 μm
0
50
100
O1 O2 O3
Fre
qu
ên
cia
re
lativa
de
fr
ag
me
nta
çã
o p
rmá
ria
[%
]
Condição de Operação
LS 80-90 μm
LT 80-90 μm
a) b)
33
Figura 3.11: Imagens típicas do MEV para vários carvões. Imagem a) lenhite
Tunçbilek, b) lenhite Soma. As imagens c) , d), e) e f) foram retiradas de [37], c) e
f) são lenhites, d) carvão betuminoso e e) sub-betuminoso.
3.3.4 Tempo de atraso à ignição
A Figura 3.12 mostra a relação entre o tempo de atraso à ignição e a temperatura média na
zona de ignição (condições T1, T2 e T3) para todos os combustíveis sólidos estudados. É possível
verificar que, independentemente do combustível sólido, o tempo de atraso à ignição diminui com o
aumento da temperatura. É interessante notar que à medida que a temperatura aumenta os tempos
de atraso à ignição das várias amostras convergem. Tal sugere que à medida que a taxa de
aquecimento aumenta, as diferenças entre os diâmetros e a composição dos combustíveis tornam-se
menos importantes, o que indica que a taxa de aquecimento do combustível sólido tem um papel
importante no tempo de atraso à ignição.
As partículas maiores de biomassa têm um tempo de atraso à ignição superior às partículas
mais pequenas. Para o mesmo combustível é expectável que a composição não varie com o tamanho
das partículas, e os factores de forma (ver Figura 3.2) não se alteram significativamente. Assim,
pode-se concluir que a taxa de aquecimento desempenha um papel principal, uma vez que as
partículas mais pequenas são sujeitas (para a mesma temperatura do gás) a taxas de aquecimento
mais elevadas.
34
Figura 3.12: Tempo de atraso à ignição para as condições T1 a T3. As barras verticais representam um intervalo
de confiança de 98%.
A lenhite Tunçbilek, cuja composição se aproxima à do carvão betuminoso, mostra tempos de
atraso à ignição inferiores aos outros combustíveis para todas as temperaturas (ver Figura 3.12). Este
facto vem de encontro aquilo que foi observado por [51], onde para a mesma temperatura e
granulometria, o carvão betuminoso apresentou menores tempos de atraso à ignição que as
biomassas estudadas. Isto poderá ser atribuído tanto às propriedades térmicas do combustível (tal
como o calor especifico e a condutividade térmica), como à sua composição e morfologia. Entre as
duas biomassas, casca de amêndoa e resíduo de oliveira, os tempos são muito similares, o que seria
de esperar visto que as suas composições e morfologias são também semelhantes. A lenhite Soma,
que tem um elevado teor de humidade e uma composição mais próxima das biomassas, apresenta
tempos de atraso à ignição próximos das biomassas.
A Figura 3.13 mostra o tempo de atraso à ignição em função da concentração de O2 para a
mesma temperatura (condições O1, O2 e O3). Os resultados mostram que para todos os
combustíveis sólidos os tempos de atraso à ignição não mudam significativamente, mantendo-se
aproximadamente uniformes.
Os trabalhos de Shaddix e Molinna [33,34] apresentam uma diminuição do tempo de atraso à
ignição com o aumento da fracção molar de O2. Em [34], fazendo uso de um entrained flow reactor,
os autores observaram uma diminuição de 25% no tempo de atraso à ignição para uma atmosfera
onde a diferença de O2 foi de 24%. No trabalho feito em [33], na mesma instalação experimental, para
uma diferença de 9% na concentração de O2 o tempo de atraso à ignição diminuiu cerca de 7%.
0
5
10
15
20
25
30
35
1400 1450 1500 1550 1600 1650 1700
Te
mp
o d
e a
tra
so
à ig
niç
ão
[m
s]
Temperatura média na zona de ignição [K]
CA 224-250 µm
RO 224-250 µm
CA 80-90 µm
RO 80-90 µm
LT 80-90 µm
LS 80-90 µm
35
Levendis et al. [29,55], verificaram num reactor de queda livre que o aumento significativo da
concentração de O2 face à de N2, tinha um impacto marginal no tempo de atraso à ignição.
Apesar de ser expectável que a reactividade local da mistura combustível oxidante aumente
com o aumento da fracção molar de O2 e tal se traduza numa diminuição do tempo de atraso à
ignição [33,34,41], os resultados aqui apresentados são coerentes pois as diferenças da
concentração de O2 não são tão significativas como em trabalhos anteriores.
Figura 3.13: Tempo de atraso à ignição para as condições de operação O1 a O3. As barras verticais
representam um intervalo de confiança de 98%.
A Figura 3.14 compara os resultados das menores partículas da presente dissertação e das
menores partículas de [51]. A laranja estão representadas as várias biomassas e a lenhite Soma, e a
azul o carvão betuminoso e a lenhite Tunçbilek. É possível verificar que o carvão betuminoso e a
lenhite Tunçbilek se agrupam à volta da linha azul com tempos de ignição inferiores face aos
combustíveis agrupados à volta da linha laranja, as biomassas e a lenhite Soma.
0
5
10
15
20
25
30
35
Te
mp
o d
e a
tra
so
à ig
niç
ão
[m
s]
Combustível sólido
O1
O2
O3
RO 80-90 µm
CA 80-90 µm
LT 80-90 µm
LS80-90 µm
CA 224-250 µm
RO224-250 µm
36
Figura 3.14: Tempo de atraso à ignição em função da temperatura média da zona de ignição. Os resultados da
casca de pinheiro (CP), palha de trigo (PT) e do carvão betuminoso (BC) foram retirados de [51]. As barras
verticais representam um intervalo de confiança de 98%.
Khatami e Levendis [45] apresentam um sumário de tempos de atraso à ignição para vários
combustíveis. Estes autores reportam tempos de atraso à ignição pela seguinte ordem decrescente:
antracite, lenhite, sub-betuminoso, betuminoso e biomassa. No trabalho de Khatami e Levendis [45] a
biomassa mostrou um comportamento oposto ao que se observou no presente estudo. No entanto, o
teor de humidade da biomassa estudada (bagaço de cana de açúcar) é bastante baixo (~4%), ao
nível do carvão betuminoso e da lenhite Tunçbilek, que são os combustíveis da Figura 3.14 que
apresentam menores tempos de atraso à ignição. Esta observação indica que humidade pode
desempenhar um papel importante na ignição.
A Figura 3.15 mostra o tempo de atraso à ignição em função da percentagem de humidade dos
vários combustíveis. Para cada combustível apresentam-se os dados relativos às várias temperaturas
da Figura 3.14. Nota-se uma tendência do aumento do tempo de atraso à ignição em função do
aumento da humidade. A figura também evidência que o carvão betuminoso e as lenhites são menos
afectadas pela temperatura do gás, o que poderá estar relacionado com as propriedades termofísicas
das partículas (por exemplo, densidade e calor especifico).
0
5
10
15
20
25
1400 1450 1500 1550 1600 1650 1700 1750 1800 1850
Te
mp
o d
e a
tra
so
à ig
niç
ão
[m
s]
Temperatura média na zona de ignição [K]
RO 80-90 µm
CA 80-90 µm
CP 80-90 µm
PT 80-90 µm
LS 80-90 µm
LT 80-90 µm
BC 80-90 µm
37
Figura 3.15: Variação do tempo de atraso à ignição com a humidade (% mássica, base tal e qual). Os
combustíveis são os mesmos da figura 3.14, Os resultados da casca de pinheiro (CP), palha de trigo (PT) e do
carvão betuminoso (BC) foram retirados de [51].
38
4 Fecho
4.1 Conclusões
O presente trabalho centrou-se no estudo de ignição de quatro combustíveis originários da
Turquia, casca de amêndoa, resíduo de oliveira e duas lenhites, Soma e Tunçbilek. As biomassas
foram peneiradas em duas granulometrias, 80-90 μm e 224-250 μm enquanto as lenhites apenas
foram peneiradas para 80-90 μm. Os testes de ignição foram feitos num queimador de chama plana
para várias condições: temperaturas médias na zona de ignição de 1460 K, 1560 K e 1660 K, e
concentrações médias de O2 de 3,5; 5,2 e 6,5 (% volume seco). O processo de ignição, o modo e o
tempo de atraso à ignição foram analisados com o auxílio de uma câmara de alta velocidade, sendo
as principais conclusões deste estudo as seguintes:
As duas biomassas apresentaram composições e factores de forma semelhantes. A lenhite
Tunçbilek apresentou uma composição típica das lenhites, mas uma morfologia semelhante à
do carvão betuminoso. A lenhite Soma apresenta uma composição atípica aproximando-se
tanto do carvão, no que respeita ao teor de voláteis, como da biomassa no que respeita ao
teor de carbono, e uma morfologia semelhante a outras lenhites. Adicionalmente, a lenhite
Soma encontra-se próxima das biomassas no diagrama de Van Krevelen. É ainda de notar
que ambas as lenhites apresentam elevados valores de cinzas, com a lenhite Soma a
apresentar também valores consideráveis de humidade.
As ignições de todos os combustíveis ocorrem maioritariamente na fase gasosa, excepto para
a menor granulometria das biomassas na condição de temperatura mais baixa.
Os tempos de atraso à ignição de todos os combustíveis convergem à medida que a
temperatura aumenta, indicando que os efeitos da composição e do tamanho da partícula
tornam-se menos importantes com o aumento da taxa de aquecimento.
Face à variação de oxigénio estudada, não houve mudanças apreciáveis no modo e tempo
de atraso à ignição.
Verificou-se que com o aumento da humidade os tempos de atraso à ignição aumentam
também, demonstrando o papel importante da humidade no tempo de atraso à ignição.
As biomassas tiveram um tempo de atraso à ignição mais afectado pela temperatura do gás
que as lenhites, revelando o papel importante das propriedades termofísicas da partícula,
nomeadamente a densidade e o calor específico.
39
4.2 Trabalhos futuros
Entre os combustíveis estudados, a lenhite Soma apresenta um teor de humidade e cinzas
elevado, pelo que seria interessante estudar o impacto de ambos os factores na ignição, por exemplo,
através da secagem e desmineralização da amostra de modo a isolar estes efeitos.
Também seria interessante estudar a ignição num reactor de queda livre onde mais facilmente
se pode variar a composição da atmosfera, nomeadamente para a biomassa, onde estudos deste
género são escassos.
Finalmente, estender o presente estudo para uma gama mais extensa de granulometrias seria
também muito interessante com o objectivo de relacionar observações experimentais com o diâmetro
das partículas.
40
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